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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XVIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Caxias do Sul - RS – 15 a 17/06/2017
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As inferências do universalismo dos direitos humanos na construção narrativa do
Jornal Piorneiro sobre o processo migratório de senegaleses no RS 1
Daniel de Moura PINTO2
Liliane Dutra Brignol ³
Universidade Federal de Santa Maria
RESUMO
O presente trabalho tem como proposta analisar as construções narrativas do jornal
Pioneiro, pertencente ao grupo RBS, acerca do processo migratório de senegaleses em
Caxias do Sul, RS, e suas inferências ideológicas a partir da concepção universalista de
direitos humanos frente o paradigma da tolerância e do reconhecimento. Temos como
base os conceitos do pensamento abissal e as ilusões que constituem o senso comum
dos direitos humanos, proposto por Boaventura de Sousa Santos, e o conceito de
discurso competente proposto por Marilena Chauí. Procura-se, a partir da análise de
discurso (ORLANDI), verificar em que medida as inferências ideológicas discursivas
adotadas pelo jornal, frente às diferenças culturais e ao paradigma de tolerância
(PINTO) e reconhecimento refletem a concepção universalista dos direitos humanos.
.
PALAVRAS-CHAVE: jornal; imigrante; direitos humanos; universalismo; tolerância.
INTRODUÇÃO
A globalização é o processo pelo qual determinada condição ou entidade local
estende a sua influência a todo o globo, e ao fazê-lo, desenvolve a capacidade de
designar como local a condição social ou entidade rival. A concepção de Boaventura de
Sousa Santos (2014) elucida o campo de disputa e rompimento das fronteiras materiais
e subjetivas estabelecida no capitalismo ocidental. As diásporas de imigrantes, que se
locomovem segundo suas pretensões, sejam essas políticas, sociais e econômicas,
1 Trabalho apresentado no DT 1 – Jornalismo do XVIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul,
realizado de 15 a 17 de junho de 2017. 2 Mestrando em Comunicação Midiática, Linha Mídia e Identidades Contemporâneas pelo Programa de
Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Santa Maria (POSCOM-UFSM), email:
3 Orientadora do trabalho. Professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação, do Departamento de
Ciências da Comunicação, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, Santa Maria - RS). Doutora e
mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos, São
Leopoldo - RS), email: [email protected]
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evidenciam de maneira explícita as contradições que permeiam a linha abissal que
separa o mundo em duas partes: o Norte, eurocêntrico, civilizado, e o Sul, primitivo.
As formas de dominação vigentes no capitalismo globalizado sustentam-se em
preceitos de herança colonial, a partir de binômios excludentes, como aponta Bhabha
(2013), os quais tendem a ver o diferente sob a construção discursiva do outro. A
hierarquia estabelecida na relação entre dominantes e dominados não se restringe ao
campo material, mas principalmente no campo das ideias e dos saberes. As diferentes
compreensões de mundo e de dignidade humana, amplas dentro da diversidade de
concepções ideológicas, práticas e particularidades culturais, chocam-se com a
compreensão ocidental do mundo que tende a reduzi-lo sob seu entendimento ignorando
ou trivializando as decisões e o modo de experiência culturais do Sul global.
Os meios midiáticos, fundamentados por uma ideologia competente, como
afirma Chauí (2014), possuem lugar de privilégio na formação da opinião pública a
partir da construção narrativa dos fatos. Entende-se que esse processo narrativo está
imbuído de ideologia, e que por esse motivo, deve-se ater um olhar crítico, observando
as camadas discursivas que o constituem sob a ótica do que não está dito, como defende
Orlandi (2001).
Tendo em vista o contraste entre a concepção universalista dos direitos humanos
frente às diferentes concepções culturais dos povos no mundo globalizado e a
competência do poder midiático em constituir suas narrativas como legitimadores do
saber hegemônico, o problema de pesquisa proposto é: em que medida o meio midiático
reproduz as inferências ideológicas dos direitos humanos universalistas para construir
sua representação dos fatos frente ao processo migratório senegalês em Caxias do Sul
no estado do Rio Grande do Sul? O trabalho tem como objetivo analisar as construções
narrativas do jornal Pioneiro, pertencente ao grupo RBS, acerca do processo migratório
de senegaleses em Caxias do Sul, RS, e suas inferências ideológicas acerca dos direitos
humanos universalistas frente o paradigma da tolerância e do reconhecimento.
O objeto escolhido foi o Jornal Pioneiro, pertencente ao grupo RBS, tendo em
vista o recente fenômeno da diáspora migrante de senegaleses no Rio Grande do Sul que
a partir de 2010 começaram a se deslocar para o Brasil, especificamente em Caxias do
Sul, sobretudo, na busca de melhores condições de vida.
Para se pensar ideologia deve-se analisar o corpus a partir da interpretação, uma
vez que essa é regulada por possibilidades em suas condições, e não um mero gesto de
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apreensão de sentido, como aponta Orlandi (2001). Portanto, como método de pesquisa,
utilizar-se-á a análise de discurso sob a concepção do não-dito para que se adentre no
discurso não somente na sua camada superficial, mas também no que está implícito ao
mesmo.
1 As pretensões universalistas dos direitos humanos e o paradigma entre tolerância
e o reconhecimento
Dentre as concepções adotadas como gramáticas de dignidade humana, a que se
toma por destaque e que é recorrentemente enaltecida não somente pelas estruturas
normativas, mas corroborada pelos meios midiáticos é a do universalismo dos direitos
humanos. Entretanto, como constata Boaventura de Sousa Santos (2014), grande parte
da população mundial não é sujeito de direitos humanos, mas sim o objeto de discurso
de direitos humanos.
Esta percepção assevera a teoria de que o paradigma da modernidade ocidental,
sob a égide idealismo filosófico e cartesiano, determina uma dicotomia abissal que
contrapõe sujeitos e objetos, metrópoles e colônias, europeus e não-europeus,
civilizados e primitivos, nacionais e imigrantes, de tal forma que resgata uma herança
colonial que atende interesses de uma classe hegemônica.
Sob o pretexto de ser universalista, a versão hegemônica dos direitos humanos
caracteriza-se primordialmente por ser universalmente válida, independentemente das
variáveis sociais, políticas e culturais, assim evitando qualquer forma de
reconhecimento real da diferença. Concebe-se a natureza humana como individual,
autossustentada e, tomando para si presunção binomial excludente apontada por Bhabha
(2013), qualitativamente diferente da natureza não humana.
Essa acepção realoca os sujeitos sob a lógica de um pensamento abissal, que
divide a realidade social em dois universos distintos: o universo deste lado da linha, e o
outro fora da linha, ou seja, marginalizado. Boaventura (2010) afirma que tudo aquilo
que é produzido como inexistente é excluído de forma radical porque permanece
exterior ao universo que a própria concepção aceite de inclusão considera como sendo o
“OUTRO”. Consoante a impossibilidade de copresença dos dois lados da linha, a
diferença ocupa-se de maneira saliente como prerrogativa na construção do discurso do
outro. Entretanto, como salienta Bhabha (2013), a representação da diferença não deve
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ser vista como reflexos de traços culturais ou étnicos inscritos por meio de discurso e
estratégias que tentam fixar-se por meio de binarismos excludentes a identidade do
outro.
Essa lógica demonstra que os direitos humanos, enquanto discurso de
emancipação, foram historicamente concebidos para vigorar nas sociedades do Norte
Social e para tanto possuem em sua base elementos como pretensão de universalidade
abstrata, de proposição de identidade homogênea e igualdade formal de todos os seres
humanos.
Consoante Boaventura (2014), é pertinente afirmar que as exclusões radicais
produzidas pelos mecanismos que engendram as linhas abissais, não foram superadas
após o fim do colonialismo histórico, mas sim, renovadas sob novas formas como
neocolonialismo, trabalhadores imigrantes indocumentados, xenofobia e racismo. Tendo
em vista o contexto da globalização econômica e as diásporas migrantes que abrangem
diferentes partes do mundo, observa-se que a afirmação do pensamento abissal, como
representação hegemônica da racionalidade moderna, assujeita os imigrantes a uma
condição subalterna no qual não são reconhecidas suas presenças, protagonismo de sua
história, e diferenças culturais.
Ao invés disso, resta-lhes um arcabouço de esquecimento, em que são negadas
questões materiais, sociais e históricas que permeiam tais fluxos migratórios, e que, por
conseguinte, não podem ser contemplados por uma visão que se pretende universalista,
como a de direitos humanos. De fato, os imigrantes deixam de ser vistos como sujeitos,
e são postos como objetos, alheios de sua condição de ação política, de suas construções
identitárias próprias e transformando-se em meros objetos de discurso de direitos
humanos hegemônico.
Essa hegemonia do qual gozam os direitos humanos na acepção universalista
adequa-se a um modelo de individualismo burguês emergente, que tinha por referência
a teoria liberal e o capitalismo. Dessa forma, construiu-se a ideia de que o caminho no
qual se desenvolveu o pensamento de consagração dos direitos humanos como
princípios reguladores de uma sociedade justa se deu de forma linear. Esta ideia de
consenso há muito anunciado, manifesta-se de várias formas, e cada uma delas assenta
numa ilusão como afirma Boaventura (2014).
A primeira ilusão apontada por Boaventura (2014) é a ilusão teleológica que
consiste em ler a história de frente para trás, partindo do consenso que existe hoje sobre
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os direitos humanos, sobre o bem incondicional que isso significa, e a leitura da história
passada como um caminhar linearmente orientado para conduzir a este resultado. Ao
tomar como referência a mídia e suas construções narrativas, observa-se que
recorrentemente se corrobora esta ilusão que age como constituinte da construção de um
discurso pós-facto dos precursores, impedindo de ver que o presente tal como o passado
é contingente, que em cada momento histórico, diferentes ideias estiveram em
competição e que a vitória de uma delas, é um resultado contingente que pode ser
explicado a posteriori, mas que não poderia ser deterministicamente previsto.
A segunda ilusão apontada é a triunfalista, que utiliza a teleológica de maneira
basilar, e consiste na ideia de que a vitória dos direitos humanos é um bem humano
incondicional. Segundo Boaventura (2014), esta noção darwiniana não toma em conta
um aspecto decisivo da modernidade ocidental hegemônica, de fato, o seu verdadeiro
gênio: o ter sempre sabido complementar a força das ideias que servem os seus
interesses com a força bruta das armas que, estando supostamente ao serviço das ideias,
é na prática, servida por ela.
A gramática de direitos humanos torna-se vencedora enquanto linguagem de
emancipação humana, porém reflete-se num histórico de subjugação histórica. A
condição explícita para superar uma etapa se dá pela derrocada de outra, ou seja, um
confronto ideológico que ocupa o espaço emancipatório. O fortalecimento que todos são
sujeitos de direitos, sob a ótica dos direitos humanos, realoca-se num discurso que
preponderantemente visualiza os sujeitos de tais direitos, porém não os contempla.
A terceira ilusão, descontextualização, apresenta-se não somente no campo dos
direitos humanos, mas recorrentemente no meio midiático. No que concerne aos direitos
humanos é pertinente assumir que o mesmo foi utilizado como arma política, ideológica
em contextos distintos e com objetivos contraditórios. Boaventura (2014) exemplifica a
partir do paradoxo que se estabeleceu na transição da concepção de ação dos direitos
humanos no século XVIII e XIX. No século XVIII, os direitos humanos eram parte
integrante dos processos revolucionários em curso e foram uma das suas linguagens.
Após as revoluções de 1848 (primaveras dos povos), esses direitos passaram a ser hostis
a qualquer ideia de transformações revolucionaria da sociedade.
Nota-se que a hipocrisia que permeia a legitimação de ação e prática através dos
direitos humanos universais ainda permanece recorrente, como se observa na inserção
de países em território alheio sob o pretexto de ajuda humanitária ocidentalista.
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Gradualmente, o discurso dominante dos direitos humanos passou a
ser o da dignidade humana, consoante com as políticas liberais, como
o desenvolvimento capitalista e suas diferentes metamorfoses e com o
colonialismo igualmente metamorfoseado (neocolonialismo,
colonialismo interno, racismo, trabalho análogo ao escravo,
xenofobia, política migratórias repressivas). (SANTOS, 2014, p. 49).
A quarta ilusão é o monolitismo, que consiste em minimizar as tensões e
também as contradições internas das teorias dos direitos humanos. Segundo Boaventura
(2014) desde seu início os direitos humanos cultivam a ambiguidade de criar pertença
em duas grandes coletividades: a primeira é coletividade supostamente mais inclusiva à
humanidade e a segunda é uma coletividade que se restringe a coletividade de um
cidadão de determinado estado. Apesar da incorporação dos direitos humanos nas
constituições e nas práticas jurídico-políticas de vários países, estes foram
reconceptualizados como direitos de cidadania, diretamente garantidos pelo Estado e
aplicados coercitivamente pelos tribunais. Logo, os direitos humanos surgem como a
escala mais baixa de inclusão, sendo sua evocação necessária quando falhavam os
direitos de cidadania.
Por fim, a quinta ilusão é o antiestatismo. Historicamente, os direitos humanos
emergem na modernidade ocidental como resultado de um duplo processo de
secularização e de individualização que se vai traduzindo social e politicamente numa
exigência contra o estado absolutista, aponta Boaventura (2014).
Nesse período se consolidou a ideia de que os direitos humanos exigiam apenas
uma atitude negativa do Estado, que por sua vez deveria abster-se de qualquer ação para
irromper com as demandas do povo. Por outro lado, no século XXI, o Estado tem
permanecido no centro do debate dos direitos humanos. Porém deve-se ater atenção que
a reconfiguração o poder do Estado que daqui decorre obriga a que na identificação e na
punição das violações de direitos humanos seja incluída as ações daqueles cujo poder
econômico é suficientemente forte para transformar o estado em um dócil instrumento
dos seus interesses.
Compreender as ilusões que permeiam a afirmação hegemônica dos direitos
humanos quanto universalistas é o princípio para a formação de uma prática contra
hegemônica de direitos humanos que destitua a ambiguidade que lhe garante o consenso
na opinião pública. Da mesma forma, torna-se importante observar as incursões desse
discurso que se fazem presentes nas narrativas midiáticas, que por sua vez, instituídas
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de competência, articulam-se ideologicamente para firmar versões dos fatos são
transmutados em um simulacro de realidade.
Nesse trabalho se dará ênfase a ilusão monolítica dos direitos humanos
universais direcionando olhar para a questão de liberdade de crença quanto direito
humano tendo em vista a tensão existente entre tolerância e reconhecimento. Pinto
(2016) afirma que a tolerância pensada em termos políticos pode levar à perigosa ideia
do mal menor, da abertura limitada à presença do outro, deixando intacta a fronteira
entre quem tolera e quem é tolerado, o segundo não modifica o primeiro.
A multiplicação das identidades dá o conteúdo para o discurso da
fragmentação e, por vias de consequência, dá espaço para a noção do
particular em contraposição ao universal. A ameaça ao universal
aparece por sua vez em muitos discursos como a ameaça aos direitos
universais conquistados pela humanidade e, por efeito disto, como
uma porta para a intolerância, já que nada está mais garantido a priori
como verdade que deva ser respeitada. (PINTO, 2016, p. 9)
Quando se coloca em questão dois grupos distintos, eis que usualmente recai-se
em um problema fundamental onde dos grupos institui-se o normal em contraponto ao
outro dos diferentes. O segundo se define em relação ao primeiro, onde por sua vez
instaura-se um cenário onde o limite para igualdade, a justiça e a solidariedade torna-se
a tolerância, aponta Pinto.
Tendo em vista o contexto de globalização econômica e as recentes diásporas
migrantes que tem se insurgido frente as fronteiras nacionais estabelecidas, é pertinente
compreender tais fenômenos de maneira que se proponha um olhar de alteridade que
compreenda o reconhecimento da diferença como riqueza cultural dos povos, suas
intersecções e respeito de saberes.
2 O discurso competente midiático e sua inserção ideológica quanto senso comum
As análises dos diversos fenômenos informacionais partilham a concepção de
que eles fazem parte de um sistema que se articula à lógica da vida social. Tendo em
vista que os meios de comunicação possuem lugar privilegiado na produção e
reprodução do real, deve-se assumi-los como interferentes cruciais e diretos na
organização do espaço relacional (HOBSBAWN, 1995). Entende-se que, não por acaso,
as construções das representações acerca do social, não são desprovidas de interesse e,
por consequência, são propositalmente movidas pelos mesmos. Dessa forma, acreditar
que um enunciado pode ser livre de qualquer tipo de coerção é algo utópico.
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Assim, Maingueneau (1987) reitera que as instâncias de enunciação devem ser
compreendidas em termos de lugares, visando a enfatizar a preeminência e a
preexistência da topografia social sobre os falantes que aí vêm se inscrever. Ou seja, o
discurso está inerentemente envolvido sob circunstâncias do seu meio, devido a
enunciação partir de um sujeito que ocupa um lugar inserido numa sociedade localizada
historicamente que está configurada a partir de suas particularidades. Foucault (2014)
reforça essa ideia ao afirmar que se deve determinar qual é a posição que pode e deve
ocupar cada indivíduo para dela ser o sujeito, e que, a partir do momento que ocupa um
lugar de enunciação, supostamente o detém.
Dessa forma, não há como desassociar os sujeitos e seus discursos, ou seja, não
se deve entender a relação discursiva como um jogo de intenções onde o enunciador
pressupõe uma suposição de resultados do que está sendo dito, com objetivos de
satisfazer alguma finalidade. Este assujeitamento leva a pensar o sujeito como
atravessado pela ideologia e pelo inconsciente, um sujeito que, não sendo fonte nem
origem do dizer, seria afetado pelo já-dito e pelo pré-construído, como afirma Althusser
(1985).
O impacto maciço da ideologia dominante na vida social como um todo só pode
ser apreendido em termos da profunda afinidade estrutural existente entre as
mistificações e inversões práticas, por um lado, e suas conceituações intelectuais
ideológicas, por outro. Se estas últimas se tornam “sedimentadas” na forma
prevalecente do “senso comum” da maneira como o fazem, este fato se deve à mesma
afinidade estrutural originada da base de determinações materiais compartilhados por
todas as modalidades de ideologia, sejam produzidas por relativamente poucos
intelectuais especializados ou por inúmeros indivíduos que são, ao mesmo tempo,
contribuintes ativos para formação do senso comum e seus sustentadores.
Na realidade o “senso comum” pode avaliar e confirmar ativamente, por sua
própria conta, a dominação das determinações estruturais básicas da sociedade
mercantil, que também penetram nas conceituações ideológicas sistemáticas. Tendo em
vista que, a questão do exercício do poder pelos meios de comunicação de massa,
reconhecendo seu caráter como aparelho ideológico determinante na sedimentação de
uma ideologia como senso comum, Chauí (2014) propõe uma observação das mídias de
massa por dois aspectos principais, o econômico e o ideológico.
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Observando pelo viés econômico os meios de comunicação de massa são
empresas privadas que num cenário político econômico da globalização,
exponencialmente foram se fundido a partir de aquisições de tal formar a compor
companhias globais que possuem lugar de domínio no mercado da informação. Logo, o
poder econômico, graças ao qual os meios de comunicação instituem o espaço e o
tempo público, não é exercido por agente que deliberam e agem por seus interesses, mas
sim por imperativos do capital.
O poder midiático é um mecanismo de tomada de decisões que
permite ao modo de produção capitalista, transubstanciado em
espetáculo, sua reprodução automática. São ações que exibem poder
mas não constituem, pois sua constituição encontra-se no modo de
produção do capital (CHAUÍ, 2014, p.185).
Do ponto de vista ideológico, adotando como referência a análise de Claude
Lefort (1982) sobre a ideologia contemporânea como ideologia invisível percebe-se que
o poder econômico apesar de aparentar estar localizado nos proprietários das empresas
da indústria da comunicação, está verdadeiramente disposto como poder não localizado
no Capital, assim como também, mas inversamente, as representações ou imagens que
constituem a ideologia aparecem desprovidas de localização, embora estejam
precisamente localizadas nos centros emissores de comunicação.
Lefort (1982) descreve que a ideologia como invisível porque não aparece
construída nem proferida por um agente determinado, recaindo em um discurso
anônimo e impessoal, que carrega em si a formação de um discurso unitário que se
distorce para um entendimento precipitado de discurso social. Segundo Chauí (2014), a
ideologia invisível só se torna compreensível como exercício de poder se a
consideramos por outro prisma, aquele da ideologia da competência.
O que possibilita a intimidação dos especialistas é, de um lado, a presença
cotidiana, em todas as esferas da nossa existência, da competência como forma que
confere sentido racional às divisões, assimetrias, desigualdades e hierarquias sociais, e
de outro, sua manifestação reiterada e perfeita na estrutura dos meios de comunicação,
que, por meio do aparato tecnológico, de atopia e da acronia, e dos procedimentos de
encenação e de persuasão, aparecem com a capacidade mágica de fazer acontecer o
mundo. Ora, essa capacidade é a competência suprema, a forma máxima do poder, o de
criar a realidade. E esse poder é ainda maior graças aos poderes técnico-científicos, essa
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realidade é virtual ou a virtualidade é real, assim o poder ideológico– político se realiza
como produção de simulacros.
Marilena Chauí (2014) intitula de discurso competente, aquele que pode ser
proferido, ouvido, e aceito como verdadeiro ou autorizado porque perdeu os laços com
o lugar e o tempo de sua origem, ou seja, não é qualquer pessoa que pode dizer qualquer
coisa a qualquer outro em qualquer lugar sob quaisquer circunstâncias. Não se deve
confundir esse tipo de discurso como se fosse inspirado por ideias e valores, mas sim,
na suposta realidade dos fatos, vistos que esses mesmo são fruto de um processo de
construção do indivíduo e na suposta eficácia dos meios de ação.
As condições de prestígio para que o discurso competente tenha aceitação como
discurso do conhecimento depende primordialmente de uma aceitação da incompetência
dos homens enquanto sujeitos sociais e políticos. Assim, segundo Chauí (2014) “para
que esse discurso (competente) possa ser proferido e mantido é imprescindível que não
haja sujeitos, mas apenas reduzidos à condição de objetos sociais”.
Uma vez deslocado do político e do social, o indivíduo sente-se submetido à
linguagem do especialista que detém os segredos da realidade vivida e que,
indulgentemente, permite ao não especialista a ilusão de participar do saber.
Eis que se evidencia a discrepância entre o dever jornalístico de informar, e a sua
posição posta quanto enunciadora de uma verdade em potencial. O discurso competente
midiático, assim os outros da mesma ordem, exige a interiorização de suas regras, pois
aquele que não as interiorizar instantaneamente passa a ver a si mesmo com um
incompetente ou marginalizado do saber.
No caso, os atores envolvidos na construção da notícia, uma vez assujeitados
pelo discurso construído na esfera midiática, além de serem frutos de um recorte social,
também são representações e normas que estão colocadas no real, como verdade. Chauí
(2014) aponta que para isso, o discurso, intrinsecamente ideológico, se desenvolve sob o
modo da afirmação, da determinação, da generalização e da redução das diferenças, da
exterioridade face ao objeto trazendo a garantia de existência de uma ordem. Por isso, a
necessidade do discurso sobre as coisas (objetos sociais) coincide com as próprias
coisas, forçando uma tendência para o anonimato ou para a neutralidade. Desta forma,
Chauí (2014) afirma que “Discurso anônimo, sem autor sem produtor, não precisa de
suportes humanos através dos quais o real se cria e se recria, pois, o mundo está dotado
de uma racionalidade que já nem é mais sua, mas a de sua representação”.
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Ao assumir o caráter institucional do meio midiático a partir seus efeitos de
poder sobre opinião pública e a informação como uma representação de mundo capaz
de instituir um conjunto de regras para distinguir um suposto verdadeiro e o falso, torna-
se imprescindível entender o lugar em que os discursos estão situados, assim como seus
atores sociais e suas inferências dentro do contexto político social.
Dessa forma, analisar um discurso não se trata propriamente de desmascarar ou
desvendar uma encenação, mas sim, constituir um olhar sob a atividade social de
comunicação com fins em entender o processo comunicativo para que não haja
confusão entre um discurso que é necessariamente passível de coerção e uma coerção
discursiva com propósitos de afirmar formas de dominação na sociedade.
3 A inferências discursivas na notícia do Jornal Pioneiro frente ao paradigma da
tolerância e representação
Observando que o discurso universalista dos direitos humanos possui um lugar
privilegiado e hegemônico dentre as gramáticas de dignidade humana e que o discurso
midiático detêm, intrínseco a si, uma competência expressiva no reconhecimento de
suas narrativas quanto representações factíveis e com valor de verdade frente aos
acontecimentos do mundo, é imprescindível ater um olhar crítico frente às formações
discursivas, já que são basiladas por preceitos ideológicos, e que as mesmas possuem
expressividade na formação da opinião pública.
Ao direcionar um olhar ao não-dito e as diferentes formas de silêncio discursivo
entende-se que o sentido pode sempre ser o outro. Segundo Orlandi (2001), entre o
dizer e o não-dizer desenrola-se todo um espaço de interpretação no qual o sujeito se
move. Consoante a isso, o presente trabalho detém seu olhar crítico para realização de
análise da construção narrativa da notícia, especificamente enquadrada no contexto
histórico-social da migração haitiana. Tendo em vista a religião quanto reinvindicação
posta em um centro de disputa que se encontra centrada em uma rede que está articulada
entre duas globalizações, uma neoliberal e outro contra hegemônica, como aponta
Boaventura Souza Santos (2014), é pertinente direcionar um olhar crítico sob os
contrastes das percepções que englobam a questão religiosa dentro do discurso
midiático.
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O jornal Pioneiro, pertencente ao grupo RBS, e distribuído na região da serra do
Rio Grande do Sul, publicou no dia 1 de maio de 2015, em sua contra-capa “Maomé é
reverenciado em território cristão”, a chamada para notícia “Muçulmanos celebram
Maomé”, essa encontrada na página 6 do caderno Cotidiano. Ater-se-á um olhar sob a
perspectivas teórica do não-dito proposto por Orlandi (2001), para destacar incursões
discursivas que permeiem a questão paradigmática do reconhecimento e da tolerância.
No título da contracapa: “MAOMÉ É REVERENCIADO EM TERRITÓRIO
CRISTÃO.”, constata-se a tentativa de correlação entre diferentes marcas culturais que
compõe o campo religioso referente aos imigrantes e a população local. Ao referir “em
território cristão”, automaticamente esse enunciado serve de referência ao dito
anteriormente, “Maomé é reverenciado”.
Eis que fica evidente que a ação (reverenciar) não está relacionada propriamente
ao lugar enquanto espaço (Caxias do Sul) como aparentemente pode ser constatado pelo
já-dito. A referência intrínseca a esse significado se dá pelo espaço-poder (território
cristão) no qual uma prática externa, não comum à cultura predominante do local, está
sendo posta em prática (reverenciar Maomé).
O contraste das duas religiões firma-se pela intersecção de poder que, por sua
vez, torna externa a prática cultural que necessariamente não é do seu lugar de origem.
Dessa forma a enunciação caracteriza-se pelo estranhamento das religiões e não pelo
possível inter-relacionamento de ambas. Eis que nesse momento pode-se evidenciar o
paradigma entre tolerância e reconhecimento, já que sob a ótica do não-dito transparece
uma relação hierárquica e subjetiva entre duas instâncias: a prática religiosa assegurada
quanto normal ao lugar comum de suas práticas, e a “outra” religião que não toma sua
representação para si, mas sob a construção narrativa do jornal, está sujeita a um
demarcador de poder (território cristão).
Retoma-se aqui a afirmação de Pinto (2016), que diz que o primeiro (Maomé
quanto representação simbólica da religião islâmica) se define em relação ao segundo
(território cristão quanto representação simbólica do cristianismo) que por sua vez, se
auto institui possibilitando um cenário onde a tolerância é o limite da possibilidade de
igualdade, da justiça e da própria solidariedade. Young (1995), ao tecer sua crítica ao
universalismo, ratifica ao dizer que o objetivo não é dar compensação especial ao
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desviante até que atinja a normalidade, mas sim fazer com que deixem de ser normais as
formas pelas quais as instituições formulam as regras, revelando as circunstâncias
plurais e necessidades existentes ou as que precisam existir.
O título presente no texto “Muçulmanos celebram Maomé”, página 6,
referente ao dia 5 de janeiro de 2015, caderno Cotidiano, corrobora, na fala
protagonista do imigrante, que a relação não se dá pelo lugar-espaço, mas sim pelo
poder. A notícia relata a comemoração do nascimento do profeta Maomé pelos
imigrantes senegaleses que foi realizada em uma igreja católica, graças ao pároco Luís
Carlos Conci que cedeu o espaço para as atividades.
“O importante não é a igreja, mas o que fazemos dentro dela. O que importa é a
fé e agradecer.” A fala do imigrante Pap Babacar Ba justifica a importância do agir
como exercício que garante seu direito de ser sujeito-político de suas práticas,
possibilitando juntar-se com seus pares para almejar objetivos do interesse de sua
classe.
Ao afirmar que o lugar pouco importa e enaltecer as práticas como fim do
exercício de sua cultura, o imigrante constrói uma relação sua com o lugar,
despragmatizando o sentido imediato de estar para ocupar espaço, e consequentemente
evidenciado o estar para praticar seu exercício político quanto cidadão. Ou seja, não é
por estar em um lugar sagrado que os imigrantes rezam, é porque rezam que o lugar se
torna sagrado para eles.
Dessa forma elucida-se o contraste entre o sentido conotado pela construção
narrativa midiática no Jornal Pioneiro, que em seu título “Maomé é celebrado em
território cristão”, ideologicamente apresenta-se sob os fundamentos do universalismo
que mesmo prevendo o direito à liberdade de crença, assegurado pela concepção
hegemônica ocidentalista de direitos humanos, só vê a diferença sob o viés da
tolerância, enquanto os relatos protagonistas dos imigrantes praticantes da religião,
ressaltam a importância do agir para consagrar sua representatividade.
CONCLUSÃO
As constatações realizadas durante o desenvolvimento da análise de discurso
deste trabalho permitem visualizar os entrelaçamentos discursivos que compõe a
construção narrativa acerca das práticas culturais de senegaleses em Caxias do Sul em
contraste com os próprios relatos protagonistas dos mesmos. Esse processo de
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interdiscursividade traz junto a si, uma camada ideológica que atribui significado para
além do já-dito, tendo por função dar aos indivíduos uma explicação racional para as
diferenças da sociedade.
Durante a análise da notícia e da contra-capa foi possível destacar algumas
inferências discursivas que observadas sob o pensamento abissal proposto por
Boaventura de Sousa Santos transpareceram o paradigma das contradições internas dos
direitos humanos universalistas. Ao constatar as implicações da relação de poder
hierárquico estabelecido entre as duas matrizes culturais distintas (local e imigrante),
notou-se ao realçar tal hierarquia frente ao “outro”, é porque efetivamente não se
reconhece a diferença, mas sim, tolera-se.
A construção discursiva do “outro” sempre em referência e contraposição ao
hegemônico, como realça Bhabha (2013), inevitavelmente condena o imigrante a
condição de exclusão. Tendo em vista que o universal, como se pretende pela
concepção de direitos humanos hegemonicamente aceita, é o produto da transformação
histórica do fundacional eurocêntrico e ocidental, que se sustenta dentro das ilusões
propostas por Boaventura, para sobrepor-se a outras gramáticas de dignidade humana.
Por fim, ao constatar a assimilação e reprodução do universalismo, sob a
concepção da liberdade de crença prevista pelos direitos humanos, por parte do Jornal
Pioneiro, torna-se evidente que o paradigma entre tolerância e reconhecimento instaura-
se na camada ideológica a tal ponto de parecer invisível num primeiro momento
observando o já-dito, e se salienta a medida que se questiona sob a perspectiva do não-
dito.
A (im)possibilidade de restringir uma gramática de dignidade humana
unicamente a condição de ser humano, sem tomar em conta os pressupostos políticos,
sociais e as relações de poder historicamente determinadas, perpetua-se no meio
midiático a partir de seu lugar de competência que eleva uma representação dos fatos
a uma condição de valor de verdade que ganhar força quanto opinião pública.
Ao restringir-se a evidenciar a linha abissal entre as duas práticas culturais
distintas, o Jornal Pioneiro, acaba por corroborar a constatação de Boaventura, de que é
dado o direito a ser iguais quando a diferença inferioriza e o direito de ser diferentes
quando a igualdade nos trivializa.
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REFERÊNCIAS
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__________________________. Direitos humanos democracia e desenvolvimento. São Paulo.
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