interação

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A presença das tecnologias interativas na educação Romero Tori Resumo As tecnologias interativas, que incluem a realidade virtual, a reali- dade aumentada e os jogos digitais, entre outras formas de se prover interatividade via sistemas computacionais, já fazem parte não ape- nas do cotidiano das pessoas que nasceram e cresceram em um mundo informatizado, como de grande — e crescente — contingente daquelas que souberam se adaptar à evolução tecnológica e dela se apropriar. Não fossem os inegáveis benefícios que tais tecnologias podem trazer para a educação, seu uso já se justificaria pela simples necessidade de a escola refletir a realidade cultural de seus alunos. É, portanto, mais do que oportuno que se discuta o papel das tecnologias interativas na educação, seja em atividades virtuais ou presenciais. No entanto, para que essa discussão seja mais produtiva, faz-se necessário que se compreendam alguns conceitos fundamentais e como essas tecnolo- gias podem interferir nas percepções de distância, interatividade e presença. Este artigo busca contribuir neste sentido, apresentando e discutindo tais conceitos. Palavras-chave: tecnologias interativas, interatividade, distância, presença, educação. Abstract Interactive technologies, including virtual reality, augmented reality and computer games, among other ways of providing interactivity through computer systems, is nowadays present not only in the daily lives of people who were born and grew up in a computerized world, as well of a large - and growing - contingent of those who knew how to adapt themselves to technological changes and take ownership of it. Were it not for the undeniable benefits that such technologies can bring to education, its use could be justified simply by the need of schools to reflect the cultural reality of their students. It is therefore more than appropriate to discuss the role of interactive technologies in education, whether in virtual or in classroom activities. However, for this discussion to be most productive, it is necessary to understand some fundamental concepts and how these technologies can affect the perceptions of distance, interactivity and presence. This article seeks to contribute in this way, by presenting and discussing such concepts. Keywords: interactive tecnologies, interactivity, distance, presence, education. Escola Politécnica da USP — PCS Departamento de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais Av. Prof. Luciano Gualberto, Travessa 3, n o. 158 Cidade Universitária CEP 05508–900 São Paulo — SP [email protected] Revista de Computação e Tecnologia da PUC-SP — Departamento de Computação/FCET/PUC-SP ISSN 2176-7998 Vol. II N o. 1 4

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Interação e interatividade

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A presença das tecnologias interativas na educação

Romero Tori

ResumoAs tecnologias interativas, que incluem a realidade virtual, a reali-dade aumentada e os jogos digitais, entre outras formas de se proverinteratividade via sistemas computacionais, já fazem parte não ape-nas do cotidiano das pessoas que nasceram e cresceram em um mundoinformatizado, como de grande — e crescente — contingente daquelasque souberam se adaptar à evolução tecnológica e dela se apropriar.Não fossem os inegáveis benefícios que tais tecnologias podem trazerpara a educação, seu uso já se justificaria pela simples necessidade dea escola refletir a realidade cultural de seus alunos. É, portanto, maisdo que oportuno que se discuta o papel das tecnologias interativasna educação, seja em atividades virtuais ou presenciais. No entanto,para que essa discussão seja mais produtiva, faz-se necessário que secompreendam alguns conceitos fundamentais e como essas tecnolo-gias podem interferir nas percepções de distância, interatividade epresença. Este artigo busca contribuir neste sentido, apresentando ediscutindo tais conceitos.

Palavras-chave: tecnologias interativas, interatividade, distância,presença, educação.

AbstractInteractive technologies, including virtual reality, augmented realityand computer games, among other ways of providing interactivitythrough computer systems, is nowadays present not only in the dailylives of people who were born and grew up in a computerized world,as well of a large - and growing - contingent of those who knew howto adapt themselves to technological changes and take ownership ofit. Were it not for the undeniable benefits that such technologies canbring to education, its use could be justified simply by the need ofschools to reflect the cultural reality of their students. It is thereforemore than appropriate to discuss the role of interactive technologiesin education, whether in virtual or in classroom activities. However,for this discussion to be most productive, it is necessary to understandsome fundamental concepts and how these technologies can affect theperceptions of distance, interactivity and presence. This article seeksto contribute in this way, by presenting and discussing such concepts.

Keywords: interactive tecnologies, interactivity, distance, presence,education.

Escola Politécnica da USP — PCS

Departamento de Engenharia deComputação e Sistemas Digitais

Av. Prof. Luciano Gualberto,Travessa 3, no. 158Cidade Universitária

CEP 05508–900São Paulo — SP

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1 Introdução

Ao publicar sua tese de doutorado, apresentandoao mundo o primeiro programa gráfico interativo,denominado Sketchpad [1], Ivan Sutherland inau-gurava a pedra fundamental das tecnologias di-gitais interativas. Conceitos e técnicas utilizadasnesse pioneiro programa CAD (Computer AidedDesign) são empregados até hoje nos mais moder-nos sistemas gráficos. Sutherland, contudo, nãose limitou a contribuir para o nascimento da com-putação gráfica interativa, já que suas pesquisascom modelagem tridimensional, estereoscopia, ca-pacetes estereoscópicos e telepresença lançaram asbases sobre as quais também se desenvolveram arealidade virtual, os jogos eletrônicos e a reali-dade aumentada. Passadas quatro décadas, sãoessas as tecnologias interativas que hoje, aliadasà Internet e às redes sociais, estão presentes emcelulares, notebooks, netbooks, desktops, pads,tablets, televisores, consoles de jogos e inúmerosoutros dispositivos nas mãos de pessoas comuns,realizando tarefas prosaicas, revolucionando com-portamentos e criando novos hábitos. Como seriade se esperar, essa revolução deve, mais cedo oumais tarde, chegar à escola, se não pelos educado-res, trazidas pelos próprios alunos da geração dos“nativos digitais”1.

A educação virtual, que precisa concorrer peloclique do mouse — ou toque do dedo — do alunonuma tela repleta de outras tentações interativas,saiu na frente e já faz uso de inúmeros recursos dasnovas tecnologias. Mas, mesmo assim, há muitoainda a ser explorado pelo e-learning no uso deredes sociais, jogos, ambientes virtuais, realidadevirtual e realidade aumentada. Para a educaçãotradicional, baseada na presença física do alunoem sala de aula, o caminho é ainda mais longo,pois o uso de tecnologias interativas nesses ambi-entes ainda se limita, na maioria dos casos, a al-gumas atividades em laboratório, quando muito.Este artigo procura ajudar a se dar os primeirospassos nesse caminho, apresentando e discutindoos fundamentos das principais tecnologias intera-tivas e os conceitos de distância, presença e intera-tividade em educação, todos de vital importânciapara a educação do futuro.

2 Interatividade e TecnologiasInterativas

Consultando-se a literatura das áreas de educaçãoe de tecnologia encontram-se muitas definições ediscussões sobre interação e interatividade, algu-mas delas conflitantes entre si. Faz-se necessário,portanto, estabelecer uma base conceitual claraantes de se avançar no emprego desses termos.Neste artigo trabalharemos com os conceitos de

interação e interatividade conforme apresentadosno livro “Educação sem Distância” [3], sintetiza-dos a seguir.

Interação: ação exercida entre dois elementos, naqual haja interferência mútua no comporta-mento dos interatores.

Interatividade: percepção da capacidade, ou po-tencial, de interação propiciada por deter-minado sistema ou atividade.

Desta forma, “interação” será considerada comoa ação interativa em si, enquanto que “interati-vidade” será tratada como uma propriedade doambiente, tecnologia, sistema ou atividade. Umaatividade pode ser interativa (possuir “interativi-dade”), independentemente das ocorrências efeti-vas de interações. Por exemplo, uma teleconferên-cia na qual seja possível a qualquer participanteremoto interromper o apresentador para fazer-lheperguntas possui mais interatividade que uma vi-deoconferência unidirecional, mesmo que nenhumaluno se utilize da possibilidade de interação exis-tente no primeiro caso.

É possível aumentar a percepção de intera-tividade de determinado sistema ou ambienteincrementando-se um ou mais das seguintes com-ponentes [4]:

Frequência: periodicidade da ocorrência de opor-tunidades de interação; uma atividade quepermite interrupção a qualquer instante —frequência contínua — certamente será per-cebida como possuindo mais interatividadedo que se a interação fosse limitada a apenasdeterminados momentos.

Abrangência: conjunto de opções disponíveis aointerator nos momentos de interação; aabrangência pode ser representada por ummenu de opções discretas ou de forma im-plícita, como as possibilidades de movimen-tação e atuação de um avatar num mundovirtual.

Significado: componente subjetiva da interativi-dade; quanto mais importante e significativafor determinada ação para o participante deuma atividade, ou usuário de um sistema,menor será sua percepção de baixa frequên-cia ou de pouca abrangência; um fã queaguarda o show inteiro pela possibilidadede ser sorteado e poder subir ao palco paraabraçar seu ídolo certamente terá mais sen-sação de interatividade que o aluno aguar-dando a hora do sinal para sair de uma aulada qual não esteja efetivamente presente.

Consideraremos como “tecnologias interativas”as ferramentas e recursos tecnológicos diretamenterelacionados com o provimento da percepção deinteratividade em ambientes informatizados. Des-sas tecnologias destacam-se a realidade virtual, a

1Os conceitos de “nativos digitais”, pessoas que cresceram usando a tecnologia digital, e de “imigrantes digitais”, usuáriosdessa tecnologia que a conheceram quando já eram adultos, foram criados por Mark Prensky ( [2]).

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realidade aumentada, os jogos digitais e os ambi-entes virtuais tridimensionais, os quais serão dis-cutidas a seguir.

2.1 Realidade Virtual

A realidade virtual, embora só tenha sido assimdenominada na década de 1980, nasceu das pes-quisas de Ivan Sutherland na década de 1960, quepublicou um famoso artigo, “The Ultimate Dis-play”, no qual descreve para que objetivos utópi-cos deveriam mirar as pesquisas nessa área:

“O display definitivo seria, certamente,uma sala na qual o computador pu-desse controlar a criação de matéria.Uma cadeira exibida em tal sala se-ria suficientemente boa para ser sen-tada. Algemas exibidas em tal salaseriam aprisionadoras e uma bala exi-bida em tal sala seria potencialmentefatal. Com uma programação apropri-ada tal display poderia se tornar, lite-ralmente, o país das maravilhas ondeAlice caminhou.” [5]

Por enquanto estamos muito longe da viabili-dade de um “display definitivo”, mas certamentejá avançamos bastante. No estágio atual da com-putação gráfica e do hardware computacional jáé possível mergulhar o usuário em um ambientevirtual dando-lhe uma quase perfeita sensação daexistência física daquele espaço. São vários osequipamentos empregados para esse fim, como ocapacete de realidade virtual (Fig. 1), as CAVE [6]— ambientes cujas paredes, e eventualmente chãoe teto, são telas de retroprojeção as quais envol-vem totalmente o usuário com um mundo virtualsintético — ou os simuladores de voo utilizadospara treinamento de piloto, que simulam em to-dos os detalhes não apenas a visão que o pilototem da cabine como também os movimentos daaeronave.

Figura 1: Capacete de realidade virtual

Mesmo sem o uso de equipamentos sofisticadospode-se ter a experiência de imersão em ambientes

virtuais interagindo via mouse, teclado e monitor.Graças às poderosas e populares placas gráficas3D é possível a navegação, com alto grau de re-alismo, em cenários tridimensionais e a interaçãocom objetos e personagens.

Imersão é o conceito fundamental da realidadevirtual e significa a sensação do usuário de estardentro do ambiente sintético. Quanto menos oparticipante se sentir no mundo real, e mais seperceber como estando no ambiente virtual, maiorserá a imersão.

Em síntese, podemos definir realidade virtualcomo se segue:

“Realidade Virtual é uma interfaceavançada para aplicações computaci-onais, que permite ao usuário a movi-mentação (navegação) e interação emtempo real, em um ambiente tridimen-sional, podendo fazer uso de disposi-tivos multisensoriais, para atuação oufeedback.” [7], p. 7

2.2 Realidade Aumentada

A realidade aumentada se diferencia da realidadevirtual por não ter a imersão como principal pa-radigma. Ao contrário, o desafio neste caso é fa-zer com que os elementos virtuais pareçam fazerparte do ambiente real e a este se integrar. Antesde seu surgimento havia apenas duas possibilida-des de ambientes interativos: o “real” e o “virtual”.Com a realidade aumentada surge um espectro depossibilidades de combinação entre real e virtual,formando um continuum (Fig. 2), conforme pro-posto por Milgram e Kishino [8] e difundido porAzuma [9].

Continuum de Milgram

Ambiente Real Ambiente VirtualRealidade Misturada

Realidade Aumentada Virtualidade Aumentada

Figura 2: Continuum Real-Virtual (baseado em [8])

De acordo com Milgram e Kishino [8], a reali-dade aumentada seria apenas uma parte do conti-nuum real-virtual, aquela referente ao predomíniodo ambiente real, ambiente este enriquecido comalguns elementos virtuais integrados. No extremooposto desse continuum encontramos ambientesvirtuais enriquecidos com alguns elementos virtu-ais. Neste último caso, denominado “virtualidadeaumentada” teríamos ainda a necessidade de imer-são, motivo pelo qual as aplicações assim classi-ficadas poderiam também ser consideradas comode realidade virtual. Na parte central desse conti-nuum temos a chamada “realidade misturada”, na

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qual não há uma predominância clara de virtualou de real.

O “continuum de Milgram” é um referencial teó-rico importante, que mostra o enorme potencialde ambientações trazido pela realidade aumen-tada, que salta de apenas duas possibilidades —ambiente totalmente real e ambiente totalmentevirtual — para infinitas proporções de combina-ção. Contudo, não é muito prático identificar oslimites que separam realidade aumentada, reali-dade misturada e virtualidade aumentada. Al-guns autores preferem a denominação ampla de“realidade misturada”, enquanto outros utilizam adenominação de “realidade aumentada” para qual-quer aplicação que misture real e virtual. Nesteartigo propomos que a diferenciação se dê não pelaquantidade de elementos reais e/ou virtuais e simpela necessidade, ou não, de imersão do usuário.Quando esta se fizer necessária e houver elemen-tos reais inseridos no ambiente virtual poderemosdizer que se trata de uma extensão do conceitode realidade virtual, que poderemos também de-nominar de “virtualidade aumentada”. Os demaiscasos, em que o usuário pode, ou deve, se sentirem seu próprio ambiente real, e desde que haja al-gum elemento virtual inserido e sejam atendidosos requisitos discutidos a seguir, chamaremos de“realidade aumentada”.

Requisitos da realidade aumentada

Se considerarmos a mistura entre real e virtualcomo condição suficiente para se ter uma aplica-ção de realidade aumentada, a simples projeção deuma apresentação via datashow, feita por um pro-fessor em sala de aula, já seria suficiente para secaracterizar essa mistura. Há, portanto, a neces-sidade de se restringir os requisitos, o que foi es-tabelecido de forma bastante eficaz por Azuma [9]na forma de três condições: ambiente tridimensio-nal; interatividade em tempo-real; e registro entrereal e virtual (os elementos virtuais devem ser po-sicionados de forma coerente com o espaço real,como se dele fizessem parte).

Técnicas de exibição de realidade aumentada

Há, hoje, quatro técnicas principais para se exibirelementos virtuais e reais misturados e registra-dos:

Optical see-through: óculos com visores semi-transparentes nos quais são exibidas ima-gens que se misturam à cena real visualizadapelo usuário (Fig. 3).

Figura 3: Optical see-through [9]

Video see-through: uso de capacetes de reali-dade virtual (Fig. 1) para exibição do mundoreal, captado por câmeras de vídeo emtempo-real, misturado a elementos virtuaisinseridos e registrados computacionalmente.

Monitor: uso de um monitor de vídeo para exibi-ção do mundo real, captado por câmeras devídeo em tempo-real, misturado a elementosvirtuais inseridos e registrados computacio-nalmente.

Projeção: uso de projetores para cobrir superfí-cies de objetos reais com texturas virtuais,o que possibilita a visualização da cena realenriquecida com elementos virtuais; essatécnica é limitada em relação às demais,mas nas situações em que pode ser empre-gada possui a vantagem de liberar o usuárioda necessidade de acoplar equipamentos aocorpo ou de precisar observar o mundo promeio de um monitor.

Técnicas de rastreamento e registro

Há várias soluções tecnológicas que possibilitamrastrear objetos no espaço, como aquelas basea-das em sensores de ultrassom, infravermelho, bra-ços mecânicos ou câmeras de vídeo. Como emgeral as aplicações de realidade aumentada neces-sitam da captação de imagens do ambiente realas técnicas de visão computacional são as maisutilizadas. A solução mais popularizada, devidoà facilidade e baixo custo já que necessita ape-nas de uma webcam e de um computador con-vencional, é a que utiliza um marcador fiducial(cartão com um símbolo impresso, em geral comuma borda preta retangular), como ilustrado naFig. 4. O símbolo do marcador é identificado, in-dicando qual objeto deve ser inserido na cena, esua deformação analisada, de forma a se obter amatriz de transformação geométrica que define oposicionamento relativo entre marcador e câmerade vídeo. De posse dessas informações o softwarepode inserir na cena real objetos tridimensionaisinterativos, registrando-os perfeitamente com oselementos ao seu redor.

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Figura 4: Uso de marcadores fiduciais pararastreamento e registro de objetos virtuais

2.3 Jogos Digitais

No início da história dos jogos digitais muitos pro-dutos de sucesso eram baseados apenas em inter-face de texto, como o famoso jogo de aventura“Carmen San Diego”, ou em simples gráficos 2D,como o cativante “Pacman”. Na busca por tra-zer ao usuário experiências cada vez mais envol-ventes e diferenciadas os desenvolvedores de jogosnum primeiro momento se aproveitaram da evolu-ção tecnológica dos processadores gráficos e pos-teriormente passaram a induzí-la, trazendo parao consumidor final a tecnologia de ponta da com-putação gráfica. Hoje a indústria dos jogos di-gitais já incorporou a computação gráfica e a re-alidade virtual e vem se aproximando cada vezmais da realidade aumentada. Com isso há gran-des investimentos no desenvolvimento de game en-gines (núcleos de software que funcionam comomotores dos jogos e que podem ser reaproveita-dos no desenvolvimento de diferentes produtos),muitos deles abertos ou disponibilizados para usolivre, assim como em consoles e placas gráficas.Essa grande disponibilidade de hardware e soft-ware pode e deve ser utilizada por educadores paraenriquecer seu leque de ferramental pedagógico.

Neste artigo não nos aprofundaremos na tecno-logia dos jogos digitais2. Optamos por apresen-tar aqui um importante fenômeno que facilmenteocorre com os jogadores e que pode ocorrer, nãotão facilmente, com qualquer pessoa engajada emotivada com a atividade que está desenvolvendo,incluindo-se nossos alunos em atividades de apren-dizagem. Trata-se do estado de “flow ” (fluxo),proposto por Csikszentmihalyi [13], como sendo:

“a forma como as pessoas descrevemseu estado mental, quando a consciên-cia fica harmoniosamente organizada,e desejam prosseguir o que quer queestejam fazendo como um fim em simesmo. Ao se analisar as atividadesque consistentemente produzem flow

— tais como práticas esportivas, ga-mes, arte e hobbies — torna-se maisfácil compreender o que faz as pessoasse sentirem felizes.”3 [13], p. 6

Foram identificados por Csikszentmihalyi os se-guintes fatores que contribuem para a passagem aum estado de flow [3]:

desafio: atividades que exijam habilidade e sejamdesafiadoras;

metas: existência de objetivos bem definidos;feedback: retorno constante que indique a pro-

ximidade dos objetivos e mostra quando osmesmos são atingidos;

engajamento: foco, envolvimento e concentraçãona atividade;

significado: importância do objetivo a ser atin-gido.

Ao entrar em estado de flow uma pessoa passaa perceber [3]:

perda da auto-consciência: alteração do estadode consciência para um nível em que a pes-soa se desconecta do seu próprio “eu”;

transformação da percepção de tempo: a pes-soa não percebe a passagem do tempo.

Os educadores que pretendem utilizar jogoscomo ferramenta didática, ou provocar estados deflow em seus alunos, mesmo sem o emprego dejogos, precisam equilibrar desafios e habilidadesde forma a garantir que os participantes entrem epermaneçam no canal de flow, conforme ilustra aFig. 5.

Ansiedade

Tédio

Canal do Flow

0 (Baixas) (Altas) ∞

DESAFIOS(Baixos)

0

(Altos)

A1

A3 A4

A2

HABILIDADES

Figura 5: Canal do Flow: adaptado deCsikszentmihalyi [13], p. 74, e também publicado em

Tori [3, 14]

2Para os interessados em se aprofundar na tecnologia e na cultura dos jogos digitais recomendamos dois sites, GameCultura (www.gamecultura.com.br) e Gamasutra (www.gamasutra.com), e a tese “Videogames: brinquedos do pós-humano” [10] e os livros “What Video Games Have to Teach Us About Learning and Literacy” [11] e “ExtendingExperiences” [12].

3Tradução do original: “ ‘Flow’ is the way people describe their state of mind when consciousness is harmoniouslyordered, and they want to pursue whatever they are doing for its own sake. In reviewing some of the activities thatconsistently produce flow — such as sports, games, art, and hobbies — it becomes easier to understand what makespeople happy.” [13], p. 6

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2.4 Ambientes VirtuaisTridimensionais

Ambientes virtuais tridimensionais se utilizam datecnologia dos jogos online multiplayer para criarum mundo virtual compartilhado e persistente (oambiente continua a existir mesmo quando o usuá-rio não o utiliza) que possibilita a cada partici-pante controlar seu avatar (personagem que o re-presenta no ambiente) e interagir em tempo realcom objetos virtuais e com os avatares de outrosparticipantes. Um conhecido representante dessaclasse de aplicação é o Second Life4, que possuimilhares de residentes (como os usuários desse am-biente são chamados), responsáveis eles própriospela construção de todo o conteúdo desse mundovirtual. A Fig. 6 mostra o avatar do autor desteartigo visitando a ilha da NASA no Second Life.

Figura 6: Romano Flow, avatar do autor no SecondLife, visitando a ilha da NASA

Para desenvolvedores e educadores interessa-dos em oferecer ambientes virtuais tridimensionaiscontrolados e adaptados às suas necessidades háopções de software livre, como o Wonderland5 e oOpenSim6, este último com o diferencial de utili-zar formatos e protocolos compatíveis com o Se-cond Life.

Uma importante característica desses ambien-tes virtuais em educação é o fato de que, ao con-trolar seu avatar, o aluno passa a se engajar ati-vamente no processo, sentindo-se mais presente eenvolvido.

3 Distância e Presença naEducação

O significado do termo “educação a distância” pa-rece ser muito claro para a maioria das pessoas.Mas quando são solicitadas a explicar o signifi-cado de “distância” no contexto educacional cos-tumam ter dificuldade em fazê-lo ou se limitam a

caracterizá-la como “ausência do professor”. Esseconceito, como veremos, é um pouco mais com-plexo. Conforme amplamente discutido em Tori[3], tomando-se o aluno como referência, verifi-camos que há três possíveis relações de distân-cia em atividades de ensino-aprendizagem: aluno-professor, aluno-aluno e aluno-conteúdo. Paracada uma dessas relações há ainda três diferen-tes tipos de distância: espacial, temporal e tran-sacional. A distância espacial se refere à se-paração física entre aluno e professor (ou entrealuno e demais alunos, ou entre aluno e conteúdo).A distância temporal é a que diferencia ativida-des síncronas (realizadas ao mesmo tempo, como“bate-papo” ou atividades presenciais) de ativida-des assíncronas (diferidas no tempo, como e-mailou fórum de discussão). Já a distância transa-cional é a percepção psicológica de afastamento,que pode ocorrer tanto virtual quanto presencial-mente. Combinando-se os três tipos de distânciapara cada uma das três possíveis relações obtém-se512 formas diferentes, quanto ao aspecto “distân-cia”, de se realizar atividades educacionais. Umnúmero, portanto, expressivamente maior que asduas modalidades convencionais: “presencial” e “adistância”. Esta segunda modalidade englobaria,desta forma, 511 das 512 possibilidades levanta-das.

Outro conceito que parece simples é o de pre-sença. No entanto, a evolução tecnológica tem seencarregado de torná-lo cada vez mais complexo.Hoje é possível unir presença e distância numamesma atividade, por meio de videoconferência,ambientes virtuais e outras soluções tecnológicasde redução de distâncias.

A seguir são discutidos mais a fundo os concei-tos de “distância transacional” e “presença”.

3.1 Distância Transacional

Moore [15] propõe o conceito de “distância transa-cional” como sendo o espaço psicológico e comuni-cacional a ser transposto pelo aluno. É essa com-ponente de distanciamento que explica a ocorrên-cia de situações em que o aluno se sente distantemesmo em atividades presenciais. Ainda segundoMoore [15] há três variáveis que influem direta-mente na percepção da distância transacional:

diálogo: quanto mais possibilidades de interaçãomenor será a percepção de “distância tran-sacional”;

estrutura do programa: quanto mais estrutu-rada for a atividade, ou seja, percursos maisprevisíveis e menos flexíveis, maior será apercepção de “distância transacional”;

autonomia do aluno: quanto menor a autonomiado aluno, maior será a percepção de “distân-

4www.secondlife.com5openwonderland.org6opensimulator.org

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cia transacional”.

Comparando-se as variáveis acima com as com-ponentes da interatividade (ver Seção 2) nota-sequão fortemente a percepção psicológica de dis-tância se relaciona com a interatividade propici-ada pelo ambiente. A componente “frequência”está diretamente relacionada à variável “diálogo”.A “estrutura do programa” interfere na “abrangên-cia” e a “autonomia do aluno” contribui para quesua participação tenha mais “significado”.

3.2 Presença e Presença Social

Presença, no contexto de atividades mediadas portecnologia, é definida pela International Societyfor Presence Research [16] como:

“[. . .] um estado psicológico, ou per-cepção subjetiva, no qual a percepçãode determinado indivíduo, passandopor uma experiência gerada e/ou fil-trada, parcial ou totalmente, por meiode tecnologia, falha, total ou parcial-mente, em reconhecer o papel da tec-nologia no processo. [. . .] Experiênciaé definida como o ato de uma pessoaobservar, e/ou interagir com, objetos,entidades e/ou eventos em seu ambi-ente; Percepção [. . .] é definida comouma interpretação significativa da ex-periência.”7 [16]

As pesquisas de telepresença buscam hoje re-duzir a percepção da tecnologia mediadora porparte do público-alvo. A realidade aumentadapode contribuir muito nesse sentido uma vez quenão necessita produzir imersão, facilitando assima percepção de realismo e presença. Basta imagi-nar que um hipotético sistema perfeito de projeçãoholográfica poderia criar a ilusão de uma pessoaou objeto virtual estar presente em determinadoambiente real sem que um observador nesse localnecessitasse de capacete, óculos, monitor ou outrodispositivo explicitamente visível para ter tal ilu-são. Aquilo que imaginamos como a realidade anossa volta é criado em nossa mente a partir de si-nais provenientes de sofisticados sensores, os quaiscompõem o sistema sensório humano. O papeldessa “tecnologia” natural do corpo humano é ig-norada pela mente proporcionando-nos a máximasensação de presença quando essa “tecnologia” éutilizada como única mediadora, a ponto de iden-tificarmos a “realidade” com as imagens (visuais,sonoras, olfativas, gustativas e táteis) que a nossamente constrói a partir dos sinais captados pornossos sentidos.

Mas além da presença acima definida há ou-tro conceito relacionado, chamado “presença so-

cial” [17], definido como “a sensação de se es-tar com alguém”. A percepção ou não da tec-nologia não interfere na sensação de “presença so-cial”, sendo mais importante a interatividade per-cebida. Numa conversa telefônica, num bate-papovia comunicador instantâneo ou até mesmo numfórum de discussão é possível ao participante tera sensação de presença social, de estar engajadocom outras pessoas em atividades de interesse co-mum. Seja colocando-se todos os envolvidos emum mesmo espaço físico ou minimizando-se a per-cepção da tecnologia em atividades mediadas adistância, é possível a realização de atividades tec-nicamente presenciais. Mas a verdadeira presençado aluno só pode ser obtida quando se conseguefazê-lo sentir-se socialmente presente, ou seja, sembarreiras de distâncias transacionais. Para tantoa interatividade é fundamental, sendo que as tec-nologias interativas podem ser poderosos instru-mentos para sua viabilização em pelo menos 511das 512 possibilidades de distanciamento em ati-vidades educacionais.

4 Estar Presente a Distânciavia Tecnologias Interativas

Conforme já discutido, as tecnologias interati-vas podem propiciar várias formas de se ofere-cer sensação de “presença” ou “presença social”aos participantes de uma atividade de ensino-aprendizagem, numa nova forma de “presença adistância”, ou “telepresença”. Nesta seção avança-remos um pouco mais sobre as tecnologias intera-tivas aplicadas à telepresença. Para uma discus-são sobre o uso de videoconferência na “educaçãoa distância” e outras referências sobre o assuntorecomenda-se o artigo de Cruz [18].

Podemos classificar as aplicações de telepre-sença nas seguintes categorias:

Sistemas de comunicação instantânea:sistemas de comunicação síncrona basea-dos em internet, com possibilidade de usode som e video; devido ao seu baixo custoe disseminação é um recurso cada vez maisutilizado por alunos, independentemente dea escola planejar ou não seu uso didático.

Salas de Videoconferência: instalações profissi-onais (Fig. 7), com toda infra-estrutura paracomunicação síncrona por meio de vídeo,bastante utilizadas em empresas para redu-ção de custos com deslocamentos e treina-mentos. Em instituições de ensino, prin-cipalmente superior, são também utilizadaspara a realização de cursos a distância, reu-niões, palestras e bancas. São bastante efici-

7Traduzido do original: “[. . .] a psychological state or subjective perception in which even though part or all of anindividual’s current experience is generated by and/or filtered through human-made technology, part or all of theindividual’s perception fails to accurately acknowledge the role of the technology in the experience. . . Experience isdefined as a person’s observation of and/or interaction with objects, entities, and/or events in her/his environment;perception [. . .] is defined as a meaningful interpretation of experience.” [16]

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entes na redução de distância espacial, masa tecnologia mediadora costuma ser muitoexplícita, dificultando a percepção de pre-sença. Para compensar essa deficiência émuito importante o uso de interatividadepara se propiciar maior presença social.

Sistemas Imersivos e 3D: ambientes de reali-dade virtual ou aumentada, que buscam re-duzir a percepção da tecnologia mediadoraem relação às salas de videoconferência tra-dicionais. A visualização tridimensional e,futuramente, em holografia, e o disfarce dos

monitores ou telas de projeção, como porexemplo a projeção em espelhos semi trans-parentes que dão a impressão de a imagemse misturar ao cenário real, são recursos uti-lizados para aumentar a sensação de pre-sença.

Ambientes virtuais de aprendizagem: propiciampresença social por meio de diversas ferra-mentas, como “bate-papo” e lousa virtual.

Ambientes virtuais tridimensionais: propiciampresença social por meio de avatares contro-lados pelos participantes.

Figura 7: Sala deVideoconferência

5 Ambientes Presenciais deAprendizagem

A “educação a distância”, de início consideradapreconceituosamente como uma alternativa demenor qualidade à “educação presencial”, soubeaproveitar a evolução das tecnologias interativas ecriar metodologia própria, conseguindo aproximaralunos, professores e conteúdos e obter resultadosde qualidade que muitas vezes chegam a superar osobtidos por métodos convencionais em sala de aulatradicional. A “sala de aula” da “educação a dis-tância” é o chamado “ambiente virtual de apren-dizagem” (AVA). Esses ambientes vêm se sofisti-cando e disseminando no mesmo ritmo da evolu-ção tecnológica, já sendo empregados até mesmoem cursos presenciais que os utilizam como ferra-mentas de apoio ao presencial. Em Tori [3] pode

ser encontrada uma ampla discussão sobre os AVAe várias referências adicionais.

A “educação presencial”, por sua vez, permane-ceu “deitada em berço esplêndido”, confiante emsua capacidade natural de aproximação de alu-nos e professores e dispensando solenemente apa-ratos tecnológicos mais sofisticados, além do tra-dicional quadro negro, ou branco, do televisor e,mais recentemente, do DVD e do datashow, o qualem alguns casos evoluiu para “lousa eletrônica”.Mesmo essa pequena evolução da sala de aula nãofoi acompanhada de uma evolução metodológica.Datashows e lousas eletrônicas, quando existem,costumam ser sub, ou mesmo mal, utilizados. Sena infância do e-learning costumava-se criticar,com razão, tentativas de se replicar modelos desala de aula em ambientes virtuais, é chegado omomento do caminho inverso, desta vez com boasperspectivas de sucesso. Os modelos presenciais,em geral, não estavam preparados para lidar comos requisitos de interatividade, redução de distân-

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cia e aumento de presença social, essenciais paraa sobrevivência de qualquer curso a distância. Jáos métodos e técnicas desenvolvidos para o en-sino virtual só têm a contribuir para o aumentode qualidade de cursos presenciais.

O que seria o equivalente ao AVA na educaçãopresencial? Ainda não existe na literatura o con-ceito de “ambiente presencial de aprendizagem”(APA). Vamos então introduzi-lo e analisar comoos APAs são hoje e como deveriam ser no futuro.O APA mais comum hoje é composto basicamentede sala de aula, incluindo, em alguns casos, la-boratórios e, mais recentemente AVAs de apoio.Em sua maior parte as salas de aula são formadaspor quadro negro, carteiras enfileiradas e, eventu-almente, algum equipamento audiovisual. É certoque a sensação de presença é máxima em uma salade aula. Mas pode-se dizer o mesmo sobre a pre-sença social? E a interatividade? As tecnologiasde informação e comunicação, tão bem exploradaspelos AVAs o são também pelos APAs?

A partir das experiências do autor, tanto emensino presencial quanto “a distância”, apresenta-mos a seguir uma proposta do que consideramosdeva ser o APA do futuro:

Ambiente multi-uso Salas com mobiliário facil-mente reconfigurável, possibilitando tantoapresentações expositivas quanto fóruns dediscussão, trabalhos em grupo, reuniões detrabalho, experimentos ou atividades de “di-nâmica de grupo”. Essa sala deve incorporaros antiquados “laboratórios de informática”,oferecendo apenas um ou dois computado-res de última geração e alguns equipamentoscomo câmeras e projetores. Cada aluno deveter seu próprio notebook, netbook ou tablet,motivo pelo qual é essencial que a sala ofe-reça infra-estrutura wireless, para acesso arede e Internet, e número suficiente de pon-tos de energia elétrica. Dessa forma, em vezde investir na atualização periódica do par-que de computadores a escola deverá ape-nas manter a infra-estrutura básica. Paraa população mais carente os computadorespoderão ser fornecidos aos estudantes, as-sim como hoje se fornecem livros didáticos(cujo custo de impressão se aproxima cadavez mais do valor de aquisição dessas má-quinas).

Bibliotecas Digitais As bibliotecas físicas sem-pre deverão existir, ainda que evoluam paraAPAs e seus acervos físicos se transformemem “museus do livro”. Já a agilidade, baixocusto e potencial de busca e cruzamentode informações das bibliotecas digitais serãocada vez mais importantes para os APAs.

Cadernos Digitais As produções, anotações e bi-blioteca digital particular de cada aluno de-vem ser armazenadas permanentemente e

ser acessíveis remotamente.Laboratórios Virtuais Simuladores de realidade

virtual e realidade aumentada podem subs-tituir, ou pelo menos minimizar, o uso delaboratórios físicos.

AVAs Os ambientes virtuais de aprendizagem,hoje utilizados apenas como apoio secun-dário de alguns cursos presenciais, deverãoser incorporados aos ambientes presenciaisde aprendizagem e utilizados com estes deforma integrada e articulada.

6 Exemplos de Aplicação deTecnologias Interativas naEducação

A seguir serão apresentados alguns exemplos depesquisas inovadoras no uso de tecnologias intera-tivas em educação, extraídos de Tori [3].

6.1 Video-avatar Tridimensional

Com o objetivo de se aumentar a sensação de pre-sença em atividades educacionais mediadas porvideoconferência, foi desenvolvido no Laboratóriode Tecnologias Interativas (Interlab) do Departa-mento de Engenharia de Computação e SistemasDigitais da Escola Politécnica da USP, com apoiofinanceiro de FAPESP8, CNPQ e CAPES, o sis-tema de Video-avatar 3D denominado VA-3D. OVA-3D é composto de dois módulos, Local e Re-moto. No módulo Local é executada a capturaem 3D do vídeo do instrutor e realizada sua inser-ção no ambiente 3D. O módulo remoto exibe paraos alunos, em três dimensões, o ambiente virtualcom o video-avatar do instrutor. Essa exibiçãopode ser feita por meio de diferentes tecnologiasde reprodução estereoscópica, de simples anaglifos(composição dos canais direito em esquerdo numúnico projetor e visualização por meio de óculosde duas cores) a monitores auto-estereoscópicos.No caso de apenas um aluno assistir à videocon-ferência, é possível detectar os movimentos de suacabeça e modificar de forma consistente o pontode vista da câmera virtual, aumentando a percep-ção tridimensional e o realismo da cena.

6.2 Robot ARena

Conforme discutido por Bernardes [19] e já come-çando a surgir em consoles de videogame, a rea-lidade aumentada deve trazer importantes inova-ções para as interfaces dos jogos digitais. Essa ten-dência poderá em algum momento ser verificadatambém em aplicações educacionais. Nesse sen-tido foi desenvolvida uma pesquisa de mestradono Interlab da Escola Politécnica da USP, denomi-

8Processo 2005/60218-1.

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nada Robot ARena [20], que trabalhou na integra-ção de técnicas de realidade aumentada, robóticae jogos.

Figura 8: Infraestrutura do sistema Robot ARena

O sistema (Fig. 8) é composto por uma mesacom retroprojeção sobre a qual um robô real(Fig. 9) se movimenta e interage com objetos e ou-tros robôs virtuais. O objetivo da pesquisa é for-necer uma infra-estrutura que possibilite o desen-volvimento de jogos educacionais integrando robôsvirtuais e reais interagindo dentro de cenários quemisturem elementos reais e virtuais.

Figura 9: Robô usado no Robot ARena, montadocom o Lego MindStorm R©

6.3 Projeto AE-3D

O projeto AE-3D, desenvolvido no Interlab da Es-cola Politécnica da USP, com financiamento inicialda FAPESP9, tem como objetivo oferecer intero-perabilidade entre o ambiente virtual de aprendi-zagem (AVA) AE do projeto TIDIA-AE (TIDIA-AE, 2009) e ambientes virtuais tridimensionais.

Figura 10: Arquitetura doAE-3D para Second Life e

TIDIA-AE

9Processo 2005/60618-1.

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Como prova de conceito foi desenvolvido umainterface do AE com o ambiente Second Life10.Atualmente o AE-3D está sendo migrado e adap-tado ao OpenSim11. A proposta é similar à doprojeto SLOODLE [21], o qual visa integrar o am-biente Moodle12 ao Second Life, com os seguintesdiferenciais:

• facilidade de adaptação a outros ambientes3D e AVAs;

• possibilidade de migração para ambientesdedicados;

• acesso opcional do aluno via ambiente 3D oupelo AVA, sem necessidade de adaptações deconteúdo pelo professor.

A Fig. 10 apresenta a arquitetura atual do AE-3D.

Uma importante contribuição deste projeto depesquisa se refere ao design de interação paraacesso ao AVA via ambiente 3D, que mapeou asinterfaces convencionais para soluções compatíveiscom o paradigma dos mundos virtuais. Comoexemplo de desafios nessa área podemos citar ochat que mistura avatares do ambiente 3D a usuá-rios do ambiente 2D ou o problema de se criarum mecanismo tridimensional que possibilitasse oacesso aos arquivos disponibilizados pelo professorno ambiente 2D de uma forma mais interessantee consistente com o ambiente tridimensional quea simples abertura de uma tela com a lista de ar-quivos. A pesquisa buscou também solucionar asquestões técnicas relacionadas à conexão e intero-perabilidade entre o Second Life e a base de dadose ferramentas do AE.

Figura 11: Ambiente de testes doAE-3D

A prova de conceito do AE-3D foi desenvolvidano ambiente do Second Life (Fig. 11), oferecendoos seguintes objetos interativos para interfacea-mento com ferramentas do AVA:

Controlador de Login: associa o usuário do Se-cond Life à sua conta de usuário do AE;

Controlador de acesso: verifica se o avatar pos-sui permissão para permanecer no ambiente;

Seletor de Matérias: permite ao usuário escolhera disciplina;

Enquete: permite a utilização do recurso de en-quete do AE;

Glossário: permite a utilização do recurso de glos-sário do AE;

Chat: integra usuários do AE-3D aos usuários dochat do AE;

Visualizador de Slides: possibilita a visualizaçãode arquivos de mídia do AE (PDF, PPT eMOV, na versão protótipo) por meio de telalocalizada no ambiente tridimensional (Fig.12);

Visualizador Individual de Slides: similar ao an-terior, exceto pelo fato de o usuário visu-alizar individualmente o conteúdo; se vá-rios avatares estiverem usando a ferramenta

ao mesmo tempo, o ambiente será compar-tilhado normalmente, todos se verão, mascada um assistirá ao seu próprio conteúdoprojetado no telão.

Figura 12: Visualizador de Slides no AmbienteAE-3D

6.4 Projeto VIDA

VIDA (Virtual Interactive Distance-learning onAnatomy) [22,23] é o nome de um projeto de pes-quisa que vem sendo desenvolvido em parceria en-tre o Laboratório de Pesquisa em Informática na

10secondlife.com11opensimulator.org12moodle.org

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Saúde (LApIS) da EACH/USP, o Laboratório dePesquisa em Tecnologias Interativas (Interlab) daPOLI/USP e o Laboratório de Pesquisa em Am-bientes Interativos (Lpai) do Centro UniversitárioSenac, com o objetivo de se criar novas soluções deinteração para aumentar a sensação de presençaem atividades online de ensino de anatomia.

O conceito que norteia essa pesquisa é o de queem algum momento serão criados monitores ouprojetores holográficos que possibilitarão a cria-ção no espaço físico de imagens reais tridimensi-onais. Nesse contexto novas formas de interaçãoe de aplicações da realidade aumentada em edu-

cação deverão ser pesquisadas. Neste projeto, emvez de se esperar a disponibilização desses equipa-mentos, as pesquisas são realizadas simulando-se,por meio de técnicas de projeção estereoscópica, ainteração com imagens holográficas. Como bene-fício imediato os protótipos, ainda que com algu-mas limitações e necessidade de óculos especiais,já podem ser aplicados em treinamentos. A pos-sibilidade de manipulação direta de objetos virtu-ais (Fig. 13 e Fig. 14) deve conferir ao sistema umaumento na sensação de presença em relação aocontrole via mouse da visualização de objetos 3Dem monitores convencionais.

Figura 13: Projeto VIDA: imagem, em anaglifo,mostrando como o usuário interage com a imagemestereoscópica exibida, também em anaglifo, na tela

Figura 14: Projeto VIDA: montagem conceitualrepresentando a sensação do usuário interagindo comos objetos anatômicos como se estivessem entre suas

mãos

7 Conclusão

Neste artigo foram apresentados e discutidos osfundamentos das principais tecnologias interativas(realidade virtual, realidade aumentada, jogos di-gitais e ambientes virtuais tridimensionais), bemcomo os conceitos de distância, presença e inte-ratividade em educação. Foi também proposto oconceito de ambientes presenciais de aprendiza-gem (APA), numa adaptação, para os ambientespresenciais, dos bem-sucedidos paradigmas de am-bientes virtuais de aprendizagem (AVA). Por fimforam apresentados alguns exemplos de pesquisasde novas aplicações de tecnologias interativas naeducação. Os conceitos e tecnologias aqui discuti-dos são de vital importância para a educação dofuturo, a qual, esperamos, deverá ser um misto deatividades interativas presenciais e virtuais, inte-grando o que há de melhor da educação baseadaem salas de aula e laboratórios com as melhorespráticas da educação online. Estamos apenas noinício de uma longa caminhada rumo a uma ver-dadeira “educação sem distância”.

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Mini-currículo do autor: Romero Tori é doutor e livre docente emtecnologias interativas pela USP. Atualmente é professor associadoda Escola Politécnica da USP e professor titular do Centro Univer-sitário Senac, onde coordena o programa de iniciação científica e aárea de pesquisa em tecnologia.e gestão. Coordenou e desenvolvediversas pesquisas na área das tecnologias interativas, com ênfaseem domínios da educação, saúde e entretenimento. Autor, enteoutros trabalhos, do livro “Educação sem Distância: TecnologiasInterativas na Redução das Distâncias em Educação” pela EditoraSenac de São Paulo. Seus principais trabalhos e artigos podem seracessados através do endereço http://romerotori.org.

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