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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA - INPA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO DEÁREAS PROTEGIDAS NA AMAZÔNIA CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO ANÁLISE DO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS COLETORES TRADICIONAIS DE CASTANHA-DO-BRASIL (BERTHOLLETIA EXCELSA H. B. K) DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ, PARÁ, BRASIL Manaus - AM 2019

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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA - INPA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO DEÁREAS PROTEGIDAS NA

AMAZÔNIA

CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO

ANÁLISE DO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS COLETORES

TRADICIONAIS DE CASTANHA-DO-BRASIL (BERTHOLLETIA EXCELSA H. B. K)

DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ, PARÁ, BRASIL

Manaus - AM

2019

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CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO

ANÁLISE DO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS COLETORES

TRADICIONAIS DE CASTANHA-DO-BRASIL (BERTHOLLETIA EXCELSA H.

B. K) DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ, PARÁ,

BRASIL

Manaus - AM

2019

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Gestão de Áreas Protegidas da

Amazônia - MPGAP, na área de concentração

Gestão de Áreas Protegidas na Amazônia,

como requisito para a obtenção do título de

Mestre em Gestão de Áreas Protegidas da

Amazônia.

Orientador: Dr. Reinaldo Corrêa Costa, PhD.

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SEDAB/INPA © 2019 - Ficha Catalográfica Automática gerada com dados fornecidos pelo(a) autor(a) Bibliotecário responsável: Jorge Luiz Cativo Alauzo - CRB11/908

P585a Picanço, Carlos Adriano Siqueira Análise do modo de vida dos quilombolascoletores tradicionais de castanha-do-brasil(Bertholletia excelsa H. B. K) da Reserva Biológicado Rio Trombetas, Oriximiná, Pará, Brasil / CarlosAdriano Siqueira Picanço; orientador Reinaldo CorrêaCosta. -- Manaus:[s.l], 2019. 265 f.

Dissertação (Mestrado - Programa de Pós Graduaçãoem Gestão de Áreas Protegidas da Amazônia) --Coordenação do Programa de Pós-Graduação, INPA, 2019.

1. Coletores tradicionais de castanha-do-brasil. 2. Microrregião Alto Trombetas . 3. Modo devida. 4. Quilombolas. 5. Reserva Biológica do RioTrombetas. I. Costa, Reinaldo Corrêa, orient. II.Título. CDD: 333.72

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Dedicatória

Dedico este trabalho aos meus pais Sérgio e

Cleana, às minhas tias queridas Alba e

Albelina Picanço e à minha esposa Maria

Francisca.

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AGRADECIMENTOS

À minha família, especialmente, aos meus pais Sérgio e Cleana, e à minha esposa

Maria Francisca. Às minhas tias queridas Alba e Albelina Picanço, pois sem elas, talvez, não

tivesse conhecido o poder transformador que a educação é capaz de proporcionar. À minha

cunhada Simone e seu esposo Lenilton pelo apoio logístico em Porto Trombetas.

Ao professor Reinaldo Corrêa Costa, por suas valiosas orientações, sempre me

norteando para os caminhos que proporcionassem a uma aprendizagem do processo de

construção da produção do conhecimento científico.

Aos docentes do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Áreas Protegidas da

Amazônia, do Instituto Nacional de pesquisas da Amazônia (INPA), pela ética e compromisso

nos ensinamentos das disciplinas ministradas, que muito contribuíram para a minha formação

profissional.

Às professoras Ana Carla dos Santos Bruno, Vilma Terezinha Lima e Elisabete Brocki

pelas valiosas contribuições na banca de qualificação, que muito me ajudaram no decorrer da

pesquisa.

Ao Laboratório de Estudos Sociais (LAES) do INPA, pelo espaço para as discussões e

por ter proporcionado a convivência com colegas de outros cursos que participam de

programas de estágios/pesquisas no LAES: Bárbara Evelyn, Ana Cláudia, Sanae Ferreira.

Ao Instituto Federal de Rondônia pelo incentivo financeiro durante os 24 meses de

pesquisa. Ao ICMBio pelo apoio documental e pelo alojamento cedido durante a pesquisa

documental no NGI/Porto Trombetas.

À Carminha Arruda, Secretária do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Áreas

Protegidas da Amazônia (MPGAP), por sua dedicação à organização do curso e competência

extraordinária à frente da Secretaria do MPGAP.

Especialmente aos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da

microrregião Alto Trombetas, os quais nos forneceram conhecimentos acerca da realidade do

seu modo de vida. Ao guia de campo Rélijshon Rocha por sua paciência e ensinamentos e à

Dona Dulce e Raimundo Dias Barbosa pela estadia na sua casa. E a família do seu Edílson

Mendes de Almeida.

Ao apoio da Arqmo: Claudinete Colé, Rogério Pereira, Carlos Printes. Ao apoio da

ACRQAT, Manoel Lucivaldo e da Associação Mãe Domingas, Ari Printes. Ao coordenador e

presidente da Associação de Moradores da Comunidade Último Quilombo, Rozinaldo

Barbosa, e aos demais coordenadores das comunidades quilombolas pesquisadas.

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“Como temos açaí, pensamos um dia sermos

produtores de açaí. Pensamos em beneficiar

castanha... vender castanha já beneficiada. Então,

temos vários sonhos aí que estão rondando nossas

mentes, nossas ideias aí. Sim, nós temos cipó, por

exemplo, que faz a confecção de tapete, de cestas.

Vários itens, que são feitos através da matéria prima

do cipó. E nós pensamos sim em exportar essas

coisas feitas na comunidade. E temos também aí a

questão do extrativismo da castanha, é o nosso ponto

forte aqui. Pensamos em beneficiar como já falei,

vender ela também em casca, mas de uma forma

lavada, ensacolada e tudo mais, bem higienizada.

Temos também copaíba, pensamos também abrir um

mercado bom pra venda de copaíba. E aí vai, tem

outros, tem breu. Tem uma série de coisas na

floresta que estão aí prontos pra nos ajudar na

sobrevivência e no nosso desenvolvimento como ser

humano”.

Entrevistado 16, 2018.

Coordenador de comunidade.

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PICANÇO, Carlos Adriano Siqueira. Análise do modo de vida dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa H. B. K) da Reserva Biológica do

Rio Trombetas, Oriximiná, Pará, Brasil. 2019. 266 f. Dissertação (Mestrado Profissional em

Gestão de Áreas Protegidas da Amazônia) – Programa de Pós-graduação em Gestão de Áreas

Protegidas da Amazônia, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Manaus, 2019.

Orientador: Reinaldo Corrêa Costa.

RESUMO

A construção do modo de vida é intrínseca a construção do território. Assim, neste trabalho,

utilizou-se ambos os conceitos/categorias, de forma indissociável, uma vez que há a

necessidade de um território para a existência de um modo de vida e vice-versa. Nesse

sentido, objetivou-se analisar o modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa H. B. K) que firmaram termos de compromisso com o

Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) para a coleta desse

produto na Reserva Biológica do Rio Trombetas, localizado na microrregião Alto Trombetas,

Oriximiná, Pará, Brasil, como subsídio para a gestão dessa unidade de conservação. Trata-se

de pesquisa qualitativa. A investigação foi realizada nos anos de 2018 e 2019, utilizando-se

como método procedimental para a coleta de dados o Estudo de Caso, com a utilização da

triangulação das fontes de dados (YIN, 2005). Os dados primários foram coletados por meio

de técnicas de observação de campo, entrevistas semiestruturadas e pesquisa documental. As

entrevistas semiestruturadas foram aplicadas junto a 32 coletores tradicionais de castanha-do-

brasil que residem no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade Último

Quilombo, ambos localizados na microrregião Alto Trombetas, 02 regatões locais, gestora

chefe da Reserva Biológica do Rio Trombetas, 06 coordenadores de comunidades e 01

coordenador da Associação Mãe Domingas. As observações semiestruturadas foram

realizadas ao mesmo tempo e nos mesmos locais nos quais foram realizadas as entrevistas. A

pesquisa documental foi realizada nos arquivos do Núcleo de Gestão Integrada – Porto

Trombetas, do ICMBio, e na Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do

Município de Oriximiná (Arqmo). Os dados secundários foram obtidos por meio de pesquisa

bibliográfica e documental. Após a coleta e tratamento dos dados, utilizou-se a técnica de

análise de conteúdo (BARDIN, 2011). Por meio da pesquisa se constatou que a implantação

da Mineração Rio do Norte (MRN), a criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas e da

Floresta Nacional Saracá-Taquera na microrregião Alto Trombetas tem relação direta com as

mudanças observadas no modo de vida e no uso do território pelos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil, dentre as quais se destaca a quase extinção de práticas

coletivas e de ajuda mútua, como o “puxirum”. Atualmente, as regras de moradia existentes

nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo limitaram os

deslocamentos frequentes pelo território de uso comum dos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil.

Palavras-chave: Coletores tradicionais de castanha-do-brasil. Microrregião Alto Trombetas.

Modo de vida. Quilombolas. Reserva Biológica do Rio Trombetas.

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PICANÇO, Carlos Adriano Siqueira. Analysis of the way of life of traditional Brazil nut

collecting quilombolas (Bertholletia excelsa H. B. K) from the Trombetas River

Biological Reserve, Oriximiná, Pará, Brazil. 2019. 266 f. Dissertation (Professional

Master's Degree in Amazon Protected Areas Management) - Postgraduate Program in

Amazon Protected Areas Management, National Amazon Research Institute, Manaus, 2019.

Advisor: Reinaldo Corrêa Costa.

ABSTRACT

The construction of the way of life is intrinsic to the construction of the territory. So in this

both concepts / categories were used inseparably, once that there is a need for a territory for

the existence of a way of life and vice versa. versa. In this sense, the objective was to analyze

the way of life of the collecting quilombolas Brazil nuts (Bertholletia excelsa H. B. K) that

have signed terms of commitment to the Chico Mendes Institute for Biodiversity

Conservation(ICMBio) for the collection of this product in the Trombetas River Biological

Reserve, located in the Alto Trombetas microregion, Oriximiná, Pará, Brazil, as a subsidy

forthe management of this conservation unit. It is qualitative research. The investigation was

carried out in 2018 and 2019, using as the procedural method for the data collection the Case

Study, using the triangulation of data sources (YIN, 2005). Primary data were collected using

observation techniques. Field interviews, semi-structured interviews and documentary

research. The interviews were applied to 32 traditional Brazil nut collectors residing in the

Quilombola Alto Trumpets 1 Territory and the Ultimate community Quilombo, both located

in the Alto Trombetas microregion, 02 local regattas, chief manager of the Trombetas River

Biological Reserve,06 community coordinators and 01 coordinator of Associação Mãe

Domingas. The semi-structured observations were performed at the same time and in the

same places where the interviews were performed. The documentary research was carried out

in the archives of ICMBio's Integrated Management Center - Porto Trombetas, and at the

Quilombo Remnant Communities Association of Oriximiná (Arqmo). Secondary data were

obtained through bibliographic and documentary research. After data collection and

treatment, the content analysis technique was used (BARDIN, 2011). The research found that

the implementation of the Rio do Norte Mining (MRN), the creation of the Trombetas River

Biological Reserve and the Saracá-Taquera National Forest in the Alto Trombetas

microregion is directly related to the changes observed in lifestyle and the use of the territory

by traditional Brazil nut gatherers, among which stands out the almost extinction of collective

practices and mutual aid, such as the “pullirum”. Currently, the existing housing rules in the

communities of TQ Alto Trombetas 1 and the Ultima Quilombo community have limited

frequent displacements through the common use territory of traditional Brazil nut collecting

quilombolas.

Keywords: Traditional Brazil nut collectors. Microregion High Trumpets. Lifestyle.

Quilombolas. Trombetas River Biological Reserve.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Organograma dos níveis de organização social e territorial da microrregião Alto

Trombetas. ................................................................................................................................ 67

Figura 02 – Casas de um grupo familiar na comunidade do Abuí, no lago do Abuí, Território

Quilombola Alto Trombetas 1, microrregião Alto Trombetas, Oriximiná – PA......... ............ 68

Figura 03 – Linha histórica dos domínios territoriais na microrregião Alto Trombetas .......... 95

Figura 04 – Área de extração do minério de bauxita na Floresta Nacional Saracá-

Taquera..................................................................................................................................114

Figura 05 – Barragens de rejeitos de bauxita da Mineração Rio do Norte na Floresta Nacional

Saracá-Taquera. ...................................................................................................................... 115

Figura 06 – Centro comunitário da comunidade do Abuí ...................................................... 119

Figura 07 – Organograma da estrutura organizacional da Arqmo ......................................... 121

Figura 08 – Organograma das Associações de Territórios Quilombolas filiadas a Arqmo.........

123

Figura 09 – Casas na microrregião Alto Trombetas. .............................................................. 127

Figura 10 – Casa construída próxima a floresta no TQ Alto Trombetas 1 ............................. 127

Figura 11 – Quintais de casas na comunidade Último Quilombo, lago Erepecu, na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, no TQ Alto Trombetas 2, Oriximiná, Pará .............................. 128

Figura 12 – Roças na microrregião Alto Trombetas. À esquerda roça na comunidade Último

Quilombo, no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas ............................................ 134

Figura 13 – Trabalho de um grupo familiar na produção de farinha na comunidade

Abuí............ ............................................................................................................................ 147

Figura 14 – Início das atividades do Círio. ............................................................................. 150

Figura 15 – Círio realizado na comunidade Último Quilombo .............................................. 151

Figura 16 – Sanitário tipo “casinha” ...................................................................................... 155

Figura 17 – “Pontes” construídas nos chamados “portos”. .................................................... 169

Figura 18 – Principais meios de transporte utilizado pelos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas ......................................................... 171

Figura 19 – Árvore da castanheira-do-brasil e no canto superior, à direita, ouriços e sementes

da castanheira. ........................................................................................................................ 173

Figura 20 – Densidade da castanheira-do-brasil, que deve ser levada em consideração para

fazer os manejos e o trabalho de coleta. ................................................................................. 174

Figura 21 – Ecologia da castanheira-do-brasil, que pode variar em cada região. .................. 174

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Figura 22 – Fluxograma que representa os espaços: da produção, institucional e do comércio,

nos quais ocorrem as diversas etapas da cadeia produtiva da castanha-do-brasil........ .......... 186

Figura 23 – Família do Sr. E. M. A., coletor tradicional de castanha .................................... 192

Figura 24 – Crachá do Coletor tradicional de castanha-do-brasil .......................................... 193

Figura 25 – Barraco do castanheiro construído ...................................................................... 194

Figura 26 – Etapas do beneficiamento da castanha-do-brasil realizado nas usinas de

beneficiamento........................................................................................................................ 196

Figura 27 – Papeleta de controle de transporte de castanha-do-brasil entregue aos

regatões.................. ................................................................................................................. 200

Figura 28 – Mulheres realizam trabalhos de lavagem, secagem, seleção da castanha-do-brasil

comercializada pela Associação Mãe Cecília, comunidade Último Quilombo, localizada no

interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. .................................................................. 204

Figura 29 – Diagrama da escala de economicidade da cadeia produtiva da castanha-do-brasil

coletada na Reserva Biológica do Rio Trombetas .................................................................. 209

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LISTA DE MAPAS

Mapa 01 – Localização da microrregião Alto Trombetas no município de Oriximiná. ........... 58

Mapa 02 – Áreas protegidas no entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas .................. 60

Mapa 03 – Comunidades da microrregião Alto Trombetas. .................................................... 61

Mapa 04 – Zona de Mineração na Flona Saracá-Taquera - Pará............................................ 113

Mapa 05 - Unidades de Manejo Florestal (UMFs) no interior da Floresta Nacional Saracá-

Taquera. .................................................................................................................................. 116

Mapa 06 – Terras Quilombolas e comunidades quilombolas no município de

Oriximiná..................... ........................................................................................................... 122

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 – Atividades produtivas praticadas para o sustento.............................................. 130

Gráfico 02 – Principais produtos provenientes do trabalho de coleta do TQ Alto Trombetas

1............ .................................................................................................................................. 137

Gráfico 03 – Principal fonte de renda ..................................................................................... 144

Gráfico 04 – Benefícios do Governo Federal ......................................................................... 144

Gráfico 05 – Local de captação da

água......................................................................................................................................169

Gráfico 06 – Formas de tratamento da água...... ..................................................................... 153

Gráfico 07 – Descarte do lixo ................................................................................................. 154

Gráfico 08 – Destinação dos excrementos ............................................................................. 155

Gráfico 09 – Fontes de energia utilizadas na microrregião Alto Trombetas .......................... 156

Gráfico 10 – O professor da comunidade é quilombola? ....................................................... 160

Gráfico 11 – Você conhece a história da formação dos quilombos?...................................... 160

Gráfico 12 – Famílias atendidas por agentes de saúde ........................................................... 161

Gráfico 13 – Famílias atendidas em postos de saúde ............................................................. 161

Gráfico 14 – Como e onde os quilombolas da microrregião Alto Trombetas tratam as

doenças... ................................................................................................................................ 163

Gráfico 15 – Doenças mais comuns entre os quilombolas da microrregião Alto Trombetas 163

Gráfico 16 – Meios de comunicação utilizados pelos quilombolas ....................................... 167

Gráfico 17 – Quantidade produzida (mil toneladas) e valor de produção (milhões de reais) na

extração vegetal de produtos não madeireiros ........................................................................ 178

Gráfico 18 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida no Brasil, em toneladas,

entre 1994 e 2017 ................................................................................................................... 179

Gráfico 19 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida nos estados brasileiros da

Amazônia, em toneladas, entre os períodos de 1994 a 2017 .................................................. 180

Gráfico 20 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida em Oriximiná e na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, em toneladas, entre os períodos de 1990 a 2005 e 2012 a

2018....... ................................................................................................................................. 183

Gráfico 21 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida no Brasil, na Região Norte,

no estado do Pará e no município de Oriximiná, em toneladas, entre 1994 e

2017.............................. .......................................................................................................... 184

Gráfico 22 – Associados, por Associação que firmou termo de compromisso com o ICMBio

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para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas ........................ 188

Gráfico 23 – Homens e mulheres que firmaram termo de compromisso com o ICMBio para a

coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas. ................................. 188

Gráfico 25– Produção brasileira, exportação e consumo interno de castanha-do-brasil (1997-

2017).......................................................................................................................................208

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LISTA DE TABELAS

Tabela 01 – Áreas protegidas com incidência territorial no município de

Oriximiná/PA............... ............................................................................................................ 59

Tabela 02 – Número de Entrevistados coletores tradicionais de castanha-do-brasil,

comunidade, sexo, idade, profissão e tempo de residência na comunidade. ............................ 82

Tabela 03 - Quantidade produzida e participação na produção nacional de castanha-do-brasil

dos 08 principais estados brasileiros produtores, em ordem decrescente – ano 2017............ 180

Tabela 04 - Quantidade produzida e participação na produção nacional de castanha-do-brasil

dos 20 principais municípios produtores e respectivas Unidades da Federação, em ordem

decrescente – ano 2017 ........................................................................................................... 181

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Elementos do modo de vida e suas funções ........................................................ 29

Quadro 02 - Diversidade de áreas protegidas. .......................................................................... 32

Quadro 03 – Evolução da categorização de áreas protegidas - UICN ...................................... 36

Quadro 04 – Lista com as seis categorias resultantes do Congresso da UICN de 1994 .......... 37

Quadro 05 – Categorias de Unidades de Conservação no Brasil com base na Lei Federal nº

9.985 de 18 de julho 2000 (Capítulo III, art. 7º.)...................................................................... 40

Quadro 06 – Instrumentos de gestão da Reserva Biológica do Rio Trombetas ....................... 49

Quadro 07 – Áreas quilombolas da microrregião Alto Trombetas, com suas respectivas

comunidades e localização na microrregião Alto Trombetas ................................................... 75

Quadro 08 – Organização do material ou dados da pesquisa ................................................... 87

Quadro 09 – Quadro matricial da categoria “Atividades Produtivas Primárias – Agricultura e

extrativismo” ............................................................................................................................ 88

Quadro 10 - Cronologia da ocupação da microrregião Alto Trombetas, com destaque para a

fundação oficial das comunidades a partir da década de 1970. ................................................ 93

Quadro 11 – Usos gerais da castanha-do-brasil...................................................................... 175

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

ABA – Associação Brasileira de Antropologia

ACORQA – Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo Ariramba

ACORQAT – Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos da Área

Trombetas

ACORQE – Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Erepecuru

ACRQAF – Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo Água Fria

ACRQAT – Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Alto Trombetas

ACRQBV – Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo Boa Vista

ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

AETMO – Associação dos Extrativistas Tradicionais do Município De Oriximiná

AMOCREC-CPT – Associação dos Moradores da Comunidade Remanescente de Quilombo

de Cachoeira Porteira

ANA – Agência Nacional de Águas

ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica

ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária

APP – Áreas de Proteção Permanente

APPCC – Análise de Perigo e Pontos Críticos de Controle

ARQMO – Associação dos Moradores da Comunidade de Remanescentes de Quilombo da

Cachoeira Porteira

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

BM – Banco Mundial

BPF – Boas Práticas de Fabricação

CCDRU – Contrato de Concessão de Direito Real de Uso

CDB – Convenção da Diversidade Biológica

CEQMO – Cooperativa Mista Extrativista dos Quilombolas do Município de Oriximiná

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CNPPA – Comissão Nacional de Parques e Áreas Protegidas

CONAE – Conferência Nacional de Educação

CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente

CPI-SP – Comissão Pro-Índio de São Paulo

CVRD – Companhia Vale do Rio Doce

DAP – Diâmetro a Altura do Peito

DNPM – Departamento Nacional de Produção Mineral

DOU – Diário Oficial da União

EIA – Estudo de Impacto Ambiental

EJA – Educação Jovens e Adultos

Emater/Pará – Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Pará

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EMEIFs – Escolas Municipais de Educação Infantil e de Ensino Fundamental

EPE – Empresa de Pesquisa Energética

EVTE – Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica

FLONA – Floresta Nacional

FUNAI – Fundação Nacional do Índio

GEF – Global Environment Facility

IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis

IBDF – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal

ICCO – International Cocoa Organization

IDEFLOR-BIO – Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do

Pará

INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia

ITERPA – Instituto de Terras do Pará

IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza

LP – Licença Prévia

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MAB – Movimento Atigindos por Barragem

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MCP – Modo Capitalista de Produção

MEB – Movimento Católico de Educação de Base

MRN – Mineração Rio do Norte

MS – Ministério da Saúde

NGI – Núcleo de Gestão Integrada

ONU – Organizações da Nações Unidas

PAA – Programa de Aquisição de Alimentos

PFNM - Produtos Florestais Não-Madeireiros

PIN – Programa de Integração Nacional

PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar

PNMA – Política Nacional do Meio Ambiente

RDS – Reserva de Desenvolvimento Sustentável

REBIO – Reserva Biológica

RESEX - Reserva Extrativista

SEI – Sistema Educacional Interativo

SEMA – Secretaria Especial de Meio Ambiente

SEMA-PA – Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará

SEMED – Secretaria Municipal de Educação de Oriximiná

SFB – Serviço Florestal Brasileiro

SISNAMA – Sistema Nacional de Meio Ambiente

SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação

SOPREN – Sociedade de Preservação dos Recursos Naturais e Culturais da Amazônia

SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia

TC – Termo de Compromisso

TQ – Território Quilombola

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UBS – Unidade Básica de Saúde

UC – Unidade de Conservação

UICN – União Internacional para a Conservação da Natureza

UIPN – União Internacional para a Proteção da Natureza

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura

URGE – Unidades Regionais de Gestão Escolar

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 21

2 REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................. 25

2.1 TERRITÓRIO E MODO DE VIDA: BREVES CONSIDERAÇÕES ......................... 25

2.1.1 Território ..................................................................................................................... 26

2.1.2 Modo de Vida .............................................................................................................. 27

2.2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE ÁREAS PROTEGIDAS ............................... 30

2.2.1 Breves considerações sobre áreas protegidas no contexto mundial ....................... 32

2.2.2 Breves considerações sobre áreas protegidas no contexto do SNUC: as unidades

de conservação ........................................................................................................................ 37

2.3 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE COMUNIDADES REMANESCENTES DE

QUILOMBOS E O RECONHECIMENTO DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS NO

VALE DO RIO TROMBETAS ................................................................................................ 42

2.4 INSTRUMENTOS DE GESTÃO DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO

TROMBETAS .......................................................................................................................... 49

3 OBJETIVOS ............................................................................................................... 57

3.1 OBJETIVO GERAL ..................................................................................................... 57

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ....................................................................................... 57

4 MATERIAL E MÉTODOS ....................................................................................... 58

4.1 CARACTERÍSTICAS DA ÁREA DE ESTUDO ........................................................ 58

4.1.1 O Território Quilombola Alto Trombetas 1 (Território Mãe Domingas) ............. 63

4.1.2 A comunidade Último Quilombo .............................................................................. 65

4.1.3 Organização social e territorial dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas .............................................. 66

4.2 COLETA DOS DADOS ............................................................................................... 75

4.3 TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS ............................................................. 85

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................... 90

5.1 FORMAÇÃO E ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DA MICRORREGIÃO ALTO

TROMBETAS: DOS QUILOMBOS A CRIAÇÃO DE TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS . 90

5.1.1 Os domínios dos quilombos e os “castanhais livres” na Microrregião Alto

Trombetas ............................................................................................................................... 96

5.1.2 O domínio dos patrões: os “donos dos castanhais” na microrregião Alto

Trombetas ............................................................................................................................. 100

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5.1.3 O domínio dos grandes projetos e das unidades de conservação na Microrregião

Alto Trombetas ..................................................................................................................... 105

5.1.4 O papel da Arqmo, das associações de territórios quilombolas no Alto Trombetas

119

5.2 ASPECTOS ATUAIS DO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS COLETORES

TRADICIONAIS DE CASTANHA-DO-BRASIL DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO

TROMBETAS ........................................................................................................................ 125

5.2.1 Elementos Fixadores do Modo de Vida dos Quilombolas Coletores Tradicionais

de Castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas ...................................... 125

5.2.2 Elementos criadores e organizadores do modo de vida dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas. ................ 146

5.2.3 Elementos limitadores do modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas ............................................ 148

5.2.4 Elementos transformadores do modo de vida dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas ................. 152

5.3 O TERMO DE COMPROMISSO E AS IMPLICAÇÕES NA cadeia produtiva DA

CASTANHA-DO-BRASIL COLETADA NA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO

TROMBETAS ........................................................................................................................ 171

5.3.1 Aspectos bioecológicos da castanha-do-brasil ........................................................ 172

5.3.2 A cadeia produtiva da castanha-do-brasil coletada na Reserva Biológica do Rio

Trombetas ............................................................................................................................. 175

5.3.3 Produção e espacialidade da castanha-do-brasil ................................................... 177

5.3.4 Organização e o uso do território das diversas etapas da produção da castanha-

do-brasil ................................................................................................................................. 184

5.3.5 Distribuição e circulação da castanha-do-brasil .................................................... 197

5.3.6 Comercialização e consumo da castanha-do-brasil ............................................... 205

6 CONCLUSÕES ......................................................................................................... 210

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 216

GLOSSÁRIO ........................................................................................................................ 233

APÊNDICES ......................................................................................................................... 240

APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................................ 241

APÊNDICE B – Roteiro (Instrumento de pesquisa utilizado na coleta de dados) ................. 244

APÊNDICE C – Autorizações da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos

do Município de Oriximiná (Arqmo); da Associação Mãe Domingas; da Associação das

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Comunidades Remanescentes de Quilombo do Alto Trombetas 2 (ACRQAT); Autorização de

coordenações de comunidades. .............................................................................................. 249

ANEXOS ............................................................................................................................... 251

Anexo A – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa ................................. 252

Anexo B – Autorização do ICMBio para a realização da pesquisa de campo na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, Pará ....................................... 258Erro! Indicador não definido.

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1 INTRODUÇÃO

A partir da década de 1960, a Amazônia tornou-se alvo de grandes investimentos do

Governo Federal, como o Programa de Integração Nacional (PIN), responsável pela abertura

de estradas e rodovias. A partir de então, o Governo Federal passou a agir com uma

verdadeira política de intervenção regional, com clara inspiração geopolítica do segmento

militar, deslocando os seus interesses para o subsolo, para as riquezas minerais da Amazônia.

O objetivo dessa política era integrar, pela via de grandes projetos econômicos empresariais, o

espaço amazônico a outros espaços de economicidades mais amplas do Brasil e do exterior.

Foram implantados os chamados grandes projetos econômicos na Amazônia (agropecuários,

madeireiros, minerais), que aliados a abertura de estradas e grandes rodovias e à construção

de hidrelétricas, provocou a aceleração do fluxo migratório para a Amazônia (GONÇALVES,

2012).

As ações do Estado brasileiro para a região Amazônica, combinadas com a ação de

grandes empresas nacionais e multinacionais que se estabeleceram nessa região, legitimaram

a devastação dos ambientes e a expropriação dos povos tradicionais locais de seus territórios.

Esses fatores despertaram a atenção dos movimentos ambientalistas, nacionais e

internacionais, que começaram a pressionar o Estado brasileiro a adotar medidas com o

objetivo de frear tal devastação. Dessa maneira, entende-se que o início da criação de

unidades de conservação (unidades de conservação) no Brasil visava atender uma demanda

das pressões dos movimentos ambientalistas. Esses movimentos ganharam proporções

mundiais na segunda metade do século XX, sendo tratados no âmbito das Organizações das

Nações Unidas (ONU), pressionando os governos dos países associados a adotar medidas que

atendessem a agenda ambiental mundial (FARIAS, 2017).

Na escala local, ou seja, na microrregião Alto Trombetas, no município de Oriximiná,

estado do Pará, não foi diferente. Na década de 1970, houve a instalação da Mineração Rio

Norte (MRN), empresa que extrai bauxita nos platôs da bacia do rio Trombetas, ocupando

parte das terras dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil. Junto ao projeto

minerador também chegaram as unidades de conservação ao vale do rio Trombetas. Em 1979,

seguindo o modelo preservacionista norte-americano, foi criada a Reserva Biológica do Rio

Trombetas, com uma área de 385.000 hectares (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

A Reserva Biológica do Rio Trombetas é uma categoria de unidade de conservação

que pertence ao grupo de unidades de conservação de proteção integral. As reservas

biológicas, assim como as demais categorias de unidades de conservação do grupo de

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proteção integral, não admitem a permanência de pessoas residindo no seu interior e nem o

uso direto dos recursos naturais. As pessoas são consideradas como ameaças a integridade da

natureza (BRASIL, 2000).

Contudo, a Reserva Biológica do Rio Trombetas foi delimitada e instituída sobreposta

a territórios centenários de comunidades1 remanescentes de quilombo que ali haviam se

estabelecido desde meados do início do século XIX. A sobreposição da Reserva Biológica do

Rio Trombetas com os territórios de comunidades remanescentes de quilombo restringiu o

acesso desse povo tradicional aos recursos naturais do território da Reserva Biológica do Rio

Trombetas e de áreas do entorno dessa unidade de conservação, necessários a reprodução de

seu modo de vida. A sobreposição de territórios gerou conflitos territoriais, uma vez que essa

unidade de conservação está localizada sobre um território extremamente rico em recursos

naturais, onde se encontram grandes “lagos” e densa floresta, além dos principais e mais

densos platôs cobertos por castanhais, áreas com as quais os quilombolas criaram forte

vínculos de territorialidade (ICMBIO, 2004; CASTRO; ACEVEDO, 1998).

Para minimizar os conflitos pelo acesso e uso dos recursos naturais em unidade de

conservação de proteção integraal, demandados por povos tradicionais residentes no interior e

entorno dessas áreas, surgiu o instrumento de gestão Termo de Compromisso, que possui

previsão legal no Decreto Federal nº 4.340, de 22 de agosto de 2002, que regulamenta o

Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). O Termo de Compromisso foi

instituído pela Instrução Normativa nº 26, de 04 de julho de 2012, que estabelece as diretrizes

e regulamenta os procedimentos para elaboração, implementação e monitoramento de termos

de compromisso entre o ICMBio e populações tradicionais residentes em unidades de

conservação onde a sua presença não seja admitida ou esteja em desacordo com os

instrumentos de gestão (TALBOT, 2016).

No âmbito da Reserva Biológica do Rio Trombetas, em 20 de dezembro de 2011,

foram firmados os Termos de Compromisso 119, 120 e 121, celebrados entre o ICMBio e as

associações representativas dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem no

interior e entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas: Associação das Comunidades

Remanescentes de Quilombo do Município de Oriximiná (Arqmo), Associação dos

1 Nesta pesquisa o termo “comunidade” se refere ao termo utilizado pela Igreja Católica local para identificar as

formas de organização territorial e administrativa de grupos de família que, nessa região, localizam-se ao longo e

às margens dos rios Trombetas e Cuminá. Instituições públicas, como a Prefeitura Municipal de Oriximiná,

baseiam seus levantamentos de dados nessa configuração espacial. Frequentemente o grupo referenda essa

terminologia na linguagem cotidiana atribuindo igual caráter organizativo para as ações políticas como se

observa nos documentos convocatórios de reuniões. Admitimos esse termo, descritivamente, dentro dessas

significações (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

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Moradores da Comunidade de Remanescentes de Quilombo da Cachoeira Porteira (Amocreq-

CPT) e a Associação dos Extrativistas Tradicionais do Município de Oriximiná (Aetmo),

respectivamente. O objetivo desses Termos de Compromisso é estabelecer regras para a coleta

e a comercialização da castanha-do-brasil dentro dos limites da Reserva Biológica do Rio

Trombetas e das áreas a montante desta unidade de conservação (ICMBIO, 2011 a; ICMBIO,

2011 b; ICMBIO, 2011 c).

Contudo, mesmo com esses instrumentos de gestão implantados na Reserva Biológica

do Rio Trombetas, há muitos conflitos pelo uso dos recursos naturais nessa unidade de

conservação, uma vez que o trabalho de coleta da castanha é sazonal, ocorrendo apenas no

período de fevereiro a maio. Assim, os quilombolas também reivindicam o uso de outros

produtos florestais não madeiros como copaíba, andiroba, cipós, palhas, breu, os quais

também podem ser incluídos nos termos de compromisso para fins de coleta e

comercialização, conforme informado pelo Entrevistado 16:

“Como temos açaí, pensamos um dia sermos produtores de açaí. Pensamos em

beneficiar castanha, sermos... vender castanha já beneficiada. Então, temos vários

sonhos aí que estão rondando nossas mentes, nossas ideias aí. Sim, nós temos cipó,

por exemplo, que faz a confecção de tapete, né. De cestas. Vários itens, que são

feitos através da matéria prima do cipó. E nós pensamos sim em exportar essas

coisas feitas na comunidade. E temos também aí a questão do extrativismo da

castanha, é o nosso ponto forte aqui. Pensamos em beneficiar como já falei, vender

ela também em casca, mas de uma forma lavada, ensacolada e tudo mais, bem

higienizada. Temos também copaíba, pensamos também abrir um mercado bom pra

venda de copaíba. E aí vai, tem outros, tem breu. Tem uma série de coisas na

floresta que estão aí prontos pra nos ajudar na sobrevivência e no nosso

desenvolvimento como ser humano” (E 16, 2018).

O desafio da gestão das unidades de conservação de proteção integral que possuem

sobreposições com territórios de povos tradicionais é garantir tanto a conservação da

biodiversidade, quanto os direitos básicos de povos e comunidades tradicionais, ambos

garantidos constitucionalmente. Mas, isso perpassa em considerar os modos de vida dos

povos tradicionais, que muitas vezes, são criminalizados por praticarem atividades basais de

sustento e obtenção de proteína animal, como por exemplo, a caça e a pesca para o próprio

alimento (GRABNER, 2014).

As sobreposições dos territórios das unidades de conservação com territórios de povos

tradicionais foram, por muito tempo, e ainda são, um grande desafio para a implementação e

gestão territorial das unidades de conservação de proteção integral. Também são fontes de

conflitos, pois a gestão dessas unidades de conservação, geralmente, não considera os modos

de vida dos povos tradicionais que residem nesses territórios especialmente protegidos por lei

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(BRASIL, 2004). Daí a importância acerca do estudo sobre o modo de vida dos quilombolas

coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem nas comunidades localizadas no

interior e no entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas, de forma a subsidiar a

construção e efetividade do plano de gestão territorial dessa unidade de conservação.

O estudo do modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

brasil que residem nas comunidades localizadas no interior e no entorno da Reserva Biológica

do Rio Trombetas, no município de Oriximiná, é de suma importância para a construção e

efetividade do plano de gestão territorial dessa unidade de conservação de bases

socioespaciais justas, caso contrário, a gestão desse território estará fadada ao fracasso, visto

que pode culminar em formação de pobreza, pois não há gestão territorial sem considerar os

modos de vida dos povos tradicionais que residem nesses territórios especialmente protegidos,

isto é, com restrições no uso do território (GRABNER, 2014).

Assim, a pesquisa contribuiu para a análise do modo de vida dos quilombolas que

firmaram termo de compromisso com o ICMBio para a coleta da castanha-do-brasil no

interior e no entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas. A maioria dos estudos

existentes sobre TC em unidades de conservação de proteção integral enfatizam mais o

instrumento legal em si, ou ainda, o problema da conveniência ou não da permanência dos

povos tradicionais nessas unidades de conservação e também à participação desses povos na

gestão das unidades de conservação e no manejo de seus recursos (SIMON; MADEIRA

FILHO; ALCÂNTARA, 2015; TALBOT, 2016). Embora reconheçamos a importância desses

estudos, esta pesquisa fará uma análise das transformações ocorridas no modo de vida dos

quilombolas a partir da implementação dos termos de compromisso sobre o modo de vida dos

quilombolas residentes no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Além da importância da investigação do tema, a pesquisa propõe subsídios à gestão

dos termos de compromisso celebrados entre o ICMBio e as associações representativas de

comunidades quilombolas residentes no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, bem como propõe mecanismos para o aperfeiçoamento desse instrumento de

gestão nessa unidade de conservação.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

O referencial teórico que norteou a pesquisa se embasou nas categorias de análise:

modo de vida, território, territorialidade e a relação entre eles.

2.1 TERRITÓRIO E MODO DE VIDA: BREVES CONSIDERAÇÕES

Território e modo de vida são elementos importantes para a compreensão, o

entendimento da construção das relações sociais, culturais e econômicas de grupos (sociais,

econômicos, políticos, culturais e outros). O modo de vida se caracteriza pelo modo como

produzem e o que produzem, assim o modo de vida reproduzido e o “que eles são coincide,

portanto, com sua produção, tanto com o que produzem como o modo como produzem, o que

os indivíduos são, por conseguinte, depende das condições materiais de sua produção”

(MARX; ENGELS, 2006 [1932] apud COSTA; FERREIRA, 2015).

Estudar o modo de vida de povos tradicionais requer considerar que o modo de vida é

construído concomitante e intrinsecamente à construção do território, uma vez que esses

povos necessitam de uma base territorial – que no caso dos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas é a mesma base territorial da Reserva

Biológica do Rio Trombetas – para garantir sua existência e a reprodução dos seus modos de

vida. Para Farias (2017), por outro lado, o modo de vida torna-se para esses grupos um

instrumento de resistência e luta frente aos sujeitos sociais hegemônicos, com a finalidade de

manter o domínio sobre seus territórios, que lhes fornecem os meios de reprodução do modo

de vida. Assim, esses dois elementos devem ser analisados de forma indissociável, de modo a

enfatizar a necessidade de um território para a existência de um modo de vida e vice-versa

(FARIAS, 2017).

O modo de vida é construído conforme a organização social de determinado povo no

território. Agrega valores, simbologias, crenças e misticismos no desenvolvimento de suas

atividades políticas, econômicas e culturais, formando uma identidade coletiva. Pode-se dizer,

então, que o processo de construção do modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas remete a forma como reconhecem o

seu território e interagem com ele por meio das ações vivenciadas, sendo que para estes, o

território é uma porção da natureza e espaço que lhes fornece os meios de reprodução do

modo de vida e sobre o qual reivindicam e garantem a todos, ou a uma parte de seus

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membros, direitos estáveis de acesso, controle ou uso sobre a totalidade ou parte dos recursos

naturais existentes nesses espaços (DIEGUES, 2001).

Dessa forma, ao se construir determinado modo de vida, cria-se forte vínculo de

territorialidade, o qual se efetiva nas relações sociais do cotidiano (SAQUET; SPOSITO,

2009), assim como nas formas como os indivíduos se relacionam com o seu território, que é o

espaço da construção da identidade de um determinado grupo social por meio de suas

representações culturais.

2.1.1 Território

Para Raffestin (1993), o território tem sua formação a partir do espaço e “é o resultado

de uma ação conduzida por um sujeito sintagmático (que realiza um programa) em qualquer

nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente [...] o sujeito ‘territorializa’ o

espaço” (RAFFESTIN, 1993, p. 143). Nessa abordagem, o autor dá ênfase político-

administrativa ao território, isto é, o território é entendido como o espaço físico onde se

localiza uma nação; um espaço onde se delimita uma ordem jurídica e política; um espaço

medido e marcado pela projeção do trabalho humano com suas linhas, limites e fronteiras

(RAFFESTIN, 1993). Raffestin (1993) enfatiza que a construção do território revela relações

marcadas pelo poder exercido por pessoas ou grupos, condição presente em todas as relações

sociais.

O conceito de território faz referência às tentativas de indivíduos ou de grupos sociais

criarem estratégias com o intuito de influenciar pessoas e de defender acessos de grupos

sociais localizados aos recursos naturais (o território como noção de sobrevivência humana).

A territorialidade humana seria, portanto, uma poderosa manifestação dos sujeitos sociais e

grupos sociais organizados que condiciona o exercício de poder, construindo territorialidades

e definindo e redefinindo territórios. A territorialidade para os seres humanos é uma estratégia

geográfica para restringir [assegurar] acesso de grupos e limitar o uso de coisas por área

controlada. E ainda, “territorialidade é antes de tudo uma expressão geográfica do poder

social”, é normativa, normas e regras associativas (SACK, 1986, apud COELHO; CUNHA;

MONTEIRO, 2009).

Segundo Coelho et al. (2009), o território é uma porção da superfície terrestre, rica em

recursos naturais (condição de sustento dos povos tradicionais), apropriada e controlada por

um grupo humano. O território é antes de tudo a porção da superfície terrestre correspondente

ao espaço das experiências vividas por um povo cuja capacidade de resistência às tentativas

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de domínio por outros pode ter sido várias vezes testada. As lutas não são apenas contra um

inimigo externo. Os confrontos (banais ou motivados pela repartição desigual do poder

político) entre indivíduos membros dos grupos sociais podem ocorrer até mesmo sem que

tenham tido motivações tangíveis (COELHO; CUNHA; MONTEIRO, 2009).

Santos (2000) corrobora essa abordagem ao afirmar que o território é, antes de

qualquer coisa, relação social, é conflito, resultante de uma ação conduzida por um sujeito

geográfico que é sujeitante e sujeitado de formas de relações sociais territorializadas de

diferentes modos com interesses e visões diferenciadas (SANTOS, 2000).

Para Santos (2000) o território é o espaço de interações dos subsistemas natural,

construído e social, subsistemas que compõem o meio ambiente nacional, regional e local. O

território não se compreende apenas como entorno físico onde se desenrola a vida, animal e

vegetal e onde estão contidos os recursos materiais, mas compreende também a atividade do

homem que modifica esse espaço, ou seja, “é a base do trabalho, da residência, das trocas

materiais e espirituais e da vida, sobre os quais ele influi”. É o chão e mais a população, ou

seja, uma identidade, o fato de sentir que pertencermos àquilo que nos pertence (SANTOS,

2000, p. 96).

2.1.2 Modo de Vida

O modo de vida, segundo SORRE (1984, p. 90 apud FARIAS et al., 2015) é o:

[...] conjunto mais ou menos coordenado das atividades espirituais e materiais

consolidadas pela tradição, graças às quais um grupo humano assegura sua

permanência em determinado meio. Descrevemos, assim, os gêneros de vida

baseados na pesca, na criação nômade, na agricultura e em seus diversos modos

(SORRE, 1984, p. 90 apud FARIAS et al., 2015).

Na atualidade, modo de vida continua sendo utilizado no campo científico, tanto por

geógrafos, quanto por sociólogos e antropólogos. Na geografia destaca-se o trabalho de

Marques (1994) que se refere ao modo de vida como um conjunto de práticas cotidianas

desenvolvidas por um determinado grupo social, correspondendo, assim, à forma como um

determinado grupo social manifesta sua vida. Essas práticas cotidianas decorrem da história e

da posição que o grupo ocupa na sociedade e da forma específica que assegura a sua

reprodução social. A autora assegura ainda que os hábitos e as preferências de um grupo são

expressos por intermédio de um conjunto de objetos constituído pelos meios de sustento,

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vestimenta, habitação, instrumentos e armas, onde seus hábitos se tornam ritos, reforçados por

crenças e superstições (MARQUES, 1994, p. 17).

Segundo Guerra (1993), ao se analisar os modos de vida deve-se levar em

consideração três dimensões: o sistema e os atores sociais; a história e o cotidiano; e o

objetivo e o subjetivo na percepção do real. A análise dessas dimensões deve ser realizada de

forma articulada de modo que se combine a força da estrutura com a possibilidade de ação

dos indivíduos, o nível da vida cotidiana articulado com o econômico, o político, o cultural,

bem como as redes de poder estabelecidas nas articulações entre as diferentes esferas do

social (GUERRA, 1993).

Guerra (1993) orienta que as análises dos modos de vida centram-se em dois aspectos

fundamentais: um voltado à análise da relação entre as diferentes práticas quotidianas (de

trabalho, de vida familiar, de consumo, de lazer, etc.) e outro, centrado nas relações que o

conjunto destas práticas quotidianas estabelecem com as relações sociais mais gerais. Assim,

para a autora, os estudos ligados aos aspectos da vida cotidiana deveriam preocupar-se com o

grau de consciência dos atores sobre a condução dos seus destinos, individuais ou coletivos.

Deveriam, ainda, buscar a compreensão do nível de racionalidade e irracionalidade presente

nas práticas sociais, seguindo tendências imersas na história da sociedade em questão

(GUERRA, 1993). Tais sentidos imersos na história, não captáveis conscientemente pelos

indivíduos, são destacados por Gomes (2015) em seus estudos sobre a sociabilidade do

homem comum, que vive à margem da sociedade. Guerra (1993) também contribui para os

estudos dos modos de vida, ao apontar que a cultura popular, no Brasil, incorpora a

modernidade, mas não a partir da tradição, além disso, discorre sobre as influências da força

expansiva da cultura urbana difundida em escala global, a qual exerceria forte influência nos

modos de vida em escalas locais.

Para Farias (2017), Derruau (1977 [1961]) entende que os modos de vida são

formados pela integração de determinado número de elementos, que são tanto materiais

(instrumentos de caçar, pescar, rede de dormir, utensílios domésticos, tipo de transporte, etc.)

quanto espirituais (rituais utilizados nas formas de plantar, atribuição a deuses e espíritos a

determinados fenômenos e outras crendices), mas também sociais (organização do trabalho,

distribuição espacial das moradias, etc.). No entanto, segundo Silva (2006), Sorre (1984)

afirma que os elementos têm papeis diferenciados, pois uns são criadores ou organizadores e

outros são fixadores e acrescenta-se ainda outro, os transformadores (QUADRO 01). Este

tem, portanto, o papel de desestruturador ou homogeneizador. Porém, percebe-se que tais

elementos ocorrem de forma interligada e a análise de um modo de vida que leve em

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consideração apenas um tipo de elemento apresentará fundamentos muito limitados na

caracterização do grupo social estudado (SILVA, 2006).

Quadro 01 – Elementos do modo de vida e suas funções

Função dos

elementos do

modo de vida

Descrição Origem

Criadores e

Organizadores

Formas de escolher o que se planta, a maneira de plantar, de

colher, o jeito de preparar os instrumentos de trabalho, o modo

de produção, etc.

Materiais e espirituais

Fixadores Formas de povoação, tipos de casa, tipo da propriedade, divisão

social do trabalho, a economia, etc. Estruturação social

Limitadores O não consumo de carne de porco por alguns grupos, não

participar de programações que não sejam da sua religião. Proibições religiosas

Transformadores O acesso a tecnologias globais, intervenção estatal, a influência

de culturas externa, a circulação, o nível de vida, etc. Política e Economia

Fonte: Elaborado por Farias (2017) com base em Derruau (1997 [1961]), Sorre (1984), Silva (2006), Marques

(1994).

Para Farias (2017), Sorre (1984) considera que um modo de vida é criado a partir de

um conjunto de técnicas, que são usadas e desenvolvidas de acordo com as oportunidades que

a natureza proporciona às sociedades. Dessa forma, os elementos do modo de vida devem ser

entendidos como técnicas. Assim, segundo Farias (2017), verifica-se que Sorre (1984) deu

mais centralidade nas suas análises à técnica como sendo o principal instrumento de criação

dos modos de vida. Nesse sentido, Sorre (1984) acrescenta que esse conjunto de técnicas se

desdobra em técnicas de obtenção de energia, de produção de matérias-primas e de utensílios

para uso no trabalho. Acrescenta também, que o modo de vida pode ser aplicado para analisar

tanto as atividades mais complexas como as industriais, assim como as formas mais

elementares de vida, como aquelas baseadas em atividades tradicionais como a pesca, a caça,

a agricultura familiar, etc (SORRE, 1984).

Dessa forma, segundo Farias (2017), pode-se afirmar que o modo de vida é construído

a partir do desenvolvimento e combinação de técnicas que permitirão não apenas a

apropriação dos recursos naturais, mas também possibilita sua particularização através da

interação direta da sociedade com seus territórios material e imaterial (FARIAS, 2017).

Finalmente, por modo de vida Marx (1996, p. 27-28) esclarece que:

“Trata-se, muito mais, de uma determinada forma de atitude dos indivíduos,

determinada forma de manifestar sua vida, determinado modo de vida dos mesmos.

(...) O que eles são coincide, portanto, com sua produção, tanto com o que

produzem, como com o modo como produzem. O que os indivíduos são, portanto,

depende das condições materiais de sua produção”.

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30

A dimensão econômica das expressões territoriais tem um papel fundamental na

superestrutura do capitalismo, tanto que existem até políticas públicas para o aproveitamento

de tais mercadorias no balizamento dos processos de mercado. É neste contato e conjuntura

espaço-temporal que se estruturam e são produzidas as relações sociais, econômicas,

políticas, institucionais, culturais na própria gênese geoeconômica no qual está inserido seu

trabalho, sua existência (COSTA, 2014). Ainda conforme em Costa (2014), o que há é uma

combinação de tempos: tempo de trabalho na roça, na pesca e no preparo do peixe, na casa e

na coleta. Essa conjugação dos tempos determina que ao fim do processo, o trabalho saia em

forma de mercadoria, e fica a territorialidade para a reprodução do modo de vida, daí a luta

pelo reconhecimento legal de suas terras. E é o que fazem os grupos, quererem a

oficialização de suas terras (COSTA, 2014).

2.2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE ÁREAS PROTEGIDAS

Antes de qualquer discussão acerca de conservação/preservação de áreas naturais, é

interessante destacar que no Brasil há muita confusão entre os conceitos de áreas protegidas e

unidades de conservação, sendo, muitas vezes, erroneamente tratados como sinônimos.

Contudo, é importante ressaltar que a terminologia “áreas protegidas” é utilizada

internacionalmente como sendo uma porção de ambiente terrestre, aquático ou marinho,

localmente delimitadas, de domínio público ou privadas, onde medidas legais e outros

instrumentos estabelecem o seu manejo com o objetivo de proteger e manter a diversidade

biológica, recursos naturais e culturais associados e, administradas através de medidas legais

ou outras medidas efetivas (UICN, 1998). Já o termo “unidades de conservação” é utilizado

apenas no Brasil para designar as áreas protegidas que compõem o Sistema Nacional de

Unidades de Conservação, as quais são definidas por meio da Lei 9.985 de 18 de julho 2000,

no seu art. 2º, inciso I, como o:

“espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com

características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com

objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração,

ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção” (BRASIL, 2000).

No Brasil, as unidades de conservação são criadas por lei ou decreto específico para

existirem, assim como somente podem ser alteradas ou suprimidas por meio de lei, sendo

vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem a sua

proteção, conforme determina o Art. 225 da Constituição Federal de 1988. Por outro lado,

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31

com a criação do Código Florestal, as Áreas de Preservação Permanente (APPs), por

exemplo, que são áreas protegidas, passaram a existir em qualquer lugar onde haja a situação

de margens de rios, nascentes, topos de morros, declividade de 45º (BRASIL, 2012a). Deste

modo, as APPs já existem por si só, sendo sua proteção obrigatória em todo território

nacional. As propostas de criação de unidades de conservação, por sua vez, surgem da

necessidade e/ou relevância ambiental de determinado espaço, e, a partir disso, suas situações

são avaliadas, analisadas, consultadas, suas áreas delimitadas para, então, sua criação ocorrer

ou não (THOMAS, 2016).

Assim, embora as chamadas unidades de conservação sejam uma espécie de espaço

territorial especialmente protegido, nem toda área definida como tal será uma unidade de

conservação, como, por exemplo, as áreas de preservação permanente e as reservas legais.

Neste sentido, a unidade de conservação é uma particularidade do espaço protegido, sendo

possível afirmar, então, que toda unidade de conservação é uma área protegida, mas nem toda

área protegida é uma unidade de conservação, já que pode se tratar de alguma outra tipologia.

No Brasil, além das unidades de conservação, estabelecidas pela Lei Federal nº 9.985

de 18 de julho 2000 (SNUC), também são áreas protegidas: as áreas de preservação

permanente (APPs) e as reservas legais, instituídas pelo Código Florestal Brasileiro, Lei

Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012; as reservas da biosfera, instituídas pela

Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura (UNESCO); as terras

indígenas e quilombolas; os sítios Ramsar2; os sítios do patrimônio da humanidade

3, entre

outros (MEDEIROS; YOUNG, 2011). (QUADRO 02).

2 Zonas úmidas de importância internacional reconhecidas com base nos critérios adotados pela Convenção de

Ramsar (1971). Essas áreas se beneficiam de prioridade no acesso à cooperação técnica internacional e apoio

financeiro para promover projetos que visem a sua proteção e a utilização sustentável dos seus recursos naturais,

favorecendo a implantação, em tais áreas, de um modelo de desenvolvimento que proporcione qualidade de vida

aos seus habitantes. 3 Áreas que possuem elementos naturais e/ou culturais que, com base nos critérios adotados pela Convenção do

Patrimônio Mundial (1977), justificaram a inscrição do bem na Lista do Patrimônio Mundial. Para ser

considerada de Valor Universal Excepcional, um bem deve também cumprir as condições de integridade e/ou

autenticidade e deve ter um sistema adequado de proteção e gestão para garantir sua salvaguarda.

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Quadro 02 - Diversidade de áreas protegidas.

Áreas Protegidas

Reserva Legal Área de Preservação Permanente

Cavidades Naturais Subterrâneas (cavernas)

Sítios Arqueológicos

Áreas de Reconhecimento Internacional

Reservas da Biosfera

Sítios Ramsar

Sítios do Patrimônio Mundial Natural

Territórios Quilombolas

Terras Indígenas

Unidades de Conservação Proteção Integral

Uso Sustentável

Fonte: Elaborado pelo autor, com base em JOHN (2018).

2.2.1 Breves considerações sobre áreas protegidas no contexto mundial

A delimitação de territórios como áreas naturais especialmente protegidas não é

precisamente um fenômeno moderno que surgiu como consequência do agravamento da crise

ambiental, mas é uma iniciativa das sociedades humanas. A instituição de áreas protegidas

evoluiu ao longo da história das sociedades humanas, sendo condicionada pelas diferentes

concepções de sociedade e natureza que prevaleceram em cada período e região (TALBOT,

2016, p. 22).

Medeiros (2003) identifica que a delimitação e criação de áreas protegidas no mundo

foram influenciadas por três ideias básicas de proteção da natureza: até o século XIX a ideia

de controle do espaço tinha conotação gerencial, com a finalidade de preservar lugares

sagrados, nos quais o uso e mesmo a presença humana eram proibidos, como as florestas

sagradas na Rússia, e a manutenção de estoques de recursos estratégicos. Do final do século

XIX até a segunda metade do século XX a ideologia central era a de preservação da paisagem

como patrimônio coletivo e testemunho de uma natureza selvagem pelo caráter contemplativo

e de recreação, pela completa separação entre a natureza e o homem; a partir da segunda

metade do século XX a ideia central passa a ser a de proteger para resguardar para as gerações

futuras, com base no uso sustentável dos recursos ambientais e pela integração do homem à

conservação da natureza, sobrepondo-se a essa ideia a questão da biodiversidade no século

XXI (MEDEIROS, 2003).

As medidas tomadas para a proteção de áreas naturais nas mais diversas partes do

mundo, até meados da segunda metade do século XIX, se basearam na necessidade de se

preservarem áreas naturais ou sítios culturais valiosos, por questões religiosas ou históricas,

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por causa das espécies silvestres que habitavam tais locais, ou por sua beleza e características

naturais próprias, ou aos recursos de alto valor, como mananciais de água, de caça e de

plantas medicinais ou madeira, ou ainda com a finalidade de regular o acesso e uso dessas

áreas. Mas, a delimitação dessas áreas protegidas não tinha como finalidade o uso público,

uma vez que sempre se fundamentou na utilização dos recursos naturais por uma parcela dos

grupos sociais aos quais pertencia, por exemplo, como a nobreza (MEDEIROS, 2007;

CASTRO JÚNIOR; COUTINHO; FREITAS, 2009; PUREZA, 2014; MACIEL, 2011).

Apenas com o advento da Revolução Industrial, diante do papel transformador do

homem e da evidente diminuição de áreas em condições prístinas, ou “virgens”, surgiram

movimentos populares no sentido da preservação de áreas naturais com a finalidade de uso

público, como o Parque Nacional de Yellowstone, criado nos Estados Unidos da América

(EUA), em 1872, como área legalmente constituída de proteção da natureza destinado a

preservação de paisagens naturais sublimes a serem protegidas como patrimônio coletivo e

testemunho de uma natureza selvagem pelo caráter contemplativo e de recreação e acesso

público (MEDEIROS, 2007; CASTRO JÚNIOR; COUTINHO; FREITAS, 2009; PUREZA,

2014; MACIEL, 2011).

O modelo de preservação de áreas naturais instituído nos EUA se fundamentou no

preservacionismo, paradigma de proteção da natureza que objetiva manter remanescentes da

natureza intocados, sendo apenas admitido o uso público desses espaços para a contemplação

e também para a preservação das populações como testemunhos para as gerações futuras,

estabelecendo a separação entre o homem e a natureza (MEDEIROS, 2003; CASTRO

JÚNIOR; COUTINHO; FREITAS, 2009). Segundo Santos (2009), os espaços naturais

protegidos constituídos nesse modelo são um recorte espacial misantropo onde tem-se o ser

humano excluído da natureza, ou uma natureza excluída e excludente do ser social (SANTOS,

2009).

O modelo preservacionista de proteção da natureza implantado nos EUA, com a

instituição do Parque Nacional de Yellowstone, tornou-se inspiração para a criação de parques

e outras áreas protegidas em diversos países, dentre eles: Canadá, em 1885; Nova Zelândia,

em 1894, Austrália, África do Sul e México em 1898, Argentina em 1903, Chile em 1926,

Equador em 1934, Brasil e Venezuela em 1937 (MILANO, 2002; MEDEIROS, 2003;

VALLEJO, 2008). Na Europa, embora o primeiro parque europeu tenha sido criado somente

em 1909, na Suécia, a maioria dos países europeus só os regulamentou a partir da década de

1960, pois nesse continente, as áreas protegidas têm uma característica de utilização

sustentável, uma vez que se encontra atrelada a uma cultura milenarmente arraigada à terra,

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sendo que a proteção da natureza estava relacionada a leis específicas de uso do solo

(MEDEIROS, 2003).

Contudo, o preservacionismo tem recebido críticas ao longo do processo de

implantação (ou importação) nos países em desenvolvimento, principalmente a partir da

década de 1960, pois, esses países entendem que esse modelo de preservação da natureza lhes

impediria o desenvolvimento, uma vez que restringe a não exploração dos recursos naturais.

Tais críticas promoveram reflexões nos países em desenvolvimento sobre as práticas de

proteção da natureza a serem adotadas e sobre o desenvolvimento de modelos mais adequados

à situação cultural e econômica dessas sociedades, uma vez que os parques nacionais, nos

países em desenvolvimento (criados principalmente na segunda metade do século XX), não

têm sido instrumentos suficientes para a proteção da natureza. É comum, por exemplo, os

gestores dos parques enfrentarem conflitos fundiários e relacionados ao uso dos recursos

naturais, quase sempre sem uma estrutura adequada à gestão e sem apoio efetivo da sociedade

a favor da conservação da natureza (CASTRO JÚNIOR; COUTINHO; FREITAS, 2009, p.

34).

A partir daí, ganham força a visão moderna de proteção da natureza e a discussão

sobre as ideias de conservação e preservação da natureza. Preservar seria defender a

wilderness, por seu valor próprio, contra qualquer intrusão, objetivando a manutenção de

recortes espaciais nos quais se tenha um ambiente isolado, intocado, para garantir a

perenidade, a perpetuidade de um bem ambiental, onde a presença humana não é permitida.

Conservar seria praticar o bom uso dos recursos naturais, priorizando também a proteção

integral dos ecossistemas, mas admitindo seu uso eventual, de forma controlada e racional,

pois seu objetivo primordial é garantir a preservação da espécie humana. Mas o que seria

isso? Na maior parte dos casos em políticas públicas, isso se refere ao uso por empresas, mas

na prática, na realidade empiricamente observada quem faz isso são formas de campesinato e

indígenas, que já fazem o bom uso e com isso preservam para a espécie humana (CASTRO

JÚNIOR; COUTINHO; FREITAS, 2009, p. 32).

Assim como as áreas naturais protegidas vem evoluindo ao longo da história das

sociedades humanas, o conceito moderno de área protegida também evoluiu com o tempo,

não tendo surgido como uma ideia pronta. No âmbito mundial, a União Internacional para a

Conservação da Natureza (UICN) 4

, fundada em outubro de 1948, tendo como principal

4 Organização importante, fundada em outubro de 1948, cuja principal missão é a conservação da biodiversidade

em escala mundial. Atualmente, os programas globais desenvolvidos pela UICN envolvem os seguintes eixos

temáticos: negócio, economia, gestão de ecossistemas, direito ambiental, conservação florestal, equidade e

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missão a conservação da biodiversidade em escala mundial, tem desempenhado um

importante papel no processo de definição e atualização conceitual de tais áreas. Atualmente,

a UICN desenvolve programas globais que envolvem os seguintes eixos temáticos: negócio,

economia, gestão de ecossistemas, direito ambiental, conservação florestal, equidade e

igualdade de sexos, política global, áreas marinhas e polares, áreas protegidas, ciência e

conhecimento, política social, espécies, água e patrimônio mundial (PUREZA, PELLIN,

PADUA, 2015).

A partir da década de 1960 houve o interesse pelas comunidades tradicionais, em

decorrência da percepção da dificuldade em se promover a conservação da biodiversidade

sem a anuência e a participação dessas comunidades, principalmente daquelas que já viviam

no interior das unidades de conservação implantadas. Assim, em 1992, durante o IV

Congresso Mundial de Parques em Caracas (Parks of Life, 1992), discutiu-se sobre a

necessidade – ou não – de uma sexta categoria, baseada nas Reservas Extrativistas propostas

pelo movimento dos seringueiros no Brasil (PUREZA, PELLIN, PADUA, 2015).

Nesse mesmo Congresso foi ratificado o sistema de classificação das unidades de

conservação, com as seguintes categorias: a) reserva científica ou área natural silvestre; b)

parque nacional; c) monumento natural; d) área de manejo hábitats/espécies; e e) paisagem

terrestre/marinha protegida (QUADRO 03) (DAVENPORT, 2002; CABRAL; SOUZA, 2002;

MEDEIROS; IRVING; GARAY, 2004; DEAN, 2002).

igualdade de sexos, política global, áreas marinhas e polares, áreas protegidas, ciência e conhecimento, política

social, espécies, água e patrimônio mundial (PUREZA, PELLIN, PADUA, 2015).

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Quadro 03 – Evolução da categorização de áreas protegidas - UICN

REFERÊNCIA CATEGORIAS

Conferência Internacional para a Proteção da Flora

e da Fauna, Londres, 1933.

Parque Nacional

Reservas de Regiões Virgens

Reserva de Fauna e Flora

Reserva com proibição para caça e coleta

Convenção para Proteção da Flora e Fauna, das

Belezas cênicas Naturais dos Países da América,

Washington, 1940, ratificada em 1942.

Parque Nacional

Reservas de Regiões Virgens

Reserva de Fauna e Flora

Monumento Natural

Primeira Lista de Áreas Protegidas, 1966, fruto de

documento apresentado no Primeiro Congresso

Mundial de Parques Nacionais, 1962, Seattle.

Parque Nacional

Reserva Científica

Monumento Natural

Grupo de Trabalho da Comissão Nacional de

Parques e Áreas Protegidas (CNPPA), 1978.

Grupo A – Categorias em que CNPPA terá

responsabilidades especiais:

I - Reserva Científica

II - Parque Nacional

III - Monumento Natural/National Landmark

IV - Reserva de Conservação da Natureza

V - Paisagens protegidas

Grupo B – outras categorias importantes para IUCN,

mas fora do escopo da CNPPA:

VI - Reserva de Recursos

VII - Reserva Antropológica

VIII - Área de gestão de múltiplo uso

Grupo C: categorias integrantes de programas

internacionais

IX - Reserva da Biosfera

X - Sítios do Patrimônio Mundial (natural)

I - Proteção Estrita

O Congresso Mundial de Parques, realizado em

1992, em Caracas, iniciou as discussões que

contribuíram para a aprovação do novo sistema de

categorias aprovado em 1994 na Assembleia Geral

da IUCN, em Buenos Aires.

I - Reserva Natural Estrita;

Área Natural Silvestre;

II - Conservação e Proteção dos Ecossistemas;

Parque Nacional;

III - Conservação das características naturais;

Monumento Natural;

IV - Conservação Mediante Manejo Ativo;

Área de manejo hábitats/espécies;

V - Conservação de paisagens terrestres e marinhas

e recreacionais;

Paisagem terrestre e marinha protegida;

VI - Uso sustentável dos recursos naturais;

Área Protegida Manejada

Fonte: Elaborado por Pureza, Pellin e Pádua (2015) com base em Dudley (2008).

No entanto, o debate sobre a necessidade (ou não) de uma sexta categoria, baseada nas

Reservas Extrativistas só avançou e se consolidou no Congresso da UICN de 1994, em

Buenos Aires, quando o relatório denominado Talking the same language: na international

rewiew system for protected areas foi aprovado e publicado como Guidelines for Protected

Area Managemente Categories (Diretrizes para Manejo de Categorias de Áreas Protegidas).

Foi então incorporada a essa lista a categoria VI: Utilização Sustentável dos Ecossistemas

Naturais – Área Protegida com Recursos Manejados (QUADRO 04). A consolidação desta

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categoria sofreu influência brasileira, principalmente relacionada ao “histórico das Reservas

Extrativistas” que foi decisivo na criação dessa categoria (PUREZA, PELLIN, PADUA,

2015).

Quadro 04 – Lista com as seis categorias resultantes do Congresso da UICN de 1994

Categoria Ia

Reserva natural estrita: área natural protegida, que possui algum ecossistema excepcional ou

representativo, característica geológicas ou fisiológicas e/ou espécies disponíveis para

pesquisa científica e/ou monitoramento ambiental.

Categoria Ib

Área de vida selvagem: área com suas características naturais pouco ou nada modificadas,

sem habitações permanentes ou significativas, que é protegida e manejada para preservar sua

condição natural.

Categoria II

Parque nacional: área designada para proteger a integridade ecológica de um ou mais

ecossistemas para os presentes e as futuras gerações e para fornecer oportunidades

recreativas, educacionais, científicas e espirituais aos visitantes desde que compatíveis com os

objetivos do parque.

Categoria III

Monumento natural: área contendo elementos naturais – eventualmente associados com

componentes culturais – específicos, de valor excepcional ou único dado sua raridade,

representatividade, qualidades estéticas ou significância cultural.

Categoria IV

Área de manejo de habitat e espécies: área sujeita a ativa intervenção para o manejo com

finalidade de assegurar a manutenção de habitats que garantam as necessidades de

determinadas espécies.

Categoria V

Paisagem protegida: área onde a interação entre as pessoas e a natureza ao longo do tempo

produziu uma paisagem de características distintas com valores estéticos, ecológicos e/ou

culturais significativos e, em geral, com alta diversidade biológica.

Categoria VI

Área protegida para manejo dos recursos naturais: área abrangendo

prEntrevistadominantemente sistemas naturais não modificados, manejados para assegurar

proteção e manutenção da biodiversidade, fornecendo, concomitantemente, um fluxo

sustentável de produtos naturais e serviços que atenda as necessidades das comunidades.

Fonte: PUREZA, PELLIN, PADUA (2015).

2.2.2 Breves considerações sobre áreas protegidas no contexto do SNUC: as unidades de

conservação

No Brasil, o processo evolutivo das categorias das unidades de conservação

acompanhou, de certa forma, o internacional, isto é, até a década de 1990, as unidades de

conservação eram criadas tendo como base o modelo preservacionista norte-americano. Além

disso, com a ditadura militar houve o aparelhamento do Estado brasileiro, por meio da

burocratização totalizante, que buscava controlar diversos cenários do país. Na política

ambiental, um reflexo dessa visão foi a revisão de diversos instrumentos jurídicos, que

passaram a ter roupagens mais adequadas ao discurso dominante da época. Também houve a

ampliação das categorias existentes de unidades de conservação: surgiram decretos para a

criação de reservas biológicas, estações e reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental,

ampliando a possibilidade de criação e manejo de áreas protegidas, o que veio atender a

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demandas específicas de conservação, pois anteriormente a isso o Código Florestal de 1934

estabelecia apenas os parques e florestas nacionais (MEDEIROS, 2003).

Segundo Medeiros (2003), nesse período foi criado o Instituto Brasileiro de

Desenvolvimento Florestal (IBDF), em 1967, como autarquia do Ministério da Agricultura

responsável por parte da execução da política ambiental, incluindo a gestão de todas as

unidades de conservação federais existentes. Em 1973, foi criada a Secretaria Especial de

Meio Ambiente (SEMA), órgão responsável pela elaboração e execução de parte da política

ambiental e que seria base para a criação do Ministério do Meio Ambiente, duas décadas mais

tarde (MEDEIROS, 2003).

Nesse período, também foi lançada a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA),

por meio da Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, instrumento significativo para a

gestão ambiental brasileira, pois sistematiza a discussão ambiental e as diretrizes políticas da

gestão do meio ambiente no país. Outro instrumento relevante da política ambiental brasileira

criado nesse período é o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), que veio se tornar

a partir do período democrático, o órgão máximo do Sistema Nacional de Meio Ambiente

(Sisnama) e condutor da PNMA, exercendo papel fundamental na discussão das políticas

públicas afins. Atualmente, o Conama é o órgão colegiado brasileiro responsável pela adoção

de medidas de natureza consultiva e deliberativa acerca do Sisnama. A PNMA previa a

implantação do Sisnama, que pretende transformar o processo de gestão ambiental em um

grande sistema formado pelas três esferas de governo e a sociedade civil, possibilitando a

gestão integrada das ações ambientais e maior eficiência na conservação (MEDEIROS, 2003).

As unidades de conservação criadas nesse período se basearam no modelo

preservacionista norte-americano de paisagens intocadas, apresentando, entretanto,

particularidades em relação a esse modelo, que podem ser aferidas pelo desenrolar de nossa

história (DRUMMOND; FRANCO; NINIS, 2006). A primeira diferença se refere ao local de

estabelecimento, pois nos Estados Unidos, os parques nacionais foram instituídos,

preferencialmente, em locais não ocupados pelos colonizadores, sendo, portanto paisagens

relativamente naturais (apesar da presença de indígenas em muitas das áreas) (CASTRO

JÚNIOR; COUTINHO E FREITAS, 2009).

Desse modo, enquanto os parques americanos buscavam proteger as paisagens de um

impacto futuro, os parques brasileiros buscaram proteger áreas de interesse ambiental de

impactos imediatos, de conflitos já existentes. Os parques brasileiros e outras unidades de

conservação já nasceram, em sua maioria, em meio a importantes conflitos territoriais e de

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acesso a recursos, sendo sua gestão bastante dificultada e particularizada (CASTRO JÚNIOR;

COUTINHO; FREITAS, 2009).

Somente a partir da década de 1970, em virtude das injustiças geradas pelo sistema de

aviamento e das mudanças que ocorriam na Amazônia – acarretando, em função da crise da

borracha, a venda de seringais a empresários sulistas e sua transformação em áreas de

pastagem – surgem mobilizações sociais e políticas que se iniciam no Acre, sob a liderança de

Chico Mendes, que mais tarde culminariam na concepção de reservas extrativistas. Estas, por

sua vez, serviram de base para a consolidação e instituição da sexta categoria de áreas

protegidas da IUCN, “Utilização Sustentável dos Ecossistemas Naturais” (Área Protegida

com recursos Manejados), aprovada no Congresso da UICN de 1994, em Buenos Aires

(PUREZA, PELLIN, PADUA, 2015).

Um marco importantíssimo para a organização das unidades de conservação é a Lei nº.

9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação.

O SNUC é uma política ambiental brasileira com o objetivo de unificar, organizar, planejar e

manejar, de forma adequada, algumas categorias de áreas protegidas brasileira. Tal política

estabelece critérios e normas para a criação, implantação e gestão das unidades de

conservação no âmbito nacional, estadual e municipal a fim de contribuir para o alcance dos

objetivos nacionais de conservação (PELLIN et al., 2007). Dessa forma, como produzem

espaços de dinâmicas específicas e com uma administração diferenciada, a criação de

unidades de conservação é considerada importante estratégia de ordenamento territorial pelo

Estado (MEDEIROS, 2006; MEDEIROS; YOUNG, 2011). Essa administração e gestão das

unidades de conservação dependem de qual grupo e, por conseguinte, de qual categoria de

espaço de proteção está se tratando.

No Brasil, as categorias de unidades de conservação que integram o Sistema Nacional

de Unidades de Conservação, instituído pela Lei nº 9.985 de 18 de julho 2000, dividem-se em

dois grupos distintos, de acordo com seus objetivos e características de manejo: Unidades de

Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável (art. 7º). O primeiro grupo tem como

objetivo básico preservar a natureza, admitindo-se o uso indireto dos recursos naturais em

algumas categorias, estando protegidas de grandes interferências humanas, com exceção dos

casos previstos em lei (§ 1º). Constituem o grupo das Unidades de Conservação de Proteção

Integral (art. 8º): as estações ecológicas, as reservas biológicas, os parques nacionais, os

monumentos naturais e os refúgios da vida silvestre. O segundo grupo, por sua vez, possui

como objetivo primordial compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de

parte dos seus recursos naturais da área (§ 2º), permitindo-se sua exploração de forma

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equilibrada, a fim de garantir sua manutenção a longo prazo e minimizando-se os impactos

negativos da atuação antrópica. Constituem o grupo das Unidades de conservação de Uso

Sustentável (art. 14): as áreas de proteção ambiental; as áreas de relevante interesse ecológico;

as florestas nacionais; as reservas extrativistas; as reservas de fauna; as reservas de

desenvolvimento sustentável e as reservas particulares do patrimônio natural (BRASIL,

2000). No Quadro 05 são apresentadas as diversas categorias de Unidades de Conservação e

suas respectivas finalidades:

Quadro 05 – Categorias de Unidades de Conservação no Brasil com base na Lei Federal nº

9.985 de 18 de julho 2000 (Capítulo III, art. 7º.)

Unidades de Conservação de Proteção Integral

Estação Ecológica

(ESEC)

Área criada com o objetivo de promover a preservação da natureza e a realização de

pesquisas científicas. É proibida a visitação pública, exceto com objetivo educacional e

a pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável.

Reserva Biológica

(REBIO)

Área criada com o objetivo de promover a preservação integral da biota e demais

atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou

modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus

ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o

equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos.

Parque Nacional

(PARNA)

Área criada com o objetivo básico de promover a preservação de ecossistemas naturais

de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas

científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de

recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.

Monumentos

Naturais

Área criada com o objetivo de preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande

beleza cênica. Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja possível

compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais

do local pelos proprietários. Havendo incompatibilidade entre os objetivos da área e as

atividades privadas ou não havendo aquiescência do proprietário às condições propostas

pelo órgão responsável pela administração da unidade para a coexistência do

Monumento Natural com o uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de acordo

com o que dispõe a lei.

Refúgios de Vida

Silvestre

Área criada com os objetivos de proteger ambientes naturais onde se asseguram

condições para a existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local e

da fauna residente ou migratória. Pode ser constituído por áreas particulares, desde que

seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos

recursos naturais do local pelos proprietários. Havendo incompatibilidade entre os

objetivos da área e as atividades privadas ou não havendo aquiescência do proprietário

às condições propostas pelo órgão responsável pela administração da unidade para a

coexistência do Refúgio de Vida Silvestre com o uso da propriedade, a área deve ser

desapropriada, de acordo com o que dispõe a lei.

Unidades de Conservação de Uso Sustentável

Área de Proteção

Ambiental (APA)

Área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos

abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de

vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a

diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade

do uso dos recursos naturais. É constituída por terras públicas ou privadas. As condições

para a realização de pesquisa científica e visitação pública nas áreas sob domínio

público serão estabelecidas pelo órgão gestor da unidade e nas áreas sob propriedade

privada, pelo seu proprietário. A Área de Proteção Ambiental deve ter um Conselho

presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes

dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente.

Área de Relevante Áreas em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com

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Interesse

Ecológico (ARIE)

características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional,

e tem como objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local e

regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de

conservação da natureza. A Área de Relevante Interesse Ecológico é constituída por

terras públicas ou privadas, sendo que se respeitados os limites constitucionais, podem

ser estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma propriedade privada

localizada em uma Área de Relevante Interesse Ecológico.

Floresta

Nacional (FLONA)

Áreas com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas, tendo como

objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica,

com ênfase em métodos para exploração sustentável de florestas nativas. São de posse e

domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser

desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei. Nas FLONAs é admitida a

permanência de populações tradicionais que ali residiam quando da criação, em

conformidade com o disposto em regulamento e no Plano de Manejo da unidade. A

visitação pública é permitida, condicionada às normas estabelecidas para o manejo da

unidade pelo órgão responsável por sua administração e a pesquisa é permitida e

incentivada, sujeitando-se à prévia autorização do órgão responsável pela administração

da unidade, às condições e restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em

regulamento. A unidade desta categoria, quando criada pelo Estado ou Município, será

denominada, respectivamente, Floresta Estadual e Floresta Municipal.

Reserva

Extrativista (RESEX)

Áreas utilizadas por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no

extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de

animais de pequeno porte, tendo como objetivos básicos proteger os meios de vida e a

cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da

unidade. São de domínio público, com uso concedido às populações extrativistas

tradicionais, sendo que, segundo a lei, as áreas particulares incluídas em seus limites

devem ser desapropriadas. A visitação pública é permitida, desde que compatível com

os interesses locais e de acordo com o disposto no Plano de Manejo da área e a pesquisa

científica é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia autorização do órgão

responsável pela administração da unidade. Nessas Reservas são proibidas a exploração

de recursos minerais e a caça amadora ou profissional, e a exploração comercial de

recursos madeireiros só será admitida em bases sustentáveis e em situações especiais e

complementares às demais atividades desenvolvidas na RESEX.

Reservas de

Fauna (RFAU)

Áreas naturais com populações animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas,

residentes ou migratórias, adequadas para estudos técnico-científicos sobre o manejo

econômico sustentável de recursos faunísticos. São de posse e domínio públicos e as

áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas, conforme

disposto na lei. A visitação pública pode ser permitida e a caça amadora ou profissional

é proibida.

Reserva de

Desenvolvimento

Sustentável (RDS)

Áreas naturais que abrigam populações tradicionais, cuja existência baseia-se em

sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de

gerações e adaptados às condições ecológicas locais e que desempenham um papel

fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica. Têm

como objetivo básico preservar a natureza e, ao mesmo tempo, assegurar as condições e

os meios necessários para a reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e

exploração dos recursos naturais das populações tradicionais, bem como valorizar,

conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente,

desenvolvido por estas populações. São de domínio público, sendo que as áreas

particulares incluídas em seus limites devem ser, quando necessário, desapropriadas,

segundo dispõe a lei. A visitação pública e a pesquisa científica são permitidas e

incentivadas, embora sujeitas aos interesses e normas locais. A exploração de

componentes dos ecossistemas naturais em regime de manejo sustentável e a

substituição da cobertura vegetal por espécies cultiváveis são permitidas quando de

acordo com o Plano de Manejo.

Reserva Particular do

Patrimônio

Natural (RPPN)

Área privada, criada por iniciativa do proprietário, gravada com perpetuidade, com o

objetivo de conservar a diversidade biológica. Só poderão ser permitidas, na RPPN,

conforme se dispuser em regulamento, a pesquisa científica e a visitação com objetivos

turísticos, recreativos e educacionais são permitidas. São de domínios privados.

Fonte: Adaptado pelo autor com base na Lei Federal 9.985 de 18 de julho de 2000.

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É importante observar que a administração e a gestão de unidades de conservação

dependem de qual grupo e, por conseguinte, de qual categoria de espaço de proteção está se

tratando, pois embora determinadas unidades de conservação pertençam ao mesmo grupo,

elas apresentam diferenças entre si (QUADRO 05). As unidades de conservação do grupo de

proteção integral são mais restritivas ao uso e situam-se, principalmente, como áreas de

domínio público e controle estatal. Esse controle, incluindo as práticas de gestão, pode ocorrer

nas esferas dos governos federal, estadual ou municipal. O que vai definir essa participação é

a própria extensão da área, sua importância quanto aos recursos ambientais para o país e,

portanto, o exercício do controle político territorial.

2.3 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE COMUNIDADES REMANESCENTES DE

QUILOMBOS E O RECONHECIMENTO DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS NO

VALE DO RIO TROMBETAS

Segundo Gomes (2015), a formação dos quilombos no Brasil tem seu início em

meados do século XVI, quando os negros africanos foram, violentamente, desterritorializados

da África e trazidos à força ao Brasil para trabalhar como escravos nas monoculturas de

exportação – a exemplo da cana-de-açúcar – e perdurou até o século XIX, mesmo após a

abolição oficial da escravidão. No Brasil, o primeiro quilombo que se tem registro data de

1575, formado na Bahia (GOMES, 2015).

Gomes (2015) afirma que os negros escravizados aproveitavam ocasiões propícias

para empreenderem as fugas, como por exemplo, as diversas revoltas rurais que ocorreram,

principalmente, no período da Regência, em Pernambuco (Cabanada), no Maranhão

(Balaiada), no Rio Grande (Farroupilha) e no Grão-Pará (Cabanagem). Os negros

escravizados identificaram que os senhores estavam divididos e as tropas desmobilizadas para

a repressão, o que proporcionava maior possibilidade de sucesso nas fugas e acarretava o

recrudescimento das deserções. No período Imperial as autoridades coloniais denominaram os

quilombos de “contagioso mal”, pois havia muitos quilombos dispersos no território brasileiro

e, estes atraíam cada vez mais fugitivos (GOMES, 2015).

Após a fuga, os negros se organizavam e se estabeleciam em locais que lhes

proporcionassem proteção, o que dificultava as expedições de captura e repressão. Assim, os

recursos naturais (relevo, hidrografia, fauna, flora) eram aliados dos quilombolas na formação

dos quilombos, pois áreas de planaltos, montanhas, pântanos, manguezais, planícies, cavernas,

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morros, serras, florestas, rios etc., eram transformados em refúgios. Depreende-se, então, que

a forte relação que os quilombolas mantêm, atualmente, com a natureza em seus territórios

têm suas origens na noção, inicialmente, de proteção, mas também de abrigo e sustento que

esta lhe proporcionava (GOMES, 2015).

Com o término do regime escravista em 1888, o Estado deixou de reconhecer o direito

de propriedade de uma pessoa sobre outra. Contudo, as terras figuravam juridicamente como

“terras devolutas”, uma vez que após a abolição formal da escravidão negra no Brasil não

houve políticas fundiárias que proporcionassem e garantissem o domínio das terras para os

ex-escravos, ou para aqueles que há tempos garantiam seus modos de vida e reprodução social

nos chamados “quilombos”. Isso ocorreu devido a medidas adotadas pelo governo do Brasil

após a proibição do tráfico transatlântico de negros africanos para escravização, em 1845, pela

Inglaterra e, em 1850, pelo Brasil. O governo brasileiro, prevendo que com o fim do regime

escravocrata centenas de milhares de pessoas estariam livres para ocupar terras virgens e

produzir para si próprios em um sistema, possivelmente, de campesinato – e que isto, se

mantida a estrutura fundiária do país, poderia representar um colapso aos grandes produtores

rurais daquela época – criou meios para garantir que poucos mantivessem acesso aos meios de

produção (SAKAMOTO, 2008).

O principal mecanismo criado pelo governo brasileiro foi a Lei nº 601, de 18 de

setembro de 1850, chamada de Lei de Terras, aprovada poucas semanas após a extinção do

tráfico de escravos, em 1850. Esta lei estabelecia a compra como a única forma de acesso à

terra e abolia, em definitivo, o regime de sesmarias. Assim, as terras devolutas passaram para

as mãos do Estado, que passaria a vendê-las e não doá-las como era feito até então. A partir

dessa Lei, a terra começou a ter um custo, mas não era significativo para os então fazendeiros,

que dispunham de capital para a ampliação de seus domínios – ainda mais com os excedentes

que deixaram de ser investidos com o fim do tráfico. Porém, era o suficiente para deixar ex-

escravos e pobres de fora do processo legal. Da mesma forma, a lei proibia que imigrantes

que tiveram suas passagens financiadas para vir ao Brasil (ato comum na política de

imigração) comprassem terras até três anos após a sua chegada. Ou seja, mantinha a força de

trabalho à disposição do serviço do capital (SAKAMOTO, 2008).

Além disso, os preceitos dessa lei não foram, necessariamente, respeitados,

principalmente por quem possuía recursos para isso. Afinal, tal lei não havia sido criada para

impor ao capitalismo brasileiro um problema, mas sim garantir o seu florescimento. De

acordo com Costa (2010), os ocupantes de terras e os possuidores de títulos de sesmarias

ficaram sujeitos à legitimação de seus direitos, o que foi feito em 1854 através do "registro

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paroquial". O documento validava a ocupação da terra até essa data. Com isso nasceu uma

indústria da falsificação de títulos de propriedades, com a participação de cartórios. Por outro

lado, os procedimentos para isso eram inatingíveis aos ex-escravos ou aos imigrantes, por

desconhecimento ou falta de recursos financeiros para subornar alguém (SAKAMOTO,

2008).

Somente com a Constituição Federal de 1988, após 100 anos do término da escravidão

no Brasil, os remanescentes das comunidades de quilombos tiveram assegurados os direitos

de propriedade das terras que estivessem ocupando quando de sua promulgação, conforme

dispõe o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que afirma:

“Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é

reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado lhes emitir os títulos respectivos”

(BRASIL, 1988). A garantia do direito de domínio dos territórios pelos remanescentes das

comunidades de quilombos é fruto, a partir da década de 1970, da sinergia entre os

movimentos sociais negros. As lutas localizadas das comunidades remanescentes de

quilombos já eram bastante significativas nesse momento no Pará e Maranhão, o que

contribui para mudanças político-institucionais e administrativas estabelecidas, sobretudo,

pela Constituição Federal de 1988 (MARQUES; GOMES, 2013, p. 137).

Contudo, é importante ressaltar que os procedimentos administrativos para

“Identificação, Reconhecimento, Delimitação, Demarcação e Titulação das terras ocupadas

por remanescentes das comunidades de quilombos” somente foi regulamentado pelo

Decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003 (BRASIL, 2003). Entretanto, isso não impediu

as comunidades remanescentes de quilombos de iniciarem os processos de solicitação de

titulação de seus territórios, tanto que o primeiro território quilombola titulado no Brasil, o

TQ Boa Vista, em Oriximiná, Pará, foi titulado em 1995 (ARQMO, 2018).

As práticas coletivas de uso dos territórios quilombolas foram alvo de intenso debate

em encontros, reuniões e conversas informais nas comunidades e demais instâncias

organizativas do movimento quilombola. Na tentativa de dissipar as incompreensões sobre o

artigo 68 do ADCT, o governo federal instituiu, em 1994, um Grupo de Trabalho sobre as

Comunidades Negras Rurais, para elaborar um conceito de remanescentes de quilombo, esse

conceito foi divulgado pela Associação Brasileira de Antropologia (ABA):

Contemporaneamente, portanto, o termo não se refere os resíduos ou resquícios

arqueológicos de ocupação temporal ou de comprovação biológica. Também não se

trata de grupos isolados ou de uma população estritamente homogênea. Da mesma

forma nem sempre foram constituídos a partir de movimentos insurrecionais ou

rebelados, mas, sobretudo, consistem em grupos que desenvolveram práticas de

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resistência na manutenção e reprodução de seus modos de vida característicos num

determinado lugar (ALMEIDA, 2002, p. 18).

Assim, as comunidades remanescentes de quilombos não se constituem como um

passado imóvel, como aquilo que sobrou de um passado remoto, pois tais povos produziram

histórias complexas de ocupação agrária, constituição de territórios, cultura material e

imaterial próprias baseadas no parentesco e no uso e manejo coletivo da terra e dos recursos

do território (GOMES, 2015). Compreender as comunidades quilombolas contemporâneas

pressupõe analisá-las sob várias representações que a conformam e, dentre elas, talvez a mais

significativa, seja aquela que remete ao seu entendimento como território étnico que organiza

socialmente indivíduos e grupos marcados por laços simbólicos de parentesco ou vizinhança,

cuja crença em uma história comum credita força política para constituir uma identidade

“quilombola” (SANTOS, 2014).

O Decreto nº 4.887, de 2003, define as comunidades remanescentes de quilombos

como “grupos étnico-raciais, segundo critérios de autoatribuição, com trajetória histórica

própria, dotados de relações territoriais específicas, com a presunção de ancestralidade negra

relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”.

Os remanescentes de quilombo são definidos como grupos étnico-raciais dotado de

relações históricas e territoriais específicas com presunção de ancestralidade negra e sua

caracterização é dada segundo critérios de autoatribuição certificada pelas próprias

comunidades como adotado pela Convenção da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais

(MOURA, 2006; VELÁSQUES, 2006). Assim, a chamada comunidade remanescente de

quilombo é uma categoria social relativamente recente e representa uma força social

relevante no meio rural brasileiro, lutando pelo direito de propriedade de suas terras

consagrado pela Constituição Federal desde 1988.

O Território Remanescente de Comunidade Quilombola é uma consolidação das

conquistas da comunidade afrodescendente no Brasil, fruto da resistência ao modelo

escravagista instaurado no Brasil Colônia e do reconhecimento dessa grave injustiça

histórica. Além de provenientes dos antigos quilombos de escravos refugiados é importante

lembrar que muitas das comunidades foram estabelecidas em terras oriundas de heranças,

doações, pagamento em troca de serviços prestados ou compra de terras, tanto durante a

vigência do sistema escravocrata quanto após sua abolição (MOURA, 2006). Quilombos

contemporâneos no Brasil in Brasil/África: como se o mar fosse mentira. CHAVES, R.,

SECCO, C., MACENTREVISTADO, T.. São Paulo: Ed. Unesp. Luanda/Angola: Chá de

Caninde). Apartadas, portanto, de suas origens, essas comunidades fixaram-se ou

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permaneceram de forma quase invisível, e resgataram ou reconstruíram sistemas de

subsistência e de compreensão do mundo que se traduzem em inúmeros conhecimentos

tradicionais, manifestações culturais, música e culinária (MOURA, 2006; VELÁSQUES,

2007).

Segundo Arruti (2006, p. 67), “a categoria ‘remanescentes de quilombos’ foi criada

pelo mesmo ato que a instituiu como sujeito de direitos (fundiários e, de forma mais geral,

‘culturais’) e, nesse ato, o objeto da lei não é anterior a ela ou, de um outro ângulo, nele o

direito cria o seu próprio sujeito”. Por outro lado, Almeida (2008) considera que o artigo é,

em si, uma resultante de mobilizações surgidas no âmbito de acirrados conflitos, sobretudo

fundiários. No entanto, parece claro, tanto para um como para outro autor, que não era

corrente a expressão “comunidades remanescentes de quilombos”, mas antes terras de preto,

mocambos, lugar de preto (ALMEIDA, 2008).

Como decorrência, a aplicação prática deste dispositivo constitucional ensejou toda

uma discussão e mobilização dos movimentos negros, bem como da comunidade acadêmica,

no sentido de uma ressignificação da ideia de remanescentes de quilombos, na medida em que

a categoria apresenta vários problemas. O principal deles é o próprio desconhecimento

histórico sobre a real dimensão do fenômeno dos quilombos no país, o que dificultaria e até

mesmo impediria um reconhecimento baseado em informações científicas sobre a localização

exata dos referidos quilombos, bem como “as relativas às condições que estimulavam a fuga e

a constituição de quilombos, as táticas de defesa e repressão aos quilombos, sua demografia e

economia e suas relações com a sociedade envolvente” (ARRUTI, 2006, p. 72).

Arruti (2006) enfatiza dois elementos principais que permearam a historiografia dos

quilombos: a resistência cultural, em que os quilombos são retratados como a busca da

reconstituição de culturas africanas em solo brasileiro, e a resistência política, em que os

quilombos são apresentados como expressão das classes excluídas no confronto com a ordem

dominante.

Os quilombolas da microrregião Alto Trombetas consideram como comunidades

remanescentes de quilombos as certificadas pela Fundação Cultural Palmares. Os territórios

quilombolas, por sua vez, são conceituados pelo § 2º do Decreto nº 4.887, como as áreas

ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos, que sejam “utilizadas para a garantia

de sua reprodução física, social, econômica e cultural” (BRASIL, 2003). Os quilombolas da

microrregião Alto Trombetas consideram como territórios quilombolas os estejam

identificadas, delimitadas e tituladas, ou em processo de identificação, delimitação e titulação

por órgão competente (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018; 2019).

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Por essa razão, o art. 11 do ato normativo em questão estabelece que, quando as terras

ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos estiverem sobrepostas às

unidades de conservação já constituídas, o Ibama – e atualmente o ICMBio – tomará as

medidas cabíveis, visando garantir a sustentabilidade dessas comunidades, conciliando o

interesse do Estado. Isto significa que não é possível sua remoção, tendo que se

compatibilizar a preservação do ambiente e das culturas quilombolas. Nesses casos, o ideal é

que se reclassifique a unidade de conservação quando a categoria de manejo não comportar a

presença de populações tradicionais residentes, pois prevalece a condição de território

quilombola, conforme previsto pela Constituição Federal de 1988. Não havendo a

reclassificação para uma categoria de uso sustentável que permita à comunidade quilombola

permanecer na área que a ela será atribuída, não será convalidado o ato ilegal de instituição da

unidade de conservação (SOARES; CUREAU, 2015).

Segundo Souza (2010), nos últimos 30 anos as comunidades remanescentes de

quilombos vieram se organizando em associações locais, estaduais e nacionais, para alcançar

a realidade organizacional atual. O desenvolvimento das comunidades negras contemporâneas

é bastante diversificado, com seus processos de identidade e luta por cidadania, o que inclui a

titulação de seus territórios. Na microrregião Alto Trombetas, a organização socioespacial dos

grupos familiares quilombolas em comunidades proporcionou a estes que se organizassem

politicamente para proteger seus territórios e garantir a manutenção do seu modo de vida

frente aos sujeitos que, historicamente, se apropriaram ou cercearam o acesso aos recursos

naturais no vale do rio Trombetas, pois antes da organização em comunidades, os quilombolas

não possuíam uma organização que os integrasse politicamente com a finalidade de lutar pela

permanência no território e garantir a reprodução do seu modo de vida. Também foram

utilizadas as categorias “quilombola” e “coletor tradicional de castanha” para designar o povo

tradicional de matriz africana que reside na microrregião Alto Trombetas. Estes se auto

reconhecem, simultaneamente, enquanto “quilombolas ou remanescentes de quilombos” e

“coletores tradicionais de castanha ou castanheiros tradicionais”. Embora estas categorias não

sejam de uso cotidiano, recentemente, passaram a ser utilizadas tanto pelos pesquisadores

quanto pelos quilombolas como atribuições representativas dos vínculos étnicos existentes

entre os diversos grupos negros do vale do rio Trombetas. Os quilombolas se reconhecem

como remanescentes de quilombos porque são descendentes dos negros que formaram os

antigos quilombos, inicialmente, acima das cachoeiras dos rios Trombetas e Erepecuru, onde

os obstáculos naturais lhes proporcionavam abrigo e proteção, e posteriormente, à jusante das

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cachoeiras, às margens desses rios (FUNES, 1995; CASTRO; ACEVEDO, 1998; FARIAS

JÚNIOR, 2016; SCARAMUZZI, 2016).

Contudo, segundo Farias Júnior (2016), não é possível afirmar que “castanheiro

tradicional” ou que “coletor tradicional de castanha” seja uma categoria social de distinção

dentro do grupo, mas é uma designação agregadora, pois “embora se trate de uma

‘comunidade’ que reivindica a identidade enquanto quilombola, ou a designação formal

enquanto ‘remanescentes de quilombos’, o grupo aciona ainda a identidade enquanto

castanheiro” (FARIAS JÚNIOR, 2016).

O ICMBio utiliza o termo “Coletor Tradicional de Castanha” (CTC) nos crachás de

identificação confeccionados por esse órgão ambiental para serem utilizados pelos

quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil para adentrar na Reserva Biológica

do Rio Trombetas. Esse termo também é utilizado nas papeletas de controle de produção e

transporte de castanha-do-brasil e demais documentações encontradas nos arquivos desse

órgão ambiental (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

O termo “tradicional” foi inserido no quotidiano dos quilombolas devido à

“tradicionalidade” exigida pela legislação ambiental brasileira para a permanência dos povos

em unidades de conservação. Segundo o art. 42 do SNUC (2000), “As populações tradicionais

residentes em unidades de conservação nas quais sua permanência não seja admitida serão

indenizadas ou compensadas pelas benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo

Poder Público, em local e condições acordados entre as partes”. E enquanto não for possível

efetivar o reassentamento, se estabelecem normas e ações para compatibilizar sua presença

com os objetivos da unidade de conservação. A partir desse entendimento, ser ou não

tradicional tornou-se um critério para a celebração ou não de um Termo de Compromisso

(TALBOT, 2016).

No entanto, é importante frisar que em nenhum momento o SNUC obriga os povos

tradicionais a adicionar o termo “tradicional” como adjetivo das suas diferentes

autodenominações. Assim, não é possível afirmar que coletor tradicional de castanha é uma

categoria social de distinção dentro do grupo, mas é uma designação agregadora, uma

necessidade de adequação ao art. 42 do SNUC, corroborando com Farias Júnior (2016).

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2.4 INSTRUMENTOS DE GESTÃO DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS

Os instrumentos de gestão são documentos norteadores das atividades que subsidiam o

órgão gestor da unidade de conservação no delineamento das ações a serem desenvolvidas em

cada categoria de unidade de conservação (GALANTE, 2002). Na Reserva Biológica do Rio

Trombetas há os seguintes instrumentos de gestão: o plano de manejo e o termo de

compromisso.

Quadro 06 – Instrumentos de gestão da Reserva Biológica do Rio Trombetas

Instrumento de Gestão Tipo de documento Número Data de Publicação

Plano de manejo Portaria 80 13/09/2004

Termo de Compromisso Termo de Compromisso 119 a 121 20/12/2011

Fonte: Instituto Socioambiental. Unidades de Conservação no Brasil. Disponível em

https://uc.socioambiental.org e data de acesso. https://uc.socioambiental.org/arp/623.

Segundo Miller (1980) o primeiro instrumento de gestão de unidade de conservação

elaborado foi o plano de manejo do parque Nacional de Canaima, na Venezuela, em 1962. No

Brasil, o instrumento de gestão de unidades de conservação utilizado é o plano de manejo, que

algumas vezes, no âmbito estadual, é denominado de plano de gestão (GALANTE, 2002).

Segundo o SNUC (2000), o Plano de Manejo é o

“documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma

Unidade de Conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem

presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das

estruturas físicas necessárias ä gestão da Unidade” (SNUC, 2000).

O plano de manejo da Reserva Biológica do Rio Trombetas

O plano de manejo é, portanto, instrumento essencial na administração efetiva de uma

unidade de conservação, ao dar as instruções necessárias ao cumprimento de seus objetivos. É

um instrumento de gestão de unidades de conservação obrigatório por lei e deve ser elaborado

em até cinco anos a partir da criação da unidade. Até que seja elaborado o Plano de Manejo,

todas as atividades e obras desenvolvidas nas unidades de conservação de proteção integral

devem se limitar àquelas destinadas a garantir a integridade dos recursos que a unidade

objetiva proteger, assegurando-se às populações tradicionais porventura residentes na área as

condições e os meios necessários para a satisfação de suas necessidades materiais, sociais e

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culturais (SNUC, 2000). No entanto o desafio para elaborá-los e implementá-los nas unidades

de conservação no Brasil é tamanho que algumas ficam por mais de uma década sem qualquer

documento planejado.

O plano de manejo deve ser elaborado considerando-se todos os possíveis fatores que

afetam a unidade de conservação e por ela são afetados, indicando ações necessárias para a

plena realização dos objetivos de sua criação. Naturalmente, os planos de manejo das

unidades de conservação de proteção integral são distintos daqueles das unidades de uso

sustentável. O Ibama, órgão responsável pela gestão das unidades de conservação até 2007,

quando essa tarefa passou ao ICMBio, produziu, em 2002, um roteiro metodológico de

planejamento para as categorias Parque Nacional, Reserva Biológica e Estação Ecológica,

visando orientar a confecção dos planos de manejo de unidades de conservação de proteção

integral e de algumas categorias de uso sustentável (GALANTE; MENEZES; BESERRA,

2002).

Em 2007, já no âmbito do ICMBio, foi publicada a Instrução Normativa nº 01, de 18

de setembro de 2007, que disciplina as diretrizes, normas e procedimentos para a elaboração

de Plano de Manejo Participativo de Unidade de Conservação Federal das categorias Reserva

Extrativista e Reserva de Desenvolvimento Sustentável. Esta Instrução Normativa formalizou

o Plano de Utilização como parte integrante do plano de manejo participativo, o qual

consistiria em:

“regras internas construídas, definidas e compactuadas pela população do território

quanto às suas atividades tradicionalmente praticadas, o manejo dos recursos

naturais, o uso e ocupação da área e a conservação ambiental, considerando-se a

legislação vigente. É o documento base para que seja firmado o Termo de

Compromisso entre a população tradicional beneficiária da Unidade, que receberá a

concessão do direito real de uso, e o Instituto Chico Mendes” (ICMBIO, 2007).

Em 2017, ainda em âmbito federal, a Instrução Normativa nº 07, de 21 de dezembro

de 2017, estabeleceu diretrizes e procedimentos para elaboração e revisão de planos de

manejo. Entretanto, a última normativa a respeito é a Portaria ICMBio nº 1163, de dezembro

de 2018, que aprova novo roteiro metodológico para elaboração e revisão de planos de

manejo de unidades de conservação federais, revogando todos os anteriores com exceção do

roteiro metodológico de RPPNs de 2015, o qual segue válido (ICMBIO, 2017).

Os planos de manejo devem conter uma caracterização ambiental, social, econômica e

institucional da unidade, bem como programas importantes para sua implementação e

sustentabilidade, monitoramento e proteção. Por outro lado, também é inerente a esse

processo a necessidade de um planejamento a médio prazo combinado com uma flexibilidade

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que permita adaptação a circunstâncias que se modificam continuamente. Ainda, é um

pressuposto básico que ele inclua a participação, interesses e o bem-estar dos habitantes da

região, atores chaves na gestão da unidade (ICMBIO, 2018).

Assim, para a formulação de um plano de manejo, de forma democrática e

participativa, um dos primeiros passos é a identificação dos atores sociais interessados que

fortalecem o propósito da unidade de conservação. No caso das unidades de conservação que

reconhecem comunidades tradicionais beneficiárias, como as Resex, RDS e algumas

Florestas, evidentemente, essas são as primeiras interessadas. Essas categorias de unidades de

conservação, geralmente, possuem formas de representação, organizando-se em grupos ou

associações, porém, muitos atores sociais relevantes não contam com uma estrutura

institucional para conduzir seus interesses. Além disso, a equitatividade das representações

dos interessados é também fundamental. Paralelamente, surgem outras questões, como a

possibilidade de participação efetiva dos diversos atores, dadas as diferenças culturais e

sociais dos envolvidos. Infelizmente apesar das normativas que disciplinam essas

representatividades, sempre podem surgir mais desafios, assim, além de seguir os protocolos,

faz-se necessária a contínua transparência, respeito e a sensibilidade dos gestores.

No caso das categorias reserva extrativista e reserva de desenvolvimento sustentável,

além dos planos de manejo, há também a necessidade da elaboração de um plano de utilização

ou acordo de uso. As regras contidas nesse plano devem ser elaboradas de forma participativa,

por meio de discussões com os moradores, e aprovadas em Assembleia Geral da Associação,

trazendo de forma clara as atividades permitidas e proibidas nas unidades de conservação,

bem como a especificação de algumas práticas tradicionais. O respeito a essas regras de uso

comprova o compromisso das comunidades tradicionais em zelar por seu território e recursos

de forma sustentável, patrimônio socioambiental nacional. O Acordo de Gestão, oficializado a

partir de 2012, por meio da Instrução Normativa nº 29, de 05 de setembro de 2012, do

ICMBio, regulamenta o uso dos recursos naturais e a ocupação do solo em Reserva

Extrativista e Reserva de Desenvolvimento Sustentável e em áreas utilizadas por populações

tradicionais em Floresta Nacional, Área de Proteção Ambiental e Área de Relevante Interesse

Ecológico. O Acordo pressupõe a sustentabilidade ambiental da UC, o reconhecimento dos

territórios tradicionais como espaços de reprodução social, cultural e econômica das

populações tradicionais e o reconhecimento, valorização e respeito à diversidade

socioambiental e cultural das populações tradicionais e seus sistemas de organização e de

representação social.

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O plano de manejo da Reserva Biológica do Rio Trombetas foi publicado por meio da

Portaria nº 80, de 13 de setembro de 2004. O plano de manejo da Reserva Biológica é um

documento onde utilizando-se técnicas de planejamento ecológico, é determinado o

Zoneamento da Reserva Biológica, caracterizando cada uma de suas finalidade (ICMBIO,

2004).

O SNUC também preconiza que cada unidade de conservação do grupo de Proteção

Integral disporá de um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão responsável por sua

administração e constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da

sociedade civil, por proprietários de terras localizadas em Refúgio de Vida Silvestre ou

Monumento Natural, quando for o caso, e, na hipótese prevista no § 2º do art. 42, das

populações tradicionais residentes, conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação

da unidade (SNUC).

O tipo de Conselho da Reserva Biológica do Rio Trombetas é o consultivo, criado em

2006, pelo IBAMA, por meio da Portaria nº. 27, de 10 de março de 2006. Este Conselho foi

renovado por meio da Portaria 155 de 25 de fevereiro de 2013 e teve a composição

modificada por meio da Portaria nº 2, de 13 de outubro de 2016. O Conselho Consultivo da

Reserva Biológica do Rio Trombetas possui a finalidade de contribuir para a implantação e

implementação de ações destinadas à consecução dos objetivos de criação da Reserva

Biológica do Rio Trombetas (IBAMA, 2006; IBAMA, 2013; IBAMA, 2016).

Os Termos de Compromisso da Castanha na Reserva Biológica do Rio Trombetas

O SNUC também trouxe avanços no que diz respeito a participação da sociedade na

criação e na gestão das áreas protegidas, principalmente, devido a participação de sujeitos

sociais do chamado socioambientalismo na criação dessa Lei, o que permitiu modificações

importantes na política das unidades de conservação, assim como a criação de instrumentos

de minimização de conflitos territoriais nessas áreas (SIMON, 2014; SIMON; MADEIRA

FILHO; ALCÁNTARA, 2015).

Apesar dos avanços alcançados com a Lei Federal nº 9.985, ainda são muitos os

problemas existentes em decorrência da permanência ou não dos povos tradicionais que

residem em unidades de conservação de proteção integral já que, nas disposições gerais e

transitórias do SNUC, este traz uma visão de que sua permanência não seria permitida nessas

UCs. Nesse contexto, até que seja possível efetuar o reassentamento, o § 2º do Artigo 42 do

SNUC diz que

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seriam estabelecidas normas e ações específicas destinadas a compatibilizar a

presença das populações tradicionais residentes com os objetivos da unidade, sem

prejuízo dos modos de vida, das fontes de subsistência e dos locais de moradia

destas populações, assegurando-se a sua participação na elaboração das referidas

normas e ações (BRASIL, 2000).

Conforme estabelece o Art. 42 do SNUC, os povos tradicionais residentes em UCs de

proteção integral deverão ser indenizados ou compensados pelas benfeitorias existentes e

devidamente realocados pelo Poder Público, por meio do órgão competente, que priorizará o

reassentamento desses povos a serem realocados em local e condições acordados entre as

partes. O Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002, que regulamenta artigos da Lei nº 9.985,

diz que o processo indenizatório deve respeitar o modo de vida e as fontes de sustento das

populações e, ainda, estipulam que “as condições de permanência das populações em

unidades de conservação de proteção integral serão reguladas por termo de compromisso

negociado entre o órgão executor e as populações, ouvido o conselho da unidade de

conservação” (BRASIL, 2002).

Apesar de não oferecer alternativas às comunidades tradicionais, senão o seu

reassentamento, muitos consideraram que este capítulo trouxe significativo avanço a essa

questão na lei, pois, anteriormente, a despeito de inúmeras unidades de conservação de

proteção integral possuir povos tradicionais residindo em seus territórios, esse assunto não era

sequer tratado pelos documentos oficiais, nem os povos tradicionais eram mencionados nos

planos de manejo. A partir de então, as populações tradicionais passaram a ter que ser

indenizadas ou compensadas pelas benfeitorias existentes e realocadas em local e condições

acordadas com o poder público (TALBOT, 2016).

No entanto, reassentar famílias não é trivial e demanda, além de recursos financeiros e

local adequado, a concordância das famílias acerca das condições e do local escolhido,

conforme o próprio Artigo 42 do SNUC pressupõe, e conforme a Convenção nº 169 da

Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre povos indígenas e tribais, ratificado no

Brasil por meio do Decreto Legislativo nº 143, de 20 de junho de 2002, em vigor desde 2003.

Assim, reassentar povos tradicionais residentes em unidades de conservação constitui um

desafio que envolve princípios constitucionais de alta hierarquia: os princípios fundamentais

da dignidade da pessoa humana e a defesa do meio ambiente como bem comum a todos e

essencial à sadia qualidade de vida (TALBOT, 2016).

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Contudo, enquanto aguardam por uma solução definitiva do ICMBio, os povos

tradicionais residentes em unidades de conservação de proteção integral necessitam produzir

para obter renda e com isso as condições necessárias para a manutenção das suas

representações materiais e simbólicas, ou seja, para a reprodução do seu modo de vida. Logo,

um dos desafios da gestão das UCs de proteção integral é compatibilizar a conservação da

biodiversidade e o atendimento às necessidades e direitos dos povos tradicionais que nelas

residem.

O Decreto Federal 4.340, de 22, em seu Capítulo IX, que trata do Reassentamento das

Populações Tradicionais, no art. 39, vincula a permanência das populações tradicionais em

Unidade de Conservação de Proteção Integral a um Termo de Compromisso a ser firmado

entre o órgão ambiental executor competente e o representante de cada família, assistido,

quando couber, pela comunidade rural ou associação legalmente constituída até que a

população tradicional seja reassentada. O inciso 4º do referido artigo, impõe a necessidade de

que o Termo de Compromisso estabeleça prazos e condições para o reassentamento futuro da

população tradicional (SIMON, 2014; SIMON; MADEIRA FILHO; ALCÁNTARA, 2015).

O Termo de Compromisso, instituído pela Instrução Normativa nº 26 de, de 04 de

julho de 2012 do ICMBio, tem previsão legal no Decreto Federal nº 4.340, de 22 de agosto de

2002, que regulamenta o SNUC. O Termo de Compromisso é um instrumento de gestão de

conflitos territoriais existentes entre a gestão das unidades de conservação de proteção

integral e os povos tradicionais residentes no interior e entorno dessas áreas. Os termos de

compromisso constituem-se em acordos de utilização dos recursos naturais, de uso do

território e outros aspectos, de modo a regulamentar a presença dos povos tradicionais nas

unidades de conservação de proteção integral, até solução definitiva (ICMBIO, 2012).

O Termo de Compromisso tem como finalidade, mesmo que provisória, assegurar as

condições de gestão das unidades de conservação enquanto o processo de regularização

fundiária não ocorre. Além disso, tem como fim proporcionar a permanência e a manutenção

dos modos de vida dos povos tradicionais residentes nas unidades de conservação de proteção

integral, ainda que com rigorosas restrições de uso, e desde que esses povos sejam

reconhecidos como residentes ou usuários dessas áreas antes da criação da unidade de

conservação (PUREZA; PELLIN; PÁDUA, 2015).

A Instrução Normativa nº 26, de 04 de julho de 2012 estabelece as diretrizes e

regulamenta os procedimentos para a elaboração, implementação e monitoramento de termos

de compromisso a serem firmados entre o ICMBio e as populações tradicionais residentes em

unidades de conservação onde não se permite a presença humana ou que esta esteja em

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desacordo com os instrumentos de gestão, visando garantir a conservação da biodiversidade e

as características socioeconômicas e culturais dos grupos sociais envolvidos (ICMBio, 2012).

Tem como finalidade romper com o paradigma da expulsão compulsória de povos

tradicionais em unidades de conservação de proteção integral, sendo que para isso, traz em

seu arcabouço marcos legais que possibilitaram a construção desse instrumento de gestão e

mediação de conflitos. Essa instrução normativa, além de mencionar os artigos previstos no

SNUC que consideram as populações tradicionais em unidades de conservação, evoca o

respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana e da cidadania, do respeito à pluralidade,

aos distintos modos de criar, fazer e viver, da proteção ao meio ambiente e do direito à

qualidade de vida, inerentes a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988

(SIMON; MADEIRA FILHO; ALCÁNTARA, 2015).

Na Reserva Biológica do Rio Trombetas os termos de compromisso firmados entre o

ICMBio e as associações representativas dos quilombolas residentes no interior e entorno

dessa unidade de conservação têm a finalidade de gerir os conflitos pelo acesso e uso dos

recursos naturais – como os de pesca, pela andiroba, pela copaíba, pela castanha e outros –

demandados pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil residentes no

interior e entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Tais conflitos surgiram devido a

sobreposição do território dessa unidade de conservação com os territórios tradicionalmente

ocupados pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil, os quais já

utilizavam os recursos demandados para a manutenção do seu modo de vida antes mesmo da

criação dessa unidade de conservação

Os quilombolas residentes no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, após reivindicações para o acesso e uso dos recursos naturais, conquistaram, em

2003, ainda que por meio de acordo informal, a permissão para a coleta dos ouriços da

castanheira-do-brasil nos castanhais dessa unidade de conservação. No entanto, somente em

2010, após anos de construção, o termo de compromisso foi submetido para a análise e

parecer da Procuradoria Federal Especializada do ICMBio, que em 2011 manifestou parecer

favorável, tendo sua publicação no Diário Oficial da União (DOU) realizada no dia 27 de

dezembro de 2011.

Nesse contexto, foram firmados os Termos de Compromisso nº: 119, 120 e 121, de 20

de dezembro de 2011, celebrados, entre o ICMBio e as associações: Associação das

Comunidades Remanescentes de Quilombo do Município de Oriximiná (Arqmo), Amocreq-

CPT) e a Aetmo, respectivamente. Os TC firmados na Reserva Biológica do Rio Trombetas

têm por objetivo estabelecer as regras para a coleta e a comercialização da castanha-do-brasil

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dentro dos limites dessa unidade de conservação e das áreas a montante desta unidade de

conservação.

Esse instrumento de gestão de conflitos territoriais poderá contribuir para a

manutenção do modo de vida dos quilombolas coletores de castanha, visto que estes povos

têm o seu modo de vida estruturado na coleta desse produto, além dessa atividade ter

influenciado na organização do território que esses povos habitam, criando forte vínculo de

territorialidade.

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3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Analisar o modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

da Reserva Biológica do Rio Trombetas, no município de Oriximiná, Pará, como subsídios

para a gestão dessa unidade de conservação.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

- Descrever a formação do modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas.

- Descrever e analisar o modo de vida atual dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que firmaram termo de compromisso para a coleta da castanha-do-brasil na

Reserva Biológica do Rio Trombetas.

- Descrever e analisar a cadeia produtiva da castanha-do-brasil coletada pelos

quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que firmaram termos de

compromisso com o ICMBio para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio

Trombetas.

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4 MATERIAL E MÉTODOS

Este capítulo tem como objetivo apresentar o método para realizar o estudo. Serão

apresentadas as características da área de estudo, o tipo de pesquisa, o método da pesquisa, a

justificativa para escolha do estudo de caso, os métodos de coleta e tratamento dos dados e as

limitações do método.

4.1 CARACTERÍSTICAS DA ÁREA DE ESTUDO

A pesquisa foi realizada no TQ Alto Trombetas 1 (também denominado Mãe

Domingas) e na comunidade Último Quilombo, ambos localizados na microrregião Alto

Trombetas, situada no município de Oriximiná, no estado do Pará, Brasil (MAPA 01). O

município de Oriximiná localiza-se na microrregião de Óbidos, na mesorregião do Baixo

Amazonas, na porção noroeste do estado do Pará. A cidade de Oriximiná se encontra distante,

aproximadamente, 820 quilômetros, em linha reta, da capital do estado, Belém. Seus limites

são: ao norte, Guiana Francesa e Suriname; a leste, o município de Óbidos; ao sul, os

municípios de Juruti e Terra Santa; a oeste, o município de Faro e o estado de Roraima.

Mapa 01 – Localização da microrregião Alto Trombetas no município de Oriximiná.

Fonte: IBGE, IDEFLOR-BIO, INCRA. Elaboração do autor.

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Com uma população estimada de 71.160 habitantes (IBGE, 2018), o município possui

uma área territorial de 107.603,39 km², dos quais 96,97%, aproximadamente, 104.177,6 km²

(TABELA 01) são constituídos por áreas protegidas: Terras Indígenas, Unidades de

Conservação e Territórios Quilombolas (MAPA 02). (ORIXIMINÁ, 2017).

Tabela 01 – Áreas protegidas com incidência territorial no município de Oriximiná/PA

Unidades de Conservação,

Territórios Quilombolas (TQ)

titulados e Terras Indígenas

(TI)

Ano de

criação Administração

Área

Total

(Km²)

Área no

território

do

município

(km²)

% de incidência

sobre o

município de

Oriximiná

Rebio do Rio Trombetas 1979 Federal 4.077,00 4.077,00 3,79

Flona Saracá-Taquera 1989 Federal 4.412,82 2.737,00 2,54

Floresta Estadual de Faro 2006 Estadual 2.455,46 200,00 0,19

Floresta Estadual Trombetas 2006 Estadual 27.922,20 10.744,00 9,98

Estação Ecológica Grão-Pará 2006 Estadual 42.458,19 32.226,00 29,95

TQ Boa Vista 1995 Privado 11,00 11,00 0,01

TQ Água Fria 1996 Privado 5,60 5,60 0,01

TQ Trombetas 1997 Privado 809,00 809,00 0,75

TQ Erepecuru 1998 Privado 2.180,44 1.212,00 1,13

TQ Alto Trombetas I 2003 Privado 791,00 791,00 0,74

TQ Cachoeira Porteira 2018 Privado 2.072,00 2.072,00 1,90

TI Nhamundá-Mapuera 1989 Federal 10.495,20 4.512,00 4,19

TI Parque do Tumucumaque 1997 Federal 42.668,53 8.495,00 7,89

TI Trombetas-Mapuera 2009 Federal 39.708,98 19.271,00 17,71

TI Kaxuyana-Tunayana5 2018 Federal 2.1841,20 17.015,00 16,19

Total 161.706,1 104.177,6 96,97

Fonte: Planos de Manejo das Unidades de conservação; Portarias de reconhecimento das TQs e Decretos de

homologação das TIs.

5 Possui áreas sobrepostas: à Flota de Faro (3,92 km²); à Flota do Trombetas (15.946,91 km²); à Esec do Grão-

Pará (255,78 Km²).

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Mapa 02 – Áreas protegidas no entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas

Fonte: IBGE, IDEFLOR-BIO, INCRA, MMA. Elaboração do autor.

Contudo, é importante ressaltar que há condições de se evitar a pobreza e a carência

alimentar nessas áreas protegidas, pois são áreas onde há condições de reprodução dos modos

de vida dos povos tradicionais que nelas residem. Essas áreas protegidas são bases territoriais

para elos iniciais de cadeias produtivas, como da castanha-do-brasil, copaíba, andiroba, açaí e

outras, atividades produtivas desenvolvidas pelos povos tradicionais sem destruir os sistemas

naturais que lhe dão matéria-prima.

A microrregião Alto Trombetas localiza-se na margem esquerda e direita do rio

Trombetas, que é afluente da margem esquerda do rio Amazonas (ORIXIMINÁ, 2017). Essa

microrregião abrange as áreas de florestas e castanhais, os lagos e igarapés adjacentes que

ficam a montante da companytown Porto Trombetas (MAPA 01). É uma das 14 microrregiões

municipais que compõem a zona rural do município de Oriximiná (TAVARES 2006, p. 15). É

constituída por 16 comunidades remanescentes de quilombos: Boa Vista (Trombetas), Moura,

Palhal, Curucá Mirim, Último Quilombo, Nova Esperança, Jamari, Juquiri, Juquirizinho, Mãe

Cué, Sagrado Coração de Jesus, Tapagem, Paraná do Abuí, Abuí, Santo Antônio do

Abuizinho e Cachoeira Porteira; e a tribo indígena Mapuera (MAPA 03).

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Mapa 03 – Comunidades da microrregião Alto Trombetas.

Fonte: IBGE, IDEFLOR-BIO, INCRA. Elaboração do autor.

A microrregião Alto Trombetas, onde estão inseridos o TQ Alto Trombetas 1 e a

comunidade Último Quilombo, situa-se, sobretudo nas margens de rios, lagos e igarapés da

bacia hidrográfica formada pelo rio Trombetas e seus tributários. O rio Trombetas é um rio de

águas claras que possui muitos trechos de corredeiras e cachoeiras, apresentando água mais

cristalina, pois não banham tantos terrenos ricos em nutrientes como os de água barrenta

(IBAMA, 2004). No início do século XIX, os mocambeiros construíram os quilombos às

margens dos rios Trombetas e Erepecuru, nos trechos encachoeirados, à jusante das linhas de

quedas das cachoeiras, obstáculos naturais que proporcionavam proteção aos quilombolas

ante as expedições punitivas.

O rio Trombetas e seus tributários influenciam diversos ambientes alagáveis, tais

como as florestas inundáveis de igapó dos lagos, as florestas inundáveis de várzeas; e, em

menor extensão, manchas de campinas sobre solo arenoso. Além dessa variedade de

ecossistemas terrestres presentes na microrregião Alto Trombetas, também há: ambientes

lóticos de pequenas, médias e altas vazões, inter-relacionados com baixa, média e alta energia

(desde remansos até cachoeiras vigorosas; ambientes lênticos, representados tanto pelos

exuberantes lagos presentes na região, com o fluxo de água controlado pelos pulsos de

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vazante e cheia do rio Trombetas, como eles ocupados por uma rica e variada fauna.

(RADAMBRASIL, 1976 apud SALOMÃO, 2012).

O clima da região na qual está inserida a microrregião Alto Trombetas, onde situam-

se o TQ Alto Trombetas 1 e a comunidade Último Quilombo, é classificado como do tipo

“AF1” de acordo com a classificação climática de Köppen-Geiger (KÖPPEN; GEIGER,

1928), sendo classificado como tropical chuvoso de floresta que apresenta precipitação

pluviométrica média anual variando entre 2.200 mm e 2.500 mm (RADAMBRASIL, 1976

apud SALOMÃO, 2012), sendo que a temperatura média, a precipitação pluviométrica, a

umidade relativa e a insolação anual para região são de respectivamente: 26ºC, 2.197 mm,

81% e 2.026 horas (INEMET 2010 apud SALOMÃO, 2012). Como regra geral, na Amazônia

há dois períodos climáticos distintos: o “inverno” e o “verão”.

O “inverno” amazônico ocorre de dezembro a maio, quando incidem as maiores

precipitações pluviométricas, e consequentemente, o aumento dos níveis dos rios, lagos e

igarapés, ocasionando as chamadas “cheias”. No “inverno” amazônico, os coletores

tradicionais de castanha-do-brasil se dedicam a coleta da castanha-do-brasil – mais

precisamente de janeiro a maio –, pois é nesse período que os ouriços, frutos da castanheira,

se desprendem dos galhos dessa árvore e caem no chão. As “cheias”, por sua vez, facilitam o

transporte do produto, pois na “seca” muitos igarapés e furos ficam intrafegáveis devido se

tornarem muito rasos. O “verão” amazônico ocorre de junho a novembro, quando a estiagem

é bem acentuada, ocasionando as chamadas “secas” (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018).

Geomorfologicamente, a área de estudo encontra-se na unidade morfoestrutural do

Planalto Dissecado Rio Trombetas – Rio Negro, onde nas proximidades da margem direita do

rio Trombetas há relevos tabulares onde ocorre a exploração de bauxita. Na Geologia da bacia

amazônica os depósitos de bauxita presentes na microrregião Alto Trombetas são associados à

série Barreiras do Terciário, constituídos de arenitos, siltitos e, ocasionalmente,

conglomerados. As lateritas, assim como a bauxita comercial, são encontradas no topo dos

platôs, fortemente dissecados pela erosão, remanescentes do peneplano Terciário, e que se

estendem ao longo do lado nordeste do rio Amazonas, desde as vizinhanças de Oriximiná até

Jardilândias, no rio Jari. Estes platôs são bem definidos, têm os topos planos, achatados, cuja

elevação varia de 70-120 m, com altitude de 150-200 m em relação ao nível do mar

(RADAMBRASIL, 1976 apud SALOMÃO, 2012).

Fitogeograficamente, a microrregião Alto Trombetas, onde estão inseridos o TQ Alto

Trombetas 1 e a comunidade Último Quilombo, situa-se no Domínio das Terras Baixas

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Florestadas da Amazônia (Ab'Saber, 1971) e, segundo a classificação fitogeográfica do IBGE

(1992), a sua cobertura vegetal está inserida na Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas ou

Floresta Pluvial Tropical de Terras Baixas mista, sempre-verde, raramente estacional,

intercalada por manchas de floresta densa. Esta tipologia florestal é dependente de alto índice

pluviométrico e conta com uma densa biomassa vegetal. Das subtipologias existentes nesta

região fitogeográfica, apenas as florestas de terra firme, as florestas inundáveis de igapó, as

florestas de várzea e a campina de areia branca se fazem presentes na Reserva Biológica do

Rio Trombetas. Dentre as principais espécies encontradas destacam-se: Dinizia excelsa

(angelim-pedra), Bertholletia excelsa (castanheira) e Cedrelinga catanaeformis

(cedrorana). O estrato uniforme é caracterizado por Manilkara spp (maçarandubas), Protium

spp. (breus) e Pouteria spp (abius). Trata-se de florestas com alto volume de madeira de

grande valor comercial, com sub-bosque limpo, boa regeneração natural e fácil locomoção

(IBAMA, 2004).

4.1.1 O Território Quilombola Alto Trombetas 1 (Território Mãe Domingas)

O Território Quilombola Alto Trombetas 1, também conhecido como Mãe Domingas,

nome da associação que o representa, está localizado a jusante do TQ de Cachoeira Porteira,

no entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas (MAPA 02). Parcialmente titulado pelo

Iterpa em 2003, o TQ Alto Trombetas 1 teve o título definitivo de seu território retificado em

2012. Atualmente, a parte titulada do TQ Alto Trombetas 1 possui uma área de 61.211,96

hectares, correspondentes às comunidades Abuí, Paraná do Abuí e Santo Antônio do

Abuizinho. A parte não titulada do TQ Alto Trombetas 1 compreende uma porção territorial

de 151.923 hectares, correspondente às comunidades: Tapagem, Sagrado Coração de Jesus e

Mãe Cué, conforme informado pelo E 11:

“A Associação Mãe Domingas da qual faço parte, ela é composta com seis

comunidades: começa no Abuí, o Paraná do Abuí, o Santo Antônio que era uma

comunidade junta com o Paraná que era só o Paraná e foi dividido e agora tem o

Santo Antônio. Aí tapagem, Sagrado Coração de Jesus e o Mãe-Cué. Então essas

comunidades a qual faz parte da Associação Mãe Domingas, que graças a Deus nós

não tem nenhuma comunidade que more, que seja implantada dentro da Reserva

Biológica. Tudo é na Floresta Nacional, mas a maior parte da extraição que a gente

faz é dentro da Reserva Biológica. Quando não coleta a castanha direcionada, mas

coleta a copaíba, coleta outra coisa. Tem três comunidades dentro do território

titulado que é o Abuí, o Paraná do Abuí e o Santo Antônio. E já a Tapagem, o

Sagrado Coração de Jesus e Mãe-Cué, a gente tá lutando pra conseguir a titulação

dessas três. A gente já, em fevereiro de 2017, foi publicado o RTID. Quando foi esse

ano a gente tinha uma data judicial que era pra ser titulada até maio de 2018, mas

não foi titulada, mas graças a Deus, foi publicada a portaria de reconhecimento pelo

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Diário Oficial da União no dia 19 de julho, o qual vai ser entregue no dia 20, lá na

comunidade da Tapagem. É um avanço enorme pra titulação porque daí não tem

mais como o governo dizer eu não titulo porque ela não é reconhecida, né. E

passando do Diário, da Portaria de reconhecimento, só é a titulação. Possa que venha

umas outras coisas, que hoje a gente tá brigando com... ainda não é caminho

diretamente pra titulação por causa de que pra fazer titulação dentro dessa área que a

gente tá tem que fazer um projeto de lei pra fazer a desafetação da Flona pra

diretamente pra titulação e isso depende de passar pelo Congresso. E a gente sabe

que o Congresso hoje, a briga do Congresso é por dinheiro, não é por ajudar

ninguém” (E 11, 2018).

De acordo com o Entrevistado 11, dentre as peculiaridades do grupo de comunidades

do TQ Alto Trombetas 1, está a ocupação da Reserva Biológica do Rio Trombetas com usos –

não há moradias. As sedes e as áreas de moradias das comunidades quilombolas da parte não

titulada do TQ Alto Trombetas 1 estão localizadas em áreas sobrepostas ao território da

Floresta Nacional Saracá-Taquera. Além das áreas sobrepostas à Floresta Nacional Saracá-

Taquera, as comunidades do TQ Alto Trombetas 1 também reivindicam áreas de uso

sobrepostas a Reserva Biológica do Rio Trombetas.

A Portaria que o Entrevistado 11 se refere é a Portaria de Reconhecimento nº 1.171,

publicada no Diário Oficial da União, no dia 17 de julho de 2018 foi publicada. Essa Portaria

é resultado de acordo entre o INCRA, o ICMBio e a Associação Mãe Domingas, entidade

representativa do Território Quilombola Alto Trombetas 1. Por meio dessa Portaria, o Incra

reconheceu e declarou como terras do Território Quilombola Alto Trombetas 1 a área de

161.719,42 hectares, situada no município de Oriximiná, no estado do Pará. A regularização

fundiária desse território será realizada via Contrato de Concessão de Direito Real de Uso

(CCDRU), a ser emitido pelo ICMBio, sendo o Incra e a Fundação Cultural Palmares

intervenientes da área de 57.938,14 hectares, que corresponde à porção do Território

Quilombola sobreposto à Floresta Nacional de Saracá-Taquera (INCRA, 2018a).

No mesmo dia também foi publicada a Portaria de Reconhecimento nº 1.172, resultado

de acordo entre o INCRA, o ICMBio e a Associação das Comunidades Remanescentes de

Quilombo do Alto Trombetas (ACRQAT), entidade representativa do Território Quilombola

Alto Trombetas 2. Por meio Portaria de Reconhecimento nº 1.172, o Incra reconheceu e

declarou como terras do Território Quilombola Alto Trombetas 2 a área de 189.657,81

hectares, situado no Município Oriximiná, no estado do Pará. A regularização fundiária será

realizada via contrato de concessão de direito real de uso a ser emitido pelo ICMBio, sendo

INCRA e Fundação Cultural Palmares intervenientes, da área de 93.794,19 hectares, que

corresponde à porção do Território Quilombola sobreposto à Floresta Nacional de Saracá-

Taquera (INCRA, 2018b).

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Apesar da publicação das Portarias de Reconhecimento, estas não encerram as

tratativas referentes à definição final das áreas dos Territórios Quilombolas Alto Trombetas 1

e Alto Trombetas 2 que se encontram sobrepostas à Reserva Biológica do Rio Trombetas,

considerando-se a sobreposição de interesses da União. A publicação da Portaria também não

implica renúncia, pelos quilombolas dos Territórios Quilombolas Alto Trombetas 1 e Alto

Trombetas 2, ao direito de futura emissão de título de domínio sobre as sobrepostas à Reserva

Biológica do Rio Trombetas (INCRA, 2018a; INCRA, 2018b).

Segundo Fonseca (2015), a titulação da área reivindicada pelo TQ Alto Trombetas 1,

sobreposta a unidades de conservação federais, atualmente geridas pelo ICMBio, impõe o

enfretamento de uma questão delicada: a necessidade de revisão dos limites das unidades de

conservação federais criadas sobre territórios secularmente ocupados por comunidades

remanescentes de quilombos. Por tal razão, a regularização fundiária do TQ Alto Trombetas 1

tem sido postergada, devido à dificuldade de consenso entre o Incra e o ICMBio quanto às

sobreposições do TQ com as unidades de conservação.

4.1.2 A comunidade Último Quilombo

A comunidade Último Quilombo recebe essa denominação por ter sido a última

comunidade quilombola a aderir, no ano de 1993, ao movimento organizado pela Arqmo. A

comunidade Último Quilombo localiza-se no Território Quilombola Alto Trombetas 2, mais

precisamente nas margens do lago do Erepecu, abrangendo o rio Trombetas e o igarapé do

Candeeiro, até o Igarapé da Água Branca. O território da comunidade Último Quilombo está

totalmente sobreposto ao território da Reserva Biológica do Rio Trombetas, ocupando a

porção sul da Reserva Biológica do Rio Trombetas, estando a noroeste da Base de Apoio do

Erepecu – posto de fiscalização do ICMBio, que está instalado na boca do lago – e fazendo

fronteira, a oeste, com a comunidade Nova Esperança (CUMBUCA NORTE, 2017).

A comunidade Último Quilombo está vinculada a Associação das Comunidades

Remanescentes de Quilombo do Alto Trombetas 2 (ACRQAT), a qual é responsável pela

solicitação de titulação do TQ Alto Trombetas 2. O processo administrativo foi formalizado

junto ao Incra desde 2004, sendo que o RTID desse TQ somente foi publicado em 14 de

fevereiro de 2017, em obediência à sentença que, em 2015, condenou a União, o Incra e o

ICMBio a concluírem em até dois anos o procedimento administrativo de identificação,

reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelas comunidades

de remanescentes de quilombo Alto Trombetas 1 e 2. A solução do procedimento, contudo,

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tem sido postergada (assim como foi postergada a publicação do RTID, concluído em 2014)

devido à dificuldade de se chegar a consenso, entre os órgãos federais, quanto às

sobreposições do TQ Alto Trombetas 2 com a Floresta Nacional Saracá-Taquera e a Reserva

Biológica do Trombetas.

A população da comunidade Último Quilombo é de 40 famílias, de acordo com os

moradores. Segundo o Departamento de Relações Comunitárias da MRN, naquele mesmo

ano, 30 famílias estariam residindo na comunidade (MRN, 2016). Já o Relatório

Antropológico do TQ Alto Trombetas 2 indicou que, em 2013, havia 27 famílias no local, das

quais 20 teriam sido cadastradas pelo Incra e outras sete não cadastradas, totalizando uma

população de 122 moradores (Ecodimensão, 2014). Por sua vez, o levantamento

socioeconômico realizado pela STCP em 2014 considerou em conjunto a população das

comunidades Nova Esperança e Último Quilombo, referindo-se a ambas como se fossem uma

só localidade, então chamada Lago Erepecu, de modo que não se procedeu à discriminação do

número de famílias referentes a cada comunidade. Enfim, diante das imprecisões e possíveis

mudanças próprias dos fluxos populacionais, adotou-se nesta pesquisa as informações das

últimas pesquisas dos relatórios antropológicos.

4.1.3 Organização social e territorial dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas

No que se refere a organização social e territorial, os resultados indicaram que os

quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que coletam na Reserva Biológica do

Rio Trombetas, tanto os que residem no TQ Alto Trombetas 1, quanto os que residem na

comunidade Último Quilombo, estão organizados em núcleos familiares, conviventes ou não

em uma mesma unidade doméstica. As unidades domésticas, por sua vez, formam os grupos

familiares, que formam as comunidades. As comunidades se organizam em torno de

associações que representam o Território Quilombola e estas estão organizadas em torno da

Arqmo, Associação-Mãe (FIGURA 01) (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

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Associação Mãe (ARQMO)

Microrregião

Associação de Área/Território

Quilombola

Comunidade

Grupo Familiar

Unidade Familiar

Figura 01 – Organograma dos níveis de organização social e territorial da microrregião Alto

Trombetas.

Os núcleos familiares no TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

Os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem no TQ Alto

Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo se organizam em núcleos familiares,

conviventes ou não em uma mesma unidade doméstica (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018). No TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

as unidades domésticas são compostas, em média, por 03 a 06 pessoas, mas esse número pode

variar a até 10 pessoas morando na mesma casa, sendo que cerca de 88% das casas abriga

apenas uma única família6 (ARQMO, 2018).

A quantidade de famílias residindo na mesma casa tem relação direta com o

desmatamento nas áreas do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo, uma

vez que quanto mais famílias constroem casas, mais áreas do interior e entrono da Reserva

Biológica do Rio Trombetas são desmatadas (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA,

2018/2019).

6 Considerou-se como família o conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou

normas de convivência, que residissem na mesma unidade domiciliar e, também, a pessoa que morasse só em

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Os grupos familiares no TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

As unidades familiares, geralmente, se organizam em grupos familiares. Os grupos

familiares do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo são formados por

aglomerações de casas construídas próximas umas das outras, em sítios elevados localizados

ao longo dos rios, lagos, igarapés e paranás (FIGURA 02). As pessoas que compõem o grupo

familiar auxiliam-se na produção e comercialização dos produtos oriundos da pequena

agricultura familiar e do extrativismo, mas há um distanciamento espacial entre esses grupos.

Contudo, apesar desse distanciamento, há uma teia de relações, trocas e ajuda mútua entre

esses grupos que integram uma unidade maior, a comunidade, que lhes dá sentido social e

cultural (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

Figura 02 – Casas de um grupo familiar na comunidade do Abuí, no lago do Abuí, Território

Quilombola Alto Trombetas 1, microrregião Alto Trombetas, Oriximiná – PA. O grupo

familiar geralmente é constituído por filhos e filhas que contraíram matrimônio, mas também

podem ser constituído por outros familiares. Fonte: PICANÇO (2018).

uma unidade domiciliar (IBGE, 1999).

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A organização em comunidades

Os grupos familiares de quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que

coletam na Reserva Biológica do Rio Trombetas se organizam socioespacialmente em

comunidades, unidades políticas e administrativas no contexto local (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Segundo Acevedo e Castro (1998), as comunidades do TQ Alto Trombetas 1, da

forma como estão organizadas atualmente, foram instituídas e reconhecidas pelos

quilombolas, no âmbito da organização da Arqmo, a partir da década de 1990. A organização

se deu em meio a lutas pela garantia de direitos territoriais das populações negras locais,

invisibilizadas nos processos de criação das unidades de conservação e afetadas por impactos

socioambientais decorrentes da implantação da mineração na região, conforme informado

pelos Entrevistados 01, 12 e 24:

“Esse negócio de comunidade foi de uns certos tempos pra cá que foi afundada e na

época que jogaram o pessoal de lá do Jacar... Daí da Reserva não tinha ainda o

negócio das comunidades. Dispois disso muitas coisas melhorou, mas foi já devido a

comunidade, depois de fundar a comunidade que melhorou mais algumas coisas”

(E01, 2018).

(...)

“A comunidade aqui é o seguinte, as comunidades aqui vizinhas, as seis

comunidades, se fazer uma E com uma, tá fazendo com todas. Tem aquela coisa

que, às vezes, a pessoa não tá mais inteirada que a outra. A gente sempre tá, graças a

Deus, uma parceria boa aí com eles da Mãe-Domingas, né, sai a gente vai junto”

(E12, 2018).

(...)

“Foi depois da morte, em 94 [1994], que um policial do Ibama matou um irmão

meu, aí já existia a Arqmo nessa época, tava próxima ainda que a Arqmo foi

fundada, aí devido a força que a Arqmo foi fundada, as comunidades de fora, aí

meio que o Ibama relaxou, aí foi que montaram essa comunidade. Foi a Igreja

Católica que organizou, foi o padre Patrício. Todas as comunidades são organizadas

pela Igreja Católica. Quando o Ibama chegou pra cá, eles vinham com o propósito

de... Até hoje eles ainda usam essa mesma situação. Eles vieram aqui porque o

governador decretou como reserva, né. Só que antes de ser Reserva existia muitos

moradores, existia na verdade. Existia moradores já, o avô dele, bisavô dele, por

exemplo, o papai, o pai do papai morou por aqui. Só que não era comunidade, mas

existia essas pessoas. Aqui sempre foi lago Erepecu. Inclusive essa data de criação

dessa comunidade aqui, houve um equívoco que tem muitas pessoas que falam que

não foi devido a morte do meu irmão que fundada essa comunidade, mas na verdade

foi. Aí tem umas pessoas da comunidade que acabam dizendo que foi antes, antes da

morte, mas na verdade foi depois da morte dele que nós... Foi de conflito nosso com

o Ibama” (E24, 2019).

Analisando as falas dos Entrevistados 01, 12 e 24, pode-se afirmar que outro uso

importante do termo/categoria “comunidade” é como marcador temporal. Segundo

Scaramuzzi (2016), a fundação das comunidades remete ao tempo da chegada da Igreja, ao

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início da luta pelos direitos territoriais, à fundação da Arqmo e a organização política das

pessoas diante dos embates políticos com aqueles que tinham interesses por suas terras. O

tempo em que não existia comunidade está interligado ao tempo dos patrões, ao regime das

colocações e a expropriação e perda do direito de uso de parte do território pela implantação

das unidades de conservação (SCARAMUZZI, 2016).

O termo/categoria “comunidade” é usado principalmente para circunscrever aquilo

que concerne ao âmbito das relações com o Estado e alguns segmentos da sociedade civil.

Inclui-se nesse espectro de relações: aquelas com as pessoas de fora que moravam ou

frequentavam o território quilombola; aquelas relativas à gestão dos bens materiais e objetos

coletivos como o barco comunitário e o motor de luz movido a óleo diesel ou gasolina; a

estrutura física dos centros comunitários como o posto de saúde, escola e igreja e os empregos

ligados a educação, transporte e saúde (SCARAMUZZI, 2016).

Segundo Scaramuzzi (2016), a organização política e o aparato burocrático e material

que acompanham a existência das comunidades na microrregião Alto Trombetas interferiram

no modo de vida e no modo de ocupação territorial dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que coletam na Reserva Biológica do Rio Trombetas. Scaramuzzi (2016)

afirma que isso ocorre devido aos mecanismos da comunidade que auxiliam na gestão dos

espaços, das pessoas e daquilo que já existia antes da chegada da Igreja Católica. Um exemplo

é a gestão sobre o estabelecimento de moradias, pois nas comunidades do TQ Alto Trombetas

1 e na comunidade Último Quilombo é comum os quilombolas deslocarem suas moradias de

forma temporária ou permanente, pelo território pelos mais variados motivos: em busca de

solos mais férteis para cultivar a roça, coletar produtos florestais, e também devido à escassez

de caça e pesca em determinados locais. Sempre que os recursos necessários para a

sobrevivência ficam escassos em algum local, os quilombolas migram para áreas onde havia

mais abundância de recursos naturais, fazendo, assim, manejo e preservação desses recursos.

Segundo Castro e Acevedo (1998) essa mobilidade territorial dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas estão associados a um

padrão de reprodução social. Segundo as autoras,

Em tempos não estritamente regulares, o grupo doméstico procura se mobilizar em

direção a lugares onde os alimentos desejáveis ou suas fontes estejam o mais

próximo possível de seu lugar de residência. Sua permanência no mesmo lugar

encontra limites nas condições do próprio meio natural. O ponto central dessa

estratégia é o aumento do tempo de trabalho e o gasto de energia necessários para

alcançar a distância entre o local de habitação e o local de trabalho. Há uma

racionalidade que busca compensar, pela economia de tempo e esforço, as

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dificuldades impostas pelo uso de tecnologias rudimentares (CASTRO; ACEVEDO,

1998).

Atualmente, no TQ Alto Trombetas 1, assim como na comunidade Último Quilombo,

a possibilidade de migrar de uma comunidade para outra, assim como o ingresso de novos

moradores não quilombolas, é discutida e avaliada nas assembleias comunitárias. No caso de

migração intercomunitária a probabilidade do requerente ter sua solicitação aceita é maior

caso possua parentes residindo próximos ao lugar onde pretende morar, sendo que estes se

responsabilizam por condutas não compatíveis com as regras do território ao qual estão

inseridos, conforme informado pelos Entrevistados 16, 17, 21, 24, 25 e 26:

“Isso é muito interessante, interessante, porque ao mesmo tempo, interessante,

esclarecedor pras pessoas que fazem algumas especulações. Então, funciona assim,

é... Eu nasci aqui, me criei aqui, mas sempre tem um momento que e gente precisa

estudar. A gente precisa conhecer as pessoas, conhecer o mundo. Conhecer a mídia,

conhecer o desenvolvimento, a tecnologia. E aqui no Erepecu, na nossa comunidade,

isso ainda não é possível, né. Nós somos um pouco aquém das realidades que

existem lá fora. Então, a minha tendo essa visão como várias outras mães e pais, nos

levaram pra estudar lá em Porto Trombetas. E nós fixamos, então residência lá na

Boa Vista, em outro território, mas com a permissão dos coordenadores da

Associação de lá do Boa Vista. Fixamos residência lá, estudamos. Depois eu me

casei e tomei conta da minha própria família. E agora, estou retornando depois de

casado, depois de filhos. Retornei pra lá, foi em 2007. Retornei pra minha

comunidade e estou aí atuando na comunidade do Último Quilombo. E por enquanto

como ainda tenho filhos que estudam aí, um último filho que estuda no colégio

Pitágoras, ainda tô com a residência lá, mas estou fazendo uma outra aqui, que eu

pretendo me mudar o quanto antes” (E 16, 2018).

(...)

“As pessoas que sai pra morar em outro local, pode sair. Até hoje pode, mas a

pessoa vai reencontrar hoje uma burocracia, todo mundo tá se organizando. Tem um

caso aí, mas graças a Deus já foi resolvido. Porque assim, Carlos tu mora na cidade

não precisa dar satisfação para ninguém, põe a mochila na costa e vai embora. Na

comunidade já é diferente, porque a pessoa vai sair da comunidade, se ele bem

pensar, ele chega com a comunidade com a coordenação ele não vai dar satisfação

da sua vida, mas ele vai comunicar que ele vai sair que vai dar um tempo, mas

depois ele volta. Quando ele sai, alguém pode ocupar o terreno quando ele sair. Ele

vai ter problema quando ele chegar. Não vai ter o terreno né, embora o estatuto diz

que ninguém pode entrar na capoeira de ninguém e ninguém pode chegar e ocupar o

terreno de alguém, então tem esse cuidado. Hoje: – Ah! Eu vou sair, vou levar meu

filho para estudar em Oriximiná. Não tem nenhum problema! Vou sair, vou

trabalhar. Não tem nenhum problema, mas o que a comunidade quer como respaldo,

assim: – Cadê o Fulano? A comunidade saber dizer o que o Fulano está fazendo lá.

Hoje, nós temos um levantamento das pessoas que moram, que estão e aqueles que

são, mas que estão lá fora. Para quê, quando essa pessoa que está lá fora chegar,

ainda tem o processo. Ele vai na comunidade, vai dizer a comunidade que ele voltou

para ficar, entendeu? Ele não pode chegar na comunidade, chegar e ficar. Porque

tem pessoas que chega afinca o seu barraco e não tá nem aí com a comunidade. E aí

o que acontece: nós temos dois tipos de pessoas na comunidade, nós temos o

comunitário e nós temos o morador. Então, o morador que que vai acontecer? A

comunidade não tem responsabilidade com aquela pessoa, porque simplesmente foi

embora e não faz parte do rol da comunidade, ai o comunitário, é diferente, por quê?

Porque ele está ali na ativa, então se for para defender quem mora e o comunitário,

com certeza o comunitário. Ele vai ter mais defesa que o morador. Porque, assim, a

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pessoa mora mas não tá nem aí, a pessoa novata que chega pra morar aí, ele vai ter

problema. Vai ter problema com a comunidade, ICMBio e com a associação. Vamos

dizer, assim, se você resolveu vir morar aqui no último quilombo, vamos dizer: –

Olha, o Carlos, aquele rapaz tá querendo vir morar na comunidade, aí vai ser feito

uma reunião. Aí ele vai vir a comunidade para escutar o que ele tem a dizer, o que a

comunidade tem a dizer. Aí ele vai dizer se aceita ou não. Porque se não for assim,

Carlos, vai ter pessoas, casas na comunidade toda” (E 17, 2018).

(...)

“Então, cada comunidade é assim, quando o comunitário quer sair, o certo, por

estatuto nosso, a pessoa sai vai na comunidade e diz eu vou passar um tempo, eu vou

mudar pra tal comunidade, mas a capoeira eles não podem vender e nem pode doar.

Até um dia nós tivemos conflito sobre isso porque teve uns que venderam, teve uns

que doaram, depois quiseram voltar, só traz problema pra gente. Então, a gente não

aceita dessa maneira, o nosso estatuto reza assim que quando a pessoa vai a

comunidade toma conta da capoeira e não deixa que ninguém entre lá. Na hora que

ele voltar, ele tem o acesso dele livre. Ele veio do Abuí, né, aí ele se apresentou.

Agora, nós temos uma situação aqui que a gente tá meio parando: o cara que veio no

tempo dos patrões, lá de outra cidade, passou uns dias, ou veio na época da castanha,

mas quando ele soube que ele nasceu aqui hoje, ele quer voltar. Então, uma pessoa

dessa não tem como a gente... – Ah, mas eu nasci aqui..., mas não é quilombola. Pra

isso aí nós estamos fechando as portas. E outra: a pessoa tá lá no Moura, agora por

besteira, a mulher tá aqui no Erepecu. Poxa, não são marido e mulher? Então

decidam onde querem ficar. Então, é para esses caras aí que a gente senta com a

pessoa e fizemos um acordo com o ICMBio para esses casos bem sérios. Agora no

caso do menino, não, o pai dele tava aqui, ele queria mudar pra cá” (E 21).

(...)

“Essas regras assim, elas funcionam de acordo com o Estatuto lá da Associação, da

Arqmo. Quem tá fora que é remanescente, é daqui, filho daqui, o direito que ele tem

é quem tá aqui, é chegar aqui, o dia que ele quiser fazer uma casa e morar. Aí a

partir daí vai conquistando seus direitos. Aí alguém de fora só pode vir se for trazido

por alguém, tipo assim casou. Se minha filha casou com o camarada lá de fora, se

quiser vir morar aqui, pode trazer. Aquele meu filho lá, ele nasceu lá no fartura,

então ele filho é natural aqui de dentro. Então, tinha pessoas, quando ele chegou, ele

falou com a tia..., que é nosso parente aqui. Aí: não meu filho, tu é filho do Edílson,

não tem problema. Ela reconheceu sozinha, sem... mas tinha alguém que tava

fuxicando... Mas porque que o Edílson chegou e disse que ia ficar aqui de novo e o

filho dele chegou e já tem casa e não falou isso. Algumas pessoas, mas ela sem

problema. Ah, meu filho, atravessa lá pro rumo do teu pai e vai fazer tua casa. É

algumas pessoas, é por isso que tava tendo aquilo. Pelo estatuto, ele tem direito sim”

(E 24).

(...)

“Eu era lá do rumo da Serrinha eu fui pro Abuí, que meu pai era de lá, aí o rapaz que

mora aqui foi para lá com meu cunhado ai agente se conheceu (E 26)”.

Analisando as falas dos Entrevistados 16, 17, 21, 24, 25 e 26, é possível afirmar que as

solicitações de pessoas que não são quilombolas, assim como as solicitações de migração

intercomunitária, também são discutidas e avaliadas em assembleia comunitária. Mas, neste

caso, para pleitear residência nas comunidades quilombolas do TQ Alto Trombetas 1, assim

como na comunidade Último Quilombo, é necessário se tornar cônjuge (e seus dependentes

legais) de remanescente de quilombo e adotar o modo de vida desse povo tradicional.

Segundo um dos coordenadores da Associação Mãe Domingas, ser quilombola não se

restringe apenas em ser “remanescente de quilombo”, os quais são descendentes e possuem a

mesma identidade étnica dos quilombolas que viveram nos quilombos no vale do rio

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Trombetas, mas tal categoria é definida pelo modo de vida peculiar construído por esse povo

tradicional ao longo de sua territorialização no vale do rio Trombetas. Assim, para ser

considerado quilombola nem sempre é necessário compartilhar da mesma identidade étnica.

Temos como exemplo os cônjuges (pessoas não quilombolas e seus dependentes legais) dos

remanescentes de quilombo, que também são considerados quilombolas, desde que adotem o

modo de vida desse povo tradicional (E16, 2018; E17; E21; E24; E25, 2019).

As coordenações das comunidades do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último

Quilombo organizam missas, atividades e festas religiosas, eventos de esporte e lazer e

trabalhos coletivos (mutirões), conforme informado pelos Entrevistados 08, 10, 12, 15, 16.

“Em relação a coordenação da comunidade, a gente como coordenação a gente tem

um trabalho que é mais voltado a questão da... do... pastoral, sabe? Assim,

organização da igreja, a organização da própria comunidade, dos comunitários pra

qualquer um outro evento que tenha ligado a associação [Mãe-Domingas]. Então a

gente como coordenador a gente tem essa função de organizar aqui os comunitários.

A gente tá sempre preparado pra ajudar nas discussão, nas luta pela titulação e lutar

pra melhoria da própria comunidade. Essa é uma das função. Porque na verdade a

comunidade ela é a base da associação. Então, se nós comunitários, ou seja, nós

coordenador, a gente não se organizar pra que a comunidade esteja preparada pra

hora que a associação precisar, aí é muito difícil, não tem como seguir” (E08, 2018).

(...)

“Eu sou duas vezes Coordenador. Antes, nós estava com três anos (período na

coordenação da Comunidade), mas sempre a Paróquia vem trocando. Nós ficava três

anos, agora cada vez vai diminuindo mais. Depois passou pra dois. Agora este ano

foi eu fui no mês de maio num curso lá na paróquia e me falaram que esse próximo

ano vai ser um ano” (E10, 2018).

(...)

“O nosso papel de coordenação na comunidade é, sempre procurar as coisas

principais pra dentro da comunidade, né, alguma melhoria pra cá pra comunidade,

pro nosso povo. Então, nosso objeto principal da comunidade é essa. Associação

(apoio a associação) a gente tá trabalhando, graças a Deus, junto aí com o

Coordenador da Associação. Sobre a titulação, a gente trabalha aqui diretamente

mesmo com a nossa associação. É ela que traz esse. A gente acompanha eles, mas

eles que trazem a liberdade pra gente sobre a Associação. A comunidade só faz

acompanhar o coordenador da comunidade, e deixa um pouco por conta deles pra

não complicar, né? Um puxar prum lado, puxar pro outro. A gente sempre ficar a par

porque a gente viaja com eles. Tá sempre junto. Olha, enquanto coordenador, as

dificuldades têm meias grandes as dificuldades aqui. O problema de recurso que a

gente. Não, eu não acho que é por tá dentro da Flona, que a Flona ela é sempre mais

liberta. Eu cismo que é por ser muito distante, por isso que eu cismo que a

dificuldades...” (E12, 2018).

(...)

“É complicado mesmo. Esse negócio de coordenação é complicado. Qualquer coisa

que dá corre em cima do coordenador, o coordenador tem que se virar. Tem vez que

as Associação me dão ajuda, agora também, tem vez que sou eu que luto mais.Uma

força grande pra manter a associação né. Até aqui, graças a Deus, tá boa a

Associação” (E15, 2018).

(...)

“Então, quando eu recebi o Convite pra assumir a coordenação da comunidade, eu

aceitei com muito amor, coragem e determinação mesmo. E eu sou aquela pessoa

envolvia, né, com qualquer assunto que me proponho a assumir, né. Então, eu vi

algumas dificuldades e vi também nas dificuldades, a oportunidade pra gente

melhorar. Melhorar a comunidade como um todo. Foi mesmo uma questão de bem

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estar, vida financeira da comunidade [...] O meu propósito como coordenador é estar

buscando incentivo e melhorias de vida pra todos, todos na comunidade. Não só pra

um ou dois, mas que todos possam melhorar de vida, que possam ter a sua liberdade

mais assistida, né? [...] É essa a minha proposta pra comunidade. É o meu

pensamento, o meu desejo. Desenvolver de uma outra forma, onde as pessoas

tenham dignidade mesmo, tenham dinheiro no bolso. É esse daí meu objetivo. [...]

Olha, além de morador, além de comunitário e além de coordenador, eu me intitulo,

me proponho na comunidade como facilitador, entendeu. Porque as pessoas, elas

ficam nas comunidades e elas precisavam de um facilitador lá fora, escutar alguma

coisa, ver alguma coisa boa e implantar na comunidade, entendeu. Como eu te falei,

eu sou coordenador, eu sou comunitário, eu coleto às vezes castanha, mas eu quero,

eu gosto de ser um facilitador pro crescimento da comunidade como um todo. A

minha preocupação é o desenvolvimento geral da comunidade” (E 16, 2018).

Analisando as falas dos Entrevistados 08, 10, 12, 15 e 16, pode-se afirmar que as

comunidades possuem um coordenador local responsável pela representação dos interesses

dos moradores perante associações locais, órgãos públicos, organizações privadas e diferentes

sujeitos que recorrem à comunidade. O coordenador também é responsável pelas negociações

e recebimento de verbas da prefeitura, pela manutenção e pelas viagens mensais do barco

comunitário à cidade de Oriximiná, como também pela organização e realização de festas

religiosas, festas dançantes e eventos esportivos. Cabe também ao coordenador representar a

comunidade em algumas reuniões com órgãos federais, estatais e municipais e conduzir as

relações com as pessoas de fora que desejam fazer pesquisa, realizar projetos ou visitar a

comunidade. A vigência de seu mandato é geralmente de dois anos e ele é escolhido em

assembleias gerais pelos próprios moradores (E08; E12; E15; E16, 2018; OBSERVAÇÕES

ESTRUTURADAS, 2018/2019).

Os Territórios Quilombolas (TQs)

As comunidades quilombolas, enquanto organização social estão inseridas nos

Territórios Quilombolas (TQs) (titulados ou em processos de titulação), espacialmente mais

amplos. O território da microrregião Alto Trombetas possui quatro territórios quilombolas:

Boa Vista, Alto Trombetas 1 (Mãe Domingas), Alto Trombetas 2 (Moura, Jamari/Último

Quilombo) e Cachoeira Porteira (QUADRO 07). A organização das comunidades

quilombolas em territórios quilombolas possui como objetivo facilitar o processo de titulação

das terras ocupadas pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

(OBSERVAÇAO ESTRUTURADA, 2018/2019; ARQMO, 2018).

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Quadro 07 – Áreas quilombolas da microrregião Alto Trombetas, com suas respectivas

comunidades e localização na microrregião Alto Trombetas

Áreas/TQs Comunidade Localização

Cachoeira Porteira Cachoeira Porteira

Território Quilombola de

Cachoeira Porteira e Reserva

Biológica do Rio Trombetas

Alto Trombetas 1 (Mãe

Domingas)

Abuí

TQ Alto Trombetas (Titulada) Paraná do Abuí

Santo Antônio do Abuizinho

Tapagem Floresta Nacional Saracá-

Taquera Sagrado Coração de Jesus

Mãe Cué

Alto Trombetas 2

Último Quilombo

Reserva Biológica do Rio

Trombetas

Nova Esperança

Juquirizinho

Juquiri Grande

Jamari

Reserva Biológica do Rio

Trombetas e Floresta

Nacional Saracá-Taquera

Curuçá Mirim Floresta Nacional Saracá-

Taquera Palhal

Moura

Boa Vista Boa Vista TQ Boa Vista (Titulado)

Fonte: IBAMA (2006); INCRA (2013); CPI-SP (2014) (modificado) apud FONSECA

(2015).

4.2 COLETA DOS DADOS

De acordo com as características do presente estudo, utilizou-se como abordagem a

pesquisa qualitativa, de caráter descritivo, envolvendo questões e procedimentos que

emergem do grupo estudado, os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que

residem nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo, os

quais firmaram Termo de Compromisso com o ICMBio para a coleta da castanha-do-brasil na

Reserva Biológica do Rio Trombetas. A pesquisa descritiva objetiva-se em registrar os fatos

como são observados, devendo ser interpretados e analisados sem nenhuma interferência do

pesquisados, ou seja, apenas descritos como ocorrem.

A fundamentação para abordagem qualitativa dessa pesquisa centra-se nos autores

Gerhardt e Silveira (2009, p. 32), no qual afirmam que “A pesquisa qualitativa preocupa-se,

portanto, com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, centrando-se na

compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais”. Sendo esta pesquisa altamente

descritiva, está sujeita à capacidade perceptiva do pesquisador.

Desse modo, como estratégia de pesquisa utilizou-se o estudo de caso, conforme Yin

(2005). Segundo Yin (2005), não se pode confundir a estratégia de pesquisa estudo de caso

com o método específico de coleta de dados, como a etnografia ou observação participante. A

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etnografia, em geral, exige longos períodos de tempo no “campo” e enfatiza evidências

observacionais detalhadas. A observação participante pode não exigir a mesma quantidade de

tempo, mas ainda presume um investimento pesado de esforços no campo. Em contraste, os

estudos de caso são uma forma de inquirição que não depende exclusivamente dos dados

etnográficos ou de observadores participantes YIN (2005). Por isso, a escolha do estudo de

caso como método de coleta de dados.

Segundo Yin (2005) é possível “realizar um estudo de caso válido e de alta qualidade

“sem se deixar a biblioteca e sem largar o telefone, dependendo do tópico que está sendo

utilizado”. Pode-se basear o estudo de caso em qualquer mescla de provas quantitativas e

qualitativas. Ademais, nem sempre os estudos de caso precisam incluir observações diretas e

detalhadas como fonte de provas (YIN, 2005).

Para Goode e Hatt (1979), identificar o estudo de caso como uma técnica particular de

obter dados é um modo de organizar os dados em termos de uma determinada unidade

escolhida, como a história de vida de um indivíduo, a história de um grupo, ou um processo

social determinado. Dentre as vantagens do método, de acordo com Gil (2009), em

comparação a outros delineamentos de pesquisa, pode se destacar a possibilidade de estudar

um caso em profundidade, considerando suas inúmeras dimensões e a ênfase no contexto em

que ocorrem os fenômenos, não sendo possível separar o contexto do fenômeno, e porque

nem sempre os limites estão claramente definidos. Favorecem a construções de hipóteses,

estimulam o desenvolvimento de outras pesquisas, permitem investigar o caso sob a

perspectiva dos grupos ou das organizações, podem ser aplicados sob diferentes enfoques

teóricos e metodológicos e são flexíveis. Embora as técnicas mais adotadas sejam a

observação, a entrevista e a análise documental, os estudos de caso podem valer-se do uso

concomitante de múltiplas técnicas, cuja aplicação pode dar-se de forma diferenciada ao

longo do desenvolvimento da pesquisa.

De acordo com as posições dos autores apresentados, o estudo de caso pode ser

entendido como uma metodologia ou como a escolha de um objeto definido pelo interesse em

casos individuais. O objetivo primordial é a investigação de um caso específico, muito bem

delimitado, contextualizado, em lugar e tempo, visando à busca circunstanciada de

informações.

Quando se considera a quantidade de estudos de caso, pode se classificar em estudos

de caso único ou estudos de casos múltiplos. O estudo de caso único refere-se a um indivíduo,

um grupo, um fenômeno, uma organização. Yin (2009) considera algumas situações que

justifiquem a escolha do estudo de caso único. A escolha da modalidade de estudo de caso

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único no presente estudo é justificada pelo estudo de caso típico ou representativo; o objetivo

é captar as circunstâncias e as condições de uma situação comum. Representa um grupo

típico, os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem no interior e

entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas e que firmaram termo de compromisso com

o ICMBio para realizar o trabalho de coleta desse produto nessa unidade de conservação. O

propósito do estudo de caso único, segundo Gil (2009), é explorar ou descrever um projeto,

uma técnica ou um fenômeno que em função de informação prévia, pareça ser a melhor

expressão do tipo ideal da categoria.

Conforme Gil (2008), em sua concepção clássica, a “unidade caso” refere-se a um

indivíduo em um contexto definido. Entretanto, ao longo do tempo, o conceito de “unidade

caso” ampliou-se de forma a incluir um grupo de objetos a serem estudados, seja o de uma

família, de um conjunto de relações, de uma comunidade, de uma nação ou de uma

organização. Assim, o objeto do estudo de caso desta pesquisa é o grupo de coletores

tradicionais de castanha-do-brasil que coletam na Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Contudo, devido ao grande contingente populacional da microrregião Alto Trombetas, ao

grande número de comunidades e às grandes distâncias que separam os aglomerados

populacionais nessa microrregião, e ainda, às dificuldades de obtenção de autorização junto

aos coordenadores das comunidades, optou-se por restringir a coleta de dados aos coletores

tradicionais de castanha-do-brasil que residem nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1 e na

comunidade Último Quilombo, e que firmaram Termo de Compromisso com o ICMBio para

a coleta desse produto Reserva Biológica do Rio Trombetas. Nestas condições, foram

Entrevistados 32 coletores tradicionais de castanha-do-brasil de um universo de 377 coletores

tradicionais de castanha-do-brasil que possuem cadastro no ICMBio, por meio do Termo de

Compromisso 119, de 20 de dezembro de 2011, firmado entre o ICMBio e a Arqmo para a

coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Grande parte dos tipos de pesquisa prevê a utilização de uma técnica básica para a

coleta de dados. Os estudos de caso, por sua vez, requerem a utilização de múltiplas técnicas

de coleta de dados. Isto garante o aprofundamento necessário ao estudo e a inserção do caso

em seu contexto, bem como confere maior credibilidade aos resultados. De acordo com Yin

(2009), a existência de dados obtidos mediante procedimentos diversos torna possível a

triangulação, que constitui um dos procedimentos mais indicados para obter a corroboração

do fato ou fenômeno (YIN, 2009).

A triangulação consiste em confrontar a informação obtida por uma fonte com outras,

com vistas a corroborar os resultados da pesquisa. A triangulação está na essência dos estudos

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de caso. Yin (2005) define este tipo de pesquisa como uma investigação que “baseia-se em

várias fontes de evidências, com os dados precisando convergir em um formato de triângulo”..

Quando numa pesquisa são obtidas informações de três diferentes fontes e pelo menos duas

delas mostram convergência, o pesquisador percebe que os resultados podem ser

corroborados (YIN, 2009).

No presente estudo utilizou-se a triangulação das fontes de dados (triangulação dos

dados), conforme Yin (2009), pois os dados foram coletados em diferentes fontes, tais como

entrevistas abertas semiestruturadas, documentos e observações diretas semiestruturadas.

As entrevistas abertas semiestruturadas – em profundidade – visam explorar mais as

razões em relação a certo tema. A realização de entrevistas em profundidade permite

perguntar aos respondentes-chave sobre os fatos de um assunto, assim como suas opiniões

sobre os eventos. Segundo Marconi e Lakatos (1991), a entrevista é um instrumento

importante para extrair informações de um indivíduo acerca de um determinado assunto ou

problema que tenha relação com o fato. Boni e Quaresma (2005) complementam que as

entrevistas denominadas semiestruturadas consistem na combinação de perguntas tanto

abertas quanto fechadas, sendo uma técnica amplamente utilizada em averiguações sociais e

que permite limitar a quantidade de informações que se pretende coletar.

O pesquisador deve conduzir a entrevista similar a uma conversa informal, deixando o

entrevistado falar livremente, sem esquecer, porém, apenas de não deixar o Entrevistado

desviar-se do tema. Optou-se por essa técnica por se compreender que seria a melhor

alternativa para entender a ótica dos povos tradicionais envolvidos, de como é viver na

Reserva Biológica do Rio Trombetas e de quais principais mudanças foram ocasionadas nesse

espaço a partir da criação dessa unidade e de quais desafios a serem enfrentados. É importante

destacar que todas as entrevistas foram gravadas e as falas utilizadas neste trabalho transcritas

na íntegra.

Quanto ao número de entrevistas necessárias em uma pesquisa, Fraser e Gondim

(2004) defendem que “o que importa não são quantos foram entrevistados, mas se os

entrevistados foram capazes de trazer conteúdos significativos para a compreensão do tema

em questão”. Para saber se o número de entrevistas realizadas já é suficiente, pode-se adotar o

conceito de “saturação teórica” (EISENHARDT, 1989). A saturação teórica ocorre quando o

aprendizado incremental obtido com as novas entrevistas for mínimo, ou seja, quando as

novas entrevistas não mais agregarem nada de novo na pesquisa, é hora de parar (VOSS,

TSIKRIKTSIS; FROHLICH, 2002).

O roteiro elaborado para a entrevista da pesquisa foi baseado na fundamentação

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teórica, de acordo com os objetivos propostos, visando coletar as percepções dos coletores

tradicionais de castanha-do-brasil que coletam esse produto na Reserva Biológica do Rio

Trombetas. Foi utilizado o mesmo roteiro para os entrevistados, a fim de obter diferentes

percepções sobre os pontos abordados. O roteiro utilizado para as entrevistas subdividiram-se

em questões conforme apresentado no Apêndice B.

Outro instrumento utilizado, a informação documental, é relevante para todos os

tópicos do estudo de caso. Este tipo de informação pode tomar várias formas e deve ser o

objeto de planos explícitos de coleta de dados. Para a coleta foram considerados documentos

tais como: atas de reuniões, termos de compromisso e relatórios referentes a construção,

avaliação e monitoramento dos termos de compromisso firmados para a coleta da castanha-

do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, entre outros. Para o estudo de caso, o uso

dos documentos serve para corroborar e aumentar a evidência de outras fontes, proporcionar

detalhes e poder fazer inferências a partir da análise destes documentos. Os registros em

arquivos também são relevantes no presente estudo.

Com relação aos dados quantitativos que constam nesta pesquisa, foi realizada

pesquisa documental nos arquivos da sede da Arqmo, a qual possui uma base de dados que é

resultado de uma pesquisa realizada nos anos de 2017 e 2018. A pesquisa faz parte do projeto

“Jovens Quilombolas de Oriximiná”, que conta com o apoio do Programa Novas Tecnologias

e Povos Tradicionais (Compartilhando Mundos), da Equipe de Conservação da Amazônia

(Ecam), que conta com o apoio financeiro da USAID. Tal programa possui como objetivo

identificar as características do modo de vida dos quilombolas e a visão que eles possuem de

seus territórios. Para tanto o programa promove capacitações dos povos tradicionais

(quilombolas e indígenas) para o uso das ferramentas tecnológicas Open Data Kit, o ODK, e

também a ferramenta Google Terra. Utilizando-se dessas ferramentas tecnológicas, os jovens

quilombolas realizaram entrevistas com os quilombolas do município de Oriximiná, com

aplicação de questionário contendo 82 perguntas aplicadas a 3306 indivíduos em 708

residências, nas 35 comunidades quilombolas do município de Oriximiná. As perguntas

abordaram temas como infraestrutura, residência, saúde, educação, cultura, religião,

associativismo e compreensão de reconhecimento estatal e documentação específica. A

ferramenta de coleta de dados Open Data Kit (ODK) permite que os dados sejam obtidos por

comunidades ou por Território Quilombola. Os dados sobre os quais nos ativemos foram os

dados dos quilombolas das comunidades nas quais realizamos as entrevistas.

Como o presente estudo foi realizado no ambiente natural do “caso”, houve a

oportunidade para observações diretas. Como os fenômenos de interesse não são puramente

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históricos, comportamentos relevantes e condições ambientais estavam disponíveis para

observação. Essas observações servem como outra fonte disponível de evidência no estudo de

caso. A observação neste caso foi participante, proporcionando algumas oportunidades

incomuns para a coleta de dados do estudo. A oportunidade mais importante está relacionada

com a capacidade de obter acesso aos eventos ou grupos que, de outro modo, seriam

inacessíveis ao caso. Outra oportunidade é a capacidade de captar a realidade do ponto de

vista de alguém “interno” ao estudo. Esta perspectiva é valiosa na produção de um “retrato”

preciso do fenômeno do estudo de caso.

Também foram produzidos mapas com o objetivo de especializar as diversas

territorialidades que há na microrregião Alto Trombetas. Os mapas foram feitos no QGIS, que

é um software livre com código fonte aberto, multiplataforma de informação geográfica (SIG)

que permite a visualização, edição e análise de dados georreferenciados. Nas confecções dos

mapas e edição dos dados geográficos foram utilizadas técnicas de geoprocessamento. As

fontes dos dados foram coletadas nos sites do DNIT, DNPM, MMA, Iterpa, Funai, CPI e

MME. Em todos os mapas foram utilizados dados do IBGE (2018): limite do estado,

localidades e limite do país. O DATUM utilizado na confecção dos mapas foi SIRGAS 2000,

base cartográfica do IBGE.

Quanto ao trabalho de campo, cabe destacar que se fez necessária a solicitação de uma

autorização do ICMBio para que a pesquisa fosse realizada. Tal procedimento referente às

Florestas Nacionais está previsto no Artigo 17, parágrafo 4º do SNUC (2000). Essa

solicitação foi feita por meio do Sistema de Autorização e Informação e Biodiversidade

(SISBIO). A autorização para o início da pesquisa foi concedida pelo ICMBio por meio da

Autorização de Pesquisa nº 62814-1 (ANEXO B), de 25 de junho de 2018, expedida por meio

do SISBio/ICMBio, uma vez que as comunidades a serem pesquisadas estão no interior da

Reserva Biológica do Rio Trombetas e da Floresta Nacional Saracá-Taquera, ou então, a

montante dessas unidades de conservação. Dessa forma, é necessário transitar por trechos da

Reserva Biológica do Rio Trombetas.

A pesquisa também respeitou todos os trâmites internos do INPA, passando pela

aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos do INPA (CEP-INPA) para

que a pesquisa de campo fosse autorizada. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo CEP-

INPA no dia 11 de maio de 2018, por meio do Certificado de Apresentação para

Apreciação Ética (CAAE) número 88961318.2.0000.0006 e do parecer consubstanciado do

CEP número 2.649.978 (ANEXO A). O CEP-INPA tem por objetivo proteger a integridade, a

dignidade e os conhecimentos dos indivíduos amostrais das pesquisas, visando tornar o estudo

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científico eticamente correto.

Também foi necessário obter autorizações (Apêndice C): da Associação das

Comunidades Remanescentes de Quilombos do Município de Oriximiná (Arqmo); da

Associação Mãe Domingas, a qual é detentora do título de propriedade do TQ Alto Trombetas

1; da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Alto Trombetas 2

(ACRQAT), que é a associação que representa as comunidades do TQ Alto Trombetas 2,

onde está localizada a comunidade Último Quilombo. Também foi necessário obter

autorização de sete coordenadores de comunidades onde residem os coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que firmaram termos de compromisso para a coleta desse produto na

Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Ressalta-se que todos os entrevistados participantes desta pesquisa assinaram o Termo

de Consentimento e Livre Esclarecido (TCLE) (Apêndice A), concordando com a realização

dela. Optou-se também por não os identificar nominalmente.

O trabalho de campo foi realizado em três fases, no período entre julho de 2018 a

fevereiro de 2019. A primeira viagem a campo foi realizada no período de 16 a 20 de julho de

2018, na qual foi realizada a pesquisa documental no NGI Trombetas/ICMBIO – Porto

Trombetas, com o objetivo de obter dados em documentos tais como: atas de reuniões, termos

de compromisso e relatórios referentes a construção, avaliação e monitoramento dos termos

de compromisso firmados para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio

Trombetas, entre outros. Além da pesquisa documental também se realizou uma entrevista

semiestruturada com a chefa da Reserva Biológica do Rio Trombetas, mas não houve

assinatura do TCLE, pois a gestora havia assumido a chefia da Reserva Biológica do Rio

Trombetas há menos de 30 dias do dia da entrevista. Além do mais, optou-se por entrevistar a

gestora da Reserva Biológica do Rio Trombetas apenas para se obter a visão da gestora, como

algo complementar ao que foi proposto, pois o objetivo do trabalho é dar ênfase na percepção

dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem no interior e no

entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas e que firmaram termo de compromisso com

o ICMBio para a coleta da castanha-do-brasil nessa unidade de conservação.

A segunda viagem a campo foi realizada no período de 09 a 17 de agosto de 2018.

Nesse período foram realizadas dezesseis entrevistas semiestruturadas gravadas: quinze com

coletores tradicionais de castanha-do-brasil; uma com regatão local; seis com coordenadores

de comunidades do TQ Alto Trombetas 1 (Mãe Domingas); uma com coordenador da

comunidade Último Quilombo (TQ Alto Trombetas 2); uma com o coordenador

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administrativo do TQ Alto Trombetas 1 (Mãe Domingas). Além das entrevistas também

foram realizadas as observações semiestruturadas, registradas em diário de campo.

A terceira viagem a campo ocorreu no período de 18 a 24 de fevereiro de 2019. Nesta,

foram realizadas 16 (dezesseis) entrevsitas semiestruturadas gravadas com coletores

tradicionais de castanha-do-brasil residentes na comunidade Último Quilombo, localizada no

interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Nessa etapa, além das entrevistas, foi

realizada observação in loco e acompanhou-se uma família de coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que se desloca para a Reserva Biológica do Rio Trombetas no período da

coleta da castanha. Além das entrevistas também foram realizadas as observações

semiestruturadas, registradas em diário de campo.

Diante disso, no total foram realizadas trinta e duas entrevistas: vinte e três com

coletores tradicionais de castanha-do-brasil; uma com regatão local; seis com coordenadores

de comunidades do TQ Alto Trombetas 1 (Mãe Domingas); uma com coordenador da

comunidade Último Quilombo (TQ Alto Trombetas 2); uma com o coordenador

administrativo do TQ Alto Trombetas 1 (Mãe Domingas). É importante ressaltar que todos os

entrevistados são coletores tradicionais de castanha-do-brasil que firmaram termos de

compromisso com o ICMBio para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do rio

Trombetas. Desse modo, tanto os coordenadores de territórios quilombolas quanto

coordenadores de comunidade e regatões, são cadastrados no ICMBio para a coleta da

castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Tabela 02 – Número de Entrevistados coletores tradicionais de castanha-do-brasil,

comunidade, sexo, idade, profissão e tempo de residência na comunidade.

ENTREVISTADO COMUNIDADE SEXO IDADE PROFISSAO

TEMPO DE

RESIDENCIA

NA

COMUNIDADE

01 Abuí F 49 Agricultora/Coletora Desde que

nasceu

02 Abuí M Não

informada Agricultor/Coletor Desde os 12 anos

03 Abuí F Agricultora/Coletora Desde que

nasceu

04 Paraná do Abuí F 48 Agricultora/Coletora Desde que

nasceu

05 Abuí F 47 Funcionária Pública/

Agricultora/Coletora

Desde que

nasceu

06 Abuí M 69 Agricultor/Coletor

Aposentado Desde 1959

07 Abuí M Agricultor/Coletor

08 Abuí M 47

Funcionário Público/

Agricultor/Coletor/

Coordenador de

Desde que

nasceu

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Comunidade

09 Paraná do Abuí M Há 28 anos

10 Paraná do Abuí M 33

Agricultor/Coletor/

Coordenador de

Comunidade

Desde que

nasceu

11 Abuí M

Agricultor/Coletor/

Coordenador de

Território Quilombola

Desde que

nasceu

ENTREVISTADO COMUNIDADE SEXO IDADE PROFISSAO

TEMPO DE

RESIDENCIA

NA

COMUNIDADE

12 Sagrado Coração

de Jesus M 48

Agricultor/Coletor/

Coordenador de

Comunidade

Desde que

nasceu

13 Sagrado Coração

de Jesus M 53 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

14 Sagrado Coração

de Jesus M 46 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

15 Mãe Cué M Não

informada Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

16 Último

Quilombo M 46

Agricultor/Coletor/

Coordenador de

Comunidade

Desde que

nasceu

17 Último

Quilombo F 59

Agricultora/Coletora/

Aposentada

Desde que

nasceu

18 Último

Quilombo M 34 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

19 Último

Quilombo M 34 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

20 Último

Quilombo M 26 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

21 Último

Quilombo F Não

informada

Agricultora/Coletora/

Aposentada

Desde que

nasceu

22 Último

Quilombo F Não

informada

Agricultora/Coletora/

Aposentada

Desde que

nasceu

23 Último

Quilombo M 30 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

24 Último

Quilombo M 79

Agricultor/Coletor/

Aposentado

Desde que

nasceu

25 Último

Quilombo F 38

Agricultora/Coletora/

Servidora pública

Desde que

nasceu

26 Último

Quilombo F 30

Agricultora/Coletora/

Servidora pública

Desde que

nasceu

27 Último

Quilombo F Não

informada

Agricultora/Coletora/

Aposentada Há 23 anos

28 Último

Quilombo M 59 Agricultor/Coletor

Nasceu na

comunidade

29 Último

Quilombo F Não

informada Agricultora/Coletora

Desde que

nasceu

30 Último

Quilombo M Não

informada Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

31 Último

Quilombo M 63 Agricultor/Coletor

Desde que

nasceu

32 Último

Quilombo M Não

informada

Agricultor/Coletor/

Aposentado

Desde que

nasceu

Fonte: Dados da Pesquisa de Campo, 2018/2019. Elaborado pelo autor.

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84

Como dito anteriormente, são 930 coletores tradicionais de castanha-do-brasil

cadastrados pelo ICMBio, por meio dos Termos de Compromisso 119, 120, 121, para coletar

castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, sendo que destes, 663 são

associados a Arqmo, 167 são associados a Aetmo e 100 são associados a Amocreq-CPT. Do

total de coletores tradicionais de castanha-do-brasil, 684 são do sexo masculino e 246 do sexo

feminino. Assim, devido ao grande contingente populacional da microrregião Alto Trombetas,

ao grande número de comunidades e às grandes distâncias que separam os aglomerados

populacionais nessa microrregião, e ainda, às dificuldades de obtenção de autorização junto

aos coordenadores das comunidades, foi necessário definir alguns critérios para selecionar os

entrevistados. São eles:

1) Utilização dos recursos naturais da unidade por meio de termo de

compromisso: esse critério teve por objetivo entrevistar aquele indivíduo cadastrados no

ICMBio por meio do Termo de Compromisso 119, de 20 de dezembro de 2011, firmado entre

o ICMBio e a Arqmo para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio

Trombetas.

2) Lideranças comunitárias: em razão de apresentarem-se como importantes

sujeitos sociais dentro das comunidades e de estarem a frente como interlocutores das

populações que possuem relação com a Reserva Biológica do Rio Trombetas.

3) Acesso até a comunidade: Em se tratando de logística na Região Amazônica, esse

critério é muito importante, pois algumas comunidades demandam risco e alto custo

(JOHN, 2018). Nesse sentido, devido às grandes distâncias que separam os aglomerados

populacionais localizados no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas, e

ainda, às dificuldades de obtenção de autorização junto aos coordenadores das comunidades,

optou-se por restringir a coleta dos dados aos coletores tradicionais de castanha-do-brasil que

residem nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1 (entorno da Reserva Biológica do Rio

Trombetas) e na comunidade Último Quilombo (interior da Reserva Biológica do Rio

Trombetas).

As entrevistas obedeceram a um roteiro para servir de orientação sobre o tema da

pesquisa. Conforme o decorrer da entrevista, esse roteiro foi mudando, uma vez que outras

questões relevantes foram surgindo.

Ao longo do trabalho de campo, foi possível participar de espaços que foram ricos na

observação da dinâmica de vida das populações locais, entre eles o XII Encontro da

Consciência Negra, realizado no Território Quilombola Alto Trombetas II, comunidade do

Moura, no período de 18 a 21 de novembro de 2018. O evento contou com a participação da

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85

chefe da Reserva Biológica do Rio Trombetas e representantes de diversas instituições

governamentais e não-governamentais envolvidas nas discussões de titulação de territórios

quilombolas que estão sobrepostos à Floresta Nacional Saracá-Taquera e à Reserva Biológica

do Rio Trombetas. Observaram-se as falas e as discussões entre os diversos sujeitos sociais

envolvidos nos conflitos territoriais na microrregião Alto Trombetas, assim como as

apresentações culturais realizadas pelos quilombolas durante as noites do evento. Também

participamos do Círio da Comunidade Último Quilombo no dia 17 de novembro de 2018,

umas das representações culturais mais importantes no calendário cultural dos quilombolas

coletores tradicionais de castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Vale mencionar que, inicialmente, houve desconfiança por parte de alguns

quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil, devido ao fato de estarem sendo

assediados por empresas madeireiras para a exploração dos recursos florestais que existem

nas suas terras já tituladas. Por esse motivo, durante algumas entrevistas, foi possível perceber

que os entrevistados não se sentiam completamente à vontade, talvez pelo fato de fazerem

ligação do pesquisador com o órgão gestor da Reserva Biológica do Rio Trombetas, já que há

conflitos de territorialidades entre o ICMBio e os quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que coletam esse produto na Reserva Biológica do Rio Trombetas. Mas, é

importante ressaltar que no período de estadia nas comunidades, a recepção foi bastante

cordial, permitindo conhecer de perto a rotina das famílias.

Mas não foi somente a desconfiança uma das dificuldades encontradas durante a

pesquisa de campo, outros fatores também foram constatados, como: a Logística: Para chegar

à maioria das comunidades, o deslocamento é por via fluvial, através de barco, canoa, lancha

ou voadeira. Nesse sentido, o acesso foi dificultado pela necessidade de fretamento de

embarcação, contratação de um barqueiro, o que elevava o custo. Outro entrave em relação à

logística foi o tempo gasto para chegar até os locais pretendidos. O tempo em média feito na

viagem até a comunidade mais distante visitada foi de doze horas.

4.3 TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS

O tratamento dos dados, para posterior análise, foi realizado por meio da técnica de

análise de conteúdo que compreende um conjunto de técnicas de análise de comunicação, que

utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens

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(BARDIN, 2011). Essa técnica visa constatar o que está sendo dito a respeito de determinado

tema, admitindo tanto abordagens qualitativas quanto quantitativas ou, ainda, ambas.

A análise de conteúdo foi realizada em três etapas: (a) pré-análise do material coletado

nas entrevistas, na observação e na pesquisa documental; (b) análise e exploração do material

propriamente dito; e, (c) tratamento dos resultados para constituição da análise reflexiva.

(BARDIN, 2011).

Na pré-análise, a pesquisa na literatura, as notas de campo, os dados primários e

secundários foram organizados para facilitar a análise. Desse modo, realizou-se um

desmembramento do texto em unidades, a partir dos diferentes núcleos de sentido, e, em

seguida, o reagrupamento dessas unidades em categorias. As categorias são classes que

agrupam elementos, em razão de seus caracteres comuns. Normalmente, segundo Bardin

(2011), envolve a leitura “flutuante”, ou seja, um primeiro contato com os documentos que

serão submetidos à análise, a escolha deles, a formulação das hipóteses e objetivos, a

elaboração dos indicadores que orientarão a interpretação e a preparação formal do material.

Inicia-se o trabalho escolhendo os documentos a serem analisados.

Após a transcrição dos dados, inicia-se a leitura flutuante. Em seguida, passa-se a

escolha de índices ou categorias, que surgirão das questões norteadoras ou das hipóteses, e a

organização destes em indicadores ou temas. Os temas que se repetem com muita frequência

são recortados “do texto em unidades comparáveis de categorização para análise temática e de

modalidades de codificação para o registro dos dados” (BARDIN, 2011, p.100).

Na segunda etapa foi realizada a análise e exploração do material propriamente dito.

Foi realizada sobre os dados coletados nas entrevistas, na pesquisa documental, na observação

direta. Nesta etapa ocorreu a categorização, que permite reunir maior número de informações

à custa de uma esquematização e assim correlacionar classes de acontecimentos para ordená-

los. Com a unidade de codificação escolhida, fez-se a classificação em blocos que expressem

determinadas categorias (no exemplo dado, foram retiradas das entrevistas apenas as falas que

se referiam às atividades produtivas primárias – agricultura), que confirmam ou modificam

aquelas nos referenciais teóricos inicialmente propostos. A organização do material ou dados

da pesquisa se realiza em colunas, como o exemplo do Entrevistado 16 (QUADRO 08).

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Quadro 08 – Organização do material ou dados da pesquisa

Semelhanças Verbalizações do Entrevistado 16

Agricultura

“Tem pessoas que produz banana, macaxeira, farinha. Olha, houve mudança porque o salário

subiu. Olha, tu faz uma roça, primeiro ano deu, outro ano ela apodrece. Aí, a pessoa faz a

banana, só que nem todos tem banana hoje, e nem todos tem roça hoje. O que acontece... os

que têm roça, mas é pouca. Acredito, assim: quando o Ibama, ele limita pra gente. Podia

fazer só uma quadra de roça, aí hoje você só pode fazer se tiver a capoeira. Quem não tem

capoeira, tá difícil fazer um roçado. Aí, esse ano poucas pessoas fizeram, porque a gestora

mudou, e ela tive que buscar com o chefe dela. Segundo ela para poder liberar... E quando a

liberação chegou, foi novembro. E novembro já começou a chover e aqui nós não sabemos

trabalhar naquela roça sem queimar. Aqui a gente trabalha com a roça queimada. Aqui a roça

começa em julho por causa da chuva”.

Extrativismo

Como temos açaí, pensamos um dia sermos produtores de açaí. Pensamos em beneficiar

castanha, sermos... vender castanha já beneficiada. Então, temos vários sonhos aí que estão

rondando nossas mentes, nossas ideias aí. Sim, nós temos cipó, por exemplo, que faz a

confecção de tapete, né. De cestas. Vários itens, que são feitos através da matéria prima do

cipó. E nós pensamos sim em exportar essas coisas feitas na comunidade. E temos também

aí a questão do extrativismo da castanha, é o nosso ponto forte aqui. Pensamos em beneficiar

como já falei, vender ela também em casca, mas de uma forma lavada, ensacolada e tudo

mais, bem higienizada. Temos também copaíba, pensamos também abrir um mercado bom

pra venda de copaíba. E aí vai, tem outros, tem breu. Tem uma série de coisas na floresta que

estão aí prontos pra nos ajudar na sobrevivência e no nosso desenvolvimento como ser

humano.

Fonte: Elaborado pelo autor. Adaptado de Hoffman-Câmara (2007).

A seguir, agruparam-se os temas nas categorias definidas, em quadros matriciais, pelos

pressupostos utilizados por Bardin (2011). Tendo sido elaboradas as categorias sínteses,

passa-se à construção da definição de cada categoria. A definição pode obedecer o conceito

definido no referencial teórico ou ser fundamentada nas verbalizações relativas aos temas,

ambos, título e definição, devem ser registrados nos quadros matriciais. Ainda de acordo com

Bardin (2011), as categorias podem ser criadas a priori ou a posteriori, isto é, a partir apenas

da teoria ou após a coleta de dados. No exemplo dado, o título e a definição da categoria,

foram estabelecidos tomando-se por base as falas dos Entrevistados, seguindo sugestão de

Mendes (2007, p.46) que propõe que “o nome e a definição devem ser sempre criados com

base nos conteúdos verbalizados e com um certo refinamento gramatical de forma. Às vezes,

o nome da categoria é uma fala do sujeito”. Em todo o processo de construção de categorias,

procurou-se preservar na íntegra a fala do Entrevistado (QUADRO 09).

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Quadro 09 – Quadro matricial da categoria “Atividades Produtivas Primárias – Agricultura e

extrativismo”

Categoria: Atividades produtivas primárias

Definição: As atividades produtivas são agricultura e extrativismo de produtos florestais não-madeireiros, caça,

pesca, estas duas últimas apenas para o sustento. Os roçados são feitos nas comunidades (Abuí, Território

Quilombola Mãe Domingas. Na roça planta-se banana, macaxeira para fazer farinha, mandioca para fazer

farinha e beijus, maxixe, abacaxi, cana-de-açúcar, cupuaçu, melancia, laranjeiras, coqueiros. Os produtos

cultivados são para o consumo. No mês de agosto cultiva-se mandioca para fazer a farinha. Os servidores

públicos municipais também cultivam a roça e fazem farinha, sendo que geralmente pagam outras pessoas para

fazerem suas funções no local de trabalho. As comunidades têm perfis parecidos, sendo que todas vivem da

agricultura e do extrativismo. Algumas pessoas produzem farinha para vender na cidade e na própria

comunidade. Tanto na Floresta Nacional Saracá-Taquera quanto na Reserva Biológica do Rio Trombetas, há

regras acordadas entre o ICMBio e as comunidades para fazem os roçados apenas nas capoeiras. A terra não é

propícia para o cultivo da mandioca, sendo que no primeiro ano a roça produz, mas no segundo ano a

macaxeira apodrece. Produzem em pequenas quantidades, tanto a produção das roças quanto a produção do

extrativismo. Os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil também cultivam macaxeira, banana,

abacaxi próximo das casas. Apenas alguns possuem casa de farinha, mas não existe casa de farinha

comunitária. Não existe casa comunitária de farinha mas as outras famílias tipo se precisar pode usar a casa de

farinha vai lá agente conversa com o dono ele libera a gente faz, e dar um pouco pra ele, como recompensa. As

roças são pequenas. Há pessoas que trabalham na MRN, mas que possuem roças. O trabalho de coleta de

castanha é uma das principais atividades produtivas desenvolvidas pelos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que coletam na reserva Biológica do Rio Trombetas. Mas também se coletam outros

produtos florestais não-madeireiros, como açaí, andiroba, copaíba, palha. Contudo, esses produtos somente

podem ser coletados para o consumo, sendo proibida a sua comercialização.

Temas Unidades de Contexto

Agricultura

E1: "São assim esses trabalhos, agricultura”.

E2: Roçado é aqui na comunidade (Abuí, Território Quilombola Mãe Domingas)".

E3: "Nós faz a roça, faz a farinha, planta banana, macaxeira. Só pro consumo próprio, é.

Somente pra isso”.

E4:” Uma época dessa (mês de agosto) é mandioca, farinha [...]”

E5: "negócio de roça" "Pra mim é todos dois juntos (risos) [...] porque as vez quando eu tenho

que ir pra roça eu tenho que pedir pra alguém ficar no meu lugar pra mim poder trabalhar né?

Às vezes plantar, ou fazer a farinha. Aí mas lá na escola tem que ter um”

E6: “Olha, é a farinha... eu faço roçado”.

E8: “Cara, ela não foge quase nada dos outros. Nós aqui, posso até dizer assim, nós, que a

maioria da comunidade, eles vivem da questão da agricultura”.

E9: “Agricultura o ano todo”.

E9: A gente trabalha com cultura, com negócio de roça, mas é mais pra consumo. Assim, no

período logo que a gente chega é mais difícil. Só que eu vim pra cá com a minha tia que, como

dizer, que agora eu considero como mãe. E aí nesse período eu não ainda não tinha essa parte

do consumo”.

E11: [Roças] “Trabalhar, trabalhar, aqui tem umas capoeiras por aí, a gente vai... [...] Aqui

mais próximo tem uma comunidade que eles já façam assim roçado pra comercializar, mas

assim, comercializar não. Eles vendem uma farinha, eles vendem até aqui pra nós. E, às vezes,

eles levam pra cidade alguns sacozinhos. É, ali no Mãe-Cué, onde vocês vão, eles já façam

uma farinha pra..., assim, não é comercializar, é pra desenrascar algumas pessoas (Não há

proibição na Flona, se a pessoa quiser fazer, ela faz). Tem o limite de tipo de roçado, dá pra

fazer, não tem... (eles permitem) aquilo que é tradicional”.

E12: “É roçado [...] O principal mesmo é a castanha e o roçado [...]”

E13: “Aqui a gente veve de mandioca [...] É roçado...”.

E14: “Mais agricultura né. É mais distante (as áreas de roçado) um pouco”.

E15: “[...] não somos acostumados em fazer roçado grande como eu falei aqui anteriormente, e

coletar grandes produtos e levar pra vender na feirinha”.

E16: Tem pessoas que produz banana, macaxeira, farinha [...] Olha, tu faz uma roça, primeiro

ano deu, outro ano ela apodrece. Aí, a pessoa faz a banana, só que nem todos tem banana hoje,

e nem todos tem roça hoje. O que acontece... os que tem roça, mas é pouca. [...] Quando a

gente planta na roça, a gente planta maxixe, banana macaxeira mandioca mesmo tudo isso, a

gente planta também aqui perto da casa se for ver tem a macaxeira tem um banana mas não é

roca, só alguns tem casa de farinha não existe casa comunitária de farinha mas as outras

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famílias tipo se precisar pode usar a casa de farinha vai lá agente conversa com o dono ele

libera a gente faz, e dar um pouco pra ele, como recompensa. [...] Sobre a agricultura só a

castanha e a farinha que pode ser comercializado.

E17: “A gente também mexe com roças. Muitos dos moradores aqui tem seu bananal, tem sua

mandioca. Outro mexe seu roçado só com a banana e assim a gente também, eu também tenho

até fica aqui no canto dessa cabeceira, aqui que ele sabe. Então, eu tô mexendo hoje em dia, já

mexi e vou continuar agora se Deus quiser a partir de dezembro como eu tô lhe falando se eu

tiver aqui, né? Mas agente mexe com roça, com mandioca, abacaxi também. É cana, outro tipo

de plantação, cupu. Tudo isso a gente planta aqui também no nosso trabalho”.

E18: “Sobre a questão de roça a gente planta aqui é a maniva pra fazer a farinha mesmo né?

Farinha, banana, macaxeira”.

E20: “Só mesmo um beiju, farinha de macaxeira... [...] mandioca, macaxeira, melancia,

abacaxi, banana”.

E25: “A gente tem uma rocinha no nosso terreno. A gente planta mandioca, macaxeira,

abacaxi, laranjeira, coqueiro, coco tem lá [...] Nascemos e se criamo trabalhando em roça [...]

Olha, no Moura ainda tem bastante gente que trabalha em agricultura ainda. Tenho um

sobrinho que ele trabalha na empresa, mas quando é na época do verão, de botar roçado, ele

não pode, mas ele paga pra fazer. Quando é no tempo da planta..”..

Extrativismo

E1: “Negócio da castanha que nós colhe, é isso [...] quando chegar o tempo da castanha, a

gente tem que tirar castanha”.

E2: “Tirar castanha”.

E4: Coleta da castanha (No período da coleta).

E5: Eu fui [pra coleta da castanha] [...] eu gosto de trabalhar com castanha.

E6: “Na época da castanha”.

E8: “[...] do extrativismo que tá ligado a castanha, a castanha..”

E9: “Exatamente, a castanha... só que a castanha é assim, ano em ano, né”.

E10: “Cara, aqui como se diz, a principal mesmo são na época é a castanha”.

E12: “O nosso recurso mais mesmo é a castanha [...] Aqui não tem outra coisa pra dizer, não,

eu vou fazer isso aqui que... Só a castanha. Aí a gente tem um tempo determinado pra tirar,

ainda tudo isso tem”.

E14: “Olha, aqui o nosso trabalho é mais a agricultura mesmo”.

E16: “Então o nosso forte aqui é a castanha mesmo, né, a castanha”.

E17: “A nossa renda, o tempo da castanha, a gente tira a renda da castanha”.

E19: “No ano passado [2018] deu muita castanha [...] A renda aqui varia aqui para falar a

verdade aqui trabalho com agricultura é pouco é mais sustento mesmo. Alguns trabalham

empregados também em trombetas, aí tem as outras coisas também tem um açaí. Agora vende

açaí em Trombetas, em Oriximiná”.

E23: “Às vezes a gente vende uma banana, quando não agente vende um peixe, falar a verdade

logo. E assim a gente vai vivendo, a gente não tem um ganho, assim, um benefício. Se a gente

tivesse um projeto pro cumaru, açaí...”.

Fonte: Elaborado pelo autor. Adaptado de Hoffman-Câmara (2007).

Na terceira etapa foi realizado o tratamento dos resultados, a descrição analítica. O

tratamento e a sistematização dos dados coletados na pesquisa de campo estão expostos no

corpo do texto desta dissertação em forma de gráficos, quadros, figuras, mapas e citação.

Nesta última identificamos os autores como Entrevistado 01, 02, 03 e assim por diante, pois

como é uma área de conflitos territoriais, os Entrevistados não autorizaram que seus nomes

fossem divulgados.

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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 FORMAÇÃO E ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DA MICRORREGIÃO ALTO

TROMBETAS: DOS QUILOMBOS A CRIAÇÃO DE TERRITÓRIOS

QUILOMBOLAS

Neste capítulo fez-se uma abordagem do processo de formação e organização

socioespacial da microrregião Alto Trombetas, enfocando o contexto histórico de formação

dessa microrregião e identificando os sujeitos e ações que impulsionaram as territorialidades e

a formação territorial dessa microrregião. Nesse sentido, identificou-se as transformações

socioespaciais ocorridas no processo histórico de formação da microrregião Alto Trombetas e

suas influências na formação do modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil.

Segundo Ferreira e Costa (2015, p. 27) a formação socioespacial produz

especificidades que não estão separadas de um contexto maior. Desse modo, as

especificidades da formação socioespacial da microrregião Alto Trombetas, assim como as

especificidades do modo de vida dos quilombolas que nela residem, fazem parte do processo

espaço temporal mais amplo, sendo resultados de suas relações e interações com esse

contexto histórico-social mais amplo. Desse modo, é necessário compreender os fatores

internos e externos que influenciaram em suas territorialidades, assim como as escalas das

ações e processos.

No período Pré-Cabralino passado, a área atualmente ocupada pelos quilombolas no

vale do rio Trombetas, conforme Wanderley (2008), fora ocupada por povos indígenas que se

organizavam em inúmeros povoamentos situados, frequentemente, às margens de rios, lagos e

igarapés, deixando as principais marcas da sua cultura no modo de vida dos povos que os

sucederam, principalmente, no que se refere na utilização das redes fluviais com a finalidade

de locomoção e de aquisição de alimentos. Segundo Wanderley (2008), esse padrão de

povoamento também foi internalizado no processo de colonização portuguesa, o qual

descreve que:

O processo de ocupação dos terrenos de várzea e de terra firme às margens dos rios

pode ser considerado o primeiro padrão de povoamento da Amazônia. Tendo esse se

intensificado no período de colonização portuguesa, sobretudo no rio Amazonas. Tal

predomínio condizia com a possibilidade de navegar por dentre rios, lagos e

igarapés, e com a dificuldade de adentrar no interior da floresta tropical densa. Os

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rios representavam a única rede de ligação e circulação existente no território

amazônico que permitia conectá-la a outras regiões e ao mundo (WANDERLEY,

2008, p. 2).

Os povoamentos indígenas do vale do rio Trombetas foram identificados, em 1727,

por meio de inspeções realizadas nessa região por enviados da Coroa Portuguesa e religiosos

da Igreja Católica. O objetivo da Coroa Portuguesa e da Igreja Católica era reduzir os povos

indígenas dessa região a aldeamentos e/ou escraviza-los, o que estava relacionado à

necessidade de ocupação dessa região pelos colonizadores europeus, para efetivar a posse da

terra e a exploração dos recursos naturais, principalmente, as denominadas drogas do sertão.

Pressionados pela ocupação e perseguição dos colonizadores europeus, os povos indígenas do

baixo vale do rio Amazonas se reterritorializaram nas regiões mais afastadas, nas terras firmes

e protegidas dos rios tributários do rio Trombetas. Atualmente, os povos indígenas da bacia

do rio Trombetas estão localizados a montante do TQ Cachoeira Porteira, que é a fronteira de

ocupação entre os povos indígenas e os povos quilombolas do vale do rio Trombetas

(WANDERLEY, 2008).

O vale do rio Trombetas não foi um espaço geográfico vazio, nem de relações

socioeconômicas e nem de conflitos. Sempre se configurou como um espaço de relações

socioeconômicas históricas entre sociedades e destas com a natureza, resultando na

construção de modos de vida e territórios singulares pelos diversos sujeitos sociais –

quilombolas, regatões, patrões, donos de usinas de beneficiamento de castanha, Estado

(IBDF, Ibama, ICMBio, município, Iterpa) MRN, ONGs, madeireiras – que, de alguma

forma, se apropriaram dos recursos desse território (CASTRO; ACEVEDO, 1998; FARIAS

JÚNIOR, 2016; SCARAMUZZI, 2016).

Contudo, nestas relações, quase sempre conflituosas, cada um mantém distintas

relações com a natureza. Para os quilombolas, assim como para os povos indígenas, o

território é tanto proteção (cachoeiras, rios, florestas, após a fuga da condição de escravos) –

quanto recurso para a manutenção de seus modos de vida, por isso lutam para permanecer e

usufruírem de seus territórios. A MRN, as madeireiras, os donos de usinas de beneficiamento

de castanha, por sua vez, veem esses mesmos territórios como recurso para suas produções,

diferente do ICMBio, que o vê como detentor de ecossistemas a serem preservados, o que

inviabiliza seus usos pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

(CASTRO; ACEVEDO, 1998; FARIAS JÚNIOR, 2016; SCARAMUZZI, 2016).

Essa relação sociedade-natureza é tão importante para a compreensão da realidade que

Castro e Acevedo (1998), Farias Júnior (2016) e Scaramuzzi (2016) periodizam o processo

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histórico de territorialização dos quilombolas no vale do rio Trombetas em função dos

diferentes tipos de apropriação e uso dos castanhais pelos diversos sujeitos envolvidos nessas

relações: o domínio da coleta “livre”, realizada nos denominados castanhais “livres”, que

compreende desde o início da coleta da castanha-do-brasil para fins comerciais na

microrregião Alto Trombetas, em meados do século XIX até o surgimento dos denominados

“patrões” ou “donos dos castanhais” no final do século XIX; o domínio dos “donos dos

castanhais” ou “patrões”, que vai do final da última década do século XIX até a década de

1970, com a implantação de grandes projetos econômicos e ambientais no vale do rio

Trombetas; o domínio das “intrusões” que vai do final da década de 1970, com a implantação

da empresa mineradora de bauxita Mineração Rio do Norte (MRN), atrelada a implantação de

políticas ambientais restritivas ao povo tradicional do vale do rio Trombetas, por meio da

criação de unidades de conservação – a Reserva Biológica do Rio Trombetas e a Floresta

Nacional Saracá-Taquera – sobrepostas a territórios de uso comum e coletivo de quilombolas

que ali residem desde meados do início do século XIX (QUADRO 10 e FIGURA 03).

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Quadro 10 - Cronologia da ocupação da microrregião Alto Trombetas, com destaque para a

fundação oficial das comunidades a partir da década de 1970. Domínios Períodos Evento

Dos povos

Pré-Cabralino

Período Pré-

Cabralino Povos indígenas

O domínio da

coleta “livre” Século XIX

Formação dos mocambos no Alto Trombetas, seguida da dispersão dos

negros pelas áreas mais baixas do rio (descenso) no final do século XIX,

após a abolição da escravidão no Brasil.

O domínio

dos patrões

Início do

século XX

Formação da comunidade de Mãe Cué pelos negros que vinham das

áreas mais altas do rio.

Meados de 1960 Início das pesquisas minerárias na microrregião Ato Trombetas.

Meados de 1970

Fundação oficial da comunidade da Tapagem. Deslocamento

compulsório dos habitantes de Mãe Cué, da margem direita para a

margem esquerda do rio Trombetas, em função da implantação da

mineradora do grupo Ludwig/Jari.

1976 Implantação da MRN; Construção do núcleo Urbano de Porto

Trombetas (MRN, 2017).

O domínio

das intrusões

1979

Saída dos patrões da microrregião Alto Trombetas; Criação da Reserva

Biológica do Rio Trombetas, atingindo territórios quilombolas

tradicionalmente ocupados, principalmente, os grupos familiares dos

lagos Erepecu e Jacaré, atingindo áreas ocupadas atualmente pelas

comunidades: Jamari, Juquiri, Juquirizinho, Último Quilombo e Nova

Esperança. Expulsão dos moradores da comunidade Mãe Cué de volta

para a margem direita do rio Trombetas, de onde haviam saído.

1980 Formação da comunidade do Abuí

1985

Instalação de postos de fiscalização do Instituto Brasileiro de

Desenvolvimento Florestal na entrada do território Alto Trombetas,

limitando o acesso ao lago do Erepecu e restringindo acesso ao lago

Jacaré.

1986 Fundação da comunidade Paraná do Abuí.

1981 Venda da concessão de lavra do grupo Ludwig/Jari para a Alcoa.

1985 Fundação oficial da comunidade Sagrado Coração de Jesus.

1989

Criação da Floresta Nacional Saracá-Taquera, atingindo áreas ocupadas

atualmente pelas comunidades: Moura, Palhal, Curuça-Mirim, Mãe Cué,

Tapagem, Sagrado Coração de Jesus.

1985 Instalação de postos de fiscalização do Instituto Brasileiro de

Desenvolvimento Florestal na entrada do território Alto Trombetas.

1989 Criação da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo

de Oriximiná.

Década de

1980/1990

Formalização da comunidade Mãe Cué com apoio da Igreja Católica e

da Arqmo.

1991 Retirada da Alcoa da área.

1993 Fundação da comunidade Último Quilombo na localidade Recreio com

posterior transferência para a localidade Santa Maria.

2003 Titulação de parte do TQ Alto Trombetas 1 pelo Iterpa. Início do projeto

de preservação dos quelônios com o ICMBio.

2004

Abertura do processo nº 54100.002185/2004-20, visando à regularização

fundiária do território Jamary-Último Quilombo junto ao Incra.

Abertura do processo nº 54100.002189/2004-16 junto ao Incra para

regularização fundiária do TQ Alto Trombetas 1.

2012 Retificação do título do território Alto Trombetas pelo Iterpa.

2014 Finalização do Relatório Antropológico que integra o RTID ensejado

pelo processo nº 54100.002185/2004-20.

2014 Abertura do processo nº 54501.001765/2014-59 solicitando a

demarcação e a titulação do TQ Alto Trombetas II

14/10/2015 Fundação da comunidade Santo Antônio do Abuizinho.

2017 Publicação de edital referente ao RTID do TQ Alto Trombetas II no

Diário Oficial da União.

14/02/2017 Publicação do RTID do TQ Alto Trombetas I no Diário Oficial.

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94

Fonte: FUNES (1995); CASTRO; ACEVEDO (1998); FARIAS JÚNIOR (2016); SCARAMUZZI (2016);

CUMBUCA NORTE (2017).

Cabe ressaltar, no entanto, que antes da organização social e política em comunidades,

os quilombolas já residiam no vale do rio Trombetas, em localidades que, geralmente, eram

denominadas de acordo com os atributos naturais como rios, lagos, paranás.

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1750 1760 1770 1780 1790 1800 1810 1820 1830 1840 1850 1860 1870 1880 1890 1900 1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010

Domínio dos Povos indígenas

Drogas do sertão e as fazendas de cacau

Quilombolas e os Domínio dos "Castanhais livres"

Domínio da Patronagem

Domínio das "intrusões"

Regatão

Comércio de diversos produtos

Comércio somen-te da castanha

Proibição da cole-ta da castanha

Criaçãoda RBRT

Início das apropriaçõesdos castanhais pelos patrões

Saída dos patrões da mi-crorregião Alto Trombetas

Formação de quilombos

Os coletores tradicionais de castanha foraminseridos nas relações de patronagem

Fugas das fazendas de cacau,e de criação de gado

Coleta, caça, pesca, peque-na agricultura tabaco, cacau

Chegada dos empreen-dimentos de mineração

da bauxita Criaçãoda FNST

Criação da ARQMO

TQ Boa Vista

TQ AltoTrombetas 1

Os patrões proibiram os coletores tradicio-nais de castanha de vender para o regatão

Expulsão de famílias de territórios da RBRT

Figura 03 – Linha histórica dos domínios territoriais na microrregião Alto Trombetas. As setas representam as trajetórias de sujeitos sociais

que, de alguma forma, se apropriaram dos recursos naturais dos territórios quilombolas da microrregião Alto Trombetas. As espessuras das

setas representam o grau de domínio exercido pelos diversos sujeitos sobre o território na microrregião Alto Trombetas. Fonte: CASTRO;

ACEVEDO, 1998; FARIAS JÚNIOR, 2016; SCARAMUZZI, 2016; FUNES, 1995; CUMBUCA NORTE, 2017).

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5.1.1 Os domínios dos quilombos e os “castanhais livres” na Microrregião Alto

Trombetas

No vale do rio Trombetas, os quilombolas são oriundos de grupos negros que

resistiram, por meio das fugas, ao trabalho escravo das grandes fazendas de cultivo de cacau e

de criação de gado instaladas, a partir de meados de 1780, na região de Santarém e de Óbidos.

Nesse período a região do baixo Amazonas obteve crescimento econômico e se tornou uma

das mais importantes no cenário regional. No entanto, essas grandes propriedades foram

enfraquecidas por crises, estagnação ou fenômenos ambientais, o que contribuiu para as

condições de fuga dos negros escravizados (CASTRO; ACEVEDO, 1991, p. 10). Após a

fuga, os negros, inicialmente, se instalaram nas cabeceiras do rio Curuá, afluente da margem

esquerda do Amazonas, formando os “mocambos” do Inferno e Cipóteua, os quais, segundo

Barbosa Rodrigues (1875 apud Farias Júnior, 2016), foram destroçados por uma expedição

punitiva em 1812. Com a destruição dos quilombos no rio Curuá, os mocambistas se

deslocaram para os rios Trombetas e Erepecuru onde constituíram novos mocambos

(CASTRO; ACEVEDO, 1998; FUNES, 1995; RODRIGUES, 1875, p. 25 apud FARIAS

JÚNIOR, 2016). Segundo Rodrigues (1875), o “mocambo” formado no rio Trombetas foi

destruído por nova expedição em 1822 ou 1823.

A destruição dos quilombos pelas elites escravocratas locais, apoiadas pelo governo

brasileiro, era uma maneira de combater os quilombos, uma vez que a formação de um

determinado quilombo em uma dada região causava preocupação às elites locais, pois

escravos desertores diminuíam a força de trabalho disponível, além dos quilombos serem

vistos como polo de atração para mais fugas para esses locais. Além disso, não era incomum

que habitantes de quilombos de recente formação se agrupassem para atacar fazendas e

engenhos, arregimentando mais escravos, pois quanto maior fosse o grupo, maiores eram as

chances de se criar estruturas para moradia e uma base agrícola. Dessa forma, os quilombos

eram sinônimos de transgressão à ordem escravista, atraindo, assim a repressão dessas elites

locais (Gomes, 2015). Isso também ocorreu na região do Baixo Amazonas, conforme

Rodrigues (1875, p. 25 apud Farias júnior, 2016, p. 45-46), ao narrar que

... os “mocambos” na região de Óbidos provocavam “medo” e alarme nos

proprietários locais e governo provincial. As primeiras notícias são dos “mocambos”

do Inferno e Cipóteua nas cabeceiras do rio Curuá. Segundo relatava Barbosa

Rodrigues, “era o terror dos povos da circunvizinhança, e o refugio de todos os

escravos” [sic] (RODRIGUES, 1875, p. 24 apud FARIAS JÚNIOR, 2016, p. 45).

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(...)

Segundo Barbosa Rodrigues, esses “mocambos” foram destruídos em 1812.

Participaram milícias de Monte Alegre, Santarém, Alenquer, Óbidos e indígenas do

povo Munduruku. A expedição foi comandada pelo capitão de milícias Bernardo

Marinho de Vasconcelos. A expedição destruiu os “mocambos”, fazendo 100

prisioneiros. Segundo o autor “os mocambistas do Curuá, vieram-se estabelecer no

Trombetas” [sic] (RODRIGUES, 1875, p. 25) apud (FARIAS JÚNIOR, 2016, p. 45-

46).

Após a destruição, em 1822 ou 1823, do quilombo que havia se formado no vale do

rio Trombetas, os quilombolas internaram-se cada vez mais a montante desse rio, buscando

abrigo a montante das cachoeiras, obstáculos naturais que lhes proporcionavam proteção ante

as expedições punitivas. Logo, tanto as zonas encachoeiradas do rio Trombetas quanto as

adjacências do lago Erepecu – chamado, no passado, de Aripecu ou Arapicu –, onde,

atualmente, se localiza a comunidade Último Quilombo, começaram a ser ocupados pelos

grupos de negros que fugiram da escravidão, ainda no século XIX (ECODIMENSÃO, 2014),

principalmente, devido a abundância de recursos naturais (produtos florestais madeireiros e

não madeireiros, caças, peixes e quelônios) e localização estratégica para a prevenção de

eventuais ataques aos mocambos instalados ao longo do rio.

Atividades produtivas nos antigos quilombos

Na produção do novo lugar os quilombolas do vale do rio Trombetas passaram a

desenvolver diversas atividades produtivas, dentre as quais, destacaram-se e ainda se

destacam o extrativismo (vegetal e animal) e a agricultura familiar, ambas utilizadas tanto

para o próprio sustento (valor de uso da matéria prima) quanto para comercialização (valor de

troca do recurso natural) de parte da produção. Dentre os produtos extrativistas

predominavam: o óleo de copaíba, o látex da balata7, a salsaparrilha (Smilax spp.)

8, o cumaru,

a castanha-do-brasil, além da extração do pau rosa e outras madeiras. Também praticavam a

pesca de pirarucu e a caça da tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa) e de outros

animais silvestres, principalmente, para o comércio de carnes e peles. Dentre os principais

produtos agrícolas produzidos pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

destacaram-se o tabaco e o cacau, produtos agrícolas com maior importância econômica, além

da mandioca para a produção de farinha de mandioca (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

7 Balata: Árvore que produz um látex conduzido como seiva da Família das Sapotáceas.

8 Salsaparrilha é uma ... MEDEIROS, F. T.; DE SENNA-VALLE, L.; ANDREATA, R. H. P. Histórico e o uso

da “salsa parrilha” (Smilax spp.) pelos boticários no Mosteiro de São Bento. Revista Brasileira de Biociências,

Porto Alegre, v. 5, supl. 1, p. 27-29, jul. 2007

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Os quilombos, portanto, não estavam isolados da sociedade escravocrata dominante,

pelo contrário, mantinham relações socioeconômicas com setores dessa sociedade. No

Erepecu, por exemplo, as relações de troca de mercadorias entre os quilombolas e

comerciantes brancos sediados nas cidades de Oriximiná e Óbidos eram regulares, mesmo

durante a escravidão. Os quilombolas do vale do rio Trombetas desciam o rio Trombetas para

vender a sua produção aos pequenos comerciantes (brasileiros, portugueses e italianos),

inclusive no porto da cidade de Óbidos, tal como observou Tavares Bastos (1866): “As vezes

descem em canôas e vêm ao proprio porto de Obidos, á noite, commerciar ás escondidas; com

os regatões que sobem o Trombetas, elles o fazem habitualmente” [sic] (TAVARES

BASTOS, 1866, p. 152 apud FARIAS JÚNIOR, 2016, p. 261). Os regatões subiam o rio

Trombetas comprando o que os quilombolas produziam. Também vendiam os mais variados

gêneros (alimentícios, querosene, instrumentos de trabalho) para os quilombolas. Nessas

relações também havia trocas de informações (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

O regatão é um comerciante ambulante que viaja entre centros regionais e

comunidades rio acima, comercializando mercadorias para pequenos produtores caboclos e

comerciantes do interior em troca de “produtos regionais”, agrícolas e extrativistas. Segundo

McGrath (1999), o regatão tem uma história controversa: por um lado é visto como um

pioneiro heróico, trazendo a civilização para produtores isolados na floresta (GOULART,

1968 apud MCGRATH, 1999); por outro, é tido como um atravessador sem escrúpulos,

explorando os pobres da zona rural e roubando comerciantes locais em seus negócios

(PENNA, 1973 apud MCGRATH, 1999). Contudo, apesar das diferenças de opinião, não há

dúvidas quanto a importância do regatão para a sociedade e a economia de alguns setores na

Amazônia, o qual desempenhou e ainda desempenha no escoamento da produção, criando

uma logística que atendeu e atende as necessidades de transporte, além de ser responsável

pelo financiamento aos trabalhadores com o fornecimento de gêneros alimentícios e utensílios

em geral.

Segundo McGrath (1999), o regatão, juntamente ao caboclo e ao patrão, formava a

base do sistema de aviamento e era muito importante no controle do excedente que o sistema

produzia. Atendendo tanto produtores quanto patrões, o regatão tem sido uma força decisiva

em vários períodos da história econômica e social da Amazônia, ajudando a construir, manter

e, mais tarde, desmantelar o sistema mercantil que dominou a região até os meados do século

XX.

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99

Nesse período, a castanha-do-brasil apresentou grande importância econômica dentre

os produtos coletados na microrregião Alto Trombetas, cuja produção nos castanhais do lago

Erepecu já era notável desde meados do século XIX, conforme registros de Derby (1898):

“Actualmente a população do Trombetas está muito espalhada. Até ao lago Arapicú

há alguns sítios dispersos de brancos e tapuios, sendo aquelles principalmente

negociantes que commerciam em castanhas. Entre este ponto e as cachoeiras vivem

alguns negros em diversos pontos ao longo do rio até o aldeamento principal que

está situado a uma distância de alguns dias de viagem acima da primeira cachoeira.

Nos mezes de outubro e novembro muita gente da parte baixa do rio e mesmo do

Amazonas, dirige-se as praias de arêa, que ficam immediatamente abaixo das

cachoeiras com o fim de apanhar tartarugas e ovos de tartarugas, ao passo que pouco

tempo depois, esta mesma região fica cheia de colledores de castanhas. O

castanheiro brasileiro é excessivamente abundante no rio e nos lagos desde as

cachoeiras rio abaixo até o lago Arapicú, e exporta-se todos os annos grande

quantidade de castanhas” [sic] (DERBY, 1898 apud ECODIMENSÃO, 2014, p.

61).

Conforme Castro e Acevedo (1998), no período de 1875 a 1900, com a inserção dos

quilombolas no circuito espacial produtivo da castanha-do-brasil, como coletores, estes

passaram a se dedicar a coleta da castanha-do-brasil, diminuindo o cultivo do tabaco para a

venda. Outras práticas econômicas, como a viração da tartaruga-da-amazônia ou o corte de

madeira, também foram desestimuladas comercialmente, pois a economia incentivava as

atividades produtivas mais importantes para o seu funcionamento via gêneros exportáveis.

No final do século XIX, período pós-abolição, grupos familiares de quilombolas

migraram no sentido a jusante das cachoeiras do rio Trombetas, formando novos

nucleamentos. O primeiro grupo seguiu a foz do rio Cachorro e Mapuera; o segundo orientou-

se para uma área que tem como referência Cachoeira Porteira e o terceiro, para as terras

localizadas no médio rio Trombetas, mais próximo de Oriximiná (CASTRO; ACEVEDO,

1998).

Coudreau (1901, apud Castro e Acevedo, 1998) registrou que surgiram várias

localidades: nas proximidades de Cachoeira Porteira ergueram-se Nova Amizade e Arrozal e,

descendo o rio, Tapagem, Tabuleiro, Conceição, Jarananum, Lago do Abuí, Sagrado Coração

de Jesus de Jesus, Sapo das Águas9, Boa Vista, Água Fria, Sacuri, Palhal e Moura. O lago da

Tapagem é mencionado no livro de Derby (1898:370 apud Castro e Acevedo, 1998), no qual

um morador dessa localidade serviu-lhe como guia. A reconstrução realizada por Castro e

Acevedo (1998) em sua pesquisa, feita a partir das lembranças dos moradores mais antigos, se

aproxima da territorialização do início do século XX e da que temos atualmente.

9 Leia-se Saco das Almas. Segundo o Edo 17, atualmente essa localidade se denomina Saco das Almas.

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Segundo Castro e Acevedo (1998), os moradores da Tapagem faziam um percurso até

os lagos do Macaco e do Jacaré – que atualmente pertencem a Reserva Biológica do Rio

Trombetas – para coletar castanha e, devido às longas viagens durante o período de safra da

castanha, os moradores fixavam residências temporárias na floresta para dar conta da

produção. Diversas localidades mantiveram ao longo do tempo uma importância maior para o

grupo: na Tapagem e Erepecuru foram construídos cemitérios; em Cachoeira Porteira e

Tapagem havia pajés e curandeiros, por isso eram referência especial; em Conceição e Santo

Antônio construíram rústicas capelas para a realização das festas religiosa e dançante e onde

esperavam a visita dos religiosos para a realização de cultos (ACEVEDO; CASTRO, 1998).

Com o fim do regime escravista, em 1888, também se intensificaram os contatos e

fluxos comerciais, valendo-se dos regatões (embarcações que faziam comércio nas zonas

ribeirinhas da região) que intermediavam as trocas de gêneros florestais, couro e carnes de

animais silvestres por sal, cachaça, pólvora e outros bens que os mocambeiros não produziam.

Deste modo, desde a formação dos quilombos no vale do rio Trombetas, o regatão foi e

continua sendo de grande importância para a circulação da produção, mercadorias e

informações, pois se internavam em rios, lagos e igarapés, e comercializavam produtos sendo

fiéis aos denominados mocambeiros e rebelando-se contra as proibições de ordem escravistas.

5.1.2 O domínio dos patrões: os “donos dos castanhais” na microrregião Alto

Trombetas

Até o final do século XIX, no trecho do rio Trombetas compreendido entre Oriximiná

e Cachoeira Porteira a economia estava alicerçada na pequena agricultura familiar,

principalmente voltada ao cultivo de cacau, e também nas pequenas criações de gado, que

coexistiam com o extrativismo, mais notadamente a coleta de castanha-do-brasil. Em relação

aos grupos situados no centro da Cachoeira Porteira e as margens mais próximas do rio,

Coudreau (1900) aponta um conjunto de atividades agrícolas e extrativas:

"Cada mocambeiro tem uma pequena plantação de cacau oh! bem pequena e uma

derrubada onde ele produz farinha suficiente para ele e sua família, ele vive da caça

e da pesca. Antigamente ele colhia o tabaco que era bem apreciado, mas desde que

ele começou a coletar a castanha, ele abandonou tudo. A castanha lhe permite

comprar uma calça e uma camisa e fazer festas" (COUDREAU, 1900, p. 131 apud

CASTRO; ACEVEDO, 1998).

Com a alta valorização da castanha-do-brasil, segundo Castro e Acevedo (1998,

p.136), a partir de 1894, teve início, no vale do rio Trombetas, a transição da exploração dos

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chamados “castanhais livres” para os que se diziam “donos dos castanhais” ou “patrões”.

Dessa forma, as terras de castanhais da microrregião Alto Trombetas, antes

consideradas como devolutas, foram indevidamente apropriadas por supostos donos. Tais

apropriações ocorreram por meio das chamadas “explorações”, que eram organizadas por

empresários locais para descobrir novos seringais e castanhais. A partir dessas “explorações”,

as “novas áreas” foram incorporadas por meio do título definitivo de posse escriturado em

cartório ou adquiridas de posseiros, criando uma nova elite local formada por um grupo de

não trabalhadores diretos sobre a terra, denominados “donos dos castanhais” ou “patrões”. A

partir de 1894, em quase 60 anos, foram registrados 173 títulos definitivos, porém, essas

titulações ganharam mais importância no período de 1920 a 1940, com a expansão das

atividades de coleta, beneficiamento e exportação da castanha (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

Na foz do lago Jacaré – atualmente localizado no interior da Reserva Biológica do Rio

Trombetas –, por exemplo, se estabeleceu Raimundo da Costa Lima, com extenso controle de

áreas de castanhais, agrimensor, que ficou conhecido ao longo de todo o rio Trombetas como

coronel Costa Lima e chegou a possuir uma área exorbitante de 100.000 hectares (CASTRO;

ACEVEDO, 1998, p.137), o que corresponde, a título de comparação, a um quarto do

território da Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Com a apropriação dos castanhais, que teve seu início por volta do final do século

XIX, os “patrões” ou “donos dos castanhais” passaram a controlar a entrada dos extrativistas

nos castanhais para trabalharem em limites determinados, as chamadas colocações. O

monopólio da compra da castanha era exercido por alguns comerciantes de Oriximiná e

Óbidos que chegaram a ter seus encarregados na área, conforme o Entrevistado 18:

Naquele tempo, aí cada patrão tinha seus trabalhadores, aí você não podia coletar no

castanhal de outro patrão e hoje não, nós que moramos aqui. A gente pode coletar

em qualquer lugar. Tinha vários donos dos castanhais, tinha aqui o Mourinha, tinha

ali o Galção, era dono... Aí tinha ali o Belo, tinha no Fartura, então cada um que

vinha os representantes dos patrões, cada um tinha os seus funcionários, não era eles

que vinham, os patrões tinha os seus funcionários [...] os patrões ficavam em

Oriximiná eles pegavam pessoas daqui mesmo, mas tinha pessoas também de fora

para coletar. No caso do Careca, ele tomava conta era ele mesmo do Fartura (E 18,

2019).

No entanto, o monopólio da comercialização, ou o controle de parte crucial da cadeia

produtiva, da coleta da castanha-do-brasil que as novas elites locais estruturaram no vale do

rio Trombetas somente se efetivou pelo controle e concentração de produtos alicerçados em

relações de patronagem, também denominado de aviamento em outros lugares. Nesse sistema

os supostos donos dos castanhais, chamados patrões, aviavam os extrativistas, isto é,

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adiantavam-lhes, em sistema de crédito e a preços normalmente mais altos que os de mercado,

os mantimentos, instrumentos de trabalho e demais itens necessários ao período de

permanência nos castanhais. Depois, compravam-lhes a produção de castanhas a preços

preestabelecidos e, em geral, abaixo do valor de mercado. Após quitarem as dívidas

assumidas com o patrão, os extrativistas terminavam o negócio em prejuízo, obrigando-se a

trabalhar para o mesmo patrão na safra de castanha-do-brasil do ano seguinte.

Nesse contexto, a coleta livre, antes praticada pelos quilombolas, foi substituída pelo

sistema de aviamento, denominado de “patronagem” no vale do rio Trombetas, conforme

explica o Entrevistado 16, morador da comunidade Último Quilombo:

“Os patrões vinham com seus barcos. Primeiro, que ele vinha logo no início da safra

e fazia um tipo de... chama-se de abono. Ele abonava os trabalhadores, coletores,

castanheiros. Ele dava, por exemplo, açúcar, café, tipo assim como se fosse uma

cesta básica. E deixava ali e ia embora e passava uns 20, 30 dias ele já vinha pra

receber a castanha E ia embora, aí passava 30 dias e voltava para buscar a castanha

daqueles coletores...” (E 16, 2019).

No sistema de aviamento implantado no vale do rio Trombetas, os patrões

estabeleciam as casas comerciais, local onde recebiam toda a castanha coletada pelos

coletores tradicionais e lhes disponibilizavam as mercadorias necessárias como ferramentas,

sacos de sal, querosene, tecidos e remédios. Nesse sistema, o dinheiro praticamente não era

utilizado. É o caso dos Guerreiros que se instalaram no alto rio Trombetas, com casa

comercial situada em Cachoeira Porteira (CASTRO; ACEVEDO, 1998, p.137).

O patrão também inovou na medida da castanha, substituindo o hectolitro pela

“caixa”, considerando que duas caixas e meia equivaleria a um hectolitro, entretanto, na

realidade, a medida de duas caixas equivalia a um hectolitro. Assim, o patrão obtinha o lucro

na medida da caixa. Os patrões podiam assegurar esse sistema de exploração visível aos olhos

dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil porque proibiram qualquer comercialização,

sendo que toda a castanha coletada pelo castanheiro era destinada a abastecer o paiol do

patrão (CASTRO; ACEVEDO, 1998, p. 142). No vale do rio Trombetas, esse sistema

inserido pelos patrões interferiu na maneira dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil

organizarem a produção, uma vez que eram os patrões que indicavam os lugares e a

intensidade de trabalho, quantificada em caixas do produto a serem vendidas para o patrão,

em conformidade com as regras estipuladas unilateralmente.

Nos lagos Cuminá, Jacaré e Arapecu (lago Erepecu) a castanha é abundante e seu

transporte mais acessível. Segundo Castro e Acevedo (1998) a produção de Oriximiná em

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1899 tinha 36.0000 arrobas (aproximadamente 414 toneladas) de castanha-do-brasil. Em

meados de 1930, quando a castanha atingiu lugar proeminente na economia regional, alguns

donos de castanhais aproveitaram-se do papel da produção do vale do rio Trombetas, que se

elevava gradativamente, para ingressar na carreira política. Nesse período figuraram à frente

das Câmaras e dos governos municipais (Óbidos) e da subprefeitura (Oriximiná): José Gabriel

Guerreiro, João Guerreiro, José Antônio Picanço Diniz, José Clementino de Figueiredo,

Raimundo José de Almeida, Manoel Costa e Carlos Maria Teixeira. Os Guerreiro, Picanço

Diniz, Figueiredo, Teixeira e Manoel Costa, por sua vez, entraram nos governos

revolucionários de 1930, tendo continuação na vida pública, e, graças a seu empenho,

conseguiram a elevação de Oriximiná à categoria de município (CASTRO; ACEVEDO, 1998,

p. 142).

O aumento da produção de castanha no vale do rio Trombetas também impulsionou o

estabelecimento das casas comerciais e a organização de pontos de recepção controlados por

compradores da castanha, sendo que eram os próprios donos dos castanhais que articulavam a

comercialização e o transporte desse produto. Acerca do transporte, é possível conferir que até

no lago Jacaré foi estabelecido um serviço de "chaloupe à vapeur", provavelmente, bastante

imprevisível, o que pouco ajudava na comercialização direta dos coletores tradicionais de

castanha-do-brasil (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

Assim, os pequenos comerciantes e regatões, sujeitos econômicos importantes na

organização da produção no vale do rio Trombetas, foram desarticulados pelos donos dos

castanhais que monopolizaram a produção da castanha na microrregião Alto Trombetas,

associando-a a propriedade da terra e passaram a assumir também o financiamento e o

transporte da produção. A tendência à desarticulação dessas estruturas com o desinteresse de

financiamento por parte dos patrões/donos de castanhais colocou parcela dos antigos e

pequenos regatões que operavam no vale do rio Trombetas à margem dessa nova

configuração social, sendo substituídos na circulação pelos donos de embarcações movidas a

vapor. Em 1962 um desses grandes patrões era proprietário de 40 canoas grandes e levava

para suas colocações mais de 400 homens (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

Os coletores tradicionais de castanha-do-brasil e regatões eram vigiados pelos donos

de castanhais para que não houvesse a comercialização de produtos em seus domínios

territoriais, o que acarretava custos para produção desse produto. Para sanar esses custos, os

donos dos castanhais inseriram, então, uma relação que implicava a confiança e a fidelidade

por parte do quilombola coletor tradicional de castanha, que se tornou afilhado do patrão e

portador de obrigações morais, como por exemplo, não vender a castanha para outro

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comerciante. O patrão era o padrinho, o prefeito, o amigo do padre, uma presença

sobrepujante aos coletores tradicionais de castanha-do-brasil. As relações familiares eram

sacramentadas pela religião através do compadrio, pois dessa forma o patrão obtinha a

lealdade dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil que eram seus afilhados ou

compadres. Esses vínculos desenvolveram elos entre moradores da cidade e os moradores

locais, produtores e comerciantes, o que modificou a relação do compadrio que antes era

intrafamiliar e intercomunitário para afirmar sua identidade étnica e territorialização

(ACEVEDO; CASTRO, 1995). Castro e Azevedo (1998) identificaram uma diversidade de

lugares e troncos familiares na bacia do Trombetas, mesmo que esses fossem precisos apenas

nos espaços onde o poder econômico e político contornavam limites precisos. No Lago

Jacaré, por exemplo, o patrão Raimundo da Costa Lima emprestava o nome aos seus

protegidos como padrinho e protetor, como forma de obter a fidelidade dos coletores

tradicionais, isto é, demarcando território.

Apesar de todos os artifícios criados, os arrendatários, proprietários de castanhais e a

sociedade regional não conseguiram ou não tiveram capacidade de subjugar esses antigos

ocupantes do Trombetas, mesmo utilizando habilidosamente os artifícios do direito agrário da

República (ACEVEDO; CASTRO, 1998). Os quilombolas da bacia hidrográfica do rio

Trombetas resistiram a essas formas de dominação impostas, seja pelas maneiras “inacabadas

de se manifestar nas linguagens multifacetadas expressas através de palavras, zombarias e

gestos ou nas crenças, orações, festas e cantorias e mesmo na clandestinidade da venda da

coleta a outro patrão” (CASTRO; ACEVEDO, 1998, p. 145-146).

Os coletores tradicionais de castanha-do-brasil da bacia hidrográfica do rio Trombetas

mantiveram, compulsoriamente, a tradição familiar do patrão nos limites das safras

comprometidas e na presença do encarregado ou do proprietário da terra, mas, burlavam esse

sistema para extrair da floresta os frutos, as madeiras e para realizar as pescarias, as caças

para extrair as peles, e assim, garantir a reprodução do seu modo de vida peculiar (CASTRO;

ACEVEDO, 1998, p. 146).

A intensidade da exploração da castanha e as formas de gestão patronal da terra e de

famílias trabalhadoras, em especial dos negros, assim como a exacerbação da procura de

pirarucu, peles e tartaruga-da-amazônia, colocaram esses extrativistas do vale do rio

Trombetas nos circuitos produtivos da economia regional, mas não conseguiram os dispersar

espacialmente. Pelo contrário, no transcorrer deste século aprofundaram sua identidade étnica,

referida de forma concreta e significativa a territórios dos rios Trombetas e Erepecuru, nos

quais têm permanecido sem maior fragmentação de relações sociais e intercomunitárias.

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Preservam, conscientemente, o sistema complexo de vida econômica e cultural que faz dos

negros do Trombetas um grupo de especificidade inegável na sociedade regional por

representar as formas camponesas mais antigas da região Amazônica (ACEVEDO; CASTRO,

p. 148).

Segundo Castro e Acevedo (1998), diferentemente dos processos migratórios de

camponeses da região Bragantina para Belém, e das margens do rio Tapajós para a cidade de

Santarém, os quilombolas da região do vale do rio Trombetas não alteraram sua localização e

distribuição no espaço. Frequentemente denominados e confundidos como caboclos e

ribeirinhos do Baixo Amazonas, os quilombolas do vale do rio Trombetas demonstram níveis

de permanência e capacidade de reprodução sobre as bases de sua identidade étnica e domínio

territorial. Somente nos anos de 1990, esse processo migratório se iniciou na região do vale do

rio Trombetas como resultado do cercamento de suas terras por empresas de mineração e das

sobreposições com os territórios da Reserva Biológica do Rio Trombetas e da Floresta

Nacional Saracá-Taquera (CASTRO; ACEVEDO, 1998, p. 148-149).

O período da patronagem no vale do rio Trombetas entra em declínio na década de

1970 quando o Estado, por meio de uma política desenvolvimentista, incentivou a instalação

de empreendimentos de extração industrial de minério de bauxita nos tabuleiros terciários da

microrregião Alto Trombetas. A decisão de explorar as jazidas de bauxita deu-se nos

delineamentos do Polo Mineral do rio Trombetas que se efetivou com a instalação da empresa

MRN. Para garantir o controle territorial das áreas de mineração de bauxita, Estado e

empresas se associaram para a criação de unidades de conservação no entorno do projeto

minerador (FARIAS JÚNIOR, 2016; SCARAMUZZI, 2016).

5.1.3 O domínio dos grandes projetos e das unidades de conservação na Microrregião

Alto Trombetas

As décadas de 1960 e 1970 trouxeram transformações importantes para o cenário

regional, em especial, a implantação da MRN em Porto Trombetas, a intensificação da

exploração de recursos e a criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Apesar de livres

dos patrões, os habitantes do Erepecu passaram a lidar com outras restrições de uso do

território, agora imputadas pela empresa privada de mineração, a MRN, que adquiriu domínio

(por meio de concessão pela União) sobre terras no vale do rio Trombetas. Além disso, a

Reserva Biológica do Rio Trombetas, unidade de conservação que não admite a presença de

pessoas residindo no seu interior, teve um histórico de criação particularmente dramático e

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violento, segundo os Entrevistados 06 e 24:

“Eu queria que essa reserva fosse dentro da Cachoeira. O pessoal do IBAMA

quando chegaram aí, como diz o coisa, até gente eles mataram (...) Aí nessa época

eles queriam ser valente, eles queriam tá indo pelas casa, tomá a comida dos outros.

Até comida da panela tiraram dos outros lá. Da minha não. Agora o Beto até tirar a

galinha de cima do ovo pra ver se diz que não tinha ovo de tracajá, tartaruga, ele

tirou. Só que ele ia se dando mal comigo, mas Deus é bom que não deixou eu acertar

nele” (E 06, 2018).

(...).

“Eu também nasci aqui, mas me criei mais aí no Boa Vista. Foi depois da morte, em

94, que um policial do Ibama matou um irmão meu, aí já existia a Arqmo nessa

época, tava próxima ainda que a Arqmo foi fundada, aí devido a força que a Arqmo

foi fundada, as comunidades de fora, aí meio que o Ibama relaxou, aí foi que

montaram essa comunidade” (E 24, 2019).

A MRN e a Reserva Biológica do Rio Trombetas são produtos da implantação de

políticas públicas pelo Estado brasileiro, a partir da década de 1960. O Governo Federal, por

uma decisão política de integrar o espaço amazônico ao restante do país, passou a agir com

uma verdadeira política de intervenção regional, com clara inspiração geopolítica do

segmento militar, deslocando os seus interesses para o subsolo, para as riquezas minerais da

Amazônia, que se tornou alvo de grandes investimentos do Governo Federal, como o

Programa de Integração Nacional (PIN), responsável pela abertura de estradas e rodovias que

tinha por objetivo integrar fisicamente a Região Amazônica ao restante do território nacional

(GONÇALVES, 2012).

A região do rio Trombetas, assim como Carajás e Amapá, era um dos polos que

integravam o Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia).

Criado pelo Governo Federal, em 1974, no contexto desenvolvimentista do PIN, o

Polamazônia objetivava a “ocupação e o desenvolvimento integrados de, incialmente, 15

áreas da Amazônia Legal. Essas áreas foram selecionadas em função de suas potencialidades

agropecuárias, agrominerais e agroindustriais” (BRASIL, 1974, p. 11020).

A implantação do projeto de mineração de bauxita na microrregião Alto Trombetas

O Polo Trombetas possuía uma área de abrangência de mais de 85.000 Km², em sua

área de abrangência, compreendendo parte dos municípios de Monte Alegre, Alenquer,

Óbidos e Oriximiná. Essa região compunha, conforme o II Plano Nacional de

Desenvolvimento (1975-1979), a área do “Complexo Mínero-Metalúrgico da Amazônia

Oriental”, principalmente, devido à descoberta, em 1966 – pela empresa canadense Alcan

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Alumínio da América Latina – das reservas de bauxita na região da bacia do rio Trombetas,

sendo o volume estimado das reservas em torno de 800 milhões de toneladas, distribuído em

diversos platôs, dentre os quais o maior e mais importante, o de Saracá, a 30 km do rio

Trombetas (ICMBIO, 2013).

Nesse contexto, onde a política regional estava tutelada ao Governo Federal brasileiro,

controlado por militares, na década de 1970 foram emitidos 36 decretos executivos federais

assinados, que juntos somavam 89.440,59 hectares destinados à concessão de direito de lavra

de bauxita na região da bacia hidrográfica do rio Trombetas. Tais decretos concediam direito

de lavra para várias empresas mineradoras: Companhia de Mineração Santarém-COMISA;

Mineração Rio do Norte S.A.; Mineração Santa Patrícia Ltda.; Mineração Santa Mônica

Ltda.; Bauxita Santa Rita Ltda.; Alumínio Minas Gerais Sociedade Anônima; e a Alumínio

Poços de Caldas S.A. Muitas equipes de pesquisas ligadas a essas empresas multinacionais e

nacionais de exploração de recursos minerais internaram-se no vale do rio Trombetas

objetivando realizar pesquisas de prospecção, principalmente, na microrregião Alto

Trombetas (FARIAS JÚNIOR, 2016, p. 280).

Após obter a concessão de direito de lavra de bauxita na microrregião Alto Trombetas,

a Alcan iniciou em 1971 a construção do porto para o embarque da bauxita no rio Trombetas

e a construção de uma estrada de ferro ligando a mina ao porto. A construção da obra foi

interrompida devido a uma retração no mercado de alumínio, sendo retomada no ano de 1972,

quando a Alcan iniciou estudos em conjunto com a CVRD objetivando a reativação do

projeto. A partir desse momento a CVRD passou a ter uma participação nacional mínima de

51% no projeto minerador, sendo que em 1974 foi constituída a Mineração Rio do Norte S.A

(MRN), um consórcio do qual participavam duas companhias nacionais, detentoras de 56%

das ações e sete estrangeiras, detentoras de 44% das ações (ICMBIO, 2014). Nesse mesmo

ano, a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM):

aprovou o projeto e o declarou interessante ao desenvolvimento socioeconômico da

Amazônia, concedendo à MRN, entre outros incentivos concedidos pelo governo,

isenção de imposto de renda pelo prazo de 10 anos, prorrogáveis por mais cinco

anos. Em 1976 foi iniciada a construção definitiva do projeto, que ficou a cargo da

Construtora Andrade Gutierrez e teve um custo aproximado de US$ 430 milhões,

sendo financiado por várias fontes nacionais e estrangeiras. Na amortização dos

empréstimos a empresa operou no vermelho até 1983, quando começou a obter

lucros, que cinco anos depois já chegavam a US$ 287,5 milhões (ICMBio, 2014).

No ano de 1976, após os incentivos concedidos pelo governo brasileiro, foi concluída

a construção da infraestrutura do projeto minerador no distrito de Porto Trombetas,

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Oriximiná, cujo início da lavra da bauxita ocorreu em abril de 1979, sendo que no dia 13 de

agosto daquele ano ocorreu o primeiro embarque de minério para o Canadá. Para a

implantação do projeto de mineração de bauxita na microrregião Alto Trombetas, criou-se

uma escala local (company town, estradas, ferrovias, porto) para receber o empreendimento da

MRN. E o Estado possui um papel fundamental, pois o mesmo é detentor da competência do

ordenamento territorial necessário para a instalação da MRN, além de conceder incentivos

para a construção da infraestrutura no distrito de Porto Trombetas, município de Oriximiná

(ICMBIO, 2014).

A implantação do projeto minerador no vale do rio Trombetas surtiu efeitos sobre o

modo de vida dos quilombolas da microrregião Ato Trombetas, os quais passaram a conviver

com distintos processos de “deslocamentos compulsórios” ao longo da faixa de concessões

minerárias de bauxita, devido à implantação de sua infraestrutura, pois esta necessita de vias

de escoamento, energia e água para a produção mineral. Wanderley (2008), ao tratar da

mineração no Trombetas afirma que

A primeira desterritorialização efetiva sofrida pelos stakeholders locais aconteceu

em 1970, quando noventa famílias quilombolas foram induzidas a travar um

“acordo” com a mineradora, concordando em deixar suas áreas – onde, atualmente,

se situa Porto Trombetas - mediante pagamento de indenização irrisória

(WANDERLEY, 2008, p. 19).

Para Farias Júnior (2016), a concessão de direito de lavra de bauxita no vale do rio

Trombetas consolidou o processo de “intrusão” dos territórios tradicionais quilombolas, os

quais eram considerados “vazios demográficos” pelo Estado brasileiro. Conforme os decretos

de concessão de lavra, as terras tradicionalmente ocupadas foram disponibilizadas no mercado

de terras para fins da extração mineral da bauxita, tendo em vista que estas figuravam

juridicamente como “terras devolutas”, uma vez que após a abolição formal da escravidão

negra no Brasil não houve políticas fundiárias que proporcionassem e garantissem o domínio

das terras para os ex-escravos, ou para aqueles que há tempos garantiam seus modos de vida e

reprodução social nos chamados “quilombos” (FARIAS JÚNIOR, 2016, p. 271-273).

A criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas

Com a consolidação dos interesses minerários no rio Trombetas, o Programa de Polos

Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia), a mesma política pública que

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incentivou a implantação do projeto de mineração de bauxita pela MRN na microrregião Alto

Trombetas, também financiou os estudos e aprovação do projeto de “Criação e Implantação

da Reserva Biológico do Rio Trombetas”, executado pelo IBDF (IBAMA, 2004).

Nesse contexto, em 21 de setembro de 1979, um mês após o primeiro embarque de

bauxita, foi criada, no entorno do projeto minerador, a Reserva Biológica do Rio Trombetas

por meio do Decreto Federal nº 84.018, de 21 de setembro de 1979, a Reserva Biológica do

Rio Trombetas, unidade de conservação de proteção integral10

, com 385.000 ha (trezentos e

oitenta e cinco mil hectares). Segundo Acevedo e Castro (1998), isso demonstra que a MRN

atuou como coadjuvante para a criação dessa unidade de conservação (ACEVEDO MARIN;

CASTRO, 1998, p. 206).

Contudo, é importante ressaltar que no vale do rio Trombetas, segundo Simon,

Madeira Filho e Alcântara (2015), a governança ambiental têm seu início em 1963. Nesse ano

foi criada uma lei pela Câmara Municipal de Oriximiná, seguida de um decreto do então

Prefeito, assinado em 1964, que criou, no âmbito do município, o “Serviço de Proteção à

Tartaruga”. Esse serviço tinha como finalidade fazer o manejo das matrizes e dos ovos da

tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa) e a fiscalização de dez tabuleiros no rio

Trombetas – área onde atualmente se localiza a Reserva Biológica do Rio Trombetas. Até

1967, esse serviço era mantido pela Diretoria do Ministério da Agricultura no estado do Pará,

por meio de convênio firmado com o município de Oriximiná. Posteriormente, em 1967, o

serviço ficou sob a responsabilidade da Delegacia do IBDF, com a colaboração da Sociedade

de Preservação dos Recursos Naturais e Culturais da Amazônia (Sopren) (MINISTÉRIO DAS

MINAS E ENERGIA/RADAMBRASIL, 1976, p. 432). O Entrevistado 04 afirma:

“Eu morava dentro da Reserva Biológica. É minha terra natal, a Reserva Biológica.

Foi lá que eu nasci. Ela já foi criada muito em antes de 79 [1979]. Porque eu sou de

71 e eu já nasci na Reserva. Ela foi fundada com 17 famílias. Aí, depois chegou

mais umas famílias de fora. Aí que foi concluída. 25 famílias que ela foi fundada,

mas ela já existia. Eu já morava, porque os meus avós, os meus bisavós eram

descendentes de lá. Meu pai nasceu e se criou lá. O IBDF chegou... retirou [as

pessoas]. A gente foi pra Tapagem. Da Tapagem a gente foi pra Oriximiná. Aí de lá

que a gente veio pra cá pro Paraná [Comunidade Paraná do Abauí]. Nós não

chegamos passar ano [tempo que ficaram em Oriximiná]. [Aqui] é melhor de

sobreviver, mais calmo, mais tranquilo” (E 04, 2018).

10

A partir da promulgação da Lei Nº 9.985 de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades

de Conservação da Natureza (SNUC), regulamenta e rege o conjunto de Unidades de Conservação no Brasil,

esse tipo de área protegida passou a ser denominada unidade de conservação de proteção integral, a qual não

prevê ocupação humana ou uso dos recursos, excetuando-se, em algumas categorias, ocupações e usos

associados a pesquisa, manejo e turismo.

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O Entrevistado 04 afirma que nasceu em 1971, dentro da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, mas essa unidade de conservação foi criada somente em 1979. O Entrevistado 04

se refere às ações preservacionistas na microrregião Alto Trombetas, que são anteriores a

criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas, corroborando com Simon, Madeira Filho e

Alcântara (2015).

Segundo Simon, Madeira Filho e Alcântara (2015), as atividades conservacionistas

que antecederam a implantação de unidades de conservação na microrregião Alto Trombetas

foram o embrião para a criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Para Acevedo e

Castro (1998), a criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas no entorno do projeto

minerador da MRN constitui-se como o primeiro passo para o “cercamento” dos territórios

tradicionalmente ocupados pelos quilombolas desde meados do início do século XIX. Para as

autoras, o Estado brasileiro e a MRN estão associados na polêmica e conflituosa implantação

e permanência da Reserva Biológica do Rio Trombetas, sendo que utilizam-se do discurso

preservacionista, onde a defesa da tartaruga-da-amazônia e das madeiras de lei foi utilizada

para sensibilizar a sociedade e justificar tal medida governamental (ACEVEDO; CASTRO,

1998, p. 208-209).

Wanderley (2008), também corrobora com a ideia de que as unidades de conservação

criadas no entorno do projeto minerador, no vale do rio Trombetas, são estratégias usadas pela

MRN, constituindo-se em territórios-tampões, ou seja, territórios como reserva de valor e

faixa isolante que protege a área da mineração de eventuais disputas territoriais

(WANDERLEY, 2008, p. 19). Coelho e Cunha (2007), também corroboram com a ideia de

Wanderley (2008) de que a criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas faz parte de uma

estratégia ambientalmente protecionista adotada pela MRN no vale do rio Trombetas, por

meio da qual se criou um cinturão de proteção no entorno das áreas de direito minerário

concedidas a esse consórcio pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Segundo Wanderley (2008), as unidades de conservação criadas no entorno do projeto

minerador no vale do rio Trombetas fazem parte de um processo planejado de reordenamento

territorial promovido pelo Estado e por grandes corporações de mineração na região dos

megaprojetos de desenvolvimento. Assim, pode-se entender que a criação da Reserva

Biológica do Rio Trombetas e, posteriormente, da Floresta Nacional Saracá-Taquera, em

1989 – a qual garantia, justamente, as áreas pretendidas pela ALCOA – possuem como

objetivos impossibilitar a exploração mineral por novas empresas mineradoras e controlar as

dinâmicas populacionais no entorno do projeto minerador. Neste processo os gestores das

unidades de conservação encontraram-se dependentes das mineradoras, no que se refere aos

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apoios financeiros, de infraestrutura e de logística operacional, comprovando o forte poder de

influência exercido pela empresa na gestão e no controle destes territórios (WANDERLEY,

2008, p. 45).

Contudo, independente de qual tenha sido a motivação para a criação de unidades de

conservação no entorno dos grandes projetos econômicos instalados na Amazônia, é certo que

na microrregião Alto Trombetas tal conjuntura está atrelada a atividade mineradora. Além do

mais, tanto os grandes empreendimentos incentivados pelo Estado brasileiro quanto as

políticas ambientais restritivas impostas por meio da Reserva Biológica do Rio Trombetas

desconsideraram os modos de vida dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

brasil, que já residiam anteriormente nas áreas onde tais empreendimentos foram implantados,

causando mudanças no modo de vida dos quilombolas da microrregião Alto Trombetas.

A Reserva Biológica do Rio Trombetas foi delineada sobre territórios tradicionalmente

ocupados por quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil e coletores tradicionais

de castanha-do-brasil não quilombolas, que já utilizavam os recursos ambientais desses

territórios para a manutenção de seus modos de vida desde meados do início do século XIX.

No processo de implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas houve a expulsão de

grupos familiares de quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residiam no

território onde atualmente se encontra essa unidade de conservação (E 11). Entretanto, muitos

grupos resistiram e permaneceram residindo no interior da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, como as cinco comunidades remanescentes de quilombos localizadas no interior

dessa unidade de conservação: Jamari, Juquiri, Juquiri Grande, Juquirizinho, Útimo Quilombo

e Nova Esperança, como afirma o Entrevistado 11:

“E hoje, as vez, tem pessoas dentro, que não mora dentro da Reserva Biológica por

causa da tirada do pessoal, que na década de 79 foi criada a Reserva Biológica, com

as 23 famílias, se não tô enganado, se não me passa a memória, que morava dentro

da Reserva biológica, foi criado em cima, na década de 80 jogaram com eles de lá.

Aí quando foi em 89 foi criado a Arqmo que começou lutar mais pelos direitos dos

remanescentes foi que foi melhorando um pouco mais. Isso é bom colocar aí porque

hoje, se a gente [TQ Alto Trombetas I] não tem famílias, comunidades dentro da

Reserva Biológica, tudo por isso, por causa desse medo que foi tirado a força o

pessoal de lá e também foram enganados, mandando assinar algum documento que

era pra melhoria ainda acaba era pra jogar com todo mundo de dentro da Reserva

Biológica. Então, pra gente é uma coisa que é triste, quando era na época da lei

disso, eles andavam dando porrada no pessoal aí nas suas próprias casas, tomavam

espingarda se topassem nas casas. Era com Polícia Federal, era tudo. Então, hoje a

gente entra em consenso com o ICMBio porque é um órgão que, às vez, foi

mudando as atitudes deles, mas que se a gente for botar na memória o que eles já

fizeram de errado pra gente, não era nem pra eles existirem mais aí. Mas, mesmo

assim a gente tá controlando e tentando se reconciliar num acordo mais ou menos.

Eles eram as pessoas que tinham o dinheiro e as comunidades não tem

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baseadamente nada, as coisas só dá pro lado mais fraco, não é pro lado mais forte”

(E 11, 2018).

Desde a implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas, as sobreposições do

território dessa unidade de conservação com os territórios de comunidades quilombolas têm

ocasionado conflitos territoriais. E, diferentemente das unidades de conservação de uso

sustentável, tais como Reservas Extrativistas (Resex), Reservas de Desenvolvimento

Sustentável (RDS) e as Florestas Nacionais (Flona), as unidades de conservação de proteção

integral não possuem como objetivos assegurar os modos de vida tradicionais e o acesso ao

uso de recursos naturais pelas famílias que nelas vivem (BRASIL, 2000).

A criação da Floresta Nacional Saracá-Taquera

Consolidando a estratégia ambientalmente protecionista no entorno das áreas de

direito minerário, foi criada em 1989, adjacente à Reserva Biológica do Rio Trombetas, a

Floresta Nacional Saracá-Taquera, com uma área de 441.152 hectares, situada no noroeste do

estado do Pará, abrangendo partes dos municípios de Terra Santa, Oriximiná e Faro, na

fronteira com o estado do Amazonas. O acesso principal a essa unidade de conservação é feito

pelo rio Trombetas, município de Oriximiná, e pelos municípios de Faro e Terra Santa, pelo

rio Nhamundá. A área onde foi implantada a Floresta Nacional Saracá-Taquera apresenta uma

grande diversidade de recursos naturais renováveis (madeiras, castanha-do-pará e outros

produtos não madeireiros) e minérios (bauxita).

Segundo Coelho e Cunha (2007) a Floresta Nacional Saracá-Taquera pertence ao

mesmo conjunto de unidades de conservação instituídas ao redor da área da Companhia Vale

do Rio Doce (CVRD), em Carajás, também no estado do Pará. Apesar de ser uma unidade de

conservação de uso sustentável, a Floresta Nacional Saracá-Taquera não foi criada de forma a

considerar os modos de vida dos quilombolas e ribeirinhos que residem nessa área, mas para

atender aos interesses minerários da MRN, tanto que no Decreto de criação da Floresta

Nacional Saracá-Taquera, a MRN adquiriu a concessão para extrair bauxita no território dessa

Flona (MAPA 04).

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Mapa 04 – Zona de Mineração na Flona Saracá-Taquera - Pará

Fonte: DNPM, 2019.

A Floresta Nacional Saracá-Taquera possui como objetivos “promover o manejo

sustentado dos recursos naturais”, “garantir a proteção dos recursos hídricos, belezas cênicas e

dos sítios históricos e arqueológicos”; e, “fomentar o desenvolvimento da pesquisa científica”

(artigo 1º do Decreto Federal nº 1.298, de 27 de outubro de 1994). Além disso, também

possuem como objetivo assegurar o modo de vida e a sobrevivência dos povos tradicionais

que ali se encontravam muito antes da criação dessa unidade de conservação e da outorga das

concessões de lavra e licenças ambientais concedidas à Mineração Rio do Norte.

Contudo, há muita dificuldade em conciliar essa atividade mineradora com os

objetivos da Floresta Nacional Saracá-Taquera, a qual causa impactos negativos tanto na

biodiversidade quanto nos modos de vida dos quilombolas do Território Alto Trombetas 1. A

extração da bauxita implica na destruição de florestas que há muito garantem sustento e fonte

de renda às comunidades quilombolas (CPI, 2019).

Para a extração industrial da bauxita nos platôs terciários da Floresta Nacional Saracá-

Taquera é necessária a retirada da floresta e a remoção do solo (FIGURA 04). Essa atividade

também produz rejeitos que são armazenados em barragens, estruturas consideradas de risco e

que demandam um monitoramento permanente e rigoroso (FIGURA 05). Segundo a Agência

Nacional de Águas, a MRN é a quarta mineradora no Brasil em número de barragens. São 24

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barragens de rejeito, 22 delas localizadas no interior da Floresta Nacional Saracá-Taquera, e

há previsão de implantação de outras 09 novas barragens, devido à ampliação das atividades

de mineração.

Figura 04 – Área de extração do minério de bauxita na Floresta Nacional Saracá-

Taquera. Fonte: Carlos Penteado/CPI-SP. Disponível em: http://cpisp.org.br/mais-

uma-unidade de conservação-na-amazonia-sob-risco-mineracao-ameaca-flona-

saraca-taquera-no-para/

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Figura 05 – Barragens de rejeitos de bauxita da Mineração Rio do Norte na Floresta Nacional

Saracá-Taquera.

Fonte: CPI-SP/Carlos Penteado (s/d). Disponível em: http://cpisp.org.br/mais-uma-unidade de

conservação-na-amazonia-sob-risco-mineracao-ameaca-flona-saraca-taquera-no-para/

A extração da bauxita implica na destruição das florestas que há muito garantem

sustento e fonte de renda às comunidades quilombolas. Temos como exemplo a exploração

dos platôs Aviso, Bacaba e Almeida, iniciada nos anos 2000 pela MRN, em regiões que eram

historicamente utilizadas por populações ribeirinhas para fins extrativistas. A destruição dessa

área de coleta afetou as famílias residentes nas proximidades do platô e os coletores

tradicionais castanheiros de várias outras localidades, que migravam sazonalmente, atraídos

pelo alto grau de produtividade dos castanhais dessas áreas (WANDERLEY, 2008).

Assim sendo, o ordenamento territorial no vale do rio Trombetas está a serviço dos

interesses da MRN. Um exemplo disso é o TQ Boa Vista, o primeiro titulado do Brasil, em

1995, cujo processo de titulação teve a participação ativa da MRN junto à comunidade e ao

INCRA como forma de compensar a expulsão desta comunidade das áreas de interesse

minerário. Localizado nas proximidades de Porto Trombetas, o TQ Boa Vista possui uma área

de 1.113 ha, mas seus moradores não reivindicam novos títulos (CPI-SP, 2013).

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Manejo florestal madeireiro na Floresta Nacional Saracá-Taquera

Outra atividade que tem causado impactos socioambientais negativos na Floresta

Nacional Saracá-Taquera é o manejo florestal madeireiro, autorizado pelo governo federal por

meio das concessões florestais conduzidas pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), que em

2009 licitou uma área de 48,8 mil hectares na Floresta Nacional Saracá-Taquera (MAPA 05).

As vencedoras do leilão foram as empresas Ebata - Produtos Florestais Ltda, que possui

autorização para manejar uma área de 30 mil hectares, e a Golf Indústria e Comércio de

Madeiras Ltda, que manejará 18.794 hectares. Tais concessionárias poderão extrair, por 40

anos – com técnicas de manejo florestal – madeira, óleos, sementes, resinas e outros produtos

da Floresta Nacional Saracá-Taquera. Os contratos preveem pagamentos ao governo, geração

de empregos e investimentos anuais de cerca de R$ 500.000,00 nas comunidades locais.

Mapa 05 - Unidades de Manejo Florestal (UMFs) no interior da Floresta

Nacional Saracá-Taquera.

Fonte: Concessões Florestais. Disponível: http://www.florestal.gov.br.

No Mapa 05 é possível observar a Zona de Mineração e a Zona de Produção Florestal.

Observe que as UMFs se sobrepõem em parte a áreas que pertencem a Zona de Mineração,

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mas que ainda não foram mineradas. Assim, as empresas madeireiras manejam áreas que,

posteriormente, serão exploradas pela Mineração Rio do Norte. As empresas madeireiras

extraem as madeiras com alto valor comercial e a MRN remove toda a vegetação dos platôs

da Floresta Nacional Saracá-Taquera para, assim, extrair a bauxita do subsolo.

O papel da Igreja Católica e o surgimento das comunidades na microrregião Alto

Trombetas

A ocupação das comunidades do TQ Alto Trombetas 1 remonta ao século XIX,

quando os negros que fugiram da escravidão das fazendas de plantações de cacau e criação de

gado do baixo Amazonas e arredores de Belém se refugiaram em núcleos de resistências

denominados “mocambos” no alto curso do rio Trombetas. Dessas aglomerações surgiram

inúmeras localidades (ACEVEDO; CASTRO, 1998; FUNES, 1995). Segundo Castro e

Acevedo (1998) as localidades eram identificadas por laços entre os grupos familiares e se

configuravam como o resultado da territorialização dos quilombolas nesse espaço geográfico.

As comunidades da microrregião Alto Trombetas se formaram a partir das inúmeras

localidades que já existiam no vale do rio Trombetas. Dentre as comunidades que constituem

o TQ Alto Trombetas 1, as maiores e mais antigas são as comunidade da Tapagem e do Abuí,

cuja população local, segundo Funes (2000), teria sido proveniente das dispersões de

quilombolas das localidades de Cachoeira Porteira, Arrozal e Nova Amizade. Há registros de

que a comunidade da Tapagem teria se originado nos anos 1800, com a chegada de uma

família de negros fugidos da escravidão que nesse lago se “amocambaram”.

Contudo, somente a partir da década de 1970, as comunidades foram fundadas

oficialmente, conforme informado pelo Entrevistado 01:

“Esse negócio de comunidade foi de uns certos tempos pra cá que foi

fundada. Na época que jogaram o pessoal de lá do Jacaré [década de

1980], daí da Reserva, não tinha ainda o negócio das comunidades.

Dispois disso muitas coisas melhorou, mas foi já devido a

comunidade, depois de fundar a comunidade que melhorou mais

algumas coisas”(E 01, 2018).

As comunidades tem sua origem no Movimento Católico de Educação de Base (MEB)

introduzido, na década de 1970, pelos padres da Sociedade do Verbo Divino, congregação

religiosa ligada a Igreja Católica, que exerceram sua atuação, principalmente, por meio de

projetos das Comunidades Eclesiais de Base (CEB) (CASTRO; ACEVEDO, 1998; FUNES,

2000; SCARAMUZZI, 2016). A partir de então houve a incorporação do termo/categoria

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“comunidades” ao vocabulário político e sociológico dos quilombolas da microrregião Alto

Trombetas para designar e circunscrever núcleos populacionais e lugares.

Os projetos da CEB tinham como objetivos organizar as famílias quilombolas em

núcleos bases para a realização das obrigações religiosas e também para lutar pelos seus

direitos territoriais (SCARAMUZZI, 2016; ACEVEDO; CASTRO, 1998), conforme

informado pelo Entrevistado 01. Com a saída dos padres franciscanos da Paróquia de Santo

Antônio de Oriximiná e a chegada dos padres da congregação do Verbo Divino, em 1980, os

núcleos base cresceram e se transformaram em comunidades, com infraestrutura maior

constituída por capelas, barracão comunitário (CORRÊA, 2016).

Segundo Scaramuzzi (2016), a Igreja Católica é percebida pelos quilombolas da

microrregião Alto Trombetas como um marco de importância fundamental para a tomada de

consciência acerca dos direitos territoriais e para a organização política que precisou ser

desenvolvida para enfrentar e resistir às tentativas de domínios de seus territórios pelos

patrões ou donos dos castanhais, pela a mineradora de bauxita MRN, pelos órgãos gestores

das unidades de conservação, pelas madeireiras e pelas instituições ligadas à regularização

fundiária, como o Incra.

Desse modo, devido à origem das comunidades estar associada à luta pela autonomia

política e pelos direitos territoriais, “comunidade” acabou por se tornar, atualmente, uma

categoria que remete a unidades políticas que atuam principalmente nas relações externas,

mas, em alguns contextos de relações sociais internas, também designa atualmente unidades

sociológicas que atuam com certa autonomia entre si. Comunidade também é o termo usado

para designar o espaço, também chamado de centro comunitário (FIGURA 06), nem sempre

habitado, onde se encontram os espaços de uso coletivo, formado por um barracão para a

realização de reuniões comunitárias e as danças durante a festa dançante; uma cozinha

comunitária, utilizada como apoio logístico para as reuniões; uma escola de alvenaria; além

de uma capela ou igreja (católica e evangélica); o campo de futebol; a casa de gerador de

energia; as palhocinhas – pequenas construções de madeira e palha utilizadas para venda de

comidas típicas nas épocas de festa; e algumas residências. Apesar de contar com espaços de

uso coletivo, a situação do centro comunitário é precária em termos de serviços e condições

de moradia. A manutenção dessas estruturas é realizada pelos próprios moradores em

trabalhos coletivos previamente organizados (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA;

SCARAMUZZI, 2016).

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Figura 06 – Centro comunitário da comunidade do Abuí. Fonte:

PICANÇO (2018)

Contudo, para Scaramuzzi (2016), além da constituição de um novo tipo de unidade

política no contexto local, o termo/categoria “comunidade” é usado principalmente para

circunscrever aquilo que concerne ao âmbito das relações com o estado e alguns segmentos da

sociedade civil. Inclui-se nesse espectro de relações aquelas com as pessoas de fora que

moravam ou frequentavam o território quilombola; aquelas relativas à gestão dos bens

materiais e objetos coletivos como o barco comunitário e o motor de luz movido a óleo diesel

ou gasolina; a estrutura física dos centros comunitários como o posto de saúde, escola e igreja

e os empregos ligados a educação, transporte e saúde.

5.1.4 O papel da Arqmo, das associações de territórios quilombolas no Alto Trombetas

As comunidades do TQ Alto Trombetas 1 estão articuladas, politicamente, à

Associação Quilombola Mãe Domingas. Enquanto a comunidade Último Quilombo –

juntamente com as comunidades Jamari, Juquiri, Juquirizinho, Moura, Palhal e Curuçá-Mirim

– está articulada, politicamente, à Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo

do Alto Trombetas (ACRQAT). Tanto a Associação Quilombola Mãe Domingas quanto a

Aeqmo são filiadas à Associação de Remanescentes Quilombolas do Município de Oriximiná

(Arqmo), que representa 37 comunidades quilombolas do município (ARQMO, 2018).

Auxiliados por diversas instituições, mais notadamente, a Pastoral da Terra e a

Comissão Pro-Índio de São Paulo (CPI-SP) – os quilombolas da microrregião Alto Trombetas

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instituíram, em 1989, a Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do

Município de Oriximiná (Arqmo), com o objetivo principal de representar e organizar a luta

das comunidades remanescentes de quilombos do município de Oriximiná na conquista do

direito de propriedade da terra, garantido no artigo 68 do ADCT da Constituição Federal de

1988, como afirma o Entrevistado 11:

“E hoje, às vez, tem pessoas dentro [da comunidade do Abuí], que não

mora dentro da Reserva Biológica por causa da tirada do pessoal, que

na década de 79 foi criada a Reserva Biológica, com as 23 famílias, se

não tô enganado, se não me passa a memória, que morava dentro da

Reserva Biológica, foi criado em cima, na década de 80 jogaram com

eles de lá. Aí quando foi em 89 foi criado a Arqmo que começou lutar

mais pelos direitos dos remanescentes. Foi que foi melhorando um

pouco mais” (E 11, 2018).

A Arqmo possui a seguinte estrutura organizacional: I – Assembleia Geral; II –

Presidência da Assembleia Geral; III – Conselho Diretor; IV – Coordenação Executiva. A

Assembleia Geral é o poder soberano da Arqmo cabendo-lhe a orientação geral da Instituição

e eleger os membros do Conselho Diretor e selecionar a Coordenação Executiva. A

Assembleia Geral é presidida por um dos membros do Conselho Diretor, designado pela

própria Assembleia, que se reúne ordinária e obrigatoriamente a cada três anos ou,

extraordinariamente, sempre que necessário, mediante convocação do Conselho Diretor ou de

um quinto dos associados (ARQMO, 2018).

A Coordenação Executiva é um coletivo democrático responsável pela gestão

administrativa da Arqmo, onde todos os seus membros têm igual poder e responsabilidade na

promoção dos objetivos da instituição, não havendo um cargo de coordenação superior aos

demais. A Coordenação Executiva é composta por nove associados, sendo sete selecionados

pelas áreas, e cada área propõe ainda mais um nome para a seleção, sendo que dois desses

serão indicados pelo Conselho Diretor para dois dos cargos da Coordenação Executiva que

composta por: um coordenador administrativo; um coordenador de secretaria; um

coordenador de projetos; um coordenador de finanças; um coordenador de patrimônio; um

coordenador de mulheres; um coordenador de jovens; um coordenador de educação; um

coordenador de cultura. Cada coordenador é responsável por coordenar atividades inerentes à

sua coordenação, mas de forma articulada com as demais coordenações, sendo que as

decisões da Coordenação Executiva são tomadas por maioria simples de seus integrantes, e

caso um coordenador não concorde com a decisão tomada pela maioria, pode recorrer ao

Conselho Diretor para novo exame da matéria (ARQMO, 2018) (FIGURA 07).

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CONSELHO DIRETOR

UM REPRES ENTANTE

DO TQ BOA VISTA

UM REPRES ENTANTE

DO TQ ÁGUA FRIA

UM REPRES ENTANTE

DO TQ TROMBETAS

UM REPRES ENTANTE

DO TQ EREPECURÚ

COORDENAÇÃO EXECUTIVA

COORDENADOR

DE PROJETOS

COORDENADOR

DE SECRETARIA

COORDENADOR

DE PATRIMÔNIO

COORDENADOR

DE FINANÇAS

COORDENADORA

DE MULHERES

COORDENADOR

DE EDUCAÇÃOCOORDENADOR

DE JOVENS

COORDENADOR

DE CULTURA

ASSEMBLEIA GERAL

COORDENADOR

ADMINISTRATIVO

UM REPRES ENTANTE DO

TQ ALTO TROMBETAS I

UM REPRES ENTANTE DO

TQ ALTO TROMBETAS Ii

Figura 07 – Organograma da estrutura organizacional da Arqmo. Observe que na

estrutura organizacional da Arqmo não há uma coordenação que se sobreponha a outra.

Não há, por exemplo, a figura de um presidente. Geralmente, as decisões são resultado

de consenso, tanto ao nível do Conselho Diretor, quanto da Coordenação Executiva.

Fonte: ARQMO (2018). Elaborado pelo autor.

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A Arqmo contribuiu para a titulação dos territórios quilombolas no município de

Oriximiná: Boa Vista (1995), Água Fria (1996), Trombetas (1997), Erepecuru (1998), Alto

Trombetas 1 (2003, parcialmente titulado) e Cachoeira Porteira (2018) (MAPA 06).

Mapa 06 – Terras Quilombolas e comunidades quilombolas no município de Oriximiná

Fonte: FUNAI. Disponível em http://www.funai.gov.br; CPI São Paulo. Elaborado pelo

Autor.

Atualmente, a Arqmo desempenha papel de associação-mãe e representa 37

comunidades remanescentes de quilombos (FIGURA 08), que congrega as seguintes

associações de áreas/territórios quilombolas: Associação da Comunidade Remanescente de

Quilombo Boa Vista (ACRQBV), Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo

Água Fria (ACRQAF), Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do

Erepecuru (Acorqe), Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos da Área

Trombetas (Acorqat), Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos Mãe

Domingas, ACRQAT, Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo Ariramba

(Acorqa), AMOCREC-CPT (ARQMO, 2018)

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Figura 08 – Organograma das Associações de Territórios Quilombolas filiadas a Arqmo.

A Amocreq-CPT, por muito tempo, não atuava em ações conjuntas com a Arqmo,

entretanto, atualmente, devido aos projetos do Governo Federal de construção de

hidrelétricas em Cachoeira Porteira, a Amocreq-CPT tem realizado ações conjuntas com a

Arqmo, o que vem aproximando essas duas associações. Fonte: Pesquisa nos arquivos da

Arqmo (2018). Elaborado pelo autor.

Além de lutar pelo direito de propriedade da terra, a Arqmo surgiu também para lutar

contra as invasões e ameaças aos territórios e modo de vida quilombolas. Dentre essas lutas

pode-se destacar as lutas: contra a ocupação de terras quilombolas pela MRN; contra a criação

da Reserva Biológica do Rio Trombetas, que impediu o acesso dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil aos principais castanhais, que estão localizados nessa

unidade de conservação; as mobilizações para a saída dos patrões da castanha, os chamados

“donos dos castanhais”, do Lago Erepecu, atualmente localizado no interior da Reserva

Biológica do Rio Trombetas; e contra a edificação pela Eletronorte de uma vila em Cachoeira

Porteira e a abertura da BR 163, obras que antecediam a implantação da Hidroelétrica de

Cachoeira Porteira, no rio Trombetas (COMISSÃO PRÓ-ÍNDIO DE SÃO PAULO;

ARQMO, 2018).

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O papel da Associação Mãe Domingas

As comunidades localizadas no Território Quilombola (TQ) Alto Trombetas 1 e na

Floresta Nacional Saracá-Taquera estão organizadas em torno da Associação Quilombola

Mãe Domingas, afiliada da Arqmo. Em 2003, o Incra iniciou procedimento para titulação do

TQ Alto Trombetas, que após levantamentos mostrou ter 242.000 hectares, dos quais 104 mil

incidiam sobre a Reserva Biológica do Rio Trombetas (25% da unidade de conservação) e

64.000 hectares sobre a Floresta Nacional Saracá-Taquera (14% da unidade de conservação).

Em função deste conflito territorial foram titulados somente 80.000 hectares no entorno das

unidades de conservação federais em processo paralelo no Iterpa, que tem procedimento mais

simples para titulação. Entre as peculiaridades deste grupo de comunidades está a ocupação

da Reserva Biológica do Rio Trombetas com usos (não há moradias) e a participação de

alguns moradores nos trabalhos de pesquisa e conservação via contratação formal na base

Tabuleiro, do ICMBio, localizada da área de reivindicação (FONSECA, 2015).

As comunidades do Território Quilombola Alto Trombetas 2, localizadas no interior

da Reserva Biológica do Rio Trombetas e da Floresta Nacional Saracá-Taquera são

representadas pela Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Alto

Trombetas II (ACRQAT), afiliada a Arqmo. A ACRQAT é a responsável pela reivindicação

da titulação do Território Quilombola Alto Trombetas II. Em 2007, encaminhou ao INCRA a

solicitação de reconhecimento e titulação, mas até 2014 a área não possuía relatório de

identificação e delimitação (RTID). Após algumas modificações de limite e na denominação

do território, que atualmente chama-se Moura/Jamari/Último Quilombo, verificou-se que a

área total pleiteada soma 187 mil hectares, sendo 85 mil sobreposto a Floresta Nacional

Saracá-Taquera (19% da unidade de conservação) e 102 mil sobreposto a Reserva Biológica

do Rio Trombetas (25% da unidade de conservação). Os títulos reivindicados no interior da

FLONA nas áreas Alto Trombetas I e Alto Trombetas 2 se sobrepõem em parte às jazidas de

bauxita concedidas à MRN, em lavra ou reserva (FONSECA, 20015).

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5.2 ASPECTOS ATUAIS DO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS COLETORES

TRADICIONAIS DE CASTANHA-DO-BRASIL DA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO

TROMBETAS

5.2.1 Elementos Fixadores do Modo de Vida dos Quilombolas Coletores Tradicionais de

Castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas

Tipo de propriedade no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade

Último Quilombo

No que se refere ao tipo de propriedade exercida pelos quilombolas que coletam

castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, os resultados indicaram que os

territórios são de uso coletivo pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

que nele residem, conforme informado pelos Entrevistados 06, 09 e 10:

“Lá não têm esse negócio de dizer esse é meu. Não. Lá aonde você entrar, é mesmo

que ser aqui [no Território Mãe Domingas]. Aqui é, é..., como é... coletivo. Aqui

tem gente que já junta aqui atrás [apontando com as mãos para a ponta de castanha

atrás da sua casa]” (E 06, 2018).

(...)

“Eu sempre trabalho, assim, num lugar livre, assim, fora de onde o pessoal tá

trabalhando que tem as pontas pela beira na margem do lago e tem também as

pontas mais pro meio da terra. É pode tudo coletar, é coletivo mesmo isso aí” (E 09,

2018).

(...)

[...] “é tudo coletivo, cada um vai lá e tira [castanha-do-brasil] seu pouco e o que der

deu” (E 10, 2018).

Analisando-se as falas dos Entrevistados 06, 09 e 10, pode-se afirmar que o território

de uso coletivo é a base territorial da organização socioeconômica para a reprodução do modo

de vida dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que coletam na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, tanto dos que residem nas comunidades do TQ Alto Trombetas

1 quanto dos que residem na comunidade Último Quilombo. Nas comunidades do TQ Alto

Trombetas 1, assim como na comunidade Último Quilombo, é livre a circulação, pelos que

nelas residem, nas áreas de pesca, caça e coleta de produtos florestais não madeireiros

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Contudo, as famílias exercem, de forma particular, a posse sobre uma parte desse

território, geralmente, a casa, o quintal e as áreas de roça atual e antigas (capoeiras) e outras,

conforme o caso. O “direito privado” da unidade familiar sobre essas áreas e recursos se dá

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pelo respeito às regras locais e não por nenhuma divisão legal ou cartorial dos mesmos. Desse

modo, o acesso a essas áreas restritas por outros membros do território ou por pessoas

externas ao território deve se dar com a exclusiva anuência da família, a qual deve ser

solicitada com respeito a certas regras locais (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA,

2018/2019; CUMBUCA NORTE, 2017; CASTRO; ACEVEDO, 1998).

No caso de povos tradicionais que residem em unidades de conservação de uso

sustentável de domínio público11

, como a Floresta Nacional Saracá-Taquera, estes podem

obter a Cessão de Direito Real de Uso (CDRU) por meio do Contrato de Concessão de Direito

Real de Uso (CCDRU) realizado entre o ICMBio e as famílias residentes nessas áreas. O

CCDRU regulariza o uso da terra e o direito de moradia de acordo com o plano de uso,

podendo estabelecer um limite de tempo para esta posse e não permite a venda, apenas a

transmissão hereditária. Além disso, permite a inserção de políticas públicas que contribuirão

para o fortalecimento socioeconômico das comunidades tradicionais (E 17, 2018).

Contudo, as unidades de conservação de proteção integral federais, como a Reserva

Biológica do Rio Trombetas – também de domínio público – não possuem dispositivos legais

para regularizar o uso da terra e o direito de moradia nessas áreas.

Tipos de casas construídas pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

brasil que residem no TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

No que se refere aos tipos de casa construídas pelos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil que residem no TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último

Quilombo os resultados indicaram que, atualmente, a maior parte das casas construídas no TQ

Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo é do tipo palafita (FIGURA 09).

11

Propriedade exercida pelo Estado, que tem o domínio da terra, ou seja, as faculdades de gozar, usar, dispor e

reaver a propriedade.

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127

Figura 09 – Casas na microrregião Alto Trombetas. À esquerda, casa construída em paredes e

assoalho de madeira na Comunidade Último Quilombo. À direita, casa construída com palha

retirada da floresta na Comunidade Última Quilombo, localizada na Reserva Biológica do Rio

Trombetas. Fonte: PICANÇO (2019).

As casas são construídas próximo às margens de rios, lagos e igarapés, possuindo uma

relação com os sistemas ecológicos aos quais estão integrados que extrapola o espaço que

circunda a casa e invade o espaço da floresta e dos corpos hídricos (FIGURA 10)

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

Figura 10 – Casa construída próxima a floresta no TQ Alto Trombetas 1. A casa está

praticamente inserida na floresta que a circunda, com destaque para as castanheiras, as

árvores de maior porte. Fonte: PICANÇO (2018).

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Em torno da casa, no chamado quintal, cultivam-se as plantas de usos medicinais

(FIGURA 11) e criam-se galinhas, patos e porcos. Num outro círculo mais amplo

desenvolvem o cultivo de tubérculos, plantas frutíferas e verduras, constroem casas de

farinha, galinheiros e paióis para depositar a castanha ou outros produtos. As casas

apresentam áreas de quintais e roçados relativamente próximos (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2019; STCP, 2014).

Figura 11 – Quintais de casas na comunidade Último Quilombo, lago Erepecu, na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, no TQ Alto Trombetas 2, Oriximiná, Pará. À esquerda roça

próxima ao quintal da casa e à direita quintal com plantas ornamentais e medicinais. Fonte:

PICANÇO (2018)

Antes da criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas, segundo Castro e Acevedo

(1998), as casas dos quilombolas do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo

eram construídas com material extraído da floresta, como madeira e palha, dando um caráter

de provisoriedade, podendo permanecer uma de suas paredes laterais abertas ao vento

(CASTRO; ACEVEDO, 1998). Atualmente, os quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que coletam na Reserva Biológica do Rio Trombetas encontram

dificuldades para extrair madeira e palha de seus territórios, tanto os localizados no interior da

Reserva Biológica do Rio Trombetas, quanto os localizados no entorno imediato dessa

unidade de conservação, conforme informado pelo Entrevistado 14.

Porque naquelas alturas a gente podia lavrar uma madeira, partir um pau pra uma

estaca pra vender, tirava um cipó, tirava uma coisa pra tá vendendo [...] Aqui o

pessoal vive muito pra fazer madeira. Fazer essas coisas, vender peça, trabalha com

peça, mas não pode levar. E aí pra mim, eu enxergo que falta melhorar. [...] Olha, as

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peças, você pode levar pronto. No caso levar um remo, levar um casco pra vender

pra Oriximiná, você pode levar, tudo já pronto. Agora, se você pegar uma ripa dessa

aqui... Agora, eu pergunto: porque? Não é a mesma madeira? (E 14, 2018)

Atividades produtivas e renda dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

brasil do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo

Os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem nas

comunidades do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo vivem de

agricultura e extrativismo (pesca, caça e produtos florestais não madeireiros – principalmente

da castanha-do-brasil. Tais atividades são influenciadas pelos períodos de cheias e secas dos

rios. No período chuvoso, denominado localmente de “inverno”, que vai de dezembro a maio,

os coletores tradicionais de castanha-do-brasil dedicam-se a coleta da castanha-do-brasil,

sendo que muitas famílias passam, então, a residir temporariamente nos castanhais. No

período de junho a novembro, após a coleta da castanha, os quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil dedicam-se ao trabalho intensivo na roça, uma das principais atividades

produtivas, e a mais permanente do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo.

No entanto, essa atividade não é exclusiva desse período, pois, concomitantemente ao

trabalho na roça, extraem-se produtos florestais e pratica-se a caça e a pesca, sendo que estas

últimas são praticadas durante o ano todo (OBSERVAÇAO SEMIESTRUTURADA,

2018/2019).

Neste contexto, os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

trabalham na produção de produtos, sejam eles provenientes do extrativismo ou da pequena

agricultura familiar e, posteriormente, vendem esses produtos, e com o dinheiro da venda,

adquirem o que não produzem, como roupas, instrumentos de trabalhos e produtos

alimentícios (OBSERVAÇAO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Desse modo, dentre as atividades produtivas realizadas pelos quilombolas é necessário

diferenciar quais são praticadas para o sustento e quais são praticadas para a obtenção da

renda. Os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da microrregião Alto

Trombetas praticam a agricultura tanto para o próprio sustento quanto para a comercialização

e obtenção de renda, enquanto o extrativismo é mais praticado para o sustento, a exemplo da

caça, pesca e extração de produtos florestais não madeireiros, com exceção da coleta da

castanha-do-brasil, açaí – permitidos pelo ICMBio em áreas da Reserva Biológica do Rio

Trombetas – que são destinados para a comercialização (OBSERVAÇAO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

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Dentre as atividades praticadas para o próprio sustento, a maior parte das famílias

quilombolas Edas, 95%, pratica a pesca, 87% praticam a agricultura e 81% praticam o

extrativismo (GRÁFICO 01). Esses dados evidenciam a dependência dos quilombolas aos

recursos do território aos quais estão vinculados, para os quais este é uma porção da natureza

e espaço que lhes fornece os meios de reprodução do modo de vida. Por isso, reivindicam a

garantia a todos, ou a uma parte de seus membros, direitos estáveis de acesso, controle ou uso

sobre a totalidade ou parte dos recursos naturais existentes nesses espaços (DIEGUES, 2001).

Gráfico 01 – Atividades produtivas praticadas para o sustento

87%

13%

Família pratica a agricultura?

Sim

Não

95%

5%

Família pratica a pesca?

Sim

Não

81%

19%

Família pratica o extrativismo?

Sim

Não

Fonte: ARQMO (2018)

Atualmente, no TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo somente são

permitidas, pelo ICMBio, a caça e a pesca de “subsistência” para fins de sustento, pois são

práticas consideradas tradicionais por esse órgão gestor, se constituindo em fontes de

proteínas que compõem a dieta alimentar dos quilombolas desde que estes se estabeleceram

no vale do rio Trombetas em meados do início do século XIX.

A pesca no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

A pesca nem sempre esteve restrita apenas ao sustento dos quilombolas do Território

Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo. Segundo Castro e

Acevedo (1998), no período compreendido de meados do século XIX até a implantação da

Reserva Biológica do Rio Trombetas, a pesca comercial foi muito importante no vale do rio

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Trombetas, principalmente a pesca do pirarucu, que submetido ao processo de salga e

secagem ao sol, era muito consumido pelos negros nas longas viagens empreendidas nas

florestas, na travessia de cachoeiras e lagos, durante o trabalho nos castanhais, constituindo

ainda forma de renda monetária. Até a implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas

as “mantas de pirarucu seco”, denominadas de “postas” pelos quilombolas, figuravam como

um dos produtos mais importantes na economia regional, sendo sua venda realizada em

Oriximiná e Óbidos, ou comercializada diretamente com os regatões (CASTRO; ACEVEDO,

1998).

Apesar da pesca, principalmente a pesca do pirarucu, ter sido importante

comercialmente no TQ Alto Trombetas 1, atualmente, esta atividade não é realizada com fins

comerciais no TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo, pois tal modalidade

de pesca é proibida pelo ICMBio, tanto na Reserva Biológica do Rio Trombetas quanto na

Floresta Nacional Saracá-Taquera, sendo permitida somente a pesca para o sustento das

famílias que residem nos territórios da microrregião Alto Trombetas. A pesca como meio de

sustento é praticada por 95% dos quilombolas (Gráfico 01), sendo realizada durante o ano

todo, embora seja mais intensiva no período do “verão” amazônico quando os rios, igarapés,

paranás, furos e lagos estão com os seus níveis volumétricos muito baixos, o que contribui

para uma maior concentração de peixes em seus leitos, facilitando, assim, a atividade de

pesca.

As técnicas mais utilizadas na pesca foram desenvolvidas acumulando-se

conhecimentos tradicionais por várias gerações, destacando-se a pesca de caniço, de linha

comprida, de arpão, de zagaia, de malhadeira (menos usada), cujos utensílios são referidos

nos relatórios de viajantes desde fins do século XIX (ACEVEDO; CASTRO, 1998). Os

equipamentos utilizados na pesca são confeccionados pelos quilombolas, conforme as

condições naturais e a espécie a ser pescada. Dentre os principais petrechos de pesca

confeccionados pelos quilombolas podemos destacar: a malhadeira, o caniço e a zagaia.

A caça no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

A caça de animais silvestres, apesar de ser proibida por lei, é fonte de alimento para os

quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil do TQ Alto Trombetas 1, assim

como da comunidade Último Quilombo. Em 2006, por exemplo, na comunidade Último

Quilombo, a média mensal de indivíduos abatidos por família era de 5,8. “No que se refere à

quantidade registrou-se um número de 104 indivíduos caçados por mês na área de utilização

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da comunidade” (MMA, 2006, p. 210). Nesse contexto, a caça é permitida pelo ICMBio, pois

essa prática é considerada tradicional e compõe a dieta alimentar dos quilombolas desde que

estes se estabeleceram no vale do rio Trombetas em meados do início do século XIX. Dentre

os animais silvestres mais utilizados na alimentação quilombola se destacam: pacas, cutias,

veados, porcos do mato, macacos, jabutis, a tartaruga-da-amazônia e outros quelônios.

Segundo Acevedo e Castro (1998), nos discursos dos quilombolas da microrregião Alto

Trombetas:

“são constantes as referências sobre a tartaruga-da-amazônia e o papel que esta

ocupou como alimento preferencial do grupo. Povoa sua memória e remete ao modo

de vida construído pelos antigos, para os quais seu consumo representava elementos

simbólicos nos ritos e celebrações da vida social. Compondo o campo mítico e

político nas expressões sobre os animais do rio, o escavador das lembranças remete

às interações mantidas com a natureza, quando participavam das virações das

tartarugas-da-amazônia no tempo de desova. Consideram essa interferência dos

antigos na reprodução da espécie como uma forma equilibrada de manejo somente

possível pela observação permanente sobre o seu ciclo de vida. Essa prática corrente

na Amazônia, provavelmente, foi assimilada da cultura indígena. "De 1885 a 1894

entravam oficialmente em Belém 123 toneladas de manteiga oriunda de ovos de

tartaruga-da-amazônia" (Ciências Hoje, Vol. 9, nº. 46, 1989). Esse quelônio

abasteceu de proteínas várias gerações no vale do rio Trombetas, tendo sido

acumulado conhecimentos sobre seu hábitat e formas de manejo tradicional

(ACEVEDO; CASTRO, 1998).

Contudo, segundo o Cumbuca Norte (2017), a importância da caça como fonte de

alimento parece ter decaído diante das restrições de uso das áreas sob a gestão da Reserva

Biológica do Rio Trombetas e da Floresta Nacional Saracá-Taquera, devido, principalmente a

presença vigilante do ICMBio e das penalidades aplicadas a quem transgride as leis

ambientais.

É importante ressaltar que a denominada “caça de subsistência” não encontra amparo

na legislação vigente, sendo que a Lei nº 9.985 de 18 de julho 2000 (SNUC), por exemplo,

apenas prevê a realização de estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico

sustentável de recursos faunísticos nas Reservas de Fauna. No entanto, até o momento atual

nenhuma unidade de conservação desta categoria de manejo foi criada no Brasil (FONSECA

et al., 2017).

Além disso, o SNUC também estabelece que as unidades de conservação de uso

sustentável – tais como Resex, RDS e subsidiariamente as Flonas – têm como um dos

objetivos assegurar os modos de vida tradicionais e o acesso ao uso de recursos naturais pelas

famílias que nelas vivem. E não há como dissociar o uso dos recursos naturais e a manutenção

dos modos de vida tradicionais da atividade de caça, tendo em vista que a chegada do homem,

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como no caso da Amazônia, se confunde às atividades mais basais de sustento e obtenção de

proteína animal, o que obviamente incluem a caça e a pesca (FONSECA et al., 2017).

Por não tratar especificamente destes temas em seu conteúdo, a Lei nº 9.985 de julho

de 2000 (SNUC) demanda naturalmente novos subsídios legais que a complementem,

tratando especificamente das atividades que impliquem no uso da fauna e promovam o seu

manejo adequado e em bases sustentáveis. Nas unidades de conservação de proteção integral,

nas quais a permanência dos povos tradicionais não é permitida, porém há povos tradicionais

residindo, como é o caso da Reserva Biológica do Rio Trombetas, é necessário oferecer as

mínimas condições para que esses povos mantenham os seus modos de vida tradicionais, o

que inclui a caça e a pesca, atividades mais basais de sustento e obtenção de proteína animal

para os quilombolas do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo (FONSECA

et al., 2017).

Práticas agrícolas no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade Último

Quilombo

No TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo, a agricultura familiar é

praticada nas roças (FIGURA 12), uma das principais atividades produtivas e a mais

permanente no calendário anual agroextrativo do TQ Alto Trombetas 1. Segundo Garcia Jr.

(1983, p. 111) a roça:

é o produto do trabalho coletivo da família, (...). É no roçado que a família se

materializa enquanto unidade de produção. É através dele que a família obtém os

meios necessários para se reproduzir. O produto do roçado serve para abastecer a

casa direta ou indiretamente (GARCIA JR., 1983, p. 111).

Assim, além de atender as necessidades familiares dos quilombolas, a roça também

produz para a comercialização intracomunitária e também na Feira Comunitária, em Porto

Trombetas e na cidade de Oriximiná, conforme informado pelos Entrevistados E 12, 2018:

“ [Roças] só faz pro consumo, não faz, assim, pra dizer, vai comerciar, é só pro

consumo. Pra comerciá, fica difícil já. Não tem mercado. A terra aqui, praticamente

desde a beira da casa é boa. Tudo que você planta tem, mas o mercado que é difícil.

Aqui não adianta uma dizer: a minha é diferente, que é difícil. Quase todas, as

comunidades mais complicadas é aquelas que moram lá dentro da REBio, da

Reserva mesmo, aí elas já tem mais complicação. Só pro sustento. Aqui não tem

outra coisa pra dizer, não, eu vou fazer isso aqui que... Só a castanha... Aqui mais

próximo tem uma comunidade que eles já façam, assim, roçado pra comercializar,

mas assim, comercializar não. Eles vendem uma farinha, eles vendem até aqui pra

nós. E, às vezes, eles levam pra cidade alguns sacozinhos. É, ali no Mãe-Cué, onde

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vocês vão, eles já façam uma farinha pra..., assim, não é comercializar, é pra

desenrascar algumas pessoas. Tem o limite de tipo de roçado, dá pra fazer, não

tem... [...]. Pode plantar o que quiser, menos campo que não tá sendo liberado pra

plantar campo, pra gente passar com gado pra cá” (E 12, 2018).

Figura 12 – Roças na microrregião Alto Trombetas. À esquerda roça na comunidade Último

Quilombo, no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. À direita roça na

comunidade do Abuí, TQ Alto Trombetas 1, com destaque para as castanheiras no meio do

roça, única árvore que não é derrubada durante a fase do roçado. Nas duas figuras é possível

observar o cultivo de mandioca, que ocupa a maior parte da roça, assim como também

alguns pés de abacaxi. O trabalho na roça é realizado durante o ano todo, com exceção do

período da coleta da castanha, no qual os quilombolas se dedicam exclusivamente a coleta

desse produto. Fonte: PICANÇO (2018)

No TQ Alto Trombetas 1, os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

decidem, juntamente com a comunidade, os tamanhos das roças, de acordo com as

necessidades das famílias. Por outro lado, na comunidade Último Quilombo, que está

sobreposta a Reserva Biológica do Rio Trombetas, os quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil possuem autorização do ICMBio para cultivar até 01 hectare de roça, o que

equivale a uma quadra, medida agrária utilizada pelos quilombolas da microrregião Alto

Trombetas. A maior parte da quadra é destinada ao cultivo da mandioca, principal cultura

cultivada na roça, sendo utilizada, principalmente, na produção de farinha de mandioca ou

farinha d’água, farinha de tapioca e beijus. Além da mandioca, os principais produtos

cultivados pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil são: macaxeira,

banana, abacaxi, cará, batata-doce, jerimum e outros. Tais produtos são cultivados tanto para

o próprio consumo como para a comercialização, conforme informado pelos Entrevistados 03,

04, 05, 06, 08, 09, 10, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 25, 26 e 27:

É uma fonte de renda, né? Antigamente, a gente tinha roça, o meu marido tinha roça.

Nós tinha muita roça, até bananal nós tinha, cana, Hoje, em dia, como tô lhe

dizendo, por causa de fatalidade da minha vista. A gente tem, a gente faz os roçados,

mas não é os roçados tão grandes, até mesmo por causa do ICMBio, né. De uma

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quadra que eles liberam, mas no momento nos fizemos com o meu esposo um

roçado, a gente fez um bananal, plantou uma roça, só que essa terra do Erepecu,

aqui, ela não é uma terra muito boa, assim, pra mandioca, ela apodrece muito a terra.

E também pra você acertar assim, numa ponta, que não tenha castanhal é difícil,

porque aqui é castanhal. Pra todo lado tem castanheira aqui, pra você achar é meio.

Então pra você achar uma área limpa, que não tenha castanheira é meio difícil. Isso

aqui porque é uma capoeira. Aqui, ela é uma terra preta. É uma ponta aqui, ela não é

uma ilha, ela é uma ponta, é um bico de ponta. E aí isso aqui é uma capoeira. Isso

aqui todo ano a gente faz melancial aí. Olha, mas cerra desconforme aqui, terra

preta, que cê olha isso aqui parece que nunca foi roçado. A capoeira que taí. Aí todo

ano a gente roça. Desde quando eu morava com meu pai ele fazia roçado aqui pra

plantar melancia. Aí depois que eu casei, que eu arrumei marido, continuei aqui, não

saí, aí a gente faz com meu esposo, todo ano a gente faz melancia aí. Roçado pra

melancia. É, aqui, a gente planta só melancia aqui. Não, horta a gente nunca teve.

Este ano que a gente ta planejando, ele ate disse que de tudo certo, nós vamos fazer

uma horta. A gente tá planejando porque... Fazer, mesmo que só plantar, né, se é pra

gente tá só comprando. Eu tenho umas plantinhas por aí medicinais, de remédio.

Fazer chá caserio, eu tenho umas plantinhas aí. Eu tenho paregórico ali, eu tenho

anador pra li, bem perto daquela planta, que aquela flor, aquilo é anador” (E 25,

2018).

(...)

[...] “"Nós faz a roça, faz a farinha, planta banana, macaxeira. Só pro consumo

próprio. Somente pra isso” (E 03, 2018).

(...)

“Uma época dessa [mês de agosto] é mandioca, farinha” (E 04, 2018).

(...)

[...] “negócio de roça [...] Pra mim é todos dois juntos (risos). Porque as vez quando

eu tenho que ir pra roça, eu tenho que pedir pra alguém ficar no meu lugar pra mim

poder trabalhar, né? Às vezes, plantar, ou fazer a farinha. Aí, mas lá na escola tem

que ter um” (E 05, 2018).

(...)

“Olha, é a farinha... eu faço roçado” (E 06).

(...)

“Cara, ela não foge quase nada dos outros. Nós aqui, posso até dizer assim, nós, que

a maioria da comunidade, eles vivem da questão da agricultura” (E 08).

(...)

“Agricultura o ano todo” (E 09).

(...)

“A gente trabalha com cultura, com negócio de roça, mas é mais pra consumo.

Assim, no período logo que a gente chega é mais difícil. Só que eu vim pra cá com a

minha tia que, como dizer, que agora eu considero como mãe. E aí nesse período eu

não ainda não tinha essa parte do consumo” (E 10, 2018).

(...)

“Olha, na época é a castanha. É roçado, tirar a castanha... O principal mesmo é a

castanha e o roçado” (E 13, 2018)

(...)

“O melhor que a gente tira é a castanha [...] Aqui a gente veve de mandioca, de

madeira, de produ... desse negócio de produção de castanha, copaíba. Tudo isso, a

copaíba, porque o pessoal eles estão se utilizando muito e tenham precisão. Aí, eles

estão, até já um bocado param de tá se arriscando, pescando, como eles [ICMBio]

chamam de roubo. Se é roubar, muitos já deixaram pra tirar copaíba, mas,

infelizmente pra Reserva não pode entrar. Só liberam pra castanha” (E 14, 2018).

(...)

“Mais agricultura né” [...] (E 15, 2018).

(...)

“Porque eu volto a dizer a nossa tradição, ela nos segura, ela nos restringe, né. Aí

você diz: mas explica isso melhor. Nós moramos pra cá. Somos acostumados pescar,

a pegar algo pra se alimentar, mas não somos acostumados em fazer roçado grande

como eu falei aqui anteriormente, e coletar grandes produtos e levar pra vender na

Feirinha” (E 16, 2018).

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(...)

“Tem pessoas que produz banana, macaxeira, farinha. [...] Olha, tu faz uma roça,

primeiro ano deu, outro ano ela apodrece. Aí, a pessoa faz a banana, só que nem

todos tem banana hoje, e nem todos tem roça hoje. O que acontece... os que tem

roça, mas é pouca. [...] Quando a gente planta na roça, a gente planta maxixe,

banana macaxeira mandioca mesmo tudo isso, a gente planta também aqui perto da

casa se for ver tem a macaxeira tem uma banana, mas não é roça. [...] Sobre a

agricultura só a castanha e a farinha que pode ser comercializado” (E 17, 2018)

(...)

“A gente tem essa cultura que a gente mantem aqui dentro da nossa comunidade

quilombola. A gente também mexe com roças. Muitos dos moradores aqui tem seu

bananal, tem sua mandioca. Outro mexe seu roçado só com a banana e assim a gente

também, eu também tenho até fica aqui no canto dessa cabeceira, aqui que ele sabe.

Então, eu tô mexendo hoje em dia, já mexi e vou continuar agora se Deus quiser a

partir de dezembro como eu tô lhe falando se eu tiver aqui, né?, mas agente mexe

com roça, com mandioca, abacaxi também. É cana, outro tipo de plantação, cupu.

Tudo isso a gente planta aqui também no nosso trabalho” (E 18, 2018).

(...)

“Sobre a questão de roça a gente planta aqui é a maniva pra fazer a farinha mesmo

né? Farinha, banana, macaxeira” (E 19, 2019).

(...)

“Só mesmo um beiju, farinha de macaxeira... [...] Castanha, mandioca, macaxeira,

melancia, abacaxi, banana. [...] O Marcelo liberou [a coleta do açaí], não sei se ela

vai liberar [nova gestora da RBRT]” (21, 2019).

(...)

“A gente tem uma rocinha no nosso terreno. A gente planta mandioca, macaxeira,

abacaxi, laranjeira, coqueiro, coco tem lá. As planta caseira medicinais já não tem

muito” (E 26, 2019).

(...)

“Nascemos e se criamo trabalhando em roça e tirando castanha. [...]” (E 27, 2019).

A roça é muito importante na produção dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil, tanto que há caso de quilombola que mantem a roça na comunidade de

onde é oriundo, mesmo trabalhando na MRN, conforme informado pelo Entrevistado 27,

2019:

“Olha, no Moura ainda tem bastante gente que trabalha em agricultura ainda. Tenho

um sobrinho que ele trabalha na empresa [MRN], mas quando é na época do verão,

de botar roçado, ele não pode, mas ele paga pra fazer. Quando é no tempo da

planta... “(E 27,2019).

Extrativismo de produtos florestais não-madeireiros no Território Quilombola Alto Trombetas

1 e na comunidade Último Quilombo

Dentre os principais produtos provenientes do trabalho de coleta nas florestas do TQ

Alto Trombetas 1, se destacam o açaí, a castanha-do-brasil, a bacaba e as chamadas plantas

medicinais bacaba, plantas medicinais, palhas, cipós, breu, cumaru, sementes, copaíba, mel,

andiroba, leite de amapá etc. (GRÁFICO 02).

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Gráfico 02 – Principais produtos provenientes do trabalho de coleta do TQ Alto Trombetas 1

11%11%

22%25%

28%29%29%

31%34%

47%62%

67%73%74%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80%

Outros

Andiroba

Copaíba

Cumaru

Cipós

Plantas medicianis

Castanha

Quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

Pro

du

tos d

o t

rab

alh

o d

e c

ole

ta

Fonte: ARQMO (2018)

Contudo, dentre esses produtos coletados na Reserva Biológica do Rio Trombetas

somente é autorizada a coleta, para fins de comercialização, da castanha-do-brasil e do açaí. A

coleta da castanha-do-brasil pelos coletores tradicionais de castanha-do-brasil na Reserva

Biológica do Rio Trombetas e nas áreas a montante dessa unidade de conservação é

autorizada por meio de Termo de Compromisso firmado entre o ICMBio e as associações

representativas das comunidades remanescentes de quilombos, enquanto a coleta do açaí para

a comercialização é autorizada por meio de acordos informais. A coleta dos outros produtos

somente é autorizada pelo ICMBio para as finalidades de sustento dos quilombolas que

residem nessas comunidades, sendo autorizadas por meio de acordos informais realizados

entre as associações representativas dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

brasil e o ICMBio (INFORMAÇÕES VERBAIS, 2019).

Dentre as atividades extrativistas, a coleta de castanha-do-brasil foi indicada na

pesquisa de campo do ECQ (Cumbuca Norte, 2017) como a principal fonte de renda, além de

ser uma tradição local que envolve famílias inteiras que chegam a passar em torno de quatro

meses por ano nos castanhais.

Em relação ao extrativismo de produtos florestais (Gráfico 106), observou-se que

88% dos comunitários que responderam à questão, coletam castanha. Foi verificado

nessa comunidade um percentual de 28% para o óleo de copaíba e 28% para o Açaí.

A seguir observam-se os cipós com 4% e o Breu com 4% e o óleo de Andiroba

também com 6,7%. O açaí aparece com 4,4% da preferência e o Ubim com 2,2%.

(MMA, 2006, p. 209).

A extração do óleo de castanha é uma prática que tem resistido ao tempo na

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comunidade. Além da castanha-do-pará, outros gêneros florestais são extraídos para uso

próprio e comercialização: madeiras, cascas, resinas, óleos, sementes, palhas, cipós, talas e

frutos diversos para alimentação.

A divisão social do trabalho no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade

Último Quilombo

No que se refere a divisão social do trabalho por sexo e idade, os resultados indicaram

que os homens da unidade familiar e do grupo familiar, geralmente, se dedicam as atividades

de caça, pesca, derrubada, plantio e limpeza dos roçados, confecção de instrumentos de

trabalho, mas observou-se que não há exclusividade masculina no desenvolvimento dessas

atividades. A atividade de caça é tarefa reservada aos homens, enquanto a pesca, apesar de ser

mais praticada pelos homens, na ausência destes, as mulheres também a praticam, ou ainda,

assim como as crianças, auxiliam na realização dessa atividade.

As atividades de extrativismo vegetal também estão perpassadas por uma divisão do

trabalho entre homens e mulheres. Os homens são responsáveis pela coleta dos produtos nas

florestas, mas esta não é uma atividade exclusiva destes. A extração de copaíba, por exemplo,

é realizada por homens, pois o coletor precisa percorrer extensas áreas na floresta, chegando a

se ausentar do local de moradia por até dois dias. Já a coleta da castanha-do-brasil é realizada

pela unidade familiar, onde homens, mulheres e crianças, estas, geralmente, a partir dos onze

anos de idade, coletam castanha. As mulheres jovens e adultas e as crianças, geralmente

coletam nos castanhais mais próximos do seu lugar de moradia, enquanto os homens jovens e

adultos coletam nos castanhais mais distantes, conforme informado pelos Entrevistados E19,

E20, E21, E25, E27:

“Aqui mulheres coleta também, homem e mulher coleta castanha. Tem mulher que

coleta mais do que homem ainda. Tem umas aí que são piores do que os homens

para tirar a castanha” (E 19, 2019).

“Aqui as mulheres também coleta Castanha. [...] As mulherada que vão lavar. Não, é

eu que vou limpar é eles lá que vão lavar. Gera emprego pra outras pessoas. Quando

não vêm uma sócia, aí entra outra sócia, né. Foi assim que minha irmã entrou nela, a

sócia não veio e ela entrou” (E 20, 2019).

“Tem, os homens montam, organizam, no caso, as mesas aí para a gente e eles vão

buscar para nós lá na floresta e as mulheres ficam lavando enquanto eles vão buscar

nós estamos arrumando beneficiando ela. Quando eles chegam, a gente toma conta,

lava, limpa, enxuga, ensaca. Então, a tarefa dos homens mais é no mato e na

organização da mesa de que a gente vai usar né? Algumas coletavam castanha,

coletoras né? Até hoje a gente coleta, mas a gente já fica mais em casa porque já fica

o trabalho dividido, mas a gente ainda vai lá” (E 21, 2019).

“[A senhora coleta castanha?] Olha, eu mesmo, algumas vezes que eu vou com meu

esposo, mas não coleto assim direto, mais é ele, meu filho mais velho. Mas eu vou

sempre, quando dá. Às vezes eu vou, não é todo dia que eu vou. O meu menino mais

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velho, ele ajuda o pai dele trabalhar”(E 25, 2019).

“Mas, eu não parava. Pescar, então. Quando eu vinha da coleta da castanha, eu já

vinha com o peixe. [Aqui no Último Quilombo, as mulheres pescam?] Pescam,

coletam. Eu amontava castanha bem aqui, embaixo desse cajueiro. Teve uma vez

que o Badu quebrou onze caixas e meia. Aí depois eu ajuntei mais, ele carregava lá

da canoa pra mim. Eu disse, esse monte aqui é pra eu tirar óleo. Eu tirei doze litros

de óleo, mas era muito bonito. Eu vendi no barco indo pra Oriximiná e o resto eu

vendi em Oriximiná que era encomenda. Naquela época era 15 reais [vendeu nos

barcos de linha]. Um óleo muito lindo. É muito gostoso, natural. Não fazem mais. A

gente descasca, rala ela, coa ela, deixa pro outro dia, aí amanhece aquela nata por

cima assim. Aí, o óleo chega tá boiando, assim, aí a gente tira tudinho, botando na

panela que vai fritar. Quando terminar, bota pra fritar, quando ele tá apurando ele vai

ficando vermelho. [Muita gente fazia isso?] Todo mundo. Ninguém comprava óleo.

Eu vim comprar óleo depois que eu fiquei mesmo mau da coluna, que eu não pude

mais fazer, mas eu não comprava, lavava pras minhas filhas, mandava pra Manaus,

pra minha mãe, pra minha irmã. [Quanto a divisão do trabalho na roça, o que o

homem faz e o que a mulher faz?] Olha quando a gente tá plantando, o homem vai

cavando, a mulher vai semeando a maniva. Aí depois, ele terminar de cavar, ele veio

ajudar a mulher plantar. Na colheita ele arranca, como eu não posso mais arrancar

né? Aí eu vou decotando, tirando a mandioca da cepa. [A etapa de derrubada do

roçado é atividade exclusiva dos homens]”(E 27, 2019).

Mas é na organização do trabalho da roça que a divisão de tarefas entre homens e

mulheres é mais visível. Embora seja importante na maximização e na economia de esforços,

essa divisão traduz outro elemento funcional ao seu modo de vida: a integração de todos os

membros da família na sua auto reprodução. Uma vez que a preparação do roçado é

estritamente atividade masculina, o trabalho familiar se estende pelas fases de plantio, capina

e colheita. Esta última não corresponde a um período particular, mas alonga-se por todo o

ano, pois raízes, cereais e mesmo frutas são colhidos de acordo com as necessidades de

sustento, em pequenas quantidades.

Segundo Castro e Acevedo (1998), na década de 1990, a técnica do “puxirum” era

muito utilizada pelos quilombolas da microrregião Alto Trombetas, principalmente nos

trabalhos de preparação da roça. Contudo, com base em pesquisas realizadas mais

recentemente, como os estudos realizados por Scaramuzzi (2016) e Farias Júnior (2016), é

possível inferir que a prática do “puxirum”, atualmente, quase não é mais utilizada, pois esses

autores não tratam sobre o “puxirum” nas suas etnografias sobre os quilombolas castanheiros

tradicionais da microrregião Alto Trombetas.

Atualmente, apesar dos grupos familiares quilombolas ainda manterem o seu modo

de produção baseado na organização do trabalho familiar, as práticas coletivas e cooperativas

de ajuda mútua, a nível comunitário e intercomunitário, como o “puxirum”, por exemplo, são

pouco utilizadas.

Além disso, muitos estudos, como o Estudo do Componente Quilombola (Cumbuca

Norte, 2017) tratam “puxirum” e mutirão como sinônimos, mas na verdade são termos que

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possuem significados diferentes, pelo menos para os quilombolas das áreas pesquisas neste

estudo de caso. O “puxirum” é uma técnica de organização do trabalho muito utilizada entre

os povos tradicionais amazônicos para as suas produções, onde se tem a divisão de tarefas

entre os membros da comunidade – no caso da Reserva Biológica do Rio Trombetas entre os

membros do grupo familiar, da comunidade ou de várias comunidades – buscando-se a

maximização e a economia de esforços na execução das tarefas, principalmente, na

preparação da roça que possui quatro fases principais: a derrubada, o plantio, a capina e a

colheita, ou em outros termos, acesso ao recurso natural, estratégia, domínio das técnicas,

trabalho territorializado, geralmente com penosidade devido aos instrumentos técnicos serem

rústicos e limitados e baixa capacidade de gerenciamento de capital e de agregar valor para

aumento de renda assim como, capacidade de gerar renda, mas baixa capacidade de

territorializar a renda em forma de melhorias socioeconômicas e técnicas entre outros. Já o

mutirão, termo inserido nas comunidades quilombolas pela Igreja Católica, é utilizado na

realização de trabalhos coletivos relacionados, principalmente, aos equipamentos públicos da

comunidade, como consertos e reparos da capela, do barracão de festas, além dos trabalhos

relacionados às festas de santo comunitárias, como podemos observar no trecho da E 25:

“Olha, sobre “puxirum”, agora chamam de mutirão. Antes, era “puxirum” mesmo,

agora chamam mais de mutirão. A gente faz o mutirão sim, faz no templo da

comunidade, faz na comunidade, todo mundo se reúne vai pra lá. Na Igreja também

tem o dia do mutirão, a gente se reúne” (E 25, 2019).

Confirmamos, por meio dos dados coletados em pesquisa de campo (Entrevistas e

observação), que, atualmente, os quilombolas castanheiros tradicionais, raramente, utilizam o

“puxirum”, conforme informado pelos Entrevistados 19, 20, 21, 23, 24, 25, 27, 27:

“A questão do puxirum para falar a verdade aqui, às vezes, tem um puxirumzinho.

Ainda existe de vez em quando existe, é mais pra roça, não acabou ainda” (E 19,

2019).

(...)

“Aqui o puxirum, né, aqui pra nós aqui, a gente aqui de casa não faz, mais é difícil

também os outros chamarem. Só assim quando é amigo né, a gente ajuda quando é

parente, mas não é como era antes” (E 20, 2019).

(...)

“[E sobre o puxirum?] Ainda tem, pouco, mas a gente faz. É nosso costume” (E 21,

2019).

(...)

“[A questão dos puxiruns?] Tudo isso acabou, né, mas se reunia muita gente. E hoje

vai um, dois. Vai acabando aquela união: (E 23, 2019).

(...)

“[Puxirum ainda existe?] Não. Hoje em dia é na diária, na empleita, tu faz teu

roçado. Deixa eu dizer uma coisa pro senhor, a maioria dos quais gostavam de

trabalhar já estão velho, a maioria já estão idoso. Olha, esse aqui não pode mais

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trabalhar. O Pindoba ainda anda mas tem problema de coluna. O Raimundo Açúcar

também tem problema de coluna, uns já morreram, o avô dele [do guia de campo],

sempre a gente fazia, né. Seu Armando também já morreu, Civico. A turma nova,

uns trabalham na escola, os que não trabalham não fazem. É assim. O jovem não faz

mais a roça. Ele reclama do preço da farinha, mas não faz mais a roça. Porque

antigamente era o seguinte, no tempo do meu pai não tinha escola, eles tinham que

fazer aquilo, eram abrigados a fazer. Tinham que trabalhar. Moram aqui mesmo,

viver da agricultura porque é o jeito. Aí os filhos já tem outra visão, não querem

mais trabalhar na roça, não querem mais morar no interior, aí vai... Pai do seu

Edilson: No ano que eu abri esse terreno aqui, nós formemo esse grupo de puxirum,

aí nós era 14, aí o meu foi o de último, aí eu comecei ajudar o pessoal aí, comecei

ajudar, comecei ajudar. Quando foi no dia do meu, mandei a mulher molhar um

quilo de feijão aí pro almoço, aí amanheceu o dia cedo, só veio o avô dele

perguntando. Esperemo, deu sete hora, nada, oito hora, nada. Umbora só nós dois

mesmo. Até hoje estão me devendo esse dia. Ninguém, só o Fulano veio me ajudar”

(E 24, 2019).

(...)

“[Sobre puxirum, ainda fazem?] Olha, sobre puxirum, agora chamam de mutirão.

Antes, era puxirum mesmo, agora chamam mais de mutirão. A gente faz o mutirão

sim, faz no templo da comunidade, faz na comunidade, todo mundo se reúne vai pra

lá. Na Igreja também tem o dia do mutirão, a gente se reúne” (E 25, 2019).

(...)

“Os puxirum já não tem muito. Nós mesmo fizemos um ano passado. Nós, com meu

marido, fizemos lá. O pai dele... fizemos lá quando a gente convida se eles vão

ajudar a fazer um puxirum, mas não existe muito mais. Lá para onde eu morava

tinha muito esse negócio de puxirum“(E 26, 2019).

(...)

“ [Questão de puxirum?] Isso aí também já não existe. Que é uma coisa que quando

nós trabalhava era assim: marcava, quando era no dia, Virgem Maria, era muita

gente. Era panelada de manicuera, era beiju, era farinha tapioca, era beiju pé-de-

moleque. Três tipos de beiju, pé-de-moleque, beiju-cica, o beiju que a gente chama

beiju-seco. Todos com castanha, que a gente guardava castanha do inverno, o verão

todinho pra fazer beiju. Hoje, nada disso mais tem. E era todo mundo trabalhando na

maior alegria. Quer ver quando era da planta. A gente vinha do roçado todo de cara

preta de tisna, que às vez tava descuidado, os atentado passava bem na tisna do pau

queimado, a gente tava descuidado, vinha por lá por trás, ensaboava. Aquilo tudo era

maior alegria” (E 27, 2019).

Analisando as falas dos Entrevistados 19, 20, 21, 23, 24, 25, 27, 27, concluímos que,

atualmente, é mais utilizada a remuneração da força do trabalho por meio de “diárias”, onde

as pessoas “contratadas” recebem uma quantia em dinheiro de acordo com o que foi

combinado com o “contratante”. Esse sistema baseado na utilização do dinheiro como

remuneração da força de trabalho vem substituindo, aos poucos, a técnica do “puxirum”.

Depreende-se que essas novas relações de trabalho desestruturaram as antigas técnicas de

organização de trabalho que eram praticadas nas comunidades quilombolas (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2019).

Castro e Acevedo (1998), geralmente, o “puxirum” era mais realizado na fase da

derrubada do roçado porque essa etapa exige maior intensidade de trabalho. A derrubada (ou

roçado) é feita somente por homens, onde as práticas apoiam-se no trabalho familiar e na

participação dos vários grupos familiares acordados no contrato de colaboração, no qual não

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há remuneração da força de trabalho ou parceria, mas é regido por um sistema que organiza a

troca de tempos de trabalho relativamente iguais para tarefas semelhantes e socialmente

necessárias. Somente por exceção e segundo acordos prévios deixaria de corresponder a

tarefas iguais, a exemplo de um trabalhador que trocaria o trabalho de derrubada da roça pela

busca de alimentos (pesca ou caça) para suprir o grupo durante a realização do “puxirum”.

Nessa perspectiva, as mulheres também participam do “puxirum”, encarregadas da

preparação de alimentos. Durante a pesquisa de campo os mais velhos relataram que nos

puxiruns havia, inclusive, o chamado “garçom”, pessoa responsável por servir o tarubá, uma

bebida fermentada produzida da raiz de mandioca, considerada por muitos como energética,

entretanto, não deve ser consumida em excesso, pois pode causar embriaguez, como uma

bebida alcoólica (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2019).

Na organização do “puxirum” cada família prepara sua roça com auxílio de

convidados (cerca de quinze homens realizam a derrubada e um número acordado de famílias

para a fase de plantio), comprometendo-se a retribuir o tempo de trabalho incorporado em seu

próprio roçado, participando da fase de derrubada dos demais. Os quilombolas explicam essa

relação como uma troca de dias. Um sistema de regras instituídas nos costumes desempenha a

função de controle dos compromissos assumidos na troca de tempo de trabalho, garantindo

eficiência na reprodução dessa modalidade de organização. Tal procedimento dá uma

mobilidade aos trabalhadores, deslocando-os pelos roçados das famílias na fase de execução

de tarefas mais demoradas e penosas (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2019).

As mulheres, além de realizarem basicamente os afazeres domésticos, que incluem o cuidado

com as crianças e a confecção de utensílios, também desempenham atividades importantes, como a

pesca e a coleta da castanha em castanhais próximos a residência ou próximos ao barraco do

castanheiro. Também auxiliam no plantio e limpeza das roças, limpeza do quintal que circunda a

residência, onde cultivam plantas frutíferas, plantas medicinais e hortaliças. Apesar dessas divisões

nas tarefas, observou-se que não há uma divisão rígida de papéis na produção entre trabalho masculino

e trabalho feminino, mas há complementações na realização das tarefas estabelecidas entre homens e

mulheres. As crianças também têm papel definido ao ajudar os pais em certas tarefas, participando de

momentos de aprendizagem da cultura do grupo, como, por exemplo, pescar, tratar o peixe, fazer

comida, sempre sob a supervisão do pai, da mãe ou de um adulto da família. Também acompanham os

pais em atividades da roça e de coleta da castanha, o que resulta em práticas que asseguram a

socialização e a aprendizagem dos processos produtivos pelas novas gerações (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2019).

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A renda dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil do Território

Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo

Ao se tratar de “renda”, é preciso entender que no cotidiano dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade Último

Quilombo, a renda das famílias é um complemento do sustento. O sustento advém dos

produtos da pequena agricultura familiar e do extrativismo (caça, pesca e coleta de PFNMs),

conforme informado pelo Entrevistado 21.

“[Origem da renda?] Às vezes a gente vende uma banana, quando não agente vende

um *****, falar a verdade logo. E assim a gente vai vivendo, a gente não tem um

ganho, assim, um benefício. Se a gente tivesse um projeto pro cumaru, açaí...” (E 21,

2019).

A renda é o dinheiro adquirido pelo quilombola castanheiro tradicional – seja por meio

do trabalho, venda de seus produtos, seja por meio de programas sociais de transferências de

renda do governo federal, onde todo o dinheiro obtido pelos quilombolas é utilizado para

comprar o que não produzem, como gêneros alimentícios industrializados, roupas, utensílios

domésticos, gasolina, óleo diesel, gerador de energia elétrica movido a gasolina ou a diesel,

rabetas e pequenos barcos a motor, etc. Nesse sentido, na microrregião Alto Trombetas a

maioria das famílias, 88%, possui renda menor que 01 salário mínimo, com exceção de

aposentados e funcionários públicos municipais (11%) que possuem renda entre 01 e 02

salários, sendo que apenas 1% possuem renda maior que 02 salários mínimos (ARQMO,

2018). Nitidamente, uma renda territorial, visto que é na lógica do modo de vida

territorializado que é sua fonte. É a mesma lógica de uso, ou gasto, para satisfação das

necessidades materiais e simbólicas.

Com a implantação da MRN na microrregião Alto Trombetas, a renda das famílias

quilombolas do TQ Alto Trombetas 1, que antes dependia exclusivamente da venda dos

produtos do trabalho baseado em práticas agroextrativistas, também passou a depender de

serviços prestados para a MRN, seja como trabalhadores assalariados, seja por meio de

serviços terceirizados realizados por meio de cooperativas, como a Cooperboa, Cooperbarcos

e Coopermoura, seja como autônomos ou diaristas (faxineiras, arrumadeiras, lavadeiras,

passadeiras, jardineiros, etc.) na Vila de Porto Trombetas. Muitos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil, principalmente os moradores das comunidades mais

próximas de Porto Trombetas, como Moura e Boa Vista, possuem uma estreita relação de

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trabalho com a companytown Porto Trombetas, principalmente, por meio das cooperativas

Cooperboa, Cooperbarcos e Coopermoura, o que tem desestruturado seus modos de vida

como agroextrativistas por meio de relações espoliadoras (ALCANTARA, 2014). Contudo,

essas novas relações de trabalho inseridas pela MRN não se limitam apenas as comunidades

Boa Vista e Moura, pois quilombolas de outras comunidades também foram inseridos nessa

nova configuração social como trabalhadores assalariados ou prestadores de serviços

terceirizados (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURA, 2018).

A criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas, em 1979, também influenciou na

renda das famílias quilombolas do TQ Alto Trombetas 1, uma vez que impediu as práticas

agroextrativistas (agricultura, pesca, caça, extração de produtos florestais madeireiros e não

madeireiros) que eram a principal fonte de renda dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil do TQ Alto Trombetas (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURA, 2018).

Nos dias atuais, 60% dos moradores do TQ Alto Trombetas 1 possui a renda

proveniente da pequena agricultura familiar, mas também de programas sociais do Governo

Federal (22%) (GRÁFICO 03), de aposentadorias e pensões (17%), do funcionalismo público

municipal (17%), do extrativismo (8%), da pesca (6%), de trabalhos autônomos (6%), além

dos que que trabalham com carteira assinada (9%), sendo que nestes estão inclusos os que

trabalham na MRN ou nas empresas terceirizadas, e outros que prestam serviços na vila de

Porto Trombetas, como empregadas domésticas, babás, cozinheiras. Além desses, há também

os que prestam serviços terceirizados (7%) para a MRN por meio de cooperativas, como a

Cooperboa, Cooperbarcos e Coopermoura e os que trabalham como diaristas (faxineiras,

arrumadeiras, lavadeiras, passadeiras, jardineiros, etc.) na vila de Porto Trombetas são 10%

(ARQMO, 2018).

Gráfico 03 – Principal fonte de renda Gráfico 04 – Benefícios do Governo Federal

1%

1%

1%

6%

6%

7%

8%

9%

10%

12%

17%

22%

60%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%

Turismo

Pecuária

Outros

Autônomos

Pesca

Cooperativas

Extrativismo

Carteira assinada

Diárias

Funcionlismo público municipal

Aposentadorias e pensões

Programas sociais

Agricultura

2%

4%

4%

17%

21%

59%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%

Auxílio Doença

Bolsa Verda

Cesta Fome Zero

Aposentadorias e pensões

Nenhum

Bolsa família

Fonte: ARQMO (2018)

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A Cooperbarcos é uma cooperativa do ramo de transportes, que atua com transporte

fluvial de pessoas e que tem como principais clientes a empresa MRN. Já a Cooperboa e a

Coopermoura são cooperativas que prestam serviços de roçagem, jardinagem, limpeza urbana,

motoristas e serviços gerais na vila de Porto Trombetas. Estes não recebem salários e não

possuem carteira assinada, pois recebem os lucros da cooperativa, mas também não podem

sofrer qualquer controle pela empresa, no caso a MRN, sequer de horário (fichas e cartões)

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURA, 2018).

É importante ressaltar que apesar de gerar renda aos associados, os serviços prestados

por cooperativas, muitas vezes causam prejuízos aos mesmos, visto que estes ficam

desguarnecidos em termos previdenciários, pois muitas cooperativas sequer têm recolhido o

INSS do trabalhador. Além disso, muitas vezes, há casos de cooperativas, o que não pude

comprovar, em que muitos empregados têm sido enganados ao se associarem para poderem

trabalhar, que, por vezes, são apenas intermediadoras de mão-de-obra que buscam economizar

valores à custa dos trabalhadores, que deixam de receber vários direitos trabalhistas, como o

registro em sua carteira de trabalho, o recolhimento do FGTS, férias acrescidas de um terço,

décimo terceiro salário, seguro-desemprego, horas extras, adicional noturno, aviso-prévio, ou

seja, todos os direitos de um empregado comum, conforme informado pelos Entrevistados

E02 e E25:

“Só cinco anos [trabalhou em empresa terceirizada no Projeto Trombetas – MRN]

noutra empresa já contratada, né? [...] Na verdade, pra nós não [sobre o trabalho na

empresa terceirizada]. Logo não era de carteira assinada. Era um contrato de uma

cooperativa e outra coisa a gente não tinha passagem. Se viesse pra cá tinha que tirar

do bolso. Aí era só de mês em mês que era quando nós tinha dinheiro e aí tinha que

pagar o transporte de lá pra cá, então não trouxe assim um “lucro” que dê pra

compensar o tempo que eu fiquei lá. Aí eu prefiro mais antes ficar por aqui mesmo...

fazendo minhas roça” (E 02).

(...)

“O mesmo esposo trabalha, né. Ele trabalha lá em Porto Trombetas, na Coopbarcos.

Ele trabalha 14 dias e folga 14 dias. Ele trabalha numa cooperativa” (E 25, 2019).

No entanto, mesmo inseridos nessas novas relações de trabalho impostas pela MRN

(seja como trabalhadores assalariados com carteira assinada, seja como diaristas, autônomos

ou prestadores de serviços por meio de cooperativas), muitos quilombolas – inclusive os que

moram permanentemente na vila de Porto Trombetas – mantêm residência na sua comunidade

de origem. Com exceção dos quilombolas que trabalham na MRN e moram de forma

permanente na Vila de Porto Trombetas, muitos dos que trabalham como funcionários

públicos ou que trabalham como autônomos ou nas cooperativas que prestam serviços

terceirizados para a MRN, geralmente, também mantêm o cultivo da roça e praticam o

extrativismo, ainda que o ICMBio proíba a coleta da castanha-do-brasil, para fins de

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comercialização por quilombolas que não têm nessa atividade importante fonte de renda e

subsistência.

A manutenção da residência na comunidade, mesmo que apenas nos finais de semana,

assim como a manutenção da roça ou o trabalho de coleta da castanha-do-brasil, é uma

maneira de manter o vínculo com o modo de vida quilombola. Também são associadas às

associações representativas dos TQs, tendo o mesmos direitos dos quilombolas.

5.2.2 Elementos criadores e organizadores do modo de vida dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas.

O modo de produção no Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade

Último Quilombo

O modo de produção dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da

microrregião Alto Trombetas se baseia no trabalho familiar e está alicerçado na concepção de

posse e uso comum da terra e dos recursos do território, atrelados a práticas produtivas

coletivas baseadas na ajuda mútua e cooperação familiar. Na produção tem-se a divisão de

tarefas entre todos os membros da família, buscando a maximização e a economia de esforços

na execução das atividades. Todavia, essa organização não se restringe apenas ao nível da

unidade familiar ou dos grupos familiares, mas também se estende ao nível das relações intra

e intercomunitárias (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

Atualmente, as cooperações entre os quilombolas da microrregião Alto Trombetas

para o trabalho de preparação da roça ou na produção da farinha, por exemplo, estão cada vez

mais raras a nível intra e intercomunitárias, ficando restritas aos grupos familiares. É comum,

por exemplo, as pessoas de uma mesma unidade familiar ou de um mesmo grupo familiar se

auxiliarem mutuamente na produção da farinha, ainda que residam em comunidades

diferentes.

As casas de farinha (Figura 13) representam, claramente, a noção de "coletivo" na

perspectiva dos quilombolas TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo.

Atualmente, as casas de farinha que existem nas comunidades remanescentes de quilombos da

microrregião Alto Trombetas são todas de domínio privado. No entanto, 24% dos

Entrevistados pelo Projeto Jovens Quilombolas, consideram-nas como bens de uso coletivo

(ARQMO, 2018). O uso coletivo de bens pela comunidade ainda é um fator muito importante

para o modo de vida quilombola, e fica evidente quando o privado se confunde com o público

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de forma tão direta que a sobrevivência da comunidade é encarada como uma

responsabilidade do todo (OBSERVAÇÕES SEMIESTRUTURADAS, 2018/2019; ARQMO,

2018).

Figura 13 – Trabalho de um grupo familiar na produção de farinha na comunidade Abuí. Na

casa de farinha, homens e mulheres trabalham na produção de farinha e seus derivados. Cada

um desempenha uma função específica, mas todos possuem domínio das técnicas de produção

desse produto. Fonte: PICANÇO (2018).

As escolhas das espécies para plantar

A escolha das espécies para cultivar nas roças e quintais localizados no interior da

Reserva Biológica do Rio Trombetas deve ser feita com a anuência do ICMBio para se evitar

a introdução de espécies exóticas, uma vez que o Artigo 31 do SNUC diz que:

Art. 31. É proibida a introdução nas unidades de conservação de espécies não

autóctones. § 1º Excetuam-se do disposto neste artigo as Áreas de Proteção

Ambiental, as Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas e as Reservas de

Desenvolvimento Sustentável, bem como os animais e plantas necessários à

administração e às atividades das demais categorias de unidades de conservação, de

acordo com o que se dispuser em regulamento e no Plano de Manejo da unidade

(BRASIL, 2000, p. 21).

No ano de 2018, por exemplo, os quilombolas da comunidade Último Quilombo,

localizada no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas, solicitaram ao ICMBio, de

maneira informal, a autorização para o cultivo de algumas espécies na roça, dentre as quais a

cana-de-açúcar, respeitando-se o tamanho máximo da quadra que é de 01 hectare por família.

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No entanto, o ICMBio não concedeu autorização para o cultivo da cana-de-açúcar na Reserva

Biológica do Rio Trombetas por se tratar de uma espécie exótica, o que é proibido pelo SNUC

É importante ressaltar que os quilombolas da comunidade Último Quilombo não produzem

em grandes quantidades. Além de possuírem autorização do ICMBio para fazer roçado com

limites de áreas de até um hectare, também não é da cultura dos quilombolas, conforme

informado pelo Entrevistado 27:

Olha, o Marcelo autorizou pra fazer roça, duas hectares e meia. Aí, a Débora veio:

Pra não cortar um pau. Na coisa dela não é para cortar um pau, se cortar... Como ela

já foi apertada, o irmão Preto apertou, apertou mesmo ela. Fizeram um baixo

assinado, aí, agora, ela já está mais... Aí foi que falaram pra ela: olha, o Marcelo

autorizou pra gente fazer duas hectares e meia de roça. Cada pessoa, dono de família

que quisesse fazer roça, podia vir aqui com ele, que ele autorizava duas hectare e

meia de roça. Eu teve na reunião. Dizer como diz o Marcelo: como é que a pessoa

vai sobreviver aqui dentro. Não pode fazer uma roça. Agora, ela não quer que, eu

tava dizendo assim pro Deno. Deno, durante vocês não entenderem que nem todas as

coisas que a gente pensa em fazer tem que levar lá pra Débora no ICMBio, nunca

vai pra frente aqui. Porque se quiser criar uma galinha tem que ir lá, ela não apoiou

criação de galinha e nem plantio de cana. Eu tava dizendo assim: Olha, gente, quem

quiser trabalhar, trabalhe [...] Nós tem graças a Deus, duas roças, madura. Uma já

não muito porque a gente já deu bastante pra fazerem de sociedade e uma nova. Aí a

pessoa vai se curvar, vai ter que fazer meio litro de farinha por causa de ir na

conversa dela. Olha, o seu Edílson chegou, foi metendo o aço, tá com duas roças,

um bananal. Olha, foram lá, acharam bonito, bateram foto. Como eu disse pro Deno,

as pessoas tenham que tomar uma vergonha, tenham que deixar esse negócio de diz

que disse. Se o pessoal tá fazendo, corre, já vai denunciar lá. Que é o mal daqui. É o

mal daqui do povo (E 27, 2019).

Analisando a fala do Entrevistado 27, é possível afirmar que o acesso a produção da

roça pelos quilombolas castanheiros tradicionais depende do perfil do gestor da Reserva

Biológica do Rio Trombetas. Se o gestor tem a unidade de conservação como espaço que

possibilite a transformação das comunidades locais, e, ainda a conservação da biodiversidade

como parte dos modos de vida dos povos tradicionais, este estimula a participação dessas

comunidades do interior e entorno da unidade de conservação. Entretanto, se o gestor da

unidade de conservação não reconhece e não incorpora em suas ações de gestão, as

comunidades tradicionais do interior e entorno da unidade de conservação em que atua, a

gestão desses territórios especialmente protegidos se torna difícil.

5.2.3 Elementos limitadores do modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas

Até a década de 1990 não havia evangélicos na microrregião Alto Trombetas.

Atualmente, dos Entrevistados pelo Projeto Jovens Quilombolas, 15% se declararam como

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149

evangélicos e 85% se declaram como católicos (ARQMO, 2018). Na comunidade Último

Quilombo há duas igrejas: a Católica e a Evangélica, conforme informado pelos Entrevistados

17, 19 e 25:

Em relação a religião existe dois povos: evangélicos e cristão. Sou evangélica.

Ainda fazem Ladainha fazem Círio, ainda continua (E 17, 2019).

[...]

Eu me declaro como evangélico. Sou da Assembleia de Deus (E 19, 2019).

[...]

[Questão da religião?] Nós somos evangélicos. Só a minha mãe que não, ela é

católica (E 25, 2019).

A religião tem influência direta na construção do modo de vida dos quilombolas

coletores tradicionais de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas, assim como

ocorreu com o modo de vida ribeirinho da comunidade de Caxiuanã, no município de

Melgaço, Pará (FARIAS, 2017). Geralmente, os membros de igrejas evangélicas não são

considerados como membros das comunidades pelas coordenações comunitárias – muitas

vezes não tendo direito a declarações que comprovam a moradia na comunidade – pois, na

maioria das vezes, tais coordenações se confundem com as coordenações comunitárias da

Igreja Católica, conforme informado pelo Entrevistado 04.

[...] aqui a maioria dos coordenador, eles tem preconceito com evangélicos. [...]

Agora, eles tem uma separação, inclusive a Mineração doou umas... uns geradores

[de energia elétrica] pra cá pra comunidade aí do Paraná e lá pra casa não deram (E

4, 2018).

Contudo, na comunidade Último Quilombo é frequente as pessoas (católicos e

evangélicos) se reunirem para mutirões com objetivos de realizarem trabalhos comunitários,

como construções e reparos dos equipamentos públicos. Também se reúnem para comemorar

datas importantes, como o ocorrido no dia 12 de agosto de 2018, quando católicos e

evangélicos se reuniram no centro comunitário da Igreja Católica para comemorar o dia dos

pais. Após o almoço comunitário, se reuniram para tratarem de assuntos referentes a

associação de moradores, que estava em sendo instituída nessa comunidade.

A Associação de Moradores da Comunidade Último Quilombo reúne tanto católicos

quanto evangélicos, com objetivos de captar recursos para investir em melhorias para os

comunitários, de forma geral. Apesar de estarem organizados em torno de uma associação de

moradores, as duas igrejas presentes na comunidade Último Quilombo mantêm suas

coordenações e lideranças religiosas.

Na reunião também estava em discussão o recebimento e repasse do dinheiro doado

pela MRN para a realização das festividades religiosas católicas (Círio e Festa) que

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150

aconteceriam em novembro de 2018. O dinheiro, que antes era repassado diretamente a

coordenação da comunidade católica do Último Quilombo, agora será recebido pela

associação de moradores e repassado para a coordenação católica. Havia discussões sobre a

utilização do dinheiro somente pela comunidade católica, uma vez que os evangélicos

também são moradores dessa comunidade.

As representações culturais dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

da Reserva Biológica do Rio Trombetas

No que tange a representações culturais, a principal referência do calendário cultural

local são as festividades dos santos padroeiros das comunidades. Atualmente, na comunidade

Último Quilombo, as festividades de Nossa Senhora Aparecida são realizadas em um final de

semana. Iniciam no sábado, com o Círio fluvial, uma espécie de procissão de embarcações

que conduzem a Santa Padroeira por trechos de rios ou de lagos próximos ao centro

comunitário (FIGURA 14) (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

Figura 14 – Início das atividades do Círio. À esquerda, dois homens balançam duas

bandeiras, uma vermelha e uma branca, em frente a capela da santa padroeira da comunidade,

Nossa Senhora Aparecida. À direita, embarque da santa no barco que fez o percurso fluvial do

Círio. Fonte: Trabalho de campo, 2018.

As festividades dos santos padroeiros das comunidades, geralmente, são festas de

mastro. O mastro é um tronco de madeira enfeitado com frutos e outros produtos da

comunidade, fincado verticalmente no chão do centro comunitário próximo à frente da capela

(FIGURA 15 – A). O mastro é erguido e enfeitado na manhã do dia do Círio e quando o santo

retorna do itinerário fluvial, à tarde, as pessoas se dirigem até o local do mastro e cada pessoa

da comunidade é chamada para golpear a base do mastro com um machado até que este seja

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derrubado (FIGURA 15 – B). As pessoas, então, carregam o mastro até o barracão da

comunidade, onde os produtos são repartidos às pessoas presentes (FIGURA 15 – C).

Figura 15 – Círio realizado na comunidade Último Quilombo. A) Mastro enfeitado com

produtos produzidos na comunidade Último Quilombo. B) Derrubada do mastro C)

Distribuição dos produtos aos membros da comunidade e visitantes. Fonte: PICANÇO

(2018).

No Em geral, a “festa religiosa” inicia com a celebração religiosa na capela do santo,

com as ladainhas cantadas pelos rezadores, e se estende pela tarde, com um torneio de futebol

que conta com a participação de times de futebol de outras comunidades. À noite ocorre outra

celebração, após a qual ocorre a festa “social”, com muita música e apresentações de danças

folclóricas e de bandas que vêm da cidade de Oriximiná (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018). Após a celebração religiosa acontece a chamada festa

cultural, com apresentação de músicas e danças consideradas pelos quilombolas como

tradicionais da comunidade.

No domingo são servidas refeições gratuitas para todos os presentes, sendo que todos

os alimentos e bebidas (beiju, macaxeira, garapa, carnes) servidos na festa são doados por

moradores que os ofertam ao santo, para serem partilhados entre os festeiros. Também é

A C

B

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152

realizado torneio de futebol com a presença de times de outras comunidades, e à noite ocorre

a “chamada festa social”, que é acompanhada de baile dançante, onde são tocados ritmos

musicais atuais como brega, sertanejo, forró e outros (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA).

Contudo, anteriormente, as festividades religiosas da Igreja Católica nas comunidades

duravam, em média, 01 semana, as quais se iniciavam com o círio fluvial. Após o Círio,

seguiam-se os dias de festejos a noite, com a realização de cultos religiosos em cada noite sob

a responsabilidade de equipes (jovens, famílias, aposentados, etc.). Nos dias que se seguiam

ao Círio Fluvial até a realização da festa social havia esmolação (pedidos de contribuições

para o festejo) nas casas da comunidade sede ou de comunidades próximas. A coordenação da

comunidade é responsável pela organização geral das festividades religiosas, coordenando

outras equipes de trabalho: litúrgica, bar, cozinha, ornamentação do centro comunitário,

música, etc., além de articular com a PMO ou a MRN para o apoio a programação

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

Atualmente, há muitas dificuldades na realização das festividades. Já não há muitos

rezadores de ladainhas e a população assalariada não tem tempo para festejos longos e nem

produz alimentos que possam doar para a realização da partilha tradicional (IPHAN, 2014,

F11-04, p. 3; OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

5.2.4 Elementos transformadores do modo de vida dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da Reserva Biológica do Rio Trombetas

O nível de vida

Quanto ao abastecimento de água, a maior parte da água consumida é captada

diretamente do próprio rio Trombetas e tributários (GRÁFICO 05). O tratamento de água

mais recorrente é a base de hipoclorito, eficaz em combater micróbios, mas sem ação eficaz

em relação aos sedimentos de bauxita, por exemplo. Dentre os Entrevistados, 19% afirmou

que não utiliza qualquer forma de tratamento da água, 1% disse que filtra e 1% ferve a água.

Apesar da maioria das pessoas afirmarem que trata a água com cloro, percebemos uma

inconsistência entre a percepção de agentes de saúde (45%) e o alto índice de tratamento de

água por cloro (79%), sendo que, geralmente, o cloro é distribuído aos comunitários por esses

agentes (GRÁFICO 06). A água captada para o consumo, geralmente, é armazenada em

baldes, caixas d’água e “tambores”, recipientes nos quais ocorre o tratamento com cloro

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(ARQMO, 2018; OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Gráfico 05 – Local de captação da água Gráfico 06 – Formas de tratamento da água

0%

1%

8%

96%

0% 20% 40% 60% 80% 100% 120%

Igarapé

Rede pública

Poço artesiano

Rio

% de famílias que captam água

Lo

cal

de

ca

pta

ção

da

ág

ua

1%

1%

19%

79%

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Água fervida

Água filtrada

Nenhum

Utilizam cloro

% de famílias que tratam a água

Fo

rma

s d

e t

rata

me

nto

d

a á

gu

a

Fonte: ARQMO (2018). Elaborado pelo Autor.

Algumas residências possuem bombas d’água elétricas para a captação da água dos

rios ou dos poços artesianos, sendo esta transferida para recipientes até as residências por

meio de mangueiras hidráulicas. Apenas 1% dos Entrevistados pelo Projeto Jovens

Quilombolas utiliza água da rede pública. Entretanto, não há abastecimento público de água

nas comunidades visitadas. Semelhante ao que ocorre com a energia elétrica, o denominado

abastecimento público de água é disponibilizado pela prefeitura para as pessoas que residem

próximo aos centros comunitários, entretanto, essa água também é captada dos rios em baldes

ou poços semiartesianos por meio das bombas d’água elétricas (ARQMO, 2018;

OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Quanto a destinação do lixo, a maioria dos Entrevistados pelo Projeto Jovens

Quilombolas, 98%, afirmou que o lixo doméstico produzido é queimado (GRÁFICO 07).

Parcelas menores desse montante são enterradas (12%) ou descartadas nas bordas das

florestas, próximo ao quintal das casas, o que amplia as possibilidades de causas de doenças

nas comunidades e a poluição de recursos naturais (ARQMO, 2018; OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

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Gráfico 07 – Descarte do lixo

1%

2%

12%

98%

0% 20% 40% 60% 80%100%120%

Armazenado em sacos paradescartar na cidade mais

próxima

Jogado direto no meio ambiente

Enterrado

Queimado

% de pessoas

De

sca

rte

do

lix

o

Fonte: ARQMO (2018)

O ICMBio desenvolve atividades com as famílias do Lago Erepecu (comunidades

Último Quilombo e Nova Esperança), por meio do Projeto Quelônios, visando a coleta e à

destinação do lixo por elas produzido. Os agentes ambientais do ICMBio distribuem sacos

para a coleta e depois retiram-nos, levando-os para o aterro sanitário em Porto Trombetas.

Além disso, alguns moradores entregam o lixo por conta própria na base de apoio do ICMBio,

situada na boca do lago do Erepecu, conhecida localmente como “flutuante”. Contudo, apenas

1% dos Entrevistados (GRÁFICO 07) pelo Projeto Jovens Quilombolas informou que

acondiciona o lixo produzido em sacos plásticos para descartar na cidade mais próxima. A

coleta realizada por esse órgão ambiental é seletiva, sendo que são os próprios agentes

ambientais que realizam a separação dos resíduos, conforme informado pelos Entrevistados

09 e 15:

“Também é a questão do cuidado lá, eles dão o negócio de saca pra a

gente colocar o lixo, pra não vir jogar... traz, quando às vezes antes de

vir embora, às vezes enche, leva lá na base. Aí eles dão outras sacolas

pra gente trazer” (E9, 2018).

(...)

“O lixo também, isso aí não pesou nada isso aí, acho que não. Isso aí

é um dever da pessoa né. Ela pegar a lixeira e colocando os lixos tudo

dentro e levar lá pra base e a base leva pra lá pra Trombetas” (E15,

2018).

Quanto a destinação dos excrementos humanos, o número de famílias que possui

sanitário dentro de casa é quase irrisório, 1% dos Entrevistados. Dos 99% que não possui

sanitário dentro de casa, 97% utiliza a denominada “casinha”, 1% utiliza o ambiente a céu

aberto e 2% utiliza as matas para descartar seus excrementos (GRÁFICO 08), o que pode

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contribuir para a contaminação do solo e da água (ARQMO, 2018; OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Gráfico 08 – Destinação dos excrementos Figura 16 – Sanitário tipo “casinha”

1%

1%

97%

0% 20% 40% 60% 80% 100% 120%

Matas

Céu aberto

Tipo casinha

% de pessoas

Desti

nação dos e

xcrem

en

tos h

um

an

os

Fonte: ARQMO (2018) Fonte: PICANÇO (2018)

Na comunidade Último Quilombo também há os sanitários do tipo casinha para o

descarte dos dejetos humanos (FIGURA 16). A casinha é uma fossa seca, cercada por paredes

em madeira ou palha e assoalho em madeira ou concreto com um orifício por onde os

excrementos são lançados diretamente em um buraco escavado no solo (ARQMO, 2018;

OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Fontes de energia utilizadas pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da

Reserva Biológica do Rio Trombetas

No TQ Alto Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo, 79% dos Entrevistados

ainda utilizam a lamparina como fonte de iluminação em casa, durante a noite. As

comunidades não possuem rede pública de distribuição de energia elétrica, sendo que a

principal fonte de energia elétrica utilizada pelos quilombolas Entrevistados é a produzida por

gerador de energia elétrica, 59%, movidos a óleo diesel, comumente chamado de “motor de

luz” pelos moradores locais (GRÁFICO 09). Algumas residências possuem o próprio gerador,

e há um localizado no centro comunitário, doado pela Prefeitura Municipal de Oriximiná ou

pela MRN, que pertence à comunidade e se destina ao uso durante as atividades comunitárias.

Também é utilizado pelos os moradores mais próximos do centro comunitário – quando há

combustível doado pela PMO – o que explica 4% das famílias Edas afirmarem ter acesso a

energia elétrica por "rede pública", contudo essa energia é apenas disponibilizada a noite,

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principalmente para assistir programas de entretenimento como as novelas (ARQMO, 2018;

OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Gráfico 09 – Fontes de energia utilizadas na microrregião Alto Trombetas

Fonte: ARQMO (2018)

Os geradores de energia elétrica, assim como uma quota mensal de óleo diesel

necessário para o seu funcionamento, são disponibilizados pela Prefeitura Municipal de

Oriximiná aos centros comunitários. As unidades familiares mais distantes, como por

exemplo, as que estão localizadas do outro lado da margem do rio, geralmente, adquirem seu

próprio “motor de luz” e, muitas vezes, compartilham a energia elétrica com o grupo familiar

ao qual estão inseridas. Apenas 1% dos Entrevistados utiliza energia solar, sendo que esta

ainda apresenta um custo muito elevado para a realidade quilombola, tanto de aquisição dos

equipamentos como para a sua manutenção (GRÁFICO 09) (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018; ARQMO, 2018).

A energia elétrica é fornecida por geradores movidos a óleo diesel ou gasolina,

combustíveis transportados da cidade de Oriximiná até as comunidades quilombolas. Há

muitos “revendedores” de combustíveis nas comunidades visitadas, sendo que durante a

pesquisa de campo o litro da gasolina era vendido a R$ 7,00, enquanto nos postos localizados

na cidade de Oriximiná, o litro era vendido a R$ 4,95, o que indica um acréscimo de 36,71%

em relação ao litro da gasolina vendida nos postos em Oriximiná. O óleo diesel era vendido a

R$ 4,35. Os combustíveis são armazenados em recipientes dentro das casas, geralmente nas

varandas (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

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A educação nas comunidades do Território Quilombola Alto Trombetas 1 e na comunidade

Último Quilombo

O TQ Alto Trombetas 1 possui Escolas Municipais de Educação Infantil e de Ensino

Fundamental (EMEIF’s) denominadas escolas-polos, geridas pela Secretaria Municipal de

Educação de Oriximiná (SEMED), nas quais há oferta dos Ensinos Infantil e Fundamental

públicos. As escolas encontram-se sediadas, estrategicamente, nas comunidades que possuem

maior contingente populacional: Tapagem e Abuí, atendendo as outras comunidades menores

que se encontram nas proximidades. A comunidade da Tapagem é a sede da Escola Municipal

de Educação Infantil e Ensino Fundamental Raimundo Vieira, que oferece turmas de ensino

infantil e nível fundamental, do 1º ao 9º ano, para crianças e adolescentes das comunidades

Sagrado Coração de Jesus, Mãe Cué e da própria Tapagem. A comunidade Abuí, por sua vez,

a sede da Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Tancredo Neves, que

oferece turmas de ensinos infantil e fundamental, do 1º ao 9º ano, para crianças e adolescentes

das comunidades Paraná do Abuí, Santo Antônio do Abuízinho e do próprio Abuí

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018; ARQMO, 2018).

As escolas-polos sediadas nas comunidades da Tapagem e Abuí, por sua vez,

pertencem a Unidade Regional de Gestão Escolar (URGE) Quilombola 11 – Alto Rio

Trombetas (ORIXIMINÁ, 2014), que têm as atividades desenvolvidas na sede da Escola

Municipal de Educação Infantil e de Ensino Fundamental Raimundo Vieira dos Santos, na

comunidade Tapagem. Essa organização é resultado de um projeto de nucleação e

consolidação das escolas rurais desenvolvido, a partir do ano de 2004, pela Secretaria

Municipal de Educação de Oriximiná (SEMED). Antes desse projeto, cada comunidade da

zona rural do município de Oriximiná possuía sua própria escola, que eram escolas

multisseriadas, geralmente com a oferta somente das séries iniciais do Ensino Fundamental

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018; ARQMO, 2018).

As escolas-polos são construídas em alvenaria e possuem microssistema de

abastecimento de água encanada por meio de poço semiartesiano. Também possuem

sanitários na parte interna do prédio, mas não possuem tratamento de esgoto, nem local

apropriado para o descarte do lixo, que é queimado ou despejado em locais próximos às

bordas das florestas ou ribanceiras dos rios (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

O transporte escolar é feito por barqueiros contratados pela Semed, que transportam os

alunos das diversas comunidades até às escolas-polos. A Prefeitura Municipal de Oriximiná

também fornece a merenda escolar para as escolas-polos. Contudo, conforme observado nas

discussões durante o XII Encontro da Consciência Negra, realizado em 2018 na Comunidade

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do Moura, no TQ Alto Trombetas 2, onde estavam presentes o prefeito municipal, vereadores

e a secretária de educação municipal, houveram muitas reclamações acerca do que vinha

acontecendo naquele município, que não estava efetuando o pagamento dos barqueiros, assim

como não estava disponibilizando as quotas mensais de diesel para esse transporte, o que

inviabilizava que o transporte dos alunos fosse realizado. Também estava com dificuldades na

distribuição da merenda escolar na região (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018;

ARQMO, 2018).

Até 2014, havia muita reclamação e insatisfação por parte das comunidades do TQ

Alto Trombetas 1 acerca do fato de não haver ensino de nível médio na região, fazendo com

que os jovens que desejassem continuar os estudos migrassem para Oriximiná. A evasão

escolar, após o término do Ensino Fundamental, era considerada alta pelos moradores das

comunidades do TQ Alto Trombetas 1, que contavam apenas com escolas que ofertavam o

Ensino Infantil e o Ensino Fundamental até o 9º ano. Ao concluírem o Ensino Fundamental,

muitos jovens das comunidades visitadas, quando não tinham condições financeiras para ir

estudar na cidade de Oriximiná, acabavam por reproduzir as atividades dos pais, a roça e o

extrativismo. Atualmente, com a implantação do Ensino Médio, mesmo que não seja regular,

os jovens das comunidades do TQ Alto Trombetas 1 podem dar prosseguimento aos seus

estudos, sem necessitar migrar para a cidade de Oriximiná, pois, muitas vezes, necessitam

morar na casa de parentes ou amigos e, geralmente, não se adaptam aos costumes estranhos ao

seu modo de vida, o que faz com que muitos que retornem as suas comunidades de origem

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018; ARQMO, 2018).

A partir de 2014 começaram a ser ofertadas turmas de Ensino Médio, sendo a primeira

destas na EMEIF Raimundo Vieira, na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA),

mas não chegou a atender aos comunitários da comunidade Sagrado Coração de Jesus, por

exemplo (STCP, 2014). Atualmente, o estado do Pará é o responsável pela oferta do Ensino

Médio, mediado pelo uso de tecnologias e na modalidade EJA. O Sistema Educacional

Interativo (SEI) foi implantado nas escolas-polos do município de Oriximiná, a partir de

2015, pelo governo do estado do Pará, em parceria com o município de Oriximiná. Nesse

sistema, o aluno participa de uma modalidade de estudo EAD, onde as aulas são oferecidas à

distância por meio de vídeos e mediadas por um professor-tutor presencial. As turmas

implantadas por essa modalidade estão alocadas em escolas-polos municipais de ensino

fundamental. O Governo Estadual fornece os tutores e a merenda escolar, enquanto o

município de Oriximiná oferece o serviço de barqueiro e merendeira, contando ainda com o

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apoio da MRN que auxiliará no que tange ao transporte dos alunos nas áreas quilombolas

(OBSERVAÇÃO ESTRUTURADA, 2018; ARQMO, 2018).

Atualmente, conforme observado nas discussões durante o XII Encontro da

Consciência Negra, realizado em 2018 na Comunidade do Moura, no TQ Alto Trombetas II,

há muitas discussões acerca da Educação Escolar Quilombola, principalmente, no que

concerne às especificidades da educação escolar quilombola, que muitas vezes, não é

considerada pelos municípios, como no caso de Oriximiná.

As Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica consideram que:

A Educação Escolar Quilombola é desenvolvida em unidades educacionais inscritas

em suas terras e cultura, requerendo pedagogia própria em respeito à especificidade

étnico-cultural de cada comunidade e formação específica de seu quadro docente,

observados os princípios constitucionais, a base nacional comum e os princípios que

orientam a Educação Básica brasileira. Na estruturação e no funcionamento das

escolas quilombolas, deve ser reconhecida e valorizada sua diversidade cultural

(DCN, 2012, p. 42).

Além disso, de acordo com o documento final da Conferência Nacional de Educação

(CONAE, 2010), a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão:

a) Garantir a elaboração de uma legislação específica para a educação quilombola,

com a participação do movimento negro quilombola, assegurando o direito à

preservação de suas manifestações culturais e à sustentabilidade de seu território

tradicional.

b) Assegurar que a alimentação e a infraestrutura escolar quilombola respeitem a

cultura alimentar do grupo, observando o cuidado com o meio ambiente e a

geografia local.

c) Promover a formação específica e diferenciada (inicial e continuada) aos/às

profissionais das escolas quilombolas, propiciando a elaboração de materiais

didático-pedagógicos contextualizados com a identidade étnico-racial do grupo.

d) Garantir a participação de representantes quilombolas na composição dos

conselhos referentes à educação, nos três entes federados.

e) Instituir um programa específico de licenciatura para quilombolas, para garantir a

valorização e a preservação cultural dessas comunidades étnicas.

f) Garantir aos professores/as quilombolas a sua formação em serviço e, quando for

o caso, concomitantemente com a sua própria escolarização.

g) Instituir o Plano Nacional de Educação Quilombola, visando à valorização plena

das culturas das comunidades quilombolas, à afirmação e manutenção de sua

diversidade étnica.

h) Assegurar que a atividade docente nas escolas quilombolas seja exercida

preferencialmente por professores/as oriundos/as das comunidades quilombolas

(CONAE, 2010, p. 131-132).

A maioria dos professores que estão atuando na educação das escolas das

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160

comunidades do TQ Alto Trombetas 1 são quilombolas (GRÁFICO 10), o que está de acordo

com as deliberações da Conferência Nacional de Educação (CONAE, 2010).

Gráfico 10 – O professor da comunidade é

quilombola?

Gráfico 11 – Você conhece a história da

formação dos quilombos?

92%

8%

Sim

Não56%

44%Não

Sim

Fonte: ARQMO (2018)

Analisando os Gráficos 10 e 11 é possível verificar que quando cruzamos os dados de

quantitativos de professores quilombolas com informações sobre o conhecimento da realidade

quilombola do território, como por exemplo, sobre o conhecimento dos quilombolas sobre

titulação territorial, esse dado traz à luz a necessidade por uma discussão da importância e o

papel dos professores, quando quilombola, para a educação cultural local.

A saúde dentre os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da Reserva

Biológica do Rio Trombetas

No que concerne à saúde, 95% das famílias das comunidades quilombolas do TQ Alto

Trombetas 1 não atendidas em postos de saúde (GRÁFICO 12), mas possuem, em geral, um

Agente Comunitário de Saúde (ACS) para atender duas comunidades, os quais atuam em

orientações educativas e preventivas a doenças (ARQMO, 2018; OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019). Na comunidade Último Quilombo não há agente

comunitário de saúde e nem posto de saúde. Se considerarmos, por exemplo, que o tratamento

de água depende de fornecimento de cloro por agentes de saúde, pelo menos metade das

famílias do território não tem contato com esta lógica de política pública, pois 43% das

famílias entrevistadas declarou não ser atendida por ACS (GRÁFICO 13).

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161

Gráfico 12 – Famílias atendidas por

agentes de saúde

Gráfico 13 – Famílias atendidas em postos

de saúde

5%

95%

A comunidade possui posto de saúde?

Sim

Não55%

43%

A família é atendida por agente de saúde?

Sim

Não

Fonte: ARQMO (2018)

Quanto ao tratamento da saúde constatou-se que os casos emergenciais são atendidos

na vila de Porto Trombetas, desde que o enfermo possua um cadastro junto a MRN. Tal

cadastro é um benefício que a MRN disponibiliza, em regra, para funcionários e seus

dependentes, e que se estende a quilombolas das comunidades do Boa Vista e Moura, mas não

àqueles que moam em outras comunidades. Somente pessoas que foram abrangidas pelo

cadastro realizado há algum tempo é que possuem direitos a consultas no hospital da MRN,

conforme informado pelos Entrevistados 21 e 25:

“Aqui na comunidade a gente não tem agente de saúde, a gente não tem. Eu e meu

esposo e meus filhos, agente é cadastrado lá em Trombetas, aí a gente se consulta lá

em Trombetas, mas nem todos os moradores daqui eles são cadastrados lá. Tem

gente que não é cadastrado. Já faz muitos anos que a Mineração fez esse cadastro.

Novos, assim, eles estão pelejando pra ver se conseguem o atendimento pra essas

pessoas. Eu e meus filhos a gente é cadastrado porque o meu esposo ele não era

daqui, ele morava lá no Batata. Tem a Vila Paraíso, o Brega que chamam. Por traz

tem um lago que é o Batata. Ele morava lá e por lá na época, quando ele era...

morava com o pai dele, por lá passou o cadastro da Mineração. Aí lá ele se

cadastrou, aí depois de eu casar com ele, aí eu entrei pelo dele, porque o marido tem

direito de cadastrar a esposa, os filhos. Aí por isso que a gente é cadastrado. Mas

nem todos aqui da comunidade são cadastrados. [Quando tem um problema grave de

saúde com as pessoas, eles atendem lá?] Eles atendem. É, só não é pra consulta,

assim, às vezes mandam pra Oriximiná. Se for uma coisa grave, eles atendem, às

vezes eles até... internado, que a pessoa fica internada. Mas ficar se consultando,

fazer consulta, isso aí a pessoa não tem direito. Tem que ir pra Oriximiná” (E 25,

2019).

(...)

“Primeiros socorros, quando a gente leva em Trombetas, às vezes eles fazem, por

aqui na Mineração ela tem um povo, que logo que ela chegou, que tava lá perto, no

Boa Vista, Batata e Moura, ela cadastrou. Uma sou eu que eu sai de lá, mas eu tenho

cadastro. Eu chego na mineração, eu me consulto, mas ele e outros, hoje não tem

cadastro. Mas, mesmo assim, a Mineração não deixa de receber, cadastrados ou não

cadastrados, agora os que não são cadastrados ela manda para Oriximiná e até

mesmo os cadastrados ela manda, mas a Mineração devido o Território, ela criou

também um projeto de médico que vem de Santarém, um grupo quilombola que vem

de Santarém que atende no moura, no Jamari, na Tapagem e aí as comunidades vai

pra lá, que querem ir pro Moura se consultar. Mas, diretamente em Oriximiná. Mas a

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gente tem esse médico que vem, esse projeto quilombola que traz esses médicos e a

gente se consulta aí no Moura” (E 21, 2019).

Analisando as falas dos Entrevistados 21 e 25, nota-se que o atendimento no hospital

de Porto Trombetas, mesmo que seja apenas para os atendimentos emergenciais e parto, é

considerado muito importante para os moradores locais. Para os demais atendimentos e para a

prevenção a doenças, os moradores que necessitam de atendimento médico deslocam-se a

cidade de Oriximiná, uma vez que as pessoas que não são cadastradas não possuem acesso ao

hospital e ao ambulatório da MRN. Quanto aos casos graves, a MRN encaminha os pacientes

para a cidade de Santarém, sendo responsável por todas as despesas com deslocamento,

estadia e tratamento.

Outra referência de serviço de saúde relada nas entrevistas é o projeto Quilombo,

executado pela Fundação Esperança, em parceria com a MRN que atende aos quilombolas do

TQ Alto Trombetas I e da Cachoeira Porteira uma por vez por mês, na Tapagem. Esse projeto

propicia atendimentos mensais aos moradores locais, incluindo consultas médicas, exames

laboratoriais, mediante a obtenção de senhas previamente disponibilizadas, além de propiciar

a formação de agentes de saúde e ações de conscientização em saúde. A comunidade Último

Quilombo, também, eventualmente, é atendida, regularmente, por meio do projeto Quilombo,

o qual realiza suas ações em dois polos do TQ Alto Trombetas 2, na comunidade Curuçá-

Mirim e no Moura, sendo nesta comunidade que os moradores do Último Quilombo são

atendidos (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2019).

Contudo, durante as pesquisas de campo constatou-se que esse serviço não estava mais

sendo oferecido por falta de repasse de recursos financeiros por parte da MRN. Os moradores

também argumentam que o projeto Quilombo não é suficiente para suprir as demandas locais

e apenas reivindicam o franqueamento do acesso ao hospital de Porto Trombetas, e que a

empresa interceda junto ao poder público municipal para que haja mais investimentos em

saúde para a população quilombola (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2019).

Durante a pesquisa de campo muito se reclamou pela falta de profissionais

capacitados, como médicos e enfermeiros para o atendimento das pessoas na própria

comunidade, uma vez que essas comunidades estão muito distantes da cidade de Oriximiná, e

as pessoas vão a Oriximiná apenas uma vez por mês, o que dificulta o tratamento e a

prevenção de doenças. As pessoas precisam agendar as consultas nas Unidades Básicas de

Saúde (UBS) de Oriximiná para se consultar com um médico posteriormente. Se for

necessário fazer exames também é preciso permanecer mais um dia na cidade de Oriximiná.

Logo, essas burocracias não favorecem aos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

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brasil do TQ Alto Trombetas 1 para um bom tratamento e acesso a medicina preventiva

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2019).

As doenças mais apontadas como recorrentes pelos Entrevistados no TQ Alto

Trombetas 1 são a gripe (95%) e a diarreia (52%), que está com índices mais sérios do que

em outros territórios de Oriximiná, reforçando ainda mais a necessidade de agentes de saúde

para distribuição de cloro tratamento de água (FIGURA 17). Dadas as condições gerais de

saúde nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1, aproximadamente 89% (GRÁFICO 14) dos

quilombolas utilizam “remédios caseiros” no tratamento de doenças (ARQMO 2018). Destes,

98% afirmaram que usam remédios caseiros como a principal forma de tratamento da saúde e

97% afirmou usar plantas medicinais no tratamento da saúde porque tem confiança nos

conhecimentos tradicionais familiares e, principalmente, pelas dificuldades de acesso e

formas de tratamento dispensadas aos quilombolas nos hospitais e postos de saúde (ARQMO,

2018).

Gráfico 14 – Como e onde os quilombolas

da microrregião Alto Trombetas tratam as

doenças

Gráfico 15 – Doenças mais comuns entre

os quilombolas da microrregião Alto

Trombetas

2%

5%

28%

63%

64%

89%

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Posto de Saúde

Hospital de Santarém

Curandeiro

Hospital de PTR

Hospital de Oriximiná

Remédio caseiro

% de famílias

Co

mo

o tra

tad

as

do

en

ça

s

9%2%5%6%6%8%9%

15%52%

95%

0% 20% 40% 60% 80% 100%

OutrasFebre Amarela

DiabetesVerminosePnemonia

MaláriaPressão alta

AnemiaDiarreia

Gripe

% de famílias

Pri

ncip

ais

do

en

ça

s

Fonte: ARQMO (2018)

Depreende-se que a utilização de remédios caseiros para o tratamento das doenças tem

sua origem nos conhecimentos tradicionais familiares acumulados e transmitidos através das

gerações no âmbito das comunidades, o que confirma a afirmação constante no Inventário

Nacional de Referências Culturais dos Quilombos de Oriximiná realizado pelo Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) de que os quilombolas acionam,

cotidianamente, outros recursos naturais aplicáveis à saúde física, mental e espiritual (IPHAN,

2014).

Os tratamentos caseiros são, regularmente, aplicados por pessoas locais chamados

benzedores e benzedeiras, puxadores e puxadeiras, ou pelos próprios moradores, já que

grande parte dos conhecimentos sobre os usos curativos de recursos naturais é disseminada

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amplamente nas comunidades, sobretudo para o tratamento de “vômito, febre, quebranto,

desmentiduras (luxações), rasgaduras e dores de cabeça” (Iphan, 2014, F1- 1, A3, p. 149). São

frequentes as práticas baseadas no uso de chás, infusões, xaropes, garrafadas, pomadas e

outros itens preparados com ervas, cipós e seivas vegetais, como, por exemplo: leite do

amapá, anador, batatão, boldo, canaficha, carapanaúba, capim-cheiroso, capim-santo, cidreira,

estoraque, jambu, japana, manjericão, mangarataia, mastruz, mucuracaá, pau-de-angola, peão-

roxo, preciosa, folha de ananás, quina, quinarana, saratudo, sacaca (casca, folha), saracura,

sene e timbó (CUMBUCA NORTE, 2017).

Dos Entrevistados pelo Projeto Jovens Quilombolas, 28% dos Entrevistados

(GRÁFICO 14) afirmou ainda tratar algumas doenças com os chamados “curadores” ou

“feiticeiros”, que, segundo os quilombolas, são pessoas dotadas de conhecimentos que podem

tanto ser usados para curar pessoas, quanto para fazer adoecer e até matar. Também são

frequentemente responsabilizados por cosias ruins que acontecem nas comunidades, como por

exemplo, pela separação de casais, pelas traições conjugais, etc.. Durante o trabalho de campo

o guia que estava auxiliando nas pesquisas de campo não permitiu que sua companheira fosse

até a comunidade da Tapagem, pois nessa comunidade, segundo ele, havia um feiticeiro que

teria sido o responsável pela separação dele e de sua ex-companheira, de um relacionamento

anterior (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018).

Segundo Jesus (2001), a feitiçaria tem suas origens no universo dos colonos da

América portuguesa e estava ligada às necessidades do dia-a-dia, sendo usada nas resoluções

de problemas concretos: perdas de propriedades, questões amorosas, doenças e inimizades.

Ela se tornou uma necessidade na formação social escravista, pois dava armas aos escravos

para moverem uma luta surda contra a escravidão, como também legitimava a repressão e a

violência exercidas sobre o cativo. Os escravos podiam ser legitimamente castigados porque

eram feiticeiros e, por meio dos castigos e ameaças físicas, os senhores procuravam se

precaver do potencial mágico deles Jesus (2001).

Apesar do uso dos chamados remédios caseiros por 89% dos Entrevistados pelo

Projeto Jovens Quilombolas (GRÁFICO 14), 64% também declarou utilizar o sistema oficial

de saúde, mesmo os que tratam as doenças com as práticas tradicionais, seja da MRN ou da

PMO. Assim, o sistema municipal de saúde tende a ser procurado, primordialmente, quando

os cuidados locais tradicionais não surtem efeitos positivos ou quando se trata de casos

graves, que necessitam de avaliação e tratamento com médicos especializados. Assim, é

importante que políticas públicas de prevenção a doenças sejam destinadas aos quilombolas

das comunidades do TQ Alto Trombetas 1 e comunidade Último Quilombo, assim como

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campanhas de conscientização. Contudo, como já visto anteriormente, é preciso considerar

que esse povo tradicional não tem acesso aos meios de comunicação mais utilizados

(televisão, internet, rádio), atualmente, para a propagação de campanhas de conscientização

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA).

Organizações Não Governamentais (ONGs)

Desde 2017 os TQs da microrregião Alto Trombetas participam do Programa

Territórios Sustentáveis (PTS), que é patrocinado pela Mineração Rio do Norte e

desenvolvido e realizado pela Agenda Pública, Ecam e Imazon, organizações da Sociedade

Civil de Interesse Público (Oscips) que atuam na área de meio ambiente, economia, gestão

pública e fortalecimento da sociedade. Atua na região amazônica do oeste do Pará, conhecida

como Calha Norte, nos municípios de Oriximiná, Terra Santa e Faro. Possui como objetivos

implementar estratégias integradas para o desenvolvimento local de forma sustentável,

incluindo as populações residentes e o poder público, contribuindo, assim, a médio prazo,

com a redução da dependência econômica que essa região possui em relação a mineração de

bauxita (PROGRAMA TERRITÓRIOS SUSTENTÁVEIS, 2019).

Os municípios de atuação do PTS enfrentam situações de desigualdade econômica e

social crescente e um cenário de interações complexas, pois apesar desses municípios

apresentarem PIBs elevados devido a alta arrecadação proveniente tanto da Compensação

Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) – os chamados royalties da

mineração – quanto de impostos como ICMS Verde e até ISS, os índices de desigualdade

social também se mostram elevados. Além disso, a área abrangida pelo Programa Territórios

Sustentáveis está inserida numa área que possui uma das maiores extensões de florestas

tropicais protegidas do mundo, com uma sociodiversidade que inclui ribeirinhos, quilombolas

e indígenas, inseridos em um contexto econômico que engloba atividades produtivas baseadas

no extrativismo, agricultura, pecuária e mineração. A chegada da MRN nessa região, por

exemplo, criou expectativas pelo aumento da arrecadação financeira pelos municípios e a

geração de empregos e renda para a população local, contudo, além de causar dependência

econômica nos municípios e alteração nas relações sociais locais estabelecidas anteriormente,

também vem ocasionando impactos sociais e ambientais, como desmatamento, poluição de

corpos hídricos e diminuição da biodiversidade local (PROGRAMA TERRITÓRIOS

SUSTENTÁVEIS, 2019).

O Programa Territórios Sustentáveis atua de forma integrada em cinco eixos: Gestão

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Pública, Capital Social, Desenvolvimento Econômico, Gestão Ambiental e Quilombola que

foram levantados como prioridade, baseando-se nos diagnósticos dos territórios, os quais

norteiam o trabalho da Agenda Pública, Ecam e Imazon por 15 anos, a partir de 2017. O eixo

quilombola possui como objetivo: apoiar as comunidades quilombolas em sua organização,

com o objetivo de fortalecer as suas organizações, sua governança e gestão comunitárias,

promovendo oficinas de planejamento, capacitações, encontros e reuniões que potencializam

a atuação de suas organizações nos processos de relacionamento com os outros sujeitos da

região e nos seus planejamentos comunitários (PROGRAMA TERRITÓRIOS

SUSTENTÁVEIS, 2019).

É um canal aberto através mesmo da Constituição que vai nos ajudar a

receber ajudas de parceiros como ECAM e várias ouras instituições

que estão aí disponíveis pra ajudar as comunidades quilombolas. E, a

gente, uma vez organizados através da Associação de Moradores, nós

temos mais confiança, mais respaldo pra receber essas ajudas pro

desenvolvimento da nossa comunidade (E 16, 2018).

Na primeira etapa do Programa Territórios Sustentáveis, os TQs elaboraram os seus

planos de vida e criaram, em colaboração com a Funtec, o Fundo Quilombola, os quais fazem

parte das ações do Eixo quilombola. O Plano de Vida e o Fundo Quilombola são duas

ferramentas de gestão territorial. O Plano de Vida é um plano de gestão territorial,

instrumento que possibilita às comunidades quilombolas planejar seus objetivos de

desenvolvimento, para, a partir destes, buscar e implementar parcerias com o intuito de

concretizá-los por meio do Fundo Quilombola, um mecanismo financeiro construído,

colaborativamente, para que os territórios quilombolas possam receber e gerir recursos para

subsidiar as ações aprovadas no Plano de Vida (PROGRAMA TERRITÓRIOS

SUSTENTÁVEIS, 2019).

A gestão do Fundo Quilombola é realizada pela Fundação de Tecnologia Florestal e

Geoprocessamento (Funtec), instituição fundada em 1998, com sede em Brasília-DF, com o

objetivo de apoiar alguns projetos ambientais, bem como o laboratório de produtos ambientais

do Ibama. A escolha da Funtec foi realizada pelos representantes das associações dos

territórios quilombolas do Erepecuru (Acorqe), Ariramba (Acorqa), Água Fria (ACRQAF),

Boa Vista (ACRQBV), Alto Trombetas I (Mãe Domingas), Área Trombetas (Acorqat), além

da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos de Oriximiná (Arqmo). O

Plano de Vida possibilita que os recursos do Fundo Quilombola sejam utilizados da melhor

maneira possível, com o intuito de melhorar a qualidade de vida das pessoas, gerando

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desenvolvimento e autonomia para as comunidades quilombolas (PROGRAMA

TERRITÓRIOS SUSTENTÁVEIS, 2019).

O acesso a tecnologias globais

Nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1 a comunicação é incipiente, já que não

possuem cobertura de sinal para serviços de telefonia móvel, assim como não há cobertura de

sinal de internet 3G ou 4G. O serviço de internet está disponível apenas nas escolas polo dessa

microrregião, onde as pessoas utilizam o serviço de WhatsApp para se comunicarem.

Aproximadamente 65% das famílias Entrevistadas (Gráfico 16), ainda utilizam recados como

principal meio de comunicação, o que demonstra uma dificuldade de implantação de

tecnologias mais modernas utilizadas atualmente na comunicação. Contudo, cerca de 37% dos

Entrevistados utiliza aparelho de telefone celular como meio de comunicação, que usam

quando vão a Porto Trombetas ou a Oriximiná. Atualmente, as bases de fiscalização do

ICMBio situada também são pontos importante de contato da comunidade com o externo,

pois o órgão ajuda a transmitir recados (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018;

ARQMO, 2018).

Gráfico 16 – Meios de comunicação utilizados pelos quilombolas

Fonte: ARQMO (2018)

Desde 2014, com o apoio da MRN, vem sendo implantados telefones rurais nos

territórios quilombolas que estão no entorno do projeto minerador, entretanto, não foi possível

a implantação desse serviço nas comunidades do TQ Alto Trombetas 1, conforme consta na

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Ata de uma reunião realizada pela MRN com as associações: Mãe Domingas, ACRQAT,

Arqmo e coordenadores de comunidades da microrregião Alto Trombetas para tratar de

assuntos diversos:

Sobre a implantação de celulares rurais nas comunidades do Alto Trombetas, foi

feita visita técnica da empresa DG Sat de Oriximiná, e após as medições de sinal, foi

detectado que do Mãe Cué até o Abuí, não há sinal de celular. A MRN informou que

a compra desse serviço para as oito comunidades onde foi encontrado sinal de

celular, está em andamento. Manoel Siqueira esclareceu que as medições no Abuí,

Paraná, Tapagem, Sagrado e Mãe Cué foram acompanhadas pelos moradores de

cada comunidade e não houve sucesso. Ficou definido que durante instalação da

Área Trombetas II, será avaliada uma forma de solucionar o problema da Área

Trombetas I (ATA DE REUNIÃO REALIZADA NO DIA 07/07/2014 PELA

MRN).

Atualmente, está em fase de operação nas comunidades da microrregião Alto

Trombetas o projeto “Inclusão Digital Quilombola”, do Programa Territórios Sustentáveis,

que tem por objetivo a instalação de internet via satélite nas escolas das comunidades

quilombola. Os pontos de “Inclusão Digital” foram instalados nos territórios de Cachoeira

Porteira, Mãe Domingas, Alto Trombetas 2, Boa Vista Trombetas, Água Fria, Erepecuru,

Área Trombetas e Ariramba e também nas escolas quilombolas de Tapagem (Alto Trombetas

1), Jamari (Alto Trombetas 2), Aracuã de Baixo e Serrinha (Área Trombetas) e Boa Vista

Cuminã (Erepecuru). O TQ Alto Trombetas 1 não possui sinal de celular e nem de internet,

mas a comunidade Último Quilombo possui sinal de telefonia celular da operadora Vivo e

também sinal de internet pela mesma operadora, devido a proximidade com a company town

Porto Trombetas (ARQMO, 2018).

A circulação

O acesso ao TQ Alto Trombetas 1 e a comunidade Último Quilombo se dá

exclusivamente por via fluvial, através do rio Trombetas, e seus tributários navegáveis em

todos os períodos do ano. O acesso a comunidade Último Quilombo, devido estar localizada

no interior da Rebio do Rio Trombetas, deve ser previamente autorizado pelo ICMBio

(OBSERVAÇÃO DE CAMPO, 2018/2019).

O TQ Alto Trombetas 1 e a comunidade Último Quilombo não possuem rotas

regulares de “barcos de linha”, sendo que os moradores das comunidades do TQ Alto

Trombetas 1, geralmente, utilizam os “barcos de linha” que possuem rotas regulares entre a

cidade de Oriximiná e a comunidade Cachoeira Porteira. Em geral, os moradores possuem

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embarcações próprias – canoas, rabetas, bajaras, barcos e lanchas – para uso individual e

familiar, sendo que alguns moradores que possuem barcos, eventualmente, também

transportam outras pessoas da comunidade. Além disso, em geral, cada uma das comunidades

do TQ Alto trombetas 1, assim como a comunidade Último Quilombo, possuem barco para o

transporte de comunitários – principalmente nos períodos de fim/início de mês – quando vão

até Oriximiná para acessar serviços e comércios na cidade e/ou uma lancha para transporte em

situações de emergência (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Há ainda os caminhos de acesso às residências, às roças e às áreas de uso coletivo,

como o centro comunitário. Para chegar a outras comunidades, a única opção é a navegação

pelos rios e lagos. Esta é feita em embarcações particulares, normalmente de pequeno porte,

ou na lancha da comunidade. No percurso pelo rio Trombetas, acima e abaixo da comunidade

Sagrado Coração de Jesus, há dois postos de fiscalização do ICMBio, aos quais os

quilombolas devem se apresentar, obrigatoriamente, por se tratar de trânsito em unidade de

conservação (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Os rios, lagos e igarapés, além se serem o espaço de pesca, também são vias de

circulação e de acesso às áreas de coleta de castanha e outros produtos. Nas margens destes,

são construídos pequenos “portos” (FIGURA 17), onde, geralmente, é construída a chamada

“ponte”, uma estrutura de tábuas construídas sobre estacas, que atende a diversas finalidades:

atracação de canoas, banho, lavagem de roupa, além de servir de ponto de acesso à rede

hidrográfica do Trombetas, principal via de circulação de pessoas e da produção, já que não

há acesso por estradas ou rodovias (OBSERVAÇÃO ESTRUTURADA, 2018/2019).

Figura 17 – “Pontes” construídas nos chamados “portos”. O “porto” é a conexão entre os

locais de moradia e os rios, lagos e igarapés, que, por sua vez são a via de acesso as áreas de

castanhais, de roçados, de caça e pesca (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA). Fonte:

PICANÇO (2018).

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A circulação de pessoas e de produtos pelo território é feita nas chamadas “rabetas”,

em barcos movidos a motor a diesel, em canoas, a pé ou em lanchas rápidas, conforme

informado pelos Entrevistados 17, 19, 20, 23, 26, 27.

“O meio de transporte aqui é rabeta cada um tem o seu e o barco da Comunidade e a

lancha para ir para Cidade geralmente vai no barco da Comunidade ou vai com

alguém que tem o barco maior Agente vai á Oriximiná todo final de mês” (E 17).

[...]

“Aqui o meio de transporte é o mesmo para andar aqui para ir para cidade barco,

rabeta, rabeta é o que mais tem, na cidade a moto, no interior é rabeta”(E 19).

[...]

“O meio de transporte é rabeta, canoa, barco é para ir para cidade quando não é no

barco da gente, é no barco da linha né, lá de Trombetas, de rabetinha mesmo vai

também, a gente vai uma vez por mês lá para Cidade” (E 20).

[...]

“[meio de transporte?] Rabeta e barco, barco de linha” (E 23).

[...]

“Ainda tem isso, tem esses barcos de linha, mas quando a gente vai no barco de

linha, tem vez que a gente é até humilhado no barco da linha, porque é deles mesmo

né? E aí, em vez de melhorá fica atrapalhando e apiorando pra gente” (E 6, 2018).

[...]

“O meio de transporte é rabeta, a gente vai pra cidade no barco da linha, às vezes, no

nosso rabeta. A gente vai só no final do mês lá” (E 26).

[...]

“[Transporte?] Antes, era no remo, saia 2 horas da manhã, pra chegar lá na feria 5

horas da manhã. Aí, depois ele comprou um rabeta, aí foi melhorando, né? Até que

chegou nesse aí. Depois que ele se aposentou chegou nesse aí. A gente vai receber

nosso dinheirinho, faz compra, aí vem embora” (E 27).

Analisando-se as falas dos Entrevistados 17, 19, 20, 23, 26, 27, é possível inferir que

os dois principais meios de locomoção dos quilombolas do TQ Alto Trombetas 1 e da

comunidade Último Quilombo são a rabeta e o barco (FIGURA 18), sendo o primeiro mais

acessível que o segundo porque custa mais barato. A rabeta é mais utilizada em viagens

curtas, enquanto o barco é mais utilizado em viagens longas, devido, principalmente, a

segurança e estabilidade de navegação que os barcos oferecem. Os quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil utilizam o barco para se locomover até a cidade de

Oriximiná, onde, enquanto ancorados no porto da cidade, é comum se transformarem em

moradias para as pessoas que neles viajam e que não possuem casa na cidade. A locomoção a

pé ou em canoas, geralmente, é feita em curtas distâncias, entre casas de vizinhos, por

exemplo, ou para caçar, pescar, coletar produtos ou transportar produtos das roças.

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Figura 18 – Principais meios de transporte utilizado pelos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas. À esquerda as chamadas

rabetas, muito utilizadas pelos coletores tradicionais de castanha-do-brasil do TQ Alto

Trombetas 1 e da comunidade Último Quilombo. À direita um barco de propriedade de um

regatão local, que também é utilizado para o transporte dos alunos da comunidade Último

Quilombo para a escola sediada na comunidade do Moura. O barco é o meio de transporte

mais utilizado para viagens a longas distâncias. O proprietário do barco também trabalha na

Coopbarcos, pelo regime de quinzena. Fonte: PICANÇO (2019).

5.3 O TERMO DE COMPROMISSO E AS IMPLICAÇÕES NA CADEIA PRODUTIVA

DA CASTANHA-DO-BRASIL COLETADA NA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO

TROMBETAS

Desde meados do século XIX, a castanha-do-brasil tem figurado como um produto de

grande importância econômica dentre os produtos extrativos florestais não madeiros extraídos

da microrregião Alto Trombetas. É importante para os quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil, que têm no trabalho de coleta desse produto importante fonte de renda

para a reprodução de seu modo de vida. Mas também é importante para os

regatões/atravessadores, donos de usinas de beneficiamento de castanha-do-brasil e empresas

atacadistas e varejistas. Estas veem nesse produto uma forma de obter lucro através da mais-

valia, seja por meio da agregação de valor nas etapas de distribuição e circulação, seja no

beneficiamento do produto. Além disso, essa atividade produtiva faz parte da tradição dos

quilombolas do vale do rio Trombetas, que coletam esse produto, para fins comerciais, desde

a segunda metade do século XIX (CASTRO; ACEVEDO, 1998). O trabalho de coleta desse

produto é um importante elemento caracterizador do modo de vida dos quilombolas do vale

do rio Trombetas, principalmente, nas lutas pelo reconhecimento e titulação de seus

territórios.

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172

5.3.1 Aspectos bioecológicos da castanha-do-brasil

A castanha-do-brasil12

(FIGURA 19) é a semente encontrada no interior do ouriço,

fruto da castanheira-do-brasil (Bertholletia excelsa H.&K.), árvore pertencente à família

Lecythidaceae, gênero Bertholletia e espécie excelsa (PACHECO; SCUSSEL, 2006). A

castanheira-do-brasil (Bertholletia excelsa H. B. K.) representa a única espécie existente no

gênero Bertholletia e, embora exista uma considerável variação no tamanho, forma e número

de sementes por fruto, não se constitui justificativa plausível para reconhecer mais de uma

espécie (MORI; PRANCE, 1990). É uma espécie popularmente denominada de castanheira,

castanheira-do-brasil, castanheira-do-pará, castanheira-do-maranhão, castanheira-da-

amazônia, Brazil nuts ou Para nuts, para os anglo-americanos, e noix du Brésil ou noix de

Para, para os franceses (SALOMÃO, 2014).

A castanheira-do-brasil (FIGURA 19) é uma árvore que possui caule ou tronco em

formato cilíndrico, liso e desprovido de galhos ou troncos até a altura da copa. Pode atingir 50

metros de altura, tendo em geral entre 20 e 30 metros na idade adulta, e apresenta um

Diâmetro a Altura do Peito (DAP) superior a 02 (dois) metros. Uma das explicações para a

altura alcançada pela espécie, que a destaca na floresta, é a necessidade de luz, uma vez que a

castanheira é uma planta tipicamente heliófila. Sua casca possui cor acinzentada e a madeira é

tida como adequada para vários usos industriais, embora o corte da árvore seja proibido pelo

Decreto Federal nº 1.282, de 19 de 1994 (HOMMA, 1984).

12

Apesar de ser chamada de castanha-do-pará, comercialmente, a partir do Decreto-Lei nº 51.209, de 18 de

setembro de 1961, passou a ser denominada, para efeito de comércio exterior, como castanha-do-brasil

(BRASIL, 1961)

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173

Figura 19 – Árvore da castanheira-do-brasil e no canto superior, à direita, ouriços e sementes

da castanheira. Fonte: http://www.oleodecastanha.com.br/home/;

http://www.celeiroprodutosnaturais.com.br/castanha-do-para-granel-100g

A castanheira ocorre em agrupamentos conhecidos como “castanhais” ou “bolas de

castanha”, como são conhecidos na microrregião Alto Trombetas, ou ainda “pontas de

castanhais”. Em áreas de ocorrência natural de castanheiras pode-se encontrar 1,3 e até 5,1

árvores adultas por hectare (PERES; BAIDER, 1997). Estudos revelam densidades entre 1,3 e

4,0 árvores por hectare na Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre. Na Floresta Nacional

de Caxuanã ocorre entre 10 a 12 árvores por hectare. No Trombetas, a densidade varia muito,

entre 0 a 15 árvores por hectare (FIGURA 20). A densidade média de castanheiras é de 01

(uma) árvore por hectare (CYMERYS et al., 2005, p. 62).

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174

Figura 20 – Densidade da castanheira-do-brasil, que deve ser levada em consideração

para fazer os manejos e o trabalho de coleta.

Fonte: CYMERYS et. al. (2005, p. 62).

O crescimento da castanheira-do-brasil é demorado, frutificando a partir dos 8 ou 10

anos. Em alguns casos, a frutificação pode começar após os 20 anos. A floração da

castanheira-do-brasil ocorre, geralmente, nos meses de agosto, setembro e outubro e a coleta

nos meses de novembro a março. No Acre, as flores da castanheira começam a abrir no final

da estação seca, quando os frutos da floração anterior estão quase prontos para caírem. As

flores aparecem de outubro a dezembro, e os frutos amadurecem em 14 ou 15 meses, caindo

de dezembro a fevereiro. No Pará, as flores aparecem entre setembro e fevereiro e os frutos

caem entre janeiro e abril (FIGURA 21) (CYMERYS et. al., 2005).

Figura 21 – Ecologia da castanheira-do-brasil, que pode variar em cada região.

Fonte: Adaptado de CYMERYS et al. (2005, p. 62).

A castanha-do-brasil é rica em proteínas e calorias, sendo considerada por muitos

como “carne vegetal”, pois a semente da castanha-do-brasil possui, mais ou menos, metade da

proteína e duas vezes mais calorias que as contidas num bife, entre 12% a 17% de proteína e a

farinha sem gordura possui 46% de proteína, enquanto a carne de gado possui entre 26% a

31% de proteína. Além disso, a proteína da castanha-do-brasil é quase equivalente à do leite

de vaca, contendo aminoácidos completos. A castanha-do-brasil possui minerais como

fósforo, potássio e vitamina B. Em adição, 100 gramas de castanha-do-brasil contêm: 61

gramas de gordura; 2,8 miligramas de ferro; 180 miligramas de cálcio; 4,2 miligramas de

zinco. A castanha-do-brasil também contém grandes quantidades de metionina, que é um dos

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175

elementos nutritivos mais limitados na dieta amazônica. Também contém selênio, um mineral

que possui papel importante como anti-oxidante, uma vez que a oxidadação influencia no

envelhecimento, Mal de Parkinson e Alzaimer. Logo, o selênio pode ser utilizado no

tratamento dessas doenças (BENTON, 2002).

A castanha-do-brasil é integralmente aproveitada, sendo consumida in natura, cozida e

cristalizada, em óleo, farinha ou farelo. Também é empregada em confeitarias e na indústria

farmacêutica e de cosméticos, entretanto, por uma questão de cultura e de oportunidades de

empreendimentos, apenas a parte comestível é que a maioria das empresas utiliza. É

importante ressaltar que de todas as formas de uso a que está gerando maior valor agregado é

a de insumo da indústria de cosméticos (QUADRO 11).

Quadro 11 – Usos gerais da castanha-do-brasil Partes da

castanha-do-

brasil

Usos gerais da castanha-do-brasil Onde são consumidos/por quem

Amêndoa

Descascada e comida fresca, bombom,

sorvete, doce, farinha e leite para temperar

comida.

Feiras, lanchonetes, supermercados, que

vendem ao consumidor final, pessoas que

consomem a castanha-do-brasil in natura ou

como ingredientes de outros alimentos;

Óleo Sabonete, creme, xampu, óleo trifásico. Indústrias de cosméticos que comercializam

com o consumidor final;

Ouriço

Artesanato, brinquedos (pés de ouriço),

remédio, carvão, pilãozinho, tigela para

coletar seringa

Comunidades tradicionais;

Casca Remédio (chá) para diarreia. Comunidades tradicionais;

Madeira

Historicamente muito utilizada para estacas e

construção, mas hoje é ilegal derrubar

castanheiras silvestres.

Sem utilização, pois é ilegal;

Fonte: Adaptado de CYMERYS et al. (2005, p. 63).

5.3.2 A cadeia produtiva da castanha-do-brasil coletada na Reserva Biológica do Rio

Trombetas

Segundo Costa e Nunes (2015), a cadeia produtiva “é o conjunto de relações

socioeconômicas de produção que são estruturadas para manter a produção e vender,

transportar e vender o produto”, até chegar ao consumidor final, cujas relações entre os

sujeitos que a compõem são de interdependência e determinadas por forças hierárquicas.

Sobre a cadeia castanha-do-brasil, Santos et al. (2004) relataram que a falta de conhecimento

de mecanismos de ação dos fatores que interferem no seu desempenho vêm impedindo a

definição de ações que possam favorecer a maior eficiência e competitividade da mesma

(KRAG, 2014).

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176

Analisar a cadeia produtiva da castanha-do-brasil como um todo é importante porque o

processo de produção, que tem origem no segmento extrativista (quilombolas), elo inicial da

cadeia produtiva, sofre influência do mercado internacional, por exemplo, muitas vezes,

oscilações no mercado da castanha, interferem no preço pago aos coletores tradicionais de

castanha-do-brasil pelo produto, não compensando, muitas vezes, a coleta. Daí a importância

de se estudar a cadeia produtiva da castanha-do-brasil coletada na Reserva Biológica do Rio

Trombetas como uma totalidade.

Assim, a espacialidade e a espacialização do processo produtivo da castanha-do-brasil

se faz entender pela relação sociedade-natureza, episteme de um conjunto de conhecimentos

interdisciplinares que se tornam fundamentais para a análise e compreensão de um mercado

específico, assim como de sua cadeia produtiva, que com o advento das tecnologias de

transformação, estas fortaleceram e modificaram o uso da biodiversidade vegetal

(BILLACRÊS, 2018). A espacialidade é o movimento concreto das ações e sua reprodução no

espaço geográfico e no território. Já a espacialização como movimento é circunstancial, é o

presente (SANTOS, 1988). Ao contrário da territorialização, a espacialização não é expansão,

são fluxos e refluxos da multidimensionalidade dos espaços. Portanto, não existe

“desespacialização”, pois uma vez realizada em movimento, a espacialização torna-se fato

acontecido, impossível de ser destruído. Logo, a circulação da castanha-do-brasil é um

exemplo de espacialização. A espacialidade é o movimento contínuo de uma ação na

realidade ou o multidimensionamento de uma ação. A espacialidade carrega o significado da

ação. Na espacialidade a ação não se concretiza como é o caso da espacialização. A

espacialidade é subjetiva e a espacialização é objetiva (FERNANDES, 2006).

A espacialidade e a espacialização da castanha-do-brasil, neste processo produtivo,

ocorrem pela identificação e estruturação dos lugares que fazem desta semente uma obtenção

de lucro (para as usinas de beneficiamento) e renda (para os coletores tradicionais de

castanha-do-brasil), dependendo das forças sociais de apropriação e utilização dos recursos,

gerando novas relações de produção. A biodiversidade, por sua vez, é uma produção da

natureza, mas as formas de uso são produções sociais que envolvem a cultura, o capital, as

tecnologias, a infraestrutura, que por meio disto, geram conflitos (COSTA; FERREIRA,

2017). A cadeia produtiva de castanha-do-brasil se constitui/produz/constrói como uma das

especificidades, das diversidades do mercado da biodiversidade, que o objetivo é a produção

de bioprodutos para a obtenção de lucros e concomitantemente territorialização do capital e de

grupos econômicos (BILLACRÊS, 2018).

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177

5.3.3 Produção e espacialidade da castanha-do-brasil

No que se refere a produção e espacialidade da castanha-do-brasil, os resultados

indicaram que é difícil estimar a produção de uma castanheira porque o número de ouriços

varia muito entre anos e entre árvores. De uma maneira geral, o tamanho da árvore está

relacionado com a sua produção. Entretanto, isso não é regra, pois existem árvores grandes

que não produzem nenhum ouriço. Uma castanheira produz em média vinte ouriços por ano.

Em média, em cada ouriço existem dezesseis castanhas, cada uma pesando sete gramas.

Normalmente, uma árvore produz quatrocentas e setenta castanhas (SALOMÃO, 1991).

A castanheira é encontrada em praticamente toda a região amazônica da América do

Sul, cobrindo uma superfície de aproximadamente 325 milhões de hectares, com a maior parte

distribuída entre o Brasil, com 300 milhões, a Bolívia com 10 milhões e o Peru com 2,5

milhões de hectares (PACHECO; SCUSSEL, 2006). No Brasil, a castanheira-do-brasil está

mais concentrada, principalmente, nos estados do Acre, Amazonas e Pará, e em menor

concentração nos estados de Rondônia, Mato Grosso, Amapá e Roraima, sendo este último o

estado amazônico de menor produção.

Até 1990, o Brasil ocupava a posição de liderança no mercado mundial, com 80% do

comércio e uma produção de 51 mil toneladas (PENNACCHIO, 2006). Atualmente, a Bolívia

é responsável por 50% da produção mundial, o Brasil por 37% e o Peru por 13%. Segundo

Pennacchio (2006) e Tonini (2007), os principais fatores que justificam o declínio nos valores

absolutos da produção brasileira são: a redução das áreas de castanhais nativos produtivos,

não havendo uma política de reposição de novos castanhais; as deficiências na cadeia

produtiva, em especial nas logísticas de transporte e de armazenamento; ausência de políticas

e de programas de incentivo à produção, de apoio direto à comercialização e de sustentação

de renda ao extrativista; desvantagens competitivas em relação à Bolívia e o Peru, ao mesmo

tempo em que investimentos e incentivos fiscais na Bolívia tornaram este país líder no

mercado internacional; aliadas as dificuldades de atendimento às exigências fitossanitárias

para exportação, especialmente quanto aos limites de tolerância para presença de aflatoxinas –

substância tóxica produzida por muitas das espécies do fungo Aspergillus, que deixam as

amêndoas da castanha-do-brasil com uma qualidade ruim para a alimentação, saúde e

comercialização – até 30 ppb no Brasil, e até 4 ppb nos EUA e Europa. Além desses fatores,

as condições climáticas desfavoráveis, como escassez de chuvas em diversas localidades das

Regiões Norte, Nordeste e Sudeste – fenômeno que afetou a produtividade das espécies –

aliados à escassez de mão de obra para a coleta, também contribuem para a diminuição da

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178

produção nacional de castanha-do-brasil (PENNACCHIO, 2006; TONINI, 2007).

Nos dados oficiais do IBGE a castanha-do-brasil ocupa o terceiro lugar entre os

produtos extrativos não madeireiros do grupo “Alimentícios”, ocupando a terceira posição em

valor de produção no ano de 2017 (R$ 104,1 milhões), ficando atrás apenas do açaí, produto

que apresentou a segunda maior quantidade produzida em 2017 (219,9 mil toneladas), mas

apresentou o maior valor de produção (R$ 596,8 milhões), seguido pela erva-mate, que apesar

de produzir a maior quantidade, apresentou o segundo maior valor de produção, com

R$ 423,9 milhões (IBGE, 2018).

Gráfico 17 – Quantidade produzida (mil toneladas) e valor de produção (milhões de reais) na

extração vegetal de produtos não madeireiros no Brasil

0,0

100,0

200,0

300,0

400,0

500,0

600,0

700,0

Mil

ton

ela

das

e M

ilh

ões d

e r

eais

Produtos extrativos não madeireiros do grupo “Alimentícios”

Quantidade produzida (mil

toneladas)

Valor de produção (milhões de

reais)

Fonte: IBGE (2018). Elaboração própria.

Em 2017, a castanha-do-brasil figurou entre os quatro produtos extrativos vegetais não

madeireiros com maior valor de produção, apesar de ter apresentado queda de 24,56% na

quantidade absoluta produzida em relação a produção de 2016, passando de 34,6 para 26,1

mil toneladas (GRÁFICO 17). Contudo, geralmente, a produção de castanha-do-brasil

apresenta um movimento cíclico que não mostra definitivamente uma tendência crescente.

(GRÁFICO 18).

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Gráfico 18 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida no Brasil, em toneladas,

entre 1994 e 2017

Fonte: IBGE – Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura, 2018. Elaboração própria.

No Brasil, a participação relativa da Região Norte no total da produção brasileira de

castanha-do-brasil entre os anos de 1994 a 2005 se manteve, em média, por volta dos 99%, o

que demonstra alta concentração da produção desse produto nessa região (GRÁFICO 19). A

partir do ano de 2006 até 2017, a participação relativa da Região Norte no total da produção

nacional passou a ser, em média, de 96%, destacando-se, fora da Região Norte, o estado do

Mato Grosso, que, em 2017, produziu 1706 toneladas e, atualmente ocupa a 5ª posição dentre

os estados produtores de castanha-do-brasil (IBGE, 2018).

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Gráfico 19 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida nos estados brasileiros da

Amazônia, em toneladas, entre os períodos de 1994 a 2017

Fonte: IBGE – Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura, 2018. Elaboração própria.

No Brasil, a produção da castanha-do-brasil está altamente concentrada nos estados do

Acre, Amazonas e Pará, que detêm, atualmente, 83% da produção, com os demais estados

(Rondônia, Mato Grosso, Amapá e Roraima) totalizando os 17% restantes, sendo que,

atualmente, o estado do Amazonas é o maior produtor de castanha-do-brasil, com um total de

12.786 toneladas, ou seja, 48,8% da produção do país, seguido pelo estado do Acre, que

responde por 18,3% da produção nacional, pelo estado do Pará, com 16%, e por Rondônia

com 7,1% do total nacional. Roraima é o estado da Amazônia que apresenta a menor

produção, com uma média histórica de 0,34% da produção nacional (IBGE, 2018).

Tabela 03 - Quantidade produzida e participação na produção nacional de

castanha-do-brasil dos 08 principais estados brasileiros produtores, em ordem

decrescente – ano 2017

Estado (UF) Produção (Ton)

Ano (2017)

Particiapção na

produção nacional

(% )

Amazonas 12.786 48,8

Acre 4.790 18,3

Pará 4.186 16,0

Rondônia 1.865 7,1

Mato Grosso 1.706 6,5

Amapá 476 1,8

Roraima 380 1,5

Tocantins 02 0,0

Total 26.191 100,0

Fonte: IBGE - Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura, 2018.

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O estado do Pará figura, nos últimos cinco anos, como o terceiro maior produtor de

castanha-do-brasil dentre os estados brasileiros produtores, contribuindo com 19,71% da

produção nacional (IBGE, 2018). Deste montante, o município de Oriximiná contribuiu, em

média, com 24,22% da produção estadual, sendo o maior produtor do estado. Atualmente, o

município de Oriximiná ocupa a 6ª posição dentre os 20 principais municípios brasileiros

produtores de castanha-do-brasil (Tabela 04), com uma produção, em 2017, de 885 toneladas,

o que responde por de 21% da produção do estado do Pará, e representa uma participação de

3,38% na produção nacional (IBGE, 2018).

Tabela 04 - Quantidade produzida e participação na produção nacional de

castanha-do-brasil dos 20 principais municípios produtores e respectivas

Unidades da Federação, em ordem decrescente – ano 2017

Municípios produtores e

respectivas Unidades da

Federação

Castanha-do-brasil

Quantidade

produzida (t)

Participação na

produção da Região

Norte (%)

Participação na produção

brasileira (%)

Brasil 26191 ---------- 100,00

Norte 24485 ---------- 93,48

Humaitá – AM 3280 13,40 12,52

Beruri – AM 3000 12,25 11,45

Lábrea – AM 1200 4,90 4,58

Porto Velho – RO 1080 4,41 4,12

Boca do Acre – AM 900 3,68 3,44

Oriximiná – PA 885 3,61 3,38

Sena Madureira – AC 867 3,54 3,31

Tefé – AM 700 2,86 2,67

Rio Branco – AC 673 2,75 2,57

Óbidos – PA 670 2,74 2,56

Brasiléia – AC 650 2,65 2,48

Codajás – AM 600 2,45 2,29

Guajará-Mirim – RO 600 2,45 2,29

Epitaciolândia – AC 551 2,25 2,10

Alenquer – PA 520 2,12 1,99

Xapuri – AC 503 2,05 1,92

Autazes – AM 465 1,90 1,78

Manicoré – AM 460 1,88 1,76

Capixaba – AC 382 1,56 1,46

Acrelândia – AC 323 1,32 1,23

Outros 7882 32,19 30,09

Fonte: IBGE - Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura, 2018.

No município de Oriximiná, a microrregião Alto Trombetas é uma das áreas com

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maior produção de castanha-do-brasil, principalmente as áreas de castanhais que se encontram

no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Nos últimos cinco anos, a microrregião

Alto Trombetas contribuiu, em média, com 6,24% na produção do município de Oriximiná.

Contudo, entre os anos de 1994 a 2005, a produção de castanha-do-brasil da microrregião

Alto Trombetas contribuiu, em média com 62,25% da produção do município (ICMBio,

2018)13

. Esse declínio na produção pode estar relacionado à criação e à implantação da

Reserva Biológica do Rio Trombetas, em 1979, com uma área de 385.000 hectare, sobreposta

a territórios centenários de quilombolas, restringindo, assim, o acesso desses grupos aos

recursos do território necessários a reprodução de seu modo de vida. A Reserva Biológica do

Rio Trombetas está localizada sobre um território extremamente rico em diversidade

biológica, onde se encontram grandes “lagos” e densa floresta, além dos principais e mais

densos platôs cobertos por castanhais, áreas com as quais os quilombolas criaram fortes

vínculos de territorialidade, visto que estes povos têm o seu modo de vida estruturado na

coleta da castanha-do-brasil (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

A partir de 2002, ano em que os acordos para a coleta de castanha-do-brasil

começaram a ser firmados com o IBAMA e posteriormente com o ICMBio, é possível

observar no Gráfico 20 uma queda na produção de castanha-do-brasil produzida na Reserva

Biológica do Rio Trombetas. No período de 1990/2001, a produção média anual oscilou em

torno de 1433,2 toneladas, volume que diminuiu no período de 2002/2018, quando a média

passou a ser de 318,7 toneladas. Para análise dessas informações, é preciso considerar as

limitações do ICMBio na coleta desses dados, afim de que não haja interpretação errônea. A

produção de castanha-do-brasil apresentou um movimento cíclico que não mostra

definitivamente uma tendência crescente, sendo que entre os anos 1990 a 2018 houve uma

queda de 82% na quantidade absoluta produzida, passando de 2.200 toneladas para 380,2

toneladas (GRÁFICO 20) (ICMBIO, 2018).

13

Dados coletados nos arquivos do Núcleo de Gestão Integrada – NGI/ICMBio Trombetas, durante pesquisa de

campo, 2018.

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Gráfico 20 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida em Oriximiná e na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, em toneladas, entre os períodos de 1990 a 2005 e 2012 a 2018.

Fonte: ICMBio, 2018. Elaboração própria

A produção brasileira de castanha-do-brasil, a da Região Norte e a do estado do Pará,

assim como a produção do município de Oriximiná e da Reserva Biológica do Rio Trombetas,

possuem um mesmo padrão, apresentando grandes oscilações que não mostram

definitivamente uma tendência crescente, sendo que entre os anos 1994 a 2017, no município

de Oriximiná houve uma queda de 57,6% na quantidade absoluta produzida, passando de

2.090 para 885 toneladas (GRÁFICO 21). Todavia, o município já registrou um pico de

produção de 3000 toneladas, em 2012 (IBGE, 2018; ICMBIO; 2018).

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Gráfico 21 – Produção extrativa de castanha-do-brasil produzida no Brasil, na Região Norte,

no estado do Pará e no município de Oriximiná, em toneladas, entre 1994 e 2017

Fonte: IBGE (2018); ICMBIO (2018). Elaboração própria.

5.3.4 Organização e o uso do território das diversas etapas da produção da castanha-

do-brasil

Segundo Castillo e Frederico (2010), a espacialidade da produção perpassa analisar a

organização e o uso do território das diversas etapas do circuito espacial produtivo da

castanha-do-brasil. De maneira geral, o uso e a organização territorial referem-se à

quantidade, à qualidade, à distribuição e ao arranjo espacial dos sistemas de objetos

envolvidos na circularidade da produção, e a maneira como são usados, possibilitando

verificar, a um só tempo, a organização interna dos subespaços, o uso coletivo dos sistemas

técnicos e a forma como são estabelecidas as relações com outros subespaços (CASTILLO;

FREDERICO, 2010). Cada lugar, de base territorial, portanto física e politica e

socioeconômica, abriga, ao mesmo tempo, diferentes etapas de diversos circuitos espaciais

produtivos, permitindo; 1) confrontar a configuração territorial pretérita com os novos

arranjos espaciais produtivos; 2) avaliar o papel das densidades normativas, inclusive as

solidariedades institucionais e as relações de conflito e cooperação entre as diversas escalas

do poder público; 3) identificar a hierarquia entre os lugares e as diversas temporalidades

coexistentes (CASTILLO; FREDERICO, 2010).

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185

Segundo Castillo e Frederico (2010), a decisão a respeito da localização das atividades

produtivas dominantes é resultado, sobretudo, no atual período, de decisões corporativas

sobre atributos materiais (naturais e técnicos) e normativos presentes em cada lugar. No caso

do mercado da castanha-do-brasil, este necessita da matéria-prima in-natura, que é um

recurso natural encontrado em ecossistemas florestais amazônicos da América do Sul,

extraído por meio do trabalho de coleta pelos coletores tradicionais de castanha-do-brasil,

enquanto o beneficiamento dessa matéria-prima ocorre nas usinas de beneficiamento

localizadas no espaço urbano. Logo, a produção na cadeia produtiva da castanha-do-brasil

envolve dois espaços: o rural e o urbano. As diferentes etapas do circuito espacial produtivo

da castanha-do-brasil encontram-se representadas no fluxograma da Figura 22.

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186

Usinas de beneficiamento de

castanhaRegatão -

Atravessador local

Atravessador

regional: Regatãode fora

Capacitaçoes para organizaçao dos

castanheirosFinanciamento para infraestrutura

Cooperativa Mista dos Quilombolas

Extrativistas do Município de Oriximina

(CEQMO)

Espaço da

Produção e

Circulação

Associação de Moradores da Comunidade

Último Quilombo Mãe Cecília

Bancos - Financiamento

Aporte financeiro

Disponibilidade de crédito

EMATER-PA

SAGRIAssistência técnica

para a produção

Poder Público Estadual

Espaço

Institucional CPI-SP;

União Europeia;Agência de cooperação

holandesa ICCO

Espaço do

Comércio

Exportaçao para o

mercado Internacional:Bloco Asiático, África e

Nafta

MAPAExigências

fitossanitárias

Exportaçao para diversos

estados do Brasil:

Atacadistas

Varejista: Supermercados, Padarias, Docerias,

Lanchonetes, Feiras

Ex: Grupo Pão de Açúcar; a empresa de alimentos

Seven Boys

Chocolates, barras de cereais, cookies,

doces, bolos, "mixed nuts, sorvetes

Consumidor Final

Poder Público Federal

Natureza

ICMBio

Normas técnicas para

a produção

NaturezaNatureza

Coletor

Tradicional de Castanha

Figura 22 – Fluxograma que representa os espaços: da produção, institucional e do comércio,

nos quais ocorrem as diversas etapas da cadeia produtiva da castanha-do-brasil.

O mercado da castanha-do-brasil abrange diferentes espaços. O espaço da “produção e

circulação” abrange o trabalho do coletor tradicional de castanha-do-brasil, o transporte

realizado pelos regatões e o beneficiamento pelas usinas de beneficiamento. O espaço

“institucional” tem a presença do poder público (federal, estadual e municipal) por meio das

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instituições, que atuam tanto no espaço da “produção” quanto no espaço do “comércio”, com

uso das políticas públicas que normatizam. O espaço do “comércio” abrange tanto o mercado

nacional quanto o internacional. As usinas de beneficiamento vendem a sua produção para o

mercado atacadista nacional ou internacional. Estes, por sua vez vendem o produto para o

mercado varejista, que pode incluir desde grandes supermercados até padarias e lanchonetes.

Diferentemente da localização do trabalho de coleta da castanha-do-brasil, que é

ditada pela natureza e se caracteriza como lugares que produzem massa e abrigam o comando

técnico da produção (SANTOS, 1996), a decisão a respeito da localização das usinas de

beneficiamento em Óbidos e Oriximiná, por exemplo, é fruto, sobretudo do acúmulo, ao

longo do tempo, da infraestrutura e do conhecimento técnico (material e dos fluxos) acerca do

mercado da castanha-do-brasil, por sujeitos que se especializaram nesse mercado. No caso da

castanha-do-brasil, a escala que produz os fluxos e detém o comando político da produção

(SANTOS, 1996), geralmente, é a nacional e a internacional, uma vez que os governos dos

países importadores criam regras para importação dos produtos, o que reflete nas normas

editadas pelo governo brasileiro tanto para a produção, quanto para a exportação. Tais

normas, por sua vez refletem nas usinas beneficiadoras que precisam adequar suas produções

às exigências de controle sanitário internacionais.

As etapas do circuito espacial produtivo da castanha-do-brasil estão geograficamente

dispersas, assim como os sujeitos que as animam também se encontram em localizações

diferenciadas, possuindo maior ou menor poder de colocar a produção em movimento. Os

diversos sujeitos, com objetivos e perspectivas próprios, se inter-relacionam dentro de

círculos de cooperação cada vez mais intensos e extensos. Dentro dos circuitos espaciais

produtivos são estabelecidos diversos círculos de cooperação: entre as empresas e poderes

públicos locais, regionais e nacionais; entre empresas, associações e instituições etc. É

necessário, portanto, analisar as especificidades dos círculos de cooperação estabelecidos e as

respectivas escalas de poder dos diferentes sujeitos (CASTILLO; FREDERICO, 2010).

O trabalho de coleta da castanha-do-brasil nos castanhais da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, Oriximiná, Pará

O trabalho de coleta é a primeira etapa da cadeia produtiva da castanha-do-brasil. Na

Reserva Biológica do Rio Trombetas, a coleta da castanha-do-brasil é realizada pelos

coletores tradicionais de castanha-do-brasil, homens e mulheres extrativistas, quilombolas ou

não quilombolas, que trabalham com a extração desse produto nos castanhais localizados nas

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florestas da Reserva Biológica Rio Trombetas (FIGURA 22). Atualmente, são 930 coletores

tradicionais de castanha-do-brasil cadastrados pelo ICMBio, por meio dos TC, para coletar

castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, sendo que destes 663 são

associados a Arqmo, 167 são associados a Aetmo e 100 são associados a Amocreq-CPT

(GRÁFICO 22). Do total de coletores tradicionais de castanha-do-brasil, 684 são do sexo

masculino e 246 do sexo feminino (GRÁFICO 23). A Aetmo é uma associação que representa

os extrativistas do município de Oriximiná, não necessariamente somente coletores

tradicionais de castanha-do-brasil, os quais podem ser quilombolas e não quilombolas.

Gráfico 22 – Associados, por Associação

que firmou termo de compromisso com o

ICMBio para a coleta da castanha-do-

brasil na Reserva Biológica do Rio

Trombetas

Gráfico 23 – Homens e mulheres que

firmaram termo de compromisso com o

ICMBio para a coleta da castanha-do-

brasil na Reserva Biológica do Rio

Trombetas.

246

684

Mulheres

Homens

167

663

100

AETMO

ARQMO

AMOCREQ-CPT

Fonte: ARQMO (2018)

Como já vimos, a cadeia produtiva da castanha-do-brasil sofre interferência da

sazonalidade, devido a sazonalidade e irregularidade da frutificação das castanheiras, que está

ligada a autoecologia da espécie, associada a fatores abióticos do meio, sendo, portanto, a

frutificação induzida por eventos como teor e umidade do solo, temperatura ou outros que

estariam associados, por exemplo, a quantidade de castanha-do-brasil produzida por árvore

em determinado ano (ALMEIDA, 2015).

A queda dos ouriços se inicia em meados do mês de novembro e se estende até

meados do mês de maio, mas o período do trabalho de coleta da castanha-do-brasil difere de

um lugar para o outro, por exemplo, na Reserva Biológica do Rio Trombetas, o período do

trabalho de coleta e comercialização desse produto, acordado em TC com o ICMBio, se inicia

no dia 15 de janeiro e se estende até o dia 31 de maio data que marca o encerramento dessa

atividade no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Nos castanhais localizados no

TQ Alto Trombetas 1, por sua vez, assim como em castanhais localizados em outros

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territórios quilombolas localizados no vale do rio Trombetas, não há regras que delimitem um

período para o trabalho de coleta da castanha-do-brasil, podendo esta ocorrer desde o início da

safra, que se inicia com a queda dos ouriços, em meados do mês de novembro, e termina com

o basculho14

, que pode variar até meados do mês de junho. O período no qual ocorre o

trabalho de coleta da castanha-do-brasil, seja o período regido pelo ICMBio para a coleta na

Reserva Biológica do Rio Trombetas e Floresta Nacional Saracá-Taquera, seja o período da

coleta no TQ Alto Trombetas 1, é denominado de “safra da castanha. O período de início e

término do trabalho de coleta, assim como o período para o transporte da castanha-do-brasil

coletada na Reserva Biológica do Rio Trombetas é definido pelo ICMBio, conforme

informado pelo Entrevistado 10:

Até mesmo essa parte da coleta com o ICMBio, pra nós que somos acostumados

colher castanha até mês de junho, que a gente chama pra cá..., o cara diz que já tá

catando a castanha... Já fica só já o basculho como a gente chama. O basculho já não

dá de fazer porque eles dão até 31 de maio. O basculho ficava pro mês de junho. O

basculho é a castanha, às vezes, ela não cai tudo. [...] É o restante que fica lá no

finalzinho [...] porque tem castanheira que joga bem atrasado. (E 10, 2018).

Desse modo, a castanha-do-brasil coletada nos TQs localizados no entorno à montante

da Reserva Biológica do Rio Trombetas somente pode ser transportada para fora dessas áreas

até a data limite de 31 de maio, seguindo a mesma regra para a castanha-do-brasil coletada em

castanhais localizados na Reserva Biológica do Rio Trombetas e Floresta Nacional Saracá-

Taquera, podendo esta ser apreendida ao passar pelas bases de fiscalização do ICMBio

localizadas nas bocas15

dos lagos Jacaré e Erepecu, uma vez que os coletores tradicionais de

castanha-do-brasil do TQ Alto Trombetas 1 e das comunidades da Floresta Nacional Saracá-

Taquera não conseguem comprovar que a castanha-do-brasil é oriunda dessas áreas

localizadas no entorno à montante da Reserva Biológica do Rio Trombetas. A regra prejudica

os coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem e coletam nos TQs Alto

Trombetas 1, Cachoeira Porteira e nas comunidades quilombolas localizadas na Floresta

Nacional Saracá-Taquera, pois não há outra via de acesso para escoar os produtos, a não ser

por esses trechos do rio Trombetas que estão localizados no interior da Reserva Biológica do

Rio Trombetas, conforme informado pelo Entrevistado 10:

“E aí esse negócio [regra do termo de compromisso], [...] fica ruim que eles fecham

com um termo de compromisso lá no IBAMA. E aí é que depois que para de coletar

14

Trabalho de coleta da castanha-do-brasil realizado no final da safra, é a catação da castanha que caiu atrasada,

ocorre, geralmente, no mês de junho. 15

Neste caso, o mesmo que furo. Estes interligam o rio Trombetas aos lagos Jacaré e Erepecu.

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da Reserva até aqui fica também quase parado porque eles cismam se levar o

basculho daqui pra lá, tá coletando na Reserva também. E aí tem até uma folha dum

cadastro que eles dão lá que se chama papeleta. Essa papeleta tem que entregar nesse

final de maio. E aí quando entrega essa papeleta castanha pra aí já está proibido, não

pode passar” (E10, 2108).

[...]

“Até a castanha que a gente tinha pra cá [Território Quilombola Alto Trombetas 1].

Podia até ser do Abuí, mas já não podia mais passar pra levar pra Oriximiná porque

eles [ICMBio] queriam prender. Aí parece que de novo se reuniram. Aí é que tá que

era até trinta de junho já. Aí de lá pronto, não pode mais entrar e tem castanheira que

começa a jogar em junho [depois do término do período de coleta acordado com o

ICMBio]. Olha, eu acho que sim que isso daí o [***] disse que eles iam tentar

resolver isso porque eles nem sabem. Se eles conhecessem de onde é a castanha,

tudo bem, mas eles não conhecem. Tem vezes que aqui tem família que ele vai

tirando e vai guardando a castanha só. Aí pra vender já no final. E só que esse ano

eu não sei se aconteceu isso de alguém levar castanha já depois” (E5, 2018).

A forma como os quilombolas organizam e realizam o trabalho de coleta da castanha-

do-brasil, assim como a gestão e o uso do espaço no âmbito dessa atividade, é

multi/transterritorial, condição cada vez mais presente no mundo contemporâneo que envolve

o trânsito entre múltiplos territórios (HAESBAERT; MONDARDO, 2010; HAESBAERT,

2014). Considera o movimento de, ao mesmo tempo, definir (ou afirmar) e de transgredir

fronteiras, estratégias que visam contornar limites ou, simplesmente, “viver no limite”, já que,

para muitos grupos subalternos, a “vida no limite” (entre o legal e o ilegal, a ordem e a

desordem, entre a barreira e o contornamento) é sua condição de sobre-vivência

(MONDARDO, 2015).

No caso dos quilombolas coletores tradicionais, entendemos que a

multi/transterritorialidade da coleta de castanha-do-brasil se expressa no fato desses coletores

não estarem circunscritos, necessariamente, a territórios específicos e de usufruto exclusivo de

acordo com famílias, comunidades ou territórios quilombolas. Para os coletores tradicionais

de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas todas as castanheiras que estão no

espaço considerado como território quilombola são de usufruto coletivo. Assim, as pessoas

que vivem no TQ podem trabalhar na coleta da castanha-do-brasil em qualquer local do

território por eles considerado de uso coletivo. Assim, pessoas de diversas famílias ou

comunidades que conformam um TQ podem trabalhar não somente nos lugares dentro dos

limites desse território, mas também em lugares localizados em diferentes TQs da

microrregião Alto Trombetas. Por exemplo, os coletores tradicionais de castanha-do-brasil

associados a Aetmo – os quais, em sua maioria, residem em territórios quilombolas que não

estão localizados na microrregião Alto Trombetas, ou ainda, em comunidades que não são

consideradas quilombolas – coletam esse produto nos castanhais da Reserva Biológica do Rio

Trombetas. Contudo, essa organização territorial da coleta não é isenta de conflitos,

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principalmente entre as Associações, pois os quilombolas que moram na microrregião Alto

Trombetas entendem que a coleta deve ser realizada pelos moradores dos TQs

(OBSERVAÇÕES SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Uma das características dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil

da microrregião Alto Trombetas é a grande mobilidade territorial do trabalho. Os coletores

tradicionais de castanha-do-brasil não possuem locais fixos para a coleta no decorrer do

tempo, assim como, a escolha de coletar em determinado castanhal não está, exclusivamente,

relacionada aos locais de nascimento ou moradia, embora possam ser influenciados por esses

fatores (OBSERVAÇÕES SEMIESTRUTURADA, 2018/2019). Segundo Scaramuzzi (2016),

as relações entre os coletores tradicionais de castanha-do-brasil e seus lugares de trabalho

podem ser permeadas por diversos fatores, tais como a origem dos antepassados, a mobilidade

territorial regida pelos casamentos, o estabelecimento de parcerias de trabalho, a ousadia e o

caráter exploratório de cada extrativista Scaramuzzi (2016).

Conforme Scaramuzzi (2016), as formas de uso dos castanhais, embora sejam

influenciadas pelos diversos fatores supracitados, são ordenadas, em grande medida, aos

conhecimentos adquiridos pela trajetória de vida e pela experiência prática de cada

extrativista nessa atividade produtiva. Quando se acompanha um extrativista, um grupo

doméstico ou um grupo de parceiros de trabalho em determinado castanhal distante do local

atual de moradia dessas pessoas, é possível perceber que o uso dos castanhais é compartilhado

por pessoas de variadas famílias e comunidades que o utilizam devido a critérios e motivos

diversos (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Do mesmo modo, quando se acompanha a coleta de castanha-do-brasil no entorno dos

locais de moradia, nos castanhais próximos a determinadas comunidades, percebe-se que

algumas das pessoas que moram na comunidade próxima não coletam castanha-do-brasil

nesses locais e se deslocam para lugares muito distantes para a realização dessa atividade. No

TQ Mãe Domingas e na comunidade Último Quilombo não há o trabalho de parceria,

diferente das observações feitas por Scaramuzzi (2016) no TQ Cachoeira Porteira.

Durante a “safra da castanha” muitas famílias de coletores tradicionais de castanha-do-

brasil deslocam-se com a família para os castanhais da Reserva Biológica do Rio Trombetas,

onde passam a residir temporariamente, o que diminui o tempo e os custos com

deslocamentos entre a casa do castanheiro e o local de coleta (FIGURA 23)

(OBSERVAÇÕES SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

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Figura 23 – Família do Sr. E. M. A., coletor tradicional de castanha que no período do

trabalho de coleta desse produto passa a residir, temporariamente, no castanhal Santa Rosa,

localizado no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Fonte: PICANÇO (2019).

Para controlar a coleta da castanha-do-brasil na microrregião Alto Trombetas, o

ICMBio entrega ao coletor tradicional de castanha-do-brasil um formulário, a papeleta de

controle, para o preenchimento de informações sobre a safra da castanha-do-brasil, tais como:

local de coleta (dentro da Flona ou da Reserva Biológica do Rio Trombetas); quem coletou a

castanha-do-brasil, o ano das atividades, a quantidade de caixas coletadas. A papeleta é

distribuída por casal/família, mas se alguém da família optar por coletar em local diferente ou

quiser sua própria papeleta, também poderá obtê-la. No final da safra da castanha-do-brasil o

coletor tradicional deverá entregar a papeleta com as informações nas bases do ICMBio ou

para os coordenadores de comunidade (Floresta Nacional Saracá-Taquera e Reserva Biológica

do Rio Trombetas) e das associações (no caso do entorno, TQ Alto Trombetas 1 e AETMO,

que auxiliarão o coletor tradicional no preenchimento da papeleta. Antes da entrada na

Reserva Biológica do Rio Trombetas os coletores tradicionais de castanha-do-brasil também

devem retirar no NGI/Porto Trombetas um crachá (Figura 24) de identificação que deverá ser

apresentado nas Bases de fiscalização do ICMBio no momento da entrada e saída da Reserva

Biológica do Rio Trombetas e das áreas a montante dessa unidade de conservação

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

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Figura 24 – Crachá do Coletor tradicional de castanha-do-brasil, um dos documentos de

identificação exigidos pelo ICMBio para a coleta nos castanhais da Reserva Biológica do Rio

Trombetas e de áreas a jusante dessa unidade de conservação. Fonte: ICMBio (2018).

Os coletores tradicionais de castanha-do-brasil que habitam no entorno dos locais de

coleta constroem acampamentos temporários, improvisados com madeiras da própria floresta,

geralmente sem paredes laterais e utilizando para cobertura lonas de plástico ou palha de ubim

(FIGURA 25). A residência temporária dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil na

Reserva Biológica do Rio Trombetas, permitida pelo ICMBIO, por meio de TC, possui como

objetivo otimizar o tempo de trabalho e diminuir os custos com deslocamentos entre o local

de moradia e o local de trabalho na coleta. Os quilombolas coletores tradicionais de castanha-

do-brasil estão proibidos pelo ICMBio de utilizarem os furos, atalhos naturais que encurtam

as distâncias entre os lugares. Assim, as grandes distâncias inviabilizam os deslocamentos

diários entre o castanhal e a casa do coletor, conforme informado pelo Entrevistado 04:

“[...] a gente, praticamente, a gente é escravo do ICMBIO, tá entendo? Porque a base

é lá embaixo, a gente mora aqui pra cima. Aí você sai lá daquele... do final da

Reserva. Aí você vai ter que ir lá pra ele pegar sua papeleta e marcou saída. Aí você

vem aqui na sua casa. Aí na entrada você vai lá pra ele marcar a entrada. Então se

você for analisar a castanha que você coleta você tem um pouco lucro porque aqui

custa sete reais um litro de gasolina e são seis litros pra você vir de lá aqui pra fazer

esse percurso. Então, é isso que eles não colaboram com a gente. Porque se a

pessoa... Eu penso assim se for pra passar quinze dias fora da reserva tudo bem.

Vamos passar lá, olha, saída, eu vou passar tantos dias fora da reserva. Como eu crio

porco ali [no Território Quilombola Alto Trombetas 1], de dois em dois dias eu

tenho que colocar comida. Aí eu tenho que ir lá fazer esse percurso. Aí é um

desperdício de gasolina. Então, pra mim, eu gostaria que eles colaborassem nessa

área. Uma maneira de melhorar pra gente. Eles aqui moram quase aqui de fronte,

dentro da reserva. Agora eles vão lá embaixo, de lá eles sobem. Aí daqui eles voltam

lá embaixo, aí eles vem pra cá pra de frente. Tá difícil [E04, 2018].

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Figura 25 – Barraco do castanheiro construído pela família do Sr. Edílson Mendes de

Almeida no castanhal Santa Rosa, localizado no interior da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, para abrigar sua família durante a safra da castanha-do-brasil. Fonte: PICANÇO

(2019).

O castanheiro tradicional interna-se nas florestas, a pé, a procura dos ouriços, que são

coletados diretamente do chão, debaixo das castanheiras, com o auxílio de um terçado (facão),

com o qual o castanheiro o atinge com a lâmina e, ainda utilizando-se deste, coloca o ouriço

no paneiro, acoplado em suas costas. Os coletores tradicionais de castanha-do-brasil do Alto

Trombetas possuem como característica principal o trabalho familiar e colaborativo, o qual

potencializa as energias individuais por meio do exercício do trabalho coletivo sob a forma de

ajuda mútua, onde os membros das famílias, homens e mulheres (adultos, jovens e crianças),

muitas vezes, assumem com intensidade tarefas idênticas ou não (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Após a coleta, os ouriços são transportados em paneiros até a margem de rios, lagos e

igarapés para o transporte da floresta para o tapiri, local, geralmente, de mais fácil acesso ao

regatão, ou ainda, transportam a castanha-do-brasil até os pontos de compra estabelecidos

pelo regatão. O regatão é um elo importante do circuito espacial produtivo da castanha-do-

brasil que comercializa e transporta esse produto dos castanhais até a cidade de Oriximiná ou

Óbidos, onde o produto é vendido às usinas de beneficiamento. É o regatão que viabiliza a

circulação da mercadoria (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

A castanha-do-brasil armazenada nos tapiris pelos coletores tradicionais de castanha-

do-brasil é vendida ao regatão, elo importante do circuito espacial produtivo da castanha-do-

brasil que comercializa e transporta as sementes dos castanhais até a cidade de Oriximiná ou

Óbidos, onde o produto é vendido aos armazéns para estocagem e posterior comercialização

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com as usinas de beneficiamento (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

A partir do dia 31 de maio é proibido o transporte da castanha-do-brasil para fora das

áreas da Reserva Biológica do Rio Trombetas, Floresta Nacional Saracá-Taquera e Território

Quilombola Alto Trombetas 1, podendo ser apreendida ao passar pelas bases de fiscalização

do ICMBio localizadas nas bocas dos lagos Jacaré e Erepecu. A regra prejudica os coletores

que residem e coletam nos TQs Alto Trombetas 1, Cachoeira Porteira e nas comunidades

quilombolas localizadas na Floresta Nacional Saracá-Taquera, pois não há outra via de acesso

para escoar os produtos, a não ser por esses trechos do rio Trombetas que estão localizados no

interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA,

2018/2019).

Os coletores tradicionais de castanha-do-brasil que coletam na Reserva Biológica do

Rio Trombetas não possuem apoio de financiamentos para o trabalho de coleta desse produto,

assim como não possuem acesso a empréstimos. Mas, essa falta de financiamento não se

restringe apenas a produção de castanha-do-brasil, sendo uma realidade que se estende às

demais produções praticadas pelos coletores tradicionais de castanha-do-brasil, tanto na

Floresta Nacional Saracá-Taquera quanto na Reserva Biológica do Rio Trombetas. Mas, é

importante ressaltar que os coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem na

Reserva Biológica do Rio Trombetas sofrem mais restrições para a produção, pois estão em

uma unidade de conservação de proteção integral. No entanto, vale ressaltar que os moradores

da Floresta Nacional Saracá-Taquera, unidade de conservação de uso sustentável, mesmo não

possuindo restrições severas para a produção, também não contam com empréstimos e

financiamentos para a coleta da castanha-do-brasil (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURA,

2018/2019).

O beneficiamento da castanha-do-brasil

No espaço urbano ocorre o processamento industrial da castanha-do-brasil realizado

pelos trabalhadores das usinas de beneficiamento. Segundo Feiteiro (2016), nessa etapa a

castanha-do-brasil passa por diversas fases de processamento industrial até chegar ao produto

final para comercialização com atacadistas e varejistas. Na indústria de beneficiamento ocorre

a lavagem, a secagem e a embalagem a vácuo (FIGURA 26).

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196

N

S

Recebimento das amêndoas in natura na

usina de beneficiamento

Peneira vibratória

Tulha da esteira de seleção

Esteira de seleção

Tulha dos classificadores

Classificação das castanhas por tamanho

Armazenamento das castanhas

classificadas emtulhas de acordo com o tamanho

Embalagem das castanhas classificadas

Transporte das castanhas classificadas para

a usina de beneficiamento

Recebimento das castanhas classificadas na

usina de beneficiamento

Secagem das castanhas classificadas

Peneira vibratória

Descanso em tulha

Castanha com

casca (Dryed)

Esteira Classificatória

Castanha não

conforme?

Embalagem e estoque do produto acabado

Expedição para o cliente

Fim

2Retrabalho

N

Autoclave

Lavagem e arrefecimento

Quegragem automática

Seleção manual das amêndoas por

características de qualidade

Peneira classificatória - por tamanhos das

amêndoas

Estufagem das amêndoas

Classificação final das amêndoas

Embalagem e estoque do produto acabado

2

Castanha não

conforme?

SRetrabalho

Castanha não

conforme?

S

Retrabalho

Expedição para o cliente

Fim

Figura 26 – Etapas do beneficiamento da castanha-do-brasil realizado nas usinas de

beneficiamento. Fonte: Mundial/Pribel - Plano de Manejo Tradicional e Orgânico

(2013) apud KRAG (2014).

Existem armazéns para a castanha-do-brasil in natura, para estocagem de produto

acabado e para estocagem de embalagens. Quanto à produção convencional, são adquiridas

castanha-do-brasil de diversos extrativistas/coletores dos municípios da região, tendo como

principais fornecedores da Indústria Mundial: os extrativistas, a população indígena, a

população quilombola e comerciantes regionais (atravessadores) (KRAG, 2014).

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A indústria destaca como sendo os principais desafios para o desenvolvimento da

atividade na região:

- Incentivos fiscais; redução de impostos;

- Parceria com entidades de pesquisa para a melhoria dos processos e do produto;

- Segurança do produto;

- Aflatoxinas (Laboratórios locais para realizar análises);

- Padrão de qualidade do produto;

- Matéria-prima de qualidade;

- Mão-de-obra qualificada;

- Tecnologia;

- Melhoria dos processos: Certificações (KRAG, 2014).

As usinas de beneficiamento de castanha-do-brasil, geralmente, operam dependendo

de aporte financeiro, pois não trabalham com capital próprio. Se houver disponibilidade

financeira, a empresa faz aquisição de matéria prima, se não houver, é necessário fazer

redução no consumo de operação de fábrica. Historicamente, esse consumo de operação de

fábrica se dá em torno de quatro a seis meses, pois não há disponibilidade de matéria prima

suficiente para possibilitar que a fábrica opere durante o ano todo (KRAG, 2014).

Nesta etapa técnicos engenheiros agrônomos, florestal e ambiental, da EMBRAPA,

IDEFLOR e Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS),

respectivamente, que desenvolvem pesquisas sobre a cadeia produtiva da castanha-do-brasil

na região norte, centradas na Região Baixo Amazonas. Segundo a Associação de

Exportadores de Castanha, entidade controlada pela família Mutran, que detém o domínio da

produção de castanha-do-brasil no estado do Pará, aproximadamente 35 mil pessoas

sobrevivem da extração desse produto. Em se tratando de toda a cadeia produtiva, a

Associação estima que há, aproximadamente, 100 mil pessoas envolvidas direta ou

indiretamente nessa atividade econômica, desde a coleta, pós-coleta e beneficamente da

amêndoa (KRAG, 2014).

5.3.5 Distribuição e circulação da castanha-do-brasil

A logística, compreendida como a expressão geográfica da circulação corporativa

(Castillo, 2008), permite analisar as condições materiais e o ordenamento dos fluxos que

perpassam os circuitos espaciais produtivos. No atual período da globalização, a ideia de

logística passou a ser fundamental para o entendimento de como os diversos momentos do

processo produtivo são articulados pelas grandes corporações, da escala local à mundial

(CASTILLO, 2008).

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A dimensão infraestrutural da logística (redes técnicas e outros equipamentos) merece

especial atenção, uma vez que, através delas, se estabelece a conexão entre as diversas

instâncias separadas da produção. Em sua dimensão material, as redes podem ser classificadas

em linhas, cada vez mais extensas, e pontos, considerados como “nós” das redes, cada vez

mais seletivos e dispersos (CASTILLO; FREDERICO, 2010).

As linhas podem ser subdivididas em materiais e imateriais; extravertidas (vinculadas

ao mercado externo) e intravertidas (voltadas para a integração territorial interna). Os pontos

devem ser observados quanto às suas densidades técnicas e normativas, das quais decorrem

sua maior ou menor funcionalidade ao circuito espacial. Como a rede é uma realidade não

apenas material, mas também social (SANTOS, 1996; DIAS, 2005), em alguns casos a

regulação política que define a propriedade (pública, privada, concedida) e o acesso às redes

deve ser levada em consideração na análise (CASTILLO; FREDERICO, 2010).

Quando se trata de distribuição e circulação de mercadorias, o transporte é

fundamental, pois é um dos principais entraves, visto que quando se trata de transporte fluvial

há questões como a cheia ou a seca dos rios, ou mesmo a falta de barco para os produtores

levarem sua mercadoria para a cidade, sendo estes auxiliados por cooperativas ou associações.

Quando se trata de via terrestre, as dificuldades perpassam pela falta de qualidade de estradas

e ramais e falta de transporte (FERREIRA; COSTA, 2015).

A principal via de circulação da produção de castanha-do-brasil na microrregião do

Alto Trombetas até os locais de distribuição é a fluvial, o que muitas vezes é um problema aos

extrativistas quilombolas, visto que algumas áreas de florestas com castanhais estão em áreas

de trechos encachoeirados de rios. Por outro lado, a coleta da castanha-do-brasil é realizada

durante o período denominado de “inverno amazônico”, quando a precipitação pluviométrica

aumenta na região, fazendo com que os níveis das águas dos rios, lagos e igarapés também

aumentem, num fenômeno chamado de “cheias” (ALMEIDA, 2015), o que facilita o

transporte do produto pelos igarapés.

É na circulação que o recurso natural agrega maior valor, conforme Martins (2000) “é

a circulação da mercadoria que diz quanto ela vale e não apenas nem fundamentalmente a sua

produção, porque é na circulação que o valor nela contido se revela, (MARTINS, 2000, p.

30)”, é nesta etapa que é acrescentada a mais valia, ou seja, o lucro, pois a circulação é o

“momento do processo econômico onde se dá a circulação efetiva das mercadorias e das

pessoas; trata-se no capitalismo da etapa onde se dá a circulação efetiva das mercadorias e das

pessoas; trata-se no capitalismo da etapa onde se dá a conversão da mercadoria em dinheiro

aumentado (M – D’)” (Oliveira, 1990, p.84), ou dinheiro-mercadoria-dinheiro (D-M-D’), é a

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etapa onde a mercadoria chega ao mercado, e há a extração da mais-valia.

No caso da castanha-do-brasil, a agregação de valor ao produto ocorre desde o

planejamento da coleta nos castanhais até a comercialização pelo consumidor final. Perpassa

por esse processo a distribuição e a circulação do produto, onde ocorre maior agregação de

valor desde o transporte primário da castanha-do-brasil coletada que é realizada pelos

coletores tradicionais de castanha-do-brasil que a transportam dos locais de coleta,

inicialmente, em paneiros acoplados em suas costas, para o igarapé mais próximo, onde se

encontra a canoa que, por sua vez, é o meio de transporte desse produto para um local de fácil

acesso ao atravessador, que na microrregião Alto Trombetas é denominado de regatão

(OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

O regatão é um comerciante atravessador, sujeito socioeconômico de fundamental

importância para que haja a distribuição e circulação de mercadorias e produtos na Amazônia.

É um comerciante que se desloca de barco movido a motor a diesel por rios e igarapés, entre

centros regionais e comunidades, comercializando mercadorias para pequenos produtores

caboclos e comerciantes do interior em troca de “produtos regionais”, agrícolas e extrativistas

Geralmente, o regatão adotava a prática da troca ou escambo nas transações comerciais que

realizava, sendo raro o uso de moeda circulante (MCGRATH, 1999). O regatão se torna mais

importante ainda quando se trata da comercialização da castanha-do-brasil, pois este é o

sujeito social que se desloca até os castanhais que, geralmente são de difícil acesso,

comprando parte da produção (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Na microrregião Alto Trombetas há três tipos de atravessadores: os pequenos

atravessadores, que moram nas comunidades e são denominados de “regatões locais”, e

compram diretamente dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil nos castanhais ou nas

comunidades produtoras, mantendo contato direto com o coletor; o atravessador regional,

oriundos das cidades de Óbidos e Oriximiná, denominados pelos coletores tradicionais de

castanha-do-brasil como “regatão de fora”, que também compram diretamente dos coletores

tradicionais de castanha-do-brasil nas áreas de coleta ou estabelecem pontos de compra nas

comunidades, sob a responsabilidade de compradores locais, podendo manter contato direto

ou não com o coletor; e o “atravessador”, geralmente dono do armazém, mantido pelas

indústrias, estrategicamente, em regiões produtoras, que compram dos regatões locais e dos

regatões “de fora” (KRAG, 2014. p. 37).

Atualmente, o regatão que circula na microrregião do Alto Trombetas perdeu algumas

de suas características elementares, sendo que possui autorização do ICMBio apenas para

comprar a castanha-do-brasil, sendo vedada a comercialização de quaisquer outros produtos.

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Para adentrar na área da Reserva Biológica do Rio Trombetas, é necessário o regatão possuir

autorização do ICMBio, que deve ser solicitada pela associação de área quilombola ou

associação de moradores, contando com 10 assinaturas de coletores tradicionais de castanha-

do-brasil que estejam cadastrados no ICMBio. O regatão deve respeitar as regras dispostas

nos TC e os combinados acordados, dos quais está ciente, sob pena de ser responsabilizado

pessoalmente pelo seu descumprimento, submetendo-se às penalidades estabelecidas no

referido TC e na legislação competente (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA,

2018/2019).

Para controlar o transporte de castanha-do-brasil na microrregião Alto Trombetas, o

ICMBio entrega ao regatão um formulário de Controle de Transporte de Castanha (FIGURA

27) para o preenchimento de informações sobre a safra da castanha-do-brasil, tais como: o ano

das atividades, além de informações sobre a embarcação, o nome do coletor de quem foi

comprada a castanha-do-brasil, a data, a quantidade, o valor da caixa e o local onde foi

comprada. Ao passar pelas bases do ICMBio, o regatão deve solicitar o visto de entrada na

Reserva Biológica do Rio Trombetas e ao sair, solicitar o visto de saída (OBSERVAÇÃO

SEMIESTRUTURADA, 2018/2019).

Figura 27 – Papeleta de controle de transporte de castanha-do-brasil entregue aos

regatões. Nela, o regatão preenche o nome do coletor tradicional de castanha-do-brasil

de quem comprou, a quantidade.

Atualmente, os chamados “regatões de fora”, atravessadores oriundos das cidades de

Oriximiná e Óbidos, que comercializaram por muito tempo na microrregião Alto Trombetas

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estão proibidos de comprar castanha-do-brasil no interior da Reserva Biológica do Rio

Trombetas, devido a uma decisão das associações de áreas e da Arqmo que objetiva favorecer

e incentivar os regatões locais a desenvolverem a atividade de comercialização da castanha-

do-brasil nas áreas de coleta e o transporte desse produto das áreas de coleta para as usinas de

beneficiamento ou para o atravessador dono de armazéns. Os atuais regatões que atuam na

microrregião Alto Trombetas são pessoas das próprias comunidades, o que, segundo alguns

coletores tradicionais de castanha-do-brasil, inibiu a concorrência, o que acarretou na fixação

de preços para a caixa da castanha-do-brasil, muitas vezes, abaixo das expectativas dos

coletores tradicionais de castanha-do-brasil, conforme informado pelo Entrevistado 09:

No tempo dos regatão que tinha muitos regatão de Óbidos e Oriximiná, todos

vinham pra cá comprar castanha. E às vezes se subia um com preço, atrás já vinha

outro com outro preço, às vez, além daquele que já tinha passado. E sempre ia assim,

né, um dava um preço, outro já vinha com um preço mais alto, outro já vinha mais

alto. Era bom pra nós nessa parte. E, às vezes, até terminar a castanha, tinha preço

alto mesmo. Hoje em dia, já querem fazer acordo, os comprador já querem entrar em

acordo pra fazer só um preço. E aí, o preço fica naquela tabela, mas o preço da

mercadoria continua sempre crescendo. E antes, não. Subia a mercadoria, mas subia

o produto que a gente tirava. Aí numa parte pra nós era melhor assim (E 09, 2018).

Outro fator importante na distribuição da produção são as associações e cooperativas,

que muitas vezes são responsáveis por coletar matéria-prima e comercializar com as

empresas, ou seja, distribuem o produto existente entre as empresas que necessitam (COSTA;

FERREIRA, 2015). Nesse sentido, com a finalidade de organizar a coleta e comercialização

da castanha-do-brasil de forma coletiva, já que até então cada castanheiro vendia a sua

produção individualmente, foi desenvolvido no Alto Trombetas, no período de 2000 a 2006, o

Projeto Manejo dos Territórios Quilombolas (PMTQ), chamado de “Projeto Castanha”, em

parceria com a Comissão Pró-Índio de São Paulo e com o apoio da União Europeia e da

agência de cooperação holandesa ICCO (CPI-SÃO PAULO; ARQMO, 2005).

O “Projeto Castanha”, que antecedeu a criação da Cooperativa Mista Extrativista dos

Quilombolas do Município de Oriximiná (CEQMO), criou uma estrutura que possibilitou que

a produção chegasse ao armazém obedecendo as exigências das BPFs e sem a necessidade do

castanheiro tradicional interromper seu trabalho de coleta para transportar o produto. O

projeto dispunha de dois barcos e oito canoas do tipo rabeta, conduzidos por um grupo de

comboieiros da própria comunidade que recolhiam a produção nos acampamentos dos

coletores tradicionais de castanha-do-brasil e a transportava até os armazéns. Foram

construídos dez armazéns com capacidade para até 200 hectolitros para armazenar a castanha-

do-brasil até a entrega ao comprador. Esses armazéns possuíam e dispunham de um

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“paioleiro” que era responsável por sua administração, além de serem equipados com

aparelhos de radiocomunicação conectados com o escritório da ARQMO, na cidade de

Oriximiná, para facilitar a comercialização (CPI-SÃO PAULO; ARQMO, 2005).

O projeto contou com a adesão de 200 a 300 coletores tradicionais de castanha-do-

brasil, principalmente, com a finalidade de melhorar os preços da castanha-do-brasil vendida

pelos produtores por meio da eliminação da contaminação por aflatoxina, substância tóxica

produzida por muitas das espécies do fungo Aspergillus, que deixam as castanhas-do-brasil

com uma qualidade ruim para a alimentação, saúde e comercialização. Para alcançar tal

objetivo era necessário garantir a qualidade da produção por meio das Boas Práticas de

Fabricação (BPF) durante as etapas de coleta e quebra dos ouriços nos castanhais, lavagem,

secagem, armazenamento e transporte da castanha-do-brasil até as usinas de beneficiamento

(KRAG, 2014. p. 37; CPI-SÃO PAULO; ARQMO, 2005). As BPFs são um conjunto de

procedimentos higiênico-sanitários necessários para garantir a qualidade dos alimentos,

instituídos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) do Ministério da Saúde

(MS), pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e pelos órgãos

fiscalizadores e reguladores das atividades realizadas nos estabelecimentos produtores e/ou

manipuladores de alimentos (RAMOS; BENEVIDES; PEREZ, 2010).

Ao se trabalhar as BPFs, o Projeto Castanha tinha por objetivo vender a produção para

as indústrias por um preço maior do que a castanha-do-brasil sem as BPFs. Entretanto, apesar

da utilização das BPFs na produção da castanha-do-brasil, os coletores tradicionais de

castanha-do-brasil do Alto Trombetas não conseguiram vender essa castanha-do-brasil por um

preço maior em relação à castanha-do-brasil que não possui as boas práticas. Isso decorre da

falta de demanda por parte das usinas de beneficiamento para pagar um preço diferenciado

pela castanha-do-brasil produzida com as BPFs. Logo, a utilização das BPFs na produção de

castanha-do-brasil pelos quilombolas do Alto Trombetas não representaram, na realidade,

agregação de valor ao produto, uma vez que as usinas de beneficiamento compravam essa

castanha-do-brasil pelo mesmo preço que era pago aos coletores tradicionais de castanha-do-

brasil que não utilizavam as BPFs (KRAG, 2014. p. 37; CPI-SÃO PAULO; ARQMO, 2005).

Então, para agregar valor a castanha-do-brasil, os quilombolas criaram, em 2005, a

Cooperativa Mista Extrativista dos Quilombolas do Município de Oriximiná (Ceqmo),

também conhecida como Cooperativa do Quilombo, com o objetivo de construir uma usina de

beneficiamento para beneficiar e vender a castanha-do-brasil sem casca, a quilo, pois,

atualmente, vendem a castanha-do-brasil com casca em hectolitro para as indústrias. Mas,

para tanto, um dos principais desafios a serem enfrentados pela cooperativa, tanto na compra

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da castanha-do-brasil, quanto no funcionamento da usina de beneficiamento é a organização

da gestão da usina, tanto na parte prática da indústria para beneficiar, quanto na gestão (CPI-

SÃO PAULO; ARQMO, 2005).

Atualmente, a Ceqmo é constituída por mais de 234 cooperados e cooperadas das

diversas comunidades quilombolas do município de Oriximiná e conta com parcerias da

Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-São Paulo) e da Empresa de Assistência Técnica e

Extensão Rural do Estado do Pará (Emater/Pará). Esta última vem garantindo aos seus

cooperados a emissão da declaração de aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da

Agricultura Familiar (Pronaf), documento que garante acesso a políticas públicas como

crédito rural e mercados diferenciados do Programa Nacional de Alimentação Escolar

(PNAE) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), mas estes não podem ser

acessados pelos moradores da Reserva Biológica do Rio Trombetas e da FLONA, uma vez

que não há regularização dessas pessoas nessas áreas (CPI-SÃO PAULO; ARQMO, 2005).

Apesar dos esforços da Ceqmo em reposicionar os quilombolas na cadeia produtiva da

castanha-do-brasil, a cooperativa teve problemas e, durante a pesquisa de campo não estava

atuando na compra do produto, conforme informado pelo Entrevistado 14 a seguir:

“Até formaram uma cooperativa, que essa cooperativa se acabou em cinza [a

CEQMO?] [...] E aí essa associação, essa cooperativa, eu acho que esses acordos

proibiram de entrar os regatões estranhos, que era quem trazia preço para dentro da

unidade [...] E ela ainda estragava um bocado que era lavado, tinha que fazer tudo

isso, e os regatão chegava era só mede [apenas mediam a castanha e compravam,

sem a necessidade desta estar lavada]. [...] Proibiram o regatão entrar. Não entrou

regatão e agora não tem a concorrência dos preços de castanha. Os cara aqui [da

comunidade] dão o que querem “(E 14, 2018).

Segundo Costa e Ferreira (2015), as dificuldades enfrentadas pelas associações para

sua consolidação decorrem da falta de participação dos moradores dos lugares que as

associações representam, que na sua maioria é cadastrada, mas não participam de reuniões,

assembleias, muitas vezes, só se associam para terem maior facilidade em obter documentos,

aposentadorias e pensões, que também é função destas. Sem essa participação, as associações

não se consolidam e não há o fortalecimento da comercialização (COSTA; FERREIRA 2015,

p. 51). Outra dificuldade enfrentada pelas associações está relacionada ao fato das pessoas

desconhecerem a função das associações e cooperativas, ressaltando que associação,

cooperativa e sindicato de produtores rurais são coisas diferentes, mas que muitos pensam ser

a mesma coisa com as mesmas funções (COSTA; FERREIRA, 2015, p. 52). Assim, a falta de

participação é uma das grandes dificuldades, visto que estas instituições são “a forma jurídica

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de legalizar a união de pessoas em torno de seus interesses” (SEBRAE, 2009), ressaltando

que a associação, cooperativa e sindicato de produtores rurais são coisas diferentes, mas que

muitos pensam ser a mesma coisa com as mesmas funções.

Atualmente, na microrregião Alto Trombetas, a comunidade Último Quilombo

instituiu, em 2018, uma associação de moradores denominada Mãe Cecília, com a finalidade

de comprar a castanha-do-brasil coletada por coletores tradicionais de castanha-do-brasil

associados a esta, e agregar valor por meio da lavagem, secagem, seleção e embalagem das

castanhas-do-brasil em sacos de fibra sintética. Para a realização dessas etapas da produção de

castanha-do-brasil, a Associação criou uma estrutura com a utilização de materiais da própria

floresta, pois não há financiamento para a produção, uma vez que, a comunidade está

localizada no interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. A Associação paga R$ 40,00

(quarenta reais) por dia de trabalho (diárias) para as mulheres associadas da comunidade pelo

trabalho realizado (lavagem, secagem, seleção e acondicionamento da castanha-do-brasil em

sacos de fibra), se constituindo em mais uma forma de renda para as famílias da comunidade

(FIGURA, 28).

Figura 28 – Mulheres realizam trabalhos de lavagem, secagem, seleção da castanha-do-brasil

comercializada pela Associação Mãe Cecília, comunidade Último Quilombo, localizada no

interior da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Á esquerda utilizam o paneiro para lavar a

castanha-do-brasil nas águas do lago Erepecu na mesma comunidade. À direita, estrutura

utilizada para a secagem da castanha-do-brasil, construída com madeira de uma palmeira

extraída das florestas da Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Uma das dificuldades enfrentadas pela Associação de Moradores Mãe Cecília se refere

ao conflito territorial com a associação de área Associação das Comunidades Remanescentes

de Quilombo da Área Trombetas 2 (ACRQAT) que considera a associação de moradores

ilegal, por ter sido criada num território onde já existia uma associação, no caso a ACRQAT.

Contudo, as finalidades e as áreas de atuação das duas associações não se sobrepõem,

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conforme informado pelo Entrevistado 16:

Nós temos uma associação, a ACRQAT, que ela é uma associação de território. [...]

Então ela foi criada com o intuito de nos representar nas questões legais, nas

demandas externas. [...] A Associação de Moradores nós visamos a organização

mais interna, as demandas mais internas da comunidade. Como temos açaí,

pensamos um dia sermos produtores de açaí. Pensamos em beneficiar castanha...,

vender castanha já beneficiada. Então, temos vários sonhos aí que estão rondando

nossas mentes, nossas ideias aí. [...] Tem uma série de coisas na floresta que estão aí

prontos pra nos ajudar na sobrevivência e no nosso desenvolvimento como ser

humano (E 16, 2018).

Então, é possível identificar que as associações e cooperativas enfrentam muitos

problemas, principalmente, devido possuírem uma estrutura organizacional e política fraca

que interfere em diversos aspectos, como na intervenção para o escoamento da produção e até

mesmo para se manter em funcionamento.

5.3.6 Comercialização e consumo da castanha-do-brasil

Segundo Krag (2014), nessa etapa final da cadeia produtiva, parte da produção de

castanha-do-brasil é comercializada no mercado interno, principalmente para o sudeste do

país e a outra parte é destinada à exportação. Nessa etapa consideram-se inseridas as

transações comerciais de venda: organização da produção, formas de comercialização como a

intermediação, por exemplo, e mercado que se refere aos principais mercados alcançados e à

qualidade comercial adequada da castanha-do-brasil a todas as leis que estão em vigor.

Segundo Enríquez (2008, p. 218), o mercado da castanha-do-brasil está razoavelmente

sedimentado, sendo esse produto exportado há mais de dois séculos para o mercado

americano e europeu, principais mercados importadores de castanha-do-brasil. As usinas de

beneficiamento da castanha-do-brasil atuam nos comércios varejista e atacadista, exportando

castanha-do-brasil com casca e descascada e embalada a vácuo, a partir de portos e aeroportos

brasileiros para os E.U.A, Canadá, México, Israel, Alemanha, França, Holanda, Itália, África

do Sul, Países Árabes, China, Hong-Kong, Austrália, Nova Zelândia e Tunísia.

Atualmente, as usinas de beneficiamento de castanha-do-brasil também atuam no

mercado nacional brasileiro desse produto, tanto no comércio varejista quanto no comércio

atacadista, tendo como principal mercado interno a região sudeste do país. A Mundial

Exportação, empresa que possui usina de beneficiamento de castanha-do-brasil sediada em

Óbidos, por exemplo, comercializa a maior parte de sua produção com a empresa Pribel

Comércio Importação e Exportação Ltda., que atua no comércio como intermediadora na

venda do produto. Também possui como clientes a rede Makro atacadista; o grupo Pão de

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Açúcar e a empresa de alimentos Seven Boys. A Caiba Indústria e Comércio S/A, empresa

que possui indústria de beneficiamento sediada em Óbidos, também atua no mercado

brasileiro, com atacadistas e indústrias, incluindo as multinacionais do setor de cosmético e

perfumaria instaladas no Brasil (KRAG, 2014).

Atualmente, o mercado nacional tem, em termos mundiais, um grande concorrente na

compra das castanhas-do-brasil, que é o mercado boliviano, que inclusive compram uma boa

parte da castanha-do-brasil produzida no estado do Acre, no Brasil. Coslovsky (2005 apud

Enríquez, 2008, p. 219), ao discutir o fato de a Bolívia dominar o mercado, afirma que não se

trata apenas da quantidade exportada, mas da tecnologia, dos níveis sanitários e do valor

agregado do produto boliviano. Entretanto, esses indicadores têm a ver também com as

exigências dos órgãos brasileiros para a comercialização do produto. A Bolívia não conta com

as normas sanitárias que o Brasil exige para seus produtos, daí o deslocamento da produção

para a Bolívia, de onde a castanha-do-brasil é exportada com menores exigências do que no

Brasil.

O comércio internacional faz com que a cadeia produtiva da castanha-do-brasil sofra

interferências ou influências internacionais, como embargos, uma vez que para a exportação e

importação existem diversas exigências, tais como normas de qualidade, regulamentos

fitossanitários, licenças, impostos, entre outros, que são cumpridas e determinadas a nível

nacional, mas sempre surgem a nível internacional, por exigências dos países importadores.

Essas exigências têm efeitos sobre a produção que precisa se adequar aos requisitos exigidos

pelo país importador (armazenamento, processamento e transporte adequado, dependendo do

tipo de produto). Além disso, os preços da castanha-do-brasil e suas variações nas safras

variam de acordo com o mercado, principalmente com o mercado externo, que regula o preço

da indústria. Nos últimos anos, os preços para os produtores têm sido razoavelmente bons e

com perspectivas de se manterem, devido ao fato de se acrescer nesse item que parte das

florestas de castanha-do-brasil foi desmatada (KRAG, 2014).

A partir de 1998, as barreiras fitossanitárias impostas pela Comunidade Europeia se

tornaram mais exigentes quanto a qualidade da castanha-do-brasil importada, sendo tolerada

uma quantidade limite máxima de 4 ppb (partes por bilhão) de aflatoxina, que antes era de 20

ppb, cinco vezes maior. Uma outra perda de mercado aconteceu a partir de 1998, quando uma

regulação na Europa reduziu o nível aceitável de substâncias tóxicas (aflatoxinas) produzidas

por fungos que contaminam a castanha-do-brasil. Essa mudança dificultou o comércio

mundial da castanha-do-brasil. Em 2003, a Comunidade Europeia, por meio da Decisão

2003/493/CE, embargou a castanha-do-brasil com casca proveniente do Brasil, não havendo

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mais exportação desse produto para a Europa. Estima-se que a indústria internacional de

exportação da castanha-do-brasil movimenta entre 18 e 65 milhões de dólares por ano. No

entanto, mais importante do que isso é a coleta, o beneficiamento e a venda das castanhas-do-

brasil localmente, pois o comércio doméstico gera dinheiro e emprego para milhares de

famílias na Amazônia. A partir de 2010, o teor máximo de aflatoxina tolerado pela

Comunidade Europeia foi reduzido, mas, àquela altura, a regulamentação internacional já

havia gerado impactos negativos nas exportações da castanha-do-brasil brasileira. No ano de

2013, a Europa também suspendeu a importação de castanha-do-brasil descascada

proveniente do Brasil, até que fossem definidas novas normas (KRAG, 2014).

Tais exigências refletiram na produção brasileira de castanha-do-brasil, que teve que

se adequar às exigências dos países importadores, por meio de normas implementadas pelo

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para a regulação e fiscalização

desse produto quanto ao armazenamento, processamento e transporte adequados. Dentre essas

normas, atualmente, o principal desafio ao acesso a outros mercados, nacional e internacional,

é a aplicação da Instrução Normativa nº. 11, de 22 de março de 2010, do MAPA (IN nº.

11/2010). Essa instrução normativa estabeleceu os critérios e procedimentos para o controle

higiênico-sanitário da castanha-do-brasil e seus subprodutos, destinados ao consumo humano

no mercado interno, na importação e na exportação, ao longo da cadeia produtiva,

especialmente quanto aos limites de tolerância para presença de aflatoxinas B1, B2, G1 e G2

– até 30 ppb no Brasil, e até 4 ppb nos EUA e Europa (BRASIL, 2010).

Nesse contexto, para que haja a comercialização, a castanha-do-brasil deve se adequar

a normas e legislações do MAPA, que objetivam a segurança alimentar, para que as pessoas

não tenham problemas, visto que a aflatoxina é prejudicial à saúde. Uma das principais

normas estabelecidas pelo MAPA é a IN nº. 11/2010 que implementou os autocontroles, que

são:

por Aflatoxinas e Medidas de Higiene e Manejo (MPRCA/MHM), implementação

de sistema de rastreabilidade, comprovação de aplicação dos autocontroles ou

certificação de controle higiênico-sanitário, conforme o caso, amostragem e análise

laboratorial, Procedimentos Padrão de Higiene Operacional (PPHO) e Análise de

Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC), que são normas internacionais,

reconhecidas e exigidas pela Comunidade Europeia (BRASIL, 2010).

Atualmente, as indústrias beneficiadoras de castanha-do-brasil que não possuem o

APPCC implementado e auditado por uma certificadora externa, têm o produto fiscalizado no

momento da entrada nos portos dos países importadores. Além das APPCCs também é

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208

necessário implementar as BPFs nas etapas de coleta, armazenamento, transporte e

beneficiamento da castanha-do-brasil, principalmente, com a finalidade de melhorar a

qualidade do produto por meio da eliminação da contaminação por aflatoxina (KRAG, 2014).

Os empresários reclamam que o bloqueio comercial e sanitário da União Europeia

para a castanha-do-brasil brasileira teve enorme impacto na orientação comercial das

indústrias, considerando o mercado em que se trabalhava, mas esse impacto foi reduzido com

a entrada da China no mercado da castanha-do-brasil, que em alguns momentos importa

quantidades consideráveis do Brasil. Além disso, outro fator que ajudou a diminuir o impacto

do bloqueio comercial e sanitário da União Europeia para a castanha-do-brasil brasileira foi o

aumento do mercado interno brasileiro que era quase “irrisório”, e atualmente possui uma

capacidade de compra e de consumo bem maior, tendo como principal mercado interno a

região sudeste do país. Esse aumento no consumo interno da castanha-do-brasil pode estar

ligado à divulgação em diversas reportagens de programas de televisão em rede nacional, a

partir de 2013, acerca das propriedades nutricionais e dos benefícios diretos e indiretos que a

amêndoa proporciona (KRAG, 2014).

As indústrias brasileiras estão se adequando às exigências do mercado, pois a

qualidade torna-se um fator de competitividade primordial no cenário internacional. Não

apenas no processo de industrialização da castanha-do-brasil, mas também no sentido de

pesquisar e descobrir novos usos e aplicações para o produto. Desta maneira, aumenta-se o

valor de venda e consequentemente o valor obtido na comercialização interna e externa da

produção, também (ENRIQUEZ, 2009).

Gráfico 24– Produção brasileira, exportação e consumo interno de castanha-do-brasil (1997-

2017).

Fonte: MDIC (2018).

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209

O consumo de castanha-do-brasil está se consolidando no Brasil (Gráfico 24), o que

vem mantendo o setor de produção, tendo em vista que a produção boliviana e peruana

dependem da exportação e o Brasil, atualmente, não teria mais produtividade para atender na

exportação com pequenos volumes. Seria necessário possuir grandes volumes como é operado

na Bolívia e no Peru. Assim, pequenas fábricas não teriam competitividade para atender

(KRAG, 2014).

Além da amêndoa inteira, principal forma consumida, a castanha-do-brasil pode ser

utilizada como ingrediente na culinária, barras de cereais, biscoitos, bombons e na formulação

de cosméticos, principalmente em linhas baseadas na biodiversidade brasileira, por ser rica

em proteínas e minerais, com destaque para o selênio, um importante elemento antioxidante.

Existe também a indústria de chocolate, a exemplo da Nestlé, que ainda hoje opera com os

tabletes de chocolate que contém castanha-do-brasil. Além dessa grande indústria, há outras

menores que adicionaram a castanha-do-brasil ao pão, às barras de cereais, a granola além do

produto ser consumido a granel e em latas de 25 a 100 gramas (KRAG, 2014).

Em análise da cadeia produtiva do castanha-do-brasil chegou-se ao seguinte diagrama

da escala de economicidade (FIGURA 29):

Usinas de beneficiamento de

castanha

Regatão de fora

(Atravessador regional)

Espaço da

Coleta

Associação de Moradores da

Comunidade Último Quilombo

Espaço da Mais-

Valia

Espaço do

Comércio

Comércio

Atacadista(Nacional e Internacional)

Consumidor Final

Coletor Tradicional

de Castanha

Comércio Varejista: Supermercados,

Padarias, Docerias, Lanchonetes

(Nacional e internacional

Pontos de compra

de castanha

(Comunidades)

Feiras e mercados

municipais

Regatão

(Atravessador local)

Donos de Armazéns

Figura 29 – Diagrama da escala de economicidade da cadeia produtiva da castanha-do-

brasil coletada na Reserva Biológica do Rio Trombetas. Fonte: Adaptado de SILVA

(2009).

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210

6 CONCLUSÕES

As unidades de conservação, enquanto políticas ambientais territoriais possuem muitos

problemas, principalmente no que se refere à gestão das unidades de conservação onde há

pessoas residindo (tanto unidades de conservação de proteção integral quanto unidades de

conservação de uso sustentável), pois há conflitos no que as instituições responsáveis querem

para essas unidades de conservação – principalmente o ICMBio – e o que os moradores

almejam. Os moradores da Reserva Biológica do Rio Trombetas enfrentam muitos problemas,

principalmente, em relação ao acesso a políticas públicas, à infraestruturas e acesso a mercado

para seus produtos, pois o único produto extrativo da Reserva Biológica do Rio Trombetas

autorizado para comercialização que o ICMBio é a castanha-do-brasil, mas há outros produtos

que poderiam ser extraídos como: copaíba, breu, andiroba, cipós. Mas esses produtos devem

ser explorados de forma sustentável pelas comunidades locais e em conformidade com a

legislação ambiental atual.

Os planos de gestão territorial da Reserva Biológica do Rio Trombetas, de uma

maneira geral, não consideram o modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que residem nas comunidades quilombolas localizadas no interior e no

entorno dessa unidade de conservação, de modo que as sobreposições territoriais têm sido um

grande desafio para a implementação e gestão da Reserva Biológica do Rio Trombetas,

desafio esse que perpassa em resolver os conflitos gerados por tais sobreposições, de forma a

garantir tanto a conservação da biodiversidade, quanto os direitos dos quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil que residem nessas áreas.

Assim, na construção de um plano de gestão territorial de uma unidade de conservação

de proteção integral na qual há povos tradicionais residindo, como é o caso da Reserva

Biológica do Rio Trombetas, é necessário considerar os modos de vida desses povos. Nesse

sentido, a participação social é de suma importância quando se trata da gestão de unidades de

conservação, visto que interferem na vida das pessoas que, geralmente já estão nas áreas onde

são instaladas. Assim, é necessário compreender o modo de vida desses sujeitos sociais para

que as políticas sejam eficientes, ou seja, os sujeitos sociais devem se sentir parte da política

pública e devem ter os mesmos objetivos/interesses para que haja parceria entre Estado e a

sociedade envolvida.

As mudanças que ocorreram no modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil que residem no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio

Trombetas foram influenciadas pelos regatões, pelos chamados “patrões” que se diziam

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“donos dos castanhais”, pela implantação da MRN e pelas unidades de conservação, estas

últimas implantadas a partir da década de 1970 no vale do rio Trombetas, sobrepostas a

territórios de uso comum e coletivo de quilombolas que ali residem desde meados do século

XIX.

A implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas impulsionou mudanças no

modo de vida dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil do vale do rio

Trombetas, sendo que a coleta da castanha-do-brasil, uma das principais atividades produtivas

realizadas pelos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil do vale do

Trombetas, foi totalmente proibida pelo IBDF, assim como pelo órgão fiscalizador que o

sucedeu, o IBAMA, os quais consideraram o trabalho de coleta da castanha-do-brasil como

“roubo”. Essas proibições impostas pelos órgãos federais gestores e fiscalizadores de

unidades de conservação fizeram com que os quilombolas coletores tradicionais de castanha-

do-brasil da microrregião Alto Trombetas adentrassem “clandestinamente” na Reserva

Biológica do Rio Trombetas para a coleta da castanha-do-brasil nos castanhais existentes

nessa unidade de conservação, uma vez que esse povo tradicional tem essa atividade

produtiva como importante fonte, desde que se estabeleceram na microrregião Alto

Trombetas em meados do início do século XIX.

A implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas também restringiu a prática

dos grupos familiares de deslocar a sua moradia pelo território de uso comum, uma vez que

foram inseridas regras de residência pelo ICMBio, sendo necessária a aquiescência desse

órgão gestor e fiscalizador das unidades de conservação para a abertura de novos locais para a

construção de casas.

Com a implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas os quilombolas coletores

tradicionais de castanha-do-brasil da microrregião Alto Trombetas também foram proibidos

de utilizar os furos, atalhos naturais que encurtam as distâncias entre os lugares, o que

economiza tempo e gastos com combustível. Além disso, no período das cheias dos rios, a

circulação somente é permitida durante o dia, até às 18 horas. Após esse horário os

quilombolas devem parar nas bases de fiscalização do ICMBio para pernoitar e somente ao

amanhecer seguir viagem.

A criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas também interferiu na escolha das

espécies a serem cultivadas nas roças e nos quintais pelos quilombolas coletores tradicionais

de castanha-do-brasil, pois espécies exóticas – como mangueiras, abacateiros, cujo cultivo é

muito comum entre os quilombolas da microrregião Alto Trombetas – são proibidas de serem

cultivadas na Reserva Biológica do Rio Trombetas.

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212

A forma de organização política e o aparato burocrático e material que acompanha a

formação das comunidades na microrregião Alto Trombetas interferiram no modo de vida e

no modo de ocupação territorial dos quilombolas da microrregião Alto Trombetas,

principalmente, pois são os mecanismos da comunidade que auxiliam na gestão dos espaços,

das pessoas e da estrutura comunitária de uso coletivo construída em decorrência da

organização social em comunidade e também do que já existia antes da chegada da Igreja

Católica.

Os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem no interior e

entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas têm o seu modo de vida alicerçado na

produção extrativista e na pequena agricultura familiar, complementares entre si.

A caça e a pesca, principalmente da tartaruga-da-amazônia da Amazônia, também

passou a ser proibida na Reserva Biológica do Rio Trombetas. Atualmente, são proibidas a

caça e a pesca no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas, exceto para o

sustento das famílias que residem no interior e entorno dessa unidade de conservação. Antes

da implantação da Reserva Biológica do Rio Trombetas os quilombolas comercializavam.

Atualmente, os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que coletam

esse produto na Reserva Biológica do Rio Trombetas também possuem acesso a tecnologias

modernas como celulares, televisão por antenas parabólicas, mas em algumas comunidades da

microrregião Alto Trombetas não há acesso a sinal de celular e a energia elétrica para o

funcionamento dos eletrodomésticos só é disponibilizada à noite por gerador de energia

elétrica movido a diesel.

Quanto a produção da castanha-do-brasil a infraestrutura para a produção é precária,

principalmente, no que concerne às práticas de coleta, armazenamento primário nos

castanhais e ao transporte dos castanhais até as usinas de beneficiamento, o que pode

ocasionar a contaminação por aflatoxina.

Os coletores tradicionais de castanha-do-brasil que coletam castanha-do-brasil na

Reserva Biológica do Rio Trombetas não possuem apoio de financiamentos nas etapas de

coleta, armazenamento primário e transporte desse produto, uma vez que moram dentro do

território da Reserva Biológica do Rio Trombetas ou no entorno, mas realizam trabalho de

coleta da castanha-do-brasil na área da Reserva Biológica do Rio Trombetas, o que inviabiliza

aquisição de empréstimos e a destinação de políticas públicas para melhorias nessas etapas da

produção da castanha-do-brasil coletada na Reserva Biológica do Rio Trombetas.

A falta de uma visão sistêmica e a falta de cooperação entre os elos da cadeia

produtiva da castanha-do-brasil, cujas relações são de interdependência, associadas a falta de

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conhecimento de mecanismos de ação dos fatores que interferem no desempenho dessa cadeia

produtiva, vêm impedindo a definição de ações que possam favorecer a maior eficiência e

competitividade da mesma.

As dificuldades impostas pela infraestrutura produtiva, aliadas à falta de cooperação

entre os sujeitos econômicos configuram-se como os principais gargalos da cadeia produtiva

da castanha-do-brasil coletada na Reserva Biológica do Rio Trombetas.

Quanto à comercialização, tem-se o regatão (atravessador) como o principal

comprador da castanha-do-brasil produzida, conferindo-o alto poder de barganha na relação

comercial. A dependência ao regatão deve-se, sobretudo, à dificuldade de escoamento do

produto, visto que a microrregião Alto Trombetas está localizada distante dos centros

urbanos, e a limitada infraestrutura para o transporte da produção local.

As fragilidades produtivas e comerciais identificadas na cadeia produtiva da castanha-

do-brasil coletada na Reserva Biológica do Rio Trombetas podem ser explicadas em

decorrência dos problemas estruturais e socioeconômicos enfrentados pelos sujeitos locais

envolvidos. A busca por interesses coletivos articulados ao ambiente institucional e

organizacional permite uma maior sustentação e viabilidade política a determinadas

iniciativas e ações capazes de impulsionar a dinamização e transformação da realidade

econômica e social.

A legislação ambiental específica das reservas biológicas, o controle e a fiscalização

excessivos praticados pelo ICMBio, são fatores que desestimulam o coletor tradicional a

coletar a castanha-do-brasil. Os Termos de Compromisso possuem inúmeras regras, as quais,

praticamente, inviabilizam a atividade extrativista da castanha-do-brasil.

Nas comunidades visitadas há ausência dos serviços públicos de abastecimento de

água, saneamento básico, energia, transporte e comunicação, entre outros serviços associados

à qualidade de vida de uma população (OBSERVAÇÃO SEMIESTRUTURADA,

2018/2019).

Recomendações

Ao ICMBio:

A gestão nessas unidades de conservação deve ser participativa e integrada, o que

inclui as comunidades locais na tomada de decisões e administração desse território,

pois não há como dissociar o uso dos recursos naturais e a manutenção do modo de

vida dos quilombolas das atividades extrativistas, tendo em vista que estes, assim

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214

como os outros povos tradicionais que habitam a Amazônia, desde suas origens, têm

as atividades de caça e pesca, por exemplo, como as atividades mais basais de sustento

e obtenção de proteína animal.

Inclusão nos Termos de Compromisso, pelo ICMBio, de outros produtos não

madeireiros (além da castanha-do-brasil e açaí) para fins de comercialização

Criação de projetos pelo ICMBio para o fortalecimento do monitoramento da caça, da

pesca e da coleta de produtos florestais não-madeireiros realizadas para fins de

sustento na RBRT

O ICMBio, juntamente às associações quilombolas, deve buscar parcerias para o

melhoramento das práticas agrícolas na RBRT, evitando, assim, a abertura de novos

roçados, principalmente no que se refere ao cultivo da mandioca, pois a terra não é

propícia para essa cultura, apodrece muito rápido em relação à terra de outras

localidades

A mobilização dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil em explorar as

capacidades e potencialidades dos recursos de forma sustentável, a gestão profissional

do negócio, cooperação e compartilhamento das informações entre os sujeitos que

constituem a cadeia e intervenções públicas integradas podem contribuir para a

competitividade da cadeia, maior integração entre os elos e, assim, melhores

resultados para os sujeitos que a constituem.

Rever as regras que impõem horários para os quilombolas moradores da RBRT

transitarem por essa UC, uma vez que os furos são atalhos naturais que encurtam as

distâncias entre os lugares, o que economiza tempo e gastos com combustível;

Buscar parcerias para a criação e fortalecimento de cooperativas;

Desenvolver uma política de apoio às comunidades extrativistas da microrregião Alto

Trombetas, apoio este que envolve investimentos na infraestrutura de escoamento,

organizações associativistas e o estudo da dinâmica dos circuitos e escalas do

mercado. Estes podem nortear as ações a serem desempenhadas pelos coletores

tradicionais de castanha-do-brasil para atender às indústrias locais, regionais ou aos

consumidores finais e assim, minimizar a relação de dependência ao regatão.

Aos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil:

Instituir cooperativas que resultam em incremento na renda para os coletores

tradicionais de castanha-do-brasil;

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215

Participar das associações e cooperativas, pois estas enfrentam muitos problemas,

principalmente, devido a falta de participação dos associados/cooperados e por

possuírem uma estrutura organizacional e política fraca que interfere em diversos

aspectos, como na intervenção para o escoamento da produção e até mesmo para se

manter em funcionamento;

Podem contribuir para a competitividade da cadeia da castanha-do-brasil, maior

integração entre os elos e, assim, melhores resultados para os sujeitos que a

constituem: a mobilização dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil em explorar

as capacidades e potencialidades dos recursos de forma sustentável, a gestão

profissional do negócio, cooperação e compartilhamento das informações entre os

sujeitos que constituem a cadeia e intervenções públicas integradas.

Para futuros trabalhos:

Utilizar metodologias participativas na obtenção dos dados.

Desdobramentos do Projeto

Serão elaborados folders para apresentação dos resultados da pesquisa às comunidades

quilombolas coletoras tradicionais de castanha-do-brasil que participaram da presente

pesquisa. Será desenvolvido um curso de elaboração de projetos e captação de recursos

financeiros a ser ministrado junto aos coordenadores de associações dos Territórios

Quilombolas e coordenadores das comunidades pesquisadas.

Limites do Estudo

Apesar de todo o esforço empreendido para demonstrar a realidade complexa na qual

estão inseridos os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil, a compreensão

dessas realidades envolvidas é extremamente difícil, uma vez que estão essas comunidades

estão inseridas num mosaico de territorialidades que muitas vezes se sobrepõe, ocasionando

conflitos, cabendo ao pesquisador perceber as mínimas nuances que podem estar submersas

nesses conflitos territoriais.

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216

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BRASIL. Lei nº. 5.727, de 04 de novembro de 1971. Dispõe sobre o Primeiro Plano Nacional

de Desenvolvimento (PND), para o período de 1972 a 1974. Diário Oficial da União:

Brasília, DF, 08 nov. 1971. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-

1979/L5727.htm>. Acesso em: 15 fev. 2018.

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em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm>. Acesso em: 15 fev. 2018.

BRASIL. Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, §1º, incisos I,

II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação

da Natureza e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 1, 19

jul. 2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso

em: 15 fev. 2018.

BRASIL. Decreto Federal nº 4.340, de 22 de agosto de 2002. Regulamenta artigos da Lei nº

9.985, de 18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de

Conservação da Natureza – SNUC, e da outras providências. Diário Oficial da União: seção

1, Brasília, DF, p. 09, 23 ago. 2002. Disponível em: <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4340.htm>. Acesso em: 25 mai. 2018.

BRASIL. Decreto Legislativo nº 143, de 20 de junho de 2002. Aprova o texto da Convenção

nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre os povos indígenas e tribais em países

independentes. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 2, 21 jun. 2002. Disponível

em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/2002/decretolegislativo-143-20-junho-

2002-458771-convencao-1-pl.html>. Acesso em: 15 jun. 2018.

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define crimes e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 1,

23 dez. 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10826.htm>.

Acesso em: 15 fev. 2018.

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de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nº 4.771, de 15 de setembro de

1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de

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ICMBio. Termo de Compromisso nº 119, de 20 de dezembro de 2011a. Termo de

Compromisso celebrado entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade –

ICMBio e a Associação dos Remanescentes de Quilombos do Município de Oriximiná -

ARQMO. Estabelece regras para a coleta e a comercialização da castanha-do-pará dentro dos

limites da Reserva Biológica do Rio Trombetas e das áreas a montante desta unidade de

conservação. Diário Oficial da União, Brasília, DF, n. 248, 27 dezembro 2011. Seção 3,

p.167.

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230

ICMBio. Termo de Compromisso nº 120, de 20 de dezembro de 2011b. Termo de

Compromisso celebrado entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade -

ICMBio e a Associação dos Moradores da Comunidade de Remanescentes de Quilombo da

Cachoeira Porteira - AMOCREQ - CPT. Estabelece regras para a coleta e a comercialização

da castanha-do-pará dentro dos limites da Reserva Biológica do Rio Trombetas e das áreas a

montante desta unidade de conservação. Diário Oficial da União, Brasília, DF, n. 248, 27

dezembro 2011. Seção 3, p.167.

ICMBIO. Termo de Compromisso nº 121, de 20 de dezembro de 2011c. Termo de

Compromisso celebrado entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade -

ICMBio e a Associação dos Extrativistas Tradicionais do Município de Oriximiná - AETMO.

Estabelece regras para a coleta e a comercialização da castanha-do-pará dentro dos limites da

Reserva Biológica do Rio Trombetas e das áreas a montante desta unidade de conservação.

Diário Oficial da União, Brasília, DF, n. 248, 27 dezembro 2011. Seção 3, p.167.

ICMBIO. Instrução Normativa nº 01, de 18 de setembro de 2007. Disciplina as diretrizes,

normas e procedimentos para a elaboração de Plano de Manejo Participativo de Unidade de

Conservação Federal das categorias Reserva Extrativista e Reserva de Desenvolvimento

Sustentável. Diário Oficial da União n. 182, de 20 de setembro de 2007. Seção I, páginas 101

e 102.

ICMBIO. Instrução Normativa n. 26, de 04 de julho de 2012. Estabelece diretrizes e

regulamenta os procedimentos para a elaboração, implementação e monitoramento de termos

de compromisso entre o Instituto Chico Mendes e populações tradicionais residentes em

unidades de conservação onde a sua presença não seja admitida ou esteja em desacordo com

os instrumentos de gestão. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 1, 23 dez. 2003.

Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. Brasília, 06 jul. 2012. Seção 1, p. 84-85.

ICMBIO. Portaria nº 1.163, de 27 de dezembro de 2018. Aprova roteiro metodológico para

elaboração e revisão de planos de manejo de unidades de conservação federais. Diário Oficial

da União, Brasília, DF, n. 250, 31 dez. 2018. Seção 1, p. 162.

INCRA. Portaria de Reconhecimento nº 1.171, de 17 de julho de 2018. Reconhece e

declarar como terras do Território Quilombola Alto Trombetas 1 a área de 161.719,4276 ha

(cento e sessenta e um mil, setecentos e dezenove hectares, quarenta e dois ares e setenta e

seis centiares), situada no Município Oriximiná, no Estado do Pará. Diário Oficial da União,

Brasília, DF, n. 138, 19 julho 2011a. Seção 1, p.1.

INCRA. Portaria de Reconhecimento nº 1.172, de 17 de julho de 2018a. Reconhece e

declarar como terras do Território Quilombola Alto Trombetas 2 a área de 189.657,8147 ha

(cento e oitenta e nove mil, seiscentos e cinquenta e sete hectares, oitenta e um ares e quarenta

e sete centiares), situado no Município Oriximiná, no Estado do Pará. Diário Oficial da União,

Brasília, DF, n. 138, 19 julho 2011. Seção 1, p.1.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Cadastro de comunidades quilombolas e

ribeirinhas localizadas no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio Trombetas -

Pará - Brasil. (Relatório final). Porto Trombetas, 2006.

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa nº. 11, de 22 de

março de 2010. Estabelece os critérios e procedimentos para o controle higiênico-sanitário da

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231

castanha-do-brasil e seus subprodutos, destinados ao consumo humano no mercado interno,

na importação e na exportação, ao longo da cadeia produtiva. Diário Oficial da União:

Brasília, DF, 23 mar. 2010. Disponível em:

http://www.agricultura.gov.br/assuntos/inspecao/produtos-vegetal/normativos-

dipov/IN11.pdf. Acesso em 20 out. 2018.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Recomendação. 3º ofício/PRM/STM nº 4. Santarém,

18 de agosto de 2014, p. 6: “Que, em razão dos fatos e argumentos apresentados determine,

em razão da urgência e do relevante interesse público, a SUSPENSÃO DAS LICENÇAS OU

AUTORIZAÇÕES EXPEDIDAS NA REGIÃO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO

TROMBETAS, especialmente a AUTORIZAÇO 2329/2013, expedida pela Secretaria

Estadual de Meio Ambiente (SEMA). Abstenha-se, ainda, de RENOVAR OU CONCEDER

QUALQUER TIPO DE LICENÇA OU DE AUTORIZAÇÂO NESTA REGIÃO à Empresa

de Pesquisa Energética (EPE) e qualquer outra empresa, subcontratada ou não, que almeje

pesquisar ou realizar estudos para inventário hidrelétrico da Bacia Hidrográfica do Rio

Trombetas, até que haja a realização de consulta prévia, livre e informada da Convenção 169

da OIT, às populações tradicionais existentes na área, tais como indígenas, ribeirinhos,

quilombolas, povos extrativistas, bem como consulta aos Conselhos Gestores e Consultivos

das unidades de conservação federais e estaduais da aludida região”.

ORIXIMINÁ. Lei nº 8.432, de 06 de maio de 2014. Cria a Unidade Regional de Gestão

Escolar – URGE Quilombola 11 – Alto Rio Trombetas. Oriximiná, 2014.

ORIXIMINÁ. Anexo I: Diagnóstico municipal. In: Lei municipal nº 9.161, de 29 de

dezembro de 2017. Institui o Plano Plurianual do município de Oriximiná para o quadriênio

2018 – 2021, e dá outras providências.

http://www.governotransparente.com.br/transparencia/documentos/4496490/download/23/AN

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RADAMBRASIL. Projeto. Folha SA. 21 - Santarém. DNPM. Projeto RADAMBRASIL.

Levantamento de Recursos naturais. V.10. p. 310 - 414. 1976.

SERVIÇO FLORESTAL BRASILEIRO. SFB. Edital de licitação para concessão florestal:

Concorrência nº 02/2012 – Floresta Nacional Saracá-Taquera/PA – Lote Sul, Brasília, 2012.

SILVA, M. F. F.; SILVA, J. B. F. 2003. Avaliação Ecológica Rápida para a Revisão do

Plano de Manejo da Estação Ecológica do Rio Trombetas, Estado do Pará - Relatório

Técnico Final do Componente Vegetação. Mineração Rio do Norte / STCP - Engenharia de

Projetos Ltda (Relatório Técnico Não Publicado).

STCP ENGENHARIA DE PROJETOS. Levantamento Socioeconômico e Ocupacional dos

Municípios do Entorno da MRN. Paraná, 2009.452p.

STCP ENGENHARIA DE PROJETOS. Atualização do Levantamento Socioeconômico e

Avaliação da Dinâmica Demográfica nas Comunidades do Entorno da Mineração Rio

do Norte. Paraná, 2011. 154p.

STCP ENGENHARIA DE PROJETOS. Levantamento Socioeconômico e Avaliação da

Percepção Sobre a MRN nas Comunidades do Entorno da Mineração Rio do Norte. Paraná, 2014.

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Switzerland: IUCN, 1994. 29p.

UNIÃO INTERNACIONAL PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA. Economic

values of protected areas: guidelines for protected área managers. Switzerland: IUCN,

1998.

VOSS, C.; TSIKRIKTSIS, N.; FROHLICH, M. Case research in operations management.

International Journal Of Operations & Production Management, v. 22, n. 2, p. 195-219,

2002.

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233

GLOSSÁRIO

Acondicionamento: Etapa no processo de trabalho na cadeia produtiva, em que consiste na

embalagem da castanha-do-brasil com material adequado a fim de garantir sua qualidade. No

paiol é realizada em sacos de polipropileno e na etapa final ocorre em embalagens de

alumínio (descascadas à vácuo) ou de fibra de juta (com cascas).

Aflatoxinas B1, B2, G1 e G2: substâncias tóxicas produzidas por muitas das espécies do

fungo Aspergillus (Aspergillus flavus, A. parasiticus, A. nomius), que deixam as castanhas-do-

brasil com uma qualidade ruim para a alimentação, saúde e comercialização.

Amontoa: fase de juntar os ouriços coletados em um só lugar na floresta ou próximo do

tapiri.

Áreas protegidas: terminologia utilizada internacionalmente para designar a porção de

ambiente terrestre, aquático ou marinho, geograficamente delimitados, de domínio público ou

privados, onde medidas legais e outros instrumentos estabelecem o seu manejo com o

objetivo de proteger e manter a diversidade biológica, recursos naturais e culturais associados

e, administradas através de medidas legais ou outras medidas efetivas (UICN, 1998).

Armazenamento da castanha-do-brasil: etapa de trabalho na cadeia produtiva, estocagem

dos ouriços na floresta ou na área do extrativista (primário); estocagem das castanhas-do-

brasil na área do extrativista (secundário); armazenamento realizado pelo extrativista ou

intermediário, visando à comercialização (terciário).

Armazenamento: estocagem das castanha-do-brasil antes do processamento.

Atravessador: comerciante que faz intermediação de compra e venda da castanha-do-brasil

entre extrativistas e comerciantes, donos de usina e exportadores. Elemento que incide na

capilaridade da circulação da mercadoria e do capital.

Bauxita: minério que contém alumina, matéria-prima da qual se extrai o alumínio, um dos

metais mais leves mais importantes e também o metal mais abundante na crosta terrestre.

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234

Beiju (Massa e Goma): substantivo masculino Rubrica: culinária 1 Regionalismo: Brasil.

espécie de bolo de goma ('polvilho') ou de massa de mandioca assada, de que há diversas

variedades (HOUAISS, 2014).

Beneficiamento/processamento: etapa da cadeia produtiva, em que processos realizados nas

usinas, que se referem ao preparo das castanha-do-brasil para consumo direto, para uso

industrial ou comercialização.

Cadeia Produtiva: envolve produção, distribuição, circulação e consumo, conjunto de

processos relativos à castanha-do-brasil constituído pelas etapas de catação, transporte,

armazenamento, beneficiamento-processamento e comercialização.

Castanheiros tradicionais ou coletores tradicionais de castanha-do-brasil:

autodenominação utilizada pelos quilombolas da microrregião Alto Trombetas que coletam

castanha-do-brasil como designação agregadora à categoria social quilombola, não sendo

possível afirmar que coletor tradicional de castanha-do-brasil ou castanheiro tradicional é uma

categoria social de distinção dentro do grupo (FARIAS JÚNIOR, 2016). O termo

“tradicional” foi inserido no quotidiano dos quilombolas devido a “tradicionalidade” exigida

para a permanência dos povos tradicionais em unidades de conservação.

Cheia: período do ano da enchente do rio, demarcador de trabalho territorial em determinadas

áreas, preços diferenciados mais caros ou mais baratos, incidindo conforme a distância do

comprado e do produto.

Comunidade: nesta pesquisa, se refere ao termo utilizado pela Igreja Católica local para

identificar as formas de organização territorial, que nucleia uma identidade de grupo e

administrativa de grupos de família que, nessa região, localizam-se ao longo e às margens dos

rios Trombetas e Cuminá. Instituições públicas, como a Prefeitura Municipal de Oriximiná,

baseiam seus levantamentos de dados nessa configuração espacial. Frequentemente o grupo

referenda essa terminologia na linguagem cotidiana atribuindo igual caráter organizativo para

as ações políticas como se observa nos documentos convocatórios de reuniões. Admitimos

esse termo, descritivamente, dentro dessas significações (CASTRO; ACEVEDO, 1998).

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Conflito: divergência entre aqueles que discordam das formas de propriedade, uso da terra

sob diferentes formas e interesses de classe e de uso da natureza. Aqui como conflitos pelo

uso do território como meio de produção e base de reprodução do modo de vida.

Dono do armazém: atravessador regional, geralmente, mantido pelas indústrias,

estrategicamente, em regiões produtoras, que compram dos regatões locais e dos regatões “de

fora” (KRAG, 2014. p. 37).

Etapas da cadeia: elos ou segmentos do circuito espacial produtivo.

Família: nesta pesquisa, considerou-se como família o conjunto de pessoas ligadas por laços

de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, que residissem na mesma

unidade domiciliar e, também, a pessoa que mora só em uma unidade domiciliar (IBGE,

1999).

Farinha de Mandioca: produto extraído pelo trabalho de torrar a mandioca moída.

Fases da cadeia: partes definidas em cada etapa do circuito espacial produtivo.

Furo: um canal fluvial sem correnteza própria, que secciona uma ilha fluvial ou interliga

componentes internos de uma mesma planície (AB’SABER, 2003).

Igarapé: canal natural estreito e navegável por pequenas embarcações, que nasce na mata e

deságua em rio.

Inverno: período que ocorre de dezembro a maio, quando ocorrem as maiores precipitações

pluviométricas, com o aumento dos níveis dos rios, lagos e igarapés, ocasionando as

chamadas “cheias”, o que facilita o transporte da castanha-do-brasil.

Lagos: denominação dada aos braços de rios que tem seu fluxo isolado no período da seca,

mas que continuam com essa nomenclatura durante todo o ano.

Manicuera: bebida de origem indígena, feita com a fermentação do suco (tucupi) da

mandiocaba (mandioca maior e doce), era muito utilizada no “puxirum” e nos festejos locais.

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236

Mutirão: termo inserido nas comunidades quilombolas pela Igreja Católica. Utilizado na

realização de trabalhos coletivos relacionados, principalmente, aos equipamentos públicos da

comunidade, como consertos e reparos da capela, do barracão de festas, além dos trabalhos

relacionados às festas de santo comunitárias.

Ouriço: fruto da castanheira.

Paiol: armazéns rústicos, utilizados para armazenagem primária das castanhas-do-brasil.

Paneiro: cesto construído com cipó ou tala de caule palmeira, utilizado para transporte dos

ouriços ou castanha-do-brasil.

Platôs: os planaltos reconhecidos, regionalmente, na Amazônia, como terras firmes, podendo

atingir altitudes de até 350m, assim, livre das inundações (RUDDIMAN, 2015).

Pontos de compra de castanha-do-brasil: locais estabelecidos pelos regatões locais ou

regatões de fora para compra da castanha-do-brasil nas comunidades, geralmente, a casa de

moradores da própria comunidade.

Povos tradicionais e comunidades tradicionais: “grupos culturalmente diferenciados e que

se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e

usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social,

religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e

transmitidos pela tradição” (BRASIL, 2007). São considerados povos ou comunidades

tradicionais os Povos Indígenas, Quilombolas, Seringueiros, Castanheiros, Quebradeiras de

coco-de-babaçu, Comunidades de Fundo de Pasto, Catadoras de mangaba, Faxinalenses,

Pescadores Artesanais, Marisqueiras, Ribeirinhos, Varjeiros, Caiçaras, Povos de terreiro,

Praieiros, Sertanejos, Jangadeiros, Ciganos, Pomeranos, Açorianos, Campeiros, Varzanteiros,

Pantaneiros, Geraizeiros, Veredeiros, Caatingueiros, Retireiros do Araguaia, entre outros.

Primeira seleção: retirada das castanhas-do-brasil, visivelmente danificadas, podres, chochas,

e outros defeitos, após sua remoção dos ouriços.

Produto in natura: produto que tenha mantido suas características físico-químicas, sensoriais

e de composição, originais e que não tenha sido submetido a processos que resultem em

alterações de suas características naturais.

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“Puxirum”: é uma técnica de organização do trabalho muito utilizada entre os povos

tradicionais amazônicos para as suas produções, onde se tem a divisão de tarefas entre os

membros da comunidade – no caso da Reserva Biológica do Rio Trombetas entre os membros

do grupo familiar, da comunidade ou de várias comunidades – buscando-se a maximização e a

economia de esforços na execução das tarefas, principalmente, na preparação da roça.

Quilombo: locais onde os negros que fugiam da escravidão se estabeleciam e se

organizavam. Geralmente, eram locais que lhes proporcionavam proteção, abrigo e sustento

(planaltos, montanhas, pântanos, manguezais, planícies, cavernas, morros, serras, florestas,

rios etc.,), o que dificultava as expedições de captura e repressão.

Quilombola: terminologia que não era de uso cotidiano nas comunidades descendentes do rio

Trombetas, mas, recentemente, por influência dos movimentos sociais negros, passou a ser

utilizada pelos quilombolas como auto definição de atribuições representativas dos vínculos

étnicos existentes entre os diversos grupos negros do vale do rio Trombetas.

Rabeta: pequena embarcação construída em madeira, movida a motor de popa do tipo rabeta,

também chamada de bote de rabeta.

Regatão de fora: atravessador regional, oriundos das cidades de Óbidos e Oriximiná, que

também compram diretamente dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil nas áreas de

coleta ou estabelecem pontos de compra nas comunidades, sob a responsabilidade de

compradores locais, podendo manter contato direto ou não com o coletor.

Regatão local: pequenos atravessadores, que moram nas comunidades e compram

diretamente dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil nos castanha-do-brasil ou nas

comunidades produtoras, mantendo contato direto com o coletor.

Regatão: comerciante ambulante, atravessador, elo importante do circuito espacial produtivo

da castanha-do-brasil que comercializa e transporta esse produto dos castanhais até a cidade

de Oriximiná ou Óbidos, onde o produto é vendido às usinas de beneficiamento. É o regatão

que viabiliza a circulação da mercadoria.

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Remanescentes de quilombos: denominação com a qual se auto definem e se auto

reconhecem os descendentes dos negros que formaram os antigos quilombos, inicialmente,

acima das cachoeiras dos rios Trombetas e Erepecuru.

Roça: área de cultivo de que possui quatro fases principais: a derrubada, o plantio, a capina e

a colheita. Na microrregião Alto Trombetas a maior parte da roça é destinada ao cultivo da

mandioca, principal cultura cultivada na roça, mas também cultiva-se: macaxeira, banana,

abacaxi, cará, batata-doce, jerimum e outros. Os quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil possuem autorização do ICMBio para cultivar até 01 hectare de roça, o que

equivale a uma quadra, medida agrária utilizada pelos quilombolas da microrregião Alto

Trombetas. Base de muitas cadeias produtivas e também demarcador territorial de trabalho,

isto é, da terra de trabalho e não da terra de negócio.

Roçado: fase de preparação da roça em que se realiza a derrubada ou retirada da vegetação

para depois fazer a queimada e realizar o plantio.

Safra da castanha-do-brasil: período de trabalho de coleta da castanha-do-brasil, que, na

microrregião Alto Trombetas, se inicia em janeiro e termina em junho.

Seca: período de descida do nível do rio, no caso do rio Trombetas, o período de julho a

dezembro. Envolve também mudanças em preços e acessibilidade em alguns lugares que são

dificultados/faciliatados.

Secagem da castanha-do-brasil: processo de redução da umidade das castanhas-do-brasil

por meio de recursos naturais (sol e vento). Também é realizado na fase do beneficiamento-

processamento que consiste na redução controlada da umidade das castanhas-do-brasil por

meio de secador mecânico.

Tapiri: elemento acessório ao processo produtivo, armação de madeira, coberta de palha ou

lona plástica, feita no acampamento para servir como moradia temporária e abrigo, durante a

coleta da castanha-do-brasil, também chamada de barraco do castanheiro.

Transporte primário: transporte das castanhas-do-brasil do local de quebra dos ouriços para

a moradia do extrativista ou outro local para ser conduzido ao transporte secundário.

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Unidades de conservação: termo utilizado apenas no Brasil para designar as áreas protegidas

que compõem o Sistema Nacional de Unidades de Conservação.

Verão: período de junho a novembro, quando a estiagem é bem acentuada, ocasionando as

chamadas “secas”. Durante o verão os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-

brasil dedicam-se ao trabalho intensivo na roça, uma das principais atividades produtivas, e a

mais permanente no calendário anual agroextrativo do TQ Alto Trombetas 1 e da comunidade

Último Quilombo. Além do trabalho na roça, também se extraem produtos florestais e pratica-

se a caça e a pesca, sendo que estas últimas são praticadas durante o ano todo e apenas para o

próprio sustento das famílias.

Manicuera: bebida de origem indígena, feita com a fermentação do suco (tucupi) da

mandiocaba (mandioca maior e doce), era muito utilizada no “puxirum” e nos festejos locais.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

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Comitê de Ética em Pesquisas Envolvendo Seres Humanos

INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO

Nós, os pesquisadores Dr. Reinaldo Corrêa Costa, PhD. - Pesquisador-Orientador e, Carlos

Adriano Siqueira Picanço - Aluno, vimos nos apresentar aos senhores, como responsáveis pelo

desenvolvimento de um projeto de pesquisa que tem como título “ANÁLISE DAS

TRANSFORMAÇÕES NO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS DO VALE DO

TROMBETAS: O CASO DOS COLETORES DE CASTANHA-DO-BRASIL NA RESERVA

BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ-PA” e pedir a sua participação no referido

projeto. Vamos lhe apresentar a pesquisa.

Esta pesquisa se faz necessária em função da necessidade de se identificar e analisar as

transformações ocorridas no modo de vida dos quilombolas residentes no interior e entorno da Reserva

Biológica do Rio Trombetas - Oriximiná/PA, e que firmaram termo de compromisso para a coleta da

castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa H. B. K) nessa UC.

O objetivo desta pesquisa é analisar as transformações que ocorreram no modo de vida dos

quilombolas a partir da criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas e da implementação dos

termos de compromisso firmados entre o ICMBio e os quilombolas para a coleta da castanha-do-brasil

na RBRT, no município de Oriximiná, estado do Pará, a partir de seu cotidiano e o uso do território e

propor subsídios para o aperfeiçoamento do termo de compromisso.

Pretende-se realizar quantas entrevistas forem necessárias até se conseguir a saturação teórica,

sendo que serão aplicadas aos coletores cadastrados no ICMBio para a coleta da castanha-do-Brasil na

RBRT. Também serão realizadas entrevistas semiestruturadas com os gestores da Reserva Biológica

do Rio Trombetas. As entrevistas serão feitas levando-se em consideração pessoas interessadas em

participar da pesquisa, objetivando coletar diagnóstico e discursos referentes à temática abordada.

As perguntas serão formuladas para buscar emersões de falas referentes a efetividade dos

termos de compromisso, respeitando-se os costumes e tradições locais. As questões tratadas não

representam tabus ou assuntos que sejam tratados como desconfiança, tendo em vista que são dados

que fazem parte da rotina do monitoramento dos termos de compromisso. Deste modo, a pesquisa não

envolve discussões sobre as dimensões moral, intelectual ou espiritual do ser humano.

Todos os documentos de autorização e consentimento tais como: Termo de Consentimento

Livre Esclarecido (TCLE) e Autorização Comunitária serão assinados durante as visitas de campo e

posteriormente anexados ao projeto. Caso o entrevistado não se sinta confortável com algum tipo de

pergunta durante a entrevista, será dada a opção de não continuar.

A partir da metodologia proposta para o desenvolvimento dessa pesquisa, espera-se alcançar

resultados capazes de produzir análise sobre a situação dos termos de compromisso firmados entre o

ICMBio e as comunidades tradicionais para o acesso e uso dos recursos naturais na Reserva Biológica

do Rio Trombetas, no município de Oriximiná/PA. Através dos resultados obtidos com a pesquisa

espera-se oferecer subsídios para a manutenção e melhorias dos termos de compromisso, auxiliando

no monitoramento e na tomada de decisões na gestão desses instrumentos de gestão.

Os participantes da pesquisa receberão informações sobre a viabilidade dos serviços analisados

e poderão a qualquer tempo, entrar em contato com o pesquisador pelos telefones (93) 99199-5328 e

99200-8658. Todos os participantes têm liberdade absoluta para recusar-se ou retirar seu

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consentimento da pesquisa em qualquer fase, sem penalização alguma. É garantida a manutenção do

sigilo e da privacidade dos participantes da pesquisa durante todas as suas fases. Todos os

participantes da pesquisa receberão uma via do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para

garantir seus direitos.

Qualquer ônus de indenização diante de eventuais danos decorrentes da pesquisa será de

responsabilidade do pesquisador e deverá ser encaminhado ao mesmo para que se faça o

ressarcimento.

Eventuais despesas dos participantes da pesquisa, que não esteja contemplada em seu orçamento

serão ressarcidas através de cobrança para o endereço Rua Rosa Vermelha, 723 – Aeroporto Velho,

Santarém – PA, CEP: 68010-200.

Os resultados da pesquisa serão analisados e divulgados no âmbito acadêmico e nas

comunidades envolvidas, porém sua identidade será mantida em sigilo para sempre. Se você quiser

saber mais detalhes e os resultados da pesquisa, faça contato com o pesquisador pelo telefone (92)

99199-5328 ou pelo e-mail: [email protected].

O Sr. (a) participante da pesquisa também pode entrar em contato, caso tenha interesse como o

Comitê de Ética do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, situado na sede Av. André Araújo,

2936, Prédio da Diretoria, térreo, Sala-CEP, telefone (92)3643-3287 ou pelo e-mail:

[email protected].

Consentimento Após–Informação

Eu,___________________________________________________________, por me

considerar devidamente informado e esclarecido sobre o conteúdo deste documento e da pesquisa a ser

desenvolvida, livremente dou meu consentimento para inclusão como participante da pesquisa e atesto

que me foi entregue uma cópia desse documento.

_________________________________ ou ____-______-_____

Assinatura do participante Data

__________________________________ ____-______-_____

Pesquisador Responsável Data

Impressão do dedo polegar

Caso não saiba assinar

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APÊNDICE B – Roteiro (Instrumento de pesquisa utilizado na coleta de dados)

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ROTEIRO DE ENTREVISTAS: COLETORES DE CASTANHAS

PARTE 1 – PERFIL DOS SUJEITOS

LOCAL: MUNICIPIO DE ORIXIMINÁ Data: / /

1.1 Nome: ___________________________________________________________________________

1.2 Idade: _____________________ 1.3 Gênero: _____________________________

1.4 Escolaridade: __________________ 1.5 Telefone para contato: _________________

2 Qual o nome da comunidade onde o(a) Sr.(a) reside?

___________________________________________________________________________

3 O local onde o(a) Sr.(a) reside fica localizado dentro de Unidade de Conservação, Terra Quilombola ou no entorno dessas áreas protegidas?

___________________________________________________________________________

4 - Desde quando o(a) Sr.(a) reside nessa localidade?

___________________________________________________________________________

PARTE 2 – QUESTÕES ESPECÍFICAS

Para realizar o objetivo 3, “Descrever e analisar a cadeia produtiva da castanha-do-brasil coletada pelos quilombolas coletores tradicionais de

castanha-do-brasil que firmaram termos de compromisso com o ICMBio para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio

Trombetas;

5 - Desde quando o(a) Sr.(a) coleta castanha? Por que o(a) Sr.(a) coleta

castanha?

7 - E antes da criação da RBRT, como era feita a coleta nos tempos do

patrão? (Como se organizavam para a coleta? Quais as técnicas

utilizadas para a coleta?) As mulheres coletavam castanha? 6 - Como é feita a coleta da castanha? (Como se organizam para a

coleta? Quais as técnicas utilizadas para a coleta?) As mulheres coletam

castanha?

8 - Para quem o(a) Sr.(a) vende a castanha que coleta? O(a) Sr.(a) pode

vender castanha para quem quiser?

9 - O que os regatões podem comprar e o que os regatões podem vender

aqui na RBRT?

10 - E antes da criação da RBRT para quem (o) Sr.(a) vendia a

castanha?

Como os patrões transportavam a castanha para a cidade?

De quem eram as embarcações?

11 – Aqui na RBRT tem data para iniciar e terminar a coleta da

castanha?

12 - E antes da criação da RBRT tem data para iniciar e terminar a

coleta da castanha? Em qual período é feita a coleta da castanha-do-

brasil?

13 – Onde o(a) Sr.(a) mora durante a coleta da castanha? (Perguntar

sobre os tapiris? De que são construídos?)

14 - Antes da criação da RBRT, também construíam tapiris? De que

eram construídos os tapiris?

15 – Quais alimentos são consumidos pelo(a) Sr.(a) durante o período

de coleta da castanha?

16 – Quais alimentos eram consumidos pelo(a) Sr.(a) durante o período

de coleta da castanha?

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Quais alimentos são consumidos pelo(a) Sr.(a) durante o período em

que não está coletando castanha?

Para realizar o objetivo 2, “Descrever e analisar o modo de vida atual

dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que

firmaram termo de compromisso para a coleta da castanha-do-brasil na

Reserva Biológica do Rio Trombetas”

Para realizar o objetivo 1, “Descrever a formação do modo de vida

dos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da

Reserva Biológica do Rio Trombetas”

17 - O senhor se autodeclara/auto define como: remanescente de

quilombola, quilombola, castanheiro, coletor tradicional de castanha?

18 – Como o(a) Sr(a) se autodeclarava/auto definia como:

remanescente de quilombola, quilombola, castanheiro, coletor

tradicional de castanha? Como as pessoas se autodeclaravam/auto

definiam (remanescente de quilombola, quilombola, castanheiro,

coletor tradicional de castanha)?

19 – Quantas pessoas moram em sua casa? Quantas famílias moram

em sua casa?

7 - De que material é feita a casa onde a sua família mora? Como eram

feitas as casas onde o senhor mora. Quantos cômodos têm na sua casa?

A sua casa possui sanitário? Dentro de casa ou no quintal (terreiro)?

Como o(a) Sr(a) chama a área ao redor da sua casa (terreiro ou quintal)?

O que o(a) Sr(a) planta ao redor da sua casa?

20 - De que material era feita a casa onde a sua família morava antes da

criação da RBRT? Como eram feitas as casas onde o(a) Sr(a) morava

nessa época? As casas possuíam sanitário? Dentro de casa ou no

quintal (terreiro)?

21 – Qual a renda da família?

22 - Qual a origem da renda da família? Como o(a) senhor(a) ganha o

dinheiro para o seu sustento e de sua família?

23 - Qual era origem da renda da família antes da criação da RBRT?

Como o(a) senhor(a) ganhava o dinheiro para o seu sustento e de sua

família?

24 - Quais eletrodomésticos o(a) senhor(a) tem na sua casa? Televisão,

antena parabólica, máquina de lavar, celular (funciona onde o(a)

senhor(a) mora)?

25 – Antes da criação da RBRT quais eletrodomésticos o(a) senhor(a)

tinha na sua casa? Televisão, antena parabólica, máquina de lavar?

13 – O(a) senhor(a) tem energia elétrica na sua casa? É gerador de

energia? É próprio ou da comunidade? A comunidade comprou, foi

doado pela mineração ou pela prefeitura?

13 – Antes da criação da RBRT tinha energia elétrica? O que era

utilizado para iluminar a noite?

26 – Quais os meios de transporte o(a) senhor(a) utiliza como meio de

locomoção (para ir de um lugar ao outro)? Aqui na comunidade? Para

pescar, visitar os amigos? E para ir para a cidade?

27 – Quais os meios de transporte o(a) senhor(a) utilizava como meio

de locomoção (para ir de um lugar ao outro)? Aqui na comunidade?

Para pescar, visitar os amigos? E para ir para a cidade?

28 – Há escola na comunidade? Quais os níveis de escolaridade são

oferecidos na escola? Quais os níveis de escolaridade? Quantos alunos

29 – Havia escola na comunidade? Quais os níveis de escolaridade

eram oferecidos na escola? Quais os níveis de escolaridade?

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há na escola (por série)? O que acontece com os alunos quando não há

mais estudos para eles na escola da comunidade?

30 - Quais tipos de tratamento para a saúde o(a) Sr(a) busca quando fica

doente? Na comunidade há agentes de saúde? E quanto a prevenção de

doenças, o(a) Sr(a) vai ao médico com frequência? Em Oriximiná ou

Porto Trombetas? Campanhas de vacinação ou equipes médicas

atendem na comunidade?

31 - Como costumavam tratar da saúde? E quanto a prevenção de

doenças? Costumavam utilizar plantas e ervas medicinais

(fitoterápicos)?

32 - Há pessoas consideradas curadoras (curandeiros) na comunidade?

O(a) Sr(a) recorre aos serviços oferecidos por essas pessoas?

33 - Havia pessoas consideradas curadoras (curandeiros) na

comunidade? O(a) Sr(a) recorria aos serviços oferecidos por essas

pessoas?

34 - Qual a sua religião? Sobre as festas, círios? Danças, cultura,

ladainhas.

35 - Antes da criação da RBRT como eram as festas aqui no Erepecu?

36 - Como é feito o tratamento da água? 37 - Como era feito o tratamento da água?

38 - O que o(a) Sr(a) faz com o lixo que produz em casa? 39 - O que o(a) Sr(a) fazia com o lixo que era produzido em casa?

40 – As pessoas que saem da comunidade para ir morar em outro local e

depois se arrependem podem voltar a morar a viver na comunidade?

Como é esse processo?

41 – As pessoas que saiam da comunidade para ir morar em outro local

e depois se arrependiam podiam voltar a morar a viver na comunidade?

Como era esse processo?

42 - E para pessoas que nunca moraram no Último Quilombo, quais são

as regras para que novas pessoas queiram morar na comunidade Último

Quilombo? Isso é permitido? A comunidade possui alguma regra para

banir (expulsar) alguma pessoa da comunidade? Essas regras estão

escritas ou são regras de convivência da comunidade? Como essas

regras são repassadas para as pessoas (reuniões)? Como as pessoas

tomam conhecimento dessas regras?

43 – A comunidade possuía alguma regra para banir (expulsar) alguma

pessoa da comunidade? Essas regras estavam escritas ou eram regras de

convivência da comunidade? Como essas regras eram repassadas para

as pessoas (reuniões)? Como as pessoas tomavam conhecimento dessas

regras?

44 - Quais as principais atividades produtivas? Qual a sua principal

atividade produtiva (Em que trabalha como faz para se sustentar)? Para

o próprio sustento ou para comercializar?

45 - Quais as suas principais atividades produtivas (Em que trabalhava)

antes da criação da RBRT? Para o próprio sustento ou para

comercializar?

46 - O que o senhor planta na roça? Quais os meses o(a) Sr.(a) faz o

roçado? Quais os meses melhores para o plantio? Quais meses se

dedicam a roça? Quais atividades são desempenhadas pelos homens e

quais as atividades são desempenhadas pela mulher? Quanto mede a

47 - O que o senhor plantava na roça? Quais os meses o(a) Sr.(a) fazia

o roçado? Quais os meses eram melhores para o plantio? Quais meses

se dedicavam a roça? Quais atividades são desempenhadas pelos

homens e quais as atividades são desempenhadas pela mulher? Quanto

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roça? Vocês podem aumentar esse tamanho do roçado. Qual a regra

para aumentar ou fazer novos roçados na RBRT?

mede a roça? Vocês podem aumentar esse tamanho do roçado. Qual a

regra para aumentar ou fazer novos roçados na RBRT ?

48 - Na comunidade do(a) Sr.(a) ocorre o puxirum? O(a) Sr.(a) participa

de puxirum? Como é o puxirum? Só pode participar do puxirum pessoas

da comunidade onde o senhor mora ou de outra comunidade?

49 – Antes da criação da RBRT havia puxirum com frequência na

comunidade do(a) Sr.(a)?

50 - O(a) Sr.(a) possui casa de farinha? Própria ou comunitária? Como é

o uso?

51 - Antes da criação da RBRT o(a) Sr.(a) possuía casa de farinha?

Própria ou comunitária? Como é o uso?

52 - O(a) senhor(a) pesca, caça? Que tipos de peixe ou caça o(a)

senhor(a) costuma se alimentar?

53 – O(a) senhor(a) pescava, caçava? Que tipos de peixe ou caça o(a)

senhor(a) costumava se alimentar?

54 – Quais os instrumentos o(a) senhor(a) utiliza para caçar ou pescar?

O senhor faz esses instrumentos ou senhor compra?

55 – Quais os instrumentos o(a) senhor(a) utilizava para caçar ou

pescar? O senhor fazia esses instrumentos ou senhor comprava?

56 – Quais os principais tipos de alimentos que o(a) senhor(a) costuma

se alimentar que é produzido na própria comunidade?

57 – Quais os principais tipos de alimentos que o(a) senhor(a)

costumava se alimentar que era produzido na própria comunidade?

58 - Quais os principais tipos de alimentos que o(a) senhor(a) costuma

se alimentar que são comprados na cidade?

59 - Quais os principais tipos de alimentos que o(a) senhor(a)

costumava se alimentar que eram comprados na cidade?

60 - O(a) senhor(a) coleta outros produtos da floresta? Quais? Para

comercializar ou para o próprio consumo?

61 - Antes da criação da RBRT, o(a) senhor(a) coletava outros

produtos da floresta? Quais? Para comercializar ou para o próprio

consumo?

62 - O(a) Sr.(a) participou do processo de construção do termo de compromisso firmado entre o ICMBIO e as comunidades tradicionais para a

coleta da castanha na REBIO do ? Conte como foi o processo de construção do termo de compromisso?

63 - Quais as dificuldades enfrentadas pelos coletores de castanha durante o processo de construção do termo de compromisso?

64 - Quais as principais regras para a coleta da castanha na RBRT? 65 - O que o(a) Sr.(a) acha dessas regras para a coleta da castanha na

Rebio?

66 - Atualmente, como o(a) Sr.(a) percebe a relação das comunidades tradicionais com o ICMBIO?

67 - O(a) Sr.(a) avalia que o TC atende às necessidades atuais dos

quilombolas residentes no interior e entorno da RBRT?

68 - O que o(a) Sr.(a) acha que deveria constar no monitoramento,

prioritariamente?

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APÊNDICE C – Autorizações da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos

do Município de Oriximiná (Arqmo); da Associação Mãe Domingas; da Associação das

Comunidades Remanescentes de Quilombo do Alto Trombetas 2 (ACRQAT); Autorização de

coordenações de comunidades.

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CARTA DE ANUÊNCIA PARA AUTORIZAÇÃO DE PESQUISA

Ilmo Sr. ___________________________________________________________

Solicitamos autorização institucional para realização da pesquisa intitulada “Análise das

transformações no modo de vida dos quilombolas do vale do Trombetas: o caso dos coletores de

castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, Oriximiná-PA” a ser realizada nas

comunidades localizadas nos Territórios Quilombolas do interior e entorno da Reserva Biológica do

Rio Trombetas, pelo aluno de pós-graduação Carlos Adriano Siqueira Picanço, sob orientação do Prof.

Dr. Reinaldo Corrêa Costa, com o(s) seguinte(s) objetivo(s): analisar o modo de vida dos quilombolas

que firmaram termos de compromisso com o Instituto Chico Mendes de Conservação da

Biodiversidade (ICMBio) para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas,

no município de Oriximiná, estado do Pará, a partir de seu cotidiano e o uso do território e propor

subsídios para o aperfeiçoamento do termo de compromisso, necessitando portanto, ter acesso aos

dados a serem colhidos nos arquivos da instituição ora solicitada.

Além da pesquisa documental, os procedimentos de coleta de dados serão realizados da

seguinte forma: por meio de observação direta participante e entrevista semiestruturada a ser aplicada

aos castanheiros que firmaram o termo de compromisso com o ICMBio para a coleta da castanha-do-

brasil na Rebio do Rio Trombetas. As observações serão realizadas no período da coleta da castanha-

do-brasil nos castanhais da RBRT e nos períodos em que os coletores estão nas comunidades. As

entrevistas serão feitas levando-se em consideração pessoas interessadas em participar da pesquisa,

objetivando coletar dados e discursos que permitam o diagnóstico referente ao modo de vida dos

quilombolas, cujas anotações serão feitas em diário de campo e, quando autorizado, gravado em áudio.

Ressaltamos que os dados coletados serão mantidos em absoluto sigilo de acordo com a

Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS/MS), que trata da pesquisa envolvendo

Seres Humanos. Salientamos ainda que tais dados serão utilizados somente para a realização deste

estudo OU serão mantidos permanentemente em um banco de dados de pesquisa, com acesso restrito,

para utilização em pesquisas futuras.

Na certeza de contarmos com a colaboração e empenho desta Associação, agradecemos

antecipadamente a atenção, ficando à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais que se

fizerem necessários.

Oriximiná, _______ de ____________________ de _________.

__________________________________________

Pesquisador responsável pelo projeto

( ) Concordamos com a solicitação ( ) Não concordamos com a solicitação

__________________________________________

Assinatura

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251

ANEXOS

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252

Anexo A – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa

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INSTITUTO NACIONAL DEPESQUISAS DA AMAZÔNIA -

INPA/MCT

PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP

Pesquisador:

Título da Pesquisa:

Instituição Proponente:

Versão:

CAAE:

MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS DOVALE DO TROMBETAS: UM ESTUDO DE CASO COM OS ¿CASTANHEIROS¿ NARESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ/PA

CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANCO

Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA/MCT/PR

1

88961318.2.0000.0006

Área Temática:

DADOS DO PROJETO DE PESQUISA

Número do Parecer: 2.649.978

DADOS DO PARECER

A investigação na pesquisa proposta será realizada tendo como referência um grupo social dentre os

diversos que habitam na região Amazônica, os quilombolas coletores de castanha-do-brasil (Bertholletia

excelsa) que firmaram os termos de compromisso com o ICMBio para a coleta e comercialização desse

produto na Reserva Biológica do Rio Trombetas, no município de Oriximiná, estado do Pará. O modo de

vida desses povos, construído e repassado pelas gerações, está relacionado à atividades produtivas

baseadas no extrativismo de produtos florestais, na caça, na pesca e na agricultura para o sustento familiar

e comercialização. Dentre essas atividades, destaca-se a coleta da castanha-do-brasil, visto que estes

povos têm o seu modo de vida estruturado na coleta desse produto, além dessa atividade ter influenciado

na organização do território que esses povos habitam, criando forte vínculo de territorialidade. A partir da

década de 1970, é possível identificar impactos no modo de vida dos quilombola, principalmente, devido a

criação da Reserva Biológica do Rio Trombetas, que impediu e ou criou regras para o acesso aos principais

castanhais.

O objetivo da pesquisa é analisar os impactos no modo de vida dos quilombolas que firmaram termos de

compromisso com o ICMBio

para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, no município de Oriximiná –

Pará, a partir de seu cotidiano e o uso do território e propor subsídios para o

Apresentação do Projeto:

Financiamento PróprioPatrocinador Principal:

69.080-971

(92)3643-3287 E-mail: [email protected]

Endereço:Bairro: CEP:

Telefone:

Av. André Araújo, nº 2936 - sala CEP - Prédio DiretoriaAleixo

UF: Município:AM MANAUSFax: (92)3643-3287

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INPA/MCT

Continuação do Parecer: 2.649.978

aperfeiçoamento do termo de compromisso. A investigação será realizada por meio da pesquisa qualitativa.

Os dados serão coletados em campo pela técnica observação participante, a coleta de documentos e por

formulários com perguntas semiestruturadas

Objetivo Primário:

Analisar os impactos no modo de vida dos quilombolas que firmaram termos de compromisso com o ICMBio

para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica do Rio Trombetas, no município de Oriximiná –

Pará, a partir de seu cotidiano e o uso do território e propor subsídios para o aperfeiçoamento do termo de

compromisso.

Objetivo Secundário:

Analisar a importância do circuito espacial produtivo dos produtos da biodiversidade como elemento

importante do modo de vida e da territoriricosalidade dos quilombolas da bacia do rio Trombetas.

Analisar as mudanças e permanências no modo de vida dos quilombolas que

firmaram termos de compromisso com o ICMBIO para a coleta da castanha-do-brasil na Reserva Biológica

do Rio Trombetas.Analisar os impactos dos termos de compromisso no modo de vida dos quilombolas

residentes no interior e entorno da Rebio do Rio Trombetas, na gestão da Rebio, e na manutenção das

estruturas sociais e naturais no interior e entorno da Rebio do Rio Trombetas.

Objetivo da Pesquisa:

Foram devidamente avaliados

Avaliação dos Riscos e Benefícios:

O trabalho tem relevância científica e social. E Está bem fundamentado teórico metodologicamente.

Comentários e Considerações sobre a Pesquisa:

Os termos e documentação foram devidamente apresentados: Folha de Rosto, Projeto de pesquisa,

declarações, TCLE, Roteiro de entrevista, no entanto alguns termos necessitam ser revisados e/ou incluídos

( por exemplo anuência das comunidades, anuência da REBIO se for acompanhar os quilombolas nas

atividaddes de coleta de castanha); Sugiro também que ajuste o cronograma tendo e vista que o tempo

entre a resposta do CEP/INPA e o início das atividades de coleta de

Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória:

69.080-971

(92)3643-3287 E-mail: [email protected]

Endereço:Bairro: CEP:

Telefone:

Av. André Araújo, nº 2936 - sala CEP - Prédio DiretoriaAleixo

UF: Município:AM MANAUSFax: (92)3643-3287

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Continuação do Parecer: 2.649.978

dados está muito apertado (lembre-se que as entrevistas só devem ser iniciadas após aprovação do CEP);

Recomendo também que na declaração de compromisso do pesquisador, o termo patente industriais seja

retirado, tendo em vista que não se aplica ao projeto de pesquisa.

O presente projeto,indubitavelmente, tem relevância Científica e social. A documentação necessária foi

devidamente apresentada. No entanto, é importante observar algumas questões:

- A anuência das comunidades, anuência da REBIO (se for acompanhar os quilombolas nas atividaddes de

coleta de castanha) Não foram incluídas;

- Ajustar o cronograma tendo e vista que o tempo entre a resposta do CEP/INPA e o início das atividades de

coleta de dados está muito apertado (lembre-se que as entrevistas só devem ser iniciadas após aprovação

do CEP);

- Recomendo também que na declaração de compromisso do pesquisador, o termo patente industriais seja

retirado, tendo em vista que não se aplica ao projeto de pesquisa.

Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações:

Acatamos na íntegra o parecer do relator. Incentivamos a interação com a plataforma Brasil para dirimir

dúvidas. A aprovação terá validade durante a vigência do projeto, conforme cronograma apresentado. Ao

final da execução do projeto, o pesquisador DEVERÁ encaminhar, via Plataforma Brasil, o Relatório final da

pesquisa.

Considerações Finais a critério do CEP:

Este parecer foi elaborado baseado nos documentos abaixo relacionados:

Tipo Documento Arquivo Postagem Autor Situação

Informações Básicasdo Projeto

PB_INFORMAÇÕES_BÁSICAS_DO_PROJETO_1108268.pdf

16/04/201814:39:21

Aceito

Outros Declaracao_de_sigilo_patentes.pdf 16/04/201814:38:09

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Folha de Rosto Folha_de_rosto.pdf 16/04/201814:26:22

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Projeto Detalhado /BrochuraInvestigador

Projeto_Detalhado_Brochura_do_Investigador.pdf

11/04/201816:25:02

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

TCLE / Termos deAssentimento /Justificativa deAusência

_TCLE_.pdf 11/04/201816:08:14

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Declaração deInstituição e

Declaracao_de_Infraestrutura.pdf 11/04/201816:05:44

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

69.080-971

(92)3643-3287 E-mail: [email protected]

Endereço:Bairro: CEP:

Telefone:

Av. André Araújo, nº 2936 - sala CEP - Prédio DiretoriaAleixo

UF: Município:AM MANAUSFax: (92)3643-3287

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INPA/MCT

Continuação do Parecer: 2.649.978

MANAUS, 11 de Maio de 2018

Cristóvão Costa(Coordenador)

Assinado por:

Infraestrutura Declaracao_de_Infraestrutura.pdf 11/04/201816:05:44

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Outros Garantia_de_Retorno_aos_participantes.pdf

11/04/201815:47:57

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Declaração dePesquisadores

Declaracao_de_Compromisso_do_Pesquisador.pdf

11/04/201815:45:13

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Cronograma cronograma_detalhado.pdf 11/04/201815:40:31

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Orçamento orcamento_detalhado.pdf 11/04/201815:39:39

CARLOS ADRIANOSIQUEIRA PICANCO

Aceito

Situação do Parecer:Aprovado

Necessita Apreciação da CONEP:Não

69.080-971

(92)3643-3287 E-mail: [email protected]

Endereço:Bairro: CEP:

Telefone:

Av. André Araújo, nº 2936 - sala CEP - Prédio DiretoriaAleixo

UF: Município:AM MANAUSFax: (92)3643-3287

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Anexo B – Autorização do ICMBio para a realização da pesquisa de campo na Reserva

Biológica do Rio Trombetas, Pará

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Ministério do Meio Ambiente - MMAInstituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBioSistema de Autorização e Informação em Biodiversidade - SISBIO

Autorização para atividades com finalidade científicaNúmero: 62814-1 Data da Emissão: 25/06/2018 11:55 Data para Revalidação*: 25/07/2019

* De acordo com o art. 28 da IN 03/2014, esta autorização tem prazo de validade equivalente ao previsto no cronograma de atividades do projeto,mas deverá ser revalidada anualmente mediante a apresentação do relatório de atividades a ser enviado por meio do Sisbio no prazo de até 30 diasa contar da data do aniversário de sua emissão.

SISBIODados do titular

Nome: CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO CPF: 830.362.102-53

Título do Projeto: MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS DO VALE DO TROMBETAS: UM ESTUDO DE CASO

COM OS CASTANHEIROS NA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ/PA

Nome da Instituição : Instituto Federal de Rondônia - Câmpus Colorado do Oeste CNPJ: 10.817.343/0001-05

Cronograma de atividades# Descrição da atividade Início (mês/ano) Fim (mês/ano)

1 Aplicação de questionários 05/2018 06/20182 reuniões com as associações de comunidades quilombolas para apresentação do projeto. 06/2018 06/20193 Sistematização de resultados 07/2018 09/20194 Análise dos Resultados 08/2018 10/20185 Elaboração da dissertação 01/2019 03/20196 Apresentação dos resultados aos participantes da pesquisa 03/2019 03/2019

Observações e ressalvas

1As atividades de campo exercidas por pessoa natural ou jurídica estrangeira, em todo o território nacional, que impliquem o deslocamento de recursos humanos emateriais, tendo por objeto coletar dados, materiais, espécimes biológicos e minerais, peças integrantes da cultura nativa e cultura popular, presente e passada,obtidos por meio de recursos e técnicas que se destinem ao estudo, à difusão ou à pesquisa, estão sujeitas a autorização do Ministério de Ciência e Tecnologia.

2

Esta autorização NÃO exime o pesquisador titular e os membros de sua equipe da necessidade de obter as anuências previstas em outros instrumentos legais, bemcomo do consentimento do responsável pela área, pública ou privada, onde será realizada a atividade, inclusive do órgão gestor de terra indígena (FUNAI), daunidade de conservação estadual, distrital ou municipal, ou do proprietário, arrendatário, posseiro ou morador de área dentro dos limites de unidade de conservaçãofederal cujo processo de regularização fundiária encontra-se em curso.

3Este documento somente poderá ser utilizado para os fins previstos na Instrução Normativa ICMBio n° 03/2014 ou na Instrução Normativa ICMBio n° 10/2010, no queespecifica esta Autorização, não podendo ser utilizado para fins comerciais, industriais ou esportivos. O material biológico coletado deverá ser utilizado para atividadescientíficas ou didáticas no âmbito do ensino superior.

4O titular de licença ou autorização e os membros da sua equipe deverão optar por métodos de coleta e instrumentos de captura direcionados, sempre que possível,ao grupo taxonômico de interesse, evitando a morte ou dano significativo a outros grupos; e empregar esforço de coleta ou captura que não comprometa a viabilidadede populações do grupo taxonômico de interesse em condição in situ.

5O titular de autorização ou de licença permanente, assim como os membros de sua equipe, quando da violação da legislação vigente, ou quando da inadequação,omissão ou falsa descrição de informações relevantes que subsidiaram a expedição do ato, poderá, mediante decisão motivada, ter a autorização ou licençasuspensa ou revogada pelo ICMBio, nos termos da legislação brasileira em vigor.

6Este documento não dispensa o cumprimento da legislação que dispõe sobre acesso a componente do patrimônio genético existente no território nacional, naplataforma continental e na zona econômica exclusiva, ou ao conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, para fins de pesquisa científica,bioprospecção e desenvolvimento tecnológico. Veja maiores informações em www.mma.gov.br/cgen.

7Em caso de pesquisa em UNIDADE DE CONSERVAÇÃO, o pesquisador titular desta autorização deverá contactar a administração da unidade a fim de CONFIRMARAS DATAS das expedições, as condições para realização das coletas e de uso da infra-estrutura da unidade.

Outras ressalvas

1

1.Os pesquisadores deverão informar com antecedência à chefia da UC sobre os locais onde serão realizadas as pesquisas de campo. 2. Estaautorização não substitui e não dispensa a necessidade de licença ambiental junto aos órgãos licenciadores. 3. Recomenda-se que opesquisador entre em contato com as associações dos moradores da área pesquisada antes de ir ao local. 4. Condicionantes da legislação,ambiental e/ou de povos e populações tradicionais, brasileira relacionada ao tema da pesquisa, embora não transcritas nesta ressalva, são parteintegrantes desta autorização. 5. Esta autorização não substitui e não dispensa a necessidade de licença ambiental junto aos órgãoslicenciadores. 6. Esta autorização não substitui demais autorizações pertinentes de responsabilidade de outros órgãos.

Equipe# Nome Função CPF Doc. Identidade Nacionalidade1 Reinaldo Corrêa Costa Orientador 458.722.282-87 210589-6 seseg-PA Brasileira

SISBIOEste documento (Autorização para atividades com finalidade científica) foi expedido com base na Instrução Normativa nº 03/2014. Através do código

de autenticação abaixo, qualquer cidadão poderá verificar a autenticidade ou regularidade deste documento, por meio da página do Sisbio/ICMBio na

Internet (www.icmbio.gov.br/sisbio).

Código de autenticação: 58211128Página 1/4

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Ministério do Meio Ambiente - MMAInstituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBioSistema de Autorização e Informação em Biodiversidade - SISBIO

Autorização para atividades com finalidade científicaNúmero: 62814-1 Data da Emissão: 25/06/2018 11:55 Data para Revalidação*: 25/07/2019

* De acordo com o art. 28 da IN 03/2014, esta autorização tem prazo de validade equivalente ao previsto no cronograma de atividades do projeto,mas deverá ser revalidada anualmente mediante a apresentação do relatório de atividades a ser enviado por meio do Sisbio no prazo de até 30 diasa contar da data do aniversário de sua emissão.

SISBIODados do titular

Nome: CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO CPF: 830.362.102-53

Título do Projeto: MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS DO VALE DO TROMBETAS: UM ESTUDO DE CASO

COM OS CASTANHEIROS NA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ/PA

Nome da Instituição : Instituto Federal de Rondônia - Câmpus Colorado do Oeste CNPJ: 10.817.343/0001-05

Locais onde as atividades de campo serão executadas# Município UF Descrição do local Tipo

1 PA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS UC Federal

SISBIOEste documento (Autorização para atividades com finalidade científica) foi expedido com base na Instrução Normativa nº 03/2014. Através do código

de autenticação abaixo, qualquer cidadão poderá verificar a autenticidade ou regularidade deste documento, por meio da página do Sisbio/ICMBio na

Internet (www.icmbio.gov.br/sisbio).

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Autorização para atividades com finalidade científicaNúmero: 62814-1 Data da Emissão: 25/06/2018 11:55 Data para Revalidação*: 25/07/2019

* De acordo com o art. 28 da IN 03/2014, esta autorização tem prazo de validade equivalente ao previsto no cronograma de atividades do projeto,mas deverá ser revalidada anualmente mediante a apresentação do relatório de atividades a ser enviado por meio do Sisbio no prazo de até 30 diasa contar da data do aniversário de sua emissão.

SISBIODados do titular

Nome: CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO CPF: 830.362.102-53

Título do Projeto: MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS DO VALE DO TROMBETAS: UM ESTUDO DE CASO

COM OS CASTANHEIROS NA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ/PA

Nome da Instituição : Instituto Federal de Rondônia - Câmpus Colorado do Oeste CNPJ: 10.817.343/0001-05

Registro de coleta imprevista de material biológicoDe acordo com a Instrução Normativa nº 03/2014, a coleta imprevista de material biológico ou de substrato nãocontemplado na autorização ou na licença permanente deverá ser anotada na mesma, em campo específico, porocasião da coleta, devendo esta coleta imprevista ser comunicada por meio do relatório de atividades. O transporte domaterial biológico ou do substrato deverá ser acompanhado da autorização ou da licença permanente com a devidaanotação. O material biológico coletado de forma imprevista, deverá ser destinado à instituição científica e, depositado,preferencialmente, em coleção biológica científica registrada no Cadastro Nacional de Coleções Biológicas (CCBIO).

Táxon* Qtde. Tipo de amostra Qtde. Data

SISBIOEste documento (Autorização para atividades com finalidade científica) foi expedido com base na Instrução Normativa nº 03/2014. Através do código

de autenticação abaixo, qualquer cidadão poderá verificar a autenticidade ou regularidade deste documento, por meio da página do Sisbio/ICMBio na

Internet (www.icmbio.gov.br/sisbio).

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Autorização para atividades com finalidade científicaNúmero: 62814-1 Data da Emissão: 25/06/2018 11:55 Data para Revalidação*: 25/07/2019

* De acordo com o art. 28 da IN 03/2014, esta autorização tem prazo de validade equivalente ao previsto no cronograma de atividades do projeto,mas deverá ser revalidada anualmente mediante a apresentação do relatório de atividades a ser enviado por meio do Sisbio no prazo de até 30 diasa contar da data do aniversário de sua emissão.

SISBIODados do titular

Nome: CARLOS ADRIANO SIQUEIRA PICANÇO CPF: 830.362.102-53

Título do Projeto: MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO MODO DE VIDA DOS QUILOMBOLAS DO VALE DO TROMBETAS: UM ESTUDO DE CASO

COM OS CASTANHEIROS NA RESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ/PA

Nome da Instituição : Instituto Federal de Rondônia - Câmpus Colorado do Oeste CNPJ: 10.817.343/0001-05

* Identificar o espécime no nível taxonômico possível.

SISBIOEste documento (Autorização para atividades com finalidade científica) foi expedido com base na Instrução Normativa nº 03/2014. Através do código

de autenticação abaixo, qualquer cidadão poderá verificar a autenticidade ou regularidade deste documento, por meio da página do Sisbio/ICMBio na

Internet (www.icmbio.gov.br/sisbio).

Código de autenticação: 58211128Página 4/4

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