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Page 1: Instituto de Pesquisas Científicas · FORMAÇÃO E EVOLUÇÃO ESTELAR Quartuccio, J. T. – Instituto de Pesquisas Científicas Agosto de 2017 Resumo Estrelas são, basicamente,

Instituto de Pesquisas Científicas

FORMAÇÃO E EVOLUÇÃO ESTELAR Quartuccio, J. T. – Instituto de Pesquisas Científicas

Agosto de 2017

Resumo Estrelas são, basicamente, enormes corpos quase esféricos de plasma incandescente. O calor liberado provém de processos nucleares que convertem, principalmente, núcleos de hidrogênio em núcleos de hélio. Esses processos nucleares são descritos pela cadeia próton-próton e pelo ciclo CNO. Ao atingirem o estado de queima de hidrogênio, as estrelas adentram à classe da sequência principal, onde permanecem o maior tempo de suas vidas. O caminho seguido pós sequência principal será determinado pela massa e luminosidade da estrela. Em termos mais gerais, as estrelas podem vir a se tornarem anãs-brancas, estrelas de nêutrons ou buracos ne-gros.

Abstract

Stars are, basically, huge almost spherical bodies of incandescent plasma. The released heat co-mes from nuclear processes that mainly convert hydrogen nuclei into helium nuclei. These nu-clear processes are described by the proton-proton chain and the CNO cycle. As they reach the hydrogen-burning state, the stars get in to the main sequence class, where they remain the lon-gest of their lives. The path followed by the main sequence will be determined by the mass and luminosity of the star. More generally, stars may become white dwarfs, neutron stars or black holes.

Formando uma estrela

O processo de formação estelar se inicia em nuvens moleculares densas e frias, proveni-entes de supernovas ou de galáxias starburst. Devido a interação gravitacional a nuvem mole-cular começa a colapsar seguindo a instabilidade de Jeans, de modo a criar porções aglomeradas de gás, os glóbulos de Bok. Com o colapso desses glóbulos, a energia potencial gravitacional é convertida em calor, de modo a aumentar a temperatura da nuvem. Essa nuvem aquecida da origem a uma protoestrela em seu núcleo quando o equilíbrio hidrostático é atingido. Por equi-líbrio hidrostático, devemos entender o processo em que a radiação proveniente do aumento da temperatura provoca uma expansão na nuvem molecular ao mesmo tempo em que a força gravitacional busca colapsá-la. Quando a força de expansão se iguala a força gravitacional, a protoestrela atinge o equilíbrio hidrostático. Na fase de protoestrela um disco protoplanetário pode existir em torno de seu centro, de modo que poderá vir a formar planetas. Com o aumento da temperatura no núcleo da nuvem os gases em seu interior tornam-se ionizados.

O processo seguinte coloca a jovem estrela na fase de sequência principal, de modo que em seu núcleo inicia-se os processos de fusão nuclear, que irão, basicamente, converter núcleos de hidrogênio em núcleos de hélio. O tempo para que uma estrela inicie o processo de fusão do hidrogênio depende da sua massa. Para o Sol, por exemplo, o colapso da nuvem até a entrada na sequência principal durou 30 milhões de anos, enquanto que para estrelas mais massivas o tempo foi bem menor (algumas centenas de milhares de anos).

Estrelas prestes a entrar na sequência principal e que possuem massas menores que duas massas solares (2𝑀⊙) são chamadas de T Tauri, enquanto que estrelas mais massivas são deno-minadas como Herbig Ae/Be. O primeiro tipo é o que apresenta o disco protoplanetário circun-dante, enquanto que o segundo tipo é caracterizado por emissões de jatos de gás ao longo de seus eixos de rotação. Essa emissão de jatos reduz o momento angular da estrela, o que acarreta em certa nebulosidade em torno do astro. Nesse caso, a estrela recebe o nome de objeto de Herbig-Haro. A radiação proveniente das estrelas em formação, e também de estrelas próximas, ajudará na expulsão dos gases em torno dela de modo a “limpar” o espaço preenchido pelos protoplanetas.

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Sequência principal

Na maior parte de suas vidas as estrelas convertem núcleos de hidrogênio em núcleos de hélio através de reações de fusão nuclear. Estrelas que geram seu combustível devido, princi-palmente, a esse processo fazem parte da sequência principal, sendo denominadas estrelas anãs. Durante a sequência principal a taxa de hélio no núcleo da estrela começa a crescer, de modo a aumentar sua temperatura e luminosidade. Desde que foi formado nosso Sol aumentou em 30% sua luminosidade.

Os processos de fusão nuclear, que podem ser vistos como o combustível das estrelas, geram ventos estelares compostos de partículas, de modo a expulsar parte de seu gás para o espaço. Isso significa que as estrelas, no decorrer de suas vidas, perdem massa de modo contí-nuo. Muitas vezes, essa perda de massa é desprezível para estrelas de tamanho próximo a do Sol. Para estrelas com mais de 50𝑀⊙, a perda de massa durante a sequência principal pode corresponder a metade de sua massa total inicial.

O tempo de permanência na sequência principal dependerá da massa, luminosidade e do quanto de combustível a estrela possui. Nosso Sol permanecerá na sequência principal por cerca de 10 bilhões1 de anos. Quanto mais massiva a estrela, mais rápido será o consumo de seu com-bustível. Outro fator importante diz respeito aos elementos mais pesados presentes no interior desses astros. A concentração desses elementos, ou metais2, nos fornece a metalicidade3 da estrela.

Pós-sequência principal

Quando estrelas com no mínimo 0,5𝑀⊙ queimam todo seu combustível de hidrogênio no

núcleo elas entram em uma fase de expansão e se tornam uma gigante vermelha. Uma gigante vermelha pode chegar a ser mais de 100 vezes maior que a estrela original. No caso de uma gigante vermelha com uma massa de até 2,3𝑀⊙, um resquício de hidrogênio é queimado em

uma casca em torno do núcleo. Esse núcleo, que se torna muito compacto, consegue iniciar os processos de fusão do hélio, fazendo com que a temperatura superficial da estrela aumente gradativamente. A medida que boa parte do hélio é queimado o núcleo se torna composto por carbono e oxigênio. O hélio que sobra passa a ser queimado em uma camada externa ao núcleo. A estrutura interna da estrela começa a se parecer com a estrutura interna de uma cebola, onde cada camada queima um elemento diferente.

Quando um gás é comprimido ele se torna mais denso e mais quente. É isso o que ocorre no interior de uma estrela. Para um gás ideal, temos uma relação direta entre a pressão e a temperatura4. Em diversas circunstâncias os gases no interior das estrelas se comportam de forma ideal, de modo que se ocorre uma expansão do gás a temperatura diminui. Esse processo inverso de expansão e temperatura garante o equilíbrio termodinâmico na estrela. Quando a taxa de reação termonuclear aumenta a energia é liberada de modo a fazer com que a estrela se expanda, fazendo com que a temperatura no núcleo seja diminuída. O núcleo, por sua vez, é comprimido devido à pressão das camadas mais externas e com isso volta a se aquecer. Para estrelas de massa entre 0,4𝑀⊙ e 2,3𝑀⊙ o núcleo se comporta de maneira diferente da de um gás ideal. Para que a fusão do hélio se inicie, o núcleo deve ser comprimido fortemente de modo que todos os átomos nessa região estarão ionizados e a temperatura será muito alta. O núcleo

1 Vale notar que o Sol possui uma idade de quase 5 bilhões de anos, de modo que ele permanecerá, então, por mais 5 bilhões de

anos na sequência principal. 2 Em astronomia chamamos de metais qualquer elemento mais pesado que o hélio. 3 Estrelas com baixo teor metálico são denominadas estrelas de população II, enquanto as estrelas mais ricas em metais são de

população I. 4 𝑃𝑉 = 𝑛𝑅𝑇

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é composto, basicamente, de núcleos atômicos e elétrons livres. Os elétrons, por sua vez, esta-rão fortemente compactados de modo que o limite de compressão será alcançado5. Como eles não podem mais ser “espremidos” o núcleo não pode mais ser contraído. Dizemos que o núcleo está degenerado. A pressão de degenerescência, diferente do gás ideal, não depende da tem-peratura. Quando a temperatura no núcleo de uma gigante vermelha de baixa massa alcança o valor necessário para iniciar o processo triplo-𝛼, mais energia começa a ser liberada. O hélio é aquecido, de modo a acelerar o processo. Como não existe uma relação entre a pressão e a temperatura a estrela não está mais segura com respeito ao equilíbrio termodinâmico. O núcleo da estrela não pode mais expandir e nem resfriar, de modo que o aumento da temperatura promove a queima do hélio a uma taxa cada vez maior, ocasionando o Flash do Hélio.

O estágio final da evolução estelar é atingido quando ferro começa a ser produzido. Os núcleos de ferro são fortemente ligados de modo que a fusão entre eles não libera energia. Elementos pesados em estrelas de grande massa podem migrar para a superfície e serem lan-çados para o espaço, projetando a atmosfera estelar para fora, através do vento estelar. Estrelas que fazem isso são comumente conhecidas como estrelas de Wolf-Rayet.

Estrelas com massas medianas, perto da massa solar, expelem suas camadas mais exter-nas e se transformam em nebulosas planetárias. O resto da estrela, que permanece na região

central, pode se tornar uma anã-branca caso sua massa seja menor que 1,4𝑀⊙6. Em estrelas

maiores, o núcleo de ferro não consegue suportar seu próprio peso e colapsa toda a estrela. Todo o material colapsante ricocheteia no núcleo endurecido em um processo chamado de bounce. A estrela, então, explode em uma supernova. Nesse processo, a estrela pode ser com-pletamente destruída sem deixar nenhum vestígio a não ser uma remanescente de supernova (uma nebulosa), ou então ela pode deixar uma estrela residual muito compacta: uma estrela de nêutrons. Se a estrela for muito massiva, então o objeto final será um buraco negro.

A cadeia próton-próton e o ciclo CNO

No período em que permanecem na sequência principal, as estrelas estão produzindo núcleos de hélio a partir de núcleos de hidrogênio. Como vimos anteriormente, esse é o com-bustível principal de todas as estrelas. Vejamos, de um modo um pouco mais detalhado, como ocorre os processos de fusão. Para estrelas de massas próximas do Sol, as reações de fusão são dominadas pela cadeia próton-próton. Essa reação inicia-se com dois núcleos de hidrogênio, dois prótons, interagindo entre si. Através de um decaimento beta mais, um dos prótons é con-vertido em um nêutron, com a liberação de um pósitron mais um neutrino, de modo que o pro-duto seja um núcleo de deutério7:

𝑝 + 𝑝 → 𝑑 + 𝑒+ + 𝜈𝑒 O deutério resultante irá reagir com um terceiro próton, de modo a formar o hélio-3 mais

energia: 𝑑 + 𝑝 → 3He + 𝛾

A partir desse momento, as reações são divididas em dois ramos principais. O ramo I, que ocorre com mais frequência (cerca de 85%), forma o hélio-4 e mais dois prótons. A energia efe-tiva produzida nesse processo é em torno de 26 MeV. A reação é descrita como:

3He + 3He → 4He + 2𝑝 No segundo ramo ocorre a formação do berílio, com a reação de um núcleo de hélio-3

mais um núcleo de hélio-4: 3He + 4He → 7Be + 𝛾

5 Fornecido pelo princípio da exclusão de Pauli. 6 O critério para que uma estrela se torne uma anã-branca é chamado de limite de Chandrasekhar, que diz que apenas estrelas de

massas menores que 1,4𝑀⊙ se tronarão anã-brancas. 7 O deutério, também conhecido como hidrogênio pesado ou hidrogênio-2, é formado por um próton e um nêutron.

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Desse segundo ramo ainda surgem mais dois ramos, sendo que um formará o lítio e o outro o boro. Tanto o lítio quanto o boro não são, de fato, os produtos finais, mas formarão núcleos de hélio-4. Ambos processos são menos frequentes que o ramo I.

Em estrelas mais massivas, o processo dominante para a formação de hélio é descrito pelo ciclo CNO (carbono-nitrogênio-oxigênio). Esse processo se inicia com um núcleo de carbono-12 capturando um próton e formando um núcleo de nitrogênio-3:

12C + 𝑝 → 13N + 𝛾 O núcleo de nitrogênio sofrerá um decaimento beta mais e se transmutará em um núcleo

de carbono-13, liberando um pósitron e um neutrino: 13N → 13C + 𝑒+ + 𝜈𝑒

Esse novo núcleo de carbono irá capturar um próton e se tornará um núcleo de nitrogê-nio-14:

13C + 𝑝 → 14N +𝛾 O nitrogênio, via captura de um próton, irá formar o oxigênio-15:

14N + 𝑝 → 15O + 𝛾 Via decaimento beta mais, o oxigênio transmuta em um nitrogênio-15:

15O → 15N +𝑒+ + 𝜈𝑒 Esse nitrogênio irá capturar um próton e então irá formar um núcleo de carbono-12 e um

núcleo de hélio-4. Pode ocorrer, entretanto, dessa captura não formar o carbono e o hélio, mas sim formar um núcleo de oxigênio-16. Se isso ocorrer, o oxigênio irá capturar um próton e então formará o flúor-17 que, por decaimento beta mais, formará o oxigênio-17. Esse oxigênio irá cap-turar um próton e então terá como produto final o nitrogênio-14 e um núcleo de hélio-4. Esse núcleo de nitrogênio-14 irá capturar um próton e voltará ao processo de formação do oxigênio-15 visto acima. Porém, esse processo é muito menos provável de ocorrer.

Os tipos de supernova

Podemos classificar as supernovas de acordo com o processo de formação e os resquícios elementares deixados após a explosão. Supernovas do tipo Ia são as que ocorrem em sistemas binários, onde um dos membros é uma estrela anã-branca e o outro é uma gigante vermelha. A expansão da gigante vermelha faz com que parte de sua massa ultrapasse o lóbulo de Roche8 e seja vinculado à estrela anã. Com o aumento da massa da anã-branca o limite de Chandrasekhar é ultrapassado, o que ocasiona o colapso estelar. Uma análise espectral desse tipo de supernova não identifica linhas de absorção de hidrogênio e nem de hélio, mas possui linhas de absorção de silício ionizado (Si II).

Figura 1 – a) Intensidade de absorção de uma supernova tipo Ia. O espectro característico mostra a presença de silício. b) Superno-vas do tipo Ib possuem intensas linhas de absorção de hélio ionizado. c) Se não há linhas de absorção de hidrogênio e hélio, então a

supernova é dita ser do tipo Ic. d) Linhas proeminentes de H𝛼 caracterizam supernovas do tipo II.

8 O lóbulo de Roche é uma região em torno de uma estrela em um sistema binário. Se uma das estrelas se expande, então o mate-

rial expelido será gravitacionalmente vinculado à outra estrela caso esse ultrapasse o lóbulo de Roche.

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Quando uma estrela supergigante perde o hidrogênio das camadas mais externas, o nú-cleo colapsa em uma supernova. Se o espectro não apresentar linhas de hidrogênio, mas apre-sentar intensas linhas de absorção de hélio ionizado (He I), dizemos que a supernova é do tipo Ib. Estrelas que perdem todo o hidrogênio e o hélio de suas camadas externas colapsam em supernovas do tipo Ic. Nesse caso, não há linhas de absorção nem de hidrogênio e nem de hélio. Se uma estrela colapsa sem que suas camadas externas sejam destruídas durante esse processo, dizemos se tratar de uma supernova tipo II. Para esse caso, a analise espectral apresenta linhas proeminentes de hidrogênio (como o H𝛼).

Referências

Universe – Freedman, R. A.; Gellar, R. M.; Kaufmann, W. J. Introduction to Cosmology, Third Edition – Ross, M. Astronomia e Astrofísica, Segunda Edição – Filho, K. S. O.; Saraiva, M. F. O. Foundations of Astrophysics – Ryden, B.; Peterson, B. M.

An Introduction to Modern Astrophysics, Second Edition – Carrol, B. W.; Ostlie, D. A.

How the Sun shines – Bahcall, J. N. Stellar Evolution & Death – NASA