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Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Direito Processual Civil MIGUEL ARCANJO NETO RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL: a competência do Superior Tribunal de Justiça e as decisões da Justiça Especializada violado- ras da lei federal comum Brasília – DF 2010

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Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP

Curso de Pós-Graduação Lato Sensu

Direito Processual Civil

MIGUEL ARCANJO NETO

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL:a competência do Superior Tribunal de Justiça e as decisões da Justiça Especializada violado-

ras da lei federal comum

Brasília – DF2010

MIGUEL ARCANJO NETO

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL:a competência do Superior Tribunal de Justiça e as decisões da Justiça Especializada violado-ras da lei federal comum

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do título de Especia-lista em Direito Processual Civil no Cur-so de Pós-Graduação Lato Sensu do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP.

Orientador: Professor ...

Brasília – DF2010

Dedicatória

Agradecimentos

RESUMO

O trabalho aborda tema deveras instigante em sede de reclamação constitu-

cional. Discute, a partir de leading case, a competência constitucional originária, pri-

vativa, do Superior Tribunal de Justiça para conhecer da ação constitucional especi-

al da reclamatória visando a afastar usurpação de sua competência, por ato ou

omissão, da “jurisdição especial”, em especial da Justiça do Trabalho, quando da in-

terpretação e aplicação do direito objetivo federal comum. Conclui que, diante do

modelo rígido de divisão de competências entre as duas “Cortes Extraordinárias” por

opção política do legislador constituinte de 1988, compete, sim, ao Superior Tribunal

de Justiça tutelar, pela via da reclamação, as decisões da “jurisdição especial” dis-

crepantes de sua jurisprudência, particularmente se cristalizada em verbete sumular.

Palavras-chave: competência originária; direito objetivo comum; jurisdição comum; jurisdição especial; reclamação constitucional; Superior Tribunal de Justiça; STJ.

ABSTRACT

The paper addresses issue quite complex in place of constitutional complaint.

Discusses, from leading case, the original constitutional jurisdiction, private facilities,

the Superior Court to hear the constitutional special reclamatória aiming to remove

misused its powers, by act or omission of the "special jurisdiction", in particular the

Labor courts when interpreting and applying federal common law objective. It con-

cludes that, given the rigid model of division of powers between the two "Extraordin-

ary Cortes" by the constitutional legislator policy choice of 1988, it is, yes, the Superi-

or Court guardianship, by way of complaint, the decisions of "special jurisdiction" dis-

crepant from its case, particularly if crystallized in docket entry.

Keywords: original competency; right common purpose; common jurisdic-tion; special jurisdiction; constitutional complaint; The Superior Court of Justice/ STJ.

SUMÁRIOINTRODUÇÃO....................................................................................2

1. BREVE HISTÓRIA..........................................................................6

2. O MODELO DE REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS

IDEALIZADO PELO LEGISLADOR CONSTITUINTE ................17

2.1 O objeto da reclamação................................................................24

2.2 Preservação da competência do STF e do STJ.............................24

2.3 Garantia de autoridade das decisões.............................................25

2.4 A natureza jurídica da reclamação...............................................30

3. O GUARDIÃO DA LEGISLAÇÃO FEDERAL COMUM ..........35

3.1 O leading case..............................................................................37

3.2 A visão do guardião da legislação federal comum.......................39

3.3 A solução que se impõe ...............................................................48

5. CONCLUSÃO................................................................................56

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................59

INTRODUÇÃO

O trabalho monográfico a ser desenvolvido discorrerá sobre o instituto da re-

clamação constitucional, mais especificamente a respeito do preceito inscrito no art.

105, inciso I, alínea f, da Constituição do Brasil, idealizado pelo legislador constituin-

te de 1988 para possibilitar que o novel Superior Tribunal de Justiça guardasse a le-

gislação federal comum.

Interessa, objetivamente, perquirir sobre a viabilidade da utilização da recla-

mação constitucional perante o guardião da “jurisdição comum” para afastar de-

cisões teratológicas proferidas no âmbito da “jurisdição especial”, logo discrepantes

da jurisprudência da Superior Tribunal de Justiça ou usurpadora de sua competên-

cia, por ato ou omissão, de ambas as jurisdições ao ramo de direito comum.

A razão de ser da investigação repousa na percepção do autor de que o Su-

perior Tribunal de Justiça, na condição de guardião da legislação infraconstitucional,

adota, contrariamente ao Supremo Tribunal Federal, visão estreita a respeito do ins-

tituto da reclamação enquanto ação constitucional especial indispensável à integri-

dade do direito objetivo federal comum.

Essa percepção se extrai da análise da decisão proferida na Reclamação nº

3.330-DF2, que bem sintetiza o entendimento daquela “Corte Extraordinária” e que

será objeto de análise no tópico adequado.

De fato, leitura do inteiro teor da decisão monocrática no bojo da reclamató-

ria, confirmada pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, denuncia que o

reclamante buscava a tutela jurisdicional, pela via expedita e excepcional da recla-

mação constitucional, em razão de o Juízo da 20ª Vara do Trabalho de Brasília ha-

ver determinado a penhora e levado a hasta pública um imóvel, bem de família, ab-

solutamente impenhorável a teor disposto na Lei nº 8.009, de 1990, e na Súmula nº

364 do próprio Superior Tribunal de Justiça.

2BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Reclamação nº 3.330-DF. Reclamante, Ivanildo Jorge Bertoloto; Re-clamado, Juiz Substituto da 20ª Vara do Trabalho de Brasília – DF, relator Ministro Carlos Fernando Mathias, Juiz Federal convocado do TRF 1ª Região), D.J. 02/02/2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/MON?seq=4589009&formato=PDF>. Acesso em: 30 abr. 2010.

3

Como objetivo geral, o trabalho procura situar o instituto da reclamação sob a

perspectiva de sua idealização no quadro jurídico brasileiro, em meados do século

passado, culminando com sua positivação na Constituição do Brasil de 1988 com a

missão de conferir eficácia e efetividade à prestação jurisdicional nas hipóteses de

usurpação de competência ou de descumprimento de decisões proferidas pelos dois

órgãos de cúpula do Poder Judiciário.

Como objetivo específico, a pesquisa tem a pretensão de evidenciar que o co-

mando constitucional elegendo as duas “Cortes Extraordinárias” como únicas autori-

zadas a conhecer da reclamação, instrumento processual constitucional legítimo, au-

tônomo, eficaz e efetivo para viabilizar a prestação jurisdicional plena, não pode so-

frer poda na sua aplicação com base em razões de conveniência.

Trata-se, na espécie, de competência originária delegada apenas aos dois

órgãos constitucionalmente guindados à condição de guardião da Constituição e da

legislação federal comum. Positivada no art. 102, inciso I, alínea l, e no art. 105, inci-

so I, alínea f, se destina a preservar a competência e a garantir a autoridade das de-

cisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça,

bem como assegurar o respeito e a adequada aplicação de Súmula Vinculante edita-

da pela Corte Suprema (CF, art. 103-A, § 3º).

O Supremo Tribunal Federal porque tem a incumbência, precípua, de guar-

dar a Constituição e a ordem federativa; o Superior Tribunal de Justiça porque criado

e guindado à condição de guardião da legislação federal comum.

Logo, a pesquisa objetiva responder à seguinte indagação: como guardião

da legislação federal comum cabe o Superior Tribunal de Justiça conhecer de recla-

mação constitucional para afastar decisões proferidas pela “jurisdição especial” que,

no caso concreto, violem a jurisprudência pacificada sobre a interpretação de deter-

minada lei federal comum?

O presente trabalho, portanto, discutirá tema deveras intrigante em sede de

reclamação constitucional, qual seja a sua aplicação no âmbito do Superior Tribunal

4

de Justiça quando decisão da “jurisdição especial” afrontar a lei federal comum, e.g.,

a impenhorabilidade do bem de família (Lei nº 8.009, de 1990).

A aridez do tema é patente, como é igualmente claro que a abdicação da

competência prevista no art. 105, I, f, da Carta Política, atrita com um dos fundamen-

tos da República Federativa do Brasil, a proclamar “[...] a igualdade e a justiça como

valores supremos de uma sociedade fraterna, ...” (CF: Preâmbulo e art. 3º, I), e mes-

mo com os princípios constitucionais do processo justo (CF: art. 5º, LVI) e do devido

processo legal na sua tríplice dimensão (CF: art. 5º, XXXIV, a, XXXV e LV), afinal na

ausência de violação direta a princípios constitucionais a questão jamais chegará à

apreciação do Supremo Tribunal Federal e, por conseguinte, a prestação jurisdicio-

nal restará incompleta.

O interesse do autor pela pesquisa reside na esperança de poder trazer para

o debate público aspectos que têm passado ao largo das discussões doutrinárias, ju-

risprudências e legislativas (iniciativas) que envolvem o tema da reclamação consti-

tucional.

O trabalho, portanto, está estruturado em três capítulos. No primeiro é feito

breve apanhado histórico a respeito do surgimento da reclamação no ordenamento

jurídico brasileiro na perspectiva de pontuar sua importância, a ponto de galgar sta-

tus constitucional. O segundo capítulo discorre sobre o modelo de repartição de

competências idealizado pelo legislador constituinte, com realce nos embates juris-

prudenciais, doutrinários e no âmbito da Assembléia Nacional Constituinte de 1988;

o relevante, no particular, é situar a opção política do legislador constituinte na orga-

nização do Poder Judiciário que, claramente, optou pela divisão de atribuições entre

o Supremo Tribunal Federal (“jurisdição constitucional”) e o novel Superior Tribunal

de Justiça (“jurisdição comum”), bem assim sobre o objeto da reclamação e as hipó-

teses de incidência de seu cabimento e sua natureza jurídica. O terceiro capítulo, ra-

zão de ser do recorte investigativo, tem sua centralidade na competência do Superi -

or Tribunal de Justiça e a partir de leading case desenvolve raciocínio, amparado em

fundamentos doutrinários e sólida jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, na

5

tentativa de demonstrar que aquela “Corte Extraordinária” está constitucionalmente

autorizado a defender sua competência e a autoridade de seus julgados, em sede

da legislação federal comum, parta a ofensa da “jurisdição comum” ou da “jurisdição

especial”. Por fim, a conclusão apresenta a síntese das principais idéias discutidas

no trabalho.

6

1. BREVE HISTÓRIA

Expostas as grandes linhas da investigação inicia-se com breve história a

respeito do surgimento do instituto jurídico da reclamação no direito brasileiro.

O recurso à contextualização histórica tem por objetivo exclusivamente evi-

denciar a natureza singular da reclamação, tida por Cassio Scarpinella Bueno como

um dos “procedimentos jurisdicionais constitucionalmente diferenciados”, afinal tem

assento expresso na própria Constituição do Brasil e impõe um específico comporta-

mento ao Estado-juiz, específica forma de atuação e de prestação da tutela jurisdici-

onal, a depender de determinada situação de direito material.

Não há como deixar de reconhecer que o legislador constituinte de 1988 va-

lorou o instituto jurídico da reclamação. Nesse particular pontua o autor, in textus:

E como procedimentos jurisdicionais diferenciados por imposição da Consti-

tuição Federal, nada mais coerente do que chamá-los de “procedimentos ju-

risdicionais constitucionalmente diferenciados”. Aqui, diferentemente do que

se dá no Livro IV do Código de Processo Civil, por exemplo, é a própria

Constituição, Federal, não a lei, que optou por criar específicas formas de

atuação do Estado-juiz que se diferenciam das demais, as “não-diferencia-

das” e, neste sentido, “comuns”, pautada a iniciativa, é certo, não só pela

tradição do próprio direito brasileiro mas, também,por motivos de conveniên-

cia política que ainda se fazem presentes.3

A evolução histórica da reclamação tem ponto de contato muito próximo, e

até mesmo se confundiu por largo lapso de tempo, com a origem e evolução da cor-

reição parcial, essa, sim, de natureza meramente administrativa.

3Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: teoria geral do direito processual civil, 3ª edição, São Paulo: Saraiva, 2009, v.1, pp. 154-155.

7

O instituto jurídico da reclamação, hoje tido pelo Supremo Tribunal Federal4

como “direito constitucional de petição” (CF: art. 5º, XXXIV, a)5, nasceu de constru-

ção pretoriana e com supedâneo na teoria dos poderes implícitos desenvolvida pela

Suprema Corte dos Estados Unidos no final do século XIX, em especial sob a presi-

dência de Jonh Marshall, seu terceiro Chief Justice, que a partir de 1801, e, por 34

anos, até sua morte, em 1835, aos 80 anos, dirigiu aquela Casa de Justiça, moldan-

do-lhe os destinos6.

No emblemático julgamento do caso McCuloch v. Maryland, no qual se dis-

cutia a possibilidade de lei federal instituir um banco, contrariamente à previsão legal

estadual, Marshall, em momento de rara inspiração, adotou a teoria dos poderes im-

plícitos desenvolvida por Alexandre Hamilton, John Jay e James Madison. Segundo

Madison, no Federalista, XLIV, “desde que um fim é reconhecido necessário, os

meios são permitidos; todas as vezes que é atribuída uma competência geral para

fazer alguma coisa, nela estão compreendidos todos os particulares poderes neces-

sários para realizá-la” , princípio este que, apresentando-se como o mais claramente

estabelecido pelo direito e pela razão, encontrou a mais franca e irrestrita aceitação

4A denominação “Supremo Tribunal Federal” foi adotada na Constituição Provisória publicada com o Decreto n.º 510, de 22 de junho de 1890, e repetiu-se no Decreto n.º 848, de 11 de outubro do mes-mo ano, que organizou a Justiça Federal. A Constituição republicada promulgada em 24 de fevereiro de 1891, que instituiu o controle da constitucionalidade das leis, dedicou ao Supremo Tribunal Federal os artigos 55 a 59, tendo sido instalado em 28/2/1891, quando realizou a sua primeira sessão plenária sob a presidência interina do Ministro SAYÃO LOBATO (Visconde de Sabará), que, até então,presidia o Supremo Tribunal de Justiça (Império). Nessa mesma sessão plenária, aberta às 13 horas, foi eleito o seu primeiro Presidente, o Ministro FREITAS HENRIQUES, natural do Estado da Bahia, in MELLO, FILHO, Celso de, 1945-. Notas sobre o Supremo Tribunal Federal (Império e República) / Ministro Celso de Mello. - 2ª ed. - Brasília: Supremo Tribunal Federal, 2007. Disponível em: <http://www.stf.-jus.br/arquivo/cms/sobreStfConhecaStfCuriosidadeStf/anexo/NotasInformativasEletronica161007.pdf)>. Acesso em: 22 jun. 2010.

5Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1 - CEARÁ, Tribunal Pleno, relatora a Ministra Ellen Gracie, D.J. 14/11/2003, Ementário nº 2132-13, e Recurso Extraordinário nº 405.031 - ALAGOAS, Tri -bunal Pleno, relator Ministro Marco Aurélio, julgamento em 15/10/2008, DJe nº 71, de 17/04/2009, Ementário nº 2356-6.

6DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000, p.147.

8

(cf. Joseph Story, Commentaries on the Constitution of the United States, Boston,

1891,vol. I, §§ 424 a 426).7

A adoção da teoria dos poderes implícitos pela Corte Suprema brasileira res-

tou materializada no julgamento da Reclamação nº 141-São Paulo, de janeiro de

1952. De fato, ao tomar conhecimento do Recurso Extraordinário nº 13.828-São

Paulo, da relatoria do Ministro Orozimbo Nonato, em que se discutia matéria atinente

ao direito de sucessão, a Segunda Turma não conheceu do recurso, porém, por mai-

oria, a pretensão recursal foi transformada em reclamação para avaliar suposta vio-

lação a julgado exarado pelo Supremo Tribunal Federal. Eis a ementa do venerando

acórdão:A competência não expressa dos tribunais federais pode ser ampliada por

construção jurisprudencial.

Vão seria o poder, outorgado ao Supremo Tribunal Federal de julgar em re-

curso extraordinário as causas decididas por outros tribunais, se lhe não

fôra possível fazer prevalecer os seus próprios pronunciamentos, acaso de-

satendidas pelas justiças locais. A criação dum remédio de direito para vin-

dicar o cumprimento fiel das suas sentenças, está na vocação do Supremo

Tribunal Federal e na amplitude constitucional e natural de seus poderes.

Necessária e legitima é assim a admissão do processo de Reclamação,

como o Supremo Tribunal Federal tem feito.

É de ser julgada procedente a Reclamação quando a justiça local deixa de a

tender à decisão do Supremo Tribunal Federal.

No voto condutor da decisão majoritária, vencidos os Ministros Abner de

Vasconcelos, Hahnemann Guimarães e Edgard Costa, o relator, Ministro Rocha La-

gôa, destacou, in verbis:

É fôra de qualquer dúvida que a competência desta côrte suprema é de or-

dem constitucional, pois vem expressamente definida na lei maior. Mas, a

função precípua do Supremo Tribunal Federal é a de guardião da carta

magna, de que é intérprete máximo. Na vigência do estatuto político de

7PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas. 4ª ed. rev. e ampl.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 603,

9

1891, decidiu este pretório excelso não constituir inovação ou acréscimo de

jurisdição o conhecer ele, por apelação, de causas não expressamente

mencionadas na Constituição, mas que por seu evidente caráter federal se

deviam ter por incluídas nas competências das justiças da União. Reconhe-

ceu assim implícita a competência federal para os crimes de moeda falsa,

contrabando e peculato dos funcionários federais (acórdão n. 350, de 21 de

setembro de 1898). Por igual admitiu este magno colégio sua competência

para tomar conhecimento de ação rescisória contra seus próprios julgados,

embora não houvesse então texto de lei dispondo expressamente a respei-

to, (ac. n. 494, de 25 de outubro de 1899).

Proclamou-se dest'arte o princípio de que a competência não expressa dos

tribunais federais pode ser ampliada por construção constitucional.

Na lição de Black, em seu Hand-book of American Constitucional Law, § 48,

tudo o que fôr necessário para fazer efetiva alguma disposição constitucio-

nal, envolvendo proibição ou restrição ou garantia de um poder, deve ser

julgado implícito e entendido na própria disposição.

Ora, vão seria o poder, outorgado a este Supremo Tribunal Federal, de jul-

gar em recurso extraordinário as causas decididas em única ou última ins-

tância por outros tribunais e juízes se lhe não fôra possível fazer prevalecer

seus próprios pronunciamentos, acaso desrespeitados pelas justiças locais.

Para tanto se tem admitido ultimamente o uso do remédio heróico da Recla-

mação, logrando desse modo fazer cumprir suas próprias decisões.8 (desta-

cou-se)

Em obra que explora em profundidade o instituto da reclamação constitucio-

nal no direito brasileiro e certamente a mais completa sobre o tema, Marcelo Navar-

ro Ribeiro Dantas9, adotando, com refinamento, a divisão histórica sugerida por José

da Silva Pacheco10 identifica cinco fases pós-criação Supremo Tribunal Federal.

8Reclamação nº 141-São Paulo, Tribunal Pleno, voto preliminar, Ministro Rocha Lagôa, julgamento 25/1/1952, Ementário nº 78. Disponível em : <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=365675>. Acesso em: 29 jun. 2010.

9Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 2000.

10A “Reclamação” no STF e no STJ de Acordo com a Nova Constituição, in O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, 4ª edição revista, atualizada e ampliada, São Paulo: Editora

10

Na primeira fase, intitulada por Marcelo Navarro como “fase de formulação

do instituto”11 e que teria como marco temporal a criação do Supremo Tribunal Fede-

ral até 1957, prevaleceu o entendimento de que, apesar de não haver norma legal

prevendo a reclamação, estava na própria vocação do Supremo Tribunal Federal

dispor de meio jurídico que lhe possibilitasse impor a respeitabilidade de seus julga-

dos e assegurasse sua competência constitucional, principalmente em face das justi-

ças locais. Numa sentença, a prevalência da teoria dos poderes constitucionais im-

plícitos, de matiz norte-americana, reverberado no voto do Ministro Rocha Lagôa no

julgamento da Reclamação nº 141-São Paulo. Diz com propriedade Marcelo Navar-

ro, in verbis:

Fulcrado, pois, nessa condição [posição qualificada do STF], e empregando

a teoria dos poderes implícitos, a meados deste século, o Supremo come-

çou a construir, em seu seio, a reclamação, como meio de solução de pro-

blemas que se lhe apresentavam, e para os quais não encontrava resposta

própria ou eficiente pelo manejo de outras medidas que se achavam, ex-

pressamente, a seu dispor, quer na Constituição, nas leis ou em quaisquer

outras entidades normativas. Ou seja, para atingir seus fins, isto é, exercer

seu poder de resolver devidamente os casos sob sua apreciação, principiou

a erigir um novo meio que não lhe estava explicitamente disponível, admitin-

do, pois, que a Carta Constitucional lhe dera implicitamente o poder de criar

tal mecanismo.12

Revista dos Tribunais, 2002, pp. 601-628. Diz o autor: “O estudo da reclamação pode ser feito em, pelos menos, quatro fases: 1ª) a primeira vai desde a criação do Supremo Tribunal Federal até 1957; 2ª) a segunda começa em 1957, com a inserção da medida no regimento interno do STF, até 1967; 3ª) a terceira, a partir do disposto na Constituição de 1967, art. 115, parágrafo único, c, que foi repro-duzido na Emenda Constitucional de 1969, art. 120, parágrafo único, c, e, posteriormente, após a Emenda 7, de 13.04.1977, com o disposto no art. 119, I, o, sobre a avocatória, e no 3º, c, autorizando que o RISTF estabelecesse 'o processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária ou recursal e da argüição de relevância da questão federal; e 4ª) a quarta, com o advento da Constitui -ção de 05.10.1988, cujos arts. 102, I, l, e 105, I, f, prevêem, expressamente, a reclamação como da competência originária do STF e do STJ.”

11Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 2000, p. 46.

12Id., pp. 168-169.

11

A segunda fase, que inicia em 1957, com a inclusão da medida no Regimen-

to Interno do Supremo Tribunal Federal13, rotulada por Marcelo Navarro como “fase

de discussão”14, se estende até o advento da Constituição de 1967.

É que nessa fase, mercê de superada a resistência à tese que advogava a

criação do instrumento jurídico da reclamação como meio hígido a dar azo ao pleno

exercício da competência constitucional atribuída à Corte Suprema, o novel remédio

jurídico deu ensejo a dúvidas tanto da jurisprudência quanto da doutrina, particular-

mente a respeito de sua natureza jurídica, e à própria confusão conceitual com a re-

clamação correicional, “dificultando o tracejamento mais preciso de seu verdadeiro

perfil.15, pois “O Supremo Tribunal prosseguia no lento e complicado processo de li-

bertação da reclamação, que instituíra regimentalmente, daquela medida de mesmo

nome, que quiçá a tenha, originalmente, inspirado, mas de cuja natureza, alcance e

objetivos ia ficando cada vez mais apartada.16

A terceira fase, nominada de “fase de consolidação”17 por Marcelo Navarro,

tem como ponto de referência a atribuição de competência ao Supremo Tribunal Fe-

deral para, por intermédio de norma regimental, dispor sobre “o processo e julga-

mento dos feitos de sua competência originária ou recursal e da argüição de re-

levância da questão federal.” (CF-67: art. 115, parágrafo único, c, e reproduzida na

EC nº 1/69, art. 120, parágrafo único, c, e EC nº 7/77).

É dizer, o Supremo Tribunal Federal foi autorizado a legislar sobre os pro-

cessos de sua competência, originária ou recursal, por intermédio do seu Regimento

13A introdução da reclamação no RISTF decorreu de proposta do Ministro Orozimbo Nonato, no exer-cício da presidência da Corte, e teve como relator o Ministro Ribeiro da Costa. (PACHECO, José da Silva. A “Reclamação” no STF e no STJ de Acordo com a Nova Constituição, in O Mandado de Segu-rança e Outras Ações Constitucionais Típicas, 4ª edição revista, atualizada e ampliada, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, pp. 570).

14Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 2000, p. 46.15Id. p. 191.16Id., p. 207.17Id., p. 47.

12

Interno, isto é, o RISTF passou a ter força de lei, sepultando a velha discussão juris-

prudencial e doutrinária a respeito da admissibilidade da reclamação nos moldes

aprovada na histórica decisão de 25/1/1952 e que culminou com sua inclusão no

RISTF, nos termos da proposta aprovada em 2/10/1957, “a fim de preservar a inte-

gridade de sua competência ou assegurar a autoridade de seu julgado.”

A quarta fase, qualificada de “fase de definição”18 por Marcelo Navarro, mar-

ca o lapso temporal entre a edição da Emenda Constitucional nº 7/77 à Constituição

de 1967, que previu o instituto da avocatória (art. 119, I, o), e a promulgação da

Constituição Cidadã 05/10/1988.

Essa fase de amadurecimento da reclamação, na visão de Marcelo Navarro,

se deveu ao fato de que

[…] apesar de dispor de uma avocatória genérica, o STF praticamente não a

pôs em uso, desprezando a reclamação; antes pelo contrário, nessa época

fortaleceu definitivamente a reclamatória, como que a indicar seu desejo de

somente proceder à avocação quando o feito a ser avocado estivesse sen-

do processado em invasão de sua competência. Realmente, a reclamação,

durante tal época, foi bastante utilizada, e nela teve seu momento de maior

afirmação jurisprudencial, consoante se verá.19

O dado mais eloqüente da definição do instituto jurídico da reclamação e de

sua singular vocação na defesa da competência da Corte Suprema e da autoridade

de seus julgados, veio à tona no julgamento da Representação nº 1.092-9 – Distrito

Federal20, proposta pelo Procurador-Geral da República, a pedido do Instituto dos

Advogados Brasileiros, na qual se discutia a constitucionalidade dos arts. 194 a 201

18Id., p. 47.19Id., p. 223.20BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Representação Nº 1.092-9 – Distrito Federal. Representante, Procurador-Geral da República; Assistente, Instituto dos Advogados Brasileiros; Representado, Tribu-nal Federal de Recursos. Tribunal Pleno, relator Ministro Djaci Falcão, D.J. 19/12/1984, Ementário Nº 1.363, e Embargos Infringentes na Rp. 1.092-9 – Distrito Federal. Embargante, Procurador-Geral da República, Tribunal Pleno, relator p/acórdão Ministro Djaci Falcão, D.J. 23/05/1986, Ementário Nº 1420-3, Disponíveis em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=263866> e <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=39647>. Acesso em: 22 jun. 2010.

13

do Regimento Interno do Tribunal Federal de Recursos, que disciplinavam a admis-

sibilidade e o julgamento da reclamatória “Para preservar a competência do Tribunal

ou garantir a autoridade das suas decisões, ...” (Título “DA RECLAMAÇÃO”, art.

194).

A previsão regimental do Tribunal Federal de Recursos foi considerada, por

maioria, inconstitucional, consoante se antever da ementa do julgado, in verbis:

Reclamação: Instituto que nasceu de uma construção pretoriana, visando a

preservação, de modo eficaz, da competência e da autoridade dos julgados

do Supremo Tribunal Federal. Sua inclusão a 2-10-57, no Regimento Interno

do órgão maior da hierarquia judicial e que desfruta de singular posição.

Poder reservado exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal para legislar

sobre o “processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária

ou recursal”, instituído pela Constituição Federal de 1967 (art. 115, parág.

Único, letra c, hoje art. 119, § 3º, letra c).

Como quer que se qualifique –recurso, ação, ou medida processual de natu-

reza excepcional, é incontestável a afirmação de que somente ao Supremo

Tribunal Federal em face primacialmente, da previsão inserida no art. 119, §

3º, letra c, da Constituição da República, é dado no seu Regimento Interno,

criar tal instituto, não previsto nas leis processuais.

O Regimento Interno do Tribunal Federal de Recursos ao criar a Reclama-

ção, nos seus arts. 194 a 201, “para preservar a competência do Tribunal

ou garantir a autoridade das suas decisões”, vulnerou os preceitos constan-

tes do art. 43 c/c o art. 8º, inc. XVII, letra b, art. 6º e seu parágrafo único, e

do art. 119, § 3º, letra c, da Lei Magna.

Representação julgada procedente, por maioria de votos.21

Daí porque conclui Marcela Navarro ao cabo da análise de diversas reclama-

ções no pós-julgamento da Rp. 1.092-9 – Distrito Federal: “A reclamação, portanto,

alcançará a maturidade. E, na fase seguinte, teria sua consagração definitiva, com o

'batismo' constitucional que recebeu do Texto Magno de 1988.”22 21Id., Ementário Nº 1.363, p. 27. 22Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 2000, p. 264.

14

A quinta fase, tida por Marcelo Navarro como “fase de plenificação constitu-

cional da reclamação”23, culminou com a promulgação da Constituição Cidadã de

1988 e a consagração da reclamação na competência originária e exclusiva do Su-

premo Tribunal Federal (CF: art. 102, I, l) e do novel Superior Tribunal de Justiça

(CF: art. 105, I, f).

É importante ter presente que a Constituição Federal não contemplou, no

seu texto, a reclamação para nenhum outro tribunal.

De fato, no CAPÍTULO III – DO PODER JUDICIÁRIO, Seção I – DISPOSI-

ÇÕES GERAIS, o art. 93 prevê a edição de lei complementar, de iniciativa do Supre-

mo Tribunal Federal, sobre o Estatuto da Magistratura, observados os princípios

constantes dos seus quinze incisos (I a XV), porém inexiste qualquer referência a

questão processual, muito menos referência à reclamação constitucional.

De igual forma, o art. 96 da mesma Seção I dispõe sobre a competência pri -

vativa dos tribunais naquilo que concerne exclusivamente a sua auto-organização, aí

incluída a elaboração dos respectivos regimentos internos, ou seja, não lhes confere

nenhuma competência para legislar sobre processo, sendo certo que após a Consti-

tuição Federal de 1988 nem mesmo o Supremo Tribunal Federal poderá legislar

sobre processo pela via do Regimento Interno.

Tal assertiva, aliás, é confirmada pela decisão proferida pelo Supremo Tribu-

nal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 405.031-Alagoas, da relato-

ria do Ministro Marco Aurélio, declarando a inconstitucionalidade dos arts. 190 a 194

do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho, que disciplinavam a admis-

sibilidade e o julgamento de reclamação “destinada à preservação da competência

do Tribunal ou à garantia da autoridade de suas decisões, quer sejam proferidas

pelo Pleno, quer pelos órgãos fracionários.''24 Eis a ementa do venerando acórdão:

23 Id., p. 47.

24 RITST: "Art. 190. A reclamação é a medida destinada à preservação da competência do Tribunal ou à garantia da autoridade de suas decisões, quer sejam proferidas pelo Pleno, quer pelos órgãos fracionários.

15

RECLAMAÇÃO – REGÊNCIA – REGIMENTO INTERNO – IMPROPRIEDA-

DE. A criação de instrumento processual mediante regimento interno discre-

pa da Constituição Federal. Considerações sobre a matéria e do atropelado

da dinâmica e organicidade próprias ao Direito.25

Noutra assentada, desta feita em sede de ação direta de inconstitucionalida-

de, a Corte Suprema admitiu, com espeque no art. 125, § 1º, da Constituição Fede-

ral, a possibilidade de Constituição Estadual introduzir o instituto jurídica da reclama-

ção. O leading case envolveu a reclamação prevista no Regimento Interno do Tribu-

nal de Justiça do Estado do Ceará e que reproduzia igual disposição da Constituição

daquele Estado da Federação.26

Registre-se, por fim, que o Supremo Tribunal Federal não descarta a hipóte-

se de outros tribunais superiores virem a dispor da reclamação, desde que editada

lei específica prevendo-a. Nesse sentido:

No tocante ao cabimento da reclamação no processo trabalhista, observem

que, de há muito, o Supremo assentou a necessidade de esse instrumento

estar previsto em lei no sentido formal e material, não cabendo criá-lo por

meio de regimento interno. (...) Realmente, não se pode cogitar de disciplina

em regimento interno, porquanto a reclamação ganha contornos de verda-

§ 1º Não desafia a autoridade da decisão a que for proferida em relação processual distinta daquela que se pretende ver preservada.

§ 2º Estão legitimados para a reclamação a parte interessada ou o Ministério Público do Trabalho.

§ 3º Compete ao Pleno processar e julgar a reclamação.

§ 4º Oficiará no feito o Ministério Público do Trabalho, como custos legis, salvo de figurar como recla-mante.” 25BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário Nº 405.031 – Alagoas. Recorrente,Sin-dicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado de Alagoas; Recorrido, Companhia Ener-gética de Alagoas – CEAL. Tribunal Pleno, julgamento 15/10/2008, unânime, DJe nº 71, publicação 17/04/2000, Ementário Nº 2.356-6. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=587095>. Acesso em: 23 jun. 2010.

26BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1 - CEARÁ. Re-querente, Governador do Estado do Ceará; Requeridos, Assembléia Legislativa do Estado do Ceará e Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. Tribunal Pleno, julgamento 2/10/2003, por maioria, D.J. 14/11/2003, Ementário Nº 2132-13. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=375353>. Acesso em: 23 jun. 2010.

16

deiro recurso, mostrando-se inserida, portanto, conforme ressaltado pelo

Supremo, no direito constitucional de petição. Cumpre, no âmbito federal,

ao Congresso Nacional dispor a respeito, ainda que o faça, ante a origem

da regência do processo do trabalho, mediante lei ordinária.27 (destacou-se)

27BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário Nº 405.031 – Alagoas. Recorrente,Sin-dicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado de Alagoas; Recorrido, Companhia Ener-gética de Alagoas – CEAL. Tribunal Pleno, julgamento 15/10/2008, unânime, DJe nº 71, publicação 17/04/2000, Ementário Nº 2.356-6. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=587095>. Acesso em: 23 jun. 2010, excerto do voto do relator, Ministro Marco Au-rélio, pp. 1188-1189.

17

2. O MODELO DE REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS IDEALIZADO PELO LEGISLADOR CONSTITUINTE

O modelo organizacional do Poder Judiciário idealizado pelo legislador cons-

tituinte tem sua centralidade na clássica divisão de competências --“jurisdição consti-

tucional” e “jurisdição comum”. Assim, o Supremo Tribunal Federal tem por missão

precípua (CF: art. 102, caput) a guarda da Constituição e a unidade federativa, en-

quanto o Superior Tribunal Federal recebe a nobre missão, dentre outras, de guar-

dar a legislação federal comum.

São, à evidência (CF: art. 92), as “Cortes Extraordinárias”, os órgãos de cú-

pulas do Poder Judiciário brasileiro.

De fato, a obra “Antecedentes Históricos do Superior Tribunal de Justiça”28,

que reverbera o “Relatório da Comissão da Constituinte” constituída pelo antigo Tri-

bunal Federal de Recursos com o objetivo de subsidiar e acompanhar os trabalhos

da Assembléia Nacional Constituinte de 1988, relativamente à temática do Poder Ju-

diciário, é relevador da atribuição especialíssima que o legislador constituinte confe-

riu às duas “Cortes Extraordinárias”.

É ilustrativo, no particular, o conjunto de emendas oferecidas pelos legisla-

dores constituintes de diversas matizes ideológicas, desde a Subcomissão do Poder

Judiciário e do Ministério Público) até desaguar no “Projeto de Constituição (D) –

Redação Final”. Confira-se, a título ilustrativo:

EMENDAS OFERECIDAS EM PLENÁRIO, POR CONSTITUINTES E ELEI-

TORES, DO PROJETO DE CONSTITIUIÇÃO DA COMISSÃO DE SISTE-

MATIZAÇÃO (AGOSTO DE 1987)

Emenda Supressiva nº 1P13743-0 (Deputado Osvaldo Bender)

28BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (STJ). Antecedentes Históricos do Superior Tribunal de Justi-ça Brasília. Superior Tribunal de Justiça, 1989.

18

Suprima-se o inciso IV do artigo 201 do Projeto.

Justificativa: O Supremo Tribunal Federal deve ser o guardião da Constitui-

ção e exercer a tutela dos direitos e garantias individuais (Constituição, art.

201, II e III). As questões acerca da interpretação e aplicação da lei fe-deral devem ser definitivamente dirimidas pelo Tribunal Superior de Justiça. Não faz sentido sobrecarregar a Corte Maior com tais matérias,

com as delongas decorrentes em prejuízo da administração da Justiça.29

(destacou-se)

.Emenda Supressiva nº 1P13637-7 (Deputado Nilson Gibson)

Suprima-se o inciso IV do art. 201 do Projeto.

Justificativa: O Supremo Tribunal Federal, em matéria recursal, deve ads-

tringir a sua atuação à proteção dos direitos individuais (art. 201, II) e à tute-

la da Constituição (art. 201, III). O inciso IV, cuja supressão se propõe, é

desnecessário e irá sobrecarregar a Corte Maior sem qualquer proveito

para a administração da Justiça.30 (destacou-se)

EMENDAS OFERECIDAS, EM PLENÁRIO, AO SUBSTITUTITO DO PRO-

JETO DE CONSTITUIÇÃO DO DEPUTADO BERNARDO CABRAL, RELA-

TOR DA COMISSÃO DE SISTEMATIZAÇÃO.

.Emenda Modificativa e Aditiva nº ES 23024-7 (Senador Maurício Cor-rêa)

Dê-se a seguinte redação aos incisos II e III do § 1º do art. 54 do Substituti -

va do Relator ao Projeto de Constituição, acrescentando-lhe o inciso IV: ...

Justificativa: Pela nova estrutura do Poder Judiciário, definido no Substituti-

vo, o Superior Tribunal de Justiça passa a Tribunal Nacional, competin-do-lhe aplicar, em última instância, a lei federal. Visa a emenda a adaptar

o texto à nova sistemática.31 (destacou-se)

29Id., pp. 313-314.

30Id., p. 325.

31Id., pp. 369-370.

19

SUGESTÃO DE DESTAQUE SUPRESSIVO OFERECIDA PELA COMIS-

SÃO DA CONSTITUINTE DE RELEVÂNCIA PARA O SUPREMO TRIBU-

NAL FEDERAL

PEDIDO DE DESTAQUE: Supressão do inciso IV do art. 121 do substitutivo

AUTOR: Deputado Nelson Jobim – Nº 004693-87

OBJETIVO: Em suma, acabar com a “argüição de relevância para o Supre-

mo”.

Justificação: A função do Supremo Tribunal Federal é a de julgar os recur-

sos extraordinários. Através dela, erige-se em guardião da Constituição e

zela pela aplicação e interpretação uniforme da lei federal. ...

Com o crescimento do País, o volume dos referidos recursos aumentou de

tal maneira que o seu julgamento passou a constituir tarefa impossível para

os onze ministros que compõem aquela Corte, por mais competentes e de-

dicados que fossem. Surgiu, então, o que se denominou de 'Crise do Supre-

mo Tribunal Federal'.

Para solucionar a referida crise, o aumento do número de Ministros não se

mostrou como medida recomendável. Os estudos, a respeito, sempre con-

duziram à criação de um novo Tribunal que absorvesse parte da competên-

cia do Supremo, ....

...

Além de não se justificar a relevância em decorrência da sua própria razão

de existir, o instituto, se mantido como previsto no Substitutivo, .... De fato,

além de não ter mais sentido, a relevância acarretará os seguintes inconve-

nientes:

omissis

e) comprometerá o sistema do Substitutivo: se o texto só prevê cabimento

de recurso extraordinário para o Supremo, quanto ao Tribunal Superior do Trabalho e ao Tribunal Superior Eleitoral, nos casos de ofensa à Cons-tituição, não faz sentido excluir da regra o Superior Tribunal de Justiça .32

(destacou-se)

32Id., pp. 413-419.

20

DESTAQUE SUPRESSIVO Nº 004693/87, DO DEPUTADO NELSON JO-

BIM, SOBRE O INSTITUTO DA ARGUIÇÃO DE RELEVÂNCIA PARA O

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

PEDIDO DE DESTAQUE Nº 004693-87

AUTOR: Deputado Nelson Jobim

PEDIDO DE DESTAQUE: Supressão da letra "a" e "b" do inciso IV, do art.

121, do Substitutivo.

OBJETIVO: Acabar com a absurda "argüição de relevância para o Supre-

mo".

Justificação

(…)

Se se trata de instituto que mereceu o repúdio desde a sua criação até ago-

ra, quando o Supremo, em terceira instância, funciona como Corte de Cas-

sação, com a criação do Superior Tribunal de Justiça perde seu sentido

mantê-lo. Com efeito, a caber relevância deveria ser interposta para o Su-

perior Tribunal de Justiça, que passará a ser a terceira instância, nunca para

o Supremo Tribunal, que se constituirá em quarta instância. Todavia, o que

se recomenda é a pura e simples extinção do instituto, verdadeira panacéia

criada para solucionar a chamada "Crise do Supremo Tribunal", mas que,

infelizmente, só a agravou ainda mais.

(…) A finalidade da referida terceira instância está em que, sendo o Brasil

uma Federação, os Estados-membros, também, aplicam o direito federal

(Códigos Civil, Penal, Comercial, Processo Civil, Processo Penal, etc). Por

isso mesmo, as Justiças dos Estados podem negar-se a aplicar a lei federal

ou divergir na sua aplicação, o que compromete a eficácia da atuação do

Congresso Nacional ou a equanimidade da administração da Justiça. Daí a

criação do Superior Tribunal de Justiça para exercer a importante missão,

peculiar aos Estados federados, que hoje é exercida pelo Supremo Tribunal

Federal. Em tal contexto, com a criação da nova Corte, cuja competência

precípua é a de substituir o Supremo Tribunal Federal quanto ao julgamento

dos recursos extraordinários previstos nas letras "a" e "d" do art. 119, inciso

III, da Constituição em vigor, constitui absurdo manter a relevância.

21

Mais ainda. As Cortes de Cassação, hoje existentes, ou seja, o Tribunal Superior do Trabalho e o Tribunal Superior Eleitoral, que são órgãos ju-

risdicionais de terceira instância, dão a última palavra em termo de aplica-

ção da legislação federal especializada reguladora das causas da sua competência. Das suas decisões só cabe recurso extraordinário para o Su-

premo no caso de violação da Constituição.33 (destacou-se)

EMENDAS OFERECIDAS DO PROJETO DE CONSTITUIÇÃO (A) DA CO-

MISSÃO DE SISTEMATIZAÇÃO

1 – Representação para interpretação de lei ou ato normativo federal

– Emenda nº 2P01007-5, Constituinte Paulo Pimental

– Emenda nº 2P01338-4, Constituinte Messias Góis

– Emenda nº 2P01504-2, Constituinte Mário Lima

– Emenda nº 2P02028-3/2P02030-5, Constituinte Walmor Lucas

De acordo com a sistemática adotada pelo Projeto, compete ao Supremo

Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição (ver art. 126), ao

passo que ao Superior Tribunal de Justiça, Tribunal de Ordem Nacional,

velar pela vigência e uniformidade interpretativa da lei federal (ver art.

129, inciso III). Portanto não se justifica, na competência da Alta Corte, a re-

presentação para interpretação de lei ou ato normativo federal. Tal atribui-

ção deve ser do Superior Tribunal de Justiça.34 (destacou-se)

SUGESTÃO PARA APROVAÇÃO DE EMENDAS SUPRESSIVAS AO PRO-

JETO DE CONSTITUIÇÃO (B) – 2º TURNO

.Emenda Supressiva nº 2T00010-3 (Deputado Nilson Gibson)

Suprima-se a alínea 'j' do inciso I, do Art. 108.

Justificativa: Propõe-se a supressão porque não se justifica, perante o Su-

premo Tribunal Federal, a interpretação em tese da lei ou ato normativo fe-

deral. É que, de acordo com a sistemática adotada pelo Projeto, essa inter-

pretação fica a cargo do Superior Tribunal de Justiça, no caso concreto (ver

art. 111, inciso III). Aliás, é próprio do Poder Judiciário decidir o caso con-

33Id., pp. 419-423.34Id., p. 503.

22

creto, pois a função jurisdicional pressupõe a existência de um conflito. Ao

Supremo compete, precipuamente, a guarda da Constituição (ver art. 108).

Em substância, ao Supremo, questão constitucional ao Superior, ques-tão de lei federal.35 (destacou-se)

.Emenda Supressiva nº 2T00214-9 (Deputado Ricardo Izar)

Suprima-se a alínea 'j' do inciso I do Artigo 108 do Projeto de Constituição

'B',

Justificativa: De acordo com a sistemática adotada pelo Projeto, compete

ao Supremo Tribunal Federal a guarda da Constituição (Art. 108) e ao Su-

perior Tribunal de Justiça velar pela vigência e uniformidade da lei fede-ral (Art. 111, inciso III, letra 'c').36(destacou-se)

.Emenda Supressiva nº 2T00326-9 (Senador Maurício Corrêa)

Dispositivo que cogita da competência do Supremo Tribunal.

Quanto à alínea 'j', vale lembrar que na nova sistemática constitucional, de-

fere-se ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, o controle de constitu-

cionalidade das leis. A preservação da autoridade, assim como da uni-formidade, na aplicação da lei federal, constitui tarefa confiada ao Su-perior Tribunal de Justiça, não cabendo recurso para a Corte Suprema.

Se assim é, não se justifica deva o Supremo Tribunal fixar a interpretação

de leis cuja aplicação, nos casos concretos, não lhe é atribuída.37 (destacou-

se)

SUGESTÃO PARA APROVAÇÃO DE FUSÃO DE EMENDAS AO PROJE-

TO DE CONSTITUIÇÃO (B) SOBRE A REPRESENTAÇÃO PARA INTER-

PRETAÇÃO DE LEI OU ATO NORMATIVO FEDERAL

Aprovar a fusão das seguintes emendas que transferem do Supremo Tribu-

nal Federal para o Superior Tribunal de Justiça a representação para inter-

pretação de lei ou ato normativo federal (art. 126,1, do Projeto), a fim de

harmonizar o texto do Projeto e evitar decisões contraditórias:

35Id., p. 523.

36Id., pp 523-524.

37Id., pp. 531-532.

23

Emenda nº 2P01007-5, do Constituinte Paulo Pimentel (D. 50 e D. 1079, do

Constituinte Ricardo Fiúza).

Emenda nº 2P01504-2, do Constituinte Mário Lima (D. 110 e D. 1078, do

Constituinte Paulo Ramos).

Emenda nº 2P02028-3/2P02030-5, do Constituinte Walmor de Luca (D.

1942).

Emenda nº 2P01338-4, do Constituinte Messias Góis

Justificação

De acordo com a sistemática adotada pelo Projeto, compete ao Supremo

Tribunal Federal a guarda da Constituição (art. 126) e ao Superior Tribunal

de Justiça velar pela vigência e uniformidade interpretativa da lei fede-ral (art. 129, III). Portanto, não se justifica, na competência da Alta Corte, a

representação para interpretação de lei ou ato normativo federal. Tal atribui-

ção deve ser do Superior Tribunal de Justiça.

Se assim não se entender, haverá a possibilidade de conflito insuperável

entre as decisões das duas Cortes: uma mesma lei poderá ser objeto de

uma interpretação do Supremo (em tese) e de outra diversa do Superior de

Justiça, ao examinar casos concretos (incidenter tantum).38

É dizer, o itinerário das discussões travadas no âmbito da Assembléia Nacio-

nal Constituinte de 1988 desde o início (Subcomissão do Poder Judiciário e do Mi-

nistério Público) até chegar ao “Projeto de Constituição (D) – Redação Final” prima-

ram pelo realce dos debates centrados na competência especial das duas “Cortes

Extraordinárias”, isto é, o Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição

e o Superior Tribunal de Justiça como guaridão da legislação federal comum ou ordi-

nária, respectivamente.

Coerente com esse modelo de divisão de atribuições entre as “Cortes Extra-

ordinárias”, o legislador constituinte doto-as, nas respectivas competências originári-

as, do instituto jurídico da reclamação constitucional como meio hígido, célere e efi-

caz na preservação de suas competências, originária ou recursal.

38Id., pp. 539-540.

24

2.1 O objeto da reclamação

A reclamação, nos moldes previstos diretamente no corpo da Constituição

do Brasil, tem por objeto a preservação da competência originária e recursal e a ga-

rantia da autoridade das decisões das duas “Cortes Extraordinárias”.

A competência do Supremo Tribunal Federal para a reclamação constitucio-

nal está prevista no art. 102, inciso I, alínea l, enquanto a do Superior Tribunal de

Justiça se encontra posicionada no art. 105, inciso I, alínea f, ambos da Constituição

Federal.

A Emenda Constitucional nº 45, de 2004, trouxe expressiva inovação jurisdi-

cional com a previsão do uso da reclamação constitucional para assegurar a autori-

dade das decisões do Supremo Tribunal Federal materializada em súmula vinculan-

te, a teor do disposto no art. 103-A, § 3º, in verbis: “Do ato administrativo ou decisão

judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá re-

clamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-o procedente, anulará o ato

administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja

proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.”

2.2 Preservação da competência do STF e do STJ

A competência do Supremo Tribunal Federal está fixada no art. 102 da

Constituição Federal, dividindo-se em originária e recursal, subdividindo-se essa em

recurso ordinário e recurso extraordinário.

A reclamação constitucional está encartada na competência originária

(art.102, I, l), significando dizer que é cabível o seu manejo na ocorrência de decisão

que viole a competência do Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar:

25

a) originalmente, as causas previstas nas alíneas a a r do inciso I do art.

102;

b) o recurso ordinário no habeas corpus, mandado de segurança, habeas

data ou mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superio-

res, se denegatória a decisão (art. 102, II); e

c) o recurso extraordinário, quando a decisão em única ou última instância

contrariar dispositivo constitucional, declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei

federal ou julgar válida lei ou ato de governo local contestado perante a Constituição

Federal (art. 102, III).

A reclamação constitucional também é cabível na hipótese de ato adminis-

trativo ou de decisão judicial que contrarie ou que indevidamente aplique súmula

com efeito vinculante (art. 103-A).

Mutatis mutandi, a competência do Superior Tribunal de Justiça está prevista

no art. 105 da Carta Magna, desdobrando-se em competência originária (art. 105, I,

a a i), competência para julgar recurso ordinário (art. 105, II, a a c) e competência

para julgar recurso especial (art. 105, III, a a c).

De igual forma, havendo ato ou decisão que, lato sensu, usurpe a competên-

cia do Superior Tribunal de Justiça, a reclamação constitucional, inserida na sua

competência originária (art. 105, I, f) é cabível para preservar a majestade da lei fe-

deral comum.

2.3 Garantia de autoridade das decisões

A reclamação constitucional é também cabível para preservar a autoridade

dos julgados tanto do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, l, parte final) quanto do

Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, f, parte final).

O normal, o corriqueiro, é que essa hipótese de violação decorra de uma re-

lação endoprocessual, isto é, em que o reclamante vá ao Supremo Tribunal Federal

26

ou ao Superior Tribunal de Justiça para denunciar que a decisão ventilada em deter-

minado acórdão está sendo desrespeitada ou não foi observada na sua plenitude,

seja por má interpretação, seja por desobediência.

É nesse quadrante que reside a maior dificuldade, em certa medida alimen-

tada pela divisão de competências dos Tribunais Superiores entre matéria de índole

constitucional (“jurisdição constitucional”, STF) e matéria de feição infraconstitucio-

nal, que se desdobra em direito comum federal ou “jurisdição comum” (STJ) e direito

especializado ou “jurisdição especial” (TST, TSE e STM).

A área cinzenta na seara da legislação federal ficou ainda mais acentuada

entre o direito federal comum ou ordinário e o direito federal especializado laboral a

partir da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, que, ao conferir nova redação para

o art. 11439 da Constitucional Federal, atribuiu competência à Justiça do Trabalho

para “processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho” (art. 114, I40), “as

ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de tra-

balho” (art. 114, VI) e “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na

forma da lei.” (art. 114, IX).

É dizer, saiu-se do modelo em que a competência da Justiça do Trabalho

era circunscrita ao processamento e julgamento de causas que envolvessem “rela-

ção de emprego” para algo muito mais abrangente (relação de trabalho).

39Redação original: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que te-nham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.” (destacou-se)40Pela Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 3.395/MC, a Corte Suprema “suspendeu toda e qual-quer interpretação do inciso I do art. 114 da CF (na redação da EC 45/2004) que inserisse, na com-petência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrati -vo. As contratações temporárias para suprir os serviços públicos estão no âmbito de relação jurídi-co-administrativa, sendo competente para dirimir os conflitos a Justiça comum e não a Justiça especi-alizada." Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigo.asp#ctx1>. Acesso em: 23 jun. 2010.

27

Nessa “área cinzenta”, por óbvio, instala-se verdadeira insegurança jurídica

e, por conseguinte, a efetividade da tutela jurisdicional resta igualmente comprometi-

da, pois a possibilidade de divergência de entendimento entre o Superior Tribunal

de Justiça, guardiã, ope constitutionis, do direito federal comum (“jurisdição co-

mum”) e a Justiça do Trabalho (“jurisdição especial”), resta acentuada. O leading

case que deu ensejo à presente dissertação, e que será melhor desenvolvido mais

adiante, é emblemático.

Aliás, no voto que proferiu no julgamento de referendum da medida cautelar

na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.395-MC, o Ministro Ricardo Lewan-

dowski, a propósito da ampliação da competência da Justiça do Trabalho, pontuou,

in textus:

Penso, data venia, que essa matéria deve ser examinada não só à luz da al-

teração pontual operada pela Emenda Constitucional nº 45. É preciso exa-

minar a matéria, com todo o respeito, dentro de uma perspectiva histórica.

Historicamente, a partir da constituição da Justiça do Trabalho, desde a

época do Estado Novo, inegavelmente a vocação da Justiça laboral é no

sentido de dirimir dissídios de natureza trabalhista.

Parece-me um certo exagero, com todo o respeito, querer-se ampliar essa

competência e avançar para campos tradicionalmente, historicamente, deli-

mitados para a Justiça estadual e a Justiça federal.41 (destacou-se)

E o Ministro Marco Aurélio, a sua vez, disse: “O que houve em decorrência

da Emenda Constitucional nº 45/2004? Uma ampliação marcante –talvez considera-

dos os novos ares da Justiça do Trabalho, com a anterior exclusos dos leigos-- da

competência dessa mesma Justiça do Trabalho.”

A ação direta de inconstitucionalidade foi julgada procedente, decidindo-se,

em de sede medida cautelar, pela suspensão de toda e qualquer interpretação dada

41BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.395-6 DISTRITO FEDERAL. Requerente, Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE e As-sociação Nacional dos Magistrados Estaduais - ANAMAGES; Requerido, Congresso Nacional. Tribu-nal Pleno, julgamento 5/4/2006, por maioria, D.J. 10/11/2006, Ementário Nº 2255-2. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=375353>. Acesso em: 23 jun. 2010.

28

ao inciso I do art. 114 da Constituição Federal que inclua, na competência da Justiça

do Trabalho, a apreciação de causas envolvendo o Poder Público e servidor que lhe

seja vinculado por relação jurídico-estatutária. Eis a ementa do venerando acórdão,

in verbis:

INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Competência. Justiça do Tra-balho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas da relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da compe-tência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, intro-duzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir ou-tra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República,

não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe

seja vinculado por relação jurídico-estatutária. (destaques do original, exceto

o sublinhado)

Ora, se se reconhece que o conhecimento e julgamento de causas envol-

vendo relação empregatícia entre o Poder Público e seus servidores pela Justiça la-

boral caracteriza invasão da competência da Justiça Comum, com muito mais razão

há que se concluir que, v.g., a penhora do único bem de família (Lei nº 8.009, de

1990) para satisfazer dívida trabalhista usurpa a competência do Superior Tribunal

de Justiça, mesmo porque se trata de matéria pacificada e cristalizada na Súmula nº

364: “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel

pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.” --DJe 03/11/2008, RSTJ vol.

212, p.627.

Sim, porque, como visto precedentemente, o legislador constituinte de 1988

elegeu o Superior Tribunal de Justiça como “Corte Extraordinária”, como Tribunal de

superposição na estrutura do Poder Judiciário, com a incumbência de preservar a in-

tangibilidade do direito objetivo comum posto pela União Federal.

Se assim é, e de fato é, soa estranho que violações à legislação federal co-

mum, inclusive em matéria sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, sejam prati-

cadas por Juízes que integrem a Justiça Especializada e fiquem infensas à aprecia-

29

ção do órgão constitucionalmente eleito guardião desse ramo do direito objetivo pela

via do instituto jurídico da reclamação constitucional.

Como pontuou com propriedade a Ministra Cármen Lúcia:

A reclamação é instrumento constitucional processual posto no sistema com

dupla garantia formal da jurisdição: primeiro, para o jurisdicionado que tenha

recebido resposta a pleito formulado judicialmente e que vê a decisão profe-

rida afrontada, fragilizada e despojada de seu vigor e de sua eficácia; se-

gundo, para o STF (art. 102, I, l, da CF) ou para o STJ (art. 105, I, f, da

CF), que podem ter as suas respectivas competências enfrentadas e me-

nosprezadas por outros órgãos do Poder Judiciário e a autoridade de suas

decisões mitigadas em face de atos reclamados. Ela não se presta a anteci-

par julgados, a atalhar julgamentos, a fazer sucumbir decisões sem que se

atenha à legislação processual específica qualquer discussão ou litígio a ser

solucionado juridicamente.42

O abismo entre o mundo do ser, a realidade, e a posição defensiva do Supe-

rior Tribunal de Justiça, a pretexto de que lhe é defeso “imiscuir-se nas decisões

provenientes das Justiças Especializadas”, é latente, restando unicamente ao jurisdi-

cionado o penoso, demorado e incerto percurso dos recursos tradicionais.

Diz-se incerto caminhar porque, sendo a matéria de índole eminentemente

de direito objetivo federal comum, não abre espaço para o remédio extremo do re-

curso extraordinário para Supremo Tribunal Federal na hipótese de eventual não

provimento de recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho.

Logo, a prestação jurisdicional restará capenga, numa clara negação de um

dos fundamentos da República Federativa do Brasil, aquele que proclama “[...] a

igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, ...” (CF:

Preâmbulo e art. 3º, I).

42BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 5.310-5 MATO GROSSO. Reclamante, Cleber Guarnieri; Reclamado, Juiz Federal da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária de Mato Grosso. Tribunal Pleno, julgamento 3/4/2008, unânime, DJe nº 088, publicação 16/5/2008, Ementário Nº 2319-2. Dis-ponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=527295>. Acesso em: 30 jun. 2010.

30

Embora coerente e resguardadora da singular natureza da reclamação cons-

titucional, a decisão proferida no Recurso Extraordinário nº 405.031 – Alagoas, da

relatoria do Ministro Marco Aurélio, aprofundou o fosso de interpretações a respeito

do mesmo texto legal do direito comum, conferidas pelo seu legítimo tutor e a “juris-

dição especial”, quer sob a perspectiva de quebra da lógica da organização do siste-

ma judiciário nacional, quer sob a ótica da segurança jurídica e da efetividade da ju-

risdição.

Tal se deve ao fato de que, no referido julgamento, foi declarada a inconsti-

tucionalidade dos arts. 190 a 194 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Tra-

balho, que previam o instituto jurídico da reclamação, único instrumento que poderia

ser manejado pelo jurisdicionado com eficácia e eficiência, evitando-se o caminho

tortuoso dos recursos ordinários disponíveis na legislação processual.

Não há como desconhecer, portanto, que a lógica da organização do siste-

ma judiciário nacional carece, outra vez, de (re)construção pela via pretoriana a fim

de restabelecer as premissas idealizadas pelo legislador constituinte de 1988.

Diferentemente de outrora não se faz necessário buscar a saída na teoria

dos poderes constitucionais implícitos, haja vista que a Constituição Federal de 1988

de forma clara, direta e inequívoca elegeu o Superior Tribunal de Justiça guardião

da legislação federal comum, bastando apenas que o guardião dessa mesma Cons-

tituição, o Supremo Tribunal Federal, diante da tibieza do agir do Superior Tribunal

de Justiça, afirme, como fez no julgamento dos Embargos de Declaração no Recur-

so Extraordinário nº 571.572-Bahia, da relatoria da Ministra Ellen Gracie, que cabe a

ele, Superior Tribunal de Justiça, a prerrogativa privativa de uniformizar a interpreta-

ção do direito objetivo comum posto pela União Federal, logo com força vinculante

para a “jurisdição comum” e para a “jurisdição especial”.

31

2.4 A natureza jurídica da reclamação

A doutrina e a jurisprudência controvertem a respeito da natureza jurídica da

reclamação. Para alguns, a reclamação é recurso; outros a consideram ação; há

quem a tenha como incidente processual; e há aqueles que julgam ser a reclamação

simples representação sem caráter processual.

O apanhado feito pelo Ministro Celso de Mello na Reclamação nº 336-1/190

– Distrito Federal, é ilustrativo da divergência:

A reclamação, qualquer que seja a qualificação que se lhe dê –ação (Pontes

de Miranda, “Comentários ao Código de Processo Civil”, tomo V/384, Foren-

se), recurso ou sucedâneo recursal (Moacyr Amaral Santos, RTJ 56/546-

548; Alcides de Mendonça Lima, “O Poder Judiciário e a Nova Constituição”,

p. 90, 1989, Aide), remédio incomum (Orozimbo Nonato, apud Cordeiro de

Mello, “O processo no Supremo Tribunal Federal”, vol. 1/280), incidente pro-

cessual (Moniz de Aragão, “A Correição Parcial”, p. 110, 1969), medida de

Direito Processual Constitucional (José Frederico Marques, “Manual de Di-

reito Processual Civil”, vol. 3º, 2ª parte, item 653, 9ª ed., 1987, Saraiva) ou

medida processual de caráter excepcional (Ministro Djaci Falcão, RTJ

112/518-522), configura, modernamente, instrumento de extração constitu-

cional, inobstante a origem pretoriana de sua criação (RTJ/504), destinado

a viabilizar, na concretização de sua dupla função de ordem político-jurídica,

a preservação da competência e a garantia da autoridade das decisões do

Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, l) e do Superior Tribunal de Justi-

ça (CF, art. 105, I, f).43 -destacou-se.

É certo, todavia, que a corrente majoritária a tem com o predicado de ação

autônoma.

É de se ter presente que o legislador constituinte de 1988 inseriu a reclama-

ção nos processos da competência originária e privativa das duas “Cortes Extraordi-

43BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 336-1/190 - Distrito Federal. Reclamante, Ed-son de Barros; Reclamado, Juiz da 1ª Vara Criminal da Comarca de Osasco-SP e Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Tribunal Pleno, relator Ministro Celso de Mello, D.J. 15/03/1991, Ementário nº 1612-1. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&do-cID=86782>. Acesso em: 3 de jul. 2010.

32

nárias”, não nos processos de competência recursal, o que, em certo sentido, refor-

ça a tese daqueles que advogam ser a reclamação ação, não recurso.

Marcelo Navarro em análise consistente sobre os diversos predicados que

tem sido conferidos à reclamação converge para a natureza de ação, pontuando, in

verbis:

É a reclamação, fundamentalmente, uma ação de conhecimento, pois a es-

pécie de tutela que se busca nela é cognitiva (rectius, um acórdão, já que se

trata de ação de competência originária dos tribunais).

Entretanto, a reclamação permite tutela cautelar, e sua decisão sai sob for-

ma de ordem.

Assim sendo, a reclamatória seria tida, pelos adeptos da classificação qui-

nária das ações (das sentenças), como ação mandamental,

(…)

Entretanto, não é uma ação de cognição no sentido puro do termo, pois con-

tém em seu bojo a possibilidade de concessão de uma liminar cautelar. En-

tão comporta a possibilidade de resguardar o direito sobre o qual irá dar-se

o pronunciamento final, isto é, possui um momento cautelar, ou seja, de tu-

tela jurisprotetiva.

Além disso, como a decisão, se pela procedência, sai sob a forma de ordem

(mandado), há nela execução direta, e, portanto, também a tutela jurissatis-

fativa.44

Ultimamente o Supremo Tribunal Federal tem afirmado que a reclamação se

insere no direito constitucional de petição (CF: art. 5º, XXXIV), sendo ilustrativo os

julgamentos proferidos na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1–Ceará,

da relatoria da Ministra Ellen Gracie, e no Recurso Extraordinário nº 405.031-Alago-

as, relator Ministro Marco Aurélio, o que tem gerado críticas de parte da doutrina fun-

44Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000, pp. 463-464. Para maior aprofundamento da discussão ver, em particular, o capítulo 6. NATUREZA JURÍDICA DA RECLAMAÇÃO, da mesma obra.

33

dadas, principalmente, na potencial descaracterização da reclamação enquanto ins-

tituto jurídico contencioso.45

Isso porque, na visão de tais críticas, o Supremo Tribunal Federal estaria si-

nalizando para a auto-aplicabilidade do direito de petição “previsto na Constituição

Federal para todos os órgãos do Poder Público.”, pois “o direito de petição constitui

uma garantia individual do cidadão, …, independentemente de regulamentação ou

previsão em qualquer outro diploma normativo.”46

Com a devida venia, não parece que se possa vislumbrar petição de princí-

pio na afirmação da Corte Suprema de que a natureza jurídica da reclamação se in-

sere “no âmbito do direito constituição previsto no artigo 5º, inciso XXXIV da Consti-

tuição Federal.”

A decisão, a rigor, não discrepa de entendimento antigo da Corte Suprema,

segundo o qual a reclamação “configura, modernamente, instrumento de extração constitucional, inobstante a origem pretoriana de sua criação (RTJ/504), destinado

a viabilizar, na concretização de sua dupla função de ordem político-jurídica” (Rcl nº

336, rel. Ministro Celso de Mello).

É dizer, se trata apenas de argumento-reforço para deixar marcado que a re-

clamação constitucional é uma ação auto-garantida que, literal, direta, autônoma e

equiparável ou similar aos writs constitucionais ou instrumentos constitucionais es-

peciais47, não está sujeita a modulação, no seu espectro de incidência, qual seja pre-

45Nesse sentido: CUNHA, Leonardo José Carneiro. Natureza jurídica da reclamação constitucional. In Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judi-ciais. Coordenação Nelson Nery Jr., Tereza Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005 (Série aspectos polêmicos e atuais dos recursos; v. 8), pp. 325-342, e MACEDO, An-dré Puppin. Reclamação constitucional: instrumento de garantia da efetividade dos julgados e da pre-servação da competência do Supremo Tribunal Federal. Tese de Doutorado em Direito: São Paulo: PUC/SP, 2007.

46CUNHA, Leonardo José Carneiro. Natureza jurídica da reclamação constitucional. In Aspectos po-lêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. Coorde-nação Nelson Nery Jr., Tereza Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005 (Série aspectos polêmicos e atuais dos recursos; v. 8), p. 338.

34

servar a competência e garantir a autoridade dos julgados das “Cortes Extraordinári-

as”, pelo legislador infraconstitucional.

Não quer isso dizer que o legislador ordinário não possa estabelecer o pro-

cedimento a ser observado no âmbito das “Cortes Extraordinárias”, como o fez nos

termos da Lei nº 8.038, de 1990 (arts. 13 a 18) e igualmente em relação ao habeas

data previsto no art. 5º, inciso LXXII, da Constituição Federal (Lei nº 9.507, de 1997),

caracterizadamente um direito fundamental individual, tal qual o habeas corpus (CF:

art. 5º, LXVIII).

Logo, não se extrai da expressão direito constitucional de petição, que nada

mais é do que direito de ação, fundamento que transforme a reclamação constitucio-

nal, haja ou não pagamento de custas processuais, em simples medida de cunho

administrativo.

É que a reclamação, seja para preservar a competência, originária ou recur-

sal, seja para garantir a autoridade das decisões prolatadas pelas “Cortes Extraordi-

nárias”, pressupõe, regra geral, a existência de relação processual em curso em al-

gum juízo ou tribunal.48

47DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação Constitucional no Direito brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000, p. 465.

48Marcelo Navarro relata que na Rcl. 161-SP, em que se buscava a preservação da competência do STJ, não havia processo judicial, porém a Corte Especial julgou procedente a reclamação porque o Ministério Público estava investigando autoridade detentora de foro privilegiado naquele tribunal, e, por conseguinte, fazia jus a inquérito judicial conduzido pela mesma casa, e não pela autoridade poli-cial. Id., p. 483.

35

3. O GUARDIÃO DA LEGISLAÇÃO FEDERAL COMUM

A interpretação constitucional está submetida ao princípio da

ótima concretização da norma (Gebot optimaler Verwirklichung

der Norm). Evidentemente, esse princípio não pode ser aplica-

do com base nos meios fornecidos pela subsunção lógica e

pela construção conceitual. Se o direito e, sobretudo, a Consti-

tuição, têm a sua eficácia condicionada pelos fatos concretos

da vida, não se afigura possível que a interpretação faça deles

tábula rasa. Ela há de contemplar essas condicionantes, corre-

lacionando-as com as proposições normativas da Constituição.

A interpretação adequada é aquela que consegue concretizar,

de forma excelente, o sentido (Sinn) da proposição normativa

dentro das condições reais dominantes numa determinada situ-

ação. (destacou-se)

Konrad Hesse49

O tema central do presente trabalho repousa na alínea f do inciso I do art.

105 da Constituição do Brasil que, a sabença, trata da competência expressa, origi-

nária e privativa do Superior Tribunal de Justiça para conhecer da reclamação cons-

titucional visando, lato sensu, a preservação de sua competência, originária e recur-

sal, e a garantia da autoridade de suas decisões em sede de legislação federal co-

mum.

A Constituição Federal de 1988, de forma clara e inequívoca (art. 92), defe-

riu ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça condição destaca-

da de órgãos de cúpula ou de superposição do Poder Judiciário.

49A Força Normativa da Constituição (Die normative Kraft der Verfassung), tradução de Gilmar Ferrei-ra Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, p. 22.

36

É importante sempre avivar a memória para ter presente que o modelo insti-

tucional plasmado pelo legislador constituinte de 1988 optou, claramente, pela divi-

são de competências entre as duas “Cortes Extraordinárias”.

Assim, coube ao Supremo Tribunal Federal “precipuamente, a guarda da

Constituição” (CF: art. 102, caput), deixando explícita que a função primordial e que

vem em primeiro plano é a “guarda da Constituição”, sendo que apenas residual-

mente conhece e julga, por opção política do legislador constituinte (e.g., art. 102, I,

b, j), causas envolvendo o direito infraconstitucional, nas hipóteses de competência

originária.

O legislador constituinte de 1988, por outro lado, outorgou ao Superior Tribu-

nal de Justiça, dentre outras eminentes funções de índole jurisdicional, a prerrogati-

va de uniformizar a interpretação das leis e normas infraconstitucionais emanadas

da União Federal.

Dito de outro modo, o legislador constituinte elegeu o Superior Tribunal de

Justiça guardião da “jurisdição comum”, conferindo-lhe, pois, a qualidade de intér-

prete autêntico desse ramo do direito. Não sem razão um de seus ilustres Ministros

profetizou, in verbis:

[...] nós somos muito importantes no direito infraconstitucional porque somos

o Supremo da lei infraconstitucional. O Supremo contrasta a lei com a Cons-

tituição, mas quem diz a última interpretação da lei, o seu espaço de eficá-

cia, de validade, a sua alma, somos nós.”50(destacou-se)

O desenho institucional idealizado pelo legislador constituinte de 1988, sem

sombra de dúvida, não permite outro entendimento senão o de que “a última inter-

pretação” do direito positivo comum, “o seu espaço de eficácia, de validade, a sua

alma” é da competência do Superior Tribunal de Justiça.

Outra, aliás, não é a conclusão a que se chega a partir de análise dos deba-

tes, proposições, marchas e contra-marchas no âmbito da Assembléia Nacional

50 NORONHA, João Otávio de. A natureza da Lei 4.595/64, in Revista de Direito Bancário e do Mercado de Ca-pitais, Ano 10, n. 35, jan.-mar/2007. Coordenação Arnoldo Wald. São Paulo: RT, 2007, pp. 207-215.

37

Constituinte de 1988, desde a “Subcomissão do Poder Judiciário e do Ministério Pú-

blico” até desaguar no “Projeto de Constituição (D) – Redação Final”, reverberados

na obra “Antecedentes Históricos do Superior Tribunal de Justiça”51 e resenhados no

capítulo II, antecedente.

Mas tal desenho institucional, quiçá em razão de interesses outros que se

chocam com o valor justiça, fundamento da República Federativa do Brasil (CF:

Preâmbulo e art. 3º, I) e fim último do Estado-juiz na sua função de árbitro das con-

tendas intersubjetivas, resta comprometido pelo embate divergente entre a interpre-

tação autêntica e qualificada do direito objetivo comum pelo seu guardião, ope cons-

titutionis, e a interpretação subsidiária, não autêntica, desse mesmo ramo do direito

comum pela “jurisdição especial”.

É o que será abordado na perspectiva de justificar a presente dissertação.

3.1 O leading case

No âmbito de reclamação trabalhista ajuizada perante a 20ª Vara do Traba-

lho de Brasília contra a empresa JMP Veículos e Peças Serviços Ltda.52, o sócio da

empresa reclamada foi responsabilizado pela execução.

O exequente juntou certidão da matrícula do único imóvel de propriedade do

executado e requereu a penhora, sendo lançado o seguinte despacho no rosto do

pedido, in verbis: “J. Expeça-se mandado de penhora do imóvel aqui indicado, per-

tencente ao sócio da executada,...”.53 51Brasil. Superior Tribunal de Justiça (STJ). Antecedentes Históricos do Superior Tribunal de Justiça. Brasília: Superior Tribunal de Justiça, 1989.

52BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, Distrito Federal e Tocantins. Reclamação Trabalhista nº 00047.2004.020.10.00-5, Reclamante, Giovanne Santana de Lima Martins; Reclamada, JMP Veículos e Peças Serviços Ltda. Disponível em: <http://www.trt10.jus.br/index.php>. Acesso em: 20 mai. 2010.

53 O bem de família, inclusive, goza de presunção iuris tantum, a teor de decisões proferidas pelo Su-premo Tribunal Federal (MS nº 21.919/PE, rel. Min. Celso de Mello, DJ de 6/6/1997, Ementário nº 1872-02, disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?

38

A partir de tal despacho, o tumulto processual se instala sob a tutela do Juí-

zo da 20ª Vara do Trabalho de Brasília, resultando, ao fim e ao cabo, no sacrifício e

na imposição de grave lesão de ordem patrimonial e moral ao executado e à entida-

de familiar por ele formada.

Sim, afinal a penhora recaiu sobre o único bem de família de propriedade de

executado, consoante atestam:

a) a CERTIDÃO de lavra da Oficial de Justiça Avaliador que afirma, in verbis:

“[...], adentrei a residência e visualizei unicamente os bens necessários ao convívio

familiar (Lei 8009/90), razão pela qual procedo a devolução do mandado.”

b) as CERTIDÕES emitidas pelos Ofícios de Registros de Imóveis do Distrito

Federal.

As ilegalidades e inconstitucionalidades adquiriram novos contornos no pro-

cesso de hasta pública, haja vista que:

a) sobre o arrematante pesava o impedimento do art. 497, inciso III, do Códi-

go Civil e do art. 690-A, inciso III, do Código de Processo Civil;

b) a arrematação se deu em primeira e única hasta, por preço inferior ao da

avaliação, com violação ao art. 686, inciso VI, do Código de Processo Civil;

c) a esposa do executado não foi intimada, violando-se os arts. 247, 475-L,

inciso I, e 655, § 2º, do Código de Processo Civil, e os embargos de terceiros, com

pedido de liminar urgente, por ela interpostos foram tardiamente decididos (16 dias

após a hasta pública), sendo-lhe destinado o produto da meação; e

d) a arrematação é ineficaz, a teor do art. 694, § 1º, inciso I, do Código de

Processo Civil.

Diante desse quadro de aberrante usurpação da competência do Superior

Tribunal de Justiça, e à míngua de remédio processual com aptidão de fazer cessar,

docTP=AC&docID=85642&pgI=1&pgF=100000 >. e pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 859.937-SP, rel. Min. Luiz Fux, DJ de 28/2/2008, disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletroni-ca/ita.asp?registro=200601250200&dt_publicacao=28/02/2008 > ).

39

tempestivamente, a ilegalidade e a omissão perpetradas contra o único bem de fa-

mília perante o Tribunal Superior do Trabalho54, o executado ajuizou Reclamação

Constitucional, com pedido liminar, com fundamento no art. 105, I, f, da Constituição

do Brasil.

3.2 A visão do guardião da legislação federal comum

Ao apreciar monocraticamente a reclamatória, o relator, Ministro Carlos Fer-

nando Mathias (Juiz Federal convocado do TRF 1ª Região), assim decidiu, in verbis:(...)

Assim, pelo que se percebe, a presente Reclamação não se enquadra nas

hipóteses de cabimento expressamente previstas pelo art. 105, I, "f", da

Constituição da República, e reiteradas pelos arts. 13 da Lei nº 8.038/90 e

187 do Regimento Interno.

Isso porque, de um lado, pelo se extrai dos autos, não existe qualquer deci-

são exarada por esta Corte Superior nos autos da referida execução traba-

lhista que estaria sendo desrespeitada pelas instâncias ordinárias.

Salienta-se, por oportuno, que a jurisprudência deste Superior Tribunal, ain-

da que sumulada a orientação, como no caso, não pode ser levada à condi-

ção de tornar cabível o ajuizamento da Reclamação

A propósito, nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:

“PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO

CUJA EFICÁCIA DEVA SER GARANTIDA. PRETENSÃO DE SE ATRIBUIR

TAL CONDIÇÃO À JURISPRUDÊNCIA DA CORTE. DESCABIMENTO.

1. Configura erro inescusável pretender-se atribuir à jurisprudência da Cor-

te, ainda que sumulada, o viés de decisão vinculante, de modo a favorecer a

utilização do instrumento processual regulado no art. 187 do Regimento In-

terno do Superior Tribunal de Justiça – RISTJ.

54O Supremo Tribunal Federal declarara a inconstitucionalidade dos arts. 190 a 194 do RITST, que previam o instituto jurídico da reclamação (RE nº 405.031-Alagoas, da relatoria do Ministro Marco Au-rélio),

40

2. A reclamação como prevista no art. 187 do Regimento Interno constitui medida correicional, acessória dentro do processo. Tão clara é essa ca-

racterística que o parágrafo único do dispositivo que a estipula determina a

sua distribuição "ao relator da causa principal sempre que possível"' (Minis-

tro Sálvio de Figueiredo Teixeira na RCL n. 66/SP).

3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, 1ª Seção, AgRg Rcl

nº 1.605/MT, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJU

02.08.2004).”

“RECLAMAÇÃO. AUSÊNCIA DE DECISÃO A SER PRESERVADA. INADE-

QUAÇÃO DA VIA ELEITA.

I - Constitui pressuposto de cabimento inafastável da reclamação a existên-

cia de decisão, tomada no caso concreto, que possa ser afrontada por outra

decisão que, direta ou indiretamente, afaste o comando de dispositivo ema-

nado do Superior Tribunal de Justiça.

II - A via expedita da reclamação não se presta à preservação de jurispru-

dência dominante, ainda que cristalizada em verbete sumular.

III - Reclamação não conhecida. (STJ, 2ª Seção, Rcl nº 647/RS, Rel. Minis-

tro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, DJU 14.08.2000)”

Por outro lado, carece de amparo a medida excepcional na necessidade de

preservação da competência desta Corte Superior, tendo em vista que é ve-

dado ao Superior Tribunal de Justiça imiscuir-se nas decisões provenientes

das Justiças Especializadas.55 (destacou-se)

Consta que foram interpostos, sucessivamente, agravo regimental e embar-

gos de declaração, porém a Segunda Seção daquela “Corte Extraordinária” manteve

a decisão sob o fundamento central de que “é vedado ao Superior Tribunal de Justi-

ça imiscuir-se nas decisões provenientes das Justiças Especializadas.” 56

55BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Reclamação nº 3.330-DF. Reclamante, Ivanildo Jorge Berto-loto; Reclamado, Juiz Substituto da 20ª Vara do Trabalho de Brasília – DF, relator Ministro Carlos Fer-nando Mathias, Juiz Federal convocado do TRF 1ª Região), D.J. 02/02/2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/MON?seq=4589009&formato=PDF>. Acesso em: 30 jun. 2010.

56Eis o teor da ementa do acórdão:

“AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. DECISÃO JUSTIÇA DO TRABALHO. MATÉRIA

41

Análise da decisão do Superior Tribunal de Justiça permite deduzir que a re-

clamação foi inacolhida sob os seguintes fundamentos centrais:

a) inexistência de decisão daquela Corte Extraordinária “nos autos da referi-

da execução trabalhista” que estivesse “sendo desrespeitada pelas instâncias ordi-

nárias.”;

b) a reclamação prevista no art. 187 do RISTJ “constitui medida correicio-nal acessória dentro do processo. Tão clara é essa característica que o parágrafo

único do dispositivo que a estipula determina a sua distribuição ‘ao relator da causa

principal sempre que possível’.”; e

c) a reclamação careceria de amparo “tendo em vista que é vedado ao Su-

perior Tribunal de Justiça imiscuir-se nas decisões provenientes das Justiças Espe-

cializadas.”

A firme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, seja quanto a natureza

singular da reclamação constitucional, seja quanto o seu campo de incidência na de-

fesa de direito constitucional ou da legislação federal comum, não chancelam a es-

cusa do Superior Tribunal de Justiça em conhecer de reclamação constitucional vi-

sando à proteção de direito positivado Lei nº 8.009, de 1990, que dispõe sobre a im-

penhorabilidade do bem de família.

De fato, resta sedimentado na jurisprudência da Corte Suprema –Represen-

tação nº 1.092-9/Distro Federal, DJ de 19/12/1984, Ementário nº 1.363, na Ação Di-

reta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1/Cará, DJ de 14/11/2003, Ementário nº 2132-

1. Não cabe reclamação como sucedâneo recursal, pois ela exige a configuração, em concreto, de desrespeito à autoridade de decisões do STJ, ou de usurpação de sua competência, revelando-se inadmissível o intuito genérico de preservação da jurisprudência da Corte Extraordinária.

2. Inexiste nos autos referida execução trabalhista qualquer decisão exarada por esta Corte Superior que estaria sendo desrespeitada pelas instâncias ordinárias.

3. A via expedita da reclamação não se presta à preservação de jurisprudência dominante, ainda que

cristalizada em verbete sumular. (Cf. Rcl nº 647/RS, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, DJU 14.08.2000). Agravo regimental não provido.” Id., D.J. 27/02/2009.

42

13 e no Recurso Extraordinário nº 405.031-Alagoas, DJe nº 71, publicação

17/04/2000, Ementário Nº 2.356-6– que a natureza jurídica da reclamação:

[...] não é a de um recurso, de uma ação e nem de um incidente processual.

Situa-se ela no âmbito do direito constitucional de petição previsto no artigo

5º, inciso XXXIV, da Constituição Federal. ... e tem por objetivo evitar, no

caso de ofensa à autoridade de um julgado, o caminho tortuoso e demorado

dos recursos previstos na legislação processual, inegavelmente inconveni-

entes quando já tem a parte uma decisão definitiva.57 (destacou-se)

No voto que proferiu na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1/Ce-

ará a relatora, Ministra Ellen Gracie, destacou a origem da construção pretoriana da

reclamação como meio de garantir que as decisões da Corte Suprema “[...] não fos-

sem desobedecidas, de modo direto ou oblíquo, preocupação também manifestada

no tocante a eventual usurpação da competência desta Corte por outro Tribunal ou

Juízo.” e mais adiante pontuou:

Trata-se de instrumento destinado a dar efetividade a decisões prolatadas

em última instância pelas Cortes de jurisdição nacional: o Supremo Tribunal

Federal, guardião da Constituição da República, e o Superior Tribunal de

Justiça, guardião da legislação federal, bem como de um instrumento desti-

nado a preservar a competência de ambos contra usurpação cometida por

outro Tribunal ou órgão do Poder Judiciário. (destacou-se)

Na mesma linha o Ministro Maurício Corrêa salientou “que a excepcionalida-

de da medida é tão grande que nem mesmo os outros Tribunais Superiores (TST,

STM e TSE) foram com ela contemplados pela Carta Federal.”, mas só e tão-somen-

te as “Cortes extraordinárias”, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de

Justiça.

Não menos contundente foi o voto do Ministro Marco Aurélio que vislumbrou

no instituto da reclamação remédio jurídico eficaz à garantia da respeitabilidade e da

efetividade da atuação do Estado-juiz. Disse sua Excelência:

57Ementa do acórdão proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1 CEARÁ, D.J. 14/11/2003, Tribunal Pleno, Ementário Nº 2132-13, relatora a Ministra Ellen Gracie.

43

Como ressaltado pelos Colegas, a reclamação teve origem em uma constru-

ção jurisprudencial. Foi constitucionalizada pelo Constituinte de 1988. Nota-

mos que existe, na Carta de 88, a previsão quanto ao Supremo Tribunal Fe-

deral, e estendeu-se ao Superior Tribunal de Justiça –porque se retirou da-

qui uma fatia da competência até então existente, e passou o Superior Tri -

bunal de Justiça a ficar encarregado da preservação da intangibilidade da

legislação federal– o valioso remédio jurídico. (destacou-se)

Deflui da posição consolidada da Corte Suprema que a reclamação positiva-

da no art. 102, I, l, e no art. 105, I, f, da Constituição Federal é o remédio processual

constitucional (CF: art. 5º, XXXIV) pelo qual, nas palavras da relatora da Ação Direta

de Inconstitucionalidade nº 2.212-CE, Ministra Ellen Gracie, “o cidadão ou a cidadã

se dirige ao Poder Público visando à defesa de direito ou ao combate de ilegalidade

ou abuso de poder.”

Sob essa perspectiva, tal instituto não pode ser encarado como “medida cor-

reicional acessória dentro do processo” e muito menos a inexistência de decisão do

Superior Tribunal de Justiça, in concreto, pode constituir barreira para que aquela

“Corte Extraordinária” se julgue impedida de “imiscuir-se nas decisões provenientes

das Justiças Especializadas”, afinal o constituinte de 1988 o elegeu guardiã da legis-

lação federal comum.

Nessa perspectiva, a proteção via reclamação constitucional não poderia so-

frer limitação protetiva só e somente pelo fato de a ofensa partir da Justiça Especiali -

zada. O divisor d’águas, a rigor, repousa na constatação, aberta e concreta, de má-

cula a direitos positivados na legislação federal comum, sendo certo que apenas as

duas “Cortes Extraordinárias” foram contempladas com o instituto da reclamação,

como, afinal, restou reafirmado no julgamento do Recurso Extraordinário nº 405.031-

Alagoas58.

58BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 405.031 – Alagoas. Recorrente, Sin-dicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado de Alagoas; Recorrido, Companhia Ener-gética de Alagoas – CEAL. Tribunal Pleno, julgamento 15/10/2008, unânime, DJe nº 71, publicação 17/04/2009, Ementário Nº 2.356-6. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=587095>. Acesso em: 23 jun. 2010.

44

De fato, nesse julgamento o Tribunal Pleno declarou a inconstitucionalidade

dos arts. 190 a 194 do Regimento Interno do Tribunal Superior Trabalho, por ausên-

cia de ato formal (lei ou emenda constitucional) autorizando-o a lançar mão de ins-

trumento similar e com os mesmos atributos processuais.

De igual forma, não é relevante, sob a perspectiva de seu caráter constituci-

onal, a vinculação necessária e obrigatória de relação endoprocessual em que as

“Cortes Extraordinárias” já tenham interagido e proferido alguma decisão. Alegue-se

na reclamatória usurpação de competência e se busque garantir a autoridade de de-

cisões, regra geral, haverá uma relação processual em curso em algum juízo ou tri-

bunal.

Não sem razão sustenta Marcelo Navarro, in verbis:

parece haver consenso em que, ao menos para a reclamação destinada a

resguardar competência, há de haver uma relação processual fluente em al-

gum juízo ou tribunal, e este ou é incompetente para processá-la, sendo

competente a corte a quem compete a reclamatória, ou, independentemente

de sê-lo, praticou algum ato, omissão ou mesmo demora que fira a atribui-

ção competencial desta.59

A recentíssima decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julga-

mento na Questão de Ordem nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordiná-

rio nº 571.572-8/Bahia, da relatoria da Ministra Ellen Gracie, é sintomática na afirma-

ção de que cabe ao Superior Tribunal de Justiça, pela via da reclamação constitucio-

nal, afastar “a divergência com a sua jurisprudência”. Confira-se a ementa do acór-

dão, in verbis:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊN-

CIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. JURISPRUDÊNCIA DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. APLICAÇÃO ÀS CONTROVÉRSIAS

SUBMETIDAS AOS JUIZADOS ESPECIAIS ESTADUAIS. RECLAMAÇÃO

PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CABIMENTO EXCEPCIO-

59DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação constitucional no direito brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000, p. 483.

45

NAL ENQUANTO NÃO CRIADO, POR LEI FEDERAL, O ÓRGÃO UNIFIR-

MIZADOR.

1.omissis

2.Quanto ao pedido de aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de

Justiça, observe-se que aquela egrégia Corte foi incumbida pela Carta Magna da missão de uniformizar a interpretação da legislação infra-constitucional, embora seja inadmissível a interposição de recurso especi-

al contra as decisões proferidas pelas turmas recursais dos juizados especi-

ais.

3. No âmbito federal, a Lei 10.259/2001 criou a Turma de Uniformização da

Jurisprudência, que pode ser acionado quando a decisão da turma recursal

contrariar a jurisprudência do STJ. É possível, ainda, a provocação dessa Corte Superior após o julgamento da matéria pela citada Turma de Uni-formização.

4. Inexistência de órgão uniformizador no âmbito dos juizados estaduais, cir-

cunstância que inviabiliza a aplicação da jurisprudência do STJ. Risco de

manutenção de decisões divergentes quanto à interpretação da legislação

federal, gerando insegurança jurídica e uma prestação jurisdicional incom-

pleta, em decorrência da inexistência de outro meio eficaz para resolvê-la.

5. Embargos declaratórios acolhidos apenas para declarar o cabimento, em

caráter excepcional, da reclamação prevista no art. 105, I, f, da Constituição

Federal, para fazer prevalecer, até a criação da turma de uniformização dos

juizados especiais estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Jus-

tiça na interpretação da legislação infraconstitucional.60 (destacou-se)

As judiciosas manifestações do julgamento dos embargos de declaração,

sintetizadas na ementa supra, são reveladoras de que a Corte Suprema prestigiou e

preservou dois valores consagradas na Constituição do Brasil: “o papel relevantíssi-

mo de órgão de uniformização de interpretação do direito federal” (Ministro Gilmar

60BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário Nº 571.572 – Bahia. Recorrente, Telemar Norte Leste S/A; Recorrido, Albérico Sampaio do Lago Pedrei-ra. Tribunal Pleno, julgamento 26/8/2009, por maioria, DJe nº 223, publicação 27/11/2009, Ementário Nº 2348-5. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=606378>. Acesso em: 23 jun. 2010.

46

Mendes) atribuído pelo legislador constituinte ao Superior Tribunal de Justiça e a

persecução de “maior efetividade e maior concretude da jurisdição” (Ministra Cár-

men Lúcia), afinal a reclamação materializa ação constitucional especial por intermé-

dio da qual “o cidadão ou a cidadã se dirige ao Poder Público visando à defesa de

direito ou ao combate de ilegalidade ou abuso de poder.” e meio hígido utilizado

para abreviar “o caminho tortuoso e demorado dos recursos previstos na legislação

processual, inegavelmente inconvenientes quando já tem a parte uma decisão defi-

nitiva.”61

Mais que isso, a ponderada decisão da Corte Suprema teve em mira, adicio-

nalmente suprir lacuna da Lei nº 9.099, de 1990, em relação à ausência de turma

nacional de uniformização de jurisprudência, evitando-se:

[…] a manutenção de decisões divergentes a respeito da interpretação da

legislação federal. Tal situação, além de provocar insegurança jurídica, aca-

ba provocando uma prestação jurisdicional incompleta, em decorrência da

inexistência de outro meio eficaz para resolvê-la.”, resguardando a autorida-

de do Superior Tribunal de Justiça assentada em “Jurisprudência consoli-dada, já sumulada ...; (Ministra Ellen Gracie)

e mais:

a) mitigar “o risco de ter a erosão da competência do STJ.”, além de a recla-

mação ter “um caráter seletivo e permite ao STJ a preservação de sua competência

enquanto órgão que uniformiza a interpretação do direito federal.” e contribuir “para

que o STJ cumpra a missão constitucional de órgão de uniformização do direito fe-

deral.”; (Ministro Gilmar Mendes) e

b) conferir “maior efetividade e maior concretude da jurisdição.” (Ministra

Cármen Lúcia)

Numa sentença: havendo, por ato ou omissão, usurpação da competência

do Superior Tribunal de Justiça em matéria já pacificada e sumulada, parta a ofensa

61Trecho da ementa e do voto de lavra da relatora, Ministra Ellen Gracie, na decisão proferida na ADI nº 2.212-1/CE, D.J. 14/11/2003, Ementário Nº 2132-3.

47

da “jurisdição comum” ou da “jurisdição especial” , ação constitucional especial con-

templada no art. 105, inciso I, alínea f, da Constituição Federal é instrumento idôneo

e eficaz à disposição do jurisdicionado.

Dito de outra forma, a última palavra sobre a melhor interpretação da legisla-

ção federal comum é do Superior Tribunal de Justiça por expresso mandamento

constitucional, não da Justiça Especializada.

A reclamação, em razão da estatura conferida pela Constituição Cidadã de

1988, não é um singelo instituto processual, a ser utilizado no bojo de uma relação

processual visando à prestação por parte do Estado, que irá, por seu órgão judiciá-

rio, aplicar o direito a um caso concreto.

Trata-se, como de longa data proclama José Frederico Marques, de um des-

dobramento das atribuições jurisdicionais que são conferidas, constitucionalmente,

àqueles Tribunais. Inserindo-se, assim, no campo do Direito Processual Constitucio-

nal, pode a ordem jurídica, mediante normas regimentais, criar providências dessa

natureza para a garantia de observância de julgados em que interfere, até mesmo, o

guardião supremo e último da própria Lei Magna.62

Significa dizer, portanto, que a preservação da intangibilidade de legislação

federal comum pela via da reclamação constitucional, mormente nas situações que

envolvem, como na espécie, atos absolutamente nulos, não pode ser diferida no

tempo, a ponto de submeter a prestação jurisdicional “[a]o caminho tortuoso e demo-

rado dos recursos previstos na legislação processual, inegavelmente inconvenientes

quando já tem a parte uma decisão definitiva.”63, com inegáveis prejuízos para o ju-

risdicional.

Outra não é, a propósito, a conclusão do Supremo Tribunal Federal no julga-

do dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 571.572-Bahia, que,

62Apud voto da Ministra Ellen Gracie nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 571.572-Bahia, Ementário nº 2348-5, p.985.

63Excerto da ementa do acórdão proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212-1-Ceará, relatora Ministra Ellen Gracie, Ementário nº 2132-13, p. 2403.

48

diante da “perplexidade manifestada pelo embargante” em relação à aparente in-

competência do Superior Tribunal de Justiça relativamente às decisões proferidas no

âmbito dos juizados especiais, decidiu que, na ausência de turma nacional de unifor-

mização da jurisprudência para os juizados especiais estaduais e

até que seja criado o órgão que possa estender e fazer a aplicação da juris -

prudência do STJ, em razão de sua função constitucional, da segurança ju-rídica e da devida prestação jurisdicional, a lógica da organização do sis-

tema judiciário nacional recomenda se dê à reclamação prevista no art. 105,

I, f, da CF amplitude suficiente à solução deste impasse. (destacou-se)

3.3 A solução que se impõe

A permanecer o atual modelo de divisão de competências delineado pelo le-

gislador constituinte, e, mais ainda, a continuar as duas “Cortes Extraordinárias” com

a competência absoluta para conhecer da ação constitucional especial da reclama-

ção, impõe-se rever o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que lhe é de-

feso imiscuir-se em decisão proferida pela “jurisdição especial”, quando, por ato ou

omissão, violar o direito positivo federal comum.

A tese que advoga a competência do Colendo Superior Tribunal de Justiça

para conhecer da reclamação prevista no art. 105, I, f, da Constituição do Brasil, na

hipótese de violação da legislação federal comum por decisões proferidas pela “ju-

risdição especial”, logo quando da ocorrência de usurpação de sua competência,

não é desarrazoada.

A razão é relativamente simples e repousa na constatação de que “o valioso

remédio jurídico” apenas foi deferido, com exclusividade, à Corte Suprema (CF: art.

102, I, l) e ao Superior Tribunal de Justiça (CF: art. 105, I, f) que, na configuração do

Poder Judiciário, foram eleitos pelo legislador constituinte de 1988 como “Cortes Ex-

traordinárias”, incumbidas, respectivamente, da guarda da Constituição (precipua-

mente) e da intangibilidade da legislação federal comum. O próprio art. 92 da Cons-

49

tituição do Brasil, em termos topográficos, é revelador da hierarquia e condição es-

pecialíssima das “Cortes Extraordinárias” como titulares da interpretação última, ou

da melhor interpretação, do direito constitucional e do direito infraconstitucional fede-

ral comum.

Mais que isso. O art. 105, inciso I, alíneas a, c, d64, v.g, da Carta Política

comprova que a “jurisdição especial” não está infensa, lato sensu, à jurisdição do

Superior Tribunal de Justiça, salvo, exclusivamente, naquela porção que diga respei-

to à legislação especial.

De outra banda, não se pode desconhecer que a partir da Emenda Constitu-

cional nº 45, de 2004, a Justiça do Trabalho teve sua competência ampliada para

julgar ações de relação de trabalho e não apenas as de relação de emprego regidas

pela Consolidação das Leis do Trabalho, significando dizer que foram aumentadas

as chances de divergências quando a matéria envolver a legislação federal comum,

de que é exemplo a violência praticada pelo Juízo do 20ª Vara do Trabalho de Brasí-

lia em relação ao dogmático direito material da impenhorabilidade do único bem de

família (Lei nº 8.009, de 1990).

É certo, ademais, que o Poder Legislativo não editou lei para disciplinar a

competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar “outras controvérsias

decorrentes da relação de emprego” de que cuida o art. 114, IX, da Constituição Fe-

deral, donde se conclui que permanece incólume a condição singular de guardião da

legislação federal comum do Superior Tribunal de Justiça.

64“Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I – processar e julgar, originalmente:

a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de res-ponsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;

d) os conflitos de competências entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, o, bem como entre tribunais e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos.” (destaquei)

50

Noutros termos, o direito infraconstitucional federal comum, salvo nas hipóte-

ses de competência residual originária do Supremo Tribunal Federal, está, todo ele,

sob a tutela do Superior Tribunal de Justiça, não havendo como chancelar a tese de

que “é vedado ao Superior Tribunal de Justiça imiscuir-se nas decisões provenientes

das Justiças Especializadas.”

É que a divisão de competências entre as “Cortes Extraordinárias” é tão

acentuada, marcante, principalmente na ótica do Superior Tribunal de Justiça, que o

guardião da “jurisdição comum” não conhece de nenhuma ação ou recurso que te-

nha por fundamento matéria de índole constitucional, diferentemente do que aconte-

ce com qualquer outro Juiz ou Tribunal.

Nessa ordem de ideias, o argumento segundo o qual o Superior Tribunal de

Justiça somente estaria autorizado a julgar, em recurso especial, as causas decidi-

das, em única ou última instância pelos Tribunais Federais ou pelos tribunais dos

Estados, do Distrito Federal e Territórios (CF: art. 105, III, a a c ) , não resiste a uma

interpretação contextualizada do próprio art. 105, na sua plenitude, e, em especial,

no cotejo com o remédio jurídico constitucional, singular, autônomo, originário, da re-

clamação prevista na alínea f do inciso I do referido artigo.

No magistério de Eros Grau, a interpretação/aplicação do direito não se re-

sume a “mera operação de subsunção”. Mais que isso:

O intérprete discerne o sentido do texto a partir e em virtude de um determi -

nado caso dado; a interpretação do direito consiste em concretar a lei em

cada só, isto é, na sua aplicação [Gadamer]. Assim, existe uma equação

mentre interpretação e aplicação: não estamos, aqui, diante de dois momen-

tos distintos, porém frente a uma só operação [Marí]. Interpretação e aplica-

ção consubstanciam um processo unitário [Gadamer], superpondo-se.

(...)

O trabalho jurídico de construção da norma aplicável a cada caso é trabalho

artesanal. Cada solução jurídica, para cada caso, será sempre, renovada-

mente, uma nova solução. Por isso mesmo –e tal deve ser enfatizado--, a

51

interpretação do direito realiza-se não como mero exercício de leitura de

textos normativos, para o que bastaria ao intérprete ser alfabetizado65.

De fato, a Constituição Federal, de forma explícita, atribui competência ao

Superior Tribunal de Justiça, lato sensu, portanto sem meio termo, para preservar a

intangibilidade da legislação federal comum contra usurpação praticada por qualquer

órgão ou tribunal da “jurisdição comum” ou da “jurisdição especial”, quer envolva a

negação de sua competência, originária ou recursal, quer consubstancie descumpri-

mento de julgado.

Logo, nas hipóteses de usurpação praticada por órgão ou tribunal da “jurisdi-

ção especial” o instrumento jurídico à disposição do jurisdicionado, como define a

Constituição Federal, é a reclamação positivada no seu art. 105, inciso I, alínea f,

sob pena de negação do modelo de repartição de competências idealizado pelo le-

gislador constituinte.

Não parece crível, nem lógico, é permitir a diminuição da eficácia da jurispru-

dência cristalizada do Superior Tribunal de Justiça com a admissão de decisões di-

vergentes sobre o direito objetivo comum, ainda que praticadas pela “jurisdição es-

pecial” .

Sim, afinal a manutenção de soluções divergentes, sobre o mesmo tema, a

exemplo da impenhorabilidade do único bem de família (Lei nº 8.009, de 1990), que,

inclusive, é objeto da Súmula nº 364, provoca, além da desconsideração do próprio

conteúdo da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, insegurança

jurídica e uma ineficaz e deficiente prestação jurisdicional, numa clara violação a um

dos fundamentos da República Federativa do Brasil, qual seja, “[...] a igualdade e a

justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, ...” (CF: Preâmbulo e art.

3º, I), e aos princípios fundamentais do devido processo legal (5º, LIV), da legalidade

(art. 5º, II), da inafastabilidade do controle jurisdicional ou do direito de ação (art. 5º,

65GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 3ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, pp. X e XI.

52

XXXV), do contraditório e ampla defesa (art. 5º, LVI) e da razoável duração do pro-

cesso (LXXXIII).

Não discrepa desse posicionamento a decisão prolatada nos Embargos de

Declaração no Recurso Extraordinário nº 571.572-Bahia, da relatoria da Ministra El-

len Gracie, por intermédio da qual o Supremo Tribunal Federal, em caso similar en-

volvendo os Juizados Especiais estaduais, julgou cabível a reclamação para o Supe-

rior Tribunal de Justiça.

Diga-se mais. No voto vista que proferiu no julgamento da Ação Direta de In-

constitucionalidade nº 2.212-1-Ceará, o Ministro Maurício Corrêa destacou, in textus:

9. Convém observar, por fim, que apenas o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, latu sensu, podem ser considerados Tri-bunais nacionais, na medida em que processam feitos em grau de recurso

tanto da Justiça Federal quanto Estadual, resolvendo, inclusive, os conflitos

de com competência entre essas esferas do Poder Judiciário (CF, artigos

102, [I], “o”, e 105, [I], ”d”). Têm nessa perspectiva na reclamação o instru-

mento de preservação de suas competências e garantia de efetividade de

suas decisões, sem que com isso haja qualquer risco de quebra de harmo-

nia entre as diversas instâncias do Poder, que é nacional, resguardada sem-

pre a hierarquia jurisdicional.

10. Note-se que a possibilidade de o Tribunal de Justiça decidir, em sede de

reclamação, que um Juiz Federal, um Tribunal Regional Federal, um Juiz do Trabalho ou um Tribunal de outro Estado, estaria usurpando sua com-

petência ou descumprindo suas decisões poderia resultar em grave risco de

ruptura do equilíbrio das instituições judiciárias. Observe-se que a excepcio-

nalidade da medida é tão grande que nem os outros Tribunais Superiores

(TST, STM e TSE) foram com ela contemplados pela Carta Federal.

Aliás, a Lei nº 10.259, de 2001, que dispõe sobre instituição dos Juizados

Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, prevê o incidente de uni-

formização perante o Tribunal Superior de Justiça (art. 14, §§ 4º a 9º)66, a reforçar, 66“Art. 14. Caberá pedido de uniformização de interpretação de lei federal quando houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por Turmas Recursais na interpretação da lei.

53

coerentemente com o texto constitucional, a condição singular de guardiã do direito

positivo federal comum do Superior Tribunal de Justiça.

Implica dizer, portanto, que a preservação da intangibilidade de legislação fe-

deral comum pela via da reclamação constitucional, mormente nas situações que

envolvem decisões teratológicas e violadoras da legislação infraconstitucional, não

pode ser diferida no tempo, a ponto de submeter a efetividade das decisões “[a]o ca-

minho tortuoso e demorado dos recursos previstos na legislação processual, inega-

velmente inconvenientes quando já tem a parte uma decisão definitiva.”67

Como leciona Inocêncio68, no Estado de Direito do século XXI todo o ordena-

mento deve estar assentado nas seguintes premissas fundamentais:

§ 1º O pedido fundado em divergência entre Turmas da mesma Região será julgado em reunião con-junta das Turmas em conflito, sob a presidência do Juiz Coordenador.

§ 2º O pedido fundado em divergência entre decisões de turmas de diferentes regiões ou da proferida em contrariedade a súmula ou jurisprudência dominante do STJ será julgado por Turma de Uniformi -zação, integrada por juízes de Turmas Recursais, sob a presidência do Coordenador da Justiça Fede-ral.

§ 3º A reunião de juízes domiciliados em cidades diversas será feita pela via eletrônica.

§ 4º Quando a orientação acolhida pela Turma de Uniformização, em questões de direito material, contrariar súmula ou jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça - STJ, a parte interes-sada poderá provocar a manifestação deste, que dirimirá a divergência.

§ 5º No caso do § 4º, presente a plausibilidade do direito invocado e havendo fundado receio de dano de difícil reparação, poderá o relator conceder, de ofício ou a requerimento do interessado, medida li-minar determinando a suspensão dos processos nos quais a controvérsia esteja estabelecida.

§ 6º Eventuais pedidos de uniformização idênticos, recebidos subseqüentemente em quaisquer Tur-mas Recursais, ficarão retidos nos autos, aguardando-se pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça.

§ 7º Se necessário, o relator pedirá informações ao Presidente da Turma Recursal ou Coordenador da Turma de Uniformização e ouvirá o Ministério Público, no prazo de cinco dias. Eventuais interessa-dos, ainda que não sejam partes no processo, poderão se manifestar, no prazo de trinta dias.

§ 8º Decorridos os prazos referidos no § 7, o relator incluirá o pedido em pauta na Seção, com prefe-rência sobre todos os demais feitos, ressalvados os processos com réus presos, os habeas corpus e os mandados de segurança.

§ 9º Publicado o acórdão respectivo, os pedidos retidos referidos no § 6º serão apreciados pelas Tur -mas Recursais, que poderão exercer juízo de retratação ou declará-los prejudicados, se veicularem tese não acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça.67Excerto da ementa do acórdão proferido na ADI nº 2.212-1-Ceará, relatora Ministra Ellen Gracie, Ementário nº 2132-13, p. 2403.68 COELHO, Inocêncio Mártires. Teoria da Constituição e Hermenêutica Constitucional. IDP: Mimeo, p. 82.

54

a) mais Constituição do que leis;

b) mais juízes do que legisladores;

c) mais princípios do que regras;

d) mais ponderação do que subsunção;

e) mais concretização do que interpretação,

afinal texto e contexto, norma e realidade, estão reciprocamente condicionados, sen-

do certo que sob o manto do Estado Constitucional, do neoconstitucionalismo, “A

Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente reali-

zadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela

estabelecida, se a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes

dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar essa or-

dem.”69

Nessa perspectiva resta indagar se, mediante fórmulas pretensamente alter-

nativas, não se está a violar a própria decisão fundamental do legislador constituinte

que, claramente, optou por atribuir ao Superior Tribunal de Justiça a nobre missão

de preservar a intangibilidade da legislação federal comum, inclusive e principalmen-

te por intermédio do instituto jurídica da reclamação. A resposta parece ser afirmati-

va!

Assim, há que se adotar interpretação compreensiva70 do texto constitucional

para resgatar e resguardar a competência do Superior Tribunal de Justiça como

guardião do direito positivo federal comum, pois somente assim será possível afas-

tar a insegurança jurídica e a incompletude da proteção judicial efetiva (CF: art. 5º,

XXXV), que resulta da ambivalência de agir discrepante entre o intérprete autêntico,

ope constitutionis, desse ramo do direito e a interpretação incidental feita pela “ju-

risdição especial”.

69 HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, p. 19. 70MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional, 2ª edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 955.

55

Arremata-se com o magistério de Eros Grau a incitar os operadores do direi-

to a um pensar crítico e evolutivo, afinal o direito é vida, é movimento:

Não se trata apenas de afirmar que o direito é norma, decisão e ordenamen-

to e estrutura, mas sobretudo –repito--, que o direito é instância da realida-

de. E que o direito é apreendido do exterior: é uma criação do homem, não

redutível às categorias e modelos rígidos da lógica formal (Menezes Cordei-

ro 1989/LXI).

Sabê-lo nos coloca diante de inúmeros desafios.

Uma enorme distância aparta o direito positivo (…) dos estudos jurídicos

que praticamos. É necessário transpormos essa distância, ainda que isso

reclame coragem e ousadia. Coragem para rompermos com conceitos, cri-

térios e princípios. Coragem para rompermos com esquemas estruturados

sobre concepções antigas, no quadro de técnicas de ensino jurídico ultra-

passadas –coragem de criarmos nossos próprios caminhos, o que reclama

ousadia.

Que tanto não nos falte, já que, afinal, não merece o privilégio de viver o seu

tempo quem não é capaz de ousar.71

71GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto, 6ª edição revista e ampliada. São Pau-lo: Malheiros Editores, 2005, p. 36.

56

5. CONCLUSÃO

O presente trabalho teve a pretensão de discutir tema fundamental para via-

bilizar segurança jurídica e uma prestação jurisdicional completa pelo órgão constitu-

cionalmente urgindo à condição de guardião do direito objetivo federal comum.

As discussões, de um modo geral, tiveram o propósito de demonstrar a exis-

tência de “vácuo”, fruto da segregação da tutela jurisdicional do direito objetivo fede-

ral entre “direito comum” e “direito especial”, com ênfase particular para a Justiça do

Trabalho que, por força da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, passou a decidir

causas imbrincadas com o direito federal comum, e, portanto, com potencial risco de

decidir em desconformidade com a jurisprudência, inclusive sumulada, do intérprete

autêntico do ramo do direito objetivo federal comum.

Nessa ordem de ideias, e após fazer breve digressão sobre a história da re-

clamação no direito brasileiro, apontando sua evolução histórica até galgar o status

de ação constitucional especial à disposição do jurisdicionado para fazer prevalecer

a competência e garantir a autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal e

do Superior Tribunal de Justiça, eleitos, respectivamente, guardião da Constituição

(precipuamente) e da ordem federativa, e da intangibilidade da legislação federal co-

mum, a pesquisa se voltou para leading case que realça a divergência de interpreta-

ção do ramo do direito comum, no caso a impenhorabilidade do bem da família, pela

Justiça do Trabalho.

Assim, tomando por referencial as discussões os embates no curso da As-

sembléia Nacional Constituinte de 1988, que, de forma inequívoca, realça a opção

política do legislador constituinte pela atribuição de competência do Superior Tribu-

nal de Justiça como intérprete autêntico e qualificado do direito federal comum, con-

verge para o entendimento de que:

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a) carece de razoabilidade o posicionamento do Superior Tribunal de Justi -

ça, que, a pretexto de não lhe cabe se imiscuir em decisão proferida pela Justiça Es-

pecializada, abdica da competência originária e absoluta para conhecer de reclama-

ção constitucional positivada no art. 105, inciso I, alínea f, da Constituição do Brasil;

b) constando a reclamação, como consta, da competência originária do Su-

perior Tribunal de Justiça, padece de consistência o argumento que, ignorando inter-

pretação integrada do próprio art. 105 da Constituição, no seu todo, se volte pontual -

mente para o inciso III desse mesmo artigo (recurso especial) para negar a compe-

tência daquela “Corte Extraordinária” quando a usurpação de sua competência parta

de ato ou omissão perpetrado pela Justiça Especializada;

c) o entendimento consolidada do Supremo Tribunal Federal quanto a natu-

reza singular da reclamação constitucional, e, mais recentemente, a decisão proferi-

da no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº

571.572-Bahia, da relatoria do Ministra Ellen Gracie, não deixa margem a dúvida

que o remédio jurídico de extração constitucional da reclamação não pode sofrer li-

mitação protetiva, sob pena de comprometer a efetividade e a concretização da juris-

dição em sede de direito federal comum;

d) não se faz necessário, como outrora, recorrer à teoria dos poderes consti-

tucionais implícitos, haja vista que o legislador constituinte, inequivocamente, atri-

buiu ao Superior Tribunal de Justiça a guardar da intangibilidade do direito federal

comum;

e) como natural decorrência desse poder-dever, o Superior Tribunal de Justi-

ça é intérprete autêntico e qualificado do direito federal comum, de tal sorte que tan-

to os aplicadores da “jurisdição comum” como os da “jurisdição especial” devem ob-

servar a sua jurisprudência, principalmente a cristalizada em verbete sumular, sob o

risco de esvaziamento missão daquela “Corte Extraordinária”, enquanto órgão judi -

cial de uniformização da interpretação do direito federal.

58

Em síntese, como decorrência do modelo rígido de divisão de competências

entre o Supremo Tribunal Federal –guarda da Constituição, precipuamente-- e o Su-

perior Tribunal de Justiça –guarda da uniformidade de interpretação e aplicação do

direito federal comum--, e tendo presente, de um lado, que um dos fundamentos da

República Federativa do Brasil, se alicerça na igualdade e na justiça “como valores

supremos de uma sociedade fraterna”, e, de outro, que essa mesma Constituição

defere ao jurisdicionados direitos fundamentais de índole processual expressos nos

princípios do devido processo (art. 5º, LIV), da legalidade (art.5º, II), inafastabilidade

do controle jurisdicional ou do direito de ação (art. 5º, XXXV), do contraditório e am-

pla defesa (CF: art.5º, LVI) e da razoável duração do processo (art. 5º, LXXXIII)-,é

forçoso concluir que aplicação supletiva desse ramo do direito pela “jurisdição espe-

cial” submete-se à tutela do órgão qualificado, ope constitutionis, guardião, por exce-

lência, do direito objetivo federal comum.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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