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Informativo 901-STF (16/05/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 901-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processo não comentado em virtude de o julgamento não ter se concluído. Será comentado assim que chegar ao fim: ADI 5.766/DF. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL CNJ CNJ pode avocar PAD que tramita no Tribunal se não há quórum suficiente para se atingir maioria absoluta. DIREITO ADMINISTRATIVO RESPONSABILIDADE CIVIL Responsabilidade civil da concessionária que administra a rodovia por furto ocorrido em seu pátio. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Ação de improbidade administrativa: ministro de estado e foro competente. DIREITO ELEITORAL INFIDELIDADE PARTIDÁRIA Análise da constitucionalidade do art. 22-A da Lei 9.096/95. DIREITO PENAL PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA (In) aplicabilidade do princípio no caso do crime previsto no art. 34 da Lei 9.605/98. DIREITO PROCESSUAL PENAL PROVA Indeferimento de todas as testemunhas da defesa sob o argumento de que seriam protelatórias: constrangimento ilegal.

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Informativo 901-STF (16/05/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 901-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Processo não comentado em virtude de o julgamento não ter se concluído. Será comentado assim que chegar ao fim: ADI 5.766/DF.

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

CNJ CNJ pode avocar PAD que tramita no Tribunal se não há quórum suficiente para se atingir maioria absoluta.

DIREITO ADMINISTRATIVO

RESPONSABILIDADE CIVIL Responsabilidade civil da concessionária que administra a rodovia por furto ocorrido em seu pátio. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Ação de improbidade administrativa: ministro de estado e foro competente.

DIREITO ELEITORAL

INFIDELIDADE PARTIDÁRIA Análise da constitucionalidade do art. 22-A da Lei 9.096/95.

DIREITO PENAL

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA (In) aplicabilidade do princípio no caso do crime previsto no art. 34 da Lei 9.605/98.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROVA Indeferimento de todas as testemunhas da defesa sob o argumento de que seriam protelatórias: constrangimento ilegal.

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DIREITO CONSTITUCIONAL

CNJ CNJ pode avocar PAD que tramita no Tribunal

se não há quórum suficiente para se atingir maioria absoluta

O TRF condenou juiz federal à pena de aposentadoria compulsória. Ocorre que, em virtude de alguns Desembargadores terem se averbado suspeitos, este juiz foi condenado com um quórum de maioria simples.

O CNJ reconheceu a irregularidade da proclamação do resultado e anulou o julgamento de mérito realizado pelo TRF. Isso porque o art. 93, VIII e X, da CF/88 exige quórum de maioria absoluta do tribunal.

Ocorre que o CNJ, após anular o julgamento de mérito realizado pelo TRF, decidiu avocar o processo administrativo para que o magistrado fosse julgado diretamente pelo Conselho.

O juiz impetrou MS contra essa avocação, mas o STF afirmou que o CNJ agiu corretamente.

A Constituição, expressamente, confere ao CNJ competência para, a qualquer tempo, avocar processos de natureza disciplinar em curso contra membros do Poder Judiciário. Assim, não há óbice para que o CNJ anule o julgamento do Tribunal e inicie lá um outro procedimento.

Uma das causas legítimas de avocação de procedimentos administrativos pelo CNJ é justamente a falta do quórum para proferir decisão administrativa por maioria absoluta em razão de suspeição, impedimento ou falta de magistrados.

O CNJ poderia ter devolvido o processo ao TRF2, mas optou por exercer sua competência concorrente, dentro da discricionariedade conferida pela Constituição, para julgar o processo e evitar novas questões de suspeição e impedimento.

STF. 1ª Turma. MS 35100/DF, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

Imagine a seguinte situação hipotética: Determinado Juiz Federal praticou ilícito que configurou grave infração disciplinar. O TRF, em processo administrativo disciplinar, condenou este Juiz à pena de aposentadoria compulsória. Ocorre que, em virtude de alguns Desembargadores terem se averbado suspeitos, este magistrado foi condenado com um quórum de maioria simples. Detalhando mais: 9 dos 27 integrantes do TRF2 se declararam suspeitos. Com isso, apenas 18 votaram. 10 Desembargadores votaram a favor da aposentadoria e 8 contra. Desse modo, foi atingida a maioria simples (maioria dos votantes), mas não a maioria absoluta do Tribunal. O magistrado condenado ingressou, então, com uma reclamação no CNJ. O que fez o CNJ? O Conselho reconheceu que a condenação proferida pelo TRF foi indevida. Isso porque o art. 93, VIII e X, da CF/88 exige quórum de maioria absoluta do tribunal e, no caso concreto, foi atingida apenas a maioria simples:

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (...) VIII - o ato de remoção, disponibilidade e aposentadoria do magistrado, por interesse público, fundar-se-á em decisão por voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada ampla defesa;

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(...) X - as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros;

Aconteceu algo, no entanto, que o Juiz não esperava: o CNJ, após anular o julgamento de mérito realizado pelo TRF, decidiu AVOCAR o processo administrativo para que o magistrado fosse julgado diretamente pelo Conselho. O juiz impetrou MS no STF contra essa decisão do Conselho. No MS impetrado, o magistrado alega que, diante da ausência de maioria absoluta pela condenação, deveria ser declarada a sua absolvição. O que decidiu o STF? O STF afirmou que o CNJ agiu corretamente:

A Constituição, expressamente, confere ao CNJ competência para, a qualquer tempo, avocar processos de natureza disciplinar em curso contra membros do Poder Judiciário. Assim, não há óbice para que o CNJ anule o julgamento do Tribunal e inicie lá um outro procedimento. Uma das causas legítimas de avocação de procedimentos administrativos pelo CNJ é justamente a falta do quórum para proferir decisão administrativa por maioria absoluta em razão de suspeição, impedimento ou falta de magistrados. O CNJ poderia ter devolvido o processo ao TRF2, mas optou por exercer sua competência concorrente, dentro da discricionariedade conferida pela Constituição, para julgar o processo e evitar novas questões de suspeição e impedimento. STF. 1ª Turma. MS 35.100/DF, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

DIREITO ADMINISTRATIVO

RESPONSABILIDADE CIVIL Responsabilidade civil da concessionária que administra

a rodovia por furto ocorrido em seu pátio

A pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público possui responsabilidade civil em razão de dano decorrente de crime de furto praticado em suas dependências, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/88.

Caso concreto: o caminhão de uma empresa transportadora foi parado na balança de pesagem na Rodovia Anhanguera (SP), quando se constatou excesso de peso. Os agentes da concessionária determinaram que o condutor estacionasse o veículo no pátio da concessionária e, em seguida, conduziram-no até o escritório para ser autuado.

Aproximadamente 10 minutos depois, ao retornar da autuação para o caminhão, o condutor observou que o veículo havia sido furtado.

O STF condenou a Dersa – Desenvolvimento Rodoviário S/A, empresa concessionária responsável pela rodovia a indenizar a transportadora.

O Supremo reconheceu a responsabilidade civil da prestadora de serviço público, ao considerar que houve omissão no dever de vigilância e falha na prestação e organização do serviço.

STF. 1ª Turma. RE 598356/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

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A situação concreta foi a seguinte: A DERSA (Desenvolvimento Rodoviário S/A.) é uma sociedade de economia mista, controlada pelo Governo do Estado de São Paulo, cujo objetivo é construir, operar, manter e administrar rodovias, algumas delas através de remuneração por meio de pedágio. Trata-se, portanto, de uma concessionária de serviço público (obs: existe uma polêmica doutrinária se uma entidade da administração pública pode ser considerada concessionária de serviço público; neste julgado, o STF expressamente considerou a DERSA como uma concessionária de serviço público). Em 1997, o caminhão de uma transportadora foi parado na balança de pesagem na Rodovia Anhanguera (SP), quando se constatou excesso de peso. Vale ressaltar que esta rodovia era administrada pela DERSA. Os agentes da concessionária determinaram que o condutor estacionasse o veículo no pátio da DERSA e, em seguida, o conduziram até o escritório para ser autuado. Aproximadamente 10 minutos depois, ao retornar da autuação para o caminhão, o condutor observou que o veículo havia sido furtado. A DERSA tem o dever de indenizar a empresa proprietária do veículo em decorrência desse furto? SIM.

A pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público possui responsabilidade civil em razão de dano decorrente de crime de furto praticado em suas dependências, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/88. O STF condenou a Dersa – Desenvolvimento Rodoviário S/A, empresa concessionária responsável pela rodovia, a indenizar a transportadora. O Supremo reconheceu a responsabilidade civil da prestadora de serviço público, ao considerar que houve omissão no dever de vigilância e falha na prestação e organização do serviço. STF. 1ª Turma. RE 598356/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

Com base no art. 37, § 6º, da CF/88, o Min. Marco Aurélio entendeu que há responsabilidade civil objetiva do Estado, ou da empresa prestadora do serviço público, em razão de dano decorrente de crime de furto praticado em posto de pesagem, considerada a omissão no dever de vigilância e falha na prestação e organização do serviço. Vamos relembrar o que diz o art. 37, § 6º da CF/88:

Art. 37 (...) § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Repare que o STF reconheceu a responsabilidade objetiva da concessionária pela omissão no dever de vigilância e falha na prestação e organização do serviço. O Min. Marco Aurélio considerou que o Estado, por ter maior quantidade de poderes e prerrogativas, deve suportar o ônus das atividades desenvolvidas. “Não há espaço para afastar responsabilidade independentemente de culpa, mesmo sob a ótica da omissão, ante o princípio da legalidade, presente a teoria do risco administrativo”. Ainda segundo o Ministro Relator, o STF, no RE 841526, consolidou o entendimento de que o art. 37, § 6º da CF/88 aplica-se também para as omissões administrativas.

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IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Ação de improbidade administrativa: ministro de estado e foro competente

Importante!!!

Os agentes políticos, com exceção do Presidente da República, encontram-se sujeitos a duplo regime sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade.

O foro especial por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal em relação às infrações penais comuns não é extensível às ações de improbidade administrativa.

STF. Plenário. Pet 3240 AgR/DF, rel. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 10/5/2018 (Info 901).

Dois temas geravam muita polêmica no Direito Administrativo: 1) A Lei de improbidade administrativa aplica-se ou não aos agentes políticos? 2) Existe ou não foro por prerrogativa de função (“foro privilegiado”) nas ações de improbidade administrativa? Vamos entender com calma. Crimes de responsabilidade Os agentes políticos estão sujeitos à prática de crimes de responsabilidade. Os crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas praticadas por pessoas que ocupam determinados cargos públicos. Caso o agente seja condenado por crime de responsabilidade, ele não receberá sanções penais (prisão ou multa), mas sim sanções político-administrativas (perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública). Crimes de responsabilidade x improbidade administrativa Como nos crimes de responsabilidade as infrações são muito próximas (parecidas) com os atos de improbidade administrativa, surgiu a tese de que se o agente político fosse condenado por crime de responsabilidade e também improbidade administrativa, haveria bis in idem. Assim, defendeu-se o argumento de que os agentes políticos deveriam estar sujeitos apenas e tão somente aos crimes de responsabilidade (não sendo a eles aplicados os atos de improbidade administrativa). Essa tese prevalece atualmente? NÃO. O entendimento atual é o de que, em regra, os agentes políticos podem sim responder por ato de improbidade administrativa. Vigora aquilo que a jurisprudência chamou de “duplo regime sancionatório”, ou seja, o fato de o agente estar sujeito a: • crime de responsabilidade e • improbidade administrativa. Constituição prevê crime de responsabilidade e improbidade como institutos autônomos Fazendo uma interpretação sistemática do texto constitucional, conclui-se que há nítida distinção entre os conceitos de improbidade administrativa e de crime de responsabilidade. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92) foi editada com fundamento no art. 37, §4º, da CF:

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§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Por outro lado, a CF/88 trata sobre os crimes de responsabilidade em outros dispositivos:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; (Redação dada pela EC 23/99) [...] Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: [...] V - a probidade na administração; [...] Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: [...] c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente; (Redação dada pela EC 23/99)

Assim, a tentativa de imunizar os agentes políticos das sanções da ação de improbidade administrativa a pretexto de que essas seriam absorvidas pelo crime de responsabilidade não tem fundamento constitucional. É plenamente possível a concorrência de esferas de responsabilização distintas.

Eu entendo que há, no Brasil, uma dupla normatividade em matéria de improbidade, com objetivos distintos: em primeiro lugar, existe aquela específica da Lei 8.429/1992, de tipificação cerrada mas de incidência sobre um vasto rol de possíveis acusados, incluindo até mesmo pessoas que não tenham qualquer vínculo funcional com a Administração Pública (Lei 8.429/1992, art. 3º); e uma outra normatividade relacionada à exigência de probidade que a Constituição faz em relação aos agentes políticos, especialmente ao chefe do Poder Executivo e aos ministros de Estado, ao estabelecer no art. 85, inciso V, que constituem crime de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a probidade da administração. No plano infraconstitucional essa segunda normatividade se completa com o art. 9º da Lei 1.079/1950. Trata-se de disciplinas normativas diversas, as quais, embora visando, ambas, à preservação do mesmo valor ou princípio constitucional, – isto é, a moralidade na Administração Pública – têm, porém, objetivos constitucionais diversos. (...) Não há impedimento à coexistência entre esses dois sistemas de responsabilização dos agentes do Estado. STF. Plenário. Pet 3923 QO, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgado em 13/06/2007.

Desse modo, o que prevalece atualmente é que os agentes políticos, em regra, submetem-se às punições por ato de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92), sem prejuízo de também poderem ser punidos por crimes de responsabilidade. Nesse sentido:

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(...) O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que os agentes políticos se submetem aos ditames da Lei de Improbidade Administrativa, sem prejuízo da responsabilização política e criminal. (...) STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 1607976/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 17/10/2017.

Por que se falou “em regra”? Existe algum caso em que o agente político não responderá por improbidade administrativa (devendo ser punido apenas por crime de responsabilidade)? SIM. O Presidente da República. Os agentes políticos, com exceção do presidente da República, encontram-se sujeitos a um duplo regime sancionatório, e se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade.

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. DUPLO REGIME SANCIONATÓRIO DOS AGENTES POLÍTICOS: LEGITIMIDADE. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência assentada no STJ, inclusive por sua Corte Especial, é no sentido de que, "excetuada a hipótese de atos de improbidade praticados pelo Presidente da República (art. 85, V), cujo julgamento se dá em regime especial pelo Senado Federal (art. 86), não há norma constitucional alguma que imunize os agentes políticos, sujeitos a crime de responsabilidade, de qualquer das sanções por ato de improbidade previstas no art. 37, § 4º. Seria incompatível com a Constituição eventual preceito normativo infraconstitucional que impusesse imunidade dessa natureza" (Rcl 2.790/SC, DJe de 04/03/2010). (...) STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1099900/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 16/11/2010.

E quanto ao foro competente? Existe foro por prerrogativa de função nas ações de improbidade administrativa? NÃO. A ação de improbidade administrativa possui natureza cível. Em outras palavras, é uma ação civil e não uma ação penal. Em regra, somente existe foro por prerrogativa de função no caso de ações penais (e não em demandas cíveis). Ex1: se for proposta uma ação penal contra um Deputado Federal por crime que ele tenha cometido durante o seu mandato e que esteja relacionado com as suas funções, esta deverá ser ajuizada no STF. Ex2: se for ajuizada uma ação de cobrança de dívida contra esse mesmo Deputado, a demanda será julgada por um juízo de 1ª instância. Por que existe essa diferença? Porque a Constituição assim idealizou o sistema. Com efeito, as competências do STF e do STJ foram previstas pela CF/88 de forma expressa e taxativa. Nos arts. 102 e 105 da CF/88, que estabelecem as competências do STF e do STJ, existe a previsão de que as ações penais contra determinadas autoridades serão julgadas por esses Tribunais. Não há, contudo, nenhuma regra que disponha que as ações de improbidade serão julgadas pelo STF e STJ. Lei nº 10.628/2012 previu foro por prerrogativa de função para a ação de improbidade: Em 24/12/2002, foi editada a Lei nº 10.628, que acrescentou o § 2º ao art. 84 do CPP, prevendo foro por prerrogativa de função para as ações de improbidade. Veja:

Art. 84. A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade. (...)

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§ 2º A ação de improbidade, de que trata a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1º.

Diante dessa alteração legislativa, foi proposta a ADI 2797 contra a Lei nº 10.628/2002 e o STF julgou inconstitucional o referido § 2º do art. 84 do CPP, decisão proferida em 15/09/2005. O Supremo decidiu que:

“no plano federal, as hipóteses de competência cível ou criminal dos tribunais da União são as previstas na Constituição da República ou dela implicitamente decorrentes. (...) Quanto aos Tribunais locais, a Constituição Federal — salvo as hipóteses dos seus arts. 29, X e 96, III —, reservou explicitamente às Constituições dos Estados-membros a definição da competência dos seus tribunais, o que afasta a possibilidade de ser ela alterada por lei federal ordinária.” STF. Plenário. ADI 2797, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 15/09/2005.

Em suma, o STF afirmou que, como a Constituição não estabeleceu foro por prerrogativa de função para as ações de improbidade administrativa, a lei ordinária assim não poderia prever. Desse modo, com a decisão da ADI 2797, ficou prevalecendo o entendimento de que as ações de improbidade administrativa deveriam ser julgadas em 1ª instância. O STF reafirmou esse entendimento e fixou a seguinte tese:

Não existe foro por prerrogativa de função em ação de improbidade administrativa proposta contra agente político. O foro por prerrogativa de função é previsto pela Constituição Federal apenas para as infrações penais comuns, não podendo ser estendido para ações de improbidade administrativa, que têm natureza civil. STF. Plenário. Pet 3240 AgR/DF, rel. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 10/5/2018 (Info 901).

DIREITO ELEITORAL

INFIDELIDADE PARTIDÁRIA Análise da constitucionalidade do art. 22-A da Lei 9.096/95

O art. 1º da Resolução 22.610/2007, do TSE, previa que a criação de novo partido político era considerada como justa causa para desfiliação, sem perda do mandato, desde que a nova filiação ocorresse em 30 dias da criação da sigla.

O art. 22-A da Lei nº 9.096/95, introduzido pela Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015 (minirreforma eleitoral de 2015), excluiu a criação de nova legenda como hipótese de justa causa para a desfiliação, sem perda de mandato, por infidelidade partidária.

Desse modo, a troca de partido, mesmo decorrente da criação de nova legenda, passou a ser considerada como hipótese de infidelidade partidária, sujeita à perda do mandato.

Ocorre que, quando a Lei nº 13.165 foi editada, em 29/09/2015, 3 novos partidos haviam acabado de ser registrados no TSE, de modo que estavam correndo seus prazos de 30 dias para que recebessem parlamentares detentores de mandato eletivo, ao abrigo da justa causa de desfiliação.

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Diante disso, o Min. Roberto Barroso, em decisão monocrática, entendeu que o art. 22-A não poderia ser aplicado para esses 3 partidos, sob pena de violação da segurança jurídica, na modalidade direito adquirido, tanto das agremiações recém-criadas quanto dos parlamentares que pretendiam se filiar a elas. Ele, então, determinou que esses 3 partidos tivessem direito de receber de volta os 30 dias para que os detentores de mandatos eletivos pudessem se filiar a novas agremiações que tenham sido registradas no TSE antes da entrada em vigor da lei impugnada.

O Plenário do STF referendou essa medida cautelar.

STF. Plenário. ADI 5398/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 9/5/2018 (Info 901).

Filiação partidária No Brasil, a pessoa só pode concorrer a um cargo eletivo se ela estiver filiada a um partido político. Essa exigência está prevista no art. 14, § 3º, V, da CF/88. Infidelidade partidária Mesmo não havendo uma norma expressa na lei ou na CF/88 dizendo isso, o TSE e o STF, em 2007, decidiram que a infidelidade partidária era causa de perda do mandato eletivo. Em outras palavras, o TSE e o STF firmaram a tese de que, se o titular do mandato eletivo, sem justa causa, sair do partido político no qual foi eleito, ele perderá o cargo que ocupa. Resolução 22.610/2007-TSE Como não havia lei disciplinando o tema, o TSE editou a Resolução nº 22.610/2007 regulamentando as hipóteses e a forma como ocorre a perda do mandato eletivo em caso de infidelidade partidária. O art. 1º da Resolução reafirma a tese da infidelidade e prevê que o partido político pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda do cargo eletivo caso o ocupante do mandato, sem possuir uma justa causa, desfilie-se do partido pelo qual foi eleito. Quais são as hipóteses que podem ser consideradas como "justa causa"? A Resolução trouxe um rol de situações que são consideradas como "justa causa". Assim, segundo a Resolução do TSE, o detentor do cargo eletivo poderia sair do partido sem perder o mandato nos seguintes casos: a) se o partido em que ele se elegeu passou por um processo de incorporação ou fusão com outro partido; b) se o detentor do cargo sai do partido pelo qual se elegeu para se filiar a um novo partido que foi recém criado; c) se ficar provado que houve uma mudança substancial no partido ou desvio reiterado do programa partidário; d) se ficar provado que o detentor do cargo sofre grave discriminação pessoal no partido. Vale ressaltar que o STF decidiu que esta Resolução do TSE é constitucional, tanto do ponto de vista formal como material (ADIs 3999 e 5081). O que fez a Lei nº 13.165/2015? A Lei nº 13.165/2015 alterou a Lei nº 9.096/95, passando a tratar expressamente sobre o tema "infidelidade partidária". Veja o artigo que foi acrescentado:

Art. 22-A. Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito. Parágrafo único. Consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as seguintes hipóteses:

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I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; II - grave discriminação política pessoal; e III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.

INFIDELIDADE PARTIDÁRIA

O detentor de cargo eletivo que, sem justa causa, se desfiliar do partido político, perderá o mandato. O que pode ser considerado como "justa causa"?

ANTES da Lei 13.165/2015 (Resolução 22.610/2007)

ATUALMENTE (art. 22-A da Lei nº 9.096/95)

Existiam quatro hipóteses de justa causa: 1) incorporação ou fusão do partido; 2) criação de novo partido; 3) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; 4) grave discriminação pessoal.

Existem agora apenas três hipóteses: 1) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; 2) grave discriminação política pessoal; e 3) mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.

A criação de novo partido não foi mais prevista como “justa causa”. De acordo com a Resolução nº 22.610/2007 e a Consulta nº 755-35, a criação de novo partido político era considerada como justa causa para desfiliação, sem perda do mandato, desde que a nova filiação ocorresse em 30 dias da criação da sigla. O art. 22-A da Lei nº 9.096/95, introduzido pela Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015 (minirreforma eleitoral de 2015), excluiu essa hipótese de justa causa. Desse modo, a troca de partido, mesmo decorrente da criação de nova legenda, passou a ser considerada como hipótese de infidelidade partidária, gerando a perda do mandato. Situação da Rede e de outros partidos recém criados que foram atingidos pela Lei nº 13.165/2015 Em 15/09/2015, foi criado o Partido Novo. Em 22/09/2018, foi criada a Rede Sustentabilidade. Em 29/09/2015, foi criado o Partido da Mulher Brasileira. Pelas regras da Resolução nº 22.610/2007, os políticos que quisessem, poderiam, dentro do prazo de 30 dias, migrar para os novos partidos (Partido Novo, Rede e Partido da Mulher Brasileira) sem perder seus mandatos. Ex: assim que foi criada a Rede, o Deputado Federal Alessandro Molon, que era do PT, anunciou que tinha a intenção de migrar para o novo partido. Pelas regras do TSE, se o político mudasse para o novo partido no prazo máximo de 30 dias após a sua criação, ele não perderia o mandato. Qual foi, no entanto, o “problema” que surgiu com a Lei nº 13.165/2015? Uma semana depois da criação da Rede, foi publicada e entrou em vigor a Lei nº 13.165/2015 (em 29/09/2015).

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Como vimos acima, a Lei nº 13.165/2015, ao acrescentar o art. 22-A, acabou com a permissão que a Resolução previa de o político migrar para o novo partido sem perder o mandato. Em outras palavras, a Lei nº 13.165/2015 disse o seguinte: a partir de 29/09/2015, se o político mudar de partido, mesmo que seja para ingressar em um novo partido recém criado, ele perderá o mandato (salvo se houver alguma justa causa). Desse modo, o Deputado Federal Alessandro Molon e todos os outros políticos que estavam se preparando para migrar para a Rede (e para os outros dois partidos recém criados) foram surpreendidos com a nova Lei, que proibiu essa possibilidade. Eles tinham 30 dias para mudar para o novo partido sem perder o mandato. No entanto, a Lei nº 13.165/2015, ao entrar em vigor uma semana depois da criação da nova agremiação, acabou com essa permissão. Diante disso, o que fez a Rede? Ingressou com uma ADI no STF alegando que o art. 22-A da Lei nº 9.096/95, inserido pela Lei nº 13.165/2015, seria inconstitucional. A ação proposta apresentou dois argumentos principais: 1) O art. 22-A, ao não considerar a criação de novo partido político como uma justa causa para a desfiliação partidária, viola os princípios democrático, do pluralismo político e da livre criação de partidos. Em outras palavras, o art. 22-A não poderia ter acabado com essa hipótese de justa causa. 2) Ainda que se considere que o art. 22-A poderia ter acabado com essa hipótese de justa causa, ele não poderia ser aplicado para os partidos políticos que foram registrados antes da entrada em vigor da Lei nº 13.165/2015, e cujo prazo de 30 dias para as filiações de detentores de mandato eletivo ainda estava transcorrendo. Em outros termos, o art. 22-A não poderia ter interferido nas filiações que estavam ocorrendo na Rede (partido recém criado) porque essas filiações estavam ocorrendo dentro do prazo de 30 dias previsto na Resolução do TSE para a troca de partido decorrente da criação de nova agremiação. A Lei, ao interromper este prazo no meio violou os princípios da segurança jurídica, do direito adquirido e da irretroatividade das normas sancionadoras. O que aconteceu em seguida? No dia 09/11/2015, o Min. Luis Roberto Barroso, monocraticamente, deferiu liminar, ad referendum do Plenário*, para determinar a devolução integral do prazo de 30 dias para filiações aos partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral até a data da entrada em vigor da Lei nº 13.165/2015. * significa que o Ministro falou: em virtude da urgência, eu decido monocraticamente, mas esta minha decisão ainda será apreciada pelo Plenário, que poderá referendá-la (confirmá-la) ou reformá-la. Explicando melhor a decisão do Min. Barroso Se o art. 22-A incidisse sobre as situações jurídicas pendentes relacionadas com os partidos políticos recém-criados, isso violaria o direito adquirido dessas legendas. O Ministro entendeu que a questão envolve direito intertemporal (conflito de leis no tempo). Isso porque na data em que a Lei nº 13.165 foi editada, em 29/09/2015, 3 novos partidos haviam acabado de ser registrados no TSE, de modo que estavam correndo seus prazos de 30 dias para que recebessem parlamentares detentores de mandato eletivo, ao abrigo da justa causa de desfiliação, conforme fixado pelo TSE na Resolução nº 22.610/2007 e na Consulta nº 755-35. Tome-se o exemplo da Rede. A Rede Sustentabilidade obteve registro no TSE em 22/09/2015. Isso significa que o partido teria 30 dias (ou seja, até 22/10/2015) para receber filiados detentores de mandatos eletivos, sem que estes perdessem o cargo. Todavia, quando alcançou o 7º dia do prazo, a Lei nº 13.165/2015 entrou em vigor, excluindo a possibilidade de imediata migração de parlamentares amparada pela justa causa de “criação de novo partido”. Passou, assim, a sujeitar os que mudassem de partido à perda de mandato eletivo por infidelidade partidária. Desse modo, com a Lei nº 13.165/2015, houve um completo desestímulo de novas filiações no novo partido.

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Assim, o Min. Barroso entendeu que houve uma ofensa ao direito adquirido dos partidos que haviam acabado de ser criados (Partido Novo, Rede ou Partido da Mulher Brasileira). Isso porque, quando a Lei entrou em vigor, os partidos já estavam criados, o que fez surgir para eles o direito de receberem em seus quadros detentores de mandato eletivo, ao abrigo da justa causa então vigente. Tal direito não poderia ser desconsiderado por eventual alteração legislativa. Se o art. 22-A se aplicasse para os 3 partidos acima e impedisse a migração que estava ocorrendo no prazo de 30 dias, isso significaria uma indevida retroatividade da lei. Para o Min. Barroso, seria necessário proteger as situações estabilizadas pela previsão normativa anterior, assegurando uma transição razoável, em respeito às legítimas expectativas geradas nas novas agremiações e também em parlamentares que estivessem em vias de se filiarem a elas. A proteção das legítimas expectativas criadas em particulares por atos do próprio Poder Público decorre da obrigação estatal de agir com boa-fé. A boa-fé exige que as autoridades públicas protejam a confiança e as legítimas expectativas, inclusive frente a alterações legislativas posteriores. Qual foi o outro “capítulo” desse enredo? Em 09/05/2018, o Plenário do STF referendou (confirmou) a medida cautelar que havia sido concedida monocraticamente pelo Min. Barroso. O STF entendeu que houve violação à segurança jurídica, na modalidade direito adquirido, tanto das agremiações recém-criadas quanto dos parlamentares que pretendiam se filiar a elas. Criada a legenda antes da vigência da lei, o partido tem o direito de receber novas filiações. O princípio da segurança jurídica exige uma forma de transição legítima e razoável, vedada a retroação do novo regime às situações já consolidadas. Ademais, a transferência sem perda de mandato era um direito subjetivo dos congressistas. Não pode uma lei superveniente retirar direito que já havia sido adquirido com base na sistemática anterior. Vale ressaltar que a decisão monocrática do Min. Barroso já exauriu seus efeitos. Ele determinou, na decisão, que os 3 partidos tivessem de volta os 30 dias para receber filiações de parlamentares sem que estes perdessem o mandato eletivo. Este prazo, contudo, foi contato da data em que a decisão monocrática foi proferida (novembro de 2015) e já expirou. E o argumento 1 veiculado na ADI? O art. 22-A da Lei nº 9.096/95 é inconstitucional? Tirando o caso desses 3 partidos, que tiveram direito a manter esse prazo de 30 dias, a criação de novo partido é ou não hipótese de justa causa? Isso ainda não foi decidido. Ainda será apreciado pelo STF. Até agora o Supremo apenas afirmou que a decisão do Ministro foi correta. Esta decisão, contudo, conforme expliquei, já exauriu seus efeitos. Resumindo:

O art. 1º da Resolução 22.610/2007, do TSE, previa que a criação de novo partido político era considerada como justa causa para desfiliação, sem perda do mandato, desde que a nova filiação ocorresse em 30 dias da criação da sigla. O art. 22-A da Lei nº 9.096/95, introduzido pela Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015 (minirreforma eleitoral de 2015), excluiu a criação de nova legenda como hipótese de justa causa para a desfiliação, sem perda de mandato por infidelidade partidária. Desse modo, a troca de partido, mesmo decorrente da criação de nova legenda, passou a ser considerada como hipótese de infidelidade partidária, sujeita à perda do mandato. Ocorre que, quando a Lei nº 13.165 foi editada, em 29/09/2015, 3 novos partidos haviam acabado de ser registrados no TSE, de modo que estavam correndo seus prazos de 30 dias para que recebessem parlamentares detentores de mandato eletivo, ao abrigo da justa causa de desfiliação.

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Diante disso, o Min. Roberto Barroso, em decisão monocrática, entendeu que o art. 22-A não poderia ser aplicado para esses 3 partidos, sob pena de violação da segurança jurídica, na modalidade direito adquirido, tanto das agremiações recém-criadas quanto dos parlamentares que pretendiam se filiar a elas. Ele, então, determinou que esses 3 partidos tivessem direito de receber de volta os 30 dias para que os detentores de mandatos eletivos pudessem se filiar a novas agremiações que tenham sido registradas no TSE antes da entrada em vigor da lei impugnada. O Plenário do STF referendou essa medida cautelar. STF. Plenário. ADI 5398/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 9/5/2018 (Info 901).

DIREITO PENAL

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA (In) aplicabilidade do princípio no caso do crime previsto no art. 34 da Lei 9.605/98

O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98:

Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:

Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:

II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;

Caso concreto: realização de pesca de 7kg de camarão em período de defeso com o uso de método não permitido.

STF. 1ª Turma. HC 122560/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

Obs: apesar de a redação utilizada no informativo original ter sido bem incisiva (“O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98”), existem julgados tanto do STF como do STJ aplicando, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o delito de pesca ilegal. Deve-se ficar atenta(o) para como isso será cobrado no enunciado da prova.

Imagine a seguinte situação adaptada: João foi encontrado pescando camarões pelo método de arrasto motorizado no período de defeso:

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Esse método não é permitido no período de defeso. Em seu barco foram localizados 7kg de camarão-rosa. Diante desse fato, João foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 34, caput e parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais):

Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente: Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem: II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;

A defesa invocou a aplicação do princípio da insignificância e o caso chegou até o STF. Indaga-se: o Supremo admitiu a incidência da insignificância neste caso concreto? NÃO. O STF decidiu que:

O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98. STF. 1ª Turma. HC 122560/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

O Ministro Relator assim fundamentou sua decisão:

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A jurisprudência aplica o princípio da insignificância para o crime de pesca ilegal? Essa resposta envolve três afirmações: 1) A jurisprudência entende que, em tese, é possível aplicar o princípio da insignificância para crimes ambientais. 2) Na prática, a esmagadora maioria dos julgados do STF e STJ nega a incidência do princípio da insignificância para o delito do art. 34 da Lei nº 9.605/98:

(...) Esta Corte entende ser possível a aplicação do princípio da insignificância aos delitos ambientais, quando demonstrada a ínfima ofensividade ao bem ambiental tutelado (AgRg no REsp 1558312/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 02/02/2016). Na espécie, contudo, é significativo o desvalor da conduta, a impossibilitar o reconhecimento da atipicidade material da ação ou a sua irrelevância penal, ante o fato de o recorrente ter sido surpreendido com considerável quantidade de pescado em período no qual, sabidamente, é proibida a pesca, demonstrando a relevância do dano causado e o risco criado à estabilidade do meio ambiente pela prática notadamente ilícita. (...) STJ. 5ª Turma. RHC 59.507/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 04/05/2017.

(...) Não é insignificante a conduta de pescar em época proibida, e com petrechos proibidos para pesca (tarrafa, além de varas de pescar), ainda que pequena a quantidade de peixes apreendidos. (...) STJ. 6ª Turma. REsp 1685927/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/09/2017. Caso concreto: não aplicado à atividade de pesca em período de defeso, em que apreendidos 5 varas com molinete, 1 tarrafa e 250g de peixe robalo.

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3) Apesar de não ser comum, a jurisprudência já reconheceu a aplicação do princípio da insignificância para o delito do art. 34. Veja:

Não se configura o crime previsto no art. 34 da Lei nº 9.605/98 na hipótese em há a devolução do único peixe – ainda vivo – ao rio em que foi pescado. STJ. 6ª Turma. REsp 1.409.051-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 20/4/2017 (Info 602).

Se a pessoa é flagrada sem nenhum peixe, mas portando consigo equipamentos de pesca, em um local onde esta atividade é proibida, ela poderá ser absolvida do delito do art. 34 da Lei de Crimes com base no princípio da insignificância? A 2ª Turma do STF possui decisões conflitantes sobre o tema:

SIM. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 1°/3/2016 (Info 816).

NÃO. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, julgados em 26/10/2016 (Info 845).

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROVA Indeferimento de todas as testemunhas da defesa sob o argumento de

que seriam protelatórias: constrangimento ilegal

Na fase de defesa prévia, o réu arrolou uma série de testemunhas, mas o juiz negou a oitiva afirmando que o requerimento seria protelatório, haja vista que as testemunhas não teriam, em tese, vinculação com os fatos criminosos imputados.

O STF entendeu que houve constrangimento ilegal.

O direito à prova é expressão de uma inderrogável prerrogativa jurídica, que não pode ser, arbitrariamente, negada ao réu.

O princípio do livre convencimento motivado (art. 400, § 1º, do CPP) faculta ao juiz o indeferimento das provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. No entanto, no caso concreto houve o indeferimento de todas as testemunhas de defesa.

Dessa forma, houve ofensa ao devido processo legal, visto que frustrou a possibilidade de o acusado produzir as provas que reputava necessárias à demonstração de suas alegações.

STF. 2ª Turma. HC 155363/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

Imagine a seguinte situação hipotética: Antônio era réu em um processo criminal. Ao apresentar resposta à acusação, o réu arrolou testemunhas de seu interesse, em obediência ao disposto no art. 396-A do CPP:

Art. 396-A. Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.

O juiz proferiu despacho determinando a intimação da defesa para que explicitasse as razões para a oitiva de cada uma das testemunhas arroladas. A defesa apresentou petição afirmando que a determinação do magistrado não tem previsão legal e que, em razão disso, não apresentaria qualquer justificativa. Ao fim, reiterou o pedido para intimação das testemunhas de defesa para comparecerem em audiência.

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O juiz, fundamentando sua decisão no § 1º do art. 400 do CPP, indeferiu a oitiva das testemunhas:

Art. 400 (...) § 1º As provas serão produzidas numa só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias.

O magistrado argumentou que as pessoas arroladas não têm qualquer vinculação com os fatos criminosos imputados ao réu, o que leva a crer que o pedido para oitiva dessas testemunhas é um ato meramente procrastinatório, com o único objetivo de retardar o processo com diligências desnecessárias. Diante disso, a defesa impetrou sucessivos habeas corpus, até que a questão chegou ao STF.

O que decidiu o Supremo? Agiu corretamente o juiz? NÃO.

O direito à prova é expressão de uma inderrogável prerrogativa jurídica, que não pode ser, arbitrariamente, negada ao réu. O princípio do livre convencimento motivado autoriza que o juiz indefira as provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias (art. 400, § 1º do CPP). Todavia, no caso concreto, não se trata do indeferimento de uma ou duas testemunhas, mas de todas elas, o que se afigura inadmissível em um Estado Democrático de Direito, em que a ampla defesa é garantia constitucional de todos os acusados (art. 5º, LV, da CF/88). O STF entendeu que a decisão do juiz extrapolou os limites do razoável, especialmente se levado em consideração que a medida extrema foi tomada no estágio inicial do processo (resposta à acusação) e a motivação para tanto foi baseada na impressão pessoal do magistrado de que o requerimento seria protelatório, já que as testemunhas não teriam, em tese, vinculação com os fatos criminosos imputados ao réu. STF. 2ª Turma. HC 155363/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 8/5/2018 (Info 901).

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) A Constituição, expressamente, confere ao CNJ competência para, a qualquer tempo, avocar processos

de natureza disciplinar em curso contra membros do Poder Judiciário. ( ) 2) A pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público possui responsabilidade civil em razão

de dano decorrente de crime de furto praticado em suas dependências, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/88. ( )

3) Os agentes políticos, sem exceção, encontram-se sujeitos a duplo regime sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade. ( )

4) O foro especial por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal em relação às infrações penais comuns é extensível às ações de improbidade administrativa. ( )

Gabarito

1. C 2. C 3. E 4. E

OUTRAS INFORMAÇÕES

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos Julgamentos por meio

eletrônico*

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Em curso Finalizados

Pleno 9.5.2018 10.5.2018 1 2 14

1ª Turma 8.5.2018 — 2 71 63

2ª Turma 8.5.2018 — 5 4 31

* Emenda Regimental 51/2016-STF. Sessão virtual de 04 a 10 de maio de 2018.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 7 A 11 DE MAIO DE 2018

Lei nº 13.660, de 8.5.2018 - Altera o § 2º do art. 819 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, para dispor sobre o pagamento dos honorários de intérprete judicial. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 88, p. 2, em 9.5.2018

Secretaria de Documentação – SDO Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD