indústria naval.pdf

54
ECCIB i UNICAMP-IE-NEIT Universidade Estadual de Campinas Instituto de Economia Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia (UNICAMP-IE-NEIT) Ministério do Desenvolvimento, da Indústria e do Comércio Exterior (MDIC) Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DE CADEIAS INTEGRADAS NO BRASIL: Impactos das zonas de livre comércio Cadeia: Indústria Naval Nota Técnica Final Campinas, Dezembro de 2002 Documento elaborado pelos consultores: João Carlos Ferraz, Ivan Leão, Renato Luiz de Castro Santos e Luiz Maurício Portela. Coordenação Geral do Projeto: Luciano G. Coutinho (NEIT-IE-UNICAMP), Mariano F. Laplane (NEIT-IE-UNICAMP), Nelson Tavares Filho (MDIC), David Kupfer (IE-UFRJ), Elizabeth Farina (FEA-USP) e Rodrigo Sabbatini (NEIT-IE- UNICAMP).

Upload: jdpneto

Post on 28-Oct-2015

80 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

ECCIB

i

UNICAMP-IE-NEIT

Universidade Estadual de Campinas Instituto de Economia

Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia (UNICAMP-IE-NEIT) Ministério do Desenvolvimento, da Indústria e do Comércio Exterior (MDIC)

Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP)

ESTUDO DA COMPETITIVIDADE DE CADEIAS INTEGRADAS NO BRASIL:

Impactos das zonas de livre comércio

Cadeia: Indústria Naval

Nota Técnica Final

Campinas, Dezembro de 2002

Documento elaborado pelos consultores: João Carlos Ferraz, Ivan Leão, Renato Luiz de Castro Santos e Luiz Maurício Portela. Coordenação Geral do Projeto: Luciano G. Coutinho (NEIT-IE-UNICAMP), Mariano F. Laplane (NEIT-IE-UNICAMP), Nelson Tavares Filho (MDIC), David Kupfer (IE-UFRJ), Elizabeth Farina (FEA-USP) e Rodrigo Sabbatini (NEIT-IE-UNICAMP).

SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................................................. 1 PARTE A: TENDÊNCIAS MUNDIAIS ...................................................................................... 2 1. PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DA DEMANDA: MARINHA MERCANTE......................... 2 2. PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DE DEMANDA: OFFSHORE............................................... 4 3. PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DA CADEIA PRODUTIVA E DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS......................................................................................................................... 4

3.1. EUROPA............................................................................................................................. 5 3.2. ESTADOS UNIDOS.............................................................................................................. 8 3.3. JAPÃO.............................................................................................................................. 10 3.4. CORÉIA............................................................................................................................ 13 3.5. CINGAPURA..................................................................................................................... 14 3.6. CHINA ............................................................................................................................. 16

PARTE B: TENDÊNCIAS NO BRASIL.................................................................................... 18 4. MERCADO: DINAMISMO NO OFFSHORE ..................................................................... 18 5. MERCADO: ESTAGNAÇÃO NA MARINHA MERCANTE ............................................ 21 6. ESTALEIROS: ESTRUTURA PATRIMONIAL................................................................. 21 7. ESTALEIROS: CAPACITAÇÃO E COMPETITIVIDADE................................................ 23

7.1. CAPACIDADE PRODUTIVA E RH....................................................................................... 23 7.2. CAPACITAÇÃO E ESTRATÉGIA DE MERCADO .................................................................... 26

8. CADEIA DE FORNECEDORES ......................................................................................... 27 8.1. RELAÇÃO ENTRE AGENTES .............................................................................................. 27 8.2. - O CASO DE NAVIO DE APOIO........................................................................................... 28 8.3. CAPACITAÇÃO DOS FORNECEDORES................................................................................ 30

9. PAPEL DO ESTADO: EVOLUÇÃO E RELEVÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS... 32 9.1. CARACTERÍSTICAS GERAIS DO FMM............................................................................... 32 9.2. O USO DO FMM NO PASSADO ......................................................................................... 34 9.3. USO PRESENTE DO FMM ................................................................................................. 34 9.4. NOVAS INSTITUIÇÕES NO PETRÓLEO E GÁS..................................................................... 36 9.5. TARIFAS, IMPOSTOS E O REPETRO................................................................................ 37

PARTE C - SÍNTESE COMPARATIVA ................................................................................... 40 10. BENCHMARK COMPARATIVO: ESTRUTURA, ESTRATÉGIAS E POLÍTICAS........ 40 11. BENCHMARK COMPARATIV0: DESEMPENHO FINANCEIRO E PRODUTIVO ...... 42 PARTE D: CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ................................................................ 44 12. SÍNTESE DAS QUESTÕES RELEVANTES...................................................................... 44 13. RECOMENDAÇÕES............................................................................................................ 46 BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................................... 48

ECCIB

ii

UNICAMP-IE-NEIT

RESUMO EXECUTIVO

A frota de navios mercantes internacional soma 791 milhões de toneladas de porte bruto (TPB), concentrada em 20 países.Até o final da década de 1990, 38% da frota foi renovada. Há necessidade de renovar os 60% restantes. Para isso, no mercado internacional, prevalece intensa competição e redução de preços, em virtude da capacidade de produção excessiva dos estaleiros nos países produtores. Os principais participantes do mercado internacional de construção naval seguem estratégias de especialização. São facilmente reconhecíveis a da Coréia, especializada navios de grande porte, a de Cingapura, especializada em plataformas e navios para a indústria de petróleo offshore, a dos Estados Unidos, que focaliza a indústria militar. A maior parte dos países europeus entrincheirou-se em nichos de navios especiais e sofisticados. O Japão constrói toda a linha de navios e luta para aumentar a produtividade e reduzir custos. Historicamente em todos os países, o Estado tem forte presença na construção naval, através de incentivos e regulação abrangentes (subsídios para operação e investimento para a armação; subsídios à construção naval; definição de reservas de mercado, através de cargas preferenciais; benefícios fiscais - renda e depreciação - e proteção à cabotagem). As razões dessa presença do Estado estão associadas à segurança nacional, às várias falhas de mercado e externalidades geradas pela atividade e, obviamente, às práticas dos demais países. Na verdade, em todos os países, inclujsive no Brasil, as representações de interesses dos atores associados (aí incluídos trabalhadores e forças armadas) têm forte importância política e poder de influência na definição das políticas públicas. O volume de recursos públicos despendidos em subsídios pelos países é desconhecido, mas reconhecidamente muito alto, o que prejudica a existência de indicadores confiáveis de preços.1 No Brasil, a partir da crise da SUNAMAM, em meados dos nos 80, observa-se um processo gradual de mudanças institucionais relevantes, incluindo desregulamentação e fim de reservas de mercado e dos subsídios à estaleiros. Assim como em outros países, porém com conformação específica, permanece ativo um fundo para investimentos, gerenciado pelo BNDES e gerado por contribuição para-fiscal sobre o frete de importação (AFRMM). Em contrapartida, inexistem mecanismos de crédito e seguros disponíveis no mercado financeiro internacional. Por isto o Fundo de Marinha Mercante é ponto focal das discussões sobre o desenvolvimento da indústria de construção naval. A indústria de construção naval brasileira, compreendida pelos estaleiros que constroem navios acima de 1.000 TPB, praticamente desativada desde o final da década de 70, iniciou em 2000 movimento de retomada da produção, impulsionada pelas encomendas da Petrobrás para o aumento da produção de petróleo em alto mar. Na navipeças também houve desativação da produção e sobrevivência de poucas empresas especializadas. Assim o recurso à importação de partes e componentes é extensivamente utilizado por todos aqueles que promovem a construção de navios ou plataformas de offshore. Na armação a internacionalização patrimonial está praticamente completa. Na carga geral a maior empresa

1 Além disto, a natureza complexa da produção naval implica dificuldades técnicas na constituição de indicadores comparativos de capacitação e desempenho produtivo

ECCIB

iii

UNICAMP-IE-NEIT

brasileira é 5 vezes menor que sua concorrente chilena, ou 25 vezes menor que a empresa líder mundial. Atualmente o setor de petróleo offshore representa a maior parcela da demanda, licitando a encomenda de plataformas, embarcações de apoio marítimo, seus equipamentos e componentes. Os investimentos em offshore vieram reativar a indústria naval. Além de plataformas, as encomendas incluem a montagem dos “skids’ dos FPSO’s, promovendo reativação dos estaleiros e atraindo investidores estrangeiros que arrendaram estaleiros no Rio de Janeiro. A demanda expandiu ainda mais quando a Petrobrás lançou o programa de substituição da frota de navios de apoio offshore definindo, no edital de concorrência internacional, preferência por navios de bandeira brasileira, induzindo as empresas operadoras, nacionais e estrangeiras, a contratar a construção local dessas embarcações. O resultado é que a indústria chegou ao final do primeiro semestre de 2002 em face de uma nova realidade, onde o principal desafio não são mais as encomendas, e sim como reativar instalações no curto prazo e montar uma competente capacidade produtiva, para atendê-las. Os estaleiros estão pedindo financiamentos para expansão e modernização ao BNDES/FMM e já surgem dificuldades de contratação de mão de obra especializada, principalmente soldadores. Na navegação, ainda são poucas ou muito recentes as encomendas de cabotagem ou longo curso, segmentos, que representam um desafio essencial para manter sustentável a atividade da construção naval brasileira no longo prazo. Armadores estrangeiros começam a contratar na indústria naval local, respondendo às exigências dos contratos conquistados com a Petrobrás, ou pelas regras da cabotagem. A Petrobrás também está procurando substituir seus petroleiros e os contratos para construção para a Transpetro estão por ser viabilizados graças a uma engenharia financeira complexa, associando-se crédito e seguros, por dificuldades de natureza patrimonial por parte dos estaleiros. O Brasil possui as condições básicas necessárias para desenvolver sua indústria de construção naval. Pelo lado da oferta, já estão atuantes no país construtores navais internacionais e existem empreendedores nacionais desenvolvendo estaleiros; a indústria siderúrgica é competitiva; os custos de mão de obra não são altos; a tecnologia, incorporada em equipamentos é disponível e em offshore o centro de pesquisas da Petrobrás e a infra-estrutura científica e tecnológica tem reputação internacional. Pelo lado do regime de incentivos e regulação, está preservado o sistema de financiamento, através do Fundo de Marinha Mercante; surgiram novas agências como a Agência Nacional do Petróleo e existem incentivos fiscais estaduais e federais (Programa Navega Brasil) em uso. Pelo lado da demanda, além da promoção de investimentos expressivos na exploração e produção de petróleo offshore o país deve expandir, fortemente, seu comércio exterior nos próximos cinco anos. A análise das construções em curso demonstra que existe capacidade no Brasil para realizar construção naval tecnologicamente atualizada. Dificilmente o país terá condições de se tornar um grande exportador de navios e/ou estruturas de offshore de todos os portes. Em outros paises, principalmente na Ásia, prevalecem articulações estabelecidas e consolidadas entre demandantes internacionais, conglomerados industriais e apoio governamental que são difíceis de serem rompidas, no curto e médio prazos. Entretanto, a indústria de construção naval brasileira poderá ampliar sua participação econômica na estrutura industrial brasileira, tornando-se especializada e construindo navios de apoio offshore, petroleiros e porta-

ECCIB

iv

UNICAMP-IE-NEIT

containers para a navegação de cabotagem. Este documento propõe uma estratégia competitiva e de crescimento – para o setor privado e para o Estado - focalizada em segmentos que possam ser inicialmente induzidos pela demanda local e estruturada em três movimentos: reativação e consolidação com os contratos da indústria offshore (plataformas e embarcações de apoio); fortalecimento com petroleiros e navios para cabotagem; expansão com a substituição de porta-containers do trade internacional por navios de bandeira nacional construídos aqui e exportação de plataformas, embarcações e navios de longo curso. A possibilidade de o Brasil vir a ser competidor internacional importante na construção naval depende de uma reativação competente de estaleiros e seus fornecedores, de forma a explorar vantagens circunstanciais, como o baixo custo da mão de obra. No entanto, a competitividade sustentada está associada à eficácia e eficiência produtiva, em primeira instância, e no longo prazo, à competência tecnológica. Para dar partida e operacionalizar esta estratégia, é necessário introduzir e difundir, entre contratantes, produtores e agências de fomento e regulação, práticas e formas de operação e gestão que assegurem baixas margens de tolerância com relação à ineficiência produtiva. Como resultante, aumentará a credibilidade e confiabilidade das políticas públicas, em especial o FMM. Operacionalmente esta proposição se sustenta na criação de um sistema independente que acompanhe e certifique boas práticas produtivas e que esteja associado ao financiamento público. Esta proposição está calçada em uma forte convicção entre os diversos atores associados à cadeia naval-offshore-mercante da necessidade de uma avaliação independente das boas práticas de construção naval, diferente do acompanhamento financeiro dos contratos, realizado rotineiramente, e geralmente protegidos pelo sigilo bancário. Instrumentos desta natureza visam assegurar a conquista de ganhos sustentáveis derivados de uma demanda em expansão para uma indústria que apenas inicia um processo de reativação bastante promissor. Garantida uma base produtiva de excelência os diversos atores associados à indústria podem almejar políticas comerciais mais agressivas, tanto no sentido da atração de demanda externa pela produção Made in Brazil quanto pela expansão dos investimentos produtivos, com conseqüentes benefícios para o emprego. Como a questão tarifária não é relevante para o setor, do ponto de vista das negociações Alca-UE, a construção naval demonstra a abertura unilateral da economia brasileira, podendo ser útil nas negociações em outros setores. Ao mesmo tempo, no âmbito da OMC, existem espaços interessantes para uma atuação brasileira. A União Européia pretende acionar a Coréia, acusando-a de ampla utilização de subsídios na construção naval. O Brasil deveria acompanhar o desenvolvimento das negociações que se seguirão e explorar a oportunidade para promover a atividade no país. Finalmente, este documento não tratou, de forma exaustiva e na medida de sua necessidade, os desafios competitivos para a Marinha Mercante. Mesmo assim, dois ou três itens podem ser destacados, alguns requerendo estudos mais aprofundados, outros de aplicação imediata. Com relação a este último, pode-se notar que créditos e saldos devedores são hoje denominados em dólares. Dependendo da direção da flutuação da moeda norte-americana

ECCIB

v

UNICAMP-IE-NEIT

pode advir sérios problemas para contratantes e contratados. Parece razoável associar crédito e saldo devedor à moeda de referência da fonte de geração da receita das empresas. Com relação à navegação é necessário empreender, com muita urgência, estudos que indiquem formas sustentáveis –para empresas e agências financiadoras - de apoio à navegação de cabotagem e interior. Finalmente, como diversos países protegem suas marinhas mercantes - com prescrição de cargas e créditos especiais para compra e operação de navios, dentre outros –, é necessária analisar em que medida proteção semelhante à marinha mercante nacional, pode resultar isonomia competitiva sustentável para a navegação brasileira.

INDÚSTRIA NAVAL João Carlos Ferraz

Ivan Leão Renato Santos

Luiz Maurício Portela

INTRODUÇÃO Este documento analisa a competitividade da indústria de construção naval brasileira, para fornecer embasamento à orientação da negociação brasileira nas novas rodadas de liberalização comercial, principalmente UE e Alca. Da análise da situação atual da indústria no mundo e no país e de suas perspectivas também serão depreendidas sugestões de políticas para fortalecer a competitividade da indústria de construção naval brasileira, visando ampliar superávits comerciais ou reduzir déficits, dentro de uma trajetória acelerada, porém realista. A avaliação a seguir se refere à indústria de construção naval focada nos estaleiros que produzem embarcações maiores que 1.000 TPB. É analisado o setor como uma cadeia produtiva, da qual fazem parte a montagem de embarcações, plataformas e equipamentos em estaleiros e a produção de peças e componentes (navipeças), destinados para o transporte marítimo e para as atividades de exploração de petróleo offshore. A primeira parte deste documento focaliza o quadro atual e as perspectivas da indústria mundial, incluindo uma pesquisa sobre a situação de um conjunto de países e regiões (EUA, Europa, Japão, Coréia, Cingapura e China). A segunda parte examina a indústria brasileira. Nas duas partes são tratadas a situação da demanda e a estrutura patrimonial e produtiva, incluindo as relações ao longo das cadeias produtivas. Também são destacadas as políticas governamentais usuais, demonstrando-se que a construção naval, definitivamente, não está norteada exclusivamente por forças de mercado, pois ela é a fornecedora da base de transporte para a hegemonia econômica e militar dos países. Na terceira parte deste documento, são destacados alguns benchmarks comparativos sobre competitividade e condições fiscal-tarifárias e creditícias. A quarta parte é dedicada às proposições de política. Especificamente, com relação à questão tarifária, demonstra-se que, no Brasil, as importações são todas praticamente realizadas com tarifa zero. De forma mais ampla, são muito expressivas as vantagens tributárias, fiscais e creditícias para equipamentos importados. Assim, do ponto de vista das negociações Alca-UE, a construção naval demonstra de um alto grau de abertura (unilateral) da economia brasileira, podendo ser útil como elemento de troca nas negociações em outros setores. Na negociação setorial específica, deve-se levar em conta que todos os países praticam políticas de apoio à construção naval, implicando na existência de espaços importantes ao setor privado e ao Estado para se definir uma estratégia competitiva e de crescimento. O documento propõe para discussão uma estratégia de desenvolvimento de uma cadeia integrada, mas focalizada em segmentos que possam ser induzidos pela demanda local. Há demanda firme, proveniente da exploração de petróleo offshore em águas profundas, abrindo espaço para especialização em plataformas, embarcações de apoio marítimo e seus equipamentos e componentes. Para o desenvolvimento deste segmento, além de esforços específicos e significativos para se aumentar a competência empresarial latente, devem ser mobilizados instrumentos de incentivo e regulação, como crédito, tarifas e impostos, de forma articulada e sempre contra indicadores de desempenho.

ECCIB

2

UNICAMP-IE-NEIT

PARTE A: TENDÊNCIAS MUNDIAIS

1. PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DA DEMANDA: MARINHA MERCANTE O ciclo de produção de um navio, da encomenda até sua entrega ao armador, é de aproximadamente dois anos ou mais. Portanto trata-se de produto que não reage a oscilações de curto prazo. O trade internacional só apresenta impacto na construção em casos de grandes crises, como o choque do preço do petróleo. O mercado de transporte de carga por via marítima é composto de dois segmentos: granéis e carga geral. Granéis (líquidos e sólidos) - segmento que apresenta grande competição entre os transportadores, ao contrário da carga geral. É comum a prescrição de cargas para navios de bandeira nacional (caso do petróleo, grãos, etc.). Em volume transportado, os granéis são a carga predominante (74% do total transportado). Carga geral - principal mercado mundial de marinha mercante, dominado pelo transporte de contêineres. Responde por 2/3 do valor do transporte mundial de cargas. É o segmento que apresenta as maiores mudanças operacionais: fim das conferências fechadas; diminuição da regulamentação; navios especializados e de alto valor; portos e terminais dedicados; operações intermodais sofisticadas.

Nesta indústria, prevalecem grandes barreiras à entrada de novos concorrentes, na forma de: elevadas exigências de capital inicial; necessidade de uma rede de agentes para captação de cargas e clientes; a atuação global é quase um imperativo.

As trocas internacionais do comércio exterior representam um valor anual de cerca de US$ 6 trilhões, segundo a Organização Mundial do Comércio. As trocas através dos oceanos são 80% desse total, representando US$ 4,8 trilhões em mercadorias. Os fretes representam cerca de 10% do valor das mercadorias transportadas, significando que a geração anual de fretes mundiais pode ser estimada em US$ 480 bilhões. As grandes potências mundiais consideram a capacidade de produzir navios e ter frota própria de transporte como uma necessidade estratégica para garantir hegemonia econômica sobre outros mercados e ter reservas navais em caso de guerra. Cerca de 65% do valor das trocas internacionais estão concentradas na América do Norte (24%), Europa (26%), Ásia (Japão, Coréia do Sul e Cingapura com 10%) e América Latina (México, Brasil, Argentina, Chile e Venezuela com 5%). Não é coincidência que os países que detém maior parcela do comércio internacional sejam os que possuem uma indústria de construção naval operando em segmentos de mercado específicos, frota própria ou associada a bandeiras de conveniência. Na marinha mercante, a análise por países de domicílio indica que Grécia, Japão, Noruega, EUA, China, Hong-Kong, Alemanha, Reino Unido, Cingapura e Dinamarca, possuíam em 2001, as 10 maiores frotas mercantes do mundo. O setor é dominado por grandes empresas internacionais. As megacarriers são presença predominante nas principais rotas mundiais. Fusões, incorporações e, mais recentemente, alianças entre megacarriers para atuação global têm deslocado o foco da concorrência dos preços para a qualidade do serviço de logística integrada. Esses números permitem uma visão da dimensão do mercado que as empresas de transporte

ECCIB

3

UNICAMP-IE-NEIT

marítimo devem atender, gerando a demanda por navios na indústria de construção naval. O comércio internacional tem crescido a taxas superiores às do crescimento da economia mundial, o que provocou, nos anos 90, um surto de construção naval (o anterior foi de 1965 a 1975), o que resultou na produção de 301 milhões de toneladas de porte bruto (TPB), renovando praticamente 38% da frota existente em 2001, estimada em 791 milhões de TPB. Os maiores indutores de encomendas de navios novos são a idade da frota e o preço da construção de um navio novo. Os grandes armadores encomendam navios quando sua frota atinge uma idade entre 8 e 10 anos, negociando com os estaleiros dos países que oferecem os menores preços possíveis. A vida útil de um navio é de até 20 anos. É oportuno substituí-lo e vendê-lo, por valor residual, após 12 anos, quando está encerrada a amortização do seu financiamento. Após essa idade, a performance do navio piora, ele se torna mais lento e tecnologicamente ultrapassado, consome mais combustível e gera despesas em reparos. Como a idade média da frota mercante mundial é superior aos 15 anos, com mais da metade das embarcações em idade superior a essa média, continua forte a pressão por reposição.

O Gráfico 1, relativo à entrega de navios construídos, demonstra uma retomada no volume (em tonelagem bruta) da construção naval na Ásia ( Japão, Coréia, China), enquanto que a Europa (Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Itália, Holanda, Noruega, Espanha, Suécia e Reino Unido), os Estados Unidos e todos os outros países permanecem estáveis, desde a queda da produção em 1980.

Gráfico 1 Entrega de navios construídos

Fonte: Lloyd's Register's – navios de mais de 100 t de tonelagem bruta.

As estatísticas do Lloyd’s Register apontam a mudança na estrutura mundial da construção naval. O pico de produção anual de 1975 registrou uma produção na Ásia de 17,4 milhões de toneladas brutas, contra 13 milhões na Europa Ocidental, e 2,5 milhões nos demais países, em 1976. Os estaleiros asiáticos conquistam o mercado e aumentam seu patamar de produção

ECCIB

4

UNICAMP-IE-NEIT

atingindo as 26,4 milhões de toneladas brutas, em 2000. Quem perdeu mercado foi principalmente a Europa, cujo patamar de produção de 13 milhões de toneladas brutas caiu para 4 milhões, em 2001. As estatísticas para 2001 apontavam a entrega de navios na Ásia, num total de 25,9 milhões de toneladas brutas, 4,3 milhões de toneladas brutas na Europa, 129 mil toneladas brutas nos EUA e 804 mil toneladas brutas nos demais países do mundo.

2. PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DE DEMANDA: OFFSHORE As publicações internacionais especializadas consideram que o mercado de equipamentos para exploração e produção de petróleo em alto mar (offshore) está numa fase de pico de encomendas. A produção de petróleo migrou para águas profundas e ultraprofundas, tornando o estoque de equipamentos existente obsoleto para as novas exigências tecnológicas, representadas por linhas d’água superiores a 1.000 metros de profundidade. O preço de petróleo apresenta estabilidade na faixa acima dos US$25 dólares o barril com tendência a aumentar. Os analistas esperam a manutenção dos investimentos das grandes petroleiras internacionais. O desaquecimento da economia americana é provavelmente o fator de maior relevância neste cenário, já que se trata do maior consumidor individual de petróleo. O banco de investimentos Salomon Smith Barney and Lehman Brothers, de Wall Street, utiliza como indicadores de tendência planos de investimento das grandes empresas de petróleo internacionais. Segundo esses dados, os investimentos para o ano de 2000 eram de US$ 81 bilhões, passando a US$ 115 bilhões, em 2001, e diminuindo, em 2002, para US$ 96 bilhões. A tradicional contagem de equipamentos de perfuração (rigs count) usados em operações offshore apresenta pequena redução, nos EUA, mas as operações internacionais devem se manter idênticas as de 2001. Contribuem para isso três fatores principais:

! Existem grandes campos descobertos, em fase de mapeamento e desenvolvimento, na África, China, Golfo do México e Brasil.

! As grandes empresas internacionais investem no aumento das suas reservas, visando aumentar o valor do balanço financeiro futuro, já que o preço do petróleo em baixa pode ser uma circunstância de vida curta.

! Ampliar a oferta de petróleo e gás é parte da estratégia econômica dos países que têm essa alternativa. Empresas internacionais e estatais estão comprometidas com esses investimentos, promovendo associações e negócios conjuntos.

3. PRINCIPAIS TENDÊNCIAS DA CADEIA PRODUTIVA E DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS

A indústria de construção naval caracteriza-se pela fabricação de um bem de capital de alto valor unitário, produzido sob encomenda. Por isso, além da observação do tradicional trinômio preço-qualidade-prazo de entrega, outro fator decisivo para o sucesso internacional neste setor é a oferta de financiamento à produção e à exportação (ou equalização às condições de financiamento dos principais produtores mundiais, além das garantias de praxe exigidas na comercialização internacional de um bem com as características do navio). Como será visto, a oferta de financiamento é apenas um dos aspectos desta indústria que abrem espaço para a presença efetiva de políticas governamentais.

ECCIB

5

UNICAMP-IE-NEIT

Quanto aos aspectos produtivos, historicamente a principal fonte de tecnologia neste setor é a indústria de navipeças, que a disponibiliza no mercado internacional sem restrições. Isto explica a entrada e rápida consolidação no mercado de produtores importantes como, Coréia do Sul e China, atualmente, e Brasil no passado. O mercado internacional caracteriza-se pelo elevado nível de concorrência, já que as barreiras à entrada, que possivelmente existiriam, dadas as características do navio (um bem de capital de elevado porte), são neutralizadas por meio de apoio governamental e pela ampla disponibilidade de tecnologia no mercado internacional. Uma avaliação dos principais produtores mundiais revela duas estratégias básicas: a produção em larga escala dos navios mais demandados (graneleiros, petroleiros, etc.), ou a busca de nichos específicos de mercado (produção de navios de alto conteúdo tecnológico). A estratégia de larga escala é seguida pelo Japão e Coréia do Sul, que ocupam a maior fatia do mercado e que tendem a ser seguidos pela China, A estratégia de nichos de mercado é seguida por europeus (Alemanha, Dinamarca, etc.), que ocupam fatias mais modestas do mercado mundial, embora se mantenham sempre entre os principais concorrentes. Os principais componentes de custo dos navios são o aço, as navipeças e os custos da mão-de-obra. Como aço e navipeças podem ser adquiridos ao preço internacional, os principais ganhos em termos de custos, além da questão salarial, acabam dependendo das exigências dos demandantes, já que cada armador tem necessidades diferentes quando encomenda a construção de uma embarcação. Isto acaba influindo na busca da produção em série e dos ganhos de escala e aprendizado por parte dos estaleiros. Políticas governamentais podem compensar efeitos de ganho de escala, mas a demanda interna, por parte dos armadores nacionais, reforça a estrutura industrial na busca ao mercado internacional.

3.1. EUROPA Visão Geral Os países da Europa são o segundo centro de construção naval do mundo, após a Ásia. A Alemanha, o Reino Unido, Espanha e França são os maiores construtores navais no ranking (Tabela 1).

Tabela 1 Produção Naval (em milhões de Euros - não inclui contratos militares)

Países 1995 1996 1997 Dinamarca 997,1 1215,2 1046,5Alemanha 4764,3 5202,5 3824,4Espanha 1679,9 1934,8 2086,0França 1384,3 2196,8 1725,0Itália 2625,6 2694,7 -Holanda 1888,7 1899,9 -Finlândia 1038,3 1621,0 1387,1Reino Unido 2009,5 2648,3 3685,0Fonte: Eurostat

ECCIB

6

UNICAMP-IE-NEIT

Na década de 1950, a Europa dominava a construção naval mundial. Em 1965, o Japão, sozinho, disputava a liderança, com uma produção que ultrapassava individualmente a de qualquer país europeu. Foi o começo da mudança do eixo da construção naval da Europa para a Ásia. Essa posição foi perdida devido à ineficiência, falta de coordenação e falta de visão sobre o futuro. Havia também o conforto dos subsídios, que amparavam as indústrias e asseguravam condições de competição, mesmo com baixa produtividade. A Europa reconhece a necessidade de estruturar algum tipo de consolidação da sua indústria da construção naval. A partir da crise dos anos 1980, agravada pelo aumento da competição do Japão e da Coréia do Sul, ocorreu a falência de diversos estaleiros, fusões e aquisições que diminuíram os grupos, criando um conglomerado, embora nada parecido como o que existe na Ásia. Na Espanha e na Itália, os maiores estaleiros são do governo e existe pressão para sua privatização. Na Espanha, ocorreu a fusão do AESA com o BASAN para formar o IZAR. São esforços na direção de criar grupos com maior escala e comando único. O fato de o governo ser empreendedor sinaliza a importância atribuída a essa atividade para os objetivos estratégicos nacionais. Os estaleiros da Europa encontraram um nicho de mercado na construção de navios sofisticados para transporte de passageiros, cargas que exigem cuidados especiais, conversão e reforma de navios e estruturas para a indústria de petróleo offshore, desenvolvida a partir da demanda criada pelas descobertas no Mar do Norte. Esse nicho representa a construção de navios de maior valor agregado e com maior conteúdo tecnológico, fato que distorce as estatísticas, geralmente baseadas no volume de cubagem produzida ou na tonelagem de porte bruto. Os estaleiros da Europa gostariam de ter maior participação no mercado internacional, mas sofrem limitações de espaço para a produção de alguns navios de grande porte, como os VLCC de 150 e 160 mil TPB. A preocupação é com a entrada dos competidores asiáticos nestes nichos de maior valor. O Japão, que já disputa esse mercado e o da construção para o setor offshore, vem preferindo os preços mais baixos dos estaleiros de Cingapura. A decisão da Europa em terminar com os subsídios à construção naval, no final de 2000, pode levar a uma nova fase de concessão de benefícios dissimulada. A indústria é de importância estratégica e, mesmo com um mercado interno de embarcações menores muito dinâmico, a capacidade de produzir navios para o comércio internacional é fundamental para a competição no mercado mundial. A construção naval para fins militares, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos, também é um fator para manter condições industriais essenciais e aperfeiçoar os sistemas existentes. A Associação de Estaleiros da Europa (AWES - Association of West-European Shipbuilders) busca uma organização entre os estaleiros para tornar maior sua competitividade em relação à Ásia. Estaleiros Principais grupos empresariais europeus atuantes na construção naval e os principais estaleiros sob seu controle: Aker - Finlândia, Noruega, Alemanha e Romênia. Kvaerner - Finlândia, Alemanha e EUA. Damen - Holanda, Romênia, Ucrânia, Reino Unido, Suécia, Cingapura, China e Cuba HDW – Alemanha e Suécia

ECCIB

7

UNICAMP-IE-NEIT

Odense/AP Moller - Dinamarca, Alemanha, Lituânia & Estônia ThyssenKrupp – dois estaleiros na Alemanha GEC – França e Reino Unido Izar – Espanha (empresa estatal com estaleiros, construindo para a marinha mercante e militar) Fincantieri – Itália (empresa estatal construindo para a marinha mercante e militar) Políticas e subsídios No final de 2000, os subsídios para a construção naval foram suspensos, concluindo-se que a integração do mercado europeu permitia que fossem estabelecidas condições similares para todas as indústrias. Estes mecanismos serão substituídos a partir do Acordo OCDE, que passará a regulamentar a questão dos auxílios estatais a nível mundial, contemplando a questão da competição no mercado internacional. Não existem informações sobre novos subsídios. Uma das políticas permite vantagem aos conglomerados na compensação de lucros e prejuízos entre as empresas sob o mesmo controle acionário. Por exemplo: um conglomerado pode pagar menos imposto de renda de lucros obtidos em indústrias eletrônicas ou de alimentos compensando perdas sofridas nas suas empresas de transporte marítimo e construção naval. Os subsídios existentes na Europa eram de quatro tipos:

• Shipbuilding Intervention Fund • Shipbuilders' Relief • Export Credit Guarantees • Home Credit Guarantees

Sistemas de alianças Cerca de 40% da frota mundial de navios pertencem a empresas da Europa, representando uma impressionante capacidade de demanda, caso organizadas para cumprir objetivos políticos em relação ao fortalecimento do bloco econômico. No passado, no entanto, esses armadores foram os primeiros a buscar as alternativas de custo mais baixo na Ásia, promovendo a crise da construção naval na região. A relação entre estaleiros e armadores é baseada em regras comerciais e de competição tradicionais. Não existem informações sobre estruturas especiais de cadeias de suprimentos para cumprir finalidades de maior competitividade. A interligação dos mercados torna os fornecimentos ainda mais simples. A Europa conta com tradicional e eficiente rede de fornecedores para a construção naval, fornecendo aos Estados Unidos e a alguns países da Ásia. A construção naval e o transporte marítimo são considerados de importância estratégica, recebendo acompanhamento dos governos, na Itália e na Espanha. As empresas de construção naval são do Estado. O futuro Existem entendimentos entre o grupo ThyssenKrupp e Babcock Borsig, controlador do HDW - Howaldtswerke-Deutsche Werft, que, por sua vez está conversando com o grupo IZAR (AESA/Bazan), o Fincantieri e a British Aerospace, visando a criação de uma rede de estaleiros, na Europa, capaz de competir com os conglomerados asiáticos e americanos.

ECCIB

8

UNICAMP-IE-NEIT

3.2. ESTADOS UNIDOS Visão Geral

Em 1981, existiam 22 grandes estaleiros, nos Estados Unidos, construindo navios de grande

porte para o governo norte-americano e para a marinha mercante. Atualmente existem apenas seis:

• Avondale Industries, New Orleans, LA • Bath Iron Works, Bath, ME (controlado pela General Dynamics) • Electric Boat, Groton, CT (controlado pela General Dynamics) • Ingalls Shipbuilding, Pascagoula, MS (Litton Industries) • National Steel & Shipbuilding Co. (NASSCO), San Diego, CA (controlado pela General

Dynamics) • Newport News Shipbuilding, Newport News, VA

As razões para tal redução foram: o fim dos subsídios do Maritime Administration (MARAD), em 1981 (na década de 1970, representaram uma injeção de mais de US$ 200 milhões de dólares anuais, em média, na indústria); o fim da guerra fria, com a redução dos orçamentos militares; a competição com os preços do Japão e Coréia do Sul, fazendo a indústria descer a patamares de produção abaixo das exigências de segurança nacional. A reação ocorreu com articulação da indústria junto a autoridades do Congresso. A partir de 1990, uma série de subsídios foi reeditada e ampliada, ao mesmo tempo em que era publicada a legislação exigindo a substituição da frota de petroleiros de casco simples para casco duplo. Os estaleiros tiveram condição de conquistar as encomendas de petroleiros americanos e estrangeiros, graças aos subsídios. Na área militar, um programa de construção naval de 47 navios de guerra, de 2000 a 2005, foi iniciado. Não é muito para a nação militar hegemônica do planeta, mas é garantia da manutenção e aperfeiçoamento do complexo produtivo. Serão fabricados navios com um nível de tecnologia e automação superiores aos que existem atualmente, promovendo aperfeiçoamento de tecnologias de produção e desenvolvimento de novos sistemas. A industria da construção naval dos EUA sai da crise para se tornar uma das mais eficientes e avançadas do mundo, mesmo detendo apenas 1% do mercado mundial da construção naval para a marinha mercante e de passageiros. Será beneficiada com o orçamento militar de US$ 300 bilhões, em 2002. Surge uma indústria mais enxuta, com foco no processo de modernização e concentração como nunca se assistiu na sua história. A General Dynamics adquiriu o controle de três estaleiros do Big Six. A indústria discute a mudança no eixo da liderança dos contratos, assistindo a integradoras de sistemas eletrônicos, como a General Dynamics, assumirem o papel tradicional dos estaleiros. A indústria é beneficiada pelo mercado representado pela navegação interior (rios e lagos) e costeira, protegida por legislação específica, o Jones Act. Por isso, existem cerca de 50 empresas de construção naval menores, operando cerca de 100 estaleiros, espalhados por 21 estados. Produzem também barcaças, rebocadores, empurradores, navios e estruturas para a indústria de petróleo offshore, navios de pesca e navios da Guarda Costeira. O Marine Transportation System, no relatório de 1999, ao Congresso, estimou em US$ 742 bilhões a contribuição para a economia americana da indústria de transporte marítimo e

ECCIB

9

UNICAMP-IE-NEIT

construção naval. Cerca de 13 milhões de pessoas trabalham neste setor, transportando 2 bilhões de toneladas anuais de frete doméstico e internacional, incluindo a importação de 3,3 bilhões de barris de óleo. A atividade de construção e reparo naval é formada por 280 empresas privadas, de diversos tamanhos, empregando 98 mil pessoas. Nesse conjunto, existem 43 estaleiros com carreiras capazes de construir ou reparar navios de 122 metros e maiores. Apenas os seis maiores, os Big Six, têm capacidade de construir navios de guerra. Estaleiros Newport News - Fundado em 1886, é o maior estaleiro do hemisfério ocidental, com 18 mil pessoas trabalhando, receitas anuais de US$ 1,8 bilhão e US$ 5 bilhões em encomendas. Seu principal negócio são os navios a energia nuclear. Possui uma parceria com o Electric Boat, controlado pela General Dynamics, para a construção de 30 submarinos de ataque da classe Virginia. Bath Iron Works - É líder no projeto e construção do destróier Aegis. Controlado pela General Dynamics, desde 1995, tem parceria com o Avondale para um programa de construção do LPD-17, anfíbio de ataque, no valor de US$ 9 bilhões. NASSCO - Instalado em San Diego, é o único estaleiro da costa Oeste construindo navios de guerra. Está estrategicamente posicionado para reparos de toda a frota do Pacífico. Ingalls - Fundado em 1938, é o maior construtor de navios de guerra convencionais. Está construindo o destróier Aegis e diversos outros navios de ataque. Tem 11 mil pessoas trabalhando e continua independente, levantando especulações sobre qual o grande conglomerado ao qual vai se associar. Avondale - Venceu, em 1996, em conjunto com o estaleiro Bath, a concorrência para construir a próxima geração do navio de assalto anfíbio LPD-17. Ainda está independente. Uma associação com o Newport News foi frustrada porque a General Dynamics adquiriu do Newport. Políticas e Subsídios Jones Act e Passenger Vessel Services Act - Obriga que toda a operação marítima em território dos EUA seja realizada por empresas americanas, com embarcações construídas nos Estados Unidos e operadas por americanos. Title XI – Ship Loan Guarantee Program – Gerenciado pelo MARAD (Maritime Administration), avalia empréstimos de longo prazo a armadores americanos e estrangeiros. Foi ampliado e reeditado, em 1993, permitindo condições aos estaleiros americanos de conquistar contratos para a substituição da frota de petroleiros de casco simples para casco duplo. Merchant Marine Act – Concede reserva de mercado para cargas com frete pago pelo governo dos EUA a armadores americanos, com navios construídos nos EUA. Oil Pollution Act of 1990 (OPA-90) – Todos os petroleiros devem ser convertidos para casco duplo, num programa de 25 anos, por motivos de proteção ambiental. National Shipbuilding and Shipyard Conversion Act – Reeditado em 1993, passou a incluir o financiamento à modernização dos estaleiros, além do financiamento a construção de navios para a exportação.

ECCIB

10

UNICAMP-IE-NEIT

Exigência de frota mínima para a Segurança Nacional – O MARAD é responsável por observar a participação relevante para a segurança nacional no total de cargas transportadas por via marítima, preservando, no país, uma capacidade mínima de mobilização de frota, de construção naval e de reparos e mantendo empregos e pessoal qualificado, para o que os EUA não percam a capacidade de responder a exigências, em caso de guerra. Sistema de alianças A questão de segurança nacional é o fator de maior peso para a proteção dos estaleiros e armadores americanos. A aliança mais relevante é com o próprio governo americano e a manutenção e modernização da frota de navios de guerra. No mercado interno, existe competição com os estaleiros de menor porte lutando para romper a predominância do Big Six. Fornecedores estrangeiros fazem lobby para aumentar fornecimentos à construção naval militar e comercial. No entanto, existe uma poderosa articulação e união de todos os setores em torno da questão da segurança nacional e da defesa da hegemonia dos EUA. O futuro Para o futuro, a indústria está mobilizada a defender a legislação de apoio ao setor, recentemente editada, e luta para conseguir pagar o imposto de renda no final da construção de cada navio, quando o lucro pode efetivamente ser medido, em vez de realizar pagamentos anuais sobre o faturamento. O fato mais relevante é a tendência da inclusão dos estaleiros, antes empresas independentes, no conglomerado das grandes corporações americanas. Essa realidade aumenta a inserção da indústria nos mais altos escalões do poder de decisão dos EUA. Sinaliza para o estabelecimento de um novo patamar de competição e aperfeiçoamento da construção naval americana, tornando-a mais apta a competir internacionalmente.

3.3. JAPÃO Visão Geral Desde 1999, os japoneses estão envolvidos no esforço de intensificar sua competitividade, reconhecendo a existência de uma capacidade mundial de construção naval superior à demanda. As recomendações aos maiores estaleiros japoneses são integrar os recursos gerenciais e criar firmes fundamentos operacionais para a nova fase da competição internacional. Os japoneses estão se dedicando a esta tarefa com a criação de um novo conceito e um novo produto para o transporte marítimo de contêineres, considerado um dos nichos com maior demanda e rentabilidade. Este produto é o Techno Superliner (TSL), porta contêineres de alta velocidade e grande capacidade de carga, direcionado para o mercado de transporte que utiliza o conceito de Hub Ports – portos concentradores e distribuidores de carga. O TSL satisfaz a necessidade de obter menor preço de frete para conquistar e abrir mercados. O produto tem a limitação de ser mais caro que os navios do mesmo tipo tradicionais e ter um custo de manutenção mais elevado. Esses obstáculos são o objeto do estudo gerencial conjunto, para diminuir custos de produção e manutenção. Entre as inovações nessa indústria, diversos estaleiros implantam portais na Internet para apoio de pós-venda.

ECCIB

11

UNICAMP-IE-NEIT

O Japão adotou a postura política de ampliar seu entendimento com as outras nações líderes na construção naval. Essa decisão visa desenvolver uma cooperação internacional, principalmente para evitar a guerra de subsídios do passado, que resultou em pressões fiscais aos governos e acomodação da indústria em relação à produtividade. A busca de um certo equilíbrio entre oferta e demanda é o foco principal. Para isso, o Japão está disposto a oferecer cooperação técnica a outros países, amparado no sucesso das práticas produtivas dos seus estaleiros. Estes entendimentos ocorrem na OCDE, com a participação da Europa e Coréia. Existe um grupo de trabalho monitorando a oferta e a demanda no mercado mundial e a definição de regras para a competição internacional. Estaleiros O núcleo central da construção naval a japonesa consiste em 19 empresas, que formam o SAJ (Shipbuilding Association of Japan). São 7 empresas de grande porte e 12 estaleiros de médio e pequeno porte, respondendo por 95% do total da construção naval no país. Os estaleiros maiores são chamados de os “7 Grandes” (Seven Majors): Mitsubishi Heavy Industries Ishikawajima Harima Heavy Industries Hitachi Zosen Coporation Kawasaki Heavy Industries Sumitomo Heavy Industries Mitsui Engineering & Shipbuilding Co NKK Co. Mitsubishi Heavy Industries, Ltd. (MHI) É um conglomerado de atuação mundial, envolvido em energia, indústria aeroespacial, equipamentos, estruturas de aço, automóveis, serviços e projetos à construção naval. Está desenvolvendo navios de contêineres e de passageiros de alta velocidade, respondendo às demandas do mercado. É tradicional fabricante de navios para transportes de químicos e para a indústria de petróleo offshore. Trabalha a partir dos seguintes estaleiros: ! Nagasaki Shipyard & Machinery Works – navios de passageiros, petroleiros,

graneleiros, navios para transporte de produtos químicos, gás e navios de passageiros.

! Kobe- The Shipbuilding Division – porta-contêineres, navios de passageiros e submarinos. Especialista em reparos e conversões.

! Shimonoseki Shipyard – navios especializados, de pesquisa oceanográfica e para colocação de cabos submarinos de comunicação e dutos.

! Yokohama Dockyard and Machinery Works - realiza reparos, conversões, sendo um dos líderes em reparos para a frota da Ásia.

Mitsui Engineering and Shipbuilding Além da construção naval, atua na área de energia, logística, projetos industriais, mecatrônica e sistemas de reciclagem e proteção ambiental. NKK Atua na construção naval e na produção de estruturas offshore. A linha de produtos inclui:

• Petroleiros e graneleiros • Navios para LNG, LPG e ethileno

ECCIB

12

UNICAMP-IE-NEIT

• Navios de passageiros • Ferry boats para carros, catamarans, quebra-gelos, dragas e navios de pesquisa. • Plataformas e navios de perfuração e produção

Ishikawajima Shipyard Fundado em 1853, confunde sua historia com a modernidade do Japão. Sua linha de produtos inclui: estruturas offshore, FPSO – navios de produção de petróleo, navios de guerra, dragas, toda a linha de navios mercantes, navio para recuperação de óleo derramado, petroleiros de casco duplo. Sumitomo / Oshima Shipbuilding É especializado na fabricação de navios graneleiros. Já fabricou 330 deles e entrega, regularmente, cerca de 20 graneleiros, ao ano, para armadores do mundo todo. Sistemas de alianças A aliança entre a indústria japonesa é objeto de estudos e investigação já há algum tempo. Além da estrutura formal, existe uma estrutura informal que levou o país a ser capaz de produzir 100% de tudo que a indústria da construção naval necessita para construir navios. Desde aço ao sistema de controle, incluindo o parafuso, a indústria japonesa produz tudo. A construção naval, mesmo no Japão, não atingiu o mesmo estágio de desenvolvimento de suprimentos da indústria automobilística, por exemplo. Está em andamento uma nova análise sobre a competitividade na indústria naval japonesa que, certamente, levará ao estabelecimento de um novo sistema de alianças. Merece destaque o fato do Japão, dentro todas as nações desenvolvidas, ter o menor ciclo do processo de decisão entre a necessidade da indústria e a emissão de uma medida de apoio do governo. Políticas e subsídios O Japão é conhecido por manter a mais ampla política de apoio e subsídios a suas indústrias e manter essas práticas cuidadosamente dissimuladas em decisões pontuais e resoluções, jamais explicitadas em legislação sujeita à análise internacional. Atualmente, com a proposta de um acordo amplo no bojo da OCDE, essas práticas podem se tornar mais claras e universais, para as indústrias de todos os países. No passado, o Japão utilizou recursos variados para subsidiar a construção naval, incluindo manter todos os trabalhadores de um estaleiro na folha de pagamento da prefeitura. A lógica é que seria mais barato a prefeitura manter o pleno emprego e receber de volta os impostos resultantes do desenvolvimento econômico local, do que sofrer as reações em cadeia de uma constante oscilação no nível de emprego local, onde o estaleiro era o principal empregador. O futuro Para o futuro, as empresas trabalham no âmbito do SAJ para encontrar uma solução financeira de apoio à competição com a Coréia. O Japão representa um exemplo de conglomerização, de organização industrial através do Keideren e de confiança mútua com a cadeia de fornecedores. Esse processo continua em andamento e a parceria da Mitsubishi e a Hitachi, que começa na área siderúrgica e pode se estender para outras áreas, principalmente à terceirização completa de sistemas para navios.

ECCIB

13

UNICAMP-IE-NEIT

3.4. CORÉIA Visão Geral A construção naval na República da Coréia conta com 11 indústrias, reunidas na Associação de Construção Naval da Coréia (Korea Shipbuilders’ Association). A Coréia entrou na disputa do mercado internacional, na metade de 1970, com a fabricação de um petroleiro pela Samsung. Na metade dos anos 1980, a Coréia concentrava cerca de 30% do total das entregas de navios ao mercado internacional. Estaleiros do mundo inteiro entraram com representações internacionais alegando práticas injustas de comércio e excesso de subsídios. Em 1998, os preços baixos levaram o estaleiro coreano Halla Engineering à falência. Com o agravamento das condições do mercado, o Daewoo Shipbuilding foi vendido. Os estaleiros da Coréia triplicaram sua capacidade, entre 1994 e 1996, apesar de saberem da existência de uma superoferta de capacidade de produção para uma demanda média, estabilizada em torno das 30 milhões de TPB / ano, de 1985 a 1995. O risco que a Coréia assumiu foi realizar a expansão e cortar drasticamente os preços para conquistar espaços num mercado onde, anteriormente, não tinha presença relevante. Um estudo da Comunidade Européia, examinando contratos de construção naval a estaleiros coreanos identificou preços de 13% a 40% mais baixos que os custos de produção. Em 1996, a Coréia entrou na disputa pelo mercado de navios e plataformas para a indústria de petróleo offshore, deslocando empresas americanas tradicionais e conquistando contratos nesse segmento. Essa tática rendeu cerca de US$ 300 milhões de dólares às empresas coreanas, segundo estimativas dos americanos. Os equipamentos offshore da Coréia chegaram ao Golfo do México, apesar dos elevados custos de transporte incorridos na conquista desses contratos. A principal acusação contra a Coréia é a de usar recursos do FMI para subsidiar as empresas de construção naval. Estaleiros Cerca de 95% do total da construção naval estão concentrados nas 4 maiores empresas: Hyundai Heavy Industries; Daewoo Shipbuilding & Heavy Machinery; Samsung Heavy Industries e Hanjin Heavy Industries. Samsung Heavy Industries Co., Ltd. A Samsung é um conglomerado integrado operando a partir de três setores Shipbuilding & Offshore Division, Digital Control System e Construction Division. A divisão de construção naval opera a partir do Geoje Shipyard - considerado um dois mais modernos do mundo, com três carreiras e três unidades industriais de produção: montagem do casco, preparação dos blocos e pintura. Todas as unidades utilizam sistemas automatizados. Está apto a produzir, de acordo com as dimensões próprias para cada carreiras, o seguinte tipo de navios: transportador de gás, Aframax, porta–container médio e grande, navio para perfuração de poço de petróleo e petroleiros VLCC e ULCC. O Samsung iniciou suas atividades em 1970, construindo um grande petroleiro. Realizou um posicionamento interessante no mercado, aumentando o foco na construção naval com investimentos a partir de capitalização na Bolsa de Valores (IPO), em 1994, e venda de diversas de suas área de negócios (em 1997, vendeu a divisão de automóveis, a de equipamentos para construção civil para Volvo e, em 1998, vendeu a unidade de empilhadeiras para a Clark). Com esses recursos, realizou uma associação com a China para desenvolver a unidade de construção naval de Ningbo, perto de Shangai, iniciando operações,

ECCIB

14

UNICAMP-IE-NEIT

em 1997. Em 2000, havia implantado a automatização do projeto de navio e produção (CAD/CAM) em sistemas de computadores e desenvolvia o seu próprio projeto de um novo navio porta-container. Hyundai O Hyunday opera através do estaleiro Ulsan, construindo a linha de navios graneleiros, petroleiros VLCC, porta-contêineres e plataformas para offshore. Trabalha com elevado nível de automação. Entregou seu primeiro petroleiro VLCC, em 1974. Hanjin Heavy Industries Fundado em 1937, é o mais antigo estaleiro da Coréia, em Youngdo, Pusan. É o pioneiro da indústria mecânica coreana, já entregou mais de mil navios e é um dos dez maiores estaleiros do mundo, com capacidade de construir petroleiros VLCC de até 150 mil TPB e realizar a produção anual de 900 mil TPB. Navios fabricados pela Hanjin recebem, já há nove anos seguidos, prêmios da imprensa especializada sobre os melhores navios do ano. Opera a partir dos estaleiros Youngdo Shipyard, Ulsan Shipyard e Masan Shipyard. Políticas e subsídios Os estaleiros da Coréia realizam um programa de industrialização orquestrado e apoiado pelo Governo, visando acelerar o processo de industrialização. A rápida conquista de relevantes parcelas do mercado deve-se a três fatores principais: apoio do governo para instalação e ampliação dos estaleiros, implantação de modernas unidades de produção usando experiências bem sucedidas e técnicas no estado da arte e escolha de operar no nicho de navios de grande porte, principalmente VLCC’s, que representam grande volume em termos de TPB produzida, sem necessariamente representar grande valor agregado. Para conquistar o mercado, ocorreram subsídios governamentais não declarados. A crise das economias asiáticas atingiu a economia da Coréia e expôs a fragilidade do sistema de subsídios, diante do orçamento fiscal sendo necessário recorrer aos recursos do FMI. Sistemas de alianças O sistema da Coréia apresenta pontos similares com sistema japonês e existe integração entre as empresas e seus negócios. A indústria de construção naval cria demanda na indústria siderúrgica e na rede de suprimentos, gerando um dinamismo industrial próprio da indústria de bens de capital. A construção naval é vista como um projeto de longo prazo. Por isso, as empresas desconheceram o fato de que já existia a superoferta mundial. O futuro A construção naval da Coréia deve realizar mudanças estruturais e necessita que a recuperação da economia asiática ocorra o mais rápido possível.

3.5. CINGAPURA Visão Geral

ECCIB

15

UNICAMP-IE-NEIT

Cingapura é um país emblemático do conjunto das economias emergentes batizadas como “Tigres Asiáticos”. Apresenta o fenômeno de ser um país pequeno onde a geração de poupança interna desafia a compreensão. Na pesquisa sobre a competitividade internacional do World Economic Forum, Cingapura ficou em 4o lugar, inserido no núcleo central da melhores economias do mundo, com os melhores fundamentos macro-econômicos, as melhores práticas governamentais e relevante aplicação de tecnologias. Até recentemente, a economia de Cingapura era alvo de um debate acadêmico sobre as origens do seu crescimento econômico (cerca de 8% durante mais de uma década); se era devido a geração de poupança interna, exclusivamente, ou se havia a contribuição de ganhos de produtividade. Recentemente o debate centrado na questão das medições encaminhou-se para um consenso, reconhecendo-se um aumento de produtividade de 2%, na década passada. Estaleiros de Cingapura estão presentes no Brasil (SembCorp / Keppel Fels e o Jurong), atraídos pela demanda da indústria de petróleo offshore, uma especialidade da construção naval daquele país. Estaleiros São cinco estaleiros principais em operação em Cingapura: PPL Shipyards Private Limited Yantai Raffles Keppel FELS Energy & Infrastructure Ltd Sembawang Shipyard PTE Ltd. Jurong Consultants, controlado da JTC Corporation PPL Shipyards Private Limited As especialidades da empresa são a construção de plataformas de exploração e produção para águas rasas e profundas e a construção de navios especializados para a atividade offshore, incluindo reparos e conversões. O PPL adquiriu o controle da Baker Marine Pte. Ltda., projetista de plataformas e sistemas para a indústria do petróleo operando no mar. Recentemente entregou para a Schlumberger um navio especial para o trabalho de recuperação de poços de petróleo offshore e o Cajun Express, uma plataforma de última geração para atuar em águas ultraprofundas, para a Transocean Sedco Forex. Yantai Raffles

É um dos poucos estaleiros instalados, na China, totalmente gerenciado por não chineses. Está localizado em Yantai, ma província de Shandong, no Norte da China. É especializado no segmento offshore e trabalha 24 horas por dia, em turnos, todos os dias do ano. Oferece esse diferencial como uma vantagem de produtividade para seus clientes. Seus acionistas são o Shengli Petroleum Bureau / China National Petroleum Company, a Yantai City Mechanical Industrial Company, Kintube Business Inc e Airtrust Pte Ltd, de Cingapura. A sede do Yantai é em Cingapura, possuindo escritórios em Houston e Yantai. Desenvolveu uma parceria estratégica com a Baker Marine e realizou mais de 600 construções para o segmento offshore, entre plataformas e navios. Sembawang Shipyard Fundado em 1968, estava, em 1975, com suas ações na Bolsa de Cingapura, sendo o primeiro

ECCIB

16

UNICAMP-IE-NEIT

estaleiro a ser cotado no pregão do mercado de capitais. É uma empresa controlada pelo governo e mantém práticas gerenciais capazes de deixar os japoneses com inveja. Um exemplo foi a rápida mobilização do estaleiro para conquistar o mercado de reparos de petroleiros VLCC’s, desenvolvendo um procedimento industrial e técnico para consertar as bases dos motores de grande porte que impulsionam esses navios gigantes, assim que o problema foi identificado no mercado mundial. Cerca de l9 petroleiros deste tipo, fabricados na Coréia, devem realizar esses reparos. Keppel FELS Energy & Infrastructure Ltd Fundado em 1967 como um estaleiro de pequeno porte, é um pioneiro na construção de plataformas offshore. Em 1999, realizou a fusão com a Keppel Integrated Engineering Ltd. Em 2000, adquiriu a Singapore Petroleum Co., definindo seu foco de negócios na indústria naval Offshore , na produção de óleo e gás, em energia e infra-estrutura. Jurong Consultants / JTC Corporation O Jurong é controlado pelo JTC, o proprietário de 35 distritos industriais, onde mais de sete mil empresas têm suas instalações e pagam aluguel. É um grupo com atividades multidisciplinares que empreendem negócios em diversos setores, incluindo a construção naval. Políticas e subsídios Com uma poupança interna mais que suficiente para capitalizar seus empreendimentos, as empresas de Cingapura contam, com certa facilidade, com acesso ao capital de risco. Mesmo assim, a estrutura societária, no país, tem 45% de participação do Estado, no total. Esta realidade indica que existe um grau de relação muito grande na estrutura produtiva, permitindo o desenvolvimento de ações coordenadas com facilidade. O fato de o país ter selecionado o segmento offshore para especializar sua construção naval indica uma elevada percepção das oportunidades, já que o Japão e a Coréia eram competidores na construção naval de grande porte, principalmente petroleiros VLCC. Sistemas de alianças Observa-se que existe a inclusão da construção naval em grandes conglomerados. Como as praticas governamentais são consideradas acima da média, essa opção indica um projeto em execução, ocupando mão-de-obra e formando recursos humanos, ocupando um nicho do mercado de alto valor agregado e com a demanda elevada. A aliança com a China coloca Cingapura como porta de entrada de um novo e pouco explorado ambiente de negócios. O futuro As empresas de Cingapura têm limitações físicas importantes para sua expansão. Desta forma, depois de constituir competência reconhecida, as empresas estão buscando instalar bases produtivas em países vizinhos, como a Malásia e China e outros mais distantes, como o Brasil. Na Malásia e China estão buscando complementar a capacidade produtiva de suas bases nacionais. No Brasil as empresas estão em busca de novas oportunidades de negócios.

3.6. CHINA

ECCIB

17

UNICAMP-IE-NEIT

A China também sente o peso da competição mundial na construção naval. Desde 1980, a exportação de navios é uma das fontes de receita em moeda forte. A China ocupa a terceira posição, depois do Japão e da Coréia, no ranking mundial dos países líderes na construção naval. Os fatores que afetam a China são: a crise das economias asiáticas diminuindo encomendas de navios; o ingresso na OMC e a adequação às regras do comércio mundial; o compromisso com os trabalhadores, dificultando a formação de preços competitivos. Um estaleiro, na China, ocupa de 9.000 a 12.000 pessoas, enquanto que, no Japão, um estaleiro com a mesma capacidade usa 900 a 1.500 pessoas. A nova estrutura de construção naval que emerge da reforma do setor é composta pela China Shipbulding Trade Co., responsável pelos negócios internacionais, enquanto a produção fica sob o controle da China Shipbuilding Industry Association. O Ministério dos Transportes da China perde sua função de desenvolver infra-estrutura, entregue para duas empresas sob o controle do Estado, mas funcionando dentro das regras do mercado. Essas empresas, por sua vez, passam para o governo toda a tecnologia de construção naval militar (para a Comissão de Ciência, Tecnlogia e Indústria do Ministério da Defesa). Os estaleiros chineses precisam lidar com a necessidade de importar peças e equipamentos e, até mesmo, alguns tipos de aço, visando manter os navios de exportação no padrão desejado pelos armadores. Esse é um fator que encarece e torna menos competitiva a produção para o mercado internacional. Além disso, licenças para uso de projetos e processos, muitos deles desenvolvidos pelos japoneses, devem ser pagas. A moderna construção naval chinesa data de 1860, com o lançamento de um navio a vapor, em Shangai. Durante quase 80 anos, os estaleiros chineses produziram pouco, principalmente para atender a navegação fluvial interior. Em 1950, o regime comunista estatizou os estaleiros e iniciou um programa de expansão industrial capaz de atender às necessidades de construção da frota mercante chinesa. Em 1970, com a abertura da economia da China, armadores de Hong Kong, interessados em estreitar laços com o continente, encomendaram navios graneleiros de 27 mil TPB, simples e básicos, aos estaleiros chineses. Em 1980, armadores europeus já haviam encomendado graneleiros, atraídos pelo preço baixo. Logo, os estaleiros começaram a produzir navios mais sofisticados. (Fonte: Paul Woodward diretor da consultoria Asian Strategies Ltd., seldiada em Hong Kong) Estaleiros North Shipbuilding Group - formado a partir do Dalian New Shipyard (DNS), em Liaoning, era o único com instalações grandes o bastante para a docagem e a construção dos Very Large Crude Carriers (VLCCs), petroleiros de até 250,000 TPB. South Shipbuilding Group - formado a partir do estaleiro Shanghai's Jiangnan, que, em 2000, terminou a construção do estaleiro, em Pudong, num investimento estimado em US$ 500 milhões, tornando-se o maior estaleiro chinês. Sistema de alianças A China também considera estratégica sua indústria de navegação e construção naval, um setor que,segundo os chineses, deve ficar sob o controle do país ( no momento do Estado). O desafio de dar um salto de qualidade e tecnologia na construção naval vem tornando possíveis diversos acordos e associações com empresas de outros países, visando à produção de equipamentos, peças, motores e equipamentos de comunicação.

ECCIB

18

UNICAMP-IE-NEIT

A indústria é do Estado e, portanto, protegida, acompanhada de perto e relacionada ao restante da estrutura produtiva e às empresas de transporte marítimo chinesas, que operam, internacionalmente, sem esquecer de atender às promessas feitas ao grupo de trabalho da OMC. A cuidadosa criação de novas parceiras visa a atender questões produtivas pontuais, como é o caso do empreendimento conjunto da China Ocean Shipping Corp. (COSCO) com a japonesa Kawasaki Heavy Industries, visando desenvolver um estaleiro de reparos, com investimentos de US$100 million, na província de Jiangsu. Outro exemplo é o investimento, com empresas de Cingapura, de uma unidade industrial para produzir estruturas à indústria de petróleo, em Yantai, Província de Shandong. Políticas e subsídios A China dava subsídios à exportação de navios, compensando diferenças de preço de até 17%. O grupo de trabalho da OMC à China identificou uma lista de subsídios proibidos, estabelecendo um prazo para sua eliminação que vai, em alguns casos, até 2003 e 2004. Mesmo assim, diversos membros do grupo de trabalho consideram que a lista obtida é incompleta. Foram identificados subsídios em diversas fases do processo de construção e aquisição de suprimentos, em diversos níveis do governo. O futuro Uma maior abertura para investimentos na construção naval da China e setores correlatos é esperada para o futuro. Em 1991, uma empresa alemã foi autorizada a comprar um pequeno estaleiro, em Shangai, atualmente fabricando navios especiais para transporte de gás a armadores europeus. Outros exemplos deste tipo podem ser esperados visando implantar, na China, produção de navios de maior valor tecnológico. Existem acordos com as coreanas Hyundai Motor Co. e Samsung Group para produção de blocos de navios, em Dalian e Ningbo, criando um pólo de construção, em Ningbo, antes inexistente, e com a vantagem do seu porto ter maior profundidade que o porto de Shanghai.

PARTE B: TENDÊNCIAS NO BRASIL

4. MERCADO: DINAMISMO NO OFFSHORE O setor de petróleo e gás continuará a ser, nos próximos anos, um dos setores mais dinâmicos da economia nacional, indutor de crescimento industrial e de geração de empregos de mão-de-obra qualificada. Essa visão do setor de petróleo e gás como um gerador de riquezas, além da produção de hidrocarbonetos, leva a uma preocupação com o impacto na indústria nacional de equipamentos. Para tornar esse impacto positivo à geração da riqueza interna, a ANP precisa atuar em coordenação com outras áreas dos governos federal, estadual e municipal, visando, além da ampliação da produção do petróleo e da atividade de prospecção, promover o desenvolvimento científico e tecnológico em toda a cadeia produtiva do petróleo e do gás. Os investimentos na exploração de petróleo offshore estão promovendo uma retomada das atividades de fornecedores deste segmento. Até o momento é a Petrobrás a líder dos investimentos, com um plano estratégico que pretende transformá-la em uma empresa de energia, ancorada em investimentos na exploração de petróleo e gás. O foco é a exploração de

ECCIB

19

UNICAMP-IE-NEIT

petróleo offshore, fazendo-se necessários equipamentos e serviços associados ao segmento naval. No plano estratégico para o período 2000-2005, estão previstos US$ 30 bilhões de investimentos, sendo 68% para a exploração e produção. Neste cenário, a indústria fornecedora de bens e serviços encontra amplas oportunidades, mas também ameaças. As encomendas da Petrobrás, para a exploração e produção de petróleo, principalmente na Bacia de Campos, no Rio de Janeiro, já estão exigindo reparos, conversões e, mais recentemente, novas construções. À semelhança do processo ocorrido no Mar do Norte, onde o Reino Unido e a Noruega lograram, em pouco tempo, criar e desenvolver uma indústria de excelência mundial, fornecendo mais de 60% dos equipamentos, a indústria brasileira tem três desafios pela frente:

1- Realizar rápido processo de aprendizado. 2- Ampliar a participação no fornecimento de bens, serviços e tecnologia. 3- Enfrentar a concorrência de produtores não localizados no país.

A base de partida não é segura, pois, conforme mostra a Tabela , as plataformas encomendadas e já entregues não apresentam níveis de nacionalização altos. Entretanto existe uma disposição política de realizar encomendas à indústria local, desde que esse setor se prepare e reduza custos. No entanto, com apoio da ONIP, a indústria local vem aumentando seu fornecimento.

Tabela 1: Plataformas, contratantes e nacionalização.

Unidade Tipo Main contractor País % Material Made in Brazil

P35 FPSO Hyundai Córeia 0 P36 SS Marítima Canadá 0 P37 FPSO Marítima Cingapura 20 P38 FPSO Mitsubishi Cingapura 15 P40 SS Mitsubishi Cingapura 20 P47 FPSO Astano Espanha 0 Fonte ANP-PUC/RJ 1999 Ao mesmo tempo em que a história recente não define uma boa base de partida, as oportunidades existem. Nas três primeiras rodadas de licitação de campos promovidas pela ANP, o comprometimento de nacionalização da Petrobrás e das empresas estrangeiras é de, no mínimo, 30% (Tabela 2).

Tabela 2: Indíces de nacionalização aproximado, nas licitações ANP

(% de nacionalização na fase de desenvolvimento) Rodada Petrobrás Empresas estrangeiras

01 30 26 02 40 47 03 36 39

Fonte: ANP Somente a Petrobrás seria suficiente para induzir uma demanda considerável, permitindo escala

ECCIB

20

UNICAMP-IE-NEIT

apropriada da indústria local. A empresa pretende, em 2005, extrair 1,85 milhões de BPD. Durante o período 1999/2005, foram ou serão encomendadas 11 plataformas de exploração, conforme mostra a Tabela 3.

Tabela 3: Plataformas da Petrobrás: campos, capacidade e tipo de embarcações

Entrada em operação Campo Capacidade (bpd)

Tipo Contratação

1999 Marlim 100.000 FPSO – P35 Hyundai 2000 Roncador 180.000 SS – P36 Marítima

(desaparecida) Marlim 150.000 FPSO – P37 Marítima

Espadarte 100.000 FPSO – P38 Mitsubishi 2001 Marlim Sul 150.000 SS – P40 Mitsubishi 2002 Barracuda 150.000 FPSO – P43 Caratinga 150.000 FPSO – P48 2003 Bijupirá-

Salema 55.000 FPSO C/Enterprise Oil

Frade 110.000 Spar FPSO C/Texaco 2004 Marlim Mod. 2 150.000 UCS-FSO Roncador

Mod.2 140.000 FPU PPS

Fonte: Petrobras Para isto serão necessários 1.200 km. de dutos flexíveis, 1.000 km. de dutos rígidos, 200 km. de risers, 750 umbilicais, 233 árvores de natal, 14 manifolds, 7.000 km de tubos de produção e 3.000 km de tubos revestidos. A Tabela 4 informa a quantidade e tipos de embarcações necessárias.

Tabela 4: Embarcações de apoio- situação atual e demanda firme Tipo de embarcação Situação atual – unidades Demanda Firme - unidadesReboque, manuseio de âncoras, suprimento

29 24

Manuseio de espias 14 14 Transporte de passageiros 6 6 Suprimento 35 34 Reboque e suprimento 16 16 Utilitário 10 10 Fonte: Petrobrás As encomendas promovem recuperação dos estaleiros e iniciam o período de caça aos recursos humanos qualificados, projetistas, engenheiros, executivos, gerentes, técnicos em montagem, metalúrgicas navais e soldadores certificados. Os estaleiros brigam para contratar pessoal e roubam profissionais um dos outros. A constatação é que se torna essencial formar recursos humanos com rapidez. Existe uma grande empresa de projetos trabalhando em sistema CAD/CAM, a Projemar, um “spin-off” do antigo estaleiro Emaq, que conquistou faixa própria

ECCIB

21

UNICAMP-IE-NEIT

de mercado, exporta serviços para os Estados Unidos e está com dificuldades de atender a demanda interna.

5. MERCADO: ESTAGNAÇÃO NA MARINHA MERCANTE Esse quadro de demanda em expansão contrasta com o vazio representado pela marinha mercante tradicional, de cabotagem e longo curso, com poucas perspectivas de encomendas ou planos para o setor. Apesar do reconhecimento geral das sérias implicações para a estratégia de comércio exterior e para o aumento do item fretes no balanço de pagamento, nenhum ação efetiva existe para construção naval destinada à Marinha Mercante. Apenas a Petrobras está contratando a construção de quatro petroleiros para a Transpetro e, recentemente, um armador estrangeiro colocou encomendas para porta-container. O quadro dos armadores apresenta o seguinte cenário: ! O grupo Hamburg Sud comprou a Aliança Transportes e Navegação, com linhas para a

Europa e Estados Unidos, em 1998. Posteriormente comprou a operação para a Europa da Transroll.

! A Libra foi comprada pela chilena CSAV. Essas operações praticamente encerraram o controle do capital nacional no transporte de carga em containêres.

Restam operando, controladas por brasileiros, na navegação de longo curso: ! Norsul (granéis/celulose), do grupo da Aracruz Celulose. ! Global, do Grupo Lachmann. ! Docenave (minérios), da Cia. Vale do Rio Doce, que não deseja manter essa operação. ! Transpetro (petróleo e derivados). ! Metalnave (gás e produtos químicos).

Essa situação reflete-se nos fretes pagos em moeda brasileira, representando apenas 3,6% do total (o máximo pago a navios de bandeira brasileira em moeda local foi 32%, na década de 1970). Outros 15,3% são fretes gerados por empresas sediadas no Brasil, mas que pagam em dólares o afretamento de navios estrangeiros. O grosso do movimento, 81,1% são fretes pagos em dólar a armadores estrangeiros. A navegação de cabotagem tem seu potencial pouco explorado no Brasil, considerando os mais de 12 mil km navegáveis (costa brasileira e rios amazônicos) e o grande volume de cargas movimentadas por distâncias superiores a 1.000 km. Isto sem considerar as importantes as implicações da consolidação do Mercosul para este segmento. Esta atividade está restrita ao transporte de petróleo e derivados, de produtos químicos e de minérios entre terminais privativos. O transporte de carga geral por cabotagem, tradicional em muitos países, no Brasil é irrelevante e está sendo ocupado por empresas estrangeiras, o que seria impensável em outros países.

6. ESTALEIROS: ESTRUTURA PATRIMONIAL Com pesada e negativa herança, bem conhecida do público em geral, a indústria naval está iniciando um processo de retomada das atividades, mas ainda sem contar com empreendedores

ECCIB

22

UNICAMP-IE-NEIT

de porte, capitalizados e integrados aos grandes conglomerados brasileiros. Nesta nova fase, as empresas em operação são de três tipos:

1. Alianças entre antigos donos de estaleiros, ex-executivos e técnicos, para atender demandas prementes de reparos e novas obras. Estão, nesta categoria a Promar / Mac Laren e a SNO / Mac Laren (recentemente a Mac Laren informou que pretende retomar as instalações usadas pela Promar, em 2004).

2. Arrendamento de estaleiros ou venda do fundo de comércio a empresas internacionais. Estão nessa categoria o arrendamento do Mauá pelo Jurong e do Verolme pelo Fels, ambos de Cingapura, e a venda do Promar ao Aker, da Noruega.

3. Empreendimentos na indústria naval, com pequeno investimento, para atender a contratos já existentes. Estão neste caso Emaq /Eisa (recentemente vendido ao Jurong), a Transnave, o SNO e a Superpesa, que embora registrada como estaleiro tem apenas unidade industrial longe da orla marítima.

4. Estaleiros que produzem para empresas do grupo. Estão neste caso o Estaleiro Itajaí, construindo navios de transporte de gás para a controladora Metalnave, e o Wilson & Sons, estaleiro em Santos, que constrói rebocadores para a controladora do mesmo nome.

Os principais estaleiros em operação apresentam o seguinte perfil: Eisa – Estaleiro da Ilha – É o antigo Emaq, foi adquirido pela Sequip, do empresário Nelson Tanure (ver a seguir) e depois vendido aos diretores. Mauá – Operado pelo Mauá Jurong S.A., que tem 99,93 % do seu capital sob controle do Jurong Shipyard Inc, uma “venture company” com sede nas Bahamas. Essa empresa nas Bahamas, por sua vez, é controlada em 65% pelo Synergy Group e em 35% pelo Jurong Pte. Ltd., subsidiária integral do SembCorp Marine, com sede em Cingapura. Verolme / IVI Angra – Arrendado ao Fels Settal, uma sociedade entre a Settal, com sede em São Paulo, e o grupo Keppel Fels, de Cingapura. O estaleiro foi adquirido pela Sequip, uma empresa controlada pelo empresário Nelson Tanure (depois adquiriu a Cia. Docas, criando a DocasNet e adquirindo o direito de uso da marca JB e seu conteúdo). adquiriu o Emaq, a Ishikawajima do Brasil e o Verolme. Vendeu o Emaq aos diretores. Consolidou o Verolme e o Ishi como Industria Verolme-Ishikawajima, com estaleiros em Angra dos Reis e no Caju, no Rio de Janeiro, respectivamente. Este último está desativado; suas máquinas foram vendidas e o canteiro de obras vem sendo utilizado como depósito de containers. Apenas seu dique continua em operação, para fins de construção e reparo naval. Mac Laren – O estaleiro da Ilha de Conceição, Niterói, está arrendado ao Promar, recentemente vendido ao Aker, em contrato com vigência pelos próximos anos. O estaleiro de Ponta da Areia, Niterói, foi, em parte, arrendado ao SNO. Mac Laren e SNO anunciaram recentemente a formação de um consórcio para atuar conjuntamente em reparo e construção naval, manifestando a intenção de retomar as instalações arrendadas a Promar. Itajaí – Estaleiro Itajaí S/A, localizado em Santa Catarina, pertence à Metalnave S/A Comércio e Indústria (controlada pelo empresário Frank Wlasek). O Estaleiro Itajaí constrói os navios gaseiros usados pela Metalnave. Foi selecionado por armadores para construir barcos de apoio offshore. Enavi-Renavi - O estaleiro Enavi-Renavi é o resultado da fusão de duas empresas de reparos

ECCIB

23

UNICAMP-IE-NEIT

navais, ocorrida em 1995. O estaleiro é controlado pelo Grupo Reicon, do Norte do país, cujas principais empresas são transportadoras de gás (Reicon), transportadoras de combustíveis (PetroAmazon), turismo (Funtur) e vale-refeição (AmazonCard).A conquista das encomendas da empresa De Lima, para a construção de navios de apoio tipo LH e PSV, lança o estaleiro no mercado de novas construções, além do reparo naval que é sua atividade tradicional. Este estaleiro integra os ativos de um grupo empresarial com interesses diversificados. Ebin-Teclabor – Estaleiro em Niterói, RJ, que está sendo reativado, para atender as demandas dessa nova fase da construção naval. A massa falida foi adquirida pela Teclabor e vai especializar-se na construção de apoio marítimo. Caneco – Indústrias Reunidas Caneco S/A, estava paralisado devido a dificuldades financeiras, foi arrendado para operar como pátio de armazenagem e a Superpesa arrendou instalações industriais para construir dois navios de apoio do tipo LH, cujos contratos coma Petrobrás foram conquistados em recente licitação internacional. Inace – Indústria Naval do Ceará S/A, produz navios de até 4.000 TPB, fabricava barcos de pesca, atualmente produz embarcações de lazer e de aplicação militar. Ebrasa – Empresa Brasileira de Construção Naval S/A, localizada em Itajaí, constrói e faz reparos de embarcações de menor porte, barcos de pesca, rebocadores e empurradores. Pode construir barcos para apoio marítimo ao offshore. Sermetal – Sermetal Rio Serviços Metalúrgicos Ltda., localizado em Niterói, tem capacidade de construir navios de até 10.000 TPB. Está produzindo módulos para plataformas de petróleo offshore. Transnave – Transnave Estaleiro de Reparos e Construção Naval S/A, localizado na Ilha do Governador, Rio de Janeiro, com capacidade de construir embarcações de apoio de pequeno porte para o setor offshore. CEC – CEC Equipamentos Marítimos e Industriais S/A, localizado em Niterói, pode fabricar módulos para plataformas e diversos tipos de navios. Pode-se concluir que a situação grave da construção naval brasileira tem que ser explicada por diversos fatores, que vão dos empresariais até aos relativos a políticas governamentais, passando pelo relacionamento entre os agentes que fazem parte da cadeia produtiva. Isto será feito a seguir.

7. ESTALEIROS: CAPACITAÇÃO E COMPETITIVIDADE

7.1. CAPACIDADE PRODUTIVA E RH A indústria naval brasileira em 1999 atingiu níveis de produção irrisórios. A partir desta data iniciou um processo de retomada da produção, principalmente com os investimentos da Petrobrás. Apesar disso observamos pelas estatísticas de produção mundial que a indústria brasileira de construção naval tem presença marginal entre os competidores mundiais. A situação, no segundo semestre de 2002, apresenta um quadro totalmente diferente e existe

ECCIB

24

UNICAMP-IE-NEIT

temor de que os estaleiros não terão condições de construir o volume de tonelagem bruta correspondente às encomendas atuais de navios de apoio offshore, petroleiros, FPSO’s, porta-cotainers e navios transportadores de gás, que representam o maior volume dos contratos de construção atual. Com base nas entrevistas realizadas no setor e nas notícias publicadas na imprensa foi possível traçar o seguinte quadro das encomendas feitas à construção naval em julho de 2002 (Tabela 5).

Tabela 5 Encomendas à construção naval em julho de 2002

Estaleiro Tipo de navio Armador Jurong/Mauá 2 FPSO’s Petrobrás Brasfels/Verolme 1 FPSO Petrobras 3 AHTS Delba Jurong/Eisa 4 Petroleiros* Transpetro Promar 6 PSV’s TideWater (02) Solstad (02) Edson Chouest (02) Itajai 2 porta container P&O 1 AHTS SeaLion 1 Multipourpuse BOS–Brasil

OffShore** 3 gaseiros Metalnave 1 Mega Iate - Transnave 1 AH Transnave SNO LH - Reforma Platafm. Petrobras Wilson & Sons 2 PSV’s Wilson&Sons Superpesa/Caneco 1 LH Superpesa Enavi-Renavi 1 LH De Lima 1 PSV De Lima

Estimativa da situação das encomendas em julho de 2002 *encomendas da Petrobrás ainda em definição ** associação da Petroserv com Farstad O quadro aponta para um razoável nível de ocupação dos estaleiros. Neste conjunto não estão computados dois AHTS que devem ser construídos, para atender a Petrobrás pelos armadores CBO e Trico, vencedores da concorrência. A esse volume de construção naval devem ser somadas as obras de reparos navais, que prosseguem, aumentando a pressão sobre o cenário de escassez de mão de obra para os estaleiros, principalmente soldadores. Existem dois problemas a serem enfrentados: a falta de mão de obra e a expansão física e modernização dos estaleiros. Esses temas são motivo de preocupação e estudos da ONIP e da Secretaria Estadual de Energia Indústria Naval e Petróleo.. A Secretaria Estadual de Energia Indústria Naval e Petróleo considera a formação de recursos

ECCIB

25

UNICAMP-IE-NEIT

humanos sua principal preocupação. A Secretaria estima a necessidade dos estaleiros, a curto prazo, em cerca de 7.000 técnicos, principalmente soldadores, e vê a possibilidade de formação de apenas 1.200, através do Senai. Uma das propostas da Secretaria é a criação no Estado do Rio de Janeiro de uma estrutura no modelo da existente na cidade de Aberdeen, na Escócia, um dos mais importantes centros de serviços para a atividade offshore no mundo, criado a partir das demandas geradas pela exploração do Mar do Norte, numa situação semelhante a que existe no RJ com a bacia de Campos.

O Governo do Estado do Rio de Janeiro tem um memorando de entendimentos assinado com a Prefeitura de Aberdeen visando o intercâmbio de informações. O interesse da Secretaria é promover um intercâmbio em que empresas e organizações de Aberdeen participem do esforço de treinamento de mão de obra do Rio de Janeiro, num primeiro momento realizando esse treinamento na Escócia e, numa segunda etapa, implantando no Rio, em conjunto com empresas e organizações brasileiras, capacidade local de treinamento de pessoal necessário para atender à demanda. A ONIP vê a falta da mão de obra como um dos problemas, principalmente a falta de soldadores, sendo necessário desenvolver um programa de formação de recursos humanos envolvendo todas as organizações que trabalham em formação de RH e treinamento. Sobre essa pressão de demanda a ONIP vê a necessidade de reposição da frota de petroleiros da Transpetro, cuja idade já atinge mais de 20 anos, e a necessidade de construir cerca de 82 navios de apoio nos próximos 10 anos, o que representa a construção de oito navios a cada ano. Esses dois componentes da demanda podem assegurar uma escala de produção que transforme a realidade industrial e a escala dos estaleiros locais, ampliando sua condição de competir. A ANP analisa formas de ampliar a participação da indústria nacional nos fornecimentos ao setor de petróleo e acompanha a evolução da nova fase da indústria de construção naval. A indústria naval será a construtora das estruturas de plataformas e realizará a reconstrução dos cascos dos FPSO’s. Os cascos e estruturas representam cerca de 40% do valor de um equipamento offshore, cabendo aos “skids” (conjuntos de produção que processam o petróleo bruto na primeira fase) 60% do valor dos investimentos.

A polêmica entre o Fels e o Jurong, envolvendo a licitação da Petrobrás do FPSO P-50, segundo a ANP, envolve apenas a construção do casco e da estrutura. Os conjuntos de produção, que representam a maior parte do investimento, já estavam contratados há algum tempo. O casco foi o último item a ser lançado em licitação pública.

O caso do P-50 é um exemplo da complexidade que envolve um programa para aumentar a participação do fornecimento local para estruturas offshore. As concorrências dos FPSO P51 e P52 se seguirão, ampliando as questões que envolvem a produção de um equipamento com um custo total de quase meio bilhão de dólares, exigindo garantias de performance do equipamento. Como não existe um contratante principal, para agir como integrador do sistema, o estaleiro tende a assumir essa função que envolve o risco pelo trabalho executado por outras empresas, muitas vezes em outros países.

A capacidade da indústria nacional para produzir localmente, incluindo a integração dos fornecedores importados, é o desejável e para isso torna-se necessário organizar os agentes

ECCIB

26

UNICAMP-IE-NEIT

antes do lançamento dos editais. Essa tarefa cabe a todos os agentes: governo federal e estadual, centros de pesquisas e de formação de recursos humanos e empresas.

A ANP considera que a forma de obter resultados é através de ambientes como a ONIP, já que o governo, ANP e a Petrobrás compreendem a importância das encomendas na promoção de renda interna. O preço dos equipamentos e sistemas fornecidos é a questão relevante e a forma de organizar os agentes locais é através de um programa de redução de custos da cadeia de suprimentos doméstica. É necessário transformar a mobilização política numa ação comercial concreta que reduza custos e aumente a participação do conteúdo local.

7.2. CAPACITAÇÃO E ESTRATÉGIA DE MERCADO A melhoria da eficiência e do desempenho passa, em última análise, pelo menos no que se refere ao esforço próprio das empresas, pelo incremento nos seus níveis de capacitação (tecnológica, produtiva e gerencial) e na redefinição das suas estratégias de mercado. Apesar de não ter sido possível a obtenção de dados atualizados sobre estas questões, muito provavelmente devem persistir ou estar agravados os problemas detectados por Grassi (1995). Capacitação tecnológica - foram apurados gastos em P&D quase inexistentes, que na verdade nunca foram incentivados pelas políticas governamentais. As empresas revelavam uma certa atualização em tecnologia (de produto e processo) porque esta é amplamente disponível no mercado internacional. A falta de inovações, principalmente em processo, sempre caracterizou a indústria naval brasileira, ajudando a explicar a sua baixa produtividade. Capacitação produtiva - constatou-se que o parque industrial encontrava-se defasado tecnologicamente, além de em muitos casos não ser suficiente para o aproveitamento das potencialidades produtivas dos estaleiros. O esforço de recuperação dos equipamentos danificados pela falta de uso já começou, bem como a atualização tecnológica. O maior desafio refere-se aos investimentos em treinamento de pessoal.

Capacitação gerencial - a reestruturação interna feita no início dos anos 90 foi insuficiente para a obtenção dos ganhos em eficiência necessários à competição internacional. Técnicas gerenciais, como Qualidade Total e Just-in-time, não foram colocadas em prática a contento. Neste último caso, a falta de cooperação entre os elos da cadeia produtiva foi decisiva para a sua não implementação. Em julho de 2002 não existia nenhum estudo sobre boas práticas gerenciais e industriais em andamento nos estaleiros nacionais, embora existam necessidades identificadas pelo DMM e a ANP.

Sabe-se que nos principais estaleiros internacionais atividades relativas ao processo produtivo já são terceirizadas, inclusive a produção dos projetos de construção. Os estaleiros tendem a ser montadores terceirizados. Em 1995, os estaleiros brasileiros estavam totalmente atrasados em relação a estas atividades.

Estratégias de mercado - os estaleiros em nenhum momento conseguiram se enquadrar (inclusive por deficiências de política governamental) numa das duas estratégias definidas anteriormente, de segmentação da oferta. Os estaleiros brasileiros já produziram praticamente todos os tipos de navios, inclusive alguns de maior conteúdo tecnológico, mas sem se especializar num nicho específico.

ECCIB

27

UNICAMP-IE-NEIT

Nesta fase atual os estaleiros enfrentam o desafio da competitividade, atropelados pela recuperação de níveis de ocupação das instalações, sem contar com nenhum projeto estruturado de aprimoramento tecnológico que permita a redução dos custos de materiais e de overhead, além do aumento da produtividade da mão de obra, uma necessidade absoluta no quadro atual. Mesmo o antigo problema de atrasos na entrega pode ser superado, como demonstrado em 1995, quando clientes suficientemente exigentes e esquema de financiamento confiável estiveram, momentaneamente em operação. Quanto ao preço, nota-se que em 1995 a indústria naval brasileira conseguiu produzir ao preço internacional, embora esta informação deva ser vista com cuidado, dado que a busca pela sobrevivência poderia levar empresas a praticar preços suficientes apenas para cobrir seus custos variáveis. Mas a vantagem em custos com mão-de-obra e a equivalência de custos com os competidores internacionais quanto a aço e navipeças (neste caso, após a abertura comercial) abre perspectivas importantes para a indústria brasileira.

8. CADEIA DE FORNECEDORES

8.1. RELAÇÃO ENTRE AGENTES Apesar da falta atual de dados para a análise do relacionamento entre os diversos atores da cadeia naval-mercante, pôde-se apontar, no passado, a gravidade dos problemas de relacionamento entre os agentes, onde prevalecia a completa falta de cooperação entre os elos da cadeia. Esta situação é, particularmente, preocupante em uma indústria onde acordos de cooperação constituem-se em importantes fontes de vantagem competitiva, conforme revelam as experiências japonesa e coreana. O fracasso da Câmara Setorial da Indústria Naval, no início da década de 90, de curta duração, exemplifica a dificuldade de resolução dos problemas do setor e deve ser levado em conta nas discussões do atual Fórum. Mesmo entre os diversos órgãos governamentais que atuam na cadeia naval-mercante (BNDES, CDFMM, DMM, GEIPOT e órgãos que vêm sucedendo a CACEX), o entrosamento entre agentes não era dos melhores. A recente criação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários pretende alterar as limitações do passado. A ANP tem incentivado iniciativas como a ONIP onde o governo participa, ao invés de Câmaras Setoriais onde governo lidera. A ONIP está ativamente envolvida na promoção da indústria no país e no exterior, buscando maximizar os benefícios associados ao investimento em petróleo e gás no país. Deve ser destacada sua participação nas negociações da Halliburton para o campo de Barracuda-Caratinga, num projeto de US$2,5 bilhões, sendo que a empresa se comprometeu em realizar, no Brasil, 40% dos investimentos de US$ 360 milhões, na conversão de dois cascos de petroleiros em FPSO’s e a fabricação e montagem dos módulos de processo dos “top sides”. A mesma iniciativa aplica-se ao projeto do navio de apoio, já incluindo a especificação de uma lista de fornecedores. No caso, o trabalho resultou na aceitação da Ulstein / Rolls Royce, fornecedores do projeto, em especificar a Apolo Produtos de Aço na sua lista de fornecedores para navios do tipo PSV (Plataform Supply Vessel) e AHTS (Anchor Handler,Tug and Supply).

ECCIB

28

UNICAMP-IE-NEIT

8.2. - O CASO DE NAVIO DE APOIO A análise do caso concreto de uma série de três navios de apoio construídos em estaleiro do Rio de Janeiro, sintetizada no Quadro 1, permite visualizar a situação da cadeia de suprimentos para a construção naval. Foram definidos 12 sistemas principais que compõem a base de produção de um navio de qualquer tipo. Estima-se que a parte nacional representa cerca de 60% do custo do navio, cobrindo a mão de obra, a estrutura do casco e os acessórios. Neste caso, o armador optou por gerenciar, através de terceiros, diversas atividades antes realizadas integralmente pelo estaleiro, superando, desta forma, práticas de suprimento defasadas. A indústria de navipeças estava desarticulada e diversas empresas precisaram ser convencidas a fornecer para a área naval, assegurando-se pagamento em dia e encomendas continuadas para os três navios. Cabe destacar que todas as vezes que o estaleiro foi solicitado a participar do processo de identificação de fornecedores, preferiu apresentar uma empresa estrangeira a identificar alternativas locais, as quais, em muitos casos, existiam. Um dos exemplos são os tanques de aço que, nos primeiros navios, foram importados e que, a partir do terceiro navio, foram produzidos pela Apollo Mecânica, de São Paulo, que passou a ser o fornecedor indicado pela projetista (Ulstein / Rolls Royce) aos demais armadores. Na cadeia de suprimentos, merece destaque a Projemar, empresa de projetos e de detalhamento de navios em computador (CADCAM), criada pelo Emaq, vendida aos seus diretores e, atualmente, operando no segmento offshore, com dificuldades de atender a indústria de construção naval, por excesso de serviço. O armador optou por terceirizar o fornecimento de peças de aço cortadas, jateadas e pintadas (a partir de programa de corte fornecido pela Projemar). Foram usados diversos fornecedores: a Usimec, do grupo da siderúrgica Usiminas, o EISA – Estaleiro da Ilha S.A. – e, por último, a caldeiraria da White Martins. No total, foram mobilizados 250 fornecedores de sete mil itens.

ECCIB

29

UNICAMP-IE-NEIT

Quadro 1: Análise da cadeia de suprimento – o caso de navios de apoio

Sistema Origem Situação FuturoPropulsão Motores Eixo Hélices

100% importado No passado oshélices eramfabricados no país.

Sem escala parafabricar motores.Eixos: possível, temtecnologia.

Governo Lemes Comando

100% importado Sem tecnologia paraos controles e semescala para os lemes.

Chances reduzidasde produção local.

Manobras Thrusters Posic. Dinâmico

100% importado Sem tecnologia ouescala.

Chances reduzidasde produção local.

Energia Gerador eixo Gerador diesel Quadros Paineis

95% importado 5% local

Poderia ser 100%fornecidolocalmente. Osquadros são locais.

Existe tecnologia einds que exportam..Não existe produçãopara mercado naval.

Automação Nível de tanque Remoto válvula Pressão / Temp.

100% importado Poderia ser em partefornecidolocalmente.

Existem inds queexportam e quepoderiam produzirp/ mercado naval.

Acomodação Cozinha Ar Condc. Frigorífico Mobiliário Divisórias

20 % importado80 % local

O mobiliário é 100%nacional.

As divisórias sãoimportadas.

O fornecedor dedivisórias nãotecnologiaatualizada para opadrão naval.

Estrutura Casco Acessórios

100% local Segmento mais fácilde desenvolverfornecedores.

Condições deavanço eaperfeiçoamento.

Carga Bombas 7 Guindaste 1 Compressor 2 Tanques 3

90% importado10% local

Os tanques foramdesenvolvidos noRio na ApolloMecânica.

Os demaisequipamentos nãosão produzidos paraas exigências navais.Há tecnologia.

Elétrico Cabos Conectores

97% importado3% local

O cabos “halogenfree” não sãofabricados no país.

Foram importadosda Pirelli na Itália.

Hidráulico Tubos Conexões

5% importado95% local

Foram encontrados edesenvolvidosfornecedores locais.

Conexões ainda sãoimportadas e podemser locais.

Navegação Radar GPS Agulha Magn Piloto autom.

100% importado No passado asencomendas daMarinha haviacriado tecnologialocal.

Há tecnologia, masnão há escalaindustrial parainteressar a inds.

Comunicação Rádios UHF Comunic. Via satélite

100% importado No passado haviafornecimento local.Tecnologia obtidacom a Marinha.

Há tecnologia. Faltaescala industrialpara interessarempresas.

ECCIB

30

UNICAMP-IE-NEIT

8.3. CAPACITAÇÃO DOS FORNECEDORES Nos investimentos planejados pela Petrobrás, a indústria fornecedora de bens e serviços encontra amplas oportunidades, mas também ameaças. O volume de investimentos, por si só, poderia induzir a recuperação da indústria fornecedora associada ao segmento naval e também promover a consolidação de um segmento de mercado capaz de atender esta empresa, outros investidores no país e buscar oportunidades nos mercados externos. As ameaças estão associadas à incapacidade de agências públicas e, principalmente, o setor empresarial realizarem os investimentos necessários para construir a competência necessária para disputar encomendas em um contexto de economia aberta. Um estudo recente, promovido pela ONIP, pesquisou e diagnosticou as dificuldades encontradas em um conjunto de empresas que atuam como fornecedores de bens e serviços para o setor do petróleo e gás natural, em relação a gargalos tecnológicos e outros aspectos em geral (Perspectiva Tecnológica-ONIP 2000). Foram consultadas 21 empresas fornecedoras de bens e serviços, selecionadas pela ONIP, através de entrevistas com dirigentes que possuem uma visão abrangente da atuação de suas empresas. O capital das empresas pesquisadas está praticamente dividido em 50% de origem nacional e 50% de origem estrangeira. O faturamento anual do conjunto de empresas pesquisadas é da ordem de R$ 2,0 bilhões. A grande maioria das empresas pesquisadas está localizada nas regiões sul e sudeste e tem porte médio ou grande, pois 85% possuem mais de 100 empregados. Foi constatado também que, independentemente de seu porte, todas as empresas visitadas dão uma ênfase na inovação classificada como alta ou média pelos entrevistadores. “Gargalos tecnológicos” são aqui considerados os fatores que inibem as atividades relativas a novos processos e produtos que cheguem ao mercado, bem como a melhoria de processos e produtos já existentes. Outros aspectos associados à tecnologia em seu sentido mais amplo também foram pesquisados: gestão, informação, logística e comercialização pioneira. Seguindo essa lógica, é possível elaborar uma síntese dos gargalos, tal como se segue:

1. Fragilidade do Capital Inovação: necessidades e dificuldades de desenvolvimento de novos produtos e serviços.

As dificuldades identificadas para o aproveitamento de oportunidades ao desenvolvimento de novos produtos, sistemas, processos e serviços vão desde a falta de recursos financeiros próprios e indisponibilidade de financiamentos adequados até, em poucos casos, a falta de idéias para novas concepções de produto. Praticamente todas as empresas estão engajadas no desenvolvimento de novos produtos e serviços, no Brasil, ou com parcerias no exterior. Entretanto, o presente trabalho revelou que o relacionamento dos centros de pesquisa e universidades com as empresas, quando feito sem a interferência da Petrobrás, pode quase limitar a realização de ensaios, análises e testes. Uma questão central relacionada à inovação é a dependência, principalmente das empresas de capital nacional, do principal cliente, a Petrobrás, que promoveu durante décadas parcerias cliente-fornecedor bem sucedidas para o desenvolvimento de novos produtos e serviços. A entrada de novos atores – operadoras e main-contractors – no mercado nacional coloca novos desafios no estabelecimento de novas parcerias para os fornecedores nacionais.

ECCIB

31

UNICAMP-IE-NEIT

A fragilidade do capital inovação, retirando-se os aspectos financeiros, é menor nas empresas com mercado diversificado, além do setor petróleo, principalmente as empresas do segmento eletro-eletrônico. Os desafios tecnológicos que enfrentam têm sido por elas solucionados. Em síntese, do ponto de vista tecnológico, as idéias surgem principalmente das parcerias com os clientes, enquanto que, no aproveitamento e materialização destas idéias e na solução dos desafios relacionados à tecnologia de produto, as empresas contam com apoio dos próprios clientes, de seus parceiros, de fornecedores e de universidades ou centros de pesquisa. Para adequação do processo de produção, os fornecedores de equipamentos contribuem com o suporte técnico necessário.

2. Deficiências na Capacitação Empresarial: carência de capital humano e de informação, fragilidade do capital mercado e necessidades de alteração nas instalações e processo de produção.

A disponibilidade de capital humano adequado às necessidades de produção e inovação das empresas é importante, especialmente no caso de ampliação da demanda por produtos e serviços. Tanto empresas de capital nacional, como estrangeiro, enfrentam o mesmo desafio. A formação básica é considerada boa e a questão mais crítica é a especialização e experiência requeridas, principalmente pelas empresas de serviço. Quanto à exploração plena do capital mercado, as empresas de capital nacional são mais frágeis, demonstrando pouco conhecimento sobre o mercado, suas oportunidades e, principalmente, seus novos atores. Além das carências de suporte na obtenção de financiamento, elas enfrentam dificuldades com o nível de reconhecimento de suas respectivas marcas, no relacionamento com as novas operadoras que entram no mercado brasileiro e com o surgimento da figura dos main-contractors. As necessidades de alteração nas instalações e processo de produção são variadas e atingem a todos os tipos de empresa. Foram encontradas necessidades de mudar a localização da fábrica, informatizar processos, adquirir novos equipamentos para expansão e o desenvolver e fabricar novos produtos.

3. Dificuldades decorrentes do Fornecimento de Produtos e Serviços: dependência da importação de materiais e componentes e outros aspectos.

As empresas não enfrentam grandes problemas com insumos e componentes que provêm de fornecedores tradicionais no mercado nacional. Porém, ao tentarem colocar, no mercado, novos produtos ou serviços, as dificuldades na identificação de fornecedores locais ressurgem. Foram encontrados problemas de fornecimento de diversos materiais e componentes importados. Existe demanda para serviços de simulação de desempenho operacional submarino dinâmico e análise de risco, hoje com atendimento por empresas de engenharia estrangeiras.

4. Deficiências Estruturais: deficiências na oferta de serviços tecnológicos, deficiências decorrentes da regulamentação governamental, de financiamento e da capacitação de recursos humanos.

Serviços Tecnológicos: existe carência de informações sobre laboratórios credenciados em determinados segmentos e, em alguns casos, os preços de ensaios são considerados caros e com prazos demasiadamente longos, vis-à-vis às necessidades do mercado. As câmaras hiperbáricas

ECCIB

32

UNICAMP-IE-NEIT

existentes no país não têm condições de atender a demanda atual de testes de equipamentos e componentes para instalação em águas profundas. Identificou-se, também, a necessidade de acreditação de laboratórios nacionais para a marca da Comunidade Européia. Regulamentação Governamental: as empresas são quase unânimes em expressar a necessidade de adequação da regulamentação atual do REPETRO em relação ao ICMS, que vem prejudicando a competitividade do setor. Financiamento: é também uma unanimidade a necessidade de financiamentos para uma gama variada de aplicações, tais como: comercialização, P&D, aumento de produção, alteração de localização, garantias, performance bonds, etc. Capacitação de Recursos Humanos: as empresas encontram bons profissionais no mercado, mas sem formação ou experiência especializada em petróleo. Na maioria das vezes, são obrigadas a complementar a formação na própria empresa. Com a expansão do mercado, a necessidade de contratação de pessoal capacitado e experiente deve se tornar premente.

9. PAPEL DO ESTADO: EVOLUÇÃO E RELEVÂNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

9.1. CARACTERÍSTICAS GERAIS DO FMM Os principais instrumentos de financiamento e fomento à marinha mercante e à construção naval são o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e o Fundo de Marinha Mercante (FMM). Criados em 1958, continuam constituídos e legalmente disponíveis para essas indústrias. Um novo modelo de controle da arrecadação do AFRMM está implantado, na Secretaria de Transporte Aquaviário (STA), através do seu Departamento de Marinha Mercante (DMM). O novo modelo de gerenciamento utiliza convênios com a Secretaria da Receita Federal e com a rede bancária, através da Federação da Associação Brasileira de Bancos (FEBRABAN), ampliando o recolhimento do adicional ao frete, por meio de uma função automatizada e operada pelos próprios usuários. As taxas do AFRMM são as seguintes:

- 25% nos fretes de importação; - 10% na cabotagem; - 40% na navegação interior (neste caso, aplica-se apenas para granéis líquidos).

A divisão dos recursos do AFRMM é a seguinte: - Armador nacional operando navio próprio ou fretado de registro nacional:

• 14% para conta individual do armador (47%, se estiver enquadrado no REB); • 50% para o FMM (17%, se estiver enquadrado no REB); • 36% para a conta especial (os mesmos 36%, se estiver enquadrado no REB).

- Armador nacional operando navio de registro estrangeiro e armador estrangeiro: 100% para o FMM.

ECCIB

33

UNICAMP-IE-NEIT

As condições atuais de financiamento para longo curso e cabotagem, para empresas que registrarão seus barcos no REB – Registro de Embarcações Brasileiro - e para exportação são informadas na Tabela 6.

Tabela 6 Política Operacional - Condições Fundo de Marinha Mercante

FINALIDADE PRAZOS MÁXIMOS

(anos) TAXA DE PARTICIPA

ÇÃO

CARÊNC

IA AMORTIZA

ÇÃO JUROS (1) MÁXIMA 1 - A EMPRESAS DE NAVEGAÇÃO CONSTRUÇÃO 4 20 4% a 6% 90% JUMBOR/CONVERSÃO 4 15 7% (2) 90% EQUIP. P/REAPAR/MODERN. 2 5 7% (2) 90% REPARO (NO PAÍS) 1 (3) 2 (3) 7% (2) 90% 2 - A ESTALEIROS - PROD/REPARO EXPORTAÇÃO * * 4% a 6% 80% MERCADO INTERNO - L. CURSO/CAB. * * 4% a 6% 90% MERCADO INTERNO - INTERIOR (5) * * 4% a 6% 90% REPARO 1 2 7% 85% 3 - A MARINHA DO BRASIL NAVIOS AUX./HIDROG./OCEANOG. 4 15 6% (4) 4 - A EMPRESAS BRASILEIRAS DIQUES FLUT./CÁBREAS/DRAGAS 4 15 6% (4) 5 - OUTROS INTERESSES ** ** ** ** 6 - CRÉDITO RESERVA *** *** 4% a 6% *** A utilização dos recursos do FMM é corrigida pela variação do dólar norte-americano (1) Os juros poderão ser capitalizados, a pedido da beneficiária. (2) Registradas ou pré-registradas no REB: 6% (3) Registradas ou pré-registradas no REB: Car.: 2 anos; Amort.: 5 anos (4) Não especificado (5) Amazônia Legal: TJLP (*) A ser paga em uma única parcela (2º dia útil após pagto ou no vencimento previsto no Contrato) (**) Serão observadas as condições do Agente Financeiro (***) Os mesmos da operação principal Garantias: Definidas pelo Agente Financeiro

Classificação de Risco Taxa de Juros

A- a AAA 4,0% a.a. BBB a BBB+ 4,5% a.a.

BB- a BB+ 5,0% a.a. B- a B+ 5,5% a.a.

Dec. nº Dir 400 6,0% a.a.

Fonte: BNDES

ECCIB

34

UNICAMP-IE-NEIT

Este apoio é inferior ao norte-americano, por exemplo, conforme informa o Jornal do Brasil (23/04/00), noticiando que uma empresa brasileira construiu embarcação de apoio, nos EUA, com condições melhores que as do FMM (o MARAD concedeu 21 anos para o pagamento, juros de 3,5% ao ano e financiamento de 95% do valor da embarcação).

9.2. O USO DO FMM NO PASSADO A política de promoção dos dois setores (construção naval e marinha mercante) sempre se caracterizou pelo fato dos incentivos serem dados para os armadores nacionais comprarem navios com os estaleiros nacionais numa economia fechada, política que nunca foi associada a requisitos de eficiência na utilização dos recursos da sociedade. Algumas deficiências identificadas:

- Ao produzirem para o mercado doméstico, os estaleiros não tinham incentivos para cumprir prazos e preços, pois sempre havia a possibilidade de descumprimento contratual sem grande ônus. Atrasos e aumentos de preço durante a construção sempre foram comuns no setor.

- Existem indícios claros de uma grande assimetria de comportamento da indústria naval entre o atendimento das encomendas para o mercado interno e o externo. Possivelmente sempre existiu combinação de interesses na formação de preços para o mercado interno. Bastava o armador e o construtor naval acertarem entre si uma sobrevalorização do valor do navio. O fato dos navios produzidos para o mercado interno terem preços superiores aos destinados à exportação é um indício de que essa prática foi usada.

- As modificações dos termos originais dos contratos com o FMM, invariavelmente, sempre foram a favor dos beneficiados.

Outras distorções deste sistema de financiamento podem ser apontadas:

- Isenções à cobrança do AFRMM. A Lei 9.432/97 permitiu isenções para as regiões Norte e Nordeste.

- Mudanças constantes de indexadores, durante os diversos planos de inflação. - Recolhimento dos recursos da quota-parte do AFRMM à conta única do Tesouro,

gerando problemas de contingenciamento orçamentário.

Ainda persiste a falta de transparência na utilização dos recursos da sociedade, que na verdade é quem financia os dois setores. Não existe um acompanhamento gerencial das obras de construção naval que possa ser um instrumento de aperfeiçoamento do setor, sem ficar restrito aos documentos de acompanhamento do BNDES, sujeito à legislação de sigilo bancário.

9.3. USO PRESENTE DO FMM

Em julho de 2002 a ANP estava propondo ao BNDES a assinatura de um convênio entre as duas instituições, visando à troca de informações e ao desenvolvimento de estudos, já que o BNDES possui linhas de créditos como o Finame, agente operador dos recursos do Fundo de

ECCIB

35

UNICAMP-IE-NEIT

Marinha Mercante (FMM). A colaboração entre as duas instituições visa criar os instrumentos que poderão oferecer a contribuição necessária para o aumento da participação do fornecimento da indústria local.

Um dos itens de impacto na competitividade é o financiamento em condições adequadas. Esses recursos existem, segundo o Departamento de Marinha Mercante (DMM), que concede as prioridades para financiamentos do Fundo de Marinha Mercante. O DMM aponta uma demanda por financiamentos muito inferior à geração de caixa do AFRMM. A projeção do orçamento, no período de 2001 a 2010, apresenta uma geração de caixa de R$ 12,7 bilhões.

Tabela 7 Fluxo de Caixa dos recursos do FMM

Valores em R$ milhões Saldo

99/2000 Recursos Gerados

Projetos contratados

Projetos c/ prioridade

Saldo para novos

projetos Orçamentos 2001 a 2005

665,9 3.771,9 238,6 1.763,6 1.769,6

Orçamentos 2001 a 2010

665,9 12.769,9 238,6 1.763,6 10.767,5

Fonte: DMM Diante desses números, técnicos do DMM são favoráveis a conceder financiamentos do FMM à construção de estruturas offshore para a prospecção e produção de petróleo. Esses projetos são importantes para o país e fortalecem a escala e a capacidade de produção dos estaleiros, tornando-os competitivos para a produção de navios porta-contaîners, navios de cabotagem e para o transporte de gás na cabotagem, um novo nicho que deverá surgir. No setor existem opiniões divergentes argumentando que o alto valor das estruturas offshore pode comprometer elevadas parcelas de recursos do FMM, impossibilitando o financiamento para construção de navios de transporte de cargas, sua verdadeira função. O transporte de granel líquido (combustíveis), por exemplo, é um segmento em que existe plano da Transpetro para construção de 11 navios. A conquista desses contratos é essencial a uma integração entre a indústria naval e a de navipeças, visando produção em prazos e preços competitivos. O Ministério dos Transportes está implementando um conjunto de medidas voltadas à dinamização da marinha mercante, em consonância com a política macroeconômica do Governo Federal, visando os incrementos do transporte marítimo e da indústria da construção naval. Essas medidas são centradas nos recursos do AFRMM. Porém, existem críticas que questionam a vantagem para sociedade em arcar com os custos da formação de fundos como o AFRMM. Entretanto, um amplo contingente de técnicos considera essa contribuição essencial para a geração de empregos na indústria naval e para a redução das despesas internacionais, com o pagamento de fretes e afretamentos.

ECCIB

36

UNICAMP-IE-NEIT

Estudos desenvolvidos pelo Geipot (1999) demonstraram que as propostas de extinção do adicional de fretes do AFRMM não representariam nenhuma vantagem para a sociedade, já que esse valor seria apropriado pelos transportadores para sua margem de lucros, sem provocar qualquer benefício econômico à sociedade brasileira e destruindo uma cadeia produtiva de importância estratégica para um país que tem a maior parte de suas trocas internacionais realizada pela via marítima. Os estaleiros já estão solicitando financiamentos para sua modernização, existindo pedidos de financiamentos do Eisa-Jurong, Mauá-Jurong, Verolme-BrasFels e Itajaí. Entre os estaleiros, existe a demanda para que os ativos representados por suas instalações sejam aceitos pelo BNDES como garantias aos financiamentos. Os financiamentos solicitados para construção naval, até final de 2001, apresentam a seguinte distribuição, mostrada na Tabela 8.

Tabela 8 Financiamentos solicitados para construção naval até o final de 2001

Tipo Quantidade Tamanho US$ milhões (total) Petroleiro 02 65 mil tpb 96,4Petroleiro 02 130 mil tpb 153,0Porta Container 02 1.700 TEU 68,0Porta Container 02 3.800 TEU 110,0Line Handler 03 1.800 bhp 4,5PSV* 04 3.000 bhp 30,8PSV* 02 1.500 bhp 28,8AHTS** 02 14.000 bhp 58,0Rebocadores 08 3.000 e 3.500 bhp 30,5Plataforma offshore 01 - 235,0Totais 28 815,0Fonte: MT/DMM - * Platform Supply Vessel; ** Anchor Handler Tug Supply Com a retomada das obras de construção, o DMM vê surgir a necessidade de desenvolver uma fiscalização gerencial terceirizada. Existe a necessidade de ser criado algum tipo de “rating” dos estaleiros e indústrias da cadeia produtiva. É apontada a ausência de algum tipo de memória e de parâmetro que analise as boas práticas nessas obras financiadas com recursos públicos, um acompanhamento diferente do que é realizado pelo BNDES, que tem sigilo bancário e objetivo de acompanhar contabilmente o programa de desembolso e o andamento da obra. Deve-se notar que, apesar da possibilidade legal, o FMM jamais foi utilizado para fins associados ao desenvolvimento científico e tecnológico, um tema que certamente merece ser discutido pelas autoridades competentes.

9.4. NOVAS INSTITUIÇÕES NO PETRÓLEO E GÁS No contexto da flexibilização das regras associadas à indústria do petróleo (Lei 9478/97), surgiram novas instituições, como a Agência Nacional do Petróleo (ANP), a Organização Nacional para a Indústria do Petróleo (ONIP), a Secretaria do Estado do Rio de Janeiro de

ECCIB

37

UNICAMP-IE-NEIT

Energia e Construção Naval e o CTPETRO, que passaram a ter importância central no desenvolvimento do setor. A ANP é uma agência de caráter público, com a missão de regular as atividades econômicas do setor. A ONIP é uma organização não governamental, com a missão de maximizar para o país os benefícios de investimentos neste setor. O CTPETRO é um fundo setorial, abastecido pelos royalties do petróleo, de responsabilidade conjunta ANP-MCT e operado pela FINEP, destinado ao desenvolvimento tecnológico do setor petróleo e gás. No contexto dos objetivos deste projeto, a ANP tem importância central, ao ser a agência responsável pela concessão de áreas de exploração de petróleo, cujos termos definem patamares de nacionalização da produção de bens e serviços associados aos investimentos de exploração e produção de petróleo no país, da ordem de 30%, conforme mostrado na Tabela 2. A ONIP surge como uma inovação institucional. Formada por empresas e instituições do setor, sua missão é realizada através da reunião de empresários e técnicos em comitês temáticos e da promoção da imagem do setor em feiras. Como resultado, a organização já sedia o comitê de normas técnicas para o setor, o CB-50, participando, também, ativamente, de congressos internacionais. Com respaldo de especialistas setoriais e estudos técnicos, a ONIP tem sido muito ativa na defesa, de forma coordenada, dos interesses da indústria, sendo atualmente considerada uma instituição interlocutora legítima e representativa de instituições e empresas interessadas na maior internalização possível dos benefícios dos investimentos realizados por empresas de petróleo e gás no Brasil. Em linha próxima, opera a Secretaria de Energia e Construção Naval do Estado do Rio de Janeiro. Mesmo sem instrumentos de intervenção diretos, ela é extremamente ágil e eficiente em articular interesses econômicos para aumentar a produção industrial associada ao petróleo e gás. A Secretaria teve um importante papel na reativação dos estaleiros do Estado do Rio de Janeiro, através da negociação para atrair novos investidores, sem contaminar os novos empreendimentos com os passivos acumulados pelos antigos empresários. O CTPETRO foi o primeiro fundo setorial para desenvolvimento científico e tecnológico a ser operacionalizado, dentro de uma nova estratégia de funding para a Ciência e Tecnologia do País, promovida pelo MCT. Operado pela FINEP, o CTPETRO é comandado por um comitê gestor, em que participam representantes do governo, da academia e do setor privado. A cada ano, são definidas áreas prioritárias, em torno das quais são lançados editais para financiamento a fundo perdido, onde podem concorrer institutos de pesquisa e centros universitários. Já foram lançados três conjuntos de editais anuais e liberados recursos acima de R$ 200 milhões, que estão promovendo investimentos significativos na infra-estrutura científica e tecnológica do país.

9.5. TARIFAS, IMPOSTOS E O REPETRO A Marinha Mercante e a Indústria de Exploração de Petróleo, efetivamente, conseguem isenção tributária e de impostos indiretos, na etapa de investimentos, beneficiando a Construção Naval e seus fornecedores. Para os armadores, ao se conseguir o Registro de Embarcação Brasileira (REB), são, de fato, conquistadas isenções tarifárias e fiscais para os insumos importados, utilizados na produção de embarcações no país. Conforme demonstra Lyra (2002), estas isenções têm como objetivo tornar mais atrativos os investimentos, pois, ao se deslocar a curva de eficiência marginal do capital, diminui-se substantivamente a da taxa interna de retorno deste

ECCIB

38

UNICAMP-IE-NEIT

investimento. A isenção fiscal tributária também se justifica pelo lado das contas externas do país. A mesma autora informa que esta prática é usual no restante do mundo. Equiparação à exportação, admissão temporária e exportação ficta são as fórmulas jurídicas usuais que desoneram os investimentos das cobranças de impostos e tarifas. A exportação ficta, por exemplo, significa que um fabricante brasileiro vende para uma empresa de petróleo, representada por uma subsidiária sua no exterior, um equipamento. Ocorre, então, uma exportação através de um contrato de venda para esta subsidiária que, por sua vez, aluga este equipamento a sua matriz no país. A transação legal e financeira atravessa as fronteiras do país, mas não o equipamento. No Brasil, após a flexibilização do monopólio estatal, se os impostos e tarifas sobre equipamentos tivessem sido mantidos, a atratividade da indústria brasileira seria muito baixa. Neste sentido, o governo decidiu atualizar regras anteriores de isenção fiscal tributária, promovendo um regime aduaneiro especial do setor, denominado REPETRO. Lyra (2002) informa que a montagem deste esquema fiscal especial foi iniciada em 1998, mas ainda não está consolidada. No início, a Secretaria da Receita Federal focalizou atenção nas tarifas de importação e, assim, promoveu regras de admissão temporária especial (IN-SRF 164/98), isentando equipamentos de IPI e II. Foi, então, necessário complementar estas regras com isenções de impostos, particularmente o ICMS que, porém, é de competência estadual. A União decide, então, criar uma nova categoria jurídica, a exportação ficta, através do REPETRO, pelo Decreto 3161/99. Caracterizada como exportação, de acordo com a Constituição, a isenção do ICMS seria automática, sem a necessidade de aprovação das autoridades estaduais. Os equipamentos estariam, então, isentos de “IPI, ICMS, COFINS, PIS, tanto na ida (exportação), quanto na volta (através da importação sob ATE – Admissão Temporária Especial). Ademais, na qualidade de bem exportado, seu produtor teria acesso a créditos favorecidos e subsídios específicos para vendas ao exterior (ACC, por ex.). Com isto, estaria caracterizada uma situação de ‘isonomia tributária’ entre os bens nacionais e os provenientes do exterior” (Lyra 2002:28-29). Mas permanecem abertos alguns problemas, em especial os referentes ao ICMS, pois alguns estados questionaram a validade jurídica do REPETRO, sob a alegação de que este abria um precedente que poderia ser utilizado pelo governo federal em outros casos, terminando por sepultar o poder estadual sob a gestão do ICMS. Esta foi a argüição feita pelo Estado de Minas Gerais que, uma vez aceita, negou aos fabricantes nacionais o ressarcimento dos créditos de ICMS decorrentes de compras interestaduais. Segundo Lyra (2002), a reação contrária ao REPETRO entre os estados promoveu novas iniciativas, no sentido de promover a equalização tributária entre o produto nacional e o estrangeiro – ambos estariam sujeitos à cobrança do ICMS. A proposta foi aceita em reunião do CONFAZ, mas ainda não foi ratificada por mais de um terço dos governadores. Lyra (2002) realizou exercícios de simulação do impacto fiscal-tributário de dois equipamentos: a conversão de um navio petroleiro em FPSO e um bem de capital de encomenda para a indústria offshore. A partir de planilhas de custo real e considerando a possibilidade de melhor uso do REPETRO sobre o conjunto de impostos e tarifas incidentes sobre bens industriais (II, IPI, ICMS, ISS, AFRMM, CPMF, PIS e COFINS), a autora encontrou um resíduo fiscal de 2.46% para a FPSO e de 6,83% para o bem de capital. Esta situação cria assimetrias competitivas com bens importados, mesmo em um contexto de melhor uso dos sistemas de incentivos. Neste sentido, a mesma autora conclui pela necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos fiscais no país para “garantir aos fornecedores nacionais condições isonômicas de

ECCIB

39

UNICAMP-IE-NEIT

competição no mercado nacional com os bens e serviços importados, pois, na prática, o atual regime de investimentos da indústria do petróleo ainda apresenta um forte viés a favor das importações – proteção às avessas” (Lyra 2002:42).

ECCIB

40

UNICAMP-IE-NEIT

PARTE C - SÍNTESE COMPARATIVA

10. BENCHMARK COMPARATIVO: ESTRUTURA, ESTRATÉGIAS E POLÍTICAS

Quadro 2 Matriz comparativa das estratégias, estruturas e políticas de apoio da construção naval (I)

Países Estratégia e segmentos

Estrutura industrial e relações entre agentes

Incentivos Fontes e destinos: Financiamento

Reservas de mercado

EUA Comando pela tecnologia Indústria militar

Concentração Entrada de main contractors de origem militar/eletrônica

Equalização da taxa juros Uso de garantias do Governo Federal.

Lastreamento em títulos públicos para financiar armadores locais e estrangeiros (MARAD) Apoio a estaleiros para expansão e modernização

Cabotagem Navegação interior Cargas do Governo

Europa Integração regional da indústria Nichos de alto valor (passageiros, cargas especiais) Offshore Indústria militar

Concentração Participação acionária do Estado. Estímulos a grandes grupos participarem da atividade naval Armadores buscam bandeiras de baixo custo

Extintos com a unificação dos mercados. Permanecem mecanismos indiretos, como compensações de lucros e prejuízos entre empresas do mesmo grupo.

Garantias ao crédito do armador local. Garantias ao crédito de exportação.

Legislação especial para navegação interior. Cargas do Governo

Japão Investimentos em novos produtos Linha completa de navios.

Estaleiros e navipeças principais integram grandes conglomerados. Navipeças 100% local

Não divulgados. Apoio especial para formação de RH e P&D

Financiamentos a exportação via mercado financeiro local.

Não identificadas

ECCIB

41

UNICAMP-IE-NEIT

Matriz comparativa das estratégias, estruturas e políticas de apoio da construção naval (cont.) Países Estratégia e

segmentos Estrutura industrial e relações entre agentes

Incentivos Fontes e destinos: Financiamento

Reservas de mercado

Coréia Baixo custo, alta qualidade, baixo tempo de entrega Grandes navios

Estaleiros e navipeças principais integram conglomerados. Participação do Estado na armação.

Não identificados Outros países apresentaram representação formal contra práticas desleais de comércio.

Financiamento à expansão de estaleiros Apoio informal a armadores e indústria fornecedora

Cargas do Governo. Informal para cargas dos grandes conglomerados.

Singa Pura

Offshore País-hub

Concentração Governo acionista.

Não identificados. Via mercado financeiro. Cargas do Governo. Informal para cargas dos conglomerados.

China Baixo custo Marinha de Guerra.

O Estado controla estaleiros e armadores. Joint-ventures com empresas estrangeiras

Subsídio financeiro à exportação

Não identificados. Prescrição de cargas

Brasil Renovação via offshore

Internacionalização patrimonial completa

Isenção tarifária (draw back para exportação e verde amarelo) Isenção fiscal para importação de partes e peças Repetro.

FMM / BNDES Navegação de apoio marítimo e portuário. Cargas do Governo.

ECCIB

42

UNICAMP-IE-NEIT

11. BENCHMARK COMPARATIV0: DESEMPENHO FINANCEIRO E PRODUTIVO Em qualquer atividade econômica, a comparação entre práticas, capacitação e desempenho financeiro e produtivo é extremamente complexa, pelas diferenças inerentes entre empresas, indicadores, acesso à informação etc. No caso da construção naval, especificamente para os estaleiros, esta tarefa é ainda mais complexa, devido à natureza da atividade: aí se produzem bens unitários e diferentes, em um processo de montagem de longa duração, envolvendo milhares de partes e componentes. Mesmo entre fornecedores para a indústria naval ou offshore, devido a sua variedade, o exercício é de extrema dificuldade técnica. Apesar disso, este é um exercício necessário, pois, mesmo uma aproximação imperfeita, mas cuidadosa pode indicar as diferenças existentes entre realidades e informar a quantidade de esforços necessários para se progredir na direção de maior competência empresarial. A ONIP, com o apoio técnico do Núcleo de Pós-Graduação da Escola de Administração da UFBA, do Centro de Pesquisa em Gestão da Inovação, da Universidade de Brighton, Inglaterra, e do CTPetro-FINEP, está promovendo uma atividade para implantar uma Rede de Aprendizado na Cadeia de Suprimento da Indústria do Petróleo (MAXIPETRO). Esta é uma rede de empresas formalmente estabelecida com o objetivo de aumentar o seu conhecimento e acelerar os processos de aprendizado produtivo. O foco são empresas produtoras de equipamentos e serviços para a construção, montagem, instalação, operação e manutenção de sistemas de produção offshore. A técnica utilizada é a de benchmarking, como forma de estabelecer a posição relativa das empresas em relação aos seus concorrentes. Este projeto envolveu a coleta de informações de produtoras de bens e serviços diversos, com as seguintes características: 25 empresas brasileiras, 29 empresas estrangeiras, não localizadas no país e que estiveram presentes na exposição Rio Oil&Gas de 2000, um amplo painel de empresas inglesas e nórdicas que fazem parte de um banco de dados da empresa First Point Assessment (FPA) e um painel das principais empresas produtoras de bens e serviços para offshore do Reino Unido, com informações coletadas pelo Department of Trade and Industry (DTI). As informações de desempenho produtivo e financeiro das empresas Maxipetro foram contrastadas, através de exercícios estatísticos, à sua capacitação produtiva e tecnológica. Os resultados revelam que os melhores indicadores financeiros estão relacionados com: Sistemas de Qualidade mais avançados, Parceria e Desenvolvimento de Fornecedores, Polivalência e Treinamento, Práticas de Planejamento mais avançadas e P&D de Processos. Do mesmo modo, a produtividade da mão-de-obra está associada a práticas de RH avançadas e um elevado Giro de Estoque está relacionado a um Just-in-time e à Parceria com Fornecedores. As tabelas abaixo comparam a performance das empresas Maxipetro com os demais painéis. Mesmo considerando a diversidade de bens e serviços das empresas de cada painel, a fraca posição competitiva das empresas brasileiras é muito evidente.

ECCIB

43

UNICAMP-IE-NEIT

Tabela 9: Faturamento por empregado em R$

Indicador Painel DTI Painel Oil&Gas Painel FPA Painel MaxipetroBens 344 582 417 222 Serviços 617 281 683 116 Total 413 495 478 191

Tabela 10 Rentabilidade/patrimônio liquido e Endividamento

Indicador Painel FPA Painel Maxipetro R/PL Bens 21 19 Serviços 97 2 Total 44 14 Endividamento Bens 1,2 2,4 Serviços 4,2 1,0 Total 2,0 1,7

Tabela 11 Gastos c/AT, Treinamento e Novos Produtos

Indicador Painel Oi&Gás Painel Maxipetro Gastos c/AT Bens 9,0 0,7 Serviços 5,0 2,6 Total 8,6 0,9 Horas Treinamento Bens 5,70 1,49 Serviços 3,3 0,96 Total 4,9 1,31 % vendas novos produtos 33,38 11,53

Tabela 12 P&D s/vendas

Indicador Painel Oil&Gas Painel FPA Painel Maxipetro P&D/vendas Bens 9,0 2,2 1 Serviços 5,3 5,3 0 Total 8,3 2,7 1

ECCIB

44

UNICAMP-IE-NEIT

PARTE D: CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

12. SÍNTESE DAS QUESTÕES RELEVANTES Em todos os países, os agentes (incluindo trabalhadores e forças armadas) têm forte importância política e poder de influência na direção das políticas públicas para a Indústria Naval-Mercante. Os regimes nacionais de incentivos e regulação utilizam subsídios para operação e investimento à armação, subsídios à construção naval, definição de reservas de mercado, através da noção de cargas preferenciais, benefícios fiscais e proteção à cabotagem. No Brasil, a situação pode ser caracterizada como:

i. Déficit na conta de transportes, na balança de serviços, indicando uma pressão negativa, de natureza macroeconômica;

ii. Fim de reservas de mercado e dos subsídios à construção naval. Permanência de um

fundo gerado por contribuição parafiscal sobre o frete de importação (AFRMM). Por ausência de mecanismos financeiros de mercado e estar designado para financiar/aparelhar a construção naval e a armação, inclusive a prestadora de serviços para a indústria offshore, o Fundo de Marinha Mercante é foco das discussões sobre o desenvolvimento naval/mercante do país;

iii. Estaleiros: início do processo de internacionalização. Reativação produtiva e nível de

encomendas em recuperação, devido à demanda offshore. Demanda crescente por mão de obra qualificada;

iv. Navipeças: desativação da produção; sobrevivência de poucas empresas especializadas;

empresas não especializadas redirecionaram produção para outros segmentos – offshore, energia;

v. Armação: internacionalização patrimonial praticamente completa;

vi. Offshore: investimentos em curso reativando estaleiros e fornecedores, abrindo amplas oportunidades para o desenvolvimento de uma indústria naval e seus fornecedores, especializada no segmento offshore;

vii. Ausência da formação de conglomerados de capital nacional. Os terminais portuários

atraíram fundos de pensão e bancos de investimento. O mesmo não aconteceu para o segmento de construção naval ou transporte marítimo;

viii. A observação da matriz de transportes internacionais brasileira aponta o transporte

marítimo com uma participação ligeiramente superior aos 70% no valor FOB (incluindo as trocas internacionais via navegação interior). O transporte aéreo fica na segunda posição, com 18,8%. No transporte em território nacional, o modo rodoviário domina com mais de 60% da tonelagem transportada, seguido pelo modo ferroviário com 21%.

ix. A marinha mercante apresenta um quadro pouco animador, em que os navios próprios

(bandeira brasileira) somam apenas sete milhões de TPB, ocupando a 19a posição no

ECCIB

45

UNICAMP-IE-NEIT

ranking mundial. É uma frota insuficiente para garantir políticas de frete do comércio internacional ou assegurar o transporte de cabotagem na costa brasileira. O cenário registra o abandono de qualquer estratégia para a navegação de cabotagem e a falta de articulação com empresas brasileiras de propriedade estrangeira que controlam as empresas de transporte marítimo de longo curso, operando navios brasileiros. A tendência é que essa frota permaneça em declínio.

x. Deficit no balanço de pagamentos por conta dos pagamentos de fretes e afretamentos.

Um estudo do Ministério dos Transportes (Fadda, 1999) registra o aumento da participação dos navios estrangeiros e do afretamento de navios estrangeiros por empresas armadoras brasileiras.

Tabela 14 Matriz de Transportes Nacionais - MT/Geipot – Ano 2000

Modalidade % tonKm Marítimo 13,8 Rodoviário 60,5 Ferroviário 20,9 Dutos 4,4 Aéreo 0,3

Setor privado Políticas

Demanda Offshore Cumprimento das metas de

nacionalização da ANP. Armadores estrangeiros contratam navios de apoio em estaleiros locais.

ANP estabelece metas de conteúdo local nos contratos de concessão para exploração e produção. Petrobrás exige navios de apoio construídos no Brasil nas concorrências internacionais

Mercante Armadores estrangeiros colocam primeira encomenda de navio porta-container em estaleiro local. Contratos locais para construção de petroleiros da Transpetro.

Financiamento com recursos do FMM atende também armadores estrangeiros.

Oferta Offshore Empresas agem com a ONIP para

ampliar a participação da indústria local. Estaleiros investem na modernização e expansão das instalações.

Financiamento FMM

Mercante Estaleiros promovem mudança patrimonial

Estado Definição de políticas fiscais.

Incentivos fiscais federais – Repetro. Incentivos fiscais estaduais do ICMS (RJ)

ECCIB

46

UNICAMP-IE-NEIT

13. RECOMENDAÇÕES Este documento propõe uma estratégia competitiva e de crescimento – para o setor privado e para o Estado - focalizada em segmentos que possam ser inicialmente induzidos pela demanda local e estruturada em três movimentos: reativação e consolidação com os contratos da indústria offshore (plataformas e embarcações de apoio); fortalecimento com petroleiros e navios para cabotagem; expansão com a substituição de porta-containers do trade internacional por navios de bandeira nacional construídos aqui e exportação de plataformas, embarcações e navios de longo curso. A possibilidade de o Brasil vir a ser competidor internacional importante na construção naval depende de uma reativação competente de estaleiros e seus fornecedores, de forma a explorar vantagens circunstanciais, como o baixo custo da mão de obra. No entanto, a competitividade sustentada está associada à eficácia e eficiência produtiva, em primeira instância, e no longo prazo, à competência tecnológica. Para dar partida e operacionalizar esta estratégia, é necessário introduzir e difundir, entre contratantes, produtores e agências de fomento e regulação, práticas e formas de operação e gestão que assegurem baixas margens de tolerância com relação à ineficiência produtiva. Como resultante, aumentará a credibilidade e confiabilidade das políticas públicas, em especial o FMM. Operacionalmente esta proposição se sustenta na criação de um sistema independente que acompanhe e certifique boas práticas produtivas e que esteja associado ao financiamento público. Esta proposição está calçada em uma forte convicção entre os diversos atores associados à cadeia naval-offshore-mercante da necessidade de uma avaliação independente das boas práticas de construção naval, diferente do acompanhamento financeiro dos contratos, realizado rotineiramente, e geralmente protegidos pelo sigilo bancário. Instrumentos desta natureza visam assegurar a conquista de ganhos sustentáveis derivados de uma demanda em expansão para uma indústria que apenas inicia um processo de reativação nbastante promissor. Garantida uma base produtiva de excelência os diversos atores associados à indústria podem almejar políticas comerciais mais agressivas, tanto no sentido da atração de demanda externa pela produção Made in Brazil quanto pela expansão dos investimentos produtivos, com consequentes benefícios para o emprego. Como a questão tarifária não é relevante para o setor, do ponto de vista das negociações Alca-UE, a construção naval demonstra a abertura unilateral da economia brasileira, podendo ser útil nas negociações em outros setores. Ao mesmo tempo, no âmbito da OMC, existem espaços interessantes para uma atuação brasileira. A União Européia pretende acionar a Coréia, acusando-a de ampla utilização de subsídios na construção naval. O Brasil deveria acompanhar o desenvolvimento das negociações que se seguirão e explorar a oportunidade para promover a atividade no país. Para a indústria naval e offshore uma política pró-competitividade pode ser construída a partir de: Premissas: alocação de recursos de acordo com o desempenho dos agentes econômicos e

ECCIB

47

UNICAMP-IE-NEIT

garantia de ampla transparência no uso de recursos públicos. Preço, confiabilidade e prazo de entrega são os parâmetros relevantes para tomadas de decisão. Foco setorial: Especialização em segmentos induzidos pela demanda local: plataformas offshore, suas embarcações de apoio e seus principais equipamentos; navios petroleiros e porta-containers para armadores locais. Objetivos: modernização e eficiência produtiva em processos de estaleiros; investimento na infra-estrutura científica e tecnológica para, em médio prazo, aumentar a densidade tecnológica das atividades econômicas realizadas no país. Instrumentos: FMM para embarcações; financiamento privado nacional/internacional para plataformas; isenção fiscal-tributária (REPETRO); CTPETRO para o desenvolvimento científico e tecnológico. Procedimentos: agilizar trâmites para o financiamento via FMM; resolução das pendências no REPETRO Finalmente, este documento não tratou, de forma exaustiva e na medida de sua necessidade, os desafios competitivos para a Marinha Mercante. Mesmo assim, dois ou três itens podem ser destacados, alguns requerendo estudos mais aprofundados, outros de aplicação imediata. Com relação a este último, pode-se notar que o crédito e o saldo devedor é hoje somente vinculado ao dólar. Dependendo da direção da flutuação da moeda norte-americana pode advir sérios problemas para contratantes e contratados. Parece razoável associar crédito e saldo devedor à moeda de referência da fonte de geração da receita das empresas. Com relação à navegação é necessário empreender, com muita urgência, estudos que indiquem formas sustentáveis –para empresas e agências financiadoras - de apoio à navegação de cabotagem e interior. Finalmente, como diversos países protegem suas marinhas mercantes - com prescrição de cargas e créditos especiais para compra e operação de navios, dentre outros –, é necessário analisar em que medida proteção semelhante à marinha mercante nacional pode resultar isonomia competitiva sustentável para a navegação brasileira.

ECCIB

48

UNICAMP-IE-NEIT

BIBLIOGRAFIA Fadda, Eliane Áreas - “ A conta de serviços e a contribuição de uma marinha mercante nacional

forte” Escola Superior de Guerra – 1999. Monografia. Ferraz, J.C. e Grassi, R., Cadeia de Construção Naval, Avaliação de Diagnósticos e

Delineamento de Metas e Ações para os Fóruns de Competitividade, MDIC/FECAMP/UNICAMP-IE-NEIT, 2000, mimeo

GEIPOT, Política Governamental e Competitividade da Marinha Mercante Brasileira, 1999, Brasília, mimeo

Grassi, R. A. A Indústria Naval Brasileira no Período 1958-94: uma análise histórica de sua crise atual e das perspectivas de mudança, a partir do conceito estrutural de competitividade, 1995, Dissertação de Mestrado, UFF, Niterói

Kupfer, D. et al, Impacto Econômico da Expansão da Indústria do Petróleo, ONIP-IE/UFRJ-CTPETRO/FINEP, 2001, Rio de Janeiro, mimeo

Lyra, T. O regime fiscal para investimentos na exploração de petróleo no Brasil: o caso do REPETRO, 2002, Rio de Janeiro, IE-UFRJ, monografia.

ONIP-Prospectiva Tecnológica, Gargalos Tecnológicos, ONIP-IE/UFRJ-CTPETRO/FINEP, 2001, Rio de Janeiro.