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Informativo 585-STJ (11 a 30/06/2016) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Todos os julgados foram comentados. ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO FUNDEF Retenção de honorários advocatícios contratuais sobre a diferença de valores de repasse ao FUNDEF. DIREITO CIVIL BEM DE FAMÍLIA Penhorabilidade de bem de família imóvel dado em hipoteca não registrada. NEGÓCIO JURÍDICO Impossibilidade de convalidação de negócio jurídico celebrado mediante a falsificação de assinatura de sócio. DPVAT Súmula 573-STJ. Aplicação da teoria da aparência em pagamento de indenização do seguro DPVAT. DIREITO EMPRESARIAL AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA Honorários sucumbenciais em desfavor do INPI. CONTRATOS EMPRESARIAIS Legalidade de cláusula de raio em contrato de locação de espaço em shopping center. DIREITO PROCESSUAL CIVIL FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS Análise do art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015. TÍTULOS EXECUTIVOS A sentença, qualquer que seja sua natureza, pode ser título executivo judicial, desde que estabeleça obrigação certa e exigível. EXECUÇÃO Competência para cancelar gravame em matrícula de imóvel arrematado. PROCESSO COLETIVO Extensão dos efeitos de coisa julgada coletiva a autores de ações individuais não suspensas. Necessidade de demonstração de motivos para a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o MPE e o MPF.

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Informativo 585-STJ (11 a 30/06/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Todos os julgados foram comentados.

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

FUNDEF Retenção de honorários advocatícios contratuais sobre a diferença de valores de repasse ao FUNDEF.

DIREITO CIVIL

BEM DE FAMÍLIA Penhorabilidade de bem de família imóvel dado em hipoteca não registrada. NEGÓCIO JURÍDICO Impossibilidade de convalidação de negócio jurídico celebrado mediante a falsificação de assinatura de sócio. DPVAT Súmula 573-STJ. Aplicação da teoria da aparência em pagamento de indenização do seguro DPVAT.

DIREITO EMPRESARIAL

AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA Honorários sucumbenciais em desfavor do INPI. CONTRATOS EMPRESARIAIS Legalidade de cláusula de raio em contrato de locação de espaço em shopping center.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS Análise do art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015. TÍTULOS EXECUTIVOS A sentença, qualquer que seja sua natureza, pode ser título executivo judicial, desde que estabeleça obrigação

certa e exigível. EXECUÇÃO Competência para cancelar gravame em matrícula de imóvel arrematado. PROCESSO COLETIVO Extensão dos efeitos de coisa julgada coletiva a autores de ações individuais não suspensas. Necessidade de demonstração de motivos para a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o MPE e o MPF.

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DIREITO PENAL

CRIME DE VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL Súmula 574-STJ. CRIMES DE TRÂNSITO Súmula 575-STJ.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PRISÃO CAUTELAR Atos infracionais pretéritos podem ser utilizados como fundamento para decretação/manutenção da prisão

preventiva. RECURSOS Agravo interno contra decisão monocrática do relator no STF/STJ e o novo CPC.

DIREITO TRIBUTÁRIO

ICMS Cálculo do ICMS por dentro aplica-se também nos casos de substituição tributária.

DIREITO ADMINISTRATIVO

FUNDEF Retenção de honorários advocatícios contratuais

sobre a diferença de valores de repasse ao FUNDEF

No caso em que Município obtenha êxito em ação judicial destinada à complementação de repasses efetuados pela União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), será legítima a retenção de parte das referidas verbas complementares para o pagamento de honorários advocatícios contratuais (art. 22, §4º, da Lei nº 8.906/94).

STJ. 2ª Turma. REsp 1.604.440-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/6/2016 (Info 585).

Vide comentários em Direito Processual Civil.

DIREITO CIVIL

BEM DE FAMÍLIA Penhorabilidade de bem de família dado em hipoteca não registrada

Importante!!!

O art. 3º da Lei nº 8.009/90 traz as hipóteses em que o bem de família legal pode ser penhorado. O inciso V afirma que o imóvel poderá ser penhorado, mesmo sendo bem de família, se ele foi dado como hipoteca (garantia real) de uma dívida em favor da entidade familiar e esta, posteriormente, não foi paga. Neste caso, o bem de família poderá ser alienado e seu produto utilizado para satisfazer o credor.

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Vale ressaltar que não é necessário que a hipoteca esteja registrada no cartório de Registro de Imóveis. Assim, a ausência de registro da hipoteca em cartório de registro de imóveis não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei nº 8.009/90.

Em outras palavras, o fato de a hipoteca não ter sido registrada não pode ser utilizado como argumento pelo devedor para evitar a penhora do bem de família.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.455.554-RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016 (Info 585).

ESPÉCIES DE BEM DE FAMÍLIA No Brasil, atualmente, existem duas espécies de bem de família: a) bem de família convencional ou voluntário (arts. 1711 a 1722 do Código Civil); b) bem de família legal (Lei nº 8.009/90). BEM DE FAMÍLIA LEGAL O bem de família legal consiste no imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar. Considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado para esse fim no Registro de Imóveis e na forma do Código Civil (bem de família convencional). PROTEÇÃO CONFERIDA AO BEM DE FAMÍLIA LEGAL O bem de família legal é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas na Lei nº 8.009/90. EXCEÇÃO À PROTEÇÃO DO BEM DE FAMÍLIA: EXECUÇÃO DE HIPOTECA (INCISO IV DO ART. 3º)

O art. 3º da Lei n. 8.009/90 traz as hipóteses em que o bem de família legal pode ser penhorado. Vejamos o inciso V:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: (...) V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;

Ex: João e Maria decidem fazer um empréstimo para pagar os estudos de seu filho. Para tanto, oferecem a sua casa como garantia real (hipoteca) de que irão quitar o débito. Caso não consigam pagar a dívida, o imóvel, mesmo sendo bem de família, poderá ser alienado e seu produto utilizado para satisfazer o credor. A dívida deve ter sido contraída em favor do casal ou da entidade familiar A exceção prevista no art. 3º, V, da Lei nº 8.009/90 deve ser interpretada restritivamente e somente atinge os bens que foram dados em garantia de dívidas contraídas em benefício da própria família, não abrangendo bens dados em garantia de terceiros. STJ. 3ª Turma. REsp 1.115.265-RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 24/4/2012. É necessário que a hipoteca esteja registrada no cartório de Registro de Imóveis? NÃO. Mesmo que a hipoteca não esteja registrada, o ato de oferecimento do bem de família em garantia real é considerado válido. Isso significa que, se a dívida não for paga, será possível penhorar o imóvel, nos termos do art. 3º, V, da Lei nº 8.009/90.

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A hipoteca pode ser constituída de três modos: a) hipoteca convencional: por meio de contrato; b) hipoteca legal: por meio de lei; c) hipoteca judicial: por sentença. O registro da hipoteca no cartório de Registro de Imóveis é indispensável para que ela se constitua como direito real. Isso está previsto no art. 1.227 do CC:

Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.

É essa inscrição no RI que confere à hipoteca a eficácia de direito real oponível erga omnes. No entanto, apesar disso, a hipoteca convencional já tem validade inter partes, como direito pessoal, desde o momento da assinatura do contrato. Desse modo, a ausência de registro da hipoteca não a torna inexistente, mas apenas válida inter partes como crédito pessoal. Logo, o fato de a hipoteca não ter sido registrada não pode ser utilizado como argumento pelo devedor para evitar a penhora do bem de família, incidindo a exceção prevista no art. 3º, V, da Lei nº 8.009/90. Resumindo: O art. 3º da Lei nº 8.009/90 traz as hipóteses em que o bem de família legal pode ser penhorado. O inciso V afirma que o imóvel poderá ser penhorado, mesmo sendo bem de família, se ele foi dado como hipoteca (garantia real) de uma dívida em favor da entidade familiar e esta, posteriormente, não foi paga. Neste caso, o bem de família poderá ser alienado e seu produto utilizado para satisfazer o credor. Vale ressaltar que não é necessário que a hipoteca esteja registrada no cartório de Registro de Imóveis. Assim, a ausência de registro da hipoteca em cartório de registro de imóveis não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei nº 8.009/90. Em outras palavras, o fato de a hipoteca não ter sido registrada não pode ser utilizado como argumento pelo devedor para evitar a penhora do bem de família. STJ. 3ª Turma. REsp 1.455.554-RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016 (Info 585).

NEGÓCIO JURÍDICO Impossibilidade de convalidação de negócio jurídico celebrado

mediante a falsificação de assinatura de sócio

Não são convalidáveis os negócios jurídicos celebrados com o intuito de alterar o quadro societário de sociedade empresária por meio da falsificação de assinatura de sócio, ainda que o próprio sócio prejudicado pelo falso tenha, por escritura pública, concedido ampla, geral e irrevogável quitação, a fim de ratificar os negócios jurídicos.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.368.960-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016 (Info 585).

Imagine a seguinte situação hipotética: A sociedade empresária "X" era formada por 3 sócios: João, Pedro e Luís. João era o sócio majoritário. Pedro e Luís falsificaram a assinatura de João e alteraram o contrato social da sociedade, de forma que eles passaram a ser os sócios majoritários. João descobriu a falsificação, fez a maior confusão, ameaçou ir à polícia e, em razão disso, os três fizeram um acordo: Pedro e Luís pagaram vultosa indenização para o sócio prejudicado (João) e este aceitou assinar uma escritura pública afirmando que confirmava a cessão de suas cotas para os demais sócios e concedendo ampla, geral e irrevogável quitação a fim de ratificar o negócio jurídico realizado.

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Um caso parecido com este chegou até o STJ. O que decidiu o Tribunal? O fato de o sócio prejudicado ter ratificado posteriormente faz com o que os negócios jurídicos realizados anteriormente possam ser considerados agora válidos (convalidados)? NÃO. Não são convalidáveis os negócios jurídicos celebrados com o intuito de alterar o quadro societário de sociedade empresária por meio da falsificação de assinatura de sócio, ainda que o próprio sócio prejudicado pelo falso tenha, por escritura pública, concedido ampla, geral e irrevogável quitação, a fim de ratificar os negócios jurídicos. STJ. 3ª Turma. REsp 1.368.960-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016 (Info 585). Para o STJ, a questão posta em discussão não trata de nulidade relativa, mas sim de evidente nulidade absoluta, nos termos do art. 166, II, do CC:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Quando o inciso II fala em "ilícito", isso não se restringe apenas ao bem da vida em discussão, mas também à própria operação jurídica realizada. Na hipótese em análise, por exemplo, embora não haja qualquer vício no objeto propriamente dito do negócio jurídico (cessão das cotas sociais de sociedade empresária), a operação realizada para esse fim revela-se manifestamente ilícita (falsificação da assinatura de um dos sócios), configurando, inclusive, crime previsto no Código Penal. Ademais, a falsificação da assinatura de uma das partes ofende não só o interesse particular dos envolvidos, mas violando também todo o ordenamento jurídico e, por consequência, o interesse público. O art. 168, parágrafo único, e o art. 169, ambos do CC, proclamam que o negócio jurídico nulo é insuscetível de confirmação, não sendo permitido nem mesmo ao Juiz suprimir a nulidade, ainda que haja expresso requerimento das partes. Veja:

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir. Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.

Convalidação x Renovação É preciso esclarecer que existe diferença entre convalidação (ratificação) e renovação (repetição) do negócio jurídico. No caso concreto, tentou-se fazer a convalidação de um negócio jurídico nulo (cessão das cotas com assinatura falsa), o que é proibido pelo Código Civil, conforme vimos acima. No entanto, a renovação é diferente. Renovação significa fazer o ato de novo sem os vícios que o macularam anteriormente.

Convalidação Renovação

Consiste em ratificar um negócio jurídico realizado de maneira ilegal ou contrariando as formalidades exigidas.

Consiste em fazer o ato ou negócio de novo sem os vícios que o macularam anteriormente.

O ato ou negócio não será refeito, mas apenas confirmado.

O ato ou negócio será feito novamente, agora de maneira correta.

Os efeitos da convalidação são retroativos (eficácia ex tunc).

Os efeitos da renovação não são retroativos (eficácia ex nunc). Trata-se de um novo negócio,

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completamente autônomo em relação ao primeiro (nulo), tendo validade, portanto, a partir da data em que for celebrado, desprezando-se completamente o tempo transcorrido entre o negócio jurídico nulo e o novo negócio realizado.

Não é possível a convalidação de negócio jurídico nulo.

É possível a renovação de negócio jurídico nulo.

Desse modo, voltando ao exemplo dado, a escritura pública posteriormente celebrada pelo sócio prejudicado não pode ratificar (convalidar) o negócio jurídico nulo. Se as partes signatárias da escritura pública tinham interesse em manter a transferência das cotas da sociedade empresária, deveriam ter renovado (repetido) o negócio jurídico, sem a falsificação da assinatura de quaisquer dos envolvidos, ocasião em que os efeitos seriam válidos a partir de então, isto é, a alteração do quadro societário somente se daria no momento do novo negócio.

Observação: O voto do Min. Marco Aurélio Bellizze faz inúmeras outras considerações mais profundas sobre o tema. Se for de seu interesse ou objeto de estudo, vale a pena conferir.

DPVAT Termo inicial da prescrição nas ações de indenização do seguro DPVAT

Súmula 573-STJ: Nas ações de indenização decorrente de seguro DPVAT, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez, para fins de contagem do prazo prescricional, depende de laudo médico, exceto nos casos de invalidez permanente notória ou naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução.

STJ. 2ª Seção. Aprovada em 22/06/2016, DJe 27/06/2016.

NOÇÕES GERAIS

Em que consiste o DPVAT? O DPVAT é um seguro obrigatório contra danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas, transportadas ou não. Em outras palavras, qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por sua carga, em via terrestre, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros. Ex.: dois carros colidem e, em decorrência da batida, acertam também um pedestre que passava no local. No carro 1, havia apenas o motorista. No carro 2, havia o motorista e mais um passageiro. Os dois motoristas morreram. O passageiro do carro 2 e o pedestre ficaram inválidos. Os herdeiros dos motoristas receberão indenização de DPVAT no valor correspondente à morte. O passageiro do carro 2 e o pedestre receberão indenização de DPVAT por invalidez. Para receber indenização, não importa quem foi o culpado. Ainda que o carro 2 tenha sido o culpado, os herdeiros dos motoristas, o passageiro e o pedestre sobreviventes receberão a indenização normalmente. O DPVAT não paga indenização por prejuízos decorrentes de danos patrimoniais, somente danos pessoais.

Quem custeia as indenizações pagas pelo DPVAT? Os proprietários de veículos automotores. Trata-se de um seguro obrigatório. Assim, sempre que o proprietário do veículo paga o IPVA, está pagando também, na mesma guia, um valor cobrado a título de DPVAT. O STJ afirma que a natureza jurídica do DPVAT é a de um contrato legal, de cunho social. O DPVAT é regulamentado pela Lei nº 6.194/74.

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VALOR DA INDENIZAÇÃO DO DPVAT

Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na Lei? • no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso a cada vítima. Quem são os beneficiários do seguro DPVAT? Quem tem direito de receber a indenização? • no caso de morte: metade será paga ao cônjuge do falecido, desde que eles não fossem separados judicialmente, e o restante aos herdeiros da vítima, obedecida a ordem da vocação hereditária. Não havendo cônjuge nem herdeiros, serão beneficiários os que provarem que a morte da vítima os privou dos meios necessários à subsistência. • no caso de invalidez permanente: a própria vítima. • no caso de despesas de assistência médica e suplementares: a própria vítima. INVALIDEZ

O que é invalidez permanente para fins do DPVAT? Em um primeiro momento, a Lei nº 6.194/74 não previu o que seria invalidez permanente. Diante dessa lacuna, o Conselho Nacional de Seguros Privados — CNSP elaborou uma tabela com diversas situações que caracterizavam invalidez permanente. A MP 451/2008 e, posteriormente, a Lei nº 11.945/2009, acrescentaram, então, um anexo à Lei nº 6.194/74, prevendo expressamente, por meio de uma tabela, situações caracterizadoras de invalidez permanente.

Essa lista prevista no anexo da Lei nº 6.194/74 é exaustiva ou exemplificativa? Exemplificativa. Não é possível prever, por meio de uma listagem de situações, todas as hipóteses de invalidez permanente, total ou parcial, de forma que, em última análise, incumbe ao intérprete a definição do conteúdo daquele conceito jurídico indeterminado. Noutras palavras, as situações previstas na lista elaborada pelo CNSP, assim como as presentes no anexo à Lei 6.194/74, constituem rol meramente exemplificativo, em contínuo desenvolvimento, tanto pela ciência como pelo direito. Portanto, o não enquadramento de uma determinada situação na lista previamente elaborada não implica, por si só, a não configuração da invalidez permanente, sendo necessário o exame das peculiaridades de cada caso concreto. STJ. 3ª Turma. REsp 1.381.214-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 20/8/2013 (Info 530). TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO NAS AÇÕES DE INDENIZAÇÃO DO SEGURO DPVAT

Caso a pessoa beneficiária do DPVAT não receba a indenização ou não concorde com o valor pago pela seguradora, ela poderá buscar auxílio do Poder Judiciário? Sim. A pessoa poderá ajuizar uma ação de cobrança contra a seguradora objetivando a indenização decorrente de DPVAT. Qual é o prazo para as ações decorrentes do DPVAT? A ação de cobrança do seguro obrigatório DPVAT prescreve em 3 anos (Súmula 405-STJ). A partir de quando se inicia a contagem desse prazo no caso da invalidez? O termo inicial do prazo prescricional é a data em que o segurado teve ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez. Em outras palavras, conta-se da data em que a pessoa teve ciência de que estava inválido permanentemente. Nesse sentido, existe um enunciado do STJ:

Súmula 278-STJ: O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.

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Quando se considera que a pessoa teve ciência inequívoca da invalidez? REGRA: a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico. Assim, para efeitos de início do prazo prescricional, considera-se que o segurado somente tem ciência da invalidez permanente quando é produzido um laudo médico atestando essa condição. EXCEÇÕES: o prazo prescricional se inicia mesmo sem ter sido feito laudo médico se: a) a invalidez permanente for notória (ex: acidente no qual a vítima teve amputada suas duas pernas); ou b) se o conhecimento anterior resultar comprovado na fase de instrução.

Dessa forma, exceto nos casos de invalidez permanente notória, ou naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico. Resumindo:

Prazo para a ação de indenização DPVAT: 3 anos.

Início do prazo em caso de invalidez permanente: data do laudo médico (regra geral).

Exceções: o prazo prescricional se inicia mesmo sem ter sido feito laudo médico se a invalidez permanente for notória (ex: acidente no qual a vítima teve amputada suas duas pernas); ou se o conhecimento anterior resultar comprovado na fase de instrução.

Nesse sentido: STJ. 2ª Seção. EDcl no REsp 1.388.030-MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 27/8/2014 (Info 555). Este entendimento pacífico do STJ foi materializado na Súmula 573 do STJ.

DPVAT Aplicação da teoria da aparência em pagamento de indenização do seguro DPVAT

É válido o pagamento de indenização do Seguro DPVAT aos pais - e não ao filho - do de cujus no caso em que os genitores, apresentando-se como únicos herdeiros, entregaram os documentos exigidos pela Lei nº 6.194/74 para o aludido pagamento (art. 5º, § 1º), dentre os quais certidão de óbito que afirmava que o falecido era solteiro e não tinha filhos.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.601.533-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016 (Info 585).

Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na Lei? • no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso a cada vítima.

Quem são os beneficiários do seguro DPVAT? Quem tem direito de receber a indenização? • no caso de morte: metade será paga ao cônjuge do falecido, desde que eles não fossem separados judicialmente, e o restante aos herdeiros da vítima, obedecida a ordem da vocação hereditária. Não havendo cônjuge nem herdeiros, serão beneficiários os que provarem que a morte da vítima os privou dos meios necessários à subsistência. • no caso de invalidez permanente: a própria vítima. • no caso de despesas de assistência médica e suplementares: a própria vítima.

Como a pessoa obtém a indenização do DPVAT? A pessoa deverá procurar uma das empresas seguradoras que seja consorciada ao DPVAT e apresentar a documentação necessária. Para requerer o seguro DPVAT não é necessário advogado, despachante ou qualquer outra ajuda de terceiros.

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Caso a pessoa beneficiária do DPVAT não receba a indenização ou não concorde com o valor pago pela seguradora, ela poderá buscar auxílio do Poder Judiciário? Sim. A pessoa poderá ajuizar uma ação de cobrança contra a seguradora objetivando a indenização decorrente de DPVAT. Imagine agora a seguinte situação hipotética: Hugo faleceu em um acidente de trânsito. João, seu pai, foi quem registrou o óbito no cartório de Registro de Pessoas Naturais. Na ocasião, João declarou que Hugo era solteiro e que não deixou filhos. Alguns dias depois, João e Maria (pais de Hugo) foram até uma seguradora consorciada ao DPVAT e requereram a indenização pelo falecimento do filho em acidente de trânsito. Para tanto, apresentaram a certidão de óbito na qual se declarava que o falecido não deixou filhos nem outros herdeiros. A seguradora pagou os R$ 13.500,00 a João e Maria. Ocorre que a declaração prestada não era verdadeira. Hugo, alguns anos antes, teve um namoro com Luciana e, desse rápido relacionamento, nasceu Lucas, que foi, na época, regularmente registrado como sendo filho de Hugo. Como Lucas é descendente de Hugo, ele tinha, segundo a ordem de vocação hereditária, preferência para receber o DPVAT. Em outras palavras, quem deveria ter recebido a indenização era Lucas (e não João e Maria). Isso está previsto no art. 4º da Lei nº 6.194/74 c/c o art. 792 c/c o art. 1.829, I, do CC:

Art. 4º A indenização no caso de morte será paga de acordo com o disposto no art. 792 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.

Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; IV - aos colaterais.

Lucas procurou a seguradora cobrando os R$ 13.500,00. A seguradora recusou-se, afirmando que já pagou a quantia e que o pagamento foi válido, já que os requerentes apresentaram documento afirmando que eram os únicos herdeiros do falecido. Inconformado, Lucas, representado por sua mãe, ingressou com ação contra a seguradora pedindo o pagamento de indenização do DPVAT.

O que o STJ decidiu? Quem tem razão: o descendente ou a seguradora? O pagamento feito pela seguradora aos pais de Hugo foi válido? A seguradora terá que pagar novamente a Lucas? O STJ decidiu que a seguradora tinha razão. Assim, o pagamento feito foi válido e a seguradora não terá que pagar novamente a Lucas.

É válido o pagamento de indenização do Seguro DPVAT aos pais - e não ao filho - do de cujus no caso em que os genitores, apresentando-se como únicos herdeiros, entregaram os documentos exigidos pela Lei nº 6.194/74 para o aludido pagamento (art. 5º, § 1º), dentre os quais certidão de óbito que afirmava que o falecido era solteiro e não tinha filhos. STJ. 3ª Turma. REsp 1.601.533-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016 (Info 585).

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De acordo com o art. 5º, § 1º, "a", da Lei nº 6.194/74 (Lei do DPVAT), o segurador deverá efetuar o pagamento de indenização mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, após a entrega dos seguintes documentos: certidão de óbito; registro da ocorrência policial; e prova da qualidade de beneficiário. Tais documentos foram apresentados pelos pais de Hugo ao requererem o DPVAT. Logo, a seguradora pagou com base na lei. Desse modo, tem-se, no presente caso, um pagamento feito de boa-fé a credor putativo, sendo reconhecido válido pelo Código Civil. Veja:

Art. 309. O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que não era credor.

Assim, pela aplicação da teoria da aparência, é válido o pagamento realizado de boa-fé a credor putativo. "Credor putativo é aquele que se apresenta aos olhos de todos como o verdadeiro credor. Recebe tal denominação, portanto, quem aparenta ser credor, como é o caso do herdeiro aparente. Se, por exemplo, o único herdeiro conhecido de uma pessoa abonada, e que veio falecer, é o seu sobrinho, o pagamento a ele feito de boa-fé é válido, mesmo que se apure, posteriormente, ter o de cujus, em disposição de última vontade, nomeado outra pessoa como seu herdeiro testamentário. (...) A boa-fé tem, assim, o condão de validar atos que, em princípio, seriam nulos. Ao verdadeiro credor, que não recebeu o pagamento, resta somente voltar-se conta o accipiens, isto é, contra o credor putativo, que recebeu indevidamente, embora também de boa-fé, pois o solvens nada mais deve. (...) Além da boa-fé, exige-se a escusabilidade do erro que provocou o pagamento, para a exoneração do devedor. (...)" (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro. Vol. 2, 8ª ed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 266-267). Para que o erro no pagamento seja escusável, é necessária a existência de elementos suficientes para induzir e convencer o devedor diligente de que o recebedor é o verdadeiro credor. No caso aqui analisado, verifica-se que a indenização do Seguro DPVAT foi paga de boa-fé aos credores putativos. Além disso, não há previsão de obrigação da seguradora em averiguar a existência de outros beneficiários da vítima. Logo, conclui-se que não houve qualquer ilegalidade no procedimento adotado pela seguradora. Vale ressaltar, por fim, que, em nosso exemplo, Lucas (o filho) terá direito de ingressar com ação cobrando a quantia dos pais do falecido que receberam a indenização de forma indevida.

SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO Inexistência de direito de retenção por benfeitorias realizadas

antes de adjudicação de imóvel vinculado ao SFH

O ex-mutuário de imóvel dado em garantia hipotecária em financiamento do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) não tem direito à retenção pelas benfeitorias realizadas no bem antes da adjudicação.

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Quanto às benfeitorias realizadas após a adjudicação, deve-se analisar se há boa-fé ou má-fé na posse. Havendo má-fé do ex-mutuário possuidor (o que é a regra), ele não tem direito de retenção pelas benfeitorias realizadas no imóvel após a adjudicação, mas poderá ser indenizado pelas benfeitorias necessárias (art. 1.220 do CC).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.399.143-MS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/6/2016 (Info 585).

Sistema Financeiro de Habitação (SFH) João financiou um imóvel pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH). O SFH é um programa do Governo Federal, criado pela Lei nº 4.380/64, com o objetivo de facilitar que pessoas de baixa renda pudessem adquirir a sua casa própria. A legislação que rege o SFH prevê condições mais favoráveis às pessoas que adquirem os imóveis porque existe um incentivo (subsídio) estatal. Em compensação, o adquirente tem que cumprir certas obrigações e, em caso de inadimplemento, são estipuladas regras mais céleres para a cobrança do débito. Personagens No exemplo dado acima, podemos assim definir os personagens envolvidos: João Chamado de mutuário. É a pessoa beneficiada por um contrato de mútuo, ou seja, quem toma dinheiro emprestado. CEF Chamada de mutuante. É a pessoa que empresta dinheiro em um contrato de mútuo. Inadimplência João comprometeu-se a pagar a dívida em 180 prestações. Ocorre que, por dificuldades financeiras, o mutuário/fiduciante tornou-se inadimplente. Diante disso, a Caixa Econômica iniciou a execução hipotecária extrajudicial. No curso dessa execução, a CEF adjudicou o imóvel e, posteriormente, o alienou a Pedro, que se tornou o proprietário da casa. Imissão de posse Pedro, passando à condição de proprietário do imóvel, ajuizou "ação de imissão de posse" contra João, com o objetivo de ser investido na posse, uma vez que o ex-mutuário continuava ocupando a casa e se recusava a sair dela. Ao apresentar sua resposta na ação, João, ex-mutuário, alegou que só sairia do imóvel após ser indenizado pelas benfeitorias que realizou na casa. Desse modo, ele disse que pretendia exercer o direito de retenção do imóvel por benfeitorias. O argumento de João é acolhido pela jurisprudência? Ele tem direito de retenção pelas benfeitorias realizadas no imóvel? NÃO. O ex-mutuário de imóvel dado em garantia hipotecária em financiamento do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) não tem direito à retenção pelas benfeitorias realizadas no bem antes da adjudicação. STJ. 3ª Turma. REsp 1.399.143-MS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/6/2016 (Info 585). Sob a ótica do princípio da gravitação jurídica (accessorium sequitur principale - o acessório segue o principal), observa-se que as benfeitorias, por serem bens acessórios, incorporam-se ao imóvel (bem principal), ficando também sujeitas à garantia hipotecária. No CC/2002, há previsão específica nesse sentido:

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Art. 1.474. A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmo imóvel.

Assim, segundo entendeu o STJ, as benfeitorias realizadas antes da adjudicação foram transferidas ao banco adjudicatário (Caixa Econômica) e, posteriormente, ao terceiro adquirente, não assistindo ao mutuário direito de retenção ou de indenização por elas. Além disso, o ex-mutuário também não faz jus ao direito de retenção, porque existe norma específica excluindo esse direito no caso de Sistema Financeiro de Habitação. Veja o que diz o Decreto-Lei nº 70/1966:

Art. 32. (...) § 2º Se o maior lance do segundo público leilão fôr inferior àquela soma, serão pagas inicialmente as despesas componentes da mesma soma, e a diferença entregue ao credor, que poderá cobrar do devedor, por via executiva, o valor remanescente de seu crédito, sem nenhum direito de retenção ou indenização sôbre o imóvel alienado.

E quanto às benfeitorias realizadas após a adjudicação? Para essas benfeitorias, deve-se analisar a qualidade da posse. A posse do ex-mutuário, no caso concreto, é injusta e de má-fé. Isso porque depois de ter vencido a dívida e após o ex-mutuário ser notificado, ele tinha um prazo de 20 dias para fazer a purgação da mora (art. 31, § 1º do DL 70/66), mas não o fez. Diante disso, a legislação autoriza que o credor hipotecário (CEF) promova a execução da hipoteca (art. 32 do DL 70/66), tendo-se por resolvido o contrato, de modo que, a partir desse momento, o mutuário não pode alegar que desconhece o vício que macula a posse. Sendo a posse do ex-mutuário de má-fé, ele não tem direito de retenção pelas benfeitorias realizadas no imóvel após a adjudicação. Possuidor de má-fé não tem direito à retenção, mas poderá ser indenizado pelas benfeitorias necessárias O possuidor de má-fé não poderá exercer o direito de retenção, sendo-lhe assegurado tão somente direito de ressarcimento das benfeitorias necessárias, conforme previsto no art. 1.220 do CC:

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

DIREITO EMPRESARIAL

AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA Honorários sucumbenciais em desfavor do INPI

Em ação de nulidade de registro de marca a que o INPI não deu causa nem ofereceu resistência direta, não cabe condenação do instituto em honorários advocatícios sucumbenciais.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.378.699-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016 (Info 585).

Na ação de nulidade de registro de marca em que o INPI foi indicado como réu ao lado de sociedade empresária em virtude da concessão indevida do registro e do não processamento do procedimento administrativo para anular o registro indevidamente concedido, o Instituto responde solidariamente pelos honorários advocatícios sucumbenciais, ainda que tenha reconhecido a procedência do pedido formulado na Inicial.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.258.662-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 2/2/2016 (Info 576).

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SITUAÇÃO 1: INPI NÃO DEVERÁ PAGAR HONORÁRIOS PELO SIMPLES FATO DE FIGURAR NO POLO PASSIVO

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "1" registrou no INPI a marca "XXX". Ocorre que a empresa "2" já utilizava a mesma expressão como título de seu estabelecimento há anos. Diante disso, a empresa "2" ingressou com ação de nulidade de registro de marca apontando como réus a empresa "1" e o INPI. Na ação, a empresa "2" alegou que o referido registro violou o art. 124, V, da Lei nº 9.279/96:

Art. 124. Não são registráveis como marca: (...) V - reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos;

Vale ressaltar que a empresa "2" (autora) não tentou anular administrativamente, junto ao INPI, o registro conferido à empresa "1". Ela propôs diretamente a ação judicial. Resposta do INPI Ao ser citado, o INPI disse que, ao receber o pedido de registro da empresa "1", cumpriu todas as formalidades legais exigidas e que não tinha como saber que esta expressão que foi registrada era a mesma utilizada pela empresa "2" no título de seu estabelecimento. Além disso, o INPI afirmou que a empresa "2" não pediu administrativamente o cancelamento do registro, o que seria analisado pela autarquia. Por fim, o INPI não atacou o mérito do pedido feito pela autora. Sentença A sentença julgou o pedido procedente e determinou a anulação do registro da marca. Ademais, condenou a empresa "1" e o INPI a pagarem, solidariamente, os honorários advocatícios de sucumbência. Agiu corretamente o juiz ao condenar o INPI ao pagamento dos honorários advocatícios? NÃO. Em ação de nulidade de registro de marca a que o INPI não deu causa nem ofereceu resistência direta, não cabe condenação do instituto em honorários advocatícios sucumbenciais. STJ. 3ª Turma. REsp 1.378.699-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016 (Info 585). A Lei nº 9.279/96 determina a participação do INPI nas ações anulatórias de registro de marca. Veja:

Art. 175. A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.

No entanto, esta exigência legal não faz com que o INPI seja sempre considerado litisconsorte passivo necessário. Se o instituto não deu causa ao ajuizamento da ação e se não ofereceu resistência direta ao pedido, não se pode considerá-lo como legitimado passivo nem se poderá condená-lo ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Assim, o que se observa é que o art. 175 da Lei nº 9.279/96 traz uma hipótese de intervenção atípica ou sui generis do INPI, considerando que ele é sempre citado mas não necessariamente irá se contrapor ao pedido do autor, podendo, inclusive, concordar com ele. Nas demandas anulatórias, o interesse jurídico do INPI se distingue do interesse individual de ambas as

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partes. O Instituto tem, ao menos em tese, posição processual própria e independente da vontade das partes litigantes.

Mas o INPI concedeu o registro anulado. Ao fazer isso, ele não agiu errado? Não deveria ser condenado a pagar honorários advocatícios por causa disso? NÃO. O STJ entende que o simples fato de o INPI ter concedido o registro que posteriormente foi anulado na via judicial não é motivo suficiente para ele ser considerado "culpado" e ser condenado a pagar honorários advocatícios. Isso porque o deferimento do registro de marca é, em regra, ato vinculado. Significa dizer que o registro deverá ser deferido pelo INPI sempre que não for detectada qualquer vedação legal à sua concessão.

Mas neste caso, o INPI não falhou por não ter percebido que a marca que seria registrada era a mesma de um título de estabelecimento? NÃO. Não havia como o INPI ter essa informação a não ser que o próprio titular do estabelecimento levasse ao conhecimento do Instituto. A proteção dos nomes empresariais e dos títulos de estabelecimento é, atualmente, feita de forma fracionária, ou seja, isso é controlado pelas Juntas Comerciais, que são órgãos estaduais. Não existe um banco de dados nacional que possibilite à autarquia consultar para saber se existe ou não impedimento para o registro da marca, nos termos do art. 124, V, da Lei nº 9.279/96. Para tentar suprir esta lacuna, o INPI publica um edital avisando a todos que determinada pessoa deu entrada no pedido de registro da marca "XXX". Assim, com a publicação do edital relativo ao depósito do pedido de registro, abre-se a qualquer interessado o direito de opor-se ao registro e de levar ao conhecimento do Instituto que aquela expressão não pode ser registrada. No caso concreto, o INPI publicou o edital, mas a empresa "2" não impugnou o pedido de registro. Nota-se, portanto, o INPI cumpriu sua função pública, consubstanciada num ato vinculado, de forma a afastar a aplicação da teoria da causalidade.

Inexistência de resistência direta no processo Deve-se notar que, durante o processo, o INPI em nenhum momento defendeu a manutenção do registro concedido, limitando-se a enfatizar que não agiu de forma irregular.

Inexistência de pedido administrativo Por fim, importante destacar que a empresa "2", além de não ter impugnado o pedido de registro feito pela empresa "1", também não pediu o cancelamento administrativo do registro depois que soube de sua efetivação. Desse modo, conclui-se que não era realmente devida a condenação do Instituto nos ônus sucumbenciais.

SITUAÇÃO 2: INPI DEVERÁ PAGAR HONORÁRIOS SE NÃO ANALISOU PEDIDO ADMINISTRATIVO PARA ANULAR O REGISTRO

CONCEDIDO

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 2005, a empresa "X" registrou no INPI a marca "Gavani", na classe 24 (Tecidos, roupa de cama, mesa, banho e cozinha e artigos têxteis para limpeza) (Classificação Internacional de Produtos e Serviços). Em 2008, a empresa "Y" conseguiu registro no INPI da mesma marca "Gavani" na classe 25 (Roupas e acessórios do vestuário em geral e artigos de viagem). Vale ressaltar que ambas as empresas atuam no mesmo nicho empresarial, sendo lojas de departamento. Além disso, as marcas registradas eram parecidas. A empresa "X" entendeu que, apesar de a marca ter sido registrada em classe diferente da sua, poderia haver confusão entre os clientes, razão pela qual protocolizou pedido administrativo junto ao INPI para que este anulasse a concessão do registro da marca concedido à empresa "Y", mas o Instituto manteve-se inerte e não processou o requerimento. Diante desta inércia, a empresa "X" ajuizou, na Justiça Federal, "ação de nulidade de registro de marca"

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contra a sociedade empresária "Y" e contra o INPI. INPI é a sigla de Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, uma autarquia federal responsável, dentre outros serviços, pelo registro das marcas em âmbito nacional. A empresa "Y" contestou a ação afirmando que deve ser aplicado ao caso o princípio da especialidade e que, como as marcas foram registradas em classes diferentes, ambas poderiam ser mantidas. O INPI, por sua vez, reconheceu a procedência do pedido da autora, ou seja, reconheceu que a empresa "X" tinha razão. A tese da empresa "X" encontra guarida no STJ? SIM. O simples fato de os registros terem sido efetuados em classes distintas não é suficiente, por si só, para afastar a confusão no mercado consumidor. Assim, para a aplicação do princípio da especialidade não basta verificar se as marcas foram registradas em classes diferentes. Isso porque algumas vezes é possível que uma marca extrapole os limites de uma classe sempre que, pela relação de afinidade dos produtos, houver possibilidade de se gerar dúvida no consumidor. Tal situação ocorre com produtos que se inserem no mesmo nicho comercial, visando a um público consumidor semelhante e utilizando os mesmos canais de comercialização. Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp 1340933/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 10/03/2015. Sentença de procedência O Juiz Federal julgou procedente o pedido da empresa "X", decretando a nulidade do registro da marca depositada pela empresa "Y". Além disso, o magistrado condenou a empresa "Y" e o INPI, solidariamente, a pagar os honorários advocatícios de sucumbência à autora da ação. O INPI recorreu contra este capítulo da sentença alegando que, ao ser citado, assumiu a condição de "assistente" da autora, tanto que concordou com o pedido por ela formulado. Desse modo, não poderia ser condenado em honorários advocatícios. Para isso, o INPI alegou a parte final do art. 175 da Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial - LPI):

Art. 175. A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.

A tese do INPI foi aceita? NÃO. Na ação de nulidade de registro de marca em que o INPI foi indicado como réu ao lado de sociedade empresária em virtude da concessão indevida do registro e do não processamento do procedimento administrativo para anular o registro indevidamente concedido, o Instituto responde solidariamente pelos honorários advocatícios sucumbenciais, ainda que tenha reconhecido a procedência do pedido formulado na Inicial. STJ. 3ª Turma. REsp 1.258.662-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 2/2/2016 (Info 576). Em regra, enquanto os particulares disputam um direito patrimonial, calcado essencialmente em objetivos fático-econômicos, o INPI compromete-se com a defesa do interesse social difuso: o desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Noutros termos, por não se comprometer com o interesse individual de quaisquer das partes, o INPI, ao menos em tese, tem posição processual própria e independente da vontade das partes litigantes, o que de fato distancia a intervenção da LPI das intervenções típicas previstas no CPC - o qual somente se aplica de forma subsidiária às demandas de nulidade de registro marcário. Todavia, na situação concreta, a solução se distingue da regra geral, pois a autora direcionou sua demanda de forma expressa contra o INPI (ele era um dos réus). Isso porque o instituto foi inerte em relação ao andamento de prévio requerimento administrativo para declarar a nulidade do registro marcário concedido à outra ré. Desse modo, a causa de pedir da recorrida não ficou limitada à concessão indevida do registro, mas incluiu o não processamento do procedimento administrativo, situação imputável exclusivamente à autarquia.

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Tendo dado causa à propositura da demanda, o INPI foi corretamente arrolado como réu, devendo, portanto, arcar com os honorários advocatícios sucumbenciais.

CONTRATOS EMPRESARIAIS Legalidade de cláusula de raio em contrato de locação de espaço em shopping center

Importante!!!

Em tese, não é abusiva a previsão, em normas gerais de empreendimento de shopping center ("estatuto"), da denominada "cláusula de raio", segundo a qual o locatário de um espaço comercial se obriga - perante o locador - a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância contado a partir de certo ponto do terreno do shopping center.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.535.727-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 10/5/2016 (Info 585).

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" é administradora do shopping center "Iguateré" A loja "Moda Infantil" está localizada dentro deste shopping. Isso significa que a referida loja mantém um contrato de locação de espaço com a empresa administradora do shopping. Uma das cláusulas das normas complementares do shopping prevê o seguinte: 7.26. O LOCATÁRIO, ressalvado estabelecimento já existente na data de assinatura deste contrato, não poderá ter outro (sede, filial etc), dedicado ao mesmo ramo de atividade a ser por ele exercida no ESPAÇO COMERCIAL objeto do contrato de locação e outras avenças, localizado dentro de um raio de 3km (três quilômetros) contados do centro do terreno do SHOPPING CENTER, salvo autorização prévia por escrito do LOCADOR. Em outras palavras, esta cláusula proíbe que a locatária (em nosso exemplo, a "Moda Infantil") possua outra loja a menos de 3km do shopping. Como é chamada esta cláusula na prática comercial? Cláusula de raio. A cláusula de raio surgiu nos EUA e se popularizou com a expansão dos shopping centers. Segundo esta cláusula "o locatário de um espaço comercial se obriga, perante o locador, a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância daquele imóvel" (Min. Marco Buzzi). Esta cláusula é válida? SIM. Em tese, não é abusiva a previsão, em normas gerais de empreendimento de shopping center ("estatuto"), da denominada "cláusula de raio", segundo a qual o locatário de um espaço comercial se obriga - perante o locador - a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância contado a partir de certo ponto do terreno do shopping center. STJ. 4ª Turma. REsp 1.535.727-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 10/5/2016 (Info 585). Controle judicial sobre cláusulas empresariais é restrito O shopping center constitui uma estrutura comercial híbrida e peculiar e o contrato firmado com os locatários possui diversas cláusulas extravagantes que têm como objetivo fazer com que o negócio tenha o

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retorno econômico planejado, além de fazer com que se mantenha como centro comercial atrativo aos consumidores. Assim, para o sucesso e viabilização econômica/administrativa do shopping center, os comerciantes interessados aceitam se vincular a uma modalidade específica de contratação, não podendo alegar que tais cláusulas são abusivas. Vale lembrar que o controle judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos de cunho empresarial deve ser restrito, porque aqui vigora o princípio da autonomia privada, da livre iniciativa, do pacta sunt servanda, da função social da empresa e da livre concorrência de mercado.

Não se trata de mero contrato de adesão Os ajustes locatícios, notadamente aqueles firmados para locação de espaço em shopping center, não constituem mero contratos de adesão, pois são de livre estipulação/comutativo entre os contratantes, sem a preponderância de um sobre outro. Assim, tanto o locador como o locatário estão livres para pactuarem as cláusulas contratuais que melhor assistam às suas necessidades.

Não há prejuízo aos consumidores A "cláusula de raio" não prejudica os consumidores. O simples fato de o consumidor não encontrar em todos os shopping centers que frequenta determinadas lojas não implica efetivo prejuízo a ele, pois a instalação dos lojistas em tais ou quais empreendimentos depende, categoricamente, de inúmeros fatores. De fato, a lógica por detrás do empreendimento se sobrepõe à pretensão comum do cidadão de objetivar encontrar, no mesmo espaço, todas as facilidades e variedades pelo menor preço e distância.

Direito de propriedade Ademais, nos termos do ordenamento jurídico pátrio, ao proprietário de qualquer bem móvel ou imóvel - e aqui se inclui o(s) dono(s) de shopping center - é assegurado o direito de usar, gozar e dispor de seus bens e, ainda, de reavê-los do poder de quem injustamente os possua. Denota-se que, para o exercício desses atributos inerentes à propriedade, principalmente a permissão do uso por terceiros, pode o proprietário impor limites e delimitar o modo pelo qual essa utilização deverá ser realizada. Assim, diversas são as restrições que pode o dono impor aos usuários do estabelecimento (vestimentas, ingresso com animais, horário de funcionamento, entre outros) e, como já mencionado antecedentemente, inúmeras são as cláusulas contratuais passíveis de inserção nos contratos de locação atinentes aos centros comerciais híbridos, sem que se possa afirmar, genérica e categoricamente, sejam elas abusivas ou ilegais, uma vez que, em última análise, visam garantir a própria viabilidade do uso, a implementação do empreendimento e, pois, o alcance e incremento real da função social da propriedade.

Conquista de mercado Além do mais, o fato de shopping center exercer posição relevante no perímetro estabelecido pela "cláusula de raio" não significa que esteja infringindo os princípios da ordem econômica estampados na CF/88, visto que inserções de "cláusulas de raio" em determinados contratos de locação são realizadas com o propósito de servir à logística do empreendimento. Aliás, a conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores não caracteriza ilícito, tanto que prevista como excludente de infração da ordem econômica (§ 1º do art. 36 da Lei nº 12.529/2011).

Pode-se dizer que a cláusula de raio é proibida pela Súmula 646 do STF ("Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área")? NÃO. A Súmula 646 do STF não diz respeito às cláusulas contratuais estabelecidas em pactos firmados entre locador e locatário. Ela se refere apenas a leis municipais, ou seja, a situações em que o próprio poder público impede e inviabiliza a implementação do princípio da livre concorrência. O enunciado não tem relação, portanto, com contratos empresariais.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS Análise do art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015

Importante!!!

O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão.

O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida. Essa é a interpretação que se extrai do art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015.

Assim, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra a decisão que não se pronunciou sobre determinado argumento que era incapaz de infirmar a conclusão adotada.

STJ. 1ª Seção. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região), julgado em 8/6/2016 (Info 585).

Fundamentação das decisões judiciais O § 1º do art. 489 do CPC 2015 traz importantes regras sobre a fundamentação da decisão judicial. Pela sua importância, vale a pena que você leia com bastante atenção este dispositivo, que será muito cobrado nas provas objetivas:

Art. 489 (...) § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

Vejamos agora um julgado envolvendo o inciso IV. Imagine a seguinte situação hipotética (diferente do caso concreto apreciado pelo STJ): João propôs ação de cobrança contra Pedro. O juiz extinguiu o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC/2015, por reconhecer que a pretensão do autor estava prescrita. Além disso, o magistrado afirmou que estava provado que Pedro já pagou o débito, não havendo, portanto, mais qualquer dívida. O autor não se conformou e interpôs apelação. O Tribunal manteve a sentença, mas se manifestou apenas sobre a prescrição, reconhecendo que ela estava presente no caso concreto. O acórdão nada falou sobre o pagamento da dívida que foi reconhecido pelo juiz de 1º grau e questionado por João no recurso. Diante disso, o autor apresentou embargos de declaração alegando que o acórdão do Tribunal foi omisso porque não se pronunciou sobre o seu argumento de que o débito ainda não foi pago e que, portanto, a dívida ainda existe.

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Assim, para o embargante, o acórdão violou o inciso IV do § 1º do art. 489 do CPC/2015:

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

Os embargos opostos merecem ser acolhidos? Houve omissão do acórdão do Tribunal? O acórdão do Tribunal contrariou a regra do art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015? NÃO. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida. Assim, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra a decisão que não se pronunciou sobre determinado argumento que era incapaz de infirmar a conclusão adotada. STJ. 1ª Seção. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região), julgado em 8/6/2016 (Info 585). A prescrição é uma causa de extinção do processo que, sendo reconhecida, faz com que o julgador não examine mais se a dívida é ou não devida. Logo, no exemplo hipotético, o Tribunal não tinha razão para se manifestar sobre a discussão se o débito tinha sido ou não pago.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Retenção de honorários advocatícios contratuais

sobre a diferença de valores de repasse ao FUNDEF

No caso em que Município obtenha êxito em ação judicial destinada à complementação de repasses efetuados pela União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), será legítima a retenção de parte das referidas verbas complementares para o pagamento de honorários advocatícios contratuais (art. 22, §4º, da Lei nº 8.906/94).

STJ. 2ª Turma. REsp 1.604.440-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/6/2016 (Info 585).

FUNDEF FUNDEF significa Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério e vigorou de 1997 a 2006. O FUNDEF foi substituído pelo FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), que está em vigor desde janeiro de 2007 e se estenderá até 2020. Em alguns Estados, o FUNDEF era complementado com verbas repassadas pela União; em outros, não era necessária essa complementação. Isso porque o art. 6º da Lei do FUNDEF (Lei 9.424/96, revogada pela Lei nº 11.494/2007) dispunha: "A União complementará os recursos do Fundo, a que se refere o art. 1º sempre que, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente." Atualmente, o FUNDEB é regulado pela Lei nº 11.494/2007, que impõe à União o dever de complementar os recursos do FUNDEF/FUNDEB "sempre que, no âmbito de cada Estado e no Distrito Federal, o valor médio ponderado por aluno, calculado na forma do Anexo desta Lei, não alcançar o mínimo definido

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nacionalmente, fixado de forma a que a complementação da União não seja inferior aos valores previstos no inciso VII do caput do art. 60 do ADCT". Imagine agora a seguinte situação: Determinado Município do interior do Estado ingressou com ação contra a União com o objetivo de conseguir o repasse integral de verbas do FUNDEF. Como o Município não possuía procuradores municipais concursados, foi contratado um escritório de advocacia privado para patrocinar a causa. No contrato assinado com os advogados ficou combinado que, se o Município vencesse a demanda, pagaria 20% do valor da causa ao escritório; caso perdesse, não teria nenhum custo com os advogados. O pedido foi julgado procedente e transitou em julgado. O Município requereu, então, que 20% do valor da condenação (verbas do FUNDEF a serem pagas pela União) fosse separado para pagamento dos honorários contratuais dos advogados que atuaram na causa, nos termos do art. 22, § 4º da Lei nº 8.906/94:

Art. 22 (...) § 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou.

A União não concordou com o pedido de retenção dos 20% alegando que os recursos do FUNDEF/FUNDEB possuem destinação específica (manutenção e desenvolvimento da educação básica e à remuneração condigna dos trabalhadores da educação - art. 60 do ADCT da CF/88), motivo pelo qual não é possível a utilização para pagamento de honorários advocatícios. Para a União, esta retenção violaria o art. 23, I, da Lei nº 11.494/2007:

Art. 23. É vedada a utilização dos recursos dos Fundos: I - no financiamento das despesas não consideradas como de manutenção e desenvolvimento da educação básica, conforme o art. 71 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996;

A questão chegou até o STJ. O que foi decidido? É possível a retenção dos valores para pagamento dos honorários advocatícios contratuais? SIM. No caso em que Município obtenha êxito em ação judicial destinada à complementação de repasses efetuados pela União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), será legítima a retenção de parte das referidas verbas complementares para o pagamento de honorários advocatícios contratuais (art. 22, §4º, da Lei nº 8.906/94). STJ. 2ª Turma. REsp 1.604.440-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/6/2016 (Info 585). Como vimos acima, é dever da União complementar os recursos do FUNDEF/FUNDEB (art. 4º da Lei nº 11.494/2007). Todas as vezes que houver transferência voluntária desses recursos, ou seja, a transferência efetuada sem a intervenção judicial, é evidente que o credor (Município ou Estado) não pode aplicá-los em despesas não consideradas como de manutenção e desenvolvimento da educação básica. Assim, sempre que houver o repasse regular da União para os Estados e Municípios, é dever de tais entes aplicar os recursos conforme determina a lei. Ocorre que a situação se torna diferente quando a União, por razões diversas, recusa-se a efetuar voluntariamente tais valores, obrigando o Município a ingressar com ação judicial pedindo a complementação dos repasses do FUNDEF/FUNDEB. Nestes casos, se o Município vencer a demanda e, ao receber os valores, utilizar parte de tais quantias para pagamento dos honorários advocatícios não haverá

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desvio de finalidade. Isso porque não havia outra forma de o Município obter as quantias e ele precisará cobrir os custos que teve com o processo. Desse modo, em razão dessa excepcional peculiaridade — transferência dos valores do FUNDEF/FUNDEB por força de decisão judicial —, o STJ entende que o disposto no art. 23, I, da Lei nº 11.494/2007 não obsta a aplicação da regra prevista no art. 22, § 4º, da Lei nº 8.906/94 (retenção de parte dos valores para pagamento dos honorários contratuais).

TÍTULOS EXECUTIVOS A sentença, qualquer que seja sua natureza, pode ser título executivo judicial,

desde que estabeleça obrigação certa e exigível

Importante!!!

A sentença, qualquer que seja sua natureza, de procedência ou improcedência do pedido, constitui título executivo judicial, desde que estabeleça obrigação de pagar quantia, de fazer, não fazer ou entregar coisa, admitida sua prévia liquidação e execução nos próprios autos.

STJ. Corte Especial. REsp 1.324.152-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/5/2016 (Info 585).

Obs: existe polêmica na doutrina se este entendimento prevalece ou não com o novo CPC, que trata sobre o tema no art. 515, I. A posição majoritária é a de que sim. No mesmo sentido, o Min. Rel. Luis Felipe Salomão em determinado trecho de seu voto dá a entender que o entendimento do STJ proferido neste julgado continua a vigorar com o CPC 2015.

Observação preliminar Este julgado foi proferido segundo a ótica do CPC 1973. Vou explicar o que foi decidido e, após, tecerei algumas considerações sobre o CPC 2015. Títulos executivos judiciais No CPC 1973, os títulos executivos judiciais estavam previstos no art. 475-N. Dentre eles, destaca-se o inciso I:

Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: I - a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia;

O STJ, ao analisar o inciso I do art. 475-N do CPC 1973, entendia que a sentença meramente declaratória era título executivo judicial? Na égide do CPC 1973 era possível a execução de sentenças meramente declaratórias? SIM. Para o STJ, o art. 475-N, I, do CPC 1973 autorizava a execução de sentença meramente declaratória, desde que elas possuíssem exigibilidade e certeza. Confira:

(...) A Lei 11.232/2005, ao revogar o art. 584 e inserir o art. 475-N no Código de Processo Civil, acolheu o entendimento já esposado por esta Corte de que as sentenças de cunho declaratório podem ter força executiva se presentes os elementos necessários à execução, como exigibilidade e certeza da relação.(...) STJ. 3ª Turma. AgRg no REsp 1384913/ES, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 06/08/2015.

Exemplo de sentença meramente declaratória que pode ser executada: Empresa “X” (contribuinte) ajuíza, contra a União, ação para que seja declarado que ela não mantém relação jurídico-tributária válida com o ente federal, considerando que o tributo cobrado é inconstitucional. A empresa “X” requer, ainda, a compensação dos valores já pagos relativos a esse tributo com outros débitos que ela tem com a União. A sentença que julgar procedente essa demanda, apesar de

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declaratória, possui conteúdo nitidamente condenatório e, portanto, poderá ser executada. O STJ reafirmou este entendimento em sede de recurso especial repetitivo e firmou a seguinte tese: A sentença, qualquer que seja sua natureza, de procedência ou improcedência do pedido, constitui título executivo judicial, desde que estabeleça obrigação de pagar quantia, de fazer, não fazer ou entregar coisa, admitida sua prévia liquidação e execução nos próprios autos. STJ. Corte Especial. REsp 1.324.152-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/5/2016 (Info 585). O que importa é o conteúdo e não a classificação da sentença Para analisar se uma sentença possui ou não exequibilidade, não se deve levar em consideração a natureza da decisão (se condenatória, constitutiva, meramente declaratória etc.), até mesmo porque estas classificações são objeto de polêmicas doutrinárias que nunca se resolvem. Assim, para se examinar se uma sentença possui ou não exequibilidade, o que importa é analisar o conteúdo da decisão, ou seja, se ela, em seu conteúdo, reconhece que a parte deverá cumprir uma prestação de dar, fazer, não fazer ou pagar quantia. Se possuir esta determinação, deve-se considerá-la como título executivo. Nem toda sentença declaratória é título executivo Vale ressaltar que nem toda sentença declaratória possui eficácia executiva, mas apenas aquelas que, reconhecendo a existência da obrigação, contenham, em seu bojo, os pressupostos de certeza e exigibilidade. Desse modo, somente as sentenças declaratórias que forem certas e exigíveis é que podem ser consideradas como título executivo. Importante esclarecer que não há problema se a sentença for certa e exigível, mas não for líquida. Isso porque na ausência de liquidez, a parte poderá fazer a prévia liquidação para, então, executá-la. Inutilidade de nova ação judicial se já há uma sentença declaratória Outro argumento para se reconhecer exequibilidade para a sentença declaratória está no fato de que seria uma enorme perda de tempo e de gastos exigir que a parte que já possui em seu favor uma sentença declaratória fosse obrigada a ingressar com nova ação, desta feita para obter uma sentença condenatória. Além disso, esta segunda demanda seria inútil, considerando que, se a primeira sentença já declarou a existência do direito, a nova sentença a ser prolatada não poderia nem mesmo contrariar esta conclusão, sob pena de ofensa à coisa julgada. Nesse sentido:

(...) 2. Tem eficácia executiva a sentença declaratória que traz definição integral da norma jurídica individualizada. Não há razão alguma, lógica ou jurídica, para submetê-la, antes da execução, a um segundo juízo de certificação, até porque a nova sentença não poderia chegar a resultado diferente do da anterior, sob pena de comprometimento da garantia da coisa julgada, assegurada constitucionalmente. E instaurar um processo de cognição sem oferecer às partes e ao juiz outra alternativa de resultado que não um, já prefixado, representaria atividade meramente burocrática e desnecessária, que poderia receber qualquer outro qualificativo, menos o de jurisdicional. (...) STJ. 1ª Turma. REsp 588.202/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 10/02/2004.

Este entendimento acima explicado permanece com o novo CPC? Compare abaixo a mudança na redação da previsão do título executivo judicial:

CPC 1973 CPC 2015

Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: I — a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia;

Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: I — as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar

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quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa;

Diante da alteração na redação acima, alguns autores defenderam que a sentença meramente declaratória não mais seria título executivo judicial. Nesse sentido: BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, p. 640. A doutrina majoritária, no entanto, está se formando no sentido de que o CPC 2015 prevê que a sentença meramente declaratória é sim título executivo judicial, desde que reconheça a exigibilidade de uma obrigação. É a conclusão, por exemplo, de Daniel Amorim Assumpção Neves (Novo Código de Processo Civil comentado. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 872). No mesmo sentido, o Min. Rel. Luis Felipe Salomão em determinado trecho de seu voto dá a entender que o entendimento do STJ proferido neste julgado continua a vigorar com o CPC 2015.

EXECUÇÃO Competência para cancelar gravame em matrícula de imóvel arrematado

Arrematado bem imóvel, o Juízo da execução que conduziu a arrematação não pode determinar o cancelamento automático de constrições determinadas por outros Juízos de mesma hierarquia e registradas na matrícula do bem, mesmo que o edital de praça e o auto de arrematação tenham sido silentes quanto à existência dos referidos gravames.

Além de o Juízo da execução não deter competência para o desfazimento ou cancelamento de constrições e registros determinados por outros Juízos de mesma hierarquia, os titulares dos direitos decorrentes das decisões judiciais proferidas em outros processos ("credores"), as quais geraram as constrições e registros imobiliários que o arrematante pretende cancelar, têm direito ao devido processo legal, com contraditório e ampla defesa a fim de manterem o bem vinculado a seus interesses.

As possíveis falhas nos atos judiciais que antecederam a arrematação, porque não mencionavam as outras constrições de outros Juízos sobre o imóvel a ser arrematado, não possibilitam ao Juízo da arrematação determinar a baixa de outras constrições levadas a efeito por outros juízos.

STJ. 4ª Turma. RMS 48.609-MT, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 19/5/2016 (Info 585).

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" ajuizou execução de título extrajudicial contra a empresa "YY". Esta ação foi distribuída para a 1ª Vara Cível. O juízo da 1ª Vara determinou a penhora de um imóvel da devedora e o levou a leilão judicial. João arrematou o imóvel. Vale ressaltar que o edital do leilão e o auto de arrematação não mencionavam a existência de quaisquer tipos de gravames sobre o imóvel arrematado. Em outras palavras, os documentos que ofereceram o imóvel e que declararam a sua arrematação não previram qualquer restrição que pudesse incidir sobre ele. No entanto, para a surpresa de João, quando ele tentou transferir o imóvel para o seu nome descobriu que havia outros gravames sobre o bem. Explicando melhor: este mesmo imóvel já tinha sido penhorado pelo juízo da 2ª Vara Cível e pelo Juízo da 3ª Vara Cível em outras duas execuções propostas contra a empresa "YY". Vale ressaltar, no entanto, que nestes dois processos o bem ainda não tinha sido levado a leilão. Diante desta situação, João peticionou ao juízo da 1ª Vara Cível, onde tramitou a execução, requerendo a baixa dos demais gravames, determinados pelos outros dois juízos, a fim de que ele pudesse fazer o registro da carta de arrematação.

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O juízo da 1ª Vara Cível, onde ocorreu a arrematação, possui competência para levantar estes dois gravames? NÃO. Arrematado bem imóvel, o Juízo da execução que conduziu a arrematação não pode determinar o cancelamento automático de constrições determinadas por outros Juízos de mesma hierarquia e registradas na matrícula do bem, mesmo que o edital de praça e o auto de arrematação tenham sido silentes quanto à existência dos referidos gravames. Além de o Juízo da execução não deter competência para o desfazimento ou cancelamento de constrições e registros determinados por outros Juízos de mesma hierarquia, os titulares dos direitos decorrentes das decisões judiciais proferidas em outros processos ("credores"), as quais geraram as constrições e registros imobiliários que o arrematante pretende cancelar, têm direito ao devido processo legal, com contraditório e ampla defesa a fim de manterem o bem vinculado a seus interesses. As possíveis falhas nos atos judiciais que antecederam a arrematação, porque não mencionavam as outras constrições de outros Juízos sobre o imóvel a ser arrematado, não possibilitam ao Juízo da arrematação determinar a baixa de outras constrições levadas a efeito por outros juízos. STJ. 4ª Turma. RMS 48.609-MT, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 19/5/2016 (Info 585). Constatado o problema, o arrematante (em nosso exemplo, João) deveria ter: buscado o desfazimento da arrematação, com o retorno ao status quo ante (devolução de seu

dinheiro); ou formulado pedido de indenização. Como optou por outra via, qual seja, o cancelamento dos registros de penhoras e hipotecas de interesse de terceiros, terá que buscar esta providência nos respectivos juízos onde as ordens foram dadas (em nosso exemplo, 2ª e 3ª Varas Cíveis). Isso porque somente tais juízos são competentes para conhecer da demanda, sendo, como já explicado, indispensável a participação dos demais credores que são autores das outras execuções.

PROCESSO COLETIVO Necessidade de demonstração de motivos para a formação de

litisconsórcio ativo facultativo entre o MPE e o MPF

Importante!!!

Em ação civil pública, a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Estadual e o Federal depende da demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.254.428-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 2/6/2016 (Info 585).

É possível, em tese, que dois Ministérios Públicos ingressem, em conjunto, com uma ação civil pública? SIM. Apesar de existirem importantes vozes em sentido contrário, a Lei e a jurisprudência admitem o litisconsórcio ativo facultativo entre Ministérios Públicos. Isso está expressamente previsto no art. 5º, § 5º,

da Lei n. 7.347/85:

§ 5º Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei.

O litisconsórcio ativo facultativo entre os ramos do Ministério Público da União e os Ministérios Públicos

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dos Estados, em tese, é possível, sempre que as circunstâncias do caso recomendem, para a propositura de ações civis públicas que visem à responsabilização por danos morais e patrimoniais causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e paisagístico, à ordem econômica e urbanística, bem como a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, inclusive de natureza trabalhista. Essa atuação conjunta deve-se ao cunho social do Parquet e à posição que lhe foi erigida pelo constituinte (de instituição essencial à função jurisdicional do Estado), incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. O Plenário do STF já reconheceu, em tese, a possibilidade de litisconsórcio entre o MPF e o MPE: ACO 1.020/SP, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 08/10/2008. Esse litisconsórcio entre os Ministérios Públicos deve ser sempre permitido? NÃO, nem sempre. O litisconsórcio ativo facultativo entre os ramos do MPU e os MPs dos Estados, em tese, é possível, mas desde que as circunstâncias do caso recomendem. Assim decidiu o STJ: Em ação civil pública, a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Estadual e o Federal depende da demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide. STJ. 3ª Turma. REsp 1.254.428-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 2/6/2016 (Info 585). Assim, se os Ministérios Públicos decidirem ingressar com ação civil pública em litisconsórcio, é indispensável que demonstrem alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide. O instituto do litisconsórcio é informado pelos princípios da economia (obtenção do máximo de resultado com o mínimo de esforço) e da eficiência da atividade jurisdicional. Cada litisconsorte é considerado, em face do réu, como litigante distinto e deve promover o andamento do feito e ser intimado dos respectivos atos. Nesse contexto, a formação desnecessária do litisconsórcio poderá, ao fim e ao cabo, comprometer os princípios informadores do instituto, implicando, por exemplo, maior demora do processo pela necessidade de intimação pessoal de cada membro do Parquet, com prazo específico para manifestação. Justamente por isso, o litisconsórcio somente deverá ser autorizado quando houver razão para tanto. Caso concreto no qual o STJ recusou o litisconsórcio entre MPE e MPF O MPE e o MPF ingressaram, em litisconsórcio, com ação civil pública contra a empresa de TV a cabo pedindo que ela fosse proibida de cobrar taxa de instalação e mensalidade por ponto extra dos consumidores para quem ela oferece seus serviços (Estado de Minas Gerais). O STJ entendeu que como os direitos dos consumidores do Estado de Minas Gerais já estavam devidamente amparados pela iniciativa do Ministério Público Estadual, não havia interesse específico do Ministério Público Federal que pudesse justificar a sua presença na lide como litisconsorte ativo facultativo. Em razão disso, o STJ determinou o afastamento do litisconsórcio ativo entre o MPE e o MPF, devendo permanecer no polo ativo da ação civil pública apenas o Ministério Público do Estado de Minas Gerais.

PROCESSO COLETIVO Extensão dos efeitos de coisa julgada coletiva a autores de ações individuais não suspensas

Importante!!!

Os autores de ações individuais em cujos autos não foi dada ciência do ajuizamento de ação coletiva e que não requereram a suspensão das demandas individuais podem se beneficiar dos efeitos da coisa julgada formada na ação coletiva.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.593.142-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 7/6/2016 (Info 585).

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Imagine a seguinte situação hipotética: Os servidores públicos de determinado Estado-membro possuem direito a uma gratificação que não está sendo paga pela Administração Pública. Em razão disso, centenas desses servidores ingressaram com ações individuais contra o Estado-membro, pedindo a concessão da gratificação. Além disso, a associação dos servidores públicos deste Estado ajuizou uma ação civil pública com o mesmo pedido, ou seja, que a gratificação seja concedida a todos os servidores integrantes da associação. O juiz, ao receber a ação coletiva proposta pela associação, poderá determinar a suspensão das ações individuais que estejam tramitando e que tenham o mesmo objeto? SIM. Segundo o STJ, ajuizada ação coletiva atinente a macrolide geradora de processos multitudinários, suspendem-se as ações individuais, no aguardo do julgamento da ação coletiva (STJ. 2ª Seção. REsp 1110549/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 28/10/2009). Assim, é possível determinar a suspensão do andamento de processos individuais até o julgamento, no âmbito de ação coletiva, da questão jurídica de fundo neles discutida, ou seja, até que se decida se a gratificação é devida ou não. Imaginemos, no entanto, que o juiz recebeu a ação coletiva, mas não determinou a suspensão das ações individuais. O que acontece neste caso? Em princípio, a ação coletiva e as ações individuais continuarão tramitando. Mas não há, neste caso, litispendência? NÃO. As ações coletivas não induzem (provocam) litispendência para as ações individuais (art. 104 do CDC). Esse tema é muito cobrado em prova: (Promotor MS 2015) As ações coletivas que buscam a defesa de direitos difusos e coletivos induzem, como regra, litispendência para as ações individuais, em decorrência do princípio da segurança jurídica. (ERRADO) Mas o resultado da ação coletiva irá beneficiar os autores das ações individuais? Suponha que a ação coletiva seja julgada antes das ações individuais e a sentença seja procedente. Esta decisão poderá ser executada pelos autores das ações individuais? Depende. A lei determina o seguinte: Os autores das ações individuais deverão ser avisados que foi proposta uma ação coletiva com o mesmo pedido. Depois de serem avisados, os autores individuais terão que fazer uma opção no prazo de 30 dias: 1) Poderão escolher continuar com a ação individual: neste caso, não poderão ser beneficiados com eventual decisão favorável no processo coletivo. 2) Poderão pedir a suspensão da ação individual: neste caso, os efeitos da coisa julgada produzida na ação coletiva beneficiarão os autores das ações individuais. Essa regra está prevista no art. 104 do CDC, que é aplicado a todos os processos coletivos mesmo que não envolvam direito do consumidor. Assim, apesar de estar no CDC, ela é considerada como norma geral do processo coletivo. Veja o dispositivo:

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II do parágrafo único do artigo 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

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(Promotor GO 2014) As ações coletivas não induzem litispendência para as ações individuais, mas, em caso de procedência do pedido, os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes incidem automaticamente sobre estas, independentemente da vontade do autor, prevalecendo a ação coletiva. (ERRADO)

Quem tem o ônus de fazer essa comunicação aos autores individuais de que foi ajuizada uma ação coletiva com o mesmo pedido? O réu das ações. Assim, em nosso exemplo, o Estado-membro teria que peticionar em cada uma das ações individuais informando que foi ajuizada ação coletiva tratando sobre o tema. A partir daí, o autor individual terá o prazo de até 30 dias para requerer a suspensão do processo individual, nos termos do art. 104 do CDC. Caso não requeira a suspensão, seu processo individual continua normalmente, mas ele não poderá se beneficiar da sentença coletiva. Veja como o tema foi cobrado em prova: (Promotor MPDFT 2015) O Ministério Público do Distrito Federal propôs ação civil pública de responsabilidade, em favor de pessoas que utilizaram a rede mundial de computadores, sítio de uma empresa aérea, para a compra de passagens aéreas, mas que acabaram comprando, sem perceberem, um seguro de viagem cuja opção de compra já estava pré-selecionada. Alguns dos consumidores lesados pela compra propuseram ação individual. Mas, a empresa aérea comunicou nos autos a existência da ação coletiva, proposta em data posterior. Tal fato configura a litispendência, que é causa de extinção da ação coletiva sem resolução de mérito. (ERRADO)

E se o réu não fizer essa comunicação? O processo individual continua a correr normalmente, mas, se for proferida uma decisão favorável no processo coletivo, o autor individual poderá se beneficiar dela. Desse modo, se a ação coletiva for julgada procedente e transitar em julgado, o autor individual que não foi comunicado formalmente pelo réu de que havia sido ajuizada uma ação coletiva, poderá requerer a desistência da ação individual e pedir a sua habilitação para promover a execução da sentença coletiva.

Em suma, o que decidiu o STJ: Os autores de ações individuais em cujos autos não foi dada ciência do ajuizamento de ação coletiva e que não requereram a suspensão das demandas individuais podem se beneficiar dos efeitos da coisa julgada formada na ação coletiva. STJ. 1ª Turma. REsp 1.593.142-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 7/6/2016 (Info 585).

Ao disciplinar a execução de sentença coletiva, o art. 104 do CDC dispõe que os autores devem requerer a suspensão da ação individual que veicula a mesma questão em ação coletiva, a fim de se beneficiarem da sentença que lhes é favorável no feito coletivo. Todavia, compete à parte ré dar ciência aos interessados da existência desta ação nos autos da ação individual, momento no qual começa a correr o prazo de 30 dias para a parte autora postular a suspensão do feito individual. Desse modo, constitui ônus do demandado dar ciência inequívoca da propositura da ação coletiva àqueles que propuseram ações individuais, a fim de que possam fazer a opção pela continuidade do processo individual, ou requerer a sua suspensão para se beneficiar da sentença coletiva.

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DIREITO PENAL

CRIME DE VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL Comprovação da materialidade

Súmula 574-STJ: Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem.

STJ. 3ª Seção. Aprovada em 22/06/2016, DJe 27/06/2016.

João foi preso em casa com dezenas de DVD’s piratas que ele estava comercializando. Qual crime, em tese, ele praticou? Essa conduta amolda-se ao § 2º do art. 184 do CP:

Violação de direito autoral Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. (...) § 2º Na mesma pena do § 1º incorre quem, com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente.

Como essa prática é cada vez mais comum, havendo, inclusive, “feiras” fiscalizadas pelo Poder Público onde esse comércio ocorre livremente, a Defensoria Pública alegou que não haveria crime, com base no princípio da adequação social. Essa tese é acolhida pela jurisprudência? NÃO. Tanto o STF como o STJ entendem que é típica, formal e materialmente, a conduta de expor à venda CDs e DVDs falsificados. Em suma, é crime. O fato de, muitas vezes, haver tolerância das autoridades públicas em relação a tal prática não significa que a conduta não seja mais tida como típica, ou que haja exclusão de culpabilidade, razão pela qual, pelo menos até que advenha modificação legislativa, incide o tipo penal, mesmo porque o próprio Estado tutela o direito autoral. Não se pode considerar socialmente tolerável uma conduta que causa sérios prejuízos à indústria fonográfica brasileira e aos comerciantes legalmente instituídos, bem como ao Fisco pelo não pagamento de impostos. Nesse sentido: STF HC 98898, julgado em 20/04/2010. Justamente para que não houvesse mais dúvidas, o STJ editou um enunciado:

Súmula 502-STJ: Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no artigo 184, parágrafo 2º, do Código Penal, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas.

Outra tese alegada pela defesa é a de que deveria ser aplicado o princípio da insignificância. Tal argumentação é aceita pelos Tribunais? NÃO. Não se aplica o princípio da insignificância ao crime de violação de direito autoral. Em que pese a aceitação popular à pirataria de CDs e DVDs, com certa tolerância das autoridades públicas em relação a tal prática, a conduta, que causa sérios prejuízos à indústria fonográfica brasileira, aos comerciantes legalmente instituídos e ao Fisco, não escapa à sanção penal, mostrando-se formal e materialmente típica (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1380149/RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 27/08/2013).

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A pena prevista para esse crime é de 2 a 4 anos. Trata-se de reprimenda desproporcional para esse tipo de conduta? NÃO. De acordo com o STJ, não há desproporcionalidade da pena prevista, pois o próprio legislador, atento aos reclamos da sociedade que representa, entendeu merecer tal conduta pena considerável, especialmente pelos graves e extensos danos que acarreta, estando geralmente relacionada a outras práticas criminosas, como a sonegação fiscal e a formação de quadrilha (HC 191568/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 07/02/2013).

Qual é a ação penal nos crimes previstos no art. 184 do CP? • Art. 184, caput: ação penal privada. • Art. 184, §§ 1º e 2º (ex.: venda de DVD pirata): ação pública incondicionada. • Art. 184, § 3º: ação penal pública condicionada. Regras de procedimento O processo e julgamento dos crimes contra a propriedade imaterial é disciplinado pelos arts. 524 a 530-I do CPP. Estes artigos preveem dois tipos de procedimento: um para o delito do art. 184, caput, do CP e outro para as infrações dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 184 do CP.

Delito do art. 184, caput, do CP: aplicam-se as regras dos arts. 524 a 530 do CPP.

Delitos dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 184 do CP:

a autoridade policial fará a apreensão dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos (ex.: CDs e DVDs piratas), em sua totalidade, juntamente com os equipamentos, suportes e materiais que possibilitaram a sua existência (ex.: computador onde eram feitas as cópias das mídias), desde que estes se destinem precipuamente à prática do ilícito;

na ocasião da apreensão será lavrado termo, assinado por 2 (duas) ou mais testemunhas, com a descrição de todos os bens apreendidos e informações sobre suas origens, o qual deverá integrar o inquérito policial ou o processo;

depois da apreensão, será realizada, por perito oficial ou, na falta deste, por pessoa tecnicamente habilitada, perícia sobre todos os bens apreendidos e elaborado o laudo que deverá integrar o inquérito policial ou o processo; Este exame técnico tem o objetivo de atestar a ocorrência ou não de reprodução (cópia) feita com violação de direitos autorais. Segundo o STJ, no caso do § 2º do art. 184 do CP, comprovada a materialidade delitiva por meio da perícia, é totalmente desnecessária a identificação e inquirição das supostas vítimas, até mesmo porque este ilícito é apurado mediante ação penal pública incondicionada, dispensando qualquer provocação por parte da vítima;

caso sejam identificadas as vítimas do delito, os titulares de direito de autor e os que lhe são conexos serão os fiéis depositários de todos os bens apreendidos, devendo colocá-los à disposição do juiz quando do ajuizamento da ação;

o juiz poderá determinar, a requerimento da vítima, a destruição da produção ou reprodução apreendida, salvo se estiver sendo discutido se o material encontrado é ou não ilícito;

o juiz, ao prolatar a sentença condenatória, poderá determinar a destruição dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos e o perdimento dos equipamentos apreendidos, desde que precipuamente destinados à produção e reprodução dos bens, em favor da Fazenda Nacional, que deverá destruí-los ou doá-los aos Estados, Municípios e Distrito Federal, a instituições públicas de ensino e pesquisa ou de assistência social, bem como incorporá-los, por economia ou interesse público, ao patrimônio da União, que não poderão retorná-los aos canais de comércio;

as associações de titulares de direitos de autor e dos que lhes são conexos poderão, em seu próprio nome, funcionar como assistente da acusação, quando praticado o delito em detrimento de qualquer de seus associados.

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Voltando ao nosso exemplo hipotético: Os peritos fizeram a perícia em apenas alguns DVD’s, por amostragem, e esse exame se limitou a analisar os elementos externos dos DVD's apreendidos, como a impressão da capa, o código de barras, o nome do fabricante etc. A Defensoria Pública questionou a validade dessa perícia, afirmando que: 1) o art. 530-D do CPP exige que a perícia seja feita sobre TODOS os bens apreendidos, não podendo ser

realizada por amostragem; 2) a perícia deveria ter examinado o conteúdo de cada um dos DVD’s (e não apenas os aspectos

exteriores); 3) para a configuração do delito em questão, é necessária a identificação dos titulares dos direitos

autorais violados. As teses suscitadas pela defesa são aceitas pela jurisprudência do STJ? NÃO. 1) É válida a perícia por amostragem Realmente, a redação literal do art. 530-D do CPP afirma que a perícia deve ser realizada "sobre todos os bens apreendidos". Apesar disso, o STJ relativiza essa exigência e admite que a perícia seja feita por amostragem. Assim, basta que haja a apreensão de um único objeto e se a perícia realizada sobre ele constatar a falsidade, estará configurado o delito do art. 184, § 2º do CP. Entender de forma diversa apenas dificultaria a apuração do delito e retardaria o término do processo judicial, em inobservância ao princípio constitucional da razoável duração do processo. Assim, a exigência do legislador de que a perícia seja realizada sobre todos os bens apreendidos se presta, na verdade, não para fins de comprovação da materialidade delitiva, mas para fins de dosimetria da pena, mais especificamente para a exasperação da reprimenda-base, uma vez que se mostra mais acentuada a reprovabilidade do agente que reproduz, por exemplo, com intuito de lucro, 500 obras intelectuais do que aquele que, nas mesmas condições, reproduz apenas 20. 2) É suficiente a análise das características externas do material apreendido É dispensável excesso de formalismo para a constatação da materialidade do crime de violação de direito autoral. Desse modo, a simples análise de características externas dos objetos apreendidos é suficiente para a aferição da falsidade necessária à configuração do delito descrito no art. 184, § 2º, do CP. Não é razoável exigir minúcias exageradas no laudo pericial, como a catalogação de centenas ou milhares de CD's e DVD's, indicação de cada título e autor da obra apreendida e contrafeita. Assim, é válida a perícia realizada nas características externas do material apreendido. 3) É dispensável a identificação individualizada dos titulares dos direitos autorais violados Para a configuração do crime em questão, é dispensável a identificação individualizada dos titulares dos direitos autorais violados ou de quem os represente. Isso porque a violação de direito autoral extrapola a individualidade do titular do direito, devendo ser tratada como ofensa ao Estado e a toda a coletividade, visto que acarreta a diminuição na arrecadação de impostos, reduz a oferta de empregos formais, causa prejuízo aos consumidores e aos proprietários legítimos e fortalece o poder paralelo e a prática de atividades criminosas conexas à venda desses bens, aparentemente inofensiva. Além disso, o tipo penal do art. 184, § 2º, do CP, é crime de ação penal pública incondicionada, de modo que não é exigida nenhuma manifestação do detentor do direito autoral violado para que se dê início à ação penal. Consequentemente, não é coerente se exigir a sua individualização para a configuração do delito em questão. Ademais, o delito previsto no art. 184, § 2º, do CP é de natureza formal. Portanto, não é necessária, para a sua consumação, a ocorrência de resultado naturalístico, o que reforça a prescindibilidade (desnecessidade) de identificação dos titulares dos direitos autorais violados para a configuração do crime.

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Em sede de recurso especial repetitivo, o STJ firmou a seguinte tese que resume essas três conclusões: É suficiente, para a comprovação da materialidade do delito previsto no art. 184, § 2º, do CP, a perícia realizada, por amostragem, sobre os aspectos externos do material apreendido, sendo desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou de quem os represente. STJ. 3ª Seção. REsp 1.456.239-MG e REsp 1.485.832-MG, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/8/2015 (recurso repetitivo) (Info 567). Este entendimento pacífico foi materializado na Súmula 574 do STJ.

CRIMES DE TRÂNSITO Entrega de direção de veículo automotor a pessoa não habilitada é crime de perigo abstrato

Súmula 575-STJ: Constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor à pessoa que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art. 310 do CTB, independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo.

STJ. 3ª Seção. Aprovada em 22/06/2016, DJe 27/06/2016.

Imagine a seguinte situação hipotética: João, 55 anos, entregou seu carro para que seu filho Igor (17 anos) fosse a uma festa. Na volta para casa, Igor foi parado em uma blitz. Além de aplicar a multa, os agentes de trânsito encaminharam cópia do processo administrativo para o Ministério Público, que denunciou João pela prática do crime previsto no art. 310 do CTB:

Art. 310. Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

Em sua defesa, João alegou que Igor não causou nenhum tipo de perigo porque sabe dirigir há anos e estava em velocidade compatível no local, não tendo os agentes de trânsito observado qualquer condução irregular do veículo por sua parte.

Os argumentos da defesa poderão ser aceitos? NÃO. Para o STJ, o delito previsto no art. 310 do CP é crime de perigo ABSTRATO. Assim, não é exigível, para o aperfeiçoamento do delito, a ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na conduta de quem permite, confia ou entrega a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou ainda a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança. O art. 310, mais do que tipificar uma conduta idônea a lesionar, estabelece um dever de garante ao possuidor do veículo automotor. Neste caso, estabelece-se um dever de não permitir, confiar ou entregar a direção de um automóvel a determinadas pessoas, indicadas no tipo penal, com ou sem habilitação, com problemas psíquicos ou físicos, ou embriagadas, ante o perigo geral que encerra a condução de um veículo nessas condições. STJ. 3ª Seção. REsp 1.485.830-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 11/3/2015 (recurso repetitivo) (Info 563). STJ. 6ª Turma. REsp 1.468.099-MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 19/3/2015 (Info 559).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

PRISÃO CAUTELAR Atos infracionais pretéritos podem ser utilizados como fundamento

para decretação/manutenção da prisão preventiva

Importante!!!

A prática de atos infracionais anteriores serve para justificar a decretação ou manutenção da prisão preventiva como garantia da ordem pública, considerando que indicam que a personalidade do agente é voltada à criminalidade, havendo fundado receio de reiteração.

Não é qualquer ato infracional, em qualquer circunstância, que pode ser utilizado para caracterizar a periculosidade e justificar a prisão antes da sentença. É necessário que o magistrado analise:

a) a gravidade específica do ato infracional cometido;

b) o tempo decorrido entre o ato infracional e o crime; e

c) a comprovação efetiva da ocorrência do ato infracional.

STJ. 3ª Seção. RHC 63.855-MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 11/5/2016 (Info 585).

João, 19 anos, está respondendo a processo criminal por roubo. Quando era adolescente, João cumpriu medida socioeducativa por homicídio. No momento da condenação, o juiz poderá considerar esse ato infracional para fins de reincidência ou de maus antecedentes? NÃO. Atos infracionais não podem ser considerados maus antecedentes para a elevação da pena-base e muito menos servem para configurar reincidência (STJ. 5ª Turma. HC 289.098/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 20/05/2014). João, 19 anos, está respondendo a processo criminal por roubo. Quando era adolescente, cumpriu medida socioeducativa por homicídio. O juiz, ao decretar a prisão preventiva do réu, poderá mencionar a prática desse ato infracional como um dos fundamentos para a custódia cautelar? Havia divergência entre as Turmas do STJ, mas o tema agora restou pacificado. A resposta é SIM. A prática de atos infracionais anteriores serve para justificar a decretação ou manutenção da prisão preventiva como garantia da ordem pública, considerando que indicam que a personalidade do agente é voltada à criminalidade, havendo fundado receio de reiteração. STJ. 5ª Turma. RHC 47.671-MS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 18/12/2014 (Info 554). STJ. 3ª Seção. RHC 63.855-MG, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 11/05/2016. O Min. Rogério Schietti Cruz ressalvou, porém, que não é qualquer ato infracional, em qualquer circunstância, que pode ser utilizado para caracterizar a periculosidade e justificar a prisão antes da sentença. Para tanto, foram estabelecidos alguns critérios (condições). Para saber se o ato infracional é idôneo ou não para ser levado em consideração no momento da decretação/manutenção da prisão preventiva, a autoridade judicial deverá examinar três condições: a) a gravidade específica do ato infracional cometido (independentemente de equivaler a crime considerado em abstrato como grave); b) o tempo decorrido entre o ato infracional e o crime em razão do qual é decretada a preventiva; e c) a comprovação efetiva da ocorrência do ato infracional.

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Resumindo, o juiz deverá analisar o ato infracional praticado e verificar se ele: a) foi grave (e aqui não importa a gravidade em abstrato, mas sim no caso concreto); b) ficou realmente provado; c) foi cometido há muitos anos, ou seja, se entre a data do ato infracional e o dia do crime praticado já se passou muito tempo, situação que faz com que o ato infracional perca importância na análise. Atos infracionais não são antecedentes criminais, mas podem ser valorados Os atos infracionais não podem ser considerados como antecedentes penais já que ato infracional não é crime e medida socioeducativa não é pena. Apesar disso, os registros sobre o passado de uma pessoa, seja ela quem for, não podem ser desconsiderados para fins cautelares. A avaliação sobre a periculosidade de alguém impõe que se examine todo o seu histórico de vida, em especial o seu comportamento perante a comunidade. Logo, os atos infracionais praticados não servem como antecedentes penais e muito menos para firmar reincidência, mas não podem ser ignorados, devendo ser analisados para se aferir se existe risco à garantia da ordem pública com a liberdade do acusado. Proteção do art. 143 do ECA só vale enquanto a pessoa for menor de 18 anos O art. 143 do ECA prevê que "é vedada a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional". Contudo, segundo entende o STJ, essa proteção estatal prevista no ECA é voltada ao adolescente infrator somente enquanto ele estiver nessa condição. Assim, a partir do momento em que se torna imputável, deixa de haver o óbice. Decisão cautelar do STF O STF ainda não enfrentou o tema em seu colegiado, mas existe ao menos uma decisão monocrática recente na qual o Min. Luiz Fux afirmou que é possível utilizar atos infracionais pretéritos como fundamento para a prisão preventiva. Veja:

"(...) A prevalecer o argumento de que a prática de atos infracionais na menoridade não se comunica com a vida criminal adulta, ter-se-á que admitir o absurdo de que o agente poderá reiterar na prática criminosa logo após adquirir a maioridade, sem que se lhe recaia a possibilidade de ser preso preventivamente. A possibilidade real de reiteração delituosa constitui, fora de dúvida, base empírica subsumível à hipótese legal da garantia da ordem pública. (...)" (STF. Decisão monocrática. RHC 134121 MC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20/04/2016)

Resumindo: A prática de atos infracionais anteriores serve para justificar a decretação ou manutenção da prisão preventiva como garantia da ordem pública, considerando que indicam que a personalidade do agente é voltada à criminalidade, havendo fundado receio de reiteração. Não é qualquer ato infracional, em qualquer circunstância, que pode ser utilizado para caracterizar a periculosidade e justificar a prisão antes da sentença. É necessário que o magistrado analise: a) a gravidade específica do ato infracional cometido; b) o tempo decorrido entre o ato infracional e o crime; e c) a comprovação efetiva da ocorrência do ato infracional. STJ. 3ª Seção. RHC 63.855-MG, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 11/05/2016.

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RECURSOS Agravo interno contra decisão monocrática do relator no STF/STJ e o novo CPC

Importante!!!

O agravo interposto contra decisão monocrática do Ministro Relator no STF e STJ, em recursos ou ações originárias que versem sobre matéria penal ou processual penal NÃO obedece às regras no novo CPC. Isso significa que:

o prazo deste agravo é de 5 dias, nos termos do art. 39 da Lei nº 8.038/90 (não se aplicando o art. 1.070 do CPC/2015);

este prazo é contado em dias corridos, conforme prevê o art. 798 do CPP (não se aplicando a regra da contagem em dias úteis do art. 219 do CPC/2015).

STF. Decisão monocrática. HC 134554 Rcon, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 10/06/2016 (Info 830).

STJ. 3ª Seção. AgRg na Rcl 30.714/PB, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 27/04/2016.

STJ. 3ª Seção. AgRg nos EDcl nos EAREsp 316.129-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/5/2016 (Info 585).

Poderes do Relator Quando um recurso ou uma ação originária chega ao Tribunal, é sorteado um magistrado para exercer a função de Relator deste processo. O Relator examina o recurso antes dos demais magistrados e elabora um relatório e um voto que serão levados ao colegiado para que os demais juízes (em sentido amplo) decidam se concordam ou não com as conclusões do Relator. Ocorre que, antes mesmo de elaborar o voto, o Relator tem poderes para, sozinho, ou seja, de forma monocrática, tomar uma série de medidas e decisões. O Relator poderá, por exemplo, monocraticamente, não conhecer do recurso que seja inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida. Os poderes do Ministro Relator no STJ estão descritos no art. 34 do RISTJ e os do STF no art. 21 do RISTF. Qual é o recurso que a parte prejudicada poderá interpor contra a decisão do Ministro Relator do STF ou STJ que, monocraticamente, decide de forma contrária aos seus interesses? Agravo interno (também chamado de agravo regimental). Qual é o prazo deste agravo em processos de natureza criminal? Com a entrada em vigor do CPC/2015, surgiu a seguinte dúvida/divergência:

1ª corrente: 15 dias 2ª corrente: 5 dias

Aplica-se o art. 1.070 do CPC/2015: Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal. (...) Art. 1.070. É de 15 (quinze) dias o prazo para a interposição de qualquer agravo, previsto em lei ou em regimento interno de tribunal, contra decisão de relator ou outra decisão unipessoal proferida em tribunal.

O art. 1.070 do novo CPC não se aplica aos processos de natureza criminal (ações originárias ou recursos) que tramitam no STF e STJ. Isso porque existe previsão específica no art. 39 da Lei nº 8.038/90, que não foi derrogado:

Art. 39. Da decisão do Presidente do Tribunal, de Seção, de Turma ou de Relator que causar gravame à parte, caberá agravo para o órgão especial, Seção ou Turma, conforme o caso, no prazo de cinco dias.

Informativo 585-STJ (11 a 30/06/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 35

O STF e o STJ adotaram a 2ª corrente, ou seja, o prazo do agravo interno nos processos de natureza criminal que tramitam nestes Tribunais continua sendo de 5 dias. O CPC/2015 previu que os prazos devem ser contados somente em dias úteis (art. 219). Esta regra vale também para o agravo interno nos processos criminais? O prazo de 5 dias do agravo deverá ser contado em dias úteis? NÃO. Não se aplica o art. 219 do CPC/2015 (que prevê a contagem dos prazos em dias úteis), considerando que existe regra específica no processo penal determinando que todos os prazos serão contínuos, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado (art. 798 do CPP).

(...) tratando-se de prazo processual penal, o modo de sua contagem é disciplinado por norma legal que expressamente dispõe sobre a matéria (CPP, art. 798, “caput”), o que torna inaplicável a regra fundada no art. 219, “caput”, do Código de Processo Civil de 2015, pois, como se sabe, a possibilidade de aplicação analógica da legislação processual civil ao processo penal, embora autorizada pelo art. 3º do próprio Código de Processo Penal, depende, no entanto, para incidir, da existência de omissão na legislação processual penal (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, art. 4º). STF. Decisão monocrática. HC 134554 Rcon, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 10/06/2016 (Info 830).

(...) O agravo contra decisão monocrática de Relator, em controvérsias que versam sobre matéria penal ou processual penal, nos tribunais superiores, não obedece às regras no novo CPC, referentes à contagem dos prazos em dias úteis (art. 219, Lei 13.105/2015) e ao estabelecimento de prazo de 15 (quinze) dias para todos os recursos, com exceção dos embargos de declaração (art. 1.003, § 5º, Lei 13.105/2015). 2. Isso porque, no ponto, não foi revogada, expressamente, como ocorreu com outros de seus artigos, a norma especial da Lei 8.038/90 que estabelece o prazo de cinco dias para o agravo interno. 3. Além disso, a regra do art. 798 do Código de Processo Penal, segundo a qual "Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado" constitui norma especial em relação às alterações trazidas pela Lei 13.105/2015. (...) STJ. 3ª Seção. AgRg na Rcl 30.714/PB, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 27/04/2016.

DIREITO TRIBUTÁRIO

ICMS Cálculo do ICMS por dentro aplica-se também nos casos de substituição tributária

O ICMS integra a sua própria base de cálculo, sendo isso chamado de ICMS "por dentro" ou "cálculo por dentro".

O ICMS por dentro está previsto no art. 13, § 1º, I, da LC 87/96, sendo considerado constitucional pelo STF.

Essa mesma regra aplica-se para o ICMS substituição tributária, considerando que se trata do mesmo tributo.

Assim, ainda que se adote a substituição tributária como forma de arrecadação de ICMS, é legal aplicar-se a sistemática do "cálculo por dentro".

STJ. 2ª Turma. REsp 1.454.184-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 5/5/2016 (Info 585).

ICMS O ICMS é um imposto estadual previsto no art. 155, II, da CF e na LC 87/96:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

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II — operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

Principais características do imposto:

plurifásico: incide sobre o valor agregado, obedecendo-se ao princípio da não-cumulatividade;

real: as condições da pessoa são irrelevantes;

proporcional: não é progressivo;

fiscal: tem como função principal a arrecadação. Fatos geradores Eduardo Sabbag afirma que, resumidamente, o ICMS pode ter os seguintes fatos geradores (Manual de Direito Tributário. 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1061):

circulação de mercadorias;

prestação de serviços de transporte intermunicipal;

prestação de serviços de transporte interestadual;

prestação de serviços de comunicação. Base de cálculo do ICMS incidente sobre a circulação de mercadorias Base de cálculo é o valor sobre o qual será aplicada a alíquota para que se calcule o quanto de imposto será devido. Segundo a CF/88, a base de cálculo do ICMS deverá ser fixada em lei complementar de caráter nacional "de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço" (art. 155, § 2º, XII, "i", da CF/88). A Lei Complementar que fixou a base de cálculo do ICMS foi a LC 87/96, conhecida como Lei Kandir. Segundo o art. 13 da LC 87/96, a base de cálculo do ICMS irá variar de acordo com o fato gerador. No caso de circulação de mercadorias, a base de cálculo será o valor da operação. ICMS "por dentro" O art. 13, § 1º, I, da LC 87/96 determina que o valor pago a título de ICMS integra a base de cálculo do próprio ICMS. Assim, a base de cálculo do ICMS, definida como o valor da operação de circulação de mercadoria, inclui o próprio montante do ICMS incidente, pois ele faz parte da importância paga pelo comprador e recebida pelo vendedor na operação. "Um exemplo pode ajudar o estudante a compreender o funcionamento da técnica de cálculo do ICMS 'por dentro'. Imagine-se uma operação de compra e venda de determinado bem realizada entre uma indústria e um estabelecimento atacadista pelo valor de R$ 100,00, a uma alíquota de 17%, já computados no preço o lucro do vendedor e as despesas com seguro e frete. Caso o cálculo do tributo fosse feito na modalidade convencional, ou 'por fora', como ocorre no cálculo do IPI, teríamos o montante a ser pago a título de ICMS de R$ 17,00: ICMS = 100 x 17% = R$ 17,00. Utilizando-se a técnica de cálculo 'por dentro', no entanto, também o ICMS pago pela indústria vendedora passa a integrar o preço da operação (R$ 100,00). Dessa forma, a alíquota de 17% incidirá não apenas sobre as demais despesas, mas sobre as despesas mais R$ 17,00. Em outras palavras, no exemplo citado, teremos um montante de R$ 19,89 (17% X R$ 117,00) pago a título de ICMS. Conforme visto, é como se a base de cálculo efetiva fosse R$ 117,00 (R$ 100,00 + 17% sobre este valor), o que implica clara majoração do imposto, daí porque tantas críticas por parte da doutrina." (CASTRO, Eduardo Moreira Lima Rodrigues de. Tributos em espécie. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 575-576).

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O ICMS "por dentro" é constitucional? SIM. A própria CF/88, alterada pela EC 33/2001, determina que, na base de cálculo do ICMS deverá ser incluído o montante pago do imposto. Veja:

Art. 155 (...) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...) XII - cabe à lei complementar: (...) i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 33/2001)

Mesmo antes da inclusão dessa alínea "i" realizada pela EC 33/2001, o STF já havia dito que a sistemática do "cálculo por dentro" no ICMS era constitucional. Nesse sentido: RE 212.209-RS, Tribunal Pleno, DJ 14/2/2003; RE 582.461 RG-SP, Tribunal Pleno, DJe 18/8/2011). Veja um precedente:

É constitucional a inclusão do montante do ICMS em sua própria base de cálculo (...) STF. 2ª Turma. AI 510439 AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgado em 26/06/2012.

Veja como o tema já foi cobrado em prova: (PGE/PR 2015) A inclusão do montante do imposto na sua própria base de cálculo (ICMS por dentro)

viola a Constituição Federal de 1988. (ERRADO) (Juiz TJDFT 2015 CESPE) Determinada associação de defesa de comerciantes, consumidores e

contribuintes, que está constituída há sete meses e tem por finalidade a defesa de seus associados no que diz respeito a relações de consumo, tributárias e econômicas, entre outros direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, propôs ACP para questionar a incidência de ICMS “por dentro”, ou seja, que na base de cálculo desse imposto, ele próprio esteja incluído, fazendo o ICMS incidir sobre ele mesmo. Considerando essa situação hipotética, o MP teria legitimidade para propor ACP contestando a incidência do ICMS “por dentro” que já foi declarado inconstitucional pelo STF, pois lhe incumbe a defesa de direitos individuais homogêneos referentes a matéria tributária. (ERRADO)

(Juiz TJDFT 2015 CESPE) Determinada associação de defesa de comerciantes, consumidores e contribuintes, que está constituída há sete meses e tem por finalidade a defesa de seus associados no que diz respeito a relações de consumo, tributárias e econômicas, entre outros direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, propôs ACP para questionar a incidência de ICMS “por dentro”, ou seja, que na base de cálculo desse imposto, ele próprio esteja incluído, fazendo o ICMS incidir sobre ele mesmo. Considerando essa situação hipotética, exceto pela ilegitimidade da associação, a ACP seria cabível. No mérito, o pedido da ação deveria ser julgado procedente, pois a incidência do ICMS “por dentro” ofende os princípios da não cumulatividade e do ne bis in idem. (ERRADO)

(Juiz TJDFT 2015 CESPE) Determinada associação de defesa de comerciantes, consumidores e contribuintes, que está constituída há sete meses e tem por finalidade a defesa de seus associados no que diz respeito a relações de consumo, tributárias e econômicas, entre outros direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, propôs ACP para questionar a incidência de ICMS “por dentro”, ou seja, que na base de cálculo desse imposto, ele próprio esteja incluído, fazendo o ICMS incidir sobre ele mesmo. Considerando essa situação hipotética, a ação não é cabível, mas, se houvesse julgamento do mérito, o pedido da ação deveria ser julgado improcedente, pois o valor referente ao ICMS faz parte da importância paga pelo comprador e recebida pelo vendedor na operação. (CERTO)

Substituição tributária progressiva A substituição tributária progressiva, também chamada de substituição tributária “para frente” ou subsequente, é uma técnica de arrecadação de alguns impostos, em especial o ICMS.

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Na substituição tributária progressiva, a lei prevê que o tributo deverá ser recolhido antes mesmo que ocorra o fato gerador. Desse modo, primeiro há um recolhimento do imposto e o fato gerador se dará em um momento posterior. Diz-se, então, que o fato gerador é presumido porque haverá o pagamento do tributo sem ter certeza que ele irá acontecer. A técnica de ICMS 'por dentro' pode ser aplicada também nos casos de substituição tributária? SIM. Ainda que se adote a substituição tributária como forma de arrecadação de ICMS, é legal a sistemática do "cálculo por dentro". STJ. 2ª Turma. REsp 1.454.184-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 5/5/2016 (Info 585). O ICMS-Substituição Tributária (ICMS-ST) não é um tributo diferente do ICMS "comum", mas um regime ou sistema utilizado com o objetivo de simplificar a tributação, facilitando a fiscalização e diminuindo os ônus administrativos para os próprios contribuintes, considerando que concentra em apenas um deles, de regra o mais capacitado do ponto de vista organizacional para o recolhimento do imposto e todas as obrigações acessórias correspondentes a várias etapas de circulação da mercadoria. A base de cálculo do ICMS não sofre qualquer modificação quando se trata de arrecadação mediante substituição tributária. Assim, ainda que não haja referência expressa quanto à inclusão do ICMS em sua base de cálculo na modalidade substituição, não se pode extrair desse fato interpretação diversa daquela prevista no art. 13 da LC nº 87/96 que, ao estabelecer regra geral, não foi excluída pelo art. 8º (que regulamenta a substituição tributária) da mesma lei. Em outras palavras, não há motivo para não se aplicar a técnica do ICMS 'por dentro' nos casos de ICMS cobrado por meio de substituição tributária. Resumindo: O ICMS integra a sua própria base de cálculo, sendo isso chamado de ICMS "por dentro" ou "cálculo por dentro". O ICMS por dentro está previsto no art. 13, § 1º, I, da LC 87/96, sendo considerado constitucional pelo STF. Essa mesma regra aplica-se para o ICMS substituição tributária, considerando que se trata do mesmo tributo. Assim, ainda que se adote a substituição tributária como forma de arrecadação de ICMS, é legal aplicar-se a sistemática do "cálculo por dentro". STJ. 2ª Turma. REsp 1.454.184-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 5/5/2016 (Info 585).