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INCLUSÃO EDUCACIONAL: O QUE MOSTRAM AS PESQUISAS RECENTES SOBRE AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL ALMEIDA, Sabrina Araujo de 1 - UNESA CAMPOS, Pedro Humberto Faria 2 - UNESA Grupo de Trabalho – Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo A partir da análise da trajetória da Educação Especial é possível perceber que a discriminação e o preconceito estão presentes no pensamento instituído nos diferentes momentos da história. Desta forma, com a evolução no atendimento à pessoa com deficiência, buscam-se possibilidades de aprendizagem, dando origem à inclusão educacional, que consiste no fenômeno que procura garantir o acesso e a permanência de todo indivíduo na rede regular de ensino. Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo fazer um levantamento sobre as pesquisas que trazem a discussão em torno da Inclusão Educacional, a partir do estudo da Teoria das representações sociais, que identifica no imaginário social, determinadas impressões sobre objetos, orientando e justificando práticas. A partir da análise dos trabalhos foi possível identificar os seguintes objetos de estudo: educação inclusiva, inclusão, o deficiente e necessidades específicas; tendo como base o discurso de professores da rede regular de ensino e professores especializados; além de promover o estudo da relação inclusão/exclusão no ambiente educacional, a fim de identificar os significados contidos no pensamento social, construídos e enraizados neste ambiente. Assim, foram analisadas 9 pesquisas, produzidas no período entre 2004 e 2012, na rede pública de ensino, no Ensino Fundamental, que utilizam como método de coleta de dados testes de livre evocação, questionários e entrevistas semi-diretivas; para a verificação dos dados utilizam técnicas como a análise de evocação e análise de conteúdo segundo Bardin. Neste sentido, é possível observar que as pesquisas mostram o trabalho centrado no amor, com paciência e afetividade, além da obrigatoriedade. Outro dado importante é que citam a exclusão como presente no ambiente escolar, mas não como princípio inerente ao ato de incluir, ou seja, se incluímos já 1 Mestre em Psicologia Social: UNIVERSO – Universidade Salgado de Oliveira. Professora do IFRJ – campus Pinheiral. Doutoranda em Educação pela UNESA (Universidade Estácio de Sá). E-mail: [email protected]. 2 Doutor em Psicologia: Universite de Provence - França. Professor Titular da Universidade Estácio de Sá (UNESA) e Professor Titular da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: [email protected].

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INCLUSÃO EDUCACIONAL: O QUE MOSTRAM AS PESQUISAS

RECENTES SOBRE AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE

PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL

ALMEIDA, Sabrina Araujo de1 - UNESA

CAMPOS, Pedro Humberto Faria2 - UNESA

Grupo de Trabalho – Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo A partir da análise da trajetória da Educação Especial é possível perceber que a discriminação e o preconceito estão presentes no pensamento instituído nos diferentes momentos da história. Desta forma, com a evolução no atendimento à pessoa com deficiência, buscam-se possibilidades de aprendizagem, dando origem à inclusão educacional, que consiste no fenômeno que procura garantir o acesso e a permanência de todo indivíduo na rede regular de ensino. Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo fazer um levantamento sobre as pesquisas que trazem a discussão em torno da Inclusão Educacional, a partir do estudo da Teoria das representações sociais, que identifica no imaginário social, determinadas impressões sobre objetos, orientando e justificando práticas. A partir da análise dos trabalhos foi possível identificar os seguintes objetos de estudo: educação inclusiva, inclusão, o deficiente e necessidades específicas; tendo como base o discurso de professores da rede regular de ensino e professores especializados; além de promover o estudo da relação inclusão/exclusão no ambiente educacional, a fim de identificar os significados contidos no pensamento social, construídos e enraizados neste ambiente. Assim, foram analisadas 9 pesquisas, produzidas no período entre 2004 e 2012, na rede pública de ensino, no Ensino Fundamental, que utilizam como método de coleta de dados testes de livre evocação, questionários e entrevistas semi-diretivas; para a verificação dos dados utilizam técnicas como a análise de evocação e análise de conteúdo segundo Bardin. Neste sentido, é possível observar que as pesquisas mostram o trabalho centrado no amor, com paciência e afetividade, além da obrigatoriedade. Outro dado importante é que citam a exclusão como presente no ambiente escolar, mas não como princípio inerente ao ato de incluir, ou seja, se incluímos já

1 Mestre em Psicologia Social: UNIVERSO – Universidade Salgado de Oliveira. Professora do IFRJ – campus Pinheiral. Doutoranda em Educação pela UNESA (Universidade Estácio de Sá). E-mail: [email protected]. 2 Doutor em Psicologia: Universite de Provence - França. Professor Titular da Universidade Estácio de Sá (UNESA) e Professor Titular da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: [email protected].

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existem práticas excludentes neste contexto, por isso a necessidade em estudar tal objeto com maior afinco. Palavras-chave: Representações sociais. Inclusão Educacional. Exclusão.

Introdução

A Educação Especial passa por diferentes situações em sua trajetória, seguindo o

pensamento instituído em diversos momentos da história. Em seus primórdios, percebe o

indivíduo com deficiência como algo desprezível, tendo como saída mais eficaz o extermínio.

Com o Cristianismo, a pessoa com deficiência passa a ser “cuidada”, pois passam a

reconhecer nesta mais um “filho de Deus”, que precisa de abrigo, cuidados e castigo. Com a

evolução da medicina e as descobertas da ciência, descobre-se que a deficiência tem causas

específicas que necessitam ser tratadas, levando a Educação Especial a atuar como mais um

espaço de produção de saberes sobre o indivíduo “diferente”, descobrindo patologias e

dividindo-se entre o cuidado e a prevenção. Neste sentido, é que observamos o atendimento à

pessoa com deficiência centrado na patologia do indivíduo, o que denominamos modelo

médico, onde o “paciente” não era conhecido por seu nome, mas sim pela “doença que

trazia”. A partir de um entendimento maior, buscando a autonomia desta clientela, o modelo

médico vai sendo aos poucos substituído pelo modelo pedagógico, centrado no indivíduo e

suas possibilidades, promovendo mais independência e a participação efetiva deste na

sociedade, ainda que encontremos a exclusão social como um fenômeno ainda presente em

nossa sociedade.

Assim, é possível perceber a partir de um breve estudo sobre o tema que a educação

especial sofreu ao longo do tempo várias transformações que se devem, principalmente, a

forma como a sociedade historicamente produziu conhecimentos e se comportou com as

pessoas com deficiência. É necessário, portanto, falar de educação especial em seu contexto e

história, a fim de entendermos o que acontece com a pessoa com deficiência desde as

instituições segregadas até as atuais propostas de inclusão na rede regular de ensino.

Um dos fenômenos que acompanha a educação especial em sua trajetória é o

preconceito. Presente na maioria das sociedades, o preconceito é a exacerbação da tendência

cognitiva de estereotipar grupos sociais. O estereótipo não é necessariamente negativo, ele

serve para que possamos, de uma forma econômica, apreender e compreender o mundo a

nossa volta. No entanto, quando sentimentos negativos são direcionados a determinado grupo

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social, dizemos que existe um preconceito sobre esse grupo. O preconceito predispõe ao

comportamento de discriminação. Os processos que hoje refletem no comportamento social e

nas representações sociais que o indivíduo tem da pessoa com deficiência são históricos e

culturais.

A partir da evolução da Educação Especial, tendo como foco as possibilidades da

pessoa com deficiência, surge a inclusão educacional, que se apresenta como um fenômeno

que procura garantir o acesso e a permanência de todo indivíduo na rede regular de ensino,

independente de sua condição física, mental, sensorial e social. Espera-se, através de ações

educacionais inclusivas, alcançar uma sociedade inclusiva de fato, em sentido mais amplo,

onde as pessoas sejam capazes de caminhar juntas, cada uma com suas diferenças e

particularidades. A escola, em uma perspectiva inclusiva, tem o papel fundamental de

ultrapassar o conhecimento científico e os conteúdos escolares, visando desenvolver o aluno

como um todo, através de suas possibilidades e capacidades.

Desta forma, precisa-se imaginar o processo da inclusão educacional em sua

completude, isto é, com o objetivo de garantir os direitos de todos os indivíduos considerados

marginalizados, devido a condição de vida, raça, cor, crença e opção sexual.

A partir daí começamos a desenhar um modelo de escola para todos, ou seja, uma

escola que respeite o ser humano e a diversidade, entendendo que somos diferentes, mas

convivemos juntos para aprendermos uns com os outros, segundo Machado (2001, p.52):

As escolas para todos são escolas inclusivas, em que todos os alunos estudam juntos, em salas de aula do ensino regular. Esses ambientes educativos desafiam as possibilidades de aprendizagem de todos os alunos, e as estratégias de trabalho pedagógico são adequadas às habilidades e às necessidades de todos.

Assim, partindo deste contexto de estudo, é que elegemos a Teoria das Representações

Sociais como aporte teórico para o estudo da relação inclusão/exclusão no ambiente

educacional, a fim de identificar os significados contidos no pensamento social, construídos e

enraizados neste ambiente. Entretanto, as Representações Sociais são conhecimentos

produzidos pelos seres sociais em dado momento histórico, a partir do contato com um

fenômeno carregado de saberes, crenças, valores, julgamentos, scripts, entre outros. Segundo

Rouquette (2003) “a noção de fenômeno social, igualmente: ela cobre tanto a identidade, a

percepção do outro ou as relações interpessoais quanto às relações de poder, história e os

movimentos de massa”. Desta forma, percebe-se que, para que um fenômeno torne-se objeto

de Representações Sociais é necessário tempo para que os seres sociais tenham contato com

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este e construam seus conceitos e impressões sobre o mesmo. De acordo com Madeira (2003)

“Esse processo não se opera no vazio: espacializa e temporaliza o binômio sujeito-objeto, nas

relações mutuamente constitutivas indivíduo-sociedade”. Assim, pode ser considerada uma

teoria desenvolvimentista por evoluir de acordo com o tempo e espaço em que se encontram

os sujeitos envolvidos em determinados grupos. A Teoria das Representações Sociais é uma teoria

que nos permite compreender a dimensão normativa e os processos de transformação dos

conhecimentos partilhados por um dado grupo, acerca da realidade social. O que está em jogo é a

explicação simultânea dos processos de manutenção (resistência) e de transformação das sociedades.

Desta forma, busca-se no presente trabalho a realização de um estudo preliminar, com

o objetivo de investigar a prática de professores quanto à inclusão educacional e suas

particularidades, a partir de estudos que utilizam o aporte teórico-metodológico da Teoria das

Representações sociais, a fim de compreender quais são as crenças construídas, partilhadas e

mantidas no grupo que conduzem esta prática no ambiente educacional. Isto é possível

segundo pesquisas que buscam compreender e analisar os sistemas de significação do

pensamento de certos grupos de professores e como estes estão enraizados, construídos

socialmente e, de que forma orientam práticas, justificando as mesmas.

Assim, para o desenvolvimento da presente proposta foram analisadas 9 pesquisas

publicadas em Anais de Congressos e Jornadas, além de Periódicos, no período entre 2004 e

2012, que investigam as representações sociais de professores do Ensino Fundamental da rede

pública de ensino, com curso superior (na grande maioria Pedagogia), além de professores

especializados, com relação ao fenômeno da Inclusão Educacional.

A partir deste estudo foi possível agrupar as pesquisas em cinco eixos norteadores:

- Representações sociais da Educação Inclusiva: 1 pesquisa;

- Representações sociais do aluno deficiente: 2 pesquisas;

- Representações sociais da Inclusão: 2 pesquisas;

- Representações sociais do professor inclusivo: 2 pesquisas;

- Representações sociais do professor do aluno com necessidades educacionais especiais

(dificuldades de aprendizagem/ hiperatividade): 2 pesquisas.

É neste contexto que o presente trabalho está alicerçado, pois trata da relação entre a

exclusão e a inclusão, suas tensões e demandas sociais, sob o enfoque da Teoria das

Representações sociais, tendo como plano de fundo pesquisa recentes, selecionadas de acordo

com um ponto em comum, a análise do discurso de professores do Ensino Fundamental sobre

inclusão educacional, como veremos em seguida.

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Referencial Teórico

O ambiente educacional e suas peculiaridades foi escolhido como cenário para

elucidar tais pesquisas e, com ele encontra-se a prática docente e sua formação inicial, que por

muitas vezes não conseguiu abordar a heterogeneidade do alunado, mostrando um modelo

para educar alunos ditos “normais”, onde as necessidades específicas deveriam ser

encaminhadas para “os especialistas para tratamento”. Durante muitos anos os cursos de

formação de professores não apresentavam a disciplina de educação especial em sua estrutura

curricular, pois o tempo de formação era de apenas três anos de estudo. Caso o aluno se

interessasse pelo trabalho em educação especial, seria necessário que o mesmo fosse

matriculado por mais um ano, a fim de concluir os chamados estudos adicionais, com

formação para a educação infantil e educação especial.

Com o avanço da discussão sobre inclusão educacional, observa-se a necessidade de

implementar, nos cursos de formação para professores, conteúdos que os ajudem a lidar cm

que vão encontrar em sala de aula. Segundo Diniz (2004):

A elaboração e a implementação de uma política de formação de professores e professoras colocam a necessidade de garantir o seu acesso aos novos conhecimentos e produções, e a reflexão sobre a sua prática profissional. Para isso, torna-se necessário lidar com temas da contemporaneidade que possam trazer novos componentes à prática educativa. (DINIZ, 2004 p.128)

Assim percebemos uma preocupação em atender tais peculiaridades da rede regular de

ensino através de documentos legais que garantem a implementação de políticas, buscando

uma educação de qualidade.

Fala-se a todo o momento em garantir a formação nos conhecimentos didáticos e

pedagógicos presentes no contexto da educação especial, pensando em um sentido inclusivo

da proposta, mas tratando a modalidade como um setor a parte, não inserido no contexto

educacional. Isto porque percebemos que os professores responsáveis pela disciplina de

educação especial, na grande maioria das vezes são professores especializados, participam de

cursos, mas não em sala de aula, passam somente informações teóricas.

Desta forma, continuam reforçando o distanciamento entre educação e educação

especial, como também trabalham a disciplina distante da prática, por não estarem em contato

com o processo. Neste caso é instituído o saber, enquanto o “saber-fazer” não é construído em

consonância com a teoria. Segundo Neusa Hickel (2004),

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analisando a questão do ensino e da aprendizagem das pessoas com deficiência, afirma que essa tarefa exige conhecimento, investigação e uma capacidade de criação de novas práticas, por parte dos professores, para descobrir como esses alunos aprendem. Acrescentamos que há necessidade de uma mudança de lógica: da concepção sobre essa criança como objeto para uma concepção dessa criança como sujeito, por meio da linguagem que opera sobre suas necessidades. (HICKEL, 1995 citado em DINIZ, 2004 p. 121)

Continuamos formando professores detentores de impressões sobre a educação

especial, mas ainda não formamos professores capazes de incluir de fato, pois os próprios

formadores estão distantes desse processo. O ato de incluir irá, certamente, se construir nas

próprias relações estabelecidas em sala de aula, entre o aluno e a escola, e, em última análise,

entre o aluno e a comunidade escolar. Isso requer uma predisposição empática que está para

além da formação em si. Atualmente existe um movimento de normalização da diferença que

prega que todos nós somos diferentes, e que normal é sabe conviver com as diferenças. Diniz

(2004) orienta quanto as dimensões em que a formação docente incide e que faz do professor

peça chave no processo educativo. Diniz nos fala,

há que considerar as duas dimensões da formação docente: a dimensão subjetiva e a dimensão coletiva. A dimensão subjetiva da formação docente tem sido compreendida como uma vertente que problematiza os saberes presentes nas experiências cotidianas e as fundamentações do saber-fazer dos educadores, analisando-as como pressupostos que podem significar novas experiências e vivências. A dimensão coletiva requer uma compreensão da escola como lugar privilegiado de formação, no qual o aspecto coletivo incidirá na forma de produzir as questões apresentadas na prática, o caminho escolhido nas decisões mais rotineiras e nas condições de trabalho. (DINIZ, 2004, p.130-131)

A grande intenção do processo de inclusão é garantir uma escola para todos. No

entanto, as representações sociais acerca da deficiência ainda são marcadas por uma mistura

de conceitos ultrapassados. A segregação provocou um silenciamento acerca dessa temática,

principalmente no que tange a garantia de direitos civis. Atualmente, a sociedade se depara

com um discurso em transformação. As mídias, as leis e os currículos já abordam essas

questões, forçando a produção de novas cognições.

Não podemos negar o avanço alcançado. Hoje se reconhece a profissionalização do

professor pensando também nas pessoas com necessidades educacionais especiais. Conhecer

como os professores e alunos do magistério estão produzindo representações sociais acerca da

inclusão reforça a necessidade de aprender com esses discursos os possíveis entraves e

também os caminhos propostos em prol de uma proposta verdadeiramente inclusiva.

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Entretanto, a relação entre o estudo das representações sociais e o campo educacional

surge do interesse em compreender fenômenos pertences ao campo da educacional e o papel

destes entre os grupos sociais suas práticas e processos. Para entendermos melhor o resultado

desta relação é necessário percebermos que este estudo ultrapassa a compreensão de

fenômenos macroscópicos como relações de pertença, atitudes, comportamentos, entre outros;

por outro lado nos auxilia no desvelamento de dados mais particulares como a construção de

saberes e as relações estabelecidas neste contexto. Isto se dá pela influência que a escola

recebe, até os dias de hoje, de discursos políticos, momentos políticos, diferentes

administrações, diversidade de idéias entre os educadores e a interferência dos diferentes

grupos sociais (comunidade). Segundo Gilly (2001):

As representações sociais, enquanto sistemas autônomos de significações sociais, são fruto de compromissos contraditórios, sob a dupla pressão de fatores ideológicos e de restrições ligadas ao funcionamento efetivo do sistema escolar, e que o peso destas últimas parece tão mais forte que os indivíduos são diretamente afetados ou implicados nas práticas cotidianas. Vê-se então que, face a um a instituição que está longe de realizar nos fatos as mudanças esperadas, os indivíduos se apóiam, para guiar e justificar seus comportamentos, em sistemas representacionais que privilegiam mais freqüentemente elementos e esquemas de forte inércia. (GILLY, 2001)

Isso acontece porque o espaço escolar é tido como berço das relações sociais,

principalmente por ser o segundo contato social da criança depois do grupo familiar. É nele

que o indivíduo cresce cercado de diferentes posições, pensamentos, discursos, práticas e

comportamentos. Assim, encontramos o espaço perfeito para explorar o estudo das

representações sociais, onde pessoas são responsáveis por “formar cidadãos” conscientes de

seus direitos, deveres.

Neste contexto que são travadas as primeiras relações de poder, através da construção

de personalidades opressoras e oprimidas, é que são estabelecidas demarcações entre o que é

“perfeito” aos olhos da comunidade ou o que difere do padrão de normalidade esperado. É

neste cenário que são produzidas as representações sociais, a partir do que nos incomoda nos

forçando a um posicionamento e, consequentemente, a partilhar saberes.

De acordo pesquisadores da Teoria em questão, compreender a representação social

em si não significa apenas entendê-la como o espelho da realidade, mas como afirma Abric

“ela é uma organização significante”, pois “funciona como um sistema de interpretação da

realidade que rege as relações dos indivíduos em seu meio físico e social”, desta relação são

determinados os comportamentos e ações do indivíduo com relação a representação que

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possui de tal objeto. Não podemos justificar estes comportamentos e ações, mas é possível,

através das representações, entendermos algumas atitudes geradas por alguns grupos, como a

dissipação de comportamentos preconceituosos e estereotipados. (MOREIRA citado por

ABRIC,1998, p 28)

Portanto, para conceituarmos a inclusão como objeto de representação social, é

necessário que seja levado em conta o conceito de exclusão e suas nuances, pois o fato de

considerarmos a noção de exclusão como polissêmico, algumas vezes confundida com outros

conceitos (o de marginalização social, por exemplo), não nos impede de conceber esta noção como

sendo útil ao estudo dos fatores simbólicos, presentes em determinadas situações sociais.

Neste sentido é imprescindível que os estudos de representações sociais que tratam de

objetos como a diversidade, educação inclusiva, inclusão educacional, investiguem sobre as

raízes da exclusão segundo o objeto que caracteriza a diferença. Um exemplo são os estudos

sobre a inclusão educacional de pessoas com deficiência, pois estes devem investigar quais as

relações estabelecidas entre a exclusão destes indivíduos e a prática de inclusão, pois o

significado simbólico internalizado por certos grupos pode ser fator determinante na

realização de práticas quanto a esta ação. Entretanto, um primeiro parâmetro que consideramos

útil para a utilização desta noção é o da constatação que não se pode discutir a exclusão sem fazer

referência ao valor social da inclusão; neste sentido somente pode se falar em uma população de

excluídos em referência a uma outra população de incluídos.

Este é um dado importante observado através da análise das presentes pesquisas, pois

o fenômeno da inclusão é estudado, mas sem considerar o valor social da exclusão, ou seja,

não faz menção a uma re-inclusão do indivíduo.

Metodologia

O presente trabalho utiliza como metodologia a análise de pesquisas recentes sobre as

Representações Sociais da Inclusão Educacional, a partir do discurso de professores do

Ensino Fundamental e professores especializados, entre os anos de 2004 e 2012, com o

objetivo de identificar o que é comum no imaginário social destes profissionais, segundo um

tema já discutido no cenário acadêmico, principalmente após a implementação da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9394/96).

A pesquisa teórica realizada de acordo com as pesquisas analisadas pretende elucidar o

fenômeno da inclusão educacional e, até que ponto estas apontam a relação entre a

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inclusão/exclusão no cenário educacional, sob o enfoque da Teoria das Representações

Sociais. Dentre os temas abordados estão a formação de professores, a inclusão educacional e

a exclusão social.

Neste contexto foram analisadas 9 pesquisas sobre as representações sociais de

professores sobre a inclusão educacional, retiradas de periódicos e Anais de Congressos e

Seminários.

Resultado das Pesquisas Analisadas

A partir da investigação sobre as pesquisas analisadas, é possível afirmar que, com

relação aos métodos de coleta a maioria das pesquisas utilizou: testes de livre evocação,

questionários e entrevistas semi-diretivas. Com relação às técnicas de análise os

pesquisadores utilizaram a análise de evocação e análise de conteúdo.

Os resultados das pesquisas analisadas apontam que os professores, apresentam certa

insegurança para o trabalho de inclusão, pois alegam falta de formação (FRAGOSO, 2012),

(TAVEIRA, 2007; MAURÍCIO, 2007), (MACHADO, 2009), declaram esta não ser suficiente

para a prática com o aluno diferente, seja ele pessoa com deficiência ou com necessidades

educacionais especiais.

A representação sobre a inclusão e a educação inclusiva trata da afetividade,

reconhecida nas pesquisas a partir da relação entre o professor-aluno incluído, baseada ainda

em uma visão romantizada onde o amor, a compreensão, a dedicação, o dom, a atenção e o

respeito é o que alicerça o trabalho docente neste sentido (NÓBREGA, 2007; CARVALHO,

2007), (SANTOS, 2008; SILVA, 2008), (MUSIS, 2010; CARVALHO, 2010).

No que diz respeito à prática do professor com o aluno diferente, as pesquisas

mostram a necessidade de informação sobre o trabalho a ser desenvolvido com o aluno e

quanto ao próprio quadro do aluno, reforçando o modelo médico de atendimento à pessoa

com deficiência, no qual tentamos substituir por um modelo pedagógico, visando às

possibilidades e não mais as incapacidades. Outro dado que reforça este quadro é a carência

de apoio técnico especializado para o cuidado com esta clientela, mostrando que é necessário

atendimento especializado como condição sine qua non para o progresso deste aluno

diferente, sem levar em conta a prática pedagógica desenvolvida por este, a partir de seus

próprios recursos em sala de aula regular, que muitas vezes, são espaços riquíssimos de

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interação e aprendizagem (TAVEIRA, 2007; MAURÍCIO, 2007), (CERQUEIRA, 2007;

PINTO, 2007), (MACHADO, 2009).

Conforme observado nos artigos, foram citados alguns termos com freqüência menor,

mas com forte interpretação durante o estudo que justificam alguns comportamentos em

espaços escolares, como falta de condições, perigo para o professor, falta de higiene das

pessoas com deficiência (TAVEIRA, 2007; MAURÍCIO, 2007), (FRAGOSO, 2012),

reforçando a idéia de exclusão em “práticas ditas” de inclusão.

Desta forma, o quadro abaixo mostra a síntese das representações sociais sobre a

inclusão, educação inclusão, deficiente, professor inclusivo e pessoa com necessidades

educacionais especiais, revelando representações sociais comuns aos cinco objetos de estudo,

são eles: amor, dedicação, formação, competência, afetividade, aceitação e apoio técnico.

Considerações finais

O presente trabalho tem como princípio norteador fazer um levantamento prévio sobre

pesquisas realizadas sobre as representações da inclusão, educação inclusiva, do deficiente, do

professor inclusivo e da pessoa com necessidades educacionais especiais, por professores da

rede regular de ensino e professores especializados, que atuam no ensino fundamental da rede

pública de diferentes regiões. A partir deste levantamento foi possível concluir que, mesmo

com formação superior, os professores declaram esta ser insuficiente para o trabalho com

alunos diferentes. Outro dado importante é a falta de apoio e suporte técnico para o trabalho

especializado com os alunos, colocando o modelo médico de atendimento à pessoas com

necessidades específicas em evidência e em situação condicional, pois se o aluno é atendido e

passa por toda uma rede de profissionais consegue êxito, caso contrário, a escola não poderá

resolver o problema dele, culminando em situações de evasão.

É neste contexto também que observa-se um discurso politicamente correto

denominando o respeito à diferenças como um chavão, pois é necessário aceitar o outro, mas

sem compreender qual o real sentido do princípio da normalização, que sobrevive mesmo em

uma sociedade que tem enraizada em suas concepções uma exclusão velada e construída

através dos tempos.

Por outro lado temos como base um princípio bastante utilizado como condição para o

cuidado com a pessoa diferente na Idade Média, “vamos praticar a caridade, mas castigar

quando necessário”, pois são todos filhos de Deus. Assim, percebe-se no discurso dos

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professores ideia de que, para incluir, é necessário amor, doação, afeto, paciência, dom, entre

outros pré-requisitos que continuam reforçando a ideia de exclusão destes indivíduos.

Com relação ao aluno diferente, percebe-se uma caracterização do mesmo, ainda

carregada pela incapacidade, pelo defeito, caracterizado pelo comportamento fora do padrão,

com aprendizagem problemática, mostrando que o profissional responsável por educar este

indivíduo deve ser diferente também, mais dedicado e responsável. Mas, este profissional

mostra em algumas pesquisas que sente-se incapaz também e, que todas as estratégias que

conhece são insuficientes para o trabalho com a inclusão, como suas próprias condições de

vida, como baixos salários, falta de condições de trabalho, fazendo com que estes sejam

fatores que engessam sua prática e que refletem como um espelho suas preocupações e

ansiedades. Entre todos os trabalhos elencados acima, poucos citam a exclusão como fator

preponderante para compreender a inclusão educacional, e em nenhum deles este tema é

desenvolvido como base para o estudo das representações e práticas de inclusão, mas torna-se

e urgente e necessário fazê-lo. Desde a Antiguidade a pessoa diferente foi “eliminada de

alguma forma”, vale só o que é perfeito para o grupo, evoluímos, conhecemos diferentes

realidades, construímos novos conceitos, mas ainda escolhemos quais são os melhores.

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