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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MARTA ALVES DA CRUZ SOUZA INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: UM ESTUDO DE CASO VITÓRIA – ES 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MARTA ALVES DA CRUZ SOUZA

INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: UM ESTUDO DE CASO

VITÓRIA – ES 2007

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MARTA ALVES DA CRUZ SOUZA

INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: UM ESTUDO DE CASO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito para obtenção do grau de Mestre em Educação, com ênfase em Educação Especial: Abordagens e Tendências. Orientadora: Profª Drª Sonia Lopes Victor.

VITÓRIA – ES 2007

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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)

Souza, Marta Alves da Cruz, 1972- S729i Inclusão e avaliação no cotidiano da escola : um estudo de caso /

Marta Alves da Cruz Souza. – 2007. 177 f. : il. Orientadora: Sonia Lopes Victor. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo,

Centro de Educação. 1. Avaliação. 2. Inclusão social. 3. Ambiente escolar. I. Victor, Sonia

Lopes. II. Universidade Federal do Espírito Santo. Centro de Educação. III. Título.

CDU: 37

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MARTA ALVES DA CRUZ SOUZA

INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: UM ESTUDO DE CASO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito para obtenção do grau de Mestre em Educação, com ênfase em Educação Especial: Abordagens e Tendências.

Aprovada em 30 de maio de 2007.

COMISSÃO EXAMINADORA

Profª Doutora Sonia Lopes Victor Universidade Federal do Espírito Santo Orientadora Profª Doutora Denise Meyrelles de Jesus Universidade Federal do Espírito Santo Profª Doutora Janete Magalhães Carvalho Universidade Federal do Espírito Santo Profª Doutora Kátia Regina Moreno Caiado Pontifícia Universidade Católica de Campinas

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Dedico este trabalho a todos aqueles que lutam pelos seus sonhos, tornando-os possíveis.

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AGRADECIMENTO

Agradecer... como tenho que agradecer...

Primeiramente, a Deus e, em segundo lugar a todas as outras pessoas que, sem

grau de hierarquia e/ou merecimento, me ajudaram. Pai, eu te agradeço, pois sem

Tua intervenção com certeza não tinha trilhado nenhum caminho. Obrigada por me

inspirar, me sustentar. A Ti, a minha devoção, pois sei que posso todas as coisas

naquele que me fortalece.

À minha família: na qual nasci e a que escolhi. À minha mãe, pelo exemplo de garra

e vitória, e aos meus irmãos, pelo apoio e torcida. Ao meu marido, Cláudio, e aos

meus filhos, Clauber e Antonio Cláudio, obrigada por me incentivar, me apoiar e por

aceitar minhas ausências. Obrigada, eu amo muito vocês. Agradeço também a

minha sogra, ao meu sogro e cunhados(as) por ficarem na retaguarda, torcendo e

apoiando.

À minha orientadora, Sonia Lopes Victor, pela sua cumplicidade, paciência e

compreensão. Obrigada, aprendi muito com você.

Aos demais professores da banca: Denise Meyrelles de Jesus, Janete Magalhães

Carvalho e Kátia Regina Moreno Caiado obrigada pelo aceite em construir e

desconstruir minha caminhada na busca da construção do conhecimento sobre o

cotidiano da escola.

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À Turma 18, que compartilhou comigo de momentos ímpares na nossa caminhada.

Alguns se tornaram amigos para sempre. Em especial: Dani e Jacy, companheiras

de carona, de discussão e muro de lamentações.

À escola que me acolheu e aceitou minha “intromissão” no seu cotidiano. Obrigada a

todos e a todas e, em especial, as duas professoras que me receberam no seu

espaço de sala de aula.

À professora Alina da Silva Bonella que aceitou o desafio de fazer a correção do

meu português em tempo recorde. Os meus sinceros agradecimentos.

Obrigada também à Secretaria Municipal de Educação de Guarapari (ES), que

possibilitou que eu me ausentasse para poder estudar e refletir, um pouco distante,

mais implicada nas nossas ações voltadas para uma política de inclusão

educacional.

Agradeço a todos e a todas que vibraram comigo a cada etapa vencida no processo

de seleção do mestrado e aguardaram ansiosos(as) por este momento final. Sintam-

se todos e todas abraçados(as).

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A imagem que nos ocorre quando pensamos nesse tema é a de um rio abundante, que corre farto de afluentes, ora turvo, ora límpido, com as famosas pororocas, sempre a desembocar em nossas trajetórias de professoras; o que nos leva muitas vezes a pensar: ‘Tudo acaba desaguando na avaliação, não tem jeito’(FERRAZ; MACEDO, 2003).

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RESUMO

A avaliação da aprendizagem serve como elemento retroalimentador da prática

pedagógica, principalmente quando o cenário educacional é atravessado pelo

movimento de inclusão. A proposta da pesquisa é compreender as práticas

avaliativas cotidianas na escola, tendo como referência as práticas pedagógicas dos

professores e a reflexão sobre a avaliação no processo de inclusão de alunos com

necessidades educacionais especiais. Este trabalho é um estudo de caso do tipo

etnográfico, realizado na Escola Bansalu, que é uma escola de ensino infantil e

fundamental do município de Guarapari. Utiliza, como instrumento de coleta de

dados, a entrevista semi-estruturada, a observação participante e a análise

documental. Dentro da unidade de ensino, as observações aconteceram na sala da

3ª e 4ª séries, onde havia matrícula de um aluno surdo e de dois com deficiência

mental. O estudo retrata que as práticas avaliativas tanto dos alunos com

necessidade educacional como daqueles que não apresentam dificuldade no

processo privilegiavam o produto final do processo de ensinoaprendizagem, em vez

de enfatizar o processo de construção do conhecimento. Pontua que é preciso uma

mudança na concepção de avaliação e uma reflexão sobre as práticas avaliativas

presentes no cotidiano da escola. Discute também a instituição de espaços-tempos

para que a comunidade escolar possa refletir e reavaliar suas concepções e práticas

pedagógicas propicinado uma educação de qualidade numa perspectiva inclusiva.

Palavras-chave: Práticas avaliativas. Inclusão. Cotidiano.

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ABSTRACT

The evaluation of the learning process works as a motivating element of the

pedagogical practice, mainly when the educational scenery is crossed by the

inclusion movement. The research aims at understanding the evaluative every day

practices at the school, having as reference the teachers’ pedagogical practices and

the reflection on the evaluation in the process of inclusion of the students with the

special educational needs. The work is an ethnographic study case, in the Bansalu

School, which is a children and fundamental school of the Guarapari district. It uses

as data collection instrument the semi-structured interview, the participating

observation and the documental analysis. Inside the teaching unit, the observations

took place in the third and forth grade which there was a deaf student and two with

mental deficiency registered. The study shows that the evaluative practices for the

students with educational needs and also for those who do not have any difficulty in

the process, favor the final product of the teaching-learning process, instead of

highlighting the knowledge building process. It points the necessity to change the

evaluation conception and to reflect on the evaluative practices present in the school

every day life. It also discusses the space-time institution so that the school

community can reflect and reevaluate its conceptions and pedagogical practices

providing a quality education in an inclusive perspective.

Keywords: Evaluative practices. Inclusion. Everyday life.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01 - Evolução de matrículas inclusivas na educação especial ................. 48

Figura 02 - Evolução de municípios com matrículas na educação especial ........ 49

Figura 03 - Evolução da política de atendimento na educação especial.............. 49

Figura 04 - Evolução de estabelecimentos inclusivos com educação especial ... 50

Figura 05 - Evolução da política de atendimento na educação especial da

Região Sudeste .................................................................................... 51

Figura 06 - Distribuição de matrículas na educação especial em 2005 .............. 51

Figura 07 - Evolução de funções docentes na educação especial ...................... 52

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LISTA DE SIGLAS

ANPED - Associação Nacional dos Pesquisadores em Educação

APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

CEB - Conselho de Educação Básica

CNE - Câmara Nacional de Educação

ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente

EJA - Educação de Jovens e Adultos

EMEIEF - Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental

ENEM - Exame Nacional de Ensino Médio

GT - Grupo de Trabalho

INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais

MEC - Ministério da Educação

PPGE - Programa de Pós-Graduação em Educação

QI - Quociente de Inteligência

SAEB - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica

SEMED - Secretaria Municipal de Educação de Guarapari

UFES - Universidade Federal do Espírito Santo

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SUMÁRIO

1 PALAVRAS INTRODUTÓRIAS .......................................................................... 14

1.1 O ESTUDO....................................................................................................... 16

2 ANÁLISE DO COTIDIANO: UMA PERSPECTIVA LEFEBVRERIANA ............. 19

2.1 O COTIDIANO E A COTIDIANIDADE.............................................................. 19

2.1.1 As marcas da cotidianidade na escola .......................................................... 22

2.3 O COTIDIANO COMO POSSIBILIDADE DE MUDANÇA ................................ 29

3 INCLUSÃO: ANÁLISE DESSE MOVIMENTO NO COTIDIANO DAS

ESCOLAS .............................................................................................................. 34

3.1 A COTIDIANIDADE DA INCLUSÃO MARCADA PELAS POLÍTICAS

EDUCACIONAIS .................................................................................................... 34

3.2 INCLUSÃO E EXCLUSÃO ............................................................................... 42

3.2.1 Inclusão e diferença .................................................................................... 44

3.3 A INCLUSÃO NO COTIDIANO DAS ESCOLAS .............................................. 48

4 AVALIAÇÃO E INCLUSÃO: CONSTRUINDO CAMINHOS POSSIVEIS........... 59

4.1 AVALIAÇÃO COMO INSTRUMENTO PARA MEDIR O CONHECIMENTO .... 60

4.2 AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO ESPECIAL ....................................................... 65

4.3 PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA ........................... 75

5 COTIDIANO, INCLUSÃO E AVALIAÇÃO: INTRODUZINDO A PESQUISA ..... 82

5.1 A PESQUISA.................................................................................................... 82

5.2. COLETA DE DADOS ...................................................................................... 84

5.2.1 Procedimentos da pesquisa ....................................................................... 86

5.3 O CONTEXTO DA PESQUISA ........................................................................ 90

5.3.1 A cidade de Guarapari ................................................................................ 90

5.3.2 A escola........................................................................................................ 93

5.4 OS SUJEITOS DA PESQUISA ........................................................................ 94

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6 A EDUCAÇÃO ESPECIAL DE GUARAPARI NO MOVIMENTO DE

INCLUSÃO: POLÍTICAS QUE RESSOAM NAS ESCOLAS................................. ..99

6.1 SERVIÇOS DE APOIO..................................................................................... 103

6.2 IDENTIFICAÇÃO E AVALIAÇÃO DOS ALUNOS COM NECESSIDADE

EDUCACIONAL ESPECIAL ....................................................................................105

6.3 OS REBATES DESSA POLÍTICA DENTRO DA ESCOLA BANSALU............. 107

7 INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: REFLEXÕES

SOBRE AS PRÁTICAS AVALIATIVAS NUMA PERSPECTIVA INCLUSIVA ...... 109

7.1 A INCLUSÃO NA ESCOLA BANSALU ............................................................ 110

7.1.1 Incluir quem e onde? .................................................................................. 110

7.1.2 O estar na escola regular e a afirmação de sua identidade..................... 116

7.1.3 A necessidade de apoios para implementar um trabalho voltado para a

inclusão ................................................................................................................ 119

7.1.3.1 O apoio para o aluno surdo ........................................................................ 125

7.2 AS PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NA ESCOLA BANSALU ................................130

7.2.1 O uso do relatório como uma prática avaliativa dos alunos com

necessidade educacional especial .................................................................... 139

7.2.2 A relação da avaliação como retroalimentadora da prática pedagógica 146

7.3 O COTIDIANO DA ESCOLA APONTANDO POSSIBILIDADES...................... 152

8 INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: CONSIDERAÇÕES

FINAIS .................................................................................................................. 158

9 REFERÊNCIAS................................................................................................... 165

APÊNDICES ............................................................................................................174

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1 PALAVRAS INTRODUTÓRIAS

No ano de 2003, fomos convidada a fazer parte da coordenação de Educação

Especial no município de Guarapari – ES e, entre as tarefas que nos eram

delegadas, estava a implantação e implementação das políticas de inclusão no

contexto das escolas municipais.

Enquanto ocupávamos esse espaço, dividido com outras colegas de trabalho,

pudemos presenciar dificuldades em conceber a potencialidade dos sujeitos da

educação especial que estavam matriculados nas escolas. Entre as várias situações

corriqueiras, uma questão nos chamava a atenção ─ a avaliação dos alunos com

necessidades educacionais especiais.

Uma questão que se destacava, nesse ponto, era a avaliação como momento final,

na qual a escola questionava se aquela criança deveria ou não ser aprovada. Para

decidir tal dilema, a escola convocava uma reunião com a equipe da Secretaria

Municipal de Educação (SEMED), os pedagogos da escola, o professor da sala de

recurso e o professor da sala regular. Juntos, ponderávamos sobre os prós e os

contras da aprovação ou reprovação daquela criança.

O que mais nos inquietava era pensar: por que a avaliação dessas crianças era tão

difícil para as escolas? Por que para definir se o desempenho escolar de

determinada criança era satisfatório ou não, dependia de uma congregação que

desse o aval para avançar ou manter esses alunos na mesma série? Parece-nos

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que havia alguns pontos a serem investigados sobre como a avaliação tem sido

usada dentro das escolas. Nesse sentido, nossa proposta de trabalho, quando

entramos para o mestrado, foi tentar compreender como a avaliação tem se

presentificado no cotidiano das escolas, num momento em que as políticas

educacionais têm apontado uma educação inclusiva.

A idéia de estudar o cotidiano se respalda na possibilidade de um olhar microssocial

que contribui para entender como a política de inclusão tem sido concebida nas

instituições escolares e que tipo de avaliação tem sido proposta. Concordamos com

Penin (1989, p. 13), quando ela aponta que “[...] é no âmbito da análise do cotidiano

que podemos melhor entender as ações dos sujeitos que movimentam a escola e

com isso alcançar a natureza dos processos constitutivos da realidade escolar,

tendo em vista a sua transformação”.

Sabemos que refletir sobre e falar da avaliação, numa perspectiva de educação

inclusiva, é uma atitude muito complexa, porque tal discussão faz parte do estudo

das dimensões pedagógicas que irão compreender e implementar as condições

possíveis e necessárias para as chamadas escolas inclusivas.

Nesse sentido, o nosso objeto de estudo, que é a avaliação na perspectiva da

educação inclusiva, não está fragmentado ou descolado desse propósito, mas

permeando ou perpassando todo o projeto de inclusão para/da escola regular, o que

nos faz querer compreender as práticas de avaliação cotidianas na escola,

tendo como referência as práticas pedagógicas dos professores e a reflexão

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sobre a avaliação no processo de inclusão de alunos com necessidades

educacionais especiais.

1.1 O ESTUDO

Neste estudo, acreditamos que a avaliação possa ser vista como retroalimentadora

das práticas pedagógicas dos professores e professoras, podendo servir como

dispositivo para a implementação de ações pedagógicas que favoreçam a

aprendizagem de todos, inclusive daqueles alunos com algum tipo de deficiência.

Nesse contexto, nosso olhar, neste estudo de caso, se pauta em dois pontos. O

primeiro remete-se a perceber como a inclusão é vivenciada no cotidiano de uma

escola de ensino fundamental de Guarapari (ES). Essa análise permitirá

compreender como a inclusão é vivida nesse cotidiano, observando se ela é

representada, apropriando-nos dos termos de Lefebvre, como obra1 ou como

produto.

O segundo ponto é compreender como a avaliação é concebida2 e vivida no

cotidiano da escola. É perceber qual a concepção da avaliação, observando como

ela se presentifica nesse cotidiano e que ações são tomadas a partir do ato

avaliativo.

1 Lefebvre (1991) usa os termos obras e produtos para distinguir as ações no cotidiano. Para ele, as obras são úncias e os produtos são cópias, repetições no cotidiano programado. 2 Lefebvre (apud PENIN, 1986) usa o termo concebido para designar o contexto teórico de uma época, entretanto ele faz uma relação dialética entre o vivido e o concebido, colocando que o concebido tem origem no vivido.

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É nosso interesse perceber como são as práticas avaliativas no cotidiano escolar,

considerando-as não só no concebido, ou seja, a partir das concepções dos

professores sobre o que é avaliação, mas também no vivido, como elas são

representadas no cotidiano escolar, principalmente no que tange à avaliação de

alunos com necessidades educacionais especiais.

Nesse sentido, o primeiro capítulo aborda o cotidiano, percebendo-o a partir do

referencial de Lefebvre, que o aponta como um lugar de imprevisibilidade, no qual as

coisas não se repetem, porque há um processo dialético na sua gênese. Entretanto

o autor afirma que esse cotidiano pode ser marcado pela cotidianidade, porque

prima pela fragmentação, pela hierarquia e pela homogeneidade. Essas

características estão presentificadas no cotidiano da escola que o torna um espaço

voltado para práticas homogêneas.

No segundo capítulo, discutimos sobre o movimento da inclusão, como um fato

mundial, instituído por políticas neoliberais que redundam em reformas educacionais

que programam o cotidiano escolar. No entanto, apesar do aspecto neoliberal, é um

princípio de respeito à diferença, de respeito à alteridade e que, conseqüentemente,

rompe com o paradigma da igualdade. Nesse sentido, a escola precisa ir além da

programação e constituir uma prática inclusiva dentro do cotidiano escolar.

O terceiro capítulo aponta a avaliação como um dispositivo que pode servir tanto

para incluir como para excluir. Na análise, percebemos que, historicamente, a

avaliação tem servido para a exclusão, mas, num momento em que se abre para a

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inclusão, acreditamos que esta precisa estar articulada às práticas pedagógicas para

ser de fato inclusiva.

Nesse contexto, o quarto capítulo aborda a metodologia usada para conseguirmos

compreender se as práticas de avaliação, no cotidiano da escola, estão contribuindo

para a efetivação de uma inclusão.

Já no quinto e sexto capítulo, relatamos nossas experiências no contexto da escola,

vivenciando um cotidiano que luta, que resiste contra a cotidianidade e acaba se

estabelecendo como obra, porque busca a construção de uma prática pedagógica

avaliativa dentro de uma inclusão nos limites possíveis. No sétimo, colocamos

nossas considerações sobre o estudo de caso no cotidiano da escola.

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2 ANÁLISE DO COTIDIANO ESCOLAR NUMA PERSPECTIVA

LEFEBVRERIANA

2.1 O COTIDIANO E A COTIDIANIDADE

O cotidiano é um espaço definido no senso comum como representação do dia-a-

dia. Quando pensamos em cotidiano escolar, pensamos num espaço onde convivem

alunos(as), professoras(es), merendeiras, serventes, pais e mães de alunos,

diretor(es), pedagogos(as), quadro, carteiras, salas, banheiros, quadra, livros,

cadernos, planos de aula, enfim, pensamos em pessoas que passam algum tempo

nesse espaço e em objetos que ajudam a compor esse cenário.

Quando pensamos na dinâmica desse cotidiano, pensamos em alunos e

funcionários chegando próximos ao horário determinado (ou, às vezes, bem antes

ou bem depois); a rotina da oração, da música, dos avisos que antecedem a entrada

na sala; a fila de alunos puxadas pela professora conduzindo-os ao interior das

classes; o início das aulas, marcado pela escrita do cabeçalho no quadro e as

crianças copiando o que a professora escreve; a distribuição da grade curricular

sendo sempre, antes do recreio, uma disciplina e, após o recreio outra

(principalmente em turmas do ensino fundamental de 1ª a 4ª e educação infantil).

Esse seria o cotidiano escolar que muitos professores ou ex-alunos descreveriam.

Um cotidiano marcado pela repetição, como se as coisas fossem sempre da mesma

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forma. Nesse cotidiano, existe um padrão de aluno, um padrão de sala, um padrão

de professor. Nesse cotidiano homogêneo, não há espaço para as diferenças, para

o novo.

Esteban (2001, p.1), falando dessa perspectiva de cotidiano, descreve-o como uma

palavra que lembra rotina e que pode ser descrito como aquele que é

[...] conhecido, o que se repete, o pequeno elemento que permite que tudo o que vem depois seja previsto [...]. Previsão que quase sempre se confirma, confirmando, por sua vez, o saber que a embasa. Saber que permite antever, rever, refazer, repetir. Saber com sabor de já visto, já vivido, já sentido, já conquistado. Saber que leva a ver de novo e a não ver o novo. Saber que perdeu o jeito maravilhado que por certo teve um dia. O cotidiano é o tempo/espaço da previsibilidade (grifo nosso).

Mas o que é o cotidiano? Será esse espaço que se repete como se as coisas

sempre fossem iguais, da mesma forma, como se não houvesse nada de novo que

nos surpreendesse....

Nas letras da poesia “O relógio”, que parece brincadeira de criança, o poeta Vinicius

de Moraes expressa as nuances do cotidiano concebido e vivido nos diversos

contextos sociais.

Passa, tempo, tic-tac Tic-tac, passa, hora Chega logo, tic-tac Tic-tac, e vai-te embora Passa, tempo Bem depressa Não atrasa Não demora Que já estou Muito cansado Já perdi Toda a alegria

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De fazer Meu tic-tac Dia e noite Noite e dia Tic-tac Tic-tac Tic-tac . . .

Percebemos um cotidiano marcado e ritmado pelo tempo Chronós, que se repete...

repete... e repete... como se fossem duplicações previsíveis, cíclicas, daquilo que vai

ocorrendo dia a dia. Um tempo marcado pelas certezas, pela aparente

homogeneidade.

Na concepção de cotidiano como espaçotempo da previsibilidade, como aquele que

não surpreende e que está sempre previsível, constrói-se um olhar calcificado como

se as coisas fossem programadas para acontecer.

Lefebvre (1991) argumenta que esse cotidiano, entendido como aquele que se

repete, não é concebido, por ele, como cotidiano. O autor denomina de cotidianidade

esse cotidiano fragmentado, programado, que parece sempre a mesma coisa.

Em sua análise sobre o cotidiano, Lefebvre (1991) coloca que o termo cotidiano só é

introduzido na sociedade, a partir do século XX, com a entrada do capitalismo, que

faz com que a vida cotidiana3 seja invertida, baseada na produção, no acúmulo de

bens.

3 Antes do capitalismo, não havia o termo cotidiano e sim vida cotidiana que, após a instauração e implantação do capitalismo, passa a ter uma inversão nos hábitos e comportamentos sociais. As atividades que eram produzidas por necessidades passam agora a ser realizadas de modo repetitivo para acúmulo de bens. Os estilos de um povo passam a ser denominados cultura, dividida entre cultura de massa e alta cultura. Nesses termos, o capitalismo, junto com a modernidade, instaura a época da homogeneidade e da hierarquização dos fatos.

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Nesse contexto, a modernidade é marcada pela técnica, pelo trabalho e pela

linguagem. Ele coloca que esse período sofreu uma crise que cessou por volta de

1980 e passa, a partir dessa data, a ser designado como Modernismo. Nessa fase, o

cotidiano passa a ser o objeto de programação, controlado pela mídia, pelo

marketing e dá-se a instalação e consolidação da cotidianidade que cristaliza o

cotidiano. Penin (1989, p.19) coloca que, para Lefebvre, a “[...] cotidianidade insiste

sobre o homogêneo, sobre o repetitivo, sobre o fragmentário”.

Esta cotidianidade é percebida pela homogeneidade dos tempos cotidianos onde a medida abstrata do tempo, e não dos ciclos e ritmos naturais, comanda a prática social; pela fragmentação dos tempos cotidianos em que descontinuidades brutais destroem os ciclos e ritmos naturais à medida que obedecem à linearidade dos processos de medida e que dividem as atividades segundo uma ordenação geral decretada do alto; pela hierarquização dos tempos cotidianos onde a desigualdade de situações e instantes recebem designação de importantes ou desprezíveis, segundo avaliações mal justificadas (LEFEBVRE, apud PENIN, p. 22, grifo nosso).

Essas marcas da cotidianidade: homogeneidade, fragmentação e hierarquia, podem

ser percebidas em todos os campos sociais, inclusive no campo da educação, de

modo geral, como também no campo da educação especial. Tais marcas são tão

programadas que parecem difícil romper com tais ideologias.

2.1.1 As marcas da cotidianidade na escola

A cotidianidade marca o cotidiano da escola. Segundo Penin (1989), a programação,

na instituição escolar se deu pela implantação do tecnicismo que se tornou

tendência pedagógica a partir da década de 70. Uma das conseqüências disso foi a

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especialização: pedagogos, professores especialistas, psicopedagos, psicólogos,

etc. Outra conseqüência foi a hierarquização na qual o saber técnico sobrepuja o

saber prático, contribuindo para uma alienação e uma heteronomia do fazer

pedagógico. Nesse contexto, ao professor cabia o papel de executor.

Roldão (2001, p.127) coloca que a organização estrutural da instituição escolar, que

se constituiu historicamente como responsável pela garantia da apropriação do

conhecimento, permanece, ao longo do tempo, concebida pelos princípios de “[...]

homogeneidade, segmentação, seqüencialidade e conformidade”.

Por sua vez, Ferraço (2000) aponta que esses princípios também se encontram na

estrutura didático-pedagógica no cotidiano da escola, fazendo com que algumas

práticas acabem se institucionalizando e se consolidando como algo inconcebível de

mudança.

Segundo ele, as disciplinas se regulam pelo princípio de compartimentalização do

conhecimento, estabelecendo fronteiras entre o que pertence a uma e o que

pertence à outra. A prática de seriação que encaixa os alunos no padrão série/idade

consolida os princípios de hierarquização e linearidade como se o conhecimento

pudesse caber em espaços programados e lineares. A determinação do ano letivo,

expressada na figura do calendário, tenta sistematizar uma visão determinista de

tempo que regula o processo de ensino-aprendizagem.

A avaliação, que é vista como sinônimo de prova, pauta-se pela precisão e é

associada ao rigor matemático e à quantificação. A estrutura-física da instituição

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busca garantir uma organização de tempo e espaço em função dos comportamentos

e atitudes desejadas. Nesse sentido, as carteiras são enfileiradas, uma após a outra,

para evitar conversas; a mesa da professora é localizada num espaço onde ela pode

ter o controle de quem entra e saí da sala de aula.

Um outro ponto que Ferraço (2002) analisa é a dinâmica da própria aula que é

assumida como elemento pontual, regulador e de controle, delimitada no tempo e no

espaço, seguindo uma ordem com começo, meio e fim. Nessa mesma lógica de se

pensar a aula como um elemento pontual, ele aponta as atividades, os materiais e

recursos didáticos tendo um fim em si mesmos. O currículo prescritivo é concebido

tanto como um elemento desencadeador, assim como a síntese do processo de

escolarização que visa a assegurar a coerência e a uniformização de todos os

elementos anteriores.

Essas estruturas didático-pedagógicas, pensadas pelos princípios da

homogeneidade, segmentação e hierarquização, acabam calcificando o olhar e

favorecendo uma visão do cotidiano escolar, como se fosse fragmentado e tendo

como metáfora os ponteiros do relógio que se repetem cadenciando o tempo, o

espaço e as ações.

Ferraço (2002, p. 91, grifo do autor) coloca que “[...] o paradigma cartesiano nos

ensinou a pensar no mundo como um cosmos mecânico, um universo relógio, com

peças fixas e movimentos previsíveis, num tempo/espaço absoluto”.

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Nesse sentido, passamos a perceber um cotidiano como se fosse instituído, no qual

existem poucas possibilidades de mudanças. Não se percebe: a complexidade

desse cotidiano, as diferentes possibilidades do ato pedagógico, as diferentes ações

inventadas a partir da inserção no cotidiano, os diferentes sujeitos que se encontram

naquele espaço e que a cada dia são modificados e modificam o cotidiano.

As marcas da cotidianidade – fragmentação, hierarquização e homogeneidade –

tentam programar um cotidiano que robotiza a ação, tornam indiferente o olhar sobre

o cotidiano, como se nada de novo, de inusitado pudesse acontecer e causar

estranhamento.

A idéia de homogeneidade no campo da educação permite a possibilidade de

enquadrar os fatos e as pessoas dentro de um campo semântico que pudesse ser

estudado, visto, apreciado, que possibilite tirar conclusões e generalizações. Criam-

se, a partir daí, estilos: de escolas, de alunos, de formas de ensinar e aprender.

Criam-se tempos-padrão nos quais todos precisam ser enquadrados, e quem não se

encaixa é considerado fora do padrão, da norma.

Essa lógica, segundo Garcia (2000), é pautada dentro do modelo de Parmênides,

que explica a diversidade a partir da unidade. Tudo que não se encaixa nesse

modelo é colocado no âmbito do errado, do anormal, do não-ser. É a lógica

darwiniana que acaba impregnando o olhar e a prática pedagógica da sala de aula

exaltando os bons e condenando à repetência, ao fracasso aqueles que não são tão

bons.

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A premissa da homogeneidade contribui para a uma visão excludente da escola e

ganha força a partir de alguns estudos produzidos pela Psicologia, que colaboram

com essa perspectiva descrevendo, normatizando e caracterizando as formas

igualitárias de aprender, de ser e de se comportar. A tendência, diante desse fato, é

ver as dificuldades como características pessoais. Entretanto essa atitude, apesar

de pontuar a heterogeneidade, acirra ainda mais o discurso de uma falsa

homogeneidade dentro da sala de aula, separando aqueles que mais se diferenciam

em tempos e ritmos de aprendizagem.

Garcia e Alves (2002, p.86), analisando esse cotidiano previsível da escola, apontam

que o que faz a escola se organizar da forma como ela está hoje é decorrente de

quatro processos dominantes: a pedagogização do conhecimento (baseada em

Varela); a grupalização (baseada em Popkewitz); a hierarquização; e a

centralização.

Na pedagogização do conhecimento, a premissa se baseia em acreditar que alguns

conhecimentos são autorizados a entrar na escola e a serem ensinados. A decisão

era pautada “[...] buscando o que era conveniente ou não aos que iam aprender,

decidido a partir de critérios exteriores a eles próprios e a partir da autoridade de

alguém que se considerava e era reconhecido em posição de fazer escolha”

(GARCIA; ALVES, 2002, p.86).

Dessa forma, pode-se inferir que os conhecimentos que não eram autorizados a

adentrar ao ambiente escolar podiam ser considerados saberes inúteis, ou sejam,

saberes do cotidiano, que podiam ser apreendidos em qualquer lugar.

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Para dar conta desse cabedal de saberes, foi preciso selecionar e fragmentar os

saberes. “Estes, ao serem escolhidos e incorporados à escola, eram retirados de

seu contexto, o que obrigava ao fracionamento, já que nem tudo podia ser dado no

espaço/tempo escolar” (GARCIA; ALVES, 2002, p. 86). Era preciso, segundo as

autoras, organizar os conteúdos criando uma seqüência que parecesse natural, que

desse um ar de normalidade e que legitimasse a passagem de um assunto para o

outro. Aliada a esse processo, estava a disciplinarização com conotações

diferenciadas: uma como parte específica do conhecimento e outra como controle do

corpo e da mente.

No processo de grupalização da sociedade, os grupos foram formados sob a ótica

dos dominantes e estes eram sempre genéricos e no masculino. Sob esse aspecto,

as autoras Garcia e Alves (2002, p. 88) colocam

Este processo foi possível pelo desenvolvimento da idéia de que os específicos e as diferenças existentes entre os variados exemplares não tinham interesse e que para se dar uma ‘idéia geral’ da sociedade era preciso a realização de somas e divisões que permitissem chegar a ‘médias’ que, na verdade, não existem, ou dito de outras formas, são mera abstração. Ou seja, foram criados conjuntos ‘naturais’, frutos de abstrações, para representar uma realidade que não existe nesses conjuntos. Reducionismos que escondem a complexidade impossível de captar, melhor dizendo, de capturar. Para que isto acontecesse de maneira tão geral como se deu, foi necessário desligar cada indivíduo, cada ser humano dos seus múltiplos contextos cotidianos reais e diversos, e criar um outro espaço/tempo abstrato que passou a ser dito/visto/percebido/sentido como real. Este lugar criado foi apropriado e marcado pelos poderosos que passaram, também eles, a agir como se esse fosse o único lugar existente (grifo das autoras).

Nesse contexto, surgem as turmas, os alunos, as séries, as avaliações para

mudanças de níveis, os graus de ensino, as classificações, os rótulos, enfim, o

cotidiano passa a ser visto como a metáfora do relógio, que se repete, sempre da

mesma forma e no mesmo tempo.

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Passa-se a ver e entender o processo pedagógico, a partir dos grupos que ‘sabem’ e dos que ‘não sabem’, dos que ‘podem passar de ano’ e dos que devem ser reprovados e ‘repetir’, dos que ‘ficam na escola’ e dos que ‘dela se evadem ou são expulsos’, dos ‘normais’ e dos ‘excepcionais’, dos que ‘entendem tudo’ e dos que ‘não conseguem compreender nada’, dos ‘quietinhos’ e dos ‘bagunceiros’ (GARCIA; ALVES, 2002, p. 90, grifo das autoras).

Garcia e Alves, ainda descrevendo os processos pelos quais as escolas se

organizam da forma tal como é hoje, discorrem que, atrelado aos dois processos já

discorridos — grupalização e pedagogização do conhecimento — está a hierarquia

dos saberes na qual se justifica por que determinados conhecimentos são mais

importantes do que outros. Nesse contexto, legitima-se, por exemplo, por que a

disciplina de Matemática e Português têm uma carga horária maior que Geografia e

Educação Física ou, mesmo, por que a disciplina de Matemática reprova mais do

que História e esta reprova mais do que Artes.

O quarto processo é a centralização, que visa a uma proposta de unificação

curricular, de um currículo nacional para todos. Esse processo de centralização faz

parte do projeto neoliberal que iguala para classificar.

Esses processos, descritos neste trecho e arrolados por Garcia e Alves (2002),

apontam que existe uma cotidianidade no contexto da escola que estabelece

quando, como e de que forma fazer, dando a impressão de uma falsa igualdade.

Essa programação não percebe as peculiaridades de cada cotidiano, de cada

contexto e acabam igualando práticas pedagógicas, modos de olhar e perceber o

aluno sem considerar as diferenças de cada um.

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Entretanto Lefebvre (1991) esclarece que, nessa cotidianidade, podemos encontrar

formas de superação, formas de olhar diferenciadas que possibilitam a construção

de obras e não de produtos, que possibilitam a cada cotidiano criar, reinventar e

viver, superando os desafios e encontrando novas possibilidades de todos se

apropriarem do conhecimento.

2.2 O COTIDIANO COMO POSSIBILIDADE DE MUDANÇA

Analisando o cotidiano das escolas, podemos perceber que os princípios que regem

a prática pedagógica são pautados pelas características da cotidianidade. Esta, que

é o cotidiano programado, tende a se fechar, porém, numa relação dialética.

Entretanto, esse mesmo cotidiano pode ter movimentos de resistências que rompem

com a programação homogênea de modo a transformar a cotidianidade em um

cotididiano imprevisível.

Lefebvre (1991) coloca que é no cerne da cotidianidade que podemos propor

mudanças. Nesse sentido, acreditamos que precisamos olhá-la de forma

diferenciada, para poder romper com a programação que a faz produzir e

(re)produzir da mesma forma. Precisamos, por meio do coletivo, transformar as

ações dessa cotidianidade em obras, pois a programação intensa do cotidiano fez

com que os agentes parassem de produzi-las, para produzir produtos que são

entendidos como cópias, repetições.

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A obra pode ser entendida como uma possibilidade de se fazer, viver, conviver

nesse cotidiano sem ser capturada pela cotidianidade. As obras, para Lefebvre, são

as produções das atividades humanas que surgem da necessidade cotidiana. Sendo

assim, elas são criativas, têm estilo e são únicas, porque partem de um determinado

contexto. Isso é possível porque Lefebvre não separa dos atores sociais a

construção do conhecimento. Nesse sentido, as concepções, as atividades, as

idéias e as criações dos professores significam a “criação de uma obra”, pois são

únicas, pertencentes àquele cotidiano (LEFEBVRE, apud BRZEZINSKI, 2001, p. 70).

Já os produtos podem ser entendidos quando realizamos ações sem refletir para

que e por que estamos fazendo dessa forma e não de outra, o que pode ser

resumido em fazermos pelo simples fato de que todo mundo está fazendo, pelo

simples modismo.

Podemos associar o conceito de obra de Lefebvre à idéia de configuração de

Norbert Elias (1980). Segundo esse autor (apud GONSALVES, 2004, p. 22), “[...]

configuração seria, portanto, uma abrangência relacional, o modo de existência do

ser social e a possibilidade conceitual de aproximação às emergências do cotidiano”.

Seriam as respostas dadas aos desafios que acontecem no dia-a-dia, pelos sujeitos

ou pelos jogadores daquele contexto. Isso significa que não há repetição desse

evento, pois essa configuração, ou esse jogo,4 é uma combinação provisória e

dinâmica das relações daquele grupo.

4 Norbert Elias (1980 apud GONSALVES, 2004, p.21) usa o termo jogo como um conceito interligado ao de configuração. Segundo ele, o “[...] jogo é um sistema de interdependência complexo que serve para pensar [...] os grupos humanos, é um ‘padrão’ mutável que compreende o conjunto criado pelos jogadores nas relações com os outros”.

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Essa combinação provisória não parte de leis preestabelecidas, já concebidas

teoricamente, mas sim de uma relação dialética entre o vivido e o concebido. Dessa

forma, tanto o vivido como o concebido estão articulados dialeticamente, e religa-se,

no espaço escolar, a teoria com a prática e esta com a teoria. O vivido “[...] é

formado tanto pela vivência da subjetividade dos sujeitos quanto pela vivência social

e coletiva dos sujeitos num contexto específico” (PENIN, 1989, p. 27). Segundo a

mesma autora, Lefebvre não contempla essa vivência como algo singular, individual,

porque, para ele, as relações sociais são vivenciadas antes de serem concebidas,

percebendo, assim, a própria teoria do conhecimento como história da prática social.

Nesse sentido, a cotidianidade pode ser superada e o cotidiano passa a ser um

espaço imprevisível no qual as configurações dos sujeitos/jogadores são

constituídas em obras. Entretanto essa imprevisibilidade não significa a inexistência

de espaços previsíveis, mas é um cotidiano que “[...] sendo lugar da previsão, da

repetição, do saber, é também seu oposto. Sempre igual e sempre diferente, o

mesmo e o múltiplo, a simplicidade e a complexidade: oposições que dialogam no

cotidiano. Assim é o cotidiano: tempo/espaço em que a vida se realiza” (ESTEBAN,

2000, p. 5).

Sendo assim, dentro do cotidiano escolar, podemos perceber as práticas

pedagógicas, os alunos, o caos e a ordem, as práticas de avaliações, o movimento

de inclusão, enfim todas as coisas que acontecem e/ou deixam de acontecer como

frutos da configuração/ da obra/ do jogo/ daquilo que é vivido e concebido pelos

atores sociais daquele grupo.

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A possibilidade de vermos o cotidiano como passível de

mudança/transformação/modificação/superação é possível porque Lefebvre enfatiza

o cotidiano como um espaço no qual se concretizam “[...] as transformações através

da ação do homem ativo, criativo e prático que ao mesmo tempo se transforma e

provoca transformações” (BRZEZINSKI, 2001, p.70).

Dessa forma, podemos romper com a cotidianidade, com o previsível, com o que

está pronto e acabado. Alves (2002), falando das múltiplas possibilidades desse

cotidiano, refere-se aos momentos de luta/ de conquista/ de superação.

Ser, assim, capaz de revoltar em mim o que está pronto e acabado, ganhando força (prática-teoria-prática) para organizar os argumentos de apoio à vida na sua passagem cotidiana, nos múltiplos combates que devo travar, tentando superar cada vez mais a tão difícil cotidianidade (LEFEBVRE,1991) que leva tantos a entregarem os pontos porque nada mais pode se fazer. Percebendo e vivendo acontecimentos nos múltiplos cotidianos em que vivo, ser capaz de buscar aproximar os conhecimentos criados em cada um, traçando analogias que melhor me permitam compreender o cotidiano vivido nas escolas para ser capaz de trançar melhor as redes necessárias ao entender (ALVES, 2002, p. 24).

É esse cotidiano que queremos abordar no nosso olhar de pesquisadora. Um

cotidiano que não é engessado pela cotidianidade, pois com a ação coletiva dos

atores sociais, pode ser modificado. É nesse cotidiano que acreditamos que pode

haver uma educação que atenda às necessidades educacionais de todos os alunos

dentro da escola.

Nesse contexto, quando pensamos no movimento de inclusão no cotidiano das

escolas, remetemos nosso pensamento a um espaçotempo no qual às pessoas da

instituição de ensino consideram o cotidiano como algo imprevisível e, sendo assim,

colocam-se numa perspectiva de busca constante de fazer e refazer as práticas

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pedagógicas baseadas numa avaliação investigativa que possibilita uma mudança

do e no cotidiano, porque é desse e nele “[...] que emergem as grandes decisões e

os instantes dramáticos de decisão e ação” (LEFEBVRE, apud PENIN, 1989, p.16).

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3 INCLUSÃO: ANÁLISE DESSE MOVIMENTO NO COTIDIANO DAS

ESCOLAS

3.1 A COTIDIANIDADE DA INCLUSÃO MARCADA PELAS POLÍTICAS

EDUCACIONAIS

O termo inclusão vem ganhando força e visibilidade a partir da década de 90.

Entretanto suas premissas originam-se desde o período pós-guerra, quando é

ressaltada a questão dos direitos iguais. Ela pode ser compreendida por dois vieses:

como um direito constituído por conta da democracia e como uma conquista que

ocorre devido aos movimentos de resistência à exclusão social.

É um movimento que está atrelado à construção de uma sociedade democrática e

pode ser encarado como um “[...] movimento de resistência contra a exclusão social,

que historicamente vem afetando grupos minoritários que visam à conquista do

exercício do direito ao acesso a recursos e serviços da sociedade” (MENDES, 2002,

p.61).

Gentili (1998) aponta que, “[...] na ótica neoliberal o Estado foi incapaz de assegurar

a democratização mediante o acesso das massas às instituições educacionais e, ao

mesmo tempo, a eficiência produtiva que deve caracterizar as práticas pedagógicas

nas escolas de qualidade”.

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Nesse contexto, algumas políticas5 foram traçadas com o intuito de prever

programas de estabilização e reformas econômicas para minimizar tal situação.

Sendo assim, várias reuniões foram agendadas com o objetivo de homogeneizar

uma política mundial de inclusão.

Dentre essas reuniões, destacam-se: a Convenção dos Direitos da Criança (Nova

York, 1989); a Conferência Mundial de Educação para Todos (Jontiem, Tailândia,

1990); a Conferência Mundial sobre “Necessidades Educativas Especiais”

(Salamanca – Espanha, 1994); e o Fórum Consultivo Internacional para a Educação

para Todos (Dakar – Senegal, 2000).

Todas essas reuniões apontam o direito de todos a uma educação e à valorização

da diferença. Bueno (2005, p. 36) ressalta que a Declararação de Salamanca, que é

um dos motes da inclusão, reconhece que

[...] as políticas educacionais de todo o mundo fracassam no sentido de estender a todas as crianças a educação obrigatória e de que é preciso modificar tanto as políticas quanto as práticas escolares sedimentadas na perspectiva da homogeneidade.

Sendo assim, “[...] no campo da educação, a inclusão envolve um processo de

reformas e de reestruturação das escolas como um todo, com o objetivo de

assegurar que todos os alunos possam ter acesso a todas as gamas de

5 Uma dessas políticas pode ser expressa pelo Consenso de Washington que segue recomendações do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional.

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oportunidades educacionais e sociais oferecidas pela escola” (MITTLER, 2003, p.

25).

As políticas educacionais do Brasil também entraram nessa perspectiva. A

legislação brasileira (leis, decretos e resoluções) aponta a matrícula de modo

preferencial dos alunos com necessidades educacionais especiais na rede regular

de ensino, assim como instrumentalizam a luta contra a discriminação e indicam

perspectivas para o atendimento educacional desses alunos, de modo que eles

possam ter acesso a uma educação de qualidade.

Nessa linha, temos o art. 208 da Constituição Federal de 1988; o Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA), promulgado em 1990; a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional (9394/96) que, além de prever a matrícula nas escolas

regulares, apresenta um capítulo deliberando sobre a educação especial no âmbito

nacional; o Decreto nº 3.928/1999,6 que legisla sobre uma Política Nacional para a

Integração da pessoa portadora de deficiência;7 a Lei nº 10.172/01, que aprova o

Plano Nacional de Educação e que, entre as ações, estabelece

normas/regras/princípios para a educação especial; o Decreto nº 3.956/01, que

corrobora o que ficou estabelecido na Convenção Interamericana para Eliminação

de todas as formas de discriminação contra as pessoas com deficiência; e a

Resolução CNE/CEB nº 02/2001, que estabelece as Diretrizes Nacionais para a

Educação Especial na Educação Básica.

6 Esse decreto tem como princípio a ação conjunta do Estado e da sociedade civil para garantir os direitos constitucionais das pessoas com deficiência, inclusive no campo educacional. 7.O termo portador apresenta uma denotação de que as pessoas com deficiência podem deixar de tê-las a qualquer momento, por isso a expressão “politicamente correta” seria pessoas com deficiência. No entanto escrevemos o título da legislação tal como ele é descrito.

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Além desses documentos legislativos, o Ministério da Educação (MEC) organizou, a

partir de 2000, uma série de documentos que visam a nortear a prática educacional

para alunos com necessidades educacionais especiais. Entre esses documentos,

podemos citar:

2000

• O Projeto Escola Viva, é composto por duas coletâneas de cartilhas, uma

amarela e outra azul, acompanhadas de vídeo para servir de formação inicial

e continuada dos professores.

2002

• Portal de ajuda técnica para a educação: equipamentos e material

pedagógico. Este documento, elaborado por Manzini e Santos, tinha como

objetivo apoiar a escola e os professores no sentido de contribuir com

sugestões para a prática pedagógica e para a capacitação e recreação de

alunos com deficiência física.

• Estratégias e orientações para a educação de alunos com dificuldades de

aprendizagem associadas às condutas típicas. É um documento que procura

identificar o aluno com essa deficiência apresentando formas de atendimento,

o currículo, a avaliação e a terminalidade específica.

• O livro Avaliação das necessidades educacionais dos alunos, que é um

documento que visa a discutir a questão da avaliação dos alunos e aponta

uma avaliação pedagógica como ponto-chave para a identificação dos alunos

com necessidades. Este documento passou a fazer parte da coletânea de

livros da coleção saberes e práticas.

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2004

• Saberes e prática da educação infantil

• Saberes e prática do ensino fundamental.

Esses documentos são compostos de nove livros em cada coleção e fazem parte

da proposta de formação inicial e continuada dos profissionais da escola. Implica

uma base sobre a inclusão e vários conhecimentos sobre os diferentes tipos de

deficiência.

• Direito à educação: subsídios para a gestão dos sistemas educacionais. Este

é um documento que traz orientações sobre a educação inclusiva, dados

estatísticos e apresenta os principais marcos legais.

• Referências para a construção dos sistemas educacionais inclusivos.

Apresenta quatro documentos com indicadores para que os sistemas

educacionais e o município possam avaliar suas ações em prol da inclusão.

2005

• Ensaios pedagógicos: construindo escolas inclusivas. Este documento é uma

coletânea de textos escrita por pesquisadores e profissionais8 que procuram

expressar o pensamento filosófico, político, jurídico e cultural para a

construção de um sistema educacional inclusivo.

• Educar na diversidade – material de formação docente. Este material faz

parte do Projeto Educar para a Diversidade, que o MEC elaborou em conjunto

com vários países do Mercosul e com o apoio da Unesco.

8 Entre esses pesquisadores e profissionais, podemos encontrar textos de: Rosa Blanco, Cláudio Baptista, Eugênia Fávero, Eduardo Manzini, Mantoan, Ronice Quadros e outros que se destacam no cenário nacional e internacional, nas pesquisas na área de educação especial.

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• Revista Inclusão – esta revista teve uma “repaginada”9 e foi relançada em

2005, com o objetivo de contribuir na formação de profissionais voltados para

a política de inclusão.

2006

• Experiências educacionais inclusivas – programa de educação inclusiva

direito a diversidade. Esse documento traz uma série de artigos de vários

locais do Brasil, que contam/relatam alguns caminhos e desafios em prol de

uma construção de um sistema inclusivo.

Podemos perceber que, entre 2000 a 2006, vários documentos foram formulados,

publicados e disponibilizados eletronicamente com o intuito de

contribuir/ajudar/programar a escola para que tivesse, na sua cotidianidade, marcas

da inclusão. Gentili (1998) coloca que, entre as políticas educacionais, nos

diferentes países, existe uma regularidade e semelhança sem levar em conta as

peculiaridades de cada caso e isso, segundo o autor, é uma das características das

reformas escolares implementadas durante os últimos 15 anos. Não podemos

esquecer que tais ações fazem parte de uma política neoliberal que procura excluir

para incluir.

Tal regularidade pode ser percebida analisando-se um trabalho recente, coordenado

por Rosangela Gavioli Prieto e apresentado na 27º Reunião da Associação Nacional

dos Pesquisadores em Educação (ANPED), em 2004. Esse trabalho, encomendado

pelo Grupo de Trabalho (GT) 15 – Educação Especial — teve como o objetivo

9 Usamos o termo repaginada, pois o MEC já tinha uma Revista cujo nome era Integração e, em consenso, produz uma “nova/velha” com o título Inclusão.

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descrever e analisar a implantação das políticas de atendimento escolar às pessoas

com necessidades educacionais especiais em diferentes municípios pertencentes às

regiões brasileiras.10 Nessa análise, podemos perceber que a Resolução nº 2/2001

da CNE/CEB é o documento que vai servir de base para que os municípios

envolvidos na pesquisa elaborem suas políticas públicas municipais.

Entre as políticas traçadas por essa Resolução, podemos elencar: a matrícula

preferencial de alunos com necessidades educacionais especiais na rede regular de

ensino; a identificação de quem são os alunos com necessidades educacionais

especiais; os serviços de apoio dentro e fora da sala de aula; o trabalho colaborativo

entre professor especialista e professor da sala regular; a formação de professores

no nível de capacitação e especialização; a preparação dentro da escola para torná-

la inclusiva; a adaptação e flexibilização de práticas pedagógicas e currículos para

atender às necessidades educacionais; o apoio da família; a avaliação pedagógica e

não com cunho de diagnóstico; uma terminalidade específica para aqueles que

chegarem a determinados limites; e apoio/reestruturação das instituições

filantrópicas para trabalharem como parceiras no processo de inclusão.

Nesse contexto, na análise da pesquisa produzida na ANPED (PRIETO, 2004),

podemos perceber que os pontos apontados pelas Diretrizes do MEC estão

arrolados nas políticas dos municípios envolvidos. No entanto não podemos nos

esquecer, tal como nos alerta Garcia (2005), de que no bojo desse documento, há

algumas ambigüidades que são características de uma política neoliberal.

10 Fizeram parte dessa pesquisa os seguintes municípios: Região Norte – Belém do Pará; Região Nordeste – Natal; Região Centro-Oeste – Campo Grande; Região Sudeste – Diadema (SP).

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Entre algumas dessas ambigüidades, Garcia (2005) aponta que há uma crítica à

homogeneidade, mas propõe a heterogenização de recursos e equipamentos

conforme a “incapacidade” dos alunos; racionaliza o acesso, prevendo

equipamentos, metodologias e profissionais necessários à educação de sujeitos com

deficiência e, ao mesmo tempo, racionaliza o conhecimento flexibilizando currículo e

também pela terminalidade específica; coloca que os professores devem ter

formação e competências diferenciadas (especialistas e capacitados), mas, ao

mesmo tempo, visualiza a família como apoio em várias frentes, desde o diagnóstico

até o acompanhamento do processo de implantação e implementação da política de

inclusão.

Como vimos até aqui, o movimento de inclusão vem sendo programado para

impregnar a cotidianidade da escola, mas essa programação em nada contribui para

um olhar diferenciado, um olhar de aceitação em relação aos alunos com deficiência

e sim acaba categorizando-os como o diferente no espaço escolar.

É preciso, portanto, termos em mente que não há modos estanques para

realizarmos a inclusão. Santos (2006, p. 8) nos ensina que a inclusão não se efetiva

somente por políticas públicas, pois “[...] inclusão é processo, e processo não se

ensina, vive-se”.

Nesse sentido, podemos inferir que, apesar de o contexto neoliberal tentar

programar o cotidiano da escola produzindo produtos, olhares, ações que serão

repetidos, como se fosse um grande relógio previsível, há também, nesse contexto,

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a possibilidade de mudanças, de retomadas que não estão e nem são fixas, prontas,

acabadas.

É no cotidiano de cada escola, de cada sociedade que iremos construir e reconstruir

uma configuração de inclusão conforme as condições possíveis do e no

espaço/tempo. Isso implica uma educação que tenha em mente que inclusão e

exclusão coexistem numa relação dialética, na qual é preciso que a diferença seja

respeitada e considerada e que, de fato, haja aprendizagem.

3.2 INCLUSÃO E EXCLUSÃO

A inclusão é, segundo Mendes (2002, p. 61), um movimento mundial proposto como

um novo paradigma que “[...] implica a construção de um processo bilateral no qual

as pessoas excluídas e a sociedade buscam, em parceria, efetivar a equiparação de

oportunidades para todos”.

Contudo não podemos nos esquecer, como nos alerta Sawaia (2002), de que

inclusão e exclusão são faces da mesma moeda. Não podemos abordar o assunto

sobre inclusão sem nos remetermos à exclusão:

[...] a exclusão é processo complexo e multifacetado, uma configuração de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É processo sutil e

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dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte constitutiva dela. Não é uma coisa ou um estado, é processo que envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros (SAWAIA, 2002, p. 9).

Essa definição de exclusão nos remete ao conceito de configuração de Nobert Elias,

e podemos dizer que é nas ações dos jogadores, no cotidiano, que será

estabelecida a relação de exclusão/inclusão. É na análise do cotidiano que podemos

perceber essa relação tão complexa.

A dialética inclusão/exclusão gesta subjetividades específicas que vão desde o sentir-se incluído até o sentir-se discriminado ou revoltado. Essas subjetividades não podem ser explicadas unicamente pela determinação econômica, elas determinam e são determinadas por formas diferenciadas de legitimação social e individual, e manifestam-se no cotidiano como identidade, sociabilidade, afetividade, consciência e inconsciência (SAWAIA, 2002, p. 9).

Nesse sentido, a inclusão não pode ser vista como um elemento à parte dos sujeitos

e do contexto no qual ela é praticada. Podemos ter, no mesmo espaço/tempo,

situações de exclusão e de inclusão. Em uma sociedade capitalista, Sawaia (2002,

p.8) aponta que “[...] a sociedade exclui para incluir” e Padilha (2004, p. 109-110)

descreve que “[...] no campo da educação fala-se mais em inclusão. Pouco se fala

da exclusão, como se fosse possível incluir sem compreender por que alguém não

está incluído. Não estar incluído, ou excluído de quê? Quando? Onde?” (grifos do

autor).

Padilha (2004, p. 96-97) aponta uma série de ações que fazemos ou deixamos de

fazer no cotidiano da escola que reflete essa dinâmica.

Deixar crianças e jovens deficientes ou pobres sem escola, sem ensino, sem aprendizagem e abandonados à própria sorte é impedir, de forma

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violenta, o exercício do direito que todos têm de participar dos bens culturais produzidos pela humanidade [...]. Igualmente violento é deixá-los na escola, matriculados, com lugar marcado na sala de aula, mas sem aprender, sem o acesso a todos os instrumentos e estratégias que respondam às suas necessidades peculiares: professores que saibam do que realmente estas crianças e jovens necessitam; equipe de profissionais que saiba orientar professores e familiares, acompanhando-os no processo de aprendizagem de seus alunos e filhos; número suficiente de pessoas para cuidar destes alunos na escola; número menor de alunos por sala de aula; salas de recurso em pleno funcionamento; estrutura física dos prédios adequada; possibilidade de locomoção garantidas; projeto pedagógico coletivo; estrutura e funcionamento administrativos compatíveis com o projeto pedagógico e com as singularidades dos diferentes grupos de crianças e jovens [...] (PADILHA, 2004, p. 96-97).

Dessa forma, podemos entender que a inclusão é muito mais que a simples

matrícula na escola, na qual os sujeitos exercem o seu direito constitucional. Muitas

vezes, essa questão de direito não é visível para todos e, como aponta Wanderley

(2002, p. 24), há uma tramutação do “direito” em “favor” e isso acaba reforçando o

processo de exclusão dentro e na escola.

Muitos acham que a inclusão se resume na inserção dentro do espaço escolar, o

que acaba, no imaginário de algumas instituições, parecendo uma coisa

boa/inevitável/suficiente, mas, no entanto, isso se torna limitado. Para, de fato,

podermos incluir alguém em algum lugar, precisamos aceitá-lo, tal como ele é, e

garantir espaços/recursos para que ele possa ter acesso a uma educação de

qualidade.

3.2.1 Inclusão e diferença

A inclusão implica um olhar sobre as diferenças. Entretanto é importante

entendermos a semântica do termo diferença. Burbules (2003) faz uma distinção

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entre diversidade e diferença que, no discurso, vêm aparecendo com a mesma

conotação.

Estudando sobre o assunto, o autor citado aponta cinco perspectivas de concebê-la.

Segundo ele, a diferença aparece na literatura como: diferença de variedade (essa

perspectiva é categorial e refere-se aos diversos tipos dentro de uma categoria. Só

se pode falar de tipos de categorias quando a categoria é conhecida.); diferença em

grau (são diferenças concebidas como pontos diferentes ao longo do continuum de

qualidades, por exemplo QI); diferença de variação (quando se muda parcialmente o

modelo); diferença de versão (tem um modelo-base e se propõe algumas mudanças.

Por exemplo, o currículo é básico e se propõem adaptação curricular); e diferença

por analogia (que é a comparação de modelos).

Essas cinco formas são consideradas pelo autor como diversidade e ele as

congrega na categoria de diferença entre, que possibilita compreender o outro a

partir de uma matriz. Segundo Burbules (2003, p.173) “[...] os discursos da

diversidade são uma forma de domesticar a diferença, permitindo-lhe livre

expressão, mas em um âmbito extremamente limitado – além disso, um âmbito que

não se abre facilmente à renegociação ou a contestação” (grifo do autor).

Pensar a diferença como uma diferença entre, acaba permitindo uma exclusão

daqueles que se distanciam de um modelo tido como padrão. Essa concepção

permite que, em determinados contextos, algumas pessoas sejam incluídas e outras

possam ser excluídas. Pensando na inclusão de alunos com deficiência, concebe-se

a idéia de que determinadas deficiências (aquelas consideradas leves e moderadas,

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por exemplo) podem ser aceitas em algumas escolas e outras podem continuar

segregadas em instituições especiais.

Acreditamos que, numa proposta de inclusão que valorize o outro, precisamos ir

além das diferenças entre para não cairmos nas armadilhas de incluir alguns e

segregar/excluir outros. Conforme Mohanty (apud BURBULES, 2003) “[...] a questão

central não é, portanto, apenas reconhecer a diferença; a questão mais difícil diz

respeito ao tipo de diferença que é reconhecido e incorporado”.

A diferença, vista como variação benigna (diversidade), não produz tensão e,

conseqüentemente, não implica uma mudança e acaba sugerindo um pluralismo

harmonioso, vazio. Lidar com a diferença11 na perspectiva da inclusão é aceitar que

haverá conflitos, pois, muitas vezes, a diferença do outro vai além da minha

capacidade de compreendê-lo. É entender que não conseguimos aprisionar as

deficiências em categorias estanques, pois somos sujeitos complexos e podemos

mudar e sermos mudados a partir de/no cotidiano em que estamos inseridos.

Burbules (2003, p. 160) aponta que, no campo educacional, a diferença pode

aparecer tanto como oportunidade assim como pode se constituir num problema. É

uma oportunidade por três pontos de vista: o primeiro, porque, a partir dos embates

entre os diversos grupos e indivíduos, podemos ter um leque de possibilidades

humanas que se expressam na cultura e na história; segundo, porque, no diálogo,

no convívio entre os diferentes, podemos aprender com eles e também ensinar

11 Burbules (2003) aponta três tipos de diferença: diferença além, diferença no interior e diferença contra. A primeira é quando a compreensão do outro vai além da nossa capacidade de compreendê-lo; a segunda é que existem diferenças no interior dentro da própria diferença que impedem de categorizar um sujeito dentro de um conceito estável; e a terceira implica uma constante retomada de reflexão e crítica sempre que os pressupostos e as lacunas de um discurso dominante que quer ser imperativo.

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formas alternativas de vida e desenvolver empatia por elas; terceiro, porque,

aprender a lidar com essa diferença é uma virtude da cultura cívica democrática.

Conviver com a diferença pode se constituir como problema na esfera educacional,

quando provoca conflitos e tensões equivocadas; são manifestações imbuídas de

divisão de poder; e quando aparecem numa perspectiva que está longe da nossa

capacidade de compreensão.

Essas colocações nos servem de alerta, quando estamos pensando na questão da

educação inclusiva que agrega, no espaço escolar, pessoas que antes eram

encaminhadas para instituições ou nem mesmo chegavam a adentrar os muros da

escola dita regular.

Nesse rol de alunos diferentes, temos os alunos com deficiências, sejam elas de

causas sensoriais, sejam orgânicas ou não, que, juntamente com aqueles que a

escola julga “não saberem nada”, se constituem nos diferentes, nos “anormais”

como se fosse possível delimitar a normalidade.

Lidar com a educação inclusiva implica um outro olhar sobre os sujeitos/alunos no

cotidiano escolar. Tal mudança requer ressignificar o olhar em relação ao aluno com

necessidades educativas especiais e também as práticas educativas. Rodrigues

(2003) aponta que a escola tradicional propõe um ensino igual para todos, porque

acredita que todos são iguais. Dessa forma, a escola marginalizava e segregava

liminarmente aqueles que aparecessem como diferentes.

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Quando falamos em igualdade de direitos, na perspectiva da inclusão, não significa

igualar todos. “Incluir não é nivelar nem uniformizar o discurso e a prática, mas

exatamente o contrário: as diferenças, em vez de inibidas, são valorizadas”

(SANTOS; PAULINO, 2006, p.12 grifo dos autores).

Assim, “[...] a inclusão provoca uma crise escolar, ou melhor, uma crise de

identidade institucional, que, por sua vez, abala a identidade do professor e faz com

que seja ressignificada a identidade do aluno” (MANTOAN, 2002, p. 87).

Nesse contexto, a educação é desafiada. Tal desafio não pode imobilizar e sim

impulsionar ações na busca de soluções possíveis (CARVALHO, 2002). Em face

desses desafios e mudanças de paradigmas, acreditamos que o movimento de

inclusão que vem se desenhando, ao longo da história, é um disparador de

necessárias mudanças no campo educacional e no cotidiano da escola.

3.3 A INCLUSÃO NO COTIDIANO DAS ESCOLAS

Conforme os dados do censo escolar (INEP/MEC), podemos perceber que, nos

últimos anos, há um aumento na matrícula de alunos com necessidades

educacionais especiais por deficiência no contexto da escola. A matrícula evoluiu,

consideravelmente, de 110.704 alunos em 2002 para 262.243 em 2005,

aumentando em mais de 100% o contingente de alunos nas escolas regulares,

conforme demonstra a Figura 1.

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Figura 1 – Evolução de matrículas inclusivas na educação especial Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP)

Esse aumento pode ser decorrente das políticas de inclusão que começaram a ser

intensificadas a partir das Diretrizes Nacionais da Educação Especial na Educação

Básica (Resolução nº 2/2001) que, como já foi dito, serviu de base para os

municípios traçarem suas políticas municipais (PRIETO, 2004).

Nesse mesmo período, podemos constatar um crescimento dos municípios que

registraram matrícula na educação especial, conforme aponta o gráfico da Figura 2.

Figura 2 - Evolução de municípios com matrículas na educação especial Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP)

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O acréscimo foi de 27%, aumentando de 3.612 em 2002 para 4.582 em 2005.

Nesses municípios, tal como apontam os dados da Figura 3, encontramos um total

de 640.317 estabelecimentos de ensino oferecendo matrículas aos alunos com

algum tipo de deficiência.

Figura 3 - Evolução da política de atendimento na educação especial Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP

Entretanto, analisando ainda os dados da figura acima, podemos notar que esses

estabelecimentos ainda são, em sua maioria, escolas especiais ou classes

especiais, configurando que, embora tenha evoluído o número de escolas na política

de inclusão, avançando de 110.704 em 2002 para 262.243 em 2005, percebe-se,

que nesse mesmo período, ainda foi autorizada a criação de 40.177 escolas

especiais e/ou classes especiais. Tal prerrogativa não é um contra-senso da

inclusão, mas sim uma situação garantida na legislação – Lei nº 9394/96; Resolução

nº 2/2001 – que prevê a não-matrícula na escola regular quando a diversidade for de

fato diferença, ou seja, quando os alunos apresentam uma deficiência mais grave a

escolar regular pode encaminhá-los para instituições.

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Podemos perceber na análise dos dados da Figura 4 que, das 38.019 escolas que

entraram no movimento da inclusão, 34.366 são provenientes do Poder Público e

3.653 são da rede particular de ensino. Percebemos uma discrepância nos números

entre as esferas administrativas. Isso pode ocorrer devido ao fato de que, para se

efetivar a inclusão, necessita-se de investimentos e, no que tange à rede privada,

acaba diminuindo a relação custo/benefício. Apesar de esses dados apontarem que

há um envolvimento da esfera pública no atendimento das crianças com deficiência,

não podemos nos esquecer de que esse número é mascarado pelas instituições que

aderiram à inclusão. Esses dados podem simplesmente significar matrícula, mas não

acesso ao conhecimento.

Figura 4 - Evolução de estabelecimentos inclusivos com educação especial Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP)

Quando olhamos na perspectiva de atendimento na educação especial, focando a

análise na Região Sudeste (Figura 5), podemos perceber que, no período de 2002 a

2005, houve uma evolução em 130% para ampliar a matrícula na escola regular

enquanto nas classes/escolas especiais essa evolução ficou em torno de 8,6%.

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Figura 5 - Evolução da política de atendimento na educação especial da Região Sudeste Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP) Apesar de um acréscimo significativo de escolas voltadas para a inclusão dos alunos

com necessidades educacionais especiais, os dados nos mostram que os alunos

com deficiência ainda estão nas classes especiais e esse número, em proporções

menores, continua crescendo.

Analisando os dados do Censo de 2005 (INEP/MEC), Figura 6, podemos perceber

que o maior contingente de alunos com deficiência está matriculado no ensino

fundamental, perfazendo um total de 419.309 alunos.

Figura 6 - Distribuição de matrículas na educação especial em 2005 Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP)

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Esses dados nos remetem a uma indagação: por que o número do ensino

fundametal é tão alto em relação as outras modalidades? Por que não há número no

ensino superior? Se analisarmos os números do ensino médio, poderemos ver que

somente 1,7% está matriculado nessa modalidade e isso será que pode significar

um alto índice de reprovação desse alunado no ensino fundamental? Essas

perguntas carecem de outras investigações que vão além do propósito deste

trabalho. Entretanto cabe ressaltar que 65,4% dos alunos com necessidades

educacionais especiais se encontram matriculados no ensino fundamental o que

requer que o cotidiano da escola esteja aberto para atendê-los.

Em relação à preparação do corpo docente, podemos perceber na Figura 7 a

evolução de funções docentes na educação especial.

Figura 7 - Evolução de funções docentes na educação especial Fonte: Censo escolar 2005 (MEC/INEP)

Nota-se que houve um acréscimo, no que tange à preparação do professor, para

trabalhar com esses alunos. Dos 51.006 professores, 77% possuem cursos

específicos para trabalhar com educação especial mas ainda se encontram, no ano

de 2005, 23% dos professores que trabalham sem curso específco na área. Porém

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não podemos perceber, na análise dos dados, se esses professores se encontram

em instituições e/ou classes especiais ou se estão em estabelecimentos de escolas

regulares.

Apesar de ser um ganho enorme para a inclusão ter profissionais com cursos

específicos na área de educação especial, isso não significa que os professores

possuem conhecimentos e que estes são transpostos para uma prática pedagógica

que garanta uma educação de qualidade para todos. É preciso refletir sobre ”[...] o

que podemos fazer como profissional para contribuir com o avançar desse processo,

sem esquecermos que essa tarefa é coletiva” (VICTOR, 2006, p.123).

Acreditamos que, para efetivar uma prática pedagógica que garanta a inclusão de

todos os alunos no cotidiano escolar, a escola precisa refletir e rever práticas que

contribuam para o sucesso pedagógico de todos. Entretanto isso não é muito

simples de ser feita.

Padilha (2004) aponta que não é fácil realizar a inclusão e que muitos professores

se sentem angustiados por não conseguirem ensinar tudo a todos.

Sinto a angústia dos professores e professoras (angústia que também é minha) que se vêem ora obrigados a realizar uma proeza pedagógica sem sequer saberem como; ora culpados por não estarem sendo solidários, caridosos, pacientes com aqueles que aprendem diferente, em tempos diferentes, de modos diferentes; ora se sentem incompetentes por não estarem conseguindo que todos os seus alunos aprendam o que programaram para ser aprendido (PADILHA, 2004, p. 110).

Nesse contexto, podemos pontuar que a inclusão é um movimento que não se faz

de modo solitário e sim em colaboração com toda a equipe da escola. Não basta

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termos números de matrículas, precisamos ter ações efetivas que garantam o

acesso de todos a uma educação de qualidade.

Padilha (2004, 116, grifo da autora) nos sugere “[...] que sem uma organização da

comunidade [...] não adianta lei, nenhuma resolução, nenhum discurso [...] cada um

de nós precisa conhecer para fazer a hora e não esperar acontecer”.

E a mesma autora continua dizendo:

Incluir é dar condições, pensar estas condições, planeja-las e replanejá-las. [...] Incluir é também excluir – incluir crianças na escola é excluir formas incompatíveis de tê-las na escola. Incluir deficientes nos sistemas de ensino é excluir preconceitos de nossas vidas. É excluir de nossa agenda cultural a crença no sistema capitalista e neoliberal. [...] Incluir é saber-se capaz de entender que a história não acabou e ninguém deve fazer, por nós, a nossa história (PADILHA, 2004, p.117).

Nesse contexto, pensamos em uma inclusão que vem sendo forjada por questões

sociais, econômicas e políticas, e que vai muito além do cumprimento de uma lei.

Pensamos numa inclusão que surge e ressurge a cada dia no cotidiano escolar e

que desafia o outro a buscar, em conjunto, possíveis saídas/respostas/ações para

determinados contextos. Uma inclusão que respeita a diferença e que ganha um

significado diferente do concebido, pois é no vivido que ela se configura e pode

romper com a cotidianidade.

Na revisão de literatura, podemos perceber que algumas pesquisas desenvolvidas

no Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo apontam

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que, para darmos conta da inclusão, algumas mudanças ainda precisam ser feitas

no cotidiano das escolas.

Uma dessas mudanças é a forma como olhamos o sujeito com alguma deficiência. O

estudo de Rodrigues (2001) enfatiza essa questão. A autora percebe que, no

processo de escolarização de crianças com deficiência mental, a marca patológica é

mais relevante do que o processo de desenvolvimento desse sujeito. Precisamos

romper com a dicotomia normal/anormal e olhar todos como sujeitos de

possibilidades que aprendem e desenvolvem em tempo e ritmo próprios.

Em virtude desse olhar patológico, as escolas encaminham os alunos para as

classes especiais e/ou escolas especiais legitimando um lugar diferenciado para que

essas crianças possam ser alojadas. O estudo de Amaral (2001) deixa bem claro

que parece haver uma celebração de contrato quando essas crianças são

encaminhadas da escola regular e acolhidas num outro espaço sem contestação do

diagnóstico apresentado.

Para garantir tal processo, precisamos mexer na prática pedagógica nos cotidianos

da nossa escola. Caetano (2002), analisando tal perspectiva em escolas do ensino

fundamental, principalmente nas séries finais, aponta que as práticas pedagógicas

presentificadas nesse contexto precisam ser ressignificadas para atender a todos os

alunos, oferencendo-lhes uma educação de qualidade.

Gonçalves (2003), Almeida (2004), Louven (2005) e Meneguci (2005)

apontam/analisam modos de ser/estar na escola que provocam/instigam possíveis

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mudanças no cotidiano da escola. Nesse contexto, Gonçalves (2003) e Almeida

(2004) indicam dados sobre a perspectiva de um trabalho colaborativo. A primeira

enfatiza a parceria entre o professor da classe regular e o professor de educação

especial, pois esse envolvimento é fundamental para o movimento da inclusão no

cotidiano da escola e, conseqüentemente, para a aprendizagem; já a segunda, por

meio de uma pesquisa ação-crítico-colaborativa, demonstra que ter uma outra

pessoa para articular/refletir sobre as questões da inclusão e da prática pedagógica

contribui para um processo de formação continuada, dentro da própria instituição, e,

portanto contribui para a mudança no contexto educativo.

Meneguci (2005) e Louvem (2005) esclarecem que, para as escolas efetivarem

essas mudanças, é preciso que elas busquem formas de organização que dêem

conta de planejar, de garantir formação continuada e atender a todos os alunos,

oferecendo-lhes acesso, permanência e educação de qualidade. Para isso

precisamos rever a forma de avaliação que deve estar atrelada à prática

pedagógica, pois esta está muito mais voltada para uma prática excludente,

classificatória dos alunos (AGUIAR, 2003) do que preocupada com um processo de

aquisição de conhecimento.

Sobre essa questão, podemos perceber que, para se garantir a inclusão, precisamos

construir/reconstruir/modificar, em nosso cotidiano, a forma de olhar a diferença e

conviver com ela e também precisamos efetivar práticas que contemplem uma ação

que dê conta da complexidade na sala de aula. Para isso, acreditamos que a prática

de avaliação precisa avançar do momento de diagnóstico, da classificação e passar

a ser usada como retroalimentadora da prática pedagógica. Sendo assim, passa a

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ser um dispositivo a mais para a busca de uma reorganização do contexto da

escola, tendo em vista uma postura que garanta a aprendizagem de todos.

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4 AVALIAÇÃO E INCLUSÃO: CONSTRUINDO CAMINHOS POSSIVEIS

[...] Manhê! Tirei um dez na prova Me dei bem tirei um cem e eu quero ver quem me reprova Decorei toda lição Não errei nenhuma questão Não aprendi nada de bom Mas tirei dez (boa filhão!)”

(GABRIEL, O PENSADOR).

Avaliar... o que é avaliar? Será que se resume a prova, a reprovação, a passar de

ano, a classificar os que sabem daqueles que não sabem mediante a nota que

tiram? A reflexão, de acordo com o trecho da música de Gabriel, o Pensador, nos

leva analisar nossa prática de avaliação presente no cotidiano da escola.

Uma prática na qual a avaliação é resumida como um instrumento de coleta de

dados, em que são esses resultados que testificam o saber dos alunos, é uma

prática que classifica para excluir e que não possibilita uma retomada na ação

pedagógica.

No atual contexto, de movimento da inclusão, em que a diferença ganha corpos e

nomes na sala de aula, concordamos com Baumel (1998, p.35), quando ela afirma

que a escola inclusiva precisa mexer na questão pedagógica “[...] exigindo uma

revisão das concepções do ensino, da aprendizagem e até da avaliação. É nesta

última que em geral emergem os mecanismos da exclusão ─ centrados na seleção e

autoritarismo”.

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A avaliação tem sido usada, há muito tempo, como mecanismo de exclusão e de

classificação que separa, na educação regular, os que sabem daqueles que não

sabem e, na educação especial, os “normais” dos “não-normais”. Nesse sentido,

acreditamos que é necessária uma (re)significação da avaliação tanto no campo da

escola comum como na sua aplicação na educação especial.

Ribeiro (2003, p. 48) aponta que tal mudança não é uma coisa simples de ser feita,

porque

Do ponto de vista da escola regular, esta se vê incapaz de resolver toda a problemática, que antes se eximia de cuidar, apenas com os recursos de que dispõe, porque simplesmente podia encaminhá-la a outras instâncias. Do ponto de vista dos serviços de Educação Especial estabelecidos e com uma tradição já consolidada, também há um acometimento pela insegurança de que tudo que já foi edificado se transforme em inutilidade, como num passe de mágica.

Entretanto não podemos manter a avaliação como vem sendo concebida, dentro de

uma visão estática no tempo/espaço e que se restringe a classificar os alunos.

Mantoan (2001) coloca que esse tipo de avaliação se constituiu num entrave na

implementação da inclusão e que precisamos, urgentemente, suprimir esse caráter

classificatório e instrumentalista.

4.1 AVALIAÇÃO COMO INSTRUMENTO PARA MEDIR O CONHECIMENTO

Quando pensamos na avaliação no contexto das escolas, sempre nos lembramos

das provas, dos trabalhos, dos boletins, das notas tiradas, enfim, dos instrumentos

que usamos para coletar informações daquilo que o aluno aprendeu.

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O uso da prova como um instrumento “infalível”, imprescindível na prática

pedagógica de muitos professores, tem uma razão histórica de ser. Segundo Dias

Sobrinho (2002) os testes escritos são uma criação da escola moderna. Essa

criação tem um ranço muito forte nas práticas de avaliação, quando educadores

atribuem um excessivo valor ao instrumento em detrimento do processo de

aprendizagem vivenciado pelos alunos.

Esteban (2003, p. 17) coloca que esses instrumentos têm a função de “[...] isolar a

subjetividade que constitui a dinâmica escolar e dar visibilidade a resultados

quantitativos que exponham o rendimento de cada estudante e que sejam

compreendidos como demonstração da aprendizagem realizada”, como se avaliar

fosse esse momento estanque, marcado pelo instrumento que se usa e pela nota

que se tira.

No trecho da música de Gabriel, o Pensador, colocada como epígrafe deste capítulo,

podemos exemplificar o que acabamos de relatar, observando que se dá uma

ênfase muito maior ao resultado do que ao processo de aprendizagem. Essa

vertente é possível ser pensada, porque há um pressuposto de que se pode

conseguir, por meio do instrumento da avaliação, a apreensão daquilo que o aluno

sabe. Baseia-se, assim, numa perspectiva metafísica de abordar o conhecimento,

vendo-o como algo pronto e acabado, sem levar em conta o contexto e a sua

condição de provisório.

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Lefebvre (1995) diz que o pensamento metafísico da lógica formal não leva em

conta a história, o contexto e, não levando em conta o tempo, o lugar e o

movimento, é abstrato, coagulado, incapaz de expressar o movimento real dos fatos.

Essa lógica de neutralidade visava a separar o sujeito do objeto para conseguir

extrair a verdade. Lefebvre (1995) coloca que essa verdade estava situada fora e

acima de qualquer erro. Sendo assim, o resultado obtido era considerado como tal.

A ênfase nos testes escritos marca a cotidianidade da escola na qual ele aparece

como um instrumento infalível e os seus resultados servem para: classificar e

separar os alunos que sabem daqueles que não sabem; para legitimar que este ou

aquele aluno fique nesta ou naquela escola. Essa prática de avaliação, com o intuito

de examinar, ainda permanece nos espaços da escola. Nas palavras de Dias

Sobrinho (2002, p. 20) “[...] determina quem passa de ano e quem fica retido, quais

são os melhores e os piores, os inteligentes e os incapazes, os esforçados e os

preguiçosos, os educados e os indisciplinados” (grifo do autor).

Segundo Dias Sobrinho (2002, p.19), tal perspectiva trouxe duas conseqüências:

[...] de um lado, os instrumentos de testes, provas e exames trouxeram mais precisão e força operacional ao sistema de medidas e seleção. Por outro lado, determinaram uma concepção e uma prática pedagógica que consistem basicamente na formulação dos deveres ou exercícios escolares e controle através dos testes.

Em relação ao sistema de medidas e seleção, esse fato teve ressonância na

construção e no uso intensificado dos testes de quociente de inteligência (QI) que

dominaram no século XIX e meados do século XX e, marcados por verdadeiras

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orgias de tabulações que quantificavam, analisavam e interpretavam os resultados

obtidos (CREMIN, 1961, apud BARRIGA, 2003, p. 66). Esses autores acrescentam

ainda que “[...] o resultado dos testes de inteligência era utilizado para justificar a

necessidade de eliminar aos que, por seu escasso coeficiente, não deviam estar na

escola”.

Dessa forma, o teste provocava uma exclusão dos alunos da escola e acabava

outorgando a educadores e psicólogos o papel de sacerdotes da sociedade

moderna, como aqueles que decidiam sobre o lugar que cada pessoa deveria

ocupar.

Essa idéia teve tanto peso no contexto escolar que, a partir dos resultados do

coeficiente de inteligência, decidia-se a vida do aluno, julgando: se ele irá avançar

para série seguinte ou se ele ficará reprovado; se ele tem condições de ficar na

escola regular ou se deve ser encaminhado para a escola ou classe especial; se ele

é normal ou anormal; se ele tem ou não tem condições para aprender.

A postura de aceitar, como suposta verdade, os resultados dos testes que medeiam

a inteligência foi também abarcada pela educação especial que aceitava os

encaminhamentos vindos da escola e/ou psicólogos que atestavam aqueles alunos

que não correspondiam ao padrão convencional.

Nessa perspectiva, a avaliação/encaminhamento das crianças, tanto pela educação

regular como pela educação especial, era a partir de um padrão de aluno e

legitimava a separação, a segregação deste ou daquele, em classes e/ou escolas

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especiais. As avaliações, como testes científicos, acabavam sendo marcadas como

forma de poder que caracterizava os alunos conforme suas impossibilidades e

legitimava a exclusão, por meio da rotulação de quem era ou não capaz.

Além da conseqüência do uso do teste de QI, temos, na mesma lógica dos sistemas

de medidas, os exames nacionais, tais como: o Sistema Nacional de Avaliação da

Educação Básica (SAEB), o PROVÃO, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM),

e outros que são construídos com o intuito de verificar a aprendizagem dos alunos

via testes padronizados que são aplicados de forma igualitária de norte a sul do País

e que, a partir dos resultados, classificam Estados, municípios e escolas conforme

os escores obtidos.

Essa prática de avaliação é criticada por vários autores, entre eles, Sacristán e

Gómez (1998, p. 334) que apontam a mentalidade eficientista baseada nos cânones

positivistas como um dos caminhos para se conhecer a realidade educacional.

Nessa prática, os resultados quantificáveis são as “[...] únicas ferramentas para falar

da qualidade de escolas, professores/as e do sistema em seu conjunto”.

Acrescentam ainda que a análise qualitativa também é avaliada por esses

parâmetros.

Percebemos, assim, que conceber a avaliação como um instrumento capaz de medir

o conhecimento em nada contribui para a retomada do processo, muito pelo

contrário, serve apenas para classificar e segregar alunos e serviços.

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Com base em Bertagna (2002), podemos dizer que o uso do instrumento é apenas

uma formalização da avaliação, mas que esta não pode ser considerada como uma

apreensão da verdade, pois, atrás de uma avaliação formal, sempre se perpassa

uma avaliação informal.

Segundo a autora, a avaliação formal pode ser entendida

[...] como sendo aquelas práticas que envolvem o uso de instrumentos explícitos de avaliação, cujos resultados podem ser examinados objetivamente pelo aluno, à luz de um procedimento claro, e a avaliação informal como a construção por parte do professor de juízos gerais sobre o aluno, cujo processo de constituição está encoberto e é aparentemente assistemático (FREITAS, 1995, apud BERTAGNA , 2002, p. 251).

Nesse sentido, nenhum instrumento de prática avaliativa pode ser considerado

fidedigno, objetivo, pois, na hora da correção, do resultado final há aspectos

subjetivos que fazem com que o professor seja mais maleável ou mais rígido

durante a correção.

4.2. AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Para entender as práticas de avaliação no campo da educação especial, fomos

buscar respaldo em Beyer (2005) que faz uma antropologia da pessoa com

deficiência. Ele aponta que as mudanças no campo avaliativo são decorrentes dos

diferentes paradigmas presentes em determinadas épocas.

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Baseando-se em Bleidick (1981), Hugo Beyer indica quatro concepções

paradigmáticas que ocorreram ao longo do tempo. Embora haja uma separação

didática entre esses paradigmas, Beyer (2005) chama-nos a atenção para entender

que eles não aconteceram/acontecem de modo linear, mas que há a coexistência de

vários paradigmas ao mesmo tempo.

A primeira forma de avaliar é respaldada no paradigma clínico-médico, no qual o

olhar para a pessoa com deficiência é pautado a partir da doença e na busca pelo

laudo que ateste se determinado aluno tem ou não uma deficiência. Acredita-se que

esse sujeito é limitado e, portanto, a avaliação recai sobre a deficiência e os

encaminhamentos e prospectivas são pautados no diagnóstico.

Numa análise da revisão de literatura, podemos perceber que vários trabalhos foram

realizados na perspectiva de construção desse tipo de avaliação. Nunes, Ferreira e

Mendes (2003), analisando a produção discente dos programas de pós-graduação

stricto sensu em Educação e Psicologia voltada para o indivíduo com necessidades

educacionais especiais, perceberam que, dos 550 trabalhos produzidos em 27

universidades brasileiras, 87 discutiam sobre a questão do diagnóstico, tendo como

pano de fundo a identificação e o encaminhamento, no período de 1974 a 2001.

Esse tipo de avaliação ligada ao diagnóstico classificatório contribuiu para um olhar

calcificado/limitado pela deficiência e que não possibilitou uma perspectiva de

avanço para esse sujeito. Tanto que os alunos identificados com deficiência eram

segregados em classes especiais ou em instituições especializadas.

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Os encaminhamentos feitos pela escola e/ou pelos profissionais (principalmente

pscicólogos) são baseados, em sua maioria, pela questão do fracasso escolar e a

escola especial entra como “valizadora” dessa exclusão, “[...] que não se inaugura

quando a criança entra na escola especial, mas se constitui na trajetória escolar dos

alunos a serem excluídos” (AMARAL, 2001, p. 60).

Padilha (2001, p. 102), falando sobre essa questão coloca que

Quando penetramos pelo caminho porque passam as crianças suspeitas de deficiência mental, encontramos os professores, os testes, os relatórios, as resoluções legais usando do poder de avaliar, julgar e tomar decisões sobre a vida das crianças – diagnósticos e prognósticos representantes de concepções e modelos teóricos por vezes inconscientes, porém com estatuto oficial de cientificidade nas tomadas de posição por parte dos profissionais considerados competentes para este fim.

Percebe-se, assim, que os encaminhamentos são feitos, porque há um serviço que

se alimenta deles, legitimando a exclusão dos alunos com necessidades

educacionais especiais da escola. A entrada na classe especial é o final de um

processo de reafirmação da inadequação ao aluno mediante um sistema escolar que

é segregacionista, estigmatizador e preconceituoso (PLATZER-AMARAL, 2001).

Nesse sentido, o diagnóstico acaba confirmando a idéia que o professor já tinha

sobre as limitações das crianças, tornando-se um “documento morto”, sem utilidade

alguma, legitimando a exclusão desses alunos (GONZÁLEZ, 2002). A prática de

diagnosticar-encaminhar acaba não causando nenhuma tensão, nenhuma

modificação e, conseqüentemente, não contribui para um outro olhar em relação às

crianças com necessidades educacionais especiais.

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Essa não mudança de olhar pode ser percebida no trabalho de Mori e Oliveira

(1999, apud FERREIRA, 2002), no qual elas apontam que, mesmo tendo a evolução

dos modelos e discursos de integração para inclusão, não houve mudanças

significativas nas formas de avaliação e encaminhamento de alunos apontados

como deficientes mentais.

Nesse contexto, podemos perceber que a avaliação, dentro do paradigma clínico-

médico, não contribui para o processo de inclusão, pois continua segregando,

excluindo, separando e não acreditando no potencial daqueles que apresentam uma

necessidade educacional especial.

A segunda concepção de avaliação, apontada por Beyer (2005), é baseada no

paradigma sistêmico. Nesta concepção, o aluno é avaliado conforme os padrões

preestabelecidos no sistema escolar. Se seu desempenho não é satisfatório, ou se

ele não alcança os critérios estabelecidos pelo currículo para toda a classe, o

sistema busca respostas. “Assim, aos alunos cujo insucesso na aprendizagem

signifique a impossibilidade da progressão na escola regular, outras alternativas

serão oferecidas” (BEYER, 2005, p. 91-92).

Essas alternativas podem variar desde pequenas flexibilidades no currículo como

até mesmo a segregação em classes e/ou escolas especiais, por julgarem que esse

sujeito não consegue acompanhar o ritmo da turma. Percebe-se, nesse paradigma,

uma avaliação individualizada, porém sempre comparada com um padrão, com um

critério de referência preestabelecido.

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O trabalho de Capellini e Mendes (2002, 2003) demonstra bem essa avaliação que

busca comparar o rendimento acadêmico dos alunos incluídos na escola regular

com rendimento dos demais alunos. As autoras utilizaram-se de testes padronizados

para verificar o nível de alfabetização, o rendimento na leitura-escrita e o rendimento

na Matemática. Além desses testes, utilizaram-se de observações dos alunos e do

boletim acadêmico. Na análise dos dados, constataram que houve um avanço na

questão dos pré-requisitos e um certo atraso no que tange ao desempenho da

leitura e da escrita, quando considerada a relação idade/série, porém apresentavam

um resultado que tinha dados inferiores, na média e acima dela, quando se levava

em conta a turma como um todo.

Percebe-se, assim uma avaliação que verifica a aprendizagem mediante

instrumentos-padrão nos quais os alunos com deficiência precisam avançar além do

seu processo natural de aprendizagem, pois precisam ter um desenvolvimento maior

que os dos demais alunos, porque o parâmetro de desempenho é o do aluno ideal.

A avaliação baseada no paradigma sistêmico também pode ser contemplada no art.

8º da Resolução CNE/CEB nº 2/2001 que propõe:

[...] flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significado prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos didáticos diferenciados e processos de avaliação adequados ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância com o projeto pedagógico da escola, respeitada a freqüência obrigatória (Inciso III, grifo nosso).

Embora se possa perceber um avanço na perspectiva de dar ao aluno as condições

para que ele tenha acesso à educação, existe um parâmetro curricular que

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prescreve os conteúdos básicos que todos precisam aprender. Sendo assim,

aqueles que não alcançarem essas metas precisarão de uma adaptação ou

flexibilização para chegar ao patamar preestabelecido, deixando transparecer a

orientação de uma avaliação sistêmica que tem como critério um modelo a ser

seguido.

O terceiro paradigma apontado por Beyer (2005) é o sociológico. Nele, desloca-se o

olhar sobre o indivíduo e volta-se para o grupo social no qual a pessoa está inserida.

“A deficiência é interpretada por meio da reação social. A forma como o grupo reagir

à situação da deficiência poderá implicar o agravamento (pelo preconceito ou

incompreensão) ou o alívio (pela empatia ou compreensão) da situação individual”

(BEYER, 2005, p. 92).

A avaliação, nesse paradigma, é subjetiva, pois, para um grupo preconceituoso, as

possibilidades de desenvolvimento são limitadas e a avaliação também; já para um

grupo mais compreensivo, o prognóstico desse indivíduo é bem melhor.

O trabalho de Borges et al. (2005)12 aponta essa perspectiva sociológica, na qual a

visão preconceituosa de um professor ou de uma pedagoga pode limitar o

desenvolvimento de uma criança com necessidade educacional especial. As autoras

trazem à baila um episódio de uma criança com síndrome de Down, matriculada em

um Centro Municipal de Educação Infantil, que ficou retida no mesmo período,

12Esse trabalho faz parte de uma pesquisa desenvolvida pela professora Drª Sonia Lopes Victor e consiste numa interface entre os alunos de graduação do Curso de Pedagogia que fazem habilitação em Educação Infantil e os alunos que fazem habilitação em Educação Especial juntamente com alunos mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFES. As alunas da graduação observam o cotidiano das unidades de ensino registrando num diário de campo que depois é compartilhado e refletido juntamente com os alunos mestrandos.

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porque a escola achava que, devido à sua condição de “deficiente”, não era eficiente

para progredir junto com seus pares. No entanto, segundo as estagiárias que

participaram da pesquisa, quando se compara o desenvolvimento da criança, tendo

como parâmetro os demais alunos da classe, não se percebe uma diferença

plausível que justifique tal atitude. Verificamos, claramente, uma avaliação

sociológica, na qual a deficiência sobressai ao próprio desenvolvimento da criança.

Esse ponto nos remete a um outro trabalho realizado por Jesus, Caetano e Aguiar

(2001) que, analisando o processo de construção de uma proposta de educação

inclusiva, na Capital do Espírito Santo, verificam o contexto pedagógico das

unidades pólos e percebem a ênfase de uma estratégia pedagógica pautada na

repetição e na falta de credibilidade da possibilidade de aprendizagem dos alunos

com necessidades educativas especiais, ou seja, uma prática que não considera

voltada para o atendimento à diferença.

Nesse mesmo tempo/espaço, foi analisada a avaliação que, no discurso, é tida

como constante, mas, na prática, pôde-se observar “[...] que via de regra o processo

enquanto todo é calcado nas limitações da criança e não em suas possibilidades”

(JESUS; CAETANO; AGUIAR, 2001, p. 11). Percebe-se, então, nesse trabalho, que

o olhar, a prática e a avaliação dos alunos com necessidades especiais é engessada

pela deficiência dos sujeitos.

A quarta concepção, baseada no paradigma crítico-materialista, coloca que a

deficiência é “[...] encarada como um resultado de inaptidão produtiva do indivíduo”

(BEYER, 2005, p. 92). Segundo o autor, ela é provocada pela desigualdade de

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classes sociais e, numa sociedade produtiva, as pessoas com deficiência são

consideradas impossibilitadas/ineficientes para conseguir sucesso na vida social.

Alguns estudos de Canejo (1997), Glat (1989), Rocha (1993), relatados por Nunes et

al. (1998, p. 97), demonstram que essa questão da produtividade, como marca de

indivíduo socializado, é muito delicada. Segundo os autores, “[...] trabalhar fora

significa, de uma certa forma, abandonar sua condição de excepcional, e juntar-se à

rotina diária das demais pessoas lutando por sua sobrevivência”. Por outro lado, não

conseguir se manter economicamente é uma marca visível da deficiência.

É preciso lembrar que a preparação para o trabalho das pessoas com necessidades

educacionais especiais não acontece de modo sistemático; elas geralmente ocorrem

por meio de oficinas pedagógicas (que podem ser vinculadas ou não a um trabalho)

ou oficinas protegidas ou abrigadas (que são voltadas para uma modalidade de

emprego ou uma colocação em alguma empresa) (NUNES et al.,1998).

A questão da produtividade também é mencionada pelas Diretrizes Nacionais da

Educação Especial para a Educação Básica que, em seu art. 16, aponta que os

alunos com grave deficiência mental ou múltipla e que tiverem recebido a

terminalidade específica por não apresentar resultados de escolarização devem ser

encaminhados para a educação profissional.

Esses quatro paradigmas citados por Beyer (2005) apontam formas diferenciadas de

avaliar o aluno com deficiência que refletem na sua própria constituição de sujeito e

também no seu potencial para aprender.

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Enquanto o primeiro paradigma faz sobressair a condição clínica, como determinante nas limitações individuais, o terceiro sobreleva as reações sociais diante da condição individual. Enquanto o segundo paradigma mostra a dinâmica entre os sistemas escolares (regular e especial) como forma social de lidar com o sujeito (aluno) que ‘fracassa’, o quarto busca desvelar o conceito de deficiência como resultado de uma sociedade de classes que supervaloriza a produção e a aquisição de bens de consumo (BEYER, 2005, p. 92).

Esses paradigmas, clínico-médico, sistêmico, sociológico ou crítico-materialista, são

formas culturais e sociais de conceber a pessoa com deficiência. Essas pessoas

podem ser representadas com base em uma única visão paradigmática ou podem

ser vistas na associação de mais de um paradigma.

Percebemos, também, no cerne dessas avaliações, uma forma de ver o sujeito com

deficiência tendo como critério a falta, o déficit do aluno e, conseqüentemente, um

prognóstico negativo em relação a ele. Essa avaliação unilateral, baseada no

“fracasso” do aluno, acaba provocando um

[...] rebaixamento das expectativas sociais. Para o aluno que fracassa na escola e que se suspeita ter alguma deficiência, espera-se o encaminhamento para a escola especial, ou uma progressão escolar muito lenta, o que não ‘recomendaria’ um maior investimento pedagógico (BEYER, 2005, p. 96).

Podemos perceber que as práticas de avaliação pouco têm contribuído para a

efetivação de uma educação de qualidade para os alunos que apresentam

necessidades educacionais especiais. O que elas têm apontado é uma avaliação

pautada na falta, no déficit, na concepção de um alunado que não precisa fazer

muita intervenção no seu processo de ensino-aprendizagem, pois seu potencial é

limitado. É uma avaliação pós-ativa (SACRISTÁN; GÓMEZ, 1998) que remete ao

que já passou, ao diagnóstico, ao que o aluno já sabe e que segrega/classifica

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aqueles que o professor acha que não sabe ou que sabe bem menos que os outros

colegas.

Numa perspectiva de educação inclusiva, a avaliação na educação especial, não

pode ser pautar no diagnóstico, na classificação desses alunos em comparação com

os demais. Essa prática limita o conhecimento das potencialidades, das

possibilidades do sujeito. É preciso mudar o foco da avaliação.

Eggert (1997, apud BEYER, 2005, p. 95) sugere que as transferências devem ser:

[...] a) da seleção dos alunos deficientes para escolas especiais, para a identificação das necessidades especiais dos mesmos; b) do encaminhamento a uma escola especial, para o apoio ao aluno no âmbito da escola regular; c) da justificativa do encaminhamento para a escola especial, através do laudo clínico, para a orientação e o acompanhamento pedagógico na escola regular; d) dos métodos quantitativos e normativos, para a descrição qualitativa e a consideração do contexto ou do entorno.

Nesse contexto, acreditamos que é preciso ressignificar a avaliação. Ela precisa ser

vista e usada como um elemento de íntima relação no fazer pedagógico, que dá

pistas, indícios de caminhos possíveis. A avaliação “[...] precisa, portanto, estar

incorporada ao próprio processo de ensino-aprendizagem para compreender as

reações, situações dos alunos, aspectos de sua evolução e dificuldades que possam

encontrar” (GONZÁLES, 2002, p.189).

Entendida assim, é uma avaliação que se abre para dar conta da diferença, que

atende a todos os alunos e a todas as alunas, inclusive aqueles(as) com deficiência.

Segundo Gonzalez (2001, p.194), “[...] as estratégias mais eficazes para atender à

diversidade serão aquelas que fazem da avaliação um instrumento para gerar

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informação que permita fundamentar as decisões dos professores e orientar a

atividade dos alunos”.

Se quisermos construir caminhos para a escola inclusiva, temos que repensar a

avaliação, usando-a como um dispositivo para a inclusão de alunos, sejam eles com,

sejam sem deficiência. Não cabem, neste atual contexto, práticas pedagógicas

segregacionistas que minimizem o potencial dos alunos contribuindo para o escore

da segregação dentro e fora da escola.

4.3 PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA

Embora a prática da avaliação tenha surgido fora do âmbito educacional, é nesse

espaço que ela se perpetua com o mesmo objetivo da primeira manifestação

histórica13 e acontece em todos os níveis e modalidades de ensino. Segundo

Sacristán e Gómez (1998, p. 295), entender a avaliação como prática significa

[...] que estamos frente a uma atividade que se desenvolve seguindo certos usos, que cumpre múltiplas funções, que se apóia numa série de idéias e formas de realiza-la e que é a resposta a determinados condicionamentos do ensino institucionalizado [...] ao mesmo tempo, ela incide sobre todos os demais elementos envolvidos na escolarização: transmissão do conhecimento, relações entre professores/as e alunos/as, interações no grupo, métodos que se praticam, disciplina, expectativas de alunos/as, professores/as e pais, valorização do indivíduo na sociedade, etc.

13 As primeiras manifestações históricas em torno da avaliação envolvem uma prática de exame, como, por exemplo, acontecia com a sociedade chinesa que escolhia seus funcionários por de seleção e hierarquização (SACRISTÁN; GÓMEZ, 1998; BARRIGA, 2004; DIAS SOBRINHO, 2002).

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Nesse contexto, podemos entender que, no cotidiano escolar, não existe uma

prática de avaliação e, sim, práticas de avaliação, pois dependem das concepções

dos professores e dos usos que eles fazem desse dispositivo.

Sacristán e Gómez (1998, p. 323-336), relatando sobre as funções da avaliação,

retratam a multifuncionalidade dela. Segundo eles, a prática avaliativa cumpre a

função de:

a) definição dos significados pedagógicos e sociais – por meio do ato avaliativo,

são atribuídos valores e conceitos relacionados com a qualidade do ensino e

conseqüentemente, com a qualidade do professor e do aluno;

b) função social – nessa prática está embutida a questão da certificação, que

atesta o rendimento pessoal e o nível de escolaridade, garantindo ao

individuo uma possível entrada no mercado de trabalho;

c) poder de controle – a avaliação é um instrumento de poder no qual o

professor tem o controle daquilo que irá cobrar como saber e do valor

atribuído a esse saber;

d) função pedagógica – essa função é o que legitima a ação avaliativa no

cotidiano da escola, porém não é a mais determinante. Várias outras funções

são intercruzadas na função pedagógica e acabam interferindo no modelo

proposto;

e) funções na organização escolar – a avaliação tem a função de organizar o

sistema escolar para garantir a escolarização. Entretanto, para dar conta

dessa função, utiliza-se de mecanismos de regulação e classificação

impedindo que muitos alunos avancem nos seus estudos;

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f) projeção psicológica – a prática da avaliação tem essa função, porque se

projeta sobre a motivação dos alunos que passa a ser controlada muito mais

por fontes extrínsecas do que intrínsecas; também se projeta sobre o

comportamento; sobre as atitudes; sobre a intensificação de ansiedades; e

sobre a auto-estima dos sujeitos;

g) apoio da investigação – a prática da avaliação vem servindo como fonte de

dados para avaliar o sistema educacional.

Com refererência a função pedagógica, Sacristán e Gómez (1998) citam vários

pontos a serem refletidos dentro dessa função: a avaliação cria um ambiente escolar

que interfere nas relações interpessoais entre alunos/alunos e alunos/professores.

Esse clima é instigado pelos resultados das provas, pelo controle da disciplina para

que haja aprendizagem, pelas atividades que são realizadas e que depois serão

avaliadas, etc.

Outra função é a diagnóstica, que é utilizada como um recurso para se conhecer os

processos de aprendizagem, visando a uma possível intervenção. Essa função tem

vários sentidos: a) avaliação inicial (para detectar os conhecimentos prévios dos

alunos e também para conhecer as condições globais, dentre elas, condições

familiares, sociais e econômicas); b) avaliação formativa (para conhecer o curso dos

processos de aprendizagem e procurar intervir); c) avaliação somativa (para

determinar o estado final do processo de aprendizagem dos alunos).

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Embora a função diagnóstica tenha esses três aspectos, na prática, em muitos

cotidianos da escola, a avaliação somativa, que é o resultado da prova, do processo,

do bimestre, é o que tem um maior valor e o tipo de avaliação mais usada.

Ainda dentro da função pedagógica, procura-se adaptar os processos pedagógicos

ao ritmo dos alunos, ou seja, pode ser usada com o sentido de recurso para a

individualização do ensino. Também tem a função de garantir a aprendizagem,

orientar os processos, servir de base prognóstica e de referência para a construção

do currículo.

Podemos observar, nas funções da prática avaliativa expostas por Sacristán e

Gómez (1998), o quanto falar sobre avaliação é complexo e necessário. Neste

trabalho, vamos nos ater à prática da avaliação enquanto função pedagógica.

Esteban (2003), fazendo uma análise geral desse tipo de prática no contexto

escolar, percebe que, atualmente há três perspectivas que coexistem. A primeira

impõe um retorno ao padrão rígido de avaliação quantitativa vivenciada pelo controle

da avaliação nacional (SAEB, ENEM, ENADE), que acaba provocando uma

homogeneização curricular e uma visão de que todos devem ter acesso ao mesmo

conteúdo, no mesmo ritmo e, conseqüentemente, uma avaliação padronizada. A

busca pela suposta qualidade acaba classificando os alunos e as instituições

conforme o escore dos resultados.

A segunda perspectiva aponta uma consolidação de um modelo híbrido, que

destaca a aprendizagem como um processo, fazendo com que a escola considere o

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tempo, o ritmo dos alunos. Nesse contexto, embora haja mudanças na concepção

de avaliação, ela é vista como um controle ou como um instrumento para comparar

o desempenho individual em relação ao desempenho da turma.

A terceira, defendida por Esteban, se pauta na construção de uma avaliação

democrática imersa numa pedagogia da inclusão. Tal perspectiva valoriza a

heterogeneidade, leva em conta a complexidade de uma sala de aula,

compreendendo os ritmos individuais, intervindo nos processos e valorizando os

saberes de modo a não dicotomizar os que sabem daqueles que não sabem.

Percebemos, nessa análise que as duas primeiras práticas, embora em nível

diferenciado, propõem uma classificação, uma hierarquização conforme os

resultados obtidos. É uma prática de exame

[...] que reduz a riqueza e complexidade dos processos de aprendizagem e de ensino, das relações sociais nas quais as relações pedagógicas se constituem e dos sujeitos que aprendem e que ensinam, como a materialização da concepção positivista de conhecimento (ESTEBAN, 2003, p.17).

Essa prática de classificar, de selecionar em nada contribui para que o aluno

aprenda e revela, como nos diz Esteban (2003, p. 23), a ambivalência da avaliação

Nesse cotidiano escolar, avaliando e sendo avaliada, a professora vai aprendendo duas lições contraditórias: é preciso classificar para ensinar; e classificar não ajuda a ensinar melhor, tampouco a aprender mais – classificar produz exclusão e para ensinar é indispensável incluir. Contradição facilmente abrigada na ambivalência da avaliação, que promete medir para incluir em alguma categoria de classificação, produzindo uma opacidade que não deixa que se perceba que algumas categorias nas quais os alunos e alunas, professoras e professores são incluídos só produzem exclusão.

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Já a terceira perspectiva de prática nos reporta a uma outra forma de conceber e

viver a avaliação. Esteban (2001) pensa a avaliação como uma prática investigativa,

que percebe o cotidiano como múltiplo, facetado e complexo. Pensando dessa

forma, estará aberta à diferença, à inclusão, porque o paradigma não é posto sob a

igualdade e sim sobre a heterogeneidade.

Esteban (2001, p. 165) coloca que

[...] a avaliação como processo de classificação está presa à homogeneidade, como prática de investigação abre espaço para a heterogeneidade, para o múltiplo, para o desconhecido [...]. As diferenças entre os/as alunos/as deixam de ser interpretadas como deficiências que precisam ser corrigidas para serem assumidas como particularidades que devem ser exploradas e integradas à dinâmica coletiva.

Nesse ponto de vista, contribui para um olhar que não classifica e que não separa os

sujeitos conforme os padrões curriculares preestabelecidos. É uma prática que “[...]

investe na busca do ainda não-saber, que trabalha com a ampliação do

conhecimento, movimento permanente em que há sempre conhecimentos e

desconhecimentos” (ESTEBAN, 2001, p. 166).

A avaliação investigativa é aquela que não tem a intenção de classificar, mas sim de

buscar indícios daquilo que o aluno sabe e daquilo que ele ainda não sabe e

construir possibilidades para que ele venha a aprender. Ela corporifica o avaliado

como sujeito que está inserido num cotidiano, o que difere do avaliado numa visão

metafísica, que objetiva encontrar os princípios que regularizam, que mantêm a

igualdade. É mister avaliar não separando o que se avalia das condições da

produção desse conhecimento. Ou seja, não se pode avaliar só o sujeito, o aluno,

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mas é preciso, de forma dialética, avaliar também o próprio avaliador e o cotidiano

que favorece ou não as condições de aprendizagem.

É uma avaliação que vai abrir caminhos para que o professor incida na “zona

proximal”. 14

O conceito de zona de desenvolvimento proximal constitui um instrumento significativo para explorar a diversidade de conhecimento e a pluralidade de processos para a sua construção, além de estabelecer mecanismos para a construção de conhecimentos novos e mais amplos que os anteriores. Esse conceito implica um professorado que reflete sobre sua ação articulando um diálogo permanente em que se entretecem a teoria e a prática (ESTEBAN, 2001, p. 164).

Tal pressuposto remete a uma superação das práticas avaliativas e pedagógicas

que se têm, nas quais, muitas vezes, se cristaliza o aluno como aquele que não

aprende, que não consegue. Atuar na zona proximal é caminhar junto com o aluno e

perceber todo o seu processo de aprendizagem e não apenas o produto final. Essa

prática favorece a inclusão daqueles alunos que, historicamente, foram alijados de

estarem na escola regular porque não se enquadram num “padrão de normalidade”.

Acreditamos que a avaliação, como prática investigativa, contribui para uma prática

de inclusão que favoreça a todos no processo educacional.

14 O conceito de zona proximal é definido por Vigotsky (1997, p. 86) como “[...].funções que ainda não estavam amadurecidas, mas em processo de maturação; funções que, amanhã, estarão maduras, mas que hoje estão em estado embrionário [...]. O nível de desenvolvimento real caracteriza o desenvolvimento mental respectivamente, enquanto a zona de desenvolvimento proximal caracteriza o desenvolvimento mental prospectivamente”.

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5 COTIDIANO, INCLUSÃO E AVALIAÇÃO: INTRODUZINDO A PESQUISA

5.1 A PESQUISA

Buscando ser coerente com a construção teórica de Lefebvre, que analisa o

cotidiano para perceber o vivido, escolhemos, como questão de investigação da

nossa pesquisa, compreender as práticas de avaliação no contexto da escola, tendo

como referência as práticas pedagógicas dos professores e a reflexão sobre a

avaliação no processo de inclusão de alunos com necessidades educacionais

especiais.

Queríamos saber, de modo específico: como os professores usavam as práticas

avaliativas no seu cotidiano; se havia consenso entre o concebido e o vivido; se

havia uma relação entre o ato de avaliar e as ações pedagógicas que serviram de

intervenção para os alunos e se estas contemplavam as diferenças dos educandos

na sala de aula; se as avaliações eram presentificadas de modo a contribuir com a

aprendizagem de todos, inclusive dos alunos com necessidades educacionais

especiais.

Nesse sentido, buscamos um tipo de pesquisa que não se caracterizasse como um

desvelamento crítico de uma realidade, pois nossa intenção, como pesquisadora,

não se remetia à idéia de construir um arcabouço de supostas verdades a serem

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passadas, pois sabemos que, na complexidade que emerge do cotidiano, isso não

seria viável e nem possível.

Nesse sentido, encontramos respaldo na pesquisa qualitativa denominada estudo de

caso do tipo etnográfico15 que, segundo André (2005), é um estudo em profundidade

de um fenômeno educacional, cuja ênfase está na singularidade e leva em conta os

princípios e métodos da etnografia.

A pesquisa etnográfica deriva das pesquisas usadas por antropólogos para estudar

a cultura de um grupo social, porém, no campo da educação, o seu objetivo é

compreender o processo educativo. Sendo assim, a autora afirma que há diferenças

entre um estudo de caso etnográfico (realizado pelos antropólogos) e um estudo de

caso do tipo etnográfico “[...] o que faz com que certos requisitos da etnografia não

sejam – nem necessitem ser – cumpridos pelos investigadores das questões

educacionais” (ANDRÉ, 2005, p. 28).

Entretanto algumas características permanecem, tais como: a relativização, que

provoca no pesquisador um estranhamento para poder investigar o objeto de estudo;

o uso da observação participante e da entrevista como instrumento de coleta de

dados; a duração do contato direto do pesquisador com a situação estudada, que

pode variar de algumas semanas até alguns anos, dependendo dos objetivos

específicos; e a descrição dos dados coletados (ANDRÉ, 2005).

15 Sabemos que existem autores que apontam outras metodologias de pesquisa para o estudo no cotidiano. Entretanto, optamos pelo estudo de caso do tipo etnográfico por que a nossa intenção, não é a pesquisa no e do cotidiano, mas sim, estudar o cotidiano, sob a luz de Lefebvre, vendo-o como um lugar grávido de possibilidades e de mudanças constantes.

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Assim, a opção por esse tipo de pesquisa pode permitir a compreensão de uma

prática singular num contexto de uma escola de ensino fundamental e entender

como a avaliação foi concebida e vivida no cotidiano que é atravessado pela

inclusão.

5.2 COLETA DE DADOS

Com o objetivo de tentar compreender como a escola pesquisada e a Secretária de

Educação do município de Guarapari - ES pensam sobre a avaliação e a inclusão,

usamos, como instrumento de coleta de dados: a entrevista semi-estruturada; a

análise documental e a observação.

Optamos pela entrevista por ser um instrumento que proporciona,

[...] um processo de interação social, verbal e não-verbal, que ocorre face a face, entre um pesquisador, que tem um objetivo previamente definido, e um entrevistado que, supostamente, possui a informação, que possibilita estudar o fenômeno em pauta, cuja mediação ocorre, principalmente, por meio da linguagem (MANZINI, 2005).

Entendendo-a como um processo de interação, realizamos uma entrevista semi-

estruturada que, segundo Triviños (1987, p. 146), parte de “[...] questionamentos

básicos [...] que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo

de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se

recebem as respostas do informante”. Tal opção nos permitiu um diálogo com os

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entrevistados de modo que eles não se sentiram “acuados”, ameaçados com a

presença de um outro interrogando-os sobre o seu saber e seus modos de fazer.

Outro tipo de instrumento usado foi a análise documental, que, segundo Lüdke e

André (1986), é uma técnica que serve tanto para complementar informações já

obtidas como para desvelar aspectos novos de um tema. A análise documental

buscou identificar informações factuais nos documentos, a partir de questões ou

hipóteses do interesse da pesquisa. Foram usados, como objetos de análise: o

projeto político-pedagógico da escola, o plano decenal do município, o regimento

das escolas municipais, as portarias do município pertinentes à avaliação, os

instrumentos avaliativos, o diário de classe, o caderno dos alunos na classe e

também, o usado na sala de recurso.

Quanto à observação, foi feita a do tipo participante, porque esta é vista, não só

como uma técnica de captação de dados, mas também como uma forma de

intervenção (MATOS; VIEIRA, 2002). Usamos essa forma de observação com o

intuito de observar, compreender o que era essencial para nossa pesquisa,

perfazendo a análise em duas classes do turno vespertino da escola que tinham

alunos com deficiência.

A escolha desses instrumentos de coleta de dados para uma pesquisa do tipo

estudo de caso contribuiu para a análise do cotidiano voltada para a compreensão

da inclusão e das práticas de avaliação naquele contexto.

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5.2.1 Procedimento de pesquisa

A pesquisa na escola começou em abril de 2006, quando conversamos com a

diretora da escola e com as pedagogas, colocando nossa intenção de realizar este

trabalho naquela instituição. A receptividade foi satisfatória, pois já tinhamos um

vínculo com essa unidade, devido ao fato de a nossa localização, como professora

efetiva do município, ser nessa escola.

Esclarecemos para todos, naquela reunião, o objetivo da pesquisa e acertamos que

começaríamos a observação a partir de maio de 2006, quando se iniciaria o ano.

Participamos, antes de entrar na sala de aula, do Conselho de Classe fechando o

ano letivo de 2005, e também da primeira reunião que a diretora fez com os

professores, colocando-os a par das mudanças que iriam acontecer naquele ano.

Informou que, devido ao atraso do ano letivo, por causa da greve no ano de 2005,

muitas famílias retiraram seus filhos da escola pública e isso ocasionou uma

diminuição no número de alunos e, conseqüentemente, no número de turmas.

Pensamos que a diretora, nesse dia, fosse nos apresentar para as professoras, mas

isto só aconteceu no outro dia, na hora do recreio, quando as pedagogas, Renata e

Janete, 16 formalizaram a nossa estada naquele contexto.

16 Apesar de os sujeitos concordarem em participar da pesquisa os nomes que aparecem no decorrer do trabalho são fictícios para assegurar a privacidade dos mesmos.

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Foi colocado para as professoras que iríamos observar as salas da 3ª série, da

professora Iza, e da 4ª série, da professora Izabela, mas que a entrevista deveria

acontecer com todos os professores e que contávamos com a colaboração deles.

A idéia inicial do projeto de pesquisa era observar a sala da 1ª série e da 4ª série,

pois eram, a nosso ver, as etapas nas quais os dilemas da avaliação se

presentificavam com maior intensidade. Entretanto, naquele ano, não havia aluno

com uma necessidade educacional especial por deficiência naquela série. As

pedagogas, então, sugeriram que ficassemos na sala da 3ª e 4ª, pois nestas havia

alunos com deficiência.

Ficamos na escola de 8 de maio até meados de setembro de 2006. Organizamos

nossa coleta de dados realizando, a princípio, as entrevistas com as professoras

durante as aulas de Educação Física. Mesmo assim, não conseguimos entrevistar

cinco professores que sempre alegavam não ter tempo, pois ora tinham que

planejar, ora preparar atividades, ora preencher diário, enfim, tinham sempre uma

justificativa que nos fez entender e aceitar a não participação nas entrevistas.

Paralelamente à coleta de dados, usando a técnica da entrevista, fazíamos a

observação dentro das salas selecionadas e também a análise de documentos

pertinentes à escola, à sala de aula e à Secretaria de Educação. Íamos, a princípio,

uma vez por semana em cada classe, depois, com o término das entrevistas,

aumentamos para dois dias em cada sala. Essa divisão, muitas vezes, não era tão

igualitária, pois, na sala da 3ª havia um aluno surdo e não tinha intérprete para

atendê-lo. Tendo a pesquisa, como um dos instrumentos de coleta de dados a

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observação participante e sabendo a pesquisadora a Língua Brasileira de Sinais

(LIBRAS) ficou acordado que ficaríamos mais tempo nessa sala para poder ajudar o

aluno.

Nosso procedimento nas classes era entrar, dar boa tarde para os alunos e sentar

sempre no final da classe de modo a não “atrapalhar” o andamento da aula. Íamos

sempre registrando no diário de campo tudo que observávamos e que achavámos

que era essencial para a nossa pesquisa.

Durante a observação participante, após a abertura da aula pela professora e depois

de ela explicar o que era para ser feito, ajudávamos os alunos a fazerem as

atividades ou interpretávamos para o aluno Pedro. Ora oferecíamos ajuda, ora eles

vinham até nossa mesa solicitando. Esse apoio era dado tanto aos alunos com

deficiência como aos demais alunos da classe.

Após os quatro meses de observações e término das entrevistas, conversamos com

as pedagogas, passando as nossas impressões sobre aquilo que havíamos

observado e visto naquele cotidiano. Propusemo-nos a fazer um estudo com elas

sobre questões que envolviam a inclusão, prática pedagógica inclusiva e avaliação.

A proposta deste estudo era criar um momento na escola no qual a equipe pudesse

parar para refletir sobre suas dificuldades e pensar juntos como poderiam equalizar

algumas saídas. Ficou acordado que esse estudo seria realizado em dois dias (3 e 7

de agosto), sendo duas horas em cada sessão e o estudo seria na própria unidade

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de ensino. A escolha por esses dias foi aproveitando o período de reforma na

escola, já que os alunos eram liberados na hora do recreio.

O estudo foi constituído por professores do turno vespertino, por pedagogos e pela

professora da sala de recursos. Para os encontros do grupo de estudo, demos um

título que expressava nosso intuito coordenando o grupo de profissionais daquela

escola: “Reflexão sobre a inclusão”. Nossa intencionalidade, era construir uma

relação dialógica que desse voz ao grupo daquela escola e colaborasse para uma

auto-reflexão daqueles autores pertencentes àquela escola, demonstrando que eles

tinham saberes que permitiam aquele cotidiano ser único e constituído de

potencialidade.

No primeiro dia, os participantes receberam uma folha para preencher na qual eles

completavam os quadrinhos com aquilo que lhes era solicitado (Quadro 1). Depois,

fazíamos uma exposição oral e um debate com argumentações teóricas, tentando

relacionar teoria e prática.

ESTUDO REFLEXIVO SOBRE A INCLUSÃO

O QUE É INCLUSÃO?

QUAIS OS PRICÍPIOS PARA UMA EDUCA-ÇÃO INCLUSIVA?

COMO PODEMOS DE-SENVOLVER UM TRA-LHO QUE FAVOREÇA A INCLUSÃO?

O QUE PODEMOS MELHORAR NA NOS-SA PRÁTICA PARA FAZERMOS UMA EDU-CAÇÃO PARA TODOS?

QUADRO 1 - ESTUDO REFLEXIVO SOBRE A INCLUSÃO

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Nesse estudo, foram debatidas algumas questões sobre: a inclusão; os princípios

que estavam presentes nesse movimento; o trabalho pedagógico para favorecer

uma educação para todos; e também falamos sobre as práticas de avaliação.

Apresentamos o estudo de Almeida (2004), que aborda sobre o trabalho

colaborativo e a proposta de ensino em multinível.

O estudo acabou sendo um momento ímpar para que os profissionais da escola

pudessem parar para refletir um pouco sobre a inclusão e avaliação presentificadas

no cotidiano da Escola Bansalu.

5.3 O CONTEXTO DA PESQUISA

5.3.1 A cidade de Guarapari

“Quer viver um sonho lindo Que eu vivi

Vá viver as maravilhas de Guarapari [...]”

(PEDRO CAETANO)

Guarapari, cantada em versos e prosas pelo poeta Pedro Caetano, é uma cidade

litorânea do Estado do Espírito Santo e fica a 41,75km da capital ─ Vitória. É

considerada uma cidade turística de fama internacional, devido às propriedades

medicinais de suas areias monazíticas. Sua área territorial compreende uma

superfície de 581,90km2 e sua população é aproximadamente 88.216 habitantes por

Km2.

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Para atender à escolarização de seus munícipes há, na cidade, 93 instituições de

ensino, 69 municipais, 10 estaduais e 14 particulares. Essas escolas, conforme o

Quadro 2, atendem desde a educação infantil até o ensino médio. Atualmente, os

moradores podem ingressar no ensino superior sem se deslocar da cidade para

outros centros, pois já existem, no município, quatro instituições oferecendo cursos

nas áreas: educacional, jurídica, biomédica, jornalismo, administração e turismo.

Modalidade Rede Municipal Rede Estadual Rede Privada

Educação Infantil 30 - 12 Ensino Fundamental 55 10 10 Ensino Médio - 07 04 Escolas Especiais - - 02 Total17 69 10 14 QUADRO 2 - QUANTIDADE DE ESCOLAS CONFORME A REDE E MODALIDADE DE ENSINO Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Guarapari - SEMED

Conforme os dados do Quadro 2, podemos perceber que as escolas que compõem

o Sistema de Ensino da Rede Municipal de Guarapari perfazem um total de 69

instituições das quais 38 se localizam na área urbana e 31 na área rural, sendo

estas, em sua maioria, unidocentes. O número de alunos matriculados no ano letivo

de 2006 perfaz um total de 16.001 estudantes distribuídos conforme os dados do

Quadro 3.

NIVEL DE ENSINO Nº DE ALUNOS Creche 696

Educação Infantil Pré-escola 1.869 1ª a 4ª (incluindo o ciclo de alfabetização) 7.336 5ª a 8ª 3.931

Ensino Fundamental

EJA 2.169 Total 16.001 QUADRO 3 - DISTRIBUIÇÃO DE NÚMERO DE ALUNOS POR NÍVEL DE ENSINO Fonte: Departamento de projetos e planejamento educacional - SEMED

17 A somatória dos números de escolas não fecha com os números listados na tabela, pois uma mesma instituição pode oferecer diferentes níveis de ensino.

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A Secretaria Municipal de Educação de Guarapari (SEMED) tem sede própria e seu

organograma é composto de três Departamentos, a saber: Departamento de

Educação, Departamento Administrativo e Financeiro e Departamento de Projetos e

Planejamento Educacional.

Cada departamento tem suas atribuições e organogramas específicos. No

organograma do Departamento de Educação, há um cargo de diretor e várias

divisões: de ensino fundamental, de educação infantil, de apoio ao educando e de

alimentação escolar. Existem ainda, ligadas ao ensino fundamental, equipes de:

acompanhamento do ensino fundamental, de educação especial, de educação de

jovens e adultos (do 1º ao 4º ciclo), de acompanhamento das escolas da zona rural,

e a equipe de inspeção escolar.

A equipe de educação especial, que ficava na SEMED, era composta, em 2003, por

dois profissionais e, em 2006, passa a ter três componentes, que são responsáveis

pela implantação e implementação de uma política educacional inclusiva, voltada

para alunos com necessidade educacional especial por deficiência. Entre as

políticas visando à inclusão estão: a abertura da sala de recursos18 para

atendimento de alunos com deficiência mental, condutas típicas, dificuldades

acentuadas de aprendizagem, surdos, cegos e baixa visão; a perspectiva de um

trabalho colaborativo entre professor especialista e professor da sala regular;

acompanhamento às escolas para saber sobre o desenvolvimento dos alunos

atendidos pela equipe de educação especial; formação continuada para todos os

professores da rede, com seminários, cursos e palestras. 18 Os alunos surdos e cegos, por demandarem um atendimento mais específico, possuem salas de recursos em espaços diferenciados das outras deficiências. Em algumas escolas, podem ter duas salas de recursos para atender às modalidades diferenciadas.

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5.3.2 A Escola

A instituição escolhida como loco da pesquisa foi uma Escola Municipal de

Educação Infantil e Ensino Fundamental (EMEIEF) de Guarapari – ES, que passa a

ter o codinome de “BANSALU”. Essa escola foi inaugurada em 1990, na gestão de

Benedito Soter Lyra. Desde a época da sua fundação, passou por três reformas. A

última foi no ano de 2006, coincidindo com o período da pesquisa, e que acabou

provocando no ambiente escolar certas inquietudes: pelo barulho, pelo cheiro de

tinta, pela poeira, pelo tumulto natural a qualquer obra, quando o espaço é co-

habitado.

A escola possui uma área de 626,40m2, localiza-se no bairro Lagoa Funda e atende

alunos oriundos dessa própria comunidade como também de comunidades

adjacentes. A maioria dos discentes pertence a uma classe econômica que tem

como renda familiar de um a cinco salários mínimos.

A estrutura física da escola corresponde a: dezesseis salas de aula, uma sala de

professor, uma sala para diretor e adjunto, uma sala para coordenação, uma sala

para os pedagogos, uma secretaria, quatros banheiros para alunos, uma sala de

recurso, uma sala de aula na qual é improvisada uma biblioteca, uma cantina, uma

cozinha, uma área coberta e equipada com mesas e bancos para ser usada como

refeitório, uma dispensa na qual é guardada material pedagógico e merenda, uma

área com areia na qual é praticada as aulas de Educação Física. Além dessas áreas

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descritas, a SEMED, ainda aluga uma casa na proximidade da escola, que é

destinada à educação infantil de crianças com quatro e cinco anos.

O quadro de funcionários da escola compreende um contingente de 88 pessoas,

sendo: sessenta professores, dois professores especialistas, um diretor, um diretor

adjunto, quatro coordenadores de turno, cinco pedagogos, quatro secretários, onze

auxiliares de serviços gerais (merendeira, servente e vigias).

A unidade atendeu, em 2006, a 96 alunos na educação infantil e 763 no ensino

fundamental, incluindo os alunos da EJA. A organização curricular é por série e por

ciclos (EJA e o ciclo de alfabetização). 19 Ela atende os alunos em três horários:

matutino, vespertino e noturno. No vespertino, que é o foco da nossa análise, ela

possui três salas de educação infantil e dez de ensino fundamental que

compreendem a: quatro salas de ciclo básico de alfabetização, duas de segunda

série, duas de terceira série e duas de quarta série. Para atender a essas turmas, a

escola conta com um contingente de doze professoras, sendo um professor de

Educação Física e um professor especialista.

O ano letivo de 2006 foi atípico da escola. Iniciou-se em maio de 2006, devido a uma

greve geral do Magistério em 2005, por reivindicações de perdas salariais e outras

questões trabalhistas, o que ocasionou um atraso no término do ano anterior e,

conseqüentemente, um atraso no ano de 2006. Além desse evento, houve, ainda,

durante o ano várias paralisações e a reforma da escola o que prejudicou o

19 Somente as classes de alfabetização são por ciclo, porque o município aderiu à proposta do Governo Federal de Educação ampliada. O Projeto de Educação Ampliada do município é baseado na Resolução do COMEG nº 003/2004, mas a efetivação da proposta só aconteceu a partir do ano de 2006, transformando as turmas de pré III como parte do ensino fundamental.

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andamento e trouxe uma série de conseqüências, como: alteração do calendário

escolar, esticando o ano de 2006 até março de 2007; retirada dos momentos de

planejamento e dias de estudo, o que dificultou uma interação coletiva dos

professores em prol de um objetivo comum; insatisfação dos pais dos alunos por

conta do atraso no ano escolar; reorganização dos Conselhos de Classe, deixando

de ser um encontro coletivo para ser um diálogo entre o professor e o pedagogo da

escola.

5.4 OS SUJEITOS DA PESQUISA

Na nossa análise dos dados, o foco da pesquisa se encontra em duas turmas que

apresentavam matrículas de alunos com necessidades educacionais especiais. As

duas turmas escolhidas foram a 3ª série da professora Iza, que tinha 26 alunos, e

entre esses um aluno surdo ─ Pedro ─ e um aluno com deficiência múltipla ─

Fernando; e a outra turma era a 4ª série da professora Izabela, que tinha 30 alunos,

incluindo um aluno com deficiência mental – Emanuel.

A professora da 3ª série tem licenciatura em Pedagogia e está fazendo pós-

graduação em Supervisão Escolar. Tem 16 anos de Magistério e busca sua

formação participando de cursos e seminários oferecidos pela SEMED. Não tem

nenhum curso específico de educação especial, mas fez uma disciplina na

graduação cujo conteúdo abordava o tema inclusão. A professora Izabela tem

Magistério e licenciatura em História. Há 13 anos atua como professora e faz sua

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formação continuada por meio de cursos, mas não tem nenhum específico na área

de educação especial.

Em relação aos alunos com deficiência dessas salas, temos Fernando, Pedro e

Emanuel. O aluno Fernando foi uma criança que nasceu prematura, com peso de

1.230g e várias complicações pós-parto: teve hipoglicemia no segundo dia de

nascido e parada cardiorrespiratória que se repetiu por três vezes consecutivas.

Após exame de ressonância magnética, pôde-se detectar que ele apresentava uma

agenesia do vérmix cerebelar e hipoplasia do hemisfério cerebelar esquerdo, com

aparente fusão entre os hemisférios cerebelares. Seu desenvolvimento físico foi em

meio a crises convulsivas e atraso no desenvolvimento motor e de linguagem.

Seu início de escolarização foi na pré-escola, na qual ficou até 2003, quando entrou

no ensino fundamental em uma escola pública. Para essa escola, na qual esta

sendo realizada a pesquisa, ele veio em 2005. Foi uma época de adaptação difícil,

na qual ele ficava meio período, pois sempre se cansava das atividades e começava

a mexer com os colegas, queria sair da sala toda hora e a estratégia que a escola

encontrou, para ambos, foi a redução do tempo diário na escola. Uma das possíveis

causas desse ato era porque ele estava na 1ª série, com crianças muito pequenas,

as quais ele não identificava como seus pares. Resolveu-se, então, após reunião

com a equipe da SEMED, colocá-lo numa turma de 2ª série, em que havia alunos

maiores e onde ele conseguiu se ambientar com a turma e com a professora. No

final do ano letivo de 2005, embora, segundo a escola, Fernando não tivesse

condições de ir para a 3ª série, ele foi “aprovado” por causa da professora Iza, que

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seria a professora da turma e era a única na escola que conseguia domínio para

mantê-lo dentro da sala.

Pedro é um aluno que apresenta surdez profunda bilateral congênita. Ele se

comunica por meio de Língua de Sinais, mas também emite algumas palavras e tem

uma boa percepção da oralidade, fazendo leitura labial. Freqüentou, antes de ser

incluído, nesta escola, no ano de 2004, uma classe especial de alfabetização para

surdos. O município oferecia atendimento em contraturno para Pedro, porém,

mesmo com o apoio sua adaptação, foi difícil, pois não havia ninguém na escola que

soubesse LIBRAS para servir de interlocutor entre o aluno e os demais

componentes da escola. Isso acabava gerando mal-entendimento das regras e

comportamento desafiante no qual o aluno assumia uma postura de defesa em

frente à dificuldade de comunicação. Essa dificuldade só melhorou quando um

professor da escola se mobilizou para aprender LIBRAS e passou a trabalhar com

ele. No ano de 2006, ele ia trocar de escola para acompanhar a professora que

sabia se comunicar com ele, porém sua família resolveu retorná-lo para a mesma

escola, pois a outra ficava distante da sua residência. Ele voltou para a sua mesma

turma, agora a 3ª série da professora Iza, na qual parte dos alunos já sabiam se

comunicar com Pedro.

O outro aluno, pertencente à 4ª série, era Emanuel, que sempre foi uma criança fácil

de se lidar, pois obedecia às regras impostas, não brigava, ficava sempre no seu

canto, porém tinha extrema dificuldade para aprender o que a escola ensinava. Ele

já havia feito um trajeto de escolarização escola regular – escola especial – escola

regular, mas, mesmo assim, não tinha laudo que testificasse uma deficiência. Isso

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fazia com que a escola não o tratasse como tal, mas também não era visto como

uma criança “normal”. Ele já tem 15 anos e várias histórias de reprovação. Apesar

de ter ficado alguns anos na 1ª série, ainda não domina a leitura nem a escrita,

conseguindo apenas decodificar algumas letras/sílabas e algumas palavras. Agora,

em 2006, orientaram a família a procurar ajuda médica na tentativa de encontrar um

diagnóstico para ele. Essa preocupação com um laudo que ateste a deficiência é

fruto de uma história marcada pelo paradigma clínico-médico que se pauta numa

busca por uma causa orgânica/biológica que justifique a “impossibilidade” do

trabalho pedagógico com esse aluno.

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6 A EDUCAÇÃO ESPECIAL DE GUARAPARI NO MOVIMENTO DE INCLUSÃO:

POLÍTICAS QUE RESSOAM NAS ESCOLAS

Antes de analisarmos o movimento da inclusão na escola, precisamos compreender

que ações, que políticas são realizadas no município para viabilizar a inclusão de

alunos com necessidades educacionais especiais.

A princípio, é bom ressaltar que não há documento oficial no município referente à

educação especial para a educação básica. O que encontramos foram registros

sobre a educação especial dentro de documentos específicos da educação

municipal, tais como, a legislação que transforma a rede municipal em sistema de

ensino (Lei nº 1.964/ 2000) e também no Regimento Comum das Escolas Municipais

que aponta algumas diretrizes sobre o acesso e a permanência dos alunos com

necessidade educacional especial nas instituições de ensino.

Essa falta de documentação20 para normatizar a educação especial deixa

transparecer uma situação ambígua. De um lado, a situação de não dicotomizar

educação especial e educação regular, que é um ponto positivo, pois expressa uma

visão de educação que integra a educação especial; por outro lado, a falta da

normatização pulveriza as ações políticas voltadas para tal modalidade que fica

muitas vezes colocada em segundo plano.

20 O posicionamento em relação à falta de documentação específica não significa a busca por legislação que engessa e homogeneíza as ações, mas sim, a nosso ver, um documento para orientar uma política de inclusão.

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Nos documentos encontrados, a educação especial aparece como modalidade do

ensino e deve ser oferecida em todas as etapas da educação básica. Na análise do

Regimento Comum das Escolas Municipais, podemos encontrar, em relação ao

atendimento, que este deve ser oferecido desde a educação infantil e se constitui

como um dos objetivos e fins da educação (art. 6º, VI). Quanto aos sujeitos desse

atendimento, o documento é omisso, garantindo apenas atendimento especializado

conforme cada especificidade.

Essa não clareza dos sujeitos que serão atendidos acaba pulverizando as ações e

abarcando um grande contingente de alunos para a educação especial contribuindo,

assim, para um olhar cada vez mais diferenciado.

Em relação ao acesso, o documento garante matrícula desde a educação infantil até

o ensino fundamental e acrescenta que, na organização das classes e das turmas

estas deverão ter número de alunos conforme a especificação do Regimento. As

salas de 1ª e 2ª séries deverão ter 25 alunos, já as de 3ª e 4ª deverão ter 30.

Entretanto, “[...] nas classes de ensino regular o número de alunos com

necessidades educacionais não poderão ultrapassar a dois (02), considerando no

agrupamento a especificidade” (art. 86).

Essa limitação de número de alunos com necessidade educacional especial por

turma ou classe pode ter conseqüências diversas. Se por, um lado, contribui para

que os alunos não sejam “alojados” todos em uma única sala e possibilita a vários

professores a experiência em trabalhar com eles, por outro, pode causar rejeições

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de matrículas argumentando que a sala já tem o número de alunos conforme a

especificação do documento.

Nesse contexto, percebemos que as ações políticas da educação especial voltadas

para a inclusão em Guarapari (ES) não diferem das ações no âmbito nacional. Elas

estão consoantes com a Lei nº 9.394/96 e a Resolução nº 2/2001, tal como as

demais Secretarias de Educação, sejam elas municipais, sejam estaduais (PRIETO,

2004).

Analisando os dados do Censo de 2006, vemos que há um número representativo

de alunos com deficiência matriculados na rede municipal. Cabe também ressaltar o

quantitativo de alunos apresentados como tendo condutas típicas, que sozinhos

representam mais de 50% do total de alunos com deficiência matriculados na rede

regular de ensino. É importante analisar o que significa condutas típicas e que tipo

de alunado é considerado como tal, pois, essa categoria é muito ampla e complexa.

Especificidade da deficiência Quantidade Surdez ou deficiência auditiva 45 Cego ou baixa visão 10 Deficiência física 12 Deficiência mental 67 Autismo 04 Síndrome Down 05 Altas habilidades 04 Condutas típicas 187 Total 334 QUADRO 4 - MATRÍCULAS DE ALUNOS COM ALGUMA DEFICIÊNCIA NAS ESCOLAS

MUNICIPAIS DE GUARAPARI Fonte: Departamento de Projetos e Planejamentos Educacionais – SEMED

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Em relação aos 334 alunos demonstrados na Figura 11 esse contingente

corresponde apenas a um percentual de 2,09% dos alunos matriculados nas escolas

municipais. Esses dados nos impulsionam a refletir sobre o porquê desse percentual

tão baixo. Três apontamentos surgem dessa questão: primeiro, a presença de

instituições especializadas (APAE e PESTALLOZZI) que, devido à tradição histórica

em atender os alunos com deficiência, acabam sendo um caminho para as famílias

matricularem seus filhos e para as escolas encaminharem os alunos com deficiência;

segundo, é que o município precisa intensificar a política de acesso dessas crianças

nas escolas, verificando o contingente de alunos que está fora para poder matriculá-

los; e terceiro, trabalhar nas escolas com questões de identificação desses alunos,

pois, na hora do preenchimento do censo, muitos alunos que aparentam ter

necessidades educacionais especiais não são arrolados por não terem laudos que

legitimam a inclusão deles no rol de alunos da educação especial.

Prietto (2004) nos chama a atenção, colocando que um dos passos para o município

efetivar as políticas de inclusão perpassa pelo conhecimento quantitativo das

características dos alunos a serem atendidos.

Paralela à questão do acesso, temos a questão da permanência, pois de nada

adianta matricular os alunos nas escolas, se não lhes forem oferecidas condições

para adquirirem uma educação de qualidade. Sendo assim, o município oferece

serviços de apoio que se constituem em salas de recursos e trabalho colaborativo do

professor especialista com o professor da sala regular.

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6.1 SERVIÇOS DE APOIO

Os serviços para o atendimento dos alunos com necessidades educacionais

especiais se constituem em apoio dentro e fora da sala de aula. O apoio intraclasse

é denominado de trabalho colaborativo, que consiste no apoio do professor

especialista ao aluno com necessidade educacional e também ao professor na

própria sala de aula. Essa forma de apoio é respaldada no art. 8º da Resolução

CNE/CEB nº 02/2001, porém, no município pesquisado, esse tipo de trabalho ainda

não está oficializado, mas acontece, oficiosamente, em várias unidades de ensino,

desde 2005.

Um outro tipo de apoio extraclasse que é oferecido é a sala de recurso, entendida,

conforme o texto extraído da pasta do professor da sala de recurso como

[...] um serviço de natureza pedagógica, conduzida por professor especializado [...]. Esta modalidade de atendimento utiliza materiais e recursos adequados a cada necessidade específica. O objetivo é facilitar a aprendizagem, a participação e integração social do aluno para levá-lo a aprender a aprender [...]. O atendimento na Sala de Recurso não pode ser confundido com reforço escolar [...] trata-se de um trabalho que visa estimular o raciocínio do educando, para aprender a pensar.

Essas salas ficam localizadas dentro das escolas de ensino fundamental. Algumas

possuem um excelente espaço físico, já outras foram montadas em espaços

adaptados com condições físicas nem sempre adequadas. A prioridade de

atendimento nessas salas é o aluno que apresenta alguma necessidade educacional

especial que interfere no seu processo de ensinoaprendizagem. No ano de 2006, o

município contava com 18 salas para o atendimento de alunos com deficiência

mental, duas salas de recurso para surdos e uma para alunos cegos e com baixa

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visão. O encaminhamento para ser atendido nessas salas é proveniente de uma

queixa da professora da sala regular, que passa uma lista com os nomes dos alunos

que ela acha que têm alguma necessidade educacional especial que esteja

prejudicando o seu desenvolvimento no processo de ensinoaprendizagem para a

professora especialista que faz uma triagem desses alunos, avaliando-os,

pedagogicamente, nas questões de leitura-escrita, raciocínio lógico e representação

gráfica do esquema corporal e de uma imagem em geral.

O atendimento nas salas de recurso é diferenciado conforme o alunado que

freqüenta a sala e deveria ser, preferencialmente, no contraturno. O apoio para os

alunos surdos era visando a repassar os conteúdos ensinados em sala regular

usando a LIBRAS como forma de comunicação. Além dessa forma de atendimento,

começou, no ano de 2006, o trabalho colaborativo nas salas regulares que tinham

surdos matriculados. Esse profissional fazia a interpretação da aula

simultaneamente e ajudava o aluno no entendimento da matéria.

Em relação aos alunos cegos e com baixa visão, é oferecida a transcrição em Braille

para tinta e vice-versa, e também a adaptação e ampliação dos conteúdos

trabalhados nas salas nas quais eles estão matriculados. Para fazer o intercâmbio

entre o professor da sala regular e o professor especialista, é realizado o serviço de

itinerância interinstitucional.

As salas para atendimento de alunos com deficiência mental, condutas típicas e

dificuldades acentuadas de aprendizagem ficam localizadas dentro das próprias

escolas de ensino fundamental e os alunos não precisam se locomover para outras

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unidades, diferente do trabalho com os alunos surdos e cegos. O atendimento é no

contraturno e é realizado por uma professora especialista que recebe os

encaminhamentos feitos pela própria escola.

6.2 IDENTIFICAÇÃO E AVALIAÇÃO DOS ALUNOS COM NECESSIDADE

EDUCACIONAL ESPECIAL

A educação especial, como uma modalidade, perpassa por todos os níveis de

ensino e cabe à escola a identificação dos alunos que apresentam necessidade

educacional especial. Em relação a esse item, o Regimento Comum das Escolas

Municipais aponta que a identificação é de responsabilidade do professor da classe

regular, com os pedagogos da escola (supervisor e orientador) e também do

professor especialista.

Cabe ao professor “[...] identificar em tempo hábil as necessidades educacionais

especiais dos alunos valorizando a diversidade na educação e a inclusão” (art. 46,

VI); aos pedagogos “[...] diagnosticar, junto aos profissionais as dificuldades dos

alunos na aprendizagem, buscando medidas de ordem pedagógica a serem

adotadas, bem como elaborar junto ao professor atividades adaptadas para os

alunos com necessidades educacionais especiais” (art. 35, V); e o professor

especialista, deve “[...] flexibilizar as ações pedagógicas, juntamente com pedagogos

e professor especializado nas diferentes áreas do conhecimento, de modo a

contemplar as necessidades educacionais especiais” (art. 46, XV).

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Percebemos, nessa sobreposição de artigos, que o documento não só menciona a

proposta de identificação, mas também a necessidade de se fazer algo que vai além

da identificação inicial. Articula, ainda, a cooperação dos pedagogos e do professor

especialista em identificar e colaborando com uma proposta pedagógica voltada

para a aprendizagem de todos que, conseqüentemente, será inclusiva, e elaborar

com a efetivação dessa proposta.

Percebemos que há uma intenção de se instituir uma proposta de educação

inclusiva na qual os sujeitos da escola se articulem para tal. Entretanto, apesar de já

estar instituída no papel, ainda é uma ação que vem se iniciando no cotidiano das

escolas, principalmente entre professor especialista e professor da sala regular.

Quanto à avaliação, não aparece uma proposta clara e específica desse item. No

entanto podemos perceber que há indício de uma avaliação que acompanha o

percurso de desenvolvimento do aluno, porém não há registro dos “[...] alunos com

necessidades educacionais especiais, destacando suas habilidades e avanços

dentro de suas potencialidades e desempenho escolar” (art. 38, XVII). Estabelece

que é da atribuição do professor, em conjunto com o professor da sala de recurso,

emitir relatório por escrito do desempenho dos alunos com necessidades

educacionais especiais (art. 30, V, II).

Apesar desse direcionamento em relação aos alunos com deficiência, o mesmo

documento aponta que as escolas devem realizar a avaliação formativa, mas o

sistema avaliativo deve ser o somatório. Sendo assim, cada bimestre tem uma

pontuação na qual os alunos precisam atingir pelo menos 60%. Por exemplo, no

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primeiro e no segundo bimestres, a pontuação é 20 pontos e os alunos precisam

atingir um mínimo de 12 pontos.

6.3 OS REBATES DESSA POLÍTICA DENTRO DA ESCOLA BANSALU

A Escola Bansalu segue as Diretrizes municipais e recebe matrículas de alunos com

necessidade educacional. No ano de 2006, havia 39 alunos com alguma

necessidade educacional especial. Conforme o censo da escola, estavam

matriculados: um aluno com deficiência múltipla, dois surdos, dois com deficiência

física, seis que apresentavam deficiência mental, um com altas habilidades, 26 com

condutas típicas. No turno vespertino, que foi o foco da nossa pesquisa, havia 13

alunos: um surdo, um com deficiência mental, um com deficiência múltipla, nove com

condutas típicas e um com altas habilidades.

A identificação desse alunado só era realizada após a entrada na sala de aula, pois,

no documento que a família preenche, no ato da matrícula, não há nenhum campo

no qual a família possa descrever, a priori, se seu filho apresenta alguma

necessidade especial.

Para o atendimento desses alunos, há na escola uma sala de recursos que, no

começo da pesquisa, localizava-se num espaço anexo à escola. Isso acabava

dificultando a interação da professora especialista com os demais professores da

unidade de ensino. Logo no início do ano letivo de 2006, a diretora deslocou esse

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atendimento para o interior da escola, pois, devido à greve do ano de 2005, houve

uma diminuição do número de alunos e acabou vagando uma sala. Esse fato

favoreceu os alunos atendidos na sala de recursos, pois ganharam uma sala ampla,

confortável bem diferente daquela com a qual eles estavam submetidos.

Apesar de a escola ter uma história de vários anos atendendo matrícula de alunos

com alguma deficiência, ainda não se tem ação planejada e voltada para eles. O

Projeto Político-Pedagógico da escola não menciona o número de alunos com

necessidades, nem formas de apoio e atendimento específico para eles. Segundo a

diretora, o Projeto está sendo reformulado, pois não atende à realidade atual da

escola.

Numa perspectiva de educação inclusiva, na qual a escola precisa se organizar para

oferecer situações de aprendizagem para todos, faz-se necessário, tal como propõe

Ribeiro (2003, p. 49), que essa intenção esteja explícita “[...] no Projeto Pedagógico

da escola, de modo que o currículo proposto seja dinâmico e flexível, permitindo o

ajuste do fazer pedagógico às peculiaridades de cada aluno”. Organizar, no papel,

as intenções da equipe da escola contribui para uma unidade entre o corpo docente

e diminui as práticas que não favorecem a inclusão.

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7 INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA: REFLEXÕES SOBRE

AS PRÁTICAS AVALIATIVAS NUMA PERSPECTIVA INCLUSIVA

Neste capítulo, vamos nos situar na análise dos dados obtidos no interior da Escola

Bansalu. Para tal, trabalhamos com três vertentes: o cotidiano, a inclusão e a

avaliação. O conceito do cotidiano é baseado em Lefebvre (1991) que nos aponta

uma forma de olhá-lo sem percebê-lo como algo que se repete, sempre da mesma

forma, do mesmo jeito. É no e do cotidiano que podemos fazer mudanças, que

podemos perceber o vivido e transformar aquilo que concebemos, entretanto as

mudanças devem ser coletivas.

Consideramos a segunda vertente — a inclusão — como um movimento mundial de

valorização e respeito às diferenças em toda a sociedade. Aqui nos atemos à

perspectiva da inclusão educacional que implica uma série de mudanças para que a

instituição possa oferecer uma educação de qualidade. A inclusão educacional não

significa colocar os alunos com necessidades educacionais especiais no conjunto

com os outros alunos tidos como “normais”, mas reorganizar as práticas

pedagógicas para que todos possam aprender e se desenvolver. Entre essas

práticas, o nosso olhar de pesquisadora nos remete à avaliação que, ao longo dos

anos, tem sido um instrumento de exclusão na e da escola. Acreditamos numa

avaliação investigativa atrelada à prática pedagógica que conduz sempre a uma

ação, que busca pistas tentando compreender o que sabem aqueles que achamos

que não sabem.

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Nessa perspectiva, acreditamos que a avaliação pode contribuir em muito para a

inclusão dos alunos com necessidade educacional especial dentro das escolas.

Sendo assim, entramos no cotidiano da Escola Bansalu, realizando um estudo de

caso etnográfico que nos possibilitou compreender como a prática da avaliação é

vivida e concebida e também qual a relação dela como retroalimentadora da prática

pedagógica num contexto de educação inclusiva.

7.1 A INCLUSÃO NA ESCOLA BANSALU

Antes de falarmos na prática avaliativa no contexto da escola, vamos pontuar como

a inclusão está presentificada nesse cotidiano. Na análise percebemos que em torno

da inclusão estão implicadas algumas categorias: o tipo de aluno que irá ser

incluído; a imagem que a escola tem desse alunado; a necessidade de apoios para

implementar a inclusão.

7.1.1 Incluir quem e onde?

Uma das questões que percebemos ao longo da pesquisa foi a identificação de

quais alunos deveriam ser incluídos na escola. Alguns professores ainda acham que

determinados alunos não podem estar na escola comum e que precisaria haver uma

espécie de triagem.

Poderia dizer que cada caso é um caso. Tem determinadas deficiência que deve primeiro ser trabalhada na escola especial. Por exemplo, casos de

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autismo, de deficiências mais graves, de deficiências que não consegue controlar as habilidades básicas (PROFESSORA MARIANA).

Já outra professora declara:

Eu ... Eu não concordo. Penso, cada macaco no seu galho. Por mais que não queira, uma criança com dificuldade de aprendizagem já é discriminada quanto mais uma com deficiência [...] (PROFESSORA IZA).21

Essas duas falas acabam revelando, por um lado, uma face da inclusão que é

marcada pela discriminação do outro por ser diferente, como se houvesse um

padrão, um nível de aluno para freqüentar a escola. É bom ressaltar que essa forma

de pensar é construída historicamente, pois o diferente sempre foi alijado do

convívio social e seu potencial foi sempre subjulgada a sua deficiência.

Carvalho (2005) coloca que o sistema educativo é apoiado numa lógica binária que

separa em lados opostos o que se tem como desejável, como legítimo, como padrão

e os que não se enquadram nessas categorias. É uma lógica que se pauta na

homogeneidade e, conseqüentemente, não estamos acostumados a viver, nem a

conviver com as diferenças, ou as concebemos como uma “diferença entre” tal como

nos ensina Burbules (2003).

Essa forma de conceber a diferença se enquadra na perspectiva de “diferença entre”

que, conforme Burbules (2003, p. 169), é uma tolerância em relação ao outro porque

se compara dentro de um padrão. Usando a “Gramática da diferença”, criada por

esse autor, essa forma de incluir alguns alunos e excluir a presença de outros com

21 Sabemos que, conforme a normas da ABNT, as citações até três linhas devem ser colocadas no corpo do texto. Entretanto optamos, por uma questão estética, por trazer todas as falas usando recuo.

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deficiências, que a escola julga ser mais difícil conviver, é uma “visão da diferença

de diferença em grau” que concebe numa graduação de um continuum esses alunos

como os últimos da fila.

Se as falas das professoras, de um lado, nos mostram um processo de

discriminação, de preconceito em relação ao outro, de desconhecimento de suas

potencialidades, de outro, nos alertam para a condição de inclusão que estamos

oferecendo a essas crianças.

Incluir não é apenas colocar dentro do espaço da escola, implica uma mudança

organizacional, uma mudança pedagógica, uma mudança atitudinal e uma mudança

política. A voz das professoras também denunciava isso.

Que espaços educativos estamos oferecendo a nossos alunos? A que práticas

pedagógicas eles estão sendo submetidos? Há uma valorização do saber que eles

produzem ou sempre são avaliados dentro daquilo que a escola aponta como

legítimo? Será que essa escola, do jeito que temos, com seus modos de fazer e ser,

consegue trabalhar com a diferença?

Nesses questionamentos, não estamos invalidando a escola como um espaço

legítimo para todos aprenderem, mas advogando que mudanças são necessárias

para que prevaleça de fato uma educação inclusiva. Como nos alerta Padilha (2004)

isso não é algo simples de se fazer.

Àvila (2004, p. 97) abordando esse contexto, revela:

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[...] a forma como se organiza o trabalho pedagógico pode ser decisiva, porquanto poderá ser ela mesma geradora dos insucessos, contribuindo para ratificar formas de entender as desigualdades, que colocam alguns em situações de inferioridade em relação a outros

E os professores da Escola Bansalu sabem disso. Eles falando sobre a inclusão

colocam

Acho importante, porém ainda não me sinto preparada para encarar suas dificuldades (PROFESSORA IZA). Depende... as vezes tem algum aluno incluído e o professor não esta preparado ai é difícil, agora se tem preparo é fácil. Eu não estou preparada apesar de ter curso. O professor tem que se sentir preparado (PROFESSORA ÉRICA).

Apesar da resistência tem professores que aceitam bem, tem professor que trabalha porque tem que trabalhar. Aqui na escola tem profissionais que aceitam, mas ainda se tem que trabalhar muita coisa (PEDAGOGA JANETE).

Nesse contexto, podemos perceber que ninguém é contra a inclusão, mas há um

certo receio de se trabalhar numa perspectiva de educação inclusiva e os

professores apontam a questão do ser preparado como algo fundamental. Ficamos

a pensar: o que é estar preparado? Será que envolve a formação? Será que tem a

ver com experiências anteriores? O que se precisa conhecer para estar preparado,

para incluir? Será que a aquisição de conhecimentos deve ser anterior à experiência

ou durante? Será que uma formação dá conta de uma educação inclusiva?

Essas questões, a nosso ver, envolvem o estar preparado. A professora Érica

coloca, em sua fala que isso vai além do curso, que é preciso se sentir preparada. E

estar preparado envolve, entre outras coisas, um trabalho de conhecimento sobre as

deficiências, sobre mudanças de práticas pedagógicas, mas também envolve um

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trabalho sobre questões de alteridade, de respeito e valorização do outro que é

diferente de mim, porque eu também sou diferente dele.

A questão da formação dos professores é um dos pontos que atualmente tem se

presentificado como desafio. Para Victor (2006, p.124), “A inclusão da classe

popular (e de alunos com deficiência) na educação impulsiona-nos a pensar um

novo modelo de escola, conseqüentemente, um novo modelo de formação de

professores consoante com essa proposta [...]”.

É preciso pensar nessa formação. Ventorim (2006) a aponta como uma

possibilidade de romper com a forma hegemônica de ensinar-aprender e

ressignificar os espaços/tempos destinados a esta formação. É preciso romper com

a visão da racionalidade técnica que apresentam modelos “[...] que vão desde

cursos, com conferências, até tipos de treinamentos que visam a aquisição ou o

reforço às competências desejadas. Modelos que partem de uma lista daquilo que

os reformistas pensam faltar para *s professor*s [...]” (LINHARES, 2006, p.26).

Nesse contexto, incluir quem e onde perpassa em refletirmos sobre as diferenças

presentificadas no cotidiano da escola e olharmos não como alguém que é inferior

ou superior ao outro. Entretanto, para a inclusão, não basta somente a mudança

atitudinal, precisamos implementar um outro modelo de escola que saiba trabalhar

com a diferença e para isso a formação do professorado é fundamental.

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7.1.2 O estar na escola regular e a afirmação de sua identidade

A inclusão implica, entre outras questões, o estar na escola regular e pertencer

àquele grupo. Os docentes da unidade Bansalu colocam que incluir é:

Oportunizar aos alunos com deficiência possibilidades de estudar junto com a escola regular. Essa inclusão não é só para socializar, mas com o intuito de fazer com que eles aprendam [...] (PEDAGOGA RENATA). [...] É todo mundo conseguir respeitar as diferenças e suas individualidades. É todo mundo participar do mesmo grupo, da sociedade. (PROFESSORA ANDREIA).

Nessas falas, percebemos que a presença de alunos com deficiência remete à idéia

de unidade e vai além da simples matrícula no rol de alunos da escola, da idéia de

incluir para socializar. Incluir é possibilitar que eles aprendam e que podem participar

do mesmo grupo sem ser discriminados.

Possibilitar é garantir que haverá espaços no ambiente escolar para troca, para

compartilhamento, para mediação, para que haja experiências de aprendizagem e

conseqüentemente, desenvolvimento do aluno. Ferreira (2005, p.73) coloca que

nessa relação

[...] podemos ressignificar a função da escola para todos os alunos, como um espaço privilegiado de vivência compartilhada de atividades humanas [...] que por estarem situadas no espaço coletivo da escola, devem favorecer a riqueza das interações sociais, que em função da diversidade humana, vão criar formas de mediação constituintes dos processos de desenvolvimento escolar.

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Nesse contexto, percebemos que estar junto favorece a todos os alunos da escola.

Observando a escola, podemos perceber que os próprios alunos também querem se

sentir pertencentes ao grupo. Eles cantam, brincam, dançam, jogam bola junto com

os colegas, sem que seus atos sejam diferenciados por causa da deficiência,

conforme podemos obsservar no texto a seguir extraído do diário de campo.

Quando a sirene soa os alunos da escola Bansalu já sabem o que precisam fazer. Caminham em direção ao pátio, fazem a fila por turma, oram e cantam. Enquanto as crianças cantavam o hino da bandeira, dois alunos se destacavam aos meus olhos. Era o Fernando e o Emanuel que embora em ritmos diferenciados, acompanhavam o grupo fazendo o que todos faziam.

O estar na escola implica uma identidade de aluno. Sacristán (2005) aponta que a

forma como concebemos o ser aluno perpassa pelas nossas próprias experiências e

também pelas concepções abarcadas em determinadas épocas. Nesse sentido,

existe um modo de conceber o aluno, e este aluno também tem um referencial a ser

seguido.

Não estamos aqui advogando sobre a homogeneidade e nem sobre modelos rígidos

a serem copiados, mas afirmamos que existem, no cotidiano da sala de aula,

algumas marcas, algumas ações que possibilitam pensar a pessoa do professor e a

pessoa do aluno.

É possível intuir que, em torno da categoria aluno, formou-se toda uma ordem social na qual se desempenham determinados papéis e se configura um modo de vida que nos parece muito familiar porque estamos acostumados a ele. Essa ordem propicia e ‘obriga’ os sujeitos nela envolvidos a serem de uma determinada maneira (SACRISTÁN, 2005, p. 14).

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Quando se trata de alunos com deficiência, eles também querem exercer seu papel

de sujeito/aluno fazendo todas as ações que todos os alunos da sala também fazem,

querendo do professor a mesma relação nas intervenções de ensino-aprendizagem,

querendo aprender o que todos aprendem, querendo fazer todas as estripulias que

cabem aos alunos. O estar na escola marca uma identidade de aluno e eles querem

e precisam exercer essa função.

Entretanto cabe relembrar que não estamos colocando que a categoria de aluno

seja homogênea, mas afirmando que esses alunos que apresentam alguma

necessidade educacional especial, por se colocarem na posição de aluno, parecem

querer ser vistos e tratados como tal.

Observando a sala da 3ª série na qual estava Fernando, relatamos no diário de

campo

[...] Assim que cheguei comecei a observá-lo. Vi que, ao mesmo tempo que eu o olhava olhando a turma, ele também me olhava. Nesses olhares entrecruzados, pude perceber que tentava assumir uma postura de aluno imitando os seus colegas: abria o caderno, folheava, olhava os movimentos dos colegas começando a copiar as atividades do quadro. Folheava de novo o caderno indo até a última página. Fecha. Parece inquieto. Não se levanta, mas movimenta o lápis indicando sua ansiedade para começar a fazer alguma atividade, tal como os outros alunos.

Pega seu caderno, levanta e mostra-o para a: ‘Tia, aqui meu caderno’. Parece querer fazer algo. A professora percebe sua ansiedade e entende a sua fala dizendo que depois irá trabalhar com ele. Ele pede para ir tomar água, ela o deixa sair e recomenda para que ele não demore. [...].

Nessa cena, podemos perceber a identidade de um aluno que sabe que estar na

escola implica manusear cadernos, escrever, recortar, ler, ou seja, implica realizar e

cumprir as tarefas que são passadas pelo professor. E esse papel é claro para

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Fernando que vê seus colegas de classe se movimentando no decorrer da aula e ele

ainda esperando a professora fazer a atividade para ele.

Embora a professora Iza tivesse sempre uma atividade para ele fazer, uma atividade

diversificada, dentro do nível do aluno, era uma atividade diferente das tarefas dos

demais alunos. Esse episódio ocorrido dentro da sala é apenas um recorte de um

dia, cuja cena parecia se repetir todos os dias, dando pistas de que esses alunos

queriam ser vistos como pertencentes àqueles grupos. Queriam realizar as

atividades pertinentes, as atividades pensadas para aquele conjunto de alunos.

Faziam as atividades sugeridas, mas queriam realizar as outras que os outros

alunos faziam.

Isso deixou claro que estar incluído implica um sentimento de pertença, pois não

basta estar na mesma sala, na mesma escola; é preciso ter uma identidade

construída e acolhida por todos.

Acreditamos, assim como Ferreira (2005, p.74), que

Tal como na nossa utopia e estabelecido por lei, a mudança pretendida é a de que aos alunos com deficiência seja garantida uma educação escolar que cumpra com eles os objetivos gerais e específicos da educação escolar. Isto é que se garanta a eles o que está previsto para todos os alunos, basicamente, a promoção do desenvolvimento dos alunos [...] dentro das possibilidades de cada um.

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7.1.3 A necessidade de apoios para implementar um trabalho pedagógico

voltado para a inclusão

Para incluirmos alunos com necessidade educacional especial, o sistema de ensino

precisa implementar apoios. A resolução CNE/CEB nº 2 coloca que esses apoios

devem ser dentro da sala regular e dentro da sala de recurso.

O art. 8º dessa Resolução aponta que os serviços de apoio pedagógicos devem ser

oferecidos por um profissional especializado, que irá atuar em colaboração com o

professor regente dentro das classes comuns. Entretanto esse serviço não pode se

constituir como uma segregação no interior da sala de aula.

Concordamos com Batista (2004), quando ele adverte, que a “pluridoscência” é uma

alternativa possível quando esse encontro serve de disparador de mudanças. Não

adianta acrescentar mais um professor na classe para favorecer a inclusão dos

alunos com necessidades especiais se as bases da exclusão continuar em a existir.

Quando olhamos, o contexto da escola Bansalu, percebemos que os alunos que

apresentam alguma necessidade educacional especial contam com um professor

especialista no turno vespertino que divide seu tempo no interior da escola, ora

atendendo os alunos dentro da classe, junto com o professor, e ora atendendo os

alunos do próprio turno ou os que vêm do turno matutino, utilizando a sala de

recurso. Os alunos que ela atende são aqueles que apresentam dificuldades

acentuadas de aprendizagem, condutas típicas e deficiência mental. Ela não

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trabalha com o aluno surdo e nem com aquele que apresenta altas habilidades,

porque, eles são atendidos por outro profissional.

A professora Mariana, falando do seu trabalho coloca:

Na sala de recursos, proponho atividades para eles escolherem dentro de um planejamento. Eu planejo várias atividades e deixo eles escolherem. Na sala regular, com o trabalho colaborativo, faço o possível para trabalhar o que o professor está trabalhando dentro do conteúdo que ele está dando. Faço adaptações dentro do conteúdo que ele está dando, não levo outro conteúdo e sim o que o professor faz.

Podemos perceber que há uma distinção entre o trabalho na sala de recurso e o

trabalho colaborativo e que ambos não se completam. Na sala de recurso, a

professora trabalha várias atividades voltadas para a alfabetização dos alunos, com

base em material lúdico e concreto. Os alunos também têm autonomia para escolher

a ordem das atividades que farão. Observando as atividades que os alunos fazem

nessa sala, podemos ver claramente a ênfase dada ao processo de alfabetização,

que é uma frente importante a ser trabalhada, porém não há uma sistematização

desse trabalho. Já na sala regular, a professora especialista segue o trabalho que a

professora regente da classe está dando, o que muitas vezes, acaba pulverizando

as ações que são feitas em prol do aluno, pois, como não há um projeto unificado

ele faz várias atividades e não acumula conhecimento.

Acreditamos que, para a proposta de trabalho colaborativo entre a professora

especialista e a professora da sala regular, faz-se necessário demarcar algumas

diretrizes. Neri (apud BATISTA, 2004, p. 200) destaca algumas ações, que devem

ser consideradas pelos professores na efetivação desse trabalho:

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[...] evitar a separação entre as ações dos diferentes docentes; a negação da atividade substitutiva, no sentido de intensificar as articulações entre os planos coletivo e individual que podem existir em uma mesma classe; a responsabilidade coletiva quanto a todos os alunos; o desenvolvimento da capacidade de projetar/planejar; o reconhecimento da importância de implementação de percursos individualizados, os quais são distintos de percursos individuais de aprendizagem.

A professora Mariana organiza seu trabalho colaborativo tendo um horário fixo para

entrar na classe. Entretanto nem sempre há um planejamento em conjunto entre a

professora da sala regular e a professora especialista. Essa atitude é justificada pela

falta de tempo para se planejar e pela própria resistência que os professores têm em

compartilhar os saberes. Capellini (2004, p. 89) coloca que

[...] uma parceria com colaboração efetiva não é muito fácil e nem rapidamente alcançada [...]. É preciso tempo e prática para construir uma relação de confiança e desenvolver os procedimentos operacionais [...] que permitam às equipes trabalharem juntas.

A mesma autora, baseando-se em vários pesquisadores que estudam a perspectiva

do ensino colaborativo, discorre que esse pode ser descrito como

Uma fusão pragmática entre os professores da Educação Comum e Especial para ensinar de forma colaborativa, ou seja, uma estratégia inclusiva desenvolvidad com reestruturação dos procedimentos de ensino para ajudar no atendimento a estudantes com necessidades educacionais especiais em classes comuns, mediante um ajuste por parte dos professores. Neste modelo, dois ou mais professores possuindo habilidades de trabalho distintas, juntam-se de forma co-ativa e coordenada, para ensinar grupos heterogêneos tanto em questões acadêmicas quanto questões comportamentais, em cenários inclusivos (CAPELLINI, 2004, 88).

Percebemos que é fundamental a interação e o compromisso de assumir

coletivamente a proposta de trabalho colaborativo. Se não há espaços para

planejamentos, a instituição de ensino precisa instituir esses espaçostempos. Se o

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professor especialista faz o trabalho colaborativo adentrando a classe e adaptando,

naquele momento, as atividades para o aluno com necessidade educacional

especial, a proposta desse tipo de apoio pode ficar distorcida e transformar-se numa

divisão de trabalho.

M. sempre ficava aqui comigo durante as aulas. O trabalho colaborativo ajuda, enquanto ela fica com ele, eu posso dar um apoio maior aos outros (PROFESSORA ÉRICA). [...] eu acho que é válido, porém precisa ser aprimorado. Precisamos de professores capacitados para apoiar. Talvez, se tivessem estagiários para apoiar o trabalho, poderia ser melhor. Quando M. está na sala, a professora da classe pode dar atenção melhor aos outros alunos (PEDAGOGA RENATA).

Percebemos, nessas falas, que há a aceitação do trabalho colaborativo, porém este

se constitui numa divisão de tarefa entre a professora especialista e a professora da

sala regular. Essa distorção da proposta do trabalho colaborativo não é culpa dos

professores ou da escola em si, pois não há documento que oriente a instituição

sobre as diretrizes de um trabalho colaborativo. Essa é a forma que a professora

especialista conseguiu organizar para oferecer este apoio e que a escola acolheu.

Entretanto, se por um lado, o Sistema de Ensino lançou a proposta e não

sistematizou para as unidades como deveria proceder, como deveria ser a

articulação entre o professor especialista e o professor da sala regular para que o

trabalho fluísse e não se configurasse como um professor exclusivo do aluno que

apresenta alguma deficiência dentro da classe, por outro lado, a escola também não

procurou entender o sentido real da proposta e nem garantir que esse apoio

pudesse beneficiar a todos dentro da escola.

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Queremos ressaltar que não estamos advogando que a SEMED trace uma proposta

que contemple todos os contextos, pois isso nunca seria possível. Entretanto

acreditamos ser importante que os sistemas de ensino tenham orientações sobre as

possibilidades desse trabalho que é um dispositivo importantíssimo para as práticas

pedagógicas voltadas para a inclusão, a fim de traçar ações que melhor aproveitem

esse recurso.

É preciso trabalhar nessa sistematização, pois não se pode negar que a ajuda de

um outro profissional seja fundamental para implementar propostas pedagógicas

inclusivas, tal como coloca a pedagoga Renata. Precisamos pensar como será esse

apoio. Será que é só disponibilizar o profissional para que ele faça a colaboração?

Será que a escola não precisa se organizar para que haja planejamentos em

conjunto do professor especialista, do professor da sala regular e do pedagogo?

Quando não há essa organização prévia, táticas são pensadas para tentar

aproveitar melhor essa proposta. É o caso do trabalho de colaboração entre a

professora Mariana e a professora Iza. Ficou acordado entre as duas que, às

quartas-feiras, seria o dia destinado para a classe da 3ª série. Então a professora da

sala regular se propôs a sempre trabalhar nesse dia a produção de texto.

Numa dessas quartas-feiras, pudemos perceber o quanto o apoio de um outro

profissional pode colaborar com os alunos e com os professores de modo geral,

conforme registramos no diário de campo:

[...] A temática da produção de texto era sobre o Dia dos Namorados. Quando a professora entregou a folha para os alunos e Fernando pegou a

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dele imediatamente ele veio até nós duas [eu e a professora da sala de recurso]. Aquele gesto remetia-nos a uma fala: quem irá me ajudar? [...]. A professora da sala de recurso foi com ele até sua mesa. Fiquei de longe observando e observando sua relação com Fernando e seu comportamento. Ela começou a intervenção, mostrando-lhe o que estava nos balões, e ia travando um diálogo com ele. Ele ia colocando suas idéias sobre a imagem e narrando uma história o mais coerente possível. A medida que ia narrando, registrava com a ajuda da professora o que havia pensado. Nesta caminhada de pensar/narrar/registrar, pude perceber que algumas letras ele dominava outras precisavam ser evocadas para ressurgir na mente e outras ainda precisavam ser aprendidas. Em um certo momento da produção de texto, a palavra que ele queria escrever era FICOU. Ela repetia a palavra, repetia, tentava fazê-lo pensar. ‘Ficou começa com quê?’ ele respondia ‘FI’, ‘e fi é de qual palavra?’, ‘Filipe’. Percebi que, durante as intervenções da professora da sala de recursos, ela ia ajudando e escrevia as palavras à medida que ele ia falando sempre aos poucos, pois ele acabava se perdendo, se tinha muitas coisas para ele copiar. A atividade tinha duas folhas, quando ele acabou a primeira parte, levantou os braços e bradou ‘CABOU’, mas a professora que o acompanhava lhe mostrou que havia outra folha para continuar a história [...].

Nessa relação da professora especialista com o aluno Fernando, podemos perceber

o quanto é significativo o apoio de um outro colaborando no processo de aquisição

de conhecimentos, como um interlocutor que faz surgir a palavra e revela o potencial

daquele que, aos olhos de muitos, era considerado “incapaz”.

Na troca entre a professora Mariana e o aluno com necessidade educacional

especial, contemplamos que este é capaz de articular suas idéias para realizar as

atividades propostas e que ele pode fazer as atividades, desde que tenha apoio para

isso.

[...] o fazer com o outro da cultura, com a ajuda [...], o que ocorre nas situações de ensino-aprendizagem, possibilita que o sujeito em desenvolvimento, no futuro, o faça de forma independentemente, apropriando-se, de forma mediada, dos instrumentos técnicos e psicológicos veiculados, e internalizando os significados e sentidos possibilitados, expandindo assim, o desenvolvimento real do indivíduo, o que viabiliza possibilidades de outros processos ensino-aprendizagem (VYGOTSKY, 1997; DUARTE, 1999, apud FERREIRA, 2005).

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7.1.3.1 O apoio para o aluno surdo

Além de alunos com deficiência mental, havia, também, no turno da tarde, um aluno

surdo, o Pedro. Vários estudos demonstram que a inclusão do surdo é complexa,

pois implica a construção de uma identidade surda, de compartilhamento de uma

língua que irá favorecer o desenvolvimento do sujeito, porque é por meio da

linguagem que significamos o mundo e nos constituímos como sujeito.

Soares e Lacerda (2004, p.128), pesquisadoras da inclusão de surdos, discorrem:

[...] a escola parece receber os sujeitos ‘diferentes’ sem fazer qualquer concessão ou adaptação para sua inclusão. Parece haver uma crença de que essa inclusão se dará ‘magicamente’. Cria-se, com isso, um paradoxo entre as propostas de inclusão e as reais tentativas de inserção de alunos em classes regulares. Pela condição lingüística do surdo, é necessário que a língua de sinais esteja presente no meio acadêmico.

Essa ausência da língua de sinais era presente no cotidiano da Escola Bansalu. Não

havia na instituição nenhum profissional que pudesse conversar com Pedro

respeitando a sua condição de usuário de LIBRAS. Essa falta foi expressada pela

diretora adjunta Adélia que reivindica a presença de um intérprete, não apenas para

o Pedro, mas também para o outro aluno surdo que estuda no turno noturno.

[...]. Nós temos dois alunos surdos e não tem nenhum profissional na escola para lidar com eles, infelizmente.

É preciso, dentro de uma proposta de educação inclusiva, que haja, no ambiente

escolar, a presença de um intérprete e que esta seja usada, vivida dentro do

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cotidiano da escola. Soares e Lacerda (2004, p. 128), colocam que “[...] a interação

lingüística requer que pessoas do meio usem efetivamente a língua em questão. No

caso da proposta de educação inclusiva, poucas vezes há usuários da língua de

sinais na sala de aula regular, salvo o próprio aluno surdo”.

Essa situação, acaba causando uma resistência, como a da professora Iza, que

colocou na sua entrevista o receio que tinha sobre a inclusão de um aluno surdo,

exatamente por ela não saber a língua de sinais brasileira.

Está incluindo [...].Eu sempre fiquei assustada [...] acho que não sou capaz. Peguei o F. mas, não é um deficiente auditivo (PROFESSORA IZA).

Em um dos momentos em que estávamos na sala, pudemos vivenciar o quanto a

falta de apoio, entendida, como sugerem Lacerda e Lodi (2006, p. 46), como “[...]

intérprete de LIBRAS responsáveis por propiciar aos alunos surdos condições por

meio da LIBRAS, para a aprendizagem; Educadores surdos responsáveis pelo

ensino de LIBRAS”, pôde dificultar o processo de aprendizagem do aluno surdo. O

trecho a seguir, do diário de campo, assim registra:

O objetivo da aula daquele dia era trabalhar produção de texto. A professora sentia instigada a fazer o melhor e dar a atenção a todos, pois ela sabia que incluir não era deixar de lado. Embora se esforçasse, a questão da comunicação com o surdo exigia uma linguagem diferenciada. Por mais que ela falasse mais articulado e tentasse gesticular, havia um ruído na comunicação. Ela não conseguia passar a mensagem nem o aluno conseguia entender. Pedi para interpretar o que estava sendo dito e explicar a atividade a ser feita. Era uma atividade de produção de texto, na qual já havia um início e os alunos deveriam terminá-lo, havia também, como apoio, uma imagem ilustrativa. Comecei a conversar com ele [Pedro] e disse que iria ajudá-lo. Mostrei o desenho pra ele e perguntei, em língua de sinais, o que tinha ali, naquele desenho. Ele me respondeu que tinha um sol, uma lua. Então disse que

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era para fazer uma história. Pedi que ele lesse o que estava escrito. O texto dizia: ‘O sol vivia solitário iluminando a terra. Um dia, ele convidou a lua para ...’ À medida que ele ia lendo as palavras, não considerava os artigos. Ele sinalizou [sol]; [terra]; [dia] e [lua]. Voltei a leitura com ele e perguntei de novo o que estava escrito. Ele, então, foi lendo outra vez e as palavras que ele não sabia o significado ia fazendo a dactologia. No diálogo, eu perguntava se ele sabia o que era, qual o significado? Ele sinalizava com a cabeça e com a expressão do rosto indicando que não sabia. Eu explicava a palavra e lhe mostrava o sinal correspondente. Aí, ele sinalizava e copiava o sinal, como se fosse uma forma de repetir e memorizar o que estava aprendendo. A história foi feita com a intervenção, à medida que ele ia construindo uma frase, eu ia traçando diálogos e questionando o que ele ia me dizendo em língua de sinais. No final, a produção de texto acabou ficando assim: ‘O sol vivia solitário iluminando a terra. Um dia ele convidou a lua para ... Brincar nuvem. Sol, lua vivia com Deus Sol lua casado’ Quando ele terminou, foi mostrar à professora tal como os outros alunos. Ela leu a história e deu visto no seu caderno [...].

Esse trecho do diário de campo mostra duas questões fundamentais, a nosso ver,

sobre a inclusão de surdos. Primeiro, demonstra a potencialidade do aluno e deixa

claro que a falta de audição não é impeditivo para que ele aprenda e, se desenvolva,

tal como os outros alunos. Depois deixa claro que

[...] quando se opta pela inserção do surdo na escola regular, esta precisa ser feita com muitos cuidados que visem garantir sua possibilidade de acesso aos conhecimentos que estão sendo trabalhados, além do respeito por sua condição lingüística e por seu modo peculiar de funcionamento (LACERDA, 2005, 101).

Percebemos que a professora Iza tenta trabalhar com ele, mas lhe falta a língua de

sinais para se fazer compreendida. Embora Pedro soubesse fazer leitura labial, esta

se faz insuficiente para a aquisição de conhecimento. Não estamos julgando a

professora por não saber LIBRAS, mas exaltando a necessidade de um apoio

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qualificado para que a inclusão de alunos surdos possa acontecer de forma efetiva

favorecendo o processo de ensinoaprendizagem do aluno em questão.

Nesse contexto, podemos afirmar que o apoio é extremamente necessário sob pena

de alijarmos, de negarmos o acesso ao conhecimento. Entretanto cabe ressaltar,

assim como Soares e Lacerda (2004, p. 129), que

[...] as necessidades dos sujeitos surdos não se restringem às questões lingüísticas, mas abrangem também sua forma visual de apreensão do mundo, implicando a demanda de uma proposta curricular e pedagógica que leve em conta as singularidades e características dessa comunidade [...].

O apoio do intérprete é fundamental, mas a inclusão do surdo exige, além disso,

uma mudança na proposta pegagógica da escola que passe a incluir recursos

visuais na prática cotidiana ao invés de valorizar somente a parte auditiva.

Cabe ressaltar que a restrição de apoio dentro da escola não significava que o

município não oferecia nenhum serviço para o atendimento dos alunos surdos, mas

que a política de atendimento precisava ser repensada. A proposta do município

para os alunos surdos era oferecer suporte em contraturno, na sala de recurso que

ficava localizada numa outra unidade escolar, e a função da professora especialista,

intérprete de LIBRAS, era atender na sala de recurso e fazer a itinerância para poder

articular esses dois campos de atendimento.

Assim como Góes (2004), acreditamos que a sala de recurso em outra unidade

dificulta a articulação dos profissionais que lidam com o aluno em tela. Para que

esse serviço tenha efeito de fato e contribua com o processo de aprendizagem do

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aluno surdo, é preciso que haja uma interação entre a professora especialista e a

professora da sala regular. “Em geral, as atuações complementares dessas salas e

dos professores itinerantes, quando disponíveis, ainda constituem uma base de

sustentação insatisfatória para mudanças promissoras do trabalho docente na

classe regular” (GÓES, 2004, p.74).

Em um dos momentos de conversa entre a professora e a pesquisadora essa falta

de interação pode ser visível, conforme registramos no diário de campo.

Enquanto as crianças faziam a atividade ela chegou perto de mim e aproveitei para questioná-la quanto ao apoio em relação ao aluno surdo. Ela me disse que ele leva os cadernos para ela e a professora da sala de recurso o ajuda. Perguntei: _ Mas você não manda nada, ou ela não vem aqui para fazer a itinerância? _ Ela me liga, às vezes. _ Só ligar não basta. Precisa ser mais sistemático. Seria bom que você mandasse um bilhete sobre o que é para ela trabalhar. Por exemplo, ela sabia que ia ter prova hoje? _ Não. _ Se ela soubesse antes, ela poderia ajudá-lo a se preparar. É difícil saber alguns sinais de uma hora para outra. Por exemplo, na prova de hoje, tive dificuldade com os sinais de imigrantes, imigração, alemão. São sinais que quase não se usa no dia-a-dia. Se ela souber com antecedência, pode preparar a aula melhor. Você não planeja? _ Sim [responde também com um movimento de cabeça e sorrindo]. _ Vejo que você é organizada, você planeja suas aulas. Mande seu planejamento para ela. _ [Sorrindo] Você me deu uma boa dica.

Nesse trecho, notamos a falta de articulação para a política de atendimento dos

alunos surdos. Existe o contato, mas este parece vulnerável, pois não é eficaz. É

preciso repensar a política de suportes, incluindo as diretrizes necessárias para

agregar sentidos a esse serviço.

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O trabalho colaborativo entre a professora especialista e a professora da sala

regular precisa ser mais do que um acordo de atendimento entre as professoras que

atendem os alunos com necessidade educacional especial, precisa ir além dessa

celebração de cavaleiros. É preciso que haja uma estratégia de atendimento, bem

planejada e organizada, para que ambos os professores possam incidir na zona

proximal dos alunos. Sendo assim, acreditamos que a inclusão implica apoios, sim,

mas implica também reestruturação de como esses apoios serão direcionados.

7.2 AS PRÁTICAS AVALIATIVAS NA ESCOLA BANSALU

Quando falamos, ou pensamos em práticas avaliativas no contexto da escola,

sempre nos remetemos a provas, trabalhos, exercícios, pesquisas, ou seja, sempre

nos voltamos para os instrumentos utilizados para se obter informações se o aluno

aprendeu ou não.

Na Escola Bansalu não é diferente. Os profissionais, falando sobre como avaliam

seus alunos, apontam

[...] Dou aquela provinha... famosa provinha. Dou trabalhos, atividades na sala, observo os cadernos para ver se eles sabem (PROFESSORA IZA). [...] prova [avaliação escrita], trabalho, pesquisa, participação nos projetos. (PEDAGOGA RENATA). [...] Atividades na sala, auto-avaliação, a danada da avaliação ‘prova’. (PROFESSORA ANDRÉA).

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Percebe-se, assim, que embora haja outros instrumentos, é a prova que sintetiza o

sistema avaliativo. O uso da prova escrita como forma de avaliação é fruto da

organização da escola moderna e “[...] sua forma escrita está ligada à idéia de

credibilidade pública, transparência e rigor” (DIAS SOBRINHO, 2002, p. 19). Por isso

é que a prova se constitui no principal instrumento avaliativo.

Segundo Cury (1989, apud BERTAGNA, 2002, p. 235), “[...] a prova e o exame são

a medida ponderável do aprendizado e o documento de que na escola se faz

alguma coisa”. É o resultado do que o aluno e a aluna tiram na prova que serve de

parâmetro para saber se determinado aluno tem ou não condições de ser aprovado.

É o valor da prova que legitima, que julga, que classifica e separa os alunos em

bons e maus alunos.

Quando os professores avaliam, seja por prova, seja por outro instrumento, é dada à

atividade um valor. Esta valorização é fruto do sistema avaliativo do município que

preconiza no Regimento Comum das Escolas que a forma de avaliar deve ser

somatória, na qual os professores distribuem pontos nas atividades que os alunos

fazem. As pedagogas expõem esses critérios em uma de suas falas:

[...] o sistema de avaliação é por notas de 0 a 20, nos dois primeiros bimestres e 30 no segundo semestre. Em relação aos instrumentos [...] as professoras diversificam as atividades sem o caráter de prova, mas tem também a sistematização da prova. No final do bimestre acaba tendo as provas escritas. Mesmo sem ter institucionalizado a ‘semana de prova’ algumas provas acabam sendo dadas no final (PEDAGOGA JANETE).

Observa-se que a distribuição de pontos não é igualitária entre todos os bimestres e

que, apesar de não se restringir ao instrumento avaliativo – prova – é esta que é o

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“carro-chave” do sistema de avaliação, tanto que foi se instituindo no final de cada

bimestre, a intitulada semana de prova.

A pedagoga Renata aponta algumas orientações sobre esse tipo de avaliação,

usando a prova como o principal instrumento:

Valorizar o qualitativo ao invés do quantitativo, priorizar dentro das avaliações escritas os conteúdos mais necessários que são importantes naquela disciplina e também o tipo de prova. A gente orienta sempre para que tenha na prova questões objetivas e subjetivas, dar sempre as duas coisas e distribuir os pontos. Para trabalhos individuais e grupos geralmente de 30% a 40% do valor dos pontos do semestre.

Na análise, ela aponta: a supremacia do quantitativo sob o qualitativo, tal como

colocado no art. 24 da Lei nº 9.394/96; a seleção daquilo que é primordial para

aquela disciplina; a elaboração do instrumento com questões objetivas e subjetivas;

a distribuição de pontos nas questões; e uma atribuição significativa da prova

equivalendo um percentual de 60% a 70% do total de pontos daquele bimestre.

Percebemos aqui uma forma de olhar a prova como um instrumento capaz de

apreender o conhecimento do aluno e por isso precisa ter o maior peso. Nessa

prática, notamos que os resultados podem ser mais importantes do que o processo

de aprendizagem. É uma concepção ligada à perspectiva metafísica que acredita

que o conhecimento é parado e que, por meio de um instrumento avaliativo, o aluno

consegue esboçar aquilo que sabe.

A prática de avaliação, seguindo essa lógica de buscar a verdade, por meio dos

instrumentos, acaba por separar os que sabem daqueles que não sabem. Separa

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em pólos dicotômicos saber e não saber, como se fossem opostos. Nesse ínterim,

Esteban (2001, p. 180) coloca que “[...] saber e não saber são interpretados como

opostos e excludentes, sendo o não saber marcado por um valor negativo”.

Dessa forma, a avaliação é empregada como se fosse algo estático e como se toda

a complexidade que a envolve não fosse percebida e muito menos contabilizada

quando há julgamento, quando há emissão de valores.

Nesse contexto, a avaliação é vista, na ótica do concebido, como uma ferramenta

que

[...] reduz a riqueza e complexidade dos processos de aprendizagem e ensino, das relações sociais nas quais as relações pedagógicas se constituem e dos sujeitos que aprendem e que ensinam, como a materialização da concepção positivista de conhecimento (ESTEBAN, 2003, p. 16).

Então o que é avaliar? Para os profissionais da Escola Bansalu, avaliar significava

diagnosticar, perceber o que a criança já aprendeu em relação àquilo que foi

ensinado. Sobre avaliação, os professores colocaram:

[...] avaliar é você poder diagnosticar como aquela criança está naquele determinado momento. O que ela aprendeu e o que não aprendeu (PROFESSORA ÉRICA). [...] é ver o nível que a criança está, observar se ela está alcançando os objetivos traçados e perceber aquilo que se pode estar trabalhando e indo além (PROFESSORA MARIANA). Avaliar seria diagnosticar para ver o que ele sabe e o que teria que aprender para a partir daí preparar atividades e dá continuidade ao trabalho (PROFESSORA IZA). O que é avaliar... vamos pensar... Avaliação... bicho de sete cabeças... é um processo que você vai percebendo o grau de conhecimento, de entendimento dentro daquilo que foi ensinado (PROFESSORA ANDRÉA)

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Podemos perceber que as falas remetem, por um lado, a uma avaliação cuja função

é diagnosticar e verificar o que o aluno já aprendeu. Essa forma de avaliar, segundo

Sacristán e Gómez (2001), é uma avaliação pós-ativa que identifica o que o aluno já

sabe e o que ele, supostamente, não sabe daquilo que o professor ensinou. Mas,

por outro lado, na fala das professoras, também percebemos uma preocupação com

a continuidade do processo ensinoaprendizagem, na qual aparece uma função do

ato de avaliar para mobilizar futuras ações.

Entretanto não podemos nos iludir achando que avaliar é algo simples de se fazer.

Pelo contrário, é algo complexo que os professores, em seu cotidiano, acabam

fazendo de modo solitário.

Oliveira e Pacheco (2003, p. 127) colocam que

[...] há que se registrar a falta de espaço, na maioria das instituições educacionais, para discussões comprometidas com a melhoria dos instrumentos de avaliação. Não há uma política sistemática de se buscar investir na criatividade dos professores e professoras para encontrar outras alternativas.

Na Escola Bansalu, não observamos, em nenhum momento, a instituição desse

espaço. O que vimos eram momentos fortuitos de um professor que dialogava com

outro ou que dialogava com os pedagogos na tentativa de solucionar alguns casos

isolados que atrapalhavam o cotidiano da sala de aula. Apesar de a escola ter a

previsão de planejamentos, esses, devido ao atraso do ano letivo, foram reduzidos

passando a ser quinzenalmente, com duração de duas horas, e acabavam sendo

restritos a planejamento de atividades e alguns informes. A questão da avaliação

não era colocada em pauta e muitos professores, durante a entrevista, se

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ressentiram da dificuldade que eles tinham de avaliar, colocando aquilo que era mais

complicado.

É saber se a avaliação está sendo justa. Se estou realmente pedindo o que ele pode me dar. [...] você avalia para saber se o aluno aprendeu ou não, às vezes cobrar na avaliação aquilo que não foi ensinado, isso não é justo (PROFESSORA ANDRÉIA). É... dar assistência na hora da avaliação de forma específica e como avaliar, pontuar as questões. É preciso valorizar o qualitativo. Tem que ser levado em conta o estado emocional. É difícil marcar o dia de prova, pois a avaliação é diária. É preciso ver caminhos, atitudes que eles tomam. Isso é difícil... é preciso perceber que cada aluno é diferente[...] (PEDAGOGA RENATA).

Nessas duas falas, podemos perceber, em aspectos diferenciados, questões que

são pertinentes à avaliação que envolvem, como, quando e quem é avaliado.

Percebemos que, embora elas continuem falando do instrumento avaliativo

denominado prova, há uma preocupação da avaliação em relação à complexidade

do alunado que se tem na sala. Alunos que, como já sabemos, tem níveis de

aprendizagem diferenciados e também aqueles que apresentam uma necessidade

educacional especial por deficiência.

Como dar a mesma prova, se esses alunos não fazem as mesmas atividades que os

outros colegas da classe? Será que é justo dar uma prova no nível deles? Será que

é necessário fazer alguma adaptação? Se derem a mesma prova, o que significa a

nota que eles tirarem?

Mesmo sem ter um espaço para discussão sobre questões que envolvem a temática

da avaliação, percebemos que ter alunos com deficiência faz a escola pensar e agir

com práticas avaliativas diferenciadas que se diferenciam conforme os tipos de

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deficiência. Para alguns, é necessário uma redução de questões; para outros, uma

avaliação oral; para outros, um suporte em LIBRAS; para outros, mais tempo; e,

para outros, a avaliação não é realizada por provas e nem tem notas, é por meio do

relatório:

A orientação é sobre o tipo de avaliação principalmente na redução do nº quantidade, pois a prova não precisa ter a mesma quantidade que os demais. No caso de Pedro (que é surdo), é a professora da sala de recurso que faz. Fernando não dá conta de fazer a prova escrita, pedimos, então, para valorizar o oral, pois, na expressão oral, o aluno pode mostrar que entendeu o assunto (PEDAGOGA RENATA). Não. Eu dou a mesma avaliação. Só o tempo que é maior. Às vezes nem é necessário ter um tempo maior, às vezes é preciso (PROFESSORA ERICA). A avaliação é ainda uma grande dificuldade. Os alunos que não têm deficiência passam pela mesma avaliação que os outros. Existem alunos que não têm um desempenho igual, eles fazem a mesma avaliação, os demais vão por relatórios. [...] (PEDAGOGA JANETE).

Percebemos, nessas falas, uma atitude diferenciada em frente à prática avaliativa

dos alunos com necessidades educacionais especiais, em relação aos alunos

considerados sem nenhuma necessidade. As orientações diferem conforme o tipo

de necessidade, desde a redução de quantidade ou variação do tempo até a

realização da prova em outro contexto, como é o caso do aluno Pedro que é surdo ─

quem aplica a sua prova é a professora da sala de recurso localizada em outra

escola.

Ainda tem, nessa diferenciação, uma distinção entre os alunos com necessidade

educacional especial sem e com deficiência. Para o primeiro, muitas vezes a

alternativa é a variação do tempo de conclusão da prova ou o auxílio da professora

especialista que, no trabalho colaborativo, ajuda no momento da prova fazendo uma

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intervenção com esses alunos; já para o segundo, eles não são obrigados a fazer a

prova e não são avaliados por notas. Para eles, é sugerido o uso de relatório.

Certo dia, na sala da 3ª série, pudemos observar, enquanto a professora Iza

entregava as provas, a reação dos alunos quando viam as notas. Eles comparavam

um com o outro os resultados obtidos. Pedro e Fernando também receberam os

instrumentos avaliativos. Pedro, assim que pegou, veio correndo me mostrar seu

desempenho na prova; Fernando também pegou sua avaliação e veio até a mim.

Neste dia a professora entregou as provas. Na de Português, Pedro ficou com nota máxima. Ele me disse que fez sozinho, olhando o livro. O conteúdo da prova era leitura, interpretação, encontro vocálico e letra maiúscula. Em Geografia e História, também tirou nota boa. Observei o diário de classe e vi que as notas dele era num nível bom, com notas muitas vezes melhores que os demais alunos.

Disciplina 1º Bim. 2º Bim. Ciências 13,0 18,5 Matemática 15,5 14,5 Educação Artística 20,0 18,5 Língua Portuguesa 14,0 18,0 História 15,0 19,5 Geografia 17,5 20,0

Fernando também veio me mostrar sua prova, porém esta só tinha o visto da professora. Não havia impressões digitais, traços de escrita que demarcassem sinais do seu processo de aprendizagem. Era simplesmente um prêmio de consolação, uma prova do tipo ‘café com leite’, para fingir que fez. Mas ele sabia que aquele papel não significava nada. Tanto que, assim que eu a olhei, ele simplesmente guardou na bolsa (TRECHO DO DIÁRIO DE CAMPO).

Conversei com a professora sobre a prova de Fernando e ela me disse que ele

sempre quer fazer a prova, por isso, para não discriminar, ela dá a avaliação a ele.

Entretanto parece que Fernando sabe que existe uma diferenciação desse ato entre

ele e os outros. Para os outros, quem sabe, indica a potencialidade; para ele, marca

a diferença, porque, na dos outros, tem marca, tem sinais; na dele somente um

visto, um silêncio. Um silêncio que se prolonga no espaço em branco dos diários.

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O que significam de fato essas mudanças? Será que a escola resolveu mudar as

práticas por respeitar o processo de aprendizagem de cada aluno? Ou será que as

mudanças têm a ver com o sujeito avaliado que é considerado um estudante fora do

padrão?

Não estamos advogando que a avaliação tenha que ser a mesma, mas sim tentando

refletir sobre os princípios que possibilitaram a mudança. Na fala da vice-diretora,

Adélia, um dos possíveis motivos é esclarecido.

Esse aluno é amparado por lei. A retenção desse aluno na série, mais uma vez gera desmotivação e baixa auto-estima. É ponderado o seu qualitativo, a sua evolução, em relação a si próprio (VICE-DIRETORA ADÉLIA).

Percebe-se aqui que a opção por fazer um registro tem a ver com uma avaliação

informal na qual há um ideário de que os alunos que apresentam alguma deficiência

são amparados por lei e, por conta dessa deficiência, não podem ficar reprovados.

Nessa fala, também, podemos refletir na seguinte questão: se o sistema avaliativo

da escola é por nota e o principal instrumento é a prova cujos resultados são

considerados a representação da aprendizagem dos alunos por intermédio da

professora, como avaliar a aprendizagem dos alunos com deficiência, se esses não

fazem a prova? Que imagem esses alunos passam para o contexto da classe,

quando são alijados dessa prática? Qual a responsabilidade da escola com a

aprendizagem desse aluno se ele passa por lei?

Antes de continuarmos nossa análise, queremos pontuar que não há uma Lei nem

no âmbito nacional nem no âmbito municipal que contemple a promoção automática

dos alunos com necessidade educacional especial. O que ocorre é o entendimento

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errôneo das legislações (Lei nº 9.394/96, em seu art. 24, e as Diretrizes Nacionais

Para a Educação Especial na Educação Básica, alínea 8, do art. 8º) que apontam

algumas orientações quanto à perspectiva da avaliação.

Essa falta de esclarecimento acaba fragilizando todo o processo pedagógico desses

alunos e como afirma Caetano (2002, p. 151):

Os alunos correm o risco de continuar avançando sem receber um ensino de qualidade. Não estamos nos prendendo aqui ao fato de o aluno avançar ou não e sim ao fato de avançar sem nenhuma proposta de ensino real, ou seja, onde haja qualidade naquilo que se ensina e se aprende.

7.2.1 O uso do relatório como uma prática avaliativa dos alunos com

necessidade educacional especial

Como já colocamos, no tópico anterior, os alunos com necessidades educacionais

especiais recebem uma prática avaliativa diferenciada dos demais alunos. Aqueles

que apresentam uma necessidade por deficiência que a escola julga ter uma séria

limitação para aprender não fazem a prova e nem outra atividade avaliativa. A

prática em relação a eles é o uso do relatório.

Os alunos que não são normais, eles não fazem essa avaliação. A avaliação deles é por meio de relatório. As atividades na sala, quando a especialista está, fazem a adaptação. Alguns professores já conseguem adaptar e dar a assistência individual aos alunos. Na avaliação dos alunos com deficiência, o registro é feito pela professora da sala junto com a professora da sala de recursos e elas mostram ao pedagogo. Os registros ficam arquivados, eles são feitos no final do ano (PEDAGOGA JANETE).

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Em relação ao registro o Pedro tem nota. Os demais não registramos nota. Tem um registro à parte. No final do ano, a gente faz um relatório e, no diário, coloca o amparo legal para avançar um aluno. A professora Mariana faz o relatório de atendimento na sala de recurso, aí a gente junta e produz um relatório unificado (PEDAGOGA RENATA).

A diferenciação entre os alunos com e sem deficiência e entre os próprios alunos

com deficiência parte de um princípio de que há uma homogeneidade e um padrão

de aprendizagem a ser seguida. É uma avaliação tal como aponta Beyer (2005),

baseada nos paradigmas clínico-médicos e sistêmicos, pois a diferenciação, no

primeiro caso, parte de critério de o estudante ter ou não deficiência. Se tem, há

uma representação sobre esse sujeito, como alguém que tem limitações. No

segundo, a diferenciação da avaliação é por inventar um padrão de turma e aqueles

que não acompanham precisam de adaptações, de mudanças para continuar

seguindo.

Percebemos, na fala das pedagogas, claramente, essa diferenciação. O aluno

Pedro, que é um aluno surdo, faz a prova e tem nota, porém ele não a faz na escola

como os demais. Ele faz a prova com a professora especialista em surdos que a

interpreta em LIBRAS para ele. Já o aluno Emanuel e o Fernando, eles são

avaliados por relatório. Esse relatório é feito pela professora da sala de recurso e

endossado pela professora da sala regular, geralmente no final do ano letivo.

Observei, no primeiro dia de aula e final do ano letivo de 2005, o Conselho de Classe daquele ano. As professoras preenchiam diários e a pedagoga ia conferindo dias letivos e dando orientações burocráticas de como preenchê-lo, pois o final do ano letivo estava totalmente atrasado por causa de uma greve naquele ano. Senti a falta de algumas discussões, sobre o desempenho dos alunos, sobre o porquê determinados alunos iriam passar de ano. Enfim, reflexões comuns em qualquer Conselho. Vendo o movimento individual/coletivo (porque, embora juntos, cada um trabalhava individualmente) dos professores, percebi que a professora da 3º série aguardava orientação sobre um aluno [Emanuel] que tinha

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deficiência mental e que não podia ficar retido naquela série. A pedagoga dizia que tinha fazer relatório e era para esperar a professora da sala de recurso para fazerem juntas. ‘M. precisa fazer o relatório’ [falou a pedagoga quando avistou a professora especialista]. A pedagoga pediu para que eu ajudasse a colocar a legislação que garantia a aprovação para a 4ª série. Disse que não havia uma legislação específica, mas que a LDB, no art. 24, dava legitimidade para tal condição. A professora da sala de recursos foi fazer junta/sozinha o documento. As duas fizeram algumas anotações/rascunhos e a professora especialista terminou sozinha o documento final. Percebi que os alunos que tinham alguma deficiência, uns eram avaliados e continham notas no diário e já outros eram avaliados somente pelos relatórios. Eram avaliados somente no final do ano, quando a professora da sala de recursos, junto com a professora da sala regular faziam o relatório final/inicial (porque esse relatório era o primeiro e o último). Este aluno em questão tinha sido avaliado, porém suas notas eram baixíssimas e necessitavam de um relatório para anular suas notas e aprová-lo como um aluno com deficiência (TRECHO DO DIÁRIO DE CAMPO).

Percebemos que o relatório é um documento que deveria apontar o processo de

aprendizagem dos alunos. Entretanto este só é feito no final do ano letivo. Como

podemos acompanhar a aprendizagem, o percurso, se só sistematizamos no final do

ano? Para que serve esse relatório? Qual a relação dele com uma prática avaliativa

que deveria estar atrelada à parte pedagógica?

Méndez (2002, p. 17) aponta que

[...] avaliar somente no final, ou por unidade de tempo ou de conteúdo, é chegar tarde para garantir a aprendizagem contínua e oportuna. Neste caso e neste uso, a avaliação só chega a tempo para qualificar, condição para a classificação, que é o passo prévio para a seleção e para a exclusão racional.

Conseguimos, com a especialista, o relatório feito por ela, do ano letivo de 2005, dos

alunos Fernando e Emanuel.

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Relatório sobre o aluno Fernado – maio/2006. O aluno apresenta DM e hiperatividade. Segundo a professora Marilândia [professora especialista da outra escola], ele conhecia vogais e algumas letras. Quando comecei o atendimento ele havia esquecido letras e numerais fazendo o seu nome nem sempre correto. Relembrou letras, conhece quase todas quando está concentrado, muitas delas relacionadas a nomes significativos. Tem momentos de total esquecimento. Desenvolveu muito a psicomotrocidade, fala (comunicação oral e expressão de vontades em geral), comportamento (obediência às normas, horários, respeito com os colegas e material dos mesmos). Hoje realiza atividades com entusiasmo e já sem precisar de condicionamento. Quer muito aprender a ler. Oralmente está na fase silábica de escrita e alguns fonemas, já escreve corretamente sem precisar falar a letra. Realiza atividades de escrita espontânea com algum valor sonoro [...]. Preenche cruzadinha, faz produção de texto (ele fala eu estruturo a frase), e escrita de nomes com ajuda (falando as letras e indicando o lugar para escrever). Muitas vezes volta e lê o que escreveu, se for de seu interesse. Relata fatos e conta historias através de gravuras e fatos do cotidiano, às vezes com frases, às vezes com palavras mais significativas do que representa a cena. Gosta de colorir e já faz com algum limite. Na escolha das cores necessita ser direcionado. Gosta de jogos como bola, tiro ao alvo, domino, boliche, boca de palhaço e outros, precisa de acompanhamento para jogar. Identifica nºs 0 e 1, às vezes lembra de outros ate 9, conta até 5 e ás vezes até 8. Tem preferência por colegas e adora ajuda deles quando realiza atividades de escrita. É muito amoroso e cativa quem o rodeia. Desenvolveu esquema corporal, quando questionado faz o corpo completo. A forma dos desenhos procura copiar para fazer melhor, tem consciência do que não está bem feito e sempre procura consertar solicitando modelo para copiar. Interpreta cena em ralação à leitura e acrescenta elementos necessários. Faz equiparação de figuras e letras. Tem noção temporal e seqüencial dos acontecimentos do dia-a dia. [...] (PROFESSORA ESPECIALISTA MARIANA).

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Relatório sobre o aluno Emanuel – maio/2006. O aluno apresenta DM, não tem atendimento médico, a família resolveu procurar o médico. Inicialmente estava no pré-silábico e havia esquecido algumas letras. Encontra-se no nível silábico com valor sonoro de vogal e consoante, com acompanhante escreve no nível alfabético. No ano passado apresentou problemas comportamentais. Hoje se relaciona bem com os colegas, em alguns momentos apresenta rebelde por dificuldade de dialogar e de se expressar quando não concorda com os fatos. A princípio não copiava ou às vezes copiava os mesmos símbolos repetidamente. Após acompanhamento em sala pelo trabalho colaborativo orientando-o e fazendo-o refletir sobre a escrita, com participação do professor regular ele passou a copiar legivelmente. Hoje copia quase toda a atividade de registro de autonomia. Apresenta boa coordenação motora e auto-estima em alta confiante que está aprendendo a ler. Realiza atividades em sala com adaptação e interferência do professor ou dos colegas. Nas atividades de português já consegue encontrar palavras nos textos e entender significados da escrita. Participa do momento da conversa informal manifestando seu conhecimento quando da explicação da matéria, ao ser solicitado pelo professor. Soma e subtrai com material concreto e com orientação. Tem noção dos conceitos de adição, subtração, numeral e quantidade. Necessita de neurologista, mas oferecido pelo SUS sua mãe não quer levar, e como agora a família resolveu leva-lo estão tentado arrumar um particular. Necessita de tratamento para chegar ao nível alfabético conforme diagnostico pedagógico da escola e já aceito pela família. Continua sendo trabalhado com leitura, escrita o que já faz rapidamente quando feito valor sonoro pausadamente (adolescência), relacionamento, psicomotricidade e autonomia alcançou os objetivos propostos. Faz a letra cursiva muito bem tendo dúvidas em algumas maiúsculas, colore nos limites quando quer, recorta e faz colagem. Participa de jogos como boliche, dominó, memória, tiro ao alvo, boca de palhaço, encaixe, e monta quebra-cabeça, com entendimento devendo ser alertado para respeitar as regras que já conhece. Relata fatos com seqüência e pede esclarecimento de termos do dia que julga inadequado de usar e nem sempre sabe o significado e o porque de não usa-los.

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Monta o corpo humano e desempenha figura humana completa quando questionado sobre partes do corpo. Gosta de monitorar colegas, falando letras para a escrita de nomes quando os monta (loto-leitura, alfabeto, móvel-cruzadinha e outros). Conhece os verdadeiros valores da vida, mas nem sempre os aceita, para tal se faz necessário conversar com a família que o orienta nos apoiando (PROFESSORA ESPECIALISTA MARIANA).

Percebemos que a professora da sala de recursos relata sobre o processo de

aprendizagem desses alunos, apontando suas dificuldades, seus desafios. E

também volta a enfatizar, no caso de Emanuel, a questão clínica como sendo um

dos recursos para a melhora na aprendizagem. Entretanto, como esse relatório só é

feito no final do ano, ele acaba se constituindo num instrumento burocrático, com um

fim em si mesmo, que não adquire um caráter avaliativo no sentido de

retroalimentador da prática pedagógica, mas, sim, um documento morto, que não

impulsiona ações. Como colocou Méndez (2002), a avaliação chegou tarde.

Outro questionamento que nos vem a partir da análise desse relatório é que este se

constitui num instrumento que marca, que separa, que exclui o aluno que está

incluído, pois quem tem o controle da aprendizagem não é a professora da sala

regular, mas a professora especialista. Os alunos estão incluídos, mas quem é

responsável por esse processo de avaliação é um outro profissional que não é o

responsável pela turma.

Dessa forma, mesmo sendo por relatório, a prática avaliativa em relação aos alunos

com necessidade educacional expressa uma prática excludente, pois não serve para

uma retroalimentação da prática pedagógica.

É uma avaliação, tal como afirma Esteban (2001, p. 100), na ótica do exame, pois,

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[..] atende as exigências de natureza administrativa, serve para reconhecer formalmente a presença (ou ausência) de determinado conhecimento, mas não dispõe da mesma capacidade para indicar qual é o saber que o sujeito possui ou como está interpretando as mensagens que recebe. Tampouco pode informar sobre o processo de aprendizagem dos estudantes ou questionar os limites do referencial interpretativo do/ a professor/a. A partir do exame o/a professor/a pode avaliar se o/a aluno/a foi capaz de responder adequadamente a suas perguntas. Porém, o erro ou acerto de cada uma das questões não indica quais foram os saberes usados para respondê-la, nem os processos de aprendizagem desenvolvidos para adquirir o conhecimento demonstrado, tampouco o raciocínio que conduz à respostas dada. Para a construção do processo ensino/aprendizagem, estas são as questões efetivamente significativas, e não o erro ou o acerto como ressalta a lógica do exame.

Podemos perceber que os relatórios mostram sujeitos/alunos que apresentam

potenciais, falam de uma aprendizagem que eles já alcançaram mas que não dá

pistas de onde o professor pode intervir para que esse aluno possa crescer. É

preciso repensar por que estamos oferecendo uma prática diferenciada, se é para

respeitar o processo de cada um ou se porque não acreditamos no potencial dos

alunos com necessidade educacional especial.

Não se trata de, simplesmente, mudar a linha metodológica nem de abolir os ‘instrumentos’ [...] classificando-os como promotores de exclusão. Trata-se, sim, de pensar a educação com o sentido de que suas possibilidades de tessitura dos conhecimentos ─ construção, se preferirem ─ não necessitam, obrigatoriamente, passar por uma avaliação que, [...] promove, quase que invariavelmente, exclusões e mutilações na formação dos nossos alunos (RIBETTO et al., 2003, p.108-109).

Muito mais importante do que a forma de avaliar, precisamos nos ater ao que ela

tem servido. Nesse contexto, precisamos analisar qual a relação da avaliação com a

prática pedagógica.

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7.2.2 A relação da avaliação como retroalimentadora da prática pedagógica

Para além de uma avaliação atrelada a momentos estanques que servem para

separar os alunos no interior das classes e da escola, acreditamos numa perspectiva

de avaliação que contribua com o processo de ensinoaprendizagem de todos os

alunos da escola.

É preciso que se tenha uma prática de avaliação “[...] qualificada como tomada de

decisões para a compreensão e melhoria do ensino” (VALLEJO, 2003, p. 51). Dessa

forma, segundo o mesmo autor, coloca-se a serviço do processo

ensinoaprendizagem, que se integra e forma parte do cotidiano da sala de aula,

porque “[...] a avaliação é parte do currículo, na medida em que a ele se incorpora

como uma das etapas do processo pedagógico” (OLIVEIRA; PACHECO, 2003, p.

119).

Nesse contexto, a avaliação precisa estar imbricada à prática pedagógica, estar

presente nas atividades diárias. Algumas professoras colocaram que elas avaliam

em todo o instante e com o intuito de rever o processo.

Em todo o instante. Eu sei da capacidade deles observando as atividades que eles fazem na sala de aula [...]. Através da atividade, das perguntas orais, proponho uma revisão, retomo o assunto novamente, (PROFESSORA ANDRÉIA) Através das atividades realizadas revejo o processo ensino-aprendizagem (PROFESSORA IZABELA).

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Apesar de as professoras apontarem essa prática de estar revendo o conteúdo

quando os alunos não atingirem o objetivo, é bom ressaltar que, na análise do

cotidiano, percebíamos que, no dia-a-dia, não havia essa retomada. Os professores

iam seguindo o conteúdo conforme a estrutura curricular da série.

Loch (2003, p. 130-131) coloca que, na escola tradicional, “[...] existe o tempo de

ensinar e o tempo de avaliar, enquanto momentos estanques [...]. Os ‘conteúdos

escolares’ são organizados de forma linear, hierárquica e previamente determinados

por bimestre, série, disciplina, sob justificativa de serem pré-requisitos de outros [...]”.

As aulas eram fragmentadas por disciplinas: História, Geografia, Matemática, Língua

Portuguesa, Ciências e Artes. Geralmente, antes do recreio, era uma disciplina e

depois do recreio era outra. Nos dias em que tinham Educação Física e Artes, o

aluno assistia a três matérias diferentes. Pela observação e análise do diário de

classe, vemos uma continuidade linear dos conteúdos a serem ensinados e a

aplicação do instrumento avaliativo sempre após uma quantidade pequena de

conteúdos que foram ensinados. Geralmente, nas matérias de Artes, História e

Geografia, havia trabalhos, além da prova, já em Matemática e Língua Portuguesa,

sempre a forma de avaliar era somente por meio de prova.

Víamos, num contexto de prática pedagógica, uma cotidianidade: explicar a matéria,

fazer exercícios, fixar e avaliar. Esse ciclo se repetia nas duas salas observadas. A

avaliação era muito mais com um fim em si mesmo. Quando o aluno não ia bem, o

que acontecia era uma recuperação paralela, não com o intuito de recuperar

conteúdos, mas sim com o propósito de alcançar a nota mínima.

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Esteban (2003, p. 88) coloca que, quando entendemos a relação de

ensinoaprendizagem como um processo, “[...] o enfoque da avaliação muda. O

importante não é atribuição de nota ou o conceito, interessa coletivamente a

compreensão do processo ensino-aprendizagem, para permitir a ampliação do

conhecimento”.

Dessa forma, “[...] a avaliação como prática de investigação pressupõe a

interrogação constante e se revela um instrumento importante para professores e

professoras comprometidos com uma escola democrática” (ESTEBAM, 2003, p. 25).

Numa perspectiva de educação inclusiva, acreditamos que a avaliação deve servir

para a compreensão dos processos de ensinoaprendizagem de cada um e assim

contribuir para uma prática peadgógica que ofereça uma educação de qualidade. A

avaliação, no contexto da Escola Bansalu, não era ligada à prática pedagógica, nem

em relação aos alunos com necessidade educacional especial nem aos outros. Em

uma das observações na sala de aula, pudemos ver:

[...]. Ela deu uma folha com atividades para ele fazer, explicou e disse que qualquer dúvida havia seu amigo do lado ou podia chamá-la. A medida que ia ‘fazendo’ confirmava com seu amigo suas hipóteses. Aos poucos, outras crianças se prontificaram a ajudar. Percebi que, embora as crianças tivessem boa vontade, elas acabavam respondendo para o Emanuel ao invés de ajudá-lo a pensar. Perguntei, então, a professora, se podia ajudá-lo. Ela me olhou e disse que sim. Pediu para que o aluno que estava próximo trocasse de lugar comigo. Então fui ajudá-lo. Era uma atividade que tinha um quadro com brinquedos e havia perguntas em relação à quantidade de cada um. Depois, ele tinha que fazer um gráfico com a quantidade. A primeira pergunta eu li para ele e ele conseguiu me responder. A segunda eu deixei, ele ir lendo comigo. Sabia as letras, mas tinha dificuldade em junta-las em voz alta. Conseguiu com ajuda ler e responder. A princípio, me pareceu nervoso, querendo me mostrar que sabia, mas tinha medo de errar. Ele coçava a toda instante o nariz, tossia. Na hora de

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escrever a primeira resposta, ele parecia não querer errar: iniciava a escrita do numeral e apagava, ora caçava o nariz, ora apagava. Parecia querer me impressionar, demonstrando que sabia. Durante a execução da atividade, olhava para os demais colegas e via que eles faziam o dever do livro, percebeu que eles estavam fazendo uma outra atividade diferente daquele que ele estava fazendo. Assim que acabou a atividade da folha, perguntou se podia fazer o dever do livro. A professora o autorizou. Ele abriu um sorriso meio de lado, olhou o colega para identificar a página e começou a folhear seu livro, procurando-a (DIÁRIO DE CAMPO- EPISÓDIO NA 4ª SÉRIE).

Podemos perceber, no relato, que, para um aluno de 4º série, ele tem um nível bem

diferenciado dos demais alunos, apresentando dificuldade de ler e interpretar, mas,

com a intervenção, é capaz de realizar as atividades. Entretanto não vislumbramos

nenhum trabalho sistematizado, nenhum planejamento específico para que ele

possa ter um desenvolvimento mais avançado.

Em um outro momento na sala da 3º série, pudemos presenciar um outro fato que

demonstra a potencialidade dos alunos:

[...] ela deu produção de texto. Era um desenho de um papagaio que morde o dedo de uma criança. A partir da imagem, Pablo fez a interpretação e me disse o que a cena representava. Começamos, então, a escrever sobre o desenho. A história ficou assim: ‘Papagaio bicou o dedo menino. O Pablo estava na janela da casa e viu o papagaio bicar dedo Lucas. Lucas saiu correndo e chamou mãe. A mãe abraçou o menino. Fim’ Essa história foi feita com a intervenção da pesquisadora, mas as idéias foram de Pedro. O fim, após a conclusão, foi autonomia dele que, após a escrita, me amostrou. Em seguida, foi amostrar à professora que lhe disse que estava bom, mas continha alguns erros [falta de artigos, pontuação]. [...] Percebi que, quando ela corrigia o caderno das outras crianças, ela circulava indicando o erro e intervia anotando a palavra correta. Já com Pablo, ela só olhava e não fazia intervenção. Conversei com ela sobre a questão dos artigos na escrita dos surdos. Ela queria saber se precisava ensiná-lo ou não [...]. Quando Pablo acabou de pintar a folha de produção de texto, estava com um colorido muito lindo.

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Ele me amostrou e foi amostrar a professora que corrigiu. Quando retornou a mesa, ele sinalizou [português], respondi que sim (TRECHO DO DIÁRIO DE CAMPO – 3ª SÉRIE).

Percebemos, nesses dois fatos, que tanto o Pedro como o Emanuel têm potencial e

podem estar sendo estimulados, podendo ter intervenções no seu processo de

aprendizagem. Eles dão pistas, dão sinais de que estão em processo. O aluno

Pedro consegue fazer uma produção textual no seu nível e dentro da estrutura de

sua língua materna.

Diante desse potencial, acreditamos que as práticas avaliativas, dentro do contexto

das escolas, devem valorizar muito mais a avaliação como prática investigativa que

dá suporte ao processo de aprendizagem do que a avaliação final. É no dia-a-dia, no

cotidiano das coisas, que catamos pistas sobre esse processo e, dessa forma,

podemos redimensionar os nossos olhares sobre todos os alunos e oferecer uma

educação de qualidade.

A avaliação como um processo de reflexão sobre e para a ação contribui para que o professor se torne cada vez mais capaz de recolher indícios, de atingir níveis de complexidade na interpretação de seus significados, e de incorporá-los como eventos relevantes para a dinâmica ensino/aprendizagem (ESTEBAM, 2003, p. 24).

É bom ressaltar que não estamos apontando a avaliação como uma panacéia que

irá resolver, como um passe de mágica, todos os desafios da inclusão, mas,

acreditamos que, por meio dela, podemos contribuir para dar pistas a uma prática

pedagógica que incida no processo de aprendizagem de cada um.

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Entretanto de nada adianta mudar a avaliação se as práticas pedagógicas ainda se

pautarem na homogeneidade, na hierarquização e fragmentação. Dentro desse

contexto, remetemos, outra vez, às cenas já relatadas. Parece-nos que, nesses

recortes, alguns apontamentos nos vêm à baila: como trabalhar com um

determinado aluno que não tem o “padrão” dos demais? Como equalizar um

trabalho pedagógico que possibilite a aprendizagem de todos sem provocar

discriminação, sem excluir ninguém?

Mas como trabalhar com as diferenças sem excluí-las? As professoras da escola

Bansalu colocam que tal perspectiva não é simples, é um desafio a ser transposto

por elas mesmas:

Trabalho o individual, essa diversidade é muito complicada. Além dos alunos com deficiência você tem aqueles que têm dificuldade. E eu encontro muita dificuldade com a diversidade [...] (PROFESSORA IZA). A minha maior dificuldade é conseguir perceber como eles pensam. Em que caminho tenho que tomar para chegar até aquela criança. Em como e o que posso fazer para que eles aprendam [...] (PROFESSORA ANDRÉIA). [...]. Preparar atividades que estejam ao seu alcance. [...] Muito complicado, faço o que posso (PROFESSORA IZABELA).

Não podemos deixar de mencionar que o uso de atividades diversificadas é um

recurso que possibilita trabalhar o aluno, e isso é um ponto positivo para a prática

pedagógica das professoras, porém essa prática não garante um sentimento de

pertença dos alunos, pois eles realizam atividades diferenciadas dos demais,

explicitando a sua diferença. Segundo Stainback (1999, p. 480), “[...] o objetivo da

inclusão não é o de apagar as diferenças, mas o de que todos os alunos pertençam

a uma comunidade educacional que valorize sua individualidade”.

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Nas falas, percebemos as dificuldades, mas também notamos o esforço para que

essas crianças não estejam simplesmente colocadas no interior das classes, sem

nenhum atendimento. Elas apontam o caminho das professoras para dar conta das

diferenças dentro da sala de aula e, para isso, utilizam atividades diversificadas.

André (2004), baseando-se em Perrenoud, aponta que o ideal não é variar as

atividades e sim diferenciar os percursos e o acompanhamento. Isso não significa

um programa especial para cada aluno, mas uma busca por estratégias que dêem

conta daquele conjunto de alunos.

Trabalhando com uma Pedagogia diferenciada, há uma possibilidade de uma prática

que atenda aos níveis diferenciados e que, ao mesmo tempo, contribua para um

processo de inclusão, pois as atividades são pensadas para todo o grupo. Entretanto

isso não é uma prática fácil de ser feita, pois implica entender a complexidade do

processo ensinoaprendizagem, perceber a escola como um lugar possível da

coletividade e dessa forma uma instituição aprendente.

7.3 O COTIDIANO DA ESCOLA APONTANDO POSSIBILIDADES DE MUDANÇA

Observando o cotidiano da escola, podemos perceber algumas ações que indicam

um processo de mudança dentro do contexto da escola. Queremos, nesta parte,

enfatizar que um olhar prospectivo permite modificar práticas já instituídas e se abre

para que um indivíduo aprenda sobre o outro e com o outro.

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No decorrer das análises, trouxemos vários exemplos que demonstram o potencial

dos alunos com necessidade educacional especial e queremos apontar aqui que,

quando a escola se propõe a aprender sobre e com o outro, ela aprende a lidar com

aqueles que ela julgava não ter conhecimento para trabalhar.

Um dos exemplos é o da professora Iza que, em uma de suas falas, na entrevista,

colocava que tinha muito receio em trabalhar com um aluno que apresentasse

“deficiência auditiva”, pois não sabia se comunicar com ele. Durante as observações

em sua sala, pudemos acompanhar seu empenho para aprender a lidar com Pedro.

Um dos primeiros pontos a ser alterado nessa relação era a questão da

comunicação. Para amenizar essa situação e conseguir conversar com ele, numa

linguagem que houvesse uma relação de emissor e receptor, ela foi fazer um curso

de LIBRAS oferecido pela Secretaria Municipal de Educação de Guarapari, dado

fora do expediente de trabalho.

Isso, com certeza, minimizou a barreira comunicacional entre os dois e possibilitou a

professora trabalhar com ele, pois, como já colocamos, não havia intérprete naquela

sala para fazer a interpretação Português-LIBRAS. A princípio, ela articulava as

palavras pausadamente, para que ele pudesse fazer a leitura labial, depois, durante

a aprendizagem do curso, ela utilizou o conhecimento que estava aprendendo para

se comunicar com ele, conforme registro no diário de campo:

Ela vira para Pedro e pergunta quando ele irá para a Sala de Recurso para surdos [faz o sinal da professora da sala de recurso para indicar a quem ela está se referindo]. Ela ainda não constrói uma estrutura frasal, faz mais uma espécie de comunicação total do que LIBRAS propriamente dita.

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Pablo olha pra mim, com cara de quem não estava entendendo. Eu, então, refiz a frase em LIBRAS. Ele responde fazendo o sinal de quinta-feira. A professora imediatamente oraliza ‘quinta-feira’. _ Ah! Está aprendendo! [aproveitei para elogia-la] _ [Sorri e diz] Estou sim! Tenho aprendido muito com ele.

Nesse recorte do diário, apesar de ela ainda não ter uma competência lingüística em

LIBRAS, procura se comunicar e entender a informação que o aluno passa. Em

relação aos alunos surdos, fazer uso da língua de sinais significa respeitar uma

cultura surda e propiciar ao aluno um desenvolvimento na sua primeira língua.

Esse episódio também deixa claro o quanto ela reconhece que estar com Pedro a

fez crescer. Ela antes concebia uma visão de que era difícil trabalhar com o surdo

exatamente por causa da comunicação e hoje ela reconhece que ter Pedro em sala

lhe possibilitou aprendizagem.

É bom ressaltar que a inclusão de um aluno surdo implica que a escola precisa ter

alguém que saiba LIBRAS, pois não podemos continuar alijando o surdo de um

desenvolvimento em sua língua materna, mas, por outro lado, não podemos deixar

de matriculá-lo sob pena de não ter ninguém para trabalhar com ele. Vimos que as

dificuldades da comunicação foram amenizadas pelo conhecimento de LIBRAS,

linguagem aprendida num curso, mas também pelo convívio, pela experiência de

estar com ele. Não estamos advogando que, para a inclusão do surdo, basta que a

professora da sala regular saiba LIBRAS, pois existem outras questões que

envolvem essa situação.

Neste contexto percebemos que estar com um aluno com alguma necessidade

especial favorece a aprendizagem de todos aqueles que estão no mesmo contexto

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que ele. Este é um dos benefícios da inclusão, a possibilidade de aprender com e

sobre o outro favorecendo o desenvolvimento de todos. Para isso, precisamos

aprender a lidar com o outro e avaliar sempre as condições com as quais estamos

lidando com a inclusão.

Apesar de o episódio relatado apontar uma saga individual, precisamos pontuar que

não dá pra realizar políticas de inclusão sem a parceria do outro. O aluno que

apresenta qualquer deficiência não é da professora Iza, Maria, Joana, ele, pertence

à escola como um todo.

Nos encontros para o Estudo Reflexivo sobre Inclusão, foi discutido sobre essas

questões e pudemos perceber, nos dois dias, que a escola precisa estar discutindo,

refletindo, pensando sobre sua organização e o que pode ser feito para melhorar

esse espaço. A escola precisa ser, nos dizeres de Alarcão (2001), uma escola

reflexiva, uma escola que se organiza e que pensa sobre si mesma.

Brzezinski (2001, p.65) coloca que a “[...] escola que se quer reflexiva e

emancipadora é também uma escola vivida cotidianamente, dimensionada em seu

projeto político pedagógico-curricular entendido aqui como elemento de organização

do processo educacional que nela ocorre”.

Para que isso ocorra, é necessário um trabalho em conjunto. Essa idéia de todos

trabalhando juntos pode ser percebida nos momentos de estudo do grupo. Os

participantes elencaram alguns pontos que julgam favorecer a melhoria do trabalho

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pedagógico e favorecer uma educação para todos. Alguns apontamentos são

elencados:

a) estudos em grupo, envolvendo todos os professores, para troca de

experiência e conhecimentos;

b) conhecimento acerca das reais necessidades dos alunos;

c) busca de conhecimento para melhorar a prática pedagógica e diferenciar as

práticas escolares com segurança;

d) utilização de recursos e estratégias que atendam à diversidade de níveis da

sala de aula;

e) planejamento com o professor da sala de recursos e corpo docente para

todos os alunos;

f) planejamento com antecedência, incluindo atividades diversificadas, de

acordo com o nível do aluno.

Nesses apontamentos, percebemos que a questão do trabalho em equipe pensando

e refletindo juntos é uma condição básica para a melhoria da prática pedagógica na

Escola Bansalu. No trabalho em equipe, eles apontam que é necessário o

conhecimento e planejamento em conjunto.

Nesse contexto, percebemos que, na hora da reflexão sobre a unidade escolar, os

profissionais conseguem perceber para além de sua prática e apontar caminhos

possíveis para a superação da realidade dada.

Segundo Mizukami et al. (2002, p. 44-45),

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A construção contínua dos saberes não ocorre de forma isolada. Ela deve se dar na parceria entre as pessoas que estão em diferentes níveis de desenvolvimento profissional [...]. Nesse processo um oferece o que sabe e, estando aberto para ouvir e analisar posições diferentes das suas adquire outras formas de ver o mundo, de se ver nele e de compreender seu papel no exercício profissional.

Isso nos remete a uma forma de aprender que considera o saber individual, mas que

considera também o saber do outro. É nesse processo dialético e dialógico que

acreditamos ser possível caminhar na rede de construção do conhecimento. Nesse

sentido, aprendendo junto e com o outro, podemos ressignificar o cotidiano.

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8 INCLUSÃO E AVALIAÇÃO NO COTIDIANO DA ESCOLA:

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando fomos à Escola Bansalu para realizar a pesquisa, tínhamos, como objetivo,

compreender as práticas de avaliação cotidianas na escola, tendo como referência

as práticas pedagógicas dos professores e a reflexão sobre a avaliação no processo

de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais.

Por meio de um estudo de caso etnográfico, entramos no cotidiano da instituição e

podemos perceber como a avaliação é concebida e vivida pelos atores sociais que

compõem aquele espaço. É preciso deixar claro, como nos coloca Lefebvre (1991),

que há uma relação dialética entre o vivido e o concebido e que aquilo que o sujeito

concebe tem implicações naquilo que é vivido e, por sua vez, aquilo que se vive tem

implicações naquilo que é concebido.

A prática avaliativa que se presentifica dentro do cotidiano da escola se pauta numa

concepção de diagnosticar o conhecimento dos alunos e, para isso, o instrumento

que ganha destaque é a prova. Utilizando esse instrumento, representado na nota

que o aluno tira, o professor pode separar os que sabem daqueles que não sabem,

os que precisam de recuperação paralela e daqueles que não precisam. A nota da

avaliação é o imperativo das tomadas de decisões e “[...] torna-se legitimadora da

posição que o aluno ocupa na classe, na escola, e que possivelmente no futuro

refletirá a sua colocação na sociedade” (BERTAGNA, 2002, p. 240).

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Essa prática não é um modelo encontrado somente na Escola Bansalu, mas é

recorrente ao longo da história que deriva desde os primórdios da escola moderna

(BARRIGA, 2003; DIAS SOBRINHO, 2002). Além do mais, a prática de avaliação,

como somativa, é o modelo sugerido pelo Sistema de Ensino Municipal.

Entretanto, para os alunos que apresentam necessidades educacionais especiais

por deficiência, a prática de avaliação é diferenciada. Alguns fazem a prova na

presença de um intérprete e outros acabam não fazendo. Não fazer a prova ou fazer

com um outro professor não é a questão que importa, mas, sim, o motivo pelo qual

se estabelece essa diferença.

Percebemos que essa diferenciação, embora seja contemplada no Regimento

Comum das Escolas Municipais, não parte de uma perspectiva de considerar a

diferença do outro, mas atua como uma forma de continuar marcando, segregando,

separando os alunos que apresentam uma necessidade educacional especial

daqueles considerados normais. Dessa forma, não há indícios do desenvolvimento

desse alunado no decorrer do ano letivo, pois o relatório, que é o documento que

registra o processo de ensinoaprendizagem do aluno, só é elaborado no final do ano

pela professora especialista e cabe à professora da sala regular legitimar o texto

assinando em conjunto.

Nesse contexto, percebemos uma prática avaliativa que privilegia somente o produto

final _ expresso na nota ou no relatório _ e que não contempla o processo de

ensinoaprendizagem. Sendo assim, como pode favorecer a educação de todos?

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Como pode implicar uma prática que retroalimenta o processo pedagógico de

ensino? Como pode favorecer a escola numa perspectiva de inclusão?

Acreditamos que essa avaliação, como sinônimo de prova e que se presentifica na

nota, pouco contribui para a aprendizagem nem favorece a inclusão, pois, em sua

gênese, ela tem, como princípio, a classificação para a exclusão.

Esteban (2003) coloca que essa situação faz parte da ambigüidade da avaliação que

mede para incluir em alguma categoria de classificação e que acaba excluindo os

que estão alí incluídos. Ela afirma que

No cotidiano escolar, avaliando e sendo avaliada, a professora vai aprendendo duas lições contraditórias: é preciso classificar para ensinar; e classificar não ajuda a ensinar melhor, tampouco a aprender mais – classificar produz exclusão e para ensinar é indispensável incluir (ESTEBAN, 2003, p. 23).

Sabemos que essa mudança não é simples de ser feita, pois implica uma série de

superações das ações que acontecem no cotidiano da escola, que precisa parar

para refletir sobre a sua prática educacional; sobre sua concepção de avaliação;

sobre os saberes produzidos pelos sujeitos que ali estão, sejam eles alunos, sejam

professores; sobre a estrutura e organização curricular e demais componentes

envolvidos no projeto político-pedagógico da escola.

Sendo assim, a prática avaliativa vivenciada na Escola Bansalu ainda privilegia uma

forma de concepção que não promove uma mudança paradigmática no concebido. A

mudança da prática de avaliação, não pode ser por decreto, nem imposta; é preciso

que seja consensual.

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É necessário, então, reconhecer a existência da consciência coletiva, definida por

Lefebvre (apud BRZEZINKI, 2001, p.70), como aquela que “[...] não surge da

espontaneidade, mas emerge na e da realidade objetiva e brutal, inicialmente pela

resistência, depois pelo enfrentamento e busca de alternativas, e amplia-se para

toda a vida do sujeito individual e social”.

A mudança da prática avaliativa só é possível se houver uma consciência coletiva.

Um único professor pode mudar a postura na sua sala, mas, para que essa

perspectiva tome corpo, é necessário que a escola toda, que a comunidade escolar

também se envolva. Percebemos, na Escola Bansalu, que todos consideram e

acham importante essa consciência coletiva, porém falta criar esse espaço-tempo da

coletividade para que a comunidade possa parar e refletir sobre si mesma.

Entendemos que, dessa forma, podemos caminhar num sentido de uma avaliação

que possa contribuir para a aprendizagem de todos, em que todos os envolvidos

possam vencer a resistência inicial de trabalhar com alunos que aprendem em

ritmos e tempos diferentes, que possuem comportamentos diferenciados, que não

são encaixados no modelo de Parmênides, mas que são vistos como alunos

concretos.

Numa perspectiva de educação inclusiva, não se pode mais conceber que o

professor trabalhe individualmente no seu espaço escolar. A escola, os professores

precisam construir o saber em conjunto, refletindo juntos sobre que caminhos

precisam ser articulados. Assim, aprendemos a lidar com todos os alunos e construir

conhecimentos sobre como organizar a escola para oferecer uma educação de

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qualidade, pois “[...] é assim que se avança o conhecimento, que não é uma

revelação num dado instante, nem mesmo numa marcha linear e simples [...], mas

uma estrada, cheio de complicados meandros, que acompanha os acidentes do

terreno” (LEFEBVRE, 1995, p.103).

Se houvesse a instituição desse espaço-tempo para a coletividade pensar/refletir em

conjunto, talvez a Escola Bansalu pudesse questionar sobre: o papel do professor

especialista dentro da escola; os apoios necessários para se incluir um aluno surdo;

uma forma de avaliar sem causar exclusão dos alunos; uma forma de avaliar que

contribua para o processo de ensinoaprendizagem de todos; a qualidade da

educação que se oferece na unidade de ensino; um processo de formação

continuada dentro da escola. Enfim, podia parar e refletir sobre aquilo que o aflige e

encontrar saídas coletivas.

O pensar coletivo traz um alívio e, de certa forma, diminui a ansiedade dos

professores e da escola nessa perspectiva de educação inclusiva, pois há sempre

uma queixa sobre a não preparação para dar conta da diferença. Quando

aprendemos que o conhecimento é provisório e que se dá na interação com o outro,

passamos a entender que as respostas para os problemas não estão dadas, mas as

ações devem e precisam ser construídas de forma artesanal, lembrando que são

possibilidades para a realidade construída naquele cotidiano. Outro ponto a ser

questionado é a visão clínico-médico que ainda serve de paradigma para olhar as

crianças com deficiência dentro da escola. É preciso avançar e ressignificar esse

olhar.

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É assim que olhamos as práticas avaliativas e o movimento de inclusão na Escola

Bansalu. Nesse sentido, não cabe julgá-los, investigando se estão certos ou errados,

mas é preciso entender essas práticas como uma representação da configuração

vivida pelos autores naquele espaço tempo. Isso remete a compreender o cotidiano

não como algo fechado, previsível; mas vê-lo aberto a novas possibilidades. E

ressaltamos a palavra possibilidade, tal como Esteban (2003, p. 18):

Quero ressaltar a palavra ‘possibilidade’. Não há certeza de que construiremos práticas menos excludentes na escola, mas podemos vislumbrar um movimento neste sentido. Portanto, a possibilidade nos convida ao trabalho, árduo porque desconhecido, de transformá-la em realidade.

Como possibilidades, vislumbramos o potencial de alunos com necessidade

educacional no cotidiano da escola que podem, com intervenção fruto de uma

avaliação investigativa, aprender no tempo e ritimo deles, mas aprender com e como

o outro; vislumbramos possibilidades de um trabalho colaborativo realizado entre

professor especialista e professor da sala regular, com o intuito de favorecer não só

a aprendizagem do aluno com deficiência, mas favorecer a aprendizagem de todos;

vislumbramos uma avaliação que contemple o dia-a-dia e que intervenha na “zona

proximal” do alunado; vislumbramos a possibilidade de um trabalho coletivo dentro

da escola, no qual todos se sintam comprometidos com uma educação de

qualidade; vislumbramos espaços-tempos destinados à reflexão e à formação

continuada no interior da escola; vislumbramos políticas públicas que não apenas

cobrem atitudes, mas que viabilizem recursos, condições para que haja inclusão

com uma educação de qualidade.

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Essas possibilidades nos apontam um desafio, mas também uma nova forma de

conceber o espaço-tempo escolar. Esteban (2001, p. 90) nos ensina:

A reflexão sobre a experiência vivida é um caminho e um recurso fundamental para instaurar uma pedagogia da possibilidade, tendo como finalidade construir novas formas de vida que, embora não existam, podem ser intuídas na complexa tessitura que constitui a realidade cotidiana.

Quando olhamos a inclusão e a avaliação no cotidiano da escola, percebemos que

se faz necessário um outro olhar, uma outra forma de viver e conber a diferença, as

práticas pedagógicas, pois, como nos diz Ventorim (2006, p. 121):

No caminho da educação inclusiva propõe-se ressignificar o já significado, desconstruir o construído, desnaturalizar o tido como natural, suspeitar das verdades e das certezas. Pluralidade, transgressão, tolerância, incerteza, criação, estética, arte, territorialização, unidade, rede, singularidade, novas linguagens, diversidade, flexibilidade, competência, prudência, política, aventura encantada e estilos são alguns conceitos que movimentam o debate sobre a emergência de um conhecimento ‘alternativo’ com, na e para a educação inclusiva.

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97 VENTORIM, Silvana. Formação de professores com, na e para a educação inclusiva. In: SEMINÁRIO CAPIXABA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA. 10., 2006, Vitória (ES). Anais... Vitória: UFES, 2006. p. 113-121.

98 VICTOR, Sonia. O debate sobre as representações dos alunos com deficiência

na educação infantil: riscos `a proposta de inclusão. In: SEMINÁRIO CAPIXABA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA. 10., 2006, Vitória (ES). Anais... Vitória: UFES, 2006. p. 122-134.

99 ZEMELMAN, Hugo. Sujeito e sentido: considerações sobre a vinculação do

sujeito ao conhecimento que constrói. In: SANTOS, Boaventura Sousa (Org.). Conhecimento prudente para uma vida decente. São Paulo: Cortez, 2004.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – ENTREVISTA REALIZADA COM OS PROFESSORES DA ESCOLA BANSALU. ROTEIRO DE ENTREVISTA A SER APLICADO AOS PROFESSORES DA ESCOLA

PROFISSÃO

1) QUAL A SUA FUNÇÃO E A SÉRIE? 2) QUANTOS ANOS VOCÊ TRABALHA NO MAGISTÉRIO?

QUAL A SUA FORMAÇÃO? 3) COMO VOCÊ COMPLETA SUA FORMAÇÃO? 4) JÁ FEZ ALGUM CURSO SOBRE INCLUSÃO OU SOBRE EDUCAÇÃO

ESPECIAL?

INCLUSÃO

1) VOCÊ TEM ALGUM ALUNO COM NEE NA SUA SALA? QUAL? 2) O QUE É INCLUSÃO PARA VOCÊ? 3) O QUE VOCÊ ACHA DA INCLUSÃO? 4) QUAL A SUA MAIOR DIFICULDADE EM LIDAR COM OS ALUNOS? E COM

AQUELES QUE TEM ALGUMA DEFICIÊNCIA? 5) COMO TEM SIDO SEU TRABALHO PEDAGÓGICO JUNTO AOS ALUNOS

COM NECESSIDADES ESPECIAIS? 6) VOCÊ RECEBE ALGUM APOIO PARA LIDAR COM ESSES ALUNOS?

AVALIAÇÃO

1) PARA VOCÊ O QUE É AVALIAR? 2) COMO VOCÊ AVALIA? QUAIS OS INSTRUMENTOS QUE VOCÊ USA? 3) COMO A ESCOLA ORIENTA A QUESTÃO DA AVALIAÇÃO? 4) HÁ ALGUMA DIFERENÇA ENTRE A AVALIAÇÃO DOS ALUNOS COM NEE

E OS ALUNOS DITOS NORMAIS? 5) COMO VOCÊ PERCEBE O DESEMPENHO DOS ALUNOS? O QUE VOCÊ

PROPÕE A PARTIR DO DIAGNÓSTICO? 6) QUAL A SUA MAIOR DIFICULDADE PARA AVALIÁ-LOS? 7) NO FINAL DO ANO LETIVO O QUE TEM MAIS PESO PARA A DECISÃO DE

APROVAÇÃO?

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APÊNDICE B – ENTREVISTA REALIZADA COM OS PEDAGOGOS E DIRETORES.

ROTEIRO DE ENTREVISTA A SER APLICADO AOS PEDAGOGOS E

DIRETORES

PROFISSÃO

1) QUAL A SUA FUNÇÃO? 2) QUANTOS ANOS VOCÊ TRABALHA NO MAGISTÉRIO? E NESSA

FUNÇÃO? 3) QUAL A SUA FORMAÇÃO? 4) COMO VOCÊ COMPLETA SUA FORMAÇÃO? 5) JÁ FEZ ALGUM CURSO SOBRE INCLUSÃO OU SOBRE EDUCAÇÃO

ESPECIAL?

INCLUSÃO

1) VOCÊS TÊM ALGUM ALUNO COM NEE NESSA ESCOLA? QUANTOS?

QUAL? 2) O QUE É INCLUSÃO PARA VOCÊ? 3) O QUE VOCÊ ACHA DA INCLUSÃO? 4) COMO A ESCOLA TEM IMPLEMENTADO A INCLUSÃO? QUAIS AÇÕES

TÊM SIDO FEITAS? 5) QUAL A MAIOR DIFICULDADE QUE A ESCOLA TEM ENFRENTADO

PARA LIDAR COM OS ALUNOS? E COM AQUELES QUE TEM ALGUMA DEFICIÊNCIA?

6) COMO TEM SIDO SEU TRABALHO PEDAGÓGICO JUNTO AOS PROFESSORES PARA LIDAR COM OS ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS?

7) VOCÊ RECEBE ALGUM APOIO PARA LIDAR COM ESSES ALUNOS?

AVALIAÇÃO

1) PARA VOCÊ O QUE É AVALIAR? 2) COMO A ESCOLA ORIENTA A QUESTÃO DA AVALIAÇÃO? QUAIS OS

INSTRUMENTOS? 3) HÁ ALGUMA ORIENTAÇÃO DIFERENCIADA ENTRE A AVALIAÇÃO

DOS ALUNOS COM NEE E OS ALUNOS DITOS NORMAIS? 4) QUAIS OS ENCAMINHAMENTOS PROPOSTOS A PARTIR DO

DIAGNÓSTICO DE DESEMPENHO DOS ALUNOS COM NEE? 5) QUAL A MAIOR DIFICULDADE ENFRENTADA PARA AVALIÁ-LOS? 6) NO FINAL DO ANO LETIVO O QUE A ESCOLA PONDERA SOBRE A

DECISÃO DE APROVAÇÃO DESSES ALUNOS?