in-mind_português, 2010, vol.1, nº.2-3, fernandes e arriaga, dor pediátrica
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Consideraes gerais sobre a
definio e a avaliao da dor
peditr ica
Sara Fernandes1 e Patrcia Arriaga2
A dor afecta em todo omundo milhes de pessoas de
todas as idades. Ao longo deste
artigo incidiremos no construto dor
peditrica, na medida em que re-
mete para uma experincia deve-ras comum durante a infncia e
fortemente associada ao medo e ansiedade infantis (Bar-
ros, 2003; ORourke, 2004). Reflectir-se- no s acerca
das diferentes definies do conceito dor, como tambm
sobre as suas distintas formas de avaliao. Em suma,
pretende-se apresentar uma viso geral do panorama da
dor, sensibilizando para a importncia desta temtica.
(In)Definies do conceito de Dor
A dor uma experincia familiar e inerente exis-tncia humana (Bernardes, 2008). Porm, dor sentida
pelas crianas nem sempre foi atribudo e reconhecido o
seu real valor (e.g. Baeyer, 2008; Barros, 2003). Esta apa-
rente negligncia pode ser atribuda a diversos factores,
em especial ao facto de a dor ser uma experincia subjec-
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1 Centro de Investigao e Interveno Social (CIS), Instituto Universitrio de Lisboa (ISCTE-IUL).
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Centro de Investigao e Interveno Social (CIS), Instituto Universitrio de Lisboa (ISCTE-IUL).
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tiva complexa (LaMontagne, Hepworth & Salisbury, 2001;
McGrath & Gillespic, 2001) sobre a qual as crianas em
fases precoces do desenvolvimento infantil no so capa-
zes de transmitir informaes precisas e fiveis (Barros,
2003; McGrath & Gillespic, 2001). Embora as crianas
mais novas sejam capazes de reconhecer a dor como
desagradvel, podem ocorrer diferenas na capacidade de
compreenderem e descreverem esse fenmeno (McGrath
& Gillespic, 2001).
No entanto, e apesar de o conceito dor no serainda totalmente claro e consensual, todavia uma expe-
rincia com a qual todos ns j tivemos contacto (directa
ou indirectamente). Convm ainda ressalvar que existem
no s dilemas ao nvel da definio cientfica do conceito
de dor, como dificuldades inerentes variabilidade da dor
em funo da fase de desenvolvimento do sujeito que a
experiencia (Barros, 2003).
Comecemos por tentar definir em que consiste ador. Segundo a definio de dor, elaborada pela Associa-
o Internacional para o Estudo da Dor, esta corresponde
a uma experincia sensorial e emocional desagradvel,
associada com dano real ou potencial(IASP, 1994).
A investigao existente nesta rea evidencia asconsequncias negativas que podem surgir em sequncia
da experincia dolorosa. De um modo geral, a dor pode
afectar todo o sistema orgnico, e mais especificamente, o
funcionamento emocional, social, familiar, ocupacional e
fsico do ser humano (McGrath, 1990; Vaughan,Wichowski & Bosworth, 2007; Walco & Goldschneider).
Em particular, a dor pode interferir nas relaes sociais,
educativas e profissionais, ou at mesmo com a realizao
das tarefas e actividades dirias (Bastos, Silva, Bastos,
Teixeira, Lustosa, Borda, Couto & Vicente, 2007).
Neste mbito, a dor tem sido classificada e defi-nida tendo em conta diversos aspectos, nomeadamente a
sua durao (transitria versus aguda versus crnica),
intensidade, natureza, localizao, grau de desconforto,
frequncia e significado (e.g. Bernardes, 2008; Waldo,
2008). A resposta individual dor ainda determinada por
factores genticos e temperamentais, por sua vez influen-
ciados por caractersticas ambientais (Waldo, 2008). Para
alm destas, as respostas das crianas dependem da
idade, do nvel cognitivo, da maturidade, de aprendiza-
gens/experincias anteriores e do meio onde est inserida
(Barros, 2003; Bussoni, 2007; McGrath & Gillespic, 2001;
ORourke, 2004). A ttulo exemplificativo, enquanto que
uma criana de 10 anos de idade define a dor como sen-timento de desconforto quando se ferida, um adoles-
cente de 17 anos j a descreve como sendo a sensao
completamente oposta ao conforto, que pode ser fsica ou
emocional (McGrath & Gillespic, 2001). Visto existirem
diversas variveis que a caracterizam e definem, torna-se
imprescindvel atender fase do desenvolvimento infantil
em que a criana se encontra. Desta forma, as significa-
es atribudas experincia dolorosa so determinadas
em funo desse prprio nvel de desenvolvimento. Nos
recm-nascidos e bebs a dor tende a manifestar-se atra-vs do choro e de certos movimentos corporais, expres-
ses faciais ou mesmo apatia. Em crianas com idades
compreendidas entre um e os trs anos o choro pode
surgir acompanhado por verbalizaes, ou gestos locali-
zados na regio do foco da dor, bem como por determi-
nados movimentos inquietos, violentos ou de birra. Pode
tambm manifestar-se em alteraes nos padres de
sono, na alimentao e no brincar. A partir dos cinco anos
de idade, o modo como a criana expressa a dor tende a
ser mais complexo, uma vez que esta comea a ser capaz
de reportar, discriminar e representar os seus sentimentos(Barros, 2003). Devido a esta multiplicidade de factores
fcil perceber a dificuldade de definir e conceptualizar a
dor no seu todo.
Avaliao da dor: Medidas e dificuldades
semelhana da dificuldade existente para defi-nir o conceito de dor, tambm a sua avaliao no ex-
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clusiva de uma nica medida. Ao longo dos anos, tm
vindo a ser desenvolvidas e validadas diversas medidas de
avaliao da dor em crianas.
Com base no modelo explicativo da percepoda dor peditrica proposto por McGrath e Gillespic (2001),
existem inmeros factores que influenciam a forma como a
sensao dolorosa experienciada e interpretada. , no
entanto, indispensvel ter em conta a forma como a crian-
a compreende a dor (factores cognitivos), o que faz (fac-tores comportamentais) e o que sente (factores emocio-
nais). tambm fundamental contemplar o contexto em
que a dor ocorre, a sua origem, bem como a idade, expe-
rincias anteriores, sexo, cultura e aspectos familiares da
criana (McGrath & Gillespic, 2001; Vaughn et al., 2007).
Assim, semelhana da sua definio, tambm na avalia-
o da dor no existe uma medida que seja a nica e a
mais vivel na avaliao da dor na criana (Finley &
McGrath, 1998). por isso imprescindvel considerar,
priori, a forma como a dor percepcionada pela criana, e
s depois escolher a medida avaliativa mais apropriada
sua idade (McGrath & Gillespic, 2001). Convm igualmente
salientar, que apesar de ser indiscutvel que desde o nas-
cimento todo o ser humano capaz de sentir dor, a sua
avaliao por parte das crianas apresenta obstculos.
Em casos de bebs e crianas pr-verbais, em especial
com idade inferior aos trs anos de idade (Finley &
McGrath, 1998; McGrath, 1990), esta avaliao pode tor-
nar-se mesmo restritiva. Esta dificuldade deve-se ao facto
de nestas idades precoces no existirem as capacidades
cognitivas e sociais necessrias sua avaliao (Besenki,Forsyth & von Baeyer, 2007; Finley & McGrath, 1998). A
partir dos cinco anos de idade as crianas, em geral, co-
meam a ser capazes de expressar e reportar a dor que
sentem, embora tendam a caracteriz-la em plos extre-
mos de muito ou nada (Besenki et al., 2007; McGrath,
1990; McGrath & Gillespic, 2001). Nesta idade, a estima-
o da dor em geral pouco precisa, devido ao facto de
as crianas poderem apresentar dificuldades em separar a
dor de outras emoes desagradveis, como o medo, a
raiva ou a ansiedade (Blount, Piira, Cohen & Cheng, 2006).
Crianas com maior idade, adolescentes e adultos podem
tender a subavaliar a dor, visto j terem uma maior experi-
ncia, que lhes permite uma maior diferenciao (McGrath
& Gillespic, 2001).
Para alm da idade, o modo como a crianapercepciona a dor depende de outras variveis de nature-
za individual, familiar e situacional (Barros, 2003; Bussoni,
2007; McGrath & Gillespic, 2001; ORourke, 2004), pelo
que a sua avaliao objectiva e sistemtica se torna umatarefa difcil (Barros, 2003).
Devido importncia que nas ltimas duas d-cadas tem sido concedida avaliao da dor peditrica,
vrias medidas e instrumentos tm sido estudados. De
forma sumria, podemos dividi-los em trs grandes gru-
pos: medidas fisiolgicas, comportamentais/de observa-
o e psicolgicas.
Em relao s medidas fisiolgicas, a avaliaoda reaco dor tem-se baseado em alteraes nos n-veis de cortisol, frequncia cardaca e respiratria, nveis
de oxignio, entre outros (e.g. Barros, 2003; Gunnar, Isen-
see & Fust, 1987; Johnston & Strada, 1986). Estas medi-
das assumem extrema importncia quando as medidas de
observao e psicolgicas so inviveis, nomeadamente
nos casos em que os doentes se encontram sedados ou
ventilados. Por outro lado, so medidas que nem sempre
se adequam prtica clnica (Barros, 2003).
As medidas comportamentais tm-se reveladoadequadas para lactentes e crianas que ainda no des-
envolveram competncias verbais ou que apresentam
atrasos cognitivos. Estas medidas baseiam-se na anlise e
interpretao de sinais exteriores que a criana exibe,
como o choro, a postura corporal, as vocalizaes, os
movimentos e as expresses faciais (ORourke, 2004;
Schechter, Berde & Yaster, 2002). Apresentam como limi-
tao o seu carcter subjectivo, tanto do observador,
como do comportamento individual da criana (Barros,
2003).
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Quanto s medidas psicolgicas, as de auto-rela-to continuam a ser as mais utilizadas (cf. Finley & McGrath,
1998; ORourke, 2004). So instrumentos rpidos, cuja
aplicao se estende da primeira infncia (acima dos qua-
tro anos de idade) at idade adulta (Baeyer, 2008). No
obstante, necessrio ter em considerao que uma boa
medida de avaliao da dor no se deve contentar apenas
em determinar a sua presena ou ausncia, mas sim con-
templar as suas possveis gradaes, isto , os seus dife-
rentes graus de intensidade (Schechter et al., 2002). Por
outro lado, visto tratarem-se de instrumentos avaliativos
para crianas, recorrente a utilizao de figuras ilustrati-
vas, de forma a tornarem a medida no s mais apelativa,
como tambm compreensvel (Blount et al., 2006). As es-calas de resposta podem ser apresentadas sob diversos
formatos, nomeadamente numricos e/ou visuo-analgi-
cos (ver as Figuras 1 e 2)12 . Adicionalmente podem ser
ilustradas por diversos estmulos discriminativos, como
so exemplos os termmetros, as caras, as linhas, cujas
prprias gradaes (das imagens, coloraes e tamanhos)
ajudam a criana a identificar a dor experienciada e quan-
tificarem a sua intensidade com maior rigor (Barros, 2003;
Blount et al., 2006; ORourke, 2004; Schechter et al.,
2002) (Ver as Figura 3 e 4) 3. Uma vez que no existe uma
nica medida avaliativa transversal a todas as idades,
fundamental ter em conta que a sua correcta utilizao e
compreenso por parte da criana est associada a capa-
cidades cognitivas e sociais. Neste mbito, o uso de me-
didas de auto-relato da dor pressupe capacidades espe-cficas como a compreenso verbal, a seriao, a catego-
rizao e a ordenao de itens, a contagem, a estimao,
a classificao e a numerao de quantidades, os proces-
sos de representaes simblicas e as correspondncias
entre conceitos e figuras (Besenski et al., 2007). Para alm
destas caractersticas inerentes ao desenvolvimento infan-
til, certas competncias sociais, como a confiana e a
motivao, so requisitos bsicos utilizao de escalas
avaliativas de auto-relato da dor peditrica (Besenski et al.,
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1 As figuras exemplificativas dos diversos tipos de escalas de auto-relato mencionadas foram retiradas do site
www.partnersagainstpain.com, originalmente em ingls, e traduzidas pelas autoras do presente artigo no mbito da sua
publicao. Porm, convm ressalvar que as escalas traduzidas em verso portuguesa no foram ainda validadas, pelo que
os termos utilizados podero no ser os mais adequados para a populao Portuguesa.
2Figura 1 retirada de Acute Pain Management (1992). Operative or Medical Procedures and Trauma. Retirado em 29 de
Fevereiro de 2010 de www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3. Figura 2 retirada
de Stratton, H. (1997). Guidelines for Treatment of Cancer Pain: The Revised Pocket Edition of the Final Report of the Texas
Cancer Council's Workgroup on Pain Control in Cancer Patients. Retirado em 29 de Fevereiro de 2010 de
www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3.
3Figura 3 retirada de Mountain Pacific Quality Health Fundation. Thermometer pain scale. Retirado em 29 de Fevereiro de
2010 de www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3. Figura 4 retirada de
Hockenberry, M. & Wilson, D. (2009). Wongs Essentials of Pediatric Nursing. Retirado em 29 de Fevereiro de 2010 de
www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3.
Figura 1: Exemplo de uma escala numrica
Figura 2: Exemplo de uma escala visuo-analgica
http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/professional-tools/pain-assessment-scales.aspx?id=3http://www.partnersagainstpain.com/http://www.partnersagainstpain.com/ -
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2007). No entanto, na perspectiva de Baeyer (2008), o
facto de a dor ser uma experincia privada e pessoal,
pouca utilidade tem a comparao dos seus resultados
com os de outras crianas. Para o autor, ento mais
vlido comparar os relatos da dor sentida pela mesma
criana, em vrios momentos.
Tendo em conta a faixa etria da criana, acon-selhvel a escolha mais adequada da forma de avaliao
da dor sentida. Segundo Baeyer (2008), para bebs e
crianas at ao segundo ano de vida, o melhor instrumen-
to para a avaliao da dor a observao dos seus com-
portamentos. Quanto a crianas em idade pr-escolar(aproximadamente entre os trs e os cinco anos), as esca-
las de auto-relato com faces so a melhor escolha. Em
comparao, a partir dos seis at aos doze anos (idade
escolar) muitos dos instrumentos de auto-relato so acon-
selhados, e tanto as escalas numricas, como as faces ou
as visuo-analgicas (em especial com linhas ou termme-
tros) so vlidas e adequadas. De notar, por fim, que para
adolescentes e adultos recomendado o uso de escalas
numricas.
Ser fundamental fazer-se ainda uma ressalvaaos possveis julgamentos enviesados (apreciaes pouco
correctas) na avaliao da dor. Estudos recentes (Bosacki,
2007; Chaplin, Cole, & Zahn-Waxler, 2005; Widen & Rus-
sell, 2002) tm procurado mostrar que o processo avaliati-
vo das emoes determinado por certos factores como
a idade e o gnero. Desta forma, e estabelecendo ligao
com a dor, fundamental ter em conta no s a forma
como a criana reage dor e as significaes que faz
dela, como tambm a forma como aqueles que a rodeiam(pais, educadores, tcnicos de sade, pares, etc.) agem.
Dito de outra maneira, as investigaes nesta rea eviden-
ciam a existncia de determinadas variveis que podem
influir com a avaliao da dor, como as caractersticas
contextuais e pessoais de quem avalia e de quem avali-
ado. Exemplo disto o caso da varivel gnero, com a
crena de que o feminino mais emotivo e apresenta me-
nor tolerncia dor do que o masculino (e.g. Bernardes,
2008; Li, DiGiuseppe, & Froh, 2006; Rudolph & Flynn,
2007). Para alm disto, existem igualmente diferenas degnero (masculino e feminino) ao nvel da forma como a
dor exprimida, isto , os meninos e as meninas podem
interpretar e exteriorizar a dor de diferentes formas. Assim,
a sinalizao da dor da criana pode depender no s do
comportamento que manifesta, como tambm de outras
variveis (como o sexo e a idade), sendo possvel que
ocorram enviesamentos na sua leitura e interpretao por
parte de quem avalia (Bernardes, 2008; Bosacki, 2007;
Chaplin, Cole, & Zahn-Waxler, 2005; Widen & Russell,
2002). por isso essencial no subestimar a dor da crian-
a em funo de certas variveis externas, sob pena de se
avaliar erradamente a situao.
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Figura 3: Exemplo de uma escala em termmetro
Figura 4: Exemplo de uma escala com caras
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Em suma, e apesar da investigao na rea dador infantil ter evoludo amplamente nos ltimos 20 anos
(Walco, 2008), visto tratar-se de um sentimento subjectivo
e pessoal, a sua definio e estratgias avaliativas no so
nicas e invariveis. A investigao nesta rea indispen-
svel, a par com um maior envolvimento dos pais e dos
profissionais de sade na compreenso deste fenmeno.
Quanto maior for a sua compreenso, melhor a escolha de
formas de avaliao e mais adequadas e eficazes as estra-
tgias de interveno junto das crianas.
Concluso
A dor um sentimento negativo que faz parte dodia-a-dia de milhes de pessoas em todo o mundo. Esta
experincia pode ter repercusses negativas em termos
do funcionamento fsico, cognitivo, social, relacional, com-
portamental e emocional do indivduo. A investigao re-
cente nesta rea tem evidenciado que todas as pessoas,desde a mais tenra idade, so capazes de experienciar dor
(Barros, 2003; ORourke, 2004). O que difere em relao
ao adulto, cuja dor foi desde sempre mais valorizada e
foco de ateno, o facto de os bebs e as crianas (em
especial as mais novas) no possurem competncias de
comunicao suficientes para transmitir informaes com-
preensivas e fiveis sobre o que sentem (McGrath & Gil-
lespic, 2001). Por outro lado, a mesma dor pode ser senti-
da de diferentes formas consoante a pessoa ou a situa-
o. Factores como a idade, temperamento, maturidade,
capacidades cognitivas, experincias anteriores, caracte-
rsticas genticas e meio scio-cultural, esto associados
ao modo como cada um de ns, em determinado mo-
mento e contexto ambiental, percepciona a dor (Bussoni,
2007; McGrath & Gillespic, 2001; Waldo, 2008). A somar a
todos estes factores, imprescindvel ter em conta que a
dor deve ser enquadrada e compreendida em funo da
fase de desenvolvimento do sujeito (Barros, 2003). Por
tudo isto, fundamental encarar a dor como um fenme-
no de natureza biopsicossocial (Bernardes, 2008).
Acresce a esta subjectividade na definio daqui-lo que a dor, a variabilidade nas suas possveis formas
de avaliao. Uma explicao pode passar por encarar-se
a dor como uma experincia privada e altamente pessoal,
que no est de todo directamente acessvel aos outros
(Schechter et al., 2002). No entanto, dada a importncia
de uma correcta avaliao da dor, tem aumentado a inves-
tigao sobre as diversas formas de a mensurar. A escolha
da tcnica avaliativa deve ter em conta inmeros factores,
como as capacidades cognitivas, sociais e comunicacio-nais das crianas, bem como o estado fsico e psicolgico
em que esta se encontra. Por outro lado, aconselhvel a
conjugao de mais do que uma medida (por exemplo
uma observao comportamental associada com uma
medida psicolgica de auto-relato). O uso de diferentes
medidas pode aumentar a validade na avaliao da dor.
Uma correcta e minuciosa avaliao da dor ter a vanta-
gem de possibilitar uma melhor interveno e um trata-
mento mais adequado e eficaz no seu alvio.
Por tudo isto, facilmente se compreende a impor-tncia de uma adequada abordagem da dor infantil em
mltiplos contextos. Dito de outro modo, alguns dos ins-
trumentos anteriormente mencionados, como as escalas
com caras ou os termmetros, podero (e devero) ser
usados alm do mbito clnico, nomeadamente em con-
textos familiares e educativos. Estas ferramentas de fcil e
rpida aplicao possibilitam aos adultos (profissionais de
sade, pais e educadores) um melhor despiste e compre-
enso da dor que sentida pela criana, permitindo uma
interveno mais atempada, de forma a minimizar o sofri-mento existente. O uso destes instrumentos pode permitir
aos pais e educadores corroborar certos comportamentos
da criana, que atravs da mera observao, considerem
mais ou menos adequados.
Porm, indispensvel a consciencializao porparte de quem avalia, da existncia de diferenas ao nvel
da expresso e significao da dor, em funo de outros
factores como o sexo e a idade da criana. Estes factores
podem influir tanto na forma como a criana expressa e
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avalia a sua dor, como no modo como os adultos inferem
a dor da criana em escalas de observao. Uma maior
consciencializao e aprofundamento desta temtica po-
der minimizar o impacto dos possveis enviesamentos
avaliativos, prejudiciais a uma interveno adequada.
Em suma, o presente artigo procura contribuirpara um maior e melhor entendimento sobre a temtica da
dor infantil, salientando a importncia da sua correcta defi-
nio e avaliao. Na medida em que a dor pode ser umsinal importantssimo de leso (Barros, 2003), que atinge
milhares de pessoas em todo o mundo, torna-se funda-
mental e urgente responder com a maior preciso possvel
s perguntas o que a dor? e como se avalia?.
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7/28/2019 In-Mind_Portugus, 2010, Vol.1, N.2-3, Fernandes e Arriaga, Dor peditrica
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Autoras
Sara Fernandes licenciada em
Psicologia e mestre em Psicolo-
gia, Aconselhamento e Psicotera-
pias pela Universidade Lusfona
de Humanidades e Tecnologias
(ULHT, Portugal). Os seus interes-
ses de investigao centram-sena promoo da sade infantil em
contexto hospitalar. Em 2009
recebeu uma bolsa de investigao concedida pela Fun-
dao para a Cincia e a Tecnologia (Ref FCT: SFRH/BD/
61041/2009), no mbito do desenvolvimento do seu pro-
jecto de doutoramento subordinado ao tema da Prepara-
o de crianas para a hospitalizao. Encontra-se na
actualidade a fazer o doutoramento no ISCTE-IUL, em
Lisboa, sob a orientao de Patrcia Arriaga e Francisco
Esteves. [email protected]
Patrcia Arriaga Licenciada
em Psicologia pelo Instituto Supe-
rior de Psicologia Aplicada. Con-
cluiu o Mestrado em Psicopatolo-
gia e Psicologia Clnica pelo ISPA
em 2000 e o Doutoramento em
Psicologia Social e das Organiza-
es no Instituto Superior de Ci-ncias do Trabalho e da Empresa
em 2006. docente no Ensino
Superior desde 1996 e actualmente Investigadora Auxili-
ar no Centro de Investigao e Interveno Social (CIS) ao
abrigo do Contrato-Programa Cincia 2008.
In-Mind_Portugus, 2010, Vol.1, N. 2-3, 30-38 Fernandes e Arriaga, Dor peditrica38
mailto:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected]