impactos da inovaÇÃo biotecnolÓgica na dinÂmica … · e à cristiane, minha irmã, sempre ......

126
RODRIGO GAVA IMPACTOS DA INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA NA DINÂMICA DA ESTRUTURA DE CONCORRÊNCIA DA INDÚSTRIA DE SEMENTES Tese apresentada à Universidade Federal de Viçosa, como parte das exi- gências do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural, para obtenção do título de “Magister Scientiae”. VIÇOSA MINAS GERAIS - BRASIL 2000

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RODRIGO GAVA

IMPACTOS DA INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA NA DINÂMICA DA

ESTRUTURA DE CONCORRÊNCIA DA INDÚSTRIA DE SEMENTES

Tese apresentada à Universidade

Federal de Viçosa, como parte das exi-

gências do Programa de Pós-Graduação

em Extensão Rural, para obtenção do

título de “Magister Scientiae”.

VIÇOSA

MINAS GERAIS - BRASIL

2000

RODRIGO GAVA

IMPACTOS DA INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA NA DINÂMICA DA

ESTRUTURA DE CONCORRÊNCIA DA INDÚSTRIA DE SEMENTES

Tese apresentada à Universidade

Federal de Viçosa, como parte das exi-

gências do Programa de Pós-Graduação

em Extensão Rural, para obtenção do

título de “Magister Scientiae”.

APROVADA: 31 de agosto de 2000.

Eduardo Rezende Galvão José Roberto Reis

Telma R. da C. Guimarães Barbosa Geraldo Magela Braga

(Conselheiro)

José Benedito Pinho

(Orientador)

ii

A seu Eloy e dona Mariza, meus amáveis pais,

e à Cristiane, minha irmã, sempre amigos, companheiros e compreensivos

nos erros e acertos de minha vida.

A minha esposa Manoela, grande influenciadora desse esforço acadêmico

e de tantos outros, por sua paciência nesses anos.

A todos os amigos, em especial, a Adriano, Carlos Henrique, Cristiano,

Denilson, Felipe, Gaúcho, João, Júlio, Walderson e Tico (in memoriam),

pelos quais tenho imensa admiração.

iii

AGRADECIMENTO

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais

(FAPEMIG), pelo suporte financeiro para realização desta pesquisa.

Aos membros da Comissão Orientadora, em especial, ao prof. José

Benedito Pinho, pela competência e pela dedicação como orientador, e aos

demais professores e funcionários do Departamento de Economia Rural (DER)

da UFV.

Aos professores do Departamento de Administração, em especial, à

prof.a Telma, cujas contribuições foram decisivas para conclusão desta pesquisa.

Aos alunos das disciplinas Teoria Geral da Administração,

Administração de Vendas e Marketing I, por terem minhas atenções divididas

entre as duas atividades.

Aos colegas do curso, Alexandre, Bruno, Celso, Cláudia, Denilson, Beth,

Helen, Luciene, José Geraldo, Nazaré e Vânia.

A minha esposa Manoela, pelas valiosas sugestões, principalmente no

início da elaboração desta dissertação.

À Marísia, acadêmica de destaque, com quem o simples convívio muito

me incentivou nesta tarefa.

iv

BIOGRAFIA

RODRIGO GAVA, filho de Eloy Gava e Mariza Bardoza Gava, nasceu

em 16 de novembro de 1970, em Viçosa - Minas Gerais.

Em 1995, graduou-se em Administração na Universidade Federal de

Viçosa. Em 1996, trabalhou com pesquisa de marketing na Empresa APTA -

Pesquisa e Informação Ltda. Em 1997, fez o curso de Pós-Graduação “Lato

Sensu” em Gestão Estratégica em Marketing, no Instituto de Educação

Continuada (IEC), da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-

MG).

Em 1998, iniciou o Programa de Mestrado em Extensão Rural no

Departamento de Economia Rural, da Universidade Federal de Viçosa. No

mesmo ano, passou a lecionar disciplinas da área de administração no

Departamento de Administração do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes

da mesma Universidade.

v

CONTEÚDO

Página

LISTA DE TABELAS ............................................................................... viii

LISTA DE FIGURAS ............................................................................... ix

RESUMO ................................................................................................... x

ABSTRACT .............................................................................................. xii

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................... 1

1.1. Pesquisa básica e aplicada .............................................................. 4

1.2. Concentração industrial .................................................................. 5

1.3. O problema e sua importância ........................................................ 6

1.4. Objetivo geral ................................................................................. 10

1.5. Objetivos específicos ..................................................................... 11

2. REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................. 12

2.1. Mercado globalizado e corporações transnacionais (TNCs) .......... 12

vi

Página

2.1.1. As corporações transnacionais e os investimentos externos

diretos ......................................................................................

17

2.2. O sistema agroalimentar (SAA) ..................................................... 23

2.2.1. Emergência do moderno SAA ................................................. 23

2.2.2. Implicações da emergência do SAA no processo de produ-

ção agrícola .............................................................................

27

2.2.3. O papel do Estado: a divisão do trabalho e a consolidação das

empresas de sementes .............................................................

30

2.2.4. A economia mundial e a expansão da indústria de sementes .. 36

2.2.5. Uma nova base tecnológica: a biotecnologia e as sementes .... 37

2.3. Análise da estrutura de concorrência da indústria: o modelo das

cinco forças de Porter ....................................................................

41

2.3.1. Rivalidade entre as empresas existentes .................................. 44

2.3.2. Ameaça de entrada de novos competidores ............................. 45

2.3.3. Pressão advinda de produtos substitutos .................................. 46

2.3.4. Poder de negociação dos fornecedores .................................... 47

2.3.5. Poder de negociação dos compradores .................................... 48

3. METODOLOGIA .................................................................................. 49

3.1. Unidade de análise ......................................................................... 49

3.2. Tipo de pesquisa ............................................................................. 50

3.3. Modelo de trabalho ........................................................................ 52

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO ................................................................... 62

4.1. Intensidade da rivalidade entre as empresas existentes .................. 62

vii

Página

4.1.1. Fusões e aquisições .................................................................. 67

4.1.2. Organismos geneticamente modificados (OGMs) ................... 74

4.2. Ameaça de entrada de novos competidores ................................... 81

4.3. Pressão advinda de produtos substitutos ........................................ 89

4.4. Poder de negociação dos fornecedores .......................................... 90

4.5. Poder de negociação dos compradores .......................................... 95

5. RESUMO E CONCLUSÕES ................................................................ 100

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 106

viii

LISTA DE TABELAS

1 Ranking das 10 maiores empresas da indústria de sementes e de

agroquímicos no ano de 1996 (em milhões de dólares) ...............

71

2 Ranking das 10 maiores empresas da indústria de sementes e de

agroquímicos no ano de 1997 (em milhões de dólares) ...............

71

3 Ranking das 10 maiores empresas da indústria de sementes e de

agroquímicos no ano de 1998 (em milhões de dólares) ...............

73

4 Área de cultivo de transgênicos em plantio comercial, por paí-

ses, nos anos de 1997 e 1998 (em milhões de hectares) ...............

75

5 Os maiores proprietários mundiais de patentes biotecnológicas

de milho (1998) ............................................................................

79

6 Maiores detentores de patentes biotecnológicas de plantas ......... 94

ix

LISTA DE FIGURAS

1 Forças que dirigem a concorrência na indústria ........................... 44

2 Fatores definidores das forças de concorrência na indústria ........ 53

3 Participação no mercado das quatro maiores empresas no Brasil,

por segmento, em 1999, em % .....................................................

63

4 Estimativa das áreas plantadas com sementes transgênicas, em

2000 ..............................................................................................

97

x

RESUMO

GAVA, Rodrigo, M.S., Universidade Federal de Viçosa, agosto de 2000.

Impactos da inovação biotecnológica na dinâmica da estrutura de

concorrência da indústria de sementes. Orientador: José Benedito Pinho.

Conselheiros: Alberto da Silva Jones e Geraldo Magela Braga.

Neste trabalho, procurou-se verificar como os avanços científicos e

tecnológicos, aqui tidos como principais instrumentos para a modernização

empresarial e elementos-chave para ganhos de participação de mercados de alta

competitividade, têm contribuído para que grandes grupos empresariais do setor

de sementes ampliem seu poder no mercado. Neste sentido, o objetivo geral deste

trabalho foi analisar a dinâmica da estrutura de concorrência do setor de insumos

agrícolas em decorrência das recentes inovações biotecnológicas, cujas

aplicações são incorporadas no insumo semente. De natureza descritiva e

interpretativa, o estudo utilizou, fundamentalmente, a pesquisa bibliográfica na

coleta de dados. A unidade de análise foram as corporações transnacionais da

indústria de sementes e o modelo utilizado na análise foi o das cinco forças de

Porter, com vistas em identificar a estrutura de concorrência da indústria de

sementes e revelar a sua dinâmica. Assim, a rivalidade entre as empresas

concorrentes, os entrantes potenciais, a ameaça de substituição, o poder de

xi

negociação dos fornecedores e o poder de negociação dos compradores foram as

variáveis de mensuração usadas para revelar a dinâmica da estrutura de

concorrência de uma indústria de sementes, cujas características básicas estão

enraizadas em sua economia e tecnologia. Os resultados demonstraram que, ao

reunir forças políticas e tecnológicas, o capital caminha rumo ao estabelecimento

de uma nova estrutura operacional, com destaque para a relação sinérgica entre

os avanços da biotecnologia e o estabelecimento de leis de patentes,

determinados pelos interesses das indústrias de sementes. Essas inovações

tecnológicas tendem a concretizar-se como projeções socialmente delineadas a

partir de uma visão de mundo como a de um grande mercado, alimentadas por

forças econômicas e difundidas pelo meio social dominante. É nesse sentido que,

embora exista um mercado para colheitas orgânicas, a maioria dos investimentos

toma a direção da agricultura biotecnológica. Pode-se apontar, como importante

achado deste estudo, que a busca de posição estratégica no mercado mundial tem

levado ao aquecimento das fusões e aquisições entre empresas, onde ganham

destaque as investidas das empresas agroquímicas rumo às de sementes, o que

demonstra o desejo das primeiras em apossar-se de um importante elemento

aglutinador das inovações, que é a semente. Pelos constantes movimentos de

fusão e aquisição, intensos nos anos em análise (1996, 1997 e 1998), percebeu-se

que pequeno número de empresas concentrou, de tal maneira, o mercado mundial

de sementes que a competição acabou se restringindo a elas, numa configuração

própria de um oligopólio industrial e distante da idéia de livre mercado formado

por grande número de vendedores independentes.

xii

ABSTRACT

GAVA, Rodrigo, M.S., Universidade Federal de Viçosa, August 2000. Impacts

of biotechnological innovation on the competition dynamics of the seed

industry. Adviser: José Benedito Pinho. Committee Members: Alberto da

Silva Jones and Geraldo Magela Braga.

The objective of this work was to verify how the scientific and

technological advances - here seen as the main tools for enterprise

modernization, decisive for assuring participation gains in a highly-competitive

market - have contributed for the greater expansion of large seed company

groups. Thus, the overall aim of this work was to analyze the dynamics of

competition in the farming input sector, caused by the new technological

innovations applied to the seed industry. Following a descriptive and

interpretative approach, bibliographic research was the main tool used for

collecting data. The analysis unit consisted of transnational seed corporations and

the analysis model used was that of Porter‟ five strengths (favor checar este

termo), aiming to identify seed industry competivity and its dynamics. Thus,

competition among the companies, potential beginners, the threat of replacement,

and buyers‟ and sellers‟ bargaining power were the variables used to measure the

competivity dynamics of a seed industry whose basic characteristics are rooted in

xiii

its economy and technology. The results showed that, by combining political and

technological forces, capital is moving towards the establishment of a new

operative structure, a synergistic relation between biotechnological advances and

the regulation of patents, determined by the interests of the seed industries. These

technological innovations tend to become socially-designed reflections based on

a vision of the world as a big marketplace, fed by economic forces and diffused

by the dominating social community. That‟s why, despite the existence of market

opportunities for organic agriculture, most investments turn to biotechnological

agriculture. An important finding in this study was that the search for a strategic

position in the world market has led to an increasing fusion and buying among

companies, especially investment of agrochemical companies on seed

companies. This shows the former‟s intention to take over the seed market – an

important element of innovation agglutination. The constant fusing and buying

activities, which were intense during the years this work was carried out (1996,

1997 and 1998), showed that a small number of corporations has concentrated on

the world seed market in such a way that competition ended up to be limited to

them, becoming an industrial oligopoly, far from the idea of free market

envisioned by a great number of independent sellers.

1

1. INTRODUÇÃO

Neste trabalho discute-se um tema de extrema atualidade - a

biotecnologia no contexto da globalização -, hoje imerso em demandas

econômicas, políticas, tecnológicas, culturais e ambientais. Entre outras questões,

MARINE (1997) identificou algumas características próprias do mercado

globalizado.

O processo mundial no qual ingressamos a partir da década de 1980, e que se convencionou chamar de globalização, se caracteriza pela superação

progressiva das fronteiras nacionais no quadro do mercado mundial, no que se

refere às estruturas de produção, circulação e consumo de bens e serviços,

assim como por alterar a geografia política e as relações internacionais, a organização social, as escalas de valores e as configurações ideológicas

próprias de cada país (MARINE, 1997:90).1

Nesse sistema globalizado, as corporações transnacionais (TNCs)

emergem como importantes protagonistas. São empresas que se dedicam à busca

de melhores alternativas para se adaptarem ao ritmo imprimido pelo processo de

globalização e de uma postura estratégica em um ambiente turbulento, mutante e

extremamente competitivo. Da mesma forma, reconhecem a necessidade de

1 Tradução literal para “el proceso mundial a que ingresamos a partir de la década de 1980, y que se ha

dado en llamar de globalización, se caracteriza por la superación progresiva de las fronteras nacionales

en el marco del mercado mundial, en lo que se refiere a las estructuras de producción, circulación y

consumo de bienes y servicios, así como por alterar la geografía política y las relaciones

internacionales, la organización social, las escalas de valores y las configuraciones ideológicas propias

de cada país” (MARINE, 1997:90).

2

ajuste nos Estados Nacionais em que haja livre concorrência, propalada como a

verdadeira mola mestra que impele o desenvolvimento das sociedades.

No entanto, ainda ganham importância outros dois importantes atores, as

instituições financeiras e os bancos. A relação entre eles e as TNCs foi

estabelecida por COX (1997), segundo o qual uma economia globalizada está,

primeiramente, associada à internacionalização da produção pelas corporações

multinacionais e ao estabelecimento de um mercado financeiro global

desregulamentado. Como sugeriu GREIDER (1997), o sistema industrial de

produção multinacional e o mercado mundial financeiro formam uma moldura na

qual se enquadra o conceito de “um único mundo”. Isto ocorre porque as pessoas,

a partir dos mais diversos lugares, estão ligadas aos mesmos mercados. Essa

convergência não tem centro fixo, fronteiras definidas ou resultados

estabelecidos. Segundo ele, cada vez que uma empresa desbrava novos

territórios, o mapa muda - e muda tão rapidamente que já se tornou lugar comum

falar de mercados de “um único mundo” para tudo, de carros a capital.

Nesse mercado sem fronteiras, a busca de fatias de mercado é acirrada,

sendo que os investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) por parte das

TNCs alcançam cifras vultosas. Já reconhecida como fator impulsionador do

desenvolvimento capitalista e importante elemento para fortalecimento de uma

posição competitiva de mercado, a tecnologia representa um ponto nevrálgico

para as empresas, principalmente para aquelas que operam em nível global.

Assim, a inovação tecnológica assume importância à medida que se torna o

principal instrumento para a modernização empresarial e para o lançamento de

novos produtos ou aperfeiçoamento dos existentes, fatores que lhe conferem

papel estratégico em mercados de alta competitividade.

Pela concepção clássica e neoclássica, a alteração técnica se produz em

resposta à demanda do consumidor. Nesse sentido, a sociedade adquire uma

dinâmica natural, o que implica que seus participantes estão em constante

mudança. Entretanto, para compreender o sentido da inovação tecnológica, é

necessário tomá-la num sentido crítico, inerente à complexidade das relações

existentes na sociedade. Na verdade, a alteração técnica converte-se num traço

3

fundamental da sociedade, ao mesmo tempo que o mercado (capitalista) se

converte num traço da atividade econômica da atualidade. Portanto, uma vez que

o mercado se institucionaliza, os produtores se encontram numa situação de

constante e inatingível busca da competência.

A habilidade em aplicar novas tecnologias aos seus processos industriais

e aos seus produtos tem sido a marca registrada do setor de insumos agrícolas. O

próprio desenvolvimento dessas indústrias, assim como o seu sucesso, pode ser

creditado a sua habilidade em suprir o processo de produção agrícola com as

mais inovadoras tecnologias. Estas, ao elevar os ganhos de produtividade,

acabam por reduzir os custos do setor produtivo. É a partir desses esforços que se

desenvolveram novas empresas, dedicadas, exclusivamente, ao fornecimento de

insumos ao setor produtivo. São essas firmas, segundo BEIERLEIN e

WOOLVERTON (1991), as grandes responsáveis pela maior parte das

modificações introduzidas nas práticas de produção agrícola, na medida em que

os produtores passam a comprar os novos insumos.

A partir do momento em que os produtores compram mais do que

preparam seus próprios insumos, eles passam a ter mais tempo para se dedicarem

à produção. Com estratégias bem definidas de marketing, os três segmentos deste

setor - de equipamentos, de sementes e fertilizantes e o químico -

desenvolveram-se, dadas as suas habilidades em atender às demandas dos

produtores. Mas é justamente a racionalidade desse modelo que leva a uma

situação que torna os produtores cada vez mais dependentes das empresas de

insumos agrícolas.

Para se manterem atualizados e produtivos, os produtores agrícolas

buscam competência, de modo que os preços de seus produtos sejam

constantemente reduzidos a partir do aumento da produtividade. O produtor tem

que optar por se retirar do mercado ou por tomar medidas para reduzir custos e

produzir mais com o mesmo capital. Nesse ponto, ele recorre à nova tecnologia.

Em contrapartida, a necessidade de vender também é maior.

Caso os setores do agronegócio não estejam integrados, grande parte do

capital investido pelo produtor estará imobilizado em um produto perecível e

4

altamente sensível à ação do tempo. Por outro lado, é justamente a integração que

intensifica as relações de dependência dos produtores, que cada vez mais

empregam as inovações para se ajustarem às necessidades industriais do setor de

processamento e manufatura.

Em essência, a alteração técnica é um processo cujo resultado deriva de

esforços conscientes de grupos específicos para satisfazer a suas necessidades

criadas socialmente, o que elimina qualquer caráter de neutralidade na geração de

tecnologia.

1.1. Pesquisa básica e aplicada

O caráter de complementaridade entre as ciências básicas e as aplicadas é

grande, na medida em que, a partir do conhecimento gerado na primeira, a

segunda produz seus resultados. Entretanto, como será visto no capítulo 2, a

vocação das empresas privadas é voltada para a pesquisa aplicada, que permite a

rápida aplicação comercial e o retorno dos investimentos realizados. Assim,

THIRTLE e ECHEVERRIA (1994) ressaltaram que haverá poucos incentivos

para que o setor privado se envolva com pesquisa, quando esta for do tipo

básica2, quando se referir a áreas de tecnologia, em que o conhecimento não pode

ser facilmente incorporado à produção, como é o caso da maioria das pesquisas

agrícolas, e quando as instituições de proteção aos direitos de propriedade

intelectual forem ineficientes, dentre outros.

Na pesquisa biológica, observa-se que o setor público tende a dirigir suas

atividades de pesquisa rumo ao controle e à investigação de material genético

básico, enquanto o setor privado se preocupa com sua aplicação prática. No caso

das indústrias de insumo, particularmente as de sementes e fertilizantes, a

2 Consideram-se como tipos de pesquisa a básica, voltada para o desenvolvimento do conhecimento, em

que se procura conhecer o objeto em estudo e não a sua aplicação prática; a estratégica, definida por parâmetros políticos, segurança nacional, alimentação, etc.; a aplicada, em que o interesse é na

aplicação do conhecimento; e a adaptativa, que abrange a idéia de desenvolvimento, ou seja, adaptar-se

usando o meio ambiente, o ambiente econômico e a tradição cultural. Vale ressaltar também que, no

emprego do termo P&D (pesquisa e desenvolvimento), o D refere-se ao uso sistemático do

conhecimento científico para a produção de um material útil, incluindo desenho e desenvolvimento de

protótipos e processos.

5

pesquisa toma a direção de mercado, para criar a diferenciação de produtos. Esta

questão ganha relevância pelos impactos que a biotecnologia promove na

estrutura de concorrência do setor de insumos, notadamente em relação à

indústria de sementes, objeto deste estudo.

1.2. Concentração industrial

As TNCs utilizam as fusões e aquisições como principais estratégias

mercadológicas para ganhos de participação de mercado e posição competitiva

estratégica. Além disso, elas levam à diminuição de poder dos demais

concorrentes e, em conseqüência de sua reestruturação organizacional, podem

ainda estar mais preparadas para o atendimento de demandas futuras.

As companhias norte-americanas foram as maiores protagonistas deste

processo de fusões e aquisições. Em 1996, os valores atingiram US$ 648 bilhões,

logo superados, em 1997, por um valor que excedeu US$ 744 bilhões. Embora

transações como estas tenham ocorrido no norte industrializado, essa

consolidação é um fenômeno global, como pode ser percebido pelos

investimentos estrangeiros diretos (IEDs) dessas companhias no exterior

(RURAL ADVANCEMENT FOUNDATION INTERNATIONAL - RAFI,

2000e).

A Rural Advancement Foundation International (RAFI) tem monitorado

alianças e fusões na indústria de sementes durante as duas últimas décadas. O

desenvolvimento de novos cultivares de plantas e a venda de sementes não são

mais domínio de pequenas empresas e companhias regionais, mas sim das

grandes corporações agroquímicas e farmacêuticas.

O grau de concentração desse mercado também pode ser notado quando

se sabe que, de meados de 1995 ao final de 1996, a empresa norte-americana

Monsanto investiu cerca de US$ 2 bilhões em aquisições de empresas do

6

mercado de sementes3. Em 1996, as 10 maiores companhias de sementes

controlavam cerca de 40% do mercado global, com valor estimado em US$ 15

bilhões (RAFI, 2000e).

Já no setor agroquímico, as 10 maiores corporações venderam US$ 25,1

bilhões em 1996, representando 82% de todas as vendas do mercado de

agroquímicos. Em agosto de 1997, a DuPont (também norte-americana) adquiriu

20% da Pioneer Hi-Bred, maior empresa de sementes do mundo, por US$ 1,7

bilhão. As duas empresas investiriam cerca de US$ 400 milhões em pesquisa

agrícola. A AgriBiotech, outra companhia sediada nos EUA, foi fundada em

1995 e estabeleceu planos de controlar, no ano de 2000, 45% do mercado de

sementes de forragem e grama. Para isso, no curto período de 1995 a 1997, a

transnacional realizou 14 aquisições de companhias de sementes e suas vendas

anuais passaram de US$ 4,7 milhões para US$ 230 milhões (RAFI, 1999a).

Estudo recente da RAFI (2000d) mostra que as cinco maiores empresas

de genes detêm, aproximadamente, 60% do mercado global de pesticida, quase

23% do mercado de sementes comerciais e, teoricamente, 100% do mercado de

sementes transgênicas.

Nesse contexto, argumenta-se que a biotecnologia tende a aumentar a

concentração no setor industrial de insumos agrícolas. Tendo em vista,

principalmente, o alto custo dos investimentos necessários, essa movimentação

acaba criando forte barreira de entrada para outras empresas, minimizando a

possibilidade de estas explorarem o mercado com produtos inovadores e

protegidos por leis de proteção aos criadores de plantas e pelas leis de patentes.

1.3. O problema e sua importância

Ao longo do tempo, muitos países na América Latina, em especial, o

Brasil, adotaram vários gigantes do agronegócio mundial e tornaram-se países

3 Outro valor presente nas fusões e aquisições pode estar em assegurar a propriedade das inovações

tecnológicas de cada empresa envolvida na negociação, o que as torna ainda mais lucrativas por

deterem os direitos, nos casos dos criadores de plantas e das patentes, resultantes de inovações. A

propriedade das inovações garante o retorno dos investimentos.

7

orientados para a exportação (export-oriented), a partir de uma agricultura

intensiva que representava a chave para o crescimento econômico de cada um

deles. O crescimento dessas empresas no Brasil, principalmente a partir da

disseminação ideológica da Revolução Verde, de origem norte-americana, teve

apoio e ação governamentais brasileiros.

Essa influência hegemônica dos EUA passa a direcionar a política

agrícola dos países do então Terceiro Mundo, que, de auto-suficientes em

diversos setores, principalmente na produção de grãos, passam a reestruturar-se

em razão de interesses externos. A nova direção leva a agricultura para uma base

exportadora, portanto, mais suscetível aos desequilíbrios externos4. Por outro

lado, além do interesse num mercado promissor, as grandes corporações

transnacionais do agronegócio buscam mercados como o brasileiro, dada a

possibilidade de apropriação de sua rica diversidade biológica, que, entre outras

características, é também fonte de lucro.

Na sociedade atual, a passagem do fim da revolução industrial às

primeiras fases da tecnológica tem revolucionado tanto aspectos inerentes à

produção quanto à informação. Em suas incursões, a biotecnologia tem seu uso

como principal fator para a produção agrícola, em que podem ser destacadas as

novas possibilidades de manufatura das commodities agrícolas e,

conseqüentemente, os demais elementos da cadeia agroalimentar (KING e

STABINSKY, 2000).

A Convenção em Diversidade Biológica (CBD), em 1992, definiu a

biotecnologia como “qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas

biológicos, organismos vivos ou derivados, para fazer ou modificar produtos ou

processos para usos específicos”5 (FOOD AND AGRICULTURE

4 Instaura-se ainda um regime de exportação agrícola para financiar a importação de alimentos, tendo este

esforço se direcionado para a importação de produtos de alto valor agregado, aumentando, ainda mais, a

diferença não só nas relações comerciais desfavoráveis ao Terceiro Mundo, como também entre a

produção agrícola doméstica (exportação) e as demandas alimentares locais. Em apenas uma geração, a auto-suficiência na produção de grãos foi desarticulada e a dependência à importação transferiu o

controle dos recursos naturais para o mercado internacional e para os complexos agroalimentares,

dominados pelas corporações transnacionais (GOODMAN, 1991).

5 Tradução literal para “any technological application that uses biological systems, living organisms or

derivates thereof, to make or modify products or processes for especific uses”.

8

ORGANIZATION - FAO, 2000). Sua aplicação na produção agrícola e na

agroindústria inclui, principalmente, a cultura de tecidos, as técnicas

imunológicas e as técnicas de genética molecular e DNA recombinante. Apesar

de suas inúmeras aplicações industriais, este trabalho focalizará as inovações

biotecnológicas aplicadas à indústria de insumos agrícolas, em especial, à

indústria de sementes.

A biotecnologia representa um importante instrumento para o

desenvolvimento agrícola, dados seus aspectos positivos e negativos. Associada a

outras tecnologias, ela pode indicar novas soluções para antigos problemas

relacionados com o desenvolvimento de uma agricultura sustentável e com a

produção de alimentos.

A despeito de suas inúmeras possibilidades, o que se tem percebido é a

busca de aplicações que traduzam os investimentos em biotecnologias em lucros,

numa conduta de fortes tendências mercadológicas, o que tem trazido à tona uma

intensa discussão ética e moral.

A aplicação da biotecnologia, que tem causado polêmica, refere-se aos

alimentos derivados de plantas alteradas geneticamente, ou, como já são

conhecidos, organismos geneticamente modificados (OGMs). Plantas derivadas

de sementes transgênicas adquirem características de interesse a partir da

introdução de um ou mais genes de outro organismo. Assim, pode-se, por

exemplo, melhorar seu desempenho produtivo ou sua resistência a pragas e a

doenças.

O assunto está envolto em grandes incertezas, é polêmico e tem recebido

extensa cobertura da imprensa. O Jornal do Brasil, por exemplo, noticiou que a

Grã-Bretanha estava preparando uma revisão completa de sua política com

relação aos transgênicos, ou, como são conhecidos por lá, GM-foods (genetically

modified foods - alimentos geneticamente modificados), ou comida frankenstein.

Por sua vez, alguns grupos de defesa do meio ambiente, como o Greenpeace e os

Amigos da Terra (FOE), propuseram uma moratória para a liberação da

plantação comercial dos transgênicos. Nesse sentido, ganharam apoio da

Associação Médica Britânica, que condena explicitamente alimentos com genes

9

programados para atacar pragas da lavoura, por entender que podem produzir

efeitos inesperados, atacar outros animais da cadeia alimentar e resultar no

surgimento de superpragas resistentes aos agrotóxicos conhecidos (JOBIM,

1999). Dentre as regulamentações a serem discutidas, incluía-se, além da

moratória, a revisão do Acordo Mundial do Comércio para garantir que os

governos, e não as empresas privadas, se responsabilizassem pelas importações e

pelo controle dos transgênicos.

Como noticiado por MUNIZ (2000:40), “ecólogos e ambientalistas

alertam sobre a falta de dados científicos capazes de assegurar que uma planta

transgênica é realmente segura ao ambiente e à saúde humana”. Nesse sentido,

esses profissionais chegaram a enunciar prováveis desequilíbrios ecológicos

decorrentes da introdução dessas plantas modificadas geneticamente nas

lavouras, como, por exemplo, o risco de as plantas mutantes se tornarem pragas

de proporções alarmantes por serem mais resistentes, o que as faria reproduzir

com maior rapidez.

O Jornal do Brasil, em editorial do dia 24 de maio de 1999, comentou

que o pólen do milho transgênico mata, além das pragas que o atacam, borboletas

e mariposas6, o que comprometeria a biodiversidade. Isto ocorre pela ação do

vento, que dispersa o pólen para áreas próximas ao milharal, sendo depositado

em outras plantas, o que faz com que atinja outros organismos não-visados.

Em países como os EUA, onde a plantação e o consumo de alimentos

que contenham modificações genéticas estão liberados, já é possível encontrar

genes modificados em papinhas de bebês, biscoitos, achocolatados, molhos,

massas e, principalmente, derivados de milho e soja, como os cereais, que, nos

EUA, já têm metade de sua produção dominada pelas lavouras transgênicas

(MUNIZ, 2000). No Brasil, apesar de a produção ainda estar suspensa, já e

possível encontrar seus derivados nos supermercados, mediante importação.

6 Nos Estados Unidos, pesquisadores da Universidade de Cornell publicaram os resultados de um estudo

em que afirmam que as folhas pulverizadas com o pólen do milho transgênico Bt (de Bacillus

thuringiensis, a bactéria utilizada para modificar geneticamente a planta) matou larvas de borboleta-

monarca (Danaus plexippus) (MITCHELL, 1999).

10

Paralelamente a essa discussão de nível ético e moral dos resultados da

biotecnologia, outra, de igual importância, precisa ser ressaltada. Trata-se das

implicações da biotecnologia na estrutura da indústria de sementes e na sua

concorrência. Assim, como problema de pesquisa, far-se-á uma análise do

impacto da biotecnologia na estrutura de concorrência do setor de sementes e,

por conseqüência, na distribuição do poder de comando dos mercados.

A este contexto de competição numa economia de livre mercado global é

que essa dissertação está direcionada. Nesse sentido e com base num estudo

sobre as mudanças estruturais ocorridas na indústria, admite-se, como hipótese,

que a biotecnologia tenha provocado impactos na estrutura de concorrência do

setor de insumos agrícolas, afastando-a mais ainda de uma estrutura fragmentada,

o que seria uma estrutura mais próxima da perspectiva dada pela livre

concorrência. Esse afastamento leva a uma estrutura concentrada, fechada, com

grandes barreiras de entrada, na qual os participantes atuais detêm grandes

parcelas de mercado e, por conseqüência, detêm o poder de comando desses

mercados. Além disso, o novo formato da estrutura de concorrência aproxima-se,

cada vez mais, de uma estrutura oligopolizada, própria das TNCs.

As conseqüências dessas mudanças devem ser drásticas e óbvias,

especialmente quando ocorrem em países em desenvolvimento e com problemas

de desemprego e dívida externa. As mudanças relacionadas com a estrutura de

concorrência do setor industrial de insumos agrícolas, notadamente as indústrias

de sementes, são evidenciadas pelo emprego do modelo das cinco forças de

PORTER (1998), que é abordado no capítulo 2.

1.4. Objetivo geral

Com base nesse contexto, o objetivo geral deste trabalho é analisar a

dinâmica da estrutura de concorrência do setor de insumos agrícolas em razão

das recentes inovações biotecnológicas, cujas aplicações são incorporadas no

insumo semente.

11

1.5. Objetivos específicos

1. Apresentar a configuração atual do setor de sementes, assim como o nível de

concorrência nesta indústria e a rivalidade entre as empresas existentes;

2. Identificar como as recentes inovações biotecnológicas podem interferir no

poder de barganha dos fornecedores da indústria de sementes;

3. Identificar a forma pela qual as recentes inovações biotecnológicas interferem

no poder de negociação dos compradores da indústria de sementes;

4. Identificar a forma como as recentes inovações biotecnológicas tendem a

aumentar as barreiras de entrada na indústria de sementes; e

5. Identificar, no caso de produtos substitutos, a maneira como as recentes

inovações biotecnológicas aumentam a concorrência entre as empresas de

semente.

12

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. Mercado globalizado e corporações transnacionais (TNCs)

Neste trabalho, a compreensão do processo de globalização segue a

orientação de autores que, em suas explanações, consideram as TNCs como

elementos dinâmicos desse processo, além de indicarem, em suas análises, o

lugar ocupado por países periféricos como o Brasil, em relação ao países

centrais.

Nesses termos, é necessário tratar o assunto com base na conjuntura

atual, de economia globalizada e premissas liberais, em que a idéia da

globalização se difundiu rapidamente. Para tanto, basta um simples olhar no

discurso político e econômico e no noticiário cotidiano dos diversos países, para

constatar que a “globalização”7 se tornou um conceito-chave nos anos 80.

No entanto, muitos autores começaram a demonstrar preocupação com a

disseminação de uma idéia restrita acerca do fenômeno, que exprime uma

aparente capacidade explicativa por reunir, numa única palavra, inúmeros

7 O emprego do termo nos círculos acadêmicos foi raro até a metade dos anos 80, sendo usado, pela

primeira vez, por Théodore Levitt, num artigo publicado em 1983, para designar a convergência dos

mercados do mundo inteiro. Mas é Kenichi Omae, a partir da obra The bordless world: powerand

strategy in the interlinked economy, publicada em 1990, que o popularizaria. Como o próprio nome do

livro indica, o contexto de referência para o termo globalização é o de um mundo sem fronteiras, que

represente, em última instância, um mercado aberto à disposição do capital.

13

acontecimentos e circunstâncias. É nesse sentido que CHESNAIS (1986)

defendeu uma distinção conceitual para o termo “globalização”.

Para ele, a busca de um termo mais preciso se faz justa quando se nota

que o conceito de globalização induz a uma falsa idéia de um mundo homogêneo

e integrado, distante da realidade desigual e desintegrada do mundo atual, o que

acaba por lhe conferir determinada carga ideológica. Além disso, CHESNAIS

(1986) ressaltou que, quando se pensa em administração de empresas, o termo

tem sua utilização direcionada às grandes corporações multinacionais

“triádicas”8, com o propósito de expressar o fim dos obstáculos à expansão das

empresas, independente do lugar onde se possam gerar lucros, graças à

liberalização e à desregulamentação, à telemática e aos satélites de comunicação,

que serviam de instrumentos de comunicação e controle.

Essa preocupação com a imprecisão do termo também está presente em

GÓMEZ (1999:129), segundo o qual

o termo está atravessado por uma ambivalência ou imprecisão constitutiva em

função da variedade de fenômenos que abrange e dos impactos diferenciados

que gera em diversas áreas: financeira, comercial, produtiva, social,

institucional, tecnológica, cultural, etc.

Ademais, ele questionou

se não se está diante de mais um modismo intelectual do ocidente neste final de

século, de consumo rápido e descartável; ou, ao contrário, se não se trata de algo revelador, para além do efeito de moda e de outros usos, da necessidade

de empreender um esforço de conceituação das múltiplas e profundas

transformações em curso no mundo atual (GÓMEZ, 1999:128).

Para usufruir dessa nova configuração mundial, seria necessário que

essas empresas reformulassem suas estratégias mercadológicas internacionais.

Instrumentos reguladores, como cotas de importação e controle de fluxos de

mercadorias, tornam-se ineficientes nesse contexto. As empresas estruturam-se

em nível global e a internacionalização acaba sendo dominada mais pelo

investimento internacional do que pelo comércio exterior, no qual os fluxos de

intercâmbios intercorporativos adquirem importância cada vez maior. Conforme

descreveu CHESNAIS (1986:27),

8 Termo empregado em referência aos três centros convergentes do poder econômico do capitalismo

mundial, ou seja, a tríade: Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão.

14

o que há de novo é que as empresas recorreram a novas combinações entre os

investimentos internacionais, o comércio e a cooperação inter-empresas

coligadas, para assegurar sua expansão internacional e racionalizar suas

operações. As estratégias internacionais do passado, baseadas nas exportações, ou as estratégias multidomésticas, assentadas na produção e

venda no exterior, dão lugar a novas estratégias, que combinam uma série de

atividades transnacionais: exportações e suprimentos externos, investimentos estrangeiros e alianças internacionais. As empresas que adotam essas

estratégias podem tirar proveito de um alto grau de coordenação, da

diversificação de operações e de sua implantação local.

Tomam forma a descentralização industrial e a formação de redes globais

baseadas no fluxo de informações, bases de sustentação para o crescimento das

empresas em nível mundial. Segundo CASTELLS (1999:21), essas são

características que correspondem a uma profunda reestruturação do capitalismo,

“caracterizado por uma maior flexibilidade de gerenciamento; descentralização

das empresas e sua organização em redes tanto internamente quanto em suas

relações com outras empresas (...)”.

A intenção era ter, como escorço desse processo, a idéia de que a

globalização, apesar de alguns inconvenientes, apresenta vantagens, embora estas

não sejam facilmente definidas nos relatórios oficiais. Generaliza-se, assim, a

noção de que é preciso que a sociedade se adapte às novas exigências e

obrigações, e também que se descarte qualquer intenção de controlar, dominar ou

orientar esse novo processo (CHESNAIS, 1986).

A globalização, pelo visto, reergue o ideal libertário do mercado, uma

vez que o grande efeito da liberalização do comércio exterior foi o de facilitar as

operações dos grupos industriais multinacionalizados.

À luz dessas considerações, CHESNAIS (1986) sugeriu o emprego do

termo “mundialização”, uma vez que este reflete mais nitidez conceitual que os

termos “global” e “globalização”. Para ele, a palavra “mundial” traduz mais

precisamente a idéia de que, já que a economia se mundializou, seria importante

construir instituições políticas mundiais capazes de dominar (domar) seu

movimento. Mas isso dificilmente ocorreria, pois é justamente o que não querem

os países do bloco triádico, cuja pretensão é tirar vantagem dessa liberdade e

assim impor sua força econômica e financeira, deixando aos demais a tarefa de se

adaptarem. Dada a liberdade desencadeada nesse processo, grupos industriais e

15

operadores financeiros mundiais estão distantes de quaisquer possibilidades de

políticas mundiais coercitivas. O contexto sugerido pelo termo “mundialização”

compreende todo o planeta como participante do processo. Ele estende a idéia de

que o mundo em questão não se refere apenas aos que, de alguma forma, são

atores diretos das trocas que dele decorre. Pelo contrário, sua abrangência

alcança os mais distantes países, estados ou cidades que, mesmo que não se

relacionem diretamente com o processo de trocas, sofrem suas conseqüências e

têm suas possibilidades de ação restringidas ou remodeladas.

Na mesma linha, COX (1997) entendeu que a globalização representa

um crescimento desconectado e com interdependência mundial. Ele abordou o

termo num sentido multidimensional, ou seja, ao mesmo tempo que representa

uma relação de interdependência, é também desconectado na política, na

economia e no bem-estar, na cultura, na ecologia e em valores de vários tipos.

Segundo ele, “nenhuma área de atividade humana está isolada; e dentro de cada

área, ninguém está a salvo das condições e atividades de outros” (1997:49).9

Assim, sem desconsiderar a decisiva contribuição de Chesnais, o

emprego do termo globalização não será descartado e seu significado

compreenderá, sempre, o sentido mais amplo sugerido pela idéia de

mundialização. No mesmo sentido, é oportuno que se faça a mesma consideração

sobre os termos multinacionais e corporações transnacionais, ou TNCs. Embora

ambos estejam empregados neste trabalho, o sentido a ser considerado é sempre

o de TNCs. Empresas multinacionais trazem a idéia de que, por estarem

presentes em vários países, possuem várias nacionalidades, o que nem sempre é

verdade. Por isso, optou-se pelo sentido dado pelo termo TNC, no qual fica claro

que, apesar de ter trânsito livre em diversos países, as decisões e estratégias

partem de seus países-sede, assim como a apropriação maior dos lucros.

9 Tradução literal para “No one area of human activity is isolated; and within each area, no one is

untouched by the condition and activities of others”. Nesse trabalho, Cox examinou como a

globalização da economia afeta as possibilidades da democracia. Dedicou-se à perspectiva de entender

democratização - o processo de se tornar democrático - de um modo que vai além da democracia liberal,

que compreende o território de um Estado com sua população. Considerou então o conceito em

instituições não-territoriais como empreendimentos industriais, igrejas, uniões comerciais, clubes,

instituições internacionais e em relações sociais em comunidades e na vida familiar.

16

Assim, a idéia base para compreender a economia globalizada refere-se

aos pressupostos do ideário liberal da economia marginalista, baseado na

liberdade das ações individuais e que sustenta o discurso dos que, aparentemente,

se beneficiam de uma liberdade generalizada.

É importante considerar que não se trata de negar a economia de

mercado em si, mas de posicionar seus elementos10

, de entender a

industrialização como força subordinada às exigências dos homens. Como

descrito por POLANYI (1980:243), “a verdadeira crítica da sociedade de

mercado não é pelo fato de ela se basear na economia - num certo sentido, toda e

qualquer sociedade tem que se basear nela - mas que a sua economia se baseava

no auto-interesse”.

O que se pretende, com essa passagem, é desmistificar a suposta

liberdade, consubstanciada na idéia de que uma mão invisível11

coordenaria as

relações internacionais. Na verdade, em busca de seu benefício próprio, o que

caracterizou o desenvolvimento dos países que hoje formam a tríade foi,

justamente, uma ativa e presente mão visível, ou seja, a mão do Estado.

POLANYI (1980) mostrou que, tanto para compreender o nascimento

quanto o sepultamento do livre mercado, o Estado é nuclear. Nas análises desse

autor, o Estado está no centro da questão, com papel decisivo tanto no

surgimento quanto na manutenção do capitalismo. DÓRIA (1994), ao comentar o

trabalho de Polanyi, argumentou que o Estado não só ajudou no surgimento do

capitalismo, mediante criação artificial do mercado de trabalho na Inglaterra do

Speenhamland Act (1795-1834), como também se fez presente como

“mediador”, sempre que foi imprescindível impor limites à exploração e amparar

10 Polanyi evidenciou que a organização econômica não tem nada de natural, contrapondo-se à idéia de

que o homem, na sua atividade econômica, tenderia a guiar-se pela racionalidade econômica, sendo

que todo pensamento contrário seria resultado de uma interferência externa. Ele opôs-se à idéia de que

o mercado aparece como instituição natural, que surgia espontaneamente a partir do momento em que o homem era deixado em paz. Um sistema econômico, em que o mercado era regido pelo controle

único dos preços e em que uma sociedade baseada nesse mercado seria o objetivo de todo progresso

(POLANYI, 1980).

11

Expressão cunhada por Adam Smith, em 1776, na obra “A Riqueza das Nações”.

17

o trabalhador. Mais à frente, pode-se perceber essa posição na forte participação

do Estado no desenvolvimento da indústria de insumos agrícolas.

Não se pretende aqui aprofundar a análise das ações do Estado e sua

complexa relação com a economia de mercado, o que fugiria aos objetivos deste

estudo, mas apenas apontar algumas considerações a ele inerentes e reconhecer o

papel fundamental que exerce nesta relação.

A partir dessas considerações, nota-se que no surgimento, no

crescimento e na consolidação dos grandes grupos industriais dos países

desenvolvidos, aqueles sempre se beneficiaram do expressivo apoio estatal.

Mesmo em épocas mais recentes, a intervenção do Estado se fez presente.

Segundo SANTOS (1993:57),

apesar do intenso processo de integração e globalização mundial e da sua

regionalização, os Estados Nacionais continuam a ser a unidade econômica,

política e cultural essencial sobre a qual se assentam esses fenômenos. (...). São eles que patrocinam ou freiam os processos globais,

pressupostos distantes do ideal de livre mercado e da não-intervenção estatal na

economia. Trata-se de uma “não-intervenção” qualificada, ou seja, o Estado não

interfere em prejuízo dos empresários, mas para disciplinar a força de trabalho.

Ele assume uma postura de permanente intervenção, numa suposta busca de

garantia da “economia da população”, a exemplo de suas ações de repressão às

greves.

Estado e mercado, mais que ordens contrárias, representaram uma força

eficaz para o desenvolvimento do capitalismo. No entanto, o discurso, de cunho

liberalizador da economia, clama pela mínima intervenção do Estado e pela

necessidade de adaptação à nova ordem mundial.

2.1.1. As corporações transnacionais e os investimentos externos diretos

A internacionalização deve ser entendida como um processo de

expressão genérica que envolve, principalmente, o comércio exterior, os

investimentos externos diretos (IED) e os fluxos internacionais de capital. Dada a

estreita relação desses fatores com os grandes grupos industriais multinacionais,

18

CHESNAIS (1986) sugeriu que se considerem as entradas e saídas de tecnologia

(sejam incorporadas aos equipamentos, sejam transmitidas ou adquiridas de

forma intangível), o movimento internacional de pessoal qualificado e o fluxo de

informação e dados como outros fatores desse processo. Entretanto, de todos, o

IED12

é o principal fator de configuração das relações internacionais, tendo,

inclusive, suplantado o comércio exterior como o vetor principal no processo de

internacionalização.

Basicamente, os IEDs foram impulsionados pela ação da concorrência,

que fizeram com que os grupos mais fortes arrebatassem das empresas

absorvidas suas participações de mercado. Além disso, reestruturam e

racionalizam suas capacidades de produção e conseguem, assim, centralizar e

concentrar suas atividades. Dessa forma, acabam obtendo maior poder. O

patamar de concentração de capital nessas grandes empresas, com suas sedes

invariavelmente nos países da tríade, acabou configurando um oligopólio

mundial, onde a estrutura de oferta de bens e serviços tem forma oligopolística.

É importante notar que as relações comerciais estabelecidas pelos

grandes grupos ocorrem, essencialmente, nos países da tríade, dando forma a um

“oligopólio mundial”13

, caracterizado por Chesnais como um “espaço de

rivalidade industrial”. Esse espaço acabou por ser constituído

sobre a base da expansão mundial dos grandes grupos, de seus investimentos diretos cruzados intratriádicos e da concentração internacional resultante das

aquisições e fusões que efetuam para esse fim. É delimitado por um tipo

peculiar de interdependência, que ligam o pequeno número de grandes grupos que chegam a adquirir e manter uma posição de concorrente efetivo a nível

mundial, em determinada indústria (CHESNAIS, 1986:37).

12 Segundo CHESNAIS (1997:30), “mais ou menos oitenta por cento dos investimentos diretos no

exterior aconteceram em países capitalistas avançados, e cerca de três quartos das operações tiveram

como objeto a aquisição e a fusão de empresas existentes, ou seja, uma mudança de propriedade do

capital e não a criação de novos meios de produção”.

13 O dinamismo das trocas foi circunscrito aos três pólos da tríade e às zonas localizadas imediatamente

em torno deles. Se se considerar que os países do Sudeste Asiático e do mar da China, a partir de

então, fazem parte do pólo em que o Japão é o centro, é entre as economias desses pólos, em direção a

eles e a partir deles que se concentram 87% das importações e 94% das exportações mundiais de produtos manufaturados. É aí que se encontram os únicos crescimentos significativos. São,

essencialmente, trocas “intra-ramo”, ou seja, baseiam-se em fluxos de produtos intermediários e

complementares e de componentes entre filiais ou empresas associadas. Os grupos industriais têm

participação ativa em dois terços das trocas internacionais de bens e serviços. Só em relação ao

comércio mundial, cerca de 33% pertencem à categoria “intragrupo” ou “intra-empresa” (CHESNAIS,

1997:42-43).

19

A idéia de oligopólio não corresponde apenas a uma quantificação

mecânica do grau de concentração de empresas na economia mundial. Segundo

CHESNAIS (1997:31), os oligopólios representam “grupos que são realmente

capazes de sustentar uma concorrência „global‟, conduzida, simultaneamente, em

seu próprio mercado, nos de seus rivais e nos mercados de terceiros”.

Ademais, a compreensão do termo torna-se mais precisa quando se têm,

como referência, dois planos de análise: o doméstico e o mundial. No plano

doméstico, o oligopólio tem forma de um monopólio coletivo, estabelecido e

gerido entre vários grupos, de acordo com regras determinadas e respeitadas por

todos. Nesse sentido, os preços são fixados pelo grupo dirigente, e a concorrência

se dá pela diferenciação de produtos, não pelos preços. Já em âmbito mundial, as

relações de oligopólio geralmente seguem acordos de cooperação técnica, de

fixação de normas comuns, entre outros; o que parece estar sempre presente é

que são normas que escapam ao alcance das legislações antitrustes. Essa

colaboração não impede que haja concorrência entre as empresas; pelo contrário,

os grupos têm relação interdependente. Tomando oligopólio como a

interdependência das empresas, percebe-se que suas reações são direcionadas não

às forças de mercados, mas diretamente a suas rivais. Essa arena de reações foi

bem descrita por CHESNAIS (1986:37), quando afirmou que

esse espaço é um lugar de concorrência escarniçada, mas também de

colaboração entre os grupos. A ele pertencem, essencialmente, grupos originários de um dos três pólos da Tríade, pois as relações constitutivas do

oligopólio são, por si mesmas, de modo intrínseco, um importante fator de

barreira de entrada, ao qual podem agregar-se, depois, outros elementos.

Embora sejam, em última instância, comandados pelo setor financeiro,

os grandes grupos manufatureiros dominam a paisagem industrial

contemporânea. Representam uma ordem concorrencial resultante de longos e

complexos processos de fusões, aquisições, incorporações etc.14

. Segundo

14 A fase de mundialização, desencadeada no início da década de 80, foi marcada pela multiplicação dos

chamados investimentos cruzados entre os países capitalistas avançados, movimento que foi seguido

de novas investidas, só que agora entre estes em busca de aquisições nos chamados novos países

industrializados (NPI), permitidos graças à desregulamentação neoliberal e a suas políticas de

liberalização e de privatização (CHESNAIS, 1997).

20

CHESNAIS (1997:30), “estima-se que mais de oitenta por cento das despesas

com pesquisa-desenvolvimento do setor de empresas dos países da OCDE são

efetuadas em firmas classificadas na categoria de grandes empresas”.

A concentração desses ativos é de tal forma relevante que, mesmo em

economias onde as pequenas e médias empresas são fortes (caso de alguns países

da Europa), a continuidade de suas atividades depende das possibilidades que

lhes são dispostas pelos grandes grupos, seja quando são compradores de seus

produtos intermediários, seja quando se pensa na natureza da cooperação

tecnológica por eles proporcionada. Assim, mesmo que a mundialização do

capital não se restrinja à ação das multinacionais, a importância do papel que

estas desempenham nesse processo é clara (CHESNAIS, 1997).

É nesse contexto que se torna possível, segundo CHESNAIS (1986),

entender as relações constitutivas do oligopólio. Estas representam, por si

mesmas, fatores de barreiras à entrada, em que elementos, como custos

irrecuperáveis (investimentos perdidos) e elevados gastos em pesquisa e

desenvolvimento, podem juntar-se. Assim, companhias multinacionais acabam

constituindo um mercado interno com suas filiais.

Assim, apreender a mundialização significa circunscrevê-la em um

regime de acumulação de nível mundial, constituída pelos grandes grupos

industriais em conjunto com as poderosas instituições financeiras bancárias e

não-bancárias, sendo que estas últimas, sob a forma de grandes fundos de pensão,

aplicações coletivas privadas, grupos de seguros e bancos multinacionais, têm

preferência pela liquidez na valorização do capital (CHESNAIS, 1997).

Traços dessas ligações podem ser vistos no caso das empresas que se

autodenominam “life science industries” ou “indústrias da ciência da vida”. As

estratégias de penetração no mercado agrícola brasileiro deram-se sob forte ritmo

de fusões e aquisições, como será visto mais adiante.

Torna-se essencial, nesse momento, elucidar alguns pontos a respeito da

relação de interdependência firmada entre bancos e indústrias. Embora seja

difícil evitar a posição central das finanças para a análise do regime de

21

acumulação, isso não significa que se devam ignorar seus vínculos com a

produção e com o investimento. Como esclareceu CHESNAIS (1997:39),

é certo que uma fração extremamente elevada das transações financeiras é

desenvolvida no campo fechado formado pelas relações entre instituições

especializadas, e não tem nenhuma contrapartida no nível das trocas de mercadorias e de serviços, e tampouco no plano do investimento. É o caso

particularmente de 1.400 bilhões de dólares de transações cotidianas no

mercado de câmbio, em que apenas 5 a 8% corresponderiam a transações internacionais efetivas. Mas isso não quer dizer que não haja ligações muito

fortes e, sobretudo, de grande alcance econômico e social, entre a esfera da

produção e das trocas e a das finanças.

Essas questões permitem apontar a presença hegemônica de

investimentos essencialmente rentísticos, desprovidos de valor15

e que

caracterizam a grande maioria dos investimentos externos diretos (IED), tanto

entre os países da tríade quanto entre estes e os países em desenvolvimento.

Na busca de multiplicar-se, esse capital rentístico acaba se deslocando

com ou sem a presença dos IEDs. Os deslocamentos sem IED são, geralmente,

operações de subcontratação internacional que representam a principal forma de

integração seletiva dos países do Sul e do Norte, que visam abastecer-se de

produtos padronizados com menores custos de produção. Estão incluídos nesses

produtos não apenas os semi-acabados, mas também os de consumo de massa,

comercializados pelas grandes cadeias comerciais e pelos grandes

supermercados. Esses dois, independentemente do local, buscam estabelecer seus

próprios contratos de subcontratação com produtores locais para depois

comercializá-los com suas próprias marcas. O que se busca é produzir em locais

em que os custos são mais baixos e vender onde os preços de mercado oferecem

maiores ganhos. O mundo pode parecer estar cada vez mais integrado nos

diversos ramos, mas ainda não o é com relação aos preços de venda das

mercadorias e às condições de fluxo da força de trabalho pelas diferentes

empresas (CHESNAIS, 1997).

15 O valor, assim como o lucro, continua se originando, pela concepção que se tem como referência, a

partir da esfera produtiva, sendo que a esfera financeira se alimenta da riqueza criada pelo

investimento e pela mobilização de uma força de trabalho em níveis de qualificação múltiplos. Mais

precisamente, “os capitais, cuja valorização os operadores financeiros garantem por meio de suas

aplicações financeiras e das arbitragens que efetuam entre os diferentes tipos de ativos, tiveram sua

origem invariavelmente no setor produtivo e começam a tomar a forma de rendimentos constituídos

eventualmente pela produção e pela troca de mercadorias e serviços” (CHESNAIS, 1997:39).

22

Já o deslocamento com IED tem sido marcado, essencialmente, pelas

aquisições e fusões, e não pelos investimentos criadores de novas capacidades.

O contexto histórico-econômico considerado neste estudo coloca em

evidência os grupos industriais com operações transnacionais. Não se pretende,

porém, aprofundar em problemas de ordem conceitual. Muitos debates foram

dedicados ao tema, o que, entretanto, não significou que se tenha chegado a

algum acordo sobre uma descrição majoritária deste. Além disso, uma discussão

dessa natureza deveria levar ao questionamento, inclusive, das posições

assumidas pelas diversas instituições que lidam com tais questões (UNCTNC,

UNCTAD, OCDE, entre outras), assim como das diversas posições no âmbito do

debate acadêmico.

Para compreender suas características predominantes, recorre-se à

contribuição de Dunning, segundo o qual

a empresa multinacional está assumindo, cada vez mais, o papel de regente da

orquestra, em relação a diversas atividades de produção e transações, que se dão no interior de um “cacho”ou “rede” de relações transnacionais, tanto

internas quanto externas às companhias, e que podem incluir ou não um

investimento de capital, mas cujo objetivo consiste em promover seus interesses

globais (CHESNAIS, 1986:69).

De acordo com Michalet, uma companhia multinacional é “uma empresa

(ou um grupo), em geral, de grande porte, que, a partir de uma base nacional,

implantou no exterior várias filiais em vários países, seguindo uma estratégia e

uma organização concebidas em escala mundial” (CHESNAIS, 1986:73).

Antes de abordar as críticas de Chesnais, é interessante analisar as

considerações que ele extraiu da definição de Michalet. Para Chesnais, estas são

empresas que começaram a se tornar grandes empresas primeiramente no plano

nacional, fato que implica que são resultados de um processo mais ou menos

longo e complexo, de concentração e centralização de capital, ou seja,

freqüentemente se diversificavam, antes de começarem a internacionalizar-se.

Sua constituição primordialmente nacional revelaria que os pontos fortes

e fracos de sua base nacional e a ajuda que teria recebido do Estado seriam

componentes de sua estratégia e de sua competitividade, e que, por serem

23

geralmente grupos (holdings), atuariam em escala mundial com estratégias e

organização estabelecidas para isso.

As críticas a esse processo de constituição ou gênese das multinacionais

podem ser melhor entendidas na perspectiva temporal. Michalet destacou a

implantação de filiais no exterior pelas multinacionais, assim como as estratégias

que as comandam. O que realmente vem caracterizando essas empresas, quanto

ao alcance de seus objetivos, é a natureza e a forma das relações que estabelecem

com outras empresas, o que não indica que, para manterem suas atividades no

exterior, devam necessariamente instalar filiais.

O objetivo continua sendo a maximização do lucro, o que pressupõe

eficiência organizacional e produtiva. Essa é a razão do crescimento dos grupos

tanto em nível local quanto em suas incursões além de suas fronteiras.

2.2. O sistema agroalimentar (SAA)

2.2.1. Emergência do moderno SAA

A relação entre a indústria de processamento de alimentos e o novo

padrão da dieta da classe trabalhadora representa um fato marcante para a

compreensão do sistema agroalimentar.

Nas primeiras décadas do século XX, a maioria da população urbana era

demasiadamente pobre. Assim, quais mudanças teriam ocorrido na indústria de

alimentos e nos empregos, de modo geral, a partir da disseminação desse novo

padrão de consumo? Inicialmente, as mais importantes mudanças no consumo de

alimentos tiveram seu impacto na classe média, o que, gradativamente, chegaria

à dieta das camadas mais pobres da população. A partir daí, davam-se os

impulsos necessários à emergência das indústrias de alimentos.

A partir do momento em que passa a desenvolver uma carreira

independente da do ambiente doméstico, a mulher passa a ter sua influência,

como consumidora, avaliada pelos anunciantes. Gradativamente, distancia-se de

sua principal contribuição para a família, cujos esforços se dirigiam aos cuidados

24

com o ambiente doméstico, como a manutenção da casa e o preparo da comida

para o marido e para as crianças.

Atualmente, apesar de esse papel ainda ficar sob sua responsabilidade,

em grande parte das famílias, é grande o impacto causado pela inserção da

mulher no mercado de trabalho. A introdução de novas tecnologias que

amenizariam as atividades domésticas, aliada às oportunidades de empregos

remunerados, contribuiu para a formação de um ambiente propício aos interesses

da indústria de alimentos.

O ponto central desse argumento é que há uma correspondência,

conforme se desenvolve o sistema alimentar, entre as mudanças no processo de

trabalho e as mudanças na preparação da comida, em que o papel das mulheres

tem grande importância. Segundo GOODMAN e REDCLIFT (1991:44),

sem um maior número de mulheres em empregos remunerados fora do ambiente doméstico, a revolução do consumidor no pós Segunda Guerra não

teria ocorrido; e um dos principais elementos nessa revolução foram as

mudanças no modo como o trabalho doméstico passou a ser executado. (...) Assim como o trabalho havia sido transferido de casa e assim se tornado uma

commodity, a comida se comoditizou com ele, e a transformação de valor de

uso em valor de troca ocorreu por mudanças a nível ideológico, assim como em termos econômicos.

16

Essas mudanças tiveram significado de grandes proporções, basta

verificar a radical diferença entre a dieta atual e aquela de 50 ou 100 anos atrás.

Hoje, a origem da maioria de nossa comida diária é processada e preparada fora

de nossa cozinha, o que, em conjunto com uma série de aparelhos

elétricos/eletrônicos, como freezers, fornos de microondas e lava-louças,

transformou a natureza do trabalho doméstico. Caso não se queira comer em

casa, a opção por um almoço rápido ofertado pelas cadeias de fast-food está

bastante disseminada. Esse mercado vem obtendo crescimento em grandes

escalas e sua conexão com a produção agrícola tornou esta última uma grande

16 Tradução literal para “without more women in paid employment outside the home the post Second

World War consumer revolution could not have occurred ; and one of the principal elements in this

revolution has been changes in the way housework is performed. (…) As labour has been transferred

from the home and become a commodity, food has been commoditized with it, and the transformation

of use values into exchange values has come about through major shifts at the ideological level, as

well as in economic terms" (GOODMAN e REDCLIFT, 1991:44).

25

fonte de produtos "comoditizados", distante de sua vocação como provedora de

produtos naturais variados.

Dessa forma, é importante considerar o sistema alimentar como aquele

que se desenvolveu ao redor de um processo estruturalmente compatível com

mudanças tanto tecnológicas como no mercado de trabalho e que não se limitou

ao nível doméstico nem ao industrial, mas a ambos. O desenvolvimento do

trabalho e do sistema alimentar não foi resultado de um imperativo tecnológico

unicamente, tampouco foi uma determinação inteiramente social, mas decorreu

da convergência de uma série de processos e componentes cuja característica

principal foi a transformação do trabalho feminino, que acabou por se configurar

como um veículo por meio do qual ocorreram mudanças radicais tanto na

produção quanto na preparação de alimentos (GOODMAN e REDCLIFT, 1991).

Ademais, essas transformações trouxeram outras conseqüências

importantes. À medida que a mulher participava de um trabalho remunerado fora

do ambiente doméstico, sua importância como consumidora crescia, e a indústria

de alimentos passava a intensificar seus esforços para maximização de lucros em

setores do mercado que apresentassem maior crescimento potencial nas vendas,

modificados por essa nova condição. Assim, os produtos alimentares tornaram-se

parte importante das estratégias de marketing, principalmente em razão do

declínio no consumo familiar de alimentos in natura no ambiente doméstico.

Associado a essa concentrada atenção às demandas dos consumidores,

emerge, segundo GOODMAN e REDCLIFT (1991), considerável poder nas

mãos dos varejistas sobre as indústrias de alimentos, assim como sobre os

produtores de alimentos nos campos, uma vez que o varejo, em busca do

desenvolvimento de novas linhas de produtos, passa a pressionar os demais elos

da cadeia agroalimentar. Nesse ponto, passa a constar nos objetivos estratégicos

de marketing das indústrias de alimentos a busca pela diferenciação dos

produtos, quando o termo “produtos de alto valor agregado” passa a imperar.

Como a produção agrícola está diretamente associada a esse processo, o

principal reflexo nele refere-se, logicamente, às mudanças em sua estrutura

produtiva. Pode-se afirmar que tais mudanças atingiram, decisivamente, muitos

26

países em desenvolvimento, dentre eles o Brasil, que teve sua estrutura adequada

aos padrões de consumo de países industrializados. Em GOODMAN e

REDCLIFT (1991), isso se torna evidente quando afirmaram que, “em países

como o Brasil e a Tailândia, o aumento do monocultivo de terras está associado,

embora indiretamente, a mudanças nas práticas de consumo de alimentos no

Reúno Unido e em outros países industrializados”17

.

Os produtos de alto valor agregado, que passam a ser ofertados a esse

“novo mercado”, têm como principais características a conveniência e maior

“shelf life” (tempo de prateleira), em decorrência das novas técnicas de

conservação de alimentos, o que resulta, principalmente, em preços mais

elevados. Além disso, esses produtos apresentam em sua composição um

percentual cada vez menor de produtos agrícolas primários. Não é difícil

entender por que razão as três principais matérias-primas dessas indústrias (trigo,

arroz e soja) foram justamente as culturas que fizeram parte do projeto de

produção agrícola, que, segundo seus idealizadores, resolveria o problema de

escassez da oferta de alimentos no mundo e, conseqüentemente, minimizaria a

fome - a “Revolução Verde”.

A partir do incremento dessas indústrias, inicia-se uma reação

sistemática nos demais atores da cadeia agroalimentar. As novas oportunidades

mercadológicas intensificam as influências no alastramento de formas

"comoditizadas" que chegariam à produção agrícola, buscando dotar toda a

cadeia da maior conformidade industrial possível. Como é comum em qualquer

mercado organizacional, sua demanda total é geralmente uma demanda derivada,

ou seja, a partir de um aumento na demanda no consumo final (doméstico),

desenrola-se uma demanda subseqüente entre os setores envolvidos na produção,

na circulação e na oferta de mercadorias.

17 Tradução literal para “In countries like Brazil and Thailand increased monocultivation of land is linked,

albeit indirectly, to changes in food consumption practices in the United Kingdom and others

industrialized countries”.

27

2.2.2. Implicações da emergência do SAA no processo de produção agrícola

Mudanças no consumo de alimentos e na ocupação remunerada das

mulheres fora do ambiente doméstico podem ser consideradas como mudanças

nos padrões tecnológicos efetuados pelas nascentes indústrias de alimentos,

desde que a isto se associem também forças sociais, políticas e ideológicas.

Ademais, tudo isso se fez possível em decorrência de um movimento de regresso

que impôs modificações fundamentais no modo de produção agrícola,

capacitando-o para o fornecimento padronizado de alimentos, seguindo as

exigências da produção industrial das processadoras de produtos alimentares.

A emergência da indústria alimentar condicionou a integração do sistema

alimentar à produção de alimentos nas propriedades rurais. Paralelo a isto, houve

um impulso demográfico relacionado com o crescente deslocamento de pessoas

dos campos para as cidades, principalmente na Europa e também nos EUA, o que

transformaria uma sociedade de bases rurais numa sociedade urbana. Não se

pode desconsiderar que, além dessa influência demográfica, havia forte

convicção ideológica que daria impulso a uma sociedade urbanizada.

Dentre essas mudanças que passaram a ocorrer na sociedade da pós

segunda guerra, destaca-se a capacidade dos produtores rurais em absorver as

mudanças tecnológicas que começavam a se tornar disponíveis ao campo.

É a partir desse período que a agricultura inicia uma relação mais

intensa, contínua e estreita com o mercado, o que levaria ao rompimento da

necessidade de se respeitar o ciclo orgânico natural das plantas. Iniciava-se,

assim, um processo de distanciamento da agricultura tradicional, um sistema que

combinava produção de comida com proteção ambiental. Nesses termos, o

produtor rural constatava que aumentava sua dependência de fornecedores

externos, assim como aumentava a presença do capital industrial no campo. Este

fato se agravava quando o Estado assumia o papel de regulador dos termos sobre

os quais a produção agrícola se constituiria, particularmente no que diz respeito

ao mercado para os produtos agrícolas (GOODMAN e REDCLIFT, 1991).

28

O fato mais marcante da penetração do capital no campo refere-se a seu

poder de transformação das condições de produção. Torna-se uma característica

desse momento o crescimento dos excedentes agrícolas, ao mesmo tempo que há

um declínio no número de agricultores nas sociedades que experimentavam essa

situação.

Novas relações tomavam forma e sua essência se referia à idéia de

empreendimento empresarial agrícola, cuja produção foi intensificada pela

crescente apropriação industrial dos modos de produção. É nesse momento que a

indústria lança suas bases para transformar o sistema agroalimentar desde a

produção até o consumo final de alimentos, ou seja, implementar modificações

suficientes para que toda a cadeia produtiva se concretizasse sem as

interferências e limitações relacionadas com a natureza, quais sejam, intempéries

climáticas, pragas e doenças das lavouras e respeito ao ciclo de vida destas. Isso

levava os produtos agrícolas a se assemelharem às demais matérias-primas

usadas como insumo pela indústria. Sobressai a idéia da "comodificação", busca

fundamental da fluência e da precisão exigidas pelo processo de produção

industrial.

Mas, ao se abordar a interação indústria e agricultura, tem-se implícita a

idéia de que as possibilidades de sucesso daí provenientes irão depender das

dificuldades que a segunda impõe à primeira. Por suas próprias características, o

modo de produção agrícola tem representado um entrave à penetração do capital.

As limitações mais comuns referem-se às exigências e às imposições da própria

natureza, como condições climáticas favoráveis e disponibilidade de espaços de

terra que sejam aproveitáveis, além de outras, como as constantes manifestações

de pragas e doenças nas culturas, embora estas tenham sido potencializadas,

consideravelmente, pelas opções de cultivo do homem moderno. Como

argumentaram GOODMAN et al. (1990:5),

a agricultura tem-se constituído no principal obstáculo à imposição de um

processo de produção capitalista unificado no sistema agroalimentício e, conseqüentemente, à capacidade de revolucionar os meios de produção.

Mas seu impulso transformador levou o capital a encontrar formas de

aliviar as dificuldades em referência. Nesse sentido, assumiu duas propriedades

29

principais: a do apropriacionismo, num primeiro instante, e a do

substitucionismo, posteriormente.

O processo apropriacionista materializava-se sob três formas principais: a

mecânica, a química e as relacionadas com inovações genéticas. Mas esse

processo não se deu sobre a totalidade do processo de produção agrícola,

tampouco seguiu uma linha temporal constante. Na verdade, as apropriações

foram e têm sido parciais e dependentes das diferentes conjunturas históricas.

É a partir desse momento que se consolidam as primeiras indústrias do

sistema agroalimentar. Elas emergem dos setores constituídos por essas

apropriações, quando as atividades essencialmente rurais passam a ficar

subordinadas ao capital, iniciando a remoção gradativa das barreiras inibidoras

da acumulação. Os investimentos em pesquisa intensificam-se para suplantar as

dificuldades próprias da natureza, o que confere às inovações tecnológicas um

papel aglutinador de vantagens competitivas entre empresas concorrentes.

Os avanços apropriacionistas buscavam dar impulso a ganhos de

produtividade de determinada lavoura (pela intensificação do emprego de

máquinas e equipamentos agrícolas, de insumos sintéticos/inorgânicos para

correção de solo, ou pela utilização de sementes híbridas).

Já o substitucionismo buscava transformar as atividades rurais em

atividades industriais, diminuindo as limitações impostas pela natureza. Tende a

reduzir o produto rural a um simples insumo industrial, no sentido de substituir

os produtos agrícolas por matérias-primas não-agrícolas, a partir da indústria

química e do desenvolvimento dos sintéticos. A diferença básica reside no fato

de o substitucionismo afastar-se de uma base rural, ou melhor, sua tendência

caminha em direção à “eliminação do processo rural de produção, seja pela

utilização de matérias-primas não-agrícolas, seja pela criação de substitutos

industriais dos alimentos e fibras” (GOODMAN et al., 1990:52).

É importante notar que os capitais relativos a investimentos

apropriacionistas ainda mantêm laços com o processo de produção de base rural,

enquanto o capital substitucionista caminha em direção oposta, justamente por

buscar substitutos industriais dos produtos agrícolas (alimentos e fibras).

30

Os investimentos em P&D, relacionados com a industrialização da

produção rural, acabam por constituir uma situação paradoxal, em referência à

biotecnologia. Algumas inovações biotecnológicas contribuíram para melhorar as

perspectivas econômicas de determinados produtos agrícolas (por modificações

nos genes que tornam as plantas mais resistentes a condições climáticas adversas,

pela adição de valores nutricionais etc.).

2.2.3. O papel do Estado: a divisão do trabalho e a consolidação das empre-

sas de sementes

Para KLOPPENBURG (1988), a ciência agrícola tem se tornado

crescentemente subordinada ao capital e seu contínuo processo moldou o

conteúdo da pesquisa e, necessariamente, o caráter de sua produção. Isto não

significa dizer que o capital obteve completo domínio do setor, que encontrou

uma variedade de barreiras para penetrar no campo da criação de plantas e fazer

da semente um veículo de acumulação.

São as próprias características naturais das sementes que ajudam a

esclarecer as dificuldades da penetração do capital na agricultura. A principal

delas refere-se à capacidade de auto-transformação inerente às sementes, quando

o embrião amadurece e transforma-se numa planta. Isto significa que a semente

acaba desempenhando dupla característica, que une os dois extremos do processo

de produção da colheita, ou seja, é tanto meio de produção quanto produto.

Como produto, pode-se entendê-la sob a forma de semente ou de grão,

quando o agricultor colhe a safra. É graças a essa possibilidade de reprodução

que milhares de agricultores têm se mantido como tal, principalmente os

pequenos, quando selecionam os melhores grãos de cada safra para plantio

futuro.

Dessa forma, evidencia-se que sua característica reprodutiva representa o

mais grave entrave à penetração do capital, uma vez que de nada adiantaria a

incorporação de inovações tecnológicas advindas de elevados gastos em pesquisa

31

e desenvolvimento, se todo o investimento se perde no momento em que a

semente é vendida. Nas palavras de KLOPPENBURG (1988),

desde que essa situação perdure, existe pouco incentivo para que o capital

penetre na criação de planta cujo propósito seja desenvolver variedades

superiores de colheita, porque o objetivo a que essa pesquisa se dedica – a semente - é instável como forma comodificada. As características naturais da

semente constituem uma barreira natural para sua comodificação.

Na visão desse autor, o capital tem duas rotas para a "comodificação" da

semente, que, apesar de serem distintas, estão interligadas: um caminho seria o

técnico, o outro, o legal, ou seja, a semente tornar-se-ia uma mercadoria atraente

para investimentos industriais, seja pela manipulação biológica, seja pela força

legislativa. São fundamentalmente esses fatores que marcam a gênese do

mercado de sementes.

O caminho técnico iniciou-se com a descoberta da via híbrida18

de

produção de sementes, que permitiu a diferenciação entre a semente e o grão. Já

o caminho legal refere-se ao surgimento de legislações relativas à propriedade

intelectual, que possibilitaram a apropriação privada das variedades de alto

rendimento.

De fato, o discurso corrente na época dirigia-se à capacidade de ganhos

em produtividade trazida pelas variedades híbridas, no entanto, sua grande

importância estava na possibilidade de separação da identidade da semente como

produto e meio de produção. Esta provou ser uma excelente solução tecnológica

às barreiras que historicamente preveniram baixos níveis de investimentos

privados na melhoria das colheitas. Ela abriu ao capital uma nova fronteira de

acumulação, cujos criadores rapidamente migraram para explorar.

Vale destacar que isso não foi possível em todas as culturas. Por razões

técnicas, a hibridação não alcançou culturas economicamente importantes, o que

estimulou a continuidade de investigações científicas nessa área. As recentes

18 Pelo método da hibridação procura-se explorar o vigor híbrido apresentado pelas plantas resultantes

do cruzamento entre indivíduos contrastantes, o qual se perde na geração seguinte. Desse modo, não é

aconselhado, economicamente, o plantio de gerações avançadas, o que implica o retorno ao mercado,

a cada ano, para aquisição das sementes híbridas (F1). Além disso, no processo de criação do milho

híbrido, as linhagens que entram na sua constituição são mantidas em segredo pelas empresas que os

produzem, fazendo da semente híbrida um produto com propriedade (informações prestadas por

Eduardo Rezende Galvão na defesa deste trabalho, em 31 de agosto de 2000).

32

inovações na engenharia genética têm representado passos decisivos para

suplantar as barreiras que ainda restam à disseminação de formas

"comodificadas".

É importante apontar a importância do Estado para que essas

modificações biológicas tivessem êxito. A primeira cultura que resultou da

hibridação foi desenvolvida por agências públicas de pesquisa norte-americanas,

como solução para problemas de produtividade. Assim, a partir de 1935, o

desenvolvimento do milho híbrido foi fundamental para o rápido crescimento da

indústria de sementes. Mas, antes mesmo dessa data, era grande e crescente o

volume de investimento público em pesquisa agrícola e quase insignificante o de

origem privada. Segundo KLOPPENBURG (1988), a partir da coleção global de

germoplasma iniciada em 1839, pelo US Patent Office, estabelecia-se forte

tradição do compromisso estatal com a agricultura, no geral, e com a ciência de

planta, em particular. Esse compromisso acabou explicitamente

institucionalizado em 1862, pela criação do United State Department of

Agriculture (USDA) e pelo “Morril Act”, que autorizou suporte federal para os

“land-grant universities” direcionados para a agricultura. KLOPPENBURG

(1988) citou ainda o “Hatch Act”, de 1887, que proveu assistência às estações

experimentais estatais agrícolas (SAEGs), dando estrutura para a aplicação

sistemática da ciência em problemas agrícolas.

Assim, já na virada do século, havia grandes investimentos tanto em

nível federal quanto estadual, ideologicamente compromissados com a missão de

servir ao agricultor. Nesse ponto, investir no melhoramento de plantas era crucial

para o desenvolvimento do capitalismo americano. Havia preocupação com o

provimento de comida barata à classe trabalhadora americana e também com a

geração de trocas externas, pois o estabelecimento do capitalismo industrial era

fundamentalmente dependente do setor agrícola. Para GOODMAN e REDCLIFT

(1991), essa relação entre agricultura e desenvolvimento industrial está presente

no importante papel da agricultura para a expansão do capitalismo industrial,

quando alivia a pressão sobre a taxa de lucro ao fornecer alimentos da dieta

básica a preços baixos para o setor industrial urbano.

33

Mas é importante notar que, nesse período, como o capital não se fazia

disponível, o capital social foi estimulado e o Estado empreendeu a tarefa do

melhoramento de plantas. A partir desse momento, buscou-se difundir uma

racionalidade para a agricultura, a qual permitisse a entrada do capital nos meios

de produção agrícola.

No entanto, chega-se a um ponto em que o desenvolvimento de

variedades agrícolas por agências públicas se torna uma barreira institucional à

penetração do capital empreendedor no campo, já que o produto da pesquisa

pública acabava competindo diretamente com aqueles oriundos dos produtores

privados, que disputavam posições no mercado de sementes. Os criadores

públicos disciplinaram o mercado com qualidade, preço e estrutura, de tal forma

que limitaram as habilidades dos produtores de sementes em acumular capital

(KLOPPENBURG, 1988). Nesse caso, o Estado, que numa sociedade capitalista

é encarregado de prover as condições para acumulação capitalista, acaba por

promover barreiras à acumulação.

Essa contradição logo iria se desfazer, quando o capital passou a

promover uma divisão do trabalho entre os setores público e privado. O Estado

passaria a desenvolver pesquisas relacionadas com investigações básicas,

enquanto o privado se dedicaria à pesquisa aplicada. Pode-se perceber essa

relação mais claramente em PESSANHA (1993:63), quando afirmou que

o setor público foi paulatinamente afastado da criação de variedades finais,

atendo-se cada vez mais às pesquisa básica, ou seja, à pesquisa quanto aos métodos de melhoramento vegetal e à produção de linhagens puras, oferecendo

suporte para a atividade do setor privado no desenvolvimento de novas

variedades comerciais.19

A relação passa a ser muito mais de cooperação que de concorrência,

ficando o setor público cada vez mais subordinado ao privado, perdendo sua

autonomia e seu papel disciplinador do mercado e tendo sua agenda de pesquisa

determinada pelas influências diretas dos objetivos e necessidades do setor

privado. No entanto, mais importantes que o tipo de pesquisa que passa a

19 Pessanha também chamou atenção para o fato de que essa mudança não ocorreu de forma imediata,

sem resistência dos melhoristas públicos e amplas discussões nas diferentes instâncias institucionais

correlatas. As transformações ocorriam à medida que o setor privado amadurecia e ganhava poder de

pressão e articulação.

34

direcionar esses dois setores são a proximidade e o grau de controle que o setor

privado passa a exercer sobre a semente na forma de commodity.

A partir de 1935, percebe-se uma inversão das forças ligadas ao

melhoramento de plantas, dada pela perda de liderança pública e pela ascensão

do setor privado. A indústria de sementes passa a direcionar as pesquisas em

melhoramento de plantas subsidiadas pelo Estado para atividades que são mais

complementares que competitivas a seus esforços.

O próprio híbrido, que foi desenvolvido por agências públicas de

pesquisa norte-americanas, foi decisivo para o rápido crescimento da indústria

sementeira a partir de 1935. No entanto, é o capital privado que daria o impulso

determinante na disseminação do híbrido, primeiramente nos EUA e depois no

mundo. PESSANHA (1993:62-63), quando buscou identificar a gênese do

mercado de sementes, afirmou que já em 1926 foi fundada a primeira companhia

norte-americana dedicada à comercialização de híbridos de milho, a HI Bred

Corn Company, que veio a se tornar a multinacional Pioneer Hi-Bred. Por ter

alcançado sucesso comercial, ela acabou contribuindo para a disseminação de

sementes híbridas.

A via híbrida não resolveu por completo as barreiras20

encontradas pelo

capital, razão por que se pode dizer, então, que os esforços despendidos para o

estabelecimento de direitos de propriedade para as atividades ligadas ao

melhoramento de plantas podem ser encarados como um mecanismo institucional

que viria solucionar o problema da apropriabilidade das espécies, nas quais a via

híbrida de produção de sementes ainda é economicamente inviável.

KLOPPENBURG (1988) considerou a configuração do Plant Variety

Patent Act (PVPA) um acontecimento determinante na consolidação do direito

de propriedade das variedades criadas. Ademais, julgou essencial entendê-lo

20 Parte do problema estava resolvido com relação às espécies alógamas, mas as dificuldades ainda

permaneciam quando se referiam às autógamas. Nestas últimas, havia a possibilidade de apropriação

por parte dos agricultores ou pelas indústrias concorrentes. Autogamia refere-se a qualquer processo

de fusão de gametas do mesmo indivíduo, ou, se tomar uma aplicação da botânica, a fertilização e a

fecundação de uma planta por meio de seu próprio pólen. Já a alogamia refere-se ao processo de

fecundação por união de gametas, oriundos de dois seres diferentes, ou seja, a fecundação cruzada

pelo qual o pólen de uma flor vai ao estigma de outra, o que caracteriza a oposição entre os termos.

35

como resultado de um processo histórico que envolvia a progressiva penetração

do capital privado no melhoramento vegetal e não como fato isolado.

Uma idéia sintética da situação que envolveu a divisão do trabalho pode

ser percebida em PESSANHA (1993:71-72), para quem,

em linhas gerias, a defesa da adoção de direitos de propriedades para os

melhoristas de plantas dava-se pelo entendimento de que tais direitos

estimulariam o investimento privado em melhoramento. Isto oferecia aos agricultores maior possibilidade de escolha e variedades superiores em

rendimento e qualidade, e liberaria a pesquisa pública do desenvolvimento de

variedades para concentrar seus esforços na pesquisa básica necessária para o melhoramento vegetal. Os argumentos contrários eram de que a concessão de

direitos monopolista sobre as variedades agrícolas acarretariam a

concentração na indústria e ao aumento de preços das sementes.

Dar ao capital privado a função de investimentos em pesquisa é

reconhecer que ele irá dar um rumo próprio aos seus interesses. Nesse ponto,

pode-se fazer uma analogia dos gastos realizados pelos setores públicos e

privados em pesquisas médicas. Em estudo do Fórum Global de Pesquisa sobre a

Saúde, apresentado em Genebra, na Suíça, em 03 de maio de 2000, relatou-se

que as enfermidades que causam 90% da mortalidade mundial recebem somente

10% do dinheiro dedicado à pesquisa médica. Os gastos chegam a US$ 7 bilhões

anuais, mas sua distribuição se mostra extremamente ineficaz e injusta (EL PAÍS

DIGITAL, 2000). A maioria dessas decisões está nas mãos de pequeno número

de países que dão prioridade a seus próprios problemas sanitários. “Tanto a

grande indústria farmacêutica quanto as instituições públicas de pesquisa se

concentram nos problemas sanitários típicos do Ocidente, muitas vezes ligados

ao envelhecimento, à obesidade e ao estilo de vida dos países desenvolvidos”21

.

Os dois principais assassinos do planeta - a pneumonia e as diarréias infecciosas -

representam 11% daqueles que morrem ou ficam incapazes no mundo, mas só

atraem 0,2% do dinheiro dedicado à pesquisa sanitária.

Seguindo seus próprios interesses e com o apoio do Estado, a indústria

de sementes expande-se, alcançando espaços cada vez mais significativos fora

21 Tradução literal para “tanto la gran industria farmacéutica como las instituciones públicas de

investigación se concentren en los problemas sanitarios típicos de Occidente, muchas veces ligados al

envejecimiento, a la obesidad y al estilo de vida de los países desarrollados” (EL PAÍS DIGITAL,

2000).

36

dos EUA. Assim, para compreender a emersão da indústria de sementes, é

fundamental compreender as relações no plano internacional.

2.2.4. A economia mundial e a expansão da indústria de sementes

A expansão da indústria de sementes nos países em desenvolvimento tem

relação direta com o fenômeno da “Revolução Verde”22

. Institucionalizou-se um

mercado para as empresas norte-americanas em diversos países a partir da

concepção de que a produção agrícola teria de dar um salto em produtividade

para acompanhar o crescimento vertiginoso da população, principalmente em

países em desenvolvimento.

A relação entre o fenômeno da Revolução Verde e a expansão do

mercado mundial de sementes melhoradas possibilitou a criação desse mercado e

a conseqüente internacionalização das indústrias sementeiras.

A justificativa para se implantar tamanha estrutura relacionava-se com

um projeto que solucionaria a crise na produção de alimentos e o problema da

forme no dito Terceiro Mundo. Além disso, mais convincente ainda era o

argumento de que a modernização das técnicas de produção de alimentos serviria

de solução para o desenvolvimento desses países. Como o tempo encarregou de

evidenciar, isto não ocorreu e a Revolução Verde acabou imersa em numerosas

críticas.

A principal delas refere-se ao modelo de agricultura que se firmaria

depois da Segunda Guerra Mundial, estruturado num modelo agrícola de

interesse dos países desenvolvidos e baseado na exportação de “pacotes

tecnológicos”. As plantações eram baseadas no monocultivo, e, devido às

características das variedades desenvolvidas pelos centros de pesquisas, era

grande a dependência dessas do uso intensivo de insumos químicos (fertilizantes,

defensivos) e de irrigação. As conseqüências foram o endividamento dos

22 A Revolução Verde, por meio da difusão internacional das técnicas da pesquisa agrícola, marca maior

homogeneização do processo de produção agrícola em torno do conjunto compartilhado de práticas

agronômicas e de insumos genéricos (GOODMAN et al., 1990).

37

agricultores e a presença indispensável de subsídio governamental para a

agricultura. Ademais, todo o fornecimento de insumo agrícola era realizado por

empresas multinacionais, o que contribuiu para maior dependência dos países em

desenvolvimento, ao mesmo tempo que crescia o mercado para tais empresas.23

2.2.5. Uma nova base tecnológica: a biotecnologia e as sementes

Quase tudo aquilo que se come tem origem na produção agrícola, na qual

a semente representa o elemento fundamental, a origem e o meio de produção

para as culturas de interesse dos agricultores.

Os povos pré-históricos encontravam alimentos em mais de 1.500

espécies de plantas silvestres e pelo menos 500 vegetais foram utilizados na

agricultura antiga. Atualmente, 95% da nutrição humana deriva de não mais que

30 plantas, sendo que oito delas equivalem a três quartas partes da contribuição

do reino vegetal para a energia humana. O trigo, o arroz e o milho são

responsáveis por cerca de 75% de consumo de cereais. “No espaço de mil anos, a

diversidade de nossos alimentos vegetais reduziram-se às 200 espécies cultivadas

pelos pequenos agricultores e às 80 espécies preferidas pelos produtores

comerciais” (MOONEY, 1987).

Essa queda no número de plantas que servem de base para a alimentação

humana pode ser atribuída, dentre outros motivos, à constante e crescente

penetração do capital industrial na produção de alimentos. Neste sentido,

direcionou a produção agrícola para grandes escalas, usando espécies das quais

poderiam derivar seus produtos alimentares para o consumo final.

Antes dessa apropriação, o homem, no seu trato com a terra, sempre

procurou selecionar e salvar as melhores sementes de determinada colheita para

aproveitá-las na próxima safra. Esse processo perdurou por muito tempo, mas

23 A difusão desse tipo de plantação em detrimento dos cultivos tradicionais-locais acarretou

uniformidade e erosão genética das espécies agrícolas dos países em desenvolvimento. Com isso

pode-se relacionar um fato com implicações mais recentes e de impacto ainda maior. A busca tanto de

informações genéticas originárias dessas culturas tradicionais assim como daquelas advindas da

enorme biodiversidade encontrada nestes países, para suprir as pesquisas desenvolvidas pelas grandes

multinacionais dos setores agrícolas, farmacêutico e químico, tem contribuído para a desigualdade das

relações internacionais entre centro e periferia.

38

começou a se desfazer à medida que o capital privado ganhava espaço no campo.

É nesse sentido que neste trabalho se considera a semente como elemento

aglutinador e ponto focal para a compreensão dos movimentos dessa indústria.

Analisá-la, como meio de produção e também como produto, é um caminho

seguro para descobertas reveladoras do desenvolvimento da agricultura.

Para RIFKIN (1999:243), o “século que se encerra foi a era da física,

com a energia nuclear ocupando lugar de destaque, o próximo (...) pertencerá à

biologia, e sua tecnologia mais importante será a engenharia genética”. Parte-se,

nesse momento, para melhor compreensão de suas aplicações que são

incorporadas às sementes.

A era da biotecnologia24

tem início em 1973, quando os pesquisadores

norte-americanos, Cohen e Boyer, conseguiram recombinar trechos de DNA de

uma bactéria, depois de terem incluído na seqüência um gene de sapo.

Constataram que o código genético era universal (DNA de espécies distantes

eram compatíveis) e assim adquiriram a faculdade de criar genótipos. Batizaram

esta técnica de DNA recombinante (LEITE, 2000).

A biotecnologia refere-se a qualquer técnica que utiliza organismos vivos

ou partes destes para gerar ou modificar um produto ou melhorar plantas,

animais, e microorganismos para usos específicos. Todas as características de

determinado organismo estão codificadas em seu material genético (genes), que

consiste da coleção de moléculas de DNA (ácido desoxirribonucléico) que existe

em cada célula dos organismos (plantas como milho ou soja, por exemplo,

contêm cerca de 20 mil a 25 mil genes). Assim, a coleção de características de

um organismo (fenótipo) depende dos genes presentes em seus genomas

(genótipo). A manifestação de uma característica específica também irá

depender, dentre vários fatores, do fato de o gene responsável pela característica

manifestar-se ou não e também do grau de seu envolvimento com fatores

ambientais (PERSLEY et al., 1999).

24 Duas precondições importantes para que a biotecnologia adentrasse de fato no mercado foram a

primeira patente concebida a um ser vivo, nos EUA, em 1980, e a decisão histórica que permitiu a

pioneira liberação intencional de um OGM no ambiente, em 1999 (LEITE, 2000).

39

A biotecnologia agrícola é a área da biotecnologia cujas aplicações se

restringem à agricultura e tem sido usada há milhares de anos, desde o advento

das primeiras práticas agrícolas. Mais recentemente, suas técnicas seguem dois

estágios. O primeiro diz respeito ao isolamento do DNA das células de um

organismo e à determinação da seqüência de nucleotídeos de regiões específicas

daquele DNA que representa os genes (muitas patentes se referem à descoberta

de algum sequenciamento de genes). O segundo estágio diz respeito à introdução

desses genes em células de diferentes espécies, ou a modificação de genes e sua

reintrodução nas espécies originais.

As aplicações agrícolas têm-se destinado à procriação seletiva, ou seja, à

realização de troca de material genético entre duas plantas para que se obtenham

descendentes com características desejadas, como maior produtividade,

resistência a doenças e melhoramento da qualidade de produtos.

Ao enumerar as principais aplicações da biotecnologia depara-se com

inovações revolucionárias. A princípio, a lógica da produção de organismos

geneticamente modificados não é diferente dos métodos tradicionais de

hibridação, usados há mais de 10.000 anos. Nesta, ocorre o cruzamento de

variedades da mesma espécie para ganhos de qualidade e produção. No caso dos

OGMs, a diferença reside no fato de a mistura ocorrer em seres de espécies

completamente diferentes, como plantas, bactérias e vírus, dos quais é retirado

um gene para desenvolver essa ou aquela qualidade (RYDLE e VERANO,

2000). Além disso, essa nova técnica permitiu aumentar a precisão das trocas de

genes de interesse e reduziu o tempo em que o processo de melhoria possa

finalmente gerar uma nova planta (PERSLEY et al., 1999).

Dessa forma, torna-se possível isolar e transferir os genes da maioria dos

organismos, de humanos a moluscos, passando pelos vegetais. Assim é que a

insulina humana, hoje, pode ser produzida por bactérias, enquanto vacas, cabras,

ovelhas e porcos têm sido modificados geneticamente para produzir grande

variedade de proteínas humanas (KING e STABINSKY, 2000).

O processo manipulativo, que resultará em sementes modificadas para

conter características específicas, é, resumidamente, o seguinte: primeiro, as

40

bactérias, os vírus e as plantas têm seus genes de interesse isolados, em seguida,

o gene é inserido no DNA de células de tecido da planta a ser alterada com

auxílio de máquinas especiais ou de microorganismos que, assim, geram

embriões transformados; por fim, ao crescerem, esses embriões dão origem a

plantas com as características desejadas, uma vez que o gene de interesse está

incorporado em seu material genético, que passa a produzir sementes

geneticamente modificadas.

A semente então gerada conterá as características que irão garantir os

retornos dos investimentos da indústria. Dentre outros produtos, os mais comuns

são a soja, que representa 54% da produção de transgênicos e tem sua principal

alteração na resistência a herbicidas (já existe desde 1996); o milho, com dezenas

de variedades alteradas, que correspondem a 28% do total dos transgênicos e cuja

modificação também visou à geração de plantas resistentes a alguns tipos de

insetos e herbicidas; a canola, cuja semente é usada para fazer óleo comestível,

que equivale a 9% do total produzido e foi alterada para tornar-se mais resistente

e produzir óleo menos nocivo à saúde. Finalizando, o algodão, cuja área plantada

já corresponde a 4 milhões de hectares ou 9% do total de transgênicos plantados

e cuja alteração buscou dar resistência à planta diante das pragas que infestam as

plantações (RYDLE e VERANO, 2000).

Vale ressaltar que, por considerar a resistência a herbicidas e similares,

essas modificações genéticas acabam por contribuir para a venda de

agroquímicos, prolongando sua vida comercial, já em decadência. Esse tipo de

modificação é classificado como representante da primeira fase das aplicações

biotecnológicas, mais relacionadas com o atendimento dos interesses da indústria

de sementes e agroquímicos, sendo que a próxima estaria direcionada à

confecção de produtos mais claramente benéficos para as pessoas, como plantas

modificadas para conter vitaminas (as chamadas plantas-vacina) ou menores

índices de gordura, açúcares etc. Nesse sentido, abre-se a possibilidade de “se

construir a pedra de toque da propaganda pró-biotecnologia” (LEITE, 2000:64).

A realidade atual, portanto, ainda apresenta alguns produtos cujas

modificações visaram, diretamente, aprisionar os produtores agrícolas a seus

41

interesses, como é o caso das sementes que contêm os genes Terminator e

Traitor.

A idéia contida no gene Terminator era modificar geneticamente a

planta, para que não produzisse sementes na geração seguinte. Desenvolvido por

um cientista do governo norte-americano, o invento foi posteriormente

patenteado pelo próprio governo, em associação com a TNC Delta and Pine Land

Co., que havia "co-financiado" a investigação. Mais tarde, esse invento entrou na

mira da Monsanto, que estava engajada em campanha para aquisições no setor de

sementes. Mas a reação pública foi tamanha que, em 1999, ela anunciou a

desistência do negócio (LEITE, 2000).

Já as modificações em plantas para conterem o gene Traitor não

impedem que eles produzam sementes, como no caso do gene Terminator. No

entanto, as sementes com o gene Traitor são incapazes de gerar novas plantas,

incapacidade que se refere, na verdade, a uma situação de latência, pois,

conjugada com produtos químicos (obviamente da mesma empresa que vende as

sementes), as sementes ganharão sobrevida e passarão a germinar normalmente.

2.3. Análise da estrutura de concorrência da indústria: o modelo das cinco

forças de Porter

O modelo das cinco forças de Porter foi elaborado em obra publicada

originalmente em 1980. Em suas sucessivas reedições, a mais recente de 199825

,

o modelo tem permanecido inalterado e, neste estudo, forneceu ferramentas

sistematizadas para avaliação da indústria de sementes e para melhor

compreensão da ação e da posição competitiva de seus concorrentes. A

aplicabilidade deste modelo tem reforço nas próprias palavras do autor:

25 Embora as empresas atuais possam ser diferentes das empresas da década de 70 ou 80, PORTER

(1998) sustentou a permanência de seu modelo, pelo fato de a base da rentabilidade superior dentro de

um setor continuar sendo os custos relativos e a diferenciação. Assim, o que afeta a rivalidade do setor

é a posição de custo relativo da empresa ou a sua capacidade de se diferenciar e cobrar preços

maiores, já que ser produtor com custos mais baixos e ainda ser realmente diferenciado, cobrando

preços mais elevados, é raramente compatível. As estratégias bem sucedidas exigem opção por uma

coisa ou por outra, ou podem ser facilmente imitadas.

42

O livro apresenta uma base conceitual para a análise competitiva que

transcende setores, tecnologias ou abordagens gerenciais específicas. Aplica-se

a setores de alta tecnologia, de baixa tecnologia e de serviços (PORTER,

1998:7-8).

Antes de se tratar do modelo em questão, é necessário esclarecer os

conceitos de indústria e de produto, conforme empregados por Porter. Por

definição, indústria deve ser entendida como o grupo de empresas fabricantes de

produtos que são substitutos bastante aproximados entre si. Já o termo produto é

empregado para referência tanto a produtos como ao serviço final de uma

indústria, uma vez que os princípios da análise estrutural proposta podem ser

aplicados, igualmente, a atividades de produção e de serviços.

Localizando-se este estudo no contexto de um mercado globalizado, o

modelo de Porter oferece a vantagem adicional de a análise estrutural também

poder ser aplicada ao diagnóstico da concorrência industrial em qualquer país ou

em um mercado internacional, embora algumas circunstâncias institucionais

possam ser diferentes.

Para PORTER (1998:22), “a essência da formulação de uma estratégia

competitiva é relacionar a companhia ao seu ambiente”. No entanto, embora seu

meio ambiente relevante seja muito amplo, uma vez que abrange forças sociais,

econômicas e até políticas, o aspecto principal do ambiente da empresa é a

indústria ou as indústrias com as quais ela compete. A estrutura industrial tem

forte influência na determinação das regras competitivas em determinado setor

industrial. Além disso, tais forças atingem não só uma ou duas, mas sim todas as

empresas do ramo, e as diferentes habilidades das empresas em lidar com tais

forças constituem o ponto básico para garantir uma posição de destaque.

A concorrência de uma indústria supera a mera ação de seus

concorrentes. Na verdade, o grau de concorrência irá depender da ação das cinco

forças competitivas básicas, quais sejam, concorrentes, entrantes potenciais,

produtos substitutos, fornecedores e compradores. É o conjunto dessas forças que

irá determinar o potencial de lucro final da indústria, medido em termos de

retorno, no longo prazo, sobre o capital investido. Isto significa que o ponto

central da atenção das empresas de um setor industrial é encontrar uma posição

43

em que ela possa se defender contra a ação dessas forças competitivas ou

influenciá-las a seu favor. Assim, o resultado de uma boa estratégia é aquele que

garante rentabilidade à empresa, ou seja, que traga lucro em relação ao capital

investido. Mesmo assim, a obtenção de rentabilidade superior às taxas de

retornos de determinado mercado acaba por estimular o fluxo de investimentos

dos concorrentes, como também por atrair empresas de outros setores para a

indústria em vantagem.

O modelo ressalta, ainda, a relação inversa entre as margens de lucro

(retorno) e a intensidade da concorrência, ou seja, à medida que a intensidade da

concorrência aumenta, as margens e os retornos sobre o capital investido

diminuem. Essa constatação pode requerer mudanças na estratégia competitiva

para manter a empresa no setor, como também para levá-la à decisão de

abandoná-lo (NICKOLS, 2000).

Assim, as cinco forças que dirigem a competição dentro de determinada

indústria ampliam a visão de quem são os concorrentes. Nesses termos, clientes,

fornecedores, substitutos e os entrantes potenciais são todos “concorrentes” para

as empresas na indústria, podendo ter maior ou menor importância, dependendo

das circunstâncias particulares. É a concorrência que PORTER (1998)

denominou de rivalidade ampliada.

A ação conjunta dessas cinco forças determina a intensidade da

concorrência no setor, assim como a rentabilidade da indústria, sendo que as

forças mais atuantes se tornam cruciais para formulação das estratégias.

Assim, a partir dessas contribuições será analisada a indústria de

sementes. A atenção estará dirigida para a “identificação das características

básicas da indústria, enraizadas em sua economia e tecnologia, e que modelam a

arena na qual a estratégia competitiva deve ser estabelecida” (PORTER,

1998:25).

A Figura 1 representa as cinco forças que conduzem a competição em

determinado setor industrial, quais sejam, a ameaça de entrada de novos

competidores, a intensidade da concorrência entre os competidores existentes, a

pressão advinda de produtos substitutos, o poder de negociação dos compradores

44

e o poder de negociação dos fornecedores. NICKOLS (2000) agregou a elas seus

respectivos fatores, com base em Porter, sem que isso signifique novos

acréscimos ao modelo. Neste capítulo, o modelo será discutido em cada um dos

seus componentes.

Fonte: PORTER (1998:23).

Figura 1 - Forças que dirigem a concorrência na indústria.

2.3.1. Rivalidade entre as empresas existentes

A rivalidade entre os concorrentes assume a forma corriqueira de disputa

por posição, mediante o uso de táticas como concorrência de preços, batalhas de

publicidade, introdução de produtos e aumento dos serviços ou das garantias ao

Ameaça de novos

entrantes

Ameaça de produtos

ou serviços

substitutos

Poder de negociação

dos fornecedores

Poder de negociação

dos compradores

CONCORRENTES

NA INDÚSTRIA

Rivalidade entre as empresas existentes

COMPRADORES

(Poder de

barganha)

FORNECEDORES

(Poder de

barganha)

SUBSTITUTOS

ENTRANTES

POTENCIAIS

45

cliente, em que ações bem elaboradas no marketing tático têm grande

importância.

A rivalidade ocorre porque um ou mais concorrentes sente-se

pressionado ou visualiza oportunidades para melhorar sua posição. Na maioria

das indústrias, segundo PORTER (1998), os movimentos competitivos de

determinada empresa têm efeitos diretos em seus concorrentes, o que poderia

levar à retaliação ou a esforços para conter esses movimentos, implicando a

dependência mútua entre as empresas de uma indústria. Ademais, esse padrão de

ação e reação pode, ou não, permitir que a indústria como um todo se aprimore.

Algumas formas de concorrência, notadamente a de preços, são

altamente instáveis. Os cortes de preços são fáceis e rapidamente igualados pelos

rivais, passando a reduzir as receitas de todas as empresas. Por outro lado, as

batalhas de publicidade podem expandir a demanda ou aumentar o nível de

diferenciação do produto na indústria, com benefício para todas as empresas.

Segundo PORTER (1998), a rivalidade é conseqüência da interação de

vários fatores estruturais, quais sejam, os concorrentes numerosos ou bem

equilibrados; o crescimento lento e gradual da indústria, os altos custos fixos ou

de armazenamento, a ausência de diferenciação ou custos de mudança, a

capacidade aumentada em grandes incrementos, os concorrentes divergentes, os

grandes interesses estratégicos e as barreiras de saída elevadas.

A rivalidade da concorrência entre os competidores existentes será

analisada com base na avaliação de seus fatores estruturais, compreendidos por

variáveis de mensuração, analisadas na metodologia.

2.3.2. Ameaça de entrada de novos competidores

Quando novas empresas entram para determinada indústria apresentam

nova capacidade, desejo de ganhar parcela de mercado e, freqüentemente,

recursos substanciais. Tendo a rentabilidade como ponto focal a partir da entrada

de novos participantes, os preços podem cair ou mesmo os custos destes podem

ser inflacionados, o que reduziria a taxa de retorno, ou seja, a rentabilidade.

46

Quando uma empresa entra num mercado pela aquisição de outra

existente, geralmente com o objetivo de construir uma posição nesse mercado,

configura-se uma entrada, embora nenhuma empresa tenha sido criada.

A ameaça de entrada em uma indústria pode variar em virtude das

barreiras existentes, em conjunto com a reação esperada da parte dos

concorrentes já estabelecidos. Se as barreiras são altas, a ameaça de entrada é

pequena, porque o novo entrante deverá receber retaliação acirrada daqueles que

compõem o mercado. Os elementos que constituem barreiras à entrada dos novos

competidores são economias de escala, diferenciação de produtos, necessidade de

capital, custos de mudança, acessos a canais de distribuição, desvantagens de

custos independentes de escalas e política governamental. Estes sete elementos

serão avaliados na metodologia.

2.3.3. Pressão advinda de produtos substitutos

Em termos amplos, todas as empresas em uma indústria estão

competindo com concorrentes que fabricam produtos substitutos, que, por sua

vez, reduzem os retornos potenciais de uma indústria, colocando um teto nos

preços que as empresas podem fixar com lucro. Quanto mais atrativa a

alternativa de preço-desempenho dos produtos substitutos, mais firme será a

pressão sobre os lucros da indústria.

PORTER (1998) usou como exemplo a experiência da indústria de

açúcar, que tem grande proximidade com as questões tratadas neste trabalho. A

busca de alternativas para adoçar os alimentos mudou o setor. Depois de

enfrentar, por muito tempo, outros concorrentes que comercializam o açúcar,

esses produtores passaram a defrontar-se com a comercialização, em larga escala,

do xarope de milho como substituto e, hoje, dos adoçantes artificiais. O fato de o

mercado agroalimentar atual ser extremamente competitivo e de os seus atores

investirem grandes cifras em P&D tem colocado diante dos diversos produtores

uma variedade extrema de materiais alternativos com custo mais baixo. Pelo fato

de a identificação de produtos substitutos ser conquistada por meio de pesquisas

47

na busca de outros produtos que possam desempenhar a mesma função que

aquele existente, podem-se entender as inúmeras aplicações industriais na cadeia

agroalimentar como frutos dos avanços na biotecnologia.

Os produtos substitutos que exigem maior atenção são aqueles sujeitos a

tendências de melhoramento do seu trade-off de preço-desempenho, ou que são

produzidos por indústrias com altas margens de lucro.

Assim, PORTER (1998) indicou, como fatores determinantes para se

avaliar a pressão advinda de produtos substitutos, a capacidade de estes

desempenharem a mesma função que o produto da indústria em análise, o trade-

off de preço-desempenho em relação ao produto da indústria e a lucratividade da

indústria em que os produtos são produzidos, que serão abordados na

metodologia.

2.3.4. Poder de negociação dos fornecedores

Os fornecedores podem exercer poder de barganha sobre os participantes

de uma indústria, quando ameaçam elevar preços ou reduzir a qualidade dos bens

e serviços fornecidos. Dessa forma, fornecedores poderosos podem sugar a

rentabilidade de uma indústria que seja incapaz de repassar os aumentos de

custos a seus próprios preços.

Como dito anteriormente, as condições que tornam os fornecedores

poderosos tendem a refletir aquelas que tornam os compradores poderosos. O

poder de barganha dos fornecedores está relacionado com o número de

fornecedores e com o grau de concentração que apresentam em relação à

indústria tida em análise, com existência ou não de produtos substitutos, com

número de clientes importantes para os fornecedores, com importância dos

produtos dos fornecedores para os negócios do comprador, com nível de

diferenciação dos produtos fornecidos e com possibilidade de os fornecedores

representarem uma ameaça de integração para frente, em direção aos

compradores. Essas variáveis serão apresentadas na metodologia.

48

2.3.5. Poder de negociação dos compradores

Os compradores competem com a indústria, ao forçarem o preço para

baixo, ao barganharem melhor qualidade ou mais serviços e ao “jogarem” os

concorrentes uns contra os outros. O poder de cada importante grupo de

compradores da indústria depende de certas características da sua situação no

mercado e da importância relativa de suas compras na indústria, em comparação

com seus negócios totais.

Assim, um grupo comprador tem seu poder medido por fatores como a

relação direta entre concentração de sua indústria ou da quantidade/volume de

suas compras e a importância dos produtos que compram para seus custos, o

nível de padronização dos produtos adquiridos, o nível do custo de mudança que

enfrenta, os lucros que consegue obter, a possibilidade de efetuar uma integração

para frente, a importância que os produtos que compra têm para a qualidade de

seus produtos e o nível de informação que possui.

Essas variáveis que medem o poder de barganha dos fornecedores em

face aos compradores são apresentadas na metodologia.

Como será percebido no momento da análise do poder de negociação dos

fornecedores, a maior parte dessas fontes de poder, usadas em referência ao

comprador, pode também ser atribuída aos fornecedores, bastando apenas

algumas modificações no quadro de referência.

Outra consideração importante diz respeito às mudanças que ocorrem,

com o passar do tempo, nos fatores citados, principalmente das que decorrem das

decisões estratégicas de determinada companhia. Exemplo disso é a migração do

poder que antes era da indústria e que, mais recentemente, passou a ser dos

distribuidores, no setor de roupas. À medida que as lojas de departamento e de

confecções ficaram concentradas, o poder passou para suas grandes cadeias,

ficando a indústria sob crescente pressão, o que tem significado margens

declinantes de lucro.

49

3. METODOLOGIA

3.1. Unidade de análise

Consideraram-se como unidades de análise as corporações transnacionais

da indústria de sementes, determinação que contradiz o pensamento de Heffernan

e Constancem, citados por BONANNO et al. (1994).

Para eles, quando se pretende compreender o sistema agroalimentar

global, as TNCs devem ter papel de destaque, como unidade de análise chave.

Segundo esses autores, a definição da unidade de análise irá depender do tópico a

ser pesquisado, ou seja, do problema de pesquisa. Assim, quando este se refere à

identificação da força determinante da reestruturação do sistema alimentar em

nível global, a unidade de análise devem ser as corporações transnacionais

(TNCs), ou grupos de TNCs, pois são estas que decidem onde, como e por quem

o alimento será desenvolvido.

Heffernan e Constance, citados por BONANNO et al. (1994), ainda

consideraram duas outras possibilidades, quais sejam, o uso de um sistema de

commodity qualquer ou do Estado-nação como unidades de análise. A primeira

se aplica quando o problema da pesquisa se refere aos deslocamentos do trabalho

e aos impactos resultantes nas comunidades rurais. A segunda é utilizada quando

o problema de pesquisa diz respeito aos aspectos regulatórios. No entanto, apesar

50

de estes terem ligação com o problema levantado neste estudo, sua consideração

levaria à perda de foco na sua investigação.

Definidas as TNCs como unidades de análise, a reunião dos dados

relativos a suas vendas e participações de mercados restringiu-se aos anos de

1996, 1997 e 1998. Ademais, esses dados se referem às 10 maiores empresas dos

ramos de semente e agroquímicos, pois são estas que concentram o maior

número de investimentos em P&D biotecnológico, assim como em gastos em

publicidade.

3.2. Tipo de pesquisa

Quanto ao arcabouço metodológico usado para se chegar aos objetivos

propostos neste trabalho, sua natureza é descritiva e interpretativa.

Seguindo a orientação de SELLTIZ et al. (1967:59), a organização das

condições para agrupamento e análise dos dados foi feita com base no objetivo

desta. Como ressaltou a autora, quando o objetivo for “apresentar precisamente

as características de uma situação, um grupo ou um indivíduo específico (com ou

sem hipóteses específicas iniciais a respeito da natureza de tais características)”,

e quando são estabelecidas relações entre variáveis, o estudo adequado é o

descritivo.

A natureza descritiva deste estudo transparece à medida que se procura

evidenciar o impacto gerado pelas inovações biotecnológicas na estrutura de

concorrência do setor de sementes. Já seu caráter interpretativo busca avaliar as

implicações desse impacto nos participantes diretos desse mercado, que são as

próprias empresas de sementes. Apesar de a principal atenção estar voltada para

essas empresas, os demais atores que integram o sistema agroalimentar também

foram considerados.

Seu sentido interpretativo vai além da simples identificação da existência

de relações entre as TNCs, uma vez que também se pretende determinar a

natureza dessa relação (GIL, 1987).

51

A técnica utilizada na reunião de dados foi, essencialmente, a pesquisa

bibliográfica, que, para CERVO (1996:68), “tem como objetivo encontrar

respostas aos problemas formulados e o recurso é a consulta de documentos

bibliográficos”, que, geralmente, se referem a livros e a artigos científicos.

Ademais, sua principal vantagem reside no fato de que a cobertura acerca do

fenômeno pode se realizar de forma muito mais ampla do que aquela advinda de

uma pesquisa direta (GIL, 1987).

Assim, este trabalho destinou-se ao levantamento de indicadores e

referenciais relacionados com o contexto do mercado atual, de economia

globalizada, em que as TNCs e as instituições financeiras têm papel

preponderante na maior proximidade com o campo da biotecnologia, sem, no

entanto, aprofundar em seus aspectos técnicos, e na compreensão do modelo das

cinco forças de PORTER (1998), utilizado na análise da estrutura de

concorrência da indústria de sementes. Em relação às características do mercado

atual e dos avanços biotecnológicos, procurou-se abranger, além de sua dimensão

e evolução conceitual, seus aspectos históricos e elementos constitutivos.

A principal fonte de dados foi a Rural Advancement Foundation

International (RAFI), organização não-governamental, sediada no Canadá, que

se dedica à conservação e ao incremento da sustentabilidade da biodiversidade

agrícola e também do desenvolvimento socialmente responsável de tecnologias

úteis às sociedades rurais. Abrange, também, as questões acerca do impacto da

propriedade intelectual na agricultura e na segurança alimentar do mundo.

Os sites da internet, especializados em biotecnologia, foram fonte de

constantes consultas, tendo em vista a rápida cobertura que dão a assuntos como

este, de extrema atualidade e em constante mudança. Tendo em vista que grande

parte de jornais e revistas, nacionais e internacionais, tem uma versão on-line,

essas fontes também foram usadas.

Outra característica do procedimento metodológico foi a definição de

cortes para precisar a observação do fenômeno. Nesse sentido, optou-se pelo

estudo dos impactos da biotecnologia no setor de insumos e, mais

especificamente, naquelas empresas fornecedoras de sementes para o setor de

52

produção agrícola. A escolha se deve ao fato de a semente ser fração

indispensável à produção agrícola e por ter sido o elemento modificado para

atender aos interesses do capital, passando a ser, além de meio de produção, cada

vez mais produto. Assim, ela concentra grande parte das inovações e representa o

ponto de partida para as inovações biotecnológicas, como a produção dos

alimentos modificados geneticamente.

É importante ressaltar que, pelo fato de as principais indústrias de

sementes terem sido adquiridas da indústria de agroquímicos ou fundidas com

esta, a análise, em diversos pontos, também considera esta última para respeitar a

sua complementaridade.

3.3. Modelo de trabalho

O modelo de PORTER (1998), discutido no Capítulo 2, foi empregado

na análise dos dados, com vistas em compreender os impactos provocados pelos

avanços da biotecnologia na dinâmica da estrutura de concorrência da indústria

de sementes.

As forças definidas por PORTER (1998) - rivalidade entre as empresas

concorrentes, entrantes potenciais, ameaça de substituição, poder de negociação

dos fornecedores e poder de negociação dos compradores - foram utilizadas na

análise da estrutura da indústria de sementes, cujas características básicas estão

enraizadas em sua economia e tecnologia.

O emprego do modelo das cinco forças de PORTER (1998), como

instrumento de análise que satisfaça aos objetivos deste trabalho, implica

considerar cada um dos fatores estruturais que caracterizam cada uma das forças.

Esses fatores correspondem às variáveis de mensuração que revelam a dinâmica

da estrutura de concorrência de uma indústria, as quais podem ser visualizadas na

Figura 2.

53

Fonte: Adaptado de PORTER (1998) e NICKOLS (2000).

Figura 2 - Fatores definidores das forças de concorrência na indústria.

CONCORRENTES

NA INDÚSTRIA

(a) Rivalidade entre as

empresas existentes

(e)

COMPRADORES (Poder de barganha)

(d)

FORNECEDORES (Poder de barganha)

(c)

SUBSTITUTOS

(b)

ENTRANTES

POTENCIAIS

Economia de escala

Diferenciação

Necessidade de K

Custo de mudança

Acesso aos canais de distribuição

Desvantagens de custo

independentes de escala

Política governamental

Esses fatores tendem a aumentar as barreiras de entrada no mercado por

novos entrantes

Poucos fornecedores e mais concentrados que os compra-

dores

Ausência de substitutos

Fornecedores têm clientes

mais importantes

Os insumos dos fornecedores

são críticos para os negócios do comprador

Produtos diferenciados ou o

grupo desenvolveu custos de mudança

Grupo de fornecedores é uma

ameaça de integração para

frente

Concorrentes numerosos ou

bem equilibrados

Crescimento lento da in-

dústria

Custos fixos ou custos altos

de armazenamento

Ausência de diferenciação

ou custo de mudança

Capacidade aumentada em

grandes investimentos

Concorrentes divergentes

Grandes interesses estraté-

gicos

Barreiras de saída elevadas

Estão concentrados ou adqui-rem grandes volumes

Compram produtos que repre-sentam grande parte de seus custos

Compram produtos padroniza-dos

Enfrentam poucos custos de mudança

Conseguem lucros baixos

Quando representam uma ame-

aça de integração para trás

O produto que compram tem

pouca importância para a qua-lidade dos seus

Têm total informação

Esses fatores tendem a aumentar o poder de barganha dos

fornecedores

Esses fatores tendem a aumentar o poder de barganha dos

compradores

Esses fatores tendem a aumentar a rivalidade entre as empresas

existentes

Capacidade de desempenhar a

mesma função que o produto da indústria em análise

O trade-off de preço - desempe-

nho em relação ao produto da indústria

Lucratividade da indústria em

que os produtos substitutos são

produzidos

54

Este modelo foi elaborado por PORTER (1998) e permite a análise da

dinâmica da estrutura de concorrência de um setor industrial e a formulação de

estratégias adequadas para que uma empresa se destaque nesse setor. No entanto,

não sendo este o propósito do trabalho, o referido modelo será aplicado para

identificar a estrutura da indústria de sementes e revelar sua dinâmica.

Os fatores relacionados com as cinco forças - rivalidade entre as

empresas existentes, ameaça de entrada de novos competidores, pressão advinda

de produtos substitutos, poder de negociação dos fornecedores e poder de

negociação dos compradores - serão apresentados e explicados a seguir.

a) Rivalidade entre as empresas existentes

Numa indústria, a rivalidade entre as empresas é conseqüência da

ocorrência dos seguintes fatores estruturais:

Concorrentes numerosos ou bem equilibrados. Quando é grande o número

de empresas, algumas tendem a acreditar que podem fazer movimentos sem

serem notadas. Já quando a indústria é altamente concentrada ou dominada por

uma ou por poucas empresas, os líderes podem impor disciplina,

desempenhando um papel coordenador na indústria por meio da liderança de

preço.

Crescimento lento da indústria. Em negócios que crescem devagar, os

competidores disputam fatias de mercado em uma concorrência que é mais

instável do que numa situação em que o crescimento rápido garante que as

empresas possam melhorar seus resultados apenas se mantendo em dia com a

indústria.

Altos custos fixos ou de armazenamento. Pressionam as empresas a

produzirem na sua plena capacidade ou evitarem a formação de estoques

elevados. Essa situação ocorre quando se tem um produto cujo

armazenamento ou estoque é difícil e despendioso. Para evitar esse processo,

muitas empresas se tornam vulneráveis a baixar os preços, de modo a

assegurar as vendas.

55

Ausência de diferenciação ou de custos de mudança. Um produto que seja

bem diferenciado e que tenha o custo de mudança facilmente percebido pelo

consumidor permite deixar a empresa em uma posição confortável em face à

concorrência.

Capacidade aumentada em grandes proporções. Quando as economias de

escala determinam que a capacidade deve ser acrescentada em grandes

proporções, esses acréscimos de capacidade podem romper o equilíbrio

oferta/procura da indústria, particularmente quando existe o risco de esses

acréscimos serem excessivos. Como ocorre no mercado de fertilizantes

nitrogenados, a indústria pode enfrentar períodos alternados de

"supercapacidade" e de reduções de preços.

Concorrentes divergentes. Concorrentes que divergem em seus objetivos e

estratégias, no que diz respeito a como competir, podem estar em choque

contínuo ao longo de todo o processo. Nesse sentido, quando uma empresa

tem dificuldade em decifrar as intenções dos outros concorrentes, as

alternativas estratégias corretas para um concorrente podem não o ser para

outros.

Grandes interesses estratégicos. A rivalidade será maior à medida que nas

empresas houver muitos interesses em jogo. Com vistas em promover uma

estratégia empresarial global que lhes garanta prestígio ou credibilidade

tecnológica, algumas empresas podem estar potencialmente inclinadas a

sacrificar sua lucratividade, uma vez que consideram importante elevar o valor

de sua marca e garantir o seu posicionamento.

Barreiras de saída elevadas. São fatores econômicos, estratégicos e

emocionais que mantêm a companhia em atividade, mesmo quando esta obtém

retornos baixos, ou mesmo negativos, sobre os investimentos que realiza. As

principais fontes de barreiras de saída são os ativos especializados, que

apresentam baixos valores de liquidação ou altos custos de transferência; os

custos fixos de saída, como acordos trabalhistas, custos de restabelecimento,

capacidade para componentes sobressalentes etc.; as inter-relações estratégicas

56

das unidades da empresa em termos de imagem; a capacidade de marketing; e

o acesso aos mercados financeiros e às instalações compartilhadas.

b) Ameaça de entrada de novos competidores

A ameaça de entrada de novos competidores depende da intensidade dos

seguintes fatores:

Economias de escala. Referem-se aos declínios nos custos unitários de um

produto à medida que o volume absoluto por período aumenta. Essas

economias detêm a entrada ao forçar a empresa entrante a ingressar em larga

escala e arriscar-se a uma forte reação das empresas existentes, ou a ingressar

em pequena escala e sujeitar-se a uma desvantagem de custo. A economia de

escala pode estar presente em quase toda função de um negócio, como as

compras e os investimentos em P&D, em marketing, na distribuição, no uso da

força de vendas e nos serviços prestados.

Atividades potencialmente compartilháveis, sujeitas a economias de

escala, podem trazer benefícios, caso existam custos conjuntos. Estes ocorrem

quando uma empresa que fabrica (vende, distribui, compra etc.) o produto “A”

tem, inerentemente, capacidade de fabricar (vender, distribuir, comprar etc.) o

produto “B”. Esta empresa, que compete tanto pelo produto “A” quanto pelo

produto “B”, terá vantagem substancial em relação àquela que compete

somente por um dos produtos. Essas atividades podem incluir a força de

vendas, os sistemas de distribuição, as compras etc.

É possível também obter economia de escala quando existem vantagens

econômicas na integração vertical, isto é, quando há operação em estágios

sucessivos de produção e distribuição. Assim, a empresa entrante, caso não

ingresse no mercado de forma integrada, enfrentará desvantagem de custo, ou

até mesmo a exclusão de insumos e de mercado para seu produto, se a maioria

dos demais concorrentes estiver integrada. Quando a maioria dos clientes

compra de unidades filiadas, ou a maioria dos fornecedores vende seus

produtos para o mesmo grupo a que pertence, ocorre a exclusão.

57

Diferenciação de produtos. A diferenciação constitui uma barreira aos

entrantes, por forçá-los a elevar despesas para quebrar essa lealdade, as quais,

geralmente, acarretam prejuízos iniciais e podem durar um longo período de

tempo. Segundo PORTER (1998), diferenciar o produto talvez seja a mais

importante barreira para dificultar a entrada em várias indústrias.

Necessidade de capital. A necessidade de amplos investimentos para poder

competir cria uma barreira de entrada, particularmente se o capital for

necessário para atividades arriscadas e, em alguns casos, irrecuperáveis, como

gastos em publicidade prévia ou em P&D. O capital pode ainda ser necessário

para instalações físicas de produção, para oferecer crédito aos consumidores,

para gastar com estoques e para cobrir investimentos iniciais que minam o

capital de giro da empresa. Embora as grandes companhias tenham recursos

suficientes para entrar em qualquer indústria, os altos investimentos exigidos

em P&D acabam por inibir ou por limitar o número de pretendentes.

Custos de mudança. São aqueles com os quais se defronta o comprador ao

mudar de um fornecedor para outro. Podem estar relacionados com

treinamento de empregados, aquisição de novos equipamentos, necessidade de

assistência técnica, novo projeto do produto, ou até mesmo com custos

psicológicos de se desfazer ou romper um relacionamento. Caso esses custos

sejam altos, as empresas entrantes precisam oferecer custos diferenciados para

que o comprador se decida a deixar um produtor já estabelecido.

Acesso a canais de distribuição. Empresas entrantes têm necessidade de

assegurar distribuição para o seu produto. Considerando-se que os canais de

distribuição lógicos já estão sendo atendidos pelas empresas estabelecidas, os

entrantes precisam persuadir esses canais a aceitarem o seu produto. Isto,

geralmente, ocorre por meio de descontos de preço e dotação de verbas para

campanhas de publicidade em cooperação, causando, entre outros efeitos, a

redução dos lucros.

Desvantagens de custo independentes de escala. Empresas já estabelecidas

podem ter vantagens de custos que dificilmente serão igualadas pelos entrantes

em potencial, independentemente do tamanho e das economias de escala que

58

puderem obter. Essas vantagens podem advir de fatores como tecnologia

patenteada; acesso favorável à matéria-prima; localização favorável; subsídios

oficiais, quando alguma empresa recebe subsídio do governo que pode lhe

oferecer vantagens duradouras em alguns negócios; e curva de aprendizagem

ou curva de experiência, que ocorre em alguns negócios quando os custos

unitários declinam à medida que a empresa acumula maior experiência na

fabricação de um produto.26

Política governamental. O governo pode limitar ou impedir a entrada de

determinadas indústrias por meio de controles como exigências de licença para

funcionamento, limites ao acesso de matérias-primas, mecanismos de controle

de preços etc. Restrições mais sutis podem derivar de controles como padrões

de poluição do ar e da água e índices de segurança e de eficiência do produto.

Padrões para testes de produtos, comuns em indústrias alimentares, não só

aumentam o custo de capital da entrada como dão às empresas estabelecidas

notícia de entradas iminentes e até o conhecimento do produto do novo

concorrente, permitindo aos já estabelecidos formularem estratégias

preventivas.

É importante destacar que nenhuma análise estrutural pode ser realizada

e considerada completa sem um diagnóstico sobre como a política governamental

atual e futura irá afetar as condições estruturais da indústria em referência. No

entanto, seguindo a sugestão de PORTER (1998), é mais esclarecedor entender

seus impactos por meio das cinco forças competitivas, do que tomá-los como um

força por si só. Essa sugestão será adotada para que não se perca a importância

que este ator tem na estrutura de concorrência do setor de insumo agrícola.

26 Dessa forma, os custos caem, pois os operários aprimoram seus métodos e se tornam mais eficientes, o

lay out é aperfeiçoado, são desenvolvidos equipamentos e processos especializados, consegue-se

melhor desempenho do equipamento, mudanças no projeto do produto tornam sua fabricação mais

fácil, melhoram as técnicas de medição e controle das operações, etc., como no caso das economias de escala, em que o declínio dos custos em função da experiência não se relaciona com a empresa como

um todo, mas surge de operações isoladas que constituem a empresa. Ademais, pode ser aplicada não

só à produção mas também à distribuição e às atividades de apoio. Numa só palavra, se os custos

declinam com a experiência em uma indústria e se a experiência pode ser resguardada pelas empresas

estabelecidas, então este efeito conduz a uma barreira de entrada.

59

c) Pressão advinda de produtos substitutos

Os produtos substitutos podem provocar concorrência entre os

competidores de uma indústria, e sua intensidade pode estar relacionada com os

fatores descritos a seguir:

produto substituto desempenha a mesma função que o produto da

indústria em referência. Nesse caso, o posicionamento em relação aos

produtos substitutos pode ser uma questão de ação coletiva empreendida pela

indústria. Por exemplo, embora a publicidade feita por uma empresa possa não

ser suficiente para sustentar a posição de uma indústria contra um substituto,

uma publicidade constante e intensa, conduzida por todos os participantes da

indústria, pode melhorar a sua posição.

trade-off de preço-desempenho em relação ao produto da indústria. Os

produtos substitutos sujeitos a melhoramentos no trade-off de preço-

desempenho exigem maior atenção.

Lucratividade da indústria em que os produtos substitutos são

produzidos. Nos casos em que os produtos substitutos são produzidos por

indústrias com lucros altos, eles entram rapidamente em cena, se algum

desenvolvimento aumentar a concorrência em suas indústrias e ocasionar

redução de preço ou aperfeiçoamento do desempenho.

d) Poder de barganha dos fornecedores

Os fatores descritos a seguir tendem a aumentar o poder de barganha dos

fornecedores:

Número de fornecedores e sua concentração em relação aos compradores.

Se a atividade for dominada por poucos competidores e a indústria for mais

concentrada do que aquela para a qual vende seus produtos, o poder de

barganha do fornecedor tenderá a ser grande. Isto porque, ao vender para

compradores mais fragmentados, os fornecedores terão capacidade de exercer

influência nos preços, na qualidade e nas condições.

Ausência de substitutos. Não sendo obrigados a lutar com outros produtos

substitutos na venda para a indústria, o poder de barganha dos fornecedores é

60

maior, visto que até fornecedores fortes enfrentam riscos ao concorrerem com

substitutos.

A indústria não é um cliente importante para o grupo fornecedor. Caso

contrário, se a indústria for um cliente importante, o destino dos fornecedores

estará fortemente ligado à indústria e eles tentarão protegê-la por meio de

preços razoáveis, de assistência em atividades como P&D e do exercício de

influência.

Os insumos dos fornecedores são críticos para os negócios do comprador.

Quando os produtos dos fornecedores forem um insumo importante para o

negócio do comprador, com influência direta no processo de fabricação do

comprador ou na qualidade do produto, o poder de barganha do fornecedor

cresce.

Os produtos são diferenciados ou o grupo desenvolveu custos de

mudança. Os fornecedores terão grande poder de barganha caso seus produtos

sejam diferenciados ou tenham sido desenvolvidos custos de mudanças, os

quais descartam a opção de o comprador jogar um fornecedor contra o outro.

Grupo de fornecedores é uma ameaça de integração para frente. Nesse

caso, o poder de barganha do fornecedor tende a ser maior, uma vez que isso

representa uma ameaça de controle das atividades do comprador.

e) Poder de barganha dos compradores

O poder de barganha do comprador tende a aumentar à medida que se

verificar um ou mais dos fatores descritos a seguir:

Os compradores estão concentrados ou adquirem grandes volumes. A isso

se acrescenta o fato de que, quando os custos fixos do vendedor são altos, os

compradores ficam ainda mais poderosos.

Compram produtos que representam grande parte de seus custos ou

compras. Nesses casos, o comprador irá buscar preços mais favoráveis,

tornando-se, portanto, altamente sensível ao preço.

61

Compram produtos padronizados. Dada a baixa diferenciação, os

compradores podem sempre encontrar fornecedores alternativos mais

facilmente e jogar uma empresa contra a outra.

Enfrentam poucos custos de mudanças. Como visto, os custos de mudanças

prendem os compradores a determinados vendedores e, inversamente, baixos

custos de mudanças aumentam o poder dos compradores.

Conseguem lucros baixos. Quanto mais baixos forem os lucros dos

compradores, maior será a tendência na busca de baixos preços junto aos

vendedores.

Representam uma ameaça de integração pra trás. Quando os compradores

são parcialmente integrados ou representam uma ameaça real de integração

para trás, eles adquirem boa posição de negociação.

Produto da indústria não é importante para a qualidade dos produtos ou

serviços do comprador.

Comprador tem total informação. Um comprador bem informado sobre

demanda, preços reais do mercado e custos dos fornecedores adquire maior

poder para negociar do que quando a informação é deficiente.

62

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO

Neste capítulo, as análises são desenvolvidas com base nos dados obtidos

a partir das referências empíricas dadas em cada uma das cinco forças do modelo

de PORTER (1998). O ponto de partida é uma apresentação da configuração

conjuntural do setor de sementes no período de 1996 a 1998 - a qual reflete o

emprego das inovações da biotecnologia - com o exame dos fatores que

determinam a intensidade da rivalidade dos concorrentes da indústria de

sementes.

4.1. Intensidade da rivalidade entre as empresas existentes

O mercado tem se concentrado27

em praticamente todos os setores da

economia global. Essa tendência de concentração corporativa vem, na verdade,

ocorrendo há tempos, mas tem sido mais intensa em anos mais recentes. Segundo

pesquisa realizada pela consultoria Price Waterhouse e Coopers, citados por

LEME e SOUZA (2000), 3.276 transações comerciais envolveram atos de

27 Para se ter dimensão do avanço de investimentos extrafronteiras, pode-se avaliar o nível de

investimentos estrangeiros diretos (IEDs), tendo em vista ser uma forma de medida da globalização

econômica. De acordo com o Informe Mundial de Investimentos da UNCTAD, citado por RAFI

(2000b), os investimentos das corporações transnacionais no estrangeiro alcançaram a cifra recorde de

440 bilhões de dólares em 1998. Ademais, essas empresas são responsáveis por cerca de dois terços

do comércio mundial, sendo que as fusões e aquisições por meio de fronteiras alcançaram 58% de

todo IED em 1997.

63

concentração no Brasil, divulgadas pela imprensa ao longo da década de 90. A

conseqüência dessas ações foi justamente a elevação da concentração de capital,

fator determinante para dar poder a determinadas indústrias da cadeia

agroindustrial. A Figura 3 permite visualizar o grau de concentração do

agronegócio no Brasil, num paralelo à tendência em escala global. Nos setores

que compõem o agronegócio, a concentração também tem sido constante. As

fusões e aquisições que envolvem empresas diretamente relacionadas com

diversos sistemas agroindustriais têm alcançado valores bastante elevados.

Fonte: LEME e SOUZA (2000).

Figura 3 - Participação no mercado das quatro maiores empresas no Brasil, por

segmento, em 1999, em %.

64

Boa parte desses números tem a contribuição direta das empresas que

formam a “indústria da ciência da vida” e dominam a pesquisa, a produção e a

comercialização de produtos agrícolas, alimentícios e farmacêuticos. Numa

definição considerada pela RAFI (2000b) como “um tanto vaga”, pode-se dizer

que esses gigantes genéticos incluem as transnacionais que dominam os avanços

tecnológicos presentes em pesticidas, sementes, produtos farmacêuticos,

alimentos e produtos veterinários. Um ponto comum de suas inovações é que

grande parte delas é proveniente de pesquisas em biotecnologia, contrariando os

que pensam haver grande distância entre tais setores.

Ao se analisarem quais são as 10 maiores companhias de pesticidas,

sementes, produtos farmacêuticos e veterinários e compará-las com as grandes

empresas que mais investem em biotecnologia e P&D, nota-se que são as

mesmas. São elas a DuPont, Novartis, AstraZeneca, Monsanto, Dow e Aventis,

dentre outras, que, além de serem líderes em biotecnologia e em P&D e deterem

maior número de patentes, também têm em seu poder os maiores números em

investimentos na área de genoma e pesquisas que exploram o seqüenciamento de

genes. Por estarem consolidadas, possuem bastante poder de controle nos setores

de atuação.

Mas as similaridades que as aproximam não são apenas coincidências,

pelo contrário, devem-se à investida estratégica da indústria de agroquímicos,

cuja principal fonte de retornos vem dos pesticidas, em direção à de sementes.

A queda nas vendas de pesticidas nos países de origem obrigava as

indústrias a orientarem sua produção para a exportação, razão por que seguiram

em direção ao Sul. No entanto, mesmo que esses mercados estivessem em

expansão, os retornos declinavam, pois resultavam de patentes que já expiravam.

Ademais, possíveis retornos provenientes da venda de pesticidas desenvolvidos

para a agricultura própria do Sul não justificam os gastos em pesquisa, em

desenvolvimento e no processo regulador que o cerca.

Assim, a reorientação da produção para o Sul foi parte da estratégia das

TNCs em assegurar o controle do mercado. Países como China, Índia e Brasil,

com baixo custo de mão-de-obra e pouca capacidade técnica, poderiam tornar-se,

65

na visão daquelas, grandes centros de produção e consumo. Mediante aquisições

e fusões, as TNCs produtoras de pesticidas partiram em busca do controle

daqueles mercados nacionais. Mesmo indústrias como a Mitsu, da Índia, que

adquiriu capacidade suficiente para competir na produção e exportação de

piretróides com a Aventis, acabaram tendo 51% de seu capital adquirido por esta

empresa, em março de 1999 (KUYEK, 2000).

As fusões e aquisições na indústria de pesticida iniciaram-se na década

de 70, acentuaram-se nos anos 80 e atingiram o ápice na década de 90. Em 1996,

a Ciba-Geigy e a Sandoz ultrapassaram todas as previsões de alianças entre as

empresas de pesticidas e criaram a Novartis. Em 1998, Rhône-Poulenc e AgrEvo

formaram a Aventis, que se tornaria líder desse mercado. Mas, pouco menos de

um ano depois, ela deixaria seu posto, quando a Novartis e a Zeneca anunciaram

fusão e a formação da Syngenta, com vendas de, aproximadamente, US$ 8

bilhões (KUYEK, 2000).

Essa urgência de fusões e aquisições foi fortemente influenciada pela

indústria de alimentos. Os processadores de alimentos e os varejistas

aumentavam seu poder sobre a cadeia agroalimentar. Grandes companhias, como

a Cargill, a Phillip Morris e a Nestlé, alcançaram vendas de US$ 50 bilhões e,

numa posição próxima à de um monopólio em seu mercado, conseguiram poder

suficiente para ditar preços, termos e condições em que as colheitas deveriam

crescer. Os impactos nos agricultores foram grandes. Por exemplo, três

companhias de cereais - Kelogg‟s, Quaker Oats e General Mills - são 500 vezes

mais lucrativas que os produtores agrícolas e obtêm um retorno médio de 147%,

comparado aos 0,3% dos agricultores.

Desde 1992, havia pressões para que os preços dos pesticidas fossem

menores, o que levava a menos esforços em inovações. A direção deveria ser

guiada por uma mentalidade de commodity, com menores custos possíveis.

Assim, todas as TNCs começaram a diminuir seus gastos em P&D relacionados

com pesticidas. A Novartis chegou a anunciar que reduziria o número de novos

pesticidas, introduzidos por ano, para 1. Outro eficiente meio para se reduzirem

os custos em P&D era a fusão com outros competidores. Assegurando maiores

66

participações de mercado, as TNCs reduziriam as pressões para o

desenvolvimento de novos produtos.

Assim, o caminho trilhado pelas TNCs agroquímicas visou completa

redefinição, agora como “indústrias da ciência da vida”, baseando suas pesquisas

em biologia e engenharia genética. Nesse esforço, começaram a migrar mais

decisivamente para os setores agrícolas e farmacêuticos, sendo comum a busca

pela integração vertical. Com vistas em atingir os dois extremos, iniciaram a

aquisição de companhias de sementes e estabeleceram alianças estratégicas com

a indústria de alimentos.

A estrutura atual da indústria de sementes pode ser percebida nas

palavras de KUYEK (2000):

a mais visível manifestação da integração vertical que está acontecendo no

sistema alimentar é a aquisição da indústria de sementes pela indústria de

pesticida e a subseqüente formação de oligopólios em vários setores do mercado de sementes. (...) A aquisição da indústria de sementes é um elemento

central das estratégias das TNCs de pesticidas para retirar mais renda e um

sistema alimentar já bastante explorado nos dois extremos - tanto para fazendeiros quanto para os consumidores.

KUYEK (2000) ainda afirmou que os resultados desses esforços irão

depender do sucesso dessas indústrias no mundo da biotecnologia. Enquanto em

outras indústrias ainda é difícil levar a biotecnologia até o mercado, no caso da

biotecnologia, em nível agrícola, este canal com o mercado é também facilmente

estabelecido pela semente. Nesse sentido, as companhias de biotecnologia

agrícola precisam ter acesso às sementes, seja na sua criação (desenvolvimento),

seja na aquisição ou fusão de alguma empresa de sementes. No entanto, dada a

dominação que a indústria de agroquímicos exerce sobre a indústria de sementes,

não seria de estranhar que a grande maioria das aplicações biotecnológicas

associe as sementes aos pesticidas. Um caso clássico é o Sistema Roundup

Ready, da Monsanto, seguido por outras companhias que dispõem de sementes

tolerantes a herbicidas ou mesmo por meio da autorização daquela empresa.

A formação da “indústria da ciência da vida” acaba por unir setores

anteriormente desconectados, mas que passam a representar uma força

estratégica de grandes dimensões. Para melhor compreender como indústrias

67

aparentemente distantes têm traços comuns em seus negócios, recorre-se às

palavras de um Diretor Executivo da Novartis, Daniel Vasella:

O denominador comum em nosso negócio é a biologia. A investigação e a

tecnologia são aplicadas com o objetivo de descobrir, desenvolver e vender

produtos que afetam sistemas biológicos, quer sejam humanos, plantas ou animais (RAFI, 2000b).

28

Apesar de as áreas que envolvem a “indústria da ciência da vida”

parecerem distantes ente si, algumas proximidades fundamentais para o êxito dos

investimentos podem ser percebidas nas palavras do Presidente da Zeneca, David

Barnes:

Os mercados agrícolas e médicos são muito diferentes, mas em nível de

pesquisa estão se aproximando cada vez mais. Tecnologia tais como o

sequenciamento genético, a química combinatória e o “screening” de alta precisão são tão relevantes para a agricultura como o são para a saúde

humana29

(RAFI, 2000b).

Assim, as antigas fronteiras existentes entre indústrias, como

farmacêutica, biotecnológica, agrícola, química e de cosméticos, tendem a

desaparecer. Sob as novas estratégias que envolvem a “indústria da ciência da

vida”, as transnacionais acabam por utilizar tecnologias complementares para se

transformarem nos atores dominantes dos diferentes setores industriais. Muitas

empresas têm, inclusive, despendido esforços para entrarem na indústria da

biologia e em suas recentes descobertas, casos de companhias petrolíferas,

químico industriais, farmacêuticas, etc.

4.1.1. Fusões e aquisições

A despeito de terem participações em várias áreas, nas mais diferentes

oportunidades comercias, aqui serão explorados os dados que se referem à

indústria de sementes. É importante ressaltar a proximidade desta com o mercado

28 Tradução literal para “El denominador común en nuestro negocio es la biología. La investigación y la

tecnología son aplicadas con el fin de descubrir, desarrollar y vender productos que afectan sistemas biológicos, ya sean humanos, plantas o animales”.

29 Tradução literal para “Los mercados agrícolas y médicos son muy diferentes, pero a nivel de

investigación se están acercando cada vez más. Tecnologías tales como el secuenciamiento genético,

la química combinatoria y el screening de alta precisión son tan relevantes para la agricultura como lo

son para la salud humana”.

68

de agroquímicos, tendo em vista ser comum a venda de “pacotes” que conjugam

o uso conjunto da semente com determinado produto químico (casos do Sistema

Round-up Read, da Monsanto, e do Gene Traitor).

Há cerca de 20 anos existiam cerca de 7.000 instituições públicas e

privadas envolvidas na comercialização de sementes em todo o mundo.

Atualmente, este número está em cerca de 10 companhias que controlam,

aproximadamente, um terço do mercado mundial de sementes.

Naquela época, nenhuma companhia ocupava percentual significativo do

mercado global de sementes30

(MULTINATIONAL MONITOR, 2000), situação

que se alteraria à medida que constantes fusões e aquisições levaram o mercado

de sementes e agroquímicos a alto grau de concentração.

No início de 1997, a Monsanto (EUA) adquiriu a Holdens Foundation

Seeds, uma grande empresa do mercado de sementes híbridas de milho, por

US$ 1,2 bilhão. Cerca de 25 a 30% dos hectares plantados com milho nos EUA

eram baseados em germoplasma desenvolvidos pela Holdens. Combinado com

os 40% que já havia adquirido da Dekalb Genetics (maior companhia de

sementes da época), ela acabou se tornando o maior ator comercial da indústria

de sementes de milho. No final do mesmo ano, a Monsanto, mediante aquisição

da empresa brasileira de sementes Agroceres, adquiriu a maior base de

germoplasma tropical, o que deu a ela cerca de 30% de participação no mercado

brasileiro de sementes. Segundo o analista Dain Bosworth, citado por RAFI

(2000e), o objetivo da Monsanto é levar suas sementes da bioengenharia para,

pelo menos, 40 milhões de hectares de milho, mediante aquisição das maiores

companhias desse mercado.

30 É interessante notar que essa concentração não se restringe à indústria de sementes, mas também a

outros setores que, de alguma forma, se relacionam com a formação da “indústria da ciência da vida”.

Nesse sentido, pode-se perceber que, no final da década 70, eram 65 as companhias que desenvolviam

e comercializavam os químicos destinados às lavouras - herbicidas, inseticidas, nematicidas etc. - e hoje este mercado se restringe a nove empresas que controlam cerca de 91% deste mercado global.

Ainda no fim dos anos 70, as 20 maiores empresas detinham cerca de 5% do mercado farmacêutico

mundial. Os dados de hoje mostram que elas detêm 40% desse mercado. Ademais, naquela época nem

se prestava muita atenção ao mercado de produtos veterinários, no entanto, as 10 maiores empresas do

setor controlam, atualmente, cerca de 60% deste (MULTINATIONAL MONITOR, 2000).

69

Ainda em 1997, a DuPont (EUA) adquiriu 20% da Pioneer Hi-Bred, a

maior empresa mundial de sementes, por US$ 1,7 bilhão. As duas companhias

iriam investir US$ 400 milhões em pesquisa agrícola no ano de 1998 e

formariam uma nova empresa, a Optimun Quality Grains. No mesmo ano em que

comprou a Pioneer, a DuPont também acabou adquirindo a Protein Technologies

International, da Ralston Purina, por US$ 1,5 bilhão (RAFI, 2000e).

A AgriBiotech (EUA), para chegar aos 45% do mercado de sementes de

forragem e gramíneas nos EUA, em torno do ano de 2000, chegou à marca de 14

aquisições de companhias de sementes desde sua fundação, em 1995. Assim,

suas vendas anuais saltaram de US$ 4,7 milhões, em 1995, para US$ 230

milhões, no ano de 199731

(RAFI, 2000e).

Na busca de forte posição no mercado de sementes, a lista de fusões e,

principalmente, de aquisições contabiliza inúmeras operações. A AgrEvo, que,

em 1996, era líder do ranking agroquímico, tendo em vista a aquisição da Plant

Genetic Systems por US$ 725 milhões, tentou adquirir a Holdens, mas acabou

perdendo a batalha para sua concorrente Monsanto, como visto anteriormente

(RAFI, 2000e).

A Novartis é outra presença constante na lista das 10 maiores

companhias tanto da indústria de sementes quanto da de agroquímicos. Uma de

suas aquisições de peso foi a compra da parte da Merck, responsável pelos

negócios agroquímicos, o que ajudou a reforçar a supremacia em pesticidas.

O mercado de atuação da “indústria da ciência da vida”, principalmente

em relação às indústrias de sementes e agroquímicos, tem características

oligopolísticas como as apontadas por CHESNAIS (1986:37), segundo o qual a

concorrência é encarniçada, ou, em suas palavras em tom de eufemismo, um

“espaço de rivalidade industrial”.

Os dados referentes aos mercados de sementes e agroquímicos serão

apresentados em tabelas sucessivas que abrangem os anos de 1996, 1997 e 1998.

31 Segundo a própria empresa, as aquisições implementadas não trariam resultados tão significativos sem

as mudanças feitas nas leis que versam sobre os direitos dos melhoristas e as leis de patentes, que

impuseram limites à possibilidade de os produtores rurais salvarem suas sementes para as safras

seguintes (RAFI, 2000e).

70

É importante notar que algumas empresas presentes num ano estão ausentes em

outros, conseqüência direta das fusões e, ou, das aquisições. Além disso, pode-se

perceber que, devido à grande intensidade das fusões e aquisições ocorridas em

1997, os números, do ano anterior para este, são bastante diferentes. Já em 1998,

os valores desses mercados não se alteraram tanto, pois já haviam chegado ao

novo patamar, apesar de a concentração ter continuado.

Em 1996, as 10 maiores empresas de sementes controlavam cerca de

40% de um mercado mundial avaliado em US$15 bilhões (Tabela 1). No

mercado agroquímico, a concentração era ainda maior, já que as 10 maiores

detinham, aproximadamente, 82% do mercado global, que era de US$ 30,5

bilhões (um valor 15% maior que as cifras de 1994). Nota-se, também, que a

Monsanto não aparece entre as 10 maiores empresas de sementes no ano de

1996, situação que viria a ser bem diferente no ano seguinte, quando ela parte, de

forma bastante agressiva, para aquisição e fusão de companhias de sementes

tanto nos EUA quanto em outros países.

Das empresas que constam na lista das 10 maiores do mercado de

sementes, apenas a Novartis também aparece como competidora da indústria de

agroquímicos, situação que começaria a mudar a partir de 1997 (Tabela 2).

No ano de 1997 (Tabela 2), o mercado de sementes teve considerável

expansão, passando de US$ 15 para US$ 23 bilhões. Acredita-se que esse

crescimento seja conseqüência do aumento da venda de outros ou novos

competidores, uma vez que, apesar de as vendas das 10 maiores companhias

também terem aumentado (de US$ 6,021 para US$ 6,933 bilhões), esse

incremento foi insuficiente para acompanhar o crescimento total do mercado.

Assim, de uma participação de 40% do mercado em 1996, essas empresas

passaram a ter, aproximadamente, 30%, relação que volta a ter a direção da

concentração já no ano de 1998. Tudo leva a crer que algumas empresas que

tenham se destacado acabaram sendo adquiridas por algumas das 10 maiores.

71

Tabela 1 - Ranking das 10 maiores empresas da indústria de sementes e agroquí-

micos no ano de 1996 (em milhões de dólares)

Indústria de sementes Indústria de agroquímicos

Empresas Vendas Empresas Vendas

Pioneer Hi-Bred Intl (EUA) 1.721 Novartis (Suíça) 4.511

Novartis (Suíça) 991 Monsanto (EUA) 2.997 Limagrain (França) 552 Zeneca (Grã Bretanha) 2.638

Advanta (Holanda) 493 AgrEvo (Alemanha) 2.475

Group Pulsar (México) 400 DuPont (EUA) 2.472 Sakata (Japão) 403 Bayer (Alemanha) 2.350

Takii (Japão) 396 Rhone-Poulenc (França) 2.203

Dekalb Plant Genetics (EUA) 388 Dow Agrosciences (EUA) 2.010

KWS (Alemanha) 377 American Home Products (EUA) 1.989 Cargill (EUA) 300 BASF (Alemanha) 1.536

Total 6.021 Total 25.181

Total do mercado em 1996 15.000 Total do mercado em 1996 30.500

Fonte: RAFI (2000a).

Tabela 2 - Ranking das 10 maiores empresas da indústria de sementes e agroquí-

micos no ano de 1997 (em milhões de dólares)

Indústria de sementes Indústria de agroquímicos

Empresas Vendas Empresas Vendas

DuPont/Pioneer Hi-Bred Intl (EUA) 1.784 Aventis Group (França) 4.554

Monsanto (EUA) 1.320 Novartis (Suíça) 4.199

Novartis (Suíça) 928 Monsanto (EUA) 3.126

Groupe Limagrain (França) 686 Zeneca/Astra (Reino Unido/Suécia) 2.674

Advanta (Reino Unido e Holanda) 437 DuPont (EUA) 2.518

AgriBiotech, Inc. (EUA) 425 Bayer (Alemanha) 2.254

Grupo Pulsar/Seminis/ELM (Méx.) 375 Dow Agrosciences (EUA) 2.200

Sakata (Japão) 349 American Home Products (EUA) 2.119

KWS (Alemanha) 329 BASF (Alemanha) 1.855 Takii (Japão) 300 Sumimoto (Japão) 717

Total 6.933 Total 26.216

Total do mercado em 1997 23.000 Total do mercado em 1997 30.900

Fonte: RAFI (2000a).

72

Muitas fusões e aquisições foram implementadas no ano de 1997 (Tabela

2), fato que levou à troca de posições no ranking. Em primeiro lugar, no ranking

de sementes começa a aparecer a DuPont, tendo em vista a aquisição de 29% da

Pioneer. Em segundo, tomando a posição da Novartis, que cai para terceiro

posto, aparece a Monsanto, empresa que não figurava entre as 10 maiores no ano

anterior, mas que, em razão das constantes aquisições de companhias de

sementes e biotecnologia agrícola que efetuou a partir de 1996, equivalente a

US$ 8 bilhões até o início do ano de 1998, chegou a este posto. Como citado

anteriormente, em 1997 ela adquiriu a Holdens e, logo depois, a Dekalb, depois

de já ter adquirido a Asgrow, em 1996.

A partir de 1997 (Tabela 2), o mercado de sementes passa a ter forte

domínio das três primeiras ocupantes do ranking, dentro de um mercado que já

era extremamente dominado pelas 10 maiores. A venda anual dessas três

empresas em conjunto (US$ 4 bilhões) passa a representar um valor 38%

superior à venda total das sete demais (US$ 2,9 bilhões). Essas três maiores

empresas tinham, neste ano, 17,5% do mercado global de sementes.

O poder desses três grandes competidores da indústria de sementes pode

ser percebido pela presença paralela destas na indústria de agroquímicos. Nota-se

que a Monsanto e a Novartis, que, na indústria de sementes, ocupam o segundo e

o terceiro lugar, respectivamente, trocam de posição na indústria de

agroquímicos, já que a líder em sementes também está presente no mercado de

agroquímicos, mesmo que num posição um pouco inferior, em quinto lugar.

Essa situação não se alteraria muito em 1998 (Tabela 3), ocasião em que

a Monsanto e a Novartis ocupavam os mesmos postos nas duas indústrias. A

diferença foi a subida da DuPont para o quarto posto.

Em 1998, tanto o mercado de sementes quanto o de agroquímicos

mantiveram seus valores globais do ano anterior (pequena alteração ocorreu no

setor agroquímico, que passou de US$ 30,9 para US$ 31 bilhões), assim como a

posição dos três maiores atores, DuPont, Monsanto e Novartis. O que aumentou

foram as vendas das 10 maiores empresas nesses dois setores, manifestando-se,

73

Tabela 3 - Ranking das 10 maiores empresas da indústria de sementes e agroquí-

micos no ano de 1998 (em milhões de dólares)

Indústria de sementes Indústria de agroquímicos

Empresas Vendas Empresas Vendas

DuPont 1.835 Aventis 4.676

Monsanto 1.800 Novartis 4.152 Novartis 1.000 Monsanto 4.032

Groupe Limagrain 733 DuPont 3.156

Savia S.A. de C.V. 428 AstraZeneca 2.897 AstraZeneca 412 Bayer 2.273

KWS 370 American Home Products 2.194

AgriBiotech, Inc. 370 Dow 2.132

Sakata 349 BASF 1.945 Takii 300 Makhteschim-Agan 801

Total 7.597 Total 28.258

Total do mercado em 1998 23.000 Total do mercado em 1998 31.000

Fonte: RAFI (2000a).

novamente, tendência de concentração nessas indústrias. Nesse sentido, pode-se

observar que, em 1998, a venda das 10 maiores companhias de sementes passou

a representar 33% do mercado mundial (contra 30% em 1997), um sinal de

aumento na concentração no setor. Ademais, as vendas das três maiores empresas

também passou para US$ 4,6 bilhões, representando um valor 56% maior que as

vendas das outras sete empresas de sementes somadas e não mais os 38% do ano

anterior. Nesse mesmo ano, o poder das três maiores também foi maior,

chegando a ser de 20% do mercado global (contra 15,5% em 1997).

A indústria de agroquímicos seguiu essa tendência de concentração, mas

num nível muito radical. As 10 maiores obtiveram, neste ano, aproximadamente

91% do mercado mundial (contra 84,5% de 1997), sendo que somente as três

maiores detinham 41% deste (contra 38% de 1997).

Outra questão se refere à tendência da ação dessas empresas em direção

aos países do Sul. Como alternativa à tendência de estagnação na demanda em

74

seus países de origem, essas empresas norte-americanas e européias começaram a

dirigir suas estratégias de aquisição para outros grandes mercados de sementes.

Uma indicação disso é a compra, em 1997, da brasileira Sementes

Agroceres, pela Monsanto, já apontada anteriormente. Em julho de 1998, esta

mesma empresa também adquiriu a divisão internacional de sementes da Cargill,

quando a Monsanto começou a colocar em operação testes com sementes e

plantas em 24 países e a comercialização e distribuição para 51 países. Esses

fatos dobraram o potencial para aplicação de suas tecnologias de sementes. A

Monsanto chegou, assim, a controlar mais da metade do mercado de milho da

Argentina. No ano de 1998, a Dow Agrosciences adquiriu a Morgan Seeds,

segunda maior companhia de sementes de milho da Argentina. Neste mesmo

país, a Phytogen, onde a maioria das ações pertencia à Dow, acabou adquirindo o

maior programa de criação de sementes de algodão, localizado na província de

Chaco. Em 1998, a mexicana do agribusiness, chamada Empresas La Moderna

(ELM), comprou duas empresas sul coreanas de sementes de vegetais e a indiana

Nath Sluis, empresa especializada em biotecnologia agrícola.

4.1.2. Organismos geneticamente modificados (OGMs)

Os campos experimentais dos transgênicos estão se alastrando pelo

mundo, mesmo diante das incertezas que rondam a produção e o consumo dos

alimentos deles provenientes (aí inclusos os derivados e carnes de animais que se

alimentam de plantas transgênicas), tanto para o meio ambiente quanto para a

saúde humana e animal.

Somente durante o período que se estendeu do início de 1986 até o fim

de 1997, foram realizados 25.000 testes de campo com cultivos transgênicos,

num total de 45 países. Destes 25.000 testes, 15.000 foram realizados durante os

10 primeiros anos, e o restante, nos dois últimos anos. Em 1998, informa a RAFI

(2000b), quase 28 milhões de hectares foram cultivados com variedades

geneticamente modificadas em todo o mundo, tendo a soja e o milho

transgênicos representado 52% e 30% do total das áreas de sementes

75

transgênicas, respectivamente. O caráter dominante empregado nessas culturas

foi a tolerância a herbicidas (71% dos casos) e a insetos (28%).

Segundo informação da Federação Internacional de Sementes, o mercado

mundial de sementes modificadas geneticamente alcançará US$ 2 bilhões por

volta do ano de 2000 e deverá triplicar em 2005. A Federação também prevê que,

por volta de 2010, o mercado mundial de sementes modificadas geneticamente

irá chegar a US$ 20 bilhões (RAFI, 2000b). A Tabela 4 indica a área total

cultivada com transgênicos para plantio comercial.

Tabela 4 - Área de cultivo de transgênicos em plantio comercial, por países, nos

anos de 1997 e 1998 (em milhões de hectares)

País 1997 1998

Estados Unidos 8.100 20.500

Argentina 1.400 4.300

Canadá 1.300 2.800

Austrália 100 100

México 100 100

Espanha 0 100

França 0 100

África do Sul 0 100

Total 11.000 28.100

Fonte: RAFI (2000a).

Observa-se que, de um ano para outro, a área cultivada com sementes

geneticamente modificadas mais que dobrou. Na realidade, o aumento foi de

aproximadamente 155%, sendo que os EUA concentram grande parte desta área,

com cerca de 73% do total em nível mundial.

76

No mercado norte-americano, a quantidade de hectares cultivados não

representa o dado de maior impacto, mas sim o fato de que ele está

completamente dominado pelos chamados “gigantes genéticos”. Segundo a

Sparks Companies, citada por RAFI (2000b), apenas três empresas cobrem todo

este mercado, sendo que duas delas, a Monsanto e a Novartis, circulam também

entre as 10 maiores do setor de sementes em nível mundial. Assim, este mercado

é controlado de forma extremamente dominadora pela Monsanto, com 88% de

participação, seguida pela Aventis, empresa líder do setor agroquímico, com 8%,

e pela Novartis, com apenas 4%. Apesar de alguns competidores, como a DuPont

e a American Home Products, começarem a produzir novos cultivares

transgênicos, o mercado parece ser controlado por uma elite extremamente

reduzida de transnacionais.

Os dados da estrutura da indústria de sementes, considerando-se o

emprego das inovações biotecnológicas, levam a crer que a concorrência do setor

de sementes acompanha o que já vem ocorrendo em outros setores, ou seja, ela

não mais se restringe à busca do desenvolvimento de novos produtos em virtude

da ameaça de novos participantes do mercado e seus produtos substitutos ou

similares. Dada a tendência de concentração do mercado de sementes, a ação dos

maiores competidores tem sido a aquisição ou fusão, num ambiente onde a

rivalidade acaba se restringindo, cada vez mais, aos grandes “players”.

Ademais, mesmo que produzam praticamente uma commodity, a

biotecnologia tem permitido que essas empresas diferenciem seus produtos

(sementes). Dessa maneira, essa indústria apresenta um perfil cada vez mais

distante do oligopólio puro, direcionado-se para a forma de um oligopólio

diferenciado. O primeiro consiste em algumas empresas que fabricam,

essencialmente, o mesmo produto tipo commodity (nesse caso, a semente). Os

concorrentes oferecem serviços similares e a única maneira de obter vantagens é

reduzir custos. Já no oligopólio diferenciado as empresas fabricam produtos

parcialmente diferenciados, e a diferenciação pode ocorrer em qualidade,

características, estilos ou serviços. Essa mudança é importante para compreender

os impactos que a biotecnologia traz na indústria de sementes.

77

Nota-se, ainda, que os movimentos competitivos de determinada

empresa provocam efeitos em seus concorrentes. Segundo PORTER (1998), esse

padrão de ação e reação pode levar ao aprimoramento de toda a indústria. A

restrição, nesse ponto, refere-se ao fato de esse aprimoramento estar muito

concentrado aos grandes competidores dessa indústria. São elas também que

travam batalhas de publicidade para expandir a demanda e reservam grandes

investimentos em pesquisa para poder diferenciar seus produtos.

Pelo fato de a indústria como um todo estar caminhando a passos largos

para a biotecnologia e os produtos daí resultantes estarem sendo questionados

sobre sua segurança (para alimentação humana e para meio ambiente), as ações

publicitárias acabam promovendo o mercado para todos os competidores, uma

vez que estão direcionadas para sensibilizar favoravelmente a opinião pública

quanto aos benefícios da aplicação dessa tecnologia.

Assim, um dos traços mais marcantes da indústria de sementes é seu

elevado grau de concentração, visto que um número cada vez menor de grandes

companhias tende a exercer seu domínio sobre todo o mercado. Mesmo sendo

expressivo o número de empresas que concorrem neste setor, parte destas

pertence às grandes companhias de sementes. Aquelas que não são subsidiárias

de uma empresa maior dificilmente podem ser consideradas como uma

concorrente equilibrada em frente às 10 maiores. Sabe-se que a inovação

tecnológica, descoberta por uma pequena empresa deste setor, pode garantir uma

patente que lhe permita atingir uma posição satisfatória para concorrer nesse

mercado. Entretanto, como foi comum na década passada, ela logo estará sendo

assediada e adquirida por alguma grande empresa. Assim, mesmo havendo

grande número de empresas no setor, a concorrência fica restrita às TNCs, campo

no qual a concorrência tende a ser muito grande, principalmente entre as 10

maiores empresas do setor.

Segundo PORTER (1998), quanto maior for o número de concorrentes e

o equilíbrio entre eles, maior será a rivalidade da indústria. No caso da indústria

de sementes, o número de concorrentes é grande, o que tende a aumentar a

rivalidade, mesmo que esta seja mais intensa entre seus grandes atores. O

78

equilíbrio também é outra marca dessa indústria, sintomas de que a rivalidade

tende a ser expressiva.

O elevado número de patentes requeridas pelas grandes empresas do

setor, na sua maioria, que favorece a diferenciação de seus produtos, dá a

dimensão da intensidade da rivalidade entre elas.

A maioria das patentes de milho, por exemplo, foi solicitada pelas

empresas norte-americanas presentes na lista das 10 maiores companhias de

sementes e, ou, agroquímicos. Elas também são responsáveis pela metade das

333 patentes biotecnológicas concedidas às culturas de milho, que podem ser

cultivadas em todo o mundo. Nota-se também que as três maiores, DuPont-

Pioneer, Monsanto e Novartis, figuram tanto no mercado de sementes quanto no

de agroquímicos. Outros indicadores da grande concentração nos pedidos de

patentes são dados por LEITE (2000:69), a seguir:

Dos 56 produtos transgênicos aprovados para o plantio comercial nos Estados

Unidos em 1998, 33 eram propriedade intelectual de apenas quatro companhias (Monsanto, Aventis, Novartis e DuPont).

A Tabela 5 mostra que, em 1998, 59% das patentes requeridas e obtidas

pertenciam a grandes companhias e que, seguindo as tradições norte-americanas

de forte apoio do Estado ao desenvolvimento deste mercado, o departamento de

agricultura e duas universidades também figuram entre os mais importantes

detentores de patentes.

O crescimento lento de uma indústria resulta na maior concorrência entre

seus competidores. No entanto, mesmo que, de 1997 para 1998, o crescimento

tenha sido quase insignificante, as previsões apontam que haverá crescimento

desse mercado à medida que novas descobertas vão sendo passíveis de aplicação

comercial. Tomando como exemplo os negócios com transgênicos, o faturamento

deve passar de US$ 3 bilhões, em 2000, para US$ 25 bilhões, em 2010

(ALFREDO, 1999), o que demonstra o quanto esse mercado pode ser

impulsionado pelos avanços biotecnológicos.

79

Tabela 5 - Os maiores proprietários mundiais de patentes biotecnológicas de mi-

lho (1998)

Empresa N.o de patentes

Du-Pont/Pioneer (USA) 55

Novartis (Switzerland) 38

Monsanto (USA) 25 Advanta (UK, Netherlands) 17

Aventis (France) 14

Dow Agrosciences (USA) 08 Japan Tobacco (Japan) 07

U.S. Department of Agriculture (USA) 06

Gene-Shears (Australia) 06 Cornell University (USA) 05

Max-Planck Institute (Germany) 05

PlantTech – Biotech 05

University of Florida (USA) 05

Total de patentes dos 13 maiores grupos industriais 196

Total de patentes 333

Fonte: BIOTHAI, GRAIN, MASIPAG and PAN Indonesia. Whose agenda? The

corporate takeover of corn in SE Asia. August 1999. [online]. Disponível

na Internet via WWW. URL: http://www.grain.org/publications/reports/

takeover.htm.

80

Por isso, o crescimento desse mercado pode ser associado à

diferenciação de seus produtos, que, antes da biotecnologia, tinham fortes

características de um mercado de commodities. Segundo a Food and Agriculture

Organization (FAO), a biotecnologia está crescentemente direcionada para o

mercado e suas demandas, e a maioria de seus produtos resulta de investimentos

em P&D, realizados pelo setor privado em países desenvolvidos. Segundo a FAO

(2000), pesquisas de mercado são fundamentais para definir em que culturas os

investimentos devem ser aplicados. Além disso, os interesses comerciais estão

longe de refletir preocupação social, que deveria ser básica no setor público de

pesquisa.

Os avanços da biotecnologia criam oportunidades para empresas que

investem em pesquisa, a qual resulta na possibilidade de diferenciação dos

produtos. Nesse sentido, a pesquisa em biotecnologia parece estar caminhando,

principalmente por estar sendo conduzida essencialmente pelo setor privado.

Percebe-se, então, que esta é uma indústria de grande rivalidade, visto

que conta com muitos competidores em todo o mundo. A alta concentração e o

domínio do mercado por poucas empresas acabam impondo certa disciplina e

fazendo com que elas desempenhem papel coordenador na indústria.

A existência de muitas e pequenas empresas acaba levando-as a achar

que podem fazer movimentos sem serem notadas. Mas o que tem ocorrido é que,

assim que começam a se destacar, acabam sendo adquiridas pelas maiores. Nesse

movimento, a rivalidade, de certa forma, adquire um perfil mais negociado que

aquele próprio de um embate natural entre os concorrentes. Mesmo assim, os

grandes participantes rivalizam-se, diretamente, por fatias de mercados que

garantam demandas de seus produtos.

O poder concentrado nas mãos dos grandes atores dessa indústria acaba

imobilizando o perfil de sua concorrência. Como visto, de 1996 para 1997, houve

grande e rápido crescimento desta, o que poderia aliviar a rivalidade (um

crescimento proporcionado, inclusive, por outros competidores e não somente

pelas 10 maiores). No entanto, assim que esse mercado sofreu o boom de

crescimento, permitindo o surgimento de novos competidores, esses foram logo

81

absorvidos pelas grandes companhias da indústria. Assim, o mercado ficava

novamente concentrado. Apesar de tender ao rápido crescimento, acredita-se que

esse mercado manterá seu grau de rivalidade, tendo em vista a rapidez com que

ocorrem as fusões e aquisições. Isso significa que, mesmo que surjam novos

competidores, o que dissiparia a rivalidade, esses provavelmente serão adquiridos

pelas TNCs antes de chegarem a um porte expressivo.

Uma situação que, a princípio, tende a diminuir a rivalidade nessa

indústria é a crescente diferenciação que a biotecnologia tem permitido

implementar nas sementes. A Monsanto, por exemplo, desenvolveu o Sistema

Roundup Ready para a cultura da soja, o que lhe garantiu participação exclusiva

em um segmento de mercado.

A elevada barreira de saída dessa indústria é outro fator que contribui

para o aumento da rivalidade ente os concorrentes, principalmente por ser uma

indústria que tende ao crescimento. Além disso, é um setor de extrema

importância estratégica, cujas descobertas têm grandes aplicações em outros

setores industriais, o que está compreendido no conceito de “indústria da ciência

da vida”.

4.2. Ameaça de entrada de novos competidores

A estrutura de determinada indústria é afetada, diretamente, pela

capacidade advinda de novas empresas, com reflexos na rentabilidade dos

competidores existentes. Entretanto, entrar num novo mercado, principalmente

naqueles onde os competidores são de grande porte, não é tarefa fácil, tendo em

vista as inúmeras barreiras de entrada.

Tem sido freqüente a destinação de grandes volumes de investimentos

em P&D em resposta a um novo paradigma dos setores industriais, que

privilegiam a inovação como vantagem competitiva. Assim, o binômio inovação

tecnológica-competitividade passou a ter importância estratégica para a

participação no mercado internacional.

82

Como a indústria de sementes concorre numa arena de dimensões

globais, os investimentos em pesquisa que lhe garantam ofertas diferenciadas ao

mercado são uma busca constante. A despeito das incertezas inerentes a seus

resultados, esses investimentos têm sido crescentes, e, por mais que possam ser

incertos quando se chega a alguma aplicação comercial, a empresa tem em suas

mãos uma nova tecnologia a ser aplicada em seus processos de produção ou a

possibilidade de obtenção de novos recursos via royalties, eventualmente pagos

por transferências de tecnologia, licenças e contratos de assistência técnica, bem

como a oportunidade de a alta gerência explorar um posicionamento estratégico

para a empresa. A partir do momento em que a alta gerência institui uma gestão

própria da tecnologia por meio de investimentos sistemáticos em P&D, numa

estrutura que permite decisões autônomas para obtenção ou desenvolvimento de

tecnologia própria, são maiores as possibilidades de a empresa tornar-se cada vez

mais competitiva.

Os destino de grande parte dos investimentos em P&D realizados pela

indústria de sementes visou, historicamente, o melhoramento de plantas. Como

visto no capítulo 2, estes se tornaram mais sistemáticos à medida que se tornou

possível recuperar o investimento realizado, quando se passou a obrigar os

produtores rurais a recorrerem ao mercado, a cada safra. Esse ponto inicial,

representado pelo desenvolvimento da semente híbrida, foi decisivo para dar

impulso à pesquisa privada.

Seguindo a tendência iniciada pelo híbrido, chegou-se à era da

biotecnologia, que possibilitou dar às sementes características que resguardam

ainda mais as possibilidades de retornos dos investimentos pelas empresas do

setor. Os genes terminator e traitor, por exemplo, possibilitam que as empresas

assegurem vendas constantes de seus produtos.

Analisando-se a indústria de sementes em relação à possibilidade de

novos entrantes, podem-se definir melhor os traços de sua estrutura. O primeiro

fator é a economia de escala, de grande importância para os participantes desse

setor, tendo em vista a relação inversa entre o volume absoluto da produção de

sementes e seu custo. Como as principais empresas desse setor possuem recursos

83

suficientes para realizarem investimentos em proporções superiores que os

demais competidores, a tendência segue em direção à concentração de mercado.

Esses investimentos, no entanto, não se restringem à capacidade de suas unidades

de produção, mas também aos seus gastos em propaganda, em P&D, em recursos

humanos altamente qualificados etc., ficando em patamares difíceis de serem

atingidos por empresas com menores recursos.

Contribuem também, como barreira de entrada nesse mercado, as

economias de escalas obtidas pelas TNCs, em razão da integração vertical

(produção e distribuição), situação comum que resulta das inúmeras e constantes

fusões e aquisições que realizam. Por exemplo, o grupo francês Limagrain tinha,

em 1998, 49 subsidiárias em todo o mundo. A norte-americana AgriBiotech, Inc.

(detentora de, aproximadamente, 45% do mercado de sementes de forragem e

grama) completou 29 aquisições, de 1995 a 1998, empresa que tinha, em 1998,

33 subsidiárias. A Monsanto contabilizava, neste ano, 21 subsidiárias no mundo

e suas vendas foram maiores que o dobro das efetuadas pela Limagrain. Já o

grupo mexicano Pulsar, Seminis, Empresas La Moderna tinha 12 subsidiárias, e a

alemã KWS, 27. A situação leva um grande número de clientes a recorrer,

obrigatoriamente, a uma dessas empresas para compra de sementes (RAFI,

2000f).

Outro importante elemento, a diferenciação de produtos, aumenta a

barreira de entrada de novos competidores no setor de sementes. Como visto, a

diferenciação foi um elemento decisivo para definir o mercado de sementes como

um oligopólio diferenciado e não como um oligopólio puro. Pela diferenciação, a

empresa tem sua marca identificada no mercado consumidor, o que acaba

desenvolvendo um sentimento de lealdade em seus clientes. Para conquistar a

fidelidade dos consumidores, a empresa divulga seu produto como aquele que foi

desenvolvido para os problemas e necessidades próprias daqueles. Nesse sentido,

pode-se citar o Sistema Roundup Ready Soja, da norte-americana Monsanto,

assim descrito por ela:

84

O Sistema Roundup Ready Soja, desenvolvido pela Monsanto do Brasil, oferece

excelente controle de plantas daninhas para a cultura da soja, baseada na

utilização conjunta da soja Roundup Ready e do herbicida Roundup Ready. É o

mais completo e revolucionário sistema de controle de plantas daninhas da cultura da soja. Este sistema inclui i herbicida Roundup Ready aplicado na pós-

emergência das variedades de soja geneticamente modificadas Roundup Ready,

tolerantes ao herbicida. A utilização conjunta das sementes e do herbicida possibilita um controle supereficiente de plantas daninhas (MONSANTO, 2000).

A empresa aponta, entre as vantagens e benefícios desse sistema, a

simplicidade de apenas uma aplicação, sem nenhuma necessidade de misturas; a

flexibilidade da aplicação, independente do estágio das plantas daninhas e da

cultura, com menor dependência das condições climáticas; e a certeza dos

resultados, uma vez que controla as ervas daninhas mais difíceis. Diferencia seu

produto dos demais quando também aponta que o uso desse sistema otimiza a

produção, permite que se ganhe tempo para o agricultor e se reduzam as

impurezas no grão, que se obtenham custos operacionais e uso de combustíveis

etc. (MONSANTO, 2000).

Outras aplicações da biotecnologia, que permitem às empresas

diferenciar seus produtos, foram aprovadas para serem comercializadas nos

EUA. Uma delas é a canola alterada para gerar óleo com alta concentração de

lauric acid, que expande seu uso para sopas e outros produtos alimentares,

desenvolvida pela Monsanto/Calgene. A Monsanto também desenvolveu um

tomate com maior tempo de prateleira, o que é comercialmente interessante para

toda a cadeia agroalimentar. Além dessas, outras sementes com inúmeras

alterações genéticas irão produzir plantas cada vez mais diferenciadas, com

conseqüências que se expandem para toda a cadeia. Ademais, a grande maioria

das diferenciações diz respeito à resistência a alguma praga ou doença nas mais

diversas culturas (LEADING..., 2000).

Acredita-se que a biotecnologia, à medida que permite a constante

diferenciação das sementes, crie barreiras para a entrada de novos competidores,

que são forçados a efetuarem pesadas despesas para romper a lealdade já obtida

pelos competidores atuais. As empresas que pretendem entrar nessa indústria

devem ser capazes de arcar com os prejuízos próprios de sua defasagem em nível

85

de pesquisa, pois é ele o responsável pelos avanços biotecnológicos patenteados

pelas grandes competidoras.

A necessidade de capital é outra barreira de entrada decisiva nessa

indústria e está diretamente relacionada com o propulsor das diferenciações, ou

seja, com o desenvolvimento de pesquisas. Esse é um ponto fundamental para

impedir novos entrantes, particularmente por existirem situações em que parte do

capital se refere a investimentos a fundo perdido. Assim, os elevados

investimentos realizados pelos grandes atores desse mercado agem como grandes

inibidores, como limitadores do número de pretendentes à entrada.

As empresas que se destacam no mercado de sementes pela diferenciação

dos seus produtos podem oferecer aos clientes custos ou desempenhos

diferenciados que os convençam a mudar de fornecedor sem grandes transtornos.

Como são as grandes empresas do setor que conseguem gerir tais ofertas aos

consumidores, os custos de mudança serão altos para possíveis entrantes.

Em mercados como os de cervejas ou refrigerantes, o acesso a canais de

distribuição é elemento fundamental para se entrar no mercado, pois os produtos

precisam ser disponibilizados para expressivo número de consumidores. As

empresas de grande porte já instaladas e suas inúmeras subsidiárias, além de

terem seus próprios canais para distribuir seus produtos, possuem poder de

negociação suficiente para restringir a comercialização de possíveis entrantes.

Ademais, mesmo que estes busquem formas como descontos em preços, verbas

para campanha de publicidade em cooperação e semelhantes, o poder de fogo das

grandes empresas instaladas é muito maior, o que lhes permite atuar nas mesmas

condições por maior período de tempo, tornando inviável a ação promocional dos

novos entrantes.

No caso em estudo, o gene traitor ilustra alguns dos benefícios, com a

relação entre inovações biotecnológicas e canais de distribuição. A técnica

milenar de garantir a nova safra era possível graças ao reaproveitamento dos

melhores grãos, que eram guardados e usados na geração de novas colheitas. Na

busca de sementes mais produtivas, caminho aberto pelos híbridos, chega-se ao

gene terminator, que, por produzir grãos estéreis, obrigava o produtor rural a

86

recorrer ao mercado para garantir sua safra seguinte. O gene traitor vai ainda

mais longe. As sementes modificadas que contenham esse gene são incapazes de

gerar novas plantas, mas essa sua incapacidade se refere, na verdade, a uma

situação de latência. No entanto, com o uso de produtos químicos produzidos

pela mesma empresa que vende as sementes, elas ganharão sobrevida e passarão

a germinar normalmente.

Para as companhias que detêm essa tecnologia, este é um meio muito

mais lucrativo do que fornecer sementes estéreis, pois não é mais necessário

manter estoques tão grandes de sementes para serem compradas novamente (o

que inclui menores custos de produção destas). Elimina-se, inclusive, a

necessidade do uso intensivo dos canais de distribuição. Na mesma venda

negocia-se todo o pacote, ou seja, ao venderem as sementes, vendem-se também

as condições de sua produção, como acontece com o Sistema Roundup Ready.

Algumas vantagens das empresas já estabelecidas nessa indústria

dificilmente serão igualadas pelos novos entrantes, o que PORTER (1998)

chamou de custos independentes de escala. No caso da indústria de sementes, a

tecnologia patenteada oferece vantagem decisiva para uma posição de destaque.

As grandes empresas desse setor contam com a proteção de Leis de patentes, que

garantem a posse das invenções que permitem a diferenciação de seus produtos.

Em 1999, sete novas patentes do gene terminator foram requeridas. As empresas

que as solicitaram foram a Delta & Pine Land/USDA (duas patentes diferentes),

a Novartis, a Pioneer Hi-Bred Foundation (da DuPont), a Cornell Research

Foundation, a ExSeed Genetics, a L.L.C./Iowa Sate University e a Purdue

Research Foundation, com apoio do USDA. Pelo menos 43 patentes sobre

sistemas induzidos de controle genético e tecnologias de controle de

características genéticas foram outorgadas. Dentre os proprietários se encontram

praticamente todos os gigantes genéticos e suas subsidiárias, como Aventis,

Bayer, DuPont, Monsanto, Novartis, Zeneca, dentre outros (RAFI, 2000d).

Nota-se que o United States Department of Agriculture (USDA) teve

participação conjunta em três das patentes requeridas, o que denota o apoio dado

87

por este país à esterilização genética de sementes, ação que se converteu numa

das grandes metas da indústria biotecnológica.

Ademais, com tecnologia assegurada, essas empresas acabam se

distanciando das demais, em razão do conceito da curva de aprendizagem ou de

experiência, ou seja, à medida que a companhia adquire experiência na

fabricação de seus produtos biotecnológicos diferenciados, ela tende a ter

diminuição nos seus custos unitários.

Por fim, mas não menos importante, a política governamental é fator

decisivo na atratividade desse setor industrial. Governos de vários países têm

realizado diversos encontros para se chegar a um consenso sobre produção e

comercialização de sementes geneticamente modificadas, tendo em vista as

incertezas que cercam o assunto e suas implicações econômicas.

Pela participação nos requerimentos de patentes, como foi visto, o

governo norte-americano tem sido um aliado na disseminação dessas tecnologias.

No entanto, enquanto o cultivo de transgênicos cresce, exponencialmente, em

países como EUA, Canadá, Argentina e China, alguns países europeus e asiáticos

ainda relutam em adotar a tecnologia baseados em diferentes argumentos, entre

os quais os aspectos de segurança qualitativa do alimento, impactos ambientais e

saudabilidade dos produtos, bem como questões éticas e morais, concentração de

empresas e liberdade de escolha do consumidor.

Dessa forma, os governos de vários desses países mostram-se mais

resistentes à disseminação desse tipo de tecnologia, o que tem dificultado sua

presença ou expansão nesse continente. Esses governos também têm sido

sensíveis às manifestações da população, que exigem maiores certezas da

segurança do consumo dos alimentos alterados geneticamente.

Quando se consideram os possíveis efeitos em toda a cadeia, pode-se ter

a dimensão econômica de decisões governamentais, favoráveis ou não à

disseminação dessa tecnologia. A indústria de processamento e as principais

empresas do varejo do setor de alimentos, importantes elos na cadeia

agroindustrial, acabam tomando suas posições em decorrência das decisões de

seus clientes diretos, os consumidores. Como muitos desses estão cobertos de

88

dúvidas, razão por que preferem adotar a precaução, aquelas empresas acabam

evitando produtos que contenham OGMs.

A Nestlé já declarou, no Reino Unido e na Alemanha, que não vai

utilizar produtos transgênicos em sua linha de produção. Outras empresas,

contrárias ao uso de ingredientes transgênicos em seus produtos, são o

hipermercado francês Carrefour (inclusive no Brasil); as filiais da Unilever, do

Reino Unido, da Áustria e da Alemanha; a Tesco, maior rede de supermercados

da Inglaterra; e a Prysca, maior rede espanhola de supermercados (IDEC, 1999).

No Brasil, o governo tem concentrado atenção naqueles que pretendem

comercializar aqui seus produtos geneticamente modificados. A situação está

imersa em grandes incertezas, tamanha a confusão que cerca o assunto.

A Agencia Nacional de Vigilância Sanitária, primeiro, afirma que não exigirá a

retirada do mercado de alimentos que já contenham OGMs, porque não há

legislação que autorize essa medida; mas, poucos dias depois, determinou essa retirada. O Ministério da Agricultura diz que não pode impedir a importação e

venda, por falta de legislação sobre rotulagem. Mas, em um semestre, só

fiscalizou 5% dos campos de plantio de transgênicos autorizados pela CTNBio - porque não contrata fiscais desde 1982 (NOVAES, 2000).

Se alguma empresa já se preparou para comercializar seus produtos neste

País, certamente está tendo dificuldades em virtude do imbróglio criado. Nas

palavras de NOVAES (2000), é possível perceber quão incerta está a situação.

Em decorrência disso, alguns possíveis novos entrantes podem estar

esperando melhor oportunidade para ingressarem nessa indústria, embora esta

decisão possa acabar contribuindo para maiores dificuldades futuras, uma vez

que as novas pesquisas que estão se realizando pelos atuais competidores podem

levar a inovações que possivelmente contornem os problemas hoje inerentes a

esta tecnologia.

A análise dos fatores que se referem às barreiras de entrada para novos

competidores parece indicar que a chance de êxito segue uma tendência

desestimuladora. As grandes empresas do setor atuam num sentido que torna as

barreiras cada vez maiores. Pode-se perceber isso, principalmente, quando se

pensa nos vultosos investimentos feitos em pesquisas, grandes responsáveis pelas

possibilidades de novas diferenciações patenteadas de seus produtos. O volume

89

de capital e o investimento em pesquisa constituem a base para que as demais

barreiras se solidifiquem.

4.3. Pressão advinda de produtos substitutos

O conceito de concorrência deve seguir uma perspectiva mais ampla e

envolver não só os concorrentes da mesma indústria, mas também competidores

de outras, cujos produtos atendam a mesma necessidade.

A crescente presença de produtos substitutos tende a reduzir os retornos

potenciais de uma indústria, à medida que colocam um preço-limite para que as

empresas possam fixar o lucro. Numa indústria onde os produtos têm baixo nível

de diferenciação, a tendência é que os preços sejam bastante similares, situação

em que a concorrência acaba se estabelecendo em nível de custos, ou seja, a

maneira de aumentar os retornos seria pela competência da empresa em fabricar

seus produtos com menores custos possíveis.

Como as possibilidades de diferenciação do produto semente têm

crescido muito em razão dos avanços da biotecnologia, o setor tende a ser

favorável às empresas que estão investindo em P&D, permitindo-lhes fugir da

pressão de substitutos. Os produtos desta indústria também são diferenciados em

relação ao preço final.

As possibilidades abertas pela biotecnologia são tantas que empresas de

outros ramos estão se dirigindo a ela, sendo um exemplo nítido dessa tendência a

formação da “indústria da ciência da vida”, que agrega as áreas próximas da

agricultura e da medicina, além das possibilidades abertas pelo desenvolvimento

de biomateriais.

Entretanto, a ameaça de um produto que substitua a semente ainda não se

concretizou, apesar das possibilidades abertas pelos avanços da biotecnologia.

90

4.4. Poder de negociação dos fornecedores

A importância da relação de uma empresa e seu fornecedor é decisiva em

qualquer setor industrial. O setor de sementes não é diferente, mas apresenta uma

característica peculiar. Em outros setores, enquanto a relação com fornecedores é

fundamental para um bom fluxo de matérias-primas necessárias à produção,

neste, a relação mais importante parece estar na aquisição de conhecimento, ou

seja, de tecnologia, para que as instituições de pesquisa possam emergir como

seus principais fornecedores.

Caso tenham forte poder de barganha, os fornecedores podem exercer

pressões para elevar os preços de seus bens/serviços ou mesmo alterar a

qualidade destes, fatores que provocarão mudanças diretas na rentabilidade da

companhia compradora (indústria de semente), principalmente quando esta é

incapaz ou limitada para repassar os aumentos de custos a seus próprios preços.

Dessa forma, para analisar o poder de barganha dos fornecedores de

matérias-primas para a indústria de sementes, estes serão definidos como os

geradores da tecnologia que resulta na criação do produto semente. Como

corolário, estão sendo desconsiderados os demais fornecedores cuja relação com

a empresa está direcionada mais para as atividades-meio do que para as

atividades-fim. Dentre esses fornecedores, aqui não serão analisados os

agricultores integrados ou não, envolvidos nas plantações onde são geradas

sementes, e os fornecedores de material usado nos laboratórios, as companhias de

energia, de água, de material administrativos etc.

O foco estará, então, direcionado para os responsáveis diretos pela

tecnologia que é implantada nas sementes. Essa tecnologia pode ser obtida na

própria empresa e em suas subsidiárias, em seus departamentos de P&D, ou

adquirida de fornecedores externos, que são, principalmente, as instituições

públicas de pesquisas, as universidades ou outras empresas concorrentes.

O capítulo 2 traz revelações importantes do relacionamento entre o setor

público e o privado no que se refere à realização de pesquisas na área agrícola.

Sabe-se que o setor público jamais abandonou as pesquisas; no entanto, passou a

91

dedicar-se mais profundamente à pesquisa básica, enquanto o setor privado

aumentava seu ingresso na pesquisa aplicada. Dessa forma, quando se considera

a relação das empresas de sementes com os fornecedores públicos de tecnologia,

entende-se que mantiveram relação muito mais próxima de complementaridade

do que de rivalidade.

A pesquisa básica é o tronco de uma árvore, enquanto a pesquisa

aplicada corresponde aos galhos, à folhagem, aos frutos. Ou se fortalece o tronco

durante toda a vida da árvore, ou a atenção é voltada para o nascimento dos

galhos e para sua formação. Portanto, os atalhos laterais, ou seja, os galhos, são

as invenções com aplicação industrial que resultam em patentes, que, por sua

vez, geram recursos que remunerarão novas pesquisas (WOLFF, 2000).

Beier e Strauss, citados por WOLFF (2000), identificaram três passos

fundamentais em um processo inventivo:

1. A etapa da pesquisa propriamente dita, que engloba o avanço científico;

2. A etapa do desenvolvimento à qual pertence o avanço técnico; e

3. A etapa da aplicação da pesquisa, que representa o avanço econômico e social.

Esses são os passos que, geralmente, um pesquisador deve percorrer para

que sua invenção reverta em retorno financeiro. Assim, na fase do

desenvolvimento, realizam-se as invenções patenteáveis e, muitas vezes, é nesta

ocasião que já se indica a elaboração de um pedido de patente, mesmo que ainda

não tenha concluído naquele momento, com detalhes, o contexto inventivo global

do produto ou do processo recém-desenvolvido. A fase da aplicação representa a

utilização do produto ou do processo comercialmente (WOLFF, 2000).

Apesar de serem uma das instituições que mais se dedicam à pesquisa

básica, com vistas no avanço científico, as universidades estão também se

dirigindo para o desenvolvimento e para a aplicação desta, tornando-se

importantes fornecedores de tecnologia para os mais diversos setores industriais.

Em torno de 1930, ela já havia desenvolvido a tecnologia do milho híbrido, que

deu impulso ao avanço capitalista para o desenvolvimento de sementes. Mais

recentemente, sem abandonar a investigação básica, a universidade tem feito

92

parte do ranking das instituições que mais requerem patentes no mundo (Tabela

5).

Em linhas gerais, acredita-se que o poder de barganha que as

universidade e instituições de pesquisa pública exercem sobre as companhias de

sementes é pequeno. Ao comparar os gastos entre essas duas esferas, podem-se

observar as diferenças. Segundo LEITE (2000:71),

apenas para efeito de comparação, o orçamento do CGIAR, maior instituição

pública internacional de tecnologia agrícola, alcança US$ 400 milhões, enquanto se estima que a Monsanto gastou perto de US$ 500 milhões apenas

para desenvolver a soja Roundup Ready, um investimento que só terá retorno

se seus derivados estiverem protegidos pelo tacão das patentes.

A atividade de pesquisa não é dominada por poucas instituições similares

e tampouco só por esse tipo de instituição, uma vez que outros competidores da

indústria de sementes também agem como fornecedores mediante recebimento de

royalties provenientes das patentes que registram. A existência de vários

fornecedores diminui o poder que poderiam exercer sobre seus compradores,

obrigando-as a descobertas que realmente se destaquem dos demais. Nesse

primeiro fator está inclusa a idéia de que tais fornecedores deverão,

necessariamente, lutar com outros fornecedores na venda para a indústria.

As universidades e instituições de pesquisa pública são menos

concentradas que as grandes empresas que dominam a indústria de sementes. Por

sua vez, ela é um dos seus mais importantes clientes, se não o mais importante.

Isso pode ser verificado na forte concorrência entre os grandes competidores

dessa indústria pelos bilhões de dólares que representa o mercado de sementes.

Como essa indústria está cada vez mais direcionada estrategicamente para a

formação da “indústria da ciência da vida”, o poder desses compradores tende a

ser ainda maior. Conseqüência disso é que o destino desses fornecedores estará

fortemente ligado à indústria de sementes, quando, segundo PORTER (1998),

eles tentarão protegê-la por meio de preços razoáveis, de assistência em

atividades como P&D e da influência.

Ademais, os produtos dos fornecedores são importantes para o negócio

do comprador, que tem influências diretas no processo de fabricação do

comprador ou na qualidade do produto. No entanto, pelo fato de a indústria de

93

sementes também realizar pesquisas e ter poder suficiente para novas aquisições

e fusões com outras indústrias que também realizam grandes investimentos em

P&D, os fornecedores acabam tendo seu poder reduzido. É compreensível o fato

de que algumas dessas instituições ocupem investigações onde a indústria de

semente não está presente (como a pesquisa básica).

Esses fornecedores não buscam aplicar as tecnologias que geram em

produtos, por isso, não se pode inferir sobre a ameaça que produtos diferenciados

dos grupos de fornecedores (universidades e instituições públicas de pesquisa)

causam aos compradores. Além disso, é pouco provável que essas instituições

representem uma ameaça de integração para frente, pois sua atividade fim é a

geração de tecnologia e não sua utilização comercial aplicada à produção e à

comercialização de determinado produto, como as sementes.

Quanto aos demais fornecedores, aqui considerados como os demais

competidores dessa indústria, assim são caracterizados por também venderem

tecnologias que são aplicadas nas sementes. A relação entre eles reflete interesses

próprios da busca por participação de mercado, num panorama de rivalidade.

Nesse caso, não ocorre a relação típica de fornecedores que não competem com

seus clientes na produção e na busca por parcelas de mercados. Dessa forma,

fornecem tecnologias cujo aproveitamento por parte de seus concorrentes não

lhes permite uma condição de vantagem ameaçadora. Se os competidores-

fornecedores relacionam-se com seus compradores em nível de concorrência, as

universidades e instituições públicas de pesquisa tendem a aproximar-se cada vez

mais da indústria de sementes para cobrir os grandes custos de suas pesquisas

biotecnológicas.

Nos casos em que as patentes dos competidores-fornecedores expiram,

os demais concorrentes podem aproveitar-se dessa tecnologia para avançar na

diferenciação de seus produtos. No entanto, o tempo do registro da patente até

sua expiração é suficiente para que se adquira um posicionamento de mercado

suficiente para enfrentar os seguidores.

Assim, o acesso à tecnologia entre os próprios competidores ficará cada

vez mais restrito às possibilidades de fusões e, ou, aquisições entre eles. A posse

94

e o controle das patentes são amplamente determinados pelo acesso à tecnologia,

que, nessa indústria, tem estado nas mãos dos grandes grupos da “indústria da

ciência da vida” (Tabela 6).

Tabela 6 - Maiores detentores de patentes biotecnológicas de plantas

Empresas Patentes % do total

Syngenta 205 9

DuPont/Pioneer 184 8

Monsanto 173 8 Aventis 55 2

Dow AgroSciences 45 2

Total das cinco companhias 662 29

Total geral 2.226 100

Fonte: KUEYK (2000).

Percebe-se que as cinco maiores detentoras de patentes têm cerca de 30%

de todas as patentes em biotecnologia agrícola. Nessas condições, especialmente

num regime de propriedade intelectual global, a competição acaba sendo

substituída por uma disputa legal. Uma semente transgênica, por exemplo, pode

envolver dezenas de patentes, e, para cada produto lançado no mercado, os

advogados dessas empresas lutam pela propriedade de seus inventos, buscando

formas de licenciamentos de benefícios mútuos.

Ao fornecer tecnologias a seus competidores, as empresas fornecedoras

garantem mais uma fonte de lucros, uma vez que ganharão royalties a partir das

vendas dos produtos de seus competidores. Ademais, não existem razões para

que se acredite que o acesso à tecnologia irá se expandir no futuro. Esse acesso

95

limitado à tecnologia agrícola é e continuará sendo direcionado para os interesses

da indústria.

4.5. Poder de negociação dos compradores

A análise da indústria de sementes e a percepção das mudanças que são

provocadas em decorrência da biotecnologia levam, inevitavelmente, à

exploração do elo mais frágil da cadeia agroalimentar - o produtor agrícola, que é

o comprador dessa indústria.

Dos setores que compõem a cadeia agroalimentar, os produtores

agrícolas são os que mais têm sentido os impactos da concentração ocorrida em

toda a cadeia, principalmente na indústria de insumo e na de processamento.

Conseqüência direta dessa concentração é que os agricultores têm tido suas

atividades cada vez mais direcionadas e determinadas pelos interesses daquelas

indústrias.

Principalmente em resposta às demandas dos processadores de

alimentos, o setor de produção agrícola tem submetido seu processo produtivo a

intensa penetração do capital. Como a produção de alimentos está sendo

crescentemente direcionada não mais para o consumo da população, mas para o

consumo da indústria de processamento, é necessário que ela forneça alimentos

no mesmo ritmo em que a indústria trabalha.

Para que a produção pudesse seguir o ritmo da demanda do setor de

processamento, o setor de insumos passou a fornecer as condições materiais

suficientes. Tais condições objetivavam transformar o produtor em mero

cultivador, completamente desprovido de decisões sobre o quê plantar, assim

como sobre os insumos a serem utilizados e para quem seriam vendidos. O certo

é que o setor agrícola ficou “encurralado” entre dois grandes oligopólios que

controlam tanto a entrada como a saída do setor de produção agrícola, resultado

direto da crescente dependência dos agricultores a um número limitado tanto de

fornecedores (indústria de insumos) quanto de compradores (indústria de

processadores).

96

Segundo estudo do Diretório de Agricultura da União Européia

publicado no El País, intitulado “Impactos econômicos dos cultivos transgênicos

no sector agroalimentar”, esta situação é resultado do "acúmulo emergente de

empresas que controlam o sistema de alimentação desde o gene até as prateleiras

dos supermercados"32

. Além disso, assinala que "o agricultor se torna um

cultivador que provê a força de trabalho e algum capital, mas nunca chega a

possuir o produto que se move pelo sistema alimentar e nunca toma uma decisão

importante sobre sua gestão"33

(EL PAÍS DIGITAL, 2000).

Os agricultores vão se tornando frágeis diante dos grupos fortes, o que

torna a negociação completamente desfavorável a seus interesses. Para agravar a

situação, muitas das inovações biotecnológicas permitem às empresas aumentar a

dependência dos agricultores em frente a seus produtos.

Muitas empresas biotecnológicas estão vendendo tanto a semente modificada geneticamente como o produto associado para a proteção da colheita. Por

exemplo, uma firma pode vender uma semente resistente a um herbicida e

depois vende esse herbicida. A vantagem para o agricultor é que ele pode pulverizar seus campos com o herbicida sem temer danos à sua colheita. O

inconveniente é que ele se vê forçado a adquirir todos esses produtos da mesma

firma34

(EL PAÍS DIGITAL, 2000).

Para que se tenha uma idéia mais precisa da abrangência dessa situação,

a União Européia estima que, no ano 2000, haverá no mundo cerca de 42 milhões

de hectares plantados com cultivos transgênicos (Figura 4).

32 Tradução literal para “cúmulos emergentes de empresas que controlan el sistema de alimentación desde

el gen hasta la estantería del supermercado” (EL PAÍS DIGITAL, 2000).

33 Tradução literal para “El agricultor se vuelve un cultivador, que provee la fuerza de trabajo y a menudo

algo de capital, pero que nunca llega a poseer el producto que se mueve por el sistema alimentario y

nunca toma una decisión importante sobre su gestión” (EL PAÍS DIGITAL, 2000).

34 Tradução literal para “muchas empresas biotecnológicas están vendiendo tanto la semilla modificada

genéticamente como el producto asociado para la protección de la cosecha". Por ejemplo, una firma

puede vender una semilla resistente a un herbicida concreto y además vende ese herbicida. La ventaja

para el agricultor es que puede fumigar sus campos con el herbicida sin temor a que pueda dañar su

cosecha. El inconveniente es que se ve forzado a adquirir todos esos productos a la misma firma” (EL

PAÍS DIGITAL, 2000).

97

Fonte: EL PAÍS DIGITAL (2000).

Figura 4 - Estimativa da áreas plantadas com sementes transgênicas, em 2000.

A principal cultura cultivada com sementes transgênicas é a soja, com

53% da área plantada, em segundo lugar, bem abaixo do percentual da primeira,

vêm o milho (27%), o algodão (9%), a colza35

(8%) e a batata (0,1%).

Dada a continuidade dessas ações, há forte tendência de os agricultores,

ao adotarem as sementes transgênicas em suas plantações, ficarem cada vez mais

“apertados” entre os dois oligopólios. De um lado, as transnacionais

biotecnológicas, que lhes vendem as sementes, de outro, as transnacionais

processadoras de alimentos, que lhes compram a produção.

Pode-se deduzir, então, que o poder de barganha dos agricultores em

frente à indústria de sementes é cada vez menor. Além dos dados já comentados,

sabe-se que eles existem em grande número, mas a maioria não está organizada

para enfrentar as grandes empresas do setor de sementes. Em países em

desenvolvimento, essa situação é ainda mais grave, uma vez que o número de

agricultores de pequeno e médio porte cresce ainda mais. O pequeno número de

grandes produtores agrícolas está distante de reunir poder suficiente para

negociar, em pé de igualdade, com as companhias de sementes. Pelo fato de o

setor de produção agrícola não estar concentrado e de o volume comprado por

cada agricultor da indústria de insumos ser insignificante em relação às vendas

35

Variedade de couve comestível (Brassica campestris), que, no inverno, serve de forragem, de cuja

semente se extrai um óleo (FERREIRA, 1995).

98

dessas indústrias, tem-se a confirmação de mais uma circunstância que

caracteriza o pouco poder de barganha dos compradores diante da indústria de

sementes.

Pelo fato de a biotecnologia levar à tendência de diferenciação das

sementes, distanciando-a da posição de produtos padronizados, é pouco provável

que os compradores consigam jogar uma indústria contra a outra, dadas as

alternativas para sua compra.

Seguindo esse mesmo raciocínio, é grande a inclinação para que os

compradores tenham cada vez mais custos de mudanças, o que os torna ainda

menos poderosos em face à indústria de sementes. Nesse sentido, as empresas de

sementes têm, via biotecnologia, amarrado os agricultores aos seus “pacotes” de

insumos, como nas sementes que contêm o gene traitor, que, devido ao impacto

em torno da situação de dependência do produtor agrícola, está com venda

suspensa.

Outro fator que também aponta para a perda de poder de barganha por

parte dos compradores é que estes representam pouca possibilidade de integração

para trás. É mais provável que a indústria de sementes ameace os produtores

agrícolas com a integração para frente, que o contrário.

A análise dos fatores que tratam da relação entre a indústria em

referência e os compradores continua a ser desfavorável para os últimos. Isto

porque o produto da indústria tem importância direta na qualidade dos produtos

do comprador, o que contribui para diminuir o poder de barganha do comprador

na negociação. O produto das empresas, a semente, é de vital importância para a

qualidade dos produtos que os agricultores irão vender a seus clientes. Esse fato

coloca os produtores rurais numa situação completamente desfavorável na

negociação, já que a semente é o insumo-base de seu processo produtivo, razão

por que qualquer alteração nesse insumo poderá provocar mudanças diretas em

sua colheita.

Além disso, o nível de informação que o comprador tem sobre o produto

que está por adquirir parece ser um grande problema, não só para os agricultores

quanto para toda a sociedade. Não se sabe ao certo que problemas os alimentos

99

modificados geneticamente poderão trazer para a saúde humana e para o meio

ambiente. Os agricultores, além de não terem conhecimento acerca dos

componentes biotecnológicos presentes nas sementes que compram, têm a

preocupação voltada para a produtividade de sua safra e para a demanda que sua

colheita terá no mercado.

Como as incertezas abrangem também os consumidores finais, são

grandes as retaliações sobre os alimentos que contêm algum tipo de alteração

genética, o que tem resultado, inclusive, na queda na previsão da safra de

transgênicos para o próximo ano.

Por fim, outro fator que levaria ao aumento do poder de compra dos

compradores, que também tem provocado poucos efeitos práticos, refere-se à

importância da semente como fração significativa dos custos de compra. As

primeiras aplicações da biotecnologia têm conjugado a compra de sementes a

insumos químicos, como herbicidas. Assim, o custo fica ainda maior; no entanto,

a dependência dos agricultores desses pacotes acaba eliminando a força desse

fator como aquele que contribui para ganho de poder de barganha para os

compradores.

Esses fatores representam um peso suficiente para retirar poder de

barganha dos compradores e deixar que a concentração na indústria de sementes

continue aumentando. Mesmo que os lucros dos compradores sejam baixos, o

que os levaria a buscar preços mais baixos junto às empresas de sementes, este

fator tem agido a favor destas, uma vez que as aplicações biotecnológicas tendem

a caminhar em direção à queda nos custos de produção para os agricultores.

100

5. RESUMO E CONCLUSÕES

Este trabalho pretendeu avaliar algumas tendências do impacto da

biotecnologia na estrutura de concorrência da indústria de sementes, embora se

reconheça que muitas destas são complexas e irredutíveis a respostas rápidas.

Procurou-se, à luz de considerações sobre a economia mundial atual, espaço de

ação das grandes responsáveis pelos avanços científicos dessa ciência e suas

aplicações - as corporações transnacionais (TNCs) - verificar esses impactos,

tendo em vista que essas indústrias são importantes agentes do setor de insumos

agrícolas.

Ao direcionar a questão para o setor agrícola, essas tecnologias abrem a

possibilidade de crescente aumento da produção de alimentos e fibras, que está,

entretanto, cada vez mais associada às exigências industriais. Num extremo dessa

tendência, a própria produção de alimentos tende a ser feita no interior das

indústrias, por uma fração do preço da produção no campo. Assim, estar-se-ia

diante de uma revolução social e econômica de grandes impactos, tendo em vista

a perda de importância da produção tradicional e a consolidação da hegemonia

do capital sobre uma das últimas atividades produtivas artesanais de grande

importância.

Ao reunir forças políticas e tecnológicas, o capital caminha para o

estabelecimento de uma nova estrutura operacional. Dentre outros, merecem

101

destaque a relação sinérgica entre os avanços da biotecnologia e o

estabelecimento de Leis de patentes, determinados pelos interesses das indústrias.

O poder adquirido por essas empresas tende a corromper os processos

normativos, colocando lado a lado autoridades governamentais, executivos de

empresas e cientistas, com vistas em assegurar as inovações biotecnológicas,

destacando a posição que os EUA ocupam nesse emergente mercado, já que suas

empresas figuram entre os maiores competidores tanto da indústria de sementes

quanto das de agroquímicos.

A possibilidade de isolar, identificar e recombinar os genes está tornando

possível a formação de novas e potentes matérias-primas para a atividade

industrial. Essas técnicas biotecnológicas estão permitindo que as empresas

manipulem os recursos genéticos para fins econômicos específicos. Associado à

concessão de patentes de genes, o mercado ganha um incentivo comercial

essencial para a exploração de novos recursos, ou seja, a combinação desses

fatores ganha dimensões globais a partir do momento em que as “indústrias de

ciência da vida” passam a atuar nos recursos biológicos em todo o planeta.

O contexto de economia globalizada dá sentido às ações das TNCs ao

contar com o apoio dos Estados Nacionais de origem dessas empresas, ao mesmo

tempo que age a favor da desnacionalização de economias de países em

desenvolvimento, que representam mercados agrícolas potenciais e alternativas

estratégicas em frente aos saturados e bastante disputados mercados de origem. A

recente disseminação de políticas neoliberais na América Latina pode representar

bem esses esforços.

A busca de posição estratégica nesse mercado mundial tem resultado no

aquecimento das fusões e aquisições entre empresas, em que ganham destaques

as investidas das empresas agroquímicas rumo às de sementes.

Essa seria uma importante percepção deste estudo. Ao partir para a

análise dos dados referentes à estrutura do mercado de sementes, constataram-se

os movimentos das TNCs agroquímicas sobre as TNCs de sementes. Essa corrida

parece demonstrar o desejo das primeiras em apossar-se de um importante

elemento aglutinador das inovações, que é a semente. Ao controlar a distribuição

102

de sementes patenteadas assegura-se, praticamente, a hegemonia da agricultura

global.

Pelos constantes movimentos de fusão e aquisição, intensos nos anos

analisados (1996, 1997 e 1998), percebe-se que pequeno número de empresas

concentrou de tal maneira o mercado mundial de sementes, que a competição

acabou se restringindo a elas, numa configuração própria de um oligopólio

industrial. Ao examinar somente as três maiores empresas do setor, constata-se

que elas tiveram, em 1998, 20% de todo o mercado mundial de sementes, valor

significativamente superior aos 15,5%, em 1997. Além de restrita, a estrutura do

mercado desses grandes competidores apresenta rivalidade intensa. Como há

tendência de uniões parciais ou até mesmo totais de umas sobre as outras,

acredita-se que a concentração industrial se agrave nesse setor.

Ao considerar as possibilidades mercadológicas abertas pela

biotecnologia, principalmente no que se refere à diferenciação do produto

semente, essa tendência de consolidação se agrava. Os avanços biotecnológicos

aplicados às sementes fazem destas o elo de ligação decisivo para obtenção de

retornos sobre o capital investido, principalmente em P&D. As grandes somas de

capital destinadas às pesquisas, que levam a um número crescente de novas

possibilidades de diferenciação das sementes, acabam representando importante

barreira de entrada para novos competidores.

Além dos investimentos em P&D (muitas vezes a fundo perdido), para se

chegar a aplicações que tornem as sementes produtos diferenciados, o poder que

as grandes competidoras desse setor adquirem em relação à economia de escala,

não só em nível de produção mas também em fatores como publicidade e

marketing, e aos intensos avanços rumo à integração vertical, em que a estrutura

de canais de distribuição conseqüente se torna importante força competitiva,

resulta em forte tendência de concentração do setor de sementes, com vistas na

redução da ameaça de entradas de novos competidores.

Os outros três fatores analisados, para compreender a estrutura de

concorrência no setor de sementes, também apontam forte tendência de

103

concentração dessa indústria, na qual os agentes reguladores deveriam intervir na

disciplina de situações de alta concentração.

Assim, a pressão advinda de produtos substitutos seria cada vez menor.

Isto porque, quando a concorrência se estabelece em razão de produtos similares,

os retornos de investimentos acabam sendo disciplinados com base nos limites de

preços, quando a grande preocupação das empresas seria com a diminuição de

seus custos. No entanto, a partir do momento em que os produtos se diferenciam,

esses limites se desarticulam, beneficiando as empresas que apresentam grandes

níveis de diferenciação de seus produtos. Por estas serem função direta do poder

de investimentos em P&D, o poder dos grandes competidores tende a levá-las a

uma situação de destaque.

Para analisar o poder de negociação dos fornecedores, consideraram-se

como tais as universidades e instituições públicas de pesquisas, num primeiro

momento, e os demais competidores da indústria de sementes, num segundo,

sendo a tecnologia a matéria-prima empregada, ou melhor, a biotecnologia.

Percebeu-se que o destino dos primeiros está direcionado ao desempenho

comercial das grandes empresas do setor, principalmente quando ampliam seus

negócios para “ciências da vida” e tendem a adquirir crescente número de

tecnologias para serem incorporadas em seus produtos. Quanto à aquisição de

tecnologias de outros competidores, esta tende a ficar restrita às possibilidades de

fusões e aquisições entre elas. Dado o alto grau de concorrência, a aquisição de

tecnologias que permitissem apenas igualar seus produtos aos de seus

concorrentes só seria importante para não deixar algum segmento de mercado

desprovido de produtos com tais características.

Os compradores de sementes aqui analisados foram os produtores rurais,

que mais têm sentido os impactos da concentração na cadeia agroalimentar. Uma

amostra disso é que eles têm tido suas atividades cada vez mais definidas pelos

interesses das indústrias, principalmente as de sementes e de processamento. Por

estarem pouco organizados e terem pouco poder quando são comparados aos

demais elos da cadeia agroalimentar, os agricultores estão submetendo seu

processo produtivo a uma intensa penetração do capital, que o leva a ser mero

104

produto, desprovido de decisões sobre o quê plantar, quais insumos utilizar e

para quem vender. Encurralados entre dois oligopólios, a indústria de sementes e

a de processamento, esses produtores tendem a se tornar ainda mais frágeis, o

que influencia diretamente o seu poder de barganha com os fornecedores.

Ademais, o fato de a semente ter importância fundamental para a qualidade de

sua produção, de estarem cada vez mais diferenciadas (o que torna pouco

provável que os agricultores joguem umas empresas contra as outras na busca

por melhores negociações), por serem grandes os custos de mudanças (tendo em

vista os pacotes tecnológicos específicos - sementes e químicos), aliados à pouca

informação que têm sobre as inovações contidas nas sementes geneticamente

alteradas, faz com que o setor de semente esteja subjugado aos interesses das

indústrias, principalmente quando se percebe que estas tendem a se tornar ainda

mais fortes.

Percebe-se que a tendência de concentração percebida pela análise da

estrutura de concorrência do setor de sementes não pode ser compreendida

isoladamente, numa referência única da racionalidade mercadológica. Em outros

termos, ela deve estar circunscrita num contexto mais amplo, que considere as

demais relações estabelecidas na sociedade atual, onde, além de econômicas,

estão as sociais, as políticas e as tecnológicas.

Ao restringir as bases nas quais a sociedade se sustenta em seus aspectos

econômicos, caminha-se para uma visão reducionista de mundo, onde ganham

importância o isolamento em frente à integração, a separação à composição e a

aplicação da força à prática de controle.

Não é o caso de se desconsiderarem as inúmeras descobertas científicas

na agricultura, medicina, geração de energia, dentre outros, mas de observar as

tendências de aplicações científicas que apresentem maiores retornos financeiros

em detrimento de inúmeras demandas sociais importantes. Nesse sentido,

questionou-se a razão pela qual, nos ramos de atuação das “indústrias de ciências

da vida”, as direções tomadas pela ciência seguiram, em sua grande maioria, o

sentido do lucro.

105

Acredita-se que o contexto de mundo atual, no qual há livre circulação

do capital e o mercado torna-se uma instituição fundamental, favoreça esse

enfoque reducionista, uma vez que é o mercado que gera os lucros. As inovações

tecnológicas tendem a concretizar-se como projeções socialmente delineadas a

partir de uma visão de mundo como a de um grande mercado, alimentado por

forças econômicas e difundido pelo meio social dominante. Nesse sentido,

embora exista um mercado para colheitas orgânicas, a maioria dos investimentos

direciona-se para a agricultura biotecnológica.

A mudança dessa situação exigiria a alteração no padrão por meio do

qual a ciência e suas aplicações são vistas. Seriam necessárias mudanças nas

escalas de valores, o que parece pouco provável. Essas indústrias que se fundem

para formar a “indústria da vida” devem ter suas ações monitoradas de perto por

instituições reguladoras. O poder que adquirem está cobrindo aspectos

fundamentais da vida, nos quais se incluem a geração de energia e as profundas

transformações na produção de alimentos e na medicina, fatores muito

importantes para serem deixados a cargos de presidentes de grupos industriais

privados.

106

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