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Imaginários urbanos – percurso de um projeto

Celina Alvetti, Rosita C. de Loyola Hummell∗

Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Índice1 Imaginários urbanos 22 A cidade 23 Os trabalhos 54 Considerações finais 85 Referências 9

ResumoEste relato tem como objetivo fazer umareflexão sobre o projeto Imaginários urba-nos, desenvolvido desde 2000 pelo NúcleoImagem em movimento do curso de Comu-nicação Social da Pontifícia UniversidadeCatólica do Paraná. Para isso, historia eapresenta os temas abordados, apontando asmetodologias e os aspectos que caracterizamo percurso do projeto em foco. Este, por suavez, tem o propósito de discutir questõescontemporâneas, a partir de pesquisas sobrea cidade, a mídia e as identidades, tendo

∗Celina Paz Alvetti é Mestre em Artes-Cinemapela ECA/USP, professora do curso de Jornalismo daPUCPR, email: [email protected] C. de Loyola Hummell é Mestre em Histó-ria pela UFPR, professora do curso de Jornalismo daPUCPR, email: [email protected] trabalho foi apresentado no GT – Mediaçõese Interfaces Comunicacionais, do Inovcom, eventocomponente do IX Congresso de Ciências da Comu-nicação na Região Sul.

como fundamento a perspectiva dos EstudosCulturais e das teorias da recepção.

Palavras-chave: pesquisa; cidade; con-temporaneidade; mídia.

O Núcleo Imagem em Movimento foi cri-ado em 1996, com o objetivo de estimulara discussão, a pesquisa e a produção acadê-mica da imagem em movimento, envolvendoprofessores e alunos, em projetos vinculadosou não às disciplinas das habilitações da gra-duação em Jornalismo, Publicidade e Rela-ções Públicas da Pontifícia Universidade Ca-tólica do Paraná, em Curitiba. Atualmente,conta também com a participação de alunosdos cursos de especialização em Comunica-ção Audiovisual e Comunicação, cultura eArte.

A partir de 2001, uma alteração curricu-lar, com implantação de horas complementa-res, destinadas aos alunos que desenvolves-sem atividades extra-classe, permitiu o posi-cionamento do núcleo como extensão, bemcomo estendeu o seu alcance além da áreado audiovisual, tornando-o aberto a múlti-plas disciplinas.

Ao longo desses 13 anos, o Núcleo desen-volveu dezenas de projetos de pesquisa, al-guns dos quais apresentados em eventos ci-entíficos no Brasil e no exterior.

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Uma das características do trabalho é acriação colaborativa, com propósitos didáti-cos, para que os alunos se engajem no am-biente científico e se envolvam numa práticade trabalho em equipe, sob a supervisão dosprofessores-orientadores.

Tendo como base a perspectiva dos Estu-dos culturais, os tipos de pesquisa mais re-correntes, ao longo dos anos, foram a pes-quisa histórica (em particular sobre a identi-dade do cinema de Curitiba), a pesquisa derecepção (em geral examinando a cultura jo-vem), a análise da narrativa de produtos mi-diáticos (especialmente cinema e teledrama-turgia) e a experimentação, por meio de rea-lização audiovisual.

1 Imaginários urbanosNo Núcleo Imagem em Movimento, o estudode questões contemporâneas a partir de trêseixos temáticos: cidade, mídia e identida-des, permitiu traçar desde o ano 2000 umplano de trabalho de longo prazo e ao mesmotempo flexível; ano a ano os sub- projetos fo-ram sendo construídos de acordo com o inte-resse dos grupos de alunos e das questões su-geridas pelas preocupações sociais tratadasna mídia. Assim os temas foram sendo estu-dados e trabalhados de modo a não fugir doseixos centrais, com particularidades a cadaano. Os primeiros três anos do projeto fo-ram dedicados à pesquisa sobre o tempo e aimagem em movimento, buscando referênciaem autores como Walter Benjamin, GastonBachelard e Norbert Elias. Nos cinco anosseguintes, diferentes autores e metodologiasforam incorporados, permitindo a definiçãode percursos teóricos.

O projeto Imaginários urbanos foi, então,sendo construído conforme as necessidades

de aprofundar os estudos da mídia, da cidadee dos seus habitantes. A metodologia, an-tes de uma escolha, inicia-se em um processode maturação do tema, das variáveis a serempesquisadas e da rotina metodológica que seestende durante todo o ano acadêmico. Oamadurecimento das idéias acerca da abor-dagem dos temas e a sua delimitação foramsempre discutidos nos encontros do grupo epode-se dizer que sofreram um processo deenvolvimento contínuo.

É pertinente observar que, sendo um tra-balho extra-classe sofre, além dos percalçosusuais de envolvimento e trabalho de alunos,rupturas contínuas em épocas de provas, fé-rias, com evasão de participantes. Há, noentanto persistência de alguns e reposiciona-mentos periódicos. Estes fatos têm sido, decerta forma, construtivos e incentivadores doprocesso criativo do grupo.

2 A cidadeA noção de espaço urbano foi tomada nosentido de território onde se situa o fluxo ouo movimento das relações urbanas, ou seja,o território passível de apropriação por todosos componentes de uma sociedade complexae, ao mesmo tempo, onde se modificam con-tinuamente estas apropriações; portanto, umespaço não um local: “Assim como as de-mais obras do homem, os espaços urbanossão produções culturais sujeitas a diferentesapropriações. É através de um permanenteprocesso de criação que o homem transformao ambiente em que vive, ao mesmo tempoem que estabelece as bases para criações fu-turas.” (DURHAN apud MOTTA in ARAN-TES, 2000, p.259).

Sérgio Paulo ROUANET, analisando aobra de Walter Benjamin, diz que este pro-

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põe a cidade como espaço da modernidade;é o espaço em que se sente em casa, e aomesmo tempo fora dela porque é um espaçosem dono; o sentimento ambíguo, impreciso,de pertença e de estranhamento é que leva oestudioso a procurar na sua própria cidade oobjeto de estudo.( ROUANET, 1993).

Ainda se pode citar Henri LEFEBVRE (1999, p.112) que em sua análise do urbanocomo fenômeno , refere-se à ideologia destee reconhece que a cidade é mais e outra coisaalém da acumulação; reconhece a abstraçãodo urbano, embora, segundo ele, ligado áuma prática social.

A revisão de bibliografia sobre a cidade,permitiu que se estabelecesse alguns pontosimportantes sobre ela; a cidade é fruto não sóde uma formação espacial e geográfica mas,e principalmente, é parte de um processo his-tórico que se estabelece sempre e de maneirapeculiar em cada um dos casos entre a ter-ritorialidade e a apropriação simbólica destepelos seus membros.

Da definição do espaço urbano, e do es-paço urbano em que se convive, passa-se aoutras questões : mídia e identidades.

Na tentativa de buscar uma nova pers-pectiva neste processo pode-se delinear commais precisão o quadro de tessitura de umimaginário urbano peculiar que caracteriza acidade.

O imaginário urbano é tecido em um es-paço de fluxos contínuos de relações de po-der e de tolerância, de modificações cultu-rais locais e inseridas em um quadro sócio-político .

Na concepção de LYNCH:

As imagens ambientais são o resultadode um processo bilateral entre o obser-vador e seu ambiente. Este último su-

gere especificidades e relações, e o obser-vador - com grande capacidade de adap-tação e à luz de seus próprios objetivos– seleciona, organiza e confere signifi-cado àquilo que vê. A imagem assimdesenvolvida limita e enfatiza o que évisto, enquanto a imagem em si é tes-tada, num processo constante de intera-ção, contra a informação perceptiva fil-trada. Desse modo, a imagem de umadeterminada realidade pode variar signi-ficativamente entre observadores diferen-tes. (1999, p.7)

A cidade e a mídia são lugares de conver-gência de culturas, aí entendendo as mudan-ças do urbano, dos meios de comunicação,do cotidiano e dos modos de olhar o mundo.Assim, com as transformações, ao longo dotempo, as cidades foram sendo reconfigura-das, da paisagem tecnológica ao cotidiano deseus habitantes. Na cidade contemporânea,a urbanidade se manifesta de distintos mo-dos, entre eles na relação do individuo como espaço urbano, no modo como esse espaçoé atravessado pelos processos, pelas redescomunicacionais que estabelecem novos flu-xos, mediando a remodelação do imaginárioda cidade.

Para Armando Silva (2001), pode-se de-finir cidade como a imagem de um mundovivido, que está sempre se construindo e re-construindo, pelos acontecimentos cotidia-nos e coletivos dos sujeitos que nela habitam.

Considerada modelo, principalmente empreservação ecológica e transporte coletivo,Curitiba tem, aos 315 anos, dificuldades parasolucionar problemas graves com acidentesde trânsito, suicídio e violência, sendo a sé-tima cidade brasileira com maior índice dehomicídios, de acordo com levantamento re-

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cente da Ritla (Rede de informação tecnoló-gica latino-americana, 2008).

De acordo com dados do IBGE (2006),são 1 milhão 797 mil e 498 habitantes (con-forme o IPARDES, são 1.797.408, em dadosde 2007), chegando a mais de três milhões aose incluir a região metropolitana. Em 2001,dados da Pesquisa Retratos de Curitiba - sé-culo XXI apontavam que a capital contavacom 1.586.898 habitantes. Nessa época, a te-levisão estava em 98% dos domicílios, sendoque em 25% dos lares havia a presença docomputador. Os índices não mudaram muito,a se considerar a atualização da Curitiba emdados (2004): 96,08% dos domicílios têmtelevisão e 27,11% computador.

De acordo com a Gazeta do Povo, a rendafamiliar per capita dos curitibanos é de 2,56salários, sendo que “a renda média do res-ponsável pelo domicílio está na casa dos 9,48salários mínimos (2008, p.4)”. Por outrolado, em 2000 (IBGE e IPARDES), foramregistradas 155 mil pessoas vivendo em Cu-ritiba, em situação de pobreza. E cresce onúmero de gangues, estimadas em cerca de100, reunindo mais de 2000 jovens, a maio-ria com idade entre 15 e 25 anos.

Ao estar à margem, os indivíduos reafir-mam a diferença, segundo Hall (in SILVA,2000, p.109) o que, efetivamente, determinaa constituição das identidades. Assim, “sãomais produto da marcação da diferença e daexclusão do que signo de uma unidade idên-tica, naturalmente constituída, de uma ‘iden-tidade’ em seu significado tradicional”. E,seguindo Bauman (2005, p.18), entende-seque, ao questionar a sua identidade, o indiví-duo deixa transparecer também uma espéciede perda do sentimento de pertencimento.

Os traços das diferenças que constituemas identidades da capital do estado sulino do

Paraná passam também pela compreensão desuas contradições - atualmente, por exemplo,cerca de um milhão de carros circulam no es-paço reconhecido pela excelência no trans-porte público.

Assim, presente no imaginário de seus ha-bitantes de modo peculiar, num movimentopendular, entre aceitação (qualidade de vida)e negação (cidade de marketing), Curitibacompõe uma paisagem mental a partir deidéias de preservação da memória, progressotecnológico e urbano.

Os espaços urbanos são produções cultu-rais sujeitas a diferentes apropriações. Aconstrução do patrimônio (artístico, histó-rico ou cultural) pelo poder público é resul-tado de uma seleção e do significado que sedeseja atribuir aos objetos.

No caso de Curitiba, a difusão de todo umsistema de valores, atitudes e comportamen-tos que determina, ainda hoje, o caráter ur-bano da cidade está alicerçado na criação deuma pedagogia social, na circulação de in-formação entre o poder público e a comu-nidade, na recuperação dos antigos marcosreferenciais, na valorização dos marcos exis-tentes e na produção de novos marcos para acidade, processo iniciado na década de 1970.Esses valores foram então definidos como:Opção pelo verde, Transporte eficiente, Mar-cos na paisagem urbana, opções sociais.

Há, ainda, que se colocar a produção con-tínua de uma relação que envolve nesse pro-cesso a criação de imagens de cartão postal,baseadas em imagens e simulacros, em umacentralidade lúdica inerente à sociedade pós-moderna.

Este imaginário compartilhado tambémpelos alunos direcionou a escolha dos temasdos sub-projetos em alguns anos. Assim,os trabalhos e pesquisas do projeto Imaginá-

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rios urbanos foram direcionados para a ci-dade de Curitiba tendo como objetivo nãoa perspectiva racional e técnica ou as solu-ções urbanísticas adotadas para a solução deproblemas, mas sua singularidade históricaenquanto sociedade complexa e contempo-rânea.

3 Os trabalhosNeste relato, opta-se por fazer uma catego-rização, agrupando os sub-projetos em trêscategorias, de acordo com a sua proximidadeem termos de natureza metodológica.

A primeira categoria, denominada Iden-tidades urbanas e cultura da midia, temcomo características metodológicas a pes-quisa bibliográfica, fundamentada na pers-pectiva dos Estudos Culturais e a pesquisa derecepção, com coleta de dados por grupo fo-cal e entrevistas. Fazem parte desta categoriadois sub-projetos: A influência da televisãona criança de Curitiba, de 2003 e Identida-des e virtualidades - os relacionamentos lí-quidos, de 2007.

Fundamentado em Guillermo Orozco Go-mes e Jesus Martin-Barbero, A influênciada televisão na criança de Curitiba é re-sultado de uma pesquisa de recepção, apli-cada em crianças com idade entre seis enove anos, de escolas de Curitiba, com oobjetivo de analisar aspectos da influênciada televisão em grupos de diferentes clas-ses socio-econômicas. Para isso, foram rea-lizadas duas etapas de aplicação. A primeiracom quatro escolas (uma estadual, duas mu-nicipais e uma privada), para levantar da-dos gerais da presença da televisão. A se-gunda, com duas dessas escolas (a particu-lar e a mais carente), para verificar a percep-ção das crianças sobre sexo e violência, te-

mas que representaram pontos de interessena primeira etapa.

Ao analisar como a televisão faz parte docotidiano das crianças, percebe-se que as di-ferenças maiores entre os dois grupos estãorelacionadas à forma pela qual estas crian-ças se envolvem com este imaginário, sendoque as crianças da escola privada conseguemlidar melhor com a diferença entre o quese passa na televisão e a realidade. Ape-sar das diferenças socio-econômicas, no en-tanto, existe uma assimilação homogênea dacultura veiculada.

A questão da cultura midiática está pre-sente também em Identidades e virtualida-des - os relacionamentos líquidos, que tratade relacionamentos amorosos na contempo-raneidade, tomando como base o conceitode liquidez de Zygmunt Bauman e a de-finição de Stuart Hall do sujeito da pós-modernidade. Ao examinar identidades ur-banas e espaços virtuais, em particular noque diz respeito aos relacionamentos, chega-se à idéia do amor frágil relacionado aoespírito pós-moderno. Assim, é possívelconstatar a presença do virtual no cotidianodas relações, mesmo que estas não sejamprioritariamente sustentadas de forma não-presencial.

Por outro lado, ao confrontar esses aspec-tos do virtual com o cotidiano dos gruposde jovens pesquisados (no caso, os própriospesquisadores do núcleo e as suas redes derelacionamentos) evidenciou-se que, atual-mente, o ciberespaço, ao formar comunida-des de afeto, integrando indivíduos em umarede social, desperta um sentimento de per-tencimento que, aparentemente, significa aformação de laços reais. Ou seja, ainda quenão presenciais, são verdadeiros.

A segunda categoria, Processos midiáti-

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cos e a cidade imaginada, caracteriza-se pelaaplicação de métodos combinados de análisee experimentação, por meio de processos decriação e produção audiovisual. Nela, o sub-projeto O tempo e um olhar para a cidade,de 2003, propõe uma reflexão sobre questõesde identidade cultural, observando Curitibaa partir de um olhar estrangeiro, de exclusãoe de um olhar de inserção, do que se sentepertencendo ao lugar. Conclui-se que, na ci-dade a maioria é, de alguma forma, estran-geiro - do que vive na periferia e sobrevivede subempregos ao executivo que não se re-conhece e se perde no processo do cotidiano.A pesquisa é fundamentada em Walter Ben-jamin e Stuart Hall, com referência em Dal-ton Trevisan (Em busca de Curitiba perdida,2001) e Italo Calvino (As Cidades Invisíveis,1990). Busca-se, nas diferentes representa-ções de cidade, olhares que permitam refle-tir sobre o entrelaçamento da memória com aficção e a realidade do indivíduo, na sua con-dição de desejar-se sujeito. A análise de refe-rências audiovisuais, com base em conceitosde tempo e experimentação, tem como refe-rência filmes de Walther Ruttman (Sinfoniade uma metrópole, 1931), Dziga Vertov (Ohomem com a câmera, 1929), Godfrey Reg-gio (trilogia Qatsi) e Wim Wenders (Asas dodesejo, 1987), realizadores ligados ao expe-rimentalismo e ao olhar para a cidade. O re-sultado da experimentação foi concretizadoem dois filmes em vídeo (Procurando Curi-tiba, de Luis Celso Sniecikoski Jr e Ítaca, deRafael Bonfim e Tiago Cargnin), que mos-tram a cidade a partir de um olhar estrangeiroe de um olhar de inserção.

Na terceira categoria, Percepções e apro-priações da cultura urbana contemporânea,estão três sub-projetos: Urbanidad, 2004,Observatório do amor, 2005 e Comunicação

café-bar, 2006. Os títulos dos trabalhos sãotomados dos espetáculos produzidos comoetapa final do processo.1

Metodologicamente, trata-se do conjuntomais complexo, assim desenvolvido: a umaprimeira etapa, a partir de fundamentação emHall e em Bauman, entre outros autores-base(especificos de cada sub-projeto), seguem-sepesquisas qualitativas por grupo focal, entre-vistas e análises de produtos midiáticos comtexto, som e imagem. A terceira etapa, de ex-perimentação, dá-se por meio de espetáculohipermídia, que articula teatro, cinema, foto-grafia, dança e música. O espetáculo consi-dera as distintas percepções de questões ur-banas contemporâneas, propondo diferentesolhares para a cidade ao apresentar para acomunidade o resultado das pesquisas. Doponto de vista acadêmico, acredita-se, dá-seuma dinâmica original ao processo, tanto depesquisa quanto da consciência da condiçãourbana.

Urbanidad, trabalho inicial da terceira ca-tegoria, apresenta a proposta de discutir lixo,água e violência na cidade. Primeiramente,discussões com alunos de Curitiba e do inte-rior (a universidade possui entre seus alunosestes universos diversos) ajudaram a delimi-tar a percepção das questões, seguindo-se olevantamento bibliográfico.

Assim, as questões teóricas permitiram

1 Urbanidad, com 50 minutos, fez temporada noTeatro do Paiol, de 16 a 18 de novembro de 2004. Ob-servatório do amor, com 90 minutos de duração, ficouem cartaz no TUCA, Teatro Universitário da PUCPR,nos dias 10 e 11 de novembro de 2005; Comunicaçãocafé-bar, com 45 minutos, foi apresentado no TUCA,dias 21 e 22 de junho de 2007. Os roteiros dos espe-táculos, em processo colaborativo de criação, produ-ção, direção e interpretação, teve como autor o aluno-pesquisador Luís Celso Sniecikoski Jr.

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uma interpretação dos dados coletados napesquisa de campo, feita por meio de entre-vistas com carrinheiros, catadores de mate-rial reciclável e em grupo focal com criançasda periferia de Curitiba. Percebeu-se que,em geral, os adultos trabalhadores sentem-sepertencer à cidade por ter uma tarefa que lhesdá um sentimento de cidadania. Por sua vez,as crianças, na sua maioria, demonstram terconsciência dos problemas urbanos, mas sãopassivas quanto às perspectivas de soluçõesque mudem o cotidiano urbano.

Entender essas percepções permitiu que setecesse um espetáculo multifacetado sobreuma realidade compartilhada pelos morado-res de uma sociedade complexa. Sob múl-tiplos olhares, universitários, carrinheiros ecrianças têm em comum a preocupação comas questões urbanas.

Apresentar diferentes olhares para o amorcontemporâneo, entendendo as suas mani-festações como modo de pensar o sujeito,foi o objetivo do sub-projeto Observatóriodo amor. As principais fontes são Bau-man (Amor líquido, 2004), Roland Barthes(Fragmentos do discurso amoroso, 1981) ea obra multimidiática de Peter Greenaway.Toma-se, ainda, a dramaturgia de WilliamShakespeare, entendendo que ela contém osdiscursos do amor do sujeito contemporâ-neo.

As entrevistas e grupos de discussão, comjovens, investigaram como se dão as relaçõesamorosas no cotidiano urbano. As consta-tações vão de encontro ao pensamento deBauman, havendo um consenso em relaçãoà fragilidade das relações, atualmente. Háuma tendência a ver o outro como objeto,portanto, descartável e por isso o impulsodo consumo origina tantos relacionamentosfugazes, em pouco tempo. Por outro lado,

há necessidade de estabilidade, da segurançaque um relacionamento mais constante pro-move. O amor idealizado é bastante pre-sente, até porque a emoção amorosa é ine-vitável, como para Barthes. Mas, ainda quebusque o eterno, reflete o efêmero, tanto nacontemporaneidade como na Renascença deShakespeare, tempos de descentramentos dosujeito.

Observe-se que, de certo modo compro-vando o apelo do tema, o espetáculo do Ob-servatório do Amor foi o que teve melhor re-ceptividade: cerca de 1000 espectadores. Damesma forma, em uma pesquisa que pode-ria ser descrita como uma sondagem de sa-tisfação dos espectadores, realizada nas ses-sões dos espetáculos produzidos pelo núcleo,Observatório do Amor obteve quase 100%de aprovação. As platéias eram heterogênas,pois os espetáculos foram abertos ao públicoem geral, mas em sua maioria eram compos-tas por jovens. O objetivo, neste caso, erasempre o retorno do trabalho à comunidadeem um processo de interação continuado.

Neste momento do relato, é oportunoapontar que o Observatório do amor tem es-treita afinidade temática com Identidades evirtualidades, da primeira categoria, reali-zado dois anos mais tarde. De certa maneira,trata-se de um desdobramento natural, o re-visitar o universo do amor em um contextomais atual, no caso, o da cibercultura. Issopermite, também, aqui, apontar a articulaçãodos sub-projetos do Imaginários urbanos eevidenciar a sua evolução.

O sub-projeto Comunicação café-bar, oterceiro da terceira categoria do Imagináriosurbanos, tem como objetivo discutir o lu-gar da Comunicação na cidade, a partir dapercepção dos indivíduos a ela ligados porcausas profissionais. Por isso, foram inves-

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tigados universitários das diferentes habili-tações, pré-vestibulandos, egressos dos cur-sos de Comunicaçao e outros profissionaisda área.2

Dos pré-vestibulandos curitibanosindagou-se como pensam a respeito doseu futuro, dos universitários de que modoestão expostos e consomem televisão, meiohegemônico na profissão que escolheram; osegressos da PUCPR e outros profissionaisforam consultados a respeito de aspectos desua formação e inserção no mercado.

Paralelamente, na elaboração do espetá-culo que tem por fim experimentar o relatoda pesquisa em forma de arte, recorreu-se aoimaginário do cinema, a partir de Woody Al-len e Federico Felllini, realizadores que têma midia e a cidade como elementos recor-rentes na sua cinematografia. Como em Otempo e um olhar para a cidade (da segundacategoria – ainda a articulaçao orgânica), aintenção foi estudar, em outro lugar, os entre-laçamentos de memória, realidade e ficção.Nesse deslocamento encontra-se, também, acidade da memória e da imaginação dos cri-adores do cinema

Foi constatado que tanto Allen como Fel-lini são pouco complacentes com a mídia,mostrada como parte do sistema, do mesmomodo que as personagens profissionais decomunicação. Esse olhar é compartilhadopor parte dos envolvidos no fazer da comu-nicação entrevistados. Para estes, o mercadolimita a criação, promove constantes dilemaséticos e, muitas vezes, oferece poucas opor-tunidades para se alcançar a visibilidade al-mejada no início da carreira. Mas, apesardisso, para a maioria, o olhar para o universo

2 Por uma questão de viabilidade, os universitáriose os egressos pesquisados são da PUCPR.

da Comunicação é de inclusão – mesmo comas dificuldades, é gratificante exercer a pro-fissão que sempre se quis.

4 Considerações finaisO projeto Imaginários urbanos é, desde2000, a principal atividade desenvolvida peloNúcleo Imagem em Movimento 3 . Trabalhoem progresso, representa os sentidos do pro-cesso de pesquisa, com dúvidas e descober-tas e também com dificuldades e desencon-tros, que foram moldando a sua identidade.

Os temas pesquisados, relacionados a su-jeito e imaginário urbano (relacionamento,mídia, pertencimento e cidade sempre esti-veram presentes), permitiram que se fizesseuma categorização. As três categorias defi-nidas - Identidades urbanas e cultura da mi-

3 O projeto contou, em diferentes etapas, com acolaboração dos professores Arlene Santana, CynthiaSchneider, Graciela Presas Areu, José Carlos Fernan-des, Zanei Barcellos; dos alunos Alessandra Vianna,Bruna Veiga, Bruno Bini, Bruno Gabriel, Caio Po-letto, Caroline do Prado, Cristiane Hayashi, CristineMarquardt, Daliane Nogueira, Deborah Coifman, Di-ogo Lima, Edlaine Tamanini, Elis Ribeirete, ElisianeAlves, Fabiola Dourado, Fabio Ortolan, Felipe Bu-quera, Felipe Carvalho, Filipe Fonseca, Fernanda Im-brizi, Francielle Keleski, Fredy Kowertz, Giana An-donini, Gilson Garret, Giovanna dal Pra, GrasianiJacomini, Guilherme Cardoso, Helen Carcereri, IaraMartins, Irídio Moura, Juliana Komiyama, JulianaQuadros, Kenia Lima, Lucas Pullin, Luís Celso Sni-ecikoski Jr, Katia Zuccolotto, Letícia Leite, LorenaIplinski, Louise Malucelli, Luciana Reggiani, LuizHenrique Bonamin, Marcos Allede, Mariangela Al-buquerque, Maria Salete Pasqual, Michelle Novais,Norma Sizilo, Paula Fiuza, Rafael Bonfim, RobertoFrega, Rosana de Moraes, Rodolfo Batista, Rosana deMoraes, Solange Faganello, Tassia Arouche, TatianaCanziani , Tiago Cargnin, Tiago Valdivieso e ValériaBini.

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dia , Processos midiáticos e a cidade imagi-nada; Percepções e apropriações da culturaurbana contemporânea, por sua vez, tem umentrelaçamento que evidencia, mais do quediferenças, a unidade da proposta.

Os principais aspectos da linha teórica es-tão sedimentados, a partir da perspectiva dosEstudos Culturais, especialmente com Halle suas discussões sobre sujeito, identidadee diferença. Traços de seu pensamento sãocombinados a conceitos de pós-modernidadee liquidez, de Zygmun Bauman, em funçãode uma identificação de aspectos do Imagi-nários urbanos às condições das cidade con-temporâneas.

Uma das razões que provavelmente contri-buem para isso é o fato de se ter, no percurso,fixado a atenção no receptor jovem e nas for-mas como ele percebe a cidade, a mídia eoutras mediações.

Avaliar a sua própria condição, o seuentorno, suas preocupações, teorizando emalguns momentos mas também criando deforma lúdica a sua própria história permiti-ram aos alunos e ao grupo de estudos fazer,ao longo desse percurso, um trabalho queconstitui a essência da vida acadêmica.

Ao encerrar este relato, julga-se perti-nente informar sobre a continuidade da li-nha de trabalho do Núcleo Imagem em Mo-vimento. Em 2008, no seu 13o ano, professo-res e alunos-pesquisadores estão envolvidosno tema A mídia e o medo da cidade.

De modo semelhante aos anos anteriores,em termos teóricos e metodológicos, o obje-tivo da pesquisa atual é identificar e definirquestões emblemáticas do medo na cidade apartir de Bauman, Hall e dos Estudos cul-turais. Ao mesmo tempo, verificar como omedo aparece na mídia, por meio de pes-quisas bibliográficas, qualitativas e quanti-

tativas, bem como de métodos combinadosde análise da narrativa. No segundo semes-tre, serão produzidos curtas-metragens sobreo tema.

Parte do trabalho colaborativo destesub-projeto, inserido na categoria Processosmidiáticos e a cidade imaginada, está noblog Imaginários urbanos, disponível em:http://imaginariosurbanoscwb.blogspot.com/

A proposta atual segue os propósitos quenorteiam o trabalho do grupo, de entender apesquisa como elemento indispensável paraa realização de projetos de Comunicação.Mais do que isso, despertar o interesse doaluno para a Ciência, dando suporte ao seuprocesso de aprender na prática a desenvol-ver pesquisas que fundamentem os seus pro-cessos produtivos.

5 ReferênciasARANTES, A. (org.). O espaço da dife-

rença. Campinas: Papirus, 2000.

BAUMAN, Zygmunt. Identidade. Rio de Ja-neiro: Jorge Zahar, 2005.

HALL, S. Quem precisa da identidade? InSILVA, T. T. da (org). Identidade e di-ferença- a perspectiva dos Estudos Cul-turais. Petrópolis: Vozes, 2000. 103 -133.

IBGE. Cidades. Disponível em:http://www.ibge.gov.br/cidades.Acesso em 25 mar.2008.

IPARDES. Disponível em:http://www.ipardes.gov.br/. Acesso em:20 mar.2008.

CURITIBA EM DADOS. Disponível em:http://ippucnet.ippuc.org.br/Bancodeda

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dos/Curitibaemdados/Curitiba_em_dados_Pesquisa.asp. Acesso em: 20mar.2008.

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