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31 Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 IGREJA EM EMERGÊNCIA: UMA INTRODUÇÃO ÀS PRIMEIRAS EXPRESSÕES VISÍVEIS DA ECLESIA PÓS-MODERNA Emerging Church: an introduction to the first visible expressions of ekklesia postmodern Rogério Hernandez de Oliveira. 1 RESUMO O presente trabalho é resultado de pesquisa sobre as primeiras expressões eclesiológicas visíveis com o advento da pós-modernidade identificada no movimento da Igreja em Emergência compilada em 2010. A abordagem parte de uma breve avaliação dos tempos de mudança de uma cultura moderna para pós-moderna que afeta a eclesiologia. Em seguida, segue um relato histórico sintético do movimento da Igreja em Emergência e suas diversas tendências e ênfases, sua origem, principais líderes, as primeiras expressões e impactos, as avaliações de alguns acadêmicos que dialogam e pesquisam o movimento com o levantamento de pontos para a continuidade de pesquisa do movimento que continua evoluindo. Palavras-chave: Eclesiologia pós-moderna; Igreja em Emergência; Igreja Emergente; Pós-modernidade. ABSTRACT This work is the result of research on early ecclesiological expressions visible with the advent of postmodernity identified in Church movement in Emergency compiled in 2010. The approach begins with a brief review of the changing times of a modern culture to postmodern affects ecclesiology. Then follows a historical account of the synthetic Emerging Church movement and its various trends and emphases, its origin, key leaders, the first expressions and impacts, assessments of some academic research that dialogue and movement to the survey points to continuing research movement that continues to evolve. 1 Pós-Graduado em Liderança e Pastoreio e Mestrando em Teologia pela Faculdade Teológica Batista do Paraná (FTBP). E-mail: [email protected].

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31Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

IGREJA EM EMERGÊNCIA: UMA INTRODUÇÃO ÀS PRIMEIRAS EXPRESSÕES VISÍVEIS DA ECLESIA PÓS-MODERNA

Emerging Church: an introduction to the first visible

expressions of ekklesia postmodern

Rogério Hernandez de Oliveira.1

RESUMO

O presente trabalho é resultado de pesquisa sobre as primeiras expressões eclesiológicas visíveis com o advento da pós-modernidade identificada no movimento da Igreja em Emergência compilada em 2010. A abordagem parte de uma breve avaliação dos tempos de mudança de uma cultura moderna para pós-moderna que afeta a eclesiologia. Em seguida, segue um relato histórico sintético do movimento da Igreja em Emergência e suas diversas tendências e ênfases, sua origem, principais líderes, as primeiras expressões e impactos, as avaliações de alguns acadêmicos que dialogam e pesquisam o movimento com o levantamento de pontos para a continuidade de pesquisa do movimento que continua evoluindo.

Palavras-chave: Eclesiologia pós-moderna; Igreja em Emergência; Igreja Emergente; Pós-modernidade.

ABSTRACT

This work is the result of research on early ecclesiological expressions visible with the advent of postmodernity identified in Church movement in Emergency compiled in 2010. The approach begins with a brief review of the changing times of a modern culture to postmodern affects ecclesiology. Then follows a historical account of the synthetic Emerging Church movement and its various trends and emphases, its origin, key leaders, the first expressions and impacts, assessments of some academic research that dialogue and movement to the survey points to continuing research movement that continues to evolve.

1 Pós-Graduado em Liderança e Pastoreio e Mestrando em Teologia pela Faculdade Teológica Batista do Paraná (FTBP). E-mail: [email protected].

32 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

Keywords: Postmodern ecclesiology; Emerging Church; Emergent Church; Postmodernity.

INTRODUÇÃO

Ciclicamente no mundo ocidental, ocorrem transformações

nas relações do pensar e agir na organização da sociedade. Este

equilíbrio de forças e relações entre os agentes sociais que o

compõem é manifesto através de seus valores, sua maneira de

pensar e decodificar o mundo à sua volta desaguando nas ações

práticas das relações humanas em suas diversas esferas.

Os valores e o pensar que caracterizam o tempo dos

ventos pós-modernos reagrupam-se e transformam o jogo de

forças estabelecidas entre os diversos agentes da sociedade. Peter

Drucker aponta que estamos atravessando muitas transformações.

Aponta que vem ocorrendo desde em meados do século treze com

a emergência das cidades, do comércio, da arquitetura gótica,

das artes e do pensamento aristotélico e a literatura europeia

com Dante. Este reflexo na religião vem com o surgimento das

ordens religiosas urbanas como os dominicanos e franciscanos.

Cerca de duzentos anos se passam e nova transformação ocorre

agora com Gutemberg e a Reforma Protestante de Lutero e

o grande cisma que vem preparar o caminho do fenômeno do

protestantismo dentro do cristianismo institucionalizado e

totalitário da Igreja Católica Apostólica Romana2. O desabrochar

da ciência, o fortalecimento e organização das nações em estados,

o expansionismo das descobertas além-mares. Novamente mais

duzentos anos se passam e se inaugura o que chamamos de período

2 DRUCKER, Peter F. Sociedade pós-capitalista. 1. ed. São Paulo: PUBLIFOLHA, 1999, p. XI.

33Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

embrionário dos tempos modernos, de onde nascem os chamados

“ismos” modernos. O capitalismo, o comunismo, a consolidação

formal e estruturada das expressões do protestantismo no cenário

religioso3. Drucker resume uma sequência histórica que acaba

desaguando numa conclusão simples:

O vazio criado pelo desaparecimento da crença na salvação pela fé foi preenchido em meados de 1700 com o surgimento da crença na salvação pela sociedade, isto é, por uma ordem social temporal, personificada por um governo igualmente temporal. Essa crença foi primeiramente exposta por Jean-Jacques Rousseau, na França. Trinta anos depois, Jeremy Bentham, na Inglaterra, transformou-a num sistema político, e ela foi moldada em sua forma permanente, o absolutismo “científico”, pelo “pai da sociologia”, Auguste Comte, e por G. W. F. Hegel, na Alemanha. Os dois então “geraram” Marx que, por sua vez, gerou Lênin, Hitler e Mao. Quando cresceu o domínio do Ocidente sobre o mundo, a superioridade de equipamentos, dinheiro e armamentos provavelmente era menos importante do que a promessa de salvação pela sociedade. E agora isso acabou.4

“E agora isso acabou”. Uma conclusão simples

e desconcertante.

Os pressupostos modernos encontram nestes tempos pós-

modernos uma realidade marcada pelo sentimento de frustração,

à medida que não se confirmam, ou mesmo vão se defrontando

com situações contraditórias ao que se esperava. A teoria da

evolução da religião ensinava que iniciamos com o animismo,

depois caminhamos para o panteísmo, politeísmo, monoteísmo

3 DRUCKER, Peter F. Sociedade pós-capitalista. 1. ed. São Paulo: PUBLIFOLHA, 1999, p. XI-XII.4 DRUCKER, Peter F. O melhor de Peter Drucker: a sociedade. 1. ed. São Paulo: NOBEL, 2001, p. 118.

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e finalmente o ateísmo, ou seja, a sociedade emancipada que não

precisa mais de Deus. Mesmo entre aqueles que se dizem cristãos,

a ideia é que os povos primitivos precisavam da linguagem

de milagres, etc., mas isso é passado. Assim antecipava-se uma

sociedade cada vez mais secular, com o eventual banimento

da religião. No entanto, o que se vê é que o mundo está mais

plurirreligioso e místico.

Na evolução da área técnico-econômica, as orientações em

vez de satisfazer as necessidades econômicas, destinam-se sim à

criação de exigência hedonistas,5 no paradoxo de um mundo com

mais tecnologia, recursos, mas com maior miséria e disparatados

desníveis sociais.

Na área política, com o aguardado fortalecimento evolutivo

de estados hegemônicos e autoritários, surge a fragmentação dos

grandes blocos políticos dominados mais por questões étnicas

e diferenças religiosas que ressuscitam características típicas de

sociedades tribais; sociedades que permaneciam sufocadas pelo

autoritarismo de estado que não mais as podia conter, como a

multiplicação de microconflitos e microrrevoluções cada vez mais

pontuais nos mais diversos tipos de estados e sociedades.

As análises clássicas sobre o papel da religião,

predominantemente cristã, são invadidas pela multiplicidade de

outras religiões onde o deus não somente pode ser outro, mas

vários. Assim, cada vez mais a discussão voltada aos meios de

expressão e construção da busca do divino e do sagrado restrito não

se restringe ao contexto histórico judaico-cristão. Ela se expande

5 MARTELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna. 1. ed. São Paulo: PAULINAS, 1995, p. 326.

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para a significância de outras expressões religiosas que ganham

cada vez mais corpo e desenvoltura no mundo ocidental. Cada vez

mais este tipo de ocorrência e influência religiosa ganha espaço,

influência e se expande em outros espaços como a militância

em organizações não governamentais, o chamado terceiro setor,

principalmente naquelas engajadas com as questões ambientais.

Paradoxalmente, o que se esperava ser diluído e absorvido agora

toma o caminho inverso e afeta o ambiente sociocultural em

todos os níveis da sociedade ocidental.

Se o destino da religião previsto na modernidade era o da

sua gradual redução como agente influente na sociedade pela

secularização, a realidade pós-moderna mostra outra dimensão.

Um cenário onde a religião, de valor considerado menor e pouco

a pouco dissipável, vem agora, paradoxalmente, levantando-se

mais forte e presente interagindo ativamente nas variáveis dos

tecidos sociais, com peculiaridades próprias. O mundo, de forma

surpreendente e inimaginável para os pensadores modernos,

tornou-se mais religioso e místico do que antes e, ao mesmo

tempo, cético, desconfiado, de olhos baços e tristes.

O cenário não só mudou, mas os métodos e conceitos como

se pressupunha ser o papel da religião devem ser rediscutidos

e analisados no ambiente pós-moderno que introduz uma real

descontinuidade diante da previsibilidade moderna, ambiente dos

outrora postulados que sustentavam a maneira de estudar a religião.

Mudanças paradigmáticas com impactos transculturais trazem um

efeito complicador como aponta Hiebert citado por Bosch:

O velho paradigma e o novo são incomensuráreis; as perspectivas de seus respectivos defensores divergem tanto que se poderia,

36 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

inclusive dizer que estão respondendo a realidades distintas. Embora o mundo em que vivem seja o mesmo para todos, respondem a ele como se vivessem em mundos diferentes [...] Falando metaforicamente, um está jogando xadrez e o outro, damas, sobre um mesmo tabuleiro. 6

Entretanto a questão que se coloca agora é mais identificar

qual é o jogo, mas onde está o tabuleiro? Se é que há tabuleiro.

O que o mosaico do passado mostra ao longo da história

é que Deus se revela e sempre de forma contextualizada dentro

desta ou daquela cultura com os ingredientes próprios que

formam cada época com todos seus particulares elementos.

Agora chega a realidade da emergência da pós-modernidade,

pós-cristã de um mundo neopagão e neorreligioso.

1. SURGIMENTO DA IGREJA EM EMERGÊNCIA

(EMERGING CHURCH – EC) E SUAS FACETAS.7

Dentro do campo da religião, o cristianismo influenciou

6 BOSCH, David J. Missão Transformadora. 3. ed. São Leopoldo. RS: EST, Sinodal, 2002, p. 231.7 Necessário colocar o esclarecimento de entendimento distinto das expressões “emerging” e “emergent” quando utilizadas na literatura ligada ao movimento que acontece no meio da igreja. Tem sido indistintamente utilizadas em obras traduzidas para o português equivocadamente pela mesma palavra “emergente”, como se fossem sinônimas, causando um problema de compreensão e entendimento. Fica mantido o uso dos termos originais em inglês neste artigo para que a diferenciação seja claramente identificada e não confundida já que, possuem significados próprios e distintos. Emerging é o termo ligado ao movimento global, geral. Emergent designa um grupo organizado chamado Emergent Village. Importante ala com identidade distinta das demais expressões dentro do movimento maior da Emerging Church (indicado pela sigla EC). Essa diferenciação foi apontada pelo Dr. Scot McKnight em palestra proferida em 27-26 de outubro 2006. “What is the Emerging Church?” - Fall Contemporary Issues Conference Westminster Theological Seminary e no artigo “Five Streams of the Emerging Church - Key elements of the most controversial and misunderstood movement in the church today” CHRISTIANITY TODAY – publicada no site www. christianitytoday.com em 19 de janeiro de 2007.

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e foi influenciado em cada um dos ciclos do passado

particularmente nas suas transições. É o que Robert Webber

chama de “o último suspiro do paradigma mais antigo” e “o

primeiro sopro do novo paradigma”. Porque nós estamos em

um momento de grande agitação cultural da modernidade para

a pós-modernidade, o século XX pode ser visto como o século

da transição8. Hoje há um inegável momento de enfrentamento

de dificuldades com mudanças culturais na transição de

modernidade para pós-modernidade. O século vinte pode ser

visto como o século da transição – particularmente nos seus

últimos vinte cinco anos – O ciclo do evangelicalismo neste

período interpretado como o último suspiro da modernidade

e o primeiro sopro da pós-modernidade segue cada vez mais em

um novo ciclo permeado de inseguranças e temores.

Reggie McNeal, diretor de desenvolvimento de liderança da

Convenção Batista da Carolina do Sul com mais de vinte cinco

anos de ministério pastoral e treinamento de líderes pastorais,

apresenta o seguinte confronto de realidade diante de pastores e

líderes atuais:

Para você que está satisfeito com as coisas como estão na vida da igreja e na sua vida ministerial, ou se você concorda com uma das seguintes afirmações a seguir:

• Se você edificar a igreja perfeita (da maneira que pensamos sobre igreja), as pessoas virão.

• O crescimento da sua igreja irá automaticamente fazer diferença na comunidade.

• O melhor desenvolvimento dos membros da igreja resultará num evangelismo muito maior.

• A igreja necessita de mais obreiros (para o trabalho da igreja).

8 WEBBER, Robert. Listening to the beliefs of emerging churches. 1. ed. USA: ZONDERVAN, 2007, p. 9.

38 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

• O envolvimento das pessoas com a igreja resultará em discipulado.• Melhores planejamentos irão levá-lo aonde você quer chegar (em

termos de efetividade missional).Se você acredita em alguma destas pressuposições, você está num mundo que, não faz muito tempo, já passou. Pior ainda, se você persistir em seguir com estas pressuposições, você pode estar atualmente obstruindo a Missão de Deus nos dias correntes.9

A questão levantada por McNeal pode ser afastada,

ou mesmo ignorada por qualquer líder pastoral que está à

frente de uma igreja local, ou área de influência institucional

denominacional ou até mesmo em alguma agência paraeclesiática,

porque perturba a paz de sua zona de conforto de pressupostos

eclesiológicos, entretanto a realidade existe.

O surgimento da Igreja em Emergência não é uma

geração espontânea, isolada, autônoma, pontual, nem

mesmo um movimento estruturado a partir de uma pessoa

ou um núcleo organizado que se dissemina na transmissão

de valores, ideias e práticas. Ela faz parte de todo um quadro

que acontece na história. Surge como um movimento que

“emerge” dentro de um conjunto de fatores e em diversos

locais, com uma diversidade de manifestações, mas com

algumas particularidades ligadas ao seu momento histórico,

às culturas geracionais existentes e a um conjunto de

pensamentos e filosofias correlatas.

A pesquisa base de onde são extraídas as informações

que seguem foram coletadas e publicadas no trabalho dos

9 MCNEAL, Reggie. The Present Future – six tough questions for the church. 1. ed. USA: JOSSEY-BASS, 2003. p.17

39Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

professores Eddie Gibbs e Ryan K. Bolger10 com um relato

dessa história de forma concisa e objetiva mostrando pouco a

pouco como são os elementos que vão compondo essa história

e seu surgimento acrescidos de informações coletadas que

passamos a descrever resumidamente.

A fase dos ministérios para a Gen-X.

Nos anos 80, uma preocupação das lideranças pastorais

estava voltada com o grupo de jovens e adolescentes, era a época da

chegada dos primeiros integrantes da chamada Geração-X. Nessa

época, surgem algumas iniciativas de experiências independentes,

mas ainda com a aplicação de mudanças superficiais cosméticas

voltadas à juventude, entretanto preservando na essência os

mesmos modelos que eram aplicados com os grupos mais antigos,

já que vinham obtendo uma razoável dificuldade de comunicação

e penetração efetiva com esses grupos.

Uma das experiências pioneiras nos EUA surgiu em

1986 com Dieter Zander em Ponoma, Califórnia, mais tarde

outros líderes independentes de grande importância vão

surgir na primeira metade dos anos 90 como Chris Seay na

Baptist University Church em Waco, Mark Driscoll, a Mars

Hill Church em Seattle e ainda mais tarde Erwin MacManus

com a Mosaic Church em Los Angeles todos voltados para os

grupos Gen-Xers.

Esse modelo passou a chamar a atenção e ser observado

pelas lideranças das grandes igrejas sendo adotado e reproduzido

10 Eddie Gibbs, professor da cadeira de Crescimento de Igreja e Ryan K. Bolger, professor assistente de Igreja na Cultura Contemporânea na School of Intercultural Studies e diretor acadêmico, ambos no Fuller Theological Seminary.

40 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

em diversas comunidades como uma diversificação funcional

dentro da sua estrutura ministerial destinada a atender o grupo

jovem, mas, ainda como um projeto voltado para o público alvo,

os jovens filhos das famílias das igrejas.

Nessa época, a cultura de departamentalização e

especialização com controles gerenciais nos ministérios das igrejas

vinha em forte ascensão, principalmente nas megaigrejas, cada

vez mais dentro de uma diversificação ministerial especializada e

direcionada na busca de maiores resultados em alcançar nichos

de “mercado”. Dessa maneira, começam a surgir as primeiras

experiências com a introdução dos ministérios voltados para a

chamada Geração-X dentro das igrejas institucionalizadas. Em

1993, uma segunda versão dessa tendência evolui e surge em

cena para o que chamaram de “igreja dentro de uma igreja”,

transformando o ministério jovem como uma igreja com

linguagem própria voltada para a juventude no seu estilo de

adoração, louvor, pregação irreverente e uma liturgia própria.

Entretanto ainda funcionam dentro das igrejas como cultos jovens,

que acontecem em horários e dias alternativos aos dos cultos

institucionais da igreja, e da qual recebem o apoio financeiro e

suporte de instalações como um tipo de diversificação ministerial,

visivelmente observado nas megaigrejas sob a direção e supervisão

da liderança pastoral.

Os líderes pastorais do momento passam a “contratar”,

ou formar, jovens pastores especializados para cuidar desta igreja

jovem dentro de suas igrejas. Na década de 90, surgem o “Next

Level” em Denver - Colorado com Trevor Bron, o “Axis” em South

Barrington (Willow Creek) com Dieter Zander, o “Graceland” em

41Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

Santa Cruz com Dan Kinball, e o “Warehouse 42” em Charlotte

com Todd Hahn.

Como resultado dessas experiências ministeriais e a

ampla projeção que essas megaigrejas tinham, os anos 90 foram

recheados de publicações voltadas para os ministérios com a

chamada Geração-X. O marketing de divulgação e promoção de

estratégias, materiais específicos, táticas de trabalho e um sem

número de conferências temáticas para o segmento jovem dos

Gen-Xers aliados aos demais ministérios que eram desenvolvidos

pelas megaigrejas e outras organizações que os promoviam dentro

de suas estruturas ministeriais.

Paralelamente a todo esse movimento, já vinha acontecendo

no ramo pentecostal outra considerável influência com o

trabalho de John Wimber e a Vineyard, que atinge fortemente

a geração mais jovem nos EUA, Canadá se extendendo até o

Reino Unido. As visitas de John Wimber ao Reino Unido no

início dos anos 80 têm um grande e profundo impacto nas igrejas

evangélicas, especialmente na igreja anglicana, que patrocinaram

diversos seminários para clérigos e líderes leigos. Essa associação

com Wimber e a Vineyard veio se tornar conhecida como a

Terceira Onda11. Por que este fato é importante? Porque no

Reino Unido, virtualmente todos os líderes da “emerging

11 TERCEIRA ONDA – Esse foi um termo cunhado por Peter Wagner com o movimento associado com John Wimber e a Vineyards que se tornou conhecido como Terceira Onda do qual participavam leigos e clérigos anglicanos. Essa nominação por Wagner foi colocada para descrever a ênfase do Espírito Santo que difere tanto do pentecostalismo clássico como do movimento carismático ao se distanciar da busca ostensiva do Batismo no Espírito Santo com o acompanhamento de sinais de falar em outras línguas. Era marcado de forma especial pela forma como Wimber tinha o hábito de apelar para o “convite” da presença do Espírito Santo mais do que “comandar” uma manifestação em particular. GIBBS p.219.

42 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

church” têm suas raízes no movimento carismático ocorrido nos

anos 1980 e início dos anos 90. Entretanto, nos EUA iso não é

tão evidente, embora dois dos líderes mais influentes nas redes

de trabalho da igreja em emergência, Todd Hunter12 e Brian

McLaren13, têm fortes raízes carismáticas da Terceira Onda.

Todavia a grande maioria desses líderes, nem no Reino Unido

nem nos EUA, trazem estilos carismáticos de adoração para

igrejas em emergência14.

Dos ministérios da Geração-X (Gen-X) para o surgimento da

Emerging Church

As estratégias dos ministérios Gen-Xers parecem ser a

solução para os líderes das igrejas, uma forma de atender os

grupos de jovens de suas comunidades, trazendo-os de volta

para a igreja local e promovendo paz e tranquilidade para seus

pais. No entanto, mais mudanças estão por acontecer com

esses ministérios. No meio dos líderes desses ministérios há

cada vez mais um desencantamento que vai crescendo após a

euforia dos primeiros anos de conquista de um espaço próprio

dentro da igreja. O sentimento é de frustração, pois, no final das

contas, descobrem que o que conquistaram é apenas um espaço

temporal, enquanto estão naquela faixa etária para aliviar as

12 Todd Hunter – foi diretor nacional da Associação das Igrejas Vineyard.13 Brian McLaren – foi pastor fundador da Cedar Ridge Church até 2006, é um dos membros fundadores do grupo Emergent Village. Em seu site pessoal apresenta-se como escritor, palestrante e ativista. Autor de vários livros e apontado como uma das principais referências do movimento emergente e formulador do pensamento do Emergent Village. 14 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.219-220.

43Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

ansiedades imediatas do grupo. Logo começam a perceber que

no final nada mudou.

Essa forte mudança pode ser bem percebida em alguns

depoimentos como o de Brad Cecil líder do Axxess em Arlington,

Texas, que rejeita a identificação geracional como um parâmetro

de rotulação muito superficial em sua análise:

Assim como outras pessoas que tenho ouvido, eu entendo que a filosofia de nosso ministério é muito diferente. Eu imagino que cada um fica pensando da mesma maneira padronizada o que somos, mas não é este o caso. Eu desejo ir a conferências com vontade de aprender, porque eu quero aprender diferentes filosofias ministeriais já existentes. Eu estou farto de ouvir boba-gens como: Gen-xers são a geração mais desiludida na história; Gen-xers são cínicos; Gen-xers não são confiáveis porque há um grande número de divórcios entre seus pais, etc. Esta bobagem geracional me incomoda, e eu acho tudo isso muito míope. Eu não consigo aceitar como as pessoas são obsessivamente focadas numa visão de um subgrupo, quando uma enorme mudança epistemológica está acontecendo. Eu nunca confiei em largas generalizações a respeito de qualquer subgrupo.15

O que aconteceu com Cecil não é um fato isolado nem

muito diferente do conflito que Dan Kimball enfrentou enquanto

ocupava a liderança do ministério de Gen-Xers chamado Graceland

em sua igreja.

Nossa liderança da igreja estava dividida em vários departamentos e nos disseram que o ensino da Graceland deveria ser exatamente o mesmo de todo o restante da igreja. O objetivo era uniformidade de tal maneira que todas as coisas fossem mais bem cuidadas e debaixo de um maior controle.Isto me afetou profundamente, e embora não pedissem minha opinião, mas ao contrário eu tinha que liderar a aplica-las.

15 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.33.

44 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

Eu compreendi que eu não poderia mais fazer isto. Todas as mudanças que eu pedia para fazer eram rejeitadas com as razões de que tudo devia voltar ao seu ponto de início. E o que me respondiam era “Nada disso. Continue a tocar a música que vocês tocam, mas pregue as mesmas mensagens que estamos pregando na igreja principal para que haja unidade”. Mas eu comecei a buscar na minha alma questionando, “Porque sinto que isto está errado? O que temos que fazer é simplesmente o mesmo que fazem na igreja principal a não ser a música?” Eu comecei a fazer algumas questões fundamentais como: O que é igreja? O que é ser um pastor? Foi então que eu compreendi que o que tinha principiado como uma discussão de metodologia tornou-se numa discussão de eclesiologia. 16

Da mesma forma, Dieter Zander, que recebeu o convite

de Bill Hybels em 1994 para implantar o projeto de “uma igreja

dentro de uma igreja” na Willow Creek, não passa incólume

no mesmo processo. Depois de uma fase de adaptação local

participando na área de ensino e liderança de grupos pequenos,

Zander, no ano seguinte, passou a liderar o ministério chamado

Axis, conduzindo-o sob sua responsabilidade até o final de 1997.

O relato de Zander sobre sua experiência com o Axis nesse período

traz um quadro semelhante aos anteriores.

Eu advogava em favor da geração Gen-X. Eu queria que os boomers entendessem os Gen-Xers e lhes dessem espaço para participar na condução da igreja. Muito do meu trabalho naquela época foi buscar lhes dar oportunidades de liderança onde não havia nenhuma. Havia uma dispensa generalizada por essa diferença.”Quando eles crescerem e vierem para a igreja principal, o Axis provavelmente não será mais necessário. Este ministério para a Gen-X vai ajudá-los a permanecer por aqui até que cresçam”, foi o que Hybels disse. Eu pensei que estava construindo uma nova etapa que a igreja viria a se tornar, mas no pensamento de Hybels não era nada mais do que um sub-

16 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.279.

45Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

ministério, como uma estratégia para estudantes secundaristas.Quando eu descobri que o Axis não passava de um “tanque de armazenagem”, um lugar para colocar os insatisfeitos até que eles estivessem prontos para a igreja real. Foi aí que eu vi o quanto de tempo eu havia perdido. Ultimamente não creio que o Axis necessitasse ser absorvido no restante da igreja, e Hybels o fez. Mesmo vendo que a “igreja dentro de uma igreja” não funcionou neste caso, eu ainda sou esperançoso sobre este modelo. 17

É nesta segunda metade da década de 90 que começam

a surgir os efeitos de novas forças latentes alimentadas pelos

seguintes ingredientes que vão catalizar mais mudanças:

a) a chegada à idade adulta dos Xers dentro de uma igreja

domindada por boomers – um confronto de voz e espaço;

b) a introdução das influências das mídias digitais de

comunicação e seus efeitos – a adoção de aplicações cosméticas

superficiais pelas gerações mais antigas versus a mudança de

cultura nas gerações mais novas;

c) o fortalecimento das influências pós-modernas para

outras áreas da vida cotidiana além dos debates acadêmicos e

filosóficos;

d) o desencanto com os valores de mercado do mundo

moderno e ansiedade por novas alternativas, especialmente

voltadas para uma espiritualidade crescente nas mais diversas

áreas do conhecimento e ação humana – o descontentamento

com o status quo vigente da igreja;

e) a consolidação da “aldeia global” pluralista, com a

valorização das diversidades étnicas, religiosas e culturais – a

rejeição a modelos reducionistas e simplificadores.

17 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.325-326.

46 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

É nesse momento que começa a ocorrer uma série de

fatos que vão desaguar na redução do foco da ênfase restrita à

categorização de ações centradas em ministérios geracionais.

O trabalho desenvolvido por uma importante organização

interdenominacional voltada para o treinamento, capacitação e

intercâmbio de pastores e líderes chamada Leadership Network18

torna-se um agente catalizador para o que vai acontecer.

No ano de 1997, essa organização promove a segunda

conferência anual chamada Gen-X 2.0 passando a organizar a

YLN – Young Leaders Network – uma rede de diálogos e conversas

entre jovens pastores abordando temáticas em torno da pós-

modernidade. Embora a conferência fosse direcionada ao tema

da Gen-X, o rumo que se seguiu foi para além de meras discussões

sobre técnicas de um ministério geracional.

Na terceira conferência no outono de 1998, pós-modernidade

torna-se o tópico central do “Forum Re-evaluation” organizado por

Doug Paggit para a YLN, e as discussões concentram-se em avaliar

os benefícios e malefícios da pós-modernidade. O consenso

foi de que os desafios evangelísticos para a igreja não eram de

angústias geracionais, mas uma desconexão filosófica com uma

cultura mais ampla. Os desdobramentos dessas discussões geram

uma ampliação dessas discussões, principalmente confrontando

as técnicas ministeriais geracionais que foram se ampliando

nos três anos que se seguiram com o tema da pós-modernidade

continuando a ser o principal assunto da YLN. Passa por uma

18 Leadership Network é uma organização interdenominacional sem fins lucrativos fundada em 1984 com o objetivo de trabalhar e divulgar as experiências e ideias inovadoras que líderes estão aplicando na igreja local em seu crescimento, amadure-cimento e preparo para o futuro. Sediada em Dallas. Site de acesso: www.leadnet.org.

47Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

alteração de sua identificação como uma nova rede chamada

“Terra Nova Theological Project”, base embrionária do que mais

tarde se tornaria o “Emergent Village”.

A história da formação do grupo que se tornaria o porta-

voz da chamada “Emergent Church”, uma forte expressão dentro

do mosaico da “Emerging Church” (EC), é relatada por um de seus

líderes Tony Jones, coordenador nacional do Emergent Village

nos EUA.

Em maio de 2001 nós saímos por nossa conta e sentimos que necessitávamos de um nome, uma bandeira, de uma forma, sob as quais poderíamos nos reunir. Em maio daquele ano, seis de nós começamos a debater sobre diversas opções de possíveis nomes. Foi então que Brian McLaren, um dedicado ambientalista disse: Vocês sabem que quando um especialista em florestas visita uma para determinar sua saúde, ele não sobe nas árvores mais antigas e mais altas. Ao contrário, ele se dobra em seus joelhos e escava em torno do que chamamos de crescimento emergente no chão da floresta. Na ecologia da igreja americana há muitas organiza-ções que estão acompanhando o que acontece com as grandes árvores crescidas, mas nos parece mais interessante ver o que está acontecendo no chão da floresta, no nível da igreja emergente.Foi então que adotamos o nome Emergente e compramos o domí-nio do nome “emergentvillage.org” Passamos a contatar outros ao redor do globo que estavam obser-vando as mesmas mudanças de modernidade para pós-modernida-de que tinha nos intrigado tanto e que, de fato, nos reuniu juntos em 1997. As conexões seguiram com grupos no Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia. O sucesso do livro de Brian “Um novo tipo de cristão”, teve um papel importante de chamar a atenção incrementando ainda mais o Cristianismo Emergente tornando-o uma marca própria, para o bem ou para o mal.19

19 JONES, Tony. 2007_Wheaton_Theology_Conference_-_Tony_Jones.pdf. www.emergentvillage.org. Acessado em: 28.06.2008. Relato extraído do texto de uma palestra que seria proferida no Wheaton College em 2007, que não foi realizada, e que Jones disponibilizou na internet.

48 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

À primeira vista pode se inferir a conclusão de que esse

seria o surgimento do núcleo formador da EC, mas trata-se da

formalização de um segmento organizado inserido no movimento

bem maior e não estruturado. Outros relatos da história de mais

alguns líderes em diversos locais e situações mostram como este

movimento de mudanças já vinha acontecendo.

Karen Ward (pastora da Church of the Apostles, Seattle)

inicialmente via os desafios da igreja num escopo geracional.

Em 1999, ela trabalhava na sede central da ELCA – Evangelical

Lutheran Church of America – em Chicago, denominando a si

mesma uma “burocrata” de igreja. Enquanto lia a respeito da

geração pós-boomers num website episcopal, ela enxergou ali a

perfeita descrição de suas frustrações. Durante o ano seguinte,

ela criou um website (www.emergingchurch.org) para auxiliar

seu trabalho de busca de respostas para suas questões sobre a

igreja. Ela não fazia ideia que “emerging church” viria a se tornar a

nominação de um movimento internacional da igreja20.

Entretanto essas manifestações não são restritas, uniformes

ou mesmo alinhadas com o grupo que originou o Emergent

Village, vários líderes vão consolidando posições próprias

nesse ambiente, quer isolados, ou mesmo como um tipo de

intercâmbio de ideias.

Um desses líderes é Mark Driscoll. No início de 1996,

quando estava com vinte cinco anos de idade e seis anos de

uma vida de fé em Cristo, junta-se a um grupo de pessoas

como ele e planta uma igreja em Seattle. O nome escolhido

20 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005, p. 30.

49Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

foi Mars Hill (a colina de Marte), referência ao local onde

Paulo pregou para a grande cidade pagã de Atenas que tinha

uma relevância cultural por causa de seus artistas e poetas.

Ele relata que eles tinham um sonho louco de fazer diferença

numa das maiores cidades americanas não alcançadas pela

igreja, onde apenas 8% da população são cristãs evangélicas

e 86 % não frequentam nenhum tipo de culto de qualquer

religião durante a semana21.

Outro importante líder é Rob Bell. Depois de ter sua

formação teológica no Wheaton College e completar seu

mestrado no Fuller Seminary, foi convidado para estudar com

Dr. Ed Dobson e cooperar na Calvary Church em Grand Rapids,

onde por vezes assumia a pregação nos cultos de sábado à noite.

Foi quando Bell tomou a iniciativa de iniciar um novo tipo de

comunidade e que se chamaria Mars Hill, baseada na mesma

experiência de Paulo em Atenas. Em fevereiro de 1999, Bell

fundou a Mars Hill Bible Church, que apesar da semelhança

com o nome da igreja fundada por Driscoll são totalmente

independentes e distintas. Ainda outras lideranças surgem na

mesma época como Chris Seay (Ecclesia Church em Houston) e

Erwin MacManus (Mosaic Church em Los Angeles).

Para avaliar e constatar o efeito diverso do surgimento de

um despertamento não articulado intencional e organizadamente

que vai desembocar no grande movimento da igreja em emergên-

cia, Gibbs junta como documentos à sua pesquisa a transcrição de

cerca de 50 biografias feitas de próprio punho de líderes desse mo-

21 DRISCOLL, Mark. Confessions of a reformission rev.: hard lessons from an emerging missional church. 1. ed. USA: ZONDERVAN, 2006, p. 9.

50 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

vimento – pesquisa restrita aos EUA e Reino Unido – que foram

reproduzidas na ordem em que iam sendo cronologicamente rece-

bidas. A partir dos relatos biográficos publicados na pesquisa do

Dr. Eddie Gibbs e Ryan Bolger anexos na obra Emerging Churches:

Creating Christian Community in Postmodern Cultures, foi realizada a

extração de dados cronológicos importantes e identificáveis infor-

mados em seus relatos pessoais que o autor deste artigo compilou

em duas tabulações que ajudam a analisar o perfil do grupo22:

a) Primeira Tabulação: Qual a data de nascimento do

pesquisado?

Para identificar o grupo a tipificação do grupo geracional:

Nascimento quantidade1950-1955 02

1956-1960 10

1961-1965 07

1966-1970 09

1971-1975 13

1976-1980 02

O resultado conclui que na amostragem de 46 líderes

identificados: 22 são originários da faixa geracional final dos

boomers e 24 dos Xers, com uma média ponderada de data de

nascimento em torno de 1965. O momento crítico que coincide

com a fase de forte transição entre dois grandes grupos geracionais,

os boomers e o Xers.

a) Segunda Tabulação: Qual a data de “despertamento” do

22 Compilação dos dados e elaboração das tabelas realizadas por Rogério Hernandez de Oliveira.

51Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

pesquisado para a “emergência”?

Identificação do marco cronológico do momento em que

foi manifestado o seu despertamento para essa busca no tempo

geral e pessoal.

Época do despertamento quantidade1980-1990 04

1991-1995 11

1996-2000 22

2001-2005 08

O momento do que foi chamado de “despertamento para

emergência” identificada em uma amostragem de 45 biografias,

onde se vê a data/época, resulta em uma idade média de 32 anos

o marco do acontecido e que o momento cronológico médio pon-

derado do acontecido geral foi o ano de 1997, meados da segunda

metade da década de 90 registrando 22 dos 45 casos identificados.

Daí para diante o movimento passa a ganhar corpo e se

manifestar em vários lugares, com pessoas diferentes, em igrejas

diferentes, manifestações diversas, com uma pluralidade cultural

de jeitos, modos e discursos, mas com um cenário de fundo muito

semelhante entre si e acontecendo cronologicamente quase que

na mesma época.

2. DO SURGIMENTO DA IGREJA EM EMERGÊNCIA

(EMERGING CHURCH - EC) AO DESPERTAMENTO

DENTRO DA ECLESIA JÁ ESTABELECIDA

Todo este movimento não passa despercebido para alguns

52 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

líderes dentro da igreja vigente23. A percepção dos sinais da mudança

do cenário passa a ser objeto de observação de alguns missiólogos

e estudiosos nas áreas de plantação de igrejas e treinamento

de lideranças. Essa preocupação vai ocorrer tanto em algumas

denominações históricas como em organizações independentes

como a Leadership Network. Essa agência interdenominacional

decide fomentar e dar espaço a oportunidades com os grupos dos

novos pastores líderes. Ela propicia esse espaço com a formação

de um grupo adicional intitulado Young Leaders em seus encontros

regulares. Paralelamente, no mesmo viés, surgem também

alguns líderes dentro de denominações históricas organizadas

preocupados em observar e discernir sobre o que vem ocorrendo.

São criados fóruns de discussão e de compartilhamento de

experiências em seus programas com avaliações e preocupações dos

efeitos dos impactos das forças pós-modernas no crescimento da

igreja, desenvolvimento de líderes no seu alcance aos “unchurched”,

assim como o desempenho ministerial neste novo cenário.

Esse grupo tem algumas características interessantes.

Em primeiro lugar, o momento em que despontam com

suas inquietações e preocupações coincide com o período do

despertamento do movimento da EC no final dos anos 90, o que

vai se mostrar como um tipo de pré-organização da reação deste

grupo de líderes emergentes.

Em segundo lugar, e na sua grande maioria, são pessoas

com uma experiência de pastoreio em igreja local já consolidada,

alguns com mais de 20 anos de ministério ativo com trânsito

23 O uso do termo “vigente” é adotado para identificar a igreja contemporânea dominante nesta época alinhada com a geração boomer no seu modo de ser, pensar e estruturar a igreja local.

53Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

no meio pastoral e de lideranças quer denominacionais

ou paraeclesiásticas.

Em terceiro lugar, são pessoas integrantes da geração boomer,

mas com preocupações bem visíveis da necessidade de uma

dinâmica que não deixe a igreja estacionada no tempo e no espaço

alienada das mudanças que vêm ocorrendo, principalmente nos

novos grupos geracionais.

Em quarto lugar, esse grupo, ao que transparece, busca a

criação de um espaço de diálogo e debates não com a nova EC e

seus integrantes, mas seu público alvo são os líderes e as igrejas já

estabelecidas no status quo vigente que eles entendem necessitar

uma renovação.

Em quinto, boa parte desses líderes integram grupos de

trabalhos comuns e diálogos cooperativos através de organizações

como a Leadership Network em eventos para lideranças

interdenominacionais. Entre os representantes desse grupo

destacam-se: Ed Stetzer, missiólogo diretor da área de plantar

igrejas na Convenção Batista da Carolina do Sul e diretor da

Life Way Research, Reggie McNeal, diretor de desenvolvimento

de lideranças também na Convenção Batista da Carolina do Sul

tambén na Leadership Network, Alan J. Roxburgh com a Allelon

Missional Leadership, Earl Creps, doutor e diretor do programa

de ministérios no Seminário Teológico das Assembléias de Deus

(AGTS) em Springfield, Neil Cole, fundador e diretor da Church

Multiplication Associates, e outros mais.

À medida que o grupo vai se robustencendo ao longo da

segunda metade da primeira década do século XXI, vem deles

boa parte do surgimento de publicações voltadas para essas

54 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

preocupações e sua aglutinação em torno de uma temática central,

que é a implantação de uma mentalidade “missional”. Não se

alinham direta e explicitamente com vínculos com as versões pós-

modernas dos novos líderes da EC, entretanto buscam manter o

diálogo e cooperação com alguns deles, em especial com aqueles

que adotam uma linguagem evangelical como Mark Driscoll.

O grupo passa a ser identificado como integrantes de

um movimento missional que trabalha por uma transição da

igreja estabelecida para a realidade de um mundo que está se

modificando fortemente. Uma forte referência de construção do

pensamento em todo o movimento é construída a partir de textos

e reflexões do teólogo e missionário inglês Lesslie Newbigin, bispo

de Madras na India.

Além desses líderes ministeriais, alguns estudiosos da

área teológica, acadêmicos de seminários, passam a estudar

o movimento, pesquisá-lo e estabelecer um diálogo com seus

integrantes contribuindo no campo da reflexão teológica

e da compreensão da sua linguagem, sua mensagem e suas

inquietações. Pelo menos duas importantes figuras se destacam

pela forma como dialogam e trabalham com as pessoas, propostas

e inquietações da EC.

Uma é o Dr. Eddie Gibbs24, professor da cadeira de

crescimento da igreja, auxiliado por Ryan K. Bolger, professor

assistente de igreja na cultura contemporânea, ambos do Fuller

Theological Seminary na California, que no período de 2000 a 2005

realizaram uma ampla pesquisa de campo com líderes da EC nos

24 O Dr. Eddie Gibbs possui uma obra editada em português: Para onde vai a Igreja: mudanças na maneira de conduzir ministérios. ESPERANÇA, 2012. Originalmente editada em 2000 com o título CHURCHNEXT.

55Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

EUA e Reino Unido, publicada em 2005, e ainda outras obras

de autoria de Gibbs tratando de balizamentos para lideranças e

eclesiologia para esses novos cenários.

Outro é o Dr. Scot McKnight25, professor de estudos

religiosos na North Park University, em Chicago, especilizado em

estudos a partir da vida de Jesus. Ambos são reconhecidamente

respeitados não só por seus pares, mas principalmente pelos

diversos líderes de tendências e matizes da EC pela sua capacidade

de diálogo com eles.

Apesar de não serem considerados membros integrantes do

movimento da EC são figuras importantes no relacionamento,

diálogo e aprofundamento da compreensão do pensamento e

formulação de pontos importantes que o movimento questiona

e propõe para a igreja.

A fragmentação da Emerging Church em diversas faces

Qualquer tentativa de tipificação simplista da EC

inevitavelmente incorrerá em equívocos, uma vez que ela é por

natureza fragmentada, diversa, não coordenadamente estruturada,

mas um grande movimento que “emerge” num caldo de muitas

e diversas forças que influenciam e suscitam formas de expressão

e pensamento das mais diversas, mesmo com um relativo corpo

de características em comum. É um retrato da fragmentação e

multiplicação das faces de uma humanidade que vem passando

por uma transição de mudanças paradigmáticas que ainda estão

em efervescência e não se acomodaram, o que traz uma série de

25 O Dr. Scot McKnight possui uma obra editada em português: O Credo de Jesus. ESPERANÇA, 209. Originalmente editada em 2004 com o título The Jesus Creed.

56 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

dificuldades de análise e interpretação, principalmente por ser

um processo em pleno andamento.

Na análise histórica da evolução do movimento da EC,

uma das marcas que chama a atenção ainda é outra faceta que

pode ser identificada exatamente pela sua ausência, e não pela

sua ascensão, que são as expressões pentecostais e neopentecostais

no novo cenário. Quais são? Como se manifestam? Existem?

Curiosamente todos os trabalhos de pesquisa trazem um forte

silêncio sobre essa faceta. Essa outra via existe?

Se as mudanças não são basicamente nucleares no que diz

respeito à essência da fé cristã, mas no sentido das mudanças

do ambiente moderno para o pós-moderno e do homem

contemporâneo, como ficam as expressões eclesiais pentecostais

e neopentecostais neste novo ambiente e na vida deste homem

em transição?

Na realidade, a única observação sobre o assunto constou

de apontamento identificado na pesquisa de GIBBS, quando

questiona: há grupos ou pessoas de origem pentecostal na EC?

No Reino Unido, virtualmente todos os líderes da “emerging church” têm raízes no movimento carismático (alguns na Terceira Onda*26, outros não) nos anos 80 e início dos anos 90. Nos EUA isto não é tão evidente, embora dois dos líderes mais influentes nas redes de trabalho emerging church, Todd Hunter e Brian McLaren, tenham fortes raízes carismáticas da Terceira Onda. A grande maioria, todavia, nem no Reino Unido, nem nos EUA, estes líderes trouxeram estilos carismáticos de

26 TERCEIRA ONDA – Este foi um termo cunhado por Peter Wagner com o movimento associado com John Wimber e a Vineyard que se tornou conhecido como Terceira Onda do qual participavam leigos e clérigos anglicanos. Esta nominação por Wagner foi colocada para descrever a ênfase do Espírito Santo que difere tanto do pentecostalismo clássico como do movimento carismático.

57Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

adoração para igrejas em emergência.27

Não existem ou ainda não emergiram? Se ainda estão

por se manifestar de forma e peso mais evidente no cenário

eclesiástico, essa é uma forte possibibilidade que não pode ser

afastada. À medida que as atuais gerações que ocupam a liderança

envelhecem e são sucedidas por novos grupos que surgem neste

novo meio ambiente, a vertente pentecostal vai construir sua

própria face nesse mosaico. Um forte indicador de uma possível

tendência pode ser observada no fenômeno ímpar com a Hillsong,

uma igreja pentecostal australiana em Sydney, integrante das

Assembléias de Deus, liderada pelo pr. Brian Houston28. Uma

igreja que se tornou conhecida pelo seu vigoroso ministério de

louvor com a liderança de Darlene Zschech, Reuben Morgan, Joel

Houston, Marty Sampson entre outros com o destaque para o

ministério jovem chamado UNITED, que já fez diversas turnês

com suas bandas ao redor do mundo. No entanto, é na pesquisa

dos seus registros discográficos e publicações29 que se encontram

alguns dados interessantes que fogem da percepção superficial das

músicas e vídeos tais como:

27 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.219-220.28 Brian Houston, pastor fundador da Hillsong, também já foi presidente das Assembléias de Deus na Austrália e presidiu a Associação Nacional das Igrejas Cristãs em seu país, notadamente voltado para uma predominante linha de pregação na vertente da confissão positiva29 Essas observações foram extraídas do estudo do conjunto das informações que constam em toda a discografia e videografia publicada no período de 1996 a 2008, incluindo outras mais colhidas no site da igreja www.hillsong.com, e nos livros editados pela própria Hillsong: HOUSTON, Bobbie. Heaven is in this house. MAXIMISED LEADERSHIP. 2001; HOUSTON, Brian, et al The church that I see. HILLSONG. 2003; A´BELL, Julia. Youth Ministry for a new millennium generation. EMPOWER TEAM. 2005.

58 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

- é uma igreja que tem um foco intencionalmente

direcionado para as gerações mais jovens;

- o envolvimento ativo de adultos, jovens, adolescentes é

voltado diretamente para os grupos etários imediatamente abaixo

dos seus, isso pode ser verificado nas lideranças dos trabalhos

com os jovens (UNITED) e nas crianças (Hillsong Kids);

- a forte transição geracional de lideranças ministeriais

ocorrida em meados de 2000 a 2001 resultou na mudança da

linguagem visual e boa parte do conteúdo de seus trabalhos,

sem, no entanto, alterar o corpo do governo da igreja (os

anciãos/presbíteros);

- a intencional abertura de espaço e sucessiva renovação

para jovens revelações que transitam e sucedem lideranças mais

antigas, principalmente onde há maior visibilidade passando para

apoio e supervisão;

- a ocupação da linha de frente ministerial na execução dos

projetos externos da igreja pelos grupos das gerações mais jovens;

- a criação de espaços que viabilizam a criatividade nas mais

diversas formas de artes aplicadas para expressões, inclusive com o

College com cursos específicos na área de TV e mídia visual, além

das produções de grandes eventos, gravações de CDs e vídeos.

Essa pode ser uma sinalização da construção de caminhos e

formas que possam emergir no viés pentecostal contemporâneo

ocupando um espaço significativo e, por isso mesmo, precisa

ser observada mais atentamente além da simples audição de

suas músicas.

Tentar analisar a EC é muito mais complexo do que se

estudar os movimentos e eventos da história passada da igreja

59Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

nos séculos e eras já transformadas em memórias na clássica

ortodoxia da construção do conhecimento. Estudos assim como

este não são como o do pesquisador da anatomia do corpo

humano, que desenvolve seus estudos em corpos de cadáveres,

inertes conservados no formol. Ao contrário, analisar e estudar

a EC não pode ser tratado dessa forma. É como buscar entender

o funcionamento de um corpo vivo, que reage, sente dor,

tem reflexos e há o risco de comprometimento da sua própria

integridade, pois é, em última instância, como dissecar e cortar

com o bisturi a si mesmo e ainda sair vivo e melhor capacitado

para viver a vida.

Um quadro muito simples de todos estes elementos que

compõem esse cenário é que a partir de meados da segunda

metade da década de 90, o que eram algumas expressões isoladas

se tornam fortes influências e, de certa maneira, trazem também

consigo algumas heranças de seu passado imediato com fortes

marcas de diversidade plural, não só entre cada grande grupo, mas

mesmo dentro de cada vertente. Não há uniformidade e, mesmo

dentro de tendências comuns, há fortes conflitos de opinião,

de formas de expressão, de construção de soluções. Some-se a

tudo isso o atual quadro fragmentado da igreja contemporânea

que continua em plena ação com o qual se sobrepõe este novo

conjunto de forças.

O resumo do quadro histórico da evolução do cenário

eclesiástico é mais complexo e diverso do que se imagina, pois, não

se trata de uma simples sucessão de formas ou pensamento, mas

de uma sobreposição de expressões que ainda vive a turbulência

de forte transição paradigmática que ainda não se acomodou e

60 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

está em transformação.

Seriam os líderes e as comunidades alinhados com o

pensamento e as propostas do grupo organizado do Emergent

Village uma nova versão pós-moderna da igreja liberal,

principalmente nos EUA? Algumas opiniões de importantes

figuras como Scot McKnight assim diagnostica e aponta que

uma das fontes que alimentam o pensamento daqueles assim

identificados tem a forte influência da agenda política de

temas e propostas da plataforma política do partido democrata

norte-americano30.

Outros líderes independentes que mesmo com algumas

diferenças de opinião alinham-se com uma postura bíblica

evangelical como Driscoll, que sustenta a afirmação de ser:

primeiro cristão, em segundo evangelical e em terceiro missional31.

Seriam eles uma nova edição paralela da ala evangelical dos

seeker services das megaigrejas modernas, dos grandes líderes

dos últimos 20 anos? Como podem ser chamados os pastores e

líderes influentes em denominações ou agências paraeclesiásticas

que buscam novos caminhos para adequar a igreja atual para os

novos cenários? E ainda, como serão as respostas pentecostais e

neopentecostais para adiante?

3. O QUE PODE ACONTECER DAQUI PARA DIANTE?

Haverá possibilidade de diálogo e cooperação conjunta

30 McKNIGHT, Scot. FIVE STREAMS OF THE EMERGING CHURCH - Key elements of the most controversial and misunderstood movement in the church today. CHRISTIANITY TODAY. www.christianitytoday.com. Postado em: 19/01/2007. Acessado em: 06.05.2008.31 Declaração de pontos centrais de crença do “The Resurgence” dirigido por Mark Driscoll. www.theresurgence.com. Acessado em: 10.07.2008.

61Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

debaixo do mesmo teto entre líderes que emergem e a sua geração

precedente? Até mesmo para essa pergunta as respostas podem

ser mais um elemento de incertezas e de possibilidades. Gibbs

questionou alguns líderes sobre essa questão e foi interessante a

sua conclusão ao observar que entre líderes baseados no Reino

Unido e outros nos EUA para a seguinte questão: “É possível

que congregações modernas e pós-modernas coexistam dentro de uma

igreja local”?32

A resposta obtida com líderes no Reino Unido foi de que

ainda não ocorreu, entretanto, creem que existe a possibilidade

para um espaço comum em que líderes evangelicais e pós-

evangelicais trabalhem lado a lado. Justificam essa avaliação

considerando que no Reino Unido há uma cultura de abertura

para novas coisas a serem experimentadas em comum e que o

caminho para essa experiência já foi pavimentado anteriormente

no diálogo e interação entre a Igreja da Inglaterra e as igrejas

carismáticas ocorridas desde a década de 80, o que lhes daria

uma flexibilidade suficiente para implementar nessas recém-

formadas comunidades.

Já na consulta norte-americana encontra-se um histórico

precedente bem conflituoso. A convicção primária é de que tanto

evangelicais como pós-evangelicais não conseguirão compartilhar

a liderança, muito menos desenvolverem ações comuns, seus

históricos vêm da formação de novas comunidades totalmente

desvinculadas das estruturas das igrejas existentes. Alguns outros

líderes norte-americanos até esperam que isso possa acontecer um

32 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p. 39-40.

62 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

dia, entretanto duvidam de que venham a ver isso acontecer.

Por outro lado, a experiência de transições e convívios

comuns entre grupos de culturas e gerações distintas é a marca que

se observa na experiência de aplicada pela liderança da Hillsong

na Austrália, que ainda segue num processo de evolução a ser

observado nos anos adiante e seus impactos além-muros, dada à

sua grande influência nas gerações mais novas.

Gibbs crê que essas variações têm a ver com diferenças

culturais do próprio povo como das diferenças históricas na

formação tanto da igreja britânica onde há uma marca de busca

ou de intenção de uma possível e tolerante convivência, como

a igreja americana no seu perfil de confronto de tendências

com conflitos e quedas de braços em disputas de espaços. E

ainda acrescentamos o exemplo australiano onde a integração

foi intencional e amigavelmente implementada sob a direção

da liderança institucional, comandada por membros de uma

geração mais antiga convivendo com os novos líderes das gerações

emergentes. Se há um fator que concorre para essas incertezas,

ações e reações dos seus agentes é o confronto das diferenças, entre

novas e antigas aspirações, visões e práticas que se confrontam com

pessoas novas e antigas que debatem entre si, com suas culturas e

formas de desenvolver seu crer e expressar sua fé, mesmo que seja

em torno do mesmo Deus.

Esse confronto não é novidade na história humana. Cada

vez que os paradigmas estabelecidos passam pela turbulência de

mudanças, isso acontece seguindo a dinâmica do seu cenário

específico e a conjugação de forças e discussões envolvidas. A

história da formação do movimento da Emerging Church parece

63Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66

trazer o mesmo desafio hoje, e as saídas perseguidas nesse

momento histórico, principalmente nos EUA, parece repetirem

os mesmos discursos condicionais: desde que se “integrem”,

desde que se “comportem”, desde que se “limitem a fazer o que

quiserem”, mas dentro do “espaço deles” ou que busquem se

estabelecer por conta própria, em outro lugar. Essa história não é

simples nem é um desenrolar de aceitações, compreensões cheias

de serenidade e compreensão. A experiência humana passada

sugere que é permeada de conflitos, dificuldades, separações. A

desacomodação é parte da nossa contemporaneidade marcada

pela diversidade plural e a fragmentação de estruturas e formas

conhecidas, consideradas estáveis e seguras.

A história dessa primeira expressão visível mais ampla do

movimento traz um importante ingrediente a ser considerado, que

é a maneira como a liderança sustentadora do status quo vigente da

igreja lidou com o surgimento de novas aspirações de alguns líderes

e mais precisamente entre jovens com aspirações diferenciadas

daquelas já estabelecidas. A dificuldade de estabelecer um diálogo

que leve em conta a possibilidade de ajustes conjuntos observa-se

uma reação que beira a intransigência e intolerância para com

qualquer manifestação que possa manifestar um tipo de risco aos

modelos vigentes e, por consequência, um descaso de avaliação

humilde prevalecendo certa arrogância. A reação de fechamento

de espaços gera uma contrarreação em insurgências locais e o

surgimento de comunidades alternativas extraespaço institucional.

Em nome da preservação ou busca da verdade, destroem-se as

possibilidades de crescimento de corpo com diversidade.

O conjunto das histórias pessoais dos recentes líderes que

64 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

foram pesquisados e encontrados nos registros das informações já

coletadas na pesquisa traz um detalhe extremamente importante

a ser considerado, que é o fato de que esses fragmentos dos relatos

não são reduzidos a poucos e menores eventos pontuais, mas são

remetidas a diversos locais, com diversas pessoas, em uma época

de tempo quase que comum e sem uma articulação conjugada ou

orquestrada por um ou mais polos. Elas se conjugam quase que

aleatoriamente como elementos de mudanças que vão acontecendo

diante de um cenário bem complexo ao fundo. Um cenário que é

mutante, inconstante, influenciado pela ascensão do pensamento

pós-moderno, às transformações sócioculturais e religiosas globais

e locais, e potencializado pelos impactos das tranformações das

mídias de comunicação com seus mecanismos de construção,

decodificação e interpretação da verdade conjugado com as

sucessões geracionais. Suas características são de um ambiente

complexo e quase caótico para quem está acostumado com os

modelos de igreja vigentes na maioria das comunidades locais do

final do século XX, ainda imersos na cultura da modernidade.

E o homem, como foco de atenção da ação da eclesia,

está passando por uma transformação onde as manipulações e

controles da modernidade estão mudando, o que significa que as

práticas e métodos de lidar com ele se realinham a partir de outras

formas de relação. Essa é uma antevisão que Drucker já sinalizou

sobre a relação das instituições com o homem baseadas numa

prática de “suborno”, de explorar a “ganância” das pessoas, no

seu prazer e ambição pessoal que tem sido a prática destes tempos

modernos mais recentes, terá que ser modificada satisfazendo seus

valores e atribuindo-lhes reconhecimento e poder social, através da

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sua transformação de subordinados em colegas e de funcionários,

bem remunerados, em parceiros33. Essa mesma tendência que

Drucker aponta para o campo das organizações do trabalho,

particularmente com os trabalhadores do conhecimento, já é uma

realidade nas organizações do terceiro setor e, particularmente, a

nova fronteira para a igreja e suas organizações conexas aprender

a lidar com seus membros. A história da EC, com seus acertos e

desvios, é o atestado de uma realidade que já chegou.

A visão que se descortina é do aumento de fortes

transformações e mutações eclesiais que surgem sem desaparecer

o passado. Há sobreposições, interações, divergências, novos

aprendizados e também erros e acertos. Esse é também um retrato

do homem contemporâneo, que com outros se ajunta e se agrupa

como igreja local, se alegra, entristece, trabalha junto com outros,

discorda, conflitua e até se dividem, em nome de Deus, de uma

visão particular e pessoal. Ao que parece, a recente história da

igreja, de emergentes ou não, também traz consigo estas mesmas

marcas que seguem redesenhando a eclesiologia contemporânea.

REFERÊNCIAS

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DRUCKER, Peter F. Sociedade pós-capitalista. 1. ed. São Paulo: PUBLIFOLHA, 1999.

33 DRUCKER, Peter F. O melhor de Peter Drucker: o homem. São Paulo: NOBEL, 2001, p. 190.

66 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica

________ O melhor de Peter Drucker: a sociedade. São Paulo: NOBEL, 2001.

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