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Tânia Gouveia de Sousa�
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AS NOVAS FERREIRINHAS

DO DOUROFOMOS À PROCURA DAS MULHERES QUE, POR ESTES DIAS, MANDAM NA REGIÃO DO DOURO,

SEGUINDO OS PASSOS DA PIONEIRA D. ANTÓNIA ADELAIDE FERREIRA. NAS PRÓXIMAS PÁGINAS,

FALA-SE APENAS NO FEMININO L U Í S A O L I V E I R A L U C Í L I A M O N T E I R O

Tânia Gouveia de Sousa�
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e há 20 anos lhe tivessem traçado uma linha do futuro que a levaria a trocar Lisboa pela região do Douro, Sandra Tavares da Silva soltaria uma garga-

lhada perante tal improbabilidade. Afinal de contas, acabara de chegar de Itália, do seu mestrado em Enologia, nas horas vagas continuava a fazer uma perninha como modelo, e, note-se, nunca tinha pisado território duriense.

No entanto, foi mesmo lá parar. E a seu pedido, para fazer um estágio de vindima, na quinta do amigo Cristiano Van Zeller, na altura em que estava a lançar o Vale D. Maria. Em 1999, só ele lhe conce-deu essa oportunidade. Todos os outros torceram o nariz à menina bonita que vinha de Lisboa, com um “canudo” em Agronomia – e essa desconfian-ça havia de se prolongar por mais um ano, até se dissipar por completo.

O Douro e a sua tradição, a sua beleza e o seu potencial mexeram tanto com ela, que nunca

Assim que se chega à Região Demarcada do Douro, ela arrebata. E pensa-se logo em quem se terá lembrado de plantar vinhas nestas encostas íngremes, que hoje lhe dão um floreado tão especial. O universo da viticultura está tradicionalmente nas mãos de homens, já se sabe, mas aqui, por entre estes socalcos, encontram--se muitas mulheres que não se intimidam com a geografia difícil nem se incomodam se forem olhadas de soslaio. Até na Casa do Douro as quotas têm vindo a subir – hoje, entre os conselheiros que representam os viticultores, a proporção já é de quatro para dez. Por aqui, diz-se que elas têm mais capacidade para interagir com os outros produtores e com o pessoal e estão à vontade para estabelecer parcerias, o que neste negócio – e neste local do País, em que as famílias senhoriais sempre estiveram muito viradas para si próprias – faz realmente a diferença. A presença feminina no Norte será ainda lastro deixado pela mítica Ferreirinha? Nas próximas páginas vamos conhecer sete mulheres que estão a mudar a face do Douro.

A MENINA DE LISBOAPrimeiro apaixonou-se pelo Douro, depois por um enólogo do Douro. O casal comprou uma vinha e hoje é ela quem gere esse negócio familiar

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Tânia Gouveia de Sousa�
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A PRIMEIRA DE SEMPREMais de 200 anos depois de D. Antónia Adelaide Ferreira (1811-1896) ter vindo ao mundo, não se hesita em escrever que ela foi uma mulher à frente do seu tempo. Nascida na Quinta de Travassos, em Loureiro, então uma pequena vila a oeste do Peso da Régua, em miúda aprendeu a fazer renda e a cozinhar, mas cedo seguiu a tradição da família, que andava há três gerações a comerciar vinhos, e rapidamente os internacionalizou.Tudo, aliás, parece ter acontecido na sua vida muito cedo. Casou-se aos 23 anos, com um primo também abastado, e enviuvou aos 33, assumindo sozinha a liderança dos negócios da família. Cinco anos mais tarde, só da Quinta do Vesúvio, uma das muitas propriedades que veio a ter no Douro, saíam 700 pipas de vinho do Porto.Uma mulher à frente de uma empresa era coisa rara na época – não podemos esquecer-nos de que estávamos em meados do século XIX –, mas o dedo só foi apontado na sua direção quando se exilou em Londres para resguardar a filha de um “rapto”. Maria da Assunção tinha apenas 11 anos; era o que mais faltava o duque de Saldanha querer casá-la com o seu primogénito.Ela própria haveria de se casar e de enviuvar novamente, regressando então ao Douro, onde era conhecida como “Ferreirinha”. Combateria como poucos a filoxera, essa moléstia que quase dizimou por completo as videiras da região, aproveitando para comprar a preços baixos várias quintas. Mas nem por isso a olharam de lado. Quando morreu, aos 84 anos, os jornais lamentaram a perda desta “mãe dos pobres”, dando conta de um cortejo com quase quatro quilómetros, tantas eram as pessoas a acompanhar o coche fúnebre. R.R.

mais de lá saiu. Já não queria voltar às sessões de fotografia, estava era desejosa de calçar as botas e entrar pela vinha adentro. A família viu-a fazer as malas, de coração apertado. “Naquela época, de-morava-se quase sete horas a chegar aqui”, lembra. Ainda por cima, imaginavam-na antes embrenhada na Quinta Choca Palha, que entretanto haviam adquirido em Alenquer. Hoje, Sandra vai uma vez por semana a Lisboa para tratar desse negócio dos pais. Os restantes dias, passa-os entre Vila Real, onde vive para que os três filhos tenham acesso a melhor educação, e a sua herdade no Douro, de onde sai o vinho Pintas.

Passou 15 anos no Vale D. Maria, enquanto res-ponsável pela viticultura. E foi uma bela escola, nos melhores anos de sempre. “Tive a sorte de aqui che-gar quando estava tudo a começar novos projetos e éramos jovens, solteiros e sem filhos... Andávamos sempre juntos, a partilhar experiências. Criaram-se amizades fortes, apesar da concorrência. Esta aber-tura foi fundamental para o Douro.” Neste contexto, conheceu o enólogo Jorge Serôdio, por quem se apaixonou e com quem se casou, vai fazer 18 anos. Com ele, comprou uma adega e uma vinha perto do Pinhão, não uma casa, como costumam fazer os recém-casados. Foram crescendo devagarinho, mas com consistência – hoje, Sandra comanda dez empregados a tempo inteiro, fora os eventuais para a vinha, sempre em modo familiar. Entretanto, compraram a Quinta da Manoella, onde têm mais vinha e é lá que hão de construir uma casa para morar. “Sempre fui obstinada, teimosa e humilde. Já todos perceberam que vim para aqui trabalhar e aprender, sem esquecer as tradições.” A sua receita tem resultado infalível.

SANDRA TAVARES DA SILVA47 ANOS

EMPRESAWine & Soul

PRODUÇÃOCom as uvas dos 30 hectares da quinta, produzem-se 90 mil garrafas por ano de vinho Pintas, tinto Character, branco Guru, Porto Vintage Pintas e Porto 5G

RITUAL“Todos os dias, de manhã, vou à vinha. É lá que estou em paz e focada só na terra, afinal de contas aquilo que sempre me apaixonou.”

Tânia Gouveia de Sousa�
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pesar de ter nascido em Vila Real, Ma-ria do Céu Gonçalves só tem memórias da sua infância em França, para onde emigrou com os pais, com apenas 2

anos. Foi lá que se formou em Economia e criou uma empresa que explora o mercado da saudade. A Quinta da Pacheca era apenas uma das muitas marcas que representava, quando começou a ter problemas financeiros e a não ter capacidade para exportar os produtos de que Maria do Céu preci-sava em França, estávamos em 2011. A empresária deslocou-se então ao Douro, para perceber o que realmente se passava com os seus clientes. Encon-trou uma quinta maravilhosa, “um diamante que não estava polido”. Não foram precisas mais de três semanas para chegar a acordo com os antigos donos, a família de José Serpa Pimentel. Atirou-se ao negócio sem pensar muito no facto de não ter qualquer conhecimento de agricultura, coisa que resolveu deixando, durante um ano, 25% nas mãos dos antigos proprietários e mantendo Maria Serpa Pimentel como enóloga, e o seu irmão, José, como comercial responsável pelo mercado português. Teresa, a matriarca da família, continua a viver numa elegante casa, na quinta.

A vida de Maria do Céu, está bom de ver, nunca mais foi a mesma. Passou a viver entre cá

e Orleães, num constante vaivém de aviões, e a debruçar-se sobre o tema da viticultura. Ouviu os ensinamentos de quem sabia da poda, leu muitos livros, consultou a internet. “Entrei de alma e coração. Ao fim de dois anos, já me sentia à von-tade para ser comandante deste barco”, assume, sentada na mesa do restaurante de onde saem pratos típicos da região. Nos primeiros tempos, exportavam essencialmente para França, que era o porto mais seguro. Mas enquanto empresária, o maior desafio foi abrir-se ao resto do mundo e conquistar o mercado nacional. Hoje, as expor-tações representam apenas 40% da faturação, que chega aos oito milhões de euros. E de cinco empregados (três da família), a quinta passou a dar trabalho a 85 pessoas. O processo foi lento, mas eficaz. Primeiro, tratou-se do restyling, de-pois contrataram-se dois enólogos e investiu-se em maquinaria. Houve um dia, numa das suas muitas viagens aéreas, em que se lembrou de criar dez suítes de luxo, dentro de barricas. Qua-tro anos mais tarde, a ideia tornou-se realidade e tem sido um sucesso. Mas nem por isso Maria do Céu sossega – as obras continuam, para se construírem mais 24 quartos de hotel, ampliar a piscina e fazer um spa. Porque não é só o vinho que mantém uma quinta ativa.

MARIA DO CÉU GONÇALVES49 ANOS

PROPRIEDADEQuinta da Pacheca

PRODUÇÃOAlém do hotel e do restaurante, a quinta, com os seus 69 hectares, dá quase 200 mil litros de vinho DOC e 100 mil de Porto. Agora também fazem azeite.

CURIOSIDADE“Nos aviões consigo pensar melhor e escrever sem que ninguém me interrompa. Lá no ar é onde tomo boas decisões.”

DE FRANÇA, COM AMORFala com sotaque típico de emigrante e gere a Quinta da Pacheca com o dinamismo característico de quem anda lá fora a lutar pela vida

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leitor há de perguntar-se porque está a palavra asfalto associada a uma mulher que desde cedo se embrenhou nas vinhas do Douro. A resposta virá

da boca da própria: “De Angola, onde nasci, vim para Vila Real, sem qualquer ligação familiar ao campo ou apetência para os vinhos.” Quando che-gou a altura de escolher o curso, foi para Aveiro tirar Engenharia Química, pois via-se a trabalhar na indústria alimentar. Mas depressa se desiludiu e começou a ouvir falar de enologia e a querer ex-perimentar. Claro que os pais lhe lembraram que o mundo dos vinhos estava vedado a mulheres, que no Douro só existiam famílias e que ela não conhecia ninguém do meio. De pouco serviram os conselhos parentais perante o fascínio que sentiu durante o estágio na Quinta do Noval, para onde foi tirar a prova dos nove. “Adorei, apaixonei-me realmente pela região e decidi que era mesmo aquilo que queria fazer.” E fez.O curso foi um arzinho, a vindima em Bordéus uma escola e tanto, e o primeiro trabalho no Clube Vintage apenas uma passagem. A vida havia de mudar quando, em 2000, a entrevis-taram para ser responsável pela área comercial da recém-criada Lavradores de Feitoria (espécie de cooperativa de pequenos produtores, que só produz vinho DOC). À primeira impressão não quis aceitar, mas Dirk Niepoort havia de con-

vencê-la a mudar de ideias. Ainda bem, porque rapidamente se deslumbrou com tudo o que aprendia e com toda a gente que conhecia. Há de ter sido boa aluna, pois não foram precisos mais de dois anos para a convidarem para o conselho de administração no qual, já se imagina, só ha-via homens. Hoje, é CEO da empresa. Até já foi condecorada com a Ordem de Mérito Agrícola, atribuída por Cavaco Silva (ao mesmo tempo que Sandra Tavares da Silva). “Procuro trabalhar com proximidade e que as pessoas se sintam felizes aqui. Se for preciso despachar uma encomenda, saio do escritório e vou para a adega ajudar.”É tudo cor-de-rosa, como nos sonhos? Nem pen-sar. Muitas vezes teve de lidar com as interrogações do meio: “Como é que ela entrou aqui? Pertence a quem?” Quando se casou com um enólogo, que tinha acabado de comprar uma vinha em muito mau estado, e foi para lá viver, sentiu bastantes olhares de reprovação. Durante um ano, frequentou o mesmo café, sem que ninguém fosse simpático com ela. “Aqui desconfia-se de quem vem de fora.” Esses dez hectares de vinha, perto do Pinhão, estão recuperados, a casa encontra-se reconstruída, os lagares e armazéns estão cheios de garrafas. Como sempre gostou de ter um pé na produção, lançou o tinto She by Poeira 2016, para demonstrar como numa vinha austera, com acidez, pode ir buscar-se a elegância e a subtileza femininas.

OLGA MARTINS43 ANOS

EMPRESALavradores de Feitoria

PRODUÇÃOÉ CEO desta espécie de cooperativa que junta 18 produtores de 20 quintas. Criaram a marca própria Três Bagos.

LEMA“Trato todas as pessoas de igual forma. E exijo o mesmo para mim.”

A RAPARIGA DO ASFALTOSem qualquer pergaminho para entrar no mundo dos vinhos do Douro, chegou a presidente de uma empresa de pequenos lavradores

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Tânia Gouveia de Sousa�
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Page 7: ID: 81240470 27-06-2019 Âmbito: Interesse Geral · Meio: Imprensa País: Portugal Period.: Semanal Âmbito: Interesse Geral Pág: 36 Cores: Cor Área: 18,00 x 27,00 cm² ID: 81240470

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avô, que sempre esteve ligado aos vinhos do Dão, volta e meia lem-brava-lhe de que a agricultura era a arte de empobrecer alegremente.

Enquanto pequena, não percebia bem o que aquilo queria dizer, mas foi entendendo ao longo do seu percurso, que começou por nada ter que ver com a terra. Catarina estudou Relações In-ternacionais, estagiou na Venezuela e trabalhou na Fundação Ricardo Espírito Santo. Mas sabia que um dia acabaria no Douro, porque sempre sentiu esse apelo, essa ligação ao campo. Ajudou o facto de se ter casado com um duriense, pro-prietário de uma quinta com vinhas velhas, no Douro Superior, que já está na família de Castro há 23 gerações e mais de 700 anos, e que precisa-va de quem realmente agarrasse no negócio. “As senhoras nem iam às quintas. Quando comecei a fazê-lo, ainda era malvisto”, conta, queixando-se do meio muito tradicional que encontrou. Indiferente a esses entraves, Catarina meteu na cabeça que haveria de explorar todo o potencial da quinta. Conheceu as pessoas certas e lançou--se na parte comercial, em 2005, depois de um curso de Jovem Agricultor. Pôs tudo em cima da mesa: o que era preciso fazer, que dinheiro tinham para gastar, quanto custavam as infraes-truturas para dar gás à quinta... Acabou a gastar meio milhão de euros a reconverter mais de 20

hectares para produzir um vinho de perfil supe-rior e indiscutivelmente bom. Uma novidade no Douro daquela época, pois o vinho de mesa era apenas para os caseiros e nem se encontravam enólogos nas quintas, porque não são precisos para o vinho do Porto. De início, conseguiram ter cinco mil garrafas, agora orgulham-se muito das 42 mil que eti-quetaram no ano passado. Também vendem uvas para vinho do Porto, mas não o produzem. Reconhecimentos, já nem os conta – era conhe-cida no meio como a “papa-prémios”. “Deixámos de ir a concursos. Prefiro guardar esse dinheiro para o marketing.” Catarina também integra, há quatro anos, o Conselho Interprofissional da Casa do Douro, a convite do seu presidente, António Lencas-tre. Com ela, sentam-se mais três mulheres a representarem os agricultores, coisa bastante inovadora para esta federação centenária. E há sete meses que é responsável pelo marketing da Porto Réccua, outra empresa da região, embora continue gestora da quinta da família, que há de deixar às suas duas filhas. Por agora, preferiu es-tar mais afastada do negócio, para não desgastar as relações, que são ótimas. “Tenho de deixar os outros irem ao mercado, o que é tão difícil”, jus-tifica, com a notória pouca convicção de quem não consegue realmente desligar a ficha.

CATARINA ALBUQUERQUE PIZARRO DE CASTRO47 ANOS

PROPRIEDADEQuinta de Lubazim

PRODUÇÃOA propriedade tem 110 hectares e de lá saem os vinhos tinto de reserva Quinta de Lubazim e os Lupucinus. Também se dedica ao azeite extra virgem.

MOTE“Sou de uma geração em que tudo começou a mudar. Levo as coisas muito na brincadeira e dou-me bem com toda a gente.”

A MULHER DOS PRÉMIOSO néctar que sai das suas vinhas é tão bom que ganha todos os concursos. A culpa está na forma como o posicionou no mercado

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Meio: Imprensa

País: Portugal

Period.: Semanal

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ode demorar hora e meia desde sua casa, em Vila Real, até Ervedosa do Douro, perto de São João da Pesquei-ra, onde tem uma das quintas, com

vinhas a pique. Mas o que importa isso, quando se tem a sorte de parte do caminho ser feita pela N222, a tal estrada que é considerada a mais bela do mundo, desenhada nas margens do rio, entre a Régua e o Pinhão? Nem a gravidez já avançada faz com que Maria deixe de se deslumbrar com a paisagem. Dependendo da época, faz este percurso um ou cinco dias por semana. “Se chove, preciso de andar em cima das vinhas. A análise visual ajuda muito a detetar doenças. De abril a julho é o período mais crítico”, explica. O seu carro, empoeirado no verão, enlameado no inverno, espelha bem essas idas permanentes ao campo. A partir do momento em que as uvas entram no lagar, a três quilómetros da Régua, o processo deixa de ser com ela. Ainda assim, gosta de controlar essa chegada para averiguar o estado sanitário da fruta.É assim desde os 23 anos, acabadinha de sair do curso de Engenharia Agrícola, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Afinal, é bisneta

do fundador da empresa e, ao ser filha única, este era o seu lugar natural. Saliente-se, no entanto, que se trata da primeira mulher a assumir o cargo de responsável pela viticultura e pelo contacto com os agricultores. E a primeira a dormir, de vez em quando, nuns quartos no armazém que servem os trabalhadores da vindima – nenhuma das três quintas tem casa de habitação. “Comigo sempre por perto, a qualidade da equipa melho-rou e a exigência aumentou.”Maria Poças também se orgulha de ter igualado os salários entre homens e mulheres da empresa familiar centenária, coisa que não acontecia até à sua entrada, nem acontece, de forma geral, no Douro. Os administradores atuais, o pai e um seu primo, vão retirar-se em breve. Caberá a esta geração de primos – além de Maria, o enólogo principal, o responsável de marketing e o finan-ceiro – assumir o comando? Maria sabe que não lhe tocará essa sorte. “Gosto muito da gestão das quintas, mas este não é o momento. Tenho uma filha de 2 anos e outro a caminho....” Nem por isso deixa de ter ideias: daqui a dois anos, passarão a organizar visitas na Quinta das Quartas, a tal que fica perto da Régua e onde funcionam os serviços centrais, o armazém e o lagar.

MARIA POÇAS38 ANOS

MARCAPoças

PRODUÇÃOCom três quintas e um total de 109 hectares, contabiliza anualmente um milhão e setecentos mil litros de vinho do Porto e 400 mil de vinho do Douro. Tem cinco marcas diferentes e o azeite Vale de Cavalos.

LEMA“As quintas têm de ver os patrões. Isso reflete-se no desempenho dos trabalhadores no dia a dia.”

TRABALHO IGUAL, SALÁRIO...Não há de ser a barriga que cresce de dia para dia a impedir Maria de ver o estado das uvas nas vinhas encavalitadas

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Page 9: ID: 81240470 27-06-2019 Âmbito: Interesse Geral · Meio: Imprensa País: Portugal Period.: Semanal Âmbito: Interesse Geral Pág: 36 Cores: Cor Área: 18,00 x 27,00 cm² ID: 81240470

Meio: Imprensa

País: Portugal

Period.: Semanal

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ão sei onde vivo”, desabafa Sophia num português esforçado, enquanto se dirige para o aeroporto de Londres de regresso ao Douro. “Passo um terço

do ano em Portugal, outro terço em Inglaterra e outro a viajar.” Este pedaço de terra a norte esta-va-lhe destinado no sangue, na alma. Quando era pequena e ia de férias para a Quinta de La Rosa, que a sua avó materna recebera de presente de batismo, custavam-lhe sempre as despedidas emocionadas, ao mesmo tempo que as histórias daquele sítio a encantavam. Saber que a sua avó Clara vivera ali sozinha, nos anos 1950, depois de se divorciar, e sem dinheiro, enchia-a, e continua a enchê-la, de orgulho (o restaurante da quinta tem o nome dessa avó). A gestão da propriedade passou, depois, para o pai, que investiu tudo o que tinha e não tinha para manter as vinhas na família. Entretanto, Sophia formara-se em Management Consulting, em Inglaterra, fizera o mestrado no Insead e trabalhava como consultora em Londres e Paris. Tudo isso ficou para trás, quando o pai lhe pediu para o ajudar a reabilitar a quinta da avó.

Até então, apenas vendiam uvas às grandes mar-cas, como era habitual no Douro. Mas, em 1988,

decidiram criar um nome próprio, socorrendo-se dos amigos, numa ação que hoje seria apelidada de crowdfunding. Cada pessoa que investisse mil libras nesse vinho receberia 20 caixas de Porto naquele ano – conseguiram juntar 200 mil libras (cerca de €223 mil). E, assim, foram os primeiros a contor-nar o monopólio das grandes casas, com a venda direta e sem sequer terem armazéns em Vila Nova de Gaia. Quatro anos depois, passaram a dedicar-se também ao vinho de consumo (a primeira colheita foi toda vendida a dois clientes em Inglaterra) e os primeiros lotes foram quase artesanais. “Ainda me lembro de estar a colar rótulos à mão, com a minha mãe.” Ao mesmo tempo, começaram a alugar um quarto a turistas, ainda sem lhe chamarem eno-turismo. Hoje, a Quinta de La Rosa tem 27 camas na vizinha Quinta Amarela, a quatro minutos do Pinhão e mesmo em cima do rio.

Aos 28 anos, Sophia encarregou-se da parte fi-nanceira, enquanto o pai – que morreu há um ano – tomava conta das vinhas e da produção do Porto. Hoje, continua responsável pela parte comercial, pelo enoturismo e pelo restaurante. O resto vai passando, lentamente, aos três filhos, todos na casa dos vinte. “A vida das vinhas é dos jovens.”

SOPHIA BERGQVIST58 ANOS

PROPRIEDADEQuinta de La Rosa

PRODUÇÃONos 55 hectares, fazem-se vinhos muito diferentes, assim como azeite e vinagre de vinho do Porto, num total de 400 mil garrafas anuais.

OBJETIVO“Sou inglesa, mas o meu coração é português, porque tenho uma paixão pelo Douro. É onde quero ficar.”

A HERANÇA DA AVÓ CLARASophia tem orgulho em perpetuar a quinta que a sua avó inglesa recebeu no batismo, socorrendo-se da inovação

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País: Portugal

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s tapetes de Arraiolos da sala de estar estão para arranjar e, por isso, Laura pede desculpa. E a refrescante limo-nada há de acompanhar a “catrefada”

de episódios que conta com muita ênfase, tal e qual faria nas aulas de História nos liceus onde ensinou, imagina-se de imediato. É desta forma que também capta a atenção dos cerca de 3 000 turistas que vão à Quinta da Casa Amarela para conhecer a vinha, fazer uma prova ou uma re-feição (em breve, terão alojamento).

Até 1978, a coisa era diferente. Laura vinha ao Douro todos os fins de semana e regressava com o carro atulhado de mantimentos, num percurso que tardava duas horas e meia. Mas durante a semana continuava no Porto, a ensinar. Só mais tarde se transferiu para a Régua, onde dava aulas à noite para poder ajudar na quinta, que nessa altura apenas vendia uvas a granel. Em 2000, consciencializou-se de que não estava a fazer nem uma coisa nem outra – talvez porque o filho lhe tenha dito que andava a brincar aos vinhos – e pediu a reforma, aos 50 anos. Foi então que decidiu estruturar o negócio, criando um porte-fólio de vinho DOC e diversificando nos vinhos do Porto. “O projeto continua a ser familiar, aliás, este ano lançámos uma colheita com o meu nome e outra com o nome do meu pai. O meu marido está mais dedicado ao enoturismo e o meu filho

é comercial.” Sabe que não quer tornar a quinta uma grande exploração – se crescesse muito mais, teria de fazer outra reestruturação e Laura está convicta de que o seu caminho não é por aí. Hoje, assume que não sabia nada disto quando começou, que não teve formação enológica. Va-leu-se do arregaçar de mangas e das visitas que fez a outras regiões para se inspirar e aprender. Claro que o saber empírico de anos de experiên-cia e vivência também contou. “O importante é o acolhimento, fazer com que os visitantes sintam o Douro e o seu património. Uma garrafa de vinho tem por trás muita cultura. Gosto sem-pre da pedagogia.” E gosta também de calçar as botas e de andar a calcorrear as vinhas, a mexer nas folhas, a ver se já têm cacho. Quando está lá no alto, no sossego do campo, abre os braços à la Titanic, e anuncia: “Este é o meu mundo!” Já lhe perguntaram porque não abranda ou passa a pasta a outro, mas Laura nem quer ouvir falar nisso, tal a paixão que sente por este trabalho. Para remate de conversa, e enquanto galga as suas vinhas, faz questão de deixar um recado: “Sempre que sou convocada para falar sobre as mulheres nesta área, explico que não foi só aqui que passámos a ter um papel diferente. Trata-se de uma evolução natural. Aliás, devo dizer que nunca senti que o meu trabalho fosse posto em causa pelo facto de ser mulher.” [email protected]

LAURA REGUEIRO70 ANOS

PROPRIEDADEQuinta da Casa Amarela

PRODUÇÃOSão 12 hectares de vinhas velhas que dão para vender 80 mil garrafas por ano.

MOTE“É importante estar atenta ao passado, mas sem parar no tempo. Para mim, o trabalho é um gozo.”

DA SALA DE AULA PARA A VINHAHá 30 anos que a ex-professora se dedica, por completo, à gestão da Quinta da Casa Amarela. Mas continua a recorrer à pedagogia

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Tânia Gouveia de Sousa�
Tânia Gouveia de Sousa�
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AS NOVAS FERREIRINHAS DO DOUROAS NOVAS FERREIRINHAS DO DOURO

ProdutorasLaura Regueiro, Catarina Pizarro de Castro, Olga Martins, Maria Poças e Sandra Tavares da silva, fotografadas no Douro

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JEOVÁSOS SEGREDOSDA “SEITADESTRUTIVA”

Tânia Gouveia de Sousa�
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