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HUBERTO ROHDEN ESCALANDO O HIMALAIA COLÓQUIOS COM DEUS E SOLILÓQUIOS COM MINHA ALMA UNIVERSALISMO

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Page 1: Huberto rohden   escalando o himalaia

HUBERTO ROHDEN

ESCALANDO O HIMALAIA

COLÓQUIOS COM DEUS E SOLILÓQUIOS COM MINHA ALMA

UNIVERSALISMO

Page 2: Huberto rohden   escalando o himalaia

ADVERTÊNCIA

A substituição da tradicional palavra latina crear pelo neologismo moderno criar

é aceitável em nível de cultura primária, porque favorece a alfabetização e

dispensa esforço mental – mas não é aceitável em nível de cultura superior,

porque deturpa o pensamento.

Crear é a manifestação da Essência em forma de existência – criar é a

transição de uma existência para outra existência.

O Poder Infinito é o creador do Universo – um fazendeiro é criador de gado.

Há entre os homens gênios creadores, embora não sejam talvez criadores.

A conhecida lei de Lavoisier diz que “na natureza nada se crea e nada se

aniquila, tudo se transforma”, se grafarmos “nada se crea”, esta lei está certa

mas se escrevermos “nada se cria”, ela resulta totalmente falsa.

Por isto, preferimos a verdade e clareza do pensamento a quaisquer

convenções acadêmicas.

Page 3: Huberto rohden   escalando o himalaia

ESCALANDO O HIMALAIA

Este livro é uma experiência metafísica. Mais do que isso, é uma vivência

espiritual.

O autor se confessa: “Outrora, ansiava eu por escalar o Himalaia da Ásia,

longe de mim... Outrora, sonhava eu com estranhas aventuras em terras

longínquas. Outrora, fascinava-me a idéia de atingir as culminâncias do

Everest. Hoje, me fascina a suprema audácia de galgar o Himalaia de dentro.

Hoje, me seduz a divina aventura de ascender ao Everest do meu ignoto EU.

Hoje, vou em demanda da montanha sagrada que, dentro de mim mesmo, se

ergue altíssima.

Hoje, sigo avante, rumo ao Everest de dentro, com os olhos fitos no excelso

ideal de minha suprema realização. Rumo ao grande Além-de-Dentro. Rumo

ao Himalaia do meu espírito.”

Escalando o Himalaia completa e finaliza outro livro de Rohden: o seu célebre

e misterioso A Voz do Silêncio. Ambos são convergentes na essência e na

forma. São obras incomuns, escritas inspiradamente, onde o processo criativo

transcende a análise e mergulha nas alturas da pura intuição cósmica.

Ambos são livros gestados e nascidos de um doloroso gozar e de um gozoso

sofrer, para uma beatitude metafísica. Poucas obras do autor atingiram clima

poético tão intenso e vivificante.

Rohden tinha uma preferência especial por estes livros, escritos em forma

versificada. Considerava-os leitura para pessoas adiantadas espiritualmente.

“Muito, para poucos”, na sua própria definição.

É a alma de Rohden que nos diz: “... É esta a sangrenta tragicidade da minha

vida. E, por entre esses pólos extremos, em dolorosa tensão bilateral, em

dinâmica passividade, se move a odisséia da minha existência rumo ao

Infinito... Sempre em demanda do termo final e sempre distante desse termo...

Sempre na linha reta do caminho certo e sempre cortado pelos ziguezagues de

mil linhas transversais...” É esta a minha doce amargura, é esta a minha

amarga doçura, a minha jornada ascensional rumo às alturas... A vida eterna

não é uma chegada. A vida eterna é uma jornada rumo ao Infinito.”

Page 4: Huberto rohden   escalando o himalaia

Sugerimos ao leitor deste livro que o leia como se ouvisse Back ou Haendel.

Sem análise e sem crítica. Quem assim o fizer, transcendentaliza-se.

Obra de poderosa atração espiritual.

Page 5: Huberto rohden   escalando o himalaia

ESCALANDO O

HIMALAIA DE DENTRO

Outrora, ansiava eu por escalar

O Himalaia da Ásia

Longe de mim...

Outrora, sonhava eu com estranhas aventuras

Em terras longínquas...

Outrora, fascinava-me a idéia

De atingir as culminâncias do Everest

E perder-me em imensos campos de neve...

Hoje me fascina a suprema audácia

De galgar o Himalaia de dentro,

Os píncaros do meu próprio ser,

Envoltos no mistério das nuvens...

Hoje me seduz a divina aventura

De ascender ao Everest do meu ignoto Eu...

Envolto em neves eternas,

Na imaculada alvura do meu Cristo interno,

No silêncio da Verdade infinita,

Na sacralidade mística do “Eu Sou”...

Por isto abandonei a profana querência

Do meu conhecido ego de antanho

Page 6: Huberto rohden   escalando o himalaia

E, pioneiro do Infinito,

Vivo os meus dias e minhas noites

Em demanda da montanha sagrada

Que, dentro de mim mesmo, se ergue

Altíssima,

Ignota,

Divina...

E todos os sacrifícios me são gozos,

E todas as tristezas me são alegrias,

E todos os espinhos me são rosas,

E todas as lágrimas me são sorrisos,

Porque são degraus da montanha sagrada,

Estágios do meu Himalaia de dentro...

E, ainda que tempestades desabem em derredor

E raios fuzilem por cima de mim,

E abismos negrejem sob os meus pés,

Ainda que sorridentes esplanadas me convidem a parar

Eu sigo avante, rumo ao Everest,

Sem medo dos perigos,

Com os olhos fitos no excelso ideal

Da minha suprema realização

Rumo ao grande Além-de-dentro...

Rumo ao Himalaia

Do meu espírito.

Page 7: Huberto rohden   escalando o himalaia

MEU SACROSSANTO TABU

Santo, santo, santo!

Três vezes longínquo, intangível,

Três vezes Transcendente,

És tu, ó Deus,

Meu sacrossanto Tabu...

Ninguém te pode ver,

E continuar a viver...

Ninguém te pode tanger,

E não deixar de morrer...

Tu és um “fogo devorador”,

Que a cinzas reduzes tudo

Que de ti se aproxime...

Tu és o pólo positivo do Absoluto

Que de ti repeles todos os pólos negativos dos Relativos.

Por isto te contemplo de longe,

Ó intangível Númeno!

Por isto, transido de terror,

Me afogo nas trevas do meu Nada,

Ante a Luz do teu Tudo...

* * *

E, no entanto, meu sacrossanto Tabu,

Tu, que és a Verdade Transcendente,

Page 8: Huberto rohden   escalando o himalaia

És também o meu Bem Imanente.

Tão propínqua me é a tua Presença

Quão longínqua me é a tua Ausência.

Tu és uma distante proximidade.

Tu és uma longínqua proximidade.

Tu és o meu amoroso Terror.

Tu és o meu terrífico Amor.

Tu és a minha luminosa Treva.

Tu és a minha tenebrosa Luz.

Sofro as torturas do teu Amor.

Gozo as delícias do teu Terror.

Adoro-te, Meu Deus,

Que és a mais longínqua das minhas propinquidades!

Amo-te, meu Deus,

Que és a mais propínqua das minhas longinquidades!

Tu és o que eu não sou

E sou o que tu és.

O pólo positivo do teu Absoluto

E também o pólo negativo do teu Relativo.

A tua terrífica Transcendência

E a tua beatífica Imanência.

E por isto, eu te temo

Amando,

E eu te amo

Temendo.

E essa tensão dinâmica entre o temor e o amor

É o segredo do meu gozo,

Page 9: Huberto rohden   escalando o himalaia

É a minha inefável beatitude.

Terrível é o teu Além-de-fora.

Amável é o teu Aquém-de-dentro

Tu és o meu terrível Amor.

Tu és o meu amável Terror!

Em ti se coadunam todos os paradoxos,

Em ti se sintetizam todas as antíteses,

Porque tu não és nem as antíteses,

Nem a síntese

Tu és a grande TESE,

Anterior a esta e àquelas.

Tu não existes, como eu

Tu ÉS, como só tu podes ser.

Tu és aquele que é!

A tua natureza é “SER”.

Tu és o SER eterno, absoluto,

Anônimo, amorfo, incolor,

Para além de tempo, espaço e causalidade.

Mas a luz incolor do teu SER

Revela-se no prisma multicor do teu existir.

Como Verdade transcendente tu és incolor,

Como Bem imanente tu és multicor.

Terrífico e benéfico ao mesmo tempo...

No teu SER tu és a Verdade

Sem nome, nem forma nem cor.

No teu existir, tu és o Amor

Page 10: Huberto rohden   escalando o himalaia

Envolto em nomes, formas e cores.

A tua Essência única se revela

Em tuas Existências múltiplas...

Tu és o Uno e o Verso

Do Universo.

Por isto eu te adoro e eu te amo,

Meu sacrossanto Tabu,

Meu beatífico Terror,

Meu terrífico Amor!...

Meu longínquo Além-de-fora,

Meu propínquo Além-de-dentro!...

Aleluia!...

Amém...

Page 11: Huberto rohden   escalando o himalaia

TRANSFORMAÇÃO VITAL

Negrejantes massas de feio esterco,

Informes, mal-cheirosas,

Cobrem os canteiros mortos

Do meu jardim hibernal,

Por que tanta fealdade manifesta

No meio de tanta beleza latente?

Mas, eis que sopram as auras matutinas,

Os refrigerantes hálitos de manhãs primaveris!

E do feio esterco nada sobrou

Tudo foi transformado em beleza...

Deslumbrantes pencas de rosas,

Esguios minaretes de zínias,

Mágicos botões de cravos,

Olhos azuis de miosótis,

Alvejantes estrelas de açucenas

Multiformes e multicores filhas

Da exuberância da Flora...

Rescendendo suaves fragrâncias,

Oferecendo cálices repletos de néctar...

Donde vieram essas belezas todas?

Tudo isto é esterco transformado,

Page 12: Huberto rohden   escalando o himalaia

Esse nauseabundo e informe adubo de ontem...

Oh! estupenda maravilha da vida invisível

Que com sua alma de luz permeou

As trevas da matéria inerte!...

* * *

E eu me lembrei de mim mesmo,

E dos meus sócios de jornada terrestre.

Lembrei-me dos homens que só conhecem

As coisas do mundo material,

Coisas inertes, escuras, repugnantes,

Deste mundo tangível dos sentidos,

Onde a matéria permanece material

Por falta de um princípio vital,

De uma alma espiritualizante...

Lembrei-me também de vós,

Meus austeros ascetas,

Que detestais de todo o coração

A matéria das coisas deste mundo,

Que vos isolais no beatífico paraíso do espírito,

Longe deste mundo imundo...

Se admiro a vossa sinceridade,

Meus austeros ascetas,

Lamento a vossa fraqueza,

Meus irmãos desertores...

Sois assaz fortes para desertardes do mundo

E assaz fracos para não transformardes pelo espírito

Page 13: Huberto rohden   escalando o himalaia

As materialidades do mundo...

Lembrei-me também de ti,

Pequenino rebanho de homens crísticos,

Vós que, como a vida da planta,

Penetrais e transformais as coisas escuras e opacas

Do mundo material.

E do seio de todas as materialidades,

Suscitais epopéias de espiritualidade,

Multiforme e multicor,

Perfumosas pétalas de amor e caridade,

Suaves néctares de alegria e felicidade,

Jardineiros da Divindade!

* * *

Quando a vida do Deus do mundo

Permeia todos os mundos de Deus,

Todos os mortos ressuscitam

E transbordam de vida juvenil.

Todas as matérias opacas

Se transformam em cristais diáfanos,

Irisando em milhares de cores

A luz Incolor

Da divindade...

Page 14: Huberto rohden   escalando o himalaia

ANSEIO POR UM FOGO VIVO

Quantas vezes, em horas de quietude,

Anseio por uma vida de luz e de paz,

Uma vida de harmonia, segurança, felicidade!

Quantas vezes entrevejo, ao longe,

Um reino de beatitude e de amor,

A acenar-me suavemente!...

E, nesses momentos de quietude dinâmica,

Eu me sinto assaz forte

Para superar todos os óbices

E romper caminho através dos impossíveis.

Mas... após dias, semanas e meses,

Desfalecem-me as forças...

Tudo em derredor é deserto árido...

Fastidiosa monotonia...

Cinzento areal...

Triste mediocridade...

É tão fácil começar,

Tão difícil continuar,

Dificílimo terminar...

E, perdendo de vista os longínquos páramos,

Eu me conformo novamente

Page 15: Huberto rohden   escalando o himalaia

Com a velha e cômoda rotina

Da vida horizontal de sempre...

Se todos assim vivem e vegetam,

Por que deveria eu ser uma exceção?

Não é isto tentação do meu lúcifer de dentro?

Querer ser herói e super-homem?...

E o meu velho egoísmo acomodatício

Doura de virtude a minha covardia...

Minha alma, porém, insatisfeita,

Continua a clamar pela luz,

Continua a ansiar pela paz imperturbável...

Mas essa luz e essa paz são filhas do sofrimento.

E eu ainda não sofri bastante...

Todas as minhas teses e teorias

Por mais verdadeiras e boas,

São como fogo pintado, artisticamente pintado

Na tela do meu ego...

Fogo fictício, sem luz nem calor...

Importa que sobre mim desabem

Dilúvios de dores,

Infernos de sofrimentos,

Oceanos de decepções,

Para que a fria inércia do meu fogo fictício

Se converta na ardente dinâmica de um fogo real!

Por isto, Senhor, não te peço que me poupes

Dores e decepções,

Page 16: Huberto rohden   escalando o himalaia

Rogo-te apenas as ponhas a serviço

Da minha cristificação,

Para que eu me realize plenamente

Em Cristo!...

Que eu seja crucificado, morto e sepultado,

Entre o Getsêmane e o Gólgota,

E ressuscite para uma vida nova,

Vida liberta dessas pequenas e grandes misérias

Que ainda me prendem a uma zona que não e minha...

Vida liberta, finalmente,

Desses ídolos e fetiches

Do meu velho ego...

Realizado em mim

A nova creatura em Cristo...

Page 17: Huberto rohden   escalando o himalaia

O PECADO DAS MINHAS ORAÇÕES

Penso com horror nas minhas preces de outrora,

Quando eu pedia alguma coisa

Vida, saúde, prosperidade e outros ídolos

Como se algo houvesse de real,

Fora de ti, meu Deus,

Realidade única, total, absoluta!

Como se em ti não estivessem contidas

Todas as coisas do universo!...

Como se todos esses pequenos “realizados”

Não fossem reflexos de ti, o grande “Real”!...

Tamanha era a minha ilusão dualista,

Que eu julgava poder possuir algum efeito individual

Sem possuir a Causa Universal!...

Hoje morreu em mim toda essa idolatria,

Esse ilusório dualismo objetivo.

Redimido pela verdade libertadora,

Sinto, hoje, nas profundezas do meu Ser,

O grande monismo do Universo.

Hoje, o alvo das minhas orações

És tu, Senhor, unicamente tu.

Hoje, sei e sinto que, possuindo a ti,

Page 18: Huberto rohden   escalando o himalaia

Possuo em ti todas as coisas

Que de ti emanaram,

E em ti ficaram...

Todas as coisas que, por mais distintas de ti,

São todas imanentes em ti.

Porque tu és a eterna Essência

De todas essas Existências temporárias.

Hoje não quero mais nada

Senão a ti somente, Senhor,

Porque em ti está tudo

Que, fora de ti, parece existir.

E, porque assim te amo, Senhor,

Amo também tudo que é teu,

Tudo que, disperso pelo cenário cósmico,

Veio de ti,

Está em ti,

Voltará a ti.

Revestiu-se de mística sacralidade

O meu antigo amor profano,

Desde que vejo o Deus do mundo

Em todas as coisas do mundo de Deus.

E o pecado das minhas orações de outrora

Foi remido pela verdade da minha prece de hoje.

Page 19: Huberto rohden   escalando o himalaia

O HOMEM CRÍSTICO

É este o sinete régio do Cristo,

Que do cristão distingue o homem crístico:

Querer espontaneamente

O que se deve compulsoriamente.

Se puderes fazer com júbilo,

Com radiante sorridência,

Com leveza gentil

E exultante felicidade,

O que, outrora, fazias

Como pesado dever obrigatório,

Então cruzaste a misteriosa fronteira

Que do velho cristão separa

O novo homem crístico.

O cristão espera o reino dos céus

Como recompensa dos seus méritos,

Em pagamento de boas obras.

O homem crístico nada espera nem receia...

Não é bom com medo do inferno,

Nem com esperança do céu...

É incondicionalmente bom

Por amor...

O cristão espera entrar no reino dos céus

Page 20: Huberto rohden   escalando o himalaia

Depois da morte,

Tem os olhos postos

Em tempos futuros

E regiões distantes...

O homem crístico realiza em si o reino de Deus,

Dia por dia,

Agora e aqui mesmo,

No tempo presente do eterno “hoje”,

No espaço propínquo do infinito “aqui”...

O cristão espera encontrar a Deus

Depois de sofrer a morte corpórea

O homem crístico se encontra com Deus

Dia por dia,

Hora por hora,

Sempre e por toda a parte,

Porque proclamou o reino de Deus dentro de si

E eis que ele lhe surge também por fora!...

O homem crístico passou pela morte do pequeno eu

Para viver o grande Deus,

Morreu a morte mística,

Imolou o pequeno ego humano

Na ara do grande Tu divino...

E após essa voluntária morte mística

Houve uma ressurreição crística...

Ouvira ele a fascinante oferta de Lúcifer:

“Eu te darei todos os reinos do mundo e sua glória”,

Mas o homem crístico não caiu aos pés do tentador,

Page 21: Huberto rohden   escalando o himalaia

Não o adorou como seu deus,

Porque sabe que o reino de Deus não é deste mundo...

E dessa espontânea renúncia aos reinos de Lúcifer

Nasceu-lhe a grande paz do reino do Cristo...

E todos os habitantes desse reino

Levam em si o invisível sinete régio do Cristo

Porque são a “comunhão dos santos”,

A fraternidade branca dos irmãos anônimos,

Que atuam poderosamente em todo o Universo,

Mas não aparecem em parte alguma,

Porque atuam como a luz cósmica,

Invisível, intangível,

Onipresente,

Irresistivelmente suave...

Silenciosamente poderosa,

Como a “luz do mundo”...

Esses homens crísticos...

Page 22: Huberto rohden   escalando o himalaia

ANSEIO DO SILÊNCIO

Estou cansado de falar,

De falar com os homens,

De falar comigo mesmo

Estou cansado até de falar com Deus...

Todas as minhas perguntas,

Ruidosas,

Insistentes,

Sangrentas,

Esbarram sempre com muralhas de granito,

Resvalam sempre de paredes marmóreas,

Agonizam sempre, exaustas, sem resposta...

Por que todo esse falar?

Esse intérmino interrogar?

Esse estéril pesquisar?

Resolvi substituir o ruidoso falar

Pelo silencioso calar.

O ruído é dos homens,

O silêncio é de Deus.

Voltei as costas aos dias ensolarados

Da minha inteligência consciente.

E abismei-me na noite estrelada

De minha alma intuitiva,

Page 23: Huberto rohden   escalando o himalaia

Essa alma que não é minha,

Mas do Universo de Deus.

E pus-me a escutar a melodia

Do magno silêncio

Que envolve a luminosa escuridão

Do grande Anônimo de mil nomes.

E, quando desci ao ínfimo nadir

Do meu silente Nirvana,

Atingi o supremo zênite

Do teu solene Himalaia,

Ó taciturna Divindade...

Fundiram-se então, em místico amplexo,

O meu silêncio do Aquém

E o teu silêncio do Além...

E eu compreendi o Incompreensível...

Conheci o Incognoscível...

Dei nome ao Inominável...

Disse o Indizível...

E do fundo dessa vacuidade do silêncio

Brotou a plenitude da sapiência...

Que me veio das grandes profundidades

E das excelsas altitudes...

Ai! como o velho ruído me falsificou!

Como me roubou a fidelidade

Que devo a mim mesmo!...

Page 24: Huberto rohden   escalando o himalaia

Ah! como esse novo silêncio me purifica!

Como me restitui a fidelidade

A mim mesmo!...

Como me re-virgina

De todas as minhas prostituições!

Como me restitui a castidade

Do meu divino Eu!

Como me envolve e penetra

Com a sacralidade das fontes eternas!

Refugiei-me, dentro de mim mesmo,

À solene solidão das matas,

À vastidão dos desertos,

À pureza das montanhas

E cessou a tormentosa tensão dos nervos,

Adormeceu a insensatez da vida profana

E sinto sossego de mim mesmo...

Convalesci da enfermidade dos ruídos

Para a grande sanidade do silêncio...

Calei-me

E Deus me fala...

Page 25: Huberto rohden   escalando o himalaia

A ANGÚSTIA DOS DITOS INDIZÍVEIS

É esta a suprema angústia de minha alma:

Não poder dizer a ninguém fora de mim.

O que sei dentro de mim,

O que sei de Ti, meu Deus!...

Quando eu nada sabia de Ti,

Falava de Ti a todos os homens,

Mesmo àqueles que não me queriam ouvir.

Hoje, que sei algo de Ti,

Nos abismos anônimos de mim mesmo,

Hoje nada sei dizer de Ti,

De Ti, o Indizível, o Inominável...

E, quando algo tento dizer de Ti,

Sofro a sangrenta angústia

Da minha insuficiência...

Porque tudo que digo de Ti

Não é aquilo que de Ti

Quisera dizer...

Sinto que todas as sacralidades

Que de Ti procuro dizer

São aleijões e profanações...

Sei que todos os esplendores,

Da minha liturgia verbal,

Page 26: Huberto rohden   escalando o himalaia

E todos os fulgores

Da minha acrobacia mental

São ridículos titubeios

Da minha ignorante incompetência,

Da minha incompetente ignorância...

E dentro de mim arde o tormento metafísico

De nunca poder dizer o indizível

Que de Ti quisera dizer

Esse indizível mistério

Que és tu mesmo,

Tu, o eterno Anônimo de mil nomes.

Sofro o teu grande anonimato

No abismo da minha incompetência...

Mas esse sofrimento me é doce amargura,

Esse mistério me é amarga doçura...

Se mistério não fosse; Senhor,

Como poderia eu adorar-te

Terrificamente?...

Como poderia eu inebriar-me de Ti,

Fascinantemente?...

Se mistério não fosses,

Incompreensível Anônimo,

Deixaria eu de sofrer-te

Deliciosamente...

Perderia a minha vida

O mais belo dos seus encantos...

Page 27: Huberto rohden   escalando o himalaia

* * *

Não, não quero gozar-te

Gozosamente!

Quero gozar-te

Dolorosamente!

Quero que sempre me sejas esse misto

De dor e de gozo,

Esse crepúsculo vespertino,

Essa penumbra matutina,

Esse Algo, semi-noturno e semi-diurno...

Porque eu mesmo sou um misto de luz e de trevas,

Mescla do teu eterno Ser e do meu efêmero existir,

Da tua divina verticalidade

E da minha humana horizontalidade.

E da junção desse vertical que tu és

E desse horizontal que eu sou,

Nasce o signo da cruz,

Símbolo de sofrimento,

Apanágio de redenção,

Emblema da vida eterna...

Nasce a grande síntese

De Ti em mim,

De mim em Ti

Nasce o homem cósmico,

Que solve os ditos indizíveis

Da minha grande angústia,

Dizendo, em grande silêncio,

Page 28: Huberto rohden   escalando o himalaia

O que palavra alguma pode dizer...

Harmonizando em mim a luz e as trevas,

O divino e o humano

Creando a suprema poesia da vida:

A nova creatura em Cristo...

Page 29: Huberto rohden   escalando o himalaia

“SE O GRÃO DE TRIGO NÃO MORRER...”

No seio de pequenina semente

Dorme, em profundo silêncio,

A luz solar.

Lucigênita é a alma da sementinha dormente,

Filha do sol.

Passam-se dias, meses, anos

E a alma solar da semente

Continua a dormir, a dormir...

Envolta em misterioso sono,

No seu castelo encantado.

Eis senão quando é soterrada

No fundo do solo,

Sepulta em úmida escuridão!

E desse tenebroso abismo

Clama a sementinha

Por um raio de luz.

E o grande Sol, lá nas alturas,

Ouve o clamor de sua filhinha,

Porque o clamor da semente

É o eco da voz solar.

Na alma do grãozinho de trigo

Page 30: Huberto rohden   escalando o himalaia

Se encontram o sol de dentro

E o sol de fora,

A fé solar da pequena semente

E a graça solar do grande astro.

E eis que em viridente planta

Brota a alma lucigênita da semente!

* * *

No seio de minha alma dormita

A luz invisível do teu espírito,

Ó Sol divino do Universo.

Quando despertará essa luz dormente?

Quando brotará a semente do teu espírito,

Meu grande Astro?...

Astro tão longínquo em tua transcendência

E tão propínquo em tua imanência?...

Não ouves o silencioso clamor da minha fé?

Por que não respondes com a luz da tua graça?

* * *

Desabou então sobre mim a grande treva

Fui sepultado nas entranhas

De indizível angústia...

Confrangeu-se-me a alma chagada,

Num frêmito de inominável agonia...

Fui crucificado,

Morto

E sepultado...

E tão alto clamou a minha luz de dentro

Page 31: Huberto rohden   escalando o himalaia

Pela luz de fora,

Que se fundiram, em silente consórcio,

A luz solar da minha fé

E a luz solar da tua graça,

Ó Astro divino...

E das núpcias místicas da tua Voz

E de minha alma,

Da tua graça

E da minha fé,

Nasceu a viridente planta

Da minha vida em ti,

Da tua vida em mim...

Aleluia!...

Page 32: Huberto rohden   escalando o himalaia

ESCRAVIZADO PELA LIBERDADE

Cansado de longos anos de obediência,

Emancipei-me da molesta autoridade

E proclamei a minha independência,

A irrestrita liberdade do meu querido ego...

E senti-me feliz, nessa grande conquista

Assim pensava eu...

Assim me dizia a altaneira sapiência

Da minha profunda insipiência...

Hoje, estou mais cansado da minha liberdade

Do que, outrora, da minha obediência.

Verifiquei que a liberdade gera insegurança,

Dolorosa insegurança,

Nos invisíveis caminhos do Além

E quem pode viver feliz na insegurança?...

Anseio por uma segurança, profunda e sólida,

Esse alfa e ômega de toda felicidade...

Privou-me a liberdade desse elemento vital

Nos invisíveis caminhos do Além,

Elemento que a obediência me dera...

Lançou-me ao caótico ziguezague

De caprichos e veleidades sem conta...

Page 33: Huberto rohden   escalando o himalaia

Por isto, comecei a suspirar pela querida escravidão

Dos tempos da minha obediência de antanho,

Por uma autoridade austera de ditador

Que me comprimisse entre muralhas de granito,

Inexoravelmente,

E me impedisse de ziguezaguear,

Incerto,

Para a direita, para a esquerda,

Qual trêfega borboleta sobre canteiros em flor,

Qual estonteado vagalume pelas trevas noturnas...

Apelei para as minhas teologias de tempos idos

Mas ai!...

Elas se calaram, como esfinges do deserto...

Eu já não podia crer, de olhos fechados,

Como naqueles tempos remotos

Da minha obediência automática,

Já não podia encampar dogmas de fora,

Sem a minha experiência de dentro,

Não podia obedecer a autoridades heterônomas

Que não fossem a voz da minha autonomia,

Da suprema autoridade do meu Eu crístico,

Do meu divino Emanuel...

Revelou-se-me, então, o grande segredo

De ser inexoravelmente escravo

E integralmente livre,

O fascinante segredo de ser

Page 34: Huberto rohden   escalando o himalaia

Livremente escravo

E escravizadamente livre...

Fiz-me livremente escravo

Da Verdade Libertadora,

De uma Autoridade Suprema, em mim...

E senti em mim a inefável segurança,

Que a liberdade me prometera

E nunca me dera...

Submeti o meu pequeno ego humano

Ao império do meu grande Eu divino...

Percebi dentro de mim uma voz que dizia:

“Tu deves!”

E respondi: “Que queres, Senhor, que eu faça?”

E meu grande Além-de-dentro,

Ecoando a mensagem do grande Além-de-fora,

Arvorou-se em soberano absoluto,

Em supremo tribunal,

Da minha vida

E desde então eu me sinto seguro,

Seguramente feliz,

Porque livremente obediente

E obedientemente livre...

Servo do Absoluto,

Do Eterno,

Do Infinito,

Que em mim habita...

Fiz-me voluntário prisioneiro da Verdade.

Page 35: Huberto rohden   escalando o himalaia

E toda a minha velha insegurança

Foi tragada pela nova segurança,

Que nasceu da austera liberdade,

Que o império da Verdade me deu...

Deveras! não há maior liberdade

Do que a espontânea obediência

À inefável tirania

Da Verdade!...

Page 36: Huberto rohden   escalando o himalaia

TENTANDO ROMPER O VÉU INVISÍVEL...

Há entre mim e o Infinito um véu,

Tenuíssimo como teia de aranha.

Para além desse véu adivinho e entrevejo

Estupenda Realidade,

Anônima,

Amorfa,

Incolor,

Tese e Síntese de tudo quanto é,

Foi e será...

É o infinito “Aqui”,

O eterno “Agora”,

O absoluto “Todo”,

O “Ser” universal...

Há entre mim e o Infinito um véu...

E eu, impaciente, sacudo esse véu,

Procuro corrê-lo,

Rompê-lo,

Para contemplar a Realidade além...

Desvendar o mistério do Cosmos...

Mas ai! que essa teia de aranha

É rija muralha de granito,

Erguida entre mim e Ti,

Page 37: Huberto rohden   escalando o himalaia

Senhor!...

Entre mim, esse insatisfeito bandeirante

E Ti, o eterno Incognoscível...

Qual cão faminto anda minha alma rondando,

Rondando, dia e noite,

O inexpugnável castelo

Da tua opulência...

Ansiosa por apanhar uma migalha

Do lauto festim da tua plenitude...

Mas ai! que as migalhas

Que caem da tua mesa,

Depois de saboreadas por minha alma,

Acendem em mim uma fome voraz,

Uma ânsia imensa de migalhas sem fim,

E sem medida,

Dos teus divinos banquetes...

E eu vitupero minha alma,

Porque saboreou tão avidamente

Um átomo da tua infinita opulência,

Porque sorveu uma gota

Do Oceano sem praias

Da tua Divindade...

Por que, minha alma, saboreias aquilo que,

Depois de saboreado,

Te ateia no Íntimo novos incêndios

De fome?

Veementes tempestades de amor?...

Page 38: Huberto rohden   escalando o himalaia

Por que é, Senhor, que a posse de Ti

Me torna mais consciente a falta que tenho

De Ti?...

Por que é, Senhor, que,

Quanto mais te possuo

Mais te procuro?...

Quanto mais te saboreio

Mais fome tenho de Ti?...

Quanto mais te gozo

Mais sofrido me sinto de Ti?...

Quanto mais saúde tenho em Ti

Mais doente agonizo longe de Ti?...

E, no entanto, não consigo

Divorciar-me de Ti,

Meu delicioso Tormento...

Minha dulcíssima Amargura...

Meu Inimigo querido...

Que seria de minha vida

Sem esse inferno celeste,

Sem esse céu infernal?...

* * *

Não, não quero romper esse véu

Dessa mística transcendência,

Dessa fascinante longinquidade,

Que me separa de Ti,

Page 39: Huberto rohden   escalando o himalaia

Senhor!...

Quero viver para sempre nessa transcendência

Do mistério,

Contanto que a imanência do Amor

Mantenha aceso em mim

O fogo sagrado que arde sem cessar

Em mim...

Page 40: Huberto rohden   escalando o himalaia

SACRALIDADE DO SILÊNCIO

Envolto em eterno silêncio

Jaz o que sei de ti, meu Deus.

Nunca ninguém saberá desse mistério.

Impensável e indizível

É essa virginal pureza

Do que eu sei de ti, Senhor,

Meu silencioso Anônimo...

Todo pensar é profanação,

Todo dizer é prostituição.

Somente im-pensado e o in-dito,

O im-pensável e o in-dizível,

É que é intacta castidade.

E do seio fecundo dessa virgem

Nasce a divina prole da intuição.

A luxúria mental e verbal

Esterilizam as entranhas do meu ser.

* * *

Entretanto, no meio deste mundo imundo,

Eu tenho de pensar e de falar

É este o meu grande sacrifício.

Tenho de pensar o impensável,

Tenho de dizer o indizível,

Page 41: Huberto rohden   escalando o himalaia

Para apontar o rumo a seguir

Aos que não conhecem ainda

A fecunda virgindade do silêncio.

Antes que desponte a noite estrelada

Do silente calar,

Deve o dia do pensar e falar

Encher de profanos ruídos

Os caminhos da vida mortal...

Pensar e falar é repugnante

Para quem aprendeu a calar,

Calar dinamicamente em tua presença,

Ó Deus silente e anônimo!...

Isto é suprema delícia,

Isto é beatitude infinita

Banhar minha alma nesse pélago,

Sem praias nem fundo,

Sem princípio nem fim,

Para além de tempo e espaço,

Para além de tudo que possa ser

Analisado e vocalizado...

Oh! inefável poesia da Verdade!

Quando me envolverá esse nirvana

Do teu eterno silêncio?...

Quando me afogarei nesse oceano

Da vida eterna?...

Quando convalescerei plenamente

Page 42: Huberto rohden   escalando o himalaia

Dessa doença crônica

Do pensar e falar?...

Quando lançarei de mim essas muletas

E possuirei a vigorosa sanidade

Da silenciosa intuição da Verdade?...

* * *

Desce sobre mim, benignamente,

Como benéfico orvalho vespertino,

Ó noite estrelada

Do grande silêncio

De Deus!...

Page 43: Huberto rohden   escalando o himalaia

AMOR SOFRIDO

Outrora,

Naqueles tempos remotos, obscuros,

Quando eu habitava na penumbra dos ínferos,

Longe, bem longe da luz dos súperos,

Naqueles tempos pensava eu

Que amar fosse gozar.

Assim pensava eu quando tateava,

Incerto, inexperiente,

No inferno da minha semi-consciência,

Longe do superno da minha pleni-consciência.

Hoje, porém, sei e sinto

Que, no zênite do amor,

Se funde o nadir do sofrimento

Numa indizível síntese cósmica

De silenciosa e eterna unidade...

Hoje sei e sinto

Que amor gozado é apenas meio amor,

Que amor sofrido é que é amor integral...

Não viesse o sofrimento associar-se ao gozo,

Nunca gozaria eu a plenitude do gozo,

Nunca chegaria o amor a ser plenamente

Page 44: Huberto rohden   escalando o himalaia

Ele mesmo,

Intensamente vivido,

Meridianamente consciente...

Hoje compreendo nitidamente

Por que o Verbo se fez carne,

E se faz carne sem cessar.

Se o Verbo do Amor fosse apenas espírito,

Espírito puramente espiritual,

Espírito-gozo

Que saberia esse espírito de si mesmo?...

Mas, depois que o Verbo do Amor

Se despojou dos esplendores do gozo

E se revestiu das trevas da dor,

Depois que o eterno Logos

Se temporalizou em Jesus,

Depois que o Filho de Deus

Nasceu como o Filho do Homem,

O seu Amor atingiu as culminâncias

Do gozo integral,

Sofrendo amorosamente,

Amando dolorosamente,

Fundindo, num amplexo cósmico,

O céu do gozar

E o inferno do sofrer,

As alturas da luz

E os abismos das trevas...

E, depois que o Verbo se fez carne,

Page 45: Huberto rohden   escalando o himalaia

Apareceu ele neste planeta médio,

“Cheio de graça e de verdade”...

Por isto, nenhum mortal pode compreender

Esse mistério do imortal

Sem que palmilhe o mesmo caminho,

Gozando e sofrendo por amor...

Page 46: Huberto rohden   escalando o himalaia

INICIAÇÃO TOTAL

Enquanto algo é meu,

Não pode triunfar o EU.

Meus são bens de fortuna,

Meus são amores de homem ou mulher,

Meus são filhos, parentes, amigos,

Meu é o prestígio social de que gozo,

Meus são o corpo e o intelecto

Nada disto, porém, sou Eu.

Eu sou o sujeito central,

Meus são os objetos periféricos.

E esses objetos são velhos companheiros meus,

Crudelíssimos tiranos,

Desde o meu nascimento,

Poucos decênios atrás.

Esses objetos são velhos companheiros,

Onipotentes ditadores,

Do gênero humano,

Há muitos séculos e milênios.

Haverá esperança de que eu possa

Realizar a minha libertação?

Que eu possa viver, aqui na terra,

Page 47: Huberto rohden   escalando o himalaia

Sem esses objetos escravizantes?

Sem esses queridos “meus”?

Sem esses idolatrados fetiches?...

Não! ninguém pode desfazer-se desses ídolos

E continuar a viver.

Já compreendi que iniciação

Não é algo que eu possa adicionar

À minha vida horizontal,

Como um belo enfeite,

Como um colar de pérolas.

Compreendi que iniciação

E algo inédito e inaudito,

A morte total desta vida

Até agora vivida...

Iniciação não é continuação

De algo preexistente

Não!

É o fim de tudo que foi e é

E o início de tudo que deve ser...

Iniciação é algo virgem,

Um novo “fiat lux” creador.

Não é remendo novo em roupa velha,

Não é vinho recente em odres gastos

Não!

Iniciação é morte total

Do “homem velho”

E ressurreição integral

Page 48: Huberto rohden   escalando o himalaia

Do “homem novo”.

Nem um átomo da bagagem do ego

Passa para além da fronteira.

Porque o ego só conhece o que é “dele”

E ignora o que é “ele”.

O meu verdadeiro Eu nada sabe

Desse mundo dos meus,

Desses pequenos e grandes nadas

Que parecem ser algo.

Iniciação é verdade suprema,

Incompatível com a menor das ilusões.

* * *

Ergue-te, pois, sobre asas levíssimas,

Meu grande Eu divino,

Meu átomo crístico!

E lá das excelsas alturas

Dominarás todos os “meus”,

Sem seres por eles dominado...

Page 49: Huberto rohden   escalando o himalaia

CRISTO – ESSE DESCONHECIDO

Há quase dois mil anos

Que os homens falam de ti, ó Cristo!

E antes que no cenário histórico aparecesses,

Por dois milênios haviam os videntes

Vislumbrado o teu advento.

Todos falam de ti, ó Cristo

E ninguém te conhece, ó enigma dos enigmas!

Supremo Desconhecido do Universo!

Todos julgam conhecer-te

E todos ignoram a sua própria ignorância...

Muitos sabem o que disseste e fizeste

Ninguém sabe o que és...

Os eruditos analisam as tuas humanas horizontalidades

Mas não valem intuir a tua divina verticalidade.

De tanto falarem de ti,

Não têm tempo para calarem de ti...

O ruído estéril do intelecto

Asfixia o silêncio fecundo do espírito.

A prostituição mental e verbal

Profana a virgindade da alma espiritual,

Dessa alma que só pode conceber o Verbo

Na sacralidade de um vasto silêncio.

Page 50: Huberto rohden   escalando o himalaia

E por isto querem os homens substituir o teu Evangelho

Por numerosas legiões de “ismos”,

Eruditamente engendrados,

Deslumbrantemente elaborados,

Ruidosamente proclamados.

Eu, porém, meu eterno Cristo,

Anseio por descobrir a tua alma divina

Dentro do corpo humano do Evangelho.

Procuro romper esse invólucro verbal

E fundir-me em ti na experiência vital do que és.

Quero conhecer o que disseste e fizeste

Por aquilo que tu és...

Dentro do átomo do teu Evangelho

Dormita a energia nuclear do divino Logos,

Esse grande Desconhecido de que todos falam

E que todos ignoram...

Não! não quero saber de ti

Novos “ismos” periféricos

Quero viver dinamicamente

A tua realidade central!

Page 51: Huberto rohden   escalando o himalaia

ADORAÇÃO DINÂMICA

Naufragaram todos os meus amores,

Gloriosa ou ingloriamente,

Porque não radicavam no Absoluto,

No Infinito,

No Eterno,

No Universal,

No grande Anônimo de mil nomes...

Naufragaram todos os meus amores,

Porque radicavam em algo tangível,

Nos pequenos propínquos do Aquém,

E não no grande longínquo do Além...

Morreram de inanição

Todos os meus amores,

De fastio de si mesmos,

Da falta de mistério...

Até que, finalmente, ultrapassei

Todos os ruidosos arroios do conhecido

E me abismei no silencioso Mar do Desconhecido...

Disse adeus a todos os amores personais,

A todas as afeições horizontais,

A todas as simpatias emocionais.

Page 52: Huberto rohden   escalando o himalaia

Verticalizei-me no solene amor de adoração

Que brotou de ignotas profundezas

E surgiu a ignotas alturas

E lá se foi o fastio dos outros amores!

E uma fome imensa de amor me inundou a alma...

Fome que tanto mais deseja quanto mais possui,

Fome que me penetra,

Que me permeia

E me pervade,

Com delicioso tormento,

Com tormentosa delícia...

* * *

Adorar! adorar! adorar!

É este o supremo anseio

De um amor sem fastio,

Dessa eterna juventude do meu amor...

Quero adorar-te, meu Deus,

Adorar-te com infinita veemência...

E, desde que saboreei esse amor de adoração,

Desde que me delicio na mística de amar a Deus,

Com toda a alma,

Com todo o coração,

Com toda a mente

E com todas as forças,

Tenho imensa necessidade de servir

A todos os filhos de Deus,

Meus irmãos;

Page 53: Huberto rohden   escalando o himalaia

Servir jubilosamente,

Não por fastidioso dever compulsório,

Não pelo imperativo categórico

De alguma virtuosidade

Não por algum senso de heroísmo moral

Mas por um insopitável querer

De todo o meu ser...

Não posso deixar de ser externamente

O que sou internamente.

E é esse desejo de vasta benevolência,

De serviço dinâmico e gratuito,

O transbordamento

Da inefável experiência de Deus.

Que é toda essa jubilosa ética horizontal

Senão o fruto da fascinante mística vertical?

Nenhuma virtude descubro em amar

Aos que me desamam,

Em fazer bem

Aos que me fazem mal,

Em ceder também a túnica

A quem me roubou a capa,

Em andar dois mil passos

A quem me exigiu mil...

Vejo e sinto eu tudo isto apenas

O leve e luminoso reflexo

Do meu novo “ser” em Deus,

Que transborda espontaneamente

Page 54: Huberto rohden   escalando o himalaia

Nesse novo “agir” entre os homens.

Vejo e sinto nisto o autêntico ser

Da minha genuína natureza crística...

...............................................................................................................................

Em solitária adoração a Deus

Eu me sinto solidário

Com todos os filhos de Deus...

Page 55: Huberto rohden   escalando o himalaia

QUANDO EU ERA MEU

Quando eu era ainda meu,

Não era de ninguém.

Era escravo de tudo que chamava “meu”,

Porque o meu pequeno eu despertara,

Tirânico,

E meu grande EU dormia

O sono da ignorância.

Muitos objetos envolviam

O meu sujeito,

Assim como as grades do cárcere

Circundam o prisioneiro.

E eu chamava “meus”

Esses objetos em derredor.

Cuidava possuir esses objetos,

Mas era por eles possuído.

E eles me vedavam o egresso

Da prisão do meu ego

E o ingresso

Na liberdade do meu EU.

Nesse tempo não sabia eu

Que o grande EU

É o melhor amigo do pequeno ego,

Page 56: Huberto rohden   escalando o himalaia

E que o pequeno ego é o pior inimigo

Do grande Eu.

Jamais olhara para além das fronteiras

Do ego humano,

Esse objeto visível,

E por isto ignorava, ignorantemente,

Meu EU divino,

Esse sujeito invisível.

Eu pertencia totalmente

A mim mesmo,

Ao meu ego conhecido,

E, por isto, era a minha vida estreita

Como um casulo em que dormia

A borboleta do meu Cristo interno.

Finalmente, graças ao bafejo solar

Da graça,

Deixei de ser casulo inerte...

Rompi as paredes de seda do meu ego

Porque empecilho me era hoje

O que auxílio me fora ontem

Expandi as asas na luminosa amplitude

Do amor universal,

Para cima,

Para os lados,

Para baixo,

Envolvendo em suave benquerença

Page 57: Huberto rohden   escalando o himalaia

Todos os mundos de Deus,

Depois que o Deus dos mundos

Me vitalizou com seu Amor...

Page 58: Huberto rohden   escalando o himalaia

MEU DEUS VELADO – E REVELADO

Que Ser estranho és tu, meu Deus!

Os teus mundos te revelam,

Assim como a teia revela a aranha,

E os teus mundos te velam,

Assim como a teia vela a aranha...

Teus mundos, meu Deus,

Sempre te descobrem

E sempre te encobrem...

Muito falam de ti

E mais ainda calam de ti...

Sempre manifestam o que fizeste

E sempre ocultam o que tu és...

E entre esses dois pólos,

Do velado e do revelado,

Do oculto e do manifesto,

Oscila minha alma,

Num vaivém de luzes

E de trevas...

Numa alvorada de saber

E num ocaso de ignorar...

Quando parece surgir o sol

Do meu compreender,

Page 59: Huberto rohden   escalando o himalaia

Logo é eclipsado pela nuvem

Do meu incompreender...

Se eu nada soubesse de ti,

Seria treva de meia-noite,

Se eu tudo soubesse de ti,

Seria luz meridiana.

Mas agora, que algo sei de ti,

E muito ignoro de ti,

E minha alma estranha penumbra,

Um incessante alvorecer

E um contínuo escurecer...

De ti sei o suficiente, meu Deus,

Para te amar intensamente,

De ti ignoro o suficiente,

Para te admirar e sofrer

Com sagrado assombro e reverência.

Tu me és assaz propínquo

Para eu te querer,

Tu me és assaz longínquo

Para eu te temer...

Tu, sempre manifesto

E sempre imanifesto...

Tu, infinitamente transcendente

E infinitamente imanente...

...............................................................................................................................

Que Ser estranho és tu, meu Deus!

Poesia crepuscular da minha vida,

Page 60: Huberto rohden   escalando o himalaia

Música penumbral da minha existência...

Page 61: Huberto rohden   escalando o himalaia

SEJA FEITA A TUA VONTADE!

Quanto, Senhor, hei sofrido com esta palavra!

Por que tenho de cumprir sempre a tua vontade?

Uma vontade alheia à minha?

Por que não posso jamais fazer a minha vontade?

Cumprir vontade alheia é doloroso,

Cumprir a vontade própria é delicioso...

Por que, Senhor, fizeste da minha vida

Um tormento perene?...

Por que me obrigas a ser bom no sofrimento?

Por que não posso ser bom no gozo?

Que admira que eu, tantas vezes, prefira

Ser mau no gozo a ser bom no sofrimento?

Por que és tu, Senhor, um Deus

Tão enigmático e paradoxal?

Será que te deleitas com os tormentos de teus filhos?

Será que tu és o rei dos sadistas

Que tanto mais gozes quanto mais teus filhos sofrem?

Seja feita a tua vontade

E não a minha!...

Quantos anos, Senhor, tenho andado a agonizar,

A sangrar com esse doloroso problema!...

Page 62: Huberto rohden   escalando o himalaia

Anoiteceram sobre mim todos os ocasos da vida...

Eclipsaram-se todas as luzes da alegria e felicidade...

Até que, finalmente, amanheceu a grande alvorada...

A alvorada da compreensão

A compreensão de mim em ti...

Compreendi, por fim, que tua vontade

Pode ser minha,

Embora a minha vontade

Nunca possa ser tua...

Compreendi que pode cessar o ominoso conflito

Entre o meu querer e o teu querer.

Compreendi que posso sintonizar o meu pequeno querer

Com o teu grande QUERER.

Compreendi que posso cumprir deliciosamente

A minha vontade,

Contanto que ela harmonize com tua vontade...

Mas... como posso eu harmonizar duas coisas

Tão antagônicas,

Com o meu humano querer

E o teu divino QUERER?...

Somente em virtude duma grande compreensão

De mim mesmo.

Se eu compreender que sou essencialmente

O que tu és,

Que “eu e o Pai somos um”

Page 63: Huberto rohden   escalando o himalaia

Embora o meu humano “existir”

Não seja o teu divino “Ser”

Está resolvido o doloroso problema da minha vida.

O meu íntimo “Ser” é o teu eterno “Ser”

E por que não poderia o meu externo “existir”

Ser permeado por meu interno “Ser”?

Por que não poderia a horizontal do meu humano Agir

Unir-se para sempre com a vertical do meu divino Ser?

Por que não poderia o meu Lúcifer mental

Seguir o meu Logos espiritual...

Porque não poderia o meu pequeno ego humano, Senhor,

Integrar-se no teu grande Tu divino?...

Após essa integração cósmica, nenhum conflito haveria

Entre o meu querer

E o teu QUERER, Senhor...

Cessaria todo o antagonismo...

Cantaria a grande harmonia

Da redenção...

Seja feita a tua vontade!...

Page 64: Huberto rohden   escalando o himalaia

NON-NATO, SEMI-NATO, PLENI-NATO

Lembro-me do tempo longínquo,

Quando eu era non-nato,

Apenas nascituro,

Incluso no tenebroso cárcere

Do seio materno.

O meu mundo eram essas trevas

E essa estreiteza.

Fora da minha escura prisão

Poderia haver outros mundos?...

Ai de mim se deixasse a tépica segurança

Daquelas entranhas vivificantes!

Ai de mim se rompesse o cordão umbilical

Que me prendia à única fonte de vida!...

Mas eis que, um dia, se rompeu

O cordão umbilical!

Saí do seio materno

Morri!...

Morri para aquela vida,

Que era a única vida que eu conhecia...

Momento de horror!...

* * *

Page 65: Huberto rohden   escalando o himalaia

Mas, quando voltei a mim,

Do delíquio inicial,

Verifiquei, com imensa surpresa,

Que estava vivo

Mais vivo que nunca!...

Vida em plena luz solar,

Vida em ampla liberdade...

Sucedera à minha pequena vida heterônoma de ontem

A minha grande vida autônoma de hoje.

De nascituro passei a nascido.

E eu me julgava, agora, pleni-nato.

Só mais tarde, muito mais tarde

Descobri que era apenas semi-nato,

Que eu não estava liberto do seio materno.

Preso a essa grande Mãe-Natura

Pelo múltiplo cordão umbilical

Dos sentidos e da mente

Por toda essa rede complexo

Do meu sentir, pensar, desejar...

Meu querer, amar e sofrer,

Por todas as fibras do meu velho ego...

Tentei libertar-me dessa prisão

Do mundo multiforme e multicor,

Da natureza ao redor de mim

E da natureza dentro de mim.

Toda a vida que eu tinha

Page 66: Huberto rohden   escalando o himalaia

Fluía através desses liames

Físico-mentais-emocionais.

E eu gemia e suspirava

Pela gloriosa liberdade

Dos filhos de Deus...

* * *

E eis que, um dia, apareceu,

No meio do meu grande silêncio,

Através das minhas lágrimas

E do fogo das minhas preces,

O único pleni-nato que o mundo conhece.

E ele disse, vagarosamente,

Solenemente:

“Se o homem não renascer pelo espírito

Não pode ver o reino de Deus.”

Desde esse dia, o meu único anseio é

Renascer pelo espírito,

Ser batizado com o fogo do espírito,

Liberta-me, definitivamente,

Da escravidão de todos os objetos,

De tudo que é apenas “meu”,

Mas não sou “Eu”

Nascer para meu grande e divino

EU SOU...

Page 67: Huberto rohden   escalando o himalaia

“NÃO SOU EU QUE FAÇO AS OBRAS”...

Outrora, quando eu era dono da minha vida,

Minha vida era pequena como seu dono,

Esse pequeno ego que eu chamava o eu.

Hoje deixei de ser dono da minha vida

E minha vida se tornou grande,

Porque grande é o seu dono,

O Deus imenso, eterno, infinito...

Por vezes, tenho ímpetos de revolta,

Por vezes teimo em ser eu o dono

Do meu destino – e tudo vai mal,

Porque esse pequeno ego é tão fraco,

Tão míope, que nada enxerga

Para além das estreitas barreiras

Dos seus interesses de cada dia.

Basta que eu remova o óbice do ego,

Que desobstrua os canais obstruídos

E logo as águas límpidas do Infinito

Fluem, jubilosas, através da minha vida.

E à beira dessas magnas torrentes,

E desses modestos arroios,

Verdejam os oásis de Deus,

Em pleno deserto do ego em derredor,

Page 68: Huberto rohden   escalando o himalaia

E eu escuto as melodias que cantam

Na verde ramagem do paraíso de Deus.

E eu inalo os perfumes das flores

Que desabrocham nas grimpas excelsas.

E eu saboreio os frutos que sazonam

Ao sol outonal que envolve os oásis de Deus.

* * *

Toda a sapiência da vida está em permitir

Que Deus faça de mim o que ele quer.

Toda a insipiência da vida está em querer

Fazer de mim o que me apraz.

“Não sou eu que faço as obras

“É o Pai que em mim está que as faz”...

Page 69: Huberto rohden   escalando o himalaia

AS GRADES DA MINHA GAIOLA

Meu Deus, como estão ensanguentadas

As grades da minha gaiola!...

Como está ferida a cabeça

Da pobre avezinha de minha alma,

De tanto bater e bater

Contra as grades de inexorável crueza...

E suas asas estão arrepeladas,

De tanto esvoaçar

Inutilmente...

Não cedem as grades da minha velha prisão...

Por que, Senhor, me prendeste nesta gaiola

De grades intermitentes?

Por que não me encerraste numa prisão

De paredes opaças e maciças?

Se eu nunca vira o azul dos céus,

A imensidade dos espaços além,

As amplitudes e altitudes dos teus mundos,

Talvez vivesse tranquilamente na minha prisão,

Ignorando estas saudades do Infinito...

Talvez vegetasse, estupidamente,

Mas agora que vislumbrei, por entre as grades,

Page 70: Huberto rohden   escalando o himalaia

Uma nesga dos teus céus,

Esses céus tão distantes,

Como posso ainda ser feliz,

Na angustez da minha prisão?...

Por que me deste, Senhor,

Esta feliz infelicidade,

Em lugar daquela infeliz felicidade?...

Quando despontará sobre mim

A felicidade feliz?

Quando se abrirão

As portas do meu cárcere?...

* * *

E a pobre avezinha continua a arremeter

Contra as grades do corpo e da mente,

Sempre esperançada,

E sempre frustrada...

Todas as minhas teorias filosóficas,

Todos os meus orgulhos iniciáticos,

Todos os arroubos da minha fé,

Todos os devaneios das minhas visões,

Nada disto me libertou do peso morto

Da minha humana materialidade...

Canto ardentes hinos de liberdade

À sombra da minha prisão...

E toda vez que tento galgar, esperançoso,

As torres altíssimas do Infinito,

Que ao longe adivinho,

Page 71: Huberto rohden   escalando o himalaia

Cravando os dedos sangrentos

Nas anfractuosidades dos eternos rochedos

Resvalo e recaio às baixadas

Da minha humana miséria...

Qual cão faminto, ando rondando

Os castelos da tua opulência, Senhor,

Ansioso por apanhar uma migalha sequer

Dos teus lautos festins...

Mas tudo quanto recebo

Não vale saciar a minha fome,

Por que o pouco que recebo

Me faz adivinhar o muito que me é negado...

A gotinha que sei de ti

Me fala dos teus mares – que Ignoro...

Não me interessa o pouco que sei,

Fascina-me o muito que ignoro...

Por que, Senhor, és tu tão estranhamente cruel?

Por que me dás uma migalha

E me negas o banquete?

* * *

Até que, finalmente, compreendi a grande verdade:

Não és tu, Senhor, que me negas o muito

Sou eu mesmo...

Por demais estreitos são os meus espaços internos,

Não podem receber a tua amplitude...

Tenho de alargar a minha estreiteza,

Tenho de superar a pequenez do eu humano

Page 72: Huberto rohden   escalando o himalaia

E expandir-me na grandeza do Tu divino.

Esse Tu que és tu em mim,

Tu, meu divino Emanuel...

Rompe, pois, Senhor, as grades da minha prisão,

Por mais que meu ego relute e proteste!...

Tira-me tudo que é meu!

Deixa-me tão-somente o Eu!

Esse Eu desnudo e puro,

Que és Tu em mim!...

Para que eu encontre descanso e sossego

Dentro de mim...

Liberta-me, Senhor, de mim mesmo!

Não quero mais ser meu,

Quero ser teu,

Teu somente...

Fundido em ti...

Diluído em ti...

Absorvido por ti...

Finalmente liberto

E livre,

Como tu...

Page 73: Huberto rohden   escalando o himalaia

VÉSPERA DE FINADOS

Há tempo, muito tempo, que a idéia de morrer

Me deixa indiferente,

Sem arrepios de terror.

Hoje, porém, à vista de túmulos floridos,

Acometeu-me estranho pavor.

O que há de terrível no morrer não é morte em si

É a idéia glacial de não mais ser amado

Pelos entes que amamos,

E que nos amavam, aqui na terra...

Por quanto tempo se recordarão eles de mim,

Após a minha partida?...

Por um mês?

Por um ano?

Por um decênio?...

No princípio, flores e lágrimas...

Depois, ainda umas reminiscências...

E, por fim, a vasta solidão

Do esquecimento...

O gélido nirvana

Do vácuo...

Não ser mais amado pelos que amamos

Que morte horrível! ...

Page 74: Huberto rohden   escalando o himalaia

Não mais banhar-se carinhosamente

Nas pupilas de um ente querido,

Não mais ouvir o timbre da sua voz,

Não mais sentir o afago da sua mão,

Nem as pulsações do seu coração

Que morte amaríssima, essa!...

* * *

Entretanto, algo me diz e garante

Que não vou morrer essa morte mortífera...

Algo me faz adivinhar e entressentir

Que há um amor mais forte que a morte...

Que encontrarei, no Além,

Um tépido ninho de afeição,

Uma família que não me fez

Mas que eu fiz...

Foi a família material que me fez

Mas sou eu que faço a minha família espiritual...

Não é o parentesco dos corpos que me interessa

Interessa-me a afinidade das almas.

E essa afinidade espiritual é obra minha,

Eminentemente minha...

Eternamente minha

É eterna como eu mesmo...

Sei que essa família que eu fiz não morre para mim

Porque os seus membros são da “comunhão dos santos”

Envoltos e permeados de vida eterna,

De amor imortal...

Page 75: Huberto rohden   escalando o himalaia

PARA ALÉM DO NIRVANA

Fui inundado por um mar imenso,

Um oceano sem praias nem fundo...

Nada mais sobrou do meu velho ego...

Afogou-se tudo na imensidade do Todo...

O meu pequeno “existir” de ontem

Foi tragado pelo grande “Ser” de hoje

E de sempre...

Oh! inefável beatitude da divina Individualidade!

Liberto da humana personalidade!

Oh! divina embriaguez desse dulcíssimo Nirvana!

Sem nome nem forma, deste Sansara!

Banhei-me, voluptuosamente, em tuas vagas,

Gélidas como os glaciares do Himalaia,

Cálidas como as areias do Saara...

Banqueteei-me no lauto festim do Absoluto,

Do Infinito,

Do Eterno,

Do Uno sem Verso

Do Todo,

Desse Todo

Que não “existe”,

Porque “É”,

Page 76: Huberto rohden   escalando o himalaia

Que “É” com a infinita potência de seu “Ser”

E eu também “era” – e não mais “existia”

Desnascido de todas as peias do nascido,

Renascido para a gloriosa liberdade do “Ser” absoluto...

Meu fascinante Nirvana!...

* * *

Mas, ai de mim! que recaí

Ao plano da minha mortalidade,

Onde as coisas começam e terminam...

Novamente o meu Atman,

Que se libertara em Brahman,

Se sente prisioneiro de Maya,

Desse cárcere do mundo objetivo

Dos sentidos e da mente...

E por detrás das grades do meu finito “existir”,

Gemo e soluço pela ventura do infinito “Ser”...

Estou crucificado nos braços sangrentos

Da pesada cruz do meu humano “existir”,

Essa barra horizontal do meu finito

Que cortou o tronco vertical do meu Infinito.

E no ponto de intersecção das duas linhas,

Do Infinito e do finito,

Sangra a minha vida terrestre...

Se eu fosse o puro “Ser”, seria Deus, o Todo,

Se fosse o puro “não-Ser”, seria o Nada.

Mas eu sou esse estranho “existir”,

Esse “algo”, impuro e híbrido,

Page 77: Huberto rohden   escalando o himalaia

Feito duma inqualificável mescla

De “Ser” e “não-Ser”,

Do Todo e do Nada

Esse “algo” do meu humano “existir”,

A equilibrar-se, dolorosamente,

Entre o Infinito e o finito...

Entre a Luz e as Trevas...

Sofro a agonia metafísica

Da minha natureza dualista,

O drama e “ser dois”...

Sou o Prometeu acorrentado

Nos rochedos do Cáucaso,

Com as vísceras devoradas pelas harpias,

Parcela por parcela...

* * *

Quando terá solução esse enigma do meu existir?...

Cala-te, profano Intelecto!

Fala, divino Espírito!

Jamais conseguirão os ruídos da humana ciência analisar

O que o silêncio da divina sabedoria vive e sabe...

Para além de Maya,

Para além de Nirvana,

Para além de tudo que é dizível ou pesável,

Está a solução do grande enigma da vida humana,

Na voz do silêncio...

Nos abismos do Infinito...

Page 78: Huberto rohden   escalando o himalaia

Do silêncio pleni-consciente,

Do silêncio da plenitude.

Page 79: Huberto rohden   escalando o himalaia

SEGURANÇA E LIBERDADE

Quão imenso era o meu anseio de segurança

Nos tempos remotos da minha infância!

Vida sem segurança me seria infelicidade

Vida com segurança me era suprema beatitude.

Felizmente, lá estavam o pai e a mãe,

Como garantia da minha segurança,

Ele, símbolo do poder,

Ela, encarnação do amor.

E esse poder e esse amor me davam

Plena segurança.

* * *

Mas ai que despertou em mim, adolescente,

O anseio da liberdade.

Fastidiosa me parecia a velha segurança,

Fascinante a nova liberdade.

Abandonei a obsoleta monotonia

Do querer-ser-seguro

Pela inebriante epopéia

De querer-ser-livre.

Sorvia liberdade a largos haustos,

Em todas as formas.

Percorri todas as latitudes e longitudes

Page 80: Huberto rohden   escalando o himalaia

Desse país de maravilhas inéditas,

Desci a todas as profundidades,

Subi a todas as altitudes

Do universo da minha liberdade.

E, por algum tempo, me sentia

Plenamente remido e feliz.

* * *

Entretanto, em horas de silêncio

E ingresso em mim mesmo,

Ouvia, nas profundezas da alma,

Os gemidos duma dolorosa insegurança...

A liberdade de hoje me roubara

A segurança de ontem...

Verifiquei, com imenso pesar,

Que não podia ser seguro e livre

Ao mesmo tempo...

Que esses dois anjos de Deus

Eram adversos um ao outro,

Incompatíveis,

Empenhados em inconciliável conflito...

Compreendi que só poderia ter

Segurança sem liberdade

Ou então liberdade sem segurança.

E minha vida começou a definhar...

Que me interessava uma vida insegura

Ou uma vida escrava?

Page 81: Huberto rohden   escalando o himalaia

Seria apenas uma semi-vida,

E eu, faminto, ansiava por uma pleni-vida...

Só Deus sabe quanto hei sofrido

Por entre a fera Cila-e-Caribdis

Desse dilema cruel,

Da segurança hostil à liberdade,

E da liberdade adversa à segurança.

* * *

Até que, finalmente, amanheceu

A grande alvorada da compreensão...

Até que alguém proclamou dentro de mim

A grande síntese

Da segurança livre

E da liberdade segura.

Vi que esse impossível conúbio

Se tornara possível somente

No mundo misterioso do Uni-verso,

À luz do meu Cristo cósmico,

Onde impera a Verdade Integral,

A Verdade Libertadora...

Verifiquei que a obediência incondicional

A Consciência Cósmica em mim

É segurança absoluta

E liberdade integral...

A suprema autoridade, outrora externa,

Passou a ser autoridade interna.

Já não é algum homem infalível,

Page 82: Huberto rohden   escalando o himalaia

Algum livro, algum dogma

Essa suprema instância infalível

É o próprio espírito de Deus em mim,

O Deus do mundo

No mundo de Deus,

A voz do reino de Deus em mim.

E desde então a segurança de Deus se fundiu

Com a liberdade de Deus em mim...

Inundou-me duma segurança livre

E duma liberdade segura...

Aleluia!...

Page 83: Huberto rohden   escalando o himalaia

PURO ENTRE IMPUROS

Longos anos, em tempos idos,

Fui impuro com os impuros.

Depois, nauseado da minha impureza,

Separei-me dos impuros,

Para ser puro com os puros.

E, como era difícil encontrar ambiente puro

Entre os homens impuros,

Abandonei a sociedade humana

Deste mundo imundo,

E refugiei-me à solidão da Natureza,

Longe, bem longe dos homens...

Habitei em vastos desertos silentes,

Isolei-me no cume de taciturnas montanhas,

Meditei em cavernas desnudas

E vi que a Natureza era pura.

Enamorei-me da Natureza,

Inconscientemente pura,

Eu, que ansiava por ser

Conscientemente puro...

Ah! como me fazia bem

Essa inconsciente pureza em derredor!

Senti profunda afinidade

Page 84: Huberto rohden   escalando o himalaia

Entre mim e a Natureza,

Entre meu superconsciente,

Desejoso de pureza,

E aquele subconsciente

Da Natureza dormente.

E verifiquei que me conservava puro

Como a água, quando solicitamente isolada

Num recipiente puro.

Mas, que seria de mim, se abandonasse

Aquele ambiente de pureza que me cercava?

Acontecer-me-ia o que acontece à água,

À água pura em contato com ambiente impuro?...

Sim, eu o sabia,

Eu o sentia...

Minha pureza era fraca e precária,

Porque condicionada àquele ambiente casual...

E nasceu dentro de mim um desejo imenso,

O desejo de ser incondicionalmente puro,

Puro por força interna,

E não apenas por proteção externa,

Puro no meio de quaisquer impurezas,

Como a luz, que não se isola

Em segregados recipientes,

Para continuar a ser pura,

E ser fiel a si mesma...

Page 85: Huberto rohden   escalando o himalaia

E por que não poderia eu ser fiel a mim mesmo,

Como a luz?

Eu, que sou a “luz do mundo”?

Puro e incontaminável como a luz,

Que, afoita e sorridente,

Se lança ao meio de cloacas e sentinas,

A fétidos pantanais,

E imundas sodomas

E de todas as impurezas

Sai imaculada e pura...

* * *

Aborrecido, envergonhado da pura solidão,

Tive desejo de testar a minha pureza,

Lançar-me ao meio das maldades do mundo

Sem ser mau,

Ao meio de impuras sodomas,

Sem ser impuro,

Ao meio das babilônias dos profanos

Sem ser profano...

Senti em mim o veemente apelo

Da minha divina sacralidade...

Aureolado e penetrado da luz do meu Cristo interno,

Quis sentar-me à mesa com publicanos e pecadores,

Sem ser pecador nem publicano...

Compreendi que as profundas verdades

Brotam da solidão,

Como as nascentes que rompem

Page 86: Huberto rohden   escalando o himalaia

Do seio de altas montanhas.

Mas compreendi também que a verdade solitária

É apenas meia verdade,

Porque necessita do isolamento perene,

Para ser perenemente pura.

E eu queria ser puro como a luz,

Que não necessita de ser solitária,

Mas é solidária – e continua a ser pura...

Queria ser puro como a luz branca, incolor,

E puro também como a luz multicor,

Difusa pelo prisma, que dispersa sem contaminar...

A verdade é austera e silente,

Como a luz branca, incolor,

Porque habita a sós com Deus,

Profundamente solitária;

Mas, quando o Verbo da Verdade

Se faz carne no seio da Beleza,

Nasce a suprema Poesia Cósmica,

Solitária em Deus

E solidária com todas as creaturas de Deus.

* * *

Assim discorria eu comigo mesmo

Quando passou alguém,

Envolto em Verdade e Beleza,

E disse: “Eu sou a luz do mundo”...

E, quando eu, fascinado, o contemplava,

Page 87: Huberto rohden   escalando o himalaia

Acrescentou, olhando para mim:

“Vós também sois a luz do mundo”...

Desde essa hora tenho a certeza

De poder ser invulnerável,

Incontaminável,

Como a luz,

Se for fiel à “luz do mundo”

Que em mim está.

À luz, que purifica todas as impurezas

E não recebe em si as impurezas que elimina.

E em horizontes longínquos surgiu

Uma alvorada de luzes e cores,

A luz branca da Verdade,

Aureolada do colorido da Beleza...

E a minha vida se aureolou

De estranha poesia

Da poesia cósmica do Nazareno...

Page 88: Huberto rohden   escalando o himalaia

SOFRIMENTO REDENTOR

Deus do céu! como andava eu falsificado!...

Quão adulterado em mim mesmo...

Como andava soterrado,

Pelo ilusório ego humano,

O meu autêntico Eu divino!...

E sobre a base desse pseudo-eu humano

Corria a minha vida diária

Vida de ódios e rancores,

Vida de cobiças e egoísmos,

Vida de orgulhos e luxúrias...

Ao redor de mim havia amigos e inimigos,

Criaturas simpáticas e antipáticas,

Seres dignos do meu amor e do meu ódio

Tamanha era a falsificação da minha vida.

Veio então o sofrimento redentor...

O grande purificador de todas as impurezas...

O grande retificador de todas as tortuosidades...

O grande demolidor de todos os ídolos...

O grande simplificador de todas as complexidades...

E, após demolidas as muralhas do pseudo-eu,

Pela violência desse terremoto,

Page 89: Huberto rohden   escalando o himalaia

Pela veemência desse incêndio,

Pela crueldade dessa tormenta,

Pela sangrenta benevolência da dor,

Eis que ficou em pé tão-somente

O meu genuíno e autêntico Eu divino,

O meu eterno e puríssimo Cristo!...

Disseram-me então que eu ia morrer,

Que me sobravam poucos dias de vida terrestre.

Mas eu nada compreendi dessa linguagem profana,

Envolto na minha grande sacralidade,

Porque abolira a morte compulsória de fora

Pela morte voluntária de dentro...

Antes de ser morto

Eu morrera...

E esse glorioso morrer espontâneo

Me libertou do inglório morrer compulsório,

Libertou-me do que esse morrer tem de amargo e lúgubre.

Agora sou todo luz e leveza,

Como um raio solar,

Como um sopro de Deus...

E, após essa morte e ressurreição de dentro.

Sinto-me seguro e invulnerável.

Nada mais me pode derrotar,

Nada mais me pode fazer infeliz.

Sinto-me definitivamente remido

De todas as velhas irredenções

Engendradas pelo ego falaz.

Page 90: Huberto rohden   escalando o himalaia

Ingressei no reino dos céus,

Nasci para a vida eterna...

Aleluia!...

Hosana!...

Page 91: Huberto rohden   escalando o himalaia

LIBERTAÇÃO DE MIM MESMO

Profundamente envergonhado de mim,

Dolorosamente contrito diante de ti, Senhor,

Eu te rogo e suplico

Não que me dês conforto e prosperidade,

Não que me dês vida longa e saúde,

Não que me dês bons amigos,

Nem que me libertes dos meus inimigos,

Não te rogo, Senhor, que me preserves

Das adversidades da natureza

Nem da perversidade dos homens

Nada disto te rogo e suplico, meu Deus

Rogo-te tão-somente

Que me libertes de mim mesmo,

Da tirania do meu ego humano,

Da obsessão da minha cobiça,

Da impureza da minha luxúria,

Do luciferismo do meu orgulho,

De todos os derivados e acessórios

Do meu velho ego humano,

Que, há tantos anos e decênios, me traz cativo

Da sua tirania.

Suplico-te, Senhor, que seja hoje

Page 92: Huberto rohden   escalando o himalaia

Hoje, e não amanhã

O fim da minha longa escravidão,

O início da minha grande liberdade!

Que seja hoje o dia da minha morte

E da minha ressurreição,

O sangrento ocaso do meu homem velho,

A lúcida alvorada do meu homem novo,

A minha sexta-feira santa

E a minha Páscoa de ressurreição...

Que eu cante hoje mesmo o requiem do homem pecador

E o aleluia do Cristo redentor...

Amem... Amém...

Page 93: Huberto rohden   escalando o himalaia

VIDA E MORTE DO

MEU ORGULHO FILOSÓFICO

Ah! como me sentia feliz,

Naquele tempo!...

Havia aprendido, com muito esforço,

A pensar filosoficamente...

Altos conceitos, sublimes idéias e ideais

Me enchiam a cabeça e o coração...

E eu olhava com secreto menosprezo

A turbamulta dos profanos,

Da massa anônima,

Dos que não sabiam pensar

Filosoficamente.

Na cabeça e no coração era plenamente triunfante

A minha querida filosofia.

Mas, quando, um dia, tentei passar para a vida,

Para as mãos, para os pés,

Para minha vivência cotidiana,

A minha bela filosofia

Foi tremenda a minha decepção...

Ao primeiro esbarro com o mundo profano

Lá se foi, em mil pedaços,

Page 94: Huberto rohden   escalando o himalaia

O meu lindo cristal filosófico!...

Humilde e cabisbaixo, varri

Para a lata de lixo

Os cacos do meu cristal partido...

Quão poéticas são as teorias mentais

E quão prosaica é a prática real!

“Você é filósofo?” perguntou-me um amigo.

Quis responder com um afoito “sim”,

Como outrora,

Mas não tive suficiente energia

Para semelhante audácia...

Os cacos do meu lindo cristal me preservaram

Da infecção do velho orgulho mental.

“Procuro compreender um pouco”, respondi, hesitante.

E fui riscar um zero e mais um zero

Do nédio “100” da minha afirmação categórica

De tempos idos.

Ficou apenas o modesto “1” do orgulhoso “100”,

Esse “1”, mirrado e magro,

A apontar, silenciosamente,

As ignotas alturas do além...

Foi o que sobrou do opulento festim

Da minha filosofia que eu tinha

Na cabeça e no coração,

Mas que não era a minha vida...

Hoje procuro amparar,

Page 95: Huberto rohden   escalando o himalaia

Com mãos de solícita Vestal,

A bruxoleante luzinha sagrada,

A chama do meu grande ideal

De espiritualidade,

Feliz quando consigo

Ser na vida

Um por cento daquilo

Que sei na cabeça.

E tão orgulhosamente doce

Esse eu sei

É tão indizivelmente amargo

Esse eu sou.

O eu sei alimenta o meu velho ego,

O eu sou exige a morte desse ego

Para que nascer possa o novo Eu...

Agora, só me resta essa chama humilde

Do meu sincero querer,

Do meu sagrado crer,

Do meu cândido querer-compreender,

Na silente expectativa da graça de Deus

Que venha com sua plenitude

Encher a minha vacuidade...

Page 96: Huberto rohden   escalando o himalaia

LITURGIA CÓSMICA

Quando, em tempos idos, abandonei

As liturgias da minha infância

Missas, bênçãos e comunhões,

Sacramentos, insígnias e estandartes

Encheu-se minha alma de dolente nostalgia,

Sofrendo cruciantes dores de parto

De uma nova vida,

Ainda não vivida...

E nessas angústias de parturição espiritual,

Quando ouvia, ao longe, o tanger de sinos,

Chamando os fiéis à tradicional liturgia,

Chorava de saudades o meu pobre coração...

Hoje, porém, após muito sofrer e orar,

Eu vivo numa imensa catedral

De liturgia cósmica...

A minha vida toda é um sacramento,

Envolto em místicas nuvens de incenso...

Os meus domingos e as minhas festas

São sete por semana

E mais de três centenas e meia por ano...

Sonoras melodias de invisíveis órgãos

Page 97: Huberto rohden   escalando o himalaia

Exalam inebriante sacralidade

De hinos e cânticos divinos...

No santuário portátil do meu coração

Canta um Te-Deum de glórias divinas,

Vibra um Magnificat de júbilos anônimos,

E eu celebro, diariamente, a minha Missa

E faço a minha sagrada Comunhão

Por entre um Tantum-ergo de um êxtase de amor...

Sem altar nem sacerdote visível,

Sem hóstia nem cálice material,

Eu comungo o meu Cristo, eterno e interno,

Em espírito e em verdade...

Ah! se os outros soubessem

Da minha liturgia cósmica!...

Que minha alma celebra, sem cessar,

Por toda a parte,

De manhã à noite,

N o silêncio da floresta

E no bulício das cidades,

Na hora da meditação solitária

E nos ruídos da vida solidária,

Por entre as luzes da alegria,

E por entre as trevas dos sofrimentos

Sempre e por toda a parte,

Celebro a minha liturgia cósmica,

Desde que realizei o reino de Deus

Dentro de mim mesmo...

Page 98: Huberto rohden   escalando o himalaia

Desde que me tornei presente a Deus

Que estava sempre presente a mim...

Aleluia!...

Page 99: Huberto rohden   escalando o himalaia

O AMARGOR DOS MEUS ÊXTASES

Por que é que todos os meus arroubos místicos,

Os meus dulcíssimos êxtases,

Os meus inefáveis samadhis,

Acabam sempre em fel e amargor?

Quanto mais suave é meu contato com Deus,

Quanto mais intensa a minha luz interna

Tanto mais negra é a escuridão subsequente,

Tanto mais violenta a dor que me dilacera...

“Miserere mei, Deus” – esse Salmo do grande penitente

É o invariável epílogo de todos os meus enlevos,

De todas as núpcias de minha alma

Com o divino Logos...

“Miserere mei, Deus” – esse Salmo do grande penitente

Segundo a tua grande misericórdia,

E segundo a multitude das tuas comiserações,

Extingue a minha iniquidade!

Porquanto eu reconheço a minha iniquidade,

E está sempre em minha presença o meu pecado...

Não me rejeites, Senhor, da tua face,

E não retires de mim o teu santo espírito!

Crea em mim um coração puro,

E renova em minhas entranhas o espírito reto!

Page 100: Huberto rohden   escalando o himalaia

Restitui-me a alegria das coisas divinas,

E consolida-me no espírito principesco!

Em sacrifícios e holocaustos não te comprazes

O que te agrada é um coração humilde

E uma alma contrita...

“Miserere mei, Deus!...”

Nunca me é tão consciente a minha impureza

Como quando me ilumina intensamente

A pureza da tua luz, Senhor!...

Ao fulgor meridiano da tua claridade

Até os menores átomos de deslizes

Me causam intolerável tormento...

Dolorosas são todas as tuas revelações...

Quanto mais me aproximo da tua luz,

Tanto mais densa é a esteira de sombras

Que meu ser projeta após si...

E, como Simão Pedro, quisera eu suplicar-te:

“Retira-te de mim, Senhor,

Que sou um homem pecador!”...

Mas, que seria de mim,

Se te retirasses?...

Se tão densas são as minhas trevas

Em tua presença

Quão espessas seriam

Na tua ausência?!...

Rogo-te, por isto, Senhor:

Page 101: Huberto rohden   escalando o himalaia

“Fica comigo, porque a noite vem chegando

E vai declinando a luz do dia!”...

Sê a minha luz divina

No meio das minhas trevas humanas!

Sê a minha lúcida alvorada

No meio deste lúgubre ocaso!

Continua a revelar-te

A minha alma faminta,

Mesmo com amargor e acerbidade!...

Continua a inspirar-me suavemente,

Ainda que cada inspiração

Me torne mais consciente

A minha miséria!...

Miserere mei, Deus!...

Page 102: Huberto rohden   escalando o himalaia

A IRMANDADE INVISÍVEL

Desde que me encontrei com o grande Anônimo,

Me tornei anônimo do meu velho ego,

Esse ego sempre faminto de nomes...

E ingressei na Fraternidade Branca

Dos irmãos Anônimos,

Incolores,

Amorfos,

Invisíveis,

Onipresentes...

Ingressei na mística “ekklesia”

Dos arautos da Divindade,

Das Vestais do Fogo Sagrado,

Que operam no mundo inteiro,

Em todos os universos do Cosmos

Mas ninguém os conhece,

Esses Anônimos,

Envoltos no manto branco

Do eterno silêncio,

De inefável beatitude...

Onde quer que haja uma dor

A ser suavizada,

Page 103: Huberto rohden   escalando o himalaia

Uma alegria

A ser compartilhada,

Onde quer que agonize

Um coração chagado,

Lá estão os Irmãos Anônimos

Da Fraternidade Branca...

Nenhum monumento ostenta seus nomes,

Nenhuma estátua perpetua seus atos,

Nenhum obelisco lhes canta as glórias

Nenhum poema celebra a grandeza

Desses invisíveis arautos do bem,

Dessas alvas Vestais do amor...

Somente nas páginas brancas

Do livro da vida eterna

Estão inscritos seus nomes,

Com as tintas da reticência,

Em perpétuo anonimato...

Suas obras ocultam sempre

Suas pessoas...

A presença do seu visível “agir”

Coincide com a ausência do seu invisível “ser”...

Porque anônimos como Deus

São esses ignotos filhos de Deus

Benéficos raios solares

Do grande sol do Universo,

Sempre ausente de mim

E sempre presente a Ti...

Page 104: Huberto rohden   escalando o himalaia

Na tua longínqua transcendência,

Na tua propínqua imanência...

Desde que me encontrei com o grande Anônimo

Me tornei anônimo do meu eu humano,

Eclipsado por seu Tu divino

Pelo eterno Eu divino

Em mim...

Page 105: Huberto rohden   escalando o himalaia

SOU ESCRAVO DA VERDADE

Naqueles tempos, sonhava eu com liberdade.

Cantava hinos à liberdade, como meus companheiros,

Tão escravos como eu.

Éramos todos escravos

Escravizados pela liberdade.

Liberdade era para nós indisciplina,

Não estar preso,

Poder andar onde quiséssemos,

Entrar e sair por toda a parte,

Pensar, dizer e fazer tudo

Que nos viesse à mente,

Não ter de obedecer a lei alguma

Não ter de prestar contas a ninguém

Era isto que nós chamávamos liberdade.

* * *

Hoje me horroriza essa liberdade

Liberticida!...

Hoje me repugna essa indisciplina

Mortífera...

Hoje renunciei à minha liberdade

Para ser livre...

Tomei sobre mim o jugo da disciplina

Page 106: Huberto rohden   escalando o himalaia

Para me des-escravizar...

Enfastiado da infeliz liberdade,

Tenho fome da feliz disciplina...

E esse jugo suave que aceitei

Não é um imperativo de fora,

É a voz do meu grande Eu divino,

É a sacralidade do espírito de Deus,

Que habita em mim,

É o império do meu Cristo interno.

O meu ego humano fez um pacto sagrado

Com o meu Eu divino,

Um pacto de obediência incondicional

A esse grande Além-de-dentro.

Por vezes, o meu ego humano geme e chora,

Sangra e agoniza,

Quando o grande Eu divino exige

Obediência incondicional.

Aos imperativos da consciência,

Esse eco imanente

Da voz transcendente;

A desobediência a essa voz severa

Seria a minha escravidão.

Por isto, aceito espontaneamente

Essa disciplina benéfica

Que me liberta

Da indisciplina maléfica...

Page 107: Huberto rohden   escalando o himalaia

* * *

Mas os de fora,

Os profanos,

Os inexperientes,

Meneiam a cabeça

E estranham minha atitude;

Dizem que eu sou escravo

E que eles são livres.

E eles têm razão:

Eu sou escravo da Verdade,

E eles são livres dessa Verdade,

Porque escravos do erro...

Oh! gloriosa escravidão da Verdade!

Não permitas que eu jamais

Me liberte de ti!

E caia vítima da liberdade do erro!

Tu me libertastes, Verdade!

Conserva a minha liberdade!

Page 108: Huberto rohden   escalando o himalaia

A ARTE DE DESAPRENDER

Muita coisa aprendi,

No decurso da minha vida

Mas só no fim da vida

Aprendi a arte dificílima

De desaprender...

Desaprender os erros sem conta

Que os sentidos percebem

Na sua erudita ignorância...

Aprendera ele que os fatos externos

São a própria Realidade.

Aprendera que este mundo

Que os sentidos percebem

E o intelecto concebe,

São a realíssima

E única Realidade...

E por largos anos

Andei escravizado por essa ilusão.

Pois, que admira?

Se, por tantos séculos e milênios,

Dormira a humanidade nas trevas,

Como poderia eu, em poucos decênios,

Despertar para a luz?

Page 109: Huberto rohden   escalando o himalaia

Até que, finalmente, descobri

A Realidade para além das facticidades,

A alma do eterno Ser

No corpo desse efêmero parecer.

Hoje sei que os fatos são meros reflexos

No espelho bidimensional de tempo e espaço,

Reflexos da Realidade,

Que está em sentido oposto

A esses fatos refletidos

No espelho de tempo e espaço.

Mas só Deus sabe quanto esforço,

Quantos sofrimentos,

E quanta agonia me custou

Essa nova atitude,

Essa meia-volta que tive de dar

Ante o espelho do mundo das velhas ilusões,

Para enxergar o novo mundo da verdade!

Esse movimento de 180 graus,

Que dei em face do refletor,

Essa conversão dos conhecidos finitos

Para o desconhecido Infinito,

Me custou o holocausto do meu ego,

Esse sangrento egocídio,

Que a verdade me exigiu...

Mas agora, de costas para os fatos

Page 110: Huberto rohden   escalando o himalaia

E de rosto para a Realidade,

Me sinto grandemente liberto

E jubilosamente feliz

E, em vez de amar o mundo sem Deus,

Amo o mundo em Deus

Porque vejo em cada fato efêmero

O reflexo da Realidade eterna.

Page 111: Huberto rohden   escalando o himalaia

OS TRÊS MUNDOS DENTRO DE MIM

Indefeso jornadear é a minha vida.

Cruzei solitários Saaras,

Galguei gigantescos Himalaias,

Perdi-me em vastas selvas,

Desci a tenebrosos abismos

Até, finalmente, atingir um oásis de paz,

De uma paz profunda, nascida da Verdade...

Entrei no terceiro e último

Dos meus mundos de dentro...

Arribei à mais longínqua galáxia

Dos universos de Deus...

No princípio, quando minha alma era criança,

Necessitava eu duma autoridade externa,

De um homem super-homem,

Que me guiasse pela mão,

Rumo a Deus.

E eu vivia tranquilo nesse mecanismo

De cega obediência

A um homem que fazia as vezes de Deus.

Mais tarde, muito mais tarde,

Quando adolescente,

Page 112: Huberto rohden   escalando o himalaia

Em face das fraquezas dos homens de fora,

Desiludido, decepcionado,

Agarrei-me a outra tábua salvadora,

Em pleno naufrágio.

Analisei fatos históricos,

Estudei livros sagrados,

Relíquias de primitivas eras

E minha fé em Deus se robusteceu

E se purificou.

Encontrei o meu Deus

No mundo dos homens

E sentia-me muito seguro

De mim mesmo.

Mas... o mundo é tão paradoxal,

Tão vácuo de Deus

E tão pleno de Satan,

Pleno de luzes...

Insatisfeito com o mundo de Deus,

Fui em busca de Deus

Dentro de mim mesmo...

Em longas horas de silente introspecção,

Em noites solenes de êxtase anônimo,

Em abismos de dinâmica passividade,

Em epopéias de luminosa escuridão,

Em céus infernais de dulcíssimas agonias,

Em silenciosos brados de amorosa tortura

Page 113: Huberto rohden   escalando o himalaia

Encontrei-me com o grande Anônimo

De mil nomes...

Celebrei as minhas núpcias místicas

Com o Infinito EU SOU...

E eclipsaram-se todos os mundos de Deus,

Aos fulgores do Deus dos mundos...

E eu era feliz, na certeza do meu destino,

Do porquê da minha vida terrestre...

Hoje, a luz de dentro

Me reconciliou com o mundo de fora

Hoje a experiência do Deus do mundo

Me tornou tolerável o mundo de Deus.

Page 114: Huberto rohden   escalando o himalaia

CONTEMPLANDO A GLÓRIA DE DEUS

Quantas vezes, meu Deus, hei suspirado

Por ver a tua glória celeste!

Glória que eu suspeitava velada

Por detrás das obras das tuas mãos.

Perlustrei vastas paragens d’aquém e d’além-mar,

Cruzei oceanos de água e de areia,

Internei-me em místicas florestas,

Ascendi silenciosas alturas de neve e gelo,

Escrevi livros sobre as “Maravilhas do Universo”

E sobre os teus “Mundos Ignotos”

Porém, as tuas glórias continuavam veladas,

Vislumbradas de longe, em incerta miragem,

Como que adivinhadas “em espelho e enigma”...

Insatisfeito, afastei-me de todas as tuas obras

E tentei intuir-te diretamente,

Em ti mesmo,

N o teu divino Ser...

Ensimesmei-me profundamente...

Fechei os olhos de fora

E abri a vista de dentro...

E do seio dessa grande noite,

Page 115: Huberto rohden   escalando o himalaia

Do abismo desse silêncio anônimo,

Surgiu uma luz...

Ecoou uma voz...

Vivi a tua glória, Senhor,

Em momentos eternos,

Em átomos de tempo...

Vivi-te em lampejos

De inefável beatitude,

Para além de todo o dizível,

Para além de todo o pensável

Na solitude anônima e incolor

Da tua Suprema Realidade...

* * *

E eu me julgava definitivamente feliz.

Plenamente realizado.

Julgava terminada a longa jornada...

Sentia-me imerso na luz eterna

Do teu reino...

Mas, quando voltava a mim,

Dessa maravilhosa ausência de mim mesmo,

Perdia a tua deliciosa presença,

Extinguia-se a tua teofania,

E eu, novamente, tateava na velha escuridão,

Clamando por tua glória, Senhor...

Por entre as angústias do meu coração,

Através das lágrimas dos meus olhos,

Page 116: Huberto rohden   escalando o himalaia

Voltei da longínqua sacralidade

Para a propínqua profanidade

Do mundo e dos homens...

* * *

Finalmente, porém, compreendi

O mistério da tua glória, Senhor...

Por fora, me fiz insipiente com os insipientes,

Impelido pela sapiência de dentro...

Sentei-me à cabeceira dos sofredores,

Pensei as chagas às ruínas humanas,

Ergui do lodo Zaqueus e Madalenas,

Amparei a vida semi-extinta

De crianças enjeitadas,

Fiz-me Cireneu de todos os crucificados,

Verônica de todos os rostos sangrentos...

Meus amigos de antanho,

Sócios do meu solitário misticismo,

Menearam a cabeça, decepcionados,

Porque eu “apostatara” dos meus ideais,

E me tornara o “mais profano dos profanos”,

Amigo de “publicanos e pecadores”,

Homem medíocre e rotineiro

Derramado em ruídos mundanos...

...............................................................................................................................

Grande foi a minha solidão externa,

Doloroso esse abandono de muitos...

* * *

Page 117: Huberto rohden   escalando o himalaia

Sentado à beira dum lago,

Margeado de verde capinzal,

Contemplo o jogo lépido

Das levianas libélulas,

A adejarem pelo espaço ensolarado...

E, de par em par, se abre minha alma

Aos imponderáveis eflúvios

Dos mundos de Deus...

E eis que a glória de Deus me transluz

Das esguias folhinhas de capim!...

E os esplendores do Infinito irradiam

Das asas vítreas das libélulas!...

E as águas do lago plácido refletem

As maravilhas do Altíssimo!...

Olho em derredor

E o Deus do mundo se revela

No mundo de Deus

Em inefável apoteose...

Envolto e permeado

Dessa divina epifania,

Compreendi o incompreensível:

Tuas glórias, Senhor,

São onipresentes,

Sempre radiantes,

Em átomos e em astros,

Em todas as tuas creaturas,

Pequenas e grandes.

Page 118: Huberto rohden   escalando o himalaia

Fraca, porém, é a minha vidência

Para intuir a realíssima Realidade

Da tua presença...

Solidão e sofrimento

São as asas que me erguem

Às alturas de estranha vidência.

A mística solidão a sós contigo

E a desinteressada vivência no meio dos homens

Geram amor e sofrimento

Amor sofrido,

Sofrimento amado

Essa polaridade cósmica

Da iniciação,

“A Deus adorarás”

Em Deus,

“E só a ele servirás”

Entre os filhos de Deus.

Page 119: Huberto rohden   escalando o himalaia

O SILÊNCIO DA VERDADE

Posso provar que a terra é redonda.

Posso provar que H2o é água.

Posso provar que 2 X 2 são quatro.

Tudo isto são verdades apenas

Nada disto é a Verdade.

A Verdade jaz para além,

Infinitamente além,

De todas as verdades demonstráveis

A Verdade começa lá onde terminam

Todas as verdades,

Todos os pensamentos,

Todas as acrobacias do intelecto.

A Verdade jaz sepulta no profundo abismo

Do eterno Silêncio

Da intuição mística.

A Verdade é a consciência do SER.

A Verdade não existe,

Debilmente

A Verdade É

Poderosamente.

Pode o meu pensar consciente

Por-me nas mãos o fio de Ariadne,

Page 120: Huberto rohden   escalando o himalaia

E eu, enrolando-o cautelosamente,

Como o lendário herói da mitologia,

Saio do tenebroso labirinto

Das minhas velhas incertezas

E sigo até ao limiar do santuário

Da Verdade

Mas... não entro no santuário

Porque o fio de Ariadne

Está preso do lado de fora...

Nenhum pensar ou querer,

Nenhuma ciência analítica

Introduz-me no santuário divino

Da Verdade Suprema,

Da Realidade Última e Absoluta

Para além de todas as coisas penúltimas e relativas...

Tenho de ser invadido

Pela alma do cosmos

Para que o Verbo se faça carne,

Para que a carne se possa fazer Verbo...

O Infinito desce ao finito,

Para que o finito possa subir ao Infinito...

Cesso de pensar e de querer

E, com isto, cessam todas as ilusões do intelecto,

Todos os tormentos da vontade,

Todas as doenças crônicas do velho ego,

Todas as miragens do mundo objetivo,

Todas as misérias da personalidade...

Page 121: Huberto rohden   escalando o himalaia

E desce sobre mim, qual orvalho vespertino,

A grande paz da Verdade,

Poderosamente suave,

Suavemente poderosa,

“Dura como diamante

Delicada como flor de pessegueiro”...

E eu sei e sinto, inefavelmente,

Que eu sou o Universo,

Que o Universo é eu...

Que “eu e o Pai somos um”,

Que “meu é tudo que é do Pai”...

...............................................................................................................................

E, depois desse sangrento egocídio,

Após essa total eutanásia,

Eu me sinto divinamente redento,

De todas as amargas reminiscências do passado,

De todos os temores do futuro...

Sei – não que encontrei a Deus –

Mas que fui encontrado por Deus...

Deus me achou,

Porque eu me tornei achável...

O Cristo me redimiu,

Porque me fiz redimível...

Aleluia!... Amém!...

Page 122: Huberto rohden   escalando o himalaia

MEU DESERTO VIVO

Exaustivo deserto era minha vida espiritual...

Após o êxodo do Egito de minha fartura material

Definhava de fome a minha alma torturada...

Para onde quer que eu volvesse meus olhos famintos,

Áridos saaras se alargavam em derredor

A perder de vista,

Em parte alguma um verde oásis

Prometia refrigério ao lasso viajor

Em parte alguma o fluido cristalino duma fonte

Acenava alívio à língua ressequida,

Desde que o globo fulvo do sol matutino

Emergia de imenso areal

Até que sua esfera sanguínea submergia

Nas trevas noturnas

Gemia minha alma errante:

“Quando terminará essa jornada?

Quando despontará no horizonte a Terra da Promissão?”

Mas eis que a dor me outorgou

Estranha clarividência

A minha alma sofredora...

Hostilizada e torturada

Page 123: Huberto rohden   escalando o himalaia

Por todas as periferias ingratas

Demandei os profundos abismos

Do meu centro divino,

Submergi nas trevas profundas

Da minha eterna essência

A princípio, nada vi

Nessa noite absoluta

Do meu centro anônimo

Até que, finalmente, vislumbrei

Estrelas longínquas

Através do pavoroso nada

Da solidão noturna,

E muito aos poucos,

Muito aos poucos,

Minha alma descobriu um novo mundo

Um universo de grandeza e formosura

Para além dos conhecidos páramos

Dos sentidos e da mente

E o meu deserto transbordou de vida.

Page 124: Huberto rohden   escalando o himalaia

PEREGRINO DO INFINITO

Estranhas luzes brotam dos abismos,

Das profundezas do meu divino Ser,

Através da noite do meu humano existir...

E ao clarão dessas luzes eu vejo

O que ninguém pode ver com olhos corpóreos,

Nem com vidência intelectual...

Vejo o que sou na realidade,

Vejo que eu sou

O EU SOU individual,

Que se emanou do seio imenso

Do EU SOU universal...

E o meu pequeno EU SOU humano,

Projetado pelo Sol imenso

Do EU SOU divino,

Caiu nas trevas longínquas

Do inconsciente individual,

Atordoado...

Perplexo...

Incônscio...

Tamanha foi minha queda!...

.........................................................................................................................................................

Mas sinto que há em mim uma luz,

Page 125: Huberto rohden   escalando o himalaia

Uma luz ofuscada que brilha nas trevas,

E as trevas não a prenderam...

E a semi-Iuz divina que em mim está

Anseia por voltar à pleni-Iuz em que estava.

E, para regredir à pleni-Iuz divina,

O meu grande EU central se reveste

De pequenos eus periféricos,

De sucessivos egos existenciais,

De máscaras, personas,

Invólucros transitórios,

Multiformes,

Multicores,

Para reacender no seio do Eu-indivíduo

A Luz do EU-Universo...

E lá se vão, como efêmeras ondas

A cobrirem o eterno oceano do meu divino EU,

Egos após egos,

Personas e mais personas,

Fantásticos invólucros existenciais telúricos

Da minha eterna essência cósmica!...

E cada uma dessas ondas do ego

Deixa no oceano do EU

Algo de si...

Algum resíduo experimental,

Uma alegria,

Uma dor,

Uma esperança,

Page 126: Huberto rohden   escalando o himalaia

Um desengano,

Um crédito,

Um débito,

Um “sim” de verdade,

Um “não” de erro...

E da imensa cadeia de elos

Das minhas personas,

Das minhas máscaras transitórias,

Se tece a epopéia eterna

Da minha existência humana,

Lançando uma ponte

Em demanda da essência divina.

Das pedrinhas brancas e pretas .

Do meu sucessivo nascer e morrer se formara o mosaico

Do meu eterno VIVER

Do VIVER sem nascer nem morrer.

Realmente, há “muitas moradas

Em casa do Pai celeste”...

Muitos planos de vivência há

No Universo de Deus...

E eu me sinto feliz viajor

Nessa jornada cósmica,

Jubiloso peregrino do Infinito,

Através de muitos finitos,

Demandando a luz da vida eterna

Através de inúmeras mortes efêmeras...

Page 127: Huberto rohden   escalando o himalaia

QUIS ENTRAR NO CÉU

DE CONTRABANDO

Ó mundo ingrato e falaz!

Ó mundo cruel e avaro!

Por que me negaste tudo

O que eu de ti esperava?...

Adorei-te intensamente,

Idolatrei-te perdidamente...

Da manhã até à noite,

Sem cessar,

Andei em busca dos teus tesouros...

Da manhã até à noite,

Da noite até à manhã,

Engendrando planos e projetos

Para captar a matéria-morta

E a carne-viva que prometes

A teus servidores.

Mas tu me davas precariamente

O que eu desejava em abundância.

Por isto, enojado de ti,

O mundo ingrato e falaz,

Abandonei-te, amargurado,

E fui em demanda de Deus.

Page 128: Huberto rohden   escalando o himalaia

Voltei-te as costas,

Em mudo protesto.

Falei mal de ti,

Ó mundo cruel e avaro,

A todos os meus amigos

E sócios de decepção.

...............................................................................................................................

Mas... oh, ingrata surpresa!

Não encontrei sossego em Deus...

Algo insatisfeito me distanciava

E me mantinha longínquo

Do Deus propínquo.

Algo como imaturidade,

Mais adivinhado que sabido,

Me enchia de nostálgica saudade,

E evocava em mim imagens profanas,

De mundos idos, semi-delidos,

De uma vida não vivida...

E eu voltei as costas a Deus

E, impetuoso, me lancei a teus braços,

Ó mundo querido e idolatrado!...

E tu me deste tudo, tudo

Que desejar pudesse,

No vasto âmbito das minhas ambições.

Cumulaste-me de riquezas,

De honras e glórias sem par.

E eu me banhava, voluptuosamente,

Page 129: Huberto rohden   escalando o himalaia

Em tuas tépidas ondas,

Longe, bem longe, das praias de antanho,

Intensamente satisfeito comigo

E contigo, ó mundo fagueiro!...

* * *

Mas, eis que a grande fome

Que eu tinha de ti,

A fome que tão prodigamente

Me saciaste,

Se converteu em fastio,

Num fastio imenso de ti

E num fastio de mim mesmo,

Teu devotado adorador...

E novamente me afastei de ti,

Não por me teres negado o que te pedira,

Mas por me teres dado tudo, tudo,

Mais do que te pedira,

Mais do que desejar pudesse...

Saciaste todas as minhas fomes,

E essas fomes todas,

Tão exuberantemente saciadas,

Criaram em mim um fastio tão grande

Que não mais te tolero,

Ó mundo profano,

Não mais te tolero,

Porque não mais me tolero,

Por ti profanado

Page 130: Huberto rohden   escalando o himalaia

E profanizado...

* * *

E agora, sem ódios nem desejos,

Sem protesto nem amargura,

Sem saudades nem nostalgias,

Em plena paz contigo

E quite comigo mesmo,

Entrei no mundo grandioso

Que teus devotos ignoram

Um mundo de gozo sem fastio,

Que amanhece para além de todas as fomes

E de todos os fastios que tu conheces,

Para além de todos os teus ocasos

Na grande Alvorada de Deus...

A grande LIBERTAÇÃO...

Page 131: Huberto rohden   escalando o himalaia

ATÉ AO LIMIAR DO SANTUÁRIO

Todas as minhas acrobacias mentais,

Todas as minhas eruditas análises

Me levaram até ao liminar do santuário

Nenhuma me introduziu no recinto sagrado...

E minha alma, faminta e sedenta,

Sofrida de Deus

E sofrida de si mesma,

Anseia pelo ingresso no sancta sanctorum

Da Verdade eterna...

Através do Inferno e do Purgatório

Me levou o Virgílio do humano intelecto

Mas no Paraíso sagrado do espírito

Só me pode introduzir Beatriz,

A alma beatificante,

A revelação da Realidade.

Altíssimas torres babilônicas

Ergueu minha ciência mental,

Em vastas planícies profanas.

Mas, se Deus não descer das alturas,

Se o divino carisma não baixar do Infinito

Sobre minhas torres humanas,

Jamais valerão os meus esforços

Page 132: Huberto rohden   escalando o himalaia

Conquistar o reino de Deus!

Necessários são todos os meus labores,

Suficiente não é esforço algum...

É esta a sangrenta tragicidade da minha vida:

Ter de exigir do meu ego humano

O máximo que ele pode prestar

Pensando, lutando, sofrendo

E depois aguardar o advento da graça divina,

Como se nada valessem

Todos os meus esforços humanos...

É esta a sangrenta tragicidade da minha vida.

E, por entre esses pólos extremos,

Em dolorosa tensão bilateral,

Em dinâmica passividade,

Se move a odisséia da minha existência

Rumo ao Infinito...

Sempre em demanda do termo final

E sempre distante desse termo...

Sempre na linha reta do caminho certo

E sempre cortado pelos ziguezagues

De mil linhas transversais...

É esta a minha doce amargura,

É esta a minha amarga doçura,

A minha jornada ascensional

Rumo às alturas...

A vida eterna não é uma chegada.

A vida eterna é uma jornada

Page 133: Huberto rohden   escalando o himalaia

Rumo ao Infinito

Em linha reta –

E sempre distante da meta.

Page 134: Huberto rohden   escalando o himalaia

EM TOTAL NUDEZ

Finalmente, Senhor, consegui despojar-me

De todas as roupagens impuras do existir...

Finalmente, o meu ego existencial

Se des-existencializou...

Finalmente, o meu EU essencial se revelou

Em sua total nudez,

Na puríssima realidade do seu divino SER,

Longe de todas as camuflagens

Do humano existir...

Finalmente, aconteceu-me

A grande Libertação...

Abriram-se as portas

Da minha velha prisão...

A tua graça, Senhor, derrotou

Todas as minhas des-graças...

A teu fiat lux me fez amanhecer

N a madrugada do teu eterno gênesis...

O meu Nada se tornou Algo,

Graças ao grande Todo

Que tu és...

E eu sei, finalmente,

O que sou...

Page 135: Huberto rohden   escalando o himalaia

Eu sou luz da tua Luz,

Eu sou vida da tua Vida,

Eu sou amor do teu Amor...

...............................................................................................................................

Sim, EU SOU!

Que estupenda realidade!

Eu sou o que tu és

Não sou assim como tu és.

O meu Ser é teu SER

Mas o meu Ser-assim

E distinto do teu.

Eu sou finitamente,

Existencialmente,

Tu és infinitamente,

Essencialmente...

Mas há entre mim e ti

Um elo comum:

Tu és o SER absoluto,

Eu sou um Ser relativo,

Tu és o SER increado,

Eu sou um Ser creado...

O meu Ser emerge, qual pequena onda,

Do vasto oceano do teu SER...

O meu Ser cintila, qual raio solar,

Em trêmula gota de orvalho,

Irradiado pelo imenso globo do sol...

...............................................................................................................................

Page 136: Huberto rohden   escalando o himalaia

Contemplo-me, finalmente,

Na castíssima nudez

Da Verdade integral...

E a Verdade me libertou

De todas as escravidões

Das inverdades...

E meu humano existir exulta

À luz do meu divino Ser...

Minha vida é bela e feliz,

Porque é um sopro da tua Vida,

Um raio da tua Luz,

Um brado do teu Amor...

Page 137: Huberto rohden   escalando o himalaia

RETIRADA ESTRATÉGICA

DA MINHA VIDA

Libertei-me, por fim, do velho ego,

Definitivamente!...

Desci do palco dos fantoches,

Desisti da comédia da vida.

Sentei-me na platéia

Como mero expectador,

Contemplando o movimento automático

Dos bonecos de engonço, lá no palco,

Onde eu estava.

Libertei-me do velho ego

E de todos os seus acessórios e derivados.

E, desde já, aceito,

Antecipadamente,

Espontaneamente,

Tudo quanto implica

Essa retirada estratégica da minha vida.

Aceito todas as angústias anônimas,

Todas as hemorragias do coração,

Todas as lágrimas de compaixão,

Todos os sorrisos de escárnio

Dos que não me compreendem,

Page 138: Huberto rohden   escalando o himalaia

Dos que me julgam herege, dissidente, traidor,

Dos que me consideram mentecapto, desvairado...

Eu disse à vida: “Que é que me podes dar,

A mim, que nada mais desejo de ti?”

Desafiei a morte: “Que é que me podes tirar,

A mim, que nada receio de ti?”

Já morri, espontaneamente,

Antes que tu me matasses,

Compulsoriamente!”...

Cometi um glorioso egocídio,

Perpetrei minha mística eutanásia...

Encerrei a minha vida,

Essa pseudo-vida do velho ego...

Já não vive o meu ego profano,

Vive somente o meu Eu sagrado,

O meu divino Cristo interno...

Eu sou por ele vivido,

E plenamente vitalizado...

E agora que nada mais desejo

Que a vida me possa dar,

E nada mais receio

Que a morte me possa tirar,

Agora entrei na gloriosa liberdade

Dos filhos de Deus.

* * *

E, daqui por diante, o mundo em derredor

Page 139: Huberto rohden   escalando o himalaia

Me é uma fascinante sinfonia,

Cheia de surpresas e encantos...

Sinto-me tão leve e luminoso,

Tão sereno e sorridente,

Que quisera cingir, num amplexo de amor,

O Universo inteiro,

E dar a todos os seres do mundo

Algo da minha grande beatitude...

Da austera disciplina de ontem

Brotou a suave alegria de hoje.

Da rude batalha da vida

Nasceu a vitória sobre a morte.

Assinei um grande tratado de paz

Flutua a bandeira branca

Sobre o santuário de minha alma...

E tudo me pertence agora,

Porque nada mais tenho de meu,

E nada mais desejo adquirir...

O pólo negativo da minha renúncia

Despertou em todas as coisas

O pólo positivo...

E tudo quer vir a mim,

Estranhamente imantado;

Desde que tudo abandonei

Todas as creaturas confiam em mim,

Page 140: Huberto rohden   escalando o himalaia

Porque de todas me desapeguei,

Não com acerbo desdém,

Não com violento protesto,

Mas com suave compreensão

E sorridente benevolência...

Todas as coisas me pertencem,

Desde que só a Deus eu pertenço...

Todas me querem bem,

Desde que nada mais quero

Senão Deus somente...

Nada me é negado,

Desde que me neguei a mim mesmo;

Desde que escolhi a solidão do Creador,

Entrei na sociedade de todas as creaturas...

O estático silêncio da mística

Canta na dinâmica vivência da ética.

* * *

E agora estou pronto

Para voltar ao mundo,

Sem ser do mundo...

Eu venci o mundo

Nunca mais serei vencido pelo mundo.

Do nadir da minha total vacuidade

Rompeu o zênite da minha infinita plenitude...

Vivo vida abundante,

Porque morri espontaneamente...

Tudo pode o mundo esperar

Page 141: Huberto rohden   escalando o himalaia

Do homem que nada espera do mundo.

Page 142: Huberto rohden   escalando o himalaia

QUANDO ME TORNAREI SUPÉRFLUO?

Almas sem conta me procuram,

Como guia e diretor,

Nas incertas veredas do Além.

Tão incertas são essas veredas,

Tão ignotos os vastos desertos,

Tão inexploradas as densas florestas,

Tão misteriosos os altos Himalaias

Que medeiam entre a alma e Deus,

Que poucos se atrevem a arrostar

Tão estranha jornada,

Sem um perito que, de experiência própria,

Conheça essas obscuras paragens.

Preferem ser conduzidos com acerto

A se conduzirem com desacerto.

Segurança é o elemento vital

Da existência humana,

Em todos os planos da vida.

E toda vez que uma alma humana

Me põe nas mãos o seu destino,

Eu me sinto humilhado,

Porque dolorosamente consciente

Page 143: Huberto rohden   escalando o himalaia

Se me torna o pouco que sei

E o muito me ignoro...

Que é essa minúscula gotinha

Da minha experiência

Em face do oceano imenso

Da minha inexperiência?

Esse pólo positivo da confiança

Que outros em mim depositam

Desperta em mim o pólo negativo

Da desconfiança que sinto em mim mesmo.

E, humilde e confiante, rogo a Deus

Que me purifique e habilite

Para servir de canal e veículo idôneo

Das águas vivas que fluem da Fonte Eterna,

Para que minhas impurezas humanas

Não contaminem a pureza divina

Que devo canalizar para as almas

Que, confiantes, me procuram.

Não compreendo nem jamais compreenderei

Como possa alguém orgulhar-se

Do seu ofício de mestre de almas...

Humildade e incerteza,

Vergonha e incompetência

São os terremotos que me abalam

Em face de tarefa tamanha.

Quando serei, finalmente, supérfluo?

Page 144: Huberto rohden   escalando o himalaia

Quando terei a suspirada glória

De ser “servo inútil”?...

Quando terão os meus conduzidos a luz e força

De se conduzirem a si mesmos?

Quando passará a sua precária heteronomia

A ser uma segura autonomia?

Quando poderão esses alo-guiados dispensar

Escoras e muletas externas de um mestre humano

E prosseguir a sua jornada, auto-guiados,

À luz do seu mestre interno?

Amanhece, enfim, ó dia ditoso

Em que eu seja supérfluo!

Em que meus conduzidos de hoje

Se tornem condutores de amanhã!

Guiados pelo espírito de Deus,

Com jubilosa segurança,

Rumo aos tabernáculos eternos!...

Page 145: Huberto rohden   escalando o himalaia

DA UMIDADE PARA A HUMILDADE

Desce das eternas alturas,

Ó fogo de Deus!

Incendeia-me todo com teu ardor!

Consome o meu combustível,

Em veemente ignição!

Batiza-me com o fogo do espírito santo!...

Assim suplicava eu,

Por anos e decênios

Mas o fogo divino não vinha,

Não descia das alturas,

Não consumia o meu velho ego,

Em grato holocausto...

Finalmente, descobri o porquê

Dessa dolorosa frustração...

Descobri que havia em mim

Excessiva umidade

A profana umidade do ego impenitente,

Os humores terrenos que embebiam

A minha humana personalidade,

A sutil vaidade e vanglória

De querer conquistar o reino de Deus

Page 146: Huberto rohden   escalando o himalaia

Pelas forças do ego luciférico...

* * *

Evaporei então o último resto

Dessa humana umidade,

Ao sopro duma grande humildade...

Confessei o meu nada,

A teus olhos, Senhor...

E à luz da tua potência

Dissipou-se a minha importância

Reduzida a total impotência...

E essa intensa aridez do meu ego

Chamou das alturas as labaredas

Do fogo divino...

E minha alma se abrasou

Num incêndio cósmico

De compreensão,

De amor,

De adoração,

De beatitude...

E sobre o altar do meu coração

Arde agora o fogo sagrado,

Amparado pela casta Vestal

De minha alma,

Em inefável ignição...

Page 147: Huberto rohden   escalando o himalaia

ALMA GESTANTE

Quando a alma anda grávida de Deus,

Em adiantada gestação,

Basta o mais ligeiro impulso

Para dela nascer o Cristo...

Um olhar,

Um gesto,

O timbre duma voz,

O eco duma melodia,

Uma florzinha à beira da estrada,

Uma estrela no céu noturno.

Um sorriso de criança,

E até a lágrima de um sofredor

Para atear na alma o amor de Deus,

Para encher de inefável beatitude

O coração faminto do Infinito...

Nasce então a prole

Concebida de Deus

E a alma-mater rejubila

Com sua ditosa fecundidade...

Page 148: Huberto rohden   escalando o himalaia

UNIVERSO DE MOLUSCO

E o molusco foi segregando substância própria,

Para arquitetar o seu universo portátil...

E aos poucos, muito aos poucos,

A gosma que lhe envolvia o corpo invertebrado

Se foi solidificando em derredor,

Formando tênue camada de cálcio e sílica

Uma concha bivalve, um caramujo espiralado.

E o molusco leva consigo,

Por toda a parte,

O seu mundo portátil,

E nele se refugiar

Em momentos de perigo,

Em horas de tristeza...

* * *

Corri os olhos em derredor

E vi o mundo dos homens

Povoado de moluscos sem conta...

E cada um leva consigo,

Por toda a parte,

O seu universo auto-fabricado,

Feito da substância sutil

Que sua mente projetou de si...

Page 149: Huberto rohden   escalando o himalaia

E o molusco humano adora

O seu cosmos antropomorfo,

Porque é feito da substância dele,

Secreção do seu ego mental e emocional.

E esse caramujo auto-fabricado,

Que ele chama sua “filosofia”,

Lhe serve de ilusório refúgio

E efêmera querência,

Em momento críticos

E transes de angústia.

E ai de quem não adore esse universo mental

Da sua filosofia.

* * *

Escuta, ó molusco humano!

Nunca saberás o que é o Universo Real,

Enquanto arrastares contigo essa concha

Feita de elementos do teu ego.

O verdadeiro Universo é o que te fez

E não esse que tu fizeste...

O Universo Real não é carregado por ti

Mas tu és carregado por ele...

Rompe o teu invólucro solidificado!

Volta à fluidez e plasticidade

Do teu espírito evolutivo,

Que é eterna juventude!

Torna-te novamente plástico,

Intensamente receptivo,

Page 150: Huberto rohden   escalando o himalaia

Para as vibrações imponderáveis

Do infinito Universo de fora

E do infinito Universo de dentro!

E a transcendência do macrocosmo

Se refletirá na imanência do microcosmo

Que é tua alma,

Essa centelha divina

Em ti...

Page 151: Huberto rohden   escalando o himalaia

MINHA LUMINOSA ESCURIDÃO

Lá se vão os tempos remotos

Em que eu me sentia satisfeito,

Obscuramente satisfeito,

Na minha amorfa ignorância,

Na minha incolor neutralidade...

Possuía tudo que desejava

E bem pouco era esse tudo,

Porque as minhas potências dormiam

O longo sono da sua inexperiência...

E o incônscio equilíbrio

Entre o meu pequeno desejar,

E o meu pequeno possuir

Era a bitola da minha satisfação,

O estático nivelamento

Entre a potencialidade das minhas aspirações

E a atualidade das minhas realizações.

Mas ai! que despertou,

Nas profundezas do meu ser,

Algo como um estranho querer

Algo como uma longínqua alvorada,

Que me fazia adivinhar vagamente

Page 152: Huberto rohden   escalando o himalaia

Um luzeiro para além dos horizontes

Das minhas rotineiras satisfações...

E esse adivinhar de uma luz ignota,

Para além das trevas tão notas

Do meu costumado viver,

Encheu-me a alma de pressaga insatisfação...

Irrequietas, oscilaram em mim

Todas as agulhas magnéticas...

Despertaram as angústias subterrâneas

Da minha natureza lucigênita

Que ainda em trevas dormia...

Acordou em mim o instinto migratório

Da ave que adivinha tépidas primaveras

E cálidos estios,

Para além dos frígidos outonos

E dos gélidos invernos

Da sua querência nativa...

Abriu-se vasto abismo

Entre o que eu era

E o que desejava ser,

Entre as minhas realidades finitas

E as minhas possibilidades infinitas...

Fiz a estranha descoberta

De que eu era muito mais

O muito que desejava ser

Do que o pouco que era...

Page 153: Huberto rohden   escalando o himalaia

Tornei-me peregrino do Infinito.

E desde então acredito mais

No muito que ignoro

Do que no pouco que sei...

Minha vida começou a gravitar

Em torno dum centro ignoto,

Mais dinâmico que todas as coisas

Que eu possuía e conhecia.

O meteoro erradio da minha vida

Passou a ser planeta,

Posto em órbita heliocêntrica.

Ultrapassei o estágio primário

Da infeliz satisfação,

Entrei na etapa secundária

Da feliz insatisfação

Mas ainda não gozo plenamente

O “terceiro céu”

Da feliz satisfação...

Algo me diz que estou longe

Dessa meta final,

Ainda que em caminho certo.

E haverá mesmo meta final?

Poderá o humano finito

Atingir o divino Infinito?

Não consistirá a vida eterna

Nesse eterno jornadear,

Page 154: Huberto rohden   escalando o himalaia

Rumo à meta distante?...

Nessa agridoce nostalgia do eterno Além?...

Nessa dulcíssima tortura

De estar no caminho certo,

Mas sempre longínquo do termo?

Nesse misto de luzes e trevas;

Nessa insatisfeita felicidade;

Nessa feliz insatisfação?...

Nesse inebriante buscar a Deus

E nesse inquietante possuir a Deus?

Estranho paradoxo!

Quanto mais possuo a Deus,

Mais o procuro.

Quanto mais deliciosamente o gozo,

Mais dolorosamente o sofro...

E esse doloroso gozar,

E esse gozoso sofrer,

É todo o meu céu infernal,

É todo o meu inferno celestial...

É a luminosa escuridão

Da minha paradoxal beatitude...

Page 155: Huberto rohden   escalando o himalaia

SE TUDO FOSSE EXPLICÁVEL...

“Como você explica isto?”

Horrorizado, ouço essas palavras...

Querem que eu explique tudo,

A luz,

A vida,

O espírito,

O amor,

E outras maravilhas anônimas.

Mas eu nada quero explicar

Quem tudo explica

Tudo implica

E tudo complica.

Belas são somente as coisas

Quando inexplicadas e inexplicáveis

E eu quero a Verdade em Beleza.

Verdade sem beleza fere,

Beleza sem Verdade falha,

Verdade com Beleza fascina...

Explicar – que palavra repugnante!

Explicar é desdobrar,

Dissolver em seus últimos componentes,

Anatomizar, analisar, esfacelar,

Page 156: Huberto rohden   escalando o himalaia

Explicar é profanar e profanizar.

Ó linda orquídea à sombra da floresta!

Como és fascinante – porque intacta,

Inexplicada,

Inexplicável!...

Ai de mim, se eu te explicasse!...

O teu composto não é a soma total

Dos teus componentes.

Falta aos componentes precisamente aquilo

Que de ti faz esse Todo Orgânico,

Misteriosamente vitalizado

Pelo sopro do Imponderável,

Esse invisível Quê,

Esse fascinante Anônimo,

Esse delicioso Incógnito,

Essa Luz Cósmica,

Que está dentro de todas as coisas,

Que a alma de todos os corpos.

Não, não quero explicar,

Porque explicar é profanar

E profanizar

O que é sacro e puro.

Quero ter diante de mim

Ignotos horizontes,

Distâncias sem limites,

Escuridões profundas,

Alturas infinitas!

Page 157: Huberto rohden   escalando o himalaia

Quero poder sonhar livremente,

Adivinhar,

Intuir,

Admirar,

Aforar,

Inebriar-me de mistério...

Tenho fome e sede do inexplicável

Dessa grande reticência,

Dessa enigmática esfinge,

Desses olhos hirtos, imóveis,

Voltados ao deserto silente,

Plenos de vacuidade,

Da plenitude do Infinito...

Enfastia-me o que sei,

Fascina-me o que ignoro...

Mesquinho e banal é o que penso,

Puro e sagrado é o que adivinho,

Para além de todas as fronteiras

De eruditas explicações...

...............................................................................................................................

Cala-te, ó homem profano!

Não me expliques nada!

Não profanes o meu sacrário!

Não quero saber o que é Deus,

Quero amá-Io e adorá-lo

Em longínquo anonimato,

Em inebriante beatitude,

Page 158: Huberto rohden   escalando o himalaia

Em sacrossanta ignorância...

Deixa-me a sós com o meu mistério!

Mil vezes mais feliz me sinto

Nesta noite estrelada

Do meu querido não-saber

Do que nos dias ensolarados

Do teu pretenso saber...

Nunca homem algum morreu sorridente

Por uma verdade inteligida.

Todos os mártires

São mártires do mistério,

Do Ignoto,

Do Anônimo...

Se tudo fosse explicável,

Perderia a minha vida os seus encantos,

Morreria eu de náusea e fastio,

Intoxicado da peçonha satânica

De tudo ver explicado,

Eruditamente analisado,

Sacrilegamente devassado...

Por favor! não me lances ao inferno

Do explicável

Deixa-me habitar no paraíso

Do inexplicável...

Page 159: Huberto rohden   escalando o himalaia

ESTOU AUSENTE

Não fales comigo, ó homem, quem quer que sejas!

Estou ausente!

Não quero visita de ninguém...

Não quero ver ninguém...

Não quero ouvir ninguém...

Estou ausente de ti,

Ausente de tudo e de todos...

Ausente até de mim mesmo...

Quero estar a sós com ELE...

Só quero ouvir a voz dELE...

Só quero sentir a presença dELE...

Quero abismar-me nELE...

Não me perguntes quem é ELE!

ELE é o UNO, o único, o TODO.

ELE é o grande Anônimo.

Nomeá-lo seria sacrilégio.

ELE é ELE – e mais ninguém...

Estou ausente de tudo e de todos,

Porque estou na presença

Do grande Anônimo,

O Inominável...

Page 160: Huberto rohden   escalando o himalaia

Estou ausente até de mim mesmo,

Quando ELE está presente.

Se tu soubesses, ó homem,

Como é delicioso estar com ELE,

Sem dizer nada,

Sem fazer nada,

Sem pensar nada,

Mas ser tudo!...

Ser intensamente,

Ser plenamente,

Ser totalmente nELE

Não tolerarias por um instante

Estar ausente dELE

E estar presente a ti...

Quando estou assim,

Presente a ELE

E ausente de mim,

Nada faço

Mas esse “nada” é mil vezes mais

Do que o “muito” que os profanos fazem

Na ausência dELE

E na presença de si mesmos,

Por entre o ruidoso afã

Da vida sem ELE...

Desse silencioso “nada” da presença dELE

Page 161: Huberto rohden   escalando o himalaia

Brotam todas as plenitudes da minha vida,

Todas as luzes e forças do meu ser,

Todo o amor e entusiasmo,

Todo o dinamismo realizador,

Toda a beatitude

Dos dias transbordantes de sol,

E toda a serenidade

Das noites afogadas em trevas...

Se eu não me abismasse nELE,

Muitas e muitas vezes,

Intolerável me seria o mundo inteiro,

Intolerável me seria o próprio Eu.

Definharia o meu ser,

Assim como definha a planta nas sombras...

Estou ausente de vós, creaturas todas,

Porque estou na presença do meu Creador!

Não perturbeis a sacralidade

Do nosso silêncio!

Não profaneis os solilóquios

Do nosso amor!...

Estou ausente

Porque ELE está presente...

Page 162: Huberto rohden   escalando o himalaia

ÍNDICE

ESCALANDO O HIMALAIA DE DENTRO

MEU SACROSSANTO TABU

TRANSFORMAÇÃO VITAL

ANSEIO POR UM FOGO VIVO

O PECADO DAS MINHAS ORAÇÕES

O HOMEM CRÍSTICO

ANSEIO DO SILÊNCIO

A ANGÚSTIA DOS DITOS INDIZÍVEIS

“SE O GRÃO DE TRIGO NÃO MORRER”

ESCRAVIZADO PELA LIBERDADE

TENTANDO ROMPER O VÉU INVISÍVEL

SACRALIDADE DO SILÊNCIO

AMOR SOFRIDO

INICIAÇÃO TOTAL

CRISTO – ESSE DESCONHECIDO

ADORAÇÃO DINÂMICA

QUANDO EU ERA MEU

MEU DEUS VELADO – E REVELADO

SEJA FEITA A TUA VONTADE!

NON-NATO, SEMI-NATO, PLENI-NATO

“NÃO SOU EU QUE FAÇO AS OBRAS”

AS GRADES DA MINHA GAIOLA

Page 163: Huberto rohden   escalando o himalaia

VÉSPERA DE FINADOS

PARA ALÉM DO NIRVANA

SEGURANÇA E LIBERDADE

PURO ENTRE IMPUROS

SOFRIMENTO REDENTOR

LIBERTAÇÃO DE MIM MESMO

VIDA E MORTE DO MEU ORGULHO FILOSÓFICO

LITURGIA CÓSMICA

O AMARGOR DOS MEUS ÊXTASES

A IRMANDADE INVISÍVEL

SOU ESCRAVO DA VERDADE

A ARTE DE DESAPRENDER

OS TRÊS MUNDOS DENTRO DE MIM

CONTEMPLANDO A GLÓRIA DE DEUS

O SILÊNCIO DA VERDADE

MEU DESERTO VIVO

PEREGRINO DO INFINITO

QUIS ENTRAR NO CÉU DE CONTRABANDO

ATÉ AO LIMIAR DO SANTUÁRIO

EM TOTAL NUDEZ

RETIRADA ESTRATÉGICA DA MINHA VIDA

QUANDO ME TORNAREI SUPÉRFLUO?

DA UMIDADE PARA A HUMILDADE

ALMA GESTANTE

UNIVERSO DE MOLUSCO

MINHA LUMINOSA ESCURIDÃO

SE TUDO FOSSE EXPLICÁVEL

Page 164: Huberto rohden   escalando o himalaia

ESTOU AUSENTE

Page 165: Huberto rohden   escalando o himalaia

HUBERTO ROHDEN

VIDA E OBRA

Nasceu na antiga região de Tubarão, hoje São Ludgero, Santa Catarina, Brasil

em 1893. Fez estudos no Rio Grande do Sul. Formou-se em Ciências, Filosofia

e Teologia em universidades da Europa – Innsbruck (Áustria), Valkenburg

(Holanda) e Nápoles (Itália).

De regresso ao Brasil, trabalhou como professor, conferencista e escritor.

Publicou mais de 65 obras sobre ciência, filosofia e religião, entre as quais

várias foram traduzidas para outras línguas, inclusive para o esperanto;

algumas existem em braile, para institutos de cegos.

Rohden não está filiado a nenhuma igreja, seita ou partido político. Fundou e

dirigiu o movimento filosófico e espiritual Alvorada.

De 1945 a 1946 teve uma bolsa de estudos para pesquisas científicas, na

Universidade de Princeton, New Jersey (Estados Unidos), onde conviveu com

Albert Einstein e lançou os alicerces para o movimento de âmbito mundial da

Filosofia Univérsica, tomando por base do pensamento e da vida humana a

constituição do próprio Universo, evidenciando a afinidade entre Matemática,

Metafísica e Mística.

Em 1946, Huberto Rohden foi convidado pela American University, de

Washington, D.C., para reger as cátedras de Filosofia Universal e de Religiões

Comparadas, cargo esse que exerceu durante cinco anos.

Page 166: Huberto rohden   escalando o himalaia

Durante a última Guerra Mundial foi convidado pelo Bureau of lnter-American

Affairs, de Washington, para fazer parte do corpo de tradutores das notícias de

guerra, do inglês para o português. Ainda na American University, de

Washington, fundou o Brazilian Center, centro cultural brasileiro, com o fim de

manter intercâmbio cultural entre o Brasil e os Estados Unidos.

Na capital dos Estados Unidos, Rohden frequentou, durante três anos, o

Golden Lotus Temple, onde foi iniciado em Kriya Yôga por Swami

Premananda, diretor hindu desse ashram.

Ao fim de sua permanência nos Estados Unidos, Huberto Rohden foi convidado

para fazer parte do corpo docente da nova International Christian University

(ICU), de Metaka, Japão, a fim de reger as cátedras de Filosofia Universal e

Religiões Comparadas; mas, por causa da guerra na Coréia, a universidade

japonesa não foi inaugurada, e Rohden regressou ao Brasil. Em São Paulo foi

nomeado professor de Filosofia na Universidade Mackenzie, cargo do qual não

tomou posse.

Em 1952, fundou em São Paulo a Instituição Cultural e Beneficente Alvorada,

onde mantinha cursos permanentes em São Paulo, Rio de Janeiro e Goiânia,

sobre Filosofia Univérsica e Filosofia do Evangelho, e dirigia Casas de Retiro

Espiritual (ashrams) em diversos Estados do Brasil.

Em 1969, Huberto Rohden empreendeu viagens de estudo e experiência

espiritual pela Palestina, Egito, Índia e Nepal, realizando diversas conferências

com grupos de yoguis na Índia.

Em 1976, Rohden foi chamado a Portugal para fazer conferências sobre

autoconhecimento e auto-realização. Em Lisboa fundou um setor do Centro de

Auto-Realização Alvorada.

Nos últimos anos, Rohden residia na capital de São Paulo, onde permanecia

alguns dias da semana escrevendo e reescrevendo seus livros, nos textos

definitivos. Costumava passar três dias da semana no ashram, em contato com

a natureza, plantando árvores, flores ou trabalhando no seu apiário-modelo.

Quando estava na capital, Rohden frequentava periodicamente a editora

responsável pela publicação de seus livros, dando-lhe orientação cultural e

inspiração.

À zero hora do dia 8 de outubro de 1981, após longa internação em uma clínica

naturista de São Paulo, aos 87 anos, o professor Huberto Rohden partiu deste

mundo e do convívio de seus amigos e discípulos. Suas últimas palavras em

estado consciente foram: “Eu vim para servir à Humanidade”.

Rohden deixa, para as gerações futuras, um legado cultural e um exemplo de

fé e trabalho, somente comparados aos dos grandes homens do século XX.

Page 167: Huberto rohden   escalando o himalaia

RELAÇÃO DE OBRAS DO PROF.

HUBERTO ROHDEN

COLEÇÃO FILOSOFIA UNIVERSAL:

O PENSAMENTO FILOSÓFICO DA ANTIGUIDADE

A FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA

O ESPÍRITO DA FILOSOFIA ORIENTAL

COLEÇÃO FILOSOFIA DO EVANGELHO:

FILOSOFIA CÓSMICA DO EVANGELHO

O SERMÃO DA MONTANHA

ASSIM DIZIA O MESTRE

O TRIUNFO DA VIDA SOBRE A MORTE

O NOSSO MESTRE

COLEÇÃO FILOSOFIA DA VIDA:

DE ALMA PARA ALMA

ÍDOLOS OU IDEAL?

ESCALANDO O HIMALAIA

O CAMINHO DA FELICIDADE

DEUS

EM ESPÍRITO E VERDADE

EM COMUNHÃO COM DEUS

Page 168: Huberto rohden   escalando o himalaia

COSMORAMA

PORQUE SOFREMOS

LÚCIFER E LÓGOS

A GRANDE LIBERTAÇÃO

BHAGAVAD GITA (TRADUÇÃO)

SETAS PARA O INFINITO

ENTRE DOIS MUNDOS

MINHAS VIVÊNCIAS NA PALESTINA, EGITO E ÍNDIA

FILOSOFIA DA ARTE

A ARTE DE CURAR PELO ESPÍRITO. AUTOR: JOEL GOLDSMITH

(TRADUÇÃO)

ORIENTANDO

“QUE VOS PARECE DO CRISTO?”

EDUCAÇÃO DO HOMEM INTEGRAL

DIAS DE GRANDE PAZ (TRADUÇÃO)

O DRAMA MILENAR DO CRISTO E DO ANTICRISTO

LUZES E SOMBRAS DA ALVORADA

ROTEIRO CÓSMICO

A METAFÍSICA DO CRISTIANISMO

A VOZ DO SILÊNCIO

TAO TE CHING DE LAO-TSÉ (TRADUÇÃO)

SABEDORIA DAS PARÁBOLAS

O QUINTO EVANGELHO SEGUNDO TOMÉ (TRADUÇÃO)

A NOVA HUMANIDADE

A MENSAGEM VIVA DO CRISTO (OS QUATRO EVANGELHOS TRADUÇÃO)

RUMO À CONSCIÊNCIA CÓSMICA

O HOMEM

Page 169: Huberto rohden   escalando o himalaia

ESTRATÉGIAS DE LÚCIFER

O HOMEM E O UNIVERSO

IMPERATIVOS DA VIDA

PROFANOS E INICIADOS

NOVO TESTAMENTO

LAMPEJOS EVANGÉLICOS

O CRISTO CÓSMICO E OS ESSÊNIOS

A EXPERIÊNCIA CÓSMICA

COLEÇÃO MISTÉRIOS DA NATUREZA:

MARAVILHAS DO UNIVERSO

ALEGORIAS

ÍSIS

POR MUNDOS IGNOTOS

COLEÇÃO BIOGRAFIAS:

PAULO DE TARSO

AGOSTINHO

POR UM IDEAL – 2 VOLS. AUTOBIOGRAFIA

MAHATMA GANDHI

JESUS NAZARENO

EINSTEIN – O ENIGMA DO UNIVERSO

PASCAL

MYRIAM

COLEÇÃO OPÚSCULOS:

SAÚDE E FELICIDADE PELA COSMO-MEDITAÇÃO

Page 170: Huberto rohden   escalando o himalaia

CATECISMO DA FILOSOFIA

ASSIM DIZIA MAHATMA GANDHI (100 PENSAMENTOS)

ACONTECEU ENTRE 2000 E 3000

CIÊNCIA, MILAGRE E ORAÇÃO SÃO COMPATÍVEIS?

CENTROS DE AUTO-REALIZAÇÃO