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História Econômica, Política e Social do Brasil

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História Econômica, Política e Social do Brasil

Formação Social, Econômica e Política do Brasil: O período colonial

Material Teórico

Responsável pelo Conteúdo:Profa. Dra. Vivian Fiori

Revisão Textual:Profa. Ms. Luciene Oliveira da Costa Santos

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Iniciaremos nossos estudos sobre a Formação Social, Econômica e Política do Brasil propondo algumas questões: como foi constituído o território brasileiro? O que havia aqui antes? Que tipo de sociedade o construiu, e baseado em que valores? Qual o modo de produção que se estabeleceu de forma preponderante? Como esses fatores contribuem para o entendimento da conformação atual de nossa sociedade em sua relação com o território?

O estudo da formação do território brasileiro visa descortinar os elementos essenciais que, dentro de um contexto de causalidade e efeito, levaram à atual disposição dos elementos, à constituição da população, às estruturas sociais e econômicas do nosso país.

Os diversos elementos étnicos que contribuíram para a construção da identidade brasileira também são devidamente trabalhados, com destaque para o papel de cada um, evitando análises pré-concebidas ou enviesadas.

Teremos uma abordagem, nesta unidade, da inserção do sistema colonial no território, as perspectivas e desafios que se apresentaram ao colonizador. Ressaltamos as reações de diferentes formas propiciadas pelas populações que aqui viviam e o papel dos trabalhadores escravizados, trazidos da África, que acabaram por constituir, desde os primórdios da colonização, em agentes fundamentais na constituição da identidade brasileira.

Entender como o processo de colonização se materializou no território brasileiro, por meio de um processo de organização econômica e política.

Formação Social, Econômica e Política do Brasil: O período colonial

· Introdução

· Portugal e Espanha no final do século XV

· A Economia Colonial

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Unidade: Formação Social, Econômica e Política do Brasil: O período colonial

Contextualização

Como se forma um país?

Esta é a pergunta básica quando estudamos a história da formação social, econômica e política do Brasil.

Para respondê-la, temos de ter em mente outras questões igualmente importantes. Que tipo de pessoas, e em quais contextos, ocuparam este território?

No caso brasileiro, há diversos elementos étnicos contribuindo para a identidade brasileira: o indígena, nome genérico pelo qual ficaram conhecidas as várias populações autóctones que aqui viviam antes da chegada dos europeus. Há o negro, escravizado e desterritorializado, inserido num novo contexto, que necessitou aqui reconstruir sua identidade perdida – tal identidade, de origem muito diversa, deu ao africano também uma generalização feita por europeus às pessoas de variadas origens étnicas e culturais oriundas da África. Há ainda o colonizador português, inserido num contexto de busca por novas riquezas em que estava investido na empreitada colonial, e cuja sociedade também continha elementos de diversas estirpes, desde nobres e senhores de terras, até pessoas humildes e sem posses.

Assim, estudar o processo de formação do Brasil é desvendar essas variadas nuances, compondo um quadro complexo sobre a estrutura econômica, social e política que aqui se formou, com todas as suas peculiaridades.

Para começar a entender um pouco esse processo, vamos iniciar dando ênfase ao Período Colonial, a partir da colonização portuguesa.

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Introdução

Vamos tratar da história econômica, política e social do Brasil, a partir do Período Colonial. Ao fazermos este exercício histórico, precisamos fazer um percurso no tempo que se inicia ainda antes da colonização e da chegada dos portugueses ao país em 1500.

Se pensarmos que a construção de um país chamado Brasil ocorreu a partir dessa data, devemos supor que estruturas de organização do espaço se materializaram, e refletir sobre como tais estruturas já estavam estabelecidas na metrópole.

Devemos pensar, ainda, que este estabelecimento dos portugueses foi um empreendimento repleto de reveses. No início do Período Colonial, houve uma corrida pelo domínio do atual território brasileiro, que envolveu também espanhóis, franceses, ingleses e holandeses, povos que competiam pelo comércio colonial do período.

Portugal e Espanha no final do século XV

Portugal e Espanha, situados na Península Ibérica, eram as grandes potências navais da época, e disputavam entre si as principais rotas de comércio com vastas áreas coloniais na Ásia e África.

Portugal estabeleceu-se como reino no ano de 1135, tendo expandido seu território, a partir de uma estreita faixa próxima à atual cidade do Porto, para o Sul. Isso ocorreu no contexto da chamada “Guerra da Reconquista”, na qual houve a progressiva reocupação de territórios que haviam sido tomados pelos mouros do norte da África séculos antes.

Ao mesmo tempo, não existia ainda o moderno Reino da Espanha. O país encontrava-se dividido em reinos menores: Castela, Leão, Aragão, Navarra, Astúrias. Apenas em 1492, houve a derrota definitiva dos mouros e a unificação dos reinos de Aragão e Castela, cujos reis, Fernando e Isabel, ficaram conhecidos como “os reis católicos”.

Durante esse governo da Espanha unificada, empreendeu-se a expansão das colônias ultramarinas, o que culminou com a descoberta da América, em 1492.

Similarmente, num contexto de intensa competição com a Espanha, o navegador português Pedro Álvares Cabral descobre o Brasil, em 1500, iniciando assim a história de nossa formação enquanto nação.

Até então, o Brasil era povoado por milhões de habitantes de origem indo-asiática, que já ocupavam todo o continente americano havia dezenas de séculos. Os portugueses e espanhóis, ao chegarem ao Novo Mundo, denominaram genericamente esses povos de “indígenas”, ou índios, maneira pela qual os designamos até hoje.

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Você Sabia ?Os índios do Brasil

“História de despovoamento, a história indígena é também de enganos e incompreensões, a começar pelo próprio vocabulário, construído no Ocidente para identificar esses povos. A palavra índio, hoje consagrada, deriva do equívoco de Colombo, o “descobridor da América” que julgara ter encontrado as Índias, o “outro mundo”, como dizia, na sua viagem de 1492. A palavra vulgarizou-se, pois, desde o começo da colonização ibérica, para designar genericamente uma infinidade de grupos étnicos, diversos troncos lingüísticos, centenas de famílias lingüísticas independentes.

A palavra índio rivalizava, porém, com várias outras. No Brasil, os jesuítas costumavam designar os nativos por meio do coletivo gentio, nominação coerente com o propósito missionário que os animava. Com o tempo, passaram a diferenciar o cristão, supostamente abarcado pela catequese, do gentio ou pagão, que no entender dos padres, eram “governados pelo demônio”. A lógica da catequese foi decisiva nas imagens dos nativos construídas a partir do século XVI. Por meio dela, se ia tecendo um movimento de homogeneização, que apagava as diferenças culturais entre os grupos”.

VAINFAS, Ronaldo. História Indígena: 500 anos de despovoamento. In: Brasil: 500 anos de povoamento. Disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv6687.pdf

Os princípios da ocupação do território brasileiroAo chegarem ao nosso país, os portugueses trataram de estabelecer contato com os habitantes

locais, em busca de algum tipo de riqueza que pudesse ser comercializada na Europa.

Ao contrário dos espanhóis que, ao chegarem ao vale do México, encontraram por lá uma civilização avançada – os astecas – que exploravam riquezas minerais como o ouro, os portugueses aportaram no litoral baiano, não encontrando por lá, ou mesmo nas imediações, vestígios de bens comercializáveis na Europa.

Devemos lembrar que, nesse momento, os portugueses vendiam as especiarias asiáticas, tais como o chá, a canela, o cravo, entre outros produtos, oriundos especialmente da Índia. Comercializavam, ainda, produtos encontrados na África, como ouro, diamantes, madeiras nobres e marfim, além de tecidos produzidos no Marrocos.

Esse comércio português era organizado por meio de feitorias, que eram entrepostos comerciais, estabelecidos na costa africana e na Índia, onde havia, em geral, uma guarnição militar ou fortificação, de modo a prevenir eventuais ataques. Portugal era um pequeno país, com uma população também pequena, não tendo condições de manter uma estrutura que pudesse avançar continentalmente, até porque isso poderia levar a maiores conflitos com populações nativas.

No entanto, ao chegarem ao Brasil, os portugueses não encontraram vestígios de uma agricultura que pudesse ser comercialmente explorada. As populações nativas (indígenas) produziam apenas aquilo que era necessário ao seu sustento, não acumulando excedentes. Além disso, apenas caçavam, pescavam, e coletavam frutos nativos da imensa floresta que cobria o território.

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O único bem que pareceu mais valioso foi o pau-brasil, árvore que ocorria do litoral baiano até o atual Rio Grande do Norte, e que fornecia uma madeira de boa qualidade, além de um pigmento que podia ser utilizado na pintura. Assim, estabeleceram-se aqui entrepostos comerciais com o intuito exclusivo de explorar tal madeira.

Estima-se que a exploração do pau-brasil tenha esgotado rapidamente nossas reservas, já que era feita de uma maneira bastante rude. Para se extrair a madeira de poucas árvores, derrubava-se uma grande área de floresta. Embora tenha durado até o século XIX, essa exploração já dava sinais de esgotamento por volta de 1530.

A partir desse ano, começa-se a estabelecer uma ocupação efetiva do território brasileiro, com a chegada de Martim Afonso de Souza, que estabeleceu as primeiras povoações, como São Vicente, fundada em 1532. A primeira atividade econômica desenvolvida de forma sistemática foi o cultivo da cana-de-açúcar, produto de alto valor no mercado europeu. Portugal havia desenvolvido a técnica de cultivo e produção do açúcar no arquipélago do Açores, e encontrou no Brasil as condições climáticas adequadas à sua produção.

Em 1534, o governo português criou uma primeira forma de administração do território, o sistema de Capitanias Hereditárias. O território foi dividido em grandes faixas de terras, entregues à jurisdição de nobres portugueses, os quais poderiam explorar comercialmente atividades econômicas, ao custo de pagarem tributos ao rei. O donatário da capitania podia ainda estabelecer a justiça em seus domínios, além de passar o direito da capitania a seus filhos, ainda que fosse proibida a venda por estes herdeiros.

Embora vários dos donatários tivessem tentado tomar posse efetiva de suas terras, a maioria não obteve êxito. Alguns tentaram se estabelecer, mas confrontaram com a imensidão do território, a dificuldade de adaptação ao clima, além da hostilidade das populações locais. Com isso, ao final de algumas décadas, apenas as capitanias de Pernambuco, administrada por Duarte Coelho, e de São Vicente, administrada por Martim Afonso de Souza, foram efetivamente implementadas, desenvolvendo atividades produtivas, comércio e gestão do território.

Em 1549, o governo português percebe a necessidade de maior intervenção direta no território, o que ocorre por meio da criação do primeiro Governo-Geral, para o qual foi nomeado Tomé de Souza. Nesse período, começa a derrocada do comércio colonial de Portugal com as Índias, que ocorre também em virtude da competição com novas potências marítimas, como Inglaterra e Holanda.

Para Portugal, se antes o Brasil constituía uma preocupação secundária, agora se tornava imperativo defender seu território da cobiça desses países. Havia a necessidade, ainda, de centralizar o controle do território, por meio da imposição de medidas administrativas, especialmente as relacionadas à criação e recolhimento dos impostos, à fundação de novos povoamentos, além do combate às tribos indígenas hostis à presença portuguesa.

Havia também a preocupação com a defesa do território, já que no período ocorreram muitas incursões de piratas estrangeiros, atraídos pelas riquezas do país. Assim, uma das atribuições do governador-geral era providenciar a construção de navios para o comércio e proteção da costa.

Além da figura do governador, toda uma estrutura burocrática foi criada, para dar suporte à administração colonial. Entre os cargos mais importantes estavam: o do capitão-mor, que era responsável pela defesa da costa; o do ouvidor-mor, responsável pela justiça; e do provedor-mor, que tratava da cobrança de impostos e das finanças da colônia.

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Os Governos Gerais

Entre 1549 e 1565, a coroa portuguesa resolveu criar um governo geral para o Brasil, em virtude da ineficiência do sistema de Capitanias Hereditárias.

O primeiro governador-mor da colônia foi Tomé de Souza, que a administrou entre 1549 e 1553, tendo tido grande preocupação em ocupar as terras, trazendo para cá escravos, mulheres da corte – que eram poucas – bem como membros da Igreja.

Seu sucessor, Duarte da Costa, ocupou-se também da efetiva colonização, tendo criado em seu governo, com apoio dos jesuítas, a vila de São Paulo de Piratininga, em 1554, que se tornou importante ponto a partir do qual se efetivou a dominação de amplas porções do território brasileiro. Foi também durante seu governo que franceses, liderados por Villegaignon, invadiram a Baía da Guanabara, tentando criar aqui a colônia da França Antártica.

Já o terceiro governador geral, Mem de Sá, procurou enfrentar os conflitos entre jesuítas e colonizadores, que eram a favor da escravidão indígena. Procurou também reestabelecer o domínio da baía da Guanabara, fundando a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1565.

Após este período, a coroa decidiu dividir a colônia em duas: um governo ao norte, com sede em Salvador, e outro ao sul, com sede no Rio de Janeiro. A experiência durou pouco, tendo sido reestabelecido o governo único, com sede em Salvador, em 1578.

As Invasões Holandesas

A Holanda havia se tornado independente da Espanha em 1581, e era um país formado por uma burguesia comercial. Os holandeses haviam financiado a infraestrutura de moagem da cana-de-açúcar no Nordeste1 brasileiro, o que constituía um negócio muito rentável.

Quando a Espanha dominou Portugal, durante o período da União Ibérica, os espanhóis romperam o acordo com os holandeses que, irritados, invadiram a costa do Nordeste, começando por Salvador, em 1624. Tendo sido contra-atacados pelos portugueses, atacaram então a costa pernambucana, ocupando gradativamente o território, numa faixa que ia de Alagoas ao Rio Grande do Norte. Posteriormente, ocuparam também o Ceará e o Maranhão.

O governo holandês, em 1637, enviou o alemão Johan-Mauritius Von Nassau-Siegen, mais conhecido no Brasil como Maurício de Nassau, para governar e reerguer a região, então conhecida como Nova Holanda.

Nassau transformou a vila do Recife na capital holandesa no Brasil, Mauritstaad. Houve um grande crescimento do comércio e liberdade religiosa, que levou para a região levas de protestantes e judeus, que haviam sido perseguidos anteriormente pelos governantes

1 Cabe lembrar que a denominação “Nordeste” brasileiro é atual, naquela época referiam-se somente ao Norte e Sul do Brasil, de maneira informal. Só no século XX, em 1942, o IBGE usou o termo Nordeste como forma de regionalizar o Brasil. No entanto, a região referida no texto refere-se aos lugares onde hoje denominamos de Nordeste.

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portugueses e espanhóis. O comércio com várias regiões do continente, como as Antilhas e a América do Norte, levou Recife a se tornar uma das mais importante cidades do continente americano neste período.

No entanto, embora Nassau fosse admirado pela população local, tornou-se alvo de acusações, já que gastava demasiadamente em obras e empréstimos aos senhores de engenho. Com sua saída do governo, houve um aumento dos impostos, que provocou reações na população local, a qual terminou por expulsar os holandeses, em 1654.

A Economia Colonial

Se no período inicial da colonização do Brasil prevalecia a extração do pau-brasil, com o passar do tempo outras atividades econômicas foram sendo implantadas à medida que também aumentavam as incursões pelo território e também o povoamento.

As principais vilas criadas inicialmente ficavam junto à costa, dada a dificuldade de se promoverem maiores incursões. Com a implantação da cultura da cana-de-açúcar, principalmente na Zona da Mata Nordestina, foi sendo ampliada a infraestrutura, pela implantação de moinhos, estradas e portos, usados para escoar a produção.

Havia ainda a necessidade de importação de mão de obra. Os indígenas se mostravam contrariados com o trabalho forçado e com a exploração de seu trabalho. Muitas das vezes, fugiam na primeira oportunidade que tinham, e não eram mais encontrados, já que conheciam muito bem o território.

Os portugueses, à época do descobrimento do Brasil, já tinham profundas relações econômicas com o continente africano, sendo que uma das principais “mercadorias” que negociavam eram os escravos. Em geral, estes haviam sido submetidos por tribos mais fortes, que negociavam os derrotados como escravos para as colônias portuguesas.

Embora já houvesse o comércio de escravos pelos portugueses no século XV, é com a colonização do continente americano que esta atividade ganha força.

A escassez da mão de obra indígena também favoreceu o recurso à escravidão africana. Por sua vez, a produção de cana-de-açúcar demandava a existência de atividades econômicas marginais, de subsistência, necessárias para o suprimento dos escravos. Havia uma verdadeira indústria agrária relacionada ao açúcar, como explica Vera Lúcia M. Ferlini:

Tabaco, pecuária, lavoura de subsistência, olarias produtoras de telhas, tijolos e formas, o abastecimento de lenha para as fornalhas e de madeira para as construções interligavam-se no processo produtivo em que o centro e a unidade eram o engenho (FERLINI, 1991, p. 30).

Dessa forma, ocorria uma complementaridade de atividades econômicas, dentro de um sistema. Enquanto os engenhos da Zona da Mata produziam açúcar a partir da cana, as regiões de entorno produziam itens para sua manutenção, como o milho, feijão, gado e mandioca.

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Figura 1: Provável limite entre as Capitanias, século XVIII

Fonte: IBGE, 2010.

Com o passar do tempo, a produção da cana e as atividades relacionadas se expandiram, levando à gradativa ocupação do Agreste2 e do Sertão nordestinos, contribuindo para a formação social e econômica do país.

2 Cabe lembrar que as expressões Zona da Mata, Sertão, Meio Norte e Agreste foram usadas por Manuel Correia de Andrade, em 1963, como forma de regionalizar o Nordeste brasileiro.

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Zumbi dos Palmares é considerado o mais importante representante da resistência de negros escravizados no Brasil no século XVII. Foi o último chefe do Quilombo dos Palmares, localizado na serra da Barriga, na antiga capitania de Pernambuco (e no atual estado de Alagoas).

Não se sabe ao certo a data do nascimento de Zumbi. Descendente de escravos angolanos, ele provavelmente nasceu no ano de 1655 em Palmares. Foi capturado ainda bebê por uma expedição de Brás da Rocha Cardoso e levado para o padre Antônio Melo, que o batizou com o nome de Francisco e lhe ensinou latim e português.

Na adolescência, fugiu e foi abrigar-se no Quilombo dos Palmares, onde viviam escondidos centenas de escravos fugidos. Palmares era uma espécie de vila, comandada à época por Ganga Zumba.

No início, o quilombo enfrentava constantes ataques de expedições com o objetivo de capturar os escravos. Porém, com a valorização das terras, os proprietários das terras vizinhas passaram a investir contra os quilombolas com o intuito de tomar-lhes a área. Zumbi comandou várias vezes a resistência a esses ataques, sob as ordens de Ganga Zumba.

Em 1678, Zumbi chefiou uma rebelião e assumiu o comando do quilombo. Durante catorze anos, ele lutou contra as sucessivas expedições enviadas pela coroa portuguesa para destruir Palmares, que recebia cada vez mais moradores.

Em 1694, a praça central de Palmares foi invadida e tomada por tropas de Domingos Jorge Velho, obrigando Zumbi a se esconder. As tropas contavam com cerca de 2 mil homens, entre brancos e índios, armados de espingardas e de flechas.

A resistência quilombola prosseguiu, com Zumbi resistindo e comandando uns poucos homens. Um integrante do quilombo foi preso e, depois de sofrer tortura, revelou o esconderijo de Zumbi. O líder de Palmares foi capturado e morto no dia 20 de novembro de 1695. Sua cabeça foi exibida em praça pública, na cidade de Recife. Na data de sua morte é comemorado o Dia da Consciência Negra, feriado em mais de duzentas cidades brasileiras.

Fonte: Zumbi dos Palmares. In Britannica Escola Online. Enciclopédia Escolar Britannica,2014. Web, 2014. Disponível em: http://escola.britannica.com.br/article/483654/Zumbi-dos-Palmares>. Acesso em: 20 de outubro de 2014.

A expansão da pecuária pelos sertões do Nordeste levou consigo todo um modo de vida sertanejo, baseado num sistema de produção que incluía não somente os grandes proprietários de terra, mas também os “posseiros” e os “meeiros”, pessoas que arrendavam a terra em troca de dinheiro ou de uma parte da produção que era dada ao proprietário como pagamento.

As grandes propriedades, chamadas sesmarias, muitas vezes se estendiam por centenas ou milhares de hectares, e eram obtidas apenas por meio de concessão real, àqueles que tinham alguma influência junto à corte portuguesa.

Devemos destacar, ainda, a importante produção de fumo, na região do Recôncavo Baiano, que se tornou um produto muito importante no continente europeu, considerado uma iguaria nobre. A relevância do fumo também residia no fato de que servia como moeda de troca por escravos na costa africana.

A lavoura do fumo, segundo Fausto (1994), também foi importante por formar um campesinato que vivia do trabalho familiar, contrapondo-se ao grande latifúndio.

Outro produto essencial, especialmente nos finais do século XVIII, foi o algodão, cultivado principalmente no Maranhão. Sua importância está relacionada, principalmente, com a crise que se abateu no mercado internacional devido à Revolução Norte-Americana, ou Guerra da Independência dos Estados Unidos (FURTADO, 2000).

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Os norte-americanos eram os principais produtores de algodão, fornecendo para as tecelagens europeias, principalmente britânicas. Com a guerra, esse produto precisou ser suprido por outras áreas, como o Maranhão, que também se tornou produtor de arroz, beneficiando-se pela crise ocasionada pela guerra de independência dos EUA. O algodão chegou a ser o segundo produto em importância nas exportações brasileiras no final do século XVIII, sendo superado apenas pelo açúcar.

Ao mesmo tempo em que essa dinâmica movimentava o Nordeste brasileiro, no Centro-Sul havia uma realidade um pouco diferente. A pequena produção de cana-de-açúcar, estabelecida na planície litorânea da capitania de São Vicente, era geograficamente limitada pela Serra do Mar, que funcionava como grande barreira ao povoamento do interior.

Aos poucos, estabelecem-se povoamentos no alto da serra: Santo André da Borda do Campo, em 1550; e São Paulo de Piratininga, em 1554. A partir desses núcleos, desenrolou-se toda uma história de expedições – chamadas popularmente de “entradas”, “bandeiras” ou “monções” – com o objetivo de reconhecer o território e buscar nele riquezas, especialmente metais preciosos, como ouro e prata.

Devemos lembrar que, na época, a corrida colonial se mostrava mais vantajosa para a Espanha, que havia descoberto a civilização asteca do Vale do México, a qual já dominava a metalurgia do ouro e da prata, metais muito demandados para o comércio entre o continente europeu e a Ásia.

Uma característica da geografia física do planalto paulista favoreceu a ocupação do território. Os rios que nascem na região, a poucas dezenas de quilômetros da costa, correm todos para o interior do continente, servindo como “guia” para as expedições exploratórias.

Ao ampliar a ocupação do território pela população europeia, as expedições serviam também para aprisionamento de indígenas, que podiam se aliar aos portugueses, guiando-os em busca de ouro, prata, diamantes; ou, como era bastante comum, confrontá-los, sendo massacrados ou escravizados.

As Monções

O processo de ocupação das terras do que hoje chamamos Região Centro-Oeste iniciou-se no final do século XVI. Basicamente, o início desse processo foi favorecido pela União Ibérica, período no qual os reinos de Portugal e Espanha encontravam-se unificados. Assim, os limites estabelecidos pelo tratado de Tordesilhas perderam sentido prático de existência. Tal fato incentivou grupos de colonizadores a adentrar o território, em busca de riquezas, principalmente minerais, como ouro e pedras preciosas.

No decorrer deste processo de ocupação e tomada de conhecimento do território, destacam-se as expedições conhecidas como monções, oriundas principalmente de São Paulo, que funcionava como uma espécie de “base” a partir da qual tais empreendimentos eram iniciados. Tais expedições dependiam muito dos contatos com as populações nativas, as quais já conheciam o território.

Os expedicionários, em geral, aliavam-se a determinados grupos, em troca de objetos e armas de fogo, e as expedições contavam com elementos bastante diversos: desde portugueses e espanhóis, até indígenas destas tribos aliadas, que formavam coalizões, e mesmo os chamados ‘mamelucos’, que eram já os mestiços de índios com brancos (SILVA, 2007).

Se, a princípio, tais expedições eram esporádicas e feitas sem apoio da metrópole, com o decorrer do tempo e o sucesso obtido na descoberta de ouro, principalmente, as empreitadas passaram a ter forte participação e aportes reais, até como forma de evitar a perda do controle sobre estas riquezas coloniais.

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A descoberta de maiores volumes de ouro propiciou a autonomia da região das Minas, em 1720, com a criação da capitania de Minas Gerais. Posteriormente, Goiás e Mato Grosso, que também eram parte do território paulista, conquistaram sua autonomia (ANDRADE, 1995).

Após a separação de Espanha e Portugal, consagrou-se entre estes o princípio do uti possidetis, ou seja, aquele que possuísse de fato um território seria seu dono legítimo. O Tratado de Madri, de 1750, estabeleceu a nova fronteira entre as Américas Portuguesa e Espanhola, ampliando consideravelmente o território colonial português, graças a estas incursões.

Podemos ilustrar a expansão territorial brasileira observando como, a partir desses dois núcleos principais, em São Vicente e Pernambuco, desenvolveram-se atividades econômicas que permitiram a expansão rumo ao interior.

Com isso, foi superada a barreira do Tratado de Tordesilhas, que se mostrou ultrapassado, diante de uma realidade territorial em que a América portuguesa (o Brasil) não enfrentava grandes obstáculos para sua expansão.

Isso pode ser explicado, ao menos em parte, pela falta de interesse espanhol em confrontar-se com Portugal por este território, especialmente quando a Espanha dominava o comércio muito lucrativo da prata, a qual era extraída dos contrafortes dos Andes, e escoada pelo rio da Prata até o porto de Buenos Aires.

Assim, no decorrer do tempo, e com a configuração do território brasileiro consideravelmente ampliada, passou a ser aplicado o princípio conhecido como uti possidetis, ou “posse pelo uso”. Baseando-se nisso, Portugal mandou erigir fortificações ao longo do rio Amazonas, no rio Paraguai, e onde mais precisasse delimitar a posse.

O Ciclo do Ouro nas Minas GeraisUm grande divisor na história da ocupação do território brasileiro se deu com a descoberta de

ouro na região das Minas Gerais. Até então, a coroa portuguesa não incentivava as expedições no interior em larga escala, primeiro porque isso poderia desarticular a economia colonial focada no açúcar, e segundo porque poderia haver uma perda de controle sobre o território.

A geógrafa Bertha Becker afirma:

O primeiro grande processo de interiorização da população brasileira veio com a descoberta de ouro em Minas Gerais, causando grande afluxo de pessoas para aquela região. Em decorrência disto, a capital da colônia também se deslocou de Salvador para o Rio de Janeiro, iniciando o processo de transferência do eixo demográfico do país para a Região Sudeste (BECKER, 2012, p.36).

Tal descoberta representou uma mudança drástica na maneira como se organizava política e socialmente o Brasil. Primordialmente por que, no período anterior, ou seja, o ciclo da cana-de-açúcar, o núcleo de todo o sistema produtivo era representado pelo engenho. Ou seja: a natureza da atividade produtiva era rural. Eventualmente, a produção era comercializada numa cidade portuária, como o Recife. Mas o núcleo de poder era o engenho, com seus proprietários constituindo a elite do país.

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A descoberta de ouro e pedras preciosas na região das Minas Gerais decorre, em grande parte, das expedições bandeirantes que partiam de São Paulo, no século XVIII. Para controlar o comércio desta riqueza mineral, o governo real português teve de organizar uma estrutura de controle, uma hierarquia que pudesse administrar o território da mineração, cobrar impostos e prover bens para suprir as regiões mineradoras.

A coroa portuguesa criou as casas de fundição, por ela administradas, e nas quais o ouro era derretido, marcado com o selo real, sendo que um quinto (20 por cento) do volume era cobrado como imposto. Além dele, havia também a derrama, taxa cobrada de uma região produtora, de aproximadamente de 1500 kg de ouro por ano, que quando não paga levava à penhora de bens dos mineradores (FIGUEIREDO, 1996, p. 30).

De forma equivocada, podemos imaginar que a extração de ouro era uma atividade simples, que podia ser explorada por qualquer um. No entanto, para conseguir grandes lucros, era necessário obter a posse das terras, além de se investir pesadamente na compra de escravos, o que restringia a mineração a pessoas que tivessem condições de arcar com tais investimentos.

Além disso, segundo Celso Furtado, havia uma dependência enorme da criação e comércio de animais de carga, diz o autor:

A tropa de mulas constitui autêntica infraestrutura de todo o sistema. A quase inexistência de abastecimento local de alimentos, a grande distancia por terra que deviam percorrer todas as mercadorias importadas, a necessidade de vencer grandes caminhadas em região montanhosa para alcançar os locais de trabalho, tudo contribuía para que o sistema de transporte desempenhasse um papel básico no funcionamento da economia (FURTADO, 2000, p. 80).

O ciclo do ouro contribuiu decisivamente para a mudança da centralidade econômica do país, do Nordeste para o Sudeste3 . Isto não significa, no entanto, que a cultura da cana foi abandonada: ela continuou importante por séculos, e ainda hoje faz parte da vida econômica de uma vasta região, especialmente quando observamos alguns aspectos sociais, como a estrutura fundiária extremamente concentradora das terras nas mãos de poucos proprietários.

Surgiram, nesse período, importantes núcleos urbanos, relacionados com a produção, comercialização, escoamento do ouro e administração das minas, como Vila Rica (atual Ouro Preto), Diamantina, Paraty, São João Del Rei, Vila Boa de Goiás e Cuiabá.

Esse comércio levou também ao surgimento de vias de comunicação importantes, como é o caso da Estrada Real, que ligava a região de Diamantina, no norte do atual Estado de Minas Gerais, aos portos de Paraty e Rio de Janeiro.

A grande transformação política, que sintetiza as transformações da época, é a mudança da capital do Estado do Brasil, de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763, evidenciando um novo ciclo econômico e uma nova dinâmica territorial da colônia.

3 Quando nos referimos ao Sudeste, estamos usando um termo atual para onde se localizava a região no passado. Antigamente, as expressões usuais eram Sul e Norte.

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Nesta unidade, vimos que o processo histórico de ocupação do território que viria a ser o Brasil é bastante complexo, envolvendo aspectos tanto relacionados com as questões que ocorriam no continente europeu, como também com a descoberta de riquezas no território, isso num contexto de intenso comércio internacional, especialmente da Europa com a Ásia.

Os ciclos econômicos implantados no Período Colonial foram extremamente importantes na história brasileira, influenciando ainda hoje diversos aspectos de nossa cultura, sociedade e, portanto, o território brasileiro, ainda que sejam resignificados aos moldes do mundo atual.

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Material Complementar

Explore · http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/default_evolucao.shtm

· http://brasil500anos.ibge.gov.br/territorio-brasileiro-e-povoamento

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional: Publifolha, 2000.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1982.

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Unidade: Formação Social, Econômica e Política do Brasil: O período colonial

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