histÓria e interdisciplinaridade no processo de...

80
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO DA FISIOTERAPIA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Fernanda Calil Petri Santa Maria, RS, Brasil 2006

Upload: vucong

Post on 14-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA

HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO DA FISIOTERAPIA

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Fernanda Calil Petri

Santa Maria, RS, Brasil

2006

Page 2: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO DA FISIOTERAPIA

por

Fernanda Calil Petri

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Integração Latino-americana, Área de

concentração em História da Saúde, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para obtenção

do grau de Mestre em Integração Latino-Americana

Orientador: Profª. Beatriz Teixeira Weber

Santa Maria, RS, Brasil

2006.

Page 3: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

iv

AGRADECIMENTOS

Embora uma dissertação seja, por sua finalidade acadêmica, um trabalho

individual, existem muitas pessoas que contribuem de diversas maneiras para

a sua realização, não podendo permanecer anônimas.

Por essa razão, quero expressar meus sinceros agradecimentos:

À Coordenação do Mestrado em Integração Latino-Americana pela

oportunidade que me foi dada em participar do Mestrado, mesmo sendo de

outra área de atuação.

À Profª. Beatriz Teixeira Weber por toda confiança depositada e por sua

tranqüilidade em me orientar.

Aos Profs. Jadir Camargo Lemos e Vítor Biasoli por aceitarem compor a

Comissão Examinadora.

À professora Tânia Fleig, Coordenadora do Curso de Fisioterapia da

UNISC, pela confiança, e amizade.

Às professoras e colegas da UNISC, Ângela Silva e Margarida Mayer pelo

conhecimento e dedicação à área da Saúde Coletiva.

Às colegas do Mestrado, em especial, à Josianne Zanoto e à Kita Tonetto

pela amizade, troca de experiência e apoio durante esses dois anos de

convivência.

Ao Henrique, meu marido, que sempre incentiva e apóia todos os projetos

da minha vida.

Page 4: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

v

“Cada um deve estar plenamente consciente de que sua própria vida é uma aventura, mesmo quando se imagina encerrado em uma segurança burocrática; todo destino humano implica uma incerteza irredutível, até na absoluta certeza, que é a da morte, pois ignoramos a data. Cada um deve estar plenamente consciente de participar da aventura da humanidade, que se lançou no desconhecido em velocidade, de agora em diante, acelerada.”

Edgard Morin

(Trecho do livro “A cabeça bem feita”)

Page 5: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

vi

RESUMO

Dissertação de Mestrado

Mestrado em Integração Latino-Americana Universidade Federal de Santa Maria, RS, Brasil

HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO DA

FISIOTERAPIA Autor: Fernanda Calil Petri

Orientador: Beatriz Teixeira Weber Data e Local da Defesa: Santa Maria, 26 de Maio de 2006.

A partir de reflexões sobre alguns conceitos relacionados à prática atual na área da saúde, foi encontrada uma nova forma de trabalhar o ensino e a prática clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente, pela humanização dos serviços prestados aos pacientes. E quais características que possivelmente influenciam no processo de humanização da saúde? Inúmeros fatores contribuem para que ele ocorra, porém, escolheu-se para trabalhar nessa dissertação dois deles, a interdisciplinaridade e o conhecimento histórico da profissão, os quais têm importância no desenvolvimento desse processo, tanto na graduação quanto, durante a vida profissional. Ao se propor uma pesquisa bibliográfica acerca da influência da interdisciplinaridade e da história no processo de humanização da Fisioterapia, acredita-se que os resultados poderão colaborar para geração de algumas mudanças dessa própria realidade. Tendo em vista as necessidades de melhor entender o processo de humanização da fisioterapia, dentro de seu contexto histórico, é proposta dessa dissertação atingir os seguintes objetivos:A partir do estudo sobre história da Fisioterapia e interdisciplinaridade verificar se esses fatores têm influência no processo de humanização da profissão. Observar como os conceitos de inter, multi e transdisciplinaridade podem influenciar na humanização da profissão. Por fim, descrever e analisar o processo de humanização da Saúde, e por conseqüência, da Fisioterapia, através da sua relação com a Saúde Pública e com as características do Sistema Único de Saúde (SUS).Objetiva-se assim, contribuir para a formação generalista e humanista do profissional fisioterapeuta, para que, dessa forma, ele trabalhe junto à sociedade, promovendo principalmente, o ganho de qualidade de vida da pessoa humana.Esta dissertação compõe-se de 4 capítulos: O primeiro capítulo, “História da Fisioterapia”, resgata a história da profissão desde o século passado até os dias de hoje, passando pela sua inserção no Mercosul. No contexto do Brasil, o texto começa debruçando-se sobre o resgate histórico da fisioterapia desde a vinda da Família Real ao país.O segundo capítulo, “Interdisciplinaridade”, aborda as diferentes formas de inter-relações entre as profissões e as disciplinas, bem como trabalha as diferenças entre os termos transdisciplinar, multidisciplinar e interdisciplinar. É abordada a interdisciplinaridade dentro da área da saúde e também sua relação na Fisioterapia. No terceiro Capítulo, “Humanização”, é trabalhada a visão de saúde e doença primeiramente, e, logo após, são verificados os possíveis fatores que promovem a humanização da saúde e da fisioterapia. No quarto capítulo, há um relato pessoal de experiência como professora em Estágio Supervisionado em Fisioterapia na Saúde Coletiva, na Universidade de Santa Cruz do Sul. Através desse relato, demonstra-se um exemplo bem sucedido de humanização nos atendimentos, através da influência da interdisciplinaridade e da consciência política-social dos alunos de graduação. Nas considerações finais são repensados os antigos e atuais modelos de saúde que permeiam a Fisioterapia como profissão da saúde, bem como são ponderadas algumas conclusões sobre humanização e interdisciplinaridade.

Palavras-chave: Fisioterapia, Interdisciplinaridade, Humanização

Page 6: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

vii

ABSTRACT

Dissertação de Mestrado Mestrado em Integração Latino-Americana

Universidade Federal de Santa Maria, RS, Brasil

HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO DA FISIOTERAPIA

Author: Fernanda Calil Petri Advisor: Beatriz Teixeira Weber

Location and date: Santa Maria, May, 26 2006. From reflections on some concepts related to practical the current one in the area of the health, a new form was found to work the education and the practical clinic of the physiotherapy, which are lived deeply, mainly, for the humanização of the services given to the patients. E which characteristics that possibly influence in the process of humanização of the health? Innumerable factors contribute so that it occurs, however, were chosen to work in this dissertação two of them, the interdisciplinaridade and the historical knowledge of the profession, which have importance in the development of this process, as much in the graduation how much, during the professional life. To if considering a bibliographical research concerning the influence of the interdisciplinaridade and history in the process of humanização of the physiotherapy, one gives credit that the results will be able to collaborate for generation of some changes of this proper reality. In view of the necessities of better understanding the process of humanização of the physiotherapy, inside of its historical context, it is proposal of this dissertação to reach the following objectives: From the study on history of the physiotherapy and interdisciplinaridade to verify if these factors they have influence in the process of humanização of the profession. To observe as the concepts of Inter, multi and transdisciplinaridade they can influence in the humanização of the profession. Finally, to describe and to analyze the process of humanização of the Health, and for consequence, of the physiotherapy through its relation with the Public Health and the characteristics of the Only System of Saúde (SUS). Objective thus, to contribute for the generalista formation and humanist of the professional physiotherapist, so that, of this form, it it works next to the society, being promoted mainly, the profit of quality of life of the person human being. This dissertação is composed in 4 chapters: The first chapter, “History of the physiotherapy”, rescues the history of the profession since the century passed until the present, passing for its insertion in the Mercosul. In the context of Brazil, the text starts leaning over itself on the historical rescue of the physiotherapist since the coming of the Real Family to the country. As the chapter, “Interdisciplinaridade”, approach the different forms of Inter-relations between the professions and you discipline them, as well as works the differences between the terms to transdisciplinar, to multidiscipline and to interdisciplinar. The interdisciplinaridade inside of the area of the health is boarded and also its relation in the physiotherapy. In the third Chapter, “Humanização”, is worked the vision of health and illness first, and, then after, the possible factors are verified that promote the humanização of the health and the physiotherapy. In the four chapter, it has a personal story of experience as teacher in Period of training Supervised in physiotherapy in the Collective Health, in the University of Santa Cruz of the South. Through this story, a successful example of humanização in the atendimentos is demonstrated, through the influence of the interdisciplinaridade and the politics-social conscience of the graduation pupils. In the final considerações the old and current models of health are rethink that permeiam the physiotherapy as profession of the health, as well as some conclusions on humanização and interdisciplinaridade are weighed. Key words: Physiotherapy, Interdisciplinaridade, Humanization

Page 7: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

viii

SUMÁRIO

Resumo........................................................................................................ ........vi Abstract................................................................................................................vii INTRODUÇÃO.....................................................................................................01 CAPÍTULO 1. HISTÓRIA DA FISIOTERAPIA ....................................................08 1.1 A Fisioterapia no Mundo.................................................................................08 1.2 Fisioterapia no Brasil......................................................................................12 1.2.1 Consequências da vinda da família Real para o Brasil...............................12 1.2.2 As Guerras Mundiais como fator decisivo no desenvolvimento da Fisioterapia no Brasil............................................................................................14 1.3 A Fisioterapia no contexto integracionista do espaço globalizado - Mercosul...............................................................................................................18 1.3.1 A inserção do fisioterapeuta no Mercosul...................................................20 CAPÍTULO 2. INTERDISCIPLINARIDADE..........................................................24 2.1 Complexidade e Interdisciplinaridade.............................................................25 2.2 Conceitos em Interdisciplinaridade.................................................................28 2.3 Interdisciplinaridade e Saúde.........................................................................33 2.4 Fisioterapia e Interdisciplinaridade.................................................................36 CAPÍTULO 3. HUMANIZAÇÃO...........................................................................40 3.1 Corpo, saúde e doença...................................................................................41 3.2 A presença do Sistema Único de Saúde no processo de humanização da Fisioterapia......................................................................................................44

Page 8: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

ix

3.2.1 O programa de Saúde da Família...............................................................48 CAPÍTULO 4. RELATO DE EXPERIÊNCIA .......................................................53 4.1 Considerações acerca do Estágio Supervisionado em Fisioterapia na Saúde Coletiva................................................................................................................53 4.2 A experiência com o Estágio..........................................................................55 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................59 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................65

Page 9: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

1

INTRODUÇÃO

A partir de reflexões sobre alguns conceitos relacionados à prática atual na

área da saúde, foi encontrada uma nova forma de trabalhar o ensino e a prática

clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente, pela humanização

dos serviços prestados aos pacientes.

E quais características que possivelmente influenciam no processo de

humanização da saúde? Inúmeros fatores contribuem para que ele ocorra, porém,

escolheu-se para trabalhar nessa dissertação dois deles, a interdisciplinaridade e

o conhecimento histórico da profissão, os quais possuem importância no

desenvolvimento desse processo tanto na graduação quanto durante a vida

profissional.

A concepção de interdisciplinaridade é entendida como um processo de

pensamento e ação fundamentados no conhecer e no pesquisar. Tem como base

o encontro, o diálogo e a troca recíproca do conhecimento e das experiências com

o outro, fazendo com que se possa perceber quando se é sujeito da própria ação.

Da mesma forma, a história influencia muito o processo de formação

profissional, no sentido de que a busca dos elos históricos compreende uma

construção cultural com uma base na construção do conhecimento. Esta participação

cultural constitui-se em uma necessidade para os grupos profissionais a fim de

garantir sua coesão e seu funcionamento, além de ilustrar a representação de seus

valores profissionais.

Entendendo a história como memória de grupo humano, que influencia a

formação da consciência coletiva e desperta a atenção do indivíduo para o mundo,

pode-se dizer que um entendimento significativo do presente exige uma visão

crítica do passado.

Page 10: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

2

Assim, para se entender os problemas da sociedade e desempenhar um

papel inteligente na construção da civilização, é preciso possuir um senso de

continuidade no tempo, ter consciência de ser impossível avançar para o futuro,

sem olhar para o passado.

Ao longo da história humana, os maiores problemas de saúde que os

homens enfrentaram estiveram relacionados com a natureza da vida comunitária.

Como exemplo, o controle das doenças transmissíveis, a melhoria do ambiente

físico (saneamento), a provisão de água e comida, a assistência médica, e o alívio

da incapacidade e do desamparo. A ênfase relativa sobre cada um desses

problemas variou no tempo, e de sua inter-relação se originou a Saúde Pública

como se conhece hoje.

Através de estudos e retrospectivas sobre a história das profissões da

saúde, pode-se contribuir com a sociedade de forma que a prática clínica seja

seguida de acordo com a evolução da ciência, sem esquecer dos princípios

humanos, da cidadania e da consciência de Saúde Pública.

A história da Fisioterapia inclui numerosos temas e um passado que se

pode situar cada vez mais no tempo. Pode-se dizer que esta visão histórica,

quando é transmitida pelos próprios profissionais reveste-se, indiscutivelmente, de

uma dimensão social e política.

No século passado, mais precisamente em 1945, após o fim da II Grande

Guerra surgiram centenas de mutilados e funcionalmente reprimidos. A

necessidade de reabilitar, física e psicologicamente esses indivíduos ao convívio

social, promovendo-lhes uma nova funcionalidade adaptada a suas condições

pós-guerra, fez surgir uma nova profissão, a Fisioterapia.

Derivada da medicina, inicialmente, a fisioterapia possuía como

características fundamentais a formação técnica e a reabilitação do ser humano

Page 11: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

3

através do uso dos meios físicos. A conduta fisioterapêutica era realizada somente

em conformidade com o diagnóstico e a prescrição médica. Havia assim, uma

pirâmide hierárquica da saúde, com o ápice composto por médicos, enquanto os

fisioterapeutas e os demais profissionais compunham a base.

Concomitante a esta realidade, na América do Norte e Europa, alguns

estudiosos, a exemplo de Carl McConnell e Mezière, respectivamente,

protagonizaram conceitos de Globalidade e Integralidade, isto é, entender e tratar

o paciente como um todo, dentro de seu contexto sócio-econômico e cultural. Foi

então que a profissão começou a ser entendida como uma ciência completa, isto

é, como instrumento de conhecimento científico na busca de causas e efeitos.

No Brasil, somente nas décadas de 80 e 90, as idéias de Globalidade e

Integralidade começaram a ser discutidas, em decorrência do intercâmbio

intercontinental, e da produção mais acelerada do conhecimento científico.

Atualmente, a assistência fisioterapêutica torna-se cada vez mais complexa

e variada, acrescida a cada instante, de técnicas e métodos mais eficazes e

acessíveis à população, ao mesmo tempo, que busca fundamentação científica

para nortear a prática clinica.

A medicina segue a tendência de ver o paciente como um todo, integrado à

sociedade e ao ambiente e procura tratá-lo levando em conta todos esses

aspectos, a fim de conseguir um perfeito entrosamento entre as suas várias fases:

preventiva, curativa e de reabilitação.

A Fisioterapia, como a medicina, atua nestas três fases, utilizando-se de

meios físicos para prevenção, diagnóstico e tratamento das enfermidades.

Diante disso, pode-se dizer que as profissões da área da saúde estão se

voltando para o atendimento integral do indivíduo, o que resulta na humanização

dos serviços de saúde.

Page 12: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

4

Para Barros (2002, p.7),

Mais do que recuperar e curar pessoas, é preciso criar condições necessárias para que a saúde se desenvolva. E quem poderia ser mais indicado do que o profissional que se dedica ao estudo e a investigação do movimento humano, das funções corporais, do desenvolvimento das potencialidades, atividades laborativas e da vida diária, entre outros, e tudo isso privilegiando a utilização de recursos da natureza e do próprio corpo humano? Para transformar a cruel realidade da saúde da população brasileira é preciso saber mais do que curar.

Da mesma forma, o trabalho em grupo, sobretudo com outros profissionais

da saúde, é uma constante na rotina do fisioterapeuta. Levando em conta alguns

princípios da interdisciplinaridade, como a parceria, a habilidade de comunicação

e, além disso, preservando sua individualidade perante os parceiros e perante o

conhecimento, consegue-se obter sucesso nos atendimentos aos pacientes. E

esse tipo de atendimento torna-se cada vez mais humanizado.

Em estudo sobre a formação universitária do fisioterapeuta, Gava (2004,

p.104) afirma que as atividades integradas, entre as disciplinas do curso de

Fisioterapia e entre outros cursos, são de extrema importância para a formação

humanizada. A própria relação dentro da clínica-escola é uma relação

interdisciplinar. Entretanto, o corpo docente necessita trabalhar

interdisciplinaridade para que o aluno tenha um ponto de referência.

Ainda segundo o autor, o profissional deve possuir, dentre outras

competências, as seguintes:

• Interação e atuação multiprofissional e interdisciplinar, tendo como

beneficiários os indivíduos e a comunidade.

• Assegurar que sua prática seja realizada de forma integrada e

contínua com os demais profissionais da saúde.

• Conhecimento de problemas políticos e sociais que afligem o

mundo e o Brasil, principalmente aqueles que têm impacto na

comunidade onde atua.

Page 13: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

5

• Promover ações de prevenção, proteção e reabilitação da saúde,

tanto de forma individual quanto coletiva, levando em conta as

particularidades e as individualidades da pessoa.

Assim, pode-se observar que dentre as competências do fisioterapeuta,

uma atuação multiprofissional, interdisciplinar e com consciência política-social,

leva invariavelmente, à qualidade nos atendimentos, tornando-os mais

humanizados, independentes da área de atuação.

A problemática escolhida para estudo nessa dissertação vem trazer

importante contribuição para o conhecimento de uma realidade ainda pouco

pesquisada. Ao se propor uma pesquisa bibliográfica acerca da influência da

interdisciplinaridade e da história no processo de humanização da Fisioterapia,

acredita-se que os resultados poderão colaborar para geração de algumas

mudanças dessa própria realidade. Através da atividade de Estágio

Supervisionado na Saúde Coletiva, realizada na Universidade de Santa Cruz do

Sul, tem-se procurado executar estes elementos, onde se espera estar

demonstrando as possibilidades dessas interações na prática.

Tendo em vista a necessidade de melhor entender o processo de

humanização da fisioterapia, dentro de seu contexto histórico, é proposta dessa

dissertação atingir os seguintes objetivos:

A partir do estudo sobre história da Fisioterapia e interdisciplinaridade

verificar se esses fatores têm influência no processo de humanização da

profissão. Observar como os conceitos de inter, multi e transdisciplinaridade

podem influenciar na humanização da profissão. Por fim, descrever e analisar o

processo de humanização da Saúde, e por conseqüência, da Fisioterapia, através

da sua relação com a Saúde Pública e com as características do Sistema Único

de Saúde (SUS).

Page 14: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

6

Objetiva-se assim, contribuir para a formação generalista e humanista do

profissional fisioterapeuta, para que, dessa forma, ele trabalhe junto à sociedade,

promovendo principalmente, o ganho de qualidade de vida da pessoa humana.

Para essa pesquisa, adotou-se o modelo de pesquisa interdisciplinar, em

que o pesquisador encontra-se dentro de seu objeto de pesquisa, sendo sujeito e

interagindo com ele, olhando-o de dentro para fora e de fora para dentro,

promovendo uma observação participante.

A fala de Fazenda (1994, p.70), transcrita a seguir, representa a opção

metodológica para essa dissertação:

...a metodologia interdisciplinar parte de uma liberdade científica, alicerça-se no diálogo e na colaboração, funda-se no desejo de inovar, de criar, de ir além e exercita-se na arte de pesquisar, não objetivando apenas uma valorização técnico produtiva, ou material, mas sobretudo, possibilitando uma ascese humana, na qual se desenvolva a capacidade criativa de transformação a concreta realidade mundana e histórica numa aquisição maior de educação em seu sentido latu, humanizante e libertador do próprio ser-no-mundo.

Esta dissertação compõe-se de 4 capítulos:

O primeiro capítulo, “História da Fisioterapia”, resgata a história da profissão

desde o século passado até os dias de hoje, passando pela sua inserção no

Mercosul. No contexto do Brasil, o texto começa debruçando-se sobre o resgate

histórico da fisioterapia desde a vinda da Família Real ao país.

O segundo capítulo, “Interdisciplinaridade”, aborda as diferentes formas de

inter-relações entre as profissões e as disciplinas, bem como trabalha as

diferenças entre os termos transdisciplinar, multidisciplinar e interdisciplinar. É

abordada a interdisciplinaridade dentro da área da saúde e também sua relação

na Fisioterapia.

Page 15: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

7

No terceiro Capítulo, “Humanização”, é trabalhada a visão de saúde e

doença primeiramente, e, logo após, são verificados os possíveis fatores que

promovem a humanização da saúde e da fisioterapia.

No quarto capítulo, há um relato pessoal de experiência como professora

em Estágio Supervisionado em Fisioterapia na Saúde Coletiva, na Universidade

de Santa Cruz do Sul. Através desse relato, demonstra-se um exemplo bem

sucedido de humanização nos atendimentos, através da influência da

interdisciplinaridade e da consciência política-social dos alunos de graduação.

Nas considerações finais são repensados os antigos e atuais modelos de

saúde que permeiam a Fisioterapia como profissão da saúde, bem como são

ponderadas algumas conclusões sobre humanização e interdisciplinaridade.

Page 16: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

8

CAPÍTULO 1. HISTÓRIA DA FISIOTERAPIA

1.1 A Fisioterapia no mundo

Os povos mais antigos já utilizavam os recursos da natureza, tais como o sol, o

calor, a água e a eletricidade para fins terapêuticos, de alívio da dor e na cura de

doenças. Conta-se que a descoberta dos princípios terapêuticos da eletricidade, que

mais recentemente deu origem à eletroterapia, vem da época em que os homens

viviam em cavernas, e que um homem com dores crônicas no calcanhar, ao banhar-

se em um rio, encostou acidentalmente seu pé em uma enguia elétrica e obteve uma

melhora dos sintomas. (BARROS, 2002)

Os recursos da natureza e o próprio movimento humano, incluindo

músculos, articulações e respiração foram, desde a antiguidade, utilizados

terapeuticamente. Na China, por exemplo, existem registros de obras abordando a

cura pelo movimento, modernamente chamada de cinesioterapia, desde o ano de

2.698 a .C. Na Grécia antiga, o filósofo Aristóteles (384 a.C.) já descrevia a ação

dos músculos, ficando conhecido como o “Pai da Cinesiologia”.

Em relação à reabilitação, encontra-se as primeiras referências ao uso de

próteses no mundo ocidental, entre os séculos VI e III a .C. De acordo com

Cherem (1990), localiza-se justamente na Grécia, no seu período de apogeu e

declínio, o que certamente deve estar relacionado com a problemática dos

mutilados nas guerras.

Na medicina Grega, a terapia pelo movimento constituía uma parte fixa do

plano de tratamento. Galeno (130 a 199 d.C) descrevia uma ginástica planificada

do tronco e dos pulmões, que teria corrigido o tórax deformado de um rapaz até

alcançar condições normais.

Page 17: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

9

Durante a Idade Média, a cultura e a dominação religiosa foram muito

presentes, gerando inúmeras conseqüências, dentre elas, a desvalorização do

corpo e da própria saúde, pois, sendo o corpo considerado apenas um mero

recipiente da alma, caberiam os cuidados e a valorização apenas ao espírito.

De acordo com Cherem (1990), na primeira metade do século XVIII,

Jallabert foi considerado um dos precursores no uso da eletrecidade médica, e, ao

final desse mesmo século, Henry Ling desenvolveu a cinesioterapia e Vincent

Prisswitz criou a hidroterapia. A hidroterapia foi bastante generalizada no século

XIX, muito embora as fontes medicinais e as estações de água já fizessem parte

da cultura ocidental desde a antiguidade romana.

No século XIX, junto com o uso da iluminação pela eletricidade, surgiram

várias clínicas especializadas na eletroterapia, tanto no campo psíquico quanto

orgânico. Consistia numa tentativa para evitar o uso de drogas. Também nessa

época, desenvolveram-se estudos, como o de Finsen sobre a Fototerapia.

A partir do século XX, foram muitas as mudanças na área da saúde.

Segundo Sanchez (1984), devido ao aumento da complexidade em ciência e

tecnologia e também ao aumento do número e variedade de casos relativos às

Grandes Guerras e às epidemias de poliomielite, o atendimento à saúde, que

antes era restrito a algumas poucas profissões, sofreu uma profunda

transformação, ao se delegarem funções a outras pessoas, formando-se equipes

de profissionais da saúde, com obrigações e atribuições determinadas.

Nesse contexto surgiram os primeiros cursos de formação de

fisioterapeutas no mundo. Na Alemanha, as primeiras escolas foram as de Kiel

(1902) e Dresdem (1918). Ainda segundo Sanchez, cabe salientar a importância

do desenvolvimento de inúmeros trabalhos conjuntos entre fisioterapeutas e

médicos, especialmente no início do século XX, destacando-se o exemplo do

médico cirurgião alemão Rudolf Klapp, que, em conjunto com as fisioterapeutas

Page 18: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

10

Blederbeck e Hess desenvolveram, o método Klapp de exercícios para tratamento

da escoliose1 sendo este método utilizado até hoje.

Depois disso, na Inglaterra, segundo Sanchez (1984), a Fisioterapia

aparece com grande destaque no cenário mundial, com os trabalhos de

massoterapia realizados pelos doutores Mendell e Cyriax, os trabalhos de

cinesioterapia respiratória, feitos por Winifred Linton, no Bromptom Hospital, em

Londres, e, sobretudo, os trabalhos de fisioterapia neurológica, realizados em

conjunto com a fisioterapeuta Berta Bobath e o neurofisiologista Karel Bobath, que

criaram o Método Bobath, para tratamento de pacientes com paralisia cerebral.2

Nas Américas, a Fisioterapia chegou primeiro à América do Norte, com a

Escola de Medicina da Harvard, por meio das pesquisas de testes musculares,

realizadas por Robert W. Lewet e Janet Merril, no período de 1912 a 1916. O

primeiro serviço de Fisioterapia surgiu na Faculdade de Medicina da Universidade

de North Western, com o setor de hidroterapia e massagem, nos anos de 1919 e

1920. (GAVA, 2004)

Na América do Sul, a Argentina foi um dos países pioneiros em cursos de

formação de fisioterapeutas, chamados pelo nome de kinesiólogos. De acordo

com Barros (2002), o argentino Ernesto Aberg, no ano de 1884 editou o livro

intitulado “Mecanoterapia de Zander”, podendo ser este considerado como a

primeira publicação referente a exercícios terapêuticos na América do Sul.

Segundo Figueirôa (1996), nos países participantes da Primeira Guerra

Mundial, o grande número de mortos e mutilados levou a uma diminuição na força

de trabalho ativa, criando a necessidade de reincorporar os acidentados e

mutilados de guerra à força produtiva. Nesta época, surgiram, então, grandes

1 Patologia ortopédica em que a coluna vertebral sofre um desvio lateral. SOUCHARD, P.,OLLIER, M. As escolioses. São Paulo: É realizações, 2001. 2 Paralisia Cerebral é um déficit neurológico motor não-progressivo, com início no período perinatal, associado a várias entidades patológicas, como hemorragias e isquemias cerebrais. As principais seqüelas são os distúrbios do movimento. ROBBINS, et al. Patologia estrutural e funcional. Rio de Janeiro: ed Guanabara Koogan, 1996.p.547

Page 19: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

11

centros de reabilitação, locais onde eram prescritas e realizadas as atividades de

reaprendizagem do movimento, reeducação funcional, entre outras, através,

principalmente, das técnicas cinesioterápicas.

Já nos tempos de paz, os tratamentos fisioterapêuticos se desenvolveram

com relação a várias doenças, especialmente no que se refere à poliomielite, que

teve sua primeira grande epidemia nos Estados Unidos a partir da primeira década

do século XX, criando, em conseqüência, uma enorme demanda por profissionais

qualificados, dentre eles o fisioterapeuta.

A partir da Segunda Guerra Mundial, o fisioterapeuta toma o pulso e o

comando da atividade cinesioterápica. Os médicos estavam mais voltados para as

cirurgias, graças as importantes descobertas que possibilitaram os avanços nessa

área. Além disso, a demanda de incapacitados gerou a necessidade de

profissionais que pudessem se dedicar somente aos exercícios reabilitativos.

No ano de 1948, em Londres, foi criada a World Confederation Physical

Therapy (WCPT), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objetivo

de intensificar a Fisioterapia no mundo.

Pode-se dizer que o passado da fisioterapia, ciência que se consagrou

apenas a partir da metade do século XX, remete à análise dos primórdios da

medicina física. Dessa forma, a apropriação de uma interface do saber médico

acabou por gerar conflitos de identidade na fisioterapia, bem como, criou uma

situação de confronto com a própria medicina física. Porém, as duas ciências

percorreram o mesmo caminho. Talvez a fisioterapia tenha apenas retomado

recursos válidos da medicina antiga, que não dispunha do arsenal tecnológico

para diagnosticar e tratar. (FONSECA, 2002)

A fisioterapia foi utilizada empiricamente desde os primórdios da

humanidade, conhecendo, no transcurso de sua história, fases de esplendor e de

ostracismo. Entretanto, a profissão permaneceu, durante muitos anos,

Page 20: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

12

desconhecida. Uma boa parcela da população ainda desconhece sua importância

e, apesar de sua idade, ela é uma profissão nova no sentido mais específico do

termo. Em contrapartida, observa-se que, atualmente, ela vem caminhando no

sentido de firmar-se no seu reconhecimento, sobretudo devido a sua utilidade na

prevenção e no tratamento de doenças.

1.2 A Fisioterapia no Brasil

A fisioterapia no Brasil tem um histórico breve, que se divide em dois

momentos: o primeiro, refere-se à organização dos centros de reabilitação e dos

cursos de formação prática (nível técnico); o segundo, ao movimento dos

profissionais para aperfeiçoar seus conhecimentos e ter sua categoria

reconhecida, ganhando autonomia para o desempenho profissional.

O curso de fisioterapia foi criado para habilitar profissionais que pudessem

auxiliar o médico na prática da medicina física e reabilitação, executando suas

prescrições. Porém, o grupo, aos poucos, foi ocupando novos espaços e, através

do aperfeiçoamento técnico e dedicação dos pioneiros, abriu-se o caminho para

que a profissão fosse projetada para formação em nível superior.

1.2.1 Conseqüência da vinda da família real para o Brasil

Napoleão Bonaparte acabou por contribuir indiretamente com o

desenvolvimento dos primeiros serviços organizados de Fisioterapia no Brasil, ao

invadir Portugal e fazer com que a família real portuguesa desembarcasse no

país, em 1808. Com os monarcas, vieram os nobres e o que havia de recursos

humanos de várias áreas para servir à elite portuguesa, de passagem por estas

terras. (NOVAES, 2005)

Page 21: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

13

Dentre todas as contribuições do reinado, destaca-se o surgimento das

primeiras escolas de ensino médico na cidade do Rio de Janeiro, o que contribuiu

muito para a formação da fisioterapia no Brasil, já que foi a partir da iniciativa de

alguns médicos que surgiram os primeiros serviços com recursos terapêuticos.

No século XIX, os recursos fisioterápicos faziam parte da terapêutica

médica, e, assim, há registros da criação, no período compreendido entre 1879 e

1883, do serviço de eletricidade médica, e também do serviço de hidroterapia no

Rio de Janeiro, existente até os dias de hoje, sob denominação de "Casa das

Duchas".

Em 1884, o médico Arthur Silva criou o primeiro serviço de Fisioterapia da

América do Sul no Hospital de Misericórdia do Rio de Janeiro. O médico

destacou-se como figura dedicada à medicina física, tendo empregado e

desenvolvido várias técnicas de galvanização e iontoforese 3 (LEITÃO, 1979).

Segundo Sanchez e Marques (1994), em 1919, na cidade de São Paulo, o

médico Raphael Penteado de Barros fundou o Departamento de Eletricidade

Médica, na Faculdade Medicina da Universidade de São Paulo. Dez anos após,

em 1929, o médico Waldo Rolim de Moraes, instalou primeiramente, no Hospital

Central da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, o serviço de Fisioterapia e,

após, o serviço de Fisioterapia do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Na década de 1930, Rio Janeiro e São Paulo possuíam serviços de

Fisioterapia idealizados por médicos que tomavam para si a terapêutica de forma

integral, experimentando recursos físicos para minimizar as seqüelas de seus

pacientes. Esses médicos eram distintos dos outros, por estarem preocupados

não apenas com a estabilidade clínica de seu paciente, mas com sua

3 Aplicação de corrente elétrica de baixa freqüência do tipo Galvânica. Iontoforese emprega eletrodos carregados (positivo ou negativo) para introduzir na pele substancias ativas.Qualquer substancia carregada ou polar pode sofrer iontoforese, entre elas medicamentos como lidocaína, iodo, salicilato, gentamicina, entre outros. YOUNG et al. Segredos em medicina Física e reabilitação. Porto Alegre: Artmed, 2000.p. 627.

Page 22: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

14

recuperação física para que pudessem voltar a viver em sociedade, com iguais

ou parecidas funções anteriores ao agravo da saúde.

Essa visão ampla de compromisso com o paciente, engajando-se num

tratamento mais eficaz que promovesse sua reabilitação, uma vez que as

incapacidades físicas, por vezes, excluíam-no socialmente, levou aqueles

médicos a serem denominados médicos de reabilitação.

As faculdades de Medicina eram úteis para embasar cientificamente a

prática médica, pelo acesso ao conhecimento adquirido pelos cientistas europeus

sobre fisiologia humana e o emprego crescente dos recursos hídricos, elétricos e

térmicos.

Através de trabalhos e apresentações de teses, criou-se uma cultura de

atenção diferenciada às deficiências não apenas físicas, mas também mentais e

sensoriais. Esse foi um período valioso no sentido de tornar possível recuperar

funções de seres humanos que, em período não muito distante, não tinham

perspectiva de melhora das suas incapacidades.

1.2.2 As Guerras Mundiais como fator decisivo de desenvolvimento da Fisioterapia

A 2ª Guerra Mundial teve como novidade o envolvimento direto do Brasil,

com o envio de pracinhas junto aos Aliados. Os reflexos dessa participação

estão no desenvolvimento da Fisioterapia enquanto prática recuperadora das

seqüelas físicas de guerra, com a modernização dos serviços de Fisioterapia no

Rio de Janeiro e em São Paulo e criação de novos serviços em outras capitais do

país.

Em 1947, o Dr. Camilo Abud inaugurou o primeiro serviço de fisioterapia

com características modernas, no Hospital Carlos Chagas, no Rio de Janeiro. Em

Page 23: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

15

1950, surgiram novas instituições, como o serviço de fisioterapia da Santa Casa

de Misericórdia do Rio de Janeiro, fundadas pelo Dr. Waldemar Bianchi. Este setor

era bem aparelhado e anexo a ele foi montado um ambulatório de reumatologia.

Ainda neste mesmo ano foi criado o serviço de medicina física e reabilitação do

Instituto dos Industriários, também no Rio de Janeiro (LEITÃO, 1995).

A modernização dos serviços, com o conseqüente aumento da oferta e da

procura, levou os chamados médicos de reabilitação a se preocuparem com a

resolutividade dos tratamentos. Com este objetivo, empenharam-se para que o

ensino da fisioterapia, como recurso terapêutico, então restrito aos bancos

escolares das faculdades médicas nos campos teórico e prático, fosse difundido

entre os para-médicos, que eram os auxiliares dos médicos.

Assim, em 1951, foi realizado, em São Paulo, na USP, o primeiro curso no

Brasil para a formação de técnicos em Fisioterapia, com duração de um ano, em

período integral, acessível a alunos com 2º grau completo e ministrado por

médicos. Homenageando o professor de física biológica da Faculdade de

Medicina, que criou um serviço de eletro-radiologia na referida cadeira em 1919,

o curso para-médico levou o nome de Raphael de Barros, formando os primeiros

“fisioterapistas”, denominação da época.

Curiosamente, os cursos de Fisioterapia iniciaram-se em São Paulo antes

do Rio, apesar dos primeiros serviços terem se desenvolvido na antiga capital

federal. Só em 1952 a cátedra de Fisioterapia foi retomada na Faculdade de

Ciências Médicas do RJ.

Leitão (1979) afirma que em 1954, foi criada a Associação Beneficente de

Reabilitação (ABBR), que, 2 anos depois, ministrou o curso de técnico em

reabilitação. No mesmo ano, um grupo de médicos liderados pelo Dr. Waldemar

Bianchi, fundou a Sociedade Brasileira de Reabilitação.

Page 24: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

16

A partir do movimento pelas Associações Beneficentes, foram fundadas,

em 1958, a Associação de Assistência à Criança Defeituosa (AACD) por Renato

Bonfim e, então, surgiram as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais

(APAEs). Nessas associações, existia um campo de trabalho muito importante no

tratamento de crianças, surgindo um novo conceito de assistência diferenciada

aos pacientes.

Porém, quem fazia o trabalho de reabilitação nesses centros eram os para-

médicos, oriundos dos novos cursos técnicos. As primeiras turmas formaram

aqueles que estavam nos consultórios e clínicas auxiliando os médicos, os quais

prescreviam os exercícios, as massagens, o uso do calor, da luz, dos banhos e

dos rudimentares recursos eletroterápicos disponíveis para a recuperação do

paciente.

Em 1959, o professor Godoy Moreira fundou o Instituto Nacional de

Reabilitação, anexo à cadeira de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de

Medicina da Universidade de São Paulo. A fundação deste Instituto foi o resultado

de negociações com a Organização Panamericana de Saúde (OPAS),

Organização Mundial da Saúde (OMS), e a World Confederation for Physical

Therapy (WCPT), fazendo parte de um projeto mais amplo, que visava a criação

de vários institutos na América Latina.

Diferentemente dos países da Europa,4 no Brasil, o ensino de Fisioterapia

nos cursos técnicos restringia-se a aprender a ligar aparelhos, reproduzir

mecanicamente determinadas técnicas de massagem e exercícios, tudo sob

prescrição. Os técnicos não possuíam os conhecimentos necessários para o

diagnóstico do funcionamento normal e patológico, para a avaliação do corpo

humano, nem para a compreensão dos mecanismos de lesão e conduta

terapêutica.

4 A França, por exemplo, desde 1927 já possuía faculdade de Fisioterapia

Page 25: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

17

De acordo com Sanchez e Marques (1994), foi no início da década de 60

que, através da Lei n º 5029, surgiu o primeiro curso com padrão internacional

mínimo para formação de profissionais atuantes em reabilitação. O curso tinha

duração de dois anos e as aulas eram ministradas pela fisioterapeuta Karen

Lemborg, sendo que o mesmo foi elaborado para atender aos programas de

reabilitação que a OPAS estava interessada em desenvolver na América Latina.

Em 1969, o Brasil contava apenas com seis escolas para formar

fisioterapeutas. Nesta ocasião, a World Confederation for Physical Therapy

promoveu o primeiro curso para professores latino-americanos das escolas de

fisioterapia, sendo escolhidos dois candidatos de cada país. O Brasil enviou dois

professores da Universidade de São Paulo: Danilo Define e Eugênio Lopez

Sanchez, que concluíram o mestrado em fisioterapia através deste projeto

(SANCHEZ, 1984).

Em 13 de outubro de 1969, o Decreto Lei 938/69 reconheceu as profissões

de Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Em 1970, a Universidade de São Paulo,

através da Portaria 1025, decretou que os certificados de conclusão dos cursos

Técnico em Fisioterapia e Terapia Ocupacional, expedidos pelo Instituto de

Reabilitação da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, nos anos

de 1958-1966, seriam considerados, para efeitos de direito, equivalentes aos

diplomas expedidos nos termos deste regulamento. (SANCHEZ E

MARQUES,1994)

Em 28/02/1983, a Resolução n º 4 do Conselho Federal de Educação fixa o

currículo mínimo para o curso de fisioterapia. Segundo Novaes (2005), esse

currículo permaneceu em vigência até o ano de 1997, quando foi extinto, com a

aprovação da Lei n º 9394 de 20/12/1996, a Lei das Diretrizes e Bases da

Educação (LDB). Os currículos mínimos foram substituídos por diretrizes

curriculares. Para tanto, foi criada uma Comissão de Especialistas de Fisioterapia

e Terapia Ocupacional (CEEFTo), encarregada de obter propostas junto às

Page 26: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

18

instituições de ensino, bem como sistematizar as contribuições recebidas no

intuito de materializar as novas diretrizes. Em 12/09/2001, o Colegiado de

Educação Superior do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação

Superior, aprovou as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação

em Fisioterapia e Terapia Ocupacional.

A situação atual da Fisioterapia no Brasil é fruto de sua história, de sua

evolução e conquista. Conhecer esse trajeto permite entender os problemas atuais

que alertam sobre os erros cometidos no passado.

Porém, de acordo com Nicida (2004), disciplinas como História da

Fisioterapia, Fundamentos e Ética, infelizmente, sofrem um grande desprestígio,

tanto por parte dos alunos quanto dos próprios professores e instituições. Essa

realidade pode ser reflexo de uma formação com base centrada no modelo

tecnicista e curativo.

Nesses trinta e seis anos de atividade profissional reconhecida (desde

1969), a Fisioterapia vem crescendo sempre, qualificando seus profissionais e

ganhando respeito e credibilidade da sociedade e dos demais profissionais da

área da saúde.

1.3 A Fisioterapia no contexto integracionista do espaço globalizado - Mercosul

O processo de globalização e integração econômica em blocos regionais

constitui o elemento dinâmico construtivo do atual movimento de reordenação das

relações internacionais, rumo a uma Nova Ordem Global.

A globalização tem sido apresentada como um fenômeno de abertura

simultânea das economias nacionais, gerando como resultado, uma

Page 27: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

19

mundialização homogeneizada. Contudo, a globalização é seletiva, pois visa

determinadas regiões, atividades e segmentos sociais a serem integrados

mundialmente. Desta forma, enquanto certas áreas e grupos são integrados

globalmente, outros são excluídos desta gigantesca transformação, conduzindo a

uma diversificação cada vez maior do espaço mundial e agravando a

concentração de riqueza em termos nacionais e sociais.

Para Vizentini (2002), este fenômeno propicia uma aceleração do processo

de reestruturação econômica e, consequentemente, da concorrência e rivalidade

interpólos. Uma manifestação desta situação foi a rápida formalização de novos

processos de integração, como o Mercosul e o NAFTA (Acordo de Livre Comércio

da América do Norte), bem como o aprofundamento da União Européia e o

estabelecimento de alianças entre alguns em detrimento de outros.

Em março de 1991, foi criado o Mercosul (Mercado Comum do Sul) através

do Tratado de Assunção, dando início à integração entre Brasil, Argentina,

Paraguai e Uruguai. Tratava-se de uma continuidade e aprofundamento da

integração Brasil-Argentina, iniciada em 1986 pelos presidentes Sarney e Alfonsin.

O Mercosul constitui-se a partir de um amplo conjunto de acordos bilaterais

e regionais, objetivando a integração econômica e a formação de um Mercado

Comum, com a livre circulação de bens de capital e de conhecimento. Os Estados

Partes, por sua vez, assumem o compromisso de harmonizar suas legislações em

áreas pertinentes para obter o fortalecimento do processo de integração com

justiça social.

A integração comercial, propiciada pelo Mercosul, também favoreceu a

implementação de ações nos mais diferentes setores, como saúde, educação,

justiça, cultura, transportes, energia, meio ambiente e agricultura. Nesse contexto,

foi instituído, em 1996, o SGT 11 Saúde (Subgrupo de Trabalho n° 11 Saúde), um

dos 14 subgrupos ligados ao Grupo Mercado Comum, que tem como tarefa geral

harmonizar as legislações dos Estados Partes referentes aos bens, serviços,

Page 28: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

20

matérias primas e produtos da área da saúde, critérios para a vigilância

epidemiológica e controle sanitário.(COFFITO, 2005) .

Dentro do SGT 11 Saúde, existem duas comissões, a Comissão de

Produtos para a Saúde e Comissão de Prestação de Serviços da Saúde, sendo

que, nesta última, se situa a Subcomissão de Exercício Profissional. O trabalho

realizado por essa subcomissão está ligado às relações coletivas e individuais de

trabalho, ao livre trânsito de trabalhadores, à formação profissional, à

compatibilização dos currículos de formação, ao reconhecimento da habilidade

profissional (títulos e diplomas), ao registro profissional, à regulamentação do

trabalho e aos requisitos para o exercício profissional no Mercosul.

De acordo com Coffito (2005), em 2004, foi criado o Fórum Permanente

Mercosul – Exercício Profissional, que busca constante diálogo e cooperação

entre gestores e trabalhadores da saúde. Um dos principais objetivos do Fórum é

formular políticas de gestão do trabalho e da educação na saúde, que levem a

maior qualidade e cobertura da atenção á saúde da população, principalmente nas

regiões fronteiriças do Mercosul além de elaborar propostas que auxiliem na

definição e na implementação da agenda de trabalho.

Nesse sentido, o Fórum promoveu, em junho de 2005, a 8° Reunião

Ordinária, onde foi discutida a proposta sobre os princípios éticos para

profissionais da saúde do Mercosul e a Matriz Mínima, que trata do registro dos

profissionais de saúde, que queiram exercer a sua profissão em países do

Mercosul.

Pode-se dizer que os dois fóruns de discussão são prioritários para as

questões que dizem respeito às profissões da área da saúde. O primeiro é o fórum

político e estratégico, com reuniões de Ministros dos Estados Parte, e o segundo é

o fórum normatizador e regulador das matérias referentes à saúde, com reuniões

do Subgrupo de Trabalho STG 11 Saúde.

Page 29: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

21

Em abril de 2005, o Grupo do Mercado Comum – GMC5 aprovou, através

de resolução, a Pauta Negociadora do STG 11 Saúde, que tem a finalidade de

promover e proteger a saúde e a vida das pessoas e eliminar os obstáculos ao

comércio regional e à atenção integral e de qualidade, contribuindo, desta

maneira, ao processo de integração.

1.3.1 A inserção do Fisioterapeuta no Mercosul

De acordo com Relatório OPAS – 1995, citado por Mendes e Morais (2002,

p.193), é possível verificar que, quando se fala em problemas de saúde

globalizados, vinculados ao desenvolvimento, a solução tem como base a

necessidade de uma inter-relação entre saúde, meio-ambiente, sociedade e

economia:

A saúde e o desenvolvimento estão intimamente relacionados. Tanto um desenvolvimento insuficiente que conduza à pobreza como um desenvolvimento inadequado que resulte em consumo excessivo, associados a uma população mundial em expansão, podem resultar em sérios problemas para a saúde relacionados ao meio ambiente, tanto nos países em desenvolvimento como nos desenvolvidos...Os vínculos existentes entre saúde e melhorias ambientais e sócio-econômicas exigem esforços intersetoriais.

Da mesma forma, quando se pensa em problemas de saúde num mundo

globalizado, é necessário pensar também no fisioterapeuta atuante na globalização.

O fisioterapeuta, profissional liberal e autônomo da área de saúde, com

formação exclusiva de nível superior, deixou de ser apenas um reabilitador e hoje

atua nas áreas de promoção, prevenção e atenção primária à saúde, em todos os

níveis de complexidade, no tratamento, prevenção e recuperação das mais diversas

patologias. No entendimento de Barros (2002), aliado a essa desenvoltura no campo

5 Órgão executivo do Mercosul

Page 30: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

22

da saúde, o fisioterapeuta é um profissional independente da indústria farmacêutica

internacional, tendo seus custos diagnósticos e terapêuticos, relativamente baixos.

Este novo perfil profissional do fisioterapeuta torna-o extremamente útil para

atender as necessidades na área da saúde no Brasil e em toda América do Sul, onde

as desigualdades sociais são profundas e o investimento em políticas públicas

consistentes e resolutivas é mínimo.

Durante a realização do XIII Congresso Brasileiro de Fisioterapia, em 1995,

ocorreram os primeiros contatos visando à integração dos fisioterapeutas no

Mercosul, com profissionais da Argentina, Uruguai, Paraguai, Brasil, Chile e

Bolívia. Após algumas reuniões foi criada a CIFIKIM, Comissão de Integração dos

Fisioterapeutas e Kinesiólogos do Mercosul (COFFITO, 1999).

As diferenças entre os países participantes do Mercosul, em relação à

fisioterapia, não são poucas. Existem diferenças quanto à formação, número de

instituições, requisitos para o exercício profissional, titulação oferecida, legislação e

quantidade de profissionais.

De acordo com dados de outubro de 1998, fornecidos pela CIFIKIM, os países

que conformam o Mercosul têm uma relação média de, aproximadamente, um

fisioterapeuta para cada 4.500 pessoas, número considerado insuficiente se

comparado com a proporção no Brasil de 757 habitantes para cada médico, 1132

para cada odontólogo (OPAS/OMS, 1998) e 5.300 habitantes para cada

fisioterapeuta.

Estes dados demonstram claramente que ainda há muito espaço no mercado

de trabalho do Brasil e do Mercosul e que existe uma grande parcela da população

sem atendimento fisioterapêutico, sem qualquer acesso ao profissional. Além disso,

existe a grande concentração de instituições formadoras, profissionais e serviços nas

grandes metrópoles e capitais, sendo que estes números se tornam ainda mais

expressivos nas cidades periféricas e interior dos países membros do Mercosul.

Page 31: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

23

Ao longo destes anos, segundo COFFITO (2005) os principais avanços foram

constituídos na Proposta de Princípios Éticos Comuns e na construção de subsídios

para formatação do perfil profissional do fisioterapeuta no Mercosul, levando em

consideração questões de formação acadêmica e profissional, regulamentação e

habilitação profissional e controle e fiscalização do exercício profissional. Estas

questões foram amplamente discutidas e proporcionaram a identificação das

principais diferenças e a necessidade de homogeneização, visando a integração da

fisioterapia no Mercosul e o fortalecimento da fisioterapia latino-americana.

Os entraves técnicos curriculares e de legislação precisam ser ultrapassados,

de modo que se possa ter pontos em comum, sem ferir a legislação de cada país,

para que se propicie a livre circulação de profissionais e prestação de serviços em

fisioterapia dentro dos países membros.

O novo perfil que vem se firmando do profissional fisioterapeuta brasileiro,

ocupando-se dos problemas de saúde da população, de forma ampla e em sintonia

com os acontecimentos sociais, deve ser o ponto de união com os fisioterapeutas do

Mercosul.

Para Barros (2002), a incorporação de tecnologia, isolada, não representa

necessariamente progresso ou benefícios à população. Existe a necessidade de se

incorporar prioritariamente a função social, comunitária, a qual deve ser praticada e

discutida através de uma formação humanizada, voltada às necessidades da

população dos países membros do Mercosul, no sentido da ampliação da

universalidade e equidade6 da assistência em saúde, incluindo as populações

marginalizadas.

Assim, acredita-se que a presença de uma formação de base humanizada e

interdisciplinar é peça chave para o desenvolvimento de profissionais capazes de

atuar em todas as áreas da fisioterapia e em qualquer nível de atenção a saúde, seja

no Brasil ou mesmo em outros países. 6 Universalidade e equidade são características que devem estar presentes nos sistemas de saúde que visem igualdade nos atendimentos, ou seja, saúde igual e para todos.

Page 32: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

24

Para entender de que forma a interdisciplinaridade está presente na

fisioterapia, o próximo capítulo abordará os diferentes tipos de interdisciplinaridade.

Page 33: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

25

CAPÍTULO 2. INTERDISCIPLINARIDADE 7

A base epistemológica que consolidou a divisão das disciplinas no final do

século XIX tem uma origem positivista comum, sendo que as ciências humanas

talvez tenham sido aquelas que possibilitaram estabelecer-se uma crítica maior

sobre o resultado da divisão disciplinar do conhecimento (NARDI, 2004)

A partir de uma perspectiva epistemológica crítica, Foucault (2004) afirma

que se deve buscar o “desdisciplinamento” dos objetos, dos problemas e das

práticas que foram forjados e construídos, a partir de um modelo disciplinar, na

construção do projeto de ciência da modernidade, na sua articulação com o campo

institucional.

Isso significa que o desafio fundamental não consiste somente em se

aproximar disciplinas de seus saberes, uma vez que esses saberes foram

construídos a partir de uma base disciplinar positiva comum. Mas trata-se de se

evidenciar os dispositivos e as lógicas de produção dos discursos, compreendendo

o modo como estes conformaram os objetos que estudam.

Essa idéia sobre interdisciplinaridade pode ser entendida através de uma

citação de Lichnerowicz, a qual Morin (2000, p.13) utiliza em sua obra a fim de

demonstrar a atual situação do ensino no mundo em relação às disciplinas

Nossa universidade atual forma, pelo mundo afora, uma proporção demasiado grande de especialistas em disciplinas predeterminadas, enquanto uma grande parte das atividades sociais, como o próprio desenvolvimento da ciência, exige homens capazes de um ângulo de visão muito mais amplo e, ao mesmo tempo, de um enfoque dos problemas em profundidade, além de novos progressos que transgridam as fronteiras históricas das disciplinas.

7 No Brasil a palavra aparece assim traduzida: interdisciplinaridade (do francês ou do inglês), ou interdisciplinariedade (do espanhol).

Page 34: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

26

No entender de Fazenda (1994), o movimento de interdisciplinaridade

surgiu na Europa, principalmente na França e na Itália, em meados de década de

1960, época em que se insurgem os movimentos estudantis, reivindicando um

novo estatuto de universidade e de escola. Aparece, inicialmente, como tentativa

de elucidação e de classificação temática das propostas educacionais que

começavam a aparecer na época, evidenciando-se através do compromisso de

alguns professores em certas universidades, que buscavam o rompimento de uma

educação segmentada.

Para fins didáticos, Fazenda (1994, p.17) subdividiu o movimento

interdisciplinar em três décadas:

• 1970: Construção epistemológica da interdisciplinaridade, em busca de uma

explicitação filosófica. Nessa época se procurava uma definição de

interdisciplinaridade.

• 1980: Explicitação das contradições epistemológicas decorrentes dessa

construção, em busca de uma diretriz sociológica. Tentava-se explicitar um

método para a interdisciplinaridade.

• 1990: Construção de uma nova epistemologia, a própria da

interdisciplinaridade, em busca de um projeto antropológico. Parte-se para a

construção de uma teoria da interdisciplinaridade.

A principal teoria da interdisciplinaridade tem base na teoria da

complexidade, e, para entendê-la melhor, no próximo item será trabalhada a

relação entre complexidade e interdisciplinaridade.

2.1 Complexidade e Interdisciplinaridade

A complexidade é uma nova maneira de pensar, que vem substituir a

simplificação, pois o ser humano é um ser físico, biológico, social, cultural, psíquico

Page 35: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

27

e espiritual, sendo a complexidade a articulação, a identidade e a diferença entre

todos esses aspectos.(KURBAN, 2005)

Através de estudos sobre complexidade na saúde pública, Tarride (1998)

explica que a complexidade é considerada uma forma de agregar metodologias

para atuação no campo da saúde, com o objetivo de avançar em sua compreensão

na busca de soluções aos problemas que a acometem. De onde decorre que a

interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade constituem mecanismos obrigatórios

para atuar em saúde pública.

Morin (2000) propõe um método complexificador, substituindo o sistema

analítico simplificador, por uma análise complexificadora, em que a circularidade

causal é utilizada a serviço da análise, na qual os elementos antagônicos e

concorrentes tornam-se evidentes e não são reduzidos ou sintetizados

rapidamente. De acordo com o autor

Existe inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas, e por outro lado, realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacionais, globais, planetários. Em tal situação, tornam-se invisíveis os conjuntos complexos, as interações e retroações entre partes e todo, as entidades multidimensionais, os problemas essenciais. (MORIN, 2000, p. 13)

A citação do autor demonstra que, a hiper-especialização impede de ver o

global, que ela fragmenta em parcelas, bem como o essencial, que ela dilui.

Porém, os problemas essenciais, nunca são parceláveis, e os problemas globais

são cada vez mais essenciais. Além disso, todos os problemas particulares só

podem ser posicionados e pensados corretamente em seus contextos, sendo que o

próprio contexto desses problemas deve ser posicionado, cada vez mais, no

contexto planetário.

Page 36: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

28

Ao mesmo tempo, segundo o autor, o retalhamento das disciplinas torna

impossível aprender “o que é tecido junto”, isto é, o complexo, segundo o sentido

original do termo, complexus.

Portanto, o desafio da globalidade é também um desafio de complexidade.

Existe complexidade, de fato, quando os componentes que constituem um todo

(como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico)

são inseparáveis e existe um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo

entre as partes e o todo, o todo e as partes.

Pode-se dizer que, quanto mais os problemas se tornam

multidimensionais, maior a incapacidade de pensar sua multidimensionalidade;

quanto mais a crise progride, mais progride a incapacidade de pensar a crise;

quanto mais planetários tornam-se os problemas, mais impensáveis eles se

tornam. É com esse pensamento que Morin (2000, p.15) afirma

Assim, os desenvolvimentos disciplinares das ciências não só trouxeram as vantagens da divisão do trabalho, mas também os inconvenientes da superespecialização, do confinamento e do despedaçamento do saber. Não só produziram o conhecimento e a elucidação, mas também a ignorância e a cegueira.

De acordo com o autor, em vez de corrigir esses desenvolvimentos, o

sistema de ensino obedece a eles. Na escola primária é ensinado a isolar objetos,

separar disciplinas, dissociar os problemas, em vez de reunir e integrar. Ocorre

uma redução do complexo ao simples.

Pode-se dizer que o conhecimento progride não tanto por sofisticação,

formalização e abstração, mas, principalmente, pela capacidade de contextualizar

e englobar. É preciso substituir um pensamento disjuntivo e redutor que isola e

separa por um pensamento que distingue e une, ou seja, complexo no sentido

originário do termo que é tecido junto.

Page 37: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

29

Embora inserida em um conjunto mais amplo, uma disciplina tende

naturalmente à autonomia pela delimitação das fronteiras, da linguagem em que

ela se constitui, das técnicas que é levada a elaborar e a utilizar e, eventualmente,

pelas teorias que lhe são próprias.

Portanto, a disciplina nasce não apenas de um conhecimento e de uma

reflexão interna sobre si mesma, mas também de um conhecimento externo. Não

basta estar por dentro de uma disciplina para conhecer todos os problemas

aferentes a ela.

Isso indica que um modo de pensar, capaz de unir e solidarizar

conhecimentos separados, é capaz de se desdobrar em uma ética da união e da

solidariedade entre humanos. Um pensamento capaz de não se fechar no local e

no particular, mas de conceber os conjuntos, estaria apto a favorecer o senso da

responsabilidade e o da cidadania. A mudança de pensamento teria, pois,

conseqüências existenciais, éticas e cívicas. (MORIN, 2000)

2.2 Interdisciplinaridade e outros conceitos

A história das ciências não se restringe à da constituição e proliferação das

disciplinas, mas abrange, ao mesmo tempo, a das rupturas entre as fronteiras

disciplinares, da invasão de um problema de uma disciplina por outra, de circulação

de conceitos, de formação de disciplinas híbridas que acabam tornando-se

autônomas; enfim, é também a história da formação de complexos, onde diferentes

disciplinas vão ser agregadas e aglutinadas. Ou seja, se a história oficial da ciência

é a da disciplinaridade, existe uma outra história, ligada e inseparável, que é a da

inter, multi, e trans disciplinaridade (MORIN, 2000)

A Interdisciplinaridade vem sendo construída nesses últimos anos e

Japiassu (1976, p.75) destaca como característica desse método, a intensidade

Page 38: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

30

das trocas entre os especialistas e o grau de integração real entre as disciplinas

dentro de um projeto de pesquisa. Neste nível ocorre, de fato, uma cooperação

entre as disciplinas, o que leva a uma interação caracterizada pela reciprocidade

nos intercâmbios e pelo enriquecimento de cada uma delas ao final do processo

interativo. Na fala transcrita a seguir, pode-se entender melhor o que o autor

entende a respeito de interdisciplinaridade na prática:

...nos reconhecemos diante de um empreendimento interdisciplinar todas as vezes que ele conseguir incorporar os resultados de várias especialidades, que tomar de empréstimo a outras disciplinas, certos instrumentos e técnicas metodológicas, fazendo uso dos esquemas conceituais e das análises que se encontram nos diversos ramos do saber, a fim de fazê-los integrarem e convergirem, depois de terem sido comparados e julgados.

Fazenda (1995) considera a Interdisciplinaridade uma relação de

reciprocidade, mutualidade, interação que irá possibilitar o diálogo entre os

interessados. Não há uma fragmentação, mas sim uma concepção unitária do agir.

A autora também conceitua interdisciplinaridade, em sua outra obra de 1994, como

sendo mais que um sintoma de emanações de uma nova tendência em nossa

civilização, e sim o signo das preferências pela decisão informada, apoiada em

visões tecnicamente fundadas no desejo de decidir a partir de cenários construídos

sobre conhecimentos precisos.

No que diz respeito ao termo multidisciplinar, Japiassu (1976) explica que

é o estudo de um objeto sob diferentes ângulos, com objetivos múltiplos, sem que

haja, necessariamente, um acordo prévio sobre os métodos e os conceitos a serem

utilizados. Esse tipo de abordagem promove um agrupamento de disciplinas, sem

fazer aparecer relações que podem existir entre elas, portanto, sem haver

cooperação. Logo, não implica, necessariamente, um trabalho em equipe e

coordenado.

Page 39: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

31

Nessa perspectiva, a solução de um problema exige informações que são

tomadas de empréstimo das especialidades convocadas a contribuir, sem ocorrer

modificação ou enriquecimento de tais áreas.

No entender de Fazenda (1995), multidisciplinaridade é uma justaposição

de conteúdos de disciplinas heterogêneas ou a integração de conteúdos em uma

mesma disciplina. Por analogia, uma atuação multiprofissional implicaria a ação

conjunta de diversos profissionais voltadas para o mesmo objeto.

Portanto, no entender de Morin (1990), é preciso ir mais longe, e com isso

aparece o termo “transdisciplinaridade”, que seria um estágio além da

multidisciplinaridade e da interdisciplinaridade.

De acordo com Morin (1990, p.104),

A ciência nunca teria sido ciência se não tivesse sido trandisciplinar. Além disso, a história da ciência é percorrida por grandes unificações transdisciplinares marcadas com os nomes de Newton, Maxwell, Einsten, o resplendor de filisofias subjacentes (empirismo, positivismo, pragmatismo) ou de imperialismos teóricos (marxismo, freudismo).

Para Japiassú (1976), o estágio da transdisciplinaridade é definido como

uma etapa superior ao das relações interdisciplinares. No primeiro, as disciplinas

não seriam separadas por fronteiras, integrando suas relações num sistema total,

não se satisfazendo, dessa forma, em atingir interações ou reciprocidade entre

pesquisas especializadas. O próprio autor destaca que esse é um patamar difícil de

se alcançar, possuindo características utópicas.

Almeida Filho (2000) define transdisciplinaridade com base na

possibilidade de comunicação não entre campos disciplinares, mas entre agentes

em cada campo, mediante a circulação não dos discursos, mas pelo trânsito dos

sujeitos dos discursos. Diante de um dado objeto complexo, cada um dos campos

disciplinares que a ele se relacionam tem acesso somente a uma faceta particular

Page 40: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

32

deste objeto. Os agentes da prática científica que tiverem acesso a uma formação

transdisciplinar são capazes de transitar entre, pelo menos, dois campos

disciplinares, enquanto os especialistas permanecem restritos aos seus respectivos

campos.

De acordo com Morin (1990), existe um problema prévio de toda a

transdisciplinaridade: o dos paradigmas ou princípios que determinam o

conhecimento científico. Para o autor, o desenvolvimento da ciência não se efetua

por acumulação dos conhecimentos, mas por transformação dos princípios que

organizam o conhecimento. Assim, a ciência não se limita a crescer, ela se

transforma.

Na visão de Morin (1990), para promover uma nova transdisciplinaridade,

é preciso de um paradigma que permita distinguir, separar, opor e, portanto,

disjuntar estes domínios científicos, mas que promova a comunicação sem operar

a redução. É preciso um paradigma de complexidade que, ao mesmo tempo,

disjunte e associe, que conceba os níveis de emergência da realidade sem reduzi-

los às unidades elementares e às leis gerais. É a comunicação com base num

pensamento complexo.

A disjunção sujeito-objeto é um dos aspectos essenciais de um paradigma

mais geral de disjunção-redução8, pelo qual o pensamento científico disjunta

realidades inseparáveis sem poder encarar a sua relação, ou identifica-se por

redução da realidade mais complexa à realidade menos complexa. Assim, física,

biologia, antropologia, sociologia tornaram-se ciências totalmente disjuntas, e

quando se quis ou quando se quer associá-las é por redução do biológico ao físico-

químico, do antropológico ao biológico.

Morin (1990, p.106) diz que é necessário enraizar o conhecimento físico e

igualmente, o biológico, em uma cultura, sociedade, história e em uma

humanidade. A partir daí, cria-se a possibilidade de comunicação entre as ciências,

8 Utilizado quando se quer unir disciplinas.

Page 41: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

33

e a ciência transdisciplinar é a ciência que poderá desenvolver-se a partir dessas

comunicações.

Em uma visão um pouco diferente de outros autores, Almeida Filho (2000,

p.209) introduz novos conceitos e explica que multidisciplinaridade,

pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade auxiliar, metadisciplinaridade,

interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, são etapas sucessivas de um

processo. Assim o autor conceitua:

• Multidisciplinaridade: Conjunto de disciplinas que simultaneamente tratam

de uma dada questão, problema ou assunto, sem que os profissionais

implicados estabeleçam entre si efetivas relações no campo técnico ou

científico. É um sistema que funciona pela justaposição de disciplinas em

um único nível, ausente uma cooperação sistemática entre os diversos

campos disciplinares. A coordenação, quando existente é de ordem

administrativa, na maioria das vezes, externa ao campo técnico-científico.

• Pluridisciplinaridade: Implica a justaposição de diferentes disciplinas

científicas que, em um processo de tratamento de uma temática unificada,

desenvolveriam relações entre si. Seria, portanto ainda um sistema de um

só nível (como na multidisciplinaridade), porém os objetivos aqui são

comuns, podendo existir algum grau de cooperação mútua entre as

disciplinas.

• Interdisciplinaridade auxiliar: Interação de diferentes disciplinas científicas,

sob a dominação de uma delas, que se impõe às outras como campo

integrador e coordenador. O sistema apresenta dois níveis e pode-se

reconhecer a posição superior de uma disciplina em relação às outras. Uma

ilustração na área da saúde: os manuais de especialidades médicas em

Page 42: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

34

geral integram distintas disciplinas (como a patologia, a epidemiologia, a

nutrição, a propedêutica, etc.) subordinando-as, posto que as informações

tomadas de empréstimo dessas disciplinas são colocadas a serviço da

especialidade sob o aspecto de disciplina-mestra.

• Metadisciplinaridade: A interação e as inter-relações entre as disciplinas são

asseguradas por uma metadisciplina que se situa num nível epistemológico

superior. Esta não se impõe como coordenadora, mas sim como integradora

do campo metadisciplinar, atuando como mediadora da comunicação entre

as disciplinas do campo. Um exemplo geral: desde a emergência da ciência

moderna, as matemáticas têm atuado como linguagem formalizada de

comunicação científica empregada por diversas disciplinas. No campo da

Saúde Coletiva, a clínica poderia ocupar esta posição metadisciplinar.

• Interdisciplinaridade: para além da disciplinaridade, a noção originalmente

piagetiana de interdisciplinaridade implica uma axiomática comum a um

grupo de disciplinas científicas conexas, cujas relações são definidas em um

nível hierárquico superior ocupado por uma delas. Esta última, geralmente

determinada por referência à sua proximidade diante de uma temática

unificada, atua não somente como integradora e mediadora da circulação

dos discursos disciplinares, mas particularmente como coordenadora do

campo disciplinar.

• Trandisciplinaridade: articulada à linhagem teórica de Piaget-Jantsch-Morin-

Bibeau, a idéia de transdisciplinaridade indica uma integração das

disciplinas de um campo particular sobre a base de uma axiomática geral

compartilhada. Fundamentada em um sistema de vários níveis e com

Page 43: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

35

objetivos diversificados, sua coordenação é assegurada por referência a

uma base de conhecimento comum, com tendência à horizontalização das

relações interdisciplinares. Desse modo, a transdisciplinaridade implica a

criação de um campo novo que idealmente seria capaz de desenvolver uma

autonomia teórica e metodológica perante as disciplinas que o originaram,

como teria ocorrido com a moderna ecologia, oriunda da biologia

evolucionista, em sua interface com as geociências.

Após a observação desses conceitos, entende-se que a ação

interdisciplinar não é suficiente se não produz a transdisciplinarização de cada um

de seus observadores. Assim, a transdisciplinaridade é o desafio que se coloca aos

que se declaram participantes das conversações em saúde .

Segundo Tarride (1998), ao se olhar a saúde pública a partir de suas

inúmeras concepções, a aproximação interdisciplinar surge como uma necessidade

metodológica obrigatória para sua compreensão. Esta multiplicidade de visões

permite tratá-la como uma complexidade. A questão é então aceitar sua

multidimensionalidade e não reduzi-la, dessa forma, a saúde pública requer a

interdisciplinaridade porque é uma complexidade a qual deve tornar-se inteligível

para todos.

Assim, o próximo item irá tratar da interdisciplinaridade na saúde.

2.3 Saúde e interdisciplinaridade

O trabalho em equipe consiste numa modalidade de trabalho coletivo

que se configura na relação recíproca entre as intervenções técnicas e a

interação dos agentes. A proposta desse tipo de trabalho tem sido veiculada

como estratégia para enfrentar o intenso processo de especialização na área da

saúde. (PEDUZZI, 2001)

Page 44: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

36

Desde os anos 50, o trabalho com equipes multiprofissionais, é prática

consolidada na Medicina de Reabilitação. Recentemente, a partir dos anos 80,

com a inclusão de outros profissionais no Sistema Único de Saúde (SUS), este

sistema de trabalho foi adotado com sucesso por outras áreas da saúde.

De acordo com Batistella (2003), as equipes são erroneamente

chamadas multidisciplinares, quando o termo correto é multiprofisionais. A forma

de atuação das equipes é que pode ser denominada de transdisciplinar.

Já quando se fala em ofertas de serviços, na área da saúde, pode ser

usado o termo multidisciplinar, entendendo disciplina como unidade funcional do

saber; porém, ele não espelha a ação integrada, coordenada e hierarquizada. A

ação multidisciplinar reflete a multiplicidade de ofertas do saber, não

necessariamente integradas ou atuando de forma coerente.

Pode-se dizer que ocorre interdisciplinaridade quando se atua na zona

limítrofe que existe entre as disciplinas científicas, sendo exemplos na medicina,

a uroginecologia, a neuropediatria, etc. A transdisciplinaridade é a ação sob a

ótica de mais de uma disciplina, buscando que o agente de cada tipo de saber

trabalhe em conjunto com os demais na busca de melhores resultados. O sistema

de trabalho reflete uma ação transdisciplinar que é desenvolvida por uma equipe

multiprofissional.

Em um artigo sobre a interdisciplinaridade no ensino médico, Sobral (1990,

p.386) relata que há 15 anos atrás, em uma reunião realizada em Brasília, foi

discutida a interação das ciências sociais e biológicas no meio médico, com o

objetivo de modificar o perfil do profissional. Para o autor,

O significado transformador da estratégia vincula-se à natureza dos temas de estudo, as facetas marcantes do fenômeno saúde-enfermidade, que podem corresponder aos problemas prioritários, selecionados por critérios sócio-epidemiológicos e examinados pelos prismas de diferentes combinações das alternativas de foco educativo: básico ou aplicado, individual ou coletivo e biológico ou social.

Page 45: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

37

Com isso, observa-se que, quando há um olhar interdisciplinar, ou seja,

com a visão de cada área, nesse caso, a saúde e a sociologia, na construção

conjunta de um objetivo, consegue-se alcançar o trabalho interdisciplinar no ensino

e, com isso, a formação interdisciplinar do profissional.

As relações estabelecidas com outras disciplinas, tanto as relações com os

modos de vida e as práticas de saúde, referem-se à interdisciplinaridade. Nesse

sentido, Almeida Filho (2000), diz que qualquer projeto conseqüente de análise das

políticas de transformação da situação de saúde das populações vai requerer

conceitos realçados pela diversidade de sua extração teórica e métodos

caracterizados pela pluralidade, propiciando uma compreensão da complexidade

dos sistemas históricos e uma formulação de práticas discursivas efetivamente

capazes de interferir no espaço social da Saúde Coletiva.

Para isso, é fundamental possuir atitude crítica e reflexiva capaz de

explicitar as implicações e determinações políticas e econômicas da produção do

conhecimento científico.

Em um artigo sobre a incorporação das Ciências Sociais no campo da

Saúde Coletiva , Minayo (2000) faz critica a um pensamento que ainda existe no

campo de estudo multidisciplinar, de considerar o conhecimento do social como um

dado impregnado no próprio objeto de estudo. A partir dessa crítica, pensa-se que

o ideal seria que o próprio sujeito tivesse o conhecimento do social, pois somente

assim se conseguiria alcançar a transdisciplinaridade, que seria pensar em

conjunto, isto é, pensar em Ciências Sociais aplicando na saúde.

Um exemplo de Interdisciplinaridade entre as Ciências Sociais e a Saúde é

a Fundação Oswaldo Cruz, a única instituição de pesquisa em saúde no país que

possui um Departamento de Ciências Sociais e mantém uma Unidade técnico-

científica (chamada Casa Oswaldo Cruz) a qual congrega historiadores, sociólogos

e filósofos. A produção intelectual das Ciências Sociais em saúde se insere num

campo denominado como Saúde Coletiva.

Page 46: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

38

2.4 Fisioterapia e interdisciplinaridade

O processo de reabilitação é definido através da Resolução 80 do

COFFITO9

É um processo de consolidação de objetivos terapêuticos, não caracterizando área de exclusividade profissional e sim uma proposta de atuação multiprofissional voltada para a recuperação e o bem-estar bio-psico-social do indivíduo, onde à cada profissional componente da equipe, deve ser garantida a dignidade e autonomia técnica no seu campo específico de atuação, observando os preceitos legais de seu exercício profissional.

Através dessa resolução, pode-se entender que a prática da ação

multiprofissional deve fazer parte da realidade do Fisioterapeuta que trabalha em

equipe, pois, dessa forma, sua atuação fica direcionada para a recuperação

completa do paciente, a qual deve ter como objetivo final o bem estar bio-psico-

social.

Em um relato de caso, Rocha (2002) explica quais seriam as razões para

implantar um projeto de extensão em Fisioterapia domiciliar em um bairro pobre de

Novo Hamburgo/RS. Para a autora a criação, do projeto nasceu da necessidade de

um olhar transdisciplinar para uma Fisioterapia que deve ser voltada para o social.

O fundamento teórico dessa proposta de extensão curricular partiu do compromisso político-social da ação fisioterapêutica, explícitos nas normas e leis que regem a profissão na atualidade, e que dão ao fisioterapeuta responsabilidades terapêuticas que transcendem a reabilitação física e que direcionam para uma ação de olhar transdisciplinar. Nesse sentido, o projeto veio para romper com as amarras do tecnicicismo reducionista, porque se volta para valores de manutenção e de prevenção da saúde, e de cura na reabilitação.(ROCHA, 2002, p.78)

9 COFFITO: Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional.

Page 47: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

39

De acordo com a autora, para pensar o ensino e a prática, acadêmica e

profissional, da Fisioterapia a partir de um novo sentido, é necessário que haja a

desconstrução de um antigo paradigma de ação. Esse paradigma nasceu com a

compartimentalização em especialidades, oriundas de uma medicina movida pela

ética cartesiana e de mercado.

Assim, o modelo biomédico que inspirou a fisioterapia tradicional precisa

ser repensado, pois ele não foi capaz de promover o desenvolvimento da saúde, já

que privilegiou as partes, não permitindo a visão do todo.

Segundo Kurban (2005), estudar o ser humano de maneira linear,

hierarquizando disciplinas, sem a interação com o meio em que vive, não contribui

no processo de harmonização do homem, que segundo a autora, é a essência da

saúde. Com o velho modelo, não se percebe que os pacientes trazem consigo

diferentes histórias de vida possuindo experiências individualizadas e

possibilidades distintas. Nesse processo, os fenômenos biológicos, psicológicos,

sociais e ambientais são interdependentes

Nesse sentido, entende-se que os saberes da medicina, psicologia,

educação física, fisioterapia, sociologia, por exemplo, precisam se articular, numa

interação que proporcione o surgimento de um novo conhecimento. Porém, esses

saberes teóricos devem ser repensados para que ocorra um processo de

construção de um novo entendimento do processo saúde-enfermidade. Minayo

(1991) sugere que a interdisciplinaridade deve ter como base, a cooperação entre

diferentes ramos do saber, a ética e o senso comum.

No que se refere ao ensino interdisciplinar de Fisioterapia, tem-se o

exemplo de gestão integrada da UMESP. Gava (2004, p.124) diz que,

Page 48: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

40

O que realizamos até aqui, foi preparar o terreno para novos passos por intermédio de uma metodologia de trabalho interdisciplinar dentro de um modelo colegiado de gestão, colocando sempre o respeito à pessoa humana no centro de cada decisão. Esta comunidade de iguais que o curso criou, vem tentar trazer um novo ambiente profícuo à relação ensino-aprendizagem, no qual se possam desenvolver o ensino e a pesquisa, onde o corpo docente e discente cresçam como pessoas e profissionais, fazendo um curso universitário de fato. Por fim, tenho a esperança de que este curso estruturado em uma gestão colegiada possa trabalhar dentro de uma forma interdisciplinar para formar fisioterapeutas melhores do ponto de vista profissional, científico e, acima de tudo, do ponto de vista humano.

De acordo com o autor citado anteriormente, é correto afirmar que para a

estruturação de um curso de Fisioterapia, que tenha como grande meta a formação

de pessoas que irão trabalhar com o ser humano, da forma mais responsável

possível, o exemplo da gestão colegiada interdisciplinar cria um espaço onde este

objetivo pode ser alcançado.

Em relação à estratégia de ensino interdisciplinar, Sobral (1990) entende

que o enfoque interdisciplinar visa à organização integrada do conhecimento no

processo de ensino-aprendizagem, objetivando a ampliação do repertório mental

do aprendiz mediante associações pertinentes. As vantagens, em termos de

estratégia educativa na formação básica, estendem-se desde a inter-relação entre

as disciplinas e o aumento da eficácia do ensino até a motivação do estudante e o

encorajamento do desenvolvimento dos objetivos de aplicação do conhecimento e

solução de problemas.

Avalia-se que percorrer o caminho da interdisciplinaridade exige uma

grande disponibilidade para diálogo por parte dos atores, devendo eles, serem

capazes de reconhecer aquilo que lhes falta e o que podem ou devem receber dos

outros. Essa atitude de abertura só é adquirida a partir da convicção de que esse

caminho é necessário, exigindo um exercício constante de sua proposta no

decorrer do trabalho.

A importância do trabalho interdisciplinar no campo da saúde do

trabalhador é discutida em interessante estudo por Hoefel et al (2004, p.191). A

Page 49: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

41

autora relata a experiência interdisciplinar no tratamento de lesões por esforços

repetitivos (LER /DORT), em um hospital em Porto Alegre/RS:

Foi possível construir-se essa proposta terapêutica somente através da integração entre o conhecimento entre diferentes áreas e saberes que articularam, na tentativa de se encontrar novas formas de olhar e intervir, com o intuito de auxiliar os portadores de LER/DORT no processo terapêutico aqui apresentado.

Da mesma forma, os autores Minayo e Fonseca (1997) acreditam não ser

viável uma disciplina isolada conseguir contemplar a abrangência da relação do

processo trabalho/saúde em suas múltiplas dimensões. Para eles, deve-se

resgatar conhecimentos desde as raízes históricas do trabalho até as formas que

ele se afirma no presente.

Em estudo de caso realizado por Freitas (2002, p.18), é possível verificar a

presença da interdisciplinaridade na inserção da Fisioterapia na atenção primária à

saúde. O autor faz um relato de experiência a respeito do estágio em Saúde

Coletiva na Universidade de Juiz de Fora.

Segundo o autor, ações integradas entre a equipe da Unidade Básica de

Saúde garantem maior resolutividade e qualidade nos atendimentos aos pacientes.

Além das interações no dia-a-dia, entre a fisioterapia e os profissionais de saúde

da Unidade, são realizadas reuniões mensais com a participação de toda a equipe

para a discussão de casos clínicos, com a finalidade de melhor adaptar as

condutas adotadas e redimensionar os procedimentos para a viabilização de

atitudes que permitam uma recuperação mais plena do paciente, seja no campo

terapêutico ou no campo social, colocando em prática a humanização dos serviços.

A interdisciplinaridade, quando presente na fisioterapia, leva

invariavelmente à humanização dos atendimentos. Para entender melhor como

ocorre o processo de humanização, o próximo capítulo desenvolve esse conceito

e trabalha a origem da humanização na área da saúde.

Page 50: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

42

CAPÍTULO 3. HUMANIZAÇÃO

A temática humanização envolve questões amplas que vão desde a

operacionalização de um projeto político de saúde baseado em valores como cidadania,

compromisso social e a saúde como qualidade de vida, passando pela revisão das

práticas tradicionais até os espaços de atuação profissional nos quais saberes, poderes

e relações interpessoais se fazem presentes. Assim, é necessário compreender a

humanização como temática complexa que permeia o fazer de distintos sujeitos.

Conforme Casate e Corrêa (2005), a humanização do atendimento supõe o

encontro entre sujeitos que compartilham saber, poder e experiência vivida, implicando

em transformações políticas, administrativas e subjetivas.

E desse encontro entre sujeitos resulta a relação médico-paciente ou

profissional-paciente, que tem grande importância no processo de humanização da

saúde.

A relação médico-paciente tem sido focalizada como um aspecto-chave para a

melhoria da qualidade do serviço de saúde, desdobrando-se em diversos

componentes, como a personalização da assistência, o direito à informação e a

humanização do atendimento (CAPRARA e FRANCO,1999).

Segundo Casate e Corrêa (2005), humanizar significa reconhecer as pessoas

que buscam nos serviços de saúde a resolução de suas necessidades de saúde, como

sujeitos de direitos. É observar cada pessoa em sua individualidade, em suas

necessidades específicas, ampliando as possibilidades para que possa exercer sua

autonomia.

Assim, a compreensão da humanização está relacionada também a um modo de

perceber o paciente no contexto dos serviços de saúde.

Page 51: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

43

Humanizar a relação com o paciente realmente exige que o profissional valorize

a afetividade e a sensibilidade como elementos necessários ao cuidar. Porém,

entende-se que tal relação não supõe um ato de caridade, mas um encontro entre

sujeitos, pessoas humanas, que podem construir uma relação saudável,

compartilhando saber e experiência vivida.

As propostas de humanização em saúde também envolvem repensar o processo

de formação dos profissionais ainda centrado, predominantemente, no aprendizado

técnico, racional e individualizado.

Para atuar na saúde, são necessários um conhecimento e uma compreensão do

ser humano que vai muito além do corpo físico. Nesse sentido busca-se entender,

através da relação entre saúde, doença e sistemas de saúde, quais características

interferem na mudança de concepção do atendimento fisioterapêutico, norteada pela

humanização.

3.1 O cunho social da saúde e da doença

Em uma de suas obras, Foucault (2004, p.57) faz um deslocamento histórico da

medicina clássica (que tem como objeto a doença considerada como essência abstrata)

para a medicina clínica, um saber sobre o indivíduo como corpo doente, exigindo uma

intervenção que dê conta de sua singularidade. Ao mesmo tempo, ocorre uma

modificação, o nascimento de uma medicina do espaço social e a consciência explícita

da doença como problema político:

O princípio de que o saber médico se forma no próprio leito do doente não data do final do século XVIII. Muitas, senão todas as revoluções da medicina, foram feitas em nome dessa experiência colocada como fonte primeira e como norma constante. Mas o que se modificava continuamente era a própria rede segundo a qual essa experiência se dava, se articulava em elementos analisáveis e encontrava uma formulação discursiva. Não apenas mudaram o nome das doenças e o agrupamento dos sintomas; variaram também os códigos perceptivos fundamentais que se aplicavam ao corpo dos doentes, o campo dos objetos a que se dirigia a observação, as superfícies e profundidades que o olhar do médico percorria, todo o sistema de orientação desse olhar.

Page 52: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

44

O conhecimento sobre as questões referentes à saúde e doença na sociedade

tem sido tradicionalmente do domínio das Ciências Biológicas (biologia, patologia,

medicina, etc). Essas ciências são pautadas pelo princípio da universalidade e buscam

assim, identificar e explicar os elementos comuns aos organismos individuais e às

diversas sociedades. Entretanto, quando o que se quer destacar é a diversidade, essas

ciências não conseguem explicar inúmeros fatores colocados pelas concepções de

saúde, doença, normalidade e anormalidade, nas quais se destacam a diversidade e a

diferença.

É buscando compreender essa diversidade que as Ciências Sociais, em

especial, a Antropologia, tomam como objetivo de estudo o corpo, a saúde e a doença.

Isso é verificado na fala de Lakatos e Brutscher (2000 p.77): “Se a doença surge e afeta

as condições ou relações sociais em que o ser humano vive, então, ela é um fenômeno

social que deve ser estudado enquanto tal e enquanto fenômeno só completamente

inteligível em um contexto biopsicossocial.”

De acordo com Víctora, et al (2000), a perspectiva antropológica não nega o

caráter universal de certos fenômenos biológicos, mas procura entender o significado

específico que esses fenômenos assumem numa dada sociedade, visto que os

registros de normalidade e anormalidade são, antes de tudo, determinados a partir de

valores. A busca desse relativismo e da singularidade dos grupos sociais tem por

pressuposto que o real só pode ser apreendido a partir da ordem simbólica, ou seja, é o

simbólico que, através dos sistemas de classificação e de sentido, define o real.

Então, a realidade é entendida como uma construção social, na qual o fato

concreto (a doença, por exemplo) só existe a partir da ordem simbólica, isto é, só existe

se naquela sociedade ela for passível de ser pensada como tal, como anormalidade.

Partindo do pressuposto de que o real é sempre mediado pelo simbólico, pode-

se considerar que a saúde e a doença possuem uma realidade independente de sua

definição biomédica, pois são objetos de representações e tratamentos específicos em

Page 53: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

45

cada cultura. Independente do fenômeno biológico, a doença pode ser vista como um

fenômeno social, na medida em que só pode ser pensada como tal dentro de um

sistema simbólico que lhe define, confere-lhe sentido e estabelece os tratamentos a

serem adotados. (VICTORA, et al, 2000)

Além disso, a doença, apesar de ser um acontecimento individual, mobiliza um

conjunto de relações sociais. É nesse sentido que a autora entende a doença como um

objeto privilegiado de investigação, pois coloca em relação, ao mesmo tempo, o

biológico e o social, o individual e o coletivo.

No mesmo sentido, Silva e De Marchi (1997) definem saúde como o resultado do

gerenciamento adequado das áreas física, emocional, social, profissional, intelectual e

espiritual.

Atualmente, quando se fala em saúde de um modo mais amplo, pensa-se

também em saúde pública, já que o campo de trabalho nessa área é muito vasto para

os profissionais da saúde.

Conforme Almeida Filho (1999), saúde pública é a ciência de prevenir a doença e

incapacidade, prolongar a vida e promover a saúde física e mental, mediante os

esforços organizados da comunidade para o saneamento do meio ambiente, o controle

de infecções e a organização de serviços médicos e para-médicos para o diagnóstico

precoce e o tratamento preventivo de doenças, além da garantia para cada indivíduo,

dentro da comunidade, de um padrão de vida adequado à manutenção da saúde. Já

saúde coletiva é definida como um conjunto de saberes que dá suporte às práticas de

distintas categorias e atores sociais face às questões de saúde/doença e da

organização da assistência.

Para relacionar saúde com prevenção e tratamento de doenças, é preciso

entender os níveis de assistência à saúde.

Page 54: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

46

O nível Primário, conforme Nicida (2004), constitui-se da promoção da saúde e

da proteção específica, ou seja, é preventivo. No nível Secundário, tem-se o

diagnóstico precoce, o tratamento apropriado e a reabilitação. Já o nível Terciário é

composto pela limitação e incapacidade e pela assistência de custódia, que se traduz

por oferecer o máximo possível de conforto nos últimos anos ou dias de vida. Como

profissional da saúde, o fisioterapeuta pode ser capaz de reconhecer esses níveis e

atuar de modo eficaz em cada um deles.

Historicamente, o fisioterapeuta vem desenvolvendo suas ações voltadas para

atenção secundária e terciária, atuando em clínicas, consultórios privados ou hospitais,

com um papel de pouco destaque na atenção primária à saúde.

De acordo com Sampaio (2002), os currículos dos cursos de Fisioterapia

existentes no país, em sua grande maioria, priorizam o enfoque curativo na sua

composição, valorizando pouco os modelos assistenciais que tenham como base à

atenção primária, isto é, a promoção de saúde e a prevenção de doenças e

incapacidades. Muitas vezes, apesar da existência de disciplinas que propõe discutir

questões relacionadas à saúde pública, na prática, o conteúdo oferecido se afasta da

realidade encontrada nas unidades de saúde.

A partir disso, pensa-se em uma reflexão a respeito das ações de promoção de

saúde implementadas pelo fisioterapeuta no sistema público.

3.2 A presença do Sistema Único de Saúde no processo de humanização da

fisioterapia

O conceito de saúde nas últimas décadas vem passando por intensas mudanças,

principalmente no que diz respeito ao modelo de saúde adotado, o qual passou de um

modelo hospitalocêntrico, curativo e reabilitador, para outro, promotor de saúde

assistencial, interdisciplinar, preventivo, e principalmente humanizado.

Page 55: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

47

Segundo Casate e Corrêa (2005), a partir do movimento de reforma sanitária que

ocorreu na década de 1980, se delineou um novo projeto de saúde que passa a

valorizá-la como direito de todo cidadão a ser garantido pelo Estado, envolvendo

princípios como equidade no atendimento, a integralidade da atenção e a participação

social do usuário.

O sistema Único de Saúde (SUS) está descrito na Constituição Federal de 1988, e

na sua legislação complementar, especialmente nas leis 8080/90 e 8142/90. Este

sistema, como proposta de atendimento à população, vem sendo defendido por

diversos segmentos sociais já há algumas décadas, fruto da própria reforma sanitária,

onde a descentralização, pela via da municipalização, torna-se o principal eixo

estratégico para a sua implementação (RINALDI, 1997). O SUS é a organização das iniciativas da União, Estados e municípios para a

execução da política nacional de saúde, cada qual com uma função específica, porém,

articulados entre si e com a participação da sociedade civil. É uma nova formulação

política e organizacional para o re-ordenamento dos serviços e ações de saúde. A

Carta Magna de 1988 garante a saúde como direito de todos e um dever do Estado,

tendo os usuários acesso igualitário e universal às ações de promoção, prevenção e

recuperação da saúde. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1990).

O SUS é baseado pelos seguintes princípios doutrinários:

Universalidade – é a garantia de atenção à saúde por parte do sistema, a todo e

qualquer cidadão. Todo cidadão brasileiro tem direito ao acesso gratuito às ações e

serviços de saúde.

Eqüidade – é assegurar ações e serviços de todos os níveis de acordo com a

complexidade que cada caso requeira, sem privilégios e sem barreiras. Todo cidadão é

igual perante o SUS.

Page 56: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

48

Integralidade – é o atendimento integral, com prioridade para as atividades

preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais.

Ação integral também tem sido freqüentemente associada, principalmente da

parte dos usuários, ao tratamento digno, respeitoso, com qualidade, acolhimento e

vínculo. A qualidade e acesso aos serviços de saúde devem permear todas as ações

conjuntas que vislumbrem a qualidade de vida, diminuam os agravos em saúde e

busquem a educação em saúde como norteadora das ações, onde cada individuo é

reconhecido na sua singularidade.

Conforme Ministério da Saúde (1999), para organizar o SUS a partir dos

princípios doutrinários apresentados e considerando-se a idéia de seguridade social e

relevância pública, existem algumas diretrizes que orientam o processo:

Regionalização e hierarquização de serviços - significam que os serviços devem

ser organizados em níveis crescentes de complexidade, circunscritos à determinada

área geográfica, planejados a partir de critérios epidemiológicos, e com definição e

conhecimento da clientela a ser atendida.

Descentralização - é entendida como uma redistribuição das responsabilidade

quanto ás ações e serviços de saúde entre os vários níveis de governo, a partir da idéia

de que quanto mais perto do fato a decisão for tomada, mais chance haverá de acerto.

Deverá haver uma profunda redefinição das atribuições dos vários níveis de governo

com um nítido reforço do poder municipal sobre a saúde, é o que se chama de

municipalização da saúde

Participação popular - é a garantia da população de participar do

estabelecimento de políticas públicas de saúde, discutindo prioridades e fiscalizando a

execução das ações e serviços de saúde, bem como a utilização dos recursos.

Page 57: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

49

O Sistema Único de Saúde tem apresentado resultados positivos nos propósitos

de universalização, descentralização e ampliação de cobertura dos serviços de saúde.

Em alguns pontos, apresenta ainda dificuldades quando se refere à garantia de

qualidade, equidade e na resolutividade da assistência ambulatorial e hospitalar,

principalmente pela falta de profissionais habilitados à prestar assistência integral de

saúde (RAGASSON et al., 2004).

Contudo, a atenção primária prevê a resolutividade das necessidades de saúde,

que, por muitas vezes, extrapolam a intervenção curativista e reabilitadora individual,

através da promoção da saúde, prevenção de doenças e educação continuada.

Pode-se dizer que essa reorganização, a qual rompeu com alguns paradigmas,

transformou a saúde pública brasileira, principalmente no que se refere ao fim da

desvinculação entre as áreas da atenção básica, média e alta complexidade. Com o

SUS, foram criadas condições necessárias para a reorganização da saúde como um

todo, deslocando-se a ênfase do modelo hospitalocêntrico, o qual prioriza a

medicamentalização e a atenção médico-curativa.

Nesse contexto da Reforma Sanitária, da troca de um modelo por outro, o

fisioterapeuta pode ter um papel de destaque, participando efetivamente de uma equipe

multidisciplinar, desenvolvendo um trabalho interdisciplinar que venha a construir uma

nova forma de organizar os serviços de saúde.

No entanto, o que se percebe é que ainda a Fisioterapia tem uma participação

secundária na organização dos serviços públicos de saúde. Isso pode ser reflexo de

uma formação universitária voltada para a clínica, com poucos debates de temas

sociais e análise da realidade.

De acordo com Schwingel (2002), no período de faculdade, há uma falta de

interesse pelas disciplinas do campo social, como Sociologia, Antropologia, entre

outras, que, via de regra, são apenas créditos a cumprir e pouco representam para o

Page 58: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

50

acadêmico. A formação em Fisioterapia leva o estudante a interessar-se quase que

exclusivamente pelas disciplinas técnicas, como ortopedia, traumatologia, reumatologia,

neurologia, entre outras.

Porém, a Fisioterapia não pode ficar de fora deste movimento de implantação do

SUS, Schwingel (2002, p.235) explica que:

Não existe possibilidade de sustentar a Fisioterapia no modelo liberal, visto que se reduz gradativamente a parcela da população que deixa de recorrer ao SUS (25% hoje). Daí que precisamos estar conhecendo este Sistema, suas diretrizes, seus princípios, sua forma de dialogar com a sociedade.

Nesse sentido, está na Constituição, em seu artigo 196, que “a saúde é direito de

todos e dever do Estado”, e que a organização deve ter como garantia de acesso

universal e igualitário. Ainda vale destacar o artigo 198, onde explicita a diretriz de

organizar a saúde em rede regionalizada e hierarquizada, com descentralização,

atendimento integral e participação comunitária.

De todas essas diretrizes ou princípios, a integralidade da atenção talvez seja

aquela que tenha maior impacto sobre a atuação do fisioterapeuta. Por objetivo, ela tem

a intenção de humanizar o atendimento ao usuário, resgatando o direito a um

tratamento de qualidade, com respeito às necessidades individuais desse sujeito. É um

desafio enorme, se for levado em conta que ainda hoje há falta de acesso aos serviços

de saúde para um percentual importante na sociedade.

3.2.1 O Programa de Saúde da Família

O Programa de saúde da família (PSF), criado em 1994 pelo Ministério da

Saúde, tem como objetivo geral contribuir para a reorientação do modelo assistencial a

partir da atenção básica, em conformidade com os princípios do Sistema Único de

Saúde, imprimindo uma nova dinâmica de atuação nas unidades básicas de saúde

(VERAS, 2002).

Page 59: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

51

A estratégia do PSF foi iniciada no Brasil em junho de 1991, com a implantação do

Programa de Agentes Comunitárias de Saúde (PACS). Em janeiro de 1994, foram

formadas as primeiras equipes de saúde da família, incorporando e ampliando a

atuação dos agentes comunitários .

Conforme Mendes e Moraes (2002), o objetivo do PSF é reorganizar a prática

assistencial em novas bases e critérios, em substituição ao modelo tradicional de

assistência, levando a saúde para mais perto da família e, com isso, melhorar a

qualidade de vida dos brasileiros. A estratégia do PSF prioriza as ações de prevenção,

proteção e recuperação da saúde das pessoas, de forma integral e contínua.

Segundo Ministério da Saúde (1999), a tática do PSF incorpora e reafirma os

princípios básicos do SUS, ou seja, a universalização, descentralização, integralidade e

participação da comunidade, sendo estruturada a partir da unidade básica de saúde da

família que trabalham com base nos seguintes princípios:

Caráter substitutivo - não significa a criação de novas unidades de saúde, exceto

em áreas totalmente desprovidas das mesmas.

Integralidade e hierarquização - onde a unidade de saúde da família está inserida

no primeiro nível de ações e serviços do sistema local de assistência, denominado

atenção básica. Deve estar vinculada à rede de serviços de forma que se garanta

atenção integral aos indivíduos e famílias e seja assegurada a referência para os

diversos níveis do sistema, sempre que for requerida maior complexidade tecnológica

para a resolução de situações ou problemas identificados na atenção básica.

Territorialização e adscrição - de clientela sendo que trabalha com território de

abrangência definido e é responsável pelo cadastramento e acompanhamento da

população adscrita a esta área.

Page 60: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

52

Equipe multiprofissional - onde a equipe é composta minimamente por um médico

generalista ou médico da família, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e de

quatro a seis agentes comunitários de saúde.

A visão multiprofissional e intersetorial da saúde, prevista nas diretrizes do PSF,

instituído pelo Ministério da Saúde (1999, p.40) define:

Ao contrário do modelo tradicional, centrado na doença e no hospital, o PSF prioriza as ações de proteção e promoção à saúde dos indivíduos e da família, tanto adultos quanto crianças, sadios ou doentes, de forma integral e contínua. A Unidade de Saúde da família deve realizar uma assistência integral, contínua e de qualidade, desenvolvida por uma equipe multiprofissional na própria unidade e também nos domicílios e em locais comunitários, como escolas creches, asilos, presídios, entre outros.

Desta forma, o programa propõe organizar as práticas nas suas Unidades Básicas

de Saúde (UBS), evidenciando o caráter multiprofissional e interdisciplinar das Equipes

de Saúde da Família (ESF), com a prestação de atendimento integral nas

especialidades básicas de saúde, numa base territorial delimitada, com garantia de

serviços de referências à saúde para os níveis de maior complexidade, possibilitando o

reconhecimento da saúde como um direito de cidadania, ao estimular a organização da

comunidade e buscar o aprimoramento da participação e do controle social da

população na área da saúde (RAGASSON et al., 2004).

Segundo COFFITO (2005), a ação dos Núcleos Integrais da Saúde da Família,

criados pela portaria n° 1065, do Ministério da Saúde, a qual ainda não foi revogada,

está à espera de uma decisão do próprio Ministério. Constitui-se em um instrumento de

geração de empregos para profissionais do campo da saúde de diferentes áreas de

conhecimento. Segundo técnicos do Ministério da Saúde, os núcleos vieram preencher

uma lacuna que existia na atenção básica, já que as equipes multiprofissionais que

integrarão esta unidade deverão compor com os profissionais da saúde da família.

Page 61: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

53

Pela portaria, serão criadas quatro modalidades de núcleo que poderão ser

implantados em sua totalidade ou em separado, segundo as necessidades

epidemiológicas locais e a disponibilidade de recursos do município. São elas:

Alimentação/Nutrição e atividade Física: nutricionista, profissional de educação

física e instrutor de práticas corporais.

Atividade Física: Profissional de educação física e instrutor de práticas corporais.

Saúde Mental: Psicólogo, psiquiatra, terapeuta ocupacional e assistente social,

sendo obrigatória a presença do psicólogo ou psiquiatra e de pelo menos mais de um

profissional entre os mencionados.

Reabilitação: Fisioterapeuta, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional,e assistente

social, sendo obrigatória a presença de fisioterapeuta e de pelo menos mais de um

profissional entre os mencionados.

A composição dos núcleos será de 1 para cada 7 equipes da Saúde da Família na

Amazônia Legal e de 1 para cada 9 equipes nos demais municípios.

Em resumo, PSF propõe um modelo de assistência integral, enfatizando a

atenção primária e a promoção da saúde. Com sua implantação, muitas profissões da

saúde foram relembradas, e viu-se a necessidade da inserção do fisioterapeuta nesta

equipe, com o objetivo de promover e prevenir os problemas de saúde, melhorando

assim a qualidade de vida da população (RAGASSON et al., 2004).

No entanto, a inserção do Fisioterapeuta nos serviços de atenção primária à

saúde é um processo que ainda encontra-se em construção, associado principalmente

à história da profissão, a qual é rotulada de ser apenas reabilitadora, voltando-se

somente para uma pequena parte de seu objeto de trabalho.

Page 62: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

54

Na visão de Barros (2002, p.8),

A participação intensa do fisioterapeuta, no Programa de Saúde da Família e em programas e ações similares de cuidados primários em saúde é condição fundamental para a concretização das diretrizes de uma assistência à saúde integral, ao contrário do tradicional modelo medicalizado, fragmentado, hospitalocêntrico e baseado na dependência e exclusão social.

Cabe reforçar que, infelizmente, pela condição sócio-econômica atual, a grande

maioria da população tem dificuldade de acesso ao trabalho do fisioterapeuta na clínica

privada. Todavia, é possível prestar atendimento em saúde pública, levando a prática

ao alcance da cidadania, socializando o trabalho de recuperação funcional, a orientação

especializada, enfim, todo o saber do fisioterapeuta.

Portanto, o fisioterapeuta é peça fundamental para a conquista e

desenvolvimento de uma assistência a saúde da população, a qual se baseia na

inclusão social, centrada na comunidade e na participação efetiva desta, na conquista

da saúde. Com isso a saúde se torna um instrumento através do qual os cidadãos

possam realizar suas aspirações e satisfazer suas necessidades, adquirindo a

capacidade de mudar seu entorno ou mesmo enfrentá-lo.

Com o objetivo de exemplificar como ocorre na prática a interdisciplinaridade e a

humanização através das relações entre profissionais, pacientes e comunidade, no

contexto da saúde coletiva, no próximo capítulo há um relato de experiência pessoal

como supervisora de estágio em saúde coletiva, na Universidade de Santa Cruz do Sul.

Page 63: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

55

CAPÍTULO 4. RELATO DE EXPERIÊNCIA

O presente capítulo trata de um breve relato de experiência pessoal como

supervisora de estágio em Fisioterapia na Saúde Coletiva na Universidade de Santa Cruz

do Sul (UNISC).

Acredita-se que a utilização de exemplos reais, vivenciados na prática, torna

possível realizar constatações dentro dessa realidade onde, muitas vezes, observa-se que

a teoria caminha a favor da prática. Porém, outras vezes, existem problemas encontrados

na prática que não existem na teoria, principalmente os de ordem acadêmica, ou seja, as

relações entre os alunos e a comunidade, já que não é costumeiro para estes um contato

tão próximo com famílias carentes.

O estágio na Saúde Coletiva é desenvolvido em bairros carentes na cidade de

Santa Cruz do Sul. Dessa forma, o aluno tem condições de vivenciar uma realidade

que, muitas vezes, ele não conhece.

4.1 Considerações acerca do estágio supervisionado em Fisioterapia na Saúde Coletiva

Sabe-se que, para atender as novas políticas de saúde, são necessárias

mudanças na formação dos recursos humanos, adaptando-os às realidades do

tratamento em saúde. Essa nova visão dentro da saúde necessita de uma demanda de

profissionais, capazes de atuar com qualidade e resolutividade no trabalho

multiprofissional e interdisciplinar.

Pode-se dizer que se trata de um processo de transformação inovador, o qual

deve ser iniciado nos cursos de graduação, voltado para a área da saúde, onde se deve

Page 64: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

56

manter um processo de educação continuada depois da saída do acadêmico

universitário para o mercado de trabalho (RAGASSON et al., 2004).

No entanto, o fisioterapeuta atuante na atenção básica deve ser considerado um

agente multiplicador de saúde, capaz de desenvolver atividades em interação com a

equipe, buscando sempre a saúde da população, objetivando a qualidade de vida dos

indivíduos.

A partir disso, o Curso de Fisioterapia da Universidade de Santa Cruz do Sul

(UNISC), desde a sua criação, contempla essa necessidade, oferecendo Estágio

Supervisionado em Saúde Pública aos acadêmicos da graduação. Em 2005, a carga

horária foi ampliada e a nomenclatura modificada, ou seja, passou de Estágio

Supervisionado em Saúde Pública para Estágio Supervisionado em Saúde Coletiva. O

currículo contempla o Estágio em Saúde Coletiva, no 8º e 9º semestres, totalizando 210

horas. As atividades são desenvolvidas nos bairros, junto aos PSFs, localizados na

cidade de Santa Cruz do Sul, obedecendo o calendário acadêmico.

Os objetivos são baseados no conhecimento, nas habilidades e nas atitudes e

valores. Os objetivos referentes ao conhecimento dos acadêmicos são:

- Oferecer aos acadêmicos, experiências para o conhecimento do exercício

profissional em fisioterapia através de técnicas adequadas e metodologias específicas a

cada situação de morbidade e/ou de prevenção;

- Desenvolver a prática da educação fisioterapêutica em saúde, para a qualidade

de vida, junto às comunidades;

- Propor a discussão de temas relacionados à humanização, integralidade,

cuidado, atenção e reabilitação, cujo enfoque é a comunidade e os processos pelos

quais ela se constrói.

O objetivo voltado para a habilidade do acadêmico refere-se à possibilidade do

contato deste com as diferentes comunidades, sendo necessária a interação para o

desenvolvimento do processo de atenção fisioterapêutica.

Page 65: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

57

Para despertar as atitudes e valores dos acadêmicos são propostos os seguintes

objetivos:

- Suscitar a postura ética, o respeito à diversidade cultural humana e a

preocupação com a qualidade da atenção fisioterapêutica às comunidades;

- Conhecer a realidade referente aos problemas de saúde, problemas físicos-

funcionais presentes nas pessoas da comunidade atendida, características culturais e

necessidades expressadas pela comunidade;

- Buscar inter-relação com outros profissionais atuantes na comunidade,

especialmente com a Equipe de Saúde da Família (PSF).

A equipe multiprofissional deve ser constituída por médicos, fisioterapeutas,

enfermeiros, nutricionistas, farmacêuticos, psicólogos e agentes de saúde. O que

determina a existência dessa equipe é a filosofia de trabalho, que visa ao bem-estar

dos pacientes e da comunidade atendida. Os membros da equipe, respeitando a

especificidade de sua formação básica, devem conhecer a ação individual de cada um

dos outros colegas.

Portanto, assim como o fisioterapeuta, os demais profissionais envolvidos devem

integrar conhecimentos nos espaços de trabalho. Essa produção deve ocorrer para que

se possa construir espaços de cidadania, mas, principalmente, para que se pense no

cuidado da saúde como mais do que um ato e, sim, uma atitude.

4.2 A experiência com o estágio

O Estágio Supervisionado de Fisioterapia em Saúde Coletiva, no segundo

semestre de 2005, foi realizado em três bairros carentes, junto aos Postos de Saúde, e

em uma casa geriátrica na cidade de Santa Cruz do Sul. Os alunos passaram, durante

o estágio, pelos bairros Glória, Menino Deus, Margarida Aurora, além da Casa

Geriátrica Santa Luzia.

Page 66: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

58

O trabalho desenvolvido pelos acadêmicos envolveu a organização e supervisão

de reuniões com grupos da comunidade, avaliação fisioterapêutica, atendimento a

domicílio e em grupo. Além disso, foram realizadas discussões entre alunos e

supervisores, para abordar temas relacionados diretamente com a Saúde Pública,

Coletiva e Comunitária, além de temas específicos da fisioterapia clínica. Destacaram-

se os seguintes temas: Inserção do Fisioterapeuta na Saúde Pública, Humanização e

Integralidade nos atendimentos, Programa de Saúde da Família (PSF), Contexto sócio-

econômico da saúde no país, Atendimento em Grupos, entre outros.

O período de Estágio Supervisionado em Fisioterapia na Saúde Coletiva iniciou

em agosto de 2005 e teve seu término em dezembro de 2005, sendo esse o segundo

ano de funcionamento no Bairro Margarida Aurora e o quarto ano de desenvolvimento

no Bairro Glória. Os atendimentos foram realizados duas vezes por semana, nos turnos

da manhã e tarde.

No Bairro Glória, os estagiários deslocavam-se até um Centro Comunitário, o qual

é representado por uma congregação católica. Foram desenvolvidas atividades em

grupo, composto por adultos e idosos, além de atendimentos a domicílio.

Também foram realizadas visitas domiciliares no Bairro Menino Deus, vizinho ao

Bairro Glória, em parceria com o PSF local. Essas visitas ocorreram nas sextas-feiras

pela manhã e tiveram como principal objetivo, a inserção do aluno junto ao PSF.

No Bairro Margarida Aurora, os acadêmicos atuaram conjuntamente com

enfermeiras, médicos ginecologista e clínico geral, agentes de saúde. Os atendimentos

a domicílio foram encaminhados pelos agentes de saúde, que se deslocavam até a

casa das pessoas pertencentes a esta comunidade e verificavam a necessidade de

algum membro da família em realizar fisioterapia.

Na Casa Geriátrica, o número de idosos atendidos pelos estagiários, no segundo

semestre de 2005, foi de vinte e nove, muitos deles dependentes fisicamente, com

problemas cognitivos e de comunicação, com alterações degenerativas neurológicas

importantes (Mal de Parkinson, Demência do tipo Alzheimer e outros tipos de

Page 67: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

59

demência) e com acometimentos osteo-musculares, como artrose generalizada e/ou

fraqueza músculo-tendinosa.

O objetivo da abordagem proposta na casa geriátrica foi construir um real espaço

de discussão sobre o assunto: o resgate da individualidade, aspirações e desejos,

vontades e necessidades dos idosos. O manejo especial que se deve ter com esta

parcela da população também foi trabalhado para que as experiências dos idosos

fossem resgatadas e aprimoradas a partir de sua co-participação no processo do auto-

cuidado e de sua qualidade de vida, visando a integralidade das ações e na atenção a

sua saúde.

Buscou-se uma construção de conhecimentos de forma participativa e reflexiva,

resgatando aspectos pessoais subjetivos, técnicos, objetivos, inter-relações no trabalho

em grupo e em equipe, proporcionando, especialmente aos acadêmicos, a visão da

integralidade na saúde do idoso. As oficinas terapêuticas realizadas proporcionaram

aos idosos momentos prazerosos, desenvolvendo o sentimento de serem sujeitos

participativos no seu processo de saúde e de valorização de suas experiências de vida,

tornando-as importantes no processo de aprendizagem dos acadêmicos.

Por se tratar de um Estágio, em que os alunos saem de dentro da Clínica e do

Hospital para atender em bairros carentes, é comum que ocorra uma falta de interesse

pela maioria deles em realizar as práticas na Saúde Coletiva. O que ocorre é um

choque entre as realidades dos alunos e dos pacientes, principalmente porque durante

a faculdade, existe uma preferência dos alunos pelo estudo das patologias e seus

tratamentos. Dessa forma, muitas vezes, é deixado de lado o estudo da prevenção, do

papel da profissão na sociedade e da realidade sócio-econômica do país, já que o

ensino da fisioterapia permaneceu durante muitos anos, baseado no curativismo e no

tecnicismo.

Pensando em modificar essa situação, os supervisores do Estágio organizaram

quatro seminários integradores durante o semestre, abordando temas atuais em Saúde

Page 68: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

60

Coletiva. Os seminários foram realizados em horário de estágio, tendo como principal

objetivo unir as turmas, as quais ficam separadas durante o estágio, e promover a troca

de experiência entre os alunos e professores.

Como resultado, obteve-se um retorno muito importante dos alunos em relação

às suas vivências durante o estágio, relacionando a teoria com as dificuldades da

prática. A partir desse retorno, os supervisores conseguiram modificar diversos

aspectos da prática, com o objetivo maior de proporcionar ao aluno um ambiente

prazeroso e interessante de trabalho, para que, com isso, os atendimentos

fisioterápicos ocorressem da melhor forma possível para o paciente e para a

comunidade.

Por último, no final do semestre, foi realizada uma prova teórica de

conhecimentos gerais em Saúde Coletiva, onde foi verificada a capacidade de

compreensão do aluno durante o estágio. A prova consistiu em duas questões amplas,

as quais englobavam muitos termos e idéias utilizadas nos artigos e livros que tratam

do SUS, da inserção do Fisioterapeuta na Unidade Básica de Saúde, da Saúde Pública

no Brasil e, principalmente, na relação entre os atendimentos com a humanização da

saúde.

Pode-se concluir que o novo currículo do curso de Fisioterapia, o qual preconiza

a vivência do aluno na Saúde Coletiva, envolvendo atendimentos em bairros carentes e

em casas geriátricas, atingiu o principal objetivo que é o conhecimento e o interesse por

essa área de atuação, tão nova e, muitas vezes, estigmatizada pelo aluno de

graduação.

Page 69: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

61

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema “Integração latino-americana” e seus desdobramentos devem ser

compreendidos através de linhas de pesquisa dinâmicas e independentes, com o

objetivo de inserir-se no próprio processo integracionista. A partir dessa idéia, a qual foi

instrumento para a criação do Programa de Pós-Graduação em Integração Latino-

americana na UFSM, acredita-se ser importante a integração das Ciências da Saúde

com as Sociais e Humanas, a fim de se colocar em prática a interdisciplinaridade, a

qual se faz tão importante para desenvolvimento e o sucesso das profissões.

Dessa forma, a realização dessa dissertação pode ser considerada um exemplo

de interdisciplinaridade entre a História e a Fisioterapia dentro de uma proposta de

integração que é o Mestrado em Integração Latino-Americana.

A busca da sociedade por fisioterapeutas de qualidade, sensíveis aos problemas

do ser humano, e aos problemas sociais do país, norteou a pesquisa realizada para

essa dissertação.

Pode-se dizer que a responsabilidade maior do fisioterapeuta está ligada à saúde

da população, e, por saúde, entende-se boa condição de vida, bem estar físico, mental

e social, e não apenas a ausência de doença. Portanto, muito mais que recuperar a

saúde ou tratar a doença, existe a responsabilidade de promover as condições e os

meios para que a saúde se desenvolva.

Os fisioterapeutas têm a missão de esclarecer a população qual o seu papel na

atenção a saúde. Eles devem ser, antes de tudo, profissionais transformadores, pois

transformam em qualidade de vida os atos dirigidos ao paciente. E têm potencial para

fazer mais, transformar, crescer na ação por uma sociedade inclusiva, socialmente

justa, igualitária, onde a saúde seja um direito.

Page 70: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

62

Portanto, a fisioterapia reconcilia a ciência com o espírito humano, formando

profissionais abertos a captar a realidade, com visão crítica que vê além das aparências,

o todo antes das partes, e a questionar a crescente desumanização das práticas de

saúde e o paradigma mecanicista que envolve essa prática, o seu saber sobre eles, e

suas inter-relações com a realidade.

A tendência moderna do pensamento científico na área da saúde é de resgatar a

integralidade do ser humano e, no uso da razão, discernir sobre as especialidades que

envolvem a qualidade de vida, longevidade e sobrevivência.

Cada vez mais, tem-se ouvido falar em equipes multiprofissionais, trabalhando

em conjunto e crescendo enquanto atores de saberes diferentes que se

complementam. A presença do cuidador familiar, por exemplo, apresenta-se como

uma garantia de manutenção de qualidade terapêutica no ambiente da casa,

relacionando, na prática, a interdisciplinaridade com a humanização.

Nesse sentido, reconhecer as competências e técnicas de cada profissional da

equipe, exercitando o respeito aos colegas, a responsabilidade da ação compartilhada,

e a importância de uma atitude eficaz é o ideal para uma vivência humanizadora no

âmbito da saúde.

Dentre as competências profissionais do fisioterapeuta, foram destacadas a

consciência interdisciplinar e humanizada, que, somadas às habilidades técnicas,

formam o tripé ideal sobre o qual firma-se o profissional generalista e humanista que o

mercado de trabalho exige.

Ao se fazer um retrospecto sobre a história da fisioterapia e sua relação com o

desenvolvimento da profissão, dentro de um contexto de saúde pública no Brasil, pode-

se dizer que a tecnologia não resolveu os problemas das instituições de saúde. Ao

contrário, agregou custos, aumentou as expectativas frustradas em relação aos

tratamentos e colaborou para a deterioração da relação médico-paciente.

Page 71: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

63

Assim, a utilização de técnicas modernas não tem sentido se não estiverem

claramente demonstrados os efeitos na qualidade de vida. É evidente que não se pode

ignorar a utilidade da tecnologia. Porém, é importante rever a postura tecnicista,

comparando-a com a valorização do investimento na formação ética e humanizada dos

profissionais de saúde e assistência.

Quando se trabalhou o histórico da fisioterapia no Brasil nessa dissertação,

observou-se que conceitos atuais, como integralidade e humanização, já foram

esboçados em prática há mais de 70 anos. Na década de 1930, Rio Janeiro e São

Paulo possuíam serviços de Fisioterapia idealizados por médicos que tomavam para si

a terapêutica de forma integral, experimentando recursos físicos para minimizar as

seqüelas de seus pacientes. Esses médicos eram distintos da grande maioria por

estarem preocupados não apenas com a estabilidade clínica de seu paciente, mas

com sua recuperação física, para que pudessem voltar a viver em sociedade, com

iguais ou parecidas funções anteriores ao agravo da saúde.

Essa visão ampla de compromisso com o paciente, engajando-se num

tratamento mais eficaz, que promovesse sua reabilitação, uma vez que as

incapacidades físicas, por vezes, excluíam-no socialmente, levou aqueles médicos a

serem denominados médicos de reabilitação. Foram esses médicos que deram origem

à profissão atual do fisioterapeuta.

Com isso, observa-se que, durante esses anos de formação profissional,

existiram períodos em que o fisioterapeuta trabalhava de uma maneira mais

humanizada, devido à própria conjuntura do país, e, em outras épocas, teve uma

influência mais técnica e mecanicista, fruto da modernização. Porém, a tendência atual

é a humanização dos profissionais e, conseqüentemente, dos atendimentos, já que o

mercado tem exigido esse tipo de serviço devido, principalmente, à concorrência

profissional e à globalização.

Uma das principais influências no processo histórico de humanização da

fisioterapia foi o desenvolvimento do SUS e a criação do PSF. A Constituição Brasileira

Page 72: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

64

trouxe significativas mudanças na área da saúde, ao ir contra a histórica fórmula

centralizadora, presente por todo o período republicano do Brasil, insuficiente para

resolver os problemas da população.

Como foi visto, as diretrizes do Sistema Único de Saúde brasileiro incluem a

descentralização, a participação da comunidade e a integralidade, ou seja, o

atendimento integral com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos

serviços assistenciais. Isso quer dizer que, quando se preconiza prevenção de

patologias, atuando de forma integral no dia-a-dia dos pacientes, consegue-se alcançar

a humanização nos atendimentos, gerando menos custos em tratamentos e menos filas

nos postos de saúde.

Isso é evidenciado na prática e pode ser comprovado através do relato de

experiência no Estágio em Saúde Coletiva na UNISC, pois, com os atendimentos

domiciliares realizados pelos acadêmicos, a grande maioria dos pacientes evoluiu em

seus quadros clínicos, procurando as unidades de saúde com menos freqüência. Isso

ocorreu por existir um atendimento integral, humanizado e, acima de tudo, preventivo.

No entanto, existem limitações enfrentadas pela fisioterapia na promoção da

saúde. O trabalho do fisioterapeuta nos serviços públicos é uma nova forma de atuação

e, por isso, ainda passa por dificuldades técnicas necessitando de adaptações e

esforços. Um dos problemas enfrentados diz respeito à formação acadêmica dos

fisioterapeutas, que são pouco preparados para esse tipo de trabalho. Uma melhor

qualidade de atuação dos fisioterapeutas depende em grande parte, do que é ensinado

na formação destes, mas por outro lado depende também de quanto os docentes e

responsáveis por esses cursos são capazes de transformar o conhecimento disponível

em comportamento profissional.

Outro problema enfrentado é a falta dos serviços de fisioterapia e a escassez de

fisioterapeutas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), com isso, muitas vezes, os

Page 73: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

65

alunos não conseguem imaginar um trabalho futuro nessa área, devido à falta de

profissionais para se inspirar.

O atendimento domiciliar em uma comunidade de baixa renda é outra nova

realidade para o fisioterapeuta. Ao atender em domicílio ele se vê convivendo e

formando vínculos com os familiares e com a própria comunidade, o que na maioria das

vezes ele não está acostumado a vivenciar

A atuação do fisioterapeuta nas UBS também é limitada por fatores como a

urgência no tratamento das seqüelas, sendo necessário priorizar, muitas vezes, o

tratamento curativo em detrimento da prevenção. A falta de recursos terapêuticos nas

UBS aliada à grande demanda de pacientes, pode dificultar o trabalho do fisioterapeuta.

Por isso, é muito importante que no período de faculdade, seja despertada a

criatividade no aluno, já que nem sempre ele terá à sua disposição uma clínica

equipada com os melhores recursos terapêuticos.

Dessa forma, é preciso deixar claro que a experiência de estágio relatada nessa

dissertação possui limites, pois o trabalho com o ser humano, tanto os profissionais

quanto os pacientes, é complexo e exige dentre outros esforços, interesse do aluno,

vontade do paciente em ser atendido, e principalmente a união entre os profissionais da

equipe de saúde.

Finalmente, acredito que todo aquele que escolhe atuar na área da saúde deve

possuir um compromisso com o ser humano, pois sem ele o profissional não é capaz de

vivenciá-lo em suas atividades de trabalho. No entanto, esse compromisso é, em sua

essência, pessoal, não podendo ser ensinado. No entanto, quando há uma educação

que priorize o enfoque humanitário, existem muitas chances de formar um profissional

mais humanizado. Assim, é muito importante que haja uma reformulação no ensino dos

Cursos de Fisioterapia, priorizando vivências como o Estágio em Saúde Coletiva, as

quais proporcionam ao aluno uma mudança na maneira de pensar e agir.

Page 74: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

66

Assim, a arte de cuidar deve refletir o humanismo em todas as suas dimensões,

sendo a tônica da assistência à saúde e do trabalho da equipe multiprofissional.

“Um profissional da saúde é obrigado a considerar mais do que um órgão doente, mais ainda do que o homem como um todo, ele deve visualizar o ser humano em seu mundo.”

(Harvey Cushing, 1869-1939)

Page 75: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

67

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA FILHO, N. A Ciência da saúde. São Paulo: Hucitec, 2000.

ANDRADE, S. M.; SOARES, D. A .; JUNIOR, L. C. Bases da Saúde Coletiva. Londrina: Ed. UEL, 2001, 268p.

ATUALIZAÇÃO BRASILEIRA DE FISIOTERAPIA. O que é ABF Ano I. Vol. II. N.º 1.São Paulo: Pancast,1984.

BARROS, F. B.M. A formação do fisioterapeuta na UFRJ e a profissionalização da fisioterapia. Dissertação de Mestrado, Rio de janeiro, UERJ, 2002.

_________,F. B. M. Autonomia Profissional do Fisioterapeuta ao longo da história. Revista FisioBrasil, Brasil, n. 59, p.20-31, 2003. _________, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. BATISTELLA, L. R. Humanização, equipes multidisciplinares e a prática do médico fisiatra. Acta Fisiátrica, 10(2): 50-51, 2003.

BOTOMÉ, S. P. ; REBELATO, S. Fisioterapia no Brasil. São Paulo: Manole, 2004.

BRASIL. Decreto-Lei n. 938, de 13 de outubro de 1969. Diário Oficial da União, out. 1969. BURKE, P. A Escola dos Annales (1929-1989): a revolução Francesa da historiografia. Trad. Nilo odália. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997.

CAMARGO, M. T. V. A revindicação do direito à saúde: um estudo de caso no contexto do Mercosul. Dissertação de Mestrado, São Paulo, USP, 1998.

CAPRARA, A.; FRANCO, A.L.S.; A Relação paciente-médico: para uma humanização da prática médica. Cad. Saúde Pública. V.15.n.3: 647-654, 1999.

CASSATE, J. C.; CORRÊA, A .K. Humanização do atendimento em saúde: conhecimento veiculado na literatura brasileira de enfermagem. Ver. Latino-americana de Enfermagem. V.13.n.1. 2005.

CHEREM, A. J. Medicina Física e Reabilitação – Fisiatria: um pouco sobre sua história. Arq. Catarinense de medicina. V. 19(2), p.137-138,1990.

Page 76: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

68

COFFITO (Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional). Resolução COFFITO-80. Diário Oficial da União de 21 de maio de 1987.

__________, Revista do. O Mercosul vai bem de saúde? 1999. n.4 :28-31.Brasília: Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional. __________, Revista do. Mercosul, a marca da maturidade. 2005. n.24: 32-33 Brasília: Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional __________, Revista do. O COFFITO no Mercosul. 2005. n.24: 34-35 Brasília: Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional

COLETÂNEA DE LEGISLAÇÃO DO SUS – Publicação conjunta da SES/ FAMURS/ CES /ASSEDISA. Ed. Nova Prata, 1997, p46 .

CONSELHO REGIONAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL DA 5 a REGIÃO. Leis e atos normativos das profissões do Fisioterapeuta e do Terapeuta Ocupacional. Rio Grande do Sul: CREFITO5, 2001.

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERAL DO BRASIL. Brasília: Gráfica e Editora da UPF, 1988. 292 p.

DEFINE, D. V.; FELTRIN, M. I. Z. A Fisioterapia no Brasil. Atualização Brasileira de Fisioterapia. Ano III. Vol. III N.º 4. Pancast Editora, São Paulo, Jul/Ago., 1986

EYZAGUIRRE, A. H. Breve historia de la terapia manual. Kinesiologia, v.54, p.10, 1999. FAZENDA, I. Interdisciplinaridade, um projeto em parceria. São Paulo: Loyola, 1995 _________, I. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. São Paulo: Papirus, 1994. FIGUEIRÔA, R.M. Aspectos da Evolução Histórica do Fisioterapeuta no Brasil em especial no Rio de Janeiro. Monografia de Pós Graduação Lato sensu em Docência Superior, Rio de Janeiro, 1996. FONSECA, M. A. Graduação em fisioterapia: Um estudo no ciclo de formação básica, rumo à melhoria da qualidade do ensino profissional. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da UFSC. Florianópolis: 2002. FOUCAULT, M. O nascimento da clínica. Rio de janeiro: Forense Universitária, 2004.

Page 77: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

69

FREIDSON, E. Renascimento do Profissionalismo: Teoria, Profecia e Política. São Paulo: Edusp, 1998.

FREITAS, M. S. A Fisioterapia na atenção primária à saúde em Juiz de Fora/MG. In: BARROS, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. p.18- 25.

GAVA, M. V. Fisioterapia: História, reflexões e perspectivas. São Bernardo do Campo: UMESP, 2004. HOEFEL, M. L.. et al. Intervenção Interdisciplinar em saúde e trabalho no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. In: MERLO, Álvaro Roberto Crespo (org). Saúde e trabalho no Rio Grande do Sul: Realidade, pesquisa e intervenção. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p.191 JAEGGER, M. L. et al. Descentralização, integralidade e participação: implementando a lei e promovendo a saúde de verdade e com qualidade para todos os gaúchos. Porto Alegre: SUS, 2000. JAPIASSÚ, H. Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976. KURBAN, E. Teoria, prática e formação do fisioterapeuta: Situação e perspectivas. Blumenau: Edifurb, 2005. 79p. LAKATOS, E. M. e BRUTSCHER, S. M. O conceito saúde-doença analisado através dos tempos, e prática previdenciária no Brasil. Saúde em Debate, Rio de Janeiro: v.24, n.54, p.77. 2000. LEITÃO, A. Fisiatria Clinica: bases físicas, fisiológicas e terapêuticas. Rio de Janeiro: Atheneu,1979. ______, A. Clínica de Reabilitação. Rio de Janeiro: Editora Atheneu, 1995. MACHADO, M. H (org.). Profissões de Saúde: Uma abordagem sociológica. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1995.

MEDINA, J. P. S. A Educação Física cuida do corpo e da mente. São Paulo: Papirus, 1992.

MENDES, E. C., MORAIS, M. I. D. M. O papel do fisioterapeuta em Saúde Pública no século XXI: Uma abordagem em parasitologia. In: BARROS, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. p. 193.

MERLO, Á. R. C. (org). Saúde e trabalho no Rio Grande do Sul: Realidade, pesquisa e intervenção. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004.

Page 78: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

70

MINAYO, M. C.S. Ciências Sociais em saúde no Brasil: vida longa e recente relevância. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v.24, n.55, p.44-53., 2000.

________,. M. C.S Interdisciplinaridade: uma questão que atravessa o saber, o poder e o mundo vivido. Medicina, Ribeirão Preto, v24, n.2, p.70-77, 1991. ________,. M. C.S O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: HUCITEC - ABRASCO, 1994. MINAYO.G. C., FONSECA, S.M.F.A construção do campo da Saúde do Trabalhador: percursos e dilemas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.13, supl.2, p.21-32, 1997. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Manual para organização da atenção básica. Brasília: Secretaria da Assistência a Saúde/MS, 1999. p. 40

MINGRONE, S. Administração em Fisioterapia. São Paulo: VP Editor, 1979.

MORIN, E .A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand, 2000.

______, E. Ciência com consciência. Portugal: Publicações Europa América, 1990.

NARDI, H. C. Saúde do trabalhador, subjetividade e interdisciplinaridade. In: MERLO, Álvaro Roberto Crespo (org). Saúde e trabalho no Rio Grande do Sul: Realidade, pesquisa e intervenção. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p.46

NASCIMENTO, M. R. Expectativas dos alunos de fisioterapia da Unicruz em relação à profissão escolhida e ao campo de trabalho inserido no meio sócio-econômico. Dissertação de Mestrado, Cruz Alta, Unicruz, 1994.

NICIDA, D. P. Desenvolvimento das competências do fisioterapeuta: um desafio ao ensino. Fisiobrasil, Rio de Janeiro, anoVIII, n.68, 2004.

NOVAES, R. R. J. Pequeno histórico do surgimento da fisioterapia no brasil e de suas entidades representativas . Fisiobrasil, no prelo. Disponível em <// http: www.efisio.com.br/>. Acesso em 14 jun. 2005.

OPAS/OMS. Escritório de representação no Brasil. A saúde no Brasil. Brasília, 1998.

PEDUZZI, M. Equipe multiprofissional de saúde:conceito e tipologia. Ver. Saúde Pública. V. 35, n.1, 2001.

PEREIRA-NETO , A. . F. A Profissão Médica em Questão: Dimensão Histórica e Sociológica. Cad. Saúde Pública v.11 n.4 Rio de Janeiro out./dez. 1995.

Page 79: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

71

RAGASSON, C. A. P. et al. Atribuições do Fisioterapeuta no Programa de Saúde da Família: Reflexões a partir da prática profissional. Experiência baseada na Residência em Saúde. Unioeste Cascavel – Paraná, 2004.

RINALDI, I. B. Qual a autonomia municipal na gestão da saúde? Porto Alegre: Da Casa Editora: 1997, 88 p.

ROBBINS, et al. Patologia estrutural e funcional. Rio de Janeiro: ed Guanabara Koogan, 1996. p.547

ROCHA, A . C .B. Elogio à ação social fisioterapêutica: Projeto de extensão em Fisioterapia Neurofuncional domiciliar em Canudos. In: BARROS, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. p. 46

ROCHA, E. F. Do corpo orgânico ao corpo relacional: uma proposta de deslocamento dos fundamentos e práticas de reabilitação da deficiência. Dissertação de Mestrado, São Paulo, USP, 1999.

ROSEN, G. Uma história da saúde pública. São Paulo: Unesp, 1994.

SAMPAIO, R. F. A experiência em Belo Horizonte. In: BARROS, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. p.12

SAMPAIO, R. F; MANCINI, M. C; FONSECA, S. T. Produção científica e atuação profissional: aspectos que limitam essa integração na fisioterapia e na terapia ocupacional. Rev. bras. fisioter. v. 6(3), p. 113-118, 2002.

SANCHEZ, E. Histórico da Fisioterapia no Brasil e no mundo. Atualização Brasileira em Fisioterapia. São Paulo: Panamed, 1984. SANCHEZ, E.; MARQUES A . Origem e evolução da fisioterapia: aspectos históricos e legais.Revista Brasileira da USP. São Paulo. Vol 1, jul/dez. 1994.

SANTOS F.º, L. C. História Geral da Medicina brasileira. São Paulo, HUCITEC-EDUSP, 1991.

SANTOS, L. A. A reabilitação e o fisioterapeuta: formação profissional. Dissertação de Mestrado, São Paulo, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2001.

SCHWINGEL, G. A Fisioterapia na Saúde Pública: Um agir técnico, político e transformador. In: BARROS, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. p.227.

SEITENFUS, R. Relações Internacionais. São Paulo: Manole, 2004.

Page 80: HISTÓRIA E INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ...cascavel.ufsm.br/tede/tde_arquivos/27/TDE-2006-12-12T063743Z-279/... · clínica da fisioterapia, os quais são vivenciados, principalmente,

72

SILVA, E. L; MENEZES, E. M .Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 3 ª edição. Florianópolis: Laboratório de Ensino à distância da UFSC, 2001

SILVA,M A . D. da e DE MARCHI, R. Saúde e qualidade de vida no trabalho. São Paulo: Best Seller, 1997.

SILVA, M. J. P. O papel da comunicação na humanização da atenção à saúde. Rev. Bioética. V. 10, n. 2, 2002.

SOARES, M.S . A doença e a cura: saberes médicos e cultura popular na Corte Imperial. Dissertação de mestrado, Niterói, UFF, 1999.

_______, M. S. Médicos e mezinheiros na Corte Imperial: uma herança colonial. História, Ciências, Saúde. v.8, n.2, p 407-438, 2001.

SOBRAL, D. T. A interdisciplinaridade no ensino médico: três aspectos da análise. Educación Médica y Salud. V.24, n.4, 1990.

SOUCHARD, P.,OLLIER, M. As escolioses. São Paulo: É realizações, 2001.

TARRIDE, M. I. Saúde Pública: Uma complexidade anunciada. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 1998.107p.

TOMBINI, F. F. Fisioterapia: Considerações sobre uma ciência em construção. Dissertação de Mestrado, Palmitos, Univ. Regional do Noroeste do estado do RS, 2000.

VEIGA, et al. A atuação fisioterapeuta na unidade básica de saúde. Fisioterapia Brasil. V.5, n.3, 2004.

VÉRAS, M. M. S. O Fisioterapeuta no Programa de Saúde da Família. In: BARROS, F. B. M. (org) O fisioterapeuta na saúde da população: atuação transformadora. Rio de Janeiro: Fisiobrasil, 2002. p.185.

VÍCTORA, C.G, et al. Pesquisa qualitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto alegre: Tomo editorial, 2000.

VIZENTINI, P. F. A nova ordem global. Relações internacionais no séc XX.Porto Alegre: Ed UFRGS, 2002. YOUNG et al. Segredos em medicina Física e reabilitação. Porto Alegre: Artmed, 2000.p. 627.