história e cultura de ananindeua - bruno costa

76
BRUNO SILVA COSTA RELAÇÕES ENTRE PATRÕES E OPERÁRIOS NO PARÁ DO SÉCULO XX: representações do Curtume Maguary para memória da sociedade ananindeuense ANANINDEUA 2009

Upload: bruno-silva

Post on 03-Aug-2015

424 views

Category:

Documents


6 download

DESCRIPTION

Monografia elabora em 2009, acerca da releitura histórica e representação da memória de Ananindeua.

TRANSCRIPT

Page 1: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

BRUNO SILVA COSTA

RELAÇÕES ENTRE PATRÕES E OPERÁRIOS NO PARÁ DO SÉCULO XX:

representações do Curtume Maguary para memória da sociedade

ananindeuense

ANANINDEUA 2009

Page 2: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

BRUNO SILVA COSTA

RELAÇÕES ENTRE PATRÕES E OPERARIOS NO PARÁ DO SÉCULO XX:

representações do Curtume Maguary para memória da sociedade

ananindeuense

Trabalho de conclusão de curso, apresentado à

ESMAC (Escola Superior Madre Celeste), como

requisito para obtenção do título de Licenciatura e

Bacharelado em História.

Orientadora professora Ms. Dayseane Ferraz da

Costa

ANANINDEUA 2009

Page 3: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

BRUNO SILVA COSTA

RELAÇÕES ENTRE PATRÕES E OPERÁRIOS NO PARÁ DO SÉCULO XX:

representações do Curtume Maguary para memória da sociedade

ananindeuense

Trabalho de conclusão de curso, apresentado à ESMAC (Escola Superior Madre

Celeste), como requisito para obtenção do título de Licenciatura e Bacharelado em

História

aprovado em: Lic. E Bac. Em História com nota 10 Banca Examinadora: ______________________________ Professor examinador: Alam Pinheiro Universidade: ESMAC _______________________________ Professora examinadora: Amélia Bemerguy Universidade: ESMAC ________________________________ Professora Orientadora: Dayseane Ferraz da Costa Universidade: ESMAC

Page 4: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

A meus pais que tornaram possível a

realização desta e de muitas fases da

minha vida. A meus avós e familiares que

sempre estiveram do meu lado me

apoiando em todos os momentos de

minha vida. E a Deus simplesmente por

eu estar vivo.

Page 5: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por me permitir completar esta grande

etapa de minha vida e me agraciar com sua luz e proteção, mesmo com todos os

problemas enfrentados até aqui, Deus me concedeu forças para continuar meu

caminho.

Agradeço a minha orientadora, Dayseane Ferraz da Costa, que com muita

sabedoria e paciência me auxiliou em diversos momentos de crise e desespero.

Sem ela o presente trabalho não seria possível de se realizar, tamanha contribuição

e colaboração. Entre muitos momentos sérios e tensos, seu bom humor e

profissionalismo serviram de apoio e base para as diversas retomadas neste árduo

caminho.

Agradeço também aos meus entrevistados, que com imensa receptividade

me auxiliaram na pesquisa, e aceitaram fazer parte da mesma. São eles: Edivar

Silva, Raimundo de Oliveira, Benedito Costa, Danilo Lavareda e principalmente ao

entrevistado Mário Lavareda. Através de seus riquíssimos depoimentos e

contribuições, foi possível desenvolver tal trabalho e enriquecer as discussões. Em

especial agradecimento ao entrevistado Mário Lavareda, além de me receber

diversas vezes em sua casa, me forneceu não somente imensurável fonte de dados

para a pesquisa como indicações e direções de documentações e forneceu também

arquivos e documentos pessoais para adicionar no trabalho.

Agradeço a todos os meus professores e amigos acadêmicos que

contribuíram de diversas formas em minha formação, tanto profissional como

pessoal. A estes dedico uma atenção e carinho especial, que ao longo destes quatro

anos pude conviver e desfrutar do prazer em conhecer pessoas de tão alto valor.

Personagens estes que sem dúvida alguma estarão sempre atuando no papel

principal do palco de minha vida.

Não podendo esquecer também de todos aqueles valiosos amigos

mundanos, que em momentos diversos nos dão apoio, carinho, nos confortam e nos

alegram. Em casos especiais, nos tornam pessoas melhores e mais vivas,

simplesmente por existirem e fazer parte de meu ciclo de amizades.

Não poderia deixar de mencionar aqui, o imensurável carinho por todos

aqueles mais próximos de mim, primos, primas, tios, avós, irmãos e pais. Tomados

Page 6: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

como um todo na classificação de “parentes”, muitos deste são o motivo e a razão

de ser quem e como eu sou. São estes que nos percebem, em grande maioria, nos

momentos mais diversos de nossas vidas, e a eles dedico agradecimento especial,

aqueles que aqui estão e aqueles que apenas em nossas memórias ainda existem,

meus sinceros agradecimentos.

Não só aqueles que por longo de uma vida acreditaram em mim, em meu

potencial, mas porque não aqueles que me criticaram e me julgaram incapaz, estes

que despertam em nós o desejo de provar que estão errados, e que podemos sim,

naquilo que cremos e nos dedicamos.

Agradeço a todos que por muitas e muitas vezes acreditaram em mim, me

apoiaram e me deram força, seja com uma simples palavra, seja com um simples

olhar. Do fundo de meu coração, sou eternamente agradecido a todos vocês. Muito

obrigado.

Page 7: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

[...] não há memória que seja somente “imaginação

pura e simples” ou representação histórica [...] todo

o processo de construção da memória passa por

um referencial que é o sujeito.

Maurice Halbwachs

Page 8: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

RESUMO

Este trabalho discute as relações entre memória e história dos moradores de Ananindeua sobre o cotidiano de uma fábrica de curtimento de couros localizada neste município, e suas contribuições para a formação da cidade, bem como, fragmentos de seus aspectos culturais. A partir de pesquisas em periódicos, assim como pesquisas com fontes orais e documentos manuscritos investigou-se sobre a representação do Curtume Maguary e sua importância simbólica e histórica para a cidade de Ananindeua. Trata-se, portanto, de uma análise que envolve o cotidiano, a memória e a história de sujeitos que construíram relações com aquela unidade produtiva, mas que foram além dos aspectos econômicos e se estenderam para além do tempo de seu funcionamento, perdurando até aos dias atuais...

Palavras-Chave: Representação, Memória, Cotidiano, Curtume Maguary,

Ananindeua.

Page 9: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

ABSTRACT

This paper discuss the relations between the memory and history of the inhabitants of Ananindeua on the quotidian of a tanning Maguary factory of leather located at the municipality and its contributions to the formation of the city as well as fragments of its cultural aspects. Through research in journals, as well as research on oral sources and written documents were investigated on representation of the tannery and its symbolic and historic importance to the city of Ananindeua. It is therefore an analysis involves the quotidian, memory and history of individuals who have constructed relations with that production unit, but were beyond the economic aspects and extended beyond the time of its operation, continuing until the days current...

Key Words: Representation, Memory, Quotidian, Maguary Tannery,

Ananindeua.

Page 10: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 01 Trecho inaugurado da E.F.B., entre Belém e Benevides, em 1884.......13

FIGURA 02 Foto de propaganda da Água Maguary..................................................20

FIGURA 03 Escola domestica da Ilha de São Pedro em Ananindeua......................21

FIGURA 04 Parada de trem da E.F.B. trecho do Entroncamento, em Ananindeua..24

FIGURA 05 Rua principal da cidade de Ananindeua, nos anos 1950.......................25

FIGURA 06 Estação de Marituba e torre da caixa d'água e Vila ferroviária..............26

FIGURA 07 Estrada da BR 316, por volta de 1970...................................................28

FIGURA 08 Galpão de pregaria e secagem de couros Curtume Maguary................30

FIGURA 09 Galpão principal do Curtume Maguary...................................................31

FIGURA 10 Mapa com recorte geográfico da área do Curtume Maguary.................36

FIGURA 11 Planta do núcleo urbano composto pelo Curtume Maguary..................39

FIGURA 12 Antigo Barracão de pregaria do Curtume Maguary................................47

FIGURA 13 Dentária dos funcionários do Curtume Maguary....................................55

FIGURA 14 Pintura do Colégio Quinta Das Carmitas................................................58

Page 11: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................10

1 O CURTUME MAGUARY EM SEUS PRIMEIROS PASSOS NA FORMAÇÃO DE

ANANIDEUA..............................................................................................................19

1.1 Os Trilhos e a Parada da Estrada de Ferro Belém-Bragança

(E.F.B.).......................................................................................................................23

1.2 As Indústrias de Couro e o Setor Industrial Paraense..........................29

1.3 A Localização do Curtume: Uma Área Diluída no Crescimento da

Cidade....................................................................................35

2 CURTUME MAGUARY MEMÓRIA E HISTÓRIA DE SEU POVO.........................40

2.1 Lembranças de um Cotidiano dos Operários.........................................46

2.2 Além dos Muros de Uma Fábrica: O “Coronel Saunders” as Regras,

Hábitos, Costumes e “Brincadeiras”......................................................................53

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................64

RFEÊNCIA BIBLIOGRÁFICA....................................................................................67

FONTES.....................................................................................................................71

ANEXOS....................................................................................................................73

Page 12: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

11

INTRODUÇÃO

Ao fazer um levantamento histórico do município de Ananindeua para um

projeto de pesquisa no ano de 2008, deparei-me com alguns poucos escritos sobre

o Curtume Maguary e seus elementos na sociedade local. O que em um primeiro

momento não chamou muita atenção, foram develandos vários indícios da presença

do mesmo na formação da sociedade ananindeuense. O que suscitou diversas

inquietações acerca desta indústria de couros que antecedeu ao próprio município.

Com o levantamento de dados e as entrevistas orais realizadas, encontrou-se

diversos discursos, que a todo o momento, perpassavam a presença do Curtume

Maguary associando-o a história do município.

A princípio pretendia-se a trabalhar relações familiares presentes em

Ananindeua, no entanto, constantemente encontraram-se relações da “origem” de

Ananindeua ligadas ao Curtume Maguary, o que despertou ainda mais interesse e

curiosidade. Por fim decidiu-se trabalhar as relações sociais e a representatividade

do Curtume Maguary para a sociedade ananindeuense, como foco principal ligado à

estas inquietações. Assim, neste trabalho estão pontuados os levantamentos

históricos sobre o mesmo, suas origens, suas ações, como também a representação

do Curtume Maguary na memória dos moradores mais antigos do município. Para

tanto problematiza-se qual a representatividade do Curtume Maguary para a

sociedade de Ananindeua; de que forma foi tecida a relação entre proprietários,

funcionários e outros sujeitos envolvidos naquela unidade produtiva e como era visto

e representado o Curtume Maguary no cenário comercial do Pará, e a representação

do mesmo pela imprensa belenense.

Com relação a bibliografia sobre o tema e o município, foi encontrada uma

parca produção, da qual cabe destacar Ananindeua dos trilhos ao asfalto1 obra que

retrata uma história geral do município, sua tipografia, posicionamento, aspectos

geográficos, econômicos, principalmente voltando-se para as gestões política do

município, sem a preocupação de esmiuçar os aspectos sociais, culturais e

históricos do município. Todavia Mendes (2003, p.16) não deixa passar

1 MENDES, Gislene Alves. Ananindeua dos trilhos ao asfalto. Belém: Gráfica Salesiano, 2003.

Page 13: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

12

despercebido a presença do Curtume Maguary como elemento de considerável

importância na formação do município. Onde o mesmo antecede ao município, cria o

primeiro núcleo urbano e se torna a primeira indústria do que virá a ser Ananindeua

posteriormente.

Ainda sobre a bibliografia é importante destacar a obra Maguary um vôo a

seu passado2, cujo diálogo com a mesma permite destacá-la também como fonte3.

Esta obra apresenta mais detalhadamente os aspectos sociais e culturais

envolvendo o Curtume Maguary e Ananindeua, se apropriando tanto de entrevistas

orais como noticiários em jornais e revistas, além das memórias do autor e de seus

familiares. Todavia, vale ressaltar que há uma exaltação extrema aos sócios do

Curtume. Os proprietários do Curtume, Claude Saunders e Artur Davis, têm seus

feitos superdimensionados pelo autor. Segundo afirma o entrevistado Danilo

Lavareda4, Roberto Leão inventariava em seu livro questões das quais não obtinha

conhecimento preciso. Exemplo principal percebe-se na suposição do nome

completos de Saunders, segundo Leão (1999, p.13) o dono do curtume se chamaria,

Cláudio Washington Tavares Saunders, todavia os registros de terras, posses, de

firma apontam o nome completo de Saundres como Claude Whitfield Tyrrel

Saunders. O que põe em dúvidas a pesquisa de Leão. Não desmerecendo a obra

como um todo, Leão (1999, passim) narrando diversos acontecimentos históricos do

Curtume, tão qual do Maguary e sua população, demonstrando um esboço da planta

do Curtume (ver figura 11), os principais aspectos da primeira gestão, as regras e

condutas sociais que permeiam os mesmos, além dos contos míticos e lendários da

região.

Segundo o histórico tradicional de Ananindeua, presente no livro de

Gislene Mendes (2003, passim), e nos escritos ou sites oficiais da prefeitura,

Ananindeua surge por volta do final do século XIX e tem seu desenvolvimento

associado a uma parada de tem da Estrada. Ferro Belém-Bragança. (ver figura 4)

Todavia, essas histórias tradicionais, de conhecimento popular, dos discursos que

permeiam o surgimento de Ananindeua, nada mais são do que associações entre o

2 LEÂO, Roberto Queiros de. Maguary: Vôo ao seu Passado. Ananindeua, PA: Editora Gráfica Sagrada

Família,1999.

3 Uma vez que Roberto Leão viveu na vila operária e também é filho de operário do Curtume Maguary.

4 Danilo Lavareda. Realizada em: 26 /09/2009 as 08:00 ( Entrevista oral )

Page 14: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

13

desenvolvimento urbano da Zona Metropolitana de Belém (ZMB) e seu núcleo

urbano, associados às transformações que ali ocorrem, com o advento industrial

crescente em todo o estado. A Estrada de Ferro Belém-Bragança, surge como um

exemplo claro desses desenvolvimentos industriais, com o objetivo de interligar as

escoações de produção entre Pará e Maranhão, de Belém à São Luiz. Todavia com

as dificuldades no decorrer da construção, principalmente no âmbito geográfico, a

ferrovia se limita em interligar os “interiores” Bragantinos ao Pará, e sua capital,

Belém.

Figura 1 - Primeiro trecho inaugurado da E. F. B., entre Belém e Benevides, em

1884 - Mapa de 1908. Fonte: Revista Brasileira de Geografia, jul-set 1961.

A construção da parada de trem em Ananindeua foi um fator importante

para o desenvolvimento local, todavia não único e determinante, se faz necessário

atentar para um conjunto de elementos elencados a este que venham causar e

justificar o surgimento do município ao longo dos processos históricos. No confuso

histórico dessa parada de trem, ainda se tem dúvidas de sua localização exata,

Page 15: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

14

Mendes (2003, p.25) afirma situa-se na localidade onde se encontra “sede

municipal”, sem precisão geográfica e sem sabermos onde situa-se esta sede

referida por Mendes, fica difícil precisar seu local. Já Gerodetti e Cornejo, na obra As

ferrovias do Brasil nos cartões-postais e álbuns de lembranças, afirmam ser esta

parada localizada onde se encontra hoje a Estação da BR, uma terceira referência

engrandece esta discussão, o entrevistado Raimundo Oliveira afirma esta parada

localizar-se no viaduto de Ananindeua. O que nos dificulta saber exatamente onde

se localizava tal parada, todavia, parece-me mais interessante perceber a relação

desta parada de trem como o município e o que representou a mesma para sua

sociedade, do que sua exata localização.

Cabe lembrar que no período ao qual estamos nos referindo, por volta de

1884-1938, Ananindeua não é um município constituído legitimamente, e sim uma

parte de um todo que compões a Zona Metropolitana de Belém. Se faz necessário

atentar para o conjunto que pertence a esta categoria, não esquecendo que

Marituba surge devido a construção da Vila Operária da E.F.B., associou-se este

caso isolado à uma generalização das freguesias em torno da E.F.B., e Ananindeua

não foi exceção. O que justificaria segundo contam os discursos populares dos

moradores de Ananindeua, ser uma “cidade dormitório” (discussão que se

aprofundará mais adiante), dependente das regências belenenses.

Partindo deste ponto, considerado os elementos postos acima, proponho-

me a estudar as relações de representação5 do Curtume Maguary como elemento

formador de condutas, costumes, crenças, e hábitos6 nas relações sócio-culturais

entre estes indivíduos do Maguary, problematizando de que forma a dinâmica de

uma fabrica de couros é representada através das memórias dos velhos7 como ator

principal da formação de sua sociedade e conseqüentemente do município.

Espera-se por fim, com a escolha desse tema, contribuir com a parca

produção bibliográfica acerca da memória histórica registrada sobre a sociedade

ananindeuense e seus aspectos históricos, políticos, sociais, e principalmente

5 Sobre o conceito de representação ver: CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e

representações. Lisboa: Difel, 1998.

6 Ver: RAGO, Margaret. A invenção do cotidiano na metrópole: Sociabilidade e Lazer em São Paulo, 1900-

1950. in: PORTA, Paula. História da cidade de são Paulo. SP: Paz e terra, V. 3. 2004

7 Ver: BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: Lembranças de Velhos- 3. Ed. - São Paulo: Companhia das Letras,

1994.

Page 16: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

15

culturais. Baseando-me na representação do Curtume Maguary como uma indústria

local de grande porte que se instaurou em uma região não urbanizada e pouco

conhecida industrialmente, venho através deste dissertar sobre a dinâmica sócio-

cultural que o Curtume Maguary exerceu na sociedade maguaryense

(posteriormente ananindeuense), no período de sua primeira gestão, compreendido

entre 1916 a 1950. Proponho-me a discutir não somente o fator econômico como

cerne deste trabalho, voltando-me também as atenções nos aspectos sociais e

culturais representados pela memória dos entrevistados e noticias de jornais

impressos do período. Pretendendo evidenciar a dinâmica do Curtume Maguary, a

que veio demonstrar na história desta sociedade e ao próprio município

posteriormente, fortes elementos sócio-culturais no cotidiano da mesma.

Ao deparar-me com uma escassa produção bibliográfica, além da

inexistência de centros de memória histórica no município de Ananindeua,

proponho-me a circunscrever alguns aspectos históricos do município e sua

respectiva população, durante seus primeiros anos, enfatizando que a presença do

Curtume Maguary também configura-se como elemento de extrema importância no

fazer parte da história e memória de Ananindeua, como afirmam os entrevistados

Edivar Silva8 e Raimundo Oliveira9, elementos que ainda hoje podem ser

encontrados, como a presença do Curtume no hino municipal de Ananindeua: “[...]

Em teu colo ostenta a paz, Polidez e madeira eficaz desde outrora, O SÍTIO, O

CURTUME revelaram o fulgor de teu lume. Em tuas veias sempre hás de sentir o

pulsar-coração Maguary [...]”.

Desvencilhando-se da idéia de Ananindeua ser uma cidade dormitório ou

alternativa para o desinchaço populacional de Belém, presente em uma história

tradicional paraense, e sim trabalhando na perspectiva de Ananindeua como um

município de autogestão e especificidades sócio-econômicas e culturais não

inteiramente dependentes de Belém, porém voltando-me a visão do Curtume

Maguary como a primeira e mais importante indústria organizada de Ananindeua,

como os braços que erguem e trabalham na construção do município, sendo

8 Edivar Barbosa da Silva, em entrevista feita no dia 26/06/2009 as 17:20. (Segundo entrevistado) Edivar da

Silva é morador de Ananindeua a 64 anos e filho de operário do curtume Maguary. Atuava constantemente com

seu pai em prestações de serviços entregas e descarregamentos de produtos para o Curtume.

9 Raimundo Lima de Oliveira. Entrevista feita em 17/06/2009 as 15:30. (Terceiro entrevistado) Raimundo

Oliveira foi trabalhador do Curtume Maguary na década de 70 e reside em Ananindeua a 45 anos.

Page 17: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

16

elemento difusor dos costumes, condutas, crenças e hábitos, de regras sociais que

permeiam a cultura dos moradores no Maguary, volto o olhar ao Curtume Maguary,

centralizado nas suas relações para além de seus muros, de suas produções e

margens de lucro.

Tentando problematizar as discussões sobre a representação do Curtume

Maguary na memória de seus moradores, recorro as entrevistas orais realizadas

com: Raimundo Lima de Oliveira, Edivar Barbosa da Silva, Socorro Leão e Mario

Lavareda. Como também diversas manchetes e anúncios encontrados nas edições

dos Jornais A Folha Do Norte (1916 a 1950), a Província do Pará, A Vanguarda

(1931- 1950) e A Palavra (1917 - 1950), objetivando cruzar as fontes de ambas

perspectivas na tentativa de problematizar a noção representativa do Curtume

Maguary na memória social tanto qual no cenário maguaryense como belenense.

No primeiro capítulo foi abordado o histórico do surgimento de Ananindeua

(como município) e do Curtume Maguary. Antecedendo a lei de decreto Nº 4.505 de

30/12/1943, e recorrendo aos primeiros registros de moradores em Ananindeua, que

datam de 1850 a 1895, nas regiões as margens do Rio Maguary, principalmente na

ilha de São Pedro. Os moradores geralmente fazendeiros e comerciantes de médio

porte, se instalavam nas margens do rio Maguary, principalmente por serem áreas

de baixo valor comercial (até então), encontrando-se no que segundo Mendes

(2003, p.26), retrata o primeiro núcleo urbano de Ananindeua. O surgimento,

povoamento e desenvolvimento considerável de Ananindeua estão associados à

construção da Estrada de Ferro Belém-Bragança (E.F.B.) e uma parada do trem na

estação entroncamento em Ananindeua nos anos de 1883 a 1908, mas seu

desenvolvimento econômico-urbano e comercial, de fato, se devem principalmente a

implementação do Curtume Maguary em 1916 e a criação e comercialização da 1ª

água mineral do estado do Pará, em 1921, conhecida como “Água Maguary”, sendo

exportada para todo o país e regiões do exterior com qualidade reconhecida em

100% pura, por químicos franceses. (MENDES, p. 30)

Com o objetivo de levantar os processos históricos que permeiam o

surgimento de Ananindeua, recorro ao levantamento mais coerente possível sobre a

construção da E.F.B. e sua respectiva parada de trem em Ananindeua, para tentar

compreender o imaginário construído acerca da estereotipada concepção do

Page 18: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

17

município surgir como fator conseqüente a esta parada. Na tentativa de desconstruir

essa idéia, ainda muito enraizada, da relação dependente e conseqüente de

Ananindeua como mero “ponto de embarque-desembarque” e/ou “cidade

dormitório”, recorro ao levantamento histórico e as memórias dos velhos, na

tentativa de contrapor os discursos políticos estereotipados desta época, objetivando

demonstrar através de toda trajetória do município e seu povo, que Ananindeua

possuía uma dinâmica própria, tanto no que diz respeito aos elementos econômicos,

como sociais, culturais e políticos. Embora não seja meu propósito partir para o

extremo oposto de afirmar que não existiam relações de troca, negociação e

comunicação entre Belém e Ananindeua nos seus diversos setores. Pelo contrário, o

objetivo é exatamente demonstrar que ambos possuem gestão própria e

especificidades únicas, todavia mantêm constantes fluxos de relações entre si, como

negociação, troca ou contatos, e não como relações de submissão.

Partindo desta análise prévia do município, retenho-me a levantar um

breve histórico do Curtume Maguary no meio ao qual este está inserido. Sobre as

circunstancias o mesmo Curtume, e ao longo dos seus anos iniciais, as proporções

alcançadas pelo mesmo dentre o cenário industrial do estado do Pará, pauto-me em

um breve levantamento comercial-econômico da indústria para salientar sua atuação

no cenário econômico que, todavia, desencadeia uma série de outros elementos

paralelos, como a política, a cultura, a infraestrutura, sem esquecer das lendas e

mitos. O Curtume Maguary veio apresentar estes aspectos como elementos ligados

diretamente a sua presença no município.

No segundo capítulo, tratou-se da memória histórica e a representação da

mesma, referente ao Curtume Maguary. Baseando-me no confronto entre os dados

obtidos nos periódicos e jornais, na bibliografia que se refere ao mesmo e

principalmente nas entrevistas orais, procurou-se obter como resultado deste

confrontar de fontes, um levantamento mais rico e apropriado acerca da memória

histórica da sociedade maguaryense sobre o Curtume Maguary e inevitavelmente

sobre Ananindeua abordando as questões principais do trabalho, como a

importância do Curtume Maguary para o município e sua sociedade, e a forma como

é constituída a representação da memória daqueles que vivenciaram, direta e

indiretamente, este período e como essa memória de hoje reconstrói o passado

Page 19: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

18

através do exercício de voltar no tempo e rememorar os acontecimentos. Não

esquecendo, todavia, a própria análise que é feita dos discursos construídos nas

manchetes presente nos jornais de época, tentando analisar suas propostas,

objetivos e os espaços alcançados pelo Curtume Maguary na imprensa belenense.

Outro ponto importante a ser abordado é sobre o cotidiano do Curtume

Maguary, reconstruído este, pelos discursos dos entrevistados que apresentam em

épocas distintas sua visão da relação cotidiana entre operários e patrões, no dia a

dia de cerca de cinqüenta operários diretamente empregados, algumas

considerações acerca do trabalho são tecidas, todavia, percebe-se que este campo,

é apenas um dos muitos cenários que envolvem e são envolvidos pelo Curtume

Maguary. Campos estes que ultrapassam, em muito, os muros de concreto da

indústria de couro.

Page 20: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

19

1 O CURTUME MAGUARY EM SEUS PRIMEIROS PASSOS NA

FORMAÇÃO DA CIDADE DE ANANIDEUA

Após uma breve introdução acerca do objeto a ser trabalhado, iniciaremos

agora um levante sobre os principais aspectos históricos que circunscrevem o objeto

e compõem seu avulso.

Ananindeua possui nome de origem Tupi, onde “Ananin” é nome de uma

espécie de árvore encontrada na localidade atual no espaço onde se compreende

município, esta árvore era muito utilizada na produção de resinas industriais para

vedar embarcações e produzir cosméticos. O restante do nome, “Teua” em Tupi

significa abundância, todavia, por uma questão de melhor fonética modificou-se o

nome de “Teua” para “Deua”, formando assim o nome Ananindeua, ou seja,

abundância de Ananin.

Temos como primeiros habitantes do local, onde hoje consideramos por

Ananindeua, a Comunidade Agrícola do Abacatal que se localiza a 8 km do Centro

de Ananindeua, sua fundação data-se 1790, onde no local existia um engenho de

cana de açúcar, tendo como proprietário o Conde Antônio Koma de Melo. Essa

comunidade localizava-se as margens do Rio Guamá, o Conde deixou as terras para

suas 3 filhas, filhas essas de uma escrava de nome Olímpia, como herança de suas

posses de terras, comprovando pela carta de sesmarias a área em questão,

tomando assim a comunidade do Abacatal como uma área de remanescentes

quilombolas.

O Rio Maguary Açu, possui influencia direta nos acontecimentos mais

importantes de Ananindeua. A priori dá nome do local onde situou-se o

desenvolvimento urbano inicial no município, Maguary, e abriga os primeiros

moradores da região nas ilhas desde 1850 (MENDES, p.26). Não só a

comercialização da Água Maguary (ver figura 02) como também o rio delimita os

espaços territoriais ao longo de suas margens. É de fundamental importância para a

sociedade maguaryense, e posteriormente ananindeuense, que dependia do rio para

as comunidades ribeirinhas se deslocarem nos entornos das ilhar e estadas, a

Page 21: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

20

orientação e o consumo fundamental na utilização do rio, nos processos de

fabricação e curtição de couros do Curtume Maguary. Dependiam também do rio os

ribeirinhos que através deste faziam a manutenção e produção de pequenas

hortaliças nas comunidades ribeirinhas, além da pesca que praticamente compunha

a base da alimentação ribeirinha, sem comentar no lazer e fonte de renda que o

mesmo propiciava a estes indivíduos. Podemos considerar dessa forma, que o Rio

Maguary, se tornava os braços e as pernas do que viria a ser Ananindeua.

Figura 2 - foto da propaganda de Água Maguary em livro de registros e comércios

do estado do Pará 1930-1960. p.306.

Em seu inicio Ananindeua tinha uma parada de trem, onde segundo

moradores antigos da localidade, afirmam a tal parada de trem situa-se onde hoje é

o Viaduto do Coqueiro, tal parada era da Estrada de Ferro Belém-Bragança (E.F.B.)

que teve sua construção de 1883 a 1904, seu primeiro trecho ligava Belém ao que

hoje é Benevides, foi inaugurada em 1884. A população que formou o município

segundo Mendes (2003, p.26) é basicamente de ribeirinhos e caboclos, fugidos da

cabanagem, de varias localidades do estado sendo depois da comunidade do

Abacatal a localidade do Maguary o mais antigo núcleo urbano do município. Suas

Page 22: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

21

ilhas foram sendo paulatinamente povoadas, como a Ilha de São Pedro (ver figura

03), Sussurema, Mutum e outras. Com a criação da E.F.B. um contingente

populacional também emergiu de outras localidades do Pará para Ananindeua. Em

1916 inaugurava o Curtume Maguary, tido como a primeira indústria do município,

onde produziam vários produtos de couro do boi. Para abrigar seus funcionários o

Curtume construiu algumas moradias, onde após o fechamento da fábrica, foram

doadas sua posse para seus habitantes dando origem no local onde se encontrava a

vila de trabalhadores. O conjunto que era chamado anteriormente de Vila do

Maguary.

Figura 03 - Escola domestica da Ilha de São Pedro em Ananindeua. Data:

desconhecida. Fonte: http--biblioteca.ibge.gov.br-

colecao_digital_publicacoes_multiplo.phplink=RBG&titulo=Revista%20Brasileira%2

0de%20Geografia%20-%20RBG

Em seu principio Ananindeua pertencia as intendências de Belém, após

1938, passou a ser parte do distrito de Santa Izabel, ate 3 de janeiro de 1943,

Page 23: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

22

quando foi emancipada como município em 1944, sua área se estendia por

Marituba, Benevídes e Benfica, atualmente sendo constituído apenas pela sede

distrital. Sua população hoje, segundo estimativa do IBGE, aproximadamente esta

entre 482.171 habitantes em uma área de 185,1 Km². Porém o que se nota em

outros trabalhos é uma visão elitista, uma visão de cima da história de Ananindeua,

uma história forjada pela elite, como forma de exaltação de seus antepassados e

submissão da cidade à capital de estado.

É de suma importância percebermos que no período ao qual nos retemos

a trabalhar, em sua grande parte dele esta compreendida a um período que

anteceda a emancipação do próprio município. Portanto percebamos que o Curtume

Maguary, existe antes mesmo do município de Ananindeua. Faz-se necessário

ressaltar também que Ananindeua, na compreensão dos mais antigos era apenas

uma minúscula redoma próxima a parada do trem da E.F.B. como afirma o

entrevistado Mário Lavareda:

[...] a maior ‘indústria’ dele, daí de Ananindeua era a padaria do seu Raul

Vicente, tinham alguns botecos de cachaça, por ai mesmo, não podia ser

longe porque não tinha ninguém, [...] Ananindeua era ali, era só aquela

frente, onde o trem parava, e seguia a estrutura dele.

Desta forma percebamos não só o caráter aventureiro e inaugurador do

Curtume Maguary, como também seu pioneirismo nesta localidade praticamente

deserta. É necessário que atentemos também para a questão financeira neste

campo, pois, se os espaços físicos em Belém se tornam cada vez mais disputados e

mais valorizados, seu valor monetário eleva. E com a estrada de ferro e a parada de

trem nesta localidade, ainda de matas densas, Saunders visualizou a possibilidade

de sucesso. Pois teria a disposição, grandes propriedades de terra, para construção

Page 24: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

23

da fábrica, matéria prima em abundância, para máquinas, móveis, ferramentas etc.

sem esquecer de mencionar um meio de escoamento de produção próximo.

Tendo em mãos tamanhas vantagens, Saunders se propôs a inicias as

atividades do Curtume Maguary, em 1916 quando adquirir um pequeno barracão do

português Mario Almeida, as margens pantanosas do Rio Maguary. A partir deste

momento Claude de Saunders, sócio majoritário, e Artur Davids, deram o passo

inicial na construção dessa história que dará vida não só ao voou do pássaro

Maguary, como também fará germinar a semente ananin que ali esta plantada

(LEÃO, 1999. passim)

1.1 OS TRILHOS E A PARADA DA ESTRADA DE FERRO BELÉM-BRAGANÇA

(E.F.B.)

No início do século XX os processos de urbanização e industrialização de

Belém passam por avançadas e incessantes transformações, em um ritmo

freneticamente acelerado sob respaldo dos discursos integralistas e

desenvolvimentistas nacionais, Belém adota medidas urgentes para sanar um

problema já existente na capital do Norte, o inchaço populacional, que sobrecarrega

os restritos núcleos urbanos da cidade. Em consequência do mesmo, as medidas de

saúde pública adotadas no código de postura municipal, fazem necessário o

“higienizar” do espaço público para que não haja propagações de doenças ou

avulsos de mau estar nas populações dos centros urbanos de Belém. Partindo deste

ponto, são tomadas como medidas de conseqüências o deslocamento das camadas

populares mais carentes para áreas apartadas da cidade, como tentativas de

suplementar a “superlotação urbana” em Belém, dando início as ocupações

desordenadas nos espaços alternativos “marginalizados” ao urbanismo belenense.10

No que diz respeito aos processos de industrialização, as restrições e

altas taxas de valores dos espaços próximos aos centros belenenses, acabam por

10 Sobre o assunto ver: SARGES, Nazaré. Belém: riquezas produzindo a Belle-Époque (1870-1912). Belém:

Paka-Tatu, 2002. Ver também: CRUZ, Ernesto. História de Belém. Belém:EDUFPA. Série José Veríssimo,

1973.

Page 25: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

24

causar o desinteresse de novos investidores nestas áreas, contribuindo para a

escolha, por parte dos industriais, de áreas distantes aos centros urbanos,

entretanto com vias de acesso a Belém. Uma das alternativas que se encaixa

nessas especificidades são os terrenos próximos a Estrada de Ferro Belém-

Bragança que fornecem vias de acesso a Belém, e as paradas de embarque-

desembarque para escoamento mercantil inter-estaduais presente na localidade,

diante da qual se concentraram paulatinamente em meados da primeira década no

século XX, numerosas quantidades de famílias e pequenos comerciantes. Diante do

ocorrido, se deu lenta e gradativamente os processos de ocupação nestas áreas

entendidas como freguesia, por volta de 1884, posteriormente reconhecida como

distrito em 1938, passando então a denominação de Macro Região Metropolitana de

Belém (MRMB) ou Zona Metropolitana de Belém (ZMB), onde posteriormente vira a

emancipar-se como município em 1944.

Figura 4 - Parada de trem da E.F.B., trecho do Entroncamento, parada de Ananindeua. Data: indisponível. Fonte: < www.estacoesferroviarias.com.br/braganca/ananindeua.htm > acessado em: 26/09/09.

Page 26: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

25

Vale salientar que a parada de trem E.F.B. em Ananindeua, ao menos em

teoria, possuiu apenas funcionalidade de embarque e desembarque de passageiros.

Quem por ventura desejasse embarcar produtos, mercadorias, maquinário, etc.

Deveria dirigir-se a ferroviária em Belém, segundo as recomendações dos

ferroviários. Todavia, tal medida contraditória não ocorria de fato. Tornando assim a

parada de trem em Ananindeua um ponto de escoamento mais próximo da região

para os que ali se encontravam.

A parada de trem da E.F.B. em Ananindeua fez parte do complexo do

Entroncamento, onde segundo afirma o entrevistado Edivar Silva11, em Ananindeua,

situava-se nesse perímetro a maior concentração de trabalhadores da região, pois

aqueles que não trabalhavam direta, ou indiretamente no Curtume Maguary, teriam

de recorrer a Belém em busca de emprego. Nascendo daí parte integrante que

justificava os discursos da relação de dependência entre Belém e Ananindeua.

Figura 5 - Rua principal da cidade de Ananindeua, nos anos 1950. Trilhos trem da E. F. B. disponível em: < HTTP://biblioteca.ibge.gov.br-colecao_digital_publicacoes_multiplo.phplink=RBG&titulo=Revista%20Brasileira%20de%20Geografia%20-%20RBG >

11 Edivar Silva em entrevista realizada no dia 10 de junho de 2009. as 18 horas. (Entrevista oral)

Page 27: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

26

Como já iniciado anteriormente a discussão, a freguesia de Ananindeua

faria parte do projeto estadual da criação de um imenso parque industrial que

atenderia as necessidades de Belém, principalmente no que diz respeito à moradia.

Dessa forma, com a criação da vila operária em Marituba, para atender as

funcionalidades do Trem e da E.F.B., generalizou-se o caso às intendências de

Ananindeua, somando com os discursos de “parque industrial” e “cidade dormitório”.

Não se sabe ao certo em que momento exato surgiram estes discursos, e tão pouco

quem os criou. Todavia sua erradicação foi consolidada pelos diversos discursos

políticos da época e imprensa belenense nas divulgações de campanhas políticas e

discursos progressistas. Em conseqüência disto, cristalizam-se estereótipos de

Ananindeua como cidade dormitório e/ou parque industrial da Zona Metropolitana de

Belém ou Macro Região de Belém (MRB) como apontam algumas bibliográficas.

Figura 6 - A estação de Marituba, ao fundo, a torre da caixa d'água e a vila ferroviária, por volta dos anos 1910. Disponível em: < www.estacoesferroviarias.com.br/braganca/marituba.htm >.

Page 28: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

27

O que se faz importante neste trabalho a respeito dos primeiros passos do

Município é repensarmos estes estereótipos enraizados desde meados a década de

20, fazendo uma análise mais coerente sobre Ananindeua. É necessário atentar

para o fato de o município não ser uma “cidade dormitório” que surge como

conseqüência dos problemas de Belém, muito menos esta estabelece uma relação

de completa dependência da capital. Tem-se, portanto, o município com

especificidades próprias, e não apenas como uma extensão territorial da capital

paraense.

A ideia de parque industrial cai por terra mesmo ainda na fase de projeto,

quando se iniciam as ocupações territoriais por famílias carentes e famílias ricas

belenenses. E a denominação de “cidade dormitório” surgiu devido às políticas de

ocupação de terras ao longo da E.F.B., com a concepção de que Ananindeua não

possuía infraestrutura alguma, e se torna apenas refúgio de moradia, quanto que

seus moradores teriam que recorrer a Belém para conseguir emprego, comida,

utensílios, atendimentos médicos, etc. situações que ainda são contadas nos dias de

hoje por alguns moradores que rememoram aqueles tempos. Todavia é necessário

que percebamos os direcionamentos políticos aos quais estes discursos trazem

consigo, e como estes cristalizam-se no imaginário popular da época. Tão quais os

mesmos discursos, por tempos, são reproduzidos no recém criado corpo político de

Ananindeua.

Page 29: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

28

Figura 7- Estrada da BR 316, por volta de 1970. Transporte de carvão em pau de

arara. Disponível em: <http--biblioteca.ibge.gov.br-

colecao_digital_publicacoes_multiplo.phplink=RBG&titulo=Revista%20Brasileira%2

0de%20Geografia%20-%20RBG >

É lamentável perceber que tão pouco se conhece sobre o próprio histórico

do município, e pior ainda, o descaso com seus aspectos culturais. Ananindeua

apresenta vários indícios de autogestão e gerências próprias, não por acaso a

prefeitura de Ananindeua funcionava com gerência própria sem as dependências de

Belém, todavia sem deixar de perceber que a prefeitura de Ananindeua era mantida

pelo Curtume Maguary assim como o cartório Bezerra Falcão, estes existiam

praticamente para atender as necessidades do Curtume e seus moradores.

Tendo em vista que Ananindeua se emancipou no ano de 1944, com uma

infraestrutura já urbanizada e organizada, seu mote histórico durante muitos anos

atribuiu-se unicamente a criação da Estrada de Ferro Belém-Bragança e aos

decorrentes problemas de inchaço populacional em Belém nas décadas de 30 a 60,

rebaixando o município no que fora chamado de “cidade dormitório” em longos

Page 30: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

29

discursos políticos e populares belenenses, reforçando a imagem de Ananindeua

com uma região periférica à 13 km da grande metrópole da Amazônia(Belém)

1.2 – AS INDÚSTRIAS DE COURO E O SETOR INDUSTRIAL PARAENSE

Adentrando para regionalização dos processos industriais, vemos o

Curtume Maguary, nas primeiras décadas do século XX, em sua dinâmica do

cotidiano de seus trabalhadores e moradores, apresentando elementos que vão

além das tradicionais concepções de relação trabalhistas e exploração da força de

trabalho, presentes nos estudos historiografia tradicionais europeus12. Tentando

transpor a importante e significante presença do Curtume Maguary na formação da

sociedade e do próprio município de Ananindeua (tendo em vista que este antecede

a emancipação do município datada de 1944), proponho-me a discutir aqui alguns

dos aspectos que legitimam essa significativa importância no surgimento do

município.

Veremos adiante alguns aspectos que demonstram o Curtume Maguary

com fundamental importância para o desenvolvimento de Ananindeua, tanto no

campo econômico, social, como cultural e urbano.

12 No que se refere à questão Thompson aborda como e quando a classe de trabalhadora se transforma em classe

operaria. Estes elementos tradicionais, aqui citados, entendemo-nos como as análises sociais direcionadas

primordialmente entre as relações de produção e exploração da força de trabalho, a organização do movimento

operário e as relações destes com o Estado e com ideologias dominantes. Para uma melhor compreensão do

assunto e leitura mais aprofundada Ver. THOMPSOM, E. P. A formação da classe operária inglesa. A árvore da

liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

Page 31: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

30

Figura 8 - Antigo galpão de pregaria e secagem de couros do Curtume Maguary, a estrutura de concreto e vigas de ferro e aço continuam de pé ate os dias atuais. Data da foto: indisponível. Fonte: arquivo pessoal Jorge Granhem.

Em 1916, iniciaram as atividades do Curtume Maguary de forma bastante

simplista, em um barracão de 3 x 4m as margens do Rio Maguary. Claude W. T.

Saunders e Artur J. W. Davids, deram princípio às atividades do Curtume. Saunders,

empreendedor inglês naturalizado brasileiro era um homem de negócios que “veio

ao Brasil atrás de novas perspectivas de vida” (MENDES,2003, P.16) e Davids,

dinamarquês industrialista especializado em química industrial era perito nas

técnicas de curtimento em couro bovino. Juntos, os dois empreendedores ergueram

o Curtume Maguary, inicialmente por volta de 1916, curtindo peças de couro com as

próprias mãos, durante um período aproximado de um ano e meio, adquirindo

posteriormente um antigo barracão de ferro em ruínas de uma instalação missionária

religiosa abandonada próxima do Rio Maguary.

Segundo Roberto Leão (1999, p.70), Claude Saunders encontrou

escondidas nas pilastras de ferro em uma antiga estrutura de um colégio de freiras

abandonados nas proximidades do rio Maguary, enorme quantidade em moedas de

ouro, algumas até portuguesas. Partindo deste ponto o Curtume Maguary se tornou

Page 32: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

31

uma das maiores referências no estado tendo reconhecimento nacional e

internacional (ver figura 9) como também afirma o segundo entrevistado Edivar da

Silva13, sendo reforçado pelas notícias de protesto dos dois maiores curtumes do

estado do Pará, Curtume Americano e Curtume Padrão (Matadouro Maguary) em

nota na Folha do norte de 9 de outubro de 1922:

[...] a indústria de curtumes do Estado do Pará está em eminência de interromper os seus trabalhos por falta de matéria prima. Devido a crescente exportação que está fazendo de couros do matadouro modelo e principalmente do novo curtume(grifo meu: Curtume Maguary). E a situação tem se agravado ultimamente, em vista do desenvolvimento cada vez maior que esta indústria vem apresentando, ao ponto de poder utilizar todos os couros deste Estado, calculados em seis mil mensais, pois só um dos três curtumes existentes beneficiam quatro mil couros por mês [...]

Figura 9 - Galpão principal do Curtume Maguary. Data desconhecida. Fonte: Jornal O Liberal

15 setembro, 1989, p. 4.

13 Silva, 2009.

Page 33: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

32

Tomando as dimensões que rapidamente o Curtume Maguary assumiu em

seus anos iniciais, e suas consideráveis possessões de terras, máquinas e

produções a nível estadual, além dos investimentos em estrutura, maquinários e

matérias primas, o Curtume Maguary apresentou inúmeros fatores atípicos de

investimentos industriais em seu primeiro momento (de 1916 a 1946) de existência.

Por exemplo, como nos informa Roberto Leão (1999, passim), em postulados

parâmetros como educação de qualidade e ensino religioso para a família do

trabalhador, normas de costumes e condutas sociais contra o alcoolismo, a falta de

higienização, a prevenção e propagação de enfermidades, entre outros campos, o

de recreação, investimentos em cinema, clube, teatro, escola de regime internato,

musica, campo de futebol e muito mais. Sem deixar de mencionar o rigoroso sistema

de “manutenção da saude” onde todos os operários eram submetidos a uma

avaliação média diariamente no início e fim de seu expediente, e suas casas eram

inspecionadas regularmente fiscalizando condições de higiene, limpeza domiciliar,

uso de mosquiteiros (sendo obrigatórios), condições de manutenção e cuidados com

a estrutura do lar, dos quintais, pátios e rua próximo a sua casa.

Se fazendo necessário ressaltar o interessante fato da preocupação de

Saunders, com o bem estar de seus trabalhadores, Segundo Roberto Leão (1999,

passim), Edivar da Silva e Mario Lavareda, os operários recém contratados do

Curtume Maguary, até meados de 1925, recebiam pequenos lotes de terras com

casas de madeira revestidas em colunas de alvenaria, sem contato com o solo,

cobertas com telhas inglesas e sub divididas em dois quartos uma sala e uma

cozinha, os banheiros se encontravam impreterivelmente fora da casa e sem contato

direto com o solo. Seguindo todas as exigências de higiene impostas pelo patrão,

não haveria restrições sobre o proceder da casa. Os terrenos eram concedidos com

as casas já construídas minuciosamente alinhadas e organizadas.

No que diz respeito às fiscalizações de limpeza, tanto nos depoimentos de

Edivar da Silva e Mario Lavareda como nos dizeres de Roberto Leão (1999, p.27),

Claude Saunders fazia pessoalmente a inspeção diária de casa em casa para

verificar as condições de higiene e limpeza em que se encontravam, aproveitando a

inspeção também para verificar se as crianças, caso houvesse, estariam

freqüentando as aulas diariamente. Segundo Roberto Leão, era extremamente

Page 34: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

33

rigoroso o proprietário do Curtume com as questões de limpeza, escolaridade,

combate ao alcoolismo e a presença de todos os trabalhadores e seus familiares

nas missas de domingo.

Como divulgado sobre título “Só o que bebem no Curtume Maguary” em

edição do jornal A Folha Do Norte, em 8 de maio de 1931:

A louvável atitude dos empregados do Curtume Maguary, apelando para o governo revolucionário no Estado de ser sustada, se não proibida, a venda naquela vila, sobretudo a empregados do estabelecimento industrial, de cachaça e outras bebidas alcoólicas ou fermentada mereceu a mais franca simpatia pública. [...]

14

Percebe-se a partir da notícia a manifestação dos próprios trabalhadores

em relação a uma conduta social extremamente enraizada entre os mesmo, se

fazendo atentar principalmente para a própria compreensão da sociedade belenense

sobre estes indivíduos os intitulando de “vila”, ou seja, se fazendo perceber o caráter

organizado e dinâmico próprio dos indivíduos deste local, não somente como meros

apartados do núcleo urbano, e sim já os reconhecendo como um grupo organizado

com bases de infraestrutura e economia.

Segundo Roberto Leão (1999, p. 37), os moradores que apresentassem o

melhor desempenho no “cumprimento do dever cívico” seriam condecorados com

premiações que permitia um status entre os moradores da vila, como o Distintivo e o

Broche Maguary. Entre nomear apenas os mais saudosos trabalhadores do curtume,

por serem exemplares de um verdadeiro Maguary, sendo este broche entregue

durante a importante cerimônia de premiação proposta por Saunders, e aqueles que

obtivessem o menor “índice” de desempenho seriam advertidos pelos fiscais

podendo ser até retirados da Vila Operária, contudo era de muito raro caso.

14 Notícia retirada do jornal A Folha do norte. De 8 de maio de 1931. p. 2.

Page 35: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

34

Sobre a memória que ficou daquele universo do Curtume Maguary, alguns

moradores de Ananindeua da época, como o entrevistado Edivar Silva e Socorro

Leão, afirmam que “o curtume Maguary é uma escola para a vida”. “O brotar da

semente Ananin” como uma espécie de jargão, ditado popular, freqüente entre os

moradores do Maguary no dito primeiro centro urbano de Ananindeua, referindo-se a

memória interpretativa construída por eles dos enredos criados e narrados durante

as entrevistas, que não trazem de fato a ‘última palavra’ sobre o acontecimento, mas

revelam aspectos particulares do mesmo. São aquilo que Alessandro Portelli15

chama de “versões do passado”. Assim, o que se pretende neste tipo de análise é

tentar compreender a maneira como os entrevistados vão se recordar à contar a

história do Curtume Maguary e não tentar “desvendar” o que de fato aconteceu, se

valendo da memória dos entrevistados e não dos fatos oficiais.

Tendo em vista que. Para além dos estereótipos já existentes, Ananindeua

emancipa-se sem a preocupação, por parte dos políticos e da elite local em registrar

e preservar seus patrimônios culturais e históricos. É de fato verdade que se

desconhecia um fator cultural característico de Ananindeua e acreditava-se que com

a emancipação do município “criar-se-ia” automaticamente elementos culturais

próprios, forjando assim uma memória histórica dita “válida”. Possivelmente por

considerar a identidade cultural como algo novo e marcante, não se tenha percebido

anteriormente esses elementos culturais já existentes.

Após recorrer à estudos produzidos sobre a cultura de Ananindeua,

deparei-me com uma questão pertinente. Ao indagar sobre a cultura ananindeuense,

não se tem respostas concretas ou diretas até os dias de hoje. Obviamente não pelo

fato de sua inexistência, mas talvez, aliado ao desconhecimento geral dos

elementos históricos, a sociedade em geral não tenha se identificado com algum

elemento marcante em comum. O que caracterizaria este sentido de ausência e

desconhecimento.

De fato muito da herança cultural de Ananindeua se perdeu no tempo.

Com dificuldades se encontram nas memórias dos moradores mais antigos, alguns

de seus mais famosos festejos, como a festa de São Pedro no bairro do Curuçambá,

15 PORTELLI, Alessandro. Forma e Significado na História Oral. A Pesquisa como um experimento em

igualdade. Projeto História: Revista do Programa de estudos Pós-graduados em História e do Departamento de

História da PUC-SP. São Paulo, 1981.

Page 36: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

35

as festas de Nsa. Sra. da Graças na Quinta Carmita, ou as fogueiradas de São João

no Maguary, sem mencionar as boiadas, corridas de cavalo, dia de quebra-queixos

(assemelha-se ao dia de Cosme e Damião) são estes elementos que poucos se

recordam, e até então, em lugar algum se encontram registros escritos tanto dos

locais das festas como nas datas comemorativas que por muito foram todas

alteradas inúmeras vezes, se não desapareceram, a boa vontade dos prefeitos

municipais. Ressaltando que todos estes elementos históricos citados acima tem

surgimento diretamente ligados ao Curtume Maguary e aos moradores do Maguary.

A pesar das análises recentes de depoimentos dos trabalhadores e de

noticias em jornais ou revistas sobre o Curtume Maguary, ainda não encontramos

fontes históricas que venham a precisar as grandes extensões de terra obtidas pelo

Curtume, e a quantidade de trabalhadores e/ou famílias pertencentes a vila do

trabalhador, Segundo Edivar da Silva e Raimundo Oliveira, nas gestões finais do

Curtume Maguary por volta de 1965 a 1980, o Curtume possuía uma média de 50

operários apenas anuais, e já havia vendido grande parte de suas propriedades de

terras, todavia em seu período auge, recorda Raimundo Oliveira, o Curtume possuía

uma das maiores propriedades de terras do estado, iniciando onde hoje localiza-se a

praça matriz de Ananindeua, passando pelo Curuçambá, Guajará, conjunto Cidade

Nova, Conjunto do 40 horas, Avenida Independência, chegando até inicio do que

hoje se encontra a saída de Icoarací.

1.3 A LOCALIZAÇÃO DO CURTUME: UMA ÁREA DILUÍDA NO CRESCIMENTO DA

CIDADE

Um dos grandes desafios deste trabalho se configura em delimitar o

espaço geográfico ao qual nos referimos. Uma vez que não encontramos

documentação suficiente que pudesse nos respaldar nas afirmativas, nos contemos

em delimitar apenas as margens explicitadas pelos entrevistados, que delimitam a

Page 37: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

36

imensa extensão territorial pertencente ao Curtume Maguary. Tomemos por

consideração também, que as informações obtidas remetem a um tempo passado

que obviamente não se encontra inalterado no presente, portanto, as dimensões ou

mesmo os próprios nomes das ruas que nos forma passadas, não são mais os

mesmo aos quais os entrevistados se referem.

Em um esforço absurdo de tentar visualizarmos o espaço geográfico ao

qual o objeto circunscreve, traçamos através de um mapa atual (ver figura 9),

apenas os pontos que nos foram dados como certos e convictos de pertence ao

Curtume Maguary.

Figura 10 - Mapa com recorte geográfico da área pertencente ao Curtume Maguary.

Page 38: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

37

Neste mapa temos em linha vermelha o espaço que delimita

geograficamente o território do Curtume Maguary, todavia somente as áreas citadas

pelas fontes ou entrevistados, que estendem-se da Agulha de Icoaraci (circulada em

vermelho) até a zona do Parque Industrial de Ananindeua. Os traços em vermelhos

claro são áreas citadas pelos entrevistados que pertenciam de fato ao Curtume,

como Cidade Nova, Guajará, Curuçambá, Coqueiro, 40 horas e Maguary. A área

em azul representa o núcleo urbano onde se encontram os galpões do Curtume

Maguary e a vila operária. Este mesmo núcleo encontra-se esboçado no livro de

Roberto Leão (ver figura 10). Onde demarca uma planta baixa deste núcleo urbano.

Como foi exposto anteriormente a dificuldade de se delimitar este espaço

é tremenda, uma vez que este sempre se transforma com o passar do tempo, e

mesmo se referindo ao tempo passado, o entrevistado Mario Lavareda nos

demonstra a percepção destas transformações.

[...] esse resto onde era cidade nova, cidade nova 1, 2, 3,... Cidade nova,

Curuçambá, tudo isso era não tinha casa, era 1, 2, 3 casas, cidade nova

não era cidade nova, tudo era uma mata fechada, onde o curtume tirava

lenha pras caldeiras, na mata, tinha lenheiro por conta do curtume, isso era

uma mata fechada só, não tinha nada nada, vendeu pro governo inclusive,

depois que o governo fez ai a cidade nova 1, 2, 3 ... né. Caixa econômica.

Desmataram, foram fazendo tudo né. Isso ai era só mato mato fechado. Só

era isso aqui mesmo, esse bolotinho aqui na frente, lá no Curuçambá só

tinha a casa do Celso, do finado Celso. 16

[...] Essa cidade todinha, toda toda, era do Curtume Maguary, toda, mas

toda. Cidade nova, 1,2,3,4,5.. toda toda, era só mata ali, onde os

trabalhador tirava lenha, era um patrimônio comprado pelo seu Saundres

16 Mario Lavareda, entrevista realizada em 11 de setembro de 2009. as 11:30 (primeira entrevista)

Page 39: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

38

imenso. Imenso, que nem se calcula. Todo esse patrimônio quem fez foi ele

[...]17

Também nos conta o entrevistado Edivar silva sobre as possessões de

terras do Curtume Maguary.

O Maguary tinha muita terra, Maguary, aquela cidade nova, tudo era do

Curtume Maguari, toda toda toda era do curtume, aquela parte do Distrito

do lado daqui tudo era do Curtume, tudo era do Curtume Icajatuba prali do

Distrito aonde é aquelas fabricas tudo era do Curtume, ali aonde é o

Cemitério da Saudade aquela parte ali, tudo era do Curtume, até.. até na...

na Agulha de Icoarací, tudo era do Curtume, tudo tudo tudo [...].18

Entre entrevistados e não oficialmente entrevistados, nos parece evidente

que o Curtume Maguary possuía um enorme patrimônio em terras. Considerando

que ate hoje ainda há terras em nome do Curtume Maguary a serem vendidas,

podemos imaginar então a movimentação capital que este patrimônio gera, ainda

nos dias de hoje, praticamente quarenta anos após seu enceramento de atividades.

17 Lavareda, 2009. (primeira entrevista, 11 de setembro)

18 Silva, 2009.

Page 40: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

39

Figura 11- Mapa esquemático do núcleo urbano composto pelo Curtume Maguary. Fonte: LEÃO, Roberto Queiroz. Maguary: um vôo a seu passado. Salesiano do Carmo. 1999. p. 16.

Page 41: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

40

2 CURTUME MAGUARY MEMÓRIA E HISTÓRIA DE SEU POVO

No capítulo anterior, vimos o histórico do surgimento de Ananindeua e do

Curtume Maguary, seus fundadores, conturbados processos de implementação, os

diversos fatores que contribuiram para o surgimento do mesmo, as contundências

da presença do curtume na vida dos moradores. Entre vários outros pontos a

realidade industrial e o espaço histórico que cabe ao curtume, imbricados às

relações sociais tecidas por esta sociedade. Criando seus espaços, costumes e

culturas do cotidiano na Vila Maguary, que posteriormente, da origem a cidade.

Vimos também, no capítulo anterior, os processos de fundação e

ocupação da área, que hoje compreendemos como Ananindeua. Este conturbado

processo gira em torno dos acontecimentos históricos da metrópole, como a

cabanagem, os processos de urbanização e higienização de Belém, a

implementação da E.F.B., entre outros, tal qual paralelamente seu ritmo de

urbanização e desenvolvimento.19

Neste capítulo serão utilizados os discursos dos entrevistados para

perceber de que forma diversos indivíduos constroem suas lembranças acerca do

Curtume Maguary e de sua importância na formação contemporânea do município.

Através destas falas, podemos nos utilizar das formas de leitura de mundo para, de

forma representativa, interpretar esta identidade e estes elementos históricos, pouco

investigados da história de Ananindeua.

Ora, este estudo se baseia na “memória dos velhos”, para evidenciar os

processos históricos que deram origem ao surgimento e desenvolvimento da cidade.

Pretendendo analisar de que forma se iniciou este processo e como este é visto pela

sociedade que o compõe, volto a afirmar, de forma representativa, através das falas

dos entrevistados, para que possamos a partir deste ponto, tomar conhecimento dos

elementos identitários dessa sociedade.

19 Entendamos aqui a noção de desenvolvimento no sentido ao qual o objeto se encontra, tomado por

modificações urbanísticas desenvolvidas e tecnologias de avanço nas áreas urbanísticas.

Page 42: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

41

Percebidos estes elementos trabalhados anteriormente, que legitimam a

construção de uma cidade e de seus valores históricos, seguiremos a diante neste

capítulo analisando a memória histórica e as relações tecidas no cotidiano destes

indivíduos que nos apresentam as realidades interpretadas por eles como a história

do passado de Ananindeua e do Curtume Maguary.

Tomemos, inicialmente, por consideração as noções de cotidiano,

memórias e representação presentes no trabalho, que por sua vez caminham

extremamente próximos aos diálogos aqui empregados.

Por cotidiano tentemos trabalhar através das considerações Mary Del-

Priore (1997. p 258-282.) e Margareth Rago (2004, p.387-436) onde ambas pautadas

nas concepções de Michel de Certeau (1999, passim) consideram o seguinte:

Quando falamos em ‘cotidiano’ e ‘vida privada’ devemos também tentar

ultrapassar a oposição entre ‘detentores’ e ‘excluídos’, atentos para a

evidência de que no interior das semoventes relações entre dois grupos,

inscreve-se outra coisa além de uma configuração sucedendo-se à outra;

inscrevem-se formas de visibilidade e de modos de enumeração próprios a

fazer emergir cada grupo enquanto sujeito da história; não simplesmente

como objeto da história, suscetíveis de história como tudo o que muda, mas

autores da mudança, inscrevendo a coletividade nem destino virtual,

resultado de um possível ou de uma promessa. Não se trata, apenas, de

fazer história do cotidiano ou da vida privada resgatando sua evolução ou

condição. Trata-se de deslocar o campo de possíveis definindo uma

historicidade específica. Não se trata de discutir o espaço do público em

oposição ao espaço do privado, mas de tentar perceber qual a natureza do

espaço que diferentes grupos sociais ocupam. Trata-se, ainda, de

interpretar os usos e representações que fazem os diversos grupos deste

espaço.

Ainda mais profundamente na forma de se ler cotidiano Del-Priore afirma:

Page 43: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

42

Pensar a história do cotidiano e da vida privada é, sobretudo, pensar a

solidez de palavras e de coisas, e as articulações entre palavras e coisas

que fixam as relações legítimas e ilegítimas entre a ordem dos corpos e a

ordem dos discursos. (Del-PRIORE.1997, p. 278)

Considerar as possibilidades de trabalhar com memória em um conceito

fechado seria adotar uma postura de risco, pois existe um leque conceitual extenso

neste campo, retenho-me a postura de memória trabalhada por Halbwachs como

possível forma de abordagem que se encaixa nas análises deste trabalho.

Se:

[...] a lembrança é em larga medida uma reconstrução do passado com a

ajuda de dados emprestados do presente, e além disso, preparada por

outrora reconstruções feitas em épocas anteriores e de onde a imagem de

outrora manifesta-se já bem alterada (WALBWACHS, 2004 p.75-75)

Podemos considerar que a rememoração, ou exercício de lembrar o

passado dos entrevistados, nada mais é do que uma releitura do passado através

dos elementos do tempo presente. Essa releitura possui não apenas seu tempo,

como primordialmente seu espaço e/ou lugar, esses “tempos e espaços da

memória”20 podem ser percebidos em inúmeros depoimentos nas narrativas dos

20 Para melhor compreensão da noção de “tempo” e “espaço” da memória e da história ver: de CERTEAU,

Micheal. O tempo das histórias. In: CERTEAU, Micheal. A invenção do cotidiano. Petrópolis: Vozes, 1999.

Page 44: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

43

entrevistados, que os reorganizam através de uma ordem forjada pelos elementos

naturais, ou artificiais, do cotidiano. Temos assim a construção de uma narrativa

histórica daquela realidade percebida por tais sujeitos, e reordenada por um

amalgama de elementos direcionados a partir de um, ou mais, referenciais.

Recorreremos neste momento a fala de um destes entrevistados para demonstrar de

que forma o cotidiano do Curtume Maguary, se devela através da memória, suas

influencias na rotina e na vida das pessoas que ali se encontram: “[...] agente nem

precisava ter relógio em casa mais, apitou a buzina do Curtume Maguary agente

ouvia até aqui.[...] apitava 7 horas, apitava 11 horas, apitava meio dia, [...] e apitava

4 horas” afirma o entrevistado Edivar Silva.21

Na tentativa de “fazer história” com base em relatos orais de membros da

comunidade “tradicional”22 popular de Ananindeua, decidimos que o melhor caminho

seria o de seguir as marcações de tempo demonstradas pelas narrativas dos

entrevistados.

Podemos então, a partir desta fala iniciar uma discussão da significativa

relevância do Curtume Maguary para muito além de sua área de trabalho

propriamente ditas. Alguns aspectos que construíram o histórico cultural dos

moradores de Ananindeua estavam estreitamente ligados as práticas cotidianas do

Curtume, sejam direta ou indiretamente, imbricadas aos elementos sociais destes

indivíduos, transpostas através das memórias dos entrevistados.

As atividades ligadas ao Curtume Maguary faziam parte da rotina diária

dos moradores do Maguary, tal afirmativa é presente na fala dos sujeitos que

rememoram o tempo tratado: “eu sabia porque eu ia todo dia deixa ‘tudinho’ no

barco com o papai né”23. Assim como afirma Halbwachs (2004, passim) que a narrativa

do indivíduo, a pesar de ser uma construção própria, baseia-se em sua memória, e

esta é uma memória coletiva, pois está pautada em diversos elementos que o

norteiam e que só podem ser pensados através destes fragmentos de pessoas,

lugares, lembranças, objetos, etc. podemos então considerar que as narrativas dos

21 Edivar Silva em entrevista realizada no dia 10 de junho de 2009. as 18 horas. (Entrevista oral)

22 Quando usamos o termo tradicional, nos referimos aos moradores mais antigos que concebem como

tradicional aquilo que lhes é de habitual do antigo. A forma de se fazer e pensar como sempre se fez. Mais

especificamente nesta abordagem, o uso do conceito de tradicional se refere aos moradores mais antigos da

localidade. Imbuídos de concepções de um tempo passado.

23 Silva, 2009.

Page 45: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

44

entrevistados estão sempre em diálogo com os espaços, os tempos e os diversos

personagens que desta narrativa se encontraram presentes.

Pautado na concepção acima, utilizaremos aqui as falas dos entrevistados

como ponte de acesso as possíveis reconstruções dos espaços sócio-históricos para

analisar de forma metodológica e epistemológica as representações das memórias e

histórias de seu povo, através do olhar e dessas reconstruções e releituras que os

entrevistados nos proporcionam.

O que nos leva ao terceiro conceito presente no trabalho, logicamente não

dissociado dos dois anteriores, de representação, aqui pautados em Roger Chartier

(1992. p 173-191). Compreendemos aqui o conceito de representação dotado de um

sentido conjunto ao de apropriação simbólica, pois. Uma vez que a memória é

construída coletivamente, e este indivíduo que a constrói, esta carregado de outras

vezes e outros elementos que o norteia. Podemos considerar que a visão exposta

através da narrativa construída por este, ou estes, entrevistados são válidas como

forma de demonstrar os elementos e cenários do passado, que este indivíduo em

conjunto com outros, construíram e reconstruíram ao longo do tempo uma

simbologia destas realidades.

Portanto, nos apropriamos das falas destes entrevistados para, através da

representação da sociedade e dos elementos passados presenciados por estes

entrevistados, “reconstruirmos” simbolicamente os elementos sócio-históricos que ira

representar, encenar, esta realidade percebida por estes indivíduos entrevistados,

em uma construção dotada de signos e símbolos, sobre os outros indivíduos quem

compunham o cenário descrito pelos entrevistados.

Assim como, “[...] centrando a sua atenção sobre as linguagens, as

representações e as práticas, a nova história cultural propõe um modo inédito de

compreender as relações entre as formas simbólicas e o mundo social [...]”

(CHARTIER, 1992. p. 182)

Feitas as devidas considerações, partiremos então para a análise dos

discursos dos entrevistados, evidenciando os aspectos históricos e sociais presentes

na construção do cenário passado, onde se inscrevem as histórias e memórias de

Ananindeua, tão qual a do Curtume Maguary e sua sociedade.

Page 46: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

45

Podemos considerar que os vestígios históricos que dão legitimidade aos

acontecimentos marcantes do município, sempre estão associados a três elementos

principais. O primeiro diz respeito a E.F.B. e a seus históricos nas cidades próximas,

como exposto no capítulo anterior; a cidade de Marituba que fora criada

especificamente em função da E.F.B., com este adendo atribuía-se

conseqüentemente o surgimento de Ananindeua as mesmas causas e fins. Todavia,

não desconsidero a presença da E.F.B. como fator importante no processo de

legitimação de Ananindeua, mas sim ressalto para atentarmos a maneira como

estes discursos surgiram e tomam para si, as apropriações históricas da cidade.

Discursos estes que não surgiram com a criação da E.F.B. e sim foram

implementados pela cúpula política belenense por volta de 193624, no período que

compreendia à restauração da, já decrépita, E.F.B.. Um segundo elemento presente

nos discursos de Ananindeua recorre a Comunidade do Abacatal, como área de

ocupação mais antiga do município25, que hora se contrapões as áreas da Ilha de

São Pedro, arrastando-se assim em uma discussão ainda sem definição nos dias de

hoje.

E em terceiro lugar, e para nós o mais importante a ser considerado, o

Curtume Maguary, invariavelmente, está presente nas falas e nas memórias da

população ananindeuense como elemento que deu origem a cidade e a suas raízes

históricas. Não apenas como a “primeira indústria de Ananindeua” (MENDES, 2003.

p. 31), não apenas como “mãe da terra de seus filhos Maguarys e Ananins”, mas

como cultivadora dos “bons tempos”, dos “bons homens”, e no que segundo

reconhece a sociedade, o Curtume Maguary é o referencial ao se falar de história,

de cultura e de origem em Ananindeua.

A pesar de não ser tomado por conhecimento generalizado, os detalhes

ou o histórico do Curtume Maguary, é notório a presença do mesmo, mesmo ainda

que seja de forma superficial ou pouco clara, em uma memória coletiva desta

sociedade. Memória pela qual estes indivíduos se reconhecem, mesmo não tendo

24 Informações retiradas dos Arquivos micro-filmados. Jornal A folha do norte. Janeiro a maio 1936. 4 de jan.

de 1936. p. 1

25 Todavia por esta área não estar compreendida geograficamente no território pertencente ao Curtume

Maguary, e por exigir uma pesquisa detalhada sobre o histórico desta área, que compreende por volta de 1820,

optei por desconsiderá-la desta pesquisa como área diretamente ligada ao objeto aqui estudado.

Page 47: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

46

feito diretamente parte desta história, como personagens destes acontecimentos.

Este sentimento de reconhecimento, de apropriação da história do Curtume

Maguary, tomados pra si, nos demonstra o quão forte e incisiva esta indústria de

couros, se fez, e ainda se faz, presente na memória social coletiva destes

indivíduos.

Partindo desta análise retomamos a problemática central deste trabalho,

demonstrando a representação que esta indústria, não como uma simples indústria,

tem sobre a memória e a história dos habitantes dessa cidade. Ora, de que outra

forma se poderia perceber melhor a importância de determinados objetos,

acontecimentos e sentimentos, se não através do reconhecimento de suas raízes

históricas? Se não da apropriação destes em sua história de vida? É, portanto,

pautado neste sentimentalismo que surge a necessidade de explorarmos as

abordagens historiográficas acerca da memória popular, e de como estas se

apropriam da realidade vivida para construir ou reconstruir, a “realidade histórica”

que para estes é a verdadeira história de como as coisas aconteceram. “[...]mas isso

é verdade pode colocar que é verdade[...]”26

2.1 LEMBRANÇAS DO COTIDIANO DOS OPERÁRIOS

Sem dúvidas, um dos entrevistados que apresenta com mais detalhes o

cenário do Curtume Maguary, é o entrevistado Mário Lavareda. Em sua primeira

entrevista ao trabalho27, Mário Lavareda praticamente iniciou a entrevista da

seguinte forma: “[...] Já te disseram como foi que o Maguary foi Criado? [...] Eu vou te

conta a história do Curtume Maguary!” demonstrando com bastante confiança e

veemência a reconstrução dos cenários da época.

26 Silva, 2009.

27 Lavareda, 2009. (Primeira entrevista, 11 de setembro)

Page 48: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

47

Assim como Mario Lavareda, o entrevistado Edivar Silva partilham de um

mesmo sentimento de perda e desgosto, ao olhar para o passado, narrando a

“realidade” do Maguary nos dias atuais (figura12). O sentimento de desagrado à

realidade do presente, ou exaltação do passado leva estes entrevistados

freqüentemente a recordar “os bons tempos do Curtume Maguary”. Como nos conta

Edivar Silva:

[...] é mas os antigos aqui contam que o Maguary, era uma vila mais organizada que aqui em Ananindeua.[...] o Maguary, eu canso de conversar com essas pessoas mais novas daqui, e perguntam a o que era o Curtume , o que era isso, o que era aquilo, eu digo: rapaz, o Curtume era muito melhor do que aqui em Ananindeua, o Maguary lá, a vila do Curtume

28

Figura 12 - Antigo Barracão de pregaria do Curtume Maguary. Data da foto: indisponível. Fonte:

Jornal O Liberal, 15 de setembro de 1989. p. 5.

28 Silva, 2009.

Page 49: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

48

Este sentimento de apego demonstrado pelos entrevistados remete ao

deslocamento que estes indivíduos se encontram na atual sociedade. Como

podemos perceber o mote referencial, ou a temporalidade construída pelo narrador

através de sua identificação com o passado, sempre se da com os termos “no meu

tempo”, “na minha época”, “quando eu era jovem” etc. ao contrapasso que, quando

os mesmo se referem ao tempo presente, utilizam termos como “nos dias de hoje”,

“agora, tudo diferente” sempre acompanhados de uma má expressão, ou

gesticulação ou acompanhados de comentários depreciativos da situação presente.

A construção narrativa pautada na afetividade demonstrada pelos

entrevistados nos remete necessariamente às análises de Portelli, quando o autor

chama atenção para o fato de que devemos interpretar criticamente os depoimentos,

mas com o devido respeito às pessoas envolvidas. Estamos, portanto, “lidando com

uma multiplicidade de memórias fragmentadas e internamente divididas [...]

ideológica e culturalmente mediadas29

Percebemos então que, através das análises dos discursos destes

entrevistados, estes sujeitos constroem uma temporalidade própria basicamente

divida em três fases. A primeira remete a um tempo mais antigo, chamado de “no

começo do curtume”, “no tempo do meu pai” ou “no tempo do seu Saunders”, o que

para nós deve ser encarado como a primeira fase do Curtume Maguary. Uma

segunda forma de temporalidade construída pelos entrevistados se da em um tempo

intermediário, chamados por eles como “no meu tempo de operário”, “mais pra cá”

ou “no tempo do seu Zig”. Ao qual se referem entre 1940 a 1960, período final da

gestão de Claude Saundres e início de uma nova gestão. E por ultimo temos a

percepção do tempo presente trabalhada de forma bem simples e comum aos

entrevistados pelas denominações de “hoje em dia”, “nos dias de hoje”, “atualmente”

e “pra tempos de hoje”.

A pesar de percebermos estas três grandes divisões trabalhadas pelos

entrevistados, temos que ter em mete a flexibilidade e permeabilidade que ambas

possuem, pois, são apenar forma de se construir um dialogo organizado por eles

29 PORTELLI, Alessandro. O massacre de Civitella Val di Chiana (Toscana, 29 de junho de 1944): mito e

política, luto e senso comum. AMADO, Janaína. FERREIRA, Marieta de Moraes. (orgs.). Usos e abusos da

história oral. 4a ed. Rio de Janeiro: Editora FGV.

Page 50: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

49

dentro de sua lógica narrativa. E percebamos também estes tempos, por mais

distintos que forem, são construções do presente sobre o passado. Por mais que os

entrevistados não se dêem conta disto.

Ao passo que estes entrevistados têm a oportunidade de “voltar no tempo”

para contar “suas histórias”, estes, excessivamente exaltam um passado glorioso do

qual fizeram parte e ajudaram a construir. Esse tipo de compreensão se percebeu

nos momentos que antecederam o inicio das entrevistas, quando muito

semelhantemente, os entrevistados suspeitaram da intenção da mesma, e afirmava

que ninguém procurava saber nada desse passado.

A análise das falas dos entrevistados nos norteiam a basicamente quatro

diferentes perspectivas de temporalidade. Primeiro o entrevistado Edivar Silva, que

nos conta sobre o cotidiano, a estrutura e a rotina de um operário do Curtume

Maguary, seja no trabalho seja em casa. O segundo entrevistado, Raimundo

Oliveira, nos conta sobre o mítico, sobre as fronteiras e além fronteiras do Curtume.

Um terceiro entrevistado, Benedito, nos conta sobre a visão social dessa população,

e as relações de convício. E por ultimo, todavia não menos importante. O quarto

entrevistado Mario Lavareda. Que nos conta a perspectiva histórica do Curtume e do

município de Ananindeua. Partilha também neste âmbito seu sobrinho Danilo

Lavareda.

Entre memórias e histórias, estes entrevistados transitam nos seus papeis,

hora de operários, hora de membros da sociedade. Podemos perceber então no que

diz respeito a constituição dessa sociedade, esteve em seu primeiro momento,

ligada as atividades trabalhadoras do Curtume Maguary. Uma vez que, segundo

Mario Lavareda

[...] aqui era Vila Operária, eles viviam só em função do Curtume Maguary. Toda Vila Operaria era, quem não trabalhava pro Curtume era lenheiro, trabalhava na mata mas vendia pro Curtume, e também quem não

Page 51: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

50

trabalhava pra um setor nem pro outro, era pescador. Que vendia seus peixes pra cá, eles que vinham pescar aqui no Rio Maguary

30

Percebendo dessa forma, como o Curtume constituía uma organização

social, além de dar moradia, educação, saúde e diversão, o Curtume Maguary,

fornecia base para várias unidades familiares estabelecerem uma relação comercial

nesta área, como a pesca, a caça, a venda de matérias primas, o transporte destes

produtos, etc.

Como afirma de forma extrovertida e sarcástica o entrevistado Mario

Lavareda. Antes do Curtume

[...] Ananindeua!? não tinha dinheiro, não tinha nada! A maior “indústria”

dele, daí de Ananindeua era a padaria do seu Raul Vicente, tinham alguns

botecos de cachaça, por ali mesmo, não podia ser longe porque não tinha

ninguém31

Consideremos então que, de acordo com o depoimento, que as famílias

necessitam de mantimentos, utensílios, materiais de limpeza, etc.. Havia a

necessidade de se ter um comércio próximo desta área. O Curtume Maguary não se

responsabilizou em criar um centro comercial, todavia cedeu um espaço de terra ao

lado da fábrica com esquina para entrada da Quinta Carmita, para que o seu “mané

padeiro” construísse sua taberna e lá vendesse de um tudo a sua vontade. Porém,

não tão a vontade assim afirma Mario Lavareda, existiam determinados produtos

que seriam obrigatórios aos operários, logo deveriam constar no estoque do

estabelecimento. Veremos adiante mais profundamente estes produtos, assim como

também existiam os “proibidos”.

30 Mario Lavareda, entrevista realizada em 18 de setembro de 2009. as 10 horas. (segunda entrevista)

31 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista 18 de setembro)

Page 52: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

51

O sistema de compra e venda da taberna funcionava em conciliação com

o Curtume Maguary no seguinte aspecto, o operário poderia retirar retalhos e

produtos “fiado”, na conta do Curtume, mas em seu nome, assinando uma ata

confirmado a compra por tal operário. No dia do pagamento de seus trabalhos o

operário recebia das mãos próprias de Claude Saunders uma folha de pagamento

descontando os valores de suas dívidas na taberna, recebendo em mãos apenas a

quantia restante de seu pagamento. Esta era uma atitude comum e já rotineira dos

operários, segundo nos conta Edivar Silva.

[...] pois é, ali era a tabernaria grande aonde era financiado toda mercadoria dos funcionários, ta entendendo? ali que era! Tinha o seu Mané Padeiro, ele que financiava tudinho nessa época pros funcionários, ai quando os funcionários recebiam, já vinha tudo descontado na folha deles, pra pagar né, pois o Maguary se responsabilizava em pagar, mas sabe como é pião né, ai financiava mas dizia, financio. mas só se o Curtume se responsabiliza a desconta na folha. ai descontavam, depois cobrava de novo, pagava um mês tirava o outro, e assim ia. Nessa época ali era tipo uma, como é que se diz, uma cantina né, era alimento era tudo, tudo tudo tudo, do fósforo ao feijão tudo tinha, pão, feijão, arroz, açúcar, maçarão, tudo ele vendia lá, tinha a panificadora dele lá mesmo[...].

32

O entrevistado Edivar Silva também nos aponta vários aspectos do

cotidiano dos moradores da Vila Maguary. Alguns dos aspectos mais pertinentes

estão ligados a engenharia e maquinário do Curtume e a própria Vila do Maguary.

Descrevendo com detalhes e em um tom de confiança, Edivar Silva nos conta sobre

as “máquinas de rachar”, os “tanques de toldem”, os camburões de tratamento e

despelagem. Entre tantos detalhes, ao descrever as máquinas de rachar, os tanques

de Toldem:

32 Silva, 2009.

Page 53: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

52

Não não! Ele era pra...pra lavar o couro, quando, quando tava salgado né, que vinha com sal tudinho, jogava tudo no Folão. Né?! Pra lava. Então aquele Folão... ele era de uma largura mais ou menos como daqui dessa coluna nessa aqui, agora aquela circunferência grade, sabe? Aquela, roda bem grandona mesmo. Agente jogava ali e caia aquela água ali e o couro ficava batendo lá... e depois que tirava pra ir pra... pros tanques de Touda né?! Que era pra, pra limpa!

Era muito processo que tinha! Ai depois da maquina de solta, ia pra máquina de rachar, que era pra tirar o couro e tira a sola, ta entendendo? Ai depois ia pra... pra estufa, a sola, ia pra secar, e o... o couro, eles iam pra pregaria, uma parte lá encima que eles pregavam o couro tudinho numas tábuas brancas né! Estica os couros tudinho e deixava lá, secando. Depois que eles já tavam secos que eles vinham pra estufa pra acaba ali, de secar né! Mas aquele processo, que eles trabalhavam com, pra tingir o couro eles trabalhavam com a casca do mangue, a casca do mangue era muito consumida ai! Ela chegava vindo por barco.

33

Desperta então o seguinte questionamento, e a segurança de trabalho do

Curtume Maguary? Ocorriam muitos acidentes? A resposta foi imediata, “sim! Eu

conheço um bocado de gente que perdeu o braço nessa máquina”. Mas segundo

nos conta o entrevistado, a maquina não era perigosa. Eram grandes cilindros

pesados que imprensavam o couro, mas rodavam muito lenta, ente. E os acidentes

ocorriam por descuido dos próprios operários. Todavia estes acidentes sempre

aconteciam em espaços de tempo longos.

É necessário que percebamos também, nesta questão de segurança do

trabalho, o tipo de reação popular demonstrada pelos trabalhadores, ao invés de

ocorrerem reivindicações exigindo mais segurança ou máquinas novas, podemos

perceber que sempre a responsabilidade do acidente é do próprio “operário

desleixado que não faz o serviço direito”34. Tirando assim, o peso da

responsabilidade do incidente sobre os ombros dos patrões. E esta postura se

mostra clara nas expressões do entrevistado, ao atribuir culpados, Edivar Silva

acaba, sem perceber, transferindo a noção de culpado para a figura do operário

acidentado, “mas tinha gente, tinha gente, que fazia aquilo conversando, ai na

distração ela pegava a mão”35 e vangloriando a postura do patão Saunders que

33 Silva, 2009.

34 Silva, 2009

35 Silva, 2009

Page 54: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

53

“num ato de bondade e prestação, seu Sondres manda o moribundo pro posto

médico”, evidenciando ainda mais a exacerbação do patão “seu Sondres”36.

Nos parece notável um sentimento de dívidas que os operários tem para

com Saunders, pois frequentemente nas falas dos entrevistamos, percebemos

justificativas como do tipo, “ele já dava a casa, […] se não dava o terreno pra você

fazer sua casa, dava trabalho, educavas os filhos e proporcionava muitas

brincadeiras aqui, quer mais o que hem? [...]”37 o que deixava estes operários, no

mínimo e uma posição de gratidão.

Essa posição de gratidão estimulava nos operários um sentido de dívidas,

levando-os assim a se dedicarem mais ao trabalho em função de se sentirem

quitados a dívida. E este emaranhado de relações refletiam diretamente na

produção diária de couros. Ao contrapasso que estes operários se dedicam mais ao

trabalho árduo, Saunders e seus sócios não dispensam seu tradicional chá das 5,

servido em seu escritórios, os sócios se reúnem para tomarem chá com biscoitos

todas as tarde, hábito este mantido pelo senhor Saunders diariamente.

É preciso lembrar também que o trabalho de curtição de couros possui

etapas, portanto, era comum em alguns dias, um ou outro setor da indústria

permanecer paralisado, segundo Edivar Silva, geralmente a área conhecida como

pregaria, onde secavam e enxugavam os couros, já curtidos e beneficiados.

Portanto estes empregados poderiam descansar até que o couro chegasse em seu

setor, todavia descansar nos entornos da fábrica38, pois mesmo que não houvesse

trabalho em seu setor, os operários eram obrigados a comparecer no trabalho e

permanecer durante o expediente normal.

2.2 PARA ALÉM DOS MUROS DE UMA FÁBRICA: O “CORONEL SAUNDERS” AS

REGRAS, HÁBITOS, CONSTUMES E “BRINCADEIRAS”

36 Silva, 2009

37 Lavareda, 2009 (Segunda entrevista, 18 de setembro)

38 É importante que lembremos, estou me referindo ao primeiro momento do Curtume Maguary. Gerenciado

pelo inglês Claude Saunders. Ente 1916 a 1950. Este primeiro momento se caracteriza e destaca principalmente

por ser caráter atípico de qualquer outra indústria existente no Pará neste período.

Page 55: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

54

Uma vez que já percebemos a construção desta sociedade organizada na

Vila do Maguary, através do que foi posto anteriormente, buscaremos agora modelar

traços do cotidiano que irão demonstrar de que forma se manteve essa ordem e

esse padrão característicos desta sociedade que compõe a Vila operária.

Como forma de demonstrar esse controle sobre os moradores e essa

sociedade que ali se encontrava, o entrevistado Mario Lavareda nos conta das

exigências mínimas e rotineiras que os operários tinham que passar para trabalhar

no Curtume Maguary.

Mas como eu te digo, antes de trabalhar, se tu viesse de Belém, de Bragança e quisesse trabalhar aqui, tu passava primeiro pela bateria de exames, tomava injeção (inaudível) por causa do paludismo. Eles te botavam dentro dos trilhos que era pra ti pra trabalha. Também pra não passa doenças, pra não contaminar o resto dos trabalhadores, se pudesse te tratar ele tratava pra ficar bom, era uma beleza, mas dali daquela curva pra cá, tu pegava essa bateria todinha pra trabalhar, o cara era fogo!

39

39 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

Page 56: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

55

Figura 13 - Ficha dentária dos funcionários do Curtume

Maguary. Data: Indisponível. Fonte: Arquivo pessoal

Danilo Lavareda.

É notório no depoimento de Lavareda que o Curtume Maguary

selecionava aqueles que poderiam ou não ingressar nesta sociedade, mas também

percebemos a presença de migrantes ou imigrantes no território, não seria a toa o

entrevistado Mario Lavareda citar bragantinos e belenenses neste montante de

trabalhadores, a E.F.B. possibilitava esse meio de acesso entre as duas cidades40, e

o curtume Maguary se encontrava no ponto intermediário entre Belém e Bragança.

Após este “processo seletivo” o operário iria esbarrar em outra série de

condições, imposições e regras. Logicamente essas regras vinham adjuntas aos

40 Não foi possível especificar em que data o entrevistado Mario Lavareda esta se referindo neste momento,

supõe-se que seja ente 30 a 50, pois são períodos de maior destaque do Curtume Maguary, nos noticiários

belenenses, pelo menos ao reconte cronológico ao qual se entende este trabalho.

Page 57: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

56

benefícios. Como por exemplo a moradia. Quando um operário era empregado no

Curtume Maguary, ele recebia uma das casas padronizadas na Vila Operária, essa

casa com armação em argamassa, feita em madeira e coberta por telhas próprias do

Curtume Maguary, era cedida ao operário e sua família, nas seguintes condições.

Era necessário que a família zelasse pela conservação do patrimônio, manter a casa

sempre limpa e bem arrumada, tanto na parte interna como extensões do quintal.

O “coronel Sondres” fazia pessoalmente a fiscalização nas casas. Como

afirma Edivar Silva:

[...] e ele tinha muita exigência o velho Saunders, tinha muito exigente, inclusive minha mãe morou lá, e isso ela cansou de me dizer, que quando chegava no dia de sábado, ele batia na casa, a pessoa abria ne... ele ia rodar a casa todinha da pessoa, pra ver se tava tudo limpo ne, se não tivesse ele esculhambava mesmo[...]

41

Reforçando ainda mais seu controle sobre esta sociedade, Claude

Saunders, se utilizava destas visitas de fiscalização como ferramentas de coerção,

para demonstrar e posicionar seu poder de voz e comando sobre aqueles que ali

estavam.

Ao entrar na casa para fazer a fiscalização da limpeza e zelo pelo

patrimônio, Saunders verificava outra medida de imposição obrigatória aos

moradores da Vila, o uso dos mosqueteiros. Era terminantemente obrigatório o uso

de mosquiteiros por todos os moradores da Vila do Maguary, “[...] e quem não

usasse mosquiteiro de noite .. era obrigado mesmo porque era dele, as casas tudo

era dele. Ele que mandou fazer [...] Deus o livre se tivesse sem mosquiteiro em casa

de umas 9 h em diante”42. De acordo com o depoimento, o operário que

descumprisse tal regra poderia ser expulso da vila.

41 Silva, 2009.

42 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

Page 58: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

57

Outras duas regras importantes direcionavam-se as crianças das famílias

operárias, onde criança não deveria faltar à escola nenhum um dia, caso faltasse os

pais eram chamados imediatamente, e o senhor Saundres também era comunicado

do ocorrido. Assim como na escola, as crianças, caso não estivessem na escola,

deveriam estar na igreja.

Como nos conta Lavareda, “criança? Tinha que ta na escola! criança,

tinha que ta na igreja, se ele visse alguma criança andando por ai na hora da escola

ou da igreja, ele esculhambava com a mãe, com o pai com todo mundo”.43 As

crianças praticamente viviam em três ambientes, escola, igreja e casa. A escola a

qual nos referimos é José Marcelino, ou a Escola da Quinta Carmita (ver figura 14),

uma escola que iniciou o grande regime de semi-internato em Ananindeua. Com

autos padrões de ensino, aulas de inglês, piano, musica, entre várias outras

atividades. A Escola Quinta das Carmitas tornou-se escola padrão e muito

requisitada até mesmo por algumas famílias elitistas de Belém, segundo nos contam

todos os entrevistados.

43 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

Page 59: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

58

Figura 14 - Fotografia de um desenho do Colégio Quinta Carmita.

Arquivo pessoal: Jorge Granhen.

Saindo do ambiente escolar, as crianças eram encaminhadas para casa, e

mais tarde levadas à igreja. Nos anos iniciais da Vila Maguary, a Primeira igreja

construída no município era uma pequena igreja de Nossa Senhora das Graças, na

Rua do Itabira, em Frente a casa Grande de Claude Saunders. Posteriormente foi

construída uma nova igreja mais ampla e à margem da Estrada Maguary, onde

neste novo espaço, provavelmente construído por volta de 1920 a 192844, ocorreram

as primeiras missas e procissões na Vila do Maguary, segundo Roberto Leão (1999.

p. 47-49).

É de suma importância ressaltar neste ponto que, Claude Saunders, se

considerava ateu, a pesar de determinar obrigatória a presença dos moradores,

44 Este recorte está sendo baseado nas informações retiradas do livro de Roberto Leão “Maguary, um vôo a seu

passado” quando o mesmo afirma ocorreram, neste período, as primeiras missas e procissões na Vila do

Maguary. Partindo destes dados extraídos do livro, estipulou-se esse período para localizar, temporalmente, o

leitor.

Page 60: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

59

trabalhadores e crianças em todas as missas. Não resta dúvidas que Saunders era

descrente de religiões, sobre esta questão encontramos no livro de Roberto Leão,

que traz a seguinte informação: “estando no seu leito do hospital e, apesar de se

ateu, mandou que chamar o padre Theodoro M. Kowke e se converteu ao

catolicismo, batizando-se na Santa Casa da Misericórdia do Pará.” (LEÃO, 1999. p

62). Como também afirmam tal fato os entrevistados Mário Lavareda, “se fosse outro

‘a porra, não sou católico’ mas ele não, ele botava todos moleque pra igreja”45,

Raimundo Oliveira “o pessoal dizia que ele era enjoado com missa, tinha que ir todo

mundo em todas as missas, ele o velho não ia, era ateu dizque, pode um negócio

desses?”46

e Edivar Silva, “rapaz, ele era ateu né, ateu. Mas brigava se tu não fosse

nas missas, mamãe dizia sempre “ vai te arruma pra missa, senão o velho sondres

vem aqui te buscar”47. A regra de ir as missas todos os domingos era incondicional,

assim como o uso dos mosqueteiros e a presença das crianças na escola.

Estas três regras, parecem se destacar nas falas dos entrevistados.

Todavia existia uma regra em especial que gerou pequenas divergências entre os

entrevistados, o que escreveu Roberto leão, e o que apontou as fontes de jornais

pesquisados. Estamos nos referindo a proibição de bebidas alcoólicas.

Segundo Roberto Leão (1999. p. 26-27) era proibido a venda e o consumo

de bebidas alcoólicas na Vila do Maguary. Todavia, Mario Lavareda afirma que a

proibição não existia, o que ocorria era um controle sobre a quantidade e venda.

“não não rapaz, aqui era o seguinte, o bebedor, ele dava um valezinho pra ele, num

sabe, não era proibido de beber assim sabe, mas o bebedor era conhecido, ele tinha

aquele negócio, porque ele não pudia deixar que viesse bêbado trabalha né.

Prejuízo”.48 Porem, encontramos também noticias em jornais belenenses sobre tal

episódio, como vimos anteriormente na citação de número 14.

Edivar Silva também afirma não haver esta proibição. “não lá não tinha,

na época que eu sei não tinha né, não tinha porque lá eles bebiam também, naquela

45 Lavareda, 2009. (Primeira entrevista, 11 de setembro)

46 Oliveira, 2009.

47 Silva, 2009.

48 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

Page 61: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

60

casa lá que eu to te falando, tinha bebida também, eu não sei logo no começo do

tempo do seu velho Sondres”49

O que podemos perceber é que, inegavelmente existiam sim coerções e

medidas de controle, porem, baseando-se nas entrevistas e pesquisa, não

acreditamos que houvesse a proibição definitiva. O que podemos concluir com o

cruzamentos de material levantado, portanto é que devido aos padrões de conduta

da época, aquele que tivesse o hábito de beber muito era mal visto perante o

restante da sociedade, e se tratando de uma sociedade que deveria respeita pelo

bem esta alheio e prezar pelos bons costumes, o hábito de beber se tornava motivo

de revolta e repúdio coletivo.

Dessa forma, aqueles que possuíam esse hábito, o continham,

obrigatoriamente coagidos, ou corriam o risco de serem mal falados pelos

moradores da vila e acabar sendo expulso. “[...] não era proibido de beber assim

sabe, mas o bebedor... ficava conhecido, e tinha aquele negócio, porque ele não

pudia deixar que viesse bêbado trabalha né. Ia ser Prejuízo,”. Como dissemos, a

proibição não era efetiva, mas sua pratica gerava consequências, que iriam variar de

uma advertência até a expulsão desse cidadão da vila operária.

A idéia de Saunders como o grande criador de tudo e “como se fosse um

prefeito” ou “como um coronel” foi levantada por Mário Lavareda e Edivar Silva

respectivamente. Como apropriação dessas interpretações expostas pelos

entrevistados. Tomamos aqui asses sentido como representativo de uma

consciência coletiva da figura identitária que a população da época tinha sobre

Claude Saunders.

[...] to dizendo que o Curtume Maguary rapas, ele, o Curtume Maguary é o

nome, ELE, ele que fez em esse patrimônio todinho que hoje é o Curtume

Maguary esse patrimônio em terra em tudo, foi ele que fez, foi ele que

compro, foi ele que pago, foi ele que mando fazer as plantas, ele que fez

tudo [...]50

49 Silva, 2009.

50 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

Page 62: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

61

[...] lá, a vila do curtume, [...] ele o velho Saunders era ali, tipo um prefeito

né, aquilo era dele, tudo era dele, ele que mandava, o prefeito nada

mandava lá, era ele que mandava em tudo, então ele que fazia tudinho lá,

[...] é o que eu digo a exigência dele era só pra, era a exigência, ele era tipo

um coronel né, que quer seu seu patrimônio bem conservado.51

Mas nem tudo no Curtume Maguary era só obrigação, existiam inúmeras

festas e festividades, comemorações promovidas pelo curtume ou patrocinadas por

ele Claude Saunders, sendo sempre chamadas pelos entrevistados de “as

brincadeiras”. Festividades como o 1º de maio, que segundo nos conta Mario

Lavareda, até o, na época interventor, Magalhães Barata vinha comemorar no

Curtume Maguary.

Quando tinha o 1º de maio era um festejo doido, vinha todo mundo, era aqui

no curtume Maguary toda brincadeira, toda alegria era tudo aqui, […] de

importância pelo menos na época, maior importância no Pará, do Pará

vinha ai no meio do mato, era o general Barata. Que era o governador.

Primeiro foi interventor, que naquele tempo não tinha governador era

interventor, então era o homem de maior importância que vivia, nos festejos

daqui do Curtume Maguary, que depois o sócio Sondres vinha52

A presença constante do então interventor do Estado Magalhães Barata

no Curtume Maguary, demonstra uma forte amizade, se não aliança, política entro

Saunders e Barata. Esse tipo de “amizade” tão influente poderia explicar o destaque

de notícias e anúncios do Curtume Maguary no jornal A Folha do norte, em relação

aos outros jornais paraenses. Também dá margens a interpretações sobre a

51 Silva, 2009.

52 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

Page 63: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

62

presença freqüente de Claude Saunders nas reuniões da Associação Comercial do

Pará.

Ainda sobre os festejos Mario Lavareda nos conta de um segundo

momento, onde ocorriam as festas mais conhecidas de “antigamente”

Tinha a sede do time Maguary, aqui atrás do campo, tem o campo ainda,

mas era do Maguary. Quem tomava conta era Jovelino Santos, que

movimentava a sede. Lá vendia bebida vendia. Arrumava coisa pra tocar

tudo era por conta dele. Esse era que era o festeiro daqui né. Daqui na

frente, bem por aqui era a casa do Zé Rodagem, pai do Riso, sabe que é o

Riso que vai ai pelas casas. Pai dele que era o festejo daqui, o seu Zé

rodagem, não era sede era casa dele. Um pátio grande na frente casa dele.

Eras as festas bem aqui. lá no Curuçambá era o festejo do seu Inácio.

Também era uma casinha com uma frente ajeitadinha um pedacinho, era as

festas La no Curuçambá. Seu Inácio que dava.53

Também nos conta sobre outras festas e brincadeiras o entrevistado

Edivar Silva

Lá tinha cinema, lá tinha corrida de cavalo, lá tinha teatro, lá tinha posto

médico, lá tinha, tinha várias brincadeiras, tinha cede de festas, tinha essas

coisa tudinho tinha lá, ta entendendo, [...] o Açude Maguary, onde hoje fica

o centro de convenção dos idosos, era lá que tinha os lazer todos, lá tinha

muita posso de curtume, se reunião lá os sócios os trabalhadores tudinho,

por que aquilo era tipo uma, tipo uma piscina né54

53 Lavareda, 2009. (Segunda entrevista, 18 de setembro)

54 Silva, 2009

Page 64: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

63

Podemos perceber dessa forma, que o Curtume Maguary contribuiu

também para o lazer e entretenimento dos seus trabalhadores, sem comentar as

comemorações que ocorriam durante o ano, como aniversários, datas

comemorativas, ou quando a fabrica fechava um grande negócio, as festas próprias

do Curtume como a premiação dos melhores funcionários, os melhores maguary's,

entre outras. O proprietário Claude Saunders, fazia questão de demonstrar e

parabenizar aqueles que mais se destacavam, e também comemorar as diversas

datas comemorativas com festejos, sem falar nos dias de lazer oferecidos aos

funcionários do Curtume, no Açude Maguary.

Não podemos afirmar até que ponto todos estes benefícios eram ofertados

de bom grado, pois a pesar de estar parecendo o lugar perfeito de se trabalhar, não

era. Trabalhar com curtição de couros era um trabalho árduo, pesado e nocivo. O

Curtume Maguary curtia couro a cromo “o único curtume do Pará, único que curtia

couro a cromo, mandava pra toda parte, todo canto do mundo, mais pro ceará. Foi o

primeiro curtume do Pará que curtia couro a cromo” Pois por trabalhar com técnicas

de manipulação química, o manejo e contato com esse tipo de material a longo

prazo, se tornava prejudicial a saúde.

Page 65: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

64

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho buscou, a partir das notas dos periódicos,

levantamento bibliográfico e principalmente entrevistas orais, entender as

representações e memórias de pessoas comuns acerca de uma fábrica de couros e

sua importância na formação de uma sociedade nas primeiras décadas do século

XX. Tal período foi tratado contemporaneamente, tendo por base de construção de

análise, os fatos, casos e lembranças narrados por vários sujeitos. Buscou-se tecer,

através das relações entre patrões e operários, a compreensão da forma pela qual

se dá esta contribuição da fábrica na construção de relações sócio-culturais que se

consolidam na área em questão trabalhada: A Vila do Maguary e sua inserção no

município de Ananindeua. Foram analisadas as regras de condutas e posturas,

obrigatoriamente a serem cumpridas, transpondo-se as fronteiras trabalhistas e

inserindo-se nas relações sociais.

Pretendemos também, analisar no presente trabalho uma nova

perspectiva sobre o histórico das origens da cidade, através da construção de

memórias. Portanto, percebemos que havia, e/ou ainda há, uma versão antiquada,

ligada a estereótipos depreciativos de um histórico submetido a relações de

submissão entre a cidade de Ananindeua e a capital do estado Belém. Com o

objetivo de tentar desconstruir essa história de sujeição, nos baseamo-nos em dados

históricos, fornecidos pelas fontes, no intuito de dar visibilidade ao caráter autônomo

e particular do município como uma cidade com seu ritmo de desenvolvimento

próprio, elementos sócio-culturais específicos e principalmente, provedores de

relações mútuas e de negociações entre as cidades vizinhas. Possibilitando, talvez,

a desconstrução de uma ultrapassada e depreciativa visão anterior que se tinha

sobre o município e sua sociedade.

No que tange essas relações e suas construções específicas da

sociedade, demonstramos através do presente trabalho, a significativa contribuição

do Curtume Maguary, na formação desta sociedade e dos elementos sócias que os

norteiam. A presença do Curtume se fez de fundamental importância nestas

Page 66: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

65

construções, tanto como elemento fomentador de crenças, hábitos e costumes.

Como difusor dos elementos econômicos, políticos e sociais desta sociedade. Para

além da contribuição econômica e urbanística, no que se refere à política o Curtume

Maguary também disseminou suas influências, tanto local, como com autoridades

estaduais.

Portanto podemos perceber através da fala dos entrevistados, tamanha

dimensão da contribuição de Claude Saunders, dono da indústria, para a formação

do município. Saunders através do Curtume Maguary, mandou construir as primeiras

estradas que deram acesso a Vila do Maguary, existentes até os dias atuais, as

primeiras igrejas, campos de futebol do município, posto médico, a prefeitura

municipal, primeira escola, o primeiro núcleo urbano, entre diversos outros fatores

culturais e sociais propiciados através da presença do Curtume Maguary na

localidade.

Tamanha contribuição, através da presença desta indústria, confere a

mesma um caráter humanizador, perceptível nos discursos dos entrevistados, como

se a presença da indústria conferisse aos indivíduos dessa sociedade a atribuição

destes benefícios. Tamanha é sua percepção, que o Curtume Maguary, passa a se

tornar caráter identitário na sociedade que ali se encontra. Não por acaso,

frequentemente, os entrevistados se referem ao mesmo como o Curtume fez, o

Curtume mandou fazer, o Curtume deu, o Curtume construiu, etc. Esse caráter

humanizador conferido pelos entrevistados nada mais é do que o reconhecimento

que estes tem sobre a importância e fundamental contribuição do Curtume Maguary

na formação de sua sociedade. E é através da presença do Curtume Maguary, que

estes indivíduos se reconhecem, e se reconhecem no caráter identitários sócio

cultural do município de Ananindeua.

Podemos, portanto, através das análises tecidas sob os discursos dos

entrevistados, nos apropriar desta memória reconstruída, segundo Halbwachs,

coletivamente, para representar esta sociedade como um todo, através dos

elementos reconstruídos por estes entrevistados. Demonstrando através do

discurso, uma perspectiva da reconstrução, e/ou um ângulo de visão sobre a

interpretação dessa sociedade, e do objeto aqui trabalhado, o Curtume Maguary e

Page 67: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

66

sua contribuição na formação da sociedade ananindeuense em seus aspectos mais

amplos, sua construção sócio-cultural.

Este aspecto configura-se em memória que irá, através destas narrativas,

cristalizar-se na memória dos indivíduos desta sociedade e formular, por que não

forjar, uma história do passado. O que pretendemos explorar neste trabalho, é

justamente como se consolida esta memória, coletiva, do passado na formação

histórico-social do município e desta sociedade através da presença do Curtume

Maguary na mesma.

Podemos considerar por fim, que a presença do Curtume Maguary, se

consolidou, não somente como aspecto influenciador, como também, formador

destes elementos sócio-culturais para esta sociedade. Circunscrevendo seus

aspectos políticos, econômicos, folclóricos, sociais e culturais. Onde estes foram

claramente percebidos através das falas dos entrevistados em demonstrar, a

importância do Curtume Maguary para a sociedade Ananindeuense e sua memória

histórica.

Page 68: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

67

REFERÊNCIA BILIOGRAFICA

AGRA, Luciano. A cultura popular no campo da historiografia.[online] 23 de

novembro de 2008. disponível em: < http://www.webartigos.com/articles/11723/1/a-

cultura-popular-no-campo-da-historiografia/pagina1.html >. acesso em 22 de março

de 2009.

ÁLVARO, Ângela Gemaque; PINHEIRO, Alessandro Maia. Informalidade na Região

Metropolitana de Belém: um retrato por gênero. In: XV encontro nacional de estudos

populacionais: Desafios e oportunidades do crescimento zero. Minas Gerais. 2006.

encontrado em: <

http://www.abep.org.br/usuario/GerenciaNavegacao.php?caderno_id=504&nivel=2&t

exto_id=3041 > Acesso em: 25/05/08.

ALVARO, Maria Ângela Gemaque. Memória emblemática: o que os tradicionais nos

contam sobre seu passado? Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação

em Ciências Sociais, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal

do Pará, Belém, 2005.

BARROS, José D'Assunção. O campo da história. Rio de Janeiro: Vozes, 2004.

BLOCH, Marc Leopold Benjamim. Apologia da história, ou, O ofício do historiador

/Marc Bloch. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

BOSI, Ecléa. Cultura de massa e cultura popular: leituras de operárias. Petrópolis -

Rio de Janeiro: Vozes, 2000.

CANCELA, Cristina Donza. A Família em Belém (1930-40). In: ENCONTRO

REGIONAL DE HISTÓRIA - AMAZÔNIA 500 ANOS: HISTÓRIA e PERSPECTIVAS,

2, 2000, Belém. Anais... Belém: ANPUH, 2000.

CANCELA, Cristina Donza. A Família na Amazônia: cotidiano, vivências e

representações. In: REUNIÃO BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA, 22., 2000,

Brasília. Anais eletrônicos ... Brasília, 2000. 1 CD-ROM.

Page 69: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

68

CATENACI, Vivian. Cultura popular: entre a tradição e a transformação. [online]

disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-

88392001000200005&lng=pt&nrm=iso >. v.15, n. 2. Rio de Janeiro, jul./dez. 2001.

Acesso em: 22 de março de 2009.

CARDOSO, Ciro Flamarion e MALERBRA, Jurandir.(orgs.). Representações.

Contribuições a uma debate transdisciplinar. São Paulo: Papirus, 2000.

CHARTIER, Roger. “cultura popular”: revisando um conceito historiográfico. [online]

disponível em: < http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/172.pdf >. v.8, n. 16, 1995.

acesso em: 28 de novembro de 2008.

CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estudos avançados, v.5, nº 11,

jan./abr. 1992. p 173-191.

Del-PRIORE, Mary. História do cotidiano e da vida privada. In: CARDOSO, Ciro

Flamarion, VAINFAS, Ronaldo. (Org.)Domínios da História : ensaios de teoria e

metodologia. Rio de Janeiro: Campus,1997. p 258-282.

GANDON, Tânia Risério d’Almeida. Entre memória e história: tempos múltiplos de

um discurso a muitas vozes. In: Projetos história 22: história e oralidade. São Paulo:

educ. n. 22. junho, 2001.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A,

2005.

HALBWACHS, Maurice. A memória Coletiva. São Paulo: Centauro, 2004

HOGGART, Richard. As utilizações da cultura. Aspectos da vida cultural da classe

trabalhadora, com especiais referências a publicações e divertimentos. Lisboa:

presença, 1973.

Page 70: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

69

HOGGART, Richard. As utilizações da cultura: o antigo cede lugar ao novo. Lisboa:

Presença. v. 2, 1957

LEÂO, Roberto Queiros de. Maguary: Vôo ao seu Passado. Ananindeua, PA: Gráfica

Sagrada Família,1999.

LOBO, Eulália Maria Lahmeyer e STOTZ, Eduardo Navarro. Formação do operário e

movimento operário no Rio de Janeiro, 1870- 1894. São Paulo: Vozes,1985.

MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. São

Paulo: EDUSC, 2002.

MENDES, Gislene Alves. Ananindeua dos trilhos ao asfalto. Belém: Gráfica

salesiano, 2003.

NEVES, Rosa. QUINTELA, Rosângela. CRUZ, Sandra. A política de assistência

social em Belém: Palavra de quem trabalha e reinventa a vida (1997 -2004). vol. 2.

Belém: Paka-tatu, 2004.

PORTELLI, Alessandro. A filosofia e os fatos: narração, interpretação e significado

nas memórias e nas fontes orais. In: tempo. Rio de Janeiro; vol. 1. nº 2, 1996. p.69-

72.

.________________. O massacre de Civitella Val di Chiana (Toscana, 29 de junho

de 1944): mito e política, luto e senso comum. AMADO, Janaína. FERREIRA,

Marieta de Moraes. (orgs.). Usos e abusos da história oral. 4a ed. Rio de Janeiro:

Editora FGV.

RAGO, Margaret. A invenção do cotidiano na metrópole: Sociabilidade e Lazer em

São Paulo, 1900-1950. in: PORTA, Paula. História da cidade de São Paulo. São

Paulo: Paz e terra, v. 3, 2004.

Page 71: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

70

SANTANA, Verônica Neuma; PONTES, Demóstenes Jesus de Lima; BARBOSA,

Jonas da Costa. História do espiritismo no Pará: 100 anos de União Espírita

Paraense. Belém: União Espírita Paraense, 2007.

SANTOS, Fernando Sergio Dumas dos. História de vida e história da cultura. [online]

disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-

59701998000100004&lng=pt&nrm=iso >. v. 5, n. 1. Rio de Janeiro, mar./jun. 1098.

Acesso em: 22 de março de 2009.

SILVA, Marilene de Deus Tavares da. Estudos amazônicos: o Pará em questão.

Belém: Design gráfico. 2003.

THOMPSON, E. P.. “introdução: costumes e cultura” in: --, sobre história: ensaios.

São Paulo: Cia das letras, 1998. p. 13-24.

Page 72: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

71

FONTES

A folha do norte (1912 -1945)

A folha do norte. 09 out. 1922. p.3

______, 01 jan. 1930. p. 3

______, 21 jan. 1930. p. 3

______, 31 jan. 1930. p. 2

______, 08 mai. 1931. p.2

______, 17 mai. 1931. p. 4

______, 13 jul. 1931. p. 3

______, 15 jul. 1931. p. 2

______, 16 jul. 1931. p. 3

______, 26 jul. 1931. p. 2

______, 27 jul. 1931. p. 3

______, 01 ago. 1931. p. 4

______, 27 dez. 1931. p. 3

______, 27 mar. 1932. p. 3

______, 31 mar. 1932. p. 1

______, 14 jun. 1932. p. 2

______, 25 jun. 1932. p. 2

______, 27 jun. 1932. p. 1

______, 29 jun. 1932. p.3

______, 18 mar. 1933. p.2

______, 01 jan. 1936. p.4

______, 04 jan. 1936. p.1

O Liberal(1980-2005)

O Liberal, 04 set. 1989, p. 3

______, 15 set. 1989, p. 4-5.

______, 04 mai. 2003. p. 3

______, fascículos jornal dos bairros. 02 jul. 1987.

Page 73: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

72

A palavra (1930 – 1945)

A palavra (anúncios de contratação). 18 nov. 1917 pag.3

A província do Pará(1938-1940)

A província do Pará (fascículo especial de aniversário). 1994.

Lei orgânica do município de Ananindeua.

DOÁRIO OFICIAL DO ESTADO. 18-01-1948

Entrevista oral com o Sr. Edivar Barbosa dos Santos. 10/06/2009 as 17:20

Entrevista oral com o Sr. Raimundo Lima de Oliveira. 17/06/2009 as 15:30

Entrevista oral com Benedito Costa. 11 de setembro de 2009, as 09:00

Entrevista oral com Mário Lavareda feita. [Primeira] 11/09/2009, as 11:30

Entrevista oral com Mário Lavareda feita. [Segunda] 18/09/2009, as 10:00

Entrevista oral com Danilo reis. Realizada em: 26 /09/2009 as 08:00

Page 74: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

73

ANEXOS

Estrada BR-318. data:

Indisponível.

Fonte: PENTEADO, Jorge

Moradores antigos na ilha de São

Pedro(Ananindeua)

Data: indisponível.

Fonte: http--biblioteca.ibge.gov.br-

colecao_digital_publicacoes_multiplo.php

link=RBG&titulo=Revista%20Brasileira%

20de%20Geografia%20-%20RBG

Page 75: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

74

Antiga estrutura da Igreja Matriz de

Ananindeua.

Fonte: Disponível em: <

HTTP://biblioteca.ibge.gov.b

r-

colecao_digital_publicacoes

_multiplo.phplink=RBG&titul

o=Revista%20Brasileira%20

de%20Geografia%20-

%20RBG >

Anúncio de endereço e caixa postal

Claude Saunders.

Data da imagem: desconhecida.

Fonte: em livro de registros e comércios do

estado do Pará 1930-1960.

Page 76: História e cultura de Ananindeua - Bruno Costa

75

Emblema oficial do curtume Maguary, Documento de escrituras de ações do Curtume Maguary.

Data: 13/12/1954.

Fonte: Arquivo pessoal de Mário Lavareda.