história do brasil - pré-vestibular - 1834 - revolta dos malês

2
Conflitos na História do Brasil - Império - Período Regencial Revolta dos Malês: 1835 A chamada Revolta dos Malês registrou-se de 25 a 27 de Janeiro de 1835 na cidade de Salvador, capital da então Província da Bahia, no Brasil. Consistiu numa sublevação de caráter racial, de escravos africanos das etnias hauçá e nagô, de religião islâmica, organizados em torno de propostas radicais para libertação dos demais escravos africanos. O termo "malê" deriva do iorubá "imale", designando o muçulmano. Foi rápida e duramente reprimida pelos poderes constituídos. Antecedentes Durante as primeiras décadas do século XIX a situação dos africanos no Brasil, em particular na então Província da Bahia, onde eram mais numerosos, era peculiar. Muitos deles, na condição de escravos, exerciam ofícios rentáveis (alfaiates, carpinteiros, vendedores ambulantes, acendedores de lampião), cujos ganhos eram repassados aos seus senhores. Denominados como negros de ganho, alguns, economizando a pequena parte que seus senhores lhes deixavam, conseguiam mesmo comprar a alforria. Mesmo na condição de libertos, os africanos eram tratados com desprezo e não tinham qualquer possibilidade de ascensão social. Esta situação levava os africanos a revoltarem-se contra os dominadores brancos, registrando-se, entre 1807 e 1830, quase vinte rebeliões naquela Província. Naquela época, a cidade de Salvador tinha cerca de metade de sua população composta por negros escravos ou libertos, das mais variadas culturas e procedências africanas, dentre as quais a islâmica, como os hauçás e os nagôs. Foram eles que protagonizaram a rebelião mais conhecida, a dos "malê", pois este termo designava os negros muçulmanos, que sabiam ler e escrever o árabe. Sendo a maioria deles composta por "negros de ganho", tinham mais liberdade que os escravos das fazendas, podendo circular por toda a cidade com certa facilidade. O plano de ação dos malês Planejada por elementos que possuíam experiência anterior de combate, na África, de maneira geral, os malês propunham o fim do catolicismo - religião que lhes era imposta -, o assassinato e confisco dos bens de todos os brancos e mulatos e a implantação de uma monarquia islâmica, com a escravidão dos não muçulmanos. De acordo com o plano de ataque, assinado por um escravo de nome Mala Abubaker, os revoltosos sairiam da Vitória (atual bairro da Barra, em Salvador) "tomando a terra e matando toda a gente branca". De lá rumariam para a Água dos Meninos e, depois, para Itapagipe, onde se reuniriam ao restante das forças. O passo seguinte seria a invasão dos engenhos do Recôncavo e a libertação dos escravos. A revolta dos Malês Desde 1834, um grupo liderado por Manuel Calafate, Aprígio, Pai Inácio, entre outros, tramou uma conspiração com o objetivo de libertar seus companheiros islâmicos e assassinar os brancos e os mulatos, estes considerados como traidores. Para esse fim, redigiram planos em árabe e arrecadaram dinheiro para comprar armas, elegendo como data para o levante, o dia 25 de Janeiro, um domingo,

Upload: history-historia-geral-e-do-brasil

Post on 06-Jun-2015

1.597 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

Page 1: História do Brasil - Pré-Vestibular - 1834 - Revolta dos Malês

Conflitos na História do Brasil - Império -

Período Regencial

Revolta dos Malês: 1835 A chamada Revolta dos Malês registrou-se de 25 a 27 de Janeiro de 1835 na cidade de Salvador, capital da então Província da Bahia, no Brasil. Consistiu numa sublevação de caráter racial, de escravos africanos das etnias hauçá e nagô, de religião islâmica, organizados em torno de propostas radicais para libertação dos demais escravos africanos. O termo "malê" deriva do iorubá "imale", designando o muçulmano. Foi rápida e duramente reprimida pelos poderes constituídos. Antecedentes Durante as primeiras décadas do século XIX a situação dos africanos no Brasil, em particular na então Província da Bahia, onde eram mais numerosos, era peculiar. Muitos deles, na condição de escravos, exerciam ofícios rentáveis (alfaiates, carpinteiros, vendedores ambulantes, acendedores de lampião), cujos ganhos eram repassados aos seus senhores. Denominados como negros de ganho, alguns, economizando a pequena parte que seus senhores lhes deixavam, conseguiam mesmo comprar a alforria. Mesmo na condição de libertos, os africanos eram tratados com desprezo e não tinham qualquer possibilidade de ascensão social. Esta situação levava os africanos a revoltarem-se contra os dominadores brancos, registrando-se, entre 1807 e 1830, quase vinte rebeliões naquela Província. Naquela época, a cidade de Salvador tinha cerca de metade de sua população composta por negros escravos ou libertos, das mais variadas culturas e procedências africanas, dentre as quais a islâmica, como os hauçás e os nagôs. Foram eles que protagonizaram a rebelião mais conhecida, a dos "malê", pois este termo designava os negros muçulmanos, que sabiam ler e escrever o árabe. Sendo a maioria deles composta por "negros de ganho", tinham mais liberdade que os escravos das fazendas, podendo circular por toda a cidade com certa facilidade. O plano de ação dos malês Planejada por elementos que possuíam experiência anterior de combate, na África, de maneira geral, os malês propunham o fim do catolicismo - religião que lhes era imposta -, o assassinato e confisco dos bens de todos os brancos e mulatos e a implantação de uma monarquia islâmica, com a escravidão dos não muçulmanos. De acordo com o plano de ataque, assinado por um escravo de nome Mala Abubaker, os revoltosos sairiam da Vitória (atual bairro da Barra, em Salvador) "tomando a terra e matando toda a gente branca". De lá rumariam para a Água dos Meninos e, depois, para Itapagipe, onde se reuniriam ao restante das forças. O passo seguinte seria a invasão dos engenhos do Recôncavo e a libertação dos escravos. A revolta dos Malês Desde 1834, um grupo liderado por Manuel Calafate, Aprígio, Pai Inácio, entre outros, tramou uma conspiração com o objetivo de libertar seus companheiros islâmicos e assassinar os brancos e os mulatos, estes considerados como traidores. Para esse fim, redigiram planos em árabe e arrecadaram dinheiro para comprar armas, elegendo como data para o levante, o dia 25 de Janeiro, um domingo,

Page 2: História do Brasil - Pré-Vestibular - 1834 - Revolta dos Malês

quando ocorreria a festa católica em homenagem a Nossa Senhora da Guia, ocasião em que era relaxada a vigilância sobre os escravos. Entre os escravos e os libertos, desde o dia 24, sábado, corriam rumores sobre o levante. Nesse mesmo dia, o liberto Domingos Fortunato, contou o que sabia a sua esposa, Guilhermina Rosa de Souza, mandando um recado para a seu antigo senhor sobre o plano, sem ser considerado. O mesmo o fez Guilhermina, a seu antigo senhor, Souza Velho, e a um vizinho branco, que transmitiu as informações ao Juiz de Paz. Desse modo, as autoridades de Salvador tomaram conhecimento à noite do plano, tomando de imediato as medidas para a repressão. Formadas as patrulhas, estas passaram a vasculhar as casas de africanos conhecidas na cidade. Em uma delas, na loja de um sobrado na ladeira da praça, estavam reunidos de cinqüenta a sessenta indivíduos, ultimando os preparativos para a revolta. Antes que a patrulha lograsse arrombar a porta, os revoltosos atacaram aos gritos de "mata soldado" e, conseguindo romper o cerco, evadiram-se em diversos grupos. Ainda durante a madrugada do dia 25 um grupo tentou tomar de assalto a Cadeia Municipal, com a intenção de libertar Pacífico Licutan, um dos líderes malês. Sem conseguir o seu intento, o grupo foi dispersado pelos soldados. Com a agitação se alastrando em algumas horas pelas ruas da cidade, os revoltosos foram se agrupando na praça do Teatro (atual praça Castro Alves). A repressão pelas autoridades Ao mesmo tempo, as autoridades também se organizaram com rapidez, conseguindo repelir os ataques aos quartéis de Salvador, colocando em fuga os revoltosos. Ao procurar sair da cidade, um grupo de mais de 500 revoltosos, entre escravos e libertos, foi barrado na vizinhança do Quartel de Cavalaria em Água dos Meninos, onde se deram os combates decisivos, vencidos pelas forças oficiais, mais numerosas e bem armadas. No confronto morreram sete integrantes das tropas oficiais e setenta do lado dos revoltosos. Duzentos e oitenta e um, entre escravos e libertos, foram detidos no Forte do Mar e levados aos tribunais. Suas condenações variaram entre a pena de morte para quatro dos principais líderes, os trabalhos forçados, o degredo e os açoites. Entre os pertences dos líderes foram encontrados livros em árabe e orações muçulmanas. À época, os africanos foram proibidos de circular à noite pelas ruas da capital e de praticar as suas cerimônias religiosas típicas. Apesar de rapidamente controlada, a Revolta dos Malês serviu para demonstrar à s autoridades e à s elites o potencial de contestação e rebelião que envolvia a manutenção do regime escravocrata, ameaça que esteve sempre presente durante todo o Período Regencial e se estendeu pelo Governo pessoal de D. Pedro II.