história do açucar

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INTRODUÇÃO A doçura sempre foi uma característica popular dos alimen- tos. O mel, provavelmente, foi a primeira fonte de açúcar usada pelo homem. Muitas plantas têm açúcar nos seus tecidos, mas apenas a cana-de-açúcar, Saccharum officinarum, e a beterraba, Beta vulgaris, são usadas para extrair açúcar em quantidades comerciais. Em ambos os casos, o açúcar é a sacarose. O uso do açúcar de cana já era comum em 1700, enquanto o açúcar de beterraba foi extraído pela primeira vez em 1798 e a indústria do açúcar de beterraba se tornou importante na França e na diversas civilizações pelas substâncias doces. Felizmente, a natureza as oferece em profusão. A mais antiga, junto com as próprias plantas e frutas, é certa- mente o mel. A mitologia já celebrava suas virtudes. Os deuses eram grandes apreciadores de mel. Ele possuía múl- tiplas virtudes, como de prolongar a vida e preservar a decomposição. O mel também servia para fabricar o hidromel, a bebida dos deuses. Por ser um produto relativamente raro, seu consumo era reservado para a elite. Na Grécia Antiga, o preço de meio litro de mel correspon- dia ao preço de um carneiro. No Antigo Testamento, a expressão “Terra do leite e do mel” é encontrada oito vezes, para designar a Terra Prometida, a Terra do povo de Israel. Mais de oito mil anos a.C., o homem já conhecia uma gramínea herbácea, com forte concentração de açúcar, a cana-de-açúcar. Originária da Melanésia, e mais exatamente da Nova Guiné, onde crescia no estado de planta silvestre e ornamental, a cana-de-açúcar foi se disseminando em vários lugares do Sul do Oceano Pacífico, na Indochina, no Arquipélago da Malásia e no Bengala, sendo certo o seu aparecimento como planta produtora de açúcar na Índia tropical. No início, o homem contentava-se em mastigar seu caule, mas existem boas razões de se pensar que os chineses e os indianos sabiam há muito tempo como usar a seiva da cana-de-açúcar que crescia em seus países como planta parasitária. A lenda ainda conta que os asiáticos conheciam desde os tempos mais remotos como fabricar açúcar cristalizado. O açúcar de cana é, de fato, de fácil extração e conservação. Alguns livros mencionam que os hindus foram os primeiros a espremer os caules de cana-de-açúcar e a proceder à evaporação, em fogos abertos, do suco assim recolhido. Eles obtinham assim uma espessa massa amarronzada, na qual se formavam cristais quando a mes- ma resfriava. Eles passariam a chamar essa massa cristalizada de sarkara. O ter- mo sânscrito sarkara, que significa grão, deu origem a todas as versões da palavra açúcar nas línguas indo-européias: sukkar em árabe, saccharum em latim, zucchero em italiano, seker em turco, zucker em alemão, e sugar em inglês. Os hindus também descobriram que o açúcar permite conservar as frutas. Em torno de 500 a.C., por ocasião das expedições do rei da Pérsia Dárius, o Grande (522-486 a.C.) pelo rio Hindus, os persas descobriram e apreciaram imediatamente essa cana que dava açú- car sem a ajuda das abelhas. Os persas trouxeram esse vegetal de volta e desen- volveram a sua cultura em toda a faixa litorânea do Mediterrânea Oriental, mo- nopolizando cuidadosamente seu culti- vo e reservando-se o direito de exportar o produto acabado. Mas, as invasões, as conquistas e o desenvolvimento do comércio, tanto por mar quanto pelas caravanas, contribuíram para expandir a cultura da cana-de-açúcar do rio Hindus até o Mar Negro, e do Golfo Pérsico até os confins do Saara. Em torno de 600 d.C., os Persas melhoraram o refino da massa cristalizada e a moldaram, pela primeira vez, em formas cônicas, dando-lhe o formato do atual pão de açúcar, batizado na época de Tabarseth. No século VII, os árabes in- vadiram a Pérsia, descobriram a cana-de-açúcar e, por sua vez, a implantaram nos países mediterrâneos que ocupavam, a saber, Egito, Palestina, Rodes, Chipre, África do Sul, Sul da Espanha e Síria. Aperfeiçoaram os processos de purificação do xarope e conseguiram obter um líquido marrom escuro, pegajoso, que chamaram de Kurat al Milh. É esse termo que está na origem da palavra caramelo. Os egípcios melhora- ram ainda mais a qualidade dos xaropes, filtrando-os com cal. Durante séculos, o açúcar não saiu do Mundo Árabe. Foram os cruzados que, a partir do século XII, levaram o açúcar para a Europa cristã: no meio das numerosas especiarias raras e desconhe- cidas no Ocidente, que eles trouxeram da Terra Santa, estava o açúcar branco! Assim, na Europa, essa nova “es- peciaria” era vendida, assim como as outras, nos apoticários, por preços elevados. Durante muito tempo foi con- siderado como remédio. Recebeu nomes insólitos e charmosos, tais como pão de açúcar, açúcar em pedra ou, ainda, em rocha. Seu comércio foi muito ativo. Foi Veneza que assegurou o abasteci- mento a partir dos países do Próximo Oriente e das Índias Orientais; a cidade tornou-se a capital açucareira da Europa e desenvolveu, paralelamente, a indús- tria do refino. Pouco a pouco o cultivo da cana-de- açúcar se espalhou no mundo cristão, O açúcar é um componente importante na formulação de vários alimentos. Fornece doçura e sabor, assim como tem efeito na cor, textura, expansão e aparência geral do produto. Contribui, ainda, no valor nutricional como fornecedor de energia. Nos processos de fermentação, serve de alimento à levedura. Alemanha. Napoleão encorajou seu desenvolvimento como um meio de boicotar o açúcar de cana vindo das colônias britânicas. O açúcar e o cacau foram as primeiras commodities a serem processadas através de métodos industriais. O açúcar branco começou a ser processado em aproxima- damente 1850. No estado refinado, há muito pouca diferença entre a sacarose extraída da cana e da beterraba. Outros tipos de açúcares são obtidos a partir do processa- mento de amidos. Na quebra dos amidos ocorre a formação de açúcares, a maioria deles apresentando um certo grau de doçura. Esta quebra acontece naturalmente através da ação enzimática; é assim que se obtém o malte, pela germinação dos cereais. A tecnologia de conversão dos amidos é hoje muito desenvolvida e, pela combinação de ação enzimática e hidrólise ácida, pode-se obter açúcar e misturas de carboi- dratos com graus de doçura variados. A ORIGEM DO AÇÚCAR O homem percebe quatro sabores: ácido, amargo, salgado e doce. O sabor doce é o que se descobre primeiro, logo após o nascimento, por meio do leite materno. Na história da humanidade, pode-se notar o interesse das 31 ADITIVOS & INGREDIENTES 30 ADITIVOS & INGREDIENTES AÇÚCAR AÇÚCAR A E V O L U Ç Ã O D O A Ç Ú C A R

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História do Açucar

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  • IntroduoA doura sempre foi uma caracterstica popular dos alimen-

    tos. O mel, provavelmente, foi a primeira fonte de acar usada pelo homem. Muitas plantas tm acar nos seus tecidos, mas apenas a cana-de-acar, Saccharum officinarum, e a beterraba, Beta vulgaris, so usadas para extrair acar em quantidades comerciais. Em ambos os casos, o acar a sacarose. O uso do acar de cana j era comum em 1700, enquanto o acar de beterraba foi extrado pela primeira vez em 1798 e a indstria do acar de beterraba se tornou importante na Frana e na

    diversas civilizaes pelas substncias doces. Felizmente, a natureza as oferece em profuso. A mais antiga, junto com as prprias plantas e frutas, certa-mente o mel. A mitologia j celebrava suas virtudes. Os deuses eram grandes apreciadores de mel. Ele possua ml-tiplas virtudes, como de prolongar a vida e preservar a decomposio. O mel tambm servia para fabricar o hidromel, a bebida dos deuses. Por ser um produto

    relativamente raro, seu consumo era reservado para a elite. Na Grcia Antiga, o preo de meio litro de mel correspon-dia ao preo de um carneiro. No Antigo Testamento, a expresso Terra do leite e do mel encontrada oito vezes, para designar a Terra Prometida, a Terra do povo de Israel.

    Mais de oito mil anos a.C., o homem j conhecia uma gramnea herbcea, com forte concentrao de acar, a cana-de-acar. Originria da Melansia, e mais exatamente da Nova Guin, onde crescia no estado de planta silvestre e ornamental, a cana-de-acar foi se disseminando em vrios lugares do Sul do Oceano Pacfico, na Indochina, no Arquiplago da Malsia e no Bengala, sendo certo o seu aparecimento como planta produtora de acar na ndia tropical.

    No incio, o homem contentava-se em mastigar seu caule, mas existem

    boas razes de se pensar que os chineses e os indianos sabiam h muito tempo como usar a seiva da cana-de-acar que crescia em seus pases como planta parasitria. A lenda ainda conta que os asiticos conheciam desde os tempos mais remotos como fabricar acar cristalizado. O acar de cana , de fato, de fcil extrao e conservao.

    Alguns livros mencionam que os hindus foram os primeiros a espremer

    os caules de cana-de-acar e a proceder evaporao, em fogos abertos, do suco assim recolhido. Eles obtinham assim uma espessa massa amarronzada, na qual se formavam cristais quando a mes-ma resfriava. Eles passariam a chamar essa massa cristalizada de sarkara. O ter-mo snscrito sarkara, que significa gro, deu origem a todas as verses da palavra acar nas lnguas indo-europias: sukkar em rabe, saccharum em latim, zucchero em italiano, seker em turco, zucker em alemo, e sugar em ingls. Os hindus tambm descobriram que o acar permite conservar as frutas.

    Em torno de 500 a.C., por ocasio das expedies do rei da Prsia Drius, o Grande (522-486 a.C.) pelo rio Hindus, os persas descobriram e apreciaram imediatamente essa cana que dava a-car sem a ajuda das abelhas. Os persas trouxeram esse vegetal de volta e desen-volveram a sua cultura em toda a faixa

    litornea do Mediterrnea Oriental, mo-nopolizando cuidadosamente seu culti-vo e reservando-se o direito de exportar o produto acabado. Mas, as invases, as conquistas e o desenvolvimento do comrcio, tanto por mar quanto pelas caravanas, contriburam para expandir a cultura da cana-de-acar do rio Hindus at o Mar Negro, e do Golfo Prsico at os confins do Saara.

    Em torno de 600 d.C., os Persas melhoraram o refino da massa cristalizada e a moldaram, pela primeira vez, em formas cnicas, dando-lhe o formato do atual po de acar, batizado na poca de Tabarseth.

    No sculo VII, os rabes in-vadiram a Prsia, descobriram a cana-de-acar e, por sua vez, a implantaram nos pases mediterrneos que ocupavam, a saber, Egito, Palestina, Rodes, Chipre, frica do Sul, Sul da Espanha e Sria. Aperfeioaram os processos de purificao do xarope e conseguiram obter um lquido marrom escuro, pegajoso, que chamaram de Kurat al Milh. esse termo que est na origem da palavra caramelo. Os egpcios melhora-ram ainda mais a qualidade dos xaropes, filtrando-os com cal.

    Durante sculos, o acar no saiu do Mundo rabe. Foram os cruzados que, a partir do sculo XII, levaram o acar para a Europa crist: no meio das numerosas especiarias raras e desconhe-cidas no Ocidente, que eles trouxeram da Terra Santa, estava o acar branco!

    Assim, na Europa, essa nova es-peciaria era vendida, assim como as outras, nos apoticrios, por preos elevados. Durante muito tempo foi con-siderado como remdio. Recebeu nomes inslitos e charmosos, tais como po de acar, acar em pedra ou, ainda, em rocha. Seu comrcio foi muito ativo. Foi Veneza que assegurou o abasteci-mento a partir dos pases do Prximo Oriente e das ndias Orientais; a cidade tornou-se a capital aucareira da Europa e desenvolveu, paralelamente, a inds-tria do refino.

    Pouco a pouco o cultivo da cana-de- acar se espalhou no mundo cristo,

    O acar um componente importante na formulao de vrios alimentos. Fornece doura e sabor, assim como tem efeito na cor, textura, expanso e aparncia geral do produto. Contribui, ainda, no valor nutricional como fornecedor de energia. Nos processos de fermentao, serve de alimento levedura.

    Alemanha. Napoleo encorajou seu desenvolvimento como um meio de boicotar o acar de cana vindo das colnias britnicas. O acar e o cacau foram as primeiras commodities a serem processadas atravs de mtodos industriais.

    O acar branco comeou a ser processado em aproxima-damente 1850. No estado refinado, h muito pouca diferena entre a sacarose extrada da cana e da beterraba.

    Outros tipos de acares so obtidos a partir do processa-mento de amidos. Na quebra dos amidos ocorre a formao de acares, a maioria deles apresentando um certo grau de doura. Esta quebra acontece naturalmente atravs da ao enzimtica; assim que se obtm o malte, pela germinao dos cereais. A tecnologia de converso dos amidos hoje muito desenvolvida e, pela combinao de ao enzimtica e hidrlise cida, pode-se obter acar e misturas de carboi-dratos com graus de doura variados.

    A orIgem do AcAr

    O homem percebe quatro sabores: cido, amargo, salgado e doce. O sabor doce o que se descobre primeiro, logo aps o nascimento, por meio do leite materno.

    Na histria da humanidade, pode-se notar o interesse das

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    A EVOLUO

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  • principalmente, na Espanha e Portugal, na ilha da Madeira e nos Aores, onde se aprendeu rapidamente a aclimat-lo. Essa nova produo veio a concorrer com aquela do Oriente.

    Em 1497, Vasco da Gama (1468-1524) passou pelo Cabo da Boa Espe-rana, abrindo assim as portas das ndias aos navegadores portugueses. Veneza perdeu, ento, o monoplio do comrcio do acar e se viu suplantada por Lisboa que, por sua vez, transformou-se na capital do refino do acar.

    No Norte da Europa foi a cidade de Bruges que, na Idade Mdia, foi o centro aucareiro. Mas no sculo XVI, com o assoreamento do esturio do rio Zwin, que ligava a cidade ao mar, sua riqueza econmica e poltica foi acabando, e a cidade caiu num estado de letargia, per-dendo sua importncia para Anturpia. Depois, durante as guerras religiosas, o centro do comrcio e refino do acar transferiu-se para Amsterd, porm a prosperidade dessa cidade holandesa viria a declinar com o incio das guerras martimas contra a Inglaterra.

    No fim do sculo XV, Cristvo Colombo (1451-1506) descobriu a Amrica. Logo na sua segunda viagem, introduziu o cultivo da cana-de-acar em So Domingos. Foi o primeiro e de-cisivo passo na propagao dessa cultura em todos os pases que viriam a ser co-

    lonizados pelos espanhis e pelos portugueses, e depois pelos franceses e os ingle-ses. Numerosas plantaes desenvolveram-se muito rapidamente no Brasil, em Cuba, no Mxico e nas An-tilhas, para ganhar depois toda a Amrica do Sul. Por outro lado, os colonos holandeses introduziram a cultura intensiva da cana- de-acar nas ilhas do Oce-ano ndico e da Indonsia. A cana-de-acar acabou assim seu priplo de volta ao mundo, implantando-se tambm nas Filipinas, no Hava e na Oceania.

    At o alvorecer do s-culo XIX, todas as naes europias esforaram-se para assegurar sua pr-pria produo aucareira atravs de suas colnias. Asseguraram o comrcio e o refino deste gnero alimentcio e numerosas refinarias nasceram em todos os grandes portos europeus. O consumo de acar cresceu sem parar e seu preo foi caindo progressivamente.

    A notoriedade deste novo produto foi assegurada pelos marinheiros e pe-los comerciantes das ilhas longnquas

    que, de volta a terra natal, consumiam todos os produtos exticos, acar, caf, cacau, e contribuam assim ao seu importante consumo. A nova moda do caf e do chocolate ajudou a desenvolver ainda mais o consumo do acar, que triplicou em um sculo. O prprio Voltaire escreveu: O caf deve ser preto como a noite, quente como o inferno e doce como o amor.

    Os eventos polticos do final do sculo XVIII e do incio do sculo XIX - a revoluo france-sa e os conflitos internacionais que a mesma gerou, seguido pelo Bloqueio Continental institudo por Napoleo, em 1806 - paralisaram o comrcio do acar de cana em todo o continente europeu e, parti-

    cularmente, na Frana. Em 1808, no se encontrava mais o famoso acar extico em Paris e seu preo tornou-se exorbitante. As autoridades francesas estimularam a procura de sucedneos. Frutas, mel, uvas, razes, tudo foi expe-rimentado.

    As pesquisas iniciadas no incio do sculo XVII pelo agrnomo francs Oli-vier de Serres (1539-1619), atestando a presena de acar cristalizvel nas beterrabas, seguidos bem mais tarde, em 1745, pelos trabalhos do qumico berlinense Andreas Sigismund Marggraf (1709-1782), que conseguiu extrair e solidificar o suco desta planta, passaram a ter uma importncia considervel. Em 1747, provou que o acar de cana e de beterraba so idnticos. Franz Karl Achard (1753-1821), aluno de Marggraf, continuou suas pesquisas e, em 1798, produziu o primeiro acar de beterraba. Aps melhorias na cul-tura da beterraba, em 1802, montou uma primeira fbrica experimental de acar de beterraba, na Silsia, com o apoio financeiro de Frederico Guilherme III (1770-1840). Os resulta-dos apresentaram-se to satisfatrios que vrias usinas comearam a aparecer na Silsia e na Bohmia. A notoriedade da descoberta ultrapassou as fronteiras

    e a Frana napolenica vislumbrou uma soluo para seus problemas de abaste-cimento. Aps cinco anos de pacientes pesquisas, Benjamin Delessert (1773-1847) conseguiu produzir, em 1812, pes de acar de beterraba, refinados graas a novos processos de depurao. Napoleo Bonaparte entendeu imedia-tamente o futuro dessa nova indstria. Por decreto, ordenou que milhares de hectares fossem consagrados a cultura da beterraba aucareira e concedeu favores aos agricultores que aceitaram pratic-la.

    No fim do Imprio, mais de 200 fbricas de acar operavam na Frana, produzindo um total de 2.000 a 3.000 toneladas de acar. Com a queda do Imperador Napoleo Bonaparte (1814), o acar das colnias, cujos estoques foram acumulando-se, chegou em massa nos portos franceses e o acar local, em alguns dias, perdeu 75% de seu valor. Um grande nmero de fbricas, arruinadas, foram obrigadas a fechar suas portas, aps ter passado por im-portantes perdas.

    Em 1848, a abolio da escravido gerou uma forte subida do preo do acar de cana e uma diminuio da pro-duo. Com isso, a indstria do acar de beterraba tornou-se rentvel. Pouco a pouco foi fortalecendo sua posio por melhorias tcnicas, pela constru-o de grandes unidades de produo e pela seleo das melhores espcies de beterrabas. Em 1875, a Frana produ-zia 450.000 toneladas de acar e foi o primeiro produtor europeu, seguido pela Alemanha. Em 1900, o acar de beterraba representava 53% do consumo mundial. A Primeira Guerra Mundial, de 1914/18, transformou as grandes plantaes de beterrabas em campos de batalha e, a produo na Frana e na Blgica para a participao do acar de beterraba no consumo mundial caiu para 26%. Nos anos de 1950 subiu de novo para atingir cerca de 40% e, em 1995, no representava mais de 30%.

    A cana-de-acar foi trazida para o Brasil em 1502. Com mudas de cana da ilha da Madeira, o militar portugus Martim Afonso de Souza (1500-1571), em 1533, fundou na Capitania de So Vicente, prximo cidade de San-tos, Estado de So Paulo, o primeiro

    engenho para produzir acar, com o nome de So Jorge dos Erasmos.

    Novas pequenas plantaes de cana foram introduzidas em vrias regies do litoral brasileiro, passando o acar a ser produzido nos Estados do Rio de Janeiro, Bahia, Esprito Santo, Sergipe e Alagoas. De todas essas regies, a que mais se desenvolveu foi a de Pernambu-co, chegando a ter em fins do sculo XVI cerca de 70 engenhos. Nessa regio, foi introduzida por Duarte Coelho, a quem foi doada a capitania em 1534. O primeiro engenho regular de acar le-vantado em Pernambuco foi o Engenho Nossa Senhora da Ajuda, de Jernimo de Albuquerque, nos arredores de Olinda. A primeira usina foi inaugurada em 24 de janeiro de 1887, equipada com maquinismos da Casa Mariolle Pinguet, da Frana: a usina mo-delo da Colnia Orfanolgica Isabel, com capacidade para produzir cinco toneladas de acar por dia.

    O engenho de produo canavieira propriamente dito compreendia vrias edifica-es, cada uma delas desti-nadas a uma fase do proces-samento da cana. Na Casa da Moenda, a cana era esmagada em cilindros movidos por uma roda dgua ou por parelhas de bois, obtendo o caldo da cana. Depois, os escravos transportavam o caldo para a Casa das Fornalhas, a fim de ser concentrado em grandes tachos de cobre e transferido para as formas, onde o acar cristalizava. J na Casa de Purgar, a massa era purificada e dividida em pedaos chamados pes-de-acar.

    Durante o perodo colonial, sculo XVII, a indstria do acar sofreu um grande desenvolvimento. Os holande-ses, portadores de tecnologia de ponta, deram nessa poca um grande impulso fabricao do acar. As melhores condies de clima e solo do Nordeste brasileiro e a maior proximidade com o continente europeu favoreceram o de-senvolvimento do acar naquela regio.

    No sculo XVIII, a indstria aucarei-ra brasileira declinou, principalmente, porque os holandeses, expulsos do Bra-sil, imigraram para o Suriname e as An-tilhas, constituindo fortes concorrentes

    aos produtores brasileiros. O interesse dos paulistas e mineiros pela minerao (sculo XVIII), o crescimento da inds-tria da beterraba (sculo XIX), o interes-se pela cultura do caf (sculo XX), os problemas poltico-sociais, decorrentes da invaso estrangeira (sculo XVIII) e das grandes guerras mundiais (sculo XX), a incidncia de pragas e molstias (sculo XX) e os baixos preos, fizeram com que a produo de acar no Brasil, nesses ltimos sculos, passasse por diversas fases de desenvolvimento, com altos e baixos.

    Na busca de novas fontes de energia como alternativa crise do petrleo na dcada de 70, o governo brasileiro passou a investir grandes quantias no

    cultivo da cana-de-acar, a fim de se obter o lcool a partir da fermentao da sacarose. Com isso, a indstria aucareira se viu beneficiada, devido a investimentos na modernizao dos en-genhos, compra de novos equipamentos, melhoria do processo, etc.

    A molculA de AcAr

    O conhecimento ntimo da molcula que constitui o acar de cana ou de be-terraba importante por vrias razes. De fato, permite melhor compreender suas propriedades (qumicas, fsicas e biolgicas) no intuito de aprimorar suas aplicaes industriais: reatividade com outros compostos, velocidade de crista-lizao, modelizao do sabor doce, etc.

    Desde o sculo XIX, a molcu-la de acar foi objeto de numero-

    Saccharum officinarum - cana-de-acar

    Beta vulgaris - Beterraba

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  • sas pesquisas. Fcil de obter, puro, barato e no txico, o acar foi amplamente pesquisa-do por qumicos, tais como Eugne-Melchior Pligot (1811-1890) e Justus von Liebig (1803-1873) que, nos anos de 1830, mostraram que o acar composto de carbono (C), hidrognio (H) e oxignio (O). Sua frmula qumica bruta C12H22O11 com massa molar de 342,297 g/mol.

    No fim do sculo XIX, o qumico alemo Hermann Emil Fischer (1852-1919), prmio Nobel de qumica em 1902, props uma representao do acar com os ciclos glicose e frutose que o constituem. Foi somente 30 anos mais tarde que a equipe do qumico britnico Sir Walter Norman Haworth (1883-1950), prmio Nobel de qumica em 1937, confirmou esses trabalhos e apresentou uma imagem da molcula de acar em perspectiva. Essa apre-sentao muito didtica foi amplamente usada e propagada pelo Prof. William Ward Pigman, nos anos de 1950, e ainda se encontra, hoje em dia, nos livros de bioqumica.

    Desde os anos de 1960, interessa-se a conformao da sacarose, ou seja, no arranjo tri-dimensional de seus elementos constitutivos. Assim, vrios trabalhos confirmaram a existncia de ligaes H no interior da molcula de sacarose.

    Atualmente, estuda-se a sua topo-grafia para poder entender, entre outras coisas, como a molcula de acar integra-se aos receptores gustativos ou, de forma mais simples, porque o acar doce!

    Em resumo, a sacarose constituda de duas molculas, uma de frutose e uma de glicose; em outras palavras, um dissacardeo, ou seja, um composto formado pela unio de dois monossacar-deos: a glicose e a frutose. Seu nome ofi-cial e internacional bastante simples: d-glicopiranosil-d-frutofuranosdeo.

    Um cristal um slido constitudo de ons, tomos ou de molculas, organi-zados segundo um plano regular e repe-

    titivo. Assim, esse material apresenta ca-ractersticas particulares, como a forma e a cor. No estado cristalizado, o acar no apresenta nenhuma caracterstica particular, nem odor, nem cor. Crista-liza sob a forma de um prisma anidro de 15 facetas e cujos eixos de simetria so ligeiramente inclinados. Porm, esses cristais perfeitos so raramente encontrados. Em um pequeno gro de acar observado com uma lupa, ou em um cristal gigante, observa-se somente 8 a 10 facetas. O acar comercializado puro a mais de 99,8%. Os 0,2% res-tantes so constitudos essencialmente de gua, de minerais em quantidades diminutas e de glicose.

    Um cristal de acar esquentado a seco comea a derreter em torno de 160C a 170C, mas seu ponto de fuso exatamente 186C. Acima desta tem-peratura, comea a formar compostos caramelizados.

    FABrIcAo do AcAr de cAnA e de BeterrABA

    O processo de fabricao de acar de cana, se inicia com a lavagem da cana, para remover a terra e os detritos, para ser depois picada e esmagada em moendas, na preparao para a remoo do caldo. O caldo extrado pela passa-gem da cana esmagada atravs de uma srie de moendas. Para macerar a cana e auxiliar a extrao possvel adicio-nar gua ou caldo diludo s moendas. Extraem-se cerca de 93% do caldo da cana. O bagao ou queimado como combustvel na usina ou serve para fabri-

    car papel, compensado ou material isolante.

    O caldo coado, para remover as impu-rezas grossas e tratado por cal para coagular parte da matria coloi-dal, precipitar certas impurezas e modificar o pH. Adiciona-se um pouco de cido fosfri-co, pois os caldos que no contm um pouco de fosfato no so bem clarificados. A mistura aquecida com vapor

    de gua alta presso e decantada em grandes tanques (decantadores do caldo) ou em decantadores ou espessa-dores contnuos.

    Para recuperar o acar dos lodos decantados usam-se filtros a vcuo, con-tnuos, a tambor rotatrio, ou prensas de quadro. A torta atinge de 1% a 4% do peso da cana utilizada e usada como adubo. .

    O filtrado, um caldo clarificado com elevado teor de cal, contm em torno de 85% de gua. , ento, evaporado at aproximadamente 40% de gua, em eva-poradores a triplo ou a qudruplo efeito, tornando-se um xarope grosso, amare-lado. O xarope resultante lanado no primeiro estgio de um evaporador a vcuo de trs efeitos, onde atinge um determinado grau de supersaturao. Adicionam-se ncleos de acar cristal (semeadura) e, pela adio de xarope grosso e evaporao controlada, os cristais crescem at o tamanho desejado nesses cristalizadores. Nesse ponto, o vcuo est quase cheio de cristais de acar, com cerca de 10% de gua. A mistura de xarope e cristais (a massa co-zida) lanada em um cristalizador, que consiste em um tanque horizontal com agitao, dispondo de serpentinas de ar-refecimento. Nesse cristalizador h uma deposio adicional de sacarose sobre os cristais j formados, e a cristalizao est completa. A massa cozida ento centrifugada para remover o xarope. Os cristais so de acar demerara de boa qualidade e o xarope reciclado para obteno de uma ou mais cristalizaes. O lquido residual, depois da reciclagem, conhecido como melao.

    que provoca a formao de espuma, que sobe superfcie, arrastando o fosfato triclcico gelatinoso e as impurezas. O licor clarificado filtrado, se for preciso, ou sujeito a uma clarificao mecnica adicional, e enviado para as unidades de alvejamento. Esse processo reduz a matria corada presente em 25% a 45%, o que reduz bastante o porte dos clarificadores subsequentes.

    No sistema a carbonatao, adicio-na-se ao magma de acar dixido de carbono proveniente de fumos de cha-min depurados, com o que se precipita o carbonato de clcio. O precipitado arrasta mais de 60% da matria corada presente e posteriormente removido por filtrao.

    O licor efluente clarificado, livre de materiais insolveis, ainda tem grande quantidade de impurezas dissolvidas. Essas impurezas so removidas por percolao atravs de filtros de carvo. A percolao efetuada a 82C, e o produto inicial um xarope claro, cris-

    O acar demerara (ligeiramente amarelado), com aproximadamente 97,8% de sacarose, enviado refinaria de acar. Os melaos so usados como matria de fermentao ctrica e outras; antigamente, usava-se muito como fon-te de carboidratos para rao de gado.

    O acar demerara entregue a granel nas refinarias. A primeira etapa da refinao a afinao, na qual os cristais do acar so tratados por um xarope concentrado (60 a 80 Brix), a fim de ser removido o filme aderente de mel. Esse xarope concentrado dissolve pouco os cristais, mas amolece ou dissolve o revestimento de impurezas. A operao efetuada em misturadores homoge-neizadores, que so transportadores- parafusos robustos, providos de palhetas misturadoras resistentes. O xarope removido em uma centrfuga (turbina) e a torta de acar borrifada com gua. Os cristais so lanados em um tacho, onde so dissolvidos por cerca da meta-de do seu peso em gua quente, parte

    da qual gua com acar proveniente dos filtros-prensa. O xarope das turbinas dividido, sendo uma parte diluda e reutilizada como xarope do misturador, e o restante diludo em cerca de 54 Brix e enviado ou unidade de clarificao e filtrao, ou para os tachos para nova fuso. O acar derretido e lavado (nas refinarias, o derretido quer dizer dissol-vido) sofre ento um processo conheci-do como clarificao. O processo pode ser mecnico ou qumico. A clarificao mecnica utiliza a adio de diatomita ou material semelhante inerte; o pH ento ajustado e a mistura filtrada em uma prensa. Este sistema origina uma soluo absolutamente clara, sem melhorar a colorao, e um processo essencialmente descontnuo.

    O sistema qumico usa um clarifica-dor a espuma ou um sistema a carbona-tao. O licor tratado a espuma, con-tendo bolhas de ar injetadas, entra no clarificador a aproximadamente 65C. No clarificador, o licor aquecido, o

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  • talino como gua. A experincia indica ao operador quando dirigir o efluente do filtro de carvo para um tanque de xarope de qualidade inferior.

    Tambm se usa um processo cont-nuo de clarificao e alvejamento. Os xaropes (mis) dos filtros de carvo so bombeados para uma casa de mis, onde so classificados de acordo com a pureza e concentrao: pureza de 99 a 99,7; de 90 a 93; de 84 a 87; e de 75 a 80. Os mis mais escuros so tratados com carvo (de ossos, de ossos sintticos, carvo ativo) ou resinas trocadoras, ou ainda, por uma combinao desses materiais, obtendo-se o acar mascavo.

    No evaporador-cristalizador a vcuo, o xarope de acar concentrado at determinado grau de supersaturao, quando ento recebe a semeadura de uma quantidade determinada de acar fino. Esses pequenos cristais crescem at uma dimenso conveniente ao mer-cado, mediante uma taxa de ebulio e de evaporao apropriadamente regu-lada junto com a agitao e a entrada do xarope. A velocidade no deve ser muito alta, pois, se for, formam-se no-vos cristais (falsos gros), que no tm tempo de crescer e se perdem na joeira da turbina.

    Os xaropes mais puros so reserva-dos para o acar lquido (incolor), os seguintes para o acar em tabletes e granulado grosso, e o restante para os fabricantes de conservas e de bebidas, para os doceiros e confeiteiros (acar mascavo).

    O vcuo descarregado em um misturador que impede a massa cozida de aglutinar-se, a qual enviada s tur-binas, onde os cristais so separados do xarope, lavados e lanados no tanque de depsito do acar mido. O xarope retorna ao processo para a recuperao do acar.

    Quando a pureza do xarope fica baixa, usado para fabricao de mela-os de mesa; as fraes de pior qualidade servem de rao animal. Esse xarope conhecido como melao ou melado.

    O acar mido seco em um gra-nulador, um tambor rotatrio horizontal com um conjunto de palhetas estreitas solidrias superfcie interna. Essas palhetas suspendem o acar e deixam- no cair atravs de uma corrente de ar

    quente, que flui em contracorrente.Os cristais secos passam por uma

    srie de peneiras, onde so classificados de acordo com o tamanho.

    O acar ento pesado e emba-lado mediante diversos equipamentos automticos, ou estocado para venda a granel.

    Os acares pulverizados so obtidos mediante a moagem do acar granu-lado, mas so to higroscpicos que costume mistur-los com 3% de amido de milho para ter os tipos apropriados fabricao de doces. Os cubos e tabletes de acar so preparados pela mistura de determinados tipos de acar gra-nulado com um xarope denso e incolor, formando uma massa mida, que ento moldada e seca.

    O rendimento do acar refinado obtido, com base no acar bruto de 96de polarizao, usualmente de 93% a 94%; o xarope monta a 5% e as perdas mecnicas e de lavagem atingem 0,7%.

    No processamento do acar h cer-ta inverso, de acordo com a seguinte reao:

    C12H22011 + H20 C6H1206 + C6H1206Sacarose d- Glicose d FrutosePolarizao +66,6 +52,8 -92,8

    O produto o acar invertido; a polarizao da sacarose pura, que +66,6 (+ significa dextrogira), passa a ser de -20 (- significa levogira) para a mistura resultante.

    J para a produo do acar de beterraba, importante destacar que a beterraba aucareira diferente da beterraba ordinria pelo fato de ser muito maior e no ser vermelha. As be-terrabas, com 13% a 17% de sacarose e 0,8% de cinzas, entram na usina atravs de calhas, pequenos canais cheios com gua quente, que no apenas as trans-portam, mas tambm as lavam. Dentro da fbrica, as beterrabas so relavadas, pesadas e cortadas em tiras compridas, denominadas cossettes.

    As cossettes so lanadas em difuso-res especiais contnuos, a contracorren-te. O acar extrado em contracorren-te com a gua, entre 71,1C e 79,4C. O xarope resultante uma soluo com 10% a 12% de sacarose e uma pequena

    quantidade de acar invertido, e 2% a 3% de cinza. A polpa restante contm de 0,1% a 0,3% de acar (com base nas beterrabas). Essa polpa enxuta em prensas, seca em um secador rotatrio e vendida como forragem para gado. A passagem da indstria de beterraba para os difusores contnuos em contracorren-te e automticos eliminou os custos de operao do xarope e reduziu a mo-de- obra necessria na bateria.

    O xarope coado grosseiramente, para remoo de materiais estranhos. Adiciona-se leite de cal (ou leite de saca-rato, quando se adota o processo Steffen para remover materiais estranhos) at uma concentrao equivalente a 2% a 3%. A cal contribui para a precipitao de impurezas indesejveis. Quaisquer traos de sacarato de clcio so decom-postos em carbonatadores, por onde o dixido de carbono, proveniente de um forno de cal, flui continuamente atravs do xarope. A espuma que aparece nessa etapa reduzida pela adio de pequena quantidade de antiespumante.

    O lodo provocado pela calagem igual a 4% a 5% do peso das beterrabas da carga. Remove-se o lodo em espes-sadores e pela filtragem em filtros do tipo Rotary. Adiciona-se novamente cal at uma concentrao equivalente a 0,5%, e o xarope carbonatado outra vez, agora a quente.

    O xarope ento filtrado em filtros a presso e o filtrado resultante alvejado com dixido de enxofre.

    O precipitado de sulfito de clcio removido em filtros de presso ou em filtros de quadros. O xarope purificado concentrado de 10% a 12%, em acar, at 60%, em acar em evaporadores a mltiplo efeito. Com isso, aumenta no-vamente a concentrao de ons clcio. Parte do clcio precipita.

    A usina Spreckles tambm usa um sistema de descoramento a adsoro em carvo reativado, em contracorren-te, para purificar e descorar o xarope concentrado, em torres onde o xarope ascende contra o carvo descendente (Op).

    O xarope grosso granulado em tabuleiros a vcuo, centrifugado, lavado e seco em um granulador, peneirado e embalado de maneira anloga que foi descrita a propsito do acar de cana.

    O xarope do primeiro vcuo recebe outro tratamento para recuperao de maior quantidade de cristais de acar, mas o produto obtido no bastante puro para o mercado e retorna ao pro-cesso para purificao posterior.

    O xarope que resta depois de vrias

    cristalizaes o melao de beterraba; comercializado para a forragem de gado ou lanado ao rejeito da polpa de beterraba. tambm um meio de cultura importante para fermentao, particularmente, do cido ctrico, pois o elevado teor de nitrognio bastante

    favorvel. Foram desen-volvidos processos para a recuperao do acar restante, os quais so usados comercialmente. A recuperao inicial foi obtida pelo processo Steffen, usado exten-samente nos Estados Unidos.

    J se experimentou, ou props, a troca ini-ca, para o tratamento dos licores do processo em diversas etapas da fabricao do acar. A troca inica opera bem para a limpeza dos lico-res do processo, mas, no total, o tratamento frequentemente muito caro em virtude do custo da colocao dos rejeitos das guas adocicadas e dos reagentes gastos (da lava-gem). Com o acar de cana, por outro lado, pode haver inverso e perdas.

    oS tIpoS de AcAr

    O acar apresenta-se no comrcio sob vrias formas, dependendo do processo de refinao ao qual submetido: melado preto, acar marrom, acar comum, cristais para caf, tabletes, de-merara, xarope dourado, acar cristal, acar de confeiteiro, melao, a-car mascavo, acar para conservas, acar com pectina, etc. De acordo com a utilizao tambm encontramos o xarope de glicose e a dextrose provenientes do amido.

    Nas aplicaes industriais, os a-cares mais usados so o acar cristal, o acar refinado, o acar lquido, o acar invertido e o acar glac.

    O acar cristal. o acar obtido por fabricao direta nas usinas, a partir

    Fluxograma da fabricao de acar de beterraba

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  • da cana-de-acar, na forma cristalizada, aps a clarificao do caldo da cana por tratamentos fsico-qumicos. usado como agente de corpo e, principalmen-te, como adoante na indstria alimen-tcia em geral, destacando-se bebidas, balas, biscoitos, chocolates, etc. O acar cristal possui elevada gama de aplicaes industriais e menor custo de aquisio em relao aos demais tipos de acares. Um acar cristal de boa qualidade apresenta de 99,5% a 99,8% de sacarose; 0,03%a 0,10% de glucose e frutose; 0,05% a 0,10% de umidade; e 0,04% a 0,10% de sais minerais.

    O acar refinado. A primeira etapa do pro-cesso de fabricao do acar refinado consiste na dissoluo em gua do acar cristal. Essa solu-o submetida a um novo processo de purificao, gerando uma calda, a qual aquecida at um ponto estabelecido. Em seguida, transferida para batedei-ras, que a transforma em uma massa quente e mida de acar. Nessa etapa, os cristais no possuem uma forma definida. Para secar e esfriar, o acar enviado para secadores com passagem de ar quente e frio. O acar peneirado para separar os aglomerados e obter a uniformidade dos cristais. Da parte mais fina extra-do o acar de confeiteiro e do restante obtm-se o acar refinado.

    O acar refinado granulado. obtido por dissoluo, purificao e recristalizao de acar cristal, apre-sentando estrutura formada por cristais bem definidos e granulometria unifor-me. Assim, trata-se de um processo de cristalizao controlada, com produtos apresentando uma granulometria homognea, com baixa cor. Possui o mais elevado grau de pureza entre os acares e, por isso, especial para processos que exijam elevada pureza. Os principais parmetros para o acar refinado so 99,8% a 99,9% de sacarose; 0,01% a 0,03% de glucose e frutose; 0,04% a 0,10% de umidade; e 0,02% a

    0,04% de sais minerais.

    O acar refinado lquido. obtido do refino de acar cristal dissolvido; um adoante natural apresentado na forma lquida em uma soluo inodora, lmpida e cristalina, obtido pela disso-luo de acar em gua com posterior purificao e descolorao, o que ga-rante a esse produto alta transparncia e limpidez com gua declorada. um produto claro, lmpido, isento de odor e aroma; apresenta uma concentrao de 65% a 68% de slidos. Especial para processos que exijam elevada pureza. o adoante mais prtico para a maioria

    das aplicaes industriais alimentcias, como sorvetes, massas, bebidas, sucos, panificadoras, indstrias farmacuti-cas ou em processos qumicos onde se utiliza sacarose (detergentes, tintas, plsticos, colas, etc.).

    Bastante aplicado onde a ausncia de cor um fator essencial, o produto ideal para a substituio de acares s-lidos em processos onde exista diluio ou acrscimo de gua em alguma fase. O acar lquido apresenta algumas vantagens operacionais significativas: de fcil utilizao e garante sempre um padro superior e uniformidade na produo de xaropes e caldas; evita pro-cessos dispendiosos de diluio, armaze-nagem e transporte de acares slidos e garante a iseno total de cristais no produto final; no interfere na produo com problemas como insetos e pontos pretos; elimina a possibilidade de perdas e facilita as condies de estocagem; reduz o consumo de gua; reduz ou mi-

    nimiza a produo de dejetos industriais provenientes dos processos de filtragem e desodorizao do xarope ou calda; devido sua caracterstica de consumo just-in-time proporciona ganhos pela re-duo de estocagem de matria-prima; permite com facilidade que se alcance alto grau de automatizao da linha de produo; reduz custos de energia utilizados nos processos de diluio e filtragem; confere alto grau de flexibili-dade no planejamento da produo; em fbricas novas ou ampliaes permite re-duo de investimentos em ativos fixos por dispensar armazenagem de acar slido e instalaes para xaroparia; e

    favorece a implantao de BPF e APPCC.

    Os principais parme-tros para o acar refinado lquido so 65% a 68% de sacarose; 0,10% a 0,40% de glucose e frutose; 32% a 355 de umidade; e 0,05% a 0,10% de sais minerais.

    O acar lquido in-vertido. O acar inver-tido, na verdade, um xarope feito a partir do acar comum, a sacarose, submetido ao aquecimen-to na presena de alguma

    substncia cida (por exemplo, suco de limo ou cido actico, que um cido presente em diversas frutas e no vinagre). Essa hidrlise cida provoca a quebra da sacarose em dois acares que formam a sua molcula: glicose e frutose. uma soluo lmpida e ligeiramente amarelada, com odor e sabor caracterstico e com alto poder adoante. A presena de acares redu-tores pode originar solues com maior poder adoante, maior concentrao de slidos e baixa atividade de gua.

    O termo acar invertido decorre de uma caracterstica fsica da sacarose, que se altera nesse processo; original-mente, um raio de luz polarizada que incide sobre a sacarose gira para a di-reita. Aps o processamento descrito, a luz desvia para a esquerda.

    As vantagens operacionais so simi-lares aquelas do acar refinado lquido.

    bastante empregado em indstrias alimentcias onde a colorao no inter-

    fere na qualidade do produto final, como panificao, gelias, sorvetes, laticnios, frutas cristalizadas, bebidas carbonata-das, sucos, recheios, licores, biscoitos, balas, caramelos, etc. Seus benefcios, do ponto de vista tcnico e aplicaes so muitos. Os principais so:

    um adoante natural que pode apresentar um poder adoante de at 20% maior que a sacarose, destacando- se o uso em bebidas carbonatadas, sucos e isotnicos;

    Aumenta a higroscopicidade dos alimentos, prolongando o shelf life de bolos e pes. De modo geral, em pro-dutos com baixo teor de gordura, sua utilizao evita que esses comecem a secar e quebrar. Possui alta afinidade com a gua (umectncia). Pode ser utilizado para substituir o glicerol, ge-ralmente utilizado como umectante em bolos, podendo-se perceber melhora no poder adoante, no sabor para produtos de frutas e no acrscimo de cor e sabor durante o cozimento.

    um modificador de textura. Devido a sua alta solubilidade e sua capacidade de baixar o ponto de congelamento, melhora a textura de sorvetes e sobre-mesas geladas. Assim, pode ser utilizado como inibidor de cristalizao, garan-tindo que produtos, como sorvetes, fon-dants, e outros, continuem macios e sua-ves durante a validade. Pode ser utilizado durante o cozimento de gelias (tambm como inibidor de cristalizao).

    um conservante natural. Exerce maior presso osmtica, permeando mais rapidamente as membranas dos ali-mentos, destacando-se frutas e gelias.

    Nos processos fermentativos pode ser utilizado como substrato, pois apresenta baixos teores de inibidores de fermentao.

    um agente de escurecimento. Em altas temperaturas, reage com as substncias nitrogenadas da farinha de trigo conferindo flavour e colorao di-ferenciada em pes e biscoitos (Reao de Maillard); tambm um efeito dese-jvel na fabricao de balas e caramelos.

    um acentuador de sabor. Em sucos e gelias, a presena de frutose no acar invertido acentua o sabor natural das frutas; reala tambm o sabor das frutas em refrigerantes, bolos e confeitos.

    Possui baixa viscosidade, conferin-do plasticidade a sorvetes, cremes e fondants.

    Possui textura suave, ideal para alguns produtos, como pes de ham-brguer, panquecas, licores, bolos, etc.

    Os principais parmetros para o acar invertido lquido so 76% a 78% de sacarose; 60% a 70% de glucose e frutose; 22% a 24% de umidade; e 0,10% a 0,30% de sais minerais.

    O acar glac. Tambm conhe-cido como acar de confeiteiro e acar acompalpvel, o acar glac se apresenta na forma de p, constitudo exclusivamente de sacarose e obtido em uma das fases da produo do acar refinado, caracterizando-se por sua fina granulometria. Geralmente misturado a amido de milho para evitar que se formem grumos. Bastante utilizado em indstrias alimentcias no polvilha-mento e na produo de massas, pes e bolos, pois no absorvido pela umidade contida na receita.

    AS mltIplAS AplIcAeS do AcAr

    O acar o adoante mais verstil de todos os que esto disponveis. Seu uso comum em uma variedade de alimentos muito grande, devido a seus muitos atributos, que no podem ser du-plicados por nenhum outro ingrediente.

    Produtos assados. A funo prin-cipal do acar nos produtos assados agir como substrato ou meio para a fermentao do levedo. O gs liberado pela fermentao (dixido de carbono) responsvel pelo crescimento do pro-duto. O acar libera dixido de carbono mais rpido do que o amido. O acar consumido pelo levedo e os produtos da fermentao contribuem para o sabor, volume, aroma e cor do produto final. O acar ajuda na reteno da umidade dos produtos assados, retardando seu envelhecimento e estendendo sua vida de prateleira.

    Em alguns produtos assados, a-cares marrons ou melados so usados para dar cor e sabor mais atraentes. Em pes, bolos e bolachas, tanto a cor

    clara quanto o tamanho dos cristais so importantes. Variar o tamanho do cristal pode levar a produo de bolachas e bolos disformes. Isso particularmente difcil quando o tamanho uniforme exigido para o empacotamento.

    Merengues. Em merengues e pes-de-l, o acar fortalece a liga protica e estabiliza a clara de ovo batida. Quando o acar introduzido nas claras de ovos, proporciona uma fora adesiva protena e, assim, possibilita que a mistura retenha uma poro grande de ar. A forma em que o acar introdu-zido nas claras de ovos afeta o volume do produto.

    A mistura do merengue em sua preparao, aquecimento e embalagem final so muito suscetveis umidade; cuidado deve ser tomado para combater sua influncia.

    H vrios mtodos para se fazer merengue. Um dos que se tem menos sucesso se d atravs da simples introdu-o do acar clara do ovo. Esse mto-do pode produzir timos resultados em um dia seco, mas no funcionar em um dia mido ou em uma cozinha com vapor. Para resultados consistentes, s claras devem ser batidas at endurece-rem, em uma tigela seca e limpa. Meta-de do acar deve ser adicionado para dar fora mistura. O resto do acar ento acrescentado lentamente para completar o preparo.

    Bolinhos. Na confeco de bolinhos, o acar granulado usado para incor-porar ar gordura durante a preparao do creme, para produzir bolinhos leves. Quando o acar batido com a man-teiga ou margarina, o ar aprisionado nos cristais de acar cobertos pela gordura, produzindo uma textura leve no produto final. Quando o acar e a farinha esto presentes na mistura, o acar dissipa as molculas de protena do glten da farinha. Mantendo o glten macio, o acar permite que ele cresa mais, dando volume e leveza mistura.

    Bolachas. Nas bolachas, o acar contribui com a doura, crespido e cor no produto final. Produz gros mais lisos, tornando a massa mais fcil de espalhar.

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  • Condimentos. Uma pequena poro de acar pode ser usada para realar o sabor desejado em um produto, sem adicionar doura. Por exemplo, uma pitada de acar modifica a acidez de ingredientes e ajuda a misturar o sa-bor de condimentos, como mostarda, molhos e temperos para saladas. Uma colher de ch de acar caramelizado em molhos quentes ou caldos de carne no s d uma cor marrom rica como tambm melhora o sabor.

    Confeitaria. A presena do acar na confeitaria essencial ao sabor, textura e aparncia dos alimentos. A confeitaria larga-mente baseada na manipulao do acar para atingir efeitos de texturas especiais. Fatores que controlam a textura dos confeitos incluem o grau de cristalizao da sacarose, a razo da sacarose e da umidade e a quantidade e tamanho dos cristais de sacarose.

    Quando o acar fervido, sofre muitos estgios at se tornar caramelo. O acar, que pode ser de cobertura, granulado ou em cubos, dissolvido em uma peque-na quantidade de gua. Essa solu-o ento fervida rapidamente at que bolhas sejam produzidas, bem prximas umas das outras. Esse evento indica que a evapora-o da gua est completa. Deve-se tomar cuidado quando o acar comea a cozinhar, tornando-se grosso e rapidamente chega a uma cor caramelo escuro. Nesse estgio, a mistura queima rapidamente e se torna amarga, assim o acar perde seu poder adoante.

    Diferenas na textura so muito importantes na qualidade do confeito. A cristalizao do acar considerada indesejvel em doces lisos e duros, e ainda essencial para a textura do doce de chocolate cremoso. Em adio a essa contribuio da textura e doura, o acar tambm age como preservativo, reala o sabor do chocolate e nozes, ajuda no desenvolvimento da cor e sabor e ajuda a manter as gorduras e leos unidos para formar uma mistura estvel que no se separar.

    Quando o acar marrom usado para substituir acar branco, um sa-

    bor caracterstico pode se desenvolver, sendo adequado para uma variedade de produtos de confeitaria.

    Produtos de laticnios. O acar contribui para o sabor de produtos de laticnios, tais como iogurte, sorvete e leite com sabores. Colabora no desenvol-vimento das texturas cremosas de sor-vete e de doces de creme. Um contedo elevado de acar em sorvetes abaixa o ponto de congelamento, produzindo um produto mais liso.

    Em creme de ovos, o acar ajuda a retardar a coagulao da protena dos ovos. Esse fator evita que o creme quebre durante o cozimento, forman-do uma textura mais firme, fina e lisa.

    Frutas. O acar age como preser-vativo em frutas enlatadas, evitando o crescimento de bolores e leveduras. Tambm auxilia na manuteno da firmeza da fruta e na proteo da fruta contra o ressecamento, uma vez que a lata aberta. A adio de acar s frutas enlatadas considerada um dos mtodos mais antigos para se minimizar a oxidao. O xarope de acar cobre a fruta e fisicamente a protege de ressecar e de escurecer.

    O acar tambm usado como preservativo na fabricao de compotas.

    Ligando-se gua disponvel, o acar previne contra o crescimento de bactrias prejudiciais. Para representar esse papel e como um auxlio na montagem e for-mao do gel, o acar deve estar a uma alta concentrao em compotas e gelias.

    No congelamento de frutas e vege-tais, muito importante retardar ou desativar as enzimas presentes. Isso necessrio porque a temperatura dos freezers caseiros no baixa o suficiente para desativ-las. No caso de vegetais, essas enzimas so destrudas pelo alveja-

    mento, mas esse mtodo no pra-ticado, nem necessrio com frutas. A adio de acar s frutas sendo preparadas para o congelamento retardar a ao das enzimas.

    O acar pode ser usado de duas formas para o congelamento, tanto como um xarope como em seu estado natural seco. Se frutas macias ou frutas silvestres so congeladas sem acar, o lquido presente vira gelo, o que quebra a estrutura da fruta, fazendo com que ela desintegre quando degela-da. Se tais frutas so congeladas com o xarope de acar, o xarope penetra na fruta e evita que part-culas de gelo se formem.

    Vegetais. Uma pequena poro de acar normalmente adiciona-da aos vegetais em processamento, onde age como intensificador do sabor e no como adoante,

    melhorando o corpo e a textura do pro-duto final. Tomates e molhos base de tomates so menos cidos se uma pitada de acar for adicionada, melhorando assim o paladar.

    Carnes. O uso de acar na inds-tria da carne pequeno, mas tem papel fundamental como agente aromatizante no processo da carne curada (presuntos, bacon, salsichas e salames).

    O acar auxilia na estabilizao da cor vermelha nas carnes curadas, redu-zindo a perda do encolhimento durante a defumao e cozimento, e ajuda a manter o produto mido e suculento.

    A cobertura de acar em carnes assadas, como presunto assado, coste-las e patos, ajuda a reter a umidade na superfcie e evita que seque.

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