histÓria da inseminaÇÃo artificial e das...

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©NEIMAR CORREA SEVERO 1 HISTÓRIA DA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL E DAS BIOTÉCNICAS REPRODUTIVAS NO BRASIL É ponto pacífico a necessidade de se incrementar a produção animal pelo emprego de medidas de fomento que venham não só a multiplicar os rebanhos, mas também promover o melhoramento zootécnico e o consequente aumento do rendimento ‘per capita’. Na realização desse programa de fomento deve ser aproveitada ao máximo a capacidade procriadora dos bons reprodutores. Para isso, o melhor meio é o emprego, em larga escala, da inseminação artificial, método rápido e econômico de se elevar a altos níveis o índice geral da produtividade dos rebanhos. A organização de cooperativas e sociedades de inseminação artificial, a princípio nos centros pecuários mais progressistas, com serviços de coleta e distribuição de sêmen, orientados por veterinários especializados, daria à nossa pecuária, em cinco ou seis anos, um desenvolvimento igual ao que seria conseguido em meio século de reprodução segundo os métodos até agora utilizados, porque colocaria ao alcance de todos os criadores interessados (e todos seriam atingidos por uma campanha informativa) os meios de aperfeiçoamento zootécnico até então reservados a uma pequena minoria [...]. Os excelentes resultados de aplicação desse processo em todos os países civilizados e os já obtidos entre nós, em campanha de âmbito restrito, estão a nos indicar os verdadeiros rumos para o fomento da pecuária. Os reprodutores machos, é sabido, representam pelo menos a metade do valor do rebanho, do ponto de vista genético. Por isso os reprodutores de grande valor zootécnico devem ser utilizados intensivamente, no máximo de suas possibilidades e em benefício do maior número de criadores 1 . 1 Seleção de parágrafos do prefácio do livro Noções sobre Reprodução Animal e INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL, autoria de Antonio Mies Filho e João Ferreira Barreto, editado em 1949 e publicado em 1951 pelo Serviço de Informação Agrícola do Ministério da Agricultura. O uso intensivo da inseminação artificial para multiplicação de genética superior era uma forte preocupação do principal órgão agrícola do nosso país já naquela época.

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©NEIMAR CORREA SEVERO

1

HISTÓRIA DA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL E DAS

BIOTÉCNICAS REPRODUTIVAS NO BRASIL

É ponto pacífico a necessidade de se incrementar a produção animal pelo

emprego de medidas de fomento que venham não só a multiplicar os

rebanhos, mas também promover o melhoramento zootécnico e o

consequente aumento do rendimento ‘per capita’. Na realização desse

programa de fomento deve ser aproveitada ao máximo a capacidade

procriadora dos bons reprodutores. Para isso, o melhor meio é o emprego,

em larga escala, da inseminação artificial, método rápido e econômico de

se elevar a altos níveis o índice geral da produtividade dos rebanhos.

A organização de cooperativas e sociedades de inseminação artificial, a

princípio nos centros pecuários mais progressistas, com serviços de coleta

e distribuição de sêmen, orientados por veterinários especializados, daria

à nossa pecuária, em cinco ou seis anos, um desenvolvimento igual ao que

seria conseguido em meio século de reprodução segundo os métodos até

agora utilizados, porque colocaria ao alcance de todos os criadores

interessados (e todos seriam atingidos por uma campanha informativa)

os meios de aperfeiçoamento zootécnico até então reservados a uma

pequena minoria [...]. Os excelentes resultados de aplicação desse processo

em todos os países civilizados e os já obtidos entre nós, em campanha de

âmbito restrito, estão a nos indicar os verdadeiros rumos para o fomento

da pecuária. Os reprodutores machos, é sabido, representam pelo menos a

metade do valor do rebanho, do ponto de vista genético. Por isso os

reprodutores de grande valor zootécnico devem ser utilizados

intensivamente, no máximo de suas possibilidades e em benefício do

maior número de criadores1.

1 Seleção de parágrafos do prefácio do livro Noções sobre Reprodução Animal e INSEMINAÇÃO

ARTIFICIAL, autoria de Antonio Mies Filho e João Ferreira Barreto, editado em 1949 e publicado

em 1951 pelo Serviço de Informação Agrícola do Ministério da Agricultura. O uso intensivo da

inseminação artificial para multiplicação de genética superior era uma forte preocupação do

principal órgão agrícola do nosso país já naquela época.

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APRESENTAÇÃO

A minha história com a inseminação artificial começou em 1983, dois anos

após a graduação como médico veterinário na Fundação Átila Taborda/Faculdades

Unidas de Bagé, hoje Universidade da Região da Campanha (URCAMP), Rio Grande

do Sul. Naquela época, o Banco Bradesco possuía um Centro de Tecnologia de

Sêmen Bovino em Uberaba, Minas Gerais, a Pecplan, e abriu outra unidade no Rio

Grande do Sul, para alojar touros das raças taurinas. O saudoso médico veterinário

Everton Caravaca da Silveira, gerente da escola da Fundação Bradesco localizada

em Rosário do Sul, me abrigou para um estágio de dois meses e após uma prova de

seleção comecei uma longa carreira no fascinante mundo da inseminação artificial.

Eram tempos de desafios, com muitos centros de coleta de sêmen em

inauguração e outros tantos fechando. Comercializava-se em torno de 1,2 milhão

de doses ao ano e importava-se muito pouco, em torno de 150 mil doses2. A ASBIA

já existia desde novembro de 1974, com o objetivo de organizar o tumultuado

mundo da inseminação artificial no Brasil. Era a época onde as empresas nacionais,

especialmente Pecplan Bradesco, Lagoa da Serra, Tairana, Sembra e VR

dominavam o mercado de sêmen bovino. Nas estrangeiras se destacavam ABS,

Carnation, Tri-State e Select Sires. A Curtiss tinha fechado as portas nos Estados

Unidos em 1981, uma das maiores empresas de distribuição genética do mundo.

Os produtores rurais ainda desconfiavam dos resultados da tecnologia,

mesmo com todas as informações disponíveis e com muitos cursos de inseminação

artificial espalhados pelo país. Os pioneiros do sêmen congelado percorriam o

Brasil para expandir o uso da técnica, mesmo com a descrença do produtor. Eram

eles Sérgio Falcão Padilha, Luis Carlos da Veiga Soares, João Floriano Casagrande,

João de Oliveira, Vicente Ribeiro do Vale Filho, Osvaldo Garcia, Aurelino Menarim

Junior e muitos outros. Tempos difíceis que exigiam sacrifícios e muitos técnicos

estrangeiros vinham ao país para divulgar a aplicação da inseminação artificial.

Enquanto isso o melhoramento zootécnico passava por grandes

transformações, com a introdução de programas de avaliação genética, tanto no

gado de corte quanto de leite, por órgãos públicos, empresas privadas, associações

de raça e criadores em particular.

2 ASBIA. Relatório 2001 - Evolução da Inseminação Artificial no Brasil, www.asbia.org.br.

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CAPÍTULO UM

INTRODUÇÃO

A história da inseminação artificial e das biotécnicas reprodutivas no Brasil

ainda não foi registrada em detalhes e, a convite dos muitos usuários da

reprodução animal, passo a contá-la em capítulos a partir dessa edição. Ao

condensar os artigos nesse formato, ofereço aos criadores, técnicos e

inseminadores, uma oportunidade para conhecer melhor um pouco dessa história.

O meu interesse pela inseminação artificial começou em 1983, quando passei

a trabalhar como instrutor do curso de inseminação de bovinos e ovinos da

Fundação Bradesco, em Rosário do Sul, no Rio Grande do Sul. Mais tarde, em 1984

passei a coordenar o laboratório de tecnologia de sêmen da então Pecplan

Bradesco, inaugurado em outubro daquele ano. Foram anos difíceis, mas

recompensado pelos bons resultados no campo e pelas muitas amizades

construídas ao longo do caminho.

A Central de Rosário era a mais moderna da América Latina em termos de

infraestrutura e tecnologia e, por lá passaram touros famosos das raças de corte

britânicas e continentais, como Angus, Hereford, Devon, Charolês e Limousin além

das raças leiteiras como Jersey e Holandês. Talvez a importância daquele

empreendimento só fosse melhor avaliada anos depois quando o centro encerrou

suas atividades em 2006. Porém, durante aqueles 22 anos de atividade daquela

unidade de produção de sêmen, milhões de doses de sêmen congelado foram

distribuídos pelo Brasil afora e também para diversos países das Américas, África e

Ásia, inclusive os Estados Unidos, quando ocorreu a primeira exportação para

aquele país em 1985.

Muitas informações sobre a história da inseminação artificial no Brasil foram

perdidas ao longo das décadas, porém aquilo que foi possível pesquisar e juntar

está publicada nessa obra. O autor deseja que aqueles apaixonados pela técnica

possam usufruir desse trabalho e aguarda sugestões e críticas para uma próxima

edição revisada.

Boa leitura.

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PRIMEIRAS PUBLICAÇÕES

A literatura especializada sobre reprodução animal e inseminação artificial

no Brasil era escassa na primeira metade do século XX, ficando restrita a

publicações em algumas poucas revistas agrícolas e em livros de zootecnia. Os

médicos veterinários do Ministério da Agricultura e das Secretarias da Agricultura

dos Estados da Federação foram responsáveis pelos primeiros trabalhos

publicados nesta área. Os serviços de extensão rural estavam a cargo dos órgãos

oficiais que publicavam artigos e trabalhos em seus boletins técnicos. Os

veterinários do Exército Nacional também publicavam artigos relacionados à

inseminação artificial, especialmente em equinos.

Na segunda metade do século XX, a partir da década de 1960, as

universidades passaram a atuar na pesquisa científica da reprodução animal como

um todo, incluindo a inseminação artificial como biotécnica reprodutiva. Nas

últimas décadas do século passado, ocorreu a maior produção literária sobre as

biotécnicas de reprodução assistida no Brasil, graças ao vasto volume de pesquisas

desenvolvidas nas universidades e ao grande número de pesquisadores brasileiros

associados a universidades e institutos de pesquisas.

A primeira referencia publicada no Brasil sobre

inseminação artificial, foi feita pelo veterinário

Epaminondas Alves de Souza em abril de 1912,

no artigo intitulado “Inseminação Artificial”, no

volume 2 da Revista de Veterinária e Zootecnia

editada no Rio de Janeiro pelo Ministério da

Agricultura3. Nesse artigo, Souza recomendava o

uso da técnica nos equinos e nos bovinos do país,

citando os bons resultados dos trabalhos norte-

americanos realizados na Estação de Pesquisa de

Oklahoma.

3 Souza, Epaminondas A. Inseminação Artificial. Revista de Veterinária e Zootechnia, Ministério da

Agricultura, Indústria e Commercio, v.2, p.92-96, 1912.

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Em 1928, o zootecnista Paulo de Lima Corrêa, futuro Secretário da Agricultura do

estado de São Paulo no início da década de 1940, fez referência em poucas linhas

ao emprego da inseminação artificial em equinos no seu livro Criação de Cavalos.

Em 1933, o veterinário fluminense Guilherme Edelberto Hermsdorff no seu

livro Zootecnia Especial, volume 1, Equídeos4, descreveu em detalhes as diversas

fases do método de inseminação artificial em equinos, ressaltando ao mesmo

tempo seu valor econômico. Mais tarde, em 1940, publicou um artigo sobre

inseminação artificial no Boletim da Sociedade Brasileira de Medicina Veterinária5,

detalhando as técnicas de coleta e aplicação do sêmen em diferentes espécies.

Hermsdorff teve participação efetiva na legalização da medicina veterinária no

país, empenhando-se pessoalmente para a aprovação do Decreto no 23.133, de 9 de

setembro de 1933, assinado pelo Presidente da República Getúlio Vargas e pelo

Ministro da Agricultura Juarez Távora, regulamentando a profissão6. Hermsdorff

foi também professor da disciplina de zootecnia especial da Escola Nacional de

Veterinária do Rio de Janeiro, hoje parte da Universidade Federal Rural do Rio de

Janeiro (UFRRJ) e Diretor Geral do Departamento Nacional da Indústria Animal do

Ministério da Agricultura e um incentivador do uso da inseminação artificial.

O veterinário paulista Leovigildo Pacheco

Jordão publicou vários textos sobre

inseminação artificial, primeiro na edição de

junho de 1934 da Revista de Indústria Animal7

e a seguir na edição de maio de 1935 da mesma

revista8. Em 1937, nas edições de dezembro-

janeiro e de fevereiro-março da Revista do

Gado Holandês9, descreveu a técnica da

inseminação artificial em detalhes e depois na

Revista da Sociedade Paulista de Medicina

4 Hermsdorff, Guilherme E. Inseminação Artificial. Zootecnia Especial, Equídeos, v.1, p.83, 1933. 5 Hermsdorff, Guilherme E. Inseminação Artificial. Bol. Soc. Bras. Med. Vet., v.1, p.21-55, 1940. 6 Hatschbach, Perci I. As Regulamentações da Medicina Veterinária Brasileira e a sua Curta

Vigência do Inusitado Decreto nº 20.931 de 11 de janeiro de 1932. A Hora Veterinária, v.27,

nº161, p.44, 2008. 7 Jordão, L. P. Teoria e prática da Fecundação Artificial. Rev. Ind. Anim., v.2, p.135-136, 1934. 8 Jordão, L. P. Fecundação por Inseminação Artificial. Rev. Ind. Anim., v.2, p.355-359, 1935. 9 Jordão, L. P. Inseminação Artificial. Rev. Gado Hollandez, v.1-2, p.4-9, 1937.

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Veterinária10 em 1937 e no volume 1 da Revista de Indústria Animal11 em 1938.

Jordão era veterinário do Departamento de Produção Animal do estado de São

Paulo e se destacou como pioneiro da inseminação artificial em diversas espécies

domésticas, ensinando e divulgando a técnica, bem como construindo

equipamentos para coleta de sêmen, vaginas artificiais, manequins e aplicadores

de sêmen, com bons resultados.

Em 1935, no I Congresso Brasileiro de Agronomia realizado em Piracicaba,

SP, o agrônomo Clodomiro Vergueiro Porto apresentou uma tese intitulada “O

Problema da Inseminação Artificial em Zootecnia”, onde destacou as suas vantagens

para o melhoramento da pecuária nacional, chamando a atenção dos poderes

públicos para a criação de uma estação experimental especializada no ensino e

aplicação da técnica.

Mais tarde, em 1938, no Congresso Agronômico do Vale do Paraíba, o

veterinário João Soares Veiga, de origem portuguesa e naturalizado brasileiro,

apresentou a tese, “Vantagens e Plano de Criação de um Posto de Inseminação

Artificial no Vale do Paraíba”, onde destacava a importância da instalação de um

departamento destinado a esse fim, junto à Estação Experimental de Produção

Animal de Pindamonhangaba, em São Paulo. Graças a essas duas teses, o governo

paulista criou através do Decreto nº 9.716, de 9 de novembro de 1938, o primeiro

posto de inseminação artificial instalado no Brasil para estudos sobre a

inseminação artificial, tendo por objeto

principal a espécie bovina12.

João Soares Veiga foi um grande incentivador

da inseminação artificial no estado de São

Paulo, colaborando com Leovigildo Pacheco

Jordão e José Gomes Vieira, para a criação do

Subposto de Inseminação Artificial na Estação

Experimental de Pindamonhangaba, em 1938.

Em 1939, Veiga foi aprovado no concurso para

professor da Escola de Medicina Veterinária

10 Jordão, L. P. Inseminação Artificial. Rev. Soc. Paul. Med. Vet., v.4, p.37-52, 1937. 11 Jordão, L. P. Inseminação Artificial. Rev. Ind. Anim., v.1, p.81-88, 1938. 12 Cortez, Eurico. Inseminação Artificial na Espécie Equina. Gráfica Editora Aurora, 1946, 210p.

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da USP (Universidade de São Paulo), passando a integrar o corpo docente daquela

instituição onde foi seu diretor entre 1950 a 1956. Entre 1958 e 1966 ele foi

diretor do IZIP (Instituto de Zootecnia e Indústrias Pecuárias Fernando Costa) da

USP em Pirassununga, SP, onde se aposentou13.

Em novembro de 1938, o então 2º tenente veterinário Ayrton Cordeiro

publicou um artigo sobre inseminação artificial, chamado “Fecundação Artificial”14,

no volume 2 do Boletim Veterinário do Exército, descrevendo a técnica da

inseminação artificial como praticada em países como a União Soviética e a Itália.

Em outubro de 1939, o veterinário paulista José Gomes Vieira publicou o

primeiro trabalho sobre inseminação artificial em galinhas no volume 2 da Revista

de Indústria Animal15. Em 1940, o mesmo autor publicou um artigo sobre

inseminação artificial em bovinos, no volume 3 da Revista de Indústria Animal16.

Em 1942, o veterinário pernambucano José Wanderlei Braga publicou um

artigo sobre a viabilidade do transporte de sêmen refrigerado a longas distâncias,

no Boletim da Secretaria da Agricultura, Indústria e Comércio de Pernambuco17.

Braga foi professor da Escola Superior de Veterinária da Universidade Federal

Rural de Pernambuco e veterinário do Ministério da Agricultura naquele estado. É

patrono do prêmio que tem seu nome no Conselho Regional de Medicina

Veterinária de Pernambuco e, exerceu importante papel na divulgação da

inseminação artificial no seu estado e no Brasil18.

Em 1943, durante o II Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária19,

realizado em Belo Horizonte, MG, foram apresentados alguns trabalhos sobre

reprodução e inseminação artificial em várias espécies. João Ferreira Barreto e

Antonio Mies Filho apresentaram duas teses, uma sobre reprodução em cabras

(Ciclo Vaginal da Cabra) e outra sobre capacidade reprodutiva do macho

13 Albuquerque, Ricardo de; Esleibe Ghion. História do Departamento de Nutrição e Produção

Animal – FMVZ / USP. USP, Pirassununga, 2007, 28p. 14 Cordeiro, Ayrton. Fecundação Artificial. Para todo o dilúvio há sempre uma arca salvadora.

Bol. Vet. do Exército, II, p.361-9, 1938. 15 Vieira, José G. Inseminação Artificial em Galinhas. Rev. Ind. Anim., v.2, p.151-65, 1939. 16 Vieira, José G. Inseminação Artificial em Bovinos. Rev. Ind. Anim., v.3, p.119-31, 1940. 17 Braga, José W. Uma Demonstração Prática da Possibilidade de Transporte de Sêmen

Conservado. Bol. Sec. Agr. Ind. Com. Pernambuco, IX, p.7-12, 1942. 18 Braga, José W. A Inseminação Artificial Vence mais uma Etapa em Pernambuco. Bol. Sec.

Agric. Ind. Com. Pernambuco, IX, p.141-6, 1942. 19 Mies Filho, Antonio. Dados Históricos da Inseminação Artificial no Brasil. Rev. Bras.

Reprodução Animal, CBRA, v.1, n.1, p. 11-22, 1977.

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(Sugestões para Avaliação da Capacidade Fecundante dos Reprodutores Machos).

Leovigildo Pacheco Jordão apresentou uma contribuição sobre avaliação de

reprodutores para exposições (Sobre o Controle da Fecundidade nos Machos

Reprodutores) e outra sobre registro genealógico de animais oriundos de

inseminação artificial (Inseminação Artificial e Registro Genealógico)20. Ruben

Roehe, veterinário da Secretaria da Agricultura do estado do Rio Grande do Sul,

mais tarde professor da Universidade Federal daquele estado (UFRGS), apresentou

um trabalho sobre inseminação artificial em ovinos (Possibilidades da Inseminação

Artificial em Ovinos no Brasil). Foram proferidas conferências e demonstrações

práticas sobre a aplicação da inseminação artificial nos animais domésticos pelo

veterinário Antonio Mies Filho.

Em 1946, no III Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária21 realizado em

Porto Alegre, RS, Barreto e Mies Filho apresentaram dois trabalhos sobre

inseminação artificial. O primeiro sobre reprodução em ovinos (Influência das

Estações Sobre a Capacidade Concepcional das Ovelhas) e o outro um extenso

trabalho sobre a padronização de equipamentos usados na inseminação artificial

(Padronização de Aparelhos para Aplicação da Inseminação Artificial), em todas as

espécies domésticas e que foram adotados por muitos profissionais que se

dedicavam a técnica.

A Revista Militar de Remonta e Veterinária22, criada em 1938 pelo Ministério

da Guerra23 era o órgão oficial de divulgação do serviço veterinário do Exército,

publicando vários artigos sobre reprodução e inseminação artificial, especialmente

20 Segundo Mies Filho (1987), a tese apresentada por Jordão sobre o controle da fertilidade de

reprodutores foi aplicada no RS quando, por determinação do Secretário da Agricultura do Estado

foi tornado obrigatório o exame andrológico dos reprodutores bovinos que concorriam às

exposições de animais. Mais tarde, dito exame andrológico dos reprodutores bovinos foi estendido

a todo o país, por instrumento federal. 21 Mies Filho, Antonio. Reprodução dos Animais - Inseminação Artificial. 2 volumes, Porto

Alegre, Sulina, 1987, 757p. 22 Este boletim foi publicado entre 1938 e 1942 com o nome de Revista Militar de Medicina Veterinária,

mudando depois para Revista Militar de Remonta e Veterinária de 1942 a 1959, mais tarde transformada

no Boletim Informativo Técnico da Veterinária Militar de 1977 a 1984, quando encerrou sua

publicação. Ao longo destes anos publicou em suas páginas muitos trabalhos dos Médicos Veterinários

daquele período, principalmente os militares e, era subordinada a Diretoria Geral dos Serviços de

Remonta e Veterinária do Exército Brasileiro. 23 Até 1967 a denominação do ministério responsável pela gestão do Exército era Ministério da Guerra.

Entre 1967 e 1999, passou a ser denominado Ministério do Exército. Com a criação do Ministério da

Defesa, em 10 de junho de 1999, foi transformado em Comando do Exército e o ministro passou a ser

denominado Comandante do Exército.

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em equinos. Em 1942, o tenente veterinário Eurico Cortez publicou naquele

periódico o artigo “Inseminação Artificial com Conservação e Transporte a Distância

do Líquido Seminal”24. Mais tarde, na edição de 1944-45 o mesmo autor publicou o

artigo “Inseminação Artificial - Vagina Artificial dos Equinos”25, onde apresentou o

modelo de vagina artificial para equinos, por ele criado. Cortez foi o primeiro

diretor do Instituto de Zootecnia da UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de

Janeiro), referenciado pela comunidade universitária como “General Cortez”, por

conta de sua origem do exército brasileiro onde foi general médico-veterinário. Ele

era, simultaneamente, professor do Instituto de Veterinária da UFFRJ.

O Ministério da Agricultura editou o primeiro número do Boletim de

Inseminação Artificial em julho-setembro de 1944, que serviu de repositório para

todos os trabalhos na área de inseminação artificial realizados pelos técnicos

federais e estaduais. O Boletim era organizado pela equipe de veterinários da

Estação Experimental do I.B.A. em Deodoro, RJ, coordenados por Barreto e Mies

Filho, com a colaboração de profissionais de diversas instituições federais e

estaduais. A partir de 1953, por deliberação dos técnicos do Ministério da

Agricultura o Boletim passou a se constituir em órgão oficial de divulgação da

inseminação artificial e teve vida durante 15 anos. Seu último volume editado foi o

de número 10 em 1959.

A partir de 1953, o Ministério da Agricultura começou a editar a Resenha

Bibliográfica do Serviço de Fisiopatologia da Reprodução e Inseminação Artificial

(SFPRIA) sobre artigos e informações relativas à inseminação artificial, seguido

depois pela Resenha do S.I.A.R.T. até 1967 e finalmente pela Resenha do E.T.E.F.R.I.A.

até 1971. Depois quem assumiu a divulgação dos trabalhos foi a Resenha da

D.I.F.R.I.A. Mais tarde, o órgão responsável por essa divulgação foi a Divisão de

Fiscalização de Material de Multiplicação Animal (DFIMA). Estas várias siglas

indicam as transformações porque passou o órgão oficial responsável pela

fiscalização e administração da inseminação artificial no Brasil26.

24 Cortez, Eurico. Inseminação Artificial com Conservação e Transporte a Distância do Líquido

Seminal. Rev. Mil. Med. Vet., p.37, 1942. 25 Cortez, Eurico. Inseminação Artificial – Vagina Artificial dos Equídeos. Rev. Mil. Rem. Vet.,

n.47, p.12-19, 1944/1945. 26 Mies Filho, 1987.

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O Instituto de Zootecnia do Ministério da Agricultura, localizado no Rio de

Janeiro, publicou em 1948, a Circular no. 1 sobre Inseminação Artificial em

Equídeos – Divulgação para Criadores. Tanto o Ministério da Agricultura como o

Exército Brasileiro utilizavam-se da inseminação artificial em seus núcleos de

criação de equinos. Era uma forma de melhorar os plantéis pelo uso de

reprodutores selecionados. O Posto de inseminação do IZ na Fazenda Experimental

em Deodoro, RJ chegava inseminar 30 éguas por dia na estação reprodutiva27.

O primeiro livro especializado em

inseminação artificial foi editado em

1946, Inseminação Artificial na Espécie

Equina, pelo tenente veterinário Eurico

Cortez28, seguida da edição do livro

Noções Sobre Reprodução dos Animais e

Inseminação Artificial em 1949, dos

veterinários Antônio Mies Filho e João

Ferreira Barreto. Esta obra foi editada

pelo Serviço de Informação Agrícola

(SIA) e foi premiada no concurso de

monografias promovido pelo Ministério

da Agricultura29. A obra teve mais cinco

edições, publicado até 1987, sendo

referencia para consulta de estudantes e

profissionais da área de reprodução

animal e inseminação artificial. Todas as

cinco edições foram produzidas pelo

professor Mies Filho.

Em 1954, Mies Filho e Ramos30 publicaram um trabalho sobre o uso do

sêmen refrigerado ovino, onde utilizaram leite desnatado como diluidor e tempo

27 Instituto de Zootecnia. Inseminação Artificial em Equídeos. Divulgação para Criadores. Circular

nº 1, 1948, 18p. 28 Cortez, 1946. 29 Mies Filho & Barreto, 1949. 30 Mies Filho, A.; A.A. Ramos. Inseminação Artificial em Ovinos. Resultados Obtidos com Sêmen

Conservado Submetido a Diferentes Formas de Usos. Bol. Ins. Art., v.6, 28-34, 1954.

Figura 4. Foto da capa do livro Noções

sobre reprodução dos animais e

inseminação artificial, de autoria dos

veterinários Antonio Mies Filho e João

Ferreira Barreto, editado pelo Ministério

da Agricultura. Fonte: Neimar Severo,

2016.

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de conservação de 12-24 horas. Este foi o primeiro artigo sobre sêmen ovino

conservado a baixas temperaturas. Também em 1954, Mies Filho e Rosa31

publicaram os resultados das primeiras inseminações realizadas com sêmen

bovino congelado, de acordo com a técnica de congelação preconizada por Chris

Polge da Inglaterra (Cambridge). Os resultados foram promissores, onde de 24

vacas inseminadas resultaram 54,2% gestantes com uma inseminação.

Em 1954, Veiga e colaboradores apresentaram um trabalho sobre a diluição e

preservação de sêmen bovino em leite desnatado em pó na Revista da Faculdade

de Medicina Veterinária de São Paulo, com índices de fertilidade de 60,71% contra

45,97% quando comparado com o diluidor citrato-gema32.

Em 1955, Araujo33 publicou os primeiros resultados do uso de sêmen ovino

congelado em ampolas, obtendo 31,2% de não retorno ao cio em 176 ovelhas

inseminadas por via intra-cervical.

Em 1956, na VI Reunião de Técnicos em Inseminação Artificial, realizado pelo

SFPRIA do Ministério da Agricultura, foi lançada a semente para a criação de uma

associação de veterinários técnicos em inseminação artificial. Em 1974 este sonho

se realizou com a fundação do Colégio Brasileiro de Reprodução Animal (CBRA)

durante o I Simpósio de Reprodução Animal realizado em Belo Horizonte, MG. Em

1977, surgia a Revista Brasileira de Reprodução Animal órgão oficial de divulgação

publicada pelo CBRA, atualmente online34.

Em 1957, o Ministério da Guerra editou um Manual Técnico sobre

inseminação artificial35 para todas as espécies, com destaque aos equinos, para

distribuição aos oficiais médicos veterinários, sargentos enfermeiros e sargentos

ferrageadores. Era uma edição com 1500 exemplares e como curiosidade ainda

não citava a inseminação artificial com sêmen congelado, onde a técnica de

aplicação da inseminação artificial era ensinada com o uso do espéculo vaginal e

seringa inseminadora.

31 Mies Filho, Antonio; Augusto José Rosa. Normas Práticas para a Congelação de Sêmen no

Brasil. Bol. Ins. Art., v.6, 5-24, 1954. 32 Veiga, J.S.; A. Chieffi; N. Masotti; J.A. Ribeiro. Diluição do Sêmen de Bovino em Leite Desnatado

em Pó. Rev. Fac. Med. Vet. São Paulo, v.5, n.2, 195-202, 1954. 33 Araujo, P.G. Verificação da fertilidade do sêmen congelado de carneiro conservado a -79o C.

Boletim de Inseminação Artificial, Ministério da Agricultura, v.7, p.5-10, 1955. 34 Revista Brasileira de Reprodução Animal, CBRA, www.cbra.org.br. 35 Ministério da Guerra. Inseminação Artificial. Manual Técnico. 1ª edição, 1957, 32p.

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Armando Chieffi e Noé Masotti, docentes da Faculdade de Medicina

Veterinária da Universidade de São Paulo, e sua equipe de colaboradores,

publicaram vários trabalhos sobre inseminação artificial na Revista Zootécnica e

Veterinária, da Itália, e na Revista Zootechnia da Espanha, entre 1959-1965. Eles

foram pioneiros no desenvolvimento de diluentes a base de sucos vegetais como

água de coco e suco de tomate para a preservação de sêmen bovino36 e também

publicaram as mesmas pesquisas sobre diluentes naturais no Boletim de Indústria

Animal, editado pelo Departamento de Produção Animal do Estado de São Paulo37.

Em 1967, os professores Ernesto Antônio Matera da USP, Eberhard Grunert,

da Escola Superior de Veterinária de Hannover na Alemanha e Antônio Mies Filho,

da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), publicaram o livro

Preleções Sobre Patologia da Reprodução Animal, oriundo dos temas abordados no

primeiro curso de pós-graduação criado no Brasil em 1965, pela Faculdade de

Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, em São Paulo38.

Neste mesmo ano, era publicado o livro Manual de Obstetrícia Veterinária de

autoria dos professores Eberhard Grunert, Sílvio Bove e Ângelo Vincenzo Stopiglia

reeditado em 1973 e 1977. Este livro foi traduzido para o espanhol e publicado na

Argentina. Em 1982, foi publicado o livro Obstetrícia Veterinária39 pelos

professores Eberhard Grunert e Eduardo Harry Birgel e em 1984, foi publicado o

livro Diagnóstico e Terapêutica da Infertilidade na Vaca40, por Eberhard Grunert e

Ricardo Macedo Gregory.

Da década de 1980 em diante, foi produzida uma profusão de artigos e obras

técnicas ligadas à reprodução animal e a inseminação artificial por autores

brasileiros. Muitos trabalhos de pesquisa também foram desenvolvidos

especialmente a partir dos cursos de pós-graduação das Escolas de Medicina

Veterinária da USP, UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), UFRGS, UNESP

36 Grunert, E; E.H. Birgel; W.G. Vale; E.H. Birgel Jr. Patologia e Clínica da Reprodução dos Animais

Domésticos – Ginecologia. Varela, São Paulo, 2005, 551p. 37 Chieffi, A. Meios de Conservação de Sêmen – Os Diluidores de Origem Vegetal. Bol. Ind.

Anim., v.20, Único, p.455-472, 1962. 38 Grunert e cols, 2005. 39 Grunert, E; E.H. Birgel. Obstetrícia Veterinária. Ed. Sulina, Porto Alegre, 1982. 40 Grunert, E; Ricardo M. Gregory. Diagnóstico e Terapêutica da Infertilidade na Vaca. Ed. Sulina,

Porto Alegre, 1984.

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(Universidade Estadual de São Paulo), UFSM (Universidade Federal de Santa

Maria) e outras faculdades de veterinária espalhadas pelo Brasil.

TRABALHOS PIONEIROS

As décadas de 1930 e 1940 foram decisivas para o desenvolvimento da

inseminação artificial no mundo. Muitos países como União Soviética, Dinamarca,

Estados Unidos e Inglaterra encontravam-se em pleno desenvolvimento da técnica.

Na União Soviética, segundo dados publicados por Pincus41 em 1938, foram

inseminadas mais de 50 milhões de fêmeas nos primeiros anos, principalmente

ovelhas e só naquele ano em torno de 16 milhões entre vacas, ovelhas e éguas,

todas no sistema cooperativo. Na Dinamarca, em 1936 foi organizada a primeira

cooperativa de inseminação artificial para gado de leite e, três anos mais tarde já

existiam 45 associações e mais de 72 mil inseminações realizadas. Nos Estados

Unidos, em 1938 foi fundada a primeira cooperativa de criadores para aplicação da

inseminação artificial, no estado de Nova Jersey seguida depois por outras

cooperativas criadas nos mesmos moldes pelo país. Na Inglaterra foi instalado o

primeiro centro de inseminação artificial em 1942, em Cambridge. Outros países

como Itália, Suécia, França e Holanda começaram mais tarde, mas logo alcançaram

o mesmo êxito. O intercâmbio científico era frequente entre os principais centros

de pesquisas daqueles países, que buscavam maiores conhecimentos sobre a nova

técnica de multiplicação animal42.

No rastro do crescimento do método noutros países, o Brasil realizou as

primeiras inseminações em caráter experimental em equinos nos anos de 1927 e

1928, na Coudelaria do Exército em Saicã, RS, pelo então Capitão Veterinário

Deodato Cintra Moreno43. Entre 1931 e 1932 Moreno continuou o seu trabalho

experimental na Coudelaria do Saicã, onde naquele último ano foram inseminadas

sete éguas, com quatro nascimentos, dois abortos e um retorno ao cio. Durante

muito tempo a Coudelaria de Saicã forneceu reprodutores de qualidade zootécnica

comprovada a fazendeiros da campanha gaúcha e, estes em troca atendiam a

demanda por cavalos mais apropriados à remonta do Exército. A necessidade de

41 Pincus, J. W. Artificial Insemination in Russia. J. Heredity, 29(3):391-392, 1938. 42 Severo, Neimar. História Ilustrada da Inseminação Artificial. Livre Expressão, 2013, 408p. 43 Cortez, 1946.

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melhorar as montarias do Exército Nacional, fez com que fosse instalada uma

unidade experimental de inseminação artificial de equinos naquela coudelaria.

A Diretoria de Remonta e Veterinária do Exercito foi muito importante na

divulgação e disseminação da técnica de inseminação artificial no Brasil,

especialmente na espécie equina. Muitos cavalos Puro Sangue Inglês que corriam

no Hipódromo da Gávea no Rio de Janeiro, bem como os primeiros cavalos de

tração, da raça Bretão que serviam ao Exército, eram oriundos da aplicação do

método de inseminação.

As primeiras importações de

garanhões puros da raça Bretão

foram realizadas entre 1926 e

1927. Mas entre 1932 e 1956,

foram feitas importações

regulares de garanhões desta

raça, que serviram nas

Coudelarias do Exército

espalhadas pelo país, para

fornecer animais de tração com o

intuito de puxar os equipamentos

de artilharia.

Na década de 1930, a Escola de

Veterinária do Exército traduzia

trabalhos estrangeiros e

incentivava seus alunos a

conhecerem e aplicarem a técnica de inseminação artificial. Muitas coudelarias

criaram Postos de Monta que se utilizavam da técnica de inseminação, como Pouso

Alegre, MG; Rincão, RS, Saicã, RS, Tindiqüera, PR, Campo Grande, MS e Avelar, RJ.

Em 1936, o veterinário Leovigildo Pacheco Jordão que trabalhava no

Departamento de Produção Animal do estado de São Paulo, emitiu uma nota de

esclarecimento sobre a inseminação artificial aos veterinários do Exército,

informando que já há algum tempo o Haras Paulista de Pindamonhangaba

Figura 5. Foto de um garanhão puro sangue

Bretão, resultado do emprego da inseminação

artificial, criado na Coudelaria de Pouso Alegre,

MG. Mais tarde este garanhão serviu na

Coudelaria do Rincão, em São Borja, RS, como

doador de sêmen. Fonte: Eurico Cortez, 1946.

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praticava a técnica no seu plantel44. O sêmen era colhido do fundo da vagina de

uma égua recém coberta, por intermédio de uma seringa apropriada e logo em

seguida aplicado no cérvix uterino de várias éguas em cio. Jordão também

informou que naquele ano (1936), foi empregado pela primeira vez um coletor de

sêmen acoplado na vagina da égua a ser coberta, momentos antes do salto, para a

coleta de sêmen. A inseminação era feita com sêmen puro, fracionado para atender

o número de éguas em cio do dia.

Em 1938 o Governo do Estado de São Paulo criou junto da Estação

Experimental de Pindamonhangaba, uma Subestação Experimental destinada ao

estudo e desenvolvimento da inseminação artificial. O responsável por esta

proposição foi o veterinário João Soares Veiga, que apresentou uma tese intitulada

“Vantagens e Plano da Criação de um Posto de Inseminação Artificial no Vale do

Paraíba” no Congresso Agronômico do Vale do Paraíba, mostrando os benefícios da

instalação de uma repartição destinada para esse fim.

Este foi o primeiro estabelecimento oficial dedicado ao estudo da

inseminação artificial na América do Sul e os veterinários Leovigildo Pacheco

Jordão, José Gomes Vieira e João Soares Veiga foram os pioneiros na aplicação da

técnica no país. Jordão é considerado o pioneiro da inseminação artificial em

bovinos no Brasil, pois seus trabalhos com esta espécie começaram logo após a sua

colação de grau, em 1932. Em 1935, ele e Veiga já utilizavam a inseminação

artificial no Departamento de Produção Animal na cidade de Pindamonhangaba45.

A inseminação artificial

estava em franca expansão nas

Coudelarias do Exército e, em 1941

o tenente veterinário Eurico Cortez

aplicou a técnica em éguas puro

sangue Bretão, na Coudelaria de

Pouso Alegre, em Minas Gerais,

com bons resultados de prenhêz46.

44 Cortez, 1946. 45 Vasconcellos, Paulo M.B. Guia Prático para o Fazendeiro. Nobel, 1983. 46 Cortez, Eurico. Inseminação Artificial com Conservação e Transporte a Distância do

Líquido Seminal. Rev. Mil. Med. Vet., nº37, p.47-54, 1942.

Figura 6. Vagina artificial de equinos, construída

por Eurico Cortez em 1945. Fonte: Inseminação

Artificial nos Equinos, 1946.

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A primeira vagina artificial para coleta de equinos aprovada pelo Exército

Nacional foi construída em 1942 por Deodato Cintra Moreno47, então diretor da

Coudelaria de Avelar. Nesta coudelaria, eram criados cavalos que iam para os

quartéis do Exército no Rio de Janeiro. Naquela unidade também era praticada a

inseminação artificial em equinos tanto do Exército como de fazendeiros da região.

Esta Coudelaria foi extinta em 1974.

Em 1945, o então Tenente Médico Veterinário Eurico Cortez48, desenvolveu

um modelo de vagina artificial destinada aos equídeos, que foi aprovada pelo

Diretor Geral de Remonta para utilização em todos os estabelecimentos de criação

mantidos pelo Exército.

Tanto o Ministério da Agricultura quanto o Ministério do Exército utilizavam

a inseminação artificial em seus núcleos de criação de equídeos e prestavam

serviço aos fazendeiros que levavam grande número de fêmeas para serem

fecundadas. Em 1945 o Posto de Monta da Fazenda Experimental de Criação do

Instituto de Zootecnia, em Deodoro, RJ, chegava a inseminar 30 éguas por dia na

estação reprodutiva49.

Para realizar a

inseminação artificial, os

técnicos coletavam o sêmen dos

garanhões com vagina artificial,

tendo o cuidado de manter

temperatura e pressão

adequadas de acordo com o

sugerido pelo italiano Giuseppe

Amantea (1914)50, inventor da

vagina artificial par cães. Após

análise da qualidade e da

quantidade produzidas, o sêmen era transferido para as éguas em cio. A

inseminação era feita com uma seringa de vidro acoplada a uma ponteira do

mesmo material ou com um lançador de cápsulas de gelatina. O sêmen era

47 Ministério da Guerra. Inseminação Artificial. Manual Técnico. 1ª edição, 1957, 32p. 48 Idem. 49 Mies Filho & Barreto, 1949. 50 Amantea, Giuseppe. Recherches sur la Sécrétion Spermatique. Arch. Ital. Biol., 62:35-45, 1914.

Figura 7. Inseminação de égua utilizando espéculo

tubular de inox e o injetor de cápsula de gelatina.

Instituto de Zootecnia-Ministério da Agricultura,

1948.

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depositado na cavidade uterina das éguas, com o auxílio de um espéculo vaginal

tubular de inox, ou direcionando o cateter com a mão introduzida na vagina da

égua. Para melhorar o aproveitamento do sêmen, muitas vezes os ejaculados eram

centrifugados e diluídos para conservação ou transporte por até 24 horas a +10ºC.

Em 1941, o Ministério da Agricultura decidiu fomentar a inseminação

artificial para utilizá-la no melhoramento zootécnico dos rebanhos nacionais e

delegou à Estação Experimental do Instituto de Biologia Animal (IBA) em Deodoro,

no Rio de Janeiro, os estudos relativos à aplicação da nova tecnologia nas espécies

domésticas de interesse econômico. Os veterinários João Ferreira Barreto e

Antônio Mies Filho coordenaram os trabalhos naquela unidade experimental onde

foram desenvolvidas pesquisas sobre inseminação artificial e problemas

reprodutivos, e os primeiros trabalhos versaram sobre inseminação e ovulação

experimental na coelha51.

Na década de 1940 no Ceará, as vacas de leite dos estábulos localizados

próximos a capital, eram inseminadas artificialmente pelo serviço oficial de

fomento daquele estado52.

Em Pernambuco, a partir de 1940, o médico

veterinário José Wanderley Braga do Instituto de

Pesquisas Agronômicas daquele estado, começa

seus trabalhos de inseminação artificial no

rebanho leiteiro das propriedades localizadas

próximo da capital, Recife53. Em 1941 consegue

seus primeiros resultados, com a gestação de

duas vacas Holandesas, que parem no ano

seguinte, em 17 de fevereiro uma fêmea e em 17

de maio um macho. A bezerra foi o primeiro

animal nascido de inseminação artificial no

estado de Pernambuco. Braga foi o responsável pela primeira remessa de sêmen

bovino refrigerado a longa distancia, quando coletou um touro em Recife e enviou

51 Mies Filho & Barreto, 1949. 52 Mies Filho & Barreto, 1949. 53 Braga, José W. Reprodução Racional. Bol. Soc. Bras. Med. Vet., v.2, p.136-144, março-abril, 1940.

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a amostra para o Rio de Janeiro por via aérea54. O sêmen foi recebido e analisado

no Instituto de Biologia Animal do Ministério da Agricultura pelo veterinário João

Ferreira Barreto.

Em junho de 1942, sob a orientação do

Professor João Soares Veiga, Uriel Franco Rocha

ainda aluno do curso de medicina veterinária da

USP, realizou as 50 primeiras inseminações em

Gado Zebu no Brasil. O veterinário Uriel Franco

Rocha foi outro pioneiro da inseminação

artificial e desenvolveu seus trabalhos no gado

zebu em São Paulo e Minas Gerais na década de

1940.

No inicio de 1942, é implantado o primeiro posto particular de inseminação

artificial em ovinos no Brasil, na Estância Camoatí, de Fernando Chagas Riet,

localizada em Uruguaiana, RS55. Ele convidou para realizar os trabalhos o

veterinário Julio Riet, professor na Escola de Veterinária de Montevidéu, Uruguai, e

que já tinha experiência na inseminação artificial de ovinos no seu país.

Também em 1942, é dado inicio aos trabalhos de inseminação artificial em

bovinos, na Fazenda Córrego das Pedras, de propriedade do médico Homero Viana

de Paula, localizada no município de Varginha, MG56. Ele solicitou a colaboração do

Ministério da Agricultura, que designou o zootecnista Luis dos Reis Ramalho, da

Divisão de Fomento da Produção Animal, para realizar os preparativos.

Em 1943, é produzido o primeiro filme sobre inseminação artificial em

equinos no Brasil, filmado na Coudelaria do Pouso Alegre, sul de Minas Gerais.

Em 1944, todos os estabelecimentos de Remonta e Veterinária do Exército

Nacional estão aplicando a inseminação artificial em larga escala em seus planteis,

chegando a centenas de éguas inseminadas em algumas coudelarias.

54 Braga, José W. Uma Demonstração Prática da Possibilidade de Transporte de Sêmen

Conservado. Bol. Sec. Agr. Ind. Com. Pernambuco, IX, p.7-12, 1942. 55 Inseminação Artificial na Estância Camoatí, R. G. do Sul. Boletim de Inseminação Artificial, v.1,

n.1, p.105, julho-setembro de 1944. 56 Trabalhos de inseminação na fazenda “Córrego das Pedras”. Boletim de Inseminação

Artificial, v.1, n.1, p.106, julho-setembro de 1944.

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Ainda em 1944, a Federação Paulista de Criadores de Bovinos normatiza o

uso da inseminação artificial aos associados, fixando os preços para os serviços de

uso do sêmen de um reprodutor da raça Holandesa.

Em dezembro de 1944, o Dr. Henrique Garcia Mata, veterinário argentino,

visitou o Brasil a convite do Ministério da Agricultura e proferiu conferencias em

Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro, sobre o uso da inseminação artificial no

seu país e os resultados obtidos57. Na Sociedade Brasileira de Medicina Veterinária

no Rio de Janeiro, esteve presente o diretor geral do Departamento Nacional de

Produção Animal, representando o Ministro da Agricultura e, todos os diretores de

Divisão e muitos veterinários de diversos órgãos civis e militares, onde o Dr. Garcia

Mata motivou os seus colegas brasileiros a utilizarem mais a técnica de

inseminação nos rebanhos bovinos e ovinos. Mata apresentou três filmes durante a

apresentação, os dois primeiros sobre a inseminação em ovinos e o terceiro sobre

a inseminação em bovinos.

Em 1946, a Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul, criou o Serviço de

Inseminação Artificial do Departamento de Produção Animal, sob a coordenação

do veterinário Ruben Roehe, disseminando o uso da técnica na bacia leiteira dos

municípios ao redor de Porto Alegre58.

Enquanto os veterinários militares se dedicavam a pratica da inseminação

artificial em equinos, os veterinários civis se dedicavam as outras espécies,

especialmente bovinos, ovinos e aves.

Entre os veterinários militares que se destacaram nos primeiros anos de

desenvolvimento da inseminação artificial estão: Ari Menezes Gil, Aylton Cordeiro,

Ben-Hur Cardoso, Bernardino Costa, Clovis Gomes da Silva, Cristovão Colombo de

Souza, Deodato Cintra Moreno, Enéas de Souza Ribeiro, Eurico Cortez, Heliodoro

Duboc, José Napoleão Bitencourt de Almeida, José Pacheco, Leandro O. Barros

Filho, Luis Morisson de Farias, Manuel Lourenço Branco e Valdemar Fretz59.

Entre os veterinários civis que se destacaram até meados da década de 1940,

encontram-se: Álvaro Bastos, Antônio Mies Filho, Azuhyl Gomes, Ciro Brito de

57 Visita o Brasil o Dr. Henrique Garcia Mata. Boletim de Inseminação Artificial, v.1, n.2, p.165-

166, dezembro de 1944. 58 Rodrigues J.L., Rodrigues B.A. Evolução da biotecnologia da reprodução no Brasil e seu papel

no melhoramento genético. Rev. Ceres, v.56, p.428-436, 2009. 59 Cortez, 1946.

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Carvalho, Guilherme E. Hermsdorff, Hugo Mascarenhas, Jorge Lessa Mota Reis, João

Ferreira Barreto, João Soares Veiga, José Gomes Vieira, José Wanderley Braga, Julio

Riet (veterinário uruguaio), Leovigildo Pacheco Jordão, Lincoln Gripp de Morais,

Moacir Soledade, Newton Guimarães Alves, Octávio Dupont, Pedro Costa Filho,

Ruben Roehe e Uriel Franco Rocha60.

O ENSINO DA REPRODUÇÃO ANIMAL NO BRASIL

A preocupação dos técnicos do Ministério da Agricultura e das Secretarias

Estaduais com a regulamentação e o ensino da inseminação artificial começou em

1945, com a elaboração de um anteprojeto de regulamento da inseminação

artificial adaptado ao Brasil. O documento foi submetido à apreciação das

organizações federais, estaduais e associações de classe, servindo de base para

criação do Decreto nº 39.795, de 16 de agosto de 1956, que deu autoridade àquele

instrumento61, dando poderes ao DNPA (Departamento Nacional de Produção

Animal), para organizar, legislar e fiscalizar a inseminação artificial no Brasil.

Leovigildo Pacheco Jordão já havia apresentado sua posição com relação ao

ensino e a prática da inseminação artificial, para que fosse competência exclusiva

dos médicos veterinários, baseado na grade de formação universitária desses

profissionais, com conhecimentos sobre sanidade, higiene e desinfecção62.

Graças à preocupação e aos esforços de muitos profissionais ligados à

reprodução animal e a inseminação artificial, que colaboraram para a criação do

Decreto promulgado em 1956, mais tarde os direitos já assegurado, foram

ampliados e consolidados através da Lei nº 5.517 de 23 de outubro de 1968, que

regulamentou a profissão do médico veterinário e criou o Conselho Federal

(CFMV) e os Conselhos Estaduais de Medicina Veterinária (CRMV).

Dos muitos profissionais ligados ao ensino da reprodução animal nas

faculdades de medicina veterinária do Brasil, merecem destaque os professores

Ernesto Antônio Matera e Ângelo Vincenzo Stopiglia, que coordenaram o primeiro

60 Idem. 61 Mies Filho, 1987. 62 Jordão. L.P. O Papel do Veterinário na Prática da Inseminação Artificial. Bol. Soc. Paul. Med.

Vet., v.6, n.1, p.55-58, 1944.

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Curso de Pós-Graduação em Reprodução Animal63 realizado na Faculdade de

Medicina Veterinária da USP, em 1965.

Mais tarde, em 1968, a Escola de Veterinária da Universidade Federal de

Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte, implantou seu curso de pós-graduação

em medicina veterinária, organizado pelo professor Leônidas Machado Magalhães,

tendo o professor Francisco Megale como coordenador do Curso de Pós-Graduação

em Reprodução Animal64. Foi o primeiro curso de pós-graduação em nível de

mestrado em medicina veterinária do Brasil. Graças a sua dedicação, Megale foi

responsável pela orientação de uma plêiade de profissionais ligados ao ensino. Ele

foi orientado e discípulo do ícone da patologia reprodutiva, Dr. Kenneth McEntee

da Universidade de Cornell, Estados Unidos. Também merece destaque o professor

Renato Campanarut Barnabé da FMVZ-USP pela

criação do primeiro curso de pós-graduação específico

sobre reprodução animal numa universidade

brasileira, em 1977, quando foi implantado o

Programa de Pós-Graduação em Reprodução Animal

(PPGRA-USP). Mais tarde em 1988, foi criado o

Departamento de Reprodução Animal daquela

faculdade65.

Após o surgimento dos cursos de pós-graduação a partir da década de 1970

nas Faculdades de Medicina Veterinária da USP, da UFMG e da UFRGS, muitos

trabalhos de dissertação e tese contribuíram para a formação de um novo conceito

da reprodução animal e da inseminação artificial no Brasil. Vários pesquisadores

foram se aperfeiçoar no exterior, principalmente nas Escolas de Veterinária da

Alemanha, Suécia e Estados Unidos.

A Escola Superior de Veterinária de Hannover da Alemanha, através dos

professores eméritos Eberhard Grunert, Hans Merkt e Karl Fritz Weitze,

influenciou um grupo de profissionais dos estados do Rio Grande do Sul e São

Paulo como docentes em cursos realizados em Porto Alegre e na capital paulista,

fato que proporcionou a oportunidade de estágios e cursos de pós-graduação

63 Grunert et al., 2005. 64 Entrevista: Professor Leônidas Machado Magalhães, Uma Referência para as Novas

Gerações de Profissionais. Revista CFMV, 10(33):3-6, 2004. 65 Entrevista: Um Expoente da Reprodução Animal no Brasil. Revista CFMV, 7(24):3-10, 2001.

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naquela famosa escola. O Colégio Real de Veterinária de Estocolmo, na Suécia,

graças ao convênio com a FAO (Food and Agriculture Organization of United

Nations) e o governo brasileiro, proporcionou o aperfeiçoamento a muitos

profissionais brasileiros na área de reprodução animal naquela escola.

Destacaram-se os professores Nils Lagerlöf e Alan Bane pelos ensinamentos

proporcionados a profissionais como Renato Campanarut Barnabé, Osvaldo de

Souza Garcia, Raul Gastão Mucciolo, Nei Queiroz Silva, William Gomes Vale e

muitos outros.

Garcia e Barnabé foram os responsáveis por trazer das Escolas Sueca e

Dinamarquesa de Andrologia, as técnicas de avaliação reprodutiva dos animais

domésticos, com enfase para os bovinos, respectivamente para a Escola de

Veterinária da UFMG em Belo Horizonte e para a FMVZ da USP em São Paulo, que

estavam iniciando seus cursos de pós-graduação à nível de mestrado, primeiro na

EV-UFMG em 1968 e mais tarde na USP em 197766.

O curso de pós-graduação em ciências veterinárias da UFRGS foi o segundo

curso criado no país e iniciou em 1969, tendo como coordenador o professor Pedro

Cabral Gonçalves, especialista em parasitologia. Porém, somente em 1975 a área

de Clínica da Reprodução foi incorporada ao curso de pós-graduação e as

primeiras dissertações foram defendidas em 1977, quando Luiz Eustáquio Lopes

Pinheiro apresentou o trabalho “Avaliação da Prevalência de Anomalias

Cromossômicas em Bovinos da Raça Ibagé”, em 30 de junho e Osvaldo de Almeida

Resende apresentou o trabalho “Influência de Alguns Fatores da Inseminação

Artificial sobre a Fertilidade em Galinhas", em 3 de novembro. As duas dissertações

foram orientadas pelo saudoso professor Antônio Mies Filho67.

No rastro dos cursos pioneiros de pós-graduação, surgem outros cursos e

departamentos específicos de reprodução animal em diversas regiões do país, a

maioria em universidades federais, que contribuem para a formação de Mestres e

Doutores em Reprodução Animal de todas as espécies domésticas e silvestres

criadas no Brasil.

66 Vale Filho, Vicente R. A Evolução da Andrologia Veterinária no Brasil e no Mundo. Cad. Téc.

Vet. Zootec., n.35, p.7-14, agosto de 2001. 67 http://www.ufrgs.br/laevet/historico.htm