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Hemangioma primário de córnea: relato de caso Primary corneal hemangioma: case report Eduardo Perlmann - Médico Veterinário, Mestre, Doutorando do Departamento de Clínica Cirúrgica da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo - FMVZ-USP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Luciana Soares Abranches - Médica Veterinária, Pós-graduanda do Curso de Especialização em Oftalmologia Veterinária – Anclivepa/ SP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Emily Amin Khayat Rodriguez - Médica Veterinária, Pós-graduanda do Curso de Especialização em Oftalmologia Veterinária – Anclivepa/ SP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Ana Carolina Almeida de Góes - Médica Veterinária, Mestranda do Departamento de Clínica Cirúrgica da Faculdade de Medicina Veteri- nária e Zootecnia, Universidade de São Paulo - FMVZ-USP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Perlmann E, Abranches LS, Rodriguez EAK, de Góes ACA. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação; 2014; 12(40); 206-211. Resumo Foi atendido um cão, fêmea, sem raça definida, de 8 anos de idade, com histórico de um tecido avermelhado na superfície do olho esquerdo (OE) com evolução de aproximadamente 1 mês. Ao exame oftálmico não foram observadas outras alterações oculares, exceto a presença da massa, ocupando grande parte da superfície corne- ana e discreta secreção mucosa. Foi instituída terapia tópica à base de dexametasona sem melhora clínica. Com base nos achados, a suspeita diagnóstica foi de neoplasia corneana sendo realizada ceratectomia lamelar su- perficial. No pós-operatório, observou-se vascularização leve e opacidade corneana, com visão preservada. O exame histopatológico confirmou o diagnóstico de neoplasia vascular benigna compatível com hemangioma. Houve recidiva após 12 meses e nova cirurgia foi realizada com sucesso. O hemangioma primário de córnea é uma neoplasia rara, e deve ser considerado como diagnóstico diferencial de alterações corneanas não responsi- vas a tratamento clínico. O caso está sendo acompanhado e não houve recidiva até o presente momento. Palavras-chave: cão, córnea, neoplasia, hemangioma, ceratectomia Abstract An 8-year-old dog, female, mixed breed, was presented for evaluation of a reddish tissue on the surface of the left eye (OS) that had been growing for about 1 month. Ophthalmic examination showed no ocular abnor- malities, except for the presence of the mass, affecting much of the corneal surface and discrete mucous dis- charge. Was instituted topical dexamethasone therapy without clinical improvement. . Based on the clinical findings, a diagnosis of corneal neoplasia was suspected. Superficial lamellar keratectomy was performed. Postoperatively, mild corneal opacity and vascularization were noticed, with no visual impairment. Histopa- thological examination confirmed the diagnosis of benign vascular neoplasm compatible with hemangioma. The neoplasia recurred after 12 months and another surgery was successfully performed. Primary heman- gioma of the cornea is a rare neoplasm, and should be considered as differential corneal alterations do not respond to medical treatment. The case is being followed and there was no recurrence to date. Keywords: dog, cornea, neoplasia, hemangioma, keratectomy RELATO DE CASO 206 Oncologia Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2014;12(40); 206-211.

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Hemangioma primário de córnea: relato de casoPrimary corneal hemangioma: case report

Eduardo Perlmann - Médico Veterinário, Mestre, Doutorando do Departamento de Clínica Cirúrgica da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo - FMVZ-USP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Soares Abranches - Médica Veterinária, Pós-graduanda do Curso de Especialização em Oftalmologia Veterinária – Anclivepa/SP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Amin Khayat Rodriguez - Médica Veterinária, Pós-graduanda do Curso de Especialização em Oftalmologia Veterinária – Anclivepa/SP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] Carolina Almeida de Góes - Médica Veterinária, Mestranda do Departamento de Clínica Cirúrgica da Faculdade de Medicina Veteri-nária e Zootecnia, Universidade de São Paulo - FMVZ-USP, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected]

Perlmann E, Abranches LS, Rodriguez EAK, de Góes ACA. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação; 2014; 12(40); 206-211.

ResumoFoi atendido um cão, fêmea, sem raça definida, de 8 anos de idade, com histórico de um tecido avermelhado na superfície do olho esquerdo (OE) com evolução de aproximadamente 1 mês. Ao exame oftálmico não foram observadas outras alterações oculares, exceto a presença da massa, ocupando grande parte da superfície corne-ana e discreta secreção mucosa. Foi instituída terapia tópica à base de dexametasona sem melhora clínica. Com base nos achados, a suspeita diagnóstica foi de neoplasia corneana sendo realizada ceratectomia lamelar su-perficial. No pós-operatório, observou-se vascularização leve e opacidade corneana, com visão preservada. O exame histopatológico confirmou o diagnóstico de neoplasia vascular benigna compatível com hemangioma. Houve recidiva após 12 meses e nova cirurgia foi realizada com sucesso. O hemangioma primário de córnea é uma neoplasia rara, e deve ser considerado como diagnóstico diferencial de alterações corneanas não responsi-vas a tratamento clínico. O caso está sendo acompanhado e não houve recidiva até o presente momento.

Palavras-chave: cão, córnea, neoplasia, hemangioma, ceratectomia

AbstractAn 8-year-old dog, female, mixed breed, was presented for evaluation of a reddish tissue on the surface of the left eye (OS) that had been growing for about 1 month. Ophthalmic examination showed no ocular abnor-malities, except for the presence of the mass, affecting much of the corneal surface and discrete mucous dis-charge. Was instituted topical dexamethasone therapy without clinical improvement. . Based on the clinical findings, a diagnosis of corneal neoplasia was suspected. Superficial lamellar keratectomy was performed. Postoperatively, mild corneal opacity and vascularization were noticed, with no visual impairment. Histopa-thological examination confirmed the diagnosis of benign vascular neoplasm compatible with hemangioma. The neoplasia recurred after 12 months and another surgery was successfully performed. Primary heman-gioma of the cornea is a rare neoplasm, and should be considered as differential corneal alterations do not respond to medical treatment. The case is being followed and there was no recurrence to date.

Keywords: dog, cornea, neoplasia, hemangioma, keratectomy

Relato de Caso

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Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2014;12(40); 206-211.

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Hemangioma primário de córnea: relato de caso

Introdução A maioria das neoplasias que acometem a córnea é

extensão do limbo, esclera ou conjuntiva (1). Neopla-sias de córnea são raras no cão, principalmente neo-plasias primárias de origem vascular, uma vez que a córnea normal não possui vasos (2) e o tecido neoplási-co necessita de nutrição para seu desenvolvimento (3).

A córnea é um tecido avascular que mantém um mecanismo altamente especializado para manutenção da sua transparência, recebe os metabólitos necessá-rios através do humor aquoso, capilares presentes no limbo e filme lacrimal pré-corneano (4). Entretanto, em processos patológicos a córnea pode ser invadida por vasos que surgem a partir do limbo e seguem atra-vés do estroma em direção à área da lesão (5).

O carcinoma de células escamosas é o tumor mais frequentemente relatado na córnea e pode ser causado por diversos fatores, como presença de pe-los que tocam constantemente a córnea causando ir-ritação crônica (6,7), ceratoconjuntivite seca e perda da inervação corneana (8).

A vascularização é um componente normal que participa do processo de reparação após lesões em vários tecidos. A córnea, no entanto, mantém um es-tado avascular através de um balanço entre os fatores angiogênicos e anti-angiogênicos. Quando este equi-líbrio é perdido, o microambiente da córnea favorece os fatores angiogênicos e o processo de vascularização resulta na destruição da arquitetura da córnea, poden-do culminar em perda de transparência corneana (9).

O hemangioma é uma neoplasia benigna, de aparên-cia vermelho brilhante e textura friável, que se origina de células do endotélio vascular e de evolução rápida. Seus principais sítios de ocorrência são: pele, baço, rins, ossos, língua e coração, sendo raro o seu desenvolvimento na região ocular (10,11). A conjuntiva bulbar temporal e a extremidade da membrana nictitante também têm sido mencionadas como sítios de neoplasias, principalmente hemangiomas e hemangiossarcomas (12).

O objetivo deste trabalho é relatar o caso de um cão diagnosticado com hemangioma primário de córnea, submetido à ceratectomia lamelar superficial, com su-cesso na preservação de sua função visual.

Relato de Caso

Um cão, fêmea, de 8 anos de idade, sem raça definida e pelagem branca, foi encaminhado para

avaliação de um tecido avermelhado na superfície do olho esquerdo (OE), com evolução de aproxima-damente um mês, sem histórico de trauma ocular ou outros antecedentes mórbidos (figura 1). Não foi observado prurido, blefarospasmo ou hiperemia conjuntival em ambos os olhos (AO), apenas secre-ção mucosa discreta em OE.

Figura 1 - Aspecto do OE, evidenciando presença de tecido ver-melho brilhante, liso, ligeiramente elevado, com bordos defini-dos, não ulcerados e sem comprometimento do fechamento pal-pebral, acometendo as regiões central e paracentral da córnea.

Ao exame oftálmico, as conjuntivas palpebral e bulbar e pálpebras não apresentavam quaisquer al-terações. Ao exame da córnea, contudo, evidenciou--se a presença de tecido vermelho brilhante, liso, ligeiramente elevado, com bordos definidos, não ulcerados e sem comprometimento do fechamento palpebral, acometendo as regiões central e paracen-tral da córnea do OE.

A resposta à ameaça e o reflexo de ofuscamento estavam presentes no olho direito (OD) e não passí-veis de avaliação em OE, devido à presença da massa.

Em ambos os olhos os reflexos pupilares à luz estavam presentes. Os testes de tingimento pela fluoresceína, retropulsão, teste lacrimal de Schir-mer (Ophthalmos Ind. Farmacêutica, São Paulo, Brasil) e pressão intraocular (Tono-Pen XL®; Men-tor, Norwell, MA, USA) estavam dentro dos pa-drões de normalidade.

A presença do tecido anormal ocupando gran-de parte da córnea impediu a avaliação do OE pela fundoscopia, ao passo que o exame do OD não evi-denciou nenhuma anormalidade.

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Hemangioma primário de córnea: relato de caso

Exame físico e perfil hematológico também não apresentaram quaisquer alterações.

Frente ao rápido crescimento e intensa vascula-rização, as principais suspeitas diagnósticas foram de tecido de granulação ou neoplasia.

Foi instituído, então, tratamento com colírio de de-xametasona a 0,1% (Maxidex®, Alcon, São Paulo, SP, Brasil), 4 vezes ao dia, durante 10 dias. Não houve me-lhora clínica e o tratamento cirúrgico foi indicado.

Realizou-se o procedimento cirúrgico, sob anes-tesia geral, para a excisão do tumor. A técnica em-pregada, com auxilio de microscópio cirúrgico (DFV, Valença, RJ), foi a ceratectomia lamelar superficial. Houve hemorragia transoperatória significativa até a aparente remoção total do tecido que se localizava até o estroma anterior da córnea. Não foi removido tecido conjuntival ou límbico, uma vez que a massa encontrava-se confinada à córnea. O tecido removi-do estava localizado superficialmente no estroma an-terior, facilitando a excisão cirúrgica. Após a remo-ção da massa, foi realizado flap de terceira pálpebra com o objetivo de proteção da córnea.

As medicações utilizadas no pós-operatório in-cluíram gatifloxacino a 0,3% colírio (Zymar®, Al-lergan, SP, Brasil) 1 gota a cada 4 horas, durante 3 semanas e ácido etilenodiamino tetra-acético dissó-dico (EDTA) a 0,35% colírio (Ophthalmos, SP, Bra-sil) 1 gota a cada 6 horas durante 3 semanas.

O tecido excisado foi fixado em formalina tam-ponada a 10% e enviado para análise histopatológi-ca. Na avaliação microscópica foi observada prolife-ração de células fusiformes, localizadas no estroma corneano, formando inúmeros vasos sanguíneos ir-regulares. O grau de pleomorfismo e atipia era bai-xo e figuras de mitose não foram observadas (figu-ra 2). Os achados clínicos e histopatológicos foram compatíveis com hemangioma primário de córnea.

Um mês após o procedimento cirúrgico, a córnea estava completamente epitelizada, apresentando poucos vasos sanguíneos e leve opacidade superfi-cial. Testes de ameaça e obstáculos foram realizados e constatou-se que a visão fora preservada. Transcor-ridos 12 meses após o procedimento cirúrgico, houve recidiva na região central da córnea (figura 3).

Figura 2 - Proliferação de células endoteliais localizadas no es-troma corneano, formando inúmeros vasos sanguíneos irregula-res. Note que não há acometimento do epitélio de revestimento (Hematoxilina & Eosina, Objetiva 10x).

Figura 3 - Olho esquerdo 12 meses após a primeira cirurgia.

Ao exame do olho contralateral, observou-se um tecido de coloração vermelho brilhante, friável e bem delimitado na extremidade da membrana nictitante (figura 4). Foi realizada nova ceratectomia lamelar superficial no OE e excisão parcial da membrana nictitante do OD. Os materiais foram enviados para exame histopatológico e foi confirmado o diagnósti-

co de hemangioma em ambos os fragmentos. Após 6 meses, o animal não apresentou recidiva.

Ao exame oftálmico, entretanto, o teste lacrimal de Schirmer teve como resultado 2 mm/min no OE, além de evidenciar intensa vascularização da cór-nea (figura 5) em decorrência da ceratoconjuntivite seca que se desenvolveu.

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discussão

A ocorrência de tumores de origem vascular na córnea é rara. Poucos casos foram reportados até o presente momento, dentre eles, o hemangiossarcoma primário em córnea de um cão anteriormente diag-nosticado com ceratite crônica (13) e, também, de um caso de hemangiossarcoma primário corneano em um gato (14). Demais relatos estão relacionados à in-vasão de neoplasias a partir do limbo ou conjuntiva (1,15,16). Não foram encontrados na literatura outros casos de hemangioma primário em córnea.

Em estudo realizado com 108 casos de tumores vasculares de conjuntiva canina, (70 hemangiomas e 38 hemangiossarcomas), a média de idade dos pa-cientes foi de 8,6 anos e notou-se tendência ao desen-volvimento destes tumores em animais que praticam atividade ao ar livre e que têm pouca pigmentação em anexos oculares. Tais tumores surgem mais fre-quentemente no epitélio não pigmentado da conjun-tiva bulbar temporal e da extremidade da membrana nictitante. Neste mesmo estudo, também se compa-rou o nível de radiação ultravioleta (UV) dos locais de onde os animais residiam com a prevalência de tumores de origem vascular e observou-se que o ris-co de desenvolvimento de hemangiossarcoma au-menta proporcionalmente com o aumento do nível de exposição aos raios UV (12). Fatores como idade, pelagem branca e histórico de atividade ao ar livre, relacionados ao surgimento desse tipo de neoplasias, como observado neste estudo, foram igualmente en-contrados no relato de caso em questão.

Tumores necessitam de nutrientes e oxigênio; bem como têm necessidade de eliminar metabólitos e dióxido de carbono. A neovascularização associa-da ao tumor supre estas necessidades e novos vasos continuam a surgir, possibilitando a sustentação e a expansão tumoral (3). A origem de uma neoplasia vascular em um tecido avascular é desconhecida. Apesar de o animal do presente relato não apresen-tar sinais de agressão crônica à superfície ocular, o aparecimento de vasos sanguíneos pode ter dado origem a uma transformação neoplásica dos mes-mos, culminando no desenvolvimento da neoplasia.

As neoplasias oculares podem trazer consequên-cias devastadoras para a visão, mesmo quando classi-ficadas como benignas. Uma massa em expansão pode prejudicar o funcionamento das estruturas adjacentes e eventualmente causar a perda da visão (10,11). Portan-to, o tratamento para uma neoplasia em crescimento na superfície ocular é a ceratectomia lamelar, que pode ser curativa na maioria dos casos (17,18).

A córnea é uma estrutura delicada, com espes-sura de 587.72 ± 32.44 µm em sua área central na espécie canina; informação esta que fora essencial ao planejamento cirúrgico (19). Pois, apesar de ocu-par uma área extensa em proximidade ao limbo em grande parte da superfície corneana superficial, o tumor acometia apenas o estroma anterior, o que possibilitou sua excisão sem o comprometimento de camadas mais profundas. A única dificuldade enfrentada no período transoperatório foi hemorra-gia local, a qual cessou quando a massa foi inteira-mente removida.

Hemangioma primário de córnea: relato de caso

Figura 4 - Tecido de coloração vermelho brilhante, friável e bem delimitado na extremidade da membrana nictitante do olho direito.

Figura 5 - Olho esquerdo 6 meses após a segunda cirurgia. Notar a ausência da massa e intensa vascularização difusa se-cundária a ceratoconjuntivite seca.

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Como a neoplasia encontrava-se totalmente na córnea, foi diagnosticada como primária, isto é, originou-se na própria córnea. De acordo com o que relataram Karasawa e Takiyama (2008), os ca-sos de hemangioma e hemangiossarcoma oculares estão sujeitos à recorrência após ceratectomia lame-lar (6,7), e, de fato, houve recidiva após um ano no animal deste relato. Sabe-se, ainda, que a recorrên-cia acontece com maior frequência nos casos de he-mangiossarcoma (12). A técnica utilizada foi efetiva quanto ao prognóstico visual, pois, mesmo na ocor-rência de recidiva, o animal teve a visão preservada.

O paciente deste relato de caso desenvolveu ce-ratoconjuntivite seca unilateral após 12 meses da última cirurgia, apenas no olho submetido à cera-tectomia lamelar. Aventou-se, então, a hipótese de que o olho seco tenha sido conseqüência da lesão na inervação corneana no momento da ceratectomia. Sabe-se que procedimentos que requerem incisão na córnea, como a ceratectomia realizada no animal deste relato, podem causar interrupção no trajeto das fibras nervosas (21,22), causando hipoestesia e interferindo na produção lacrimal reflexa (21), além de diminuir a freqüência do piscar, o que aumenta a evaporação da parte aquosa da lágrima e agrava o olho seco (23,24). Há, ainda, a liberação de media-dores inflamatórios que alteram o potencial de ação nos receptores nervosos e diminuem sua capacida-de de resposta, resultando, também, em redução da sensibilidade corneana (23,26). Ocorre, portanto, uma epiteliopatia neurotrófica (23,24).

A redução da sensibilidade da córnea em decor-rência de ceratectomias (23,24, 25,26,27) é bem docu-mentada em pacientes humanos, podendo estas afir-mações serem extrapoladas para a espécie canina e explicar a ceratoconjuntivite seca unilateral reportada.

Considerações Finais

O hemangioma primário de córnea, apesar de raro, deve ser considerado como diagnóstico dife-rencial de massa elevada na superfície corneana do cão. No presente relato, o tumor acometeu apenas a porção superficial da córnea, houve recidiva após o primeiro procedimento, pois mesmo tumores be-nignos como o hemangioma podem ter comporta-mento clínico maligno, em que uma das caracterís-ticas é a recidiva. Devido a este comportamento, o caso está sendo acompanhado e não houve recidiva

até o presente momento. A ceratectomia lamelar su-perficial foi efetiva neste caso, e apesar da recidiva, obteve-se bom prognóstico da função visual.

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Recebido para publicação em: 11/02/2014.Enviado para análise em: 21/02/2014.Aceito para publicação em: 19/03/2014.

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