guia pratico de governanca corporativa

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Guia Prtico de Governana CorporativaExperincias do Crculo de Companhias da Amrica Latina

Motivao

Direitos Autorais 2009 Corporao Financeira Internacional 2121 Pennsylvania Ave., NW, Washington, DC 20433 Estados Unidos da Amrica Um Membro do Grupo Banco Mundial Todos os direitos reservados As constataes, interpretaes e concluses expressas nesta publicao no devem ser atribudas de forma alguma Corporao Financeira Internacional (IFC), Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE), a suas organizaes afiliadas ou aos membros dos respectivos conselhos de administrao ou aos pases que eles representam. A IFC e a OCDE no garantem a exatido dos dados includos nesta publicao e no aceitam qualquer responsabilidade decorrente do seu uso. As informaes sobre as empresas, organizadas pelas prprias integrantes do Crculo de Companhias da Mesa Redonda Latino-Americana de Governana Corporativa, refletem a viso de suas diretorias executivas e conselhos de administrao no que se refere aos motivos, desafios, solues e benefcios obtidos com o planejamento e implementao das regras e melhores prticas de governana. Esta publicao protegida por direitos autorais. A cpia e/ou a reproduo total ou parcial desse material sem permisso pode constituir violao das leis em vigor. A IFC e a OCDE incentivam, no entanto, a divulgao desse contedo e de antemo concedem permisso para sua reproduo parcial para uso pessoal e no comercial, sem direito de revenda, redistribuio ou criao de trabalhos derivados. Qualquer outra cpia ou uso deste trabalho requer a autorizao expressa por escrito da IFC.

Guia Prtico de Governana CorporativaExperincias do Crculo de Companhias da Amrica Latina

Corporao Financeira Internacional (IFC) A Corporao Financeira Internacional (IFC International Finance Corporation) integra o Grupo do Banco Mundial, tendo sido fundada em 1956 para incentivar a liderana do setor privado no crescimento econmico sustentvel dos pases em desenvolvimento atravs de financiamentos de projetos, mobilizao de capital nos mercados financeiros internacionais e prestao de servios de consultoria empresarial e governamental. A IFC oferece suporte para que empresas e instituies financeiras em pases emergentes promovam a gerao de empregos e receitas tributrias, alm de incrementar as prticas de governana corporativa e desempenho ambiental, contribuindo com as comunidades locais. Na Amrica Latina e no Caribe, a IFC concentra suas atividades nos principais desafios ao desenvovimento enfrentados pela regio, trabalhando na melhoria do ambiente de negcios ao oferecer acesso mais amplo a financiamentos e incentivar o aumento da infraestrutura. As prioridades estratgicas da IFC na regio tambm incluem: Incentivar a sustentabilidade ambiental e social e elevar os padres de governana corporativa. O objetivo promover a vida, especialmente daquelas pessoas que mais podem se beneficiar do desenvolvimento econmico.

Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE) A Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE) um frum nico em que os governos de 30 democracias trabalham em conjunto e em colaborao estreita com outras economias para abordar os desafios econmicos, sociais e ambientais da globalizao. Um desses desafios a governana corporativa, um tpico sobre o qual a OCDE desenvolveu um conjunto de Princpios acordados internacionalmente e que tem servido como base para dilogos regionais sobre o tema em todo o mundo. A Mesa Redonda Latino-Americana de Governana Corporativa uma das iniciativas organizadas anualmente pela OCDE em parceria com a IFC/Grupo Banco Mundial e com o apoio do Frum Global de Governana Corporativa, oferecendo a oportunidade para que os governos e demais partes interessadas possam comparar experincias, buscar respostas para problemas comuns, identificar boas prticas e trabalhar para coordenar polticas nacionais e internacionais. Frum Global de Governana Corporativa (GCGF) O Frum Global de Governana Corporativa um fundo fiducirio de vrios doadores da Corporao Financeira Internacional (IFC), que integra os Servios de Consultoria da instituio. Fundado em 1999 pelo Banco Mundial e pela Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE), o Frum promove o setor privado como motor do desenvolvimento econmico, reduz a vulnerabilidade de economias em desenvolvimento e em transies em crises financeiras e incentiva que as empresas invistam para produzir com mais eficincia e responsabilidade social. O Frum patrocina iniciativas locais e regionais que debatam os pontos fracos da governana corporativa em pases de baixa e mdia rendas dentro do contexto de programas econmicos nacionais ou regionais mais amplos. Alm da IFC, o Frum financiado atualmente por agncias dos governos da Frana, Luxemburgo, Holanda, Noruega e Sua.

Sumrio

viii xi xiii 3 11 13 14 18 19 20 21 24 26 29 31

Sobre o Crculo de Companhias Uma palavra do presidente Prefcio Agradecimentos Introduo Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios 1 Acessando capital ou reduzindo o custo do capital 1.1 Boa governana leva a melhores avaliaes de mercado 1.2 Atraindo e retendo acionistas 1.3 Reduzindo o custo do capital, diversificando a estrutura de capital 2 Enfrentando e respondendo s presses do mercado externo 3 Equilibrando os interesses algumas vezes divergentes dos acionistas 4 Resolvendo questes de governana em empresas familiares 5 Garantindo a sustentabilidade das empresas 5.1 Atraindo e retendo executivos para garantir a implementao de estratgias 6 Obtendo melhores resultados operacionais Captulo 2 Alinhamento de propsitos: mudando atitudes e gerando compromisso 1 Acordar sobre uma viso comum; alinhar interesses 1.1 Superando o problema de agncia: aproximando os interesses de gestores e proprietrios 1.2 Identificar os promotores da governana corporativa 1.3 Desenvolvendo uma compreenso comum em toda a empresa 1.4 Compreendendo as fontes de resistncia; tomando medidas para superar 2 Mudando atitudes Captulo 3 Planejando e definindo prioridades 1 Definindo as prioridades 1.1 As motivaes orientam a priorizao 2 O papel dos padres de referncia (benchmarks) 3 Fontes de aconselhamento e orientao 4 Menos mais: desenhe um roteiro de fcil compreenso

37 38 38 39 40 45 47 51 52 53 55 57 60

65 66 71 71 73 75 78 82 84 87 88 92 95 97 99 99 102 105 108 109 114 115 117 127 128 132 134 136 137 139 140 142 155 155 157 161 163 164 165 169 171

Captulo 4 O que fazer: principais prticas de boa governana corporativa 1 Formalizao das polticas de governana: cdigos e diretrizes 2 Funcionamento do conselho de administrao e relaes com os diretores executivos 2.1 O conselho de administrao: o motor da governana 2.2 A composio do conselho de administrao: tamanho, mix de aptides e experincias 2.3 Independncia dos conselheiros 2.4 Comits especializados: analisando a fundo as questes 2.5 Procedimentos do conselho de administrao 2.6 Conselhos melhores requerem avaliao de desempenho 2.7 A eficcia do conselho exige ateno a vrios detalhes 2.8 Relacionamento entre o conselho de administrao e a diretoria executiva 2.9 O relacionamento entre o presidente do conselho de administrao e o presidente executivo 2.10 Planejamento de sucesso para os executivos seniores 2.11 Sistemas de monitoramento para medir o desempenho, avaliao e remunerao da gesto 3 Fortalecimento dos direitos de acionistas e manuteno do alinhamento 3.1 Organizando as assembleias de acionistas 3.2 Assembleias em empresas com grande base de acionistas 3.3 Direitos a tag-along 3.4 Criando regras claras para tratar conflitos de interesse 4 Melhoria do ambiente de controle 5 Transparncia e divulgao de informaes 5.1 Organizando a divulgao de informaes 5.2 Comunicao com o mercado: muito mais do que transparncia Captulo 5 Desafios da governana corporativa nas empresas familiares 1 Vantagem da empresa familiar 2 Desafios de governana corporativa nas empresas familiares 3 Solues de governana corporativa para os desafios das empresas familiares 3.1 Distino das solues de governana corporativa em diferentes estgios de propriedade da empresa familiar 3.2 Instituies de governana familiar 3.3 Documentos de governana familiar 3.4 Solues especficas para alguns desafios governana familiar 3.5 Planejamento da sucesso na empresa familiar Captulo 6 Implementando governana corporativa O processo de implementao leva tempo Governando a governana Monitoramento do progresso da implementao Procedimentos provisrios e situaes em transio Comunicao das mudanas 5.1 Convencendo os cticos 5.2 Aprendendo com as reaes de pessoas de fora 6 A busca de melhores prticas um processo de aprendizado contnuo 1 2 3 4 5

179 180 181 182 182 184 186 186 188 190 192 193 193 196 198 199 205 207 211 237 239 253 261 269

Captulo 7 Os benefcios tangveis da boa governana corporativa 1 Abordagem geral em relao anlise comparativa 1.1 Anlise apresenta cinco abordagens 2 Impacto da governana corporativa sobre indicadores operacionais 2.1 Comparao de indicadores contbeis tradicionais 2.2 A segunda abordagem: anlise do lucro econmico mostra resultados positivos 3 Impacto da governana corporativa no custo de capital 3.1 Comparao de indicadores tradicionais do mercado de aes 3.2 Anlise do impacto de divulgaes de melhorias de governana corporativa 3.3 O resultado final: anlise do retorno total das aes 3.4 Qual o grau de robustez dos resultados? 4 Benefcios da boa governana corporativa durante a crise financeira do final de 2008 4.1 Comparao dos indicadores operacionais e de mercado 4.2 Anlise da reao do mercado s aes das empresas do Crculo em 2008 4.3 Atributos corporativos que afetam o melhor desempenho das aes durante um choque econmico 5 Membros do Crculo de Companhias reconhecem os ganhos Apndice 1 Matriz de Progresso de Governana Corporativa da IFC Apndice 2 Organizaes envolvidas com governana corporativa Apndice 3 Questionrio sobre os padres de referncia de governana corporativa Apndice 4 Definio indicativa de conselheiro independente da Corporao Financeira Internacional (IFC) Apndice 5 Metodologia da anlise do Captulo 7 Referncias Glossrio ndice

Sobre o Crculo de Companhias uma palavra do presidenteTenho o prazer de compartilhar com voc esta grande iniciativa do Crculo de Companhias da Amrica Latina um momento muito especial em sua histria. O Crculo de Companhias foi criado em maio de 2005 por recomendao da Mesa Redonda Latino-Americana de Governana Corporativa uma rede de autoridades pblicas, investidores, institutos no governamentais, bolsas de valores e associaes, assim como outros interessados no aprimoramento da governana corporativa (GC) naquela regio. Reunindo um grupo de catorze empresas latino-americanas, o Crculo oferece a viso do setor privado nos trabalhos da Mesa Redonda e compartilha entre si e com a comunidade empresarial da regio as experincias na aplicao dos princpios da boa governana. O Crculo de Companhias composto por empresas de cinco pases da Amrica Latina, que demonstraram liderana na adoo de boas prticas de GC, ajudando a desenvolver negcios e empresas mais slidas: Atlas, da Costa Rica; Argos e ISA, da Colmbia; Buenaventura e Ferreyros, do Peru; Homex, do Mxico; e CCR, CPFL ENERGIA, Embraer, Marcopolo, Natura, NET, Suzano e Ultrapar do Brasil. As integrantes do Crculo de Companhias so empresas com aes negociadas nas bolsas locais e internacionais, tendo, portanto, presena significativa em seus mercados de capitais. Embora suas experincias apresentem relevncia mais imediata para as empresas listadas, as participantes do Crculo consideram que as prticas implementadas em relao aos conselhos de administrao, relacionamento com investidores e demais partes interessadas, controles internos e transparncia tambm podem servir de aprendizado para as companhias de capital fechado, incluindo as familiares. Sendo assim, os esforos para compartilhar experincias na regio no se limitam comunidade formada por grandes companhias com aes em bolsa.

As catorze empresas do Crculo trabalham em conjunto para: Promover as melhores prticas de governana corporativa na regio, ampliando a compreenso sobre o tema e auxiliando na estruturao de polticas Promover o contnuo dilogo entre os setores privado e pblico para troca de experincias Monitorar e avaliar o progresso da governana corporativa na regio Identificar a demanda por assistncia tcnica em governana corporativa e estimular a formao de especialistas Informar a comunidade internacional sobre as iniciativas de reforma nacionais e regionais Hoje o Crculo de Companhias mais do que uma oportunidade para compartilhar experincias e trabalha para ser reconhecido como um centro de estudos atualizado, experiente e ativo em prticas de governana corporativa na Amrica Latina. Este livro o resultado de nossos esforos para realizar esta ambiciosa misso. Estamos confiantes de que estes esforos iro ajudar todos os entusiastas da governana corporativa a cultivar os valores profissionais e ticos dos quais dependem o bom funcionamento dos mercados. Aproveitem a leitura,

Andr Covre Presidente do Crculo de Companhias

PrefcioEm curto espao de tempo, o Crculo de Companhias da Amrica Latina tornou-se um dos mais vibrantes e eficazes defensores das melhores prticas de governana corporativa em toda a regio. Fundado em 2005 pela Corporao Financeira Internacional (IFC) e pela Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE), por recomendao da Mesa Redonda LatinoAmericana de Governana Corporativa, o Crculo rapidamente, conquistou reputao positiva pela forma generosa e aberta com que seus integrantes compartilham experincias nos diversos eventos realizados em toda a Amrica Latina com o objetivo de elevar o patamar de conscincia sobre a GC. Para ampliar ainda mais o escopo desse intercmbio, as experincias das empresas integrantes do Crculo de Companhias no desenvolvimento de melhores regras e prticas de governana corporativa esto destacadas na publicao anterior, Estudos de Caso de Boa Governana Corporativa. O esforo conjunto da IFC e da OCDE com parceiros regionais e locais para incentivar a adoo das prticas de governana corporativa, na Amrica Latina e em todo o mundo, tem propiciado um avano no mbito das empresas e da estruturao de polticas. Um dos primeiros resultados positivos foi o documento pioneiro Relatrio Oficial sobre Governana Corporativa na Amrica Latina (White Paper on Corporate Governance in Latin America) da Mesa Redonda Latino-Americana de Governana Corporativa. Alm disso, os avanos incluem reformas legais e normativas, o desenvolvimento de cdigos nacionais de melhores prticas, a criao de instituies de defesa e apoio, os esforos pioneiros do Novo Mercado no Brasil e a crescente ateno recebida pelo tema junto aos participantes do mercado. Contudo, os progressos no so universais e h muito mais a fazer. Como a atuao do Crculo de Companhias demonstra, a comunidade empresarial um importante impulsor para a reforma. Embora os formuladores de polticas e reguladores tenham um papel essencial na definio do contexto geral, o setor privado que garante a implementao bemsucedida nesse campo. Saudamos, portanto, essa iniciativa de algumas das principais empresas listadas da Amrica Latina por desenvolver esse Guia Prtico de Governana Corporativa: Experincias do Crculo de Companhias da Amrica Latina (Experiences from the Latin American Companies Circle). o primeiro Guia desse tipo produzido para empresas da Amrica Latina que reflete um conjunto diverso de experincias empresariais da regio. Sua orientao prtica e simples e seus exemplos tangveis e relevantes devem ser de enorme ajuda para empresas que comeam a rumar para uma melhor governana corporativa. Quando a ideia de criar esse Guia nasceu, mercados do mundo inteiro, especialmente na Amrica Latina, estavam em rpida e bem-sucedida expanso, o que deve ser atribudo, pelo menos parcialmente, ao avano da GC na regio. Hoje, com a situao econmica global alterada pela crise financeira e o consequente e generalizado desaquecimento econmico, destaca-se a importncia das prticas consistentes de governana corporativa para o desenvolvimento de empresas slidas. Portanto, este Guia Prtico no poderia chegar em melhor hora. Estamos convencidos de que esse Guia ser amplamente divulgado e usado pelas empresas da Amrica Latina, resultando em outras melhorias em sua governana corporativa. Gostaramos de agradecer a todas as empresas integrantes e aos colaboradores do Crculo de Companhias, especialmente aos seus competentes presidentes, Roque Benavides, da Buenaventura, no Peru; Carlos Yepes, da Argos, na Colmbia; e Andr Covre, da Ultrapar, no Brasil. Todos contriburam muito para tornar o Crculo de Companhias um sucesso. Toshiya Masuoka Carolyn Ervin

Diretor do Departamento de Consultoria Corporativa Corporao Financeira Internacional IFC

Diretora para Assuntos Financeiros e Empresariais Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico OCDE

AgradecimentosA preparao e a publicao deste Guia Prtico envolveram a participao de um grande nmero de pessoas dedicadas e tm sido um esforo produtivo e de colaborao. Em nome da Corporao Financeira Internacional (IFC) e da Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE), gostaramos de expressar nossa sincera gratido a Sandra Guerra, coordenadora do Crculo, por todos os seus esforos na produo deste Guia. Ela foi de grande ajuda na idealizao e desenvolvimento do esboo do Guia e no preparo da primeira verso ao solicitar, coletar, coordenar e editar pacientemente os dados das empresas do Crculo de Companhias. Sandra Guerra trabalhou diligentemente com as organizaes patrocinadoras para melhorar ainda mais a verso preliminar original. Nossos sinceros agradecimentos s vrias empresas e indivduos cujos esforos ajudaram a tornar este Guia uma realidade. Seu apoio foi uma constante desde a primeira reunio do Crculo de Companhias em maio de 2005, quando o cerne da ideia comeou a ganhar forma. O Guia abrange conceitos e contribuies de vrios acionistas, membros do conselho de administrao e importantes executivos, representando 14 empresas, sediadas em cinco pases da Amrica Latina. Eles compartilham um vnculo comum o compromisso de ampliar e difundir o conhecimento das melhores prticas de governana corporativa. As pginas do Guia refletem esse forte compromisso e estamos profundamente gratos a eles. Nossos colaboradores forneceram grande nmero de dados qualitativos e quantitativos, dedicando seu valioso tempo para explorar argumentos e motivaes na implementao de melhores prticas de governana corporativa. E expressaram os pontos altos e baixos da experincia. Sua disposio para realizar esse enorme trabalho resultou em um volume extremamente prtico e amplo que no se resume a narrar eventos. Em vez disso, o livro destaca as motivaes e os mtodos, detalha os resultados quantificveis, oferece lies teis extradas de experi-

ncias reais e fornece uma orientao clara sobre medidas a serem adotadas. Em alguns casos, os colaboradores, que comearam a jornada conosco e cujo entusiasmo pela causa superou de longe nossas expectativas, seguiram outros desafios. Ficamos gratos por seus sucessores terem mantido o mesmo nvel de compromisso e contribuio. Um agradecimento especial s pessoas dedicadas das empresas integrantes do Crculo de Companhias que tornaram esse trabalho possvel e asseguraram a contribuio de participanteschave: Carlos Raul Yepes e Maria Uriza, da Argos; Diego Artiano e Roberto Truque Harrington, da Atlas; Daniel Dominguez e Roque Benavides, da Buenaventura; Eduardo Andrade, Francisco Bulhes, Massami Uyeda, Renato Vale e Silvia Salmeron, da CCR; Gislia da Silva, Marco da Camino Soligo e Wilson Ferreira Jr., da CPFL ENERGIA; Anna Cecilia Bettencourt Cochrane, Antonio Luiz Pizarro Manso e Carlos Eduardo Camargo, da Embraer; Mariela Garca de Fabbri e Patricia Gastelumendi Lukis, da Ferreyros; Eustaquio de Nicols Gutierrez e Javier Romero, da Homex; Juan David Bastidas Saldarriaga, da ISA; Jos Rubens de la Rosa e Thiago A. Deiro, da Marcopolo; Fernando Mesquita, Helmut Bossert, Jos Guimares Monforte, Moacir Salzstein e Pedro Passos, da Natura; Joo Elek, Leonardo P. Gomes Pereira e Marcio Minoru Miyakava, da NET; Andrea Pereira, Bernardo Szpiegel, David Feffer, Joo Nogueira Batista e Maria Cecilia de Castro Neves, da Suzano; Andr Covre, Fabio Schvartsman, Marcello De Simone, Maria Fernanda Leme Brasil e Pedro Wongtschowski, da Ultrapar. A determinao das trs organizaes patrocinadoras e de seus lderes Darrin Hartzler, da IFC; Mats Isakson, da OCDE; e Phil Armstrong do Frum Global de Governana Corporativa ajudou a garantir que a ideia do Guia se tornasse realidade. Nosso agradecimento tambm aos esforos exercidos por vrias pessoas a equipe atual e a anterior das organizaes patrocinadoras. Mike Lubrano abraou o desafio de organizar esse Guia quando era o Diretor Executivo da unidade de Governana Corporativa na IFC e continuou a ser um colaborador incansvel mesmo

aps deixar a instituio. Sem ele, esse Guia no estaria nas mos das pessoas hoje. Nancy Metzger, que trabalhava no GCGF quando o projeto teve incio, props e implementou solues prticas para ajudar a equipe a superar desafios operacionais complexos. Santiago Chaher, seu sucessor, demonstrou o mesmo nvel de dedicao e viso. Cuauhtmoc Lopez-Bassols, da OCDE, tambm prestou um apoio valioso para este projeto. Alexandre Di Miceli da Silveira, Doutor e Mestre, Professor de Contabilidade e Finanas da Escola de Economia, Negcios e Contabilidade da Universidade de So Paulo, props a estrutura da pesquisa para o ltimo captulo. Ele supervisionou a coleta e a anlise de dados que formaram a base dos resultados detalhados naquele captulo. Agradecemos por sua ampla contribuio. Cristina SantAnna agradecemos a colaborao na edio final do texto em portugus desse livro.

A governana corporativa um processo contnuo. medida que as circunstncias mudam ao longo do tempo, os esforos da governana tambm mudaro. Esperamos que esse volume sirva de orientao queles com interesse em cuidar da governana de suas empresas, independentemente do ponto em que estejam do processo. Daniel Blume, Administrador-Chefe da Diviso de Assuntos Corporativos da OCDE

Davit Karapetyan, Especialista de Governana Corporativa da Unidade de Governana Corporativa da IFC

I

1

Introduo

Introduo

U

ma iniciativa de 14 empresas lderes da Amrica Latina, o Guia Prtico de Governana Corporativa: Experincias do Crculo de Companhias da Amrica Latina resume as lies extradas de suas experincias na melhoria de sua prpria governana. O Guia serve como um roteiro para outras empresas latino-americanas interessadas em aprimorar sua governana corporativa (GC). Embora o processo de elaborao do Guia tenha se estendido ao longo de vrios anos, o cronograma de sua publicao coincide com uma crise financeira global que tem catapultado a governana corporativa para o topo da lista na agenda de polticas globais. Com lacunas na governana desde gesto inadequada de riscos at estrutura de incentivos distorcidos que contribuem para a crise, boas prticas de governana corporativa sero uma parte importante da resposta necessria para as economias da Amrica Latina, assim como para outras no mundo inteiro. Alm da existncia da crise, a Amrica Latina possui um conjunto nico de caractersticas de governana corporativa e de mercado: uma predominncia de conglomerados e uma estrutura de propriedade altamente concentrada, frequentemente familiar. Alm disso, os mercados de capitais nacionais ainda esto em estgios iniciais de desenvolvimento. Tudo isso representa desafios especiais para atrair investimentos e eleva a importncia das prticas de governana. Entre esses desafios, est o de ampliar a proteo dos direitos e interesses dos acionistas para garantir que os minoritrios tenham confiana suficiente para investir em empresas listadas. Nesse contexto, tem havido um notvel aumento da conscientizao e da prtica da governana corporativa durante a ltima dcada, conforme reconhecido pela Mesa Redonda LatinoAmericana de Governana Corporativa. Essa uma iniciativa contnua da Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE) e da Corporao Financeira Internacional/ Grupo Banco Mundial (IFC), que renem anualmente formuladores de polticas, reguladores, bolsas de valores, investidores, empresas e outras partes interessadas para tratar de questes especficas da GC para o contexto da Amrica Latina. O Relatrio Oficial sobre Governana Corporativa na Amrica Latina, publicado em 2003, foi uma primeira tentativa de descrever as prioridades das polticas pblicas e as boas prticas para a regio. Ao reconhecer que ainda h muito a ser feito, a Mesa Redonda prosseguiu com a criao do Crculo de Companhias, em 2005, para promover a implementao da governana corporativa nas empresas. Esse Guia Prtico uma consequncia natural desses esforos, envolvendo muitas etapas ao longo do caminho. Quando os membros da Mesa Redonda sentiram necessidade de uma maior participao das empresas do setor privado, nasceu o Crculo de Companhias. Um primeiro livro de estudos de casos foi lanado em 2005, com uma segunda edio ampliada publicada em 2006. As empresas integrantes do Crculo estavam interessadas em compartilhar experincias e acreditavam que um pblico empresarial mais amplo na Amrica Latina poderia se beneficiar de um Guia Prtico que explorasse os motivos e os meios utilizados para aprimorar sua governana. O Guia Prtico de Governana Corporativa: Experincias do Crculo de Companhias da Amrica Latina oferece uma oportunidade aos lderes empresariais latino-americanos de

Guia Prtico de Governana Corporativa

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aprender com a experincia dos colegas a implementar melhorias substanciais de forma bemsucedida nos padres e prticas de governana, abrindo um raro acesso aos principais executivos, acionistas e membros do conselho de administrao das pioneiras nas prticas de GC na regio. Entre essas empresas esto: Atlas, da Costa Rica; Argos e ISA, da Colmbia; Buenaventura e Ferreyros, do Peru; Homex, do Mxico; e CCR, CPFL ENERGIA, Embraer, Marcopolo, Natura, NET, Suzano e Ultrapar, do Brasil. O Guia rene com exclusividade quatro diferentes dimenses: casos das prprias empresas; resultados de estudos de mercado e acadmicos com evidncias dos benefcios da governana; padres de melhores prticas de referncias institucionais, incluindo IFC, OCDE e o Frum Global de Governana Corporativa; e, finalmente, evidncias empricas com a comparao dos resultados das empresas do Crculo aos de seus pares na Amrica Latina. A natureza prtica do livro resultado das experincias reais dos lderes, que relatam os porqus e como implementaram as polticas e prticas de governana corporativa. O Guia possibilita aos leitores um nvel raro de acesso a um amplo conjunto de partes interessadas que afetam a governana e so afetadas por ela: desde acionistas a membros do conselho at diretores executivos. Testemunhos ricos e na primeira pessoa so parte integrante do livro quando lderes experientes compartilham motivaes, linhas de pensamento e experincias, oferecendo solues prticas que foram tentadas e testadas previamente e podem ser implementadas. O mesmo tipo de empresas que forneceu informaes o que mais pode se beneficiar deste Guia, especialmente aquelas j listadas ou as que consideram abrir capital e pretendem compreender em profundidade a abrangncia do impacto em seu padro de governana. O Guia tambm ser benfico para executivos e proprietrios de empresas de capital privado interessados em aprofundar seu conhecimento de melhores prticas e em aproveitar as experincias de lderes que escolheram essa trajetria. A empresa de propriedade familiar, que to predominante e relevante nos mercados da Amrica Latina, encaixa-se tambm nessa categoria.Benefcios tangveis

Motivao Implementao

Alinhamento de propsitos Desafios das empresas familiares

Planejamento O que fazer

4

Introduo

Dividido em sete captulos, o Guia recria a jornada que os lderes das empresas fizeram ao implementar mudanas. Comeando pelas motivaes e terminando com os benefcios, o livro ajuda o leitor a navegar de forma lgica pelo processo de implementao da governana. Alguns leitores talvez prefiram comear pelos ltimos captulos a seo de benefcios tangveis no final pode ser til para definir motivaes ou ler de forma aleatria os diversos captulos. A abordagem de cada leitor ir variar de acordo com suas motivaes e interesses.Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

Este captulo apresenta as motivaes que serviram de base para a deciso dos lderes das 14 empresas do Crculo de Companhias Latino-Americanas de implementar mudanas na governana corporativa e explora os meios utilizados para definir as motivaes para a implementao da boa GC. Mostra a importncia de identificar claramente os benefcios desejados e trabalhar para alcan-los, ao mesmo tempo em que apresenta a diversidade das possveis motivaes, cujas diferenas so ditadas pela estrutura de propriedade, pelo ciclo de vida da empresa, seu setor de atuao e pela estrutura institucional e normativa do pas. Todos esses elementos tero um papel e afetaro os resultados desejados. O captulo enfatiza o fato de que a motivao para melhorias na governana corporativa conduzir a agenda e o ritmo das iniciativas.Captulo 2 Alinhamento de propsitos: mudando atitudes e gerando compromisso

Este captulo examina os meios para alinhar os diversos interesses de acionistas individuais e demais partes interessadas estrutura de mudanas propostas para um novo desenho de governana corporativa da empresa. Explora formas de desenvolver uma compreenso comum sobre aspectos da GC, impulsionar mudanas de atitude e gerar um compromisso comum dos grupos com diferentes pontos de vista. O captulo tambm aborda opinies divergentes e discute abordagens mais perceptivas para alterar atitudes associadas a crenas e, s vezes, a perspectivas culturais conflitantes. Oferece ainda sugestes para cativar as partes interessadas e mtodos para a incluso de todas essas partes.Captulo 3 Planejando e definindo prioridades

O captulo 3 detalha o processo de planejamento, como priorizar e definir as metas mais importantes e como traar objetivos, identificando os resultados desejados da governana. Destaca a importncia de equilibrar metas facilmente alcanveis a curto prazo com mudanas mais profundas e demoradas e avaliar os benefcios de cada uma. O captulo mostra como os lderes da mudana podem usar os padres de referncia locais e internacionais para criar um plano vivel com responsabilidades e cronogramas claramente definidos: um roteiro apoiado em um sistema de recompensas e incentivos. Enfatiza tambm a importncia da flexibilidade e da criao de expectativas realistas para o cronograma da mudana os lderes precisam reconhecer que mesmo os planos mais bem elaborados podem sofrer alguns atrasos.Captulo 4 O que fazer: principais prticas de boa governana corporativa

Este captulo fornece exemplos prticos sobre a implementao e execuo de planos e melhores prticas. Abrange os mecanismos de governana corporativa a assembleia geral anual, os conselhos de administrao e seus comits, a diretoria executiva e as relaes entre eles. So descritas prticas e polticas com base na rica experincia das empresas do Crculo. As melhorias da governana corporativa so agrupadas e apresentadas em seis sees:f Formalizando as polticas de governana corporativa: cdigos e diretrizes f Funcionamento do conselho de administrao e relacionamento com a diretoria executiva

Guia Prtico de Governana Corporativa

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Fortalecendo os direitos de acionistas e mantendo o alinhamento Melhorando o ambiente de controle Transparncia e divulgao de informao Garantindo a sustentabilidade do negcio

Captulo 5 Desafios da governana corporativa nas empresas familiares

O captulo 5 examina os benefcios e desafios especficos enfrentados pelas empresas de propriedade familiar. Apresenta vrias perspectivas, inclusive dos membros da famlia e dos investidores, e apresenta uma pesquisa acadmica sobre o tpico. Este captulo investiga os problemas mais comuns, incluindo a administrao de conflitos de interesses dos vrios membros da famlia, a profissionalizao da diretoria e a institucionalizao de boas prticas e polticas. Incorpora tambm um caso de negcios de uma empresa familiar controlada pala terceira gerao, mostrando como os membros resolveram essas questes.Captulo 6 Implementando governana corporativa

Este captulo detalha as especificidades da implementao de polticas, prticas e novas estruturas. Inclui orientaes para dar os primeiros passos concretos na jornada da governana corporativa, monitorar resultados e se certificar de que estejam alinhados com as expectativas iniciais. O captulo sugere ainda formas de refinar as polticas de governana corporativa para torn-las resistentes s reaes de acionistas e outras partes interessadas. O material abrange medidas iniciais, bem como o monitoramento e a reviso contnua do processo de governana para obter melhores resultados e continuar a aprender e se aprimorar um processo apelidado de governando a governana.Captulo 7 Os benefcios tangveis da boa governana corporativa

O captulo 7 apresenta os resultados alcanados com a implementao da mudana: uma srie de resultados quantitativos obtidos em cinco abordagens diferentes avalia os benefcios da governana corporativa atravs de um amplo conjunto de indicadores. A anlise foca o impacto da governana nos indicadores operacionais e no custo de capital. Esses dados reforam a viso de que a governana gera benefcios. Os dados demonstram a fora dos resultados financeiros e operacionais alcanados pelos lderes em governana corporativa quando comparados a todas as empresas listadas da Amrica Latina. As empresas do Crculo de Companhias reportaram altos nveis de lucratividade, melhores preos e liquidez de aes, alm de custo de capital mais baixo do que seus equivalentes da Amrica Latina. Em curto prazo, os anncios pblicos de melhorias na governana foram seguidos por um aumento mdio imediato de 8% no valor das aes acima do que seria normalmente esperado. Para os acionistas, a anlise refora os benefcios de investir em empresas com slidas polticas de governana corporativa. Este captulo tambm lana um primeiro olhar sobre o impacto da crise financeira no resultados da governana corporativa durante o segundo semestre de 2008, mais uma vez comparando o grupo do Crculo com todas as demais empresas latino-americanas listadas. Os resultados apresentados mostram que, mesmo depois das primeiras reaes instabilidade financeira, as companhias do Crculo registraram melhores resultados operacionais e de mercado. E o que ainda mais importante: a anlise comprova que o grupo do Crculo aumentou sua liderana nos indicadores Preo/Lucro por ao e Preo / Valor patrimonial por ao em comparao aos resultados de 20052007. Claramente, os investidores perceberam que as empresas do Crculo ofereciam melhor valor do que o grupo mais amplo da Amrica Latina mesmo em uma poca de dificuldades de mercado.

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Introduo

O captulo tambm detalha a reao do mercado de aes durante esse perodo. Os resultados mostram que o declnio no foi to acentuado para os papis das empresas do grupo do Crculo. Tendo em vista que isso poderia ser atribudo a outros fatores, foi aplicado outro teste, usando uma metodologia mais complexa e colocando parte outros atributos corporativos. Mais uma vez, os resultados ofereceram um claro sinal de que integrar o Crculo e/ou negociar aes em mais de uma bolsa de valores (cross listing) em mercados de alto padro regulatrio so fatores que abrandam a queda do preo das aes nos momentos de crise. Esses resultados qualitativos e quantitativos so especialmente oportunos e surgem em um momento em que muitas empresas esto lutando contra o que pode se tornar a pior crise econmica em geraes. quando as companhias podem ficar tentadas a engavetar seus planos de governana. Nos apndices do Guia, h ferramentas para ajudar as empresas a iniciar sua jornada em direo governana corporativa. Um questionrio de 100 pontos sobre os padres de referncia, criado para as companhias listadas, oferece uma referncia para a autoavaliao das prticas de governana. A Matriz de Progresso de Governana Corporativa da IFC outra ferramenta til para as empresas listadas. Ambos podem ser teis na estruturao de uma avaliao inicial da governana na companhia. Referncias adicionais de outras fontes so fornecidas juntamente com um glossrio de termos para ajudar a navegao pelos conceitos e definies. Em uma poca que promete ser mais competitiva por financiamento e pela atrao de investidores, esse livro serve como lembrete de que a governana de vital importncia para o crescimento sustentvel e a criao de valor para todos os atores da cadeia de governana: acionistas, gestores, membros do conselho, investidores e todas as outras partes interessadas que contribuem para a criao de riqueza das empresas. O livro tem por objetivo servir de orientao prtica para as companhias interessadas em empreender a jornada pela governana corporativa. S resta dar aos leitores as boas-vindas nessa jornada com a esperana de que esse Guia fornea elementos para reflexo e conduza a destinos recompensadores. Sandra Guerra

Crculo de Companhias da Mesa Redonda Latino-Americana de Governana Corporativa Coordenadora

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1MotIvao: oS MotIvoS defIneM oS MeIoSMotivaoBenefcios tangveis Motivao Implementao

Alinhamento de propsitos Desafios das empresas familiares

Planejamento O que fazer

Alinhamento de propsitos

PrInCIPaIS MenSaGenSDefinir a motivao. Ao comear a pensar sobre como melhorar a governana corporativa de sua empresa, defina a razo, ou razes, subjacentes a motivao por trs dessas melhorias. Identificar os benefcios para os negcios. Sua motivao para melhorias de governana deve resultar da identificao dos benefcios desejados para o negcio. Adaptar pormenores aos benefcios desejados para a empresa. Sua motivao para as melhorias na governana corporativa deve moldar as medidas especficas de governana que a empresa adotar, assim como o ritmo e as prioridades dessas medidas.

C

omo em muitos outros aspectos da vida empresarial, as prticas de governana corporativa no devem seguir um princpio nico. Ao contrrio: a experincia indica que as formas de implementar e obter uma melhor governana podem diferir consideravelmente de pas para pas e de empresa para empresa, mesmo quando aplicadas no mesmo setor de atividade empresarial. Os motivos que levam uma companhia a buscar melhorias na governana corporativa so to numerosos e variados quanto as formas de implement-las. Em muitos casos, a deciso de adotar medidas especficas de governana acontece somente aps um perodo relativamente longo dedicado compreenso sobre os custos e os benefcios de tal esforo. Durante esse perodo, os atores-chave da companhia adquirem maior conhecimento sobre o que uma melhor governana corporativa pode trazer para a empresa e para seus vrios grupos interessados, internos e externos. Em alguns casos, a sobrevivncia da companhia est por um fio. Nessa situao, os atores-chave devem tomar decises relacionadas governana imediatamente e a implementao deve ser acelerada. Os fatores que motivam a empresa normalmente determinam a priorizao das aes de melhoria na governana e o ritmo de implementao. Necessidade urgente de capital ou a ausncia repentina do fundador sem que haja um plano de sucesso podem aumentar a importncia da adoo de prticas que resolvam esses problemas. Outras companhias podem levar mais tempo para compreender o valor de uma boa governana corporativa, o que resulta em um ritmo mais lento. Seja como for, as necessidades especficas ditaro o processo de implementao.

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Motivao

Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

As experincias das catorze companhias do Crculo1 revelam uma variedade de motivaes e aes. Aqui, os vrios fatores de motivao so agrupados em categorias, que so exploradas neste captulo.f f f f f f

Acessando capital ou reduzindo o custo do capital Enfrentando e respondendo s presses do mercado externo Equilibrando os interesses algumas vezes divergentes dos acionistas Resolvendo questes de governana em empresas familiares Garantindo a sustentabilidade das empresas Obtendo melhores resultados operacionais

Acessando o capital ou reduzindo o custo do capital

Enfrentando presses do mercado externo Obtendo melhores resultados operacionais

Motivao

Garantindo a sustentabilidade

Equilibrando os interesses algumas vezes divergentes dos acionistas Resolvendo questes de governana em empresas familiares

Observe que, na maioria dos casos, vrios fatores de motivao desempenharo um papel na implementao de melhorias na governana corporativa.

Alinhamento de propsitos1

O Crculo de Companhias foi formado por catorze empresas que demonstraram sua liderana ao adotar boas prticas de governana corporativa em cinco pases latino-americanos. So elas: Atlas, da Costa Rica; Argos e ISA, da Colmbia; Homex, do Mxico; Buenaventura e Ferreyros, do Peru; e CCR, CPFL Energia, Embraer, Marcopolo, Natura, NET, Suzanoe Ultrapar, do Brasil. Desde a sua aquisio pela empresa mexicana Mabe em 2008, a Atlas no mais integrante do Crculo de Companhias. As prticas mencionadas neste Guia referem-se a antes dessa aquisio. A Buenaventura deixou o Crculo de Empresas depois de importante contribuio a esta iniciativa. Atualmente, o Crculo de Companhias formado por doze membros.

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

A Buenaventura era considerada uma empresa familiar com operaes concentradas em um pas em desenvolvimento. Precisvamos mostrar ao mercado que ramos uma empresa to aberta e confivel quanto qualquer outra do mundo. A adoo de melhores prticas de governana corporativa nos deu a credibilidade que o mercado exige de uma empresa nova no mercado. Internamente, isso significou ser mais transparente, dispor de melhores informaes e ser capaz de aprimorar a tomada de decises. No Peru, ganhamos mais respeito da comunidade empresarial e de outras partes interessadas. Calculo que, de modo geral, as melhorias que implementamos em governana corporativa adicionaram 20% nossa avaliao de mercado, uma contribuio significativa na entrega de valor aos acionistas.

Roque Benavides, Buenaventura, Presidente Executivo

Os lderes citam com frequncia a necessidade de acesso ao capital como o principal motivo para iniciar melhorias na governana corporativa. De fato, todas as integrantes do Crculo de Companhias citaram o acesso ao capital externo e/ou a reduo do custo de capital como um dos fatores de motivao mais importantes por trs da melhoria de suas polticas e prticas de governana. Em muitos casos, o capital inicial financiado pelos fundadores da empresa e a capitalizao de lucros so suficientes para iniciar o negcio e financiar uma certa expanso. Em ltima anlise, porm, o sucesso da empresa depende da capacidade de acessar o financiamento externo. Quanto mais uma empresa cresce, maior a necessidade de capital adicional. H tambm um risco cada vez maior associado ao financiamento unilateral do negcio por uma nica pessoa ou por um pequeno grupo de acionistas. De que forma os lderes da companhia podem ter acesso ao dinheiro de outras pessoas? As boas prticas de governana corporativa podem fornecer uma resposta e influenciar as maneiras pelas quais as empresas conseguem acesso a financiamento adicional.

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Motivao

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Acessando capital ou reduzindo o custo do capital

Boa parte do estudo sobre as questes da governana corporativa nos mercados emergentes tem como foco o papel que a boa governana desempenha na melhoria do acesso a fontes de financiamento global. Os investidores precisam ter certeza de que seus direitos esto sendo devidamente protegidos pelos proprietrios controladores e diretores executivos. E precisam saber que a empresa definiu mecanismos mnimos de governana para reduzir o risco de o grupo controlador da empresa abusar de seus poderes. As experincias de algumas companhias do Crculo, todas de capital aberto, destacam como a necessidade de encontrar fontes adicionais de financiamento pode moldar uma agenda de governana corporativa. A busca pelo dinheiro dos outros Os seis fundadores da Cemento Argos, a maior empresa de cimento da Colmbia, logo perceberam a necessidade de encontrar mais parceiros. Em 1934, quando fundaram a companhia, eles sabiam que precisariam do dinheiro de outras pessoas para financiar operaes e planos de expanso. Nas dcadas seguintes, o grupo abriu mais oito empresas em diferentes regies do pas e comeou a operar em outros pases, apoiado por um fluxo estvel de financiamento de investidores externos. Esse caminho e o ritmo de crescimento constante exigiram prticas comerciais que gerariam a confiana entre os novos parceiros e facilitariam o acesso a investimentos. As melhorias da governana corporativa foram uma resposta natural aos desafios da Argos, mesmo na ausncia de padres de referncia para governana no pas naquela poca. A Argos entrou no mercado de dvida pblica em novembro de 2005 com uma emisso de US$ 197,5 milhes cuja demanda excedeu trs vezes o valor da emisso. Pensando globalmente, listando localmente e internacionalmente A busca de crescimento parte do DNA da Buenaventura, empresa mineradora lder no Peru e uma das maiores produtoras de ouro e prata do mundo. Operando em uma indstria com uso intenso de capital, a Buenaventura decidiu, desde sua fundao em 1953, que o crescimento atravs de exploraes e aquisies seria o seu caminho. Desde o incio, a companhia considerou as joint ventures e as ofertas por intermdio dos mercados de capitais do Peru e dos EUA como fontes potenciais para o financiamento de seus planos de crescimento. A companhia deu os primeiros passos para a melhoria de sua governana corporativa desde o comeo da operao. Mas a deciso de fazer uma oferta pblica inicial de ADRs (American Depositary Receipts) na Bolsa de Nova York em 1996, acionou uma mudana abrangente no sentido da boa governana. A iniciativa levou a empresa a cumprir os requisitos da legislao norte-americana e as regulamentaes da Comisso de Ttulos e Valores Mobilirios dos Estados Unidos. A direo dedicou grande parte do seu tempo e foram empregados muitos recursos da companhia para que a Buenaventura pudesse atender a esses requisitos. Alm de obter os benefcios das novas listagens em forma de financiamento, outros resultados tangveis incluram a melhoria da tomada de decises da empresa sobre aspectos crticos do seu negcio, especialmente em relao s orientaes para o futuro.

1.1 Boa governana leva a melhores avaliaes de mercadoUm volume cada vez maior de evidncias empricas demonstra que empresas bem governadas recebem melhores avaliaes de mercado. Essas empresas so consideradas favorveis aos investidores de mercado e isso proporciona a estes a confiana de que sua aplicao gerar

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

os estudos comprovam os benefcios: empresas bem governadas obtm melhores avaliaes de mercadoNo Brasil, as empresas com estruturas de governana frgeis poderiam aumentar sua capitalizao de mercado em cerca de 85100% com uma reviso geral de suas prticas de governana e a mudana para a boa governana corporativa, segundo dois estudos recentes com base em ndices amplos de governana. Empresas sediadas no Brasil com as melhores classificaes de governana corporativa acumularam em 2004 relaes do ndice Preo/Lucro por ao 20% superiores s das empresas com as piores classificaes de governana, observa um estudo do ABN AMRO. Na Rssia, as empresas que passaram da pior para a melhor classificao em governana corporativa puderam desfrutar de um aumento de 70.000% no valor da empresa, de acordo com um estudo de amostra reduzida. Embora um estudo mais amplo talvez no demonstrasse aumentos to grandes, evidente a relao entre a boa governana corporativa e o aumento do valor das companhias.

Um exame nos segmentos especiais de listagem da bolsa de valores brasileira, BM&FBOVESPA, demonstra essa ligao. O desempenho das aes das empresas listadas no Novo Mercado, no Nvel 1 e no Nvel 2, lanadas em 2001 e que exigem o compromisso com padres mais elevados de governana corporativa, mostra que os preos das aes de companhias com melhores prticas de governana tambm tm melhor desempenho.3 Embora as melhores prticas de governana das companhias listadas nos segmentos especiais possa no ser a nica razo para o excelente desempenho de suas aes, amplamente reconhecido que essas empresas precisaram, antes de mais nada, fazer melhorias significativas em suas polticas e prticas de governana corporativa para atrair os investidores. A Figura 1 mostra a comparao.2

Ver BLACK, B.; JANG, H.;e KIM, W. Does corporate governance predict firms market values? Evidence from Korea. Journal of Law, Economics, and Organization, 22, n. 2, p. 366-413, 2006.; SILVEIRA, A. Di M. da; BARROS, L. A. Corporate governance quality and firm value in Brazil. SSRN Working Paper, 2007. Disponvel em: .; LEAL, R. P.; CARVALHAL-DA-SILVA, A. L. Corporate governance and value, in Brazil (and in Chile). Banco Interamericano de Desenvolvimento, Latin American Research Network. Research Network Working Paper #R-514, 2005. Disponvel em: .; BLACK, B. The corporate governance behavior and market value of Russian firms. Emerging Markets Review, 2, p. 89-108, 2001. 3 Em 2001, a BM&FBOVESPA lanou seus segmentos especiais de listagem de governana corporativa criados para aes emitidas por empresas que voluntariamente se comprometem com padres mais altos de governana corporativa, alm dos j exigidos pela legislao brasileira e pela Comisso de Valores Mobilirios (CVM) do Brasil. Os segmentos de listagem premium incluem o Nvel 1 (N1), que exige prticas adicionais de divulgao de informaes. O Nvel 2 (N2), que requer todos os itens do N1 mais um conjunto de prticas de governana corporativas para fortalecer os direitos de acionistas minoritrios, como determinar um preo mnimo aceitvel para as aes preferenciais (sem direito a voto) durante alteraes de controle corporativo, e fornecer direitos de voto em certas decises importantes da empresa. O Novo Mercado (NM) semelhante ao N2, com o requisito adicional de que o capital social deve ser composto somente de aes ordinrias (com direito a voto). No final de julho de 2008, a BM&FBOVESPA tinha 443 empresas listadas, das quais 103 eram do NM; 18 no N2; 44 no N1, representando 61,6% da capitalizao total do mercado. Detalhes de todos os segmentos especiais de listagem podem ser obtidos no website da BM&FBOVESPA: http://www.bovespa.com.br/Home/redirect. asp?end=/ BovespaEv/Publications/publ_grai.asp?Origem=investor&idioma=i.

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Motivao

rendimentos sem violar os seus direitos de acionistas.2 Essas melhores avaliaes so vistas no somente quando as companhias so adquiridas por empresas maiores ou assim que so listadas em uma bolsa de valores, mas tambm quando o preo das suas aes reflete mltiplos mais elevados.

Figura 1: IGC x IBOVESPA x IBrX 50: Desempenho comparativo dos preos das aes4 800 700 600 500 400 300 200 100 2001 jun 2001 dez 2001 dez 2002 dez 2003 dez 2004 dez 2005 dez 2006 jan 2007 fev 2007 mar 2007 abr 2007 mai 2007 jun 2007 jul 2007 ago 2007 set 2007 out 2007 nov 2007 dez 2007 jan 2008 fev 2008 mar 2008 abr 2008 mai 2008 jun 2008 jul 2008 ago 2008 set 2008 out 2008 nov 2008 dez 2008IGC IBOVESPA IBRx50

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Fonte: Economatica

Melhorias na governana corporativa precedem a entrada na bolsa A experincia da CPFL Energia especialmente notvel. Maior empresa privada do setor eltrico do Brasil, a CPFL Energia foi criada durante um perodo tumultuado, em agosto de 2002, poucos meses aps o incio de um racionamento de energia eltrica de mbito nacional. Os participantes do mercado estavam confusos em relao atividade de fornecimento de energia eltrica no pas. Esse ambiente, associado a uma alta taxa de cmbio do dlar dos EUA em relao moeda brasileira em um ano de eleio, criou uma onda de incertezas a respeito do futuro do pas. No incio de 2003, taxas de juros mais altas afetaram o fluxo de caixa operacional da CPFL Energia. A empresa precisava captar US$ 570,5 milhes, em parte para liquidar uma dvida de mais de US$ 298,4 milhes com vencimento em abril do mesmo ano.5 Ao mesmo tempo, a CPFL Energia tinha um plano de investimento agressivo para sua operao de distribuio e para a construo de seis usinas hidreltricas quatro delas j estavam em operao no momento em que este trabalho foi escrito. Para levantar os recursos necessrios, a companhia restruturou sua governana corporativa, estabelecendo um sistema que facilitasse a construo de uma relao confivel e de baixo risco entre a empresa e os investidores,

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O IGC ndice de Governana Corporativa foi concebido para medir a rentabilidade de uma carteira hipottica composta por aes de empresas com um bom nvel de governana corporativa. Essas empresas devem ser negociadas no Novo Mercado da BM&FBOVESPA ou classificadas no Nvel 1 ou no Nvel 2 da BM&FBOVESPA. O IBOVESPA o principal indicador do desempenho mdio do mercado de aes brasileiro e sua importncia se deve a dois fatores: reflete a variao das aes mais negociadas da BM&FBOVESPA e tem tradio, tendo mantido a integridade de suas sries histricas sem nenhuma mudana de metodologia desde a sua criao em 1968. O IBrX-50 um ndice que mede o rendimento total em uma carteira hipottica composta por 50 aes selecionadas entre os ttulos mais comercializados na BM&FBOVESPA em termos de liquidez, ponderadas de acordo com o valor de mercado das aes em circulao. Os valores em US$ fornecidos para as transaes das empresas latino-americanas em todo este Guia refletem a taxa de cmbio das moedas locais utilizadas durante o perodo correspondente.6

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

Melhores indicadores financeiros Prazo mais longos para amortizao das dvidas Reduo do Custo de FinancimentoO setor eltrico desempenha um papel importante no fornecimento de infraestrutura para o desenvolvimento econmico do Brasil, no presente e no futuro. Para a expanso desse tipo de negcio, precisamos de grandes investimentos e investidores de longo prazo, como os que j temos (fundos de penso e grandes grupos empresariais), alm de atrair parceiros potenciais do mercado de capitais. Precisamos oferecer mais do que taxas de rendimento competitivas. Precisamos assegurar nveis elevados de governana corporativa para desenvolver relaes confiveis e slidas, baseadas em informaes claras para o mercado sobre a forma como operamos a companhia e traamos nossas estratgias de longo prazo. Desde o IPO em 2004, a CPFL Energia tem captado uma srie de oportunidades de negcios e oferecido aos investidores de nossas subsidirias a possibilidade de migrar para a holding, participando assim da nossa histria de sucesso. Durante toda essa trajetria, as diretrizes de governana corporativa tm sido uma ferramenta importante, que nos ajudaram a reintroduzir o conceito de confiana no setor de eltrico.Wilson Ferreira Jr., CPFL Energia, Diretor Presidente

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O preo da ao da CPFL Energia aumentou 64,7%, passando de R$ 16,43 (US$ 6,22) em 31 de dezembro de 2004 para R$ 30,15 (US$ 12,90) em 31 de dezembro de 2008.

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Motivao

de forma a atrair capital novo e melhorar sua estrutura de capital. Entre os resultados positivos das iniciativas de governana que contriburam para melhorar a avaliao do mercado esto:6

1.2 Atraindo e retendo acionistasMelhorar a governana corporativa um elemento essencial para o acesso a novas fontes de financiamento. As pesquisas mostram que, com todos os outros fatores iguais, quando os investidores tm como escolher o modo de alocar seus fundos, eles tendem a preferir empresas melhor administradas.7 Mas isso no significa que as melhorias na governana possam ser realizadas de uma s vez. As empresas precisam prestar ateno constante manuteno dos altos padres de governana. Como as melhorias na governana corporativa ajudam as companhias a atrair novos investidores e explorar novas fontes de financiamento, elas motivam muitas empresas a continuar aperfeioando suas prticas de governana para reter os acionistas existentes ou atrair novos investidores de varejo e/ou carteira. Capacidade interna insuficiente gera busca por financiamento externo Os fundadores da CCR Companhia de Concesses Rodovirias, um consrcio de operadoras de rodovias com pedgio, sabiam que sua prpria capacidade de investimento seria insuficiente para responder oportunidade oferecida pela privatizao da enorme malha rodoviria brasileira. Embora a CCR tenha sido fundada por atores slidos do ramo da construo civil, eles compreenderam que tambm precisariam atrair outros investidores para sua operao de capital intensivo em rodovias pedagiadas. Eles sabiam que no seria uma tarefa simples. Afinal, quem pensaria em investir em uma empresa controlada por seus principais fornecedores? O potencial para conflitos de interesse era bvio e somente uma garantia confivel de transparncia e equidade satisfaria os novos investidores. Uma governana equilibrada foi a resposta inicial ao desafio. A CCR convidou a Brisa, uma operadora internacional de rodovias com pedgio que no atuava na indstria de construo de rodovias do Brasil, para fazer parte do grupo de acionistas controladores e atuar como promotora da transparncia. A reestruturao da propriedade foi o primeiro passo no sentido da boa governana corporativa participaes acionrias iguais dos acionistas controladores garantiram o equilbrio de poder. Em seguida, a empresa implementou uma srie de procedimentos e prticas que sinalizou para o mercado que sua estrutura de governana corporativa protegeria os direitos de acionistas minoritrios. O resultado: A CCR atraiu os investidores adicionais que buscava mantendo, ao mesmo tempo, a confiana dos acionistas existentes. Ampliando a base de acionistas O Grupo ISA a maior empresa de transmisso de energia da Colmbia e uma companhia de servios pblicos de economia mista. Foi criada em 1967 originalmente como uma empresa 100% estatal para conectar as vrias redes regionais de transmisso existentes poca na Colmbia. Mas, depois de atender aos requisitos energticos do pas, a empresa traou planos para expandir-se alm das fronteiras nacionais. Para atingir essa nova viso, a estrutura de capital foi reconsiderada, apoiada por prticas aprimoradas de governana corporativa. O resultado foi o seguinte:

Em 2000, a ISA tornou-se a primeira empresa de economia mista de servios pblicosda Colmbia a democratizar sua propriedade, recebendo novos acionistas de varejo que detiveram 13,62% do capital da companhia.

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Os investidores institucionais globais que administram mais de 1 trilho em ativos vo pagar um prmio para as empresas bem-administradas. Ver MCKINSEY. Mckinsey global investor opinion survey on corporate governance. 2002. Disponpivel em: .

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

de mais investidores, a ISA adotou outras prticas de boa governana corporativa para dirimir dvidas. Isso gerou uma IPO bem-sucedido, seguido rapidamente por uma segunda oferta de aes em 2002. Os novos acionistas privados da ISA logo controlaram 30% da empresa.

A indstria que faz uso de capital intensivo precisa de capital A NET Servios, a maior operadora de televiso a cabo do Brasil, atua em um negcio que exige volume significativo de capital para desenvolver sua infraestrutura. Desde o incio, o intuito foi incluir acionistas estratgicos. Esses acionistas abririam o capital da empresa como uma forma de explorar os mercados de aes, proporcionando-lhe uma estrutura de capital eficiente e diversificada. Em meados da dcada de 1990, a NET fez melhorias em suas prticas de governana corporativa que lhe permitiram abrir o capital nos mercados do Brasil e dos EUA.

No final da dcada de 1990, quando as questes relacionadas governana corporativa ganharam mais publicidade, os acionistas da NET decidiram que a companhia deveria adaptar sua governana s exigncias dos investidores. Em 2001, a empresa adotou a primeira rodada de prticas de boa governana, entrando para o Nvel 1 do segmento de listagem de governana corporativa da BM&FBOVESPA. Ao se deparar com um ambiente macroeconmico turbulento, at porque visava ser lder no setor de televiso a cabo, a companhia percebeu que precisava de capital novo e estrangeiro para cumprir suas obrigaes e sustentar o crescimento. Para atrair esse novo financiamento, a NET comprometeu-se a manter padres mais elevados de governana corporativa, tornando-se a segunda empresa a avanar para o Nvel 2 da BM&FBOVESPA.

1.3 Reduzindo o custo do capital, diversificando a estrutura de capitalO impacto da melhoria da governana corporativa pode fazer mais do que atrair capital e emprstimos globais. As fontes domsticas de capital e crdito tambm devem fluir para empresas que demonstram um forte compromisso com uma boa governana. As empresas talvez queiram no apenas obter fontes novas e mais baratas de capital para financiar suas operaes, mas tambm diversificar sua estrutura acionria.

No mundo corporativo, todos esto cientes de que medida que aumentam os riscos dos investidores, tambm aumenta o custo do capital. Nos ltimos anos, os investidores que fornecem finaciamentos tenderam a incluir as prticas de governana de uma companhia, como estrutura de participao transparente e relatrio financeiro apropriado, como critrios-chave em seu processo de tomada de decises sobre investimentos. Portanto, ter um bom sistema de governana corporativa em vigor resultar, em ltima anlise, em taxas de juros mais baixas e prazo de vencimento mais longo para emprstimos e crditos.8 Concluso: as empresas que praticam uma melhor governana corporativa tm mais probabilidade de obter custos reduzidos, quando incorrem em dvidas e financiamentos para suas operaes.8

Pode-se argumentar que os bancos e outros fornecedores de capital de terceiros nem sempre exigem que as empresas sigam altos padres de governana corporativa no mesmo grau que certos investidores de capital fariam (principalmente os investidores institucionais ativos). Isso explicado pelo fato de que os bancos em geral tm melhores informaes sobre as empresas para as quais emprestam dinheiro, devido a um relacionamento mais prximo e direto. Alm disso, os bancos tambm tm outros mecanismos adicionais para proteger seus direitos, tais como a exigncia de garantias para os emprstimos. No entanto, muitos bancos so proponentes ativos de melhores prticas de governana corporativa, inclusive, de seus prprios clientes.

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Motivao

Ao compreender que o Estado, na qualidade de acionista, poderia dificultar a captao

uma melhor governana pode ter um impacto positivo no custo de capitalClassificao de crdito: Na Romnia, no final de 2004, a FitchRatings atualizou a classificao de crdito individual da Banca Comerciala Romana de D para C/D. A Standard&Poors elevou a classificao equivalente de longo prazo de B+ para BB. As duas agncias citaram as melhorias na governana corporativa e a gesto de riscos como os principais motivos para as atualizaes. Avaliao: No Brasil, o Credit Suisse elevou a avaliao da Brasil Telecom em maio de 2006 de hold para outperform justamente devido s melhorias nas prticas de governana corporativa da empresa. Taxas Libor e reduo de spread: a PREVI, maior fundo de penso do Brasil, comparou uma carteira de cinco empresas que receberam aportes e que adotaram prticas de boa governana, com um grupo de oito companhias com governana deficiente, por meio de classificao de risco e custos de crdito. O grupo com boa governana recebeu uma classificao significativamente melhor, com avanos obtidos aps a adoo de boas prticas de governana corporativa. Essa comparao foi considerada especialmente significativa devido s fortes restries de crdito no setor industrial das empresas.

O grupo de governana acessou o mercado de dvida externa de

20042006. O financiamento que havia custado Libor + 3,875% foi renegociado a Libor + 1% aps as melhorias de governana corporativa. Ao emitir debntures, as empresas do grupo de governana corporativa tambm lucraram com uma reduo de spread de 3,5% sobre o CDI em 2004 para 1% aps as reformas de governana, em 2005.

Esta seo observa que atrair capital externo e reduzir seu custo um importante estmulo das melhorias na governana corporativa. Embora a motivao tenha origem principalmente dentro da empresa e em sua liderana, outras motivaes para melhorias na governana podem decorrer de fontes externas.

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Enfrentando e respondendo s presses do mercado externo

Presses externas podem ser decorrentes da concorrncia global, de matrias-primas escassas ou de custos variveis de outros insumos da companhia. Uma fonte central de presso tambm pode ter origem na comunidade de investidores. Os investidores tm um real interesse em reduzir seu risco, exigindo a melhoria da governana das empresas que recebem aportes. Os estudos tm demonstrado que ambientes de governana corporativa com baixos padres e frgil estrutura de conformidade continuam a enfrentar barreiras para investimento, com investidores estrangeiros enfrentando maiores dificuldades para obter informaes de qualidade nesses pases. Embora os investidores possam investir menos nesses pases, por vrias razes, como diversificao de carteira, eles ainda podem considerar investimentos apesar dos frgeis padres de governana, regulamentaes e garantia de cumprimento da legislao vigente. Nessas circunstncias, os investidores so mais inclinados a selecionar as companhias que possam ser diferenciadas pelo seu comprometimento com uma melhor governana.9

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LEUZ, C.; LINS, K. V.; WARNOCK, F. E. Do foreigners invest less in poorly governed firms? ECGI Finance working paper n. 43/2004, 2008.

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

Conformidade com as normas legais e regulatrias Novos requisitos legais ou regulatrios podem se constituir em uma importante oportunidade para as empresas repensarem e reformularem seus processos de governana corporativa, de forma a adicionar mais valor aos negcios. A CPFL Energia adotou essa abordagem, utilizandose das regras de listagem na Bolsa de Valores de Nova York e no mercado local como forma de adotar um meio eficiente de cumprir as normas de mercado. A companhia criou um departamento de Compliance para garantir o cumprimento das regulamentaes de mercado das bolsas nas quais ela est listada BM&FBOVESPA e NYSE e tambm se certificar de que a companhia cumpre com as vrias disposies da Lei SarbanesOxley. Os lderes recordam que o cumprimento da Seo 404 da Lei Sarbanes-Oxley, que trata dos controles internos na preparao das demonstraes financeiras, exigiu um significativo aprimoramento dos processos da empresa. Ampliando a base de capital Quando os acionistas da NET comearam a discutir a melhor forma de aumentar o capital da empresa como elemento-chave em seu processo de reestruturao, imediatamente surgiram problemas. Se no fosse encaminhada apropriadamente, a situao poderia ter gerado um tratamento diferente dos acionistas com e sem direito a voto. Ciente dos problemas potenciais, a companhia levou o caso para a Associao Brasileira de Investidores Minoritrios, ANIMEC. Aps extensa e imparcial discusso na ANIMEC, a direo da NET compartilhou as recomendaes da Associao com o seu conselho de administrao. interessante observar que a empresa previu uma possvel presso externa e tratou a situao de uma forma que solucionaria as preocupaes. A franca e dinmica troca de ideias, que reuniu todas as partes incluindo acionistas minoritrios para debate resultou em uma aprovao geral de medidas slidas de governana corporativa que poderiam alinhar os interesses de todas as partes interessadas. O conselho identificou formas de simplificar o processo de reestruturao de capital e resolver as questes problemticas.

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Equilibrando os interesses (algumas vezes) divergentes dos acionistas

Em determinados casos, as empresas podem vivenciar situaes nas quais seus acionistas tenham diferentes interesses quanto orientao geral dos negcios. Como esse tipo de situao potencialmente prejudicial companhia, a preveno de conflitos pode demandar a introduo de estruturas especficas de governana corporativa, polticas e processos voltados a assegurar a todos os acionistas que seus interesses sero protegidos. Viabilizando o acordo de acionistas Consideremos o exemplo da CPFL Energia. A complexa estrutura de propriedade da empresa envolvia oito acionistas controladores, trs dos quais so grandes grupos empresariais, e os outros cinco so fundos de penso. Evidentemente, estabelecer o equilbrio das relaes representou grandes desafios.

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Motivao

Em alguns casos, as demandas do mercado externo acionam ou aceleram o ritmo das melhorias de governana em uma empresa.

Os acionistas controladores interagiram por meio de trs veculos:

Os grupos Bradesco,10 Votorantim11 e Camargo Crrea, por meio da VBC Energia O Fundo de Penso dos Funcionrios do Banco do Brasil Previ por meio de uma Os quatro fundos de penso de empresas estatais Fundao Cesp, Petros, Sistel eSabesprev por meio de uma sociedade denominada Bonaire Participaes Devido natureza diversa dos acionistas controladores, foi essencial estruturar o processo decisrio,de modo a evitar conflitos potenciais que prejudicassem a sustentabilidade da empresa. Para tanto, os acionistas assinaram um acordo, em maro de 2002, que definiu as regras de controle comum e os processos de tomada de deciso aplicados a todos os acionistas controladores. Em dezembro de 2007, o acordo de acionistas foi modificado para contemplar os aperfeioamentos na governana corporativa implementadas pela empresa e para adaptar os mecanismos corporativos ao contexto atual de negcios. Presso para manter a liquidez aumenta a necessidade de aperfeioamento da governana corporativa Entre 5 de novembro de 1997, data de privatizao da CPFL Paulista, e o final do exerccio de 2004, os acionistas controladores incluindo os fundos de penso, que possuiam 55% de capital prprio fizeram grandes investimentos na estruturao da CPFL Energia, com as aquisies das subsidirias CPFL Paulista, CPFL Piratininga e Rio Grande Energia RGE, alm de investimentos adicionais nos projetos de gerao de energia. Tendo em vista a natureza destes acionistas, a liquidez era de extrema importncia, considerada um valor agregado pelo mercado de capitais e tambm a perspectiva de gerao de valor no longo prazo. Para garantir a liquidez, a empresa tomou medidas para aperfeioar sua estrutura de governana corporativa alinhando suas prticas s regras do segmento de listagem do Novo Mercado da BM&FBOVESPA e os regulamentos de listagem na Bolsa de Valores de Nova York, emitindo ADSs de Nvel III.12 Estas melhorias na governana corporativa incluram medidas explicitamente voltadas ao alinhamento dos interesses de diferentes acionistas, como: empresa chamada 521 Participaes

A migrao de acionistas minoritrios das subsidirias CPFL Paulista, CPFL Piratininga,

CPFL Gerao e RGE para a CPFL Energia, atravs de uma incorporao de aes, que envolveu um montante de R$ 560 milhes e aproximadamente 57.000 acionistas

O alinhamento dos estatutos sociaiss das subsidirias ao estatuto social da CPFL Energia: CPFL Paulista, CPFL Piratininga, CPFL Gerao, RGE e CPFL Santa Cruz Outras questes que devem ser consideradas ao tentar equilibrar interesses ocasionalmente divergentes dos acionistas:f Implementao de prticas para evitar favoritismo: a motivao para alinhar os interes-

ses dos acionistas fundadores tambm foi um dos motivos para a CCR adotar determinadas medidas de governana corporativa, como a de criar uma estrutura acionria na qual os acionistas controladores eram concorrentes histricos no ramo da construo civil. Ao trazer um acionista controlador adicional que no fazia parte do setor de construo, mas somente doEm dezembro de 2006, o Bradesco deixou o grupo de controle. Ele continua como acionista, mas suas aes agora fazem parte do free float (aes negociadas livremente na bolsa). Em fevereiro de 2008, a Votorantim deixou o grupo de controle. 12 Os certificados de depsito ADS (American Depositary Shares ) so as aes individuais de uma empresa estrangeira representadas por um ADR (American Depositary Receipt).10 11

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

setor de administrao de rodovias pedagiadas, e ao tomar outras medidas, como garantir um percentual de aes negociadas em bolsa (free float) e criar um mecanismo explcito para avaliar contratos entre as partes relacionadas, a CCR demonstrou que tinha uma estrutura em prtica que asseguraria o equilbrio dos interesses de todos os acionistas, em vez de favorecer os interesses de seus acionistas controladores envolvidos na construo. f Equilbrio dos interesses dos controladores e dos minoritrios: h tambm a necessidade de equilibrar os interesses dos acionistas ao lidar com as relaes entre os controladores e os minoritrios. Estes podem estar preocupados que os controladores abusem de sua posio de controle em detrimento do grupo minoritrio. Isso pode criar problemas tambm para os acionistas controladores, pois possvel que estejam interessados em atrair novos investidores. f Atrao de um universo mais amplo de investidores: muitas empresas podem estar motivadas a melhorar sua governana para tornar suas aes mais atraentes a um universo mais amplo de investidores. Essas melhorias na governana corporativa sero orientadas para garantir aos acionistas minoritrios atuais e potenciais que seus direitos sejam apropriadamente observados e protegidos. Quanto mais ativamente forem negociadas as aes da companhia no mercado de aes, o que facilitado por volumes maiores de aes fora do bloco de controle (free float), menos obstculos haver para que os investidores no controladores entrem e saiam da companhia. Isso garante que os acionistas possam sair, se discordarem da estratgia dos acionistas controladores e do conselho, ou se estiverem insatisfeitos com o desempenho da direo. A disponibilidade de sada em um mercado lquido tambm aumenta o potencial para que os investidores recebam o valor integral referene a sua participao na empresa, ou seja, no sofra desconto no preo de sua ao pela falta de liquidez na companhia. Para obter acordo sobre o aumento da liquidez, os acionistas controladores, cujo controle e participao na empresa sero diludos, devem compreender que, ao desistir de algumas de suas aes, eles podem atrair outros investidores um movimento que provavelmente aumentar o valor da empresa e de suas aes. O Grupo Suzano busca uma valorizao do preo das aes O principal objetivo de curto prazo da estratgia do Grupo Suzano13 no mercado de capitais foi a rpida valorizao do preo das aes. Seu conselho de administrao e diretoria precisaram apresentar resultados positivos em curto e mdio prazos para garantir o ganho rpido ou seja, para que o valor e os benefcios do movimento pr-mercado de capitais fossem rapidamente percebidos pelos acionistas controladores. Por que isso foi necessrio? Porque a implementao de melhores prticas de governana corporativa como um prrequisito para a estratgia no mercado de capitais implicou na concesso imediata de determinados direitos de controle e direitos econmicos aos acionistas minoritrios pelos controladores. Os acionistas controladores precisaram entender que isso tambm acarretaria na valorizao potencial do preo das aes. A rpida valorizao seria possvel, reduzindo-se o risco associado baixa liquidez da empresa no mercado de aes, o que poderia ser obtido por meio da oferta de aes ao mercado. Como a empresa conseguiu isso? A companhia realizou melhorias de governana corporativa ditadas pelos Nveis 1 e 2 segmentos especiais de listagem da BM&FBOVESPA. A valorizao apropriada do preo das13

O grupo era composto pela Suzano Papel e Celulose e a Suzano Petroqumica, sendo que a ltima foi vendida para a Petrobras em 2007. Atualmente, a empresa a maior produtora de papel e celulose de eucalipto verticalmente integrada da Amrica Latina.

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Motivao

aes da empresa junto com maior liquidez ofereceram uma sada simples, justa e atraente para os acionistas minoritrios, incluindo os integrantes da famlia controladora e as geraes futuras da famlia que poderiam querer buscar outros interesses de negcios ou pessoais, sem colocar em risco as atividades da companhia.

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Resolvendo questes de governana em empresas familiaresPara o grupo Suzano, . . . (governana corporativa) a garantia de continuidade daquilo que os fundadores semearam. a evoluo de um sonho. Podemos sofrer acidentes ao longo do caminho, isso natural. Mas boas prticas de governana favorecem a continuidade das empresas da Suzano e tornam seus alicerces resistentes ao movimento incontestvel que a globalizao.14

David Feffer, Suzano, Presidente do Conselhode Administrao

Empresas familiares ou de propriedade dos fundadores enfrentam problemas de governana corporativa singulares. No Captulo 5, esses problemas e desafios so abordados em detalhes. Mas importante abordar essas questes aqui tambm, pois criam motivao para a melhoria das prticas de governana de um modo que difere de outras de capital aberto. Muitas coisas podem dar errado em uma empresa familiar. Com o tempo, medida que a companhia e os parentes crescem, a famlia, que havia sido considerada a principal fonte de sucesso do negcio, pode tornar-se a origem de um desastre potencial. Entre as armadilhas que podem levar uma empresa familiar a perder todo seu valor, se no forem tratadas adequadamente, esto:f f f f f

Sucesso da propriedade e da direo Polticas de emprego familiar Relaes entre os assalariados da famlia e os recebedores de dividendos da famlia Processos de tomada de decises dentro da famlia Fornecer incentivos para contratar e reter gestores no familiares que sejam profissionais qualificados

Lidar com esses desafios para permitir que a empresa sobreviva e cresa tambm motiva as empresass a buscar melhorias na sua governana.

14 IBGC Instituto Brasileiro de Governana Corporativa. Uma dcada de governana corporativa histria do IBGC, marcos e lies da experincia. So Paulo: Saraiva, 2005.

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

de grande porte no processo de sucesso de sua liderana familiar. Ela escolheu tornar-se uma das principais companhias brasileiras nos mercados de capitais. A profissionalizao de sua direo foi o caminho escolhido e, para materializar o objetivo, a governana corporativa comeou a mudar. Houve vrios marcos: 1997 profissionalizao do conselho; 1999 IPO; 2000 direitos de tag-along para todos os acionistas; e 2002 a incorporao da Oxiteno e Gipia. O processo de profissionalizao com a implementao de prticas slidas de governana culminaram na minha sucesso como presidente-executivo do grupo. Em 2007, a aquisio da Ipiranga ocorreu por meio do uso de aes da Ultrapar como moeda, que foi um processo bem-sucedido com base nas melhores prticas de governana corporativa.

Paulo Cunha, Ultrapar, ex-Presidente Executivo e atual Presidentedo Conselho de Administrao

Transformao da Buenaventura Alm de acessar o capital necessrio para expandir as operaes da empresa, os planos da Buenaventura para melhorar suas polticas e prticas de governana corporativa foram motivados pelo desejo de transform-la de empresa familiar em uma companhia gerida profissionalmente. Isso alinharia os objetivos da famlia aos objetivos de longo prazo dos acionistas e, em ltima instncia, maximizaria o valor para todos os acionistas. Estruturas apropriadas de governana corporativa tambm ajudariam a empresa a evitar os riscos de desentendimentos entre os membros da famlia que poderiam prejudicar a organizao. Mudana de geraes na Ferreyros No incomum ocorrer brigas pelo poder entre membros de segunda e terceira geraes. Felizmente, esse no era o caso da Ferreyros empresa peruana focada na importao, venda e aluguel de mquinas e equipamentos pesados e assistncia tcnica pois os herdeiros tinham outros interesses para suas carreiras e vidas. O modelo de propriedade e controle na Ferreyros evoluiu desde sua fundao em 1922, com o nmero de acionistas e a estrutura de suas holdings mudando com o tempo, devido a

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Motivao

A Ultrapar tinha a opo de transformar-se em uma verdadeira empresa

esses fatores familiares. A primeira gerao de scios fundadores passou sua propriedade para a segunda, que inclua alguns parentes desinteressados no negcio. Portanto, h mais de 30 anos, os controladores da Ferreyros passaram a direo para diretores executivos profissionais e decidiram criar uma base diversificada de acionistas. Essa rotatividade exigiu mudanas na governana para garantir que os interesses da famlia permanecessem protegidos e que os diretores executivos no-familiares fizessem o mximo possvel para agir no interesse da companhia. As mudanas na governana tambm foram motivadas pela meta estratgica da empresa de registrar suas aes na Bolsa de Valores de Lima. Depois de listar suas aes na Bolsa de Lima em 1971, a companhia determinou que o mercado de capitais iria se tornar uma importante fonte de financiamento. Hoje, a Ferreyros um reconhecido ator nos mercado de capitais peruano. A Suzano e o planejamento de sucesso As mortes de Leon Feffer, fundador da Suzano, e Max, filho de Leon Feffer, em um intervalo de dois anos, motivaram a acelerao das melhorias na governana corporativa da empresa. Embora David Feffer, neto do fundador, estivesse preparado para seu novo papel de liderana, tambm estava claro que a dinmica da famlia provavelmente iria se tornar mais complicada no futuro. As melhorias na governana corporativa voltadas a solucionar essa questo tambm levaram a companhia a contar mais com de diretores executivos no familiares. A empresa continuou a aprimorar seu modelo de governana, priorizando o respeito cultura e dinmica interna da companhia, ao mesmo tempo em que lucrava com resultados de curto prazo. Um marco importante: uma iniciativa de planejamento estratgico de 2004 com planos de ao que levaram a melhorias contnuas de governana no futuro. Desafios singulares de uma empresa familiar A compreenso dos desafios singulares enfrentados pelas empresas familiares levou Pery Igel, filho do fundador da Ultrapar, a fazer uma mudana sem precedentes no mercado local. Em 1984, ele preparou uma emisso de aes restritas aos diretores executivos da empresa como parte de um contrato de emprego de vinte anos. Isso alinharia seus interesses aos da famlia controladora e de outros acionistas. Tambm garantiria que eles ajudassem a construir uma companhia slida para si mesmos como acionistas de longo prazo, teriam uma participao financeira no enriquecimento da organizao. Essa foi a primeira medida de uma srie de iniciativas que Igel tomou, em uma poca em que o termo governana corporativa ainda nem era usado. O motivo dessas medidas corajosas? O desejo de garantir o futuro da empresa independentemente das incertezas da famlia e interesses potencialmente divergentes.

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Garantindo a sustentabilidade das empresas

A maioria das companhias formada sem nenhum senso de limite de tempo para a durao de sua operao. provvel que os proprietrios-fundadores de boa parte das companhias esperem que elas sobrevivam a eles. Esse desejo de garantir a sobrevivncia de longo prazo da empresa uma motivao para as melhorias na governana. Os acionistas podem ajudar a garantir o sucesso de longo prazo e a sustentabilidade da empresa ao implementar prticas slidas de governana corporativa.

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Captulo 1 Motivao: os motivos definem os meios

Encontrar um caminho para financiar o negcio no foi uma preocupao para a Natura, empresa lder do setor de cosmticos, higiene pessoal e produtos de perfumaria no Brasil. Sua operao era uma forte geradora de caixa. Alm disso, a abordagem dos acionistas controladores gerou confiana no mercado e criou um ambiente slido para as atividades comerciais da empresa.

Quais so os motivos para isso (abrir o capital da empresa)?. . . uma viso do futuro, de pensar sobre como perpetuar a companhia. Ns tnhamos um sonho, comeamos em um quintal. uma companhia que cresceu baseada em valores e tem um papel social que transcende os interesse dos fundadores. Ela se tornou uma ferramenta para o desenvolvimento socioeconmico e a abertura do capital da empresa tem a ver com isso, com um processo de perpetuar essa cultura, esses valores. Queremos novos parceiros como aliados na preservao dessa cultura do compromisso com o desenvolvimento econmico, mas tambm com o desenvolvimento social e ambiental responsvel.15

Guilherme Peiro Leal, Natura, Copresidente do Conselho de Administrao

A motivao que impulsionou a empresa a dar seus primeiros passos rumo a uma governana melhor era um pouco diferente: foi o desejo de garantir a continuidade de uma maneira particular de fazer negcios fundamentada em determinados valores e crenas. No havia pressa: ao longo dos anos, os trs acionistas, chamados de chefes do estado-maior, implementaram prticas de governana corporativa que eram comuns s empresas de capital aberto embora a Natura no fosse ainda listada. Antes de finalmente abrir o capital, a empresa recebeu um prmio pelo Melhor Relatrio Anual em 2003. O caminho para uma melhor governana era firme e consistente. A Natura queria perpetuar no somente o prprio negcio. Sustentar a abordagem da Natura para fazer negcios tambm foi fundamental, pois a companhia acredita que a responsabilidade socioambiental corporativa to importante quanto o desempenho de seus resultados financeiros.

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BOVESPA. Como e por que tornar-se uma empresa aberta. 2004.

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Motivao

Perpetuando a empresa e a abordagem para fazer negcios

Com gesto orientada pela valorizao dos trs 3Ps (People, Planet and Profit), a Natura sentiu-se motivada a realizar melhorias na governana corporativa devido ao seu desejo de institucionalizar e perpetuar o modelo de negcios e a cultura da empresa. Os trs acionistas controladores tambm queriam diversificar suas carteiras pessoais. A deciso foi tomada: os acionistas registraram as aes da Natura na BM&FBOVESPA. Para os proprietrios da Natura, essa era a forma de atrair novos parceiros que os ajudassem a monitorar a conduta empresarial parte de um processo orientado a separar propriedade e direo. Como empresa de capital aberto, a Natura tambm estaria mais bem posicionada em projetos de expanso futura, levantando fundos a baixo custo no mercado e no a taxas de emprstimo comercial. Houve ainda benefcios para a direo executiva: os acionistas tambm compreenderam que uma empresa de capital aberto teria melhores condies se atrasse e mantivesse executivos realmente talentosos. Sustentabilidade por meio de privatizao A Embraer do Brasil, uma das maiores fabricantes de aeronaves do mundo, foi fundada em 1969 como uma empresa estatal, mas foi privatizada em 1994. Como consequncia da privatizao, a Embraer no apenas recuperou seu equilbrio financeiro como tambm foi capaz de empreender um novo processo de expanso. O desenvolvimento de novos produtos pela Embraer, assim como seu crescimento futuro, dependiam de sua flexibilidade para acessar mercados de capital. Foi isso que aconteceu em 2000, quando a empresa acessou mercados de capitais internacionais por meio de uma oferta inicial (IPO) de ADRs (American Depositary Receipts) na Bolsa de Valores de Nova York para financiar o desenvolvimento de uma nova linha de jatos comerciais. A natureza da estrutura da Embraer limitava, no entanto, o acesso da companhia aos mercados de capitais. Tambm restringiu a liquidez das aes da empresa, uma vez que limitou a adoo de nveis mais elevados de padres de governana corporativa. A Embraer percebeu que precisava agir. No dia 31 de maro de 2006, a maioria dos acionistas, incluindo aqueles com aes ordinrias, preferenciais e ADRs, aprovou uma proposta de reestruturao societria. O plano simplificou a estrutura de capital, transformando todos os tipos ao em apenas um aes ordinrias. Essa mudana aprimorou as prticas e a transparncia da governana corporativa. A principal meta da reestruturao corporativa era criar uma base de sustentabilidade, crescimento e continuidade das operaes da Embraer. Na realidade, a reestruturao foi dividida em blocos de acionistas controladores. Como resultado, a Embraer tornou-se a maior empresa aberta do Brasil com capital totalmente disperso. Concluso: sem um bloco de controle permanentemente definido, os acionistas da Embraer devem reunir-se, discutir e alcanar um consenso sobre como alinhar seus interesses, quando tomam decises em cada Assembleia Geral dos acionistas e isso tem contribudo para uma maior transparncia. Institucionalizando a empresa Garantir a sustentabilidade da organizao foi a principal motivao da Homex para adotar boas prticas de governana corpo