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1 Guia de Estudos B CRISE CONJUNTA – CONFLITO SINO-SOVIÉTICO, 1969 Partido Comunista da República Popular da China A disputa pela Ilha Damansky/ Zhenbao Part Guilherme Henrique Lima de Mattos Kamila Vital Gabriela Pita Gabriela Gome Lizandra Alencar

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Guia de Estudos B

CRISE CONJUNTA – CONFLITO SINO-SOVIÉTICO, 1969

Partido Comunista da República Popular da China

A disputa pela I lha Damansky/ Zhenbao Part

Guilherme Henrique Lima de Mattos Kamila Vital Gabriela Pita Gabriela Gome Lizandra Alencar

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CARTA DE APRESENTAÇÃO Caros delegados,

é com imenso prazer que lhes damos as boas-vindas à primeira crise conjunta do

FACAMP Model United Nations (FAMUN). Desde seu início, o FAMUN se propõe a

trazer comitês de naturezas diferentes para seus delegados e tem desempenhado essa

tarefa com sucesso. Assim, a crise conjunta sobre o conflito sino-soviético busca manter

esse padrão de excelência e trazer aos seus delegados ótimos temas para discussão.

Desde o início, pensamos esse comitê como sendo uma discussão muito

importante e de pouco conhecimento da maioria. Toda nossa equipe tem trabalhado para

que esta possa ser uma simulação com discussões profundas acerca do comunismo, da

Guerra Fria e de como o bloco comunista poderia, ou não, ter se organizado nesse

momento de tensão internacional.

Esperamos os senhores para simular conosco e conhecer mais sobre o

relacionamento entre China e União Soviética, bem como seus próprios modelos de

funcionamento no meio internacional. Aguardamos a presença de todos e estamos à

disposição para ajudá-los no que for preciso.

Sinceramente,

A Assessoria da Crise Conjunta

Guilherme H. L. de Mattos - Diretor-geral

Kamila de Cássia Vital - Diretora RPC

Felipe Madeira Almeida- Diretor URSS

Verônica Soster Ramos – Diretora URSS

Luísa Sartori – Diretora assistente URSS

Matheus Ferraz – Diretor assistente URSS

Gabriela Pita – Diretora assistente RPC

Gabriela Gomes – Diretora assistente RPC

Lizandra Alencar – Diretora assistente RPC

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Índice

CARTA DE APRESENTAÇÃO ...................................................................................... 1

DESCRIÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES...................................................................... 4

INFORMAÇÕES ADICIONAIS ................................................................................... 17

DIRETIVAS....................................................................................................................20

MARXISMO-MAOÍSMO ........................................................................................... 28

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DESCRIÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES

Mao Zedong - Presidente do Partido Comunista Chinês

Mao Zedong nasceu em 26 de dezembro de 1893, na cidade de Shaoshan, em

Hunan, província localizada na parte central da China. Na Universidade de Pequim,

ainda durante a juventude, passou a se interessar pelo marxismo, o que o levaria a

participar da fundação do Partido Comunista da China (PCCh), em 1921. Em 1934,

com o avanço dos nacionalistas do Kuomintang nas cidades, Mao liderou parte do

contingente comunista rumo ao noroeste do país em um percurso de mais de 9 mil

quilômetros, que ficou conhecido como Longa Marcha, cuja finalidade era consolidar

a base rural do movimento comunista, angariando apoiadores no campo. Em 1943,

Mao foi eleito secretário-geral do PCCh e, em 1949, os comunistas venceram a

guerra civil e fundaram a República Popular da China, com Mao como presidente do

PCCh e líder do Estado (“MAO ...”, s/d; GAO, 2011).

Como presidente do partido, Mao detinha, desde 1949, o poder de tomada de

decisão dentro da política chinesa. Sua autoridade advinha da imagem de pai da

nação que ele conquistara após a vitória comunista. Ainda que alguns membros do

partido não concordassem com a sua opinião, as ordens de Mao eram prontamente

obedecidas, podendo ser elas de cunho econômico, político, militar ou social

(TEIWES, 2014). Em 1969, a figura de Mao, entretanto, encontrou-se relativamente

fragilizada: após o fracasso do Grande Salto para Frente e com os radicalismos que

vinham sendo realizados pela Revolução Cultural, dissidências internas tornaram-se

mais visíveis. Na perspectiva interna, Mao trabalhou no sentido de evitar que

opositores se organizassem contra a sua liderança, enquanto, na perspectiva

externa, o presidente do Partido via como cada vez mais urgente a necessidade de

colocar a China como líder do bloco comunista para que, desse modo, não fosse

mais necessário se subjugar à liderança soviética (GAO, 2011).

Deng Xiaoping – Secretário-geral do Comitê Permanente

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Deng Xiaoping nasceu em 24 de agosto de 1904, na província de Sichuan. Em

1921, foi enviado pelo pai à França, onde passou cinco anos estudando e

trabalhando. Em Paris, conheceu Zhou Enlai e aderiu ao seu grupo, o Corpo da

Juventude Chinesa Socialista, em 1922. No ano de 1925, viajou para Moscou para

estudar na Universidade Oriental, onde teve um primeiro contato com as ideias

leninistas, o que o inseriu ainda mais na defesa das ideologias socialistas. Em 1927,

com o avanço da ofensiva do governo nacionalista contra os comunistas, Deng

passou a viver secretamente em Shangai, até unir-se a Mao e outros comunistas na

província de Jiangxi. Nesse momento, Deng assumiu o cargo de chefe do Escritório

de Propaganda do Exército Vermelho, cujo objetivo era promover um governo

comunista na província, opondo-se, portanto, ao governo central nacionalista. Em

1934, participou da Longa Marcha, liderada por Mao para consolidar o apoio chinês

no interior do país (HANES; HANES, 2003). Após a proclamação da República

Popular da China, no ano de 1949, juntou-se ao Comitê Permanente do Politburo

como seu presidente (SCHELL; DELURY, 2014). Deng e Mao tinham constantes

atritos devido à maneira de cada um agir em relação à política e à economia. O

primeiro prezava por uma posição política mais moderada e, em contraste, o

segundo tinha um caráter mais radical e revolucionário. No entanto, a oposição só

ficava clara quando as políticas de Mao não alcançavam o resultado desejado. Deng

tornou-se o secretário-geral do Comitê Central em 1954. Em 1956, tornou-se o sexto

membro do Comitê Central do Politburo. (HANES; HANES, 2003).

Como secretário-geral do Comitê Permanente, sua função era solicitar

reuniões com o Congresso Nacional, uma vez que era uma parte ativa desse

organismo político. Por se tratar de um dos membros superiores do Comitê

Permanente, ao secretário-geral cabe elaborar decretos; interpretar leis; conferir o

trabalho do Conselho de Estado; certificar o cumprimento das normas conforme os

princípios estabelecidos na constituição chinesa; nomear ou demitir ministros,

chefes, comandantes, secretário do Conselho de Estado e vice-premiers; além de ter

o poder, junto com os demais membros do Comitê Permanente, de discutir sobre

uma declaração de guerra, ratificação ou abdicação de tratados (REPÚBLICA

POPULAR DA CHINA, 1954).

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Peng Zhen – Secretário-geral do partido em Pequim e prefeito de

Pequim

Membro do partido comunista desde 1923, Peng era extremamente fiel à

ideologia comunista e a pregava constantemente. Por isso, foi preso em 1929, porém

continuou propagando o comunismo mesmo durante seu período de cárcere. Logo

quando saiu da prisão, iniciou um movimento de contenção das forças japonesas e

começou seus esforços para avançar a influência do partido comunista em Pequim.

Após 1949, foi nomeado como prefeito de Pequim e alcançou o cargo de secretário-

geral do Comitê do partido em Pequim (MARXISTS INTERNET ARCHIVE, 2015).

Entretanto, Peng Zhen nem sempre tinha posições alinhadas aos preceitos de

Mao: no período que antecedeu à Revolução Cultural, por exemplo, defendeu que o

trabalho dos intelectuais chineses não deveria estar subordinado apenas ao objetivo

da Revolução Comunista. Esta e outras posições que destoavam das vontades de

Mao Zedong fizeram com que, em 1966, um tribunal fosse organizado em Pequim

para julgar os traidores do movimento comunista: Peng Zhen foi duramente

acusado, mas acabou liberado (FAIRBANK; GOLDMAN, 2006, p. 358). No cargo de

secretário do partido em Pequim, Peng teve a responsabilidade de cuidar para que

os processos do partido local estivessem de acordo com os preceitos do PCCh

central, respeitando a ideologia comunista, garantindo a interpretação das leis e a

coerência entre as ações do Politburo e os interesses do partido (MARXISTS

INTERNET ARCHIVE, 2015). Peng Zhen representava ainda os interesses de sua

região diante do partido central.

Tan Zheng - Diretor do Departamento Político Geral do Exército de

Libertação Popular

Tan Zheng nasceu em 1906, na cidade de Xiangxiang, em Hunan (“THIRTY-

SIX...”, 2009). Em 1927, já tendo entrado em contato com as ideologias comunistas,

juntou-se a Mao Zedong para uma resistência camponesa contra a perseguição aos

comunistas propagada pelo governo nacionalista de Chang Kai-shek. Após seu

contato mais direto com o líder comunista, Tan passou a ser seu secretário pessoal,

o que o levou a conhecer mais de perto os objetivos do grupo comunista e o fez

também mais influente diante dos demais membros seguidores de Mao. Em 1934,

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partiu junto com o grupo para a Longa Marcha até o norte da China. Com o fim da

Segunda Guerra Mundial e o início da guerra civil chinesa entre nacionalistas e

comunistas, em 1945, Tan ocupou cargos políticos dentro das forças armadas e

assim permaneceu, mesmo após a ascensão do Partido Comunista Chinês (PCCh)

ao poder e a proclamação da República Popular da China por Mao, em 1949. Em

1954, foi nomeado vice-ministro da Defesa e, posteriormente, diretor do

Departamento Político do Exército de Libertação Popular (“GEN. TAN...”, 1988).

Nesse último cargo, Tan lidava com todas as questões relativas ao setor

político dessa força armada. Dentre essas questões, tinha a responsabilidade de

administrar e organizar o trabalho das forças armadas do PCCh, a fim de estabelecer

o cumprimento das ordens do presidente do partido. Para isso, acompanhou de

perto o trabalho do secretário da Defesa e de seus subordinados, a fim de garantir o

respeito das ordens proclamadas pelo presidente do PCCh (MINISTRY OF

NATIONAL DEFENSE OF PEOPLES REPUBLIC OF CHINA, s/d). A partir dessas

responsabilidades, Tan atuou como grande estrategista dessa força armada chinesa,

bem como general sênior dessas tropas (“THIRTY-SIX...”, 2009).

Liu Shaoqi - Presidente da República Popular da China

Nascido em 1889, na província de Hunan, Liu Shaoqi era de uma família de

camponeses ricos e, desde muito cedo, recebeu uma educação singular para um

camponês. Em 1920, viajou a Moscou para estudar e entrou em contato com a ideias

comunistas. Ainda na Rússia, enquanto estudava a ideologia comunista, afiliou-se ao

Partido Comunista Chinês. No ano de 1922, retornou à China e passou a exercer uma

liderança às causas comunistas em sua província natal. Em 1927, quando os

comunistas passaram a ser perseguidos pelo governo nacionalista de Chang Kai-

shek, Liu foi eleito membro do Comitê Central do Partido Comunista Chinês (PCCh)

(“LIU...”, s/d). No início dos anos 1930, ascendeu como membro do Politburo do

PCCh. Com todo o seu sucesso nas tarefas que lhe eram estipuladas, Liu se tornou

um dos homens mais influentes dentro do partido, principalmente depois da

Segunda Guerra Mundial e da vitória dos comunistas na guerra civil chinesa contra

os nacionalistas (“LIU...”, s/d). Nesse período, também se tornou o porta-voz do

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partido. Com a proclamação da República Popular da China em 1˚ de outubro de

1949, Liu passou a ser o vice-premier e vice-líder do PCCh.

Em 1959, Liu Shaoqi foi nomeado por Mao presidente da República Popular

da China (TEWEIS, 2014) e era tido pelo líder como seu sucessor direto. Entretanto,

a partir de então, Liu passou a assumir uma posição de oposição a Mao dentro do

Partido, reforçando o discurso de que o Grande Salto para Frente havia sido um

fracasso sem precedentes na história do país. Pouco a pouco, Liu foi se consolidando

como uma figura forte dentro do PCCh e que oferecia um caminho alternativo ao

proposto por Mao. Diante disso, Mao organizou um movimento de enfraquecimento

do então presidente da RPC e se aproveitou do movimento da Revolução Cultural

para denegrir a figura de Liu e minar sua posição de liderança: Liu foi acusado de

revisionismo e aproximação com a União Soviética. Em agosto de 1966, Mao

classificou Liu como contrarrevolucionário e destituiu-o de sua posição de sucessor:

Liu, todavia, manteve por mais alguns anos sua reputação (GAO, 2011, pp. 130-160).

Chen Yun – Vice-presidente da República Popular da China

Chen Yun nasceu em 1905. Trabalhava como escritor na Imprensa Comercial

de Shangai, quando se associou ao Partido Comunista Chinês (PCCh), em 1924. Em

1936, quando a Longa Marcha teve início, Chen aderiu ao movimento. No entanto,

ainda no começo do movimento, em busca de aprimorar seus conhecimentos quanto

à ideologia e à organização da política socialista soviética, o revolucionário partiu

para Moscou. Nos anos 1940, Chen retornou à China e ingressou no Departamento

de Organização do Partido Comunista Chinês, quando iniciou de fato seus trabalhos

no Partido. Nesse período, aproximou-se dos temas econômicos, mas muitas de

suas opiniões nessa área iam contra as de Mao Zedong. O primeiro defendia um

desenvolvimento vagaroso e mais sustentável para a economia chinesa, bem como

acreditava num desenvolvimento de mercado para a agricultura, enquanto o líder

chinês valorizava um desenvolvimento econômico rápido, a fim de aproveitar o

espírito revolucionário que ainda tomava conta da sociedade chinesa (KAVANAGH,

2003). Apesar das desavenças, Chen Yun se consolidou como o grande estrategista

da política econômica da China maoísta.

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Foi nomeado vice-premier em 1949, sendo seu trabalho a assistência ao

premier do Conselho de Estado, Zhou Enlai, o qual participava das decisões quanto

ao comércio nacional e internacional do Estado, à adoção de planos econômicos, à

propagação da cultura e da educação e, por fim, à administração da política e

jurídica da China (CHINA, 1954). A partir do seu encargo, Chen passou a trabalhar

ativamente no gerenciamento da economia chinesa. Com o fracasso do Grande Salto

para Frente, ele passou a liderar a equipe que teve como o objetivo reorganizar o

cenário econômico do país. Para que isso fosse alcançado, Chen defendia o controle

dos gastos públicos e do câmbio, bem como o investimento no setor de construção

civil (WuDUNN, 1995).

Zhou Enlai - Premier do Conselho de Estado

Zhou Enlai nasceu em 5 de março de 1898, no interior de uma família que

tradicionalmente servia à burocracia estatal imperial. Entre os anos de 1917 e 1920

militou em prol da soberania chinesa, contra a força imperialista japonesa, chegando

a, em 1920, ficar preso durante quatro meses pelo seu ativismo político. Ainda no

mesmo ano, viajou a Paris, para participar de um programa de estudo, e lá, em

março de 1921, se uniu à célula europeia do recém-criado Partido Comunista da

China (GAO, 2011, pp. 58-65). Em 1924, regressou à China e logo aderiu à aliança

comunista-nacionalista, assumindo a liderança do Partido Comunista de Cantão.

Desde então, teve um papel notório nos esforços do Partido conta os japoneses e

contra os nacionalistas, o que o levou a ser nomeado membro do Comitê Central do

Partido Comunista Chinês (PCCh), o órgão central do PCCh. De 1927 a 1934, Zhou

ocupou um cargo hierarquicamente superior ao de Mao dentro do PCCh e era mais

bem visto que o companheiro, tido como radical: tal fato marcaria para sempre a

relação de ambos (GAO, 2011, pp. 85-114).

Após a proclamação da República Popular da China, em 1˚ de outubro de

1949, Zhou foi nomeado premier do Conselho Geral de Estado, bem como ministro

das Relações Exteriores, sendo o último cargo exercido até 1958 e sendo notória sua

grande capacidade diplomática e sua tentativa de manter boas relações com os

soviéticos (HANES; HANES, 2003). Zhou Enlai era fiel ao PCCh e, principalmente, a

Mao Zedong: era o homem de confiança do líder, mas também seu constante rival,

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uma vez que incorporava todo o equilíbrio e sensatez que faltavam à Mao. Zhou era

adepto dos preceitos confucionistas de harmonia e equilíbrio, escolhendo sempre o

“caminho do meio” (GAO, 2011, pp. 137-40). Na década de 1960, sempre

preservando a figura de Mao e a integridade chinesa, esforçou-se para amenizar as

instabilidades geradas pela Revolução Cultural, no campo interno, e para garantir o

poder de barganha da China com a URSS e EUA, no campo externo (GAO, 2011, pp.

15-35).

Li Xiannian - Ministro das Finanças

Nascido em 23 de junho de 1909, Li Xiannian era de uma família de

camponeses pobres da cidade de Huang’an, localizada na província de Hubei. No

ano de 1920, além de filiar-se ao Partido Comunista Chinês, assumiu também a

liderança do movimento camponês. Em 1927, liderou o grupo camponês da

Insurreição de Huangma. Posteriormente, o líder camponês liderou os trabalhadores

e camponeses chineses da Guarda Vermelha, o que o fez uma figura importante nas

manobras e batalhas camponesas pelos interesses do partido, sobretudo em seu

setor estratégico. Durante a agressão japonesa na Segunda Guerra Mundial e a

Guerra de Libertação (guerra civil chinesa) contra o governo nacionalista, Li tornou-

se um oficial superior no PCCh, liderando, portanto, as forças armadas, participando

de um número significativo de batalhas e estabelecendo novas bases revolucionárias

vinculadas ao partido (XINHUA, 2009). No ano de 1954, já durante a liderança de

Mao Zedong da então República Popular da China, foi nomeado ministro das

Finanças (JONES, 2013).

Como ministro das Finanças, Li cumpriu um papel relevante na administração

da economia nacional (XINHUA, 2009). Suas funções giravam em torno da

recuperação da China fragilizada pelo Grande Salto Adiante e da liderança de

delegações da RPC para o exterior no intuito de estreitar laços com outros países

socialistas e países do terceiro mundo (LI, 2012).

Chen Yi - Ministro das Relações Exteriores e Prefeito de Xangai

Chen Yi nasceu em 1901, em Sichuan. Estudou na França entre 1919 e 1921,

período no qual se juntou à Liga da Juventude Socialista. Depois de retornar à China,

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afiliou-se ao Partido Comunista Chinês (PCCh) em 1923 (”CHEN...”, s/d). Nesse

mesmo período, acompanhou Mao Zedong até Jiangxi, a fim de refugiar-se das

perseguições declaradas aos comunistas pelo governo nacionalista (HANES;

HANES, 2003). Liderou a partida do Exército Vermelho pela sua Longa Marcha e,

em 1945, tornou-se membro do Comitê Permanente do PCCh. Após a proclamação

da república Popular da China, em 1949, foi presidente da Comissão de Controle

Militar de Xangai e prefeito de Xangai e exerceu ambos os cargos até 1958. Durante

esse período, foi nomeado vice-presidente do Conselho de Estado, em 1954, mas,

em 1958, abdicou da vice-presidência em prol da sua nomeação como ministro das

Relações Exteriores (”CHEN...”, s/d).

Como ministro das Relações Exteriores, Chen visitou diversos países, com

enfoque para os denominados no momento Terceiro Mundo, bem como para os

Estados do Oriente. A ele cabia o desenvolvimento das relações exteriores e a

propagação da imagem da China, sobretudo no que diz respeito ao estabelecimento

do contato com os governos dos demais Estados da Comunidade Internacional.

Nesse sentido, durante o período, procurava estabelecer contatos fora da influência

da União Soviética e dos Estados Unidos. O direcionamento da política externa,

entretanto, era elaborado por Zhou Enlai, por quem Chen Yi tinha grande respeito.

Durante a Revolução Cultural, Chen Yi chegou a ser pressionado por suas críticas a

alguns programas do partido, mas Zhou se encarregou pessoalmente de livrá-lo

(GAO, 2011, pp. 210-211).

Kang Sheng - Líder do Serviço Secreto Chinês (CID)

Com nome original de Zhang Zongke, nasceu em 1898, na província de

Shandong. Iniciou sua carreira no Partido Comunista Chinês (PCCh) em 1925, sendo

um dos primeiros líderes do partido. Zhang adotou o codinome Kang Sheng em 1937,

após a sua volta de Moscou, onde fora estudar técnicas de segurança em

inteligência soviética e passou a ser um colaborador próximo a Mao, ingressando no

comando do Órgão de Segurança no âmbito do Comitê Central até meados de 1946

(“KANG..., s/d). Kang Sheng desempenhou um papel de extrema importância na

implementação da política e ideologia de Mao: fazendo parte do grupo considerado

esquerdista e alinhado aos preceitos de Mao, Kang auxiliou o líder no expurgo de

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opositores durante a Revolução Cultural. Entre seus principais rivais, estavam Liu

Shaoqui e Deng Xiaoping, que representavam uma visão mais revisionista. Em 1966,

Kang foi reeleito para o Politburo (GAO, 2011, pp. 144-158).

Em 1969, Kang se tornou um dos cinco poderosos homens no Politburo.

Como membro permanente, restabeleceu a “Ideologia de Mao”. Foi um grande

defensor das políticas de Mao e fundamental para a promoção e incentivo ao culto a

Mao.

Li Fuchun - Presidente da Comissão de Planejamento do Estado

Li Fuchun, nascido em Changsha, juntou-se ao Partido Comunista da China

(PCCh), em 1922, enquanto estudava na França. Durante sua permanência no PCCh,

passou por diversos cargos, como o de secretário-geral do Comitê Central e ministro

da Finança e Economia (JIAN; SONG; ZHOU, 2006). Uma de suas principais

contribuições foi o Primeiro Plano Quinquenal (aprovado em 1955), que previa um

processo de industrialização com base socialista da China, além do desenvolvimento

de propriedades cooperativas que estabeleceriam a base da reestruturação

socialista das indústrias privadas e comércio (LIN; CAI; LI, 2003).

Foi em 1954, no entanto, que Li Fuchun foi apontado como presidente da CPE.

Assim, ao final da década de 1950 e começo de 1960, Li executou um papel notável

no controle das políticas econômicas para restaurá-la da danificação que o Grande

Salto para Frente havia provocado na economia (JIAN; SONG; ZHOU, 2006). Como

presidente do CPE, por fim, tinha a responsabilidade de gerir a economia chinesa no

dia a dia, submetendo-se ao direcionamento elaborado por Chen Yun

(FEIGENBAUM, 2003, p. 234).

Lu Dingyi - Diretor do Departamento de Propaganda de Comitê Central

Lu Dingyi nasceu em 1906, na província de Jiangsu. Em 1928, entrou para o

sexto congresso nacional, o que passou a lhe conferir maior destaque no partido.

Porém desde a sua entrada como membro original do partido, trabalhou com as

áreas de propaganda e promoveu o comunismo por meio dela, contendo o

nacionalismo de Chiang Kai-shek. Em 1957 e em 1960, acompanhou a delegação

chinesa na Conferência dos países comunistas, em Moscou. A partir de 1965, passou

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a ocupar o cargo de ministro da Cultura, envolvendo-se mais com os principais

cargos do Politburo chinês e, com isso, passou a trabalhar mais proximamente aos

seus líderes (“ANIVERSÁRIO...”, 2003). Tido como um intelectual de ideias

progressistas, foi acusado de revisionismo durante a Revolução Cultural, mas não

chegou a ser condenado ou afastado do partido (GAO, 2011, p. 146)

Como diretor do Departamento de Propaganda, Lu Dingyi era o responsável

pela propaganda do partido para a população. Ele tornou-se o principal veículo entre

os interesses do partido e de seus líderes e a população chinesa, podendo refletir

tudo aquilo que seus superiores queriam que fosse passado à população por meio de

propaganda para influenciar o comportamento da massa chinesa

(“ANIVERSÁRIO...”, 2003).

Lin Biao - Secretário da Defesa

Lin Biao nasceu em 1907, na província de Hubei, no centro da China. Com 18

anos, Lin associou-se ao grupo da Liga dos Jovens Socialistas e entrou para a

Academia Militar de Whampoa, em Cantão. Nessa academia militar, iniciou um

treinamento para oficiais militares, dirigido pelo já líder nacional Chang Kai-shek. A

partir de então, ocupou postos importantes no exército nacionalista. Em 1927, com o

fim da aliança entre os comunistas e os nacionalistas, abandonou o seu posto junto

aos nacionalistas e seguiu com Mao Zedong para o sudeste do país (“A HERO...”,

2001). Ao lado de Mao, Lin passou a auxiliar na formulação da Guarda Vermelha,

que vinha constantemente crescendo. Em 1934, acompanhou Mao em sua Longa

Marcha, buscando pressionar o governo central ao norte da China. Em 1949, chefiou

a vitória comunista frente aos nacionalistas, expulsando-os do país. Ainda que

viesse de uma carreira repleta de conquistas, Lin teve uma ascensão lenta dentro do

Partido Comunista Chinês (PCCh). Foi apenas em 1958 que o líder militar foi

nomeado o sétimo membro do Comitê Permanente. Um ano depois, assumiu o cargo

de ministro da Defesa, dado o tamanho apreço de Mao por sua carreira (“A

HERO...”, 2001).

Em 1966, Lin Biao foi nomeado o segundo homem do partido, no lugar de Liu

Shaoqi. No entanto, a partir de então, começaram a surgir desavenças entre ambos

os líderes por causa do destaque que Lin Biao vinha ganhando na política chinesa

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(TEIWES, 2014). Como ministro da Defesa, Lin trabalhou ativamente no controle das

forças armadas do país, reeducando-as de acordo com as exigências propostas por

Mao. Por meio de seu ministério, auxiliava na propagação do culto ao líder, o que o

fazia trabalhar lado a lado com o presidente do PCCh em busca da manutenção da

sua alta popularidade (“A HERO...”, 2001). Promovia a conscientização política das

tropas durante a Revolução Cultural, a fim de estimular os soldados durante o

movimento (JONES, 2013).

Zhu De - Comandante-chefe do Exército de Libertação Popular

Em 1909, após se matricular na escola de Exército em Yunnan, Zhu De se

juntou à Liga Revolucionária Chinesa. No ano de 1922, foi para Alemanha estudar e

ingressou no Partido Comunista Chinês. Zhu, em 1928, juntou-se às forças armadas,

reorganizando-as no que ficou conhecido como Exército Vermelho, além de ter

criado um centro militar (LI, 2012). Foi também o maior aliado de Mao, e

comandante-chefe durante a Longa Marcha. Em diversas ocasiões, Zhu demonstrou

sua habilidade em consolidar a estratégia de guerrilha chinesa (“ZHU...”, s/d).

Durante a Revolução Cultural, no entanto, Zhu De acabou sendo perseguido e

perdeu algumas posições dentro do Partido: graças a Zhou Enlai, entretanto, não foi

expurgado (GAO, 2011, p. 210). Como comandante-chefe, tinha responsabilidade e

autoridade para desenvolver e implantar tropas militares, controlar o uso de armas

nucleares e nomear membros do alto escalão militar. Adicionalmente, planejava o

orçamento financeiro e o distribuía conforme os níveis de demandas de alocação do

exército.

Referências

“ANIVERSÁRIO de Lu Ting, 09 de junho de 1906”. In: Website official do People’s Daily, 01 de agosto de 2003. Disponível em: <http://www.people.com.cn/GB/historic/0609/1897.html>. Acesso em: 10.jul.2015.

“CHEN YI”. In: Website oficial do Ministério de Relações Exteriores da República Popular da China. s/d. Disponível em: <http://www.fmprc.gov.cn/mfa_eng/ziliao_665539/wjrw_665549/3606_665551/t44146.shtml>. Acesso em 10.ago.2015.

15

WuDUNN; S. “Chen Yun, a Chinese Communist Patriarch who helped slow reforms, is dead at 89”. In: Website oficial do The New York Times, obituário, 11 de abril de 1995. Disponível em: <http://www.nytimes.com/1995/04/11/obituaries/chen-yun-a-chinese-communist-patriarch-who-helped-slow-reforms-is-dead-at-89.html>. Acesso em: 01.jul.2015.

FAIRBANK, J. K.; GOLDMAN, M. “The Great Leap Forward”. In: China - A New History. The Belknap Press of Harvard University Press. England, 2006.

FEIGENBAUM, E. A. China’s techno-warriors: national security and strategic competition from nuclear to information age. Standford: Standford University Press, 2003.

GAO, W. Zhou Enlai: o último revolucionário perfeito. Tradução de Flávia Souto Maior. Rio de Janeiro: Record, 2011.

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17

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

Partido Comunista Chinês e sua estrutura

O Partido Comunista Chinês (PCCh) foi fundado em 1921 e, em 1949, assumiu

o governo da recém-criada República Popular da China (RPC), sob a liderança de

Mao Zedong (“THE CHINESE...”, s/d). A compreensão do PCCh envolve, antes de

mais nada, a análise da suposta contradição existente entre Partido e Estado. Na

China comunista, a relação entre as duas esferas sempre foi marcada por

indefinições e sobreposições que dificultavam uma identificação precisa de qual era

a função do Partido e qual era a do Estado. Isso porque o Partido Comunista era, em

sua própria essência, revolucionário e antiburocrático, enquanto o Estado era,

essencialmente, burocrático: o desafio de equilibrar essas duas realidades marcou a

história política da China nas décadas de 1950 e de 1960 (SHIPING, 1997, p. 50).

Desde o início da RPC, a convivência entre Partido e burocracia estatal foi um

desafio para a liderança chinesa: como criar um Estado revolucionário capaz de se

adequar à lógica antiburocrática do Partido? No caso chinês, a resposta a esse

questionamento foi resultado de um longo processo de acomodação de ambas as

partes. O PCCh era a instância máxima de poder político da nação: era dele que

vinha todo o planejamento estratégico e ideológico que guiava o projeto chinês. Nas

décadas seguintes à fundação da RPC, o grande objetivo do partido era consolidar a

transformação socialista, estruturando a economia nessas bases, com projetos

próprios de industrialização e agricultura (LIU, 1956).

Entretanto, para conseguir alcançar esse ideal em uma nação com as

proporções da China, a liderança do PCCh logo notou que precisaria do aparato

estatal: sendo um partido comunista, o PCCh restringia seu controle e seu quadro a

uma parte da população chinesa, o proletariado; todavia, a partir do Estado,

garantiria o controle sobre toda a China, tornando exequível seu projeto de reforma

e redirecionamento do país (SHIPING, 1997, pp. 47-49). Diante disso, o PCCh e o

Estado chinês se misturaram e se sobrepuseram: de modo geral, o PCCh

desenvolveu o direcionamento político, e o Estado aplicou as políticas provenientes

de tal orientação.

18

Nesse sentido, o PCCh era composto por diferentes órgãos que, aos poucos,

afunilaram a liderança do Partido. O maior e mais representativo desses órgãos era

o Congresso Nacional do PCCh, que reunia cerca de mil representantes e cem

alternos, das diversas unidades provinciais do partido (“THE...”, 2015). No

Congresso, eram discutidas as questões gerais do partido, bem como as principais

demandas: eram seus representantes que elegiam os membros do Comitê Central.

Este, por sua vez, era composto por cerca de noventa membros e setenta alternos,

sendo o órgão decisório do PCCh e tendo um chairman, Mao Zedong (“THE...”,

2015). O Comitê elegia os membros do Politburo, que representava a real cúpula do

PCCh: desses representantes, destacava-se ainda o Comitê Permanente do Politburo

que, sob a liderança de Mao, era composto por ele e pelos membros mais próximos

do PCCh, como Zhou Enlai, Chen Yun e Deng Xiaoping (“THE...”, 2015).

O Estado chinês, por sua vez também tinha uma hierarquia e órgãos próprios

em paralelo à estrutura partidária, que haviam sido definidos na Constituição de

1954 (REPÚBLICA POPULAR DA CHINA, 1954). Inicialmente, foi estabelecido o

Congresso Nacional do Povo como o maior órgão do poder Legislativo do Estado.

Nele, foi determinado que o trabalho no Congresso deveria ocorrer a partir da

convocação pelo seu Comitê Permanente ou se um quinto dos congressistas

solicitassem uma reunião. É um órgão que tinha como responsabilidade direcionar

questões para o Conselho de Estado, bem como tinha por direito exigir o envio de

materiais e relatórios por outras instituições do Estado, para cumprir com suas

obrigações e também confirmar e controlar se as políticas do partido estavam sendo

executadas conforme previsto (“NATIONAL...”, s/d; FAIRBANK, 1986). Além disso,

o Congresso detinha também autoridade para emendar a Constituição, eleger o

presidente e vice-presidente, fazer planejamento econômico e resolver questões de

guerra e paz. São membros participantes do Congresso os deputados eleitos pelas

províncias, regiões autônomas e municípios, que estão sob a autoridade central

(REPÚBLICA POPULAR DA CHINA, 1954).

Outro órgão de máxima importância na estrutura estatal chinesa era o

Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo, composto pelo presidente,

vice-presidente, secretário-geral e alguns premiers e secretários eleitos pelo

Congresso Nacional. Sua função era conduzir as eleições dos deputados do

19

Congresso; interpretar as leis; supervisionar as instituições como o Conselho de

Estado, Tribunal Popular Supremo e Procuradoria Popular e convocar o Congresso

Nacional (REPÚBLICA POPULAR DA CHINA, 1954). Ainda que, de acordo com a

Constituição de 1954, o Congresso ocupasse a maior autoridade legislativa do PCCh,

o Comitê Permanente era detentor da autoridade de Poder Legislativo, quando o

primeiro não se encontrasse reunido (“NATIONAL...”, 1954).

O Poder Executivo tinha sua maior autoridade administrativa representada

pelo Conselho de Estado, o qual era composto pelos seguintes membros: o premier,

o vice-premier, os ministros, os chefes de Comissões e o secretário-geral do Partido.

O Conselho de Estado tinha como responsabilidade geral emitir medidas

administrativas, ordens e decisões e verificar sua execução. Deveria também

estabelecer o controle do comércio nacional e internacional, analisar planos

econômicos e averiguar o Orçamento do Estado, apresentar projetos de leis e

relatórios, quando requeridos pelo Congresso ou Comitê Permanente (REPÚBLICA

POPULAR DA CHINA, 1954). Por fim, as forças militares e a segurança pública

estavam sob controle estrito do Partido. Além disso, apesar dos vários poderes

citados, a autoridade máxima permanecia sempre com o Comitê Permanente do

PCCh e seus membros (FAIRBANK, 1986).

Sob o regime maoísta, Partido e Estado guardavam ainda uma similaridade:

ambos estavam subordinados à liderança de Mao Zedong, cuja legitimidade estava

fundamentada em sua experiência revolucionária. Pessoalmente, Mao se opunha às

estruturas burocráticas estatais que acabavam atribuindo muita autonomia aos

departamentos estatais em relação à estrutura partidária: o papel do partido era

monitorar o Estado, e o papel de Mao era controlar o partido (SHIPING, 1997).

Diante disso, Mao não só era o grande idealizador de grandes campanhas

implementadas pelo partido e pelo Estado, como o Grande Salto Adiante, mas

também era o responsável pela orientação da grande nação chinesa: era a visão de

Mao sobre a China que predominava tanto na estrutura partidária quanto na estatal.

Desse modo, ainda que o PCCh e o Estado chinês fossem estruturados de forma a

permitir um processo de tomada de decisão da base para o topo, o que acontecia era

o centralismo decisório na figura de Mao.

20

Referências:

FAIRBANK, J. K. “Creating the new State”. In: The Great Chinese Revolution, 1800-1945. Nova Iorque: Harper and Row, 1986. Disponível em: <http://archives.cerium.ca/IMG/pdf/Fairbank_-_Great_revolution_Chap-_15.pdf>. Acesso em: 25.jul.2015.

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DIRETIVAS

As diretivas são ações oficiais do PCCh. Esse documento atende às

demandas do Estado, como negociações internacionais, posicionamento de tropas,

políticas de Estado, e qualquer membro do Politburo é hábil para ser seu titular

(desde que respeite os poderes de seu cargo). Os delegados não precisam indicar

21

que tipo de diretiva estão produzindo. Porém, para melhor orientação, os tipos de

diretiva são os seguintes:

• Ação Administrativa: o gabinete pode produzir medidas

administrativas, regulações, ou legislações que têm força de lei. Por

exemplo, censura de mídia, medidas legais de emergência ou a remoção

de oficiais de menor cargo;

• Diretivas Políticas: o gabinete pode se comunicar e enviar comandos às

organizações governamentais locais, líderes legislativos ou aliados,

como uma maneira de angariar apoio político interno;

• Comunicação Interna: o gabinete pode produzir documentos que

organizem as discussões sobre diretivas específicas, instruções,

lembretes ou sugestões. Esse instrumento pode ser usado inclusive

como reforço de uma política específica ou para instruir os ministros

nacionais a respeito do comportamento com a mídia sobre

determinados assuntos, por exemplo;

• Comunicação Externa: o gabinete pode se comunicar com

representantes que não pertencem ao governo nacional:

o Communiqués: usado para a comunicação com governos ou

órgãos estrangeiros para expressar interesses, políticas ou

intenções internas;

o Pronunciamento Público: usado para comunicação com o público

geral, braços do governo e exército em grande escala;

o Convites e Pedidos: o gabinete, ou seus membros, podem decidir

se encontrar com testemunhas, políticos, prisioneiros ou outros.

Essa diretiva pode ser útil para contato direto ou negociação com

um membro de fora do gabinete do delegado; entretanto, não

existem garantias de aceitação dos pedidos, pois é necessária a

aceitação da parte requisitada;

• Diretivas Militares: o gabinete pode emitir ordens para operações

militares pelas forças armadas:

22

o Ordem de Operação: usada para promover exercício militar. Esse

tipo de ação requer explicação detalhada sobre a maneira pela

qual a operação funcionará, bem como sobre seus objetivos;

o Missões: usadas para operações de aeronaves ou navios com

objetivo específico como reconhecimento, resgate, patrulha,

sinalização ou escolta;

• Diretivas de Inteligência: os gabinetes podem se valer de exercícios de

inteligência para obtenção de informações sobre outro Estado, tanto por

novas operações, quanto por instruções a agentes já estrategicamente

localizados;

o Obtenção de Informação: tem o objetivo de instruir espiões para

obter informações secretas de outros Estados. No entanto, essa

ação pode ser dificultada por recursos limitados ou pelo risco de

exposição dele aos oficiais estrangeiros;

o Sabotagem: tem o objetivo de instruir oficiais de inteligência a

tomar atitudes para enfraquecer o outro Estado por meio de

danos às instalações produtivas ou de outra categoria que sejam

vitais para esse inimigo. Para isso, a operação e seu objetivo

devem ser detalhados;

o Contrainteligência: tem o objetivo de promover medidas

especiais para prevenir que outras organizações consigam

coletar ou implantar informações no governo nacional ou no

gabinete. Isso pode ser feito por meio de assassinatos ou

divulgação de informações erradas;

o Vigilância: tem o objetivo de monitorar personagens específicas

que têm capacidade de mudança constante para ter as

informações necessárias para a tomada de decisão, o que

funciona nos níveis doméstico e internacional, com aliados ou

inimigos;

• Outras Diretivas: caso o gabinete veja como necessário outro tipo de

diretiva que não se enquadre às anteriores, os delegados devem enviar

tal proposta para a Secretaria do Gabinete para análise.

23

Contexto Histórico

(I) Condicionantes internos

Da perspectiva interna, os condicionantes que nos levam a entender o

contexto político vigente na China, em 1969, remetem aos antecedentes históricos

do Grande Salto para Frente e, principalmente da Revolução Cultural. Episódios que,

juntos, alterariam os rumos do Partido Comunista chinês.

Em 1958, o governo comunista lançou o Grande Salto para Frente, também

conhecido como o Segundo Plano Quinquenal. Esse programa foi idealizado por Mao

e implantado pelo PCCh, sendo seus principais objetivos modernizar a agricultura e

a indústria nacional por meio do controle e do direcionamento estatal (CHAN,

2001). A partir da aplicação das ideias do Grande Salto para Frente, as fazendas

chinesas foram coletivizadas e reformadas para serem criadas as comunas

populares: unidades produtivas rurais de caráter autônomo, que deveriam se

responsabilizar pelo abastecimento do país (YANG, 1996). No final de 1958, milhões

de pessoas viviam em cerca de vinte e seis mil comunas. O governo incentivava cada

vez mais a vida nas comunas, principalmente por meio da utilização das

propagandas. Além disso, o programa econômico trazia consigo o apoio à produção

familiar e à dos produtos vitais para a produção industrial, como o aço e o ferro

(CHAN, 2001).

Acompanhada de toda a modificação causada pelo Grande Salto para Frente,

bem como pelas más condições climáticas que se seguiram nesse período, a

economia chinesa sofreu um grande abalo. A produtividade caiu drasticamente após

a implementação do novo plano econômico, levando, em 1960, a uma fome sem

precedentes. Diante desse quadro, o governo deu início a um programa de

racionamento de alimentos, em que a população consumia o mínimo necessário

para sua sobrevivência. Durante o período compreendido entre 1959 a 1962, é

estimado que 20 milhões de pessoas tenham morrido de fome ou por causa de

doenças desenvolvidas a partir da falta de nutrientes (CHAN, 2001).

24

Com o evidente fracasso do Grande Salto para Frente, o plano foi

abandonado em 1960, e a figura de Mao ficou extremamente abalada dentro do

partido. Durante todo o período do Grande Salto para Frente, muitos membros do

partido condenaram as medidas que estavam sendo aplicadas no país. Com o

fracasso e fim do programa, tais figuras opositoras acabaram ganhando certa força

dentro do PCCh em detrimento da figura de Mao (GAO, 2011, pp. 141-144). Em 1959,

ocorreu o Plenário do Comitê Central em Lushan, no qual toda a gama das políticas

radicais de Mao, nacionais e internacionais, foram alvo de ataques pelo ministro da

Defesa Nacional Peng Dehuai. Três eventos favoreciam as críticas: o cisma nas

relações sino-soviéticas, que, além de resultar na retirada de técnicos soviéticos da

China, causou também grande abalo na economia chinesa; o colapso do Grande

Salto para Frente; o programa das comunas.

Consequentemente, ganhou destaque a ala do partido que propunha novas

ideias e modelos para o avanço chinês que, nem sempre, estavam de acordo com os

preceitos maoístas. Diante disso, cresceu em Mao Zedong o temor de que o

revisionismo tomasse conta do PCCh, destruísse as bases revolucionárias e

marginalizasse por completo a figura do grande líder (GAO, 2011, p. 117-119). Vale

destacar que, a despeito dos fracassos do final da década de 1950, a figura de Mao

ainda era respeitada tanto dentro do partido quanto em meio à população chinesa.

Desse modo, Mao fez uso desses altos índices de popularidade e organizou um

movimento social que objetivava a restauração de sua autoridade. Tal movimento

ficaria conhecido como Revolução Cultural (CHAN, 2001).

A segunda metade da década de 1960 na China foi, portanto, marcada por

esse episódio que alterou os rumos do PCCh, a Revolução Cultural (1966-1969). Para

contornar a descrença e recuperar sua credibilidade, Mao utilizou-se de um

movimento de mobilização popular cujo objetivo era expurgar do partido as figuras

opositoras ao líder. Tais pessoas foram classificadas como antirrevolucionárias e

revisionistas: os cargos ocupados no governo e no partido teriam influenciado os

opositores de tal modo, que eles teriam perdido a ligação com a origem da revolução

comunista (FAIRBANK; GOLDMAN, 2006, pp. 354-356). Os revisionistas tinham a

intenção de reformular o comunismo chinês, de modo a absorver alguns elementos

capitalistas, dando prioridade ao crescimento econômico e a lealdade

25

revolucionária, como estava sendo feito na União Soviética. Foram acusados de

revisionismo, por exemplo, Liu Shaoqi e Deng Xiaoping. Com tais argumentos, Mao,

então, partiu para uma empreitada contra o próprio partido, marginalizando, ou até

mesmo excluindo, seus opositores (GAO, 2011, p. 117).

Para dar suporte à sua campanha política, Mao contou com o Exército de

Libertação Popular (ELP), comandado por Lin Biao, que atuara em conjunto com

várias organizações revolucionárias que se espalharam por todo o país. Na

estratégia de Mao, entretanto, o ELP deveria ocupar um papel secundário nos

levantes e garantir apenas o controle da situação. O protagonismo seria assumido

pela Guarda Vermelha, composta em sua maioria por jovens que eram instigados

por Mao Zedong e seus aliados a questionar as velhas estruturas que tomavam

conta do PCCh1 (GAO, 2011, pp. 162-165). A maioria dos recrutados era pertencente

às “cinco classes vermelhas” – trabalhadores, camponeses pobres, jovens que

tinham uma aptidão revolucionária ou um mártir revolucionário –, a Guarda

Vermelha era consciente de sua mais importante função: servir como o exército de

Mao na Revolução Cultural. No decorrer da Revolução cultural, entretanto, as

consequências foram inúmeras. A liderança do Partido foi completamente abalada e

reestruturada, mesmo figuras próximas a Mao tinham sido afastadas. Ao final da

Revolução Cultural, o líder confiava apenas em um pequeno grupo de pessoas que

incluía Lin Biao, Zhou Enlai, Chen Boda e Kang Sheng. No âmbito militar, o Exército

de Libertação Popular ocupava agora um papel importante em toda a China,

principalmente em Pequim. Foram atribuídas a ele funções administrativas e

econômicas e atividades de segurança pública, que abrangiam todo o território

chinês. Seu principal foco era manter a ordem e a estabilidade que foram

prejudicadas pela Revolução Cultural (FAIRBANK; GOLDMAN, 2006, pp. 356-359).

Diante disso, não só o ELP, mas também os militares ganharam uma posição de

destaque na política chinesa. Com o desmantelamento da liderança do PCCh,

provocado pela Revolução Cultural, fez-se necessário o estabelecimento de uma

nova estrutura: Mao, então, aproximou seus aliados, como Lin Biao, e os opositores

1 Nesse período, qualquer elemento considerado como reflexo da “velha China” era criticado pela Revolução Cultural. Entre eles estavam o confucionismo, o mandarinato e os privilégios de classe que, na visão de Mao, eram incompatíveis com os preceitos comunistas que deveriam embasar a “nova China” (GAO, 2011, p.163).

26

que queria manter sob vigilância, como Deng Xioping. O PCCh que ressurgiu da

Revolução Cultural tinha, assim, um novo perfil: mais militares, muitos dos quais

tinham um grau de escolaridade inferior aos de seus antecedentes, classificados

como burgueses e revisionistas pela campanha de Mao (FAIRBANK; GOLDMAN,

2006, pp. 369-372). É esse PCCh que vai enfrentar o desafio de se contrapor à URSS

no caso das ilhas Damansky/Zhenbao.

(II) Condicionantes externos

Da fundação da República Popular da China, em 1949, até o fim dos anos

1950, a política externa chinesa se encaixava no quadro esperado de um país

comunista em meio à Guerra Fria: aproximou-se da União das Repúblicas Socialistas

Soviéticas (URSS) e se distanciou dos Estados Unidos da América (EUA). Nesse

período, a China contou com forte apoio econômico soviético direcionado,

principalmente, a estimular a industrialização chinesa. A URSS, entretanto, tomava

cuidado para, ao mesmo tempo em que dava suporte ao vizinho comunista, não

fortalecer demais a China a ponto de torná-la uma concorrente dentro do bloco

comunista (GAO, 2011, pp. 19-20). Diante disso, não tardou para que as

desconfianças de Mao Zedong em relação aos soviéticos ganhassem força e se

refletissem na relação bilateral.

Na década de 1960, as relações exteriores da China foram fortemente

influenciadas pela reviravolta que ocorria na esfera interna. Frente aos fracassos

internos da década anterior, Mao Zedong estava convencido de que seria necessário

aprofundar a revolução comunista para levar a China adiante e superar os

obstáculos ao crescimento. Para tanto, tudo o que remetesse à Velha China deveria

ser destruído, inclusive os estrangeirismos que haviam fragilizado tanto o Império do

Meio em períodos anteriores: a China precisaria se fortalecer com base em sua

própria estratégia (FAIRBANK; GOLDMAN, 2006, p. 363). Na esfera externa, isso se

traduziu como um combate ao crescente revisionismo propagado no bloco

comunista e a contraposição e crítica cada vez mais frequentes à falta de

capacidade soviética para liderança do comunismo internacional. Tal oposição

chinesa, que em muito refletia uma oposição pessoal de Mao, ficou ainda mais

27

visível durante o governo de Krushchev, na URSS (GAO, 2011, p. 20). A China

passou, então, a buscar a liderança do bloco comunista, mobilizando diversos países

da África e do sudeste asiático.

Com o início da Revolução Cultural, o Ministério das Relações Exteriores foi

prejudicado pela ofensiva direcionada a Chen Yi pela Guarda Vermelha (FAIRBANK;

GOLDMAN, 2006, p. 363). Em diversas ocasiões, Chen Yi foi obrigado a reconhecer

os supostos erros estratégicos da política externa chinesa, que havia se aproximado

demais da URSS, sem trilhar um caminho próprio. Diante dessa postura mais radical

por parte da China no contexto interno e externo, a URSS passou a criticar o país

vizinho e a confrontá-lo em diversas esferas: o reflexo mais visível eram os conflitos

fronteiriços, que se tornavam cada vez mais frequentes entre China e URSS (GAO,

2011, p. 22).

Em função desse embate crescente entre China e URSS no campo comunista,

ressurgiu o interesse chinês em relação ao outro polo da Guerra Fria: os EUA. Se, até

então, o país ocidental era tido como inimigo número um do gigante oriental, nos

anos 1960, a aproximação com os EUA parecia ser uma ferramenta útil na

contraposição à URSS. Nas palavras de Mao, a China ”usaria os bárbaros para

reprimir os bárbaros” (GAO, 2011, p. 21). Nesse sentido, Zhou Enlai, que era o

grande formulador da estratégia internacional chinesa, começou a fazer pequenos

esforços de aproximação com o governo americano, ao mesmo tempo em que

convencia o próprio Mao a aceitar o novo arranjo (GAO, 2011, pp. 20-21). Aos EUA

também interessava uma retomada das relações com a China: cada vez mais

afundados e fragilizados pela Guerra do Vietnã, o país capitalista precisava de um

novo trunfo que permitisse que desequilibrasse a relação com a URSS (FAIRBANK;

GOLDMAN, 2006, p. 363).

Foi nesse contexto externo que a disputa entre URSS e China pelas ilhas

Damansky/Zhenbao ocorreu: de um lado, a relação sino-soviética se tornava cada

vez mais frágil e instável; de outro lado, a aproximação com os EUA se firmava como

a possibilidade de desferir um golpe final em relação ao vizinho do norte, além de

permitir a estabilização de suas fronteiras ao sul. A resolução da disputa, portanto,

vai além de uma estratégia de reafirmação nacional, fazendo parte do próprio

contexto da Guerra Fria.

28

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princípios marxistas-leninistas com a adaptação para o momento político que a

China vivia na primeira metade do século XX e para as particularidades da realidade

nacional. Tal vertente da teoria sociológica de Marx tem heranças claras do

marxismo-leninismo e também tem diversos pontos que divergem dele.

Em ambas as interpretações do marxismo – a leninista, adaptada à realidade

russa, e a maoísta, adaptada à realidade chinesa –, a luta contra o imperialismo e

contra a interferência externa sobre o governo nacional é ponto central na teoria

(MASSALIJN, 2014). A luta contra o capitalismo é proveniente do desenvolvimento

que se deu no leninismo contra as estruturas subordinantes da sociedade burguesa

elitista. Existia uma identificação das lutas dentro da vertente maoísta que

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aproximava o imperialismo e o capitalismo, o que fazia com que a luta contra o

imperialismo também fosse o esforço contra o capitalismo. Nos anos 1920, a força

desse movimento não foi tão intensa na China e demonstrou que a burguesia estava

mais atrelada aos interesses imperialistas do que ao anseio de desenvolvimento da

sociedade. Somente no período dos anos 1940 e 1950, os interesses de não

subordinação do povo às estruturas desiguais da sociedade alcançaram as massas e

permitiram que a revolução acontecesse na China e estabelecesse o governo

comunista no país (MASSALIJN, 2014).

A visão que o marxismo-maoísmo expunha sobre o povo e a massa está

conectada à sua orientação da organização do Estado e ao relacionamento entre

área rural e área urbana. A maior parte da China nesse período era rural e, por isso,

Mao fundamentou a estratégia com base na atuação constante do campesinato e no

uso do espaço rural como locus revolucionário. No campo, eram formadas as

comunas, onde os ideais do comunismo eram trabalhados e desenvolvidos pela

massa camponesa, pela qual Mao não escondia seu profundo apreço (MEISNER,

1971, p. 19). Tal interesse pelo ambiente rural fez com que não só a orientação

anterior à revolução fosse direcionada à massa rural, mas também a orientação pós-

revolução estivesse direcionada a essa área. Os planos de Mao, no pós-revolução,

priorizavam o desenvolvimento socioeconômico das áreas rurais, pois, nesses locais,

encontravam-se as ideias de desenvolvimento do socialismo e a lealdade à ideologia

marxista-leninista (MEISNER, 1982, p. 55). Dessa maneira, aqueles que

necessitassem de orientação quanto à ideologia do partido poderiam ser enviados

ao campo, a fim de que aprendessem com os campesinos os princípios que deveriam

seguir, assim como foi feito durante a Revolução Cultural.

Foi nesse sentido que o maoísmo reformulou a organização do Estado. As

cidades dos moldes europeus e ocidentais eram consideradas como um polo de

força nas relações sociais dentro do Estado. Logo, os grandes centros urbanos

teriam o poder de subordinar o campo às suas necessidades, caso fosse de seu

interesse. Da perspectiva maoísta, era preciso alterar esse quadro, pois essa relação

hierárquica de poder permitiria a exploração do campo pela elite da cidade, criando

novamente as estruturais contra as quais o marxismo discorria e permitindo o

desenvolvimento da desigualdade entre meio rural e meio urbano. Assim, o

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maoísmo defendia que a cidade e o campo deveriam se relacionar de modo a não

permitir que o meio urbano subjugasse o rural. Ao contrário, o campo deveria

ascender sobre a cidade e ser a região mais importante para a estruturação do país

(MEISNER, 1982, p. 56).

O povo seria a estrutura para defender os interesses daqueles adeptos ao

maoísmo. Essa revolução seria feita por meio de três estruturas: as massas, o

exército e o partido comunista, pois seriam necessárias a força, a administração dela

e a liderança para que a revolução tivesse sucesso (MASSALIJN, 2014). Ou seja,

defendia-se a revolução por conflito contra as forças imperialistas para alcançar a

integração global ao sistema socialista. A luta chinesa contra o capitalismo era vista

de uma maneira global. Ela era assumida como parte de um movimento

internacional contra as forças imperialistas e capitalistas, a fim de não tomar a falta

de estruturas do capitalismo, como as forças produtivas ou os bens de produção,

como um obstáculo para a realização da revolução socialista (CAVENDISH; GRAY,

1968, p. 58). Dessa maneira, a revolução para o maoísmo estaria relacionada

somente às estruturas sociais e à ideologia, o que permitiria a inexistência de

estruturas capitalistas para a realização da revolução e desvincularia a necessidade

de sua existência, como era previsto pelo marxismo-leninismo do qual o maoísmo

herdou seus princípios básicos (MEISNER, 1982, p. 59). A força do marxismo-

maoísmo não se encontrava no desenvolvimento das forças materiais de produção,

mas na força dos jovens e livres das estruturas capitalistas que pudessem imprimir a

consciência de classe por eles alcançada nas estruturas sociais históricas, a fim de

desmantelar a desigualdade e a exploração (MEISNER, 1982, p. 60).

O interesse dessa luta, desse esforço contra o imperialismo capitalista era

para que fosse feita uma revolução neodemocrática, a fim de formar uma nova

democracia para o Estado. Essa nova democracia, como defendida por Mao, seria a

real democracia, sem os empecilhos do capitalismo ou a exploração dos mais fracos,

que não permitiam que o caráter democrático fosse exercido de fato (CAVENDISH,

GRAY, 1968, p. 52). Somente assim, o povo seria livre das estruturas do capitalismo

e poderia expor aquilo que defendia de fato e que achava ser o melhor para o

desenvolvimento da sociedade. Entretanto, vale ressaltar que essa nova estrutura de

organização social deveria estar amparada na massa trabalhadora sob liderança do

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aparelho político-organizativo do Partido Comunista Chinês (MEISNER, 1982), o que

denota certa subordinação do povo ao que é defendido pelo partido.

Enfim, o maoísmo trazia consigo um certo afastamento das teorias marxistas.

O marxismo-maoísmo negava a necessidade do proletariado urbano como força

para a revolução socialista no ambiente chinês. As características rurais da China

nesse momento faziam com que o campesinato fosse a principal divisão da

sociedade para o desenvolvimento do socialismo, uma vez que as cidades se

encontravam contaminadas pelos ditames capitalistas implantados no período em

que o nacionalismo governou a grande nação chinesa. São essas referências que

seguem como a base do pensamento político chinês, influenciando a tomada de

decisão no Partido Comunista.

REFERÊNCIAS

CAVENDISH, P; GRAY, J. Chinese communism in crisis: Maoism and the cultural

revolution. Nova York: Frederick A. Praeger, inc., 1968. ”MARXISM-leninism-maoism basic course”. In: Website oficial Massalijn. 2014.

Disponível em: <http://massalijn.nl/theory/marxism-leninism-maoism-basic-course/#chapter24> Acesso em: 08.jul.2015.

MEISNER, M. ”Leninism and Maoism: some populist perspectives on Marxism-

Leninism in China”. In: The China Quarterly, vol 45, março de 1971, pp. 2-36.

Disponível em:

<http://journals.cambridge.org/action/displayAbstract?fromPage=online&

aid=3540832>. Acesso em: 14.fev.2015.

______. Marxism, Maoism and utopianism: Eight essays. Winsconsin: The University of Winsconsin Press, 1982.