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Page 1: GUERRA DO PARAGUAI: versões historiográficas. · – História e Consciência do Brasil, de Gilberto Cotrim, 1999, ed. Saraiva; – História & Cidadania, de Alfredo Boulos Júnior,
Page 2: GUERRA DO PARAGUAI: versões historiográficas. · – História e Consciência do Brasil, de Gilberto Cotrim, 1999, ed. Saraiva; – História & Cidadania, de Alfredo Boulos Júnior,

GUERRA DO PARAGUAI: versões historiográficas.

Neusa Pereira da Silva Bassani1Rodrigo Modesto Nascimento 2

Resumo

O projeto de pesquisa realizou-se com estudantes da 2ª série do Ensino Médio, do

Colégio Estadual Professor Segismundo Antunes Netto, em Siqueira Campos, Paraná e

teve por finalidade promover uma melhora na qualidade de ensino de História, através da

discussão das versões historiográficas sobre a Guerra do Paraguai, contribuindo para

valorizar mais a História do Brasil que muitas vezes é deixada para segundo plano e

solucionar as dificuldades percebidas pelos alunos em identificar, comparar e relacionar

os textos e outras fontes históricas apresentadas por vários autores. As obras analisadas

são: Genocídio Americano: A Guerra do Paraguai, de Júlio José Chiavenatto e Maldita

Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai, de Francisco Doratioto que foram compara

das com o textos do livros didáticos utilizados pelos professores do colégio. Neste projeto

de pesquisa aplicou-se a metodologia Unidade Temática Investigativa, buscou-se elaborar

uma proposta de trabalho em História para que os alunos pudessem ver como um autor e

outro pensam sobre o mesmo assunto, fazendo diferentes abordagens.

Palavras-chave:Guerra do Paraguai; Historiografia; Unidade Temática Investigativa.

1 Professora PDE - especialização em História -atua no Colégio Estadual Professor Segismundo Antunes Netto-EFMP2 Professor Mestre da Universidade Estadual Norte do Paraná

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1- Introdução:

O presente projeto teve como prioridade desenvolver análises de historiografia por

meio de uma pesquisa fundamentada na utilização de novas teses sobre a Guerra do

Paraguai levando o aluno a questionar a produção do conhecimento histórico.

O evento histórico escolhido se deve ao seu esquecimento , não existe muita

bibliografia sobre o tema , os arquivos militares da Guerra do Paraguai são fechados,

considerados ultra-secretos e por ser um dos episódios mais sangrentos da História do

Brasil e da América do Sul, que contraria a ideia de que nosso país sempre resolveu seus

conflitos de modo pacífico. A escolha de um tema relacionado à História do Brasil tem por

objetivo valorizar a História nacional.

As obras analisadas neste projeto foram:

- Genocídio Americano: A Guerra do Paraguai, de Júlio José Chavenatto, 1979. ed.

Brasiliense;

- Maldita Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai, de Francisco Doratioto,2002, ed.

Cia. Das Letras.

As obras selecionadas serão comparadas com a produção didática do período,

portanto, o livro didático será utilizado como fonte. Os livros foram escolhidos

aleatoriamente de acordo com a biblioteca da escola, seguindo o critério antes e depois

do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático):

– História e Consciência do Brasil, de Gilberto Cotrim, 1999, ed. Saraiva;

– História & Cidadania, de Alfredo Boulos Júnior, 2006, ed. FTD.

O objetivo é contribuir para solucionar as dificuldades percebidas pelos alunos de

todos os níveis: ensino fundamental e médio, especificamente da 2ª série do Ensino

Médio a identificar, comparar e relacionar os textos e outras fontes históricas

apresentados por vários autores. Ao mesmo tempo em que o exame de novas

historiografias, deverá permitir a identificação da presença daqueles aspectos

contraditórios, imprecisos e míticos sobre o tema, desvelando então, os possíveis usos

políticos desse ensino.

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2- Análise historiográfica:

Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná, a metodologia

adotada para o ensino de História no Ensino Médio é a abordagem temática dos

conteúdos , construindo um diálogo entre o passado e o presente, e não a reprodução de

conhecimentos neutros e acabados. A História pode ter várias vertentes sobre a mesma

temática, no caso da Guerra do Paraguai, as maiores divergências estão relacionadas às

causas. Desta forma, faz-se necessário analisar os contextos históricos de autores

clássicos como: Júlio José Chiavenatto, León Pomer, Doratioto e Vitor Izeckohn.

A Guerra do Paraguai foi o mais longo conflito da América do Sul, que teve início em

Dezembro de 1864, quando o Paraguai atacou o navio brasileiro “Marques de Olinda” que

conduzia o presidente da província do Mato Grosso. Ela é conhecida como a guerra da

Tríplice Aliança, pois para enfrentar o Paraguai, o Brasil, Argentina e Uruguai se uniram.

A historiografia tradicional do Império brasileiro até o séc. XX, mostrou a versão de que

o conflito foi resultado da ganância, loucura e dos planos expansionistas de Francisco

Solano Lopes, ditador paraguaio, que tinha a ambição de conquistar toda a América do

Sul. A historiografia republicana consolidou a narrativa do Império, sem analisar a

conjuntura, mostrando uma visão tradicional da História. Neste período, no Paraguai, a

versão era outra. O conflito era visto como uma agressão dos vizinhos a um pequeno país

autônomo e desenvolvido.

Segundo Mario Maestri, desde a segunda metade do séc. XX , com as mudanças

mundiais – descolonização da África e Ásia; revoluções americanas; crise do stalinismo

uma nova historiografia chamada de revisionistas, que valorizam a história a partir das

classes subalternas, ou seja “História vista de baixo”.

No Brasil, a partir de 1960, os intelectuais nacionalistas e de esquerda elaboram o

revisionismo sobre o episódio, onde Solano Lopes aparece como líder anti-imperialista.

Esta historiografia surgiu com León Pomer, autor do livro publicado no Brasil sob o título “

A Guerra do Paraguai: a grande tragédia rioplatense”, em 1979, que defende a ideia que o

Paraguai antes da guerra era um país de pequenos proprietários, autônomo, com baixo

índice de analfabetismo, independente economicamente em relação ao capital

estrangeiro, ou seja, era uma ameaça ao domínio inglês na América e deveria ser

destruído. Brasil e Argentina considerados países dependentes do capital inglês, teriam

sido manipulados para destruir essa nação que lhe ameaçava.(Boris Fausto, 2007 ).

Do mesmo modo á esta visão temos os escritos do jornalista brasileiro, Júlio José

Chiavenatto, em sua obra “Genocídio Americano: a Guerra do Paraguai”, em 1979.

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Lançado no final da ditadura militar, o estudo teve grande aceitação no Brasil, influenciaria

várias gerações e ainda é difundido nos livros didáticos como a verdadeira história do

conflito. Escrito em linguagem voltada para o público popular, o que facilitou sua

divulgação

Chiavenatto em sua obra desconstruía a narrativa militar-patriótica da história do

Brasil, colocando o Paraguai como vítima do imperialismo inglês. Descreve como o país

conquistou sua autonomia econômica, a partir do General Francia, e no período pré-

guerra era um país desenvolvido, que o diferenciava dos demais países latino-

americanos, o que não ocorria com Brasil e Argentina, que definam-se como países

dependentes do capital e tecnologia estrangeiros, “teriam sido manipulados pela

Inglaterra para destruir uma pequena nação cujo caminho não lhe convinha”. (Boris

Fausto,2007).

Dentro das correntes revisionistas da História, destaca-se a obra de Francisco

Doratioto, Maldita Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai, “que desfaz um dos

maiores mitos a respeito do conflito: o de que a guerra teria sido provocada pelos

interesses “imperialistas”. (Vidigal, 2002).

Uma obra valorizada no meio acadêmico, por ser resultado de mais de década de

pesquisas, em análise de material de fonte primária (documental) e bibliográfica. Livro

editado em 2002, é considerado o material mais completo sobre a guerra, pela

diversidade das fontes utilizadas. Em seu trabalho busca explicar as origens do conflito e

seu desenvolvido com maior veracidade possível.(Cunha Filho, 2010).

Segundo Doratioto, não havia nenhum interesse da Inglaterra em ajudar o Brasil a

combater os paraguaios, inclusive propõe mandar um representante britânico para evitar

o conflito. Outra divergência desta obra em relação as historiografias revisionistas é a

versão de que o Paraguai possuía um desenvolvimento econômico,equilibrado e

autônomo, e que seria um modelo a ser destruído pela Tríplice Aliança.

Contrariando as teorias anteriores que afirmava o desenvolvimento para dentro, a

“nova história”, mostra o Paraguai com um desenvolvimento igual aos demais países da

América Latina, sem nenhum diferencial . O governo do ditador José Gaspar Rodriguez

de Francia, adotou uma política de isolamento do país, buscando fortalecer o Estado,

manteve uma base econômica agrícola baseada na erva-mate, tabaco e madeira; as

fazendas estatais, consideradas como modelo de igualdade social utilizaram não só o

trabalho dos camponeses, mas dos escravos de origem africana e de prisioneiros. O país,

desde 1840, para promover seu desenvolvimento buscou o mercado externo, utilizado na

exportação de produtos primários e na importação de tecnologia e armamentos.

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Doratioto descreve como causas da guerra:

(…) Desta forma, as causas da Guerra do Paraguai devem ser buscadas na política regional. A guerra foi um desdobramento previsível de uma política exterior “agressiva”, que aproximou o Paraguai do Partido Blanco uruguaio, em detrimento dos interesses do Brasil e Argentina. Fatores políticos internos desses dois países – a ascensão de um gabinete liberal no Brasil e a vitória de Mitre sobre Urquiza – favoreceram a aproximação, inusitada para a época, entre Brasil e Argentina. Não se trata de negar a influência exercida e os benefícios obtidos pela Grã- Bretanha durante o conflito, mas de retirar dos fatores do conflito “os interesses imperialistas ingleses”.

“Pela primeira vez na História do Brasil independente, se combateu pela mesma causa

de norte a sul do país”. (Doratioto, 2009).

Outra obra publicada recentemente foi de Vitor Izecksohn, publicada em 2009, onde o

autor descreve a guerra como uma necessidade de resolver os conflitos entre os países

vizinhos: Argentina, Paraguai, Uruguai e Brasil.

O Vice- Reinado do Rio Prata criado no séc. XVIII, não conseguiu sobreviver por muito

tempo. No início do séc. XIX dividiu-se em cinco nações independentes: Chile, Províncias

Unidas do Prata, Uruguai, Paraguai e Bolívia, que viam a dificuldade em definir o território

para cada país.

Havia também o medo das políticas expansionistas já praticada pelo Brasil, com a

incorporação do Uruguai como a Província Cisplatina (1821-1828). Após a independência

das colônias espanholas, os novos países lutavam para manter o controle territorial, o que

teria resultado na Guerra do Paraguai.

No caso do Brasil, para resolver os conflitos, aliaram diplomacia ao uso da força. A

relação entre Paraguai e Brasil era cheia de altos e baixos. Os maiores problemas eram

em relação à fronteira e à navegação do rio Paraguai, que permitia acesso rápido à

Província do Mato Grosso.

A situação do Uruguai, era o ponto de tensão do Brasil na Bacia Platina, tanto na

política interna como na externa. Os estancieiros do Rio Grande do Sul não reconheciam

a fronteira entre os dois países e ocupavam o território uruguaio, ocupando 30% do país.

Na Argentina, a ascensão de Bartolomeu Mitre (1821-1906) promoveu a

transformação econômica do país, modernizando a economia integrada ao mercado

internacional, gerando uma estabilidade.

O governo paraguaio não levou em conta as transformações nos países vizinhos

(Izecksohn, 2009): (…) A diplomacia paraguaia, comandada por López, subestimou essas transformações ao acreditar que obteria a vitória num golpe de mão, levando o país para a guerra que os paraguaios não tinham condições de vencer. Apesar da miopia diplomática, os primeiros movimentos paraguaios foram bem sucedidos, inspirando a confiança da população em seu líder.

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A guerra tem início por iniciativa do Paraguai, que mantem o domínio do conflito até a

formação da Tríplice Aliança, formada por Brasil, Argentina e Uruguai. As maiores

dificuldades do Paraguai eram as decisões equivocadas de Solano Lopes; a vastidão do

território; falta de preparo do Exército; a falta de suprimento, que favoreceu o

aparecimento de doenças e o desentendimento entre os comandantes.

Incentivados a lutar contra a barbárie paraguaia, grupos patrióticos do Brasil,

organizaram campanha para arrecadação de donativos e voluntários para lutar na guerra,

apesar do pouco interesse pelo serviço militar, conseguiram um grande número de

soldados (Izecksohn,2009). Após a vitória em várias batalhas, as tropas brasileiras

derrotam o Paraguai, em 1870.

As consequências da guerra foram desastrosas para todos os envolvidos,

principalmente para o Paraguai. Como disse, Neville Chamberlain: “ Na guerra, seja qual

for a parte que se diga vencedora, não há vencedores: todos são perdedores”.O país

perdeu parte de seu território para o Brasil e Argentina, o país passou a ser exportador de

produto de pouca importância no mercado, perdeu mais da metade de sua população,

sendo a maioria dos sobreviventes velhos, mulheres e crianças. Para o Brasil, houve o

aumento da dívida com a Inglaterra, fortalecimento do Exército, que ganhou mais

autonomia, formação de campanha republicana que levou a queda do Império. (Bóris

Fausto, 2007).

3- Resultados:

O presente projeto de implementação – Guerra do Paraguai: as versões

historiográficas – foi bem aceito por toda a equipe pedagógica da escola, que colaborou

para que pudéssemos desenvolver este trabalho com os alunos selecionados. O tema

despertou interesse do corpo docente e discente.

Os alunos que fizeram parte deste projeto eram da 2ª série, turma B do Ensino Médio,

faixa etária de 15 e 16 anos; todos da zona urbana; do período da manhã; possuem

familia estruturada afetiva e financeiramente.

O colégio colaborou na preparação do material utilizado na implentação. Inicialmente

foi feito a apresentação do projeto de intervenção, a explicação de como se daria o

desenvolvimento, quais os objetivos e expectativas e que a parceria com toda a turma

seria imprescindível, uma vez que possibilitaria a eles um maior conhecimento da história

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do nosso país. Foram muito solícitos, e sentiram-se honrados por terem sido escolhidos

para participarem deste trabalho.

De acordo com as Diretrizes Curriculares de História do Estado do Paraná, o

conhecimento histórico é temporário, não existe uma verdade absoluta e que podemos ter

várias explicações e interpretações para o mesmo acontecimento do passado, neste

sentido, a metodologia utilizada no material didático foi a (UTI) Unidade Temática

Investigativa, porque cria um campo enorme de possibilidades que permitem aos

professores organizarem os momentos de forma estruturada dentro do modo de pensar

histórico.

O projeto desenvolveu-se em muitas etapas: No 1º momento

foi feito um levantamento da ideias tácitas dos alunos, ou seja, que conhecimentos tinham

sobre a Guerra do Paraguai, através do método conhecido como “tempestade cerebral”,

onde os alunos expressam o que sabem sobre o assunto. Quando perceberam que pouco

sabiam, ficaram curiosos para saber mais. Os professores de História da rede pública do

estado do Paraná, concordam que o assunto é pouco estudado nas escolas, como mostra

o depoimento do professor Esdras Cordeiro Chavante em 31/10/2011.

O pouco conhecimento sobre a Guerra do Paraguai mostra apenas a ponta do iceberg do desconhecimento da História do Brasil. Infelizmente, em sala de aula, no ensino Fundamental e Médio, presenciamos diariamente a insuficiência de nossos alunos quanto a questões básicas relacionadas a nossa trajetória até chegarmos ao atual estágio.Muitas razões podem ser apresentadas: a enorme carga de conteúdos sobre a História Geral que só tem sentido de ser pelo ranço eurocêntrico de nossa educação ou pela imposição dos vestibulares que exigem minúcias de vastas áreas do conhecimento, inclusive a História. Só para exemplificar, recentemente uma Universidade Estadual, em seu processo seletivo (Vestibular), solcitou que os alunos informassem o nome de 5 cidades da Mesopotâmia. O que tal questão avalia de fato? A capacidade de decoreba dos alunos... Se analisarmos as provas de vestibular das principais instituições de ensino superior veremos que o número de questões da História Geral é consideravelmente maior que da nossa História.Penso que a História Geral deva ser trabalhada como pano de fundo e preparação para a compreensão profunda da história nacional, em suas vertentes e possibilidades.

O menoprezo que se dá a este episódio da História do Brasil, foi intencional, segundo

depoimento do professor Paulo César de Souza, em 27/10/2011.

O que podemos perceber é que a História do Brasil é pouco explorada ou não possui material para tal abordagem. Por exemplo quando o Regime Militar criou um curriculum conforme interesse do governo colocou-se apenas os interesses daquele Regime deixando de lado ou ocultando fatos e fonte importantes da História do Brasil. Além disso temos a questão do analfabetismo no Brasil o que levou a falta de fontes seguras fazendo com que grande parte de sua História ainda esta por ser escrita. E ainda temos um grande déficit tanto na formação de professores bem

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como na produção de material visando os conteúdos de História do Brasil, como por exemplo a Guerra do Paraguai.

No segundo momento, após serem detectadas as ideias tácitas dos alunos foi possível

iniciar a intervenção pedagógica. Que foi estruturada por fontes históricas e narrativas

historiográficas.

Para que o estudante fundamente as diversas perpectivas geradas por suas

narrativas foi necessário apresentar a historiografia de referência sobre as causas da

Guerra do Paraguai. Para isto, foi utilizado fontes históricas, fragmentos de textos teóricos

e de narrativas historiográficas que se confrontem e /ou dialoguem entre si.

NARRATIVA 1:

Texto do historiador argentino e professor do departamento de História da Faculdade

de Ciências Sociais da PUC- SP., Leon Pomer, autor do livro publicado no Brasil sob o

título “ A Guerra do Paraguai: a grande tragédia rioplatense”, em 1979,

... que defende a ideia que o Paraguai antes da guerra era um país de pequenos proprietários, autônomo, com baixo índice de analfabetismo, independente economicamente em relação ao capital estrangeiro, ou seja, era uma ameaça ao domínio inglês na América e deveria ser destruído. Brasil e Argentina considerados países dependentes do capital inglês, teriam sido manipulados para destruir essa nação que lhe ameaçava.

NARRATIVA 2: Texto do historiador Júlio José Chiavenatto, jornalista brasileiro, a partir de 1971,

impressionado com o subimperialismo brasileiro no Paraguai, começou a estudar a

história daquele país, ponto de partida para uma série de livros

analisando o grau de dependência da América do Sul aos imperialismos da Inglaterra e

dos EUA, o livro do autor analisado neste projeto é “Genocídio Americano: a Guerra do

Paraguai”, em 1979. Lançado no final da ditadura militar, o estudo teve grande aceitação

no Brasil, influenciaria várias gerações e ainda é difundido nos livros didáticos como a

verdadeira história do conflito. Escrito em linguagem voltada para o público popular, o

que facilitou sua divulgação.Chiavenatto em sua obra desconstruía a narrativa militar-patriótica da história do Brasil, colocando o Paraguai como vítima do imperialismo inglês. Descreve como o país conquistou sua autonomia econômica, a partir do General Francia, e no período pré-guerra era um país desenvolvido, que o diferenciava dos demais países latino-americanos, o que não ocorria com Brasil e Argentina, que definam-se como países dependentes do capital e tecnologia estrangeiros, “teriam sido manipulados pela Inglaterra para destruir uma pequena nação cujo caminho não lhe convinha”.

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NARRATIVA 3: Texto do historiador Francisco Doratioto, autor do livro Maldita Guerra: Nova História da

Guerra do Paraguai, “que desfaz um dos maiores mitos a respeito do conflito: o de que a

guerra teria sido provocada pelos interesses “imperialistas”. Uma obra valorizada no meio

acadêmico, por ser resultado de mais de década de pesquisas, em análise de material de

fonte primária (documental) e bibliográfica. Livro editado em 2002, é considerado o

material mais completo sobre a guerra, pela diversidade das fontes utilizadas. Em seu

trabalho busca explicar as origens do conflito e seu desenvolvido com maior veracidade

possível.(Cunha Filho, 2010,p.3).

Segundo Doratioto, não havia nenhum interesse da Inglaterra em ajudar o Brasil a

combater os paraguaios, inclusive propõe mandar um representante britânico para evitar

o conflito. Outra divergência desta obra em relação as historiografias revisionistas é a

versão de que o Paraguai possuía um desenvolvimento econômico,equilibrado e

autônomo, e que seria um modelo a ser destruído pela Tríplice Aliança.

Contrariando as teorias anteriores que afirmava o desenvolvimento para dentro, a

“nova história”, mostra o Paraguai com um desenvolvimento igual aos demais países da

América Latina, sem nenhum diferencial . O governo do ditador José Gaspar Rodriguez

de Francia, adotou uma política de isolamento do país, buscando fortalecer o Estado,

manteve uma base econômica agrícola baseada na erva-mate, tabaco e madeira; as

fazendas estatais, consideradas como modelo de igualdade social utilizaram não só o

trabalho dos camponeses, mas dos escravos de origem africana e de prisioneiros. O país,

desde 1840, para promover seu desenvolvimento buscou o mercado externo, utilizado na

exportação de produtos primários e na importação de tecnologia e armamentos.

Doratioto(2002,p.197) descreve como causas da guerra:

(…) Desta forma, as causas da Guerra do Paraguai devem ser buscadas na política regional. A guerra foi um desdobramento previsível de uma política exterior “agressiva”, que aproximou o Paraguai do Partido Blanco uruguaio, em detrimento dos interesses do Brasil e Argentina. Fatores políticos internos desses dois países – a ascensão de um gabinete liberal no Brasil e a vitória de Mitre sobre Urquiza – favoreceram a aproximação, inusitada para a época, entre Brasil e Argentina. Não se trata de negar a influência exercida e os benefícios obtidos pela Grã- Bretanha durante o conflito, mas de retirar dos fatores do conflito “os interesses imperialistas ingleses”.

Após a leitura das narrativas foi proposto atividades com questões para comparar os

textos. Este momento é necessário para que o estudante compreenda a diversidade de

perspectivas que os sujeitos de uma determinada época possuem em relação a

determinados acontecimentos históricos.

No terceiro momento, os alunos assistiram o documentário “Guerra do Brasil: Toda a

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verdade sobre a guerra do Paraguai” , encontrado no site www.filmeseserieshd.com.br ,

Em seguida responderam questões sobre o vídeo.

Para o quarto momento estava previsto assitir ao filme “Heróis brasileiros na Guerra

do Paraguai” do site www.interfilmes.com.br para comparar as semelhanças e diferenças

entre os documentos. Mas, não foi possível porque o fime não foi encontrado. Não há

filmes sobre este evento histórico.

No quinto momento, foi apresentado aos alunos trechos de livros didáticos sobre o

assunto. Os livros foram escolhidos aleatóriamente de acordo com as possibilidades da

biblioteca da escola, seguindo apenas o critério: antes e depois do PNLD( Plano Nacional

do Livro Didático).

Texto1:

Anterior ao PNLD, temos o HISTÓRIA E CONSCIÊNCIA DO BRASIL, de Gilberto Cotrim, publicado em 1999, pela editora Saraiva, p.208 e 209. Que apresenta a Guerra do Paraguai, como resultado do imperialismo inglês:

(…) Francisco Solano Lopez, continuou a obra de seus antecessores, buscando fazer do Paraguai um país soberano e livre da exploração do capitalismo internacional.O projeto paraguaio de emancipação desagradava profundamente a Inglaterra, que tinha interesse em manter todos os países latino-americanos como simples fornecedores de matérias-primas e consumidores dos seus produtos industrializados. Percebendo que o Paraguai não se enquadrava no esquema pretendido pelo seu capitalismo industrial, a Inglaterra financiou, com todo empenho, o Brasil, a Argentina e o Uruguai quando esses países, por intermédio do Tratado da Tríplice Aliança, decidiram lutar contra o Paraguai. Foi o mais longo e sangrento conflito armado já ocorrido na América do Sul.

Texto2:

Após o PNLD, temos HISTÓRIA: SOCIEDADE & CIDADANIA, de Alfredo Boulos Júnior,

publicado em 2006, pela editora FTD, p..252 e 253. Que apresenta a guerra como

resultado de interesses de todos os países envolvidos: (…) O Brasil queria conservar-se como potência regional.(…) A Argentina vivia um problema interno: suas províncias Entre Rios e Corrientes queriam separar-se e formar países independentes, contando para isso com o apoio do Paraguai.O Paraguai, governado por Francisco Solano López, desejava fortalecer-se a ponto de garantir que não seria anexado por seus dois poderosos vizinhos – Argentina e Brasil. O governo paraguaio queria conquistar uma saída para o mar, para comerciar com o exterior com maior facilidade. Para que as mercadorias paraguaias chegassem ao Atlântico, o caminho ideal eram os rios Paraguai, Paraná e da Prata. Mas o rio Paraná está situado na fronteira do Brasil; o rio Prata era controlado pela Argentina, que cobrava altas taxas sobre produtos de outros países. Diante disso, Solano López aliou-se ao Uruguai e aos rebeldes argentinos com o objetivo de formar um novo país, cujo porto marítimo seria Montevidéu. O presidente do novo país, é claro, seria ele próprio.Seria uma espécie de união dos pequenos países contra a pretensão à hegemonia alimentada pelo Brasil e pela Argentina.

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O plano de Solano López, porém, não deu certo. Seu aliado no Uruguai, o presidente Aguirre, foi derrotado pelo exército brasileiro, que invadiu o Uruguai em1864 e ajudou Venâncio Flores, um político favorável ao Brasil, a ocupar o poder. Assim, López ficou sem seus aliados.Apesar disso, Solano López começou a guerra. Mandou bloquear o navio brasileiro Marquês de Olinda, que navegava pelo rio Paraguai com destino ao Mato Grosso. Em seguida, os paraguaios invadiram essa província e, pouco depois, atravessaram terras argentinas e brasileiras para chegar ao Uruguai,. Reagindo a isso, em maio de 1865, o Brasil, e a Argentina e o Uruguai uniram-se formando a Tríplice Aliança, para combater o Paraguai.

Após a leitura dos textos 1 e 2, os alunos responderam as questões

propostas,comparando-os. E em seguida elaboraram uma narrativa histórica sobre a

Guerra do Paraguai utilizando as fontes propostas.

A turma foi dividida em grupos, e cada grupo confeccionou mapas históricos dos

países envolvidos e das batalhas que foram expostos no pátio do colégio para todos os

estudantes.

Cada aluno leu para a turma a última versão da narrativa histórica produzida por eles

e anotaram as considerações dos colegas e da professora.

Com o término das atividades foi feita uma sistematização, comparando o

conhecimento prévio dos alunos com as últimas narrativas produzidas por eles, para

investigar se houve mudança nas ideias destes sujeitos.

A metodologia aplicada favorece a discussão sobre o assunto, como comentam

alguns professores:

Acredito que como nas DCEs e também como foi apresentado no projeto, muitos de nos já utiliza essa metodologia que procura mostrar para os alunos que na disciplina de História não existe uma verdade pronta e acabada, por isso, a necessidade de sempre estar questionando as fontes sobre um outro olhar. Como não estou em sala de aula, já arquivei o material sugerido em seu projeto e, com certeza, quando houver a possibilidade irei colocá-lo em prática. Prof. Paulo César de Souza, 2011.

4- Considerações finais:

Com o término das atividades foi possível constatar que esta forma de trabalhar tem

resultado bastante positivo, pois levam os alunos a compreenderem que em História há

várias verdades,várias nuances e que a escrita da História é limitada pelas fontes, mas é

necessário mais tempo para elaboração do material didático pelo professor. Muitas

críticas são feitas ao ensino de História do Brasil, a maioria está ligada ao seu uso

politico, cabe ao professor mostrar com clareza os possíveis usos e abusos da disciplina.

Ao analisar a História a partir de questões, temas e conceitos, o professor poderá

possibilitar a critica a dogmatismos e “verdades absolutas” (Pinski,2005).

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Ao utilizar o livro didático como fonte de pesquisa neste projeto, conclui-se que apesar

das inovações, o que prevalece nos livros atuais é a História Integrada, privilegiando os

conteúdos de História Geral e a divisão tradicional: Antiga, Média, Moderna,

Contemporânea, América , História do Brasil e do Paraná, é o que ocorre também na

organização das disciplinas nos cursos de formação dos professores nas Universidades

como na UENP (Universidade Estadual do Norte do Paraná).

É necessário investir na formação inicial e continuada dos professores, pois o livro

didático ainda é o instrumento de ensino mais utilizado em sala de aula e considerado

fonte única de verdade. O professor deve ter mais tempo disponível para preparar suas

aulas, diversificando a forma de trabalhar os conteúdos, para isso deve-se aumentar o

tempo da hora-atividade, com permanência na escola.

5.Referências:CHIAVENATTO, Júlio José. Genocídio Americano:a Guerra do Paraguai, São Paulo:

Brasiliense 1979.

CUNHA FILHO, Miguel Ângelo Melo Vieira et.al. A Guerra do Paraguai: Historiografia e

Debate.2010. Trabalho de conclusão de curso- Universidade Federal de Pelotas/RS,

2010.

Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, 2009.

DORATIOTO, Francisco- Maldita Guerra:nova história da Guerra do Paraguai-Cia das

Letras, 2002.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. 12 ed. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2007.

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