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GRUPO DE TRABALHO II EDUCAÇÃO E ENSINO EM DEBATE: PERSPECTIVAS PARA AS CIÊNCIAS SOCIAIS Coord.: Prof. Fagner Carniel A prática escolar como novo aprendizado ao cientista social Eliane Aparecida de Oliveira ................................................................................................................................................... 156 Algumas reflexões a partir da análise do caipira e sua identidade no cinema brasileiro Leni Virgínia Costa Nickel; Rosana Steinke ......................................................................................................................... 166 Crianças indígenas na cidade: a educação infantil no Centro Social Mitangue-Nhiri Driéli da Silva Vieira .................................................................................................................................................................. 179 Cultura infantil e espaço rural: o caso das crianças de Marialva Poliana Ferreira de Oliveira..................................................................................................................................................... 192 Cultura quilombola no Paraná: uma experiência em sala de aula Aurineide Maria Moreno; Rosana Steinke ........................................................................................................................... 200 Cultura indígena, escola e teoria outsider: um estudo sobre a estigmatização do indígena numa escola de Maringá Verônica Yurika Mori ................................................................................................................................................................ 210 Sociologia na EJA: da teoria à prática Fabiana Virgínio da Rocha ..................................................................................................................................................... 222

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GRUPO DE TRABALHO II EDUCAÇÃO E ENSINO EM DEBATE:

PERSPECTIVAS PARA AS CIÊNCIAS SOCIAIS

Coord.: Prof. Fagner Carniel

A prática escolar como novo aprendizado ao cientista social

Eliane Aparecida de Oliveira ...................................................................................................................................................156

Algumas reflexões a partir da análise do caipira e sua identidade no cinema brasileiro

Leni Virgínia Costa Nickel; Rosana Steinke .........................................................................................................................166

Crianças indígenas na cidade: a educação infantil no Centro Social Mitangue-Nhiri

Driéli da Silva Vieira ..................................................................................................................................................................179

Cultura infantil e espaço rural: o caso das crianças de Marialva

Poliana Ferreira de Oliveira.....................................................................................................................................................192

Cultura quilombola no Paraná: uma experiência em sala de aula

Aurineide Maria Moreno; Rosana Steinke ...........................................................................................................................200

Cultura indígena, escola e teoria outsider: um estudo sobre a estigmatização do indígena numa escola de Maringá

Verônica Yurika Mori ................................................................................................................................................................210

Sociologia na EJA: da teoria à prática

Fabiana Virgínio da Rocha .....................................................................................................................................................222

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A PRÁTICA ESCOLAR COMO NOVO APRENDIZADO AO CIENTISTA SOCIAL

Eliane Aparecida de Oliveira

PPG – Ciências Sociais/UEM

Resumo: Por se tratar de uma disciplina que retorna aos bancos escolares depois de algumas idas e vindas históricas, a transposição da Sociologia como disciplina acadêmica para o campo do ensino médio pede algumas observações e ou reflexões. As batalhas travadas nesse campo, vão muito alem da visão simplista de que o ensino de Sociologia sofre de um academicismo em seu saber, e que muitas vezes isso é transportado para as salas de aulas sem o critério avaliativo necessário. A proposta desse trabalho é apresentar algumas dificuldades enfrentadas pelos professores de ensino médio no ensino dessa disciplina bem como, sistematizar algumas práticas observadas nas escolas, visando contribuir para a legitimação e fortalecimento desse campo aos cientistas sociais.

Palavras-chave: Ensino médio; Legitimação; Professor de Sociologia.

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A PRÁTICA ESCOLAR COMO NOVO APRENDIZADO AO CIENTISTA SOCIAL

INTRODUÇÃO

O retorno da disciplina de Sociologia ao ensino médio pode ser percebido como a possibilidade de se analisar a escola com um olhar que é próprio do cientista social, o de desnaturalizar práticas arraigadas. Assim, pensar o professor de Sociologia no ensino médio, é também formular estratégias para a atuação num campo que se descortina como “novo” ao cientista social na atualidade educacional brasileira. Quando falamos professor de Sociologia, estamos falando de profissionais formados nas Ciências Sociais, ou seja, conhecedor das três ciências que compõem essa área de formação, a saber: Sociologia, Antropologia e Ciência Política, embora essa não seja uma realidade que vigora nos sistemas de ensino no país.

Provavelmente esta não seja uma tarefa das mais fáceis, pois ainda é perceptível o distanciamento que há entre a academia e o ensino básico, se refletindo na ausência dos cientistas sociais nas pesquisas relacionadas ao ensino médio. Ileizi Silva (2007) destaca essa relação conflituosa, diz:

“(...) não será fácil definir orientações para a formação de professores de sociologia diante de tantas formas de conceber a relação das ciências sociais com a educação básica. Há uma clara tentação de para preservar o campo das ciências sociais nos distanciarmos dessa tarefa dupla: intervir na elaboração das políticas educacionais, pensar a sociologia como disciplina escolar e na formação dos professores para o ensino médio.”

Esse preciosismo em relação ao campo é próprio da legitimação do mesmo, e não é uma exclusividade dos professores de sociologia, Bourdieu (1989; 2004) nos diz que é esta disputa (não somente de espaço) dentro de um campo, que o legitima como tal, sendo uma pratica comum a todos. Dentro dessa premissa, ele vai nos falar da construção do “habitus” do agente, nos remetendo ao capital simbólico e cultural do professor de sociologia, que muitas vezes sai da academia cheio de concepções que fogem a realidade social na qual esta inserida a escola pública. Mas, na medida em que a efetivação da Lei nº 11.684 de 2008 da LDB que incluiu a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio se concretiza, uma realidade se sobrepõe a essa tensão, tornando clara a necessidade de se pensar essa emergência que é a formação, e ate porque não dizer, a capacitação do professor de Sociologia para o ensino médio. Em defesa a Sociologia como disciplina Silva (2007) argumenta que:

“Pensar na sociologia no currículo de ensino médio, nos obriga a pensar antes de mais nada, na educação brasileira, no papel do ensino médio e na formatação de seus currículos. É uma tarefa fundamental para os cientistas sociais abrigados nos departamentos das universidades públicas.”

Dessa forma, as dificuldades que se apresentam ao retorno da Sociologia a grade

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ELIANE APARECIDA DE OLIVEIRA

curricular do ensino médio, enfrenta vários problemas, iniciando dentro da academia e perpassando as políticas educacionais do Estado. Se nos ativer a enumerar essas políticas e os vários discursos, contra e a favor, o fôlego irá se esgotar, mas o assunto não. A Sociologia vive uma instabilidade e a precariedade na construção de uma identidade própria enquanto disciplina, o que a torna vulnerável num campo onde as relações e práticas parecem estáveis e ou legitimamente hierarquizadas. Cabendo ao cientista social, não somente se aperceber enquanto professor da disciplina, mas também detentor do olhar apurado da realidade social e política na qual a escola está inserida.

Uma análise em relação aos professores de sociologia no ensino médio não será possível sem antes compreendermos que a profissão de professor esta sempre em questionamento, uma relação conflituosa entre a percepção da importância desse profissional e a capacidade do mesmo em relação a uma pretensa postura que se deve ter dentro e fora das salas de aulas. Questiona-se inclusive sua formação e as avaliações de capacidade no decorrer de sua atuação (MORAIS e NEVES, 2005). Dessa forma, as dificuldades que alguns professores de sociologia do ensino médio enfrentam em campo e que são atribuídas a uma deficiência na sua formação, não é uma exclusividade do curso de Ciências Sociais, e a justificativa que nenhuma licenciatura prepara de fato, apenas a prática é que molda esse profissional não traz benefícios para a legitimação desse profissional e, tão pouco, da disciplina.

É preciso pensar que no período que compreende o ano de 1942 a 1982, a sociologia esteve fora do currículo escolar ou foi opcional no ensino de segundo grau, dessa forma não houve uma preocupação com a constituição e ou elaboração de propostas metodológicas ou livros didáticos. (MORAES, 2003). Por conta dessa indeterminação nos materiais didáticos a sociologia tem sua legitimidade questionada em maior grau e sua reinserção no ensino médio fica assim, muito mais complicada. Muito se fala sobre como essa falta de sistematização e ferramentas metodológicas contribui para a instabilidade dessa disciplina e consecutivamente, de seus professores, que saem da academia com uma formação deficitária, pois o curso de formação, ainda não tem uma preocupação instituída com a prática de ensino, muito necessária para que haja a legitimação da mesma. Segundo MORAES (2003), “(...) quando os professores clamam por “conteúdos programáticos mínimos” de sociologia ou material didático adequado, acabam por manifestar uma formação deficiente para o exercício do magistério em nível médio.”.

Acreditamos assim que neste caso específico – da sociologia - a relação formação acadêmica e prática nas salas de aulas estão intimamente ligadas no sentido que, sendo este um campo de ação que é retomado, os cursos acadêmicos nem sempre estão moldados para essa nova realidade, pois se passou muito tempo formando bacharéis, ficando a licenciatura em segundo plano. Nesse sentido, muitas disciplinas de suma importância para a percepção da realidade escolar, em alguns casos ficam delegadas a uma grade opcional e não obrigatória dentro dos

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cursos. Assim, pensar o professor de sociologia no ensino médio, passa necessariamente em pensar sua formação e, desta maneira, também a formatação de alguns cursos superiores que formam esses profissionais.

Alem disso, perceber que, para que haja a fixação da sociologia como disciplina no ensino médio, será necessário que haja a estabilidade desse novo agente, ou seja, que haja a preocupação em formar professores com identificação com o espaço escolar. Pois é dele que dependerá a forma como a instituição e a sociedade como um todo, enxergará a relevância da sociologia para a formação de um novo individuo social. Buscar construir uma consciência professoral no estudante das ciências sociais é uma ação necessária para a legitimação desse agente, uma vez que é preciso adentrar ao campo sabendo como agir para conseguir, não somente ser reconhecido como um produtor/transmissor de saberes, mas para conseguir construir um campo próprio para a sociologia.

Nas Orientações Curriculares (Brasil, 2006), o texto deixa claro o caráter de fragilidade da sociologia em comparação a outras disciplinas, considera que a sua historicidade é bem diversa, em relação às outras, com um tempo muito reduzido de efetividade na grade curricular da educação. Explicita a falta de sistematização dos conteúdos e teorias a serem ministradas, necessária para que a proposta inicial se concretize. Ainda, que a falta de consenso por parte dos agentes neste caso, também sinaliza para a carência de uma fala comum a todas as comunidades que defendem essa disciplina, dificultando a legitimidade e conquista de espaço. Assim, muito embora as batalhas a serem travadas pareçam infindáveis, questões que poderiam já ter sido superadas, continuam fortalecidas nesse campo, muito provavelmente devido à fragmentação relacionada à permanência da Sociologia nos currículos.

DIFICULDADES E ENFRENTAMENTOS

O discurso que justifica a presença da Sociologia no ensino médio já virou frase feita, cansativamente repetida – “formar o cidadão crítico”. Fugindo um pouco dessa premissa, caímos em outra interpretação que também já se tornou recorrente, embora não abarque toda a dinâmica desse tema, versa sobre o papel da disciplina na “formação do aluno para o exercício da cidadania”. Porem, por mais repetido que seja essa fala, ela não dimensiona a dificuldade para a realização desse projeto educacional. Mesmo porque, a transposição dos conteúdos da formação superior para o ensino médio, delimita ou reduz o campo de ação do professor.

Mais do que pensar como professor, os novos profissionais precisam se vir como professores “de sociologia”, ou seja, com a capacidade de formar esse senso crítico e possuidores de estratégias para que esse projeto se realize na prática. Penso que a graduação ainda esta formatada sem a preocupação legítima de formar professores dessa disciplina para o ensino médio, causando assim, certo desconforto neste agente que adentra um campo totalmente

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desconhecido, munido muito mais de ideologias do que senso prático. Seu habitus assimilado na universidade lhe instrumenta para observação e análise, mas muito pouco para a prática de ensino. Assim, muitos ao se depararem com a grade curricular nas escolas e de posse de uma análise crítica acadêmica, se sentem compelidos a fazer “a diferença”, mesmo sabendo que terão pela frente regras e normas quase que intransponíveis para quem busca se legitimar num novo campo.

Dessa forma, nos deparamos com a questão: o quê/como lecionar sociologia para o ensino médio, sem se desvincular ou se perder dos saberes advindo da academia, buscando uma formatação de aula que fuja ao academicista cumprindo, ao mesmo tempo, com uma grade estabelecida dentro dos parâmetros institucionais?

Cabe aqui uma análise, diante da intermitência histórica da disciplina, a valorização pelo saber acadêmico, pode ser considerado como uma necessidade da academicização dos conteúdos como uma possível forma de busca pela legitimação. Ileizi Silva (2007) já nos alerta sobre as mudanças que ocorrem nos conteúdos ao transportar uma ciência para o campo de disciplina escolar, diz:

“Assim, a constituição de uma ciência em disciplina escolar se dá pelos processos de contextualização, em que se produzem os conhecimentos e os discursos da disciplina no campo cientifico/acadêmico, e pelos processos de recontextualização, reelaboração dos conhecimentos/textos/discursos nos órgãos oficiais do Estado e destes pras escolas. Nesse processo há deslocamentos de textos/discursos, alguns selecionados em detrimentos de outros, reformulando-os a partir de questões práticas, que são definidas nas lutas e nos conflitos de interesses presentes no campo da recontextualização.” (pag. 406).

Pensar essa questão servirá para medir uma inconsistência que permeia a disciplina e também o profissional, pois o “se tornar” um professor de sociologia muitas vezes entra em conflito com o ser “sociólogo”. Bourdieu, em entrevista a Menga Lüdke (1991) já fazia uma crítica aos sociólogos que, segundo ele, abriram mão da sociologia da educação, passando esta especialidade para os educadores, bem como teriam abandonado o tema “educação” para os pedagogos.

O que vale observar é se esse antagonismo e ou divisão se faz de fato necessário, pois o espaço escolar é um campo fértil para o cientista social, onde o conhecimento das três ciências que compõe sua formação (Sociologia, Antropologia, Ciência Política) é totalmente aplicável, não somente dentro das salas de aulas, bem como em seu entorno, passando pelas relações de poder/política dos setores administrativos chegando à forma de atuação junto aos alunos. Ou seja, mais do que ser “professor” de Sociologia, pensamos ser necessário que esse profissional se veja, antes de tudo, como cientista social atuando num espaço público.

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A PRÁTICA ESCOLAR COMO NOVO APRENDIZADO AO CIENTISTA SOCIAL

ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO

Com a reinserção da sociologia no ensino médio, o Governo do Paraná através da Secretaria de Estado da Educação sistematizou as Diretrizes Curriculares da Educação básica de Sociologia buscando uma inclusão que iria além das exigências usuais de uma disciplina escolar. Para escapar da metodologia da pedagogia tradicional, a proposta do ensino de Sociologia visa contribuir para instigar uma perspectiva crítica aos temas sociológicos trabalhados em sala de aula. O método a ser utilizado é o da pedagogia histórico - crítica, onde o educando é chamado a contrapor sua realidade com a dinâmica histórica.

Para que essa perspectiva de atuação se realize o cientista social consciente do modelo a ser seguido, em algumas situações, irá se perceber dentro de outro ideal pedagógico na escola onde atua, pois mesmo que as orientações governamentais apontem a direção, o espaço escolar é regido por profissionais que também passam por uma adequação estrutural, existindo assim, uma relação de estranhamento entre o que é pressuposto e o que é possível realizar na prática.

Quando se impõe algo sem bases para que isso seja assimilado, corre-se o risco de dar espaço para múltiplas interpretações sobre o que se propõe. O retorno da sociologia ao ensino médio sofre desse mal. Com pouco material especifico para ser trabalhada, contando com livros didáticos que atendem de formas diferentes aos conteúdos propostos, ou seja, falta unicidade. Com um numero reduzido de professores formados na área que possa suprir a carência do campo e sem políticas públicas que auxilie essa reinserção, a sociologia ainda vivencia momentos de crise em busca de sua legitimação. Ou seja, a reinserção dessa disciplina não significou necessariamente, a introdução dos seus conteúdos, que viria a corroborar com a sua especificidade. Em contrapartida, o cientista social tem a escola como seu campo de atuação primeira, dessa forma, mais que legitimar a sociologia enquanto disciplina necessária e exercer um direito adquirido, esse novo agente, terá que defender seu campo de ação, necessário não somente a sua sobrevivência, mas também a confirmação da relevância dessa disciplina fora dos bancos acadêmicos.

Podemos assim pontuar alguns atos e ou estratégias que visam contribuir para que essa legitimação se realize, dentre elas elencamos:

- A criação, efetivação e reconhecimento de um coletivo que defenda os interesses desses profissionais diante das políticas governamentais;

- A consciência política e de classe deve ser valorizada, desde os bancos acadêmicos, neste caso passando, necessariamente, pelo maior reconhecimento das licenciaturas;

- A produção e a divulgação de materiais de apoio aos livros didáticos, visando facilitar a atuação do professor em sala de aula;

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ELIANE APARECIDA DE OLIVEIRA

- A reformulação na composição da grade de alguns cursos que formam os cientistas sociais, onde não se delegue disciplinas de imperiosa importância para o professor de sociologia no ensino médio a categoria de optativas. Disciplinas essas que ajudam a pensar tanto a educação quando o adolescente, que são o foco de trabalho desse novo profissional;

- A expansão de projetos como o PIBID, pois esses possibilitam a aproximação dos acadêmicos com a realidade escolar;

Algumas ações coletivas já estão sendo tomadas, mesmo que timidamente, faltando ainda um engajamento maior dos envolvidos e ou interessados, sejam eles acadêmicos, professores do ensino médio e universidade.

Em suma, acreditamos que um estreitamento nas relações entre academia e escola, irá não só contribuir para a formação dos cientistas sociais, como também facilitar sua atuação no espaço escolar. Fazendo que esse se reconheça como detentor de saberes que lhe são próprios dentro de um campo que carece desse conhecimento e da atuação engajada e dinâmica. A Sociologia nasce com a modernidade, os cientistas sociais são os detentores de um saber que observa e atua numa realidade que se constrói a todo o momento, pois sabemos que a sociedade não é estática, esta em constante transformação e a escola é uma instituição presente e ativa dentro dessa realidade. Ainda, esses novos profissionais surgem com uma formação que tende a ser diferente, moderna, tecnológica, devido a essa nova emergência educacional que só se tornou realidade enquanto lei em 2008. Dessa forma, compreender a instituição escolar como campo legítimo de atuação do cientista social é legitimar a disciplina e também fortalecer o profissional das Ciências Sociais.

CONCLUSÃO

Diante do que foi aqui exposto e, mesmo considerando que este é um tema que precisa ser mais bem estudado, o que se buscou mostrar é que a sociologia enquanto disciplina, para se legitimar no campo de saber especifico que é o ensino médio, deverá ainda enfrentar muitos “dragões”. Repensar este novo campo de atuação se faz necessário desde a academia, pois deverá existir uma preocupação em relação à forma de atuação prática nesse espaço. Os conflitos próprios desse campo, a disputa por reconhecimento e legitimidade esta presente como em qualquer outro, porem o que se percebe é que em muitas situações, o agente que esta adentrando nesse meio, ainda não conta com ferramentas próprias para essa disputa.

Numa outra área do saber, provavelmente essa deficiência seria assimilada com o tempo sem maiores transtornos, no caso da sociologia essa deficiência de adequação irá agir diretamente na legitimação e também na permanência da mesma como disciplina obrigatória no ensino médio. Visto que é perceptível o quanto ela ainda é rejeitada e combatida, tanto em

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A PRÁTICA ESCOLAR COMO NOVO APRENDIZADO AO CIENTISTA SOCIAL

algumas escolas quanto nas políticas governamentais, essas ações são observadas na redução de hora aula quanto na distribuição semanal de acordo com os interesses da escola, duas aulas divididas entre segunda e sexta feira, dificultando a continuidade do trabalho do professor.

Lembrando ainda que mesmo sendo uma disciplina que já esteve nos currículos escolares, à geração de professores que esta nas escolas, na maioria, não teve contato com ela. Afinal foram anos de afastamento, de fragmentação dos saberes, substituído por disciplinas que também não se estabeleceram, vindo a fortalecer a ideia de que o retorno da mesma seria apenas para complicar a já atribulada grade curricular do ensino médio. Não conseguem precisar a relevância do retorno dessa disciplina, também porque, esses agentes que estão no campo há mais tempo, não sabem ou não (re) conhecem as emergências teóricas próprias da Sociologia, sua especificidade. Sendo mais fácil negar algo que não se conhece, com base em pressupostos que ainda restam no imaginário escolar, advindos das disciplinas que a substituíram nas inúmeras mudanças que ocorreram na educação brasileira no decorrer da história.

A fragilidade na formatação da Sociologia como disciplina leva também a pressupostos que visam à defesa do campo por parte dos agentes que já estão estabelecidos. Assim, buscam não abrir mão do espaço conquistado e, a falta de legitimidade da Sociologia, desconsiderada em sua necessidade e relevância, irá contribuir para que não se consiga a conquista e permanência nesse campo, pois ao professor de Sociologia faltam ferramentas para sua defesa. Outro problema que ainda ronda a sociologia no ensino médio, diz respeito à forma de transmissão do conteúdo e as práticas de ensino. Existe uma tendência à reprodução para o nível médio dos conteúdos e práticas próprias do ensino acadêmico, desconsiderando assim a formatação diferenciada dos estudantes universitários em relação aos do ensino médio (SOUZA. 2008).

Para que haja a fixação da sociologia como disciplina no ensino médio, será necessário que haja a estabilidade desse novo agente, ou seja, que haja a preocupação em formar professores com identificação com o espaço escolar. Pois é dele que dependerá a forma como a instituição e a sociedade como um todo, enxergará a relevância da sociologia para a formação de um novo individuo social, necessário para uma nova concepção de sociedade. Buscar construir uma consciência professoral no estudante das ciências sociais é uma ação necessária para a legitimação desse agente, uma vez que é preciso adentrar ao campo sabendo como agir para conseguir, não somente ser reconhecido como um produtor/transmissor de saberes, mas para conseguir construir um campo próprio para a sociologia.

Considerando todas essas relevâncias, podemos dizer que vários são os fatores que contribuem para que a sociologia ainda esteja fragilizada no ensino médio, necessitando que as comunidades que defendem essa temática, promovam debates para que se enxerguem as deficiências e, em conjunto, se busque meios para que ela se firme nesse campo, não correndo o risco de, novamente, ser colocada fora dos currículos como disciplina obrigatória. É necessária uma mobilização maior tanto da academia quanto dos profissionais da área.

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ELIANE APARECIDA DE OLIVEIRA

O interesse pela estabilização da sociologia na educação de nível médio, não diz respeito apenas aos licenciados e ou licenciando, mas também aos alunos do bacharelado, pois é despertando a curiosidade nos educandos que teremos um número maior de indivíduos interessados nos temas relacionados a Ciências Sociais, sejam eles sociológicos, antropológicos e ou políticos. Assim, para que haja a tão esperada legitimidade da Sociologia, há uma necessidade de que o curso, como um todo, trabalhe a favor. Não visando apenas à formação de novos indivíduos para suprir uma emergência da sociedade, mas para que se criem pessoas conscientes, com um mínimo de saber crítico e com capacidade de análises sociais.

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A PRÁTICA ESCOLAR COMO NOVO APRENDIZADO AO CIENTISTA SOCIAL

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ALGUMAS REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DO CAIPIRA E SUA IDENTIDADE NO CINEMA BRASILEIRO

Leni Virgínia Costa Nickel; Rosana Steinke

1 Professora SEED - PR (programa PDE História UEM)

2 Professora Orientadora. Docente do DHI (Departamento de História - UEM);Licenciada em História e Mestre em Arquitetura e Urbanismo (USP);Pesquisadora do CEAPAC(Centro de Estudos das Artes e do Patrimônio Cultural-UEM)

Resumo: O povo brasileiro é formado por diversos grupos humanos que constituem as identidades do país. Para desenvolvermos este artigo escolhemos dentre estes grupos a figura do caipira por apresentar fortes traços do mundo rural em contraposição ao mundo citadino. Para tanto faremos a análise de três filmes (Chofer de Praça, Dois Filhos de Francisco e Tapete Vermelho), procurando observar de que forma o hibridismo cultural da identidade caipira (num embate com as identidades nacionais), é retratada nas películas, ressaltando a influência da sociedade capitalista no processo de construção e reconstrução desta identidade. O referencial teórico em que pautamos este trabalho está situado no campo dos Estudos Culturais, cujos conceitos de cultura, identidade, sistemas de significação e poder, fundamentaram o desenvolvimento do mesmo. Ao trabalhar com a linguagem fílmica a partir da eleição das três películas já citadas buscaremos também discutir a temática das culturas e identidades e como isso pode ser usado no ensino em Ciências Humanas.

Palavras-chave: Cultura e idendidade; Cinema nacional; Ensino de jovens e adultos.

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ALGUMAS REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DO CAIPIRA E SUA IDENTIDADE NO CINEMA BRASILEIRO

Este artigo busca fazer alguns apontamentos sobre a questão do ensino na área das ciências humanas e discutir o uso do cinema em sala de aula como instrumento para se tratar o tema das identidades culturais. Evidentemente, se trata de um assunto e tema bastante amplos e que não se esgotam brevemente. Talvez a maior dificuldade seja não incorrer em riscos como a busca uma identificação da singularidade cultural ou o discurso ufanista ou patriótico. Buscamos, de forma breve, discutir, a partir da eleição de alguns autores que julgamos apropriado, a questão da identidade e depois apresentar os três filmes eleitos para discussão.

No contato com os profissionais do ensino fundamental e médio se percebe que, adentrando o século XXI, cada vez mais o professor se vê diante da convivência dos alunos e dele próprio com o uso da internet, celulares e redes sociais, a veiculação de vídeoclips, músicas, filmes, entre tantas outras formas de interação.

Conforme aponta Ciampi:

Desde o final do século XX enfrentamos um novo desafio: o volume de informações produzido em função das novas tecnologias. A questão não está no acúmulo destes conhecimentos, mas na capacidade de selecionar, na formação do aluno, conceitos básicos e desenvolver uma prática pedagógica consistente que permita à criança e ao jovem serem capazes de pesquiar informações substantivaas para resolver um problema; de analisar, entre as possíveis soluções, a(s) mais adequada(s) ao seu contexto, e de utilizar diferentes tecnologias relativas às áreas de atuação. (CIAMPI, 2011, p.52-53).

A revolução tecnológica, como aponta Ciampi, cria novas formas de socialização, novos processos de produção e até mesmo novas formas de identidade individual e coletiva (CIAMPI, 2011, p. 53). Ortiz assinala sobre a necessidade de se falar em cultura e identidade no plural (ORTIZ, 1994). Entender as questões referentes à “identidade cultural” na atualidade tem sido uma das grandes preocupações das ciências sociais, e tem se tornado tema cada vez mais freqüente nas discussões entre os estudiosos contemporâneos.

No mundo moderno, o sistema de representação que chamamos culturas nacionais, se constituía em uma das principais fontes de identidade cultural. Historicamente, o nacionalismo/cultura nacional teria surgido entre os séculos XVIII e XIX na Europa, quando os grandes países buscavam uma coesão interna baseado em valores culturais que seriam próprios de cada grupo. Assim sendo, a língua, a religião, os símbolos, as tradições, os valores éticos, seriam responsáveis por caracterizar o sentimento de pertencimento a uma determinada região, conferindo aos sujeitos que ali vivia uma dita identidade.

Neste sentido, o sentimento de pertencimento passa a ser visto como uma narrativa construída a partir de mitos fundadores, da história que nega as diferenças e cria laços que Stuart Hall chama de “comunidades imaginadas”, referindo-se a construção das identidades das nações. Hall, ao mapear as possíveis conseqüências do processo de globalização em face

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das identidades nacionais, aponta três caminhos. O primeiro seriam as identidades nacionais que na sua visão estão se desintegrando, como resultado do crescimento da homogeneização cultural e do ‘pós-moderno global’; em seguida o autor chama atenção para o fato de que as identidades nacionais e outras identidades ‘locais’ ou particularistas estarem sendo reforçadas pela resistência à globalização; por último, o autor frisa que as identidades nacionais estão em declínio, mas novas identidades – híbridas – estão tomando seu lugar’ (HALL, 2000, p. 69).

Essa questão se modifica na contemporaneidade, pautada nas transformações ocorridas no interior da sociedade, em que o fenômeno da globalização promoveu um processo de fragmentação articulada do mundo e da recomposição de suas partes. Segundo Canclini, o processo descrito como globalização está ligado à passagem de identidades modernas, territoriais e monolinguísticas, para identidades pós-modernas, que seriam transterritoriais e multilinguísticas. (CANCLINI, 1999, p. 59).

Portanto, na sociedade capitalista contemporânea, não existe mais uma identidade que seja fixa, imutável, cartesiana, baseada em uma essência inata, uma identidade unificada e sem conflitos. Esse fenômeno (globalização) produz novos sujeitos com identidades voláteis, fragmentadas, contraditórias e que estão constantemente sendo formadas, assim como a própria história desses sujeitos. Segundo Hall, a identidade, em vez de algo inato a nós, acabado e definitivo, é, antes um processo que vem do exterior aquilo que nos falta.

[...] a identidade é realmente algo formado, ao longo do tempo, através de processos inconscientes, e não algo inato, existente na consciência no momento do nascimento. Existe sempre algo ‘imaginário’ ou fantasiado sobre sua unidade. Ela permanece sempre incompleta, esta sempre ‏’em processo’, sempre sendo formada. Assim em vez de falar da identidade como uma coisa acabada, deveríamos falar e vê-la como um processo em andamento. (HALL, 2000, p.38-39).

Com relação à fragmentação do sujeito, Bhabha diz que

[...] nós nos encontramos em um momento de trânsito onde espaço e tempo se cruzam para produzir figuras complexas cujas identidades são extremamente fragmentadas e em um constante processo de construção, e exatamente por isso, levando a certa sensação de desorientação e algumas vezes até mesmo de exclusão. (BHABHA, 1994. p.2).

A partir da leitura de Bhabha e Hall podemos dizer que vivemos um tempo de rupturas e heterogeneidade, de segmentações e comunicações fluidas. No entanto, em meio a toda essa heterogeneidade os seres humanos encontram códigos que os unificam. Porém, esses códigos são cada vez menos os de etnia, de classe ou nação. O que vemos hoje são comunidades internacionais.

As identidades, concebidas como estabelecidas e estáveis, estão naufragando nos rochedos de uma diferenciação que prolifera. Por todo o globo, os processos

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ALGUMAS REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DO CAIPIRA E SUA IDENTIDADE NO CINEMA BRASILEIRO

das chamadas migrações livres e forçadas estão mudando de composição, diversificando as culturas e pluralizando as identidades culturais dos antigos Estados-nação dominantes, das antigas potências imperiais, e, de fato, do próprio globo. Os fluxos não regulados de povos e culturas são tão amplos e irrefreáveis quanto os fluxos patrocinados do capital e da tecnologia. (HALL, 2003, p. 44-45).

É cada vez mais freqüente encontrarmos pessoas que por escolha ou por necessidade tenham que viver longe de sua terra natal e, consequentemente, longe de suas referências culturais. É frequente encontrar alunos nesta situação, principalmente descendentes nipônicos, nas salas de aula do interior do Paraná, em cidades como Maringá, onde o material didático produzido a partir da discussão deste artigo, foi usado. Segundo Hall, esse movimento migratório está diversificando as culturas e pluralizando as identidades culturais não só das antigas nações como de todo o mundo.

Quando a circulação cada vez mais livre e freqüente de pessoas, capitais e mensagens nos relaciona cotidianamente com muitas culturas, nossa identidade já não pode ser definida pela associação exclusiva com uma comunidade nacional. O objeto de estudo não deve ser, então, apenas a diferença, mas também a hibridização. (HALL, 2000, p.166)

Segundo Canclini, o hibridismo é um “processo sociocultural no qual estruturas ou práticas discretas, que existiam de forma separada, se combinam para gerar novas estruturas, objetos e práticas” (CANCLINI, 1997, p.19).

A combinação de práticas culturais diferentes cria então essas novas possibilidades, que se multiplicam, uma vez que os grandes centros oferecem o contato com a heterogeneidade, e a interação com tal diversidade afeta, inevitavelmente, a construção de novas redes de valores e significados. No entanto, esse movimento de apropriação, criação, reterritorialização deve ser entendido com cautela. O olhar do observador não pode se restringir às superposições que são feitas, mas precisa considerar que essas relações fazem parte e também constroem relações de poder e questões de identidade. As perguntas sobre identidade, soberania nacional não desaparecem com o hibridismo, pelo contrário. Permanecem os conflitos e repensa-se a autonomia de cada cultura.

Stuart Hall, após sua própria experiência de jamaicano fora de sua terra de origem, discute como as diferenças que entram em contato após o processo da diáspora, do deslocamento, acabam por contribuir às reflexões sobre o hibridismo. Na situação da diáspora, as identidades se tornam múltiplas. (HALL, 2003, p.27).

(...) o que a experiência da diáspora causa a nossos modelos de identidade cultural? Como podemos conceber ou imaginar a identidade, a diferença e o pertencimento, após a diáspora? Já que a ‘identidade cultural’ carrega consigo tantos de unidade essencial, unicidade primordial, indivisibilidade e mesmice, como deveram

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‘pensar’ as identidades inscritas nas relações de poder, construídas pela diferença, e disjuntura? (HALL, 2003, p.28).

Um termo que tem sido utilizado para caracterizar as culturas cada vez mais mistas e diásporicas dessas comunidades é ‘hibridismo’. Contudo, seu sentido tem sido comumente mal interpretado. Hibridismo não é uma referencia à composição racial mista de uma população. (...) O hibridismo não se refere a indivíduos híbridos, que podem ser contrastados com os ‘tradicionais’ e ‘modernos’ como sujeitos plenamente formados. Trata-se de um processo de tradição cultural, agonístico uma vez que nunca se completa, mas que permanece em sua indecibilidade. (HALL, 2003, p.71).

Percebemos em Hall que o conceito de hibridização, levando em conta o viés da diáspora sob o qual o autor trabalha, é pensado dentro da lógica cultural da tradição e que se torna proeminente em sociedades multiculturais.

Com relação à identidade cultural brasileira, esse hibridismo se faz presente, não em relação à composição racial mista de sua população, mas pelo fato de agregar parte das diferentes culturas que existem no interior do país interior. Para isso é preciso levar em consideração a importância da linguagem, e do discurso, pois, estes contribuem sobremaneira na construção, fixação e reprodução da igualdade/desigualdade.

Neste sentido, a família e a escola são espaços onde circulam linguagens e discursos que acabam privilegiando algumas identidades, em detrimento de outras. Com relação ao papel da escola nesse processo de construção e reconstrução das identidades, devemos refletir sobre a afirmação de Silva de que “não é preciso dizer que a educação institucionalizada e o currículo – oficial ou não – estão, por sua vez, no centro do processo de formação de identidade”. Para este autor, “o currículo, como espaço de significação, está estreitamente vinculado ao processo de formação de identidades sociais.” (SILVA, 1999, p. 27).

Na verdade, tanto os conteúdos pedagógicos como aqueles que circulam na voz cotidiana dos professores, dos alunos, dos funcionários e de todos aqueles que transitam pelo ambiente escolar, em muito contribuem para a construção de identidades variadas sejam elas de nacionalidade, etnia, gênero, entre outros.

CAIPIRA: IDENTIDADE E CULTURA NO CINEMA

As origens históricas desse grupo social, remonta aos bandeirantes (séc.XVII) como foram chamados os primeiros homens a adentrarem em terras brasileiras, em busca de metais preciosos e de aldeias indígenas, cuja escravização abastecia os mercados, carentes de mão-de-obra. Tornaram-se, esses homens, pequenos agricultores quando da necessidade de produção de alimentos para subsistência, fixando-se nas terras dos sertões paulistas, e iniciando a formação de pequenas vilas e aldeias que, mais tarde, se tornariam grandes cidades.

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ALGUMAS REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DO CAIPIRA E SUA IDENTIDADE NO CINEMA BRASILEIRO

Portanto, o caipira paulista surge na nossa história como fruto do encontro cultural entre portugueses e índios (mais tarde negros africanos) e, aos poucos foram moldando uma vivência alicerçada na produção familiar essencialmente de subsistência e nas relações de compadrio; praticavam diversas manifestações culturais como a culinária, as modas de viola, as danças, a contação de causos, as adivinhas e mentiras. Estabeleceram ainda uma relação entre a vida religiosa e suas crendices.

Segundo Cândido, o bandeirismo trouxe consigo, entre tantas outras questões, um determinado tipo de sociabilidade, que influênciou os tipos de ajustamento do grupo ao meio, com a fusão entre a herança portuguesa e a do primitivo habitante da terra (CÂNDIDO, 1975, p.36). Isso significou que a prática da coleta, da caça e da lavoura de subsistência supriu suas necessidades, tornando totalmente desnecessária a produção de excedentes para o mercado, favorecendo seu isolamento. Segundo Neto, esse isolamento facilitou a estagnação da língua, mantendo-se, pelo Brasil adentro, verdadeiras ilhas culturais (NETO, 1976, p.188).

Esses agrupamentos, por sua vez, apresentam uma forma de sociabilidade baseada no princípio do trabalho e da ajuda solidária que vão estabelecer não só as regras do trabalho coletivo, como as redes de afeto e sociabilidade, o que poderia nos levar a questionar o dito “isolamento” do caipira.

O isolamento a que nos referimos não é da sociedade urbana propriamente dita, até porque o caipira ia à cidade comprar aquilo que não produzia. Ele também participava ativamente das missas e das festas religiosas. O caipira se isolou, na verdade, da forma como os homens citadinos estão organizados para a produção, uma vez que a produção de excedente e o acúmulo de riquezas não faziam parte do seu modo de vida.

A IDENTIDADE CULTURAL BRASILEIRA, A LINGUAGEM FÍLMICA E O ENSINO DE HISTÓRIA.

Vivemos numa sociedade imagética, isto é um fato inquestionável. Dessa forma, nosso aluno sofre uma grande influência das diferentes formas de imagens que transitam em seu cotidiano, dentre elas, o cinema, como já foi assinalado.

O uso da linguagem fílmica, como recurso didático, é importante pois é um documento que apresenta não só os vestígios do passado, como também mensagens individuas e múltiplas que impregnadas de valores culturais, sociais e ideológicos, nos permitem indagá-lo. No entanto, devemos tomar o cuidado de não usarmos o filme como único documento, devemos sempre compará-lo a outra fonte, a bem da verdade sempre que possível devemos trabalhar com mais de uma fonte independente de que tipo ela seja, pois dessa forma fica mais fácil o entendimento do próprio filme e o processo de construção do conhecimento.

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O objeto de nosso estudo no projeto foi abordar como a identidade cultural do caipira aparece na linguagem fílmica, na segunda metade do século XX e início do século XXI ? Para desenvolvermos esse projeto elencamos três películas que abordam essa temática: “Chofer de Praça”, “2 filhos de Francisco” e “Tapete Vermelho”. Neste artigo, especificamente, buscaremos situar a temática do caipira e o filme do Mazzaropi, citado aqui.

Ainda em meados de 1940, ocorreram inúmeras manifestações culturais da sociedade urbana que passaram a contar com uma significativa participação dos caipiras recém-chegados do interior. No entanto, prevalece a ideia da cidade que acolhe a tudo e a todos, mas que impõe um determinado tipo de cultura e de comportamento, renegando a dita desqualificada e atrasada cultura caipira. Ou seja, a cultura urbana passa a ser adotada em substituição à cultura caipira, impondo, a partir de “um projeto civilizador”, traços culturais estranhos às tradições caipiras como o consumo de bens tipicamente urbanos, a individualização do trabalho (em detrimento ao trabalho de caráter coletivo), novas relações homem/natureza, novas redes de sociabilidade, o descarte de determinadas crenças tradicionais, enfim, um processo de incorporação (atabalhoada, injusta e desigual) do caipira à vida urbana (CÂNDIDO, 2001; QUEIROZ, 1978).

Podemos dizer, também, que o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa que ocorreu nesse período – rádio, revistas ilustradas, televisão e cinema – muito contribuíram para a concretização desse projeto. No entanto, criaram uma situação ambígua, pois, se por um lado tornaram-se instrumentos de manipulação e de padronização de hábitos e estilos de vida, por outro tornaram-se um importante veículo na elaboração e contraposição de diferentes visões de sociedade e de mundo.

E é nesse contexto que Amácio Mazzaropi (1912-1981), ator popular conhecido por suas participações em espetáculos circenses e em programas radiofônicos, no cinema dá vida à figura do caipira que, embora não se adapte ao progresso da cidade grande, serve de intérprete a um Brasil que ao mesmo tempo em que afirmava a consolidação da modernização e da industrialização nas cidades, deixava vir à tona todas as suas contradições. O famoso caipira criado por Mazzaropi recriou no cinema o legado, que na década de 20 colocou em debate nacional a realidade de um Brasil rural por meio da discussão de Monteiro Lobato, entre outros. Soma-se a essa questão, a aliança entre duas linguagens - a literatura e o cinema -, as discussões que ocorriam naquele momento (1950-60) em torno da criação de uma identidade brasileira no interior da história cultural, política e social do país.

O Jeca Tatu de Mazzaropi por meio do riso foi sutilmente denunciando a situação do homem rural brasileiro. Com sua simplicidade e matreirice expressou algumas das mais importantes contradições de um país que afirmava a consolidação da modernização e da industrialização nas cidades rechaçando os traços de um país com “natural vocação agrária” e “identidade caipira”. Como assinalam alguns autores:

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ALGUMAS REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DO CAIPIRA E SUA IDENTIDADE NO CINEMA BRASILEIRO

Símbolo da resistência cultural de um povo, ajustado à maneira desse povo inserir-se na economia moderna, a personagem de Mazzaropi passou a ser identificado com seu próprio criador, fenômeno característico da cultura de massa que o cineasta soube explorar muito bem. (BARSALINI, 2002; p. 109).

De fato, o cinema empreendido por Mazzaropi era bastante popular desde a década de 60. Deve-se lembrar que embora tivéssemos a presença da Cinédia ná década e 30 e a Atlântida na década de 40, no Rio de Janeiro, bem como a companhia cinematográfica Vera Cruz em 1949, em São Paulo, antecedendo este período, estamos nos referindo a um cinema que circulava nos mais variados lugares do Brasil, desde as capitais até as pequenas cidades e vilarejos. Não existia nem mão-de-obra especializada na nova técnica, nem energia elétrica nas cidades brasileiras, sendo que na maioria das vezes eram os motores dos automóveis que produziam energia para que a exibição das películas de fato acontecesse.

O trabalho de Mazzaropi no cinema pode ser dividido em três fases distintas: a primeira (de 1951 a 1956) que engloba o período do cinema paulista em que participou de filmes na Vera Cruz, na Brasil Filmes e na Fama Filmes; a segunda (de 1956 a 1958) no Rio de Janeiro, em parceria com a Cinedistri; e a terceira (de 1958 a 1980) quando criou sua própria produtora: a PAM Filmes.

As produções de Mazzaropi podem ser classificadas em duas fases que revelam momentos históricos distintos. A primeira, que vai de 1951 a 1958 é intitulada fase urbana e abrange temas, cenário e locações citadinas. Nela vemos o caipira caracterizado mais como um operário acaipirado que como um caipira de fato, um sitiante. Já a segunda fase é inaugurada pelo filme “Jeca Tatu” (1959) e é chamada0 de fase rural, pois trata predominantemente de temas, cenários e locações rurais. É neste momento que ocorre a tipificação integral do caipira, o Jeca, com cavanhaque, costeletas, botinas, chapéu de palha, cachimbo, roupas remendadas com retalhos, lenço no pescoço e guaiaca (BARSALINI, 2002).

É no filme “Jeca Tatu” que se consolidam as características de seu personagem. O Jeca passa e ter um andar desengonçado, um espontâneo e peculiar jeito de falar, um gesticular estereotipado; um tradicional cavanhaque e um inseparável cachimbo. Consolidando essas características, o que Mazzaropi fazia era manter não só os elementos constitutivos de sua identidade, mas também a essência da mensagem aos segmentos populares. Essência essa que contesta simbolicamente as estruturas sociais da exclusão, alterando o invólucro da manifestação cultural mudando sua aparência, conforme o público ou o momento histórico: as modificações pelas quais passa seu Jeca efetivam a prática mesma da resistência cultural (BARSALINI, 2002, p.84).

Percebe-se que ao longo da carreira o ladino Jeca, criado por Mazzaropi aborda questões cruciais como a migração do campo para a cidade, a mudança do homem da roça para operariado, o racismo, a questão que diferenciava o matuto do homem citadino em relação a alimentação,

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vestes, comportamente social, forma de expressao verbal, entre outras questões. À isto se atribui também a empatia com o público, que se identificava com tal personagem.

No final dos anos 50, a simplicidade do caipira de Mazzaropi foi reconhecida como marca da essência brasileira. A nacionalidade passou a ser sinônimo do rural, do puro, daquilo que deve ser mantido. O caipira de Mazzaropi (consciente ou não) foi um agente social que, convivendo com situações impostas pelo capitalismo, rejeitou seus fundamentos e, de uma forma ou outra, venceu sem corromper seus valores tradicionais de honestidade e solidariedade.

Todavia, vale lembrar que se o caipira foi reconhecido como sinônimo de brasilidade é porque alguma coisa mudou substancialmente: o caipira já podia constituir-se em ficção. A industrialização brasileira já se mostrava como ideia dominante e como fato, assim como a urbanização galopante das cidades, o Jeca não mais deporia contra a imagem do país. (TOLENTINO, 2001, p. 22)

O sucesso de Mazzaropi como ator e empresário de cinema ocorreu em função da sua habilidade em construir com o público uma relação de cumplicidade mediante suas referências culturais, especialmente do interior. Seus filmes expõem o estranhamento cultural entre o homem do campo e o citadino e constituem precioso registro da agressiva urbanização brasileira com profundas consequências na memória social.

Em “Chofer de Praça”, primeiro filme produzido por Amácio Mazzaropi, em 1958, acompanhamos a história de Zacarias, um caipira que vai para cidade grande com sua mulher, à procura de trabalho para poder pagar os estudos do filho na faculdade de Medicina. Com muita dificuldade consegue um emprego como chofer de táxi. Seus trejeitos que denotavam sua origem camponesa, aliado às suas desajeitadas tentativas de se tornar um homem citadino, o tornam motivo de piada na vizinhança, fazendo com seu filho sinta vergonha de ter pais “caipiras”.

A história de Zacarias atinge diretamente os pais daqueles jovens recém saídos do interior que, na película, se desdobravam para pagar o estudo do filho, que por sua vez já tem mais facilidade em assimilar a cultura paulistana.

A implementação pedagógica, aconteceu no CEEBJA- Professor Manoel Rodrigues da Silva, na cidade de Maringá – PR. Foi disponibilizado, num primeiro momento, o material didático produzido pela Professora PDE a toda a equipe pedagógica e professores das áreas de História, Sociologia, Filosofia, Arte, Geografia e Português, para que por meio de uma leitura prévia poudessem conhecer e contribuir com o projeto, visto que a implementação do mesmo objetiva também a tão almejada interdisciplinaridade. Esta implementação ocorreu ao longo do ano letivo de 2011. Foi ministrado um curso de 32 h/a a todos os alunos interessados e com matrícula ativa na escola

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Como estratégia inicial, foi promovido um debate, mediado pelo professor, sobre conceitos como cultura, nação, nacionalismo, identidade. Também foram abordados os temas região, caipira, poder, memória, patrimônio, tradição, trabalho, rural, urbano e cinema. Buscou-se fundamentar estes conceitos entre os professores por meio da discussões de artigos científicos, artigos jornalísticos, revistas especializadas, livros, entre outros.

Durante o debate foi importante estimular os educandos a expressarem, suas idéias e conhecimentos (mesmo que primários) acerca destes conceitos, seja através da oralidade, seja na forma de um pequeno texto.

Foi utilizado como material didático o Caderno Pedagógico, produzido pelo professor PDE, “EJA: refletindo sobre a identidade cultural brasileira através do cinema”. A explicitação deste tema ocorreu por meio da análise de três filmes, e atividades deles derivada. O primeiro filme trabalhado foi produzido no início da década de 1950, intitulado “Sai da Frente”, primeiro filme estrelado por Mazzoropi. Neste filme o personagem é caipira que vai à cidade e vive às voltas com seus traços de homem rural e ainda tem que lidar com o cotidiano de ser um trabalhador marginalizado urbano, conforme já foi apontado.

Para a discussão que queremos apontar aqui, é importante notar como é retratado no filme a forma simples e direta dos diálogos, hábitos e cultura do homem do campo, que se contrapõe ao homem citadino o que representa uma constante acentuada da época (final da década de 50) e que hoje ainda persiste.

Partindo dessa premissa, que pergunta podemos fazer a esse documento fílmico, que possibilite a nosso aluno investigar nosso objeto (o caipira)? Em sala de aula, além de uma discussão prévia sobre a questão da cultura e da identidade, feita a partir das referências colocadas na discussão inicial deste artigo, foi exibido o filme e depois foi feita uma discussão baseada em questões variadas, junto aos alunos. Buscou-se nesta discussão que os alunos apontassem qual é o tema central do filme, que tipo de lignugagem é possível observar (dramática, romântica, cômica, caricata, etc.). se existia uma relação do filme selecionado com o tema tratado na aula anteriormente, como identificar esta relação e como tais questoes se relacionam com a temática do caipira, como estas relações ficam explícitas no filme e quais os personagens que se enquadram em tais relações. Também foi discutido a relação dos personagens entre si, se estes são fictícios ou se parecem com pessoas conhecidas do nosso dia-a-dia, qual(is) a(s) concepção(ões) de home e de cultura é(são) retratada(s) no filme, se aparece a questão racial ou alguma discriminação social e como esta é tratada no filme e como estes temas abordados na ficção de Mazzaropi podem levar a uma reflexão crítica, se podemos levantar, a partir da mesma, outras questões referentes a sociedade na qua estamos inseridos atualmente.

Estas foram algumas das indagações feitas em sala de aula e que geraram discussões e interesse por parte da turma. Embora tal tema sempre sucite uma perene indagação, podemos

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LENI VIRGÍNIA COSTA NICKEL; ROSANA STEINKE

dizer o projeto foi bastante proveitoso e os alunos buscaram discutir o filme e como o mesmo buscou retratar não só as mudanças sociais e econômica ocorrida na época, como também o choque cultural entre o homem do campo e o citadino. Esse choque evidencia-se pela simplicidade dos personagens que vivem na roça e que ao chegarem à cidade grande defrontam-se com o fato de terem de abandonar tudo aquilo que lhes é seguro, como sua “comunidade estável em seus aspectos religiosos, lingüísticos e étnicos” (BUENO, 1999), por algo que lhes é total ou parcialmente desconhecido. A integração dessas duas culturas lhe confere uma nova identidade, nem melhor, nem pior apenas diferente.

Assim, a escolha do tema “Identidade Cultural Brasileira” como objeto de estudo, buscou reflexões sobre o processo de construção e reconstrução dessa identidade. Este tema assume maior relevância no caso da Educação de Jovens e Adultos, pois na maioria dos casos os educandos ficaram fora da escola durante muito tempo (às vezes fora do país) e tem muita dificuldade em compreender os conteúdos que abordam freqüentemente a questão da identidade, seja na discussão da formação histórica do povo brasileiro (diferentes etnias), seja no reconhecimento das diferenças em relação a outros grupos, etnias e nacionalidades ao longo da História.

Estas diferenças por sua vez não podem ser confundidas com a idéia do exótico ou do pitoresco, uma vez que o povo brasileiro é formado por diversos tipos humanos que constituem as identidades do país. Dentre estes grupos escolhemos especificamente a figura do caipira por retratar (ou apresentar) fortes traços do mundo rural em contra posição ao mundo citadino.

Outra questão de fundamental importância sobre este tema é que ele não pode ser pensado isoladamente, precisa ser articulado aos eixos da cultura, do trabalho e do poder, que norteiam as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, que afirmam:

[...] na aula de História, é indispensável ir além dos documentos escritos, trabalhando com os iconográficos, os registros orais, os testemunhos de história local, além de documentos contemporâneos, como: fotografia, cinema, quadrinhos, literatura e informática. Outro fator a ser observado é a identificação das especificidades do uso desses documentos, bem como entender a sua utilização para superar as meras ilustrações das aulas de História. Quanto à identificação do documento, a sugestão é determinar sua origem, natureza, autor ou autores, datação e pontos importantes do mesmo” (GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ, 2008, p 69).

Optamos, então, por trabalhar com a linguagem fílmica porque nos permite uma transposição didática e prática do saber histórico uma vez que possui mensagens individuais e múltiplas, traduzindo valores culturais, sociais, ideológicos e identitários de um indivíduo ou de uma sociedade.

Para Napolitano, “trabalhar com cinema em sala de aula é ajudar a escola a reencontrar a cultura ao mesmo tempo cotidiana e elevada, pois o cinema é o campo no qual a estética, o

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ALGUMAS REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DO CAIPIRA E SUA IDENTIDADE NO CINEMA BRASILEIRO

lazer, a ideologia e os valores sociais mais amplos são sistematizados numa mesma obra de arte” (NAPOLITANO, 2003: p.11-12).

Muitos filmes (brasileiros) contemporâneos são importantes instrumentos de estudo, pois refletem traços identitários de nossa nação que estão presentes em nosso imaginário cultural, além de enriquecê-la, reproduzindo, questionando e criando novas formulações culturais. Portanto, o uso da linguagem fílmica nas aulas de História, além de servir de fonte de pesquisa, de prazerosa analise posterior (reflexão com os alunos), ainda pode promover a construção do conhecimento histórico uma vez que passa pelo sensorial, emocional, intuitivo e por fim pelo racional, estabelecendo um “elo” entre o presente (momento da projeção) passado e futuro (objetos de reflexão).

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LENI VIRGÍNIA COSTA NICKEL; ROSANA STEINKE

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CRIANÇAS INDÍGENAS NA CIDADE: A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CENTRO SOCIAL MITANGUE-NHIRI

Driéli da Silva Vieira

Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Maringá;Antropóloga da Assindi – Associação Indigenista de Maringá

Resumo: Quando falamos em educação infantil nos remetemos à creches e pré-escolas voltadas para crianças brancas moradoras de centros urbanos cujo objetivo é educá-las e discipliná-las conformes os padrões burgueses da sociedade ocidental. No entanto, as cidades têm se tornado reduto de diferentes povos e este é o caso de Maringá que recebe indígenas das etnias Kaingang e Guarani ou para vender artesanato ou estudar nas universidades da cidade. A Associação Indigenista – ASSINDI abriga essas famílias dando o suporte necessário para se manterem no município, tais como, alimentação, moradia e, recentemente, um Centro Social Infantil Indígena a fim de que seus filhos permaneçam na associação enquanto seus pais vão às ruas vender artesanato ou estudar. No entanto, como organizar uma creche ou pré-escola para crianças de diferentes etnias sem ao menos conhecer o que é ser crianças para aquelas sociedades? Os profissionais da educação infantil estão aptos a atuar com essas crianças sem desconsiderar seus sinais culturais diacríticos? A fim de buscar respostas a essas questões é que fui contratada pela associação, para trazer a escola indígena para a cidade, para isto, até o momento, busquei compreender o que é ser criança para ambos grupos étnicos e quais métodos de ensino-aprendizagem são utilizados em sociedades indígenas. Destaco que esta proposta é um esboço de uma futura pesquisa que já fora colocada em prática, mas ainda é prematura.

Palavras-chave: Educação infantil; Crianças indígenas; Escola; Cidade.

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DRIÉLI DA SILVA VIEIRA

INTRODUÇÃO

As escolas de educação infantil atendem crianças de zero a seis anos, antes da idade escolar, e são instituições criadas pela sociedade burguesa em razão da urbanização e industrialização no intuito de “educar e disciplinar a criança dentro dos valores sociais dominantes” (AGULERA URQUIZA; BRAND e NASCIMENTO, 2007).

Diante dessas informações nós podemos nos colocar a pensar como é que a educação infantil chegou às aldeias indígenas sendo que ela surgiu num contexto de urbanização e industrialização? Para desvendarmos essa questão não podemos deixar de considerar alguns eventos relativos aos movimentos populares urbanos como o pós-guerra, o êxodo rural e a inserção da mulher no mercado de trabalho; proponho esse esclarecimento para que possamos demarcar as diferenças entre uma escola da educação infantil na cidade e outra em terra indígenas, ou seja, a educação infantil em dois contextos diferentes.

Neste sentido, a educação infantil oferecida nas cidades impõe-se como uma necessidade de assistência, em razão da ausência da mãe trabalhadora; já nas terras indígenas, mesmo com o advento da colonização que gerou grande perda territorial e, por sua vez, alterou todo o modelo econômico das aldeias, a educação das crianças continuou sendo de responsabilidade dos mais velhos e das mulheres que permaneceram aldeados.

Contudo, este artigo tem como objetivo apresentar-nos o caso, não de uma escola indígena de educação infantil na aldeia, mas sim na cidade e, de início já pudemos constatar uma semelhança entre essas instituições em contextos diferentes, o caráter assistencial.

Segundo Bujes (2002) outro fator relevante é que as sociedades indígenas, hoje, assim como a sociedade nacional, reconhece a importância da educação infantil e de suas propostas pedagógicas “a escola infantil e as propostas pedagógicas nela desenvolvidas teriam[...] um papel preponderante na superação da ignorância e da opressão que caracterizariam o nosso sistema social e constituiriam, por certo, um fator significativo na consecução da eqüidade” (id., p,13). Por conseguinte, dados do INEP/MEC/2005 apontam o aumento da oferta da educação indígena nos anos de 2003, 2004 e 2005 em 17,5%. Em 2003 foram matriculados 139.556 estudantes indígenas, em 2004 147.571 e em 2005 164.018, sendo que destes, 18.583 correspondente a 11,3% estavam matriculados na educação infantil1.

No entanto, os direitos das sociedades indígenas previstos na Constituição de 1988, que condiz com a manutenção das diferenças e da autonomia dos povos indígenas, não vêm sendo respeitados, afinal o Estado vem fomentando políticas, no caso, educacionais, externa a realidade cultural daquelas sociedades, isto é, a educação infantil oferecida às crianças indígenas

1 Editado pela Subsecretaria de Comunicação Institucional da Secretaria-Geral da Presidência da República. Nº 410 - Brasília, 15 de março de 2006.

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CRIANÇAS INDÍGENAS NA CIDADE: A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CENTRO SOCIAL MITANGUE-NHIRI

não se preocupa em compreender a cosmovisão daquelas, a sua socialização primária ou, antes disso, buscar o entendimento do que vem a ser criança para aqueles povos.

Diante desses fatos, pode- se afirmar que as políticas educacionais direcionadas às crianças indígenas são iguais às oferecidas às crianças da sociedade nacional, portanto, entende-se que para o Estado crianças são iguais em todo e qualquer contexto. É fato que existem aspectos universais concernetes ao mundo da criança como o ciclo biológio, segundo Nunes (id.) “a imitação constante (daquilo que as crianças vêem acontecer na vida dos adultos) e a ocorrência de brincadeiras que são praticadas por crianças de todos os lugares e de todas as culturas, como, por exemplo, a brincadeira de casinha” (p. 247).

CRIANÇA INDÍGENA E A ESCOLA

Conforme nos aponta Agulera Urquiza; Brand e Nascimento (2007), o contexto de socialização primária da criança indígena é de bricolage, um espaço de organização socio-temporal diferente: uma outra lógica, outro locus de saber [...] (id., p. 03). Segundo relatos de professoras Guarani, coletados por estes mesmos autores, a educação da criança indígena é feita através da oralidade, das práticas, exemplos e conselhos. Segundo essas professoras, até os seis anos de idade a educação da criança é ofertada pela família que, conforme fora apresentado anteriormente, fica a encargo dos mais velhos e das mulheres. Para estes educadores, criança é sinônimo de herdeiro que adquire um conhecimento que é passado de geração em geração.

Frente esta explicação, podemos estabelecer uma relação entre a fala dos professores indígenas que podem ser os profissionais da educação ou também familiares responsáveis pela educação daquelas crianças com as reflexões teóricas de Benjamin (1985) Berger & Luckmann (1987) a respeito da importância da socialização primária da criança e das narrativas tradicionais a fim de que se possa garantir a sobrevivência de tradições de uma determinada cultura ao longo do processo de construção de identidades.

Segundo Benjamin (id.) através da oralidade é possível a preservação do vivido, das experiências coletivas e/ou individuais, da cultura de um povo; ele ainda destaca a relevância do papel da mulher e dos anciãos que são os transmissores de um conhecimento tradicional e responsáveis pela sua difusão de geração em geração.

Berger & Luckmann (id.) enfatizam a importância da socialização primária das crianças, consequentemente, o conhecimento adquirido pelas crianças dos seus familiares; segundo estes autores a socialização secundária é menos importante que a primária

[...] o tom da realidade do conhecimento interiorizado na socialização secundária é mais facilmente posto entre parênteses (isto é, o sentimento subjetivo de que estas interiorizações são reais é mais fugitivo). [...] é relativamente fácil anular a realidade das interiorizações secundárias. A criança vive quer queira quer não

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DRIÉLI DA SILVA VIEIRA

no mundo tal como é definido pelos pais, mas pode alegremente deixar atrás o mundo da aritmética logo que sai da aula. (1987. p. 190)

Diante da reflexão de Berger & Luckmann (id.) podemos nos indagar sobre o que acontece com as crianças que são inseridas no sistema escolar na infância e que são, consequentemente, distanciados do modelo de educação tradicional ensinado pelos seus familiares? Segundo estes autores, a mudança no tipo de socialização primária destas crianças prejudica a sedimentação da sua realidade cultural e promove um diálogo intercultural que ela ( a criança) ainda não está preparada para enfrentar.

Agulera Urquiza, Brand e Nascimento (id.), embasados nos conceitos propostos por Barth (2000) e Tassinari (2001) de fronteiras, consideram a escola (indígena ou formal) como um espaço de fronteira onde as crianças sofrem um deslocamento em vários níveis, tais como, no aspecto geográfico (pois trata-se de um outro espaço e que é limitado), no social (pois as relações interpessoais com a família é marcada pela total falta de regras diferentemente daquele espaço) e no simbólico (pois a escola, de início, representa uma ruptura com a cosmovisão da criança por estar fora do imaginário e cotidiano dela) (AGULERA URQUIZA; BRAND e NASCIMENTO, s/a, p. 05).

Portanto, se a criança ainda não assimilou o seu pertencimento étnico-cultural ela está preparada para transitar entre fronteiras e participar deste processo de “negociação” entre culturas distintas?

Até o momento, baseado nos autores citados, acredito que não, porém, as crianças indígenas que são objeto da presente pesquisa não têm alternativa a não ser sofrer esse abrupto deslocamento e conviver entre dois mundos distintos afinal, a cidade já é uma realidade.

A PEDAGOGIA INDÍGENA

Na perspectiva da pedagogia indígena, a criança aprende experimentando, vivendo o cotidiano da aldeia e, principalmente, convivendo com os mais velhos tendo em vista que o grupo familiar oferece a liberdade e autonomia necessárias à criança para ela experimentar. Conforme Nunes (2002) essa liberdade engloba “acesso aos diferentes lugares e às diferentes pessoas, às várias atividades domésticas, educacionais e rituais [...] Essa aparente desordem ou ordem vivida de outro modo, imerso num espírito lúdico, espontâneo e sem compromisso estaria no cerne de todo o processo educacional indígena” (p. 71 e 72).

Enfim, liberdade, autonomia, permissividade, experimentação e participação fazem parte do ensino-aprendizagem dessas crianças e também da aquisição de responsabilidades que, em sociedades indígenas, tem início muito cedo.

Clarice Cohn (2002) se dedicou a vida das crianças Xikrin e constatou que entre eles a

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criança têm a “possibilidade de ver tudo”, do cotidiano aos rituais (exceto aqueles que oferecem riscos a elas). Segundo esta autora “O processo de aprendizagem (e o coração é o lugar entre os Xikrin) parece consistir em ir aperfeiçoando (tornando fortes) o processo de ver e ouvir” (id., p. 142).

Segundo Velanga e Venere (2008) crianças da etnia Oro Waram Xijein participam dos momentos em que todos se ocupam dos afazeres domésticos, mas nada lhes é exigido acima de suas forças físicas e capacidade. Ajudam, à sua maneira, nas atividades da roça, da pesca, da caça, da limpeza do terreiro e ajudam a cuidar dos irmãos menores bem como de

outras crianças, buscam água, lavam os utensílios, ajudam a carregar lenha, a fazer o fogo e a cozinhar. Diante disso, observa-se que essas crianças aprendem brincando, experimentando de modo a se prepararem para a vida adulta.

Nos estudos de Schaden (1974) referente aos Guarani, o autor identifca uma caracterísitica do grupo étnico que para este momento é muito importante para compreendermos o que é e como é ser criança entre aqueles. Esta carcterística é “o respeito pela personalidade humana e a noção de que este se desenvolve livre e independente em cada individuo...” (id., p. 59), deste modo, fica evidente o contexto no qual a criança cresce, isto é, num ambiente de liberdade, autonomia e independência perante o mundo dos adultos.

Diante disso, observa-se que o processo educativo indígena está longe de pautar-se na repressão, diferente do nosso sistema de ensino que, parafraseando Foucault (1977), tem como objetivo criar “corpos dóceis”; portanto, mais uma vez, fica evidente os pincípios básicos da pedagogia indígena, liberdade, autonomia e experimentação.

A REALIDADE DOS INDÍGENAS GUARANI E KAINGANG NA ASSINDI

Ainda nos dias atuais, as sociedades indígenas sofrem as consequências dos processos de colonização que acarretaram, especialmente, a perda territorial alterando assim a sua economia, ou de maneira geral, seu modo de vida, forçando-os a irem rumo às cidades a fim de alcançarem melhores condições de vida.

Assim sendo, os indígenas que habitam as cidades saem de suas aldeias em busca de trabalho e neste contexto, as escolas de educação infantil têm a mesma função tanto para a sociedade nacional como para aqueles indígenas, o caráter assistencial, pois os pais dessas crianças indígenas, ao saírem para trabalhar precisam deixar seus filhos em algum lugar, haja vista que estão longe dos seus familiares que poderiam cumprir esse papel.

O caso da Assindi é semelhante, pois os Kaingang e Guarani que moram lá estão trabalhando ou estudando na cidade de Maringá, mas para compreendermos melhor esta

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DRIÉLI DA SILVA VIEIRA

situação farei um breve resumo da história da associação e seus objetivos.

O Município de Maringá, há décadas vem sendo constantemente visitado por grupos indígenas da etnia Kaingang, originários da Terra Indígena Ivaí, município de Manoel Ribas/PR, distante 180 quilômetros de Maringá e conta com uma população de 2.300 indivíduos.

Nesta conjuntura, no ano 2000 no município de Maringá, visando proporcionar melhores condições durante sua estadia no município, tendo em vista que estes dormiam nas ruas de Maringá e cidades da região como Marialva e Sarandi, mais precisamente nas rodoviárias destas, teve início um projeto de apoio a essas comunidades com a oferta de uma casa abrigo para sua permanência.

Figura 1: Frente do abrigo que acolhe os índios artesãos (Foto de Tabajara Marques).

No ano de 2003, a entidade diversificou seu atendimento aos indígenas, como resposta a nova demanda apresentada, ou seja, os indígenas estudantes universitários, aprovados em vestibular específico, conforme a Lei nº 13.134 de 18/04/2001, que prevê a obrigatoriedade da abertura de 3 (três) vagas para o ingresso de indígenas, através dos vestibulares nas universidades estaduais do Paraná com ampliação para 6 (seis) vagas, segundo a Lei nº 14.995 de 09/01/2006. Diante deste contexto, a entidade oferece apoio e moradia aos estudantes durante o período de graduação (cerca de 04 a 05 anos), assim como aos seus familiares, conforme a disponibilidade de vagas nas 08 residências destinadas a este público alvo, diferentemente dos indígenas artesãos que ficam alojados na casa abrigo. Com essa ampliação no atendimento, a

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associação passou a receber, além dos Kaingang, famílias Guarani.

Figura 2: Moradia dos estudantes (Foto de Tabajara Marques)

Foi implantado no ano de 2012, o serviço de atendimento às crianças, filhos de artesãos e estudantes, pelo Centro Social Infantil Indígena Mitangue-Nhiri no intuito de, no primeiro caso, tirar as crianças das ruas que acompanhavam seus pais na venda do artesanato e, no segundo, dar assistência aos filhos dos estudantes enquanto estes estavam na universidade e/ou realizando seus estágios.

É diante deste contexto que surgiu esta iniciativa de pesquisa, pois conversando com os estudantes indígenas que também são pais, ficou evidente a preocupação deles em relação a transmissão dos conhecimentos tradicionais de seu povo, que seriam repassados às crianças na fase primária de socialização pela qual elas estão passando. A partir destes depoimentos evidenciou-se a diferente dinâmica do tempo na aldeia e na cidade, sendo que no primeiro contexto os pais têm tempo de ouvir a criança, brincar com ela, contar histórias, etc, e na cidade eles têm que ir para universidade, fazer estágios, estudar em casa, fazer cursos de outra natureza como de informática por exemplo; por isso, o centro social Mitangue-Nhiri é tão importante para essas famílias. Abaixo segue uma foto da sala de aula da escola.

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Figura 3: Sala de aula do Centro Social Infantil Mitangue-Nhiri (Foto de Tabajara Marques).

O centro social conta com uma estagiária de pedagogia, uma merendeira, uma assistente social e mais recentemente, uma antropóloga (no caso, eu). Fazendo um estudo preliminar sobre essa instituição percebeu-se que trazer a escola indígena pra cidade é tarefa dificílima, até mesmo porque como foi observado anteriormente, a escola indígena se fundamenta em princípios bem diferentes de uma escola da sociedade ocidental, no entanto o que se pretende é trazer para o Mitangue-Nhiri as bases da educação indígena, isto é, liberdade, autonomia e experimentação, mas vocês leitores devem estar se questionando como isso será possível? De início, as “aulas” são realizadas mais extra-classe, ou seja, as crianças realizam atividades nos arredores da escola como, por exemplo, no parquinho, brincam na terra, sobem em árvores, aprendem a separar o lixo em ôrganico e reciclável; mas também não deixam de usar recursos tecnológicos como a televisão e o dvd, eles também tem acesso a brinquedos (carrinhos, bonecas, livros de pintura, massinha de modelar) além dos brinquedos pedagógicos. Abaixo segue uma foto do pátio da assindi, espaço de socialização não só dos alunos do centro social, mas também das famílias, e é onde está o parquinho.

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CRIANÇAS INDÍGENAS NA CIDADE: A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CENTRO SOCIAL MITANGUE-NHIRI

Figura 4: Pátio da Assindi (Foto de Tabajara Marques).

Atualmente, estamos elaborando atividades relacionadas ao meio ambiente como a confecção de uma composteira a fim de que produzamos adubo que será, posteriormente, utilizado na horta da Assindi. Acreditamos que esta seria uma maneira de, mesmo essas crianças morando nas cidades, não perderem o contato com a natureza e o prazer do lidar com a terra.

A alimentação é uma outra preocupação, pois os hábitos e a dieta alimentar são diferentes dos da sociedade envolvente. Sabe-se que a base alimentar das etnias Guarani e Kaingang é vegetal, basicamente de milho, mandioca, batata e frutas, mas isso não significa que eles não se alimentam de arroz e feijão, pelo contrário, eles gostam muito desses alimentos, acredito que até em função das cestas básicas que recebem de instituições como a Funai, prefeituras municipais e até igrejas. Enfim, os alimentos não são tão distintos dos da sociedade nacional, na verdade o que difere é o modo de preparo, o modo de comer. Conversando com a merendeira do centro social ela relatou que percebeu que as crianças gostam muito das comidas “secas”, sem caldo (farofa, mandioca frita, arroz); mas, os filhos dos estudantes (que moram na cidade) se adaptaram melhor a sua comida, diferentemente dos filhos dos artesão que vêm à cidade esporadicamente; para estes últimos a comida devem ser “insossa”, segundo a merendeira, com pouco sal e sem nenhum outro tempero. Por isso a alimentação é também uma preocupação, pois a intenção é fazer com que elas (as crianças) sintam-se em casa, provem sabores que os remeta a aldeia, ao seu povo; no entanto isso ainda é uma dificuldade, pois os alimentos da

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DRIÉLI DA SILVA VIEIRA

escola são fornecidos por um programa do SESC chamado Mesa Brasil2 e são, basicamente, berinjela, abobrinha, chuchu, batata, pimentão, mandioca, cenoura, pepino, couve-flor, banana, entre outros. Nota-se que vários alimentos desta lista não fazem parte da dieta habitual daquelas pessoas, por isso é necessário um trabalho de reeducação alimentar, deste modo, no que tange a alimentação, o objetivo do centro social é fazer pratos que resgatem a cultura alimentar indígena (Kaingang e Guarani), mas também complementar esta dieta com outros alimentos. Abaixo está a foto do carro do programa Mesa Brasil no dia da distribuição dos alimentos.

Figura 5: Carro do programa Mesa Brasil no dia de distribuição dos alimentos recebidos pelo centro social (Foto de Driéli Vieira).

Conversando com uma estudante Guarani de enfermagem e mãe de duas crianças que ficam na escola da associação, ela nos revelou que uma das filhas afirmou não ser índia, porque segundo ela, índio mora em casa de madeira e a casa dela não é de madeira. Uma outra estudante Guarani do curso de letras também disse que seu filho de três anos também afirmou não ser índio, mas ela logo enfatizou que o repreendeu dizendo que ele era índio sim! Ao mesmo tempo, a pedagoga da escola perguntou à criança do primeiro exemplo onde ela mais gostava de morar, se na aldeia ou na cidade, e a menina respondeu que prefere a aldeia. Percebem as consequências do deslocamento (aldeia/cidade) para essas crianças? Elas estão confusas quanto a sua identidade cultural, as fronteiras entre uma cultura e outra ainda não são bem definidas. Diante disso eu me pergunto se é possível sanar esse impacto sobre estas

2 O programa Mesa Barsil visa o combate a fome e ao desperdício de alimentos, para isto faz a coleta em restaurantes da cidade e repassa-os para as entidades cadastradas e também oferece cursos de capacitação aos profissionais responsáveis pelo manuseio destes alimentos a fim de que eles possam reaproveitá-los da melhor maneira possível.

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CRIANÇAS INDÍGENAS NA CIDADE: A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CENTRO SOCIAL MITANGUE-NHIRI

crianças e logo eu mesma respondo: Não! Esse impacto é forte tanto para os adultos e jovens como para as crianças, no entanto, para essas crianças parece ser um pouco mais difícil porque como foi levantado anteriormente, ela é privada de uma relação muito importante na sua formação, o contato com seus familiares, especialmente os avós, que são detentores de um extenso conhecimento tradicional; porém é possível sim amenizar, mas não sanar, esse impacto proveniente do deslocamento e o locus desse processo é o centro social, pois lá é que se dá a socialização primária daquelas crianças, haja vista que é lá que elas passam a maior parte do dia com a pedagoga.

Por fim, diante deste contexto eu encerro este ensaio com os seguintes questionamentos: Essa profissional está sendo preparada na universidade para lidar com esta situação? O tema da diversidade cultural está sendo tratado de modo eficaz dentro das universidades? A melhor alternativa seria a contratação de uma professora indígena? Essas são questões a serem pensadas futuramente, pois essa pesquisa ainda está em fase preliminar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste ensaio me propus a pensar se seria possível trazer o modelo de educação indígena para a cidade e para isto, utilizei-me do exemplo do Centro Social Infantil Indígena Mitangue-Nhiri. A fim de responder esse questionamento busquei compreender, em primeiro lugar, o que as sociedade indígenas, a princípio de uma maneira geral, entendem por ser criança e o seu papel naquelas sociedades. Posteriormente, procurei identificar os educadores daquelas crianças e entender o método de ensino-aprendizagem utilizados em comunidades indígenas.

Após ter absorvido essas informações constatei que crianças indígenas são indivíduos com autonomia e liberdade e têm os mais velhos da comunidade e os pais como professores e portanto, o deslocamento da aldeia pra cidade interfere completamente no processo de socialização primária destas crianças, pois estas perdem o contato com seus avós (principais educadores) e também porque seus pais trabalham e/ou estudam.

Desse modo, quase todo o tempo que as crianças teriam com os seus familiares como uma maneira de transmissão de conhecimento foi transferido para o ambiente escolar e o seu educador passou a ser a professora; no entanto eu me pergunto se esta pedagoga está sendo preparada na universidade para lidar com esta particularidade, pois como foi observado pouco acima, as políticas educacionais indígenas são falhas por considerar que crianças são iguais independente do contexto em que vivem.

Durante este ensaio observour-se que as crianças quando saem de suas aldeias transitam entre dois mundos diferentes, o que por sua vez, cria uma dificuldade de aceitação quanto ao seu pertencimento étnico e é justamente por isso que é tão importante profissionais capacitados em volta destas crianças.

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DRIÉLI DA SILVA VIEIRA

Enfim, esta é a proposta do Centro Social Infantil Mitangue-Nhiri, mas sabemos que esta não é uma tarefa fácil, pois este trabalho independe da Assindi, a responsabilidade está na formação dos profissionais responsáveis por socializar aquelas crianças e mais uma vez eu pergunto: A universidade forma professores capazes de compreender as particularidades culturais destes alunos? Acredito que este seja um longo caminho a ser percorrido, mas não podemos perder de vista que o primeiro passo já foi dado, afinal o ensino da história e cultura indígena nas séries iniciais e do ensino médio3 vem ganhando espaço no universo pedagógico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NUNES, Angela. No tempo e no espaço: brincadeiras das crianças A’uwe-Xavante. In: LOPES DA SILVA, Aracy. MACEDO, A.V. L. Da Silva. NUNES, Angela (orgs.). Crianças Indígenas – Ensaios Antropológicos. São Paulo: Global Editora, 2002.

3 Através da Lei 11.645 a partir de 2008.

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CRIANÇAS INDÍGENAS NA CIDADE: A EDUCAÇÃO INFANTIL NO CENTRO SOCIAL MITANGUE-NHIRI

SCHADEN, Egon. Aspectos Fundamentais da Cultura Guarani. São Paulo: Pedagógica/USP, 1974.

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CULTURA INFANTIL E ESPAÇO RURAL: O CASO DAS CRIANÇAS DE MARIALVA

Poliana Ferreira de Oliveira

Graduanda em Educação Física na Universidade Estadual de Maringá, monitora da disciplina Teorias do Lazer e professora na rede estadual de ensino do Paraná

Resumo: Este estudo caracteriza-se como qualitativo e de campo que utiliza técnicas etnográficas e, tem como objetivo principal, caracterizar os aspectos ludicos das culturas infantis no espaço rural do distrito de Santa Fé da cidade Marialva – PR. A pesquisa voltou-se para a visão sociológica e antropológica na relação entre infância, cultura infantil e espaço rural. Realizamos observações dentro do ônibus escolar da prefeitura e uma entrevista na Escola Rural Professor Gumercindo Lopes. A partir das observações no ônibus e em respostas na entrevista constatamos que é presente o lúdico entre as crianças e que se apropriam de tudo que é natural do espaço para brincar construindo suas culturas.Mas, com isolamento geográfico na distância de uma residência para a outra as atividades em grupo e coletivamente são restritas.

Palavras-chave:

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CULTURA INFANTIL E ESPAÇO RURAL: O CASO DAS CRIANÇAS DE MARIALVA

INTRODUÇÃO

Neste trabalho investigou-se as características da cultura infantil no espaço rural, tendo a Sociologia da Infância e a Antropologia como principais referenciais teóricos. Algumas tendências teóricas entendem a infância como uma fase de preparação para a vida adulta, outras como um período no qual a criança se desenvolve passando por diversas mudanças orgânicas para a consolidação maturacional. Contudo, atualmente encontramos diversos estudos no âmbito da sociologia da infância demonstrando que as crianças são agentes produtores de cultura e transformadores de suas próprias culturas.

Para a realização da investigação utilizamos a pesquisa qualitativa no âmbito sociológico da infância e do brincar e, também, pautada na visão da antropologia sobre o espaço rural. Segundo Minayo (2004), o estudo qualitativo visa incorporar a questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações e às estruturas sociais. As análises das experiências, significados e dos grupos sociais não devem ser consideradas como fenômenos isolados. Os estudos qualitativos devem ser realizados com contextualizações relacionadas aos aspectos históricos, sociais, culturais e estruturais. Para Molina Neto (2004), o termo qualitativo é utilizado para sustentar um conjunto de técnicas e significados que um grupo social dá a suas experiências cotidianas.

Este trabalho envolve também uma pesquisa de campo com a utilização da etnografia. A pesquisa bibliográfica voltou-se para as produções teóricas da Sociologia da Infância e da Antropologia, buscando a transdisciplinaridade na abordagem da relação entre culturas infantis e espaços rurais. Buscamos encontrar a ludicidade e todas as suas características no espaço rural, sabendo que a cultura rural tem diminuído devido à expansão do êxodo rural. A opção por uma pesquisa qualitativa, de cunho etnográfico, está relacionada às características dos problemas propostos neste estudo. Ou seja, nós queríamos compreender a cultura lúdica infantil na zona rural.

Para Magnani (2002, p.12) “Inúmeros são os estudos e as abordagens sobre os rumos e as consequências do processo de urbanização em curso, principalmente das grandes metrópoles contemporâneas”. Partindo desse princípio, há um público menos conhecido e menos estudado que são os habitantes do espaço rural, dentre eles destacamos o segmento infantil.

E para se compreender a infância, Müller e Morelli (2001, p. 6), colocam que: “[...] é necessário contextualizá-la, vinculá-la, portanto, a aspectos da realidade existente (...) encontrando no meio no qual está inserida e condicionada, possibilidades de enriquecimento ou de empobrecimento da sua cultura”. Ainda segundo os autores (2001, p.33), “Constata-se a materialidade da construção das infâncias, entre outros aspectos, através da observação dos espaços que lhe são destinados”. Faz-se necessário, portanto, a observação do espaço para o entendimento da cultura infantil nas zonas rurais.

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POLIANA FERREIRA DE OLIVEIRA

O local onde foi realizada a pesquisa é a cidade de Marialva/PR, que no ano de 2007 contava com 30.017 habitantes, conforme dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Foi emancipada em 1952 com exitosa venda de lotes urbanos. Atualmente, tem um setor de desenvolvimento financeiro voltado para a prática da agricultura, especificamente para a produção de uva, contando ainda com acentuada população rural, o que torna o município um lugar propício para este estudo.

Sob o pensamento no senso comum, produzimos a ideia de que a criança é um ser em estado de preparação para a fase adulta, vista como inferior aos adultos, não sendo formadora de opinião ou de qualquer forma de criticidade. A Educação Física torna-se fundamental na medida em que é utilizada para a valorização da cultura infantil oferecendo à sociedade, de forma geral, possibilidades de ampliar o conhecimento sobre as crianças por meio das características da vida infantil em movimento e da opinião daquelas acerca do mundo.

Utilizamos na fase de campo o recurso fotográfico para melhor caracterizar o espaço rural e para captar momentos lúdicos das crianças em um ônibus escolar à medida que a pesquisa foi acontecendo, sabendo que o ônibus escolar é um espaço no qual a cultura lúdica infantil e as relações humanas entre as crianças se fazem presentes e são importantes para as observações adultas na produção do conhecimento sobre a infância.

A etnografia feita nos momentos de observação de determinados estudos tem como intenção captar a essência, os detalhes, os quais segundo Geertz (1986), devem ser descritos de forma densa e interpretativa, de modo que o olhar do leitor acerca do trabalho teórico capte a nítida descrição do momento, mas sob a ótica dos pesquisadores. Desta forma, foram realizadas observações no campo da cultura infantil no espaço rural da cidade de Marialva.

O ônibus escolar do município sai do almoxarifado e vai direto para a escola Gumercindo Lopes. Na volta, vai passando pelas estradas rurais deixando os alunos nas entradas de seus carreadores. Nós, por vinte e três vezes estivemos dentro do ônibus durante todo o percurso de ida e volta, que dura em média duas horas e meia. As observações foram registradas no diário de campo. As anotações foram feitas depois da saída do ônibus para que as crianças se sentissem mais a vontade em suas práticas lúdicas.

Conhecer a relação entre crianças, espaços rurais e a produção das culturas infantis foi o que nos motivou, pois há poucos estudos sobre o tema. Como comprova Damasceno e Bezerra (2004) em uma pesquisa a respeito dos trabalhos acadêmicos no âmbito rural entre os anos de 1981 a 1998 há cerca de cento e dois estudos na área rural enquanto em outras áreas foram feitos mais de oito mil trabalhos.

Existe uma insuficiência quanto aos estudos rurais, por isso quando se fala em pesquisar qualquer característica no que se diz respeito ao rural, se esbarra em várias dificuldades, dentre elas, a falta de material bibliográfico. As explicações sobre as poucas investigações no âmbito

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CULTURA INFANTIL E ESPAÇO RURAL: O CASO DAS CRIANÇAS DE MARIALVA

rural podem ser apoiadas na colocação de Damasceno e Bezerra (2004): “[...] a escassez de estudos na área é também fruto da dificuldade de financiamento de pesquisas e da relativa facilidade de desenvolvimento de pesquisas nas áreas urbanas onde o próprio pesquisador habita” (p. 5). Essa pesquisa foi um grande desafio para nós.

CULTURA

O conceito de cultura está repleto de diferentes ideias e concepções ao longo da história, devido à diversidade e aos sujeitos culturais que se manifestam de acordo com distintas religiões, gêneros, economias e sistemas políticos. A soma destes fatores reflete o modo como os sujeitos e grupos sociais pensam, gostam, se interessam e necessitam.

Por meio de estudos e discussões da antropologia social contemporânea e da história, trazemos alguns conceitos de cultura para o processo de discussão do presente trabalho. A cultura tem significado primeiro no determinismo biológico no século XVIIII.

Muita gente ainda acredita que os nórdicos são mais inteligentes do que os negros; que os alemães têm mais habilidade para a mecânica; que os judeus são avarentos e negociantes; que os norte-americanos são empreendedores e interesseiros; que os portugueses são muito trabalhadores e pouco inteligentes; que os japoneses são trabalhadores, traiçoeiros e cruéis; que os ciganos são nômades por instinto, e, finalmente que os brasileiros herdaram a preguiça dos negros, a imprevidência dos índios e a luxúria dos portugueses (LARAIA, 1986, p. 17).

Hoje, é possível desconsiderar esse conceito de cultura voltado para o aspecto biológico a partir de “[...] pesquisas científicas que revelam que o nível das aptidões mentais é quase o mesmo em todos os grupos étnicos” (LARAIA, 1986, p. 19). Assim, a conduta e comportamento humano não se referem à fisiologia e a graus de hereditariedade, mas sim a fatores culturais, históricos e sociais.

No século XVII, a cultura vai ganhando outra concepção. Segundo Chauí (2006), nesse período há uma espécie de modelo a ser seguido, onde um estágio menor de sua prática é determinante para avaliar se uma sociedade ainda é primitiva. Trata-se então de uma questão de evolução humana, mostrando que a cultura é o resultado de uma sociedade civilizada e suas práticas, tais como a filosofia, as ciências humanas e as artes, são consideradas padrões de progresso.

Esse conceito de cultura, profundamente político e ideológico, reaparece no final do século XIX, quando se constitui um ramo das ciências humanas, a antropologia, o estudo do homem. No inicio da constituição da antropologia, os antropólogos mantém o vinculo entre o conceito de cultura e o de evolução. Por tomar a noção de progresso como medida de cultura, a antropologia precisou de um padrão para medir a evolução ou o grau de progresso de uma cultura (CHAUÍ, 2006, p. 130).

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POLIANA FERREIRA DE OLIVEIRA

Esses padrões culturais são os modelos em países capitalistas, onde ainda hoje é possível encontrar esse tipo de conceito no senso comum de diversas pessoas e sociedades, como explica Chauí (2006, p. 130): “Isso implica não só um juízo de valor, mas também, sobretudo que se tomem os critérios da escrita, do mercado e do Estado como definidores da essência da cultura”. As civilizações que ainda não haviam alcançado a escrita, sem atividade de mercado e sem um estado governante eram consideradas pertencentes a um estágio atrasado, mas que poderia ser alcançado com o “desenvolvimento cultural”.

Não espanta, portanto, a quantidade de preconceitos e de ideologias montadas a partir dessa visão eurocêntrica da cultura, na qual o Ocidente capitalista-colonialista e imperialista se apresenta como modelo e finalidade universais (CHAUÍ, 2006, p. 131).

Posteriormente, Hegel e Marx tratam do tema, entendendo como cultura a própria história, já que esta é movimento e cultura também. Chauí (2006, p.108) afirma que: “Por esse prisma, o movimento da história-cultura é realizado pela luta das classes sociais para vencer formas de exploração econômica, opressão social e dominação política”, o que trouxe uma nova perspectiva de cultura para a época, mais especificamente a partir da metade do século XX.

Laraia (1986) aponta a consideração do antropólogo francês Lévi-Strauss sobre o surgimento de cultura por meio de uma norma, criada de forma consensual entre os homens. Esta primeira regra seria a proibição da prática do incesto, considerada até então uma prática natural entre os seres humanos de todas as sociedades. Sendo desconhecida pelos animais, essa regra que proíbe a relação sexual de uma mulher com determinadas categorias de homens, torna-se uma lei.

As visões montadas do Ocidente capitalista começam a dar espaço a expansão de ideias formadas por marxistas e outros teóricos que têm perspectivas diferentes sobre cultura, com o olhar voltado para as particularidades e têm sua abrangência em uma concepção de ordem e forma simbólica. Assim para Geertz (1989, p. 15):

O conceito de cultura que eu defendo, e cuja utilidade os ensaios abaixo tentam demonstrar, é essencialmente semiótico, Acreditando como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e a sua análise; portanto, não como uma ciência experimental em busca de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura do significado.

Neste sentido, a cultura é compreendida como um meio de dar sentido aos símbolos estabelecidos nas relações humanas. E, dentro das comunidades, as práticas, costumes, crenças e significações produzidas em condições históricas, o chamado multiculturalismo. Por isso, a cultura não é uma categoria, ou algo que pode ser determinado por condutas pessoais, instituições ou processos, ela é uma forma de contextualizar a realidade densamente.

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CULTURA INFANTIL E ESPAÇO RURAL: O CASO DAS CRIANÇAS DE MARIALVA

A CULTURA RURAL DE MARIALVA – SANTÁ FÉ

O distrito de Santa Fé da cidade de Marialva, onde está localizada a Escola Rural Municipal Professor Gumercindo Lopes conta com apenas duas ruas.

Uma rua que dá acesso a entrada da cidade onde está a maioria das residências populares que, no geral, tem o mesmo padrão de estrutura física e que são financiadas pelo governo municipal ou alguma outra empresa que tenha ligação com a prefeitura da cidade. Na mesma rua há uma pequena igreja evangélica de madeira, que só não dá impressão de ser abandonada pela existência da plaquinha de identificação ainda com pintura nova. No centro dessa rua há uma entrada para outra rua. Entre as duas ruas, em uma esquina, há uma mercearia que os moradores chamam de “venda” e algumas pessoas mais velhas ficam sentadas na escada olhando o movimento da cidade e conversando.

De dentro do ônibus, conseguimos observar algumas coisas que há na venda, como alguns salames pendurados em um varal que perpassa do início ao fim do balcão, uma mesa de sinuca que pelo menos durante as manhãs não é nem um pouco disputada. Em cima do balcão há um baleiro giratório que depois da aula fica rodeado de crianças.

Na segunda rua há uma igreja católica, um salão de festas da comunidade, um campo de futebol usado também nas aulas de educação física e finalmente, a escola.

A ESCOLA DE MARIALVA

A Escola Rural Professor Gumercindo Lopes conta hoje com noventa e seis alunos, sete professores e uma estagiaria. Cada sala de aula tem em média 15 estudantes.

No que diz respeito à estrutura física da escola, ela está muito bem estruturada, contando com um portão eletrônico na entrada e um refeitório. A seguir, ilustramos o espaço físico escolar com algumas imagens:

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POLIANA FERREIRA DE OLIVEIRA

Figura 1: Escola Rural Municipal Professor Gumercindo Lope

Há um corredor com três salas de aula do lado de fora e mais três salas no prédio ao lado. Pelas visitas à escola, foi possível notar que se mantêm o aspecto de higiene nos corredores e banheiros.

O gráfico que se refere sobre o grau de escolaridade dos pais das crianças no ensino infantil traz as seguintes informações:

Utilizando o referencial bibliográfico de Silva (2004, p. 14), quando afirma que: “[...] a escola não é algo importante para a vida e para o trabalho da população do campo, visto que a mesma está distante de sua realidade” os resultados do gráfico reafirmam que os pais por não terem a necessidade de um grau de escolaridade superior, param de estudar mais cedo.

Para Lacki (2004):

Os poucos conteúdos que poderiam ser úteis aos jovens rurais e ou, aos das classes populares localizados em bairros dos grandes centos urbanos, geralmente são ensinados de maneira excessivamente teórica, abstrata, fragmentada e desvinculada da vida e do trabalho, que se transforma em virtualmente inúteis (LACKI, 2004, p.1).

Realiza a seguinte reflexão Arroyo (1997):

Que tipo de escola é possível para os filhos das classes subalternas? A ilusão liberal parecia ter chegado a uma conclusão: sonhar que a escola possível para os filhos do povo pode ser a mesma que vinha servindo aos filhos das elites e das camadas médias. Na realidade, até as estatísticas oficiais vinham demonstrando que era uma utopia a ser extirpada do ideário pedagógico e social. Velha ilusão liberal e humanista sonhar com conteúdos, métodos e processos democráticos iguais para todos, independente da classe (ARROYO, 1997, p. 27-28).

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CULTURA INFANTIL E ESPAÇO RURAL: O CASO DAS CRIANÇAS DE MARIALVA

O tratamento democrático dentro das instituições de variadas classes sociais e de diferentes culturas, não tem se estabelecido de forma a contribuir com uma educação universal, pelo contrário, os resultados dos gráficos mostrados anteriormente denotam a fragilidade da LDB ( Lei de Diretrizes e Bases), trazendo como problemas escolares mais comuns, as reprovações, a evasão, a retenção e a defasagem de idade e série.

O descaso com a educação rural inicia-se na falta de apoio de políticas que intervenham no âmbito rural, segundo Damasceno e Bezerra (2004):

Não sendo um requisito para o trabalho rural e, nesse caso, indispensável para a reprodução do capital, a educação rural fica negligenciada. Já do ponto de vista da prioridade a programas de educação rural, sempre valeu aquela idéia que um dia Darcy Ribeiro defendeu a respeito da educação de adultos. Ou seja, considerando que os recursos estatais para as políticas públicas sempre foram bastante limitados, seria preferível investir recursos em áreas que a médio ou longo prazos apresentariam resultados positivos [...] (DAMASCENO; BEZERRA, 2004, p. 5).

É com essa problematização que trazemos a discussão acerca da educação rural na escola de Marialva e as dificuldades encontradas nela, como por exemplo, em relação à aprendizagem, conforme relatado pela diretora:

“As crianças têm muita dificuldade de aprendizado, de aprender a ler, escrever, se comunicar, mesmo nas salas que as turmas são pequenas a professora tem bastante trabalho, isso porque os pais não ajudam em casa, eles estão sempre trabalhando chegam tarde da uva e estão cansados ou então não sabem explicar” (Rose Lemuchi - Diretora).

Pensando na dificuldade de aprendizagem e no período em que as crianças não estão na escola, a coordenação da instituição escolar teve a ideia de formar um projeto no período da tarde. Sobre isso, perguntamos a diretora qual era a intenção principal do projeto:

O projeto, essa atividade complementar, a gente só iniciou porque as crianças estavam ficando muito tempo debaixo da parreira de uva com muito veneno, então nosso objetivo é estender para um, para o dia todo sabe, como atividade o dia todo, todos os dias e não só alguns dias na semana. Nós aqui da escola vimos a necessidade, porque às vezes o filhos vinham pra escola e já comentavam: ‘ai hoje vai passar veneno, hoje tem isso hoje tem aquilo’, entendeu então...Não tinham um medo, mas a nossa preocupação foi não ficar debaixo da parreira tanto tempo com esse veneno, e a gente sabe que a uva tem que passar veneno pra produzir, então a primeira ideia nossa de se montar esse projeto, essa atividade complementar, foi pra isso, pra tirar alguns dias das crianças do meio da uva” (Rose Lemuchi- Diretora).

Há uma grande preocupação da escola em relação à presença das crianças durante os momentos que os adultos passam veneno nas parreiras, pois enquanto alguns pais aplicam o veneno, as crianças ficam brincando embaixo das parreiras expostas ao agrotóxico.

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CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ: UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

Aurineide Maria Moreno; Rosana Steinke

1 Graduada em Pedagogia e História (UNIPAR);Professora PDE, Colégio Estadual Marechal Costa e Silva, Cidade Gaúcha, PR;Núcleo Regional de Educação de Cianorte.

2 Professora Orientadora. Docente do DHI (Departamento de História - UEM);Licenciada em História e Mestre em Arquitetura e Urbanismo (USP);Pesquisadora do CEAPAC(Centro de Estudos das Artes e do Patrimônio Cultural-UEM)

Resumo: Este artigo retrata o projeto elaborado junto ao PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional) e seu desenvolvimento junto aos professores e alunos buscando apontar seus resultados dentro da área de Ensino de História. Tal perspectiva faz parte de uma intervenção pedagógica, junto aos alunos da 8º série do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Marechal Costa e Silva – E.F.M., município de Cidade Gaúcha, Estado do Paraná. Como objetivo, busca compreender como os quilombos e a cultura quilombola pode ser tema de assunto abordado nas aulas de História e constituir patrimônio material e imaterial no Estado do Paraná. Especificamente buscou-se identificar as regiões quilombolas do Paraná e destacar a comunidade remanescente quilombola Manoel Ciríaco dos Santos, na região de Guaíra, como estudo de caso. Para tanto, foi realizado um levantamento histórico sobre a criação do mesmo e entrevistas com os moradores, além de registros diversos, bem como uma visita dos alunos ao referido local. O material proposto certamente não tem a pretensão de esgotar o assunto, no entanto busca uma reflexão sobre a formação dos quilombos rurais e urbanos como formas de organizações coletivas, discutindo a questão da identidade e da cultura dos quilombolas no Paraná e, por fim, apresentar um material didático para subsidiar o professor nas aulas do ensino fundamental a partir de uma discussão teórico-metodológica envolvendo questões de patrimônio cultural material e imaterial.

Palavras-chave: Cultura quilombola; História local; História e memória.

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22 a 26 de Outubro de 2012201

CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ: UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ

Como sabemos, os sujeitos da Educação Básica, crianças, jovens e adultos são, em geral, oriundos de zonas urbanas ou rurais, de diversas regiões e com diferentes origens étnicas e culturais. Tal pluraliade cultural também coloca em sala de aula a questão da diversidade. Há, então, a necessidade de se trabalhar do singular ao plurar.

Para atender essa demanda, em janeiro de 2003, o Governo Federal, por meio do Ministério da Educação, aprovou a Lei n. 10.639/03, que determina a inclusão do ensino da História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nas escolas de nível fundamental e médio no Brasil.

Já as Diretrizes confirmam a necessidade de um ensino de história local, apresentando uma proposta pedagógica de História para o Ensino Fundamental que parta das histórias locais e do Brasil para a História Geral possibilitando assim, a abordagem da História regional, o que atende a outra Lei de n. 13.381/01 que a torna obrigatória, no Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública Estadual, o trabalho com os conteúdos de História do Paraná (PARANÁ, 2008, p.45).

Considerando a importância de implementação das Leis citadas, e a necessidade de incluir os diferentes sujeitos históricos no contexto ensino-aprendizagem, este trabalho teve como justificativa o estudo da formação da identidade do povo paranaense, apresentando a ótica do negro no Estado, especificamente a comunidade remanescente de quilombos. Abordar a temática sobre os remanescentes de quilombos objetiva dar visibilidade à população negra e à sua contribuição para a formação de nosso patrimônio cultural.

Difundir os saberes dessas populações entre os educandos e professores é pertinente, como um meio de compreensão e de afirmação de nossa identidade que é pluricultural.

Tal proposta teve como resultado a elaboração de material didático-pedagógico oferecido aos alunos da Educação Básica das escolas públicas. O referente material procurou ter embasamento sobre publicações acerca do tema comunidades quilombolas paranaenses, com a intenção de dar suporte à prática pedagógica proposta, buscando sempre a diretriz de contribuir para que tenhamos uma escola cidadã, inclusiva e democrática.

Como objetivo geral buscou-se compreender como os quilombos e a cultura quilombola se constitui patrimônio material e imaterial, no Estado do Paraná. Como objetivo específico a preocupação foi redimensionar o conceito de quilombo, identificar as regiões quilombolas do Paraná e destacar a comunidade remanescente quilombola Manoel Ciríaco dos Santos. Para isso, foi feito um estudo/trabalho em grupo com alunos e professores sobre a formação dos quilombos rurais e urbanos, como formas de organizações coletivas sempre na tentativa de discutir a questão da identidade e da cultura dos quilombolas no Paraná.

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AURINEIDE MARIA MORENO; ROSANA STEINKE

O ENSINO DE HISTÓRIA E A QUESTÃO DOS QUILOMBOLAS NO PARANÁ

O ensino de história no Brasil sempre se utilizou de uma visão eurocêntrica, contando os grandes feitos das conquistas européias e desconsiderando milênios de História e conflitos de diferentes povos e civilizações que também contribuíram para o desenvolvimento da humanidade. Ante esse contexto, leis brasileiras vêm respaldar um ensino que procure observar outras frentes históricas. A Lei nº. 9.394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional embasou a implementação da Lei nº. 10.639/2003, que estabelece a obrigatoriedade no currículo oficial da Rede de Ensino da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Torna-se oportuno e agora obrigatório o estudo dessa parte da História do Brasil. O parecer CNE/CP 3/2004, do Conselho Nacional de Educação institui as “Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas”. O cumprimento dessas Diretrizes ficará a cargo dos estabelecimentos de ensino sob a orientação dos sistemas de ensino.

Ante essas leis, pergunta-se: quando isso entra em pauta de fato nos conteúdos educacionais? Sabe-se que é pouquíssimo trabalhado, por isso, este projeto, a partir deste problema geral, abordando a temática do Quilombo, busca responder questões como as seguintes: como se deu a formação dessa comunidade no Paraná? Os alunos reconhecem essa comunidade? Poderiam identificar membros desta comunidade no contexto de sala de aula? Essas comunidades são reconhecidas como patrimônio cultural?

Especificamente quanto à comunidade remanescente de Quilombola Manoel Ciríaco dos Santos, outras questões foram analisadas como, por exemplo, quanto à questão educacional: como ocorre a Educação nessa comunidade, quais são os desafios sociais, políticos e religiosos enfrentados por essa comunidade, quais são as iniciativas governamentais para sustentabilidade dessa comunidade?

Desde o período colonial, a denominação “quilombos” vem sendo sistematicamente usada, conceito que passou por várias interpretações. Primeiro, reporta-se ao conceito emitido pelo Conselho Ultramarino em 1740 “(...) toda habitação de negros fugidos, que passam de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados nem se achem pilões neles” (SHMITT et all, 2002, p.2). Assim, Quilombo é um termo que designou, por muito tempo, apenas acampamentos de escravos fugidos, tendo origem africana(REIS, 1996 apud MOURA, 2007).

Esta matriz histórica dos quilombos foi retomada para se referir às comunidades rurais negras no Brasil. O conceito de quilombo tem sido objeto de reflexão histórica e política desde os anos 70.

Nesse contexto temporal, o Movimento Negro denominou os quilombos como “pedaços da África no Brasil”, organização que tem encabeçado várias lutas para valorização da cultura

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CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ: UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

afro-brasileira e conquistado avanços governamentais e legislativos.

Atualmente, podem-se conceituar Quilombos Contemporâneos como comunidades negras rurais habitadas por descendentes de africanos escravizados, que mantêm laços de parentesco e vivem, em sua maioria, de culturas de subsistência, em terra doada, comprada ou ocupada secularmente pelo grupo (MOURA, 1999).

Quanto à formação de quilombos no Brasil se deu, principalmente, através da fuga de escravos das grandes fazendas açucareiras, no período colonial. Existiram muitos quilombos ao longo da nossa história, e entre eles Palmares é considerado um símbolo nacional da resistência negra. Sua comunidade era localizada na Serra da Barriga, em Alagoas, nasceu no início do século XVII e se manteve até 1695. Tinha uma complexa organização territorial, militar e administrativa.

Em relação à presença do negro no Paraná e a existência de comunidades quilombolas, de acordo com o Grupo de Trabalho Clóvis Moura, existem 91 comunidades quilombolas em 26 municípios paranaenses, 36 delas já tem certificação da Fundação Cultural Palmares que as reconhece como comunidades quilombolas. A criação do Grupo de Trabalho Clóvis Moura possibilitou o conhecimento dessas comunidades e a chegada nestes locais. (VIEIRA e GONÇALVES, 2007)

Dentre as 36 comunidades quilombolas já certificadas no Paraná, será dado destaque neste projeto de intervenção pedagógica a Comunidade Remanescente Quilombola Manoel Ciríaco dos Santos, localizada próxima à Cidade Gaúcha - PR.

Essa comunidade se localiza no município de Guairá. Seus membros fixaram-se no Paraná, em meados do século XX, no Patrimônio do Maracajú dos Gaúchos, no município de Guaíra. Depois de muito trabalhar para fazendeiros em Minas Gerais, passam por São Paulo em busca de real liberdade e finalmente chegam ao Paraná. A referência geográfica da comunidade é o rio Barigui.

Além disso, outro conceito que mobilizado nesta pesquisa é o de Patrimônio Material e Imaterial. Este é definido como:

As práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas e também os instrumentos, objetos, artefatos e lugares que lhe são associados e as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos que se reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural (UNESCO, apud R.G. BOTH, 2006, p.53).

Aquele, o Patrimônio Material, segundo o IPHAN, diz respeito ao conjunto de bens culturais classificados de acordo com sua natureza em arqueológico, paisagístico e etnográfico, histórico, belas artes e das artes aplicadas. É dividido em bens móveis e imóveis (BOTH, 2006, p.53).

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AURINEIDE MARIA MORENO; ROSANA STEINKE

É preciso ressaltar que o IPHAN (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) é responsável por preservar a diversidade das contribuições dos diferentes elementos que compõem a sociedade brasileira e seus ecossistemas. Sendo função dele, preservar, divulgar e fiscalizar os bens culturais brasileiros, como também assegurar a permanência e usufruto destes bens para a contemporânea e as futuras gerações (BOTH, 2006, p.53). Foi instituído a partir do Decreto-lei nº. 25, de 30 de novembro de 1937. É um órgão executivo da administração pública federal, com características muito peculiares, pois elabora a política, cria o instrumento do tombamento e executa a fiscalização dos bens salvaguardados. É nessa perspectiva que o quilombo em questão foi analisado, ou seja, como patrimônio cultural do Brasil.

Desse modo, se percebe que a visibilidade das comunidades negras rurais começou a ganhar maior expressão a partir da Constituição Federal de 1988, que nos artigos 215 e 216, promove e defende o patrimônio cultural brasileiro e, em especial no seu artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias garantiu a propriedade territorial desses moradores. Baseados na Lei, desde então os quilombolas lutam pela emissão dos títulos definitivos de suas terras.

Pensar o quilombola como Patrimônio Cultural é, além disso, valorizar a identidade e a cultura desta comunidade, abrindo caminho para o estudo das diversidades, como afirma Pelegrini e Funari:

A valorização da diversidade humana não pode ser desvencilhada da eclosão das reivindicações do reconhecimento do valor de identidades sociais e, portanto, da contestação dos conceitos de cultura monolítica e homogênea. Partindo do pressuposto de que as pessoas de um mesmo grupo compartilham valores, de que se sentem partícipes, formulou-se o conceito normativo de “pertencimento” (PELEGRINI E FUNARI, 2008, p. 23).

Assim, entendemos que quilombo não pertence somente ao passado escravista, tampouco se configura como comunidade isolada. Ao contrário, várias comunidades quilombolas mantêm-se vivas e atuantes, lutando tanto pelo direito de suas propriedades, como em manter vivas suas heranças culturais, que lhes são peculiares – como é o caso da Comunidade Manoel Ciríaco dos Santos.

A EXPERIÊNCIA DA TEMÁTICA EM SALA DE AULA

Este Projeto de Implementação Pedagógica, do Programa PDE do Estado do Paraná foi desenvolvido ao longo do ano letivo de 2010, no Colégio Estadual Marechal Costa e Silva- Ensino Fundamental e Médio, na Cidade Gaúcha - PR. Foi aplicado a alunos de 8ª série do Ensino Fundamental no período matutino, tendo duração de 32 horas, sendo revertido em 12 h/a. Nesta parte, discorre-se sobre o contexto e a intervenção do projeto.

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CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ: UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

O estudo de caso feito teve como intenção partir do geral ao particular, buscando contextualizar os conceitos sobre o tema abordado e o surgimento e permanência destes espaços no Brasil. Por fim, identificar as regiões quilombolas do Paraná e, mais especificamente, a comunidade remanescente quilombola Manoel Ciríaco do Santos, localizada na região de Guairá.

Foram feitas visitas à referida comunidade, coletando dados e registrando por meio de fotografias, com a devida anuência da população local, material esse incorporado no material didático – unidade temática elaborada ao fim deste projeto.

Com tal proposta, acredita-se atender as necessidades do PDE, visando a interação entre a pesquisa e o ensino de História, colaborando na discussão e elaboração de fontes de pesquisa para sala de aula. O que nos move é a posição, como professora na atualidade, de que ensinar História não se restringe a documentos escritos (Renovação Historiográfica), deve-se também introduzir fontes orais – os relatos dos moradores da comunidade, bem como documentos icnográficos (fotografias, imagens), objetos. Além disso, faz-se uso de outras linguagens como documentários, filmes e mídias em geral.

Vale lembrar que, em momento algum, ao trabalhar com as fontes o professor vai transformar o aluno em historiador, nem substituir o seu trabalho no processo ensino-aprendizagem.

Para o trabalho com fontes e documentos, lança-se mão das teorias das historiadoras Schmidt e Cainelli (2004), que apontam alguns encaminhamentos para esse trabalho. Também se buscou trazer para o ensino a discussão da presença dos quilombos e do valor cultural dos mesmos, ressaltando sua presença no Paraná. Para isso, como já foi citado anteriormente neste artigo, foi feito um histórico sobre estas comunidades e um estudo de caso.

Os sujeitos participantes da experiência foram alunos de uma escola pública, estadual, localizada na Rua Vasconcelos Jardim, nº. 1696, no município de Cidade Gaúcha, Estado do Paraná. A escola funciona em três turnos, recebendo aproximadamente 1.500 alunos da Educação Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos.

A implementação foi realizada no segundo semestre de 2010, com alunos da 8º série do Ensino Fundamental, participando 38 alunos do período matutino, com interação direta da pesquisadora e alunos envolvidos.

O roteiro de trabalho proposto compreendia várias etapas que foram desenvolvidas com diversas atividades como pesquisa, sistematização das informações em forma de texto, produção de painéis para apresentação ao público. Produzindo assim, o conhecimento reflexivo da realidade.

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AURINEIDE MARIA MORENO; ROSANA STEINKE

Esta implementação ocorreu durante encontros marcados no contra-turno dos alunos. Utilizamos primeiramente leitura de textos para informações sobre comunidades remanescentes quilombolas para desmistificar a idéia de que quilombo era um local apenas de resistência e de isolamento. Foi levada em consideração durante a pesquisa a existência de quilombos no Brasil, Paraná e nas proximidades do município onde está localizado o estabelecimento de ensino no qual foi aplicado o projeto.

Para assegurar a compreensão do significado de comunidades remanescente quilombolas reportaram-se a textos informativos, recortes de filmes e documentários sobre o tema em estudo. Na constituição Federal de 1988, foi estudado seu Artigo 68 que se refere ao direito de propriedade das terras ocupadas pelas comunidades quilombolas, devendo o Estado emitirem-lhes os respectivos títulos.

O estudo cartográfico fez parte desta pesquisa, onde os alunos observaram a localização das comunidades remanescentes quilombolas, fazendo uso do mapa do Brasil, Paraná e Guaíra. No mapa do Paraná foi dado maior destaque a região de Guaíra por estar ali situado à comunidade remanescente Manoel Ciriaco dos Santos em estudo pela pesquisadora.

Os vários instrumentos utilizados geraram nos alunos discussões e reflexões pelo reconhecimento quanto à existência de comunidades remanescentes de quilombos nos dias atuais, isto foi concretizado na visita a comunidade remanescente de quilombo Manoel Ciriaco dos Santos em Guaíra, resultando em documentos icnográficos produzidos pelos alunos e relatos orais dos moradores da comunidade. Neste momento da implementação, percebe-se um avanço qualitativo na relação do aluno com o tema trabalhado, constatando-se que em atividades práticas, de campo, há um maior envolvimento do aluno com a aprendizagem.

A conclusão do projeto de intervenção se deu com uma atividade envolvendo a comunidade local e regional, onde os alunos apresentaram seus conhecimentos adquiridos na Feira de Ciências e do Conhecimento (FECICO), em novembro de 2010, evento cultural que se realiza no Colégio Estadual Marechal Costa e Silva, a mais de 20 anos. A participação neste evento proporcionou momentos de grande satisfação e concretização do aprendizado.

As visitações contaram com a presença de professores, funcionários do núcleo de educação de Cianorte, alunos de outras localidades, moradores da cidade, interagindo diante dos painéis e até mesmo se surpreendendo com o que estavam vendo e ouvindo sobre o tema exposto.

A implementação deste projeto foi partilhada e analisada com diversos professores de História da rede pública paranaense, através do Grupo de Trabalho em Rede – GTR, em ambiente virtual de aprendizagem, oferecido no portal e-escola sob a coordenação desta pesquisadora.

A receptividade deste projeto foi grande por parte da maioria dos professores participantes,

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CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ: UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

os mesmos avaliaram-no como positivo e de grande proveito para o ensino de história como forma de conhecimento das comunidades remanescentes quilombolas do Paraná. Pensamos que este estudo trouxe contribuições para a prática do Ensino de História. Em primeiro lugar, colocando a questão da história dos quilombolas de forma geral e depois especificamente no estado do Paraná. O estudo da presença de tais comunidades em território paranaense é recente e ainda pouco explorado em sala de aula. Em segundo lugar, o projeto e sua implementação permitiu que se fizesse uma interação entre teoria e prática ao visitarmos com os alunos a comunidade em questão, localizada perto do município de atuação em que trabalhamos. Para os alunos foi uma experiência diferenciada se deparar com algo que está geograficamente perto e que não se tinha conhecimento da existência, então acreditamos que isso facilitou a discussão que foi do geral ao particular. A visita e as discussões que antecederam a mesma serviram de motivação para o fechamento do projeto e a socialização do mesmo por parte dos alunos.

Além disso, o material disponibilizado pode servir de inspiração para outros estudos que avancem nesse sentido e que possam, assim como neste projeto, incentivar tanto alunos como professores a trabalhar com história e abordar temas ainda pouco tratados usando recursos que estejam próximos, mas que ainda não foram percebidos.

Forquin (2003) nos lembra que a conservação e a transmissão da herança cultural do passado, como é o caso da comunidade quilombola Manoel Ciríaco dos Santos, é uma função essencial da educação em todas as sociedades e se faz paralelamente a uma reinterpretação e ravaliaçao contínua daquilo que é conservado. Nesse sentido podemos afirmar que os alunos se depararam com uma comunidade rural que não se distingue, à primeira vista, de outras e só ao se aproximar e perceber os relatos e objetos/costumes/práticas culturais pertencentes ao grupo em si é que é percebida essa diferença mas também as influências do mundo contemporâneo nestas comunidades.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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_____. Ministério da Educação e Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Médio. 1999.

_____. Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988.

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22 a 26 de Outubro de 2012208

AURINEIDE MARIA MORENO; ROSANA STEINKE

CHARTIER, R. A história cultural – entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1987.

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MOURO, Clovis. Quilombos resistência ao escravismo. São Paulo: Ática, 1993. 95 p.

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ORTIZ, R. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1985.

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PROENÇA, Maria C. Ensinar/aprender história: questões de didática aplicada. Lisboa: Livros Horizontes, 1990.

REIS, João J.; GOMES, Flávio S. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

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22 a 26 de Outubro de 2012209

CULTURA QUILOMBOLA NO PARANÁ: UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

REVEL, Jacques (Org.). Jogos de Escalas: a experiência da micro-análise. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 1998.

SCHMIDT, Maria Auxiliadora; CAINELLI, Marlene. Ensinar história: pensamento e ação no magistério. São Paulo: Scipione, 2004.

SCHMITT, A.; TURATTI, M. C. M.; CARVALHO, M. C. de. A atualização do conceito de quilombo: identidade e território nas definições teóricas. In: Ambiente & Sociedade. Ano V, n. 10. 1. Semestre de 2002.

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22 a 26 de Outubro de 2012210

CULTURA INDÍGENA, ESCOLA E TEORIA OUTSIDER: UM ESTUDO SOBRE A ESTIGMATIZAÇÃO DO INDÍGENA

NUMA ESCOLA DE MARINGÁ

Verônica Yurika Mori

Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UEM;Professora de Sociologia pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná.

Resumo: Não é de hoje que a necessidade da valorização da diversidade cultural nos processos escolares vem sendo discutida. O caráter homogeneizante e homogeneizador da escola já não consegue dar conta da diversidade existente em seu meio, seja ela social, cultural ou étnica. Sendo assim, desde 2008, a lei n°11.645 torna obrigatória a inserção da temática “Indígena” no currículo oficial da Rede de Ensino. No entanto, a imagem ora romantizada, ora estigmatizada do indígena ainda permeia os discursos dos estudantes. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo, tentar compreender a visão do aluno maringaense e demais atores educacionais sobre o indígena e quais as classificações, definições e implicações que essa visão pode causar ao mesmo.

Palavras-chave: Cultura indígena; Alteridade; Estigmas.

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22 a 26 de Outubro de 2012211

CULTURA INDÍGENA, ESCOLA E TEORIA OUTSIDER:UM ESTUDO SOBRE A ESTIGMATIZAÇÃO DO INDÍGENA NUMA ESCOLA DE MARINGÁ

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem a proposta de descrever a visão de estudantes e demais atores educacionais sobre o indígena. Parto do pressuposto de que a visão romantizada do indígena como uma extensão da natureza sendo selvagem e primitivo ou de que foram exterminados durante o período de ocupação e colonização territorial, ainda permeia o imaginário nacional, visão esta que a escola ajuda a reproduzir e a legitimar, tendo em vista que os próprios professores desconhecem a dinâmica cultural indígena.

Neste sentido, quando falamos ou encontramos indígenas vivendo ou convivendo junto ao meio urbano, toda a ideia romantizada abre espaço para um discurso já superado pela Etnologia Indígena: o discurso da aculturação.

Sendo assim, este trabalho terá como princípio norteador a classificação de indivíduos indígenas dada por indivíduos não indígenas, utilizarei aqui o conceito de outsider, formulada por Howard S. Becker em seu livro “Outsiders: estudos de sociologia do desvio”. Entendendo como outsider “aquele que se desvia das regras de grupo” (BECKER, 2008, p. 17), como pensar a imposição de regras de um grupo para outro? Como se encaixa aquele que se desvia da imposição da regra de um grupo sobre outro quando este é oprimido e depende das ações do grupo opressor? No que implica a rotulação de “aculturado” para indivíduos indígenas? Quando a rotulação acontece como se dá a interação entre o grupo que impõe regras e o grupo que sofre essa imposição?

Para responder a essas questões, trabalharei com descrições realizadas por alunos do Ensino Médio, professores e funcionários de uma escola pública de Maringá1, coletados durante o segundo semestre de 2010 através de atividades em sala de aula2 e uma visita a ASSINDI (Associação Indigenista de Maringá) – no caso dos alunos – , e de um questionário – no caso de professores e funcionários – . Faço também um resgate das opiniões e impressões deixadas por professores de Sociologia da rede estadual de ensino da região de Maringá, durante um mini-curso oferecido por mim, no primeiro semestre de 2010.

Além disso, parto do pressuposto que os movimentos de globalização e o consumismo presente no modernismo não levam a homogeneização cultural e é a partir dessa premissa que muitos preconceitos e discriminações são direcionados aos indígenas, pois a sociedade não assimila a ideia de manutenção das especificidades culturais mesmo havendo a interculturalidade

1 As descrições dadas pelos alunos foram coletadas durantes as aulas de Sociologia ministradas por mim, temos uma comparação entre respostas dos alunos antes das aulas de Sociologia e depois destas. Manteremos os depoimentos em sigilo, sendo diferenciados por: aluno, professor, funcionário.

2 Cabe ressaltar que, após um curtíssimo período em que estes alunos tiverem acesso ao conhecimento produzido recentemente sobre a temática indígena bem como conceitos antropológicos tais como alteridade, etnocentrismo, dinamismo cultural, preconceito, etnicidade, identidade étnica, houve uma significativa mudança no discurso e pensamento sobre destes estudantes em relação ao indígena.

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22 a 26 de Outubro de 2012212

VERÔNICA YURIKA MORI

que a globalização propõe, os indígenas então devem se manter puros, tal como eram no passado. Levantarei uma pequena discussão sobre os estudos de hibridação, definido pelo autor Néstor García Canclini em seu livro “Culturas Híbridas”, como uma possibilidade da valorização da diversidade cultural nos meios escolares.

INDÍGENA COMO PRIMITIVO: “AQUELE QUE VIVE NO MATO E ANDA PELADO”

Ao falar sobre os indígenas com alunos e funcionários da rede de ensino percebi que há uma grande distância entre produção acadêmica e o conhecimento difundido nas escolas, isto é, ao falar sobre índio uma confusão se estabelece, ou ainda vive isolado, vivendo de maneira “primitiva”, ou foi exterminado nos tempos de colonização, ou ainda esta aculturado, e por todos esses fatores, o índio não existe mais.

Sendo assim, uma dessas ideias difundidas sobre o indígena, principalmente nos conteúdos de literatura ao conhecermos a invenção do herói nacional eternizado pelo personagem Peri, no romance de José de Alencar3 intitulado de “O Guarani”, é de que este é sinônimo de isolamento e pureza, no sentido de que é necessário dar-lhes retorno às origens nativas, isolar-lhes para que sejam considerados “índios”, estes devem ser protegidos, como núcleo de nacionalidade ou para armazenar como registro de alteridade, sob o signo do universalismo, ou como contribuição a uma visão total do humano. É marcado e valorizado como origem4:

“Os índios são pessoas primitivas que moram no meio da floresta. Eles se vestem com poucas roupas, só para tampar as partes íntimas, e também se pintam muito. O alimento deles vem dos recursos da natureza como as plantas, as sementes, frutas e também matam peixes nos rios e pequenos animais como pássaros, aves e porcos. Os índios moram em casas armadas por eles mesmos feitas de bambus e palhas. Os índios trabalham para si mesmo e alguns recebem ajuda do governo.”(aluno 1)

Neste sentido, quando consideramos indígena somente aquele que mantem as características culturais de isolamento, como uma extensão da natureza, negamos a este o direito de viver onde vivemos e principalmente de consumir o que consumimos. Falar sobre o índio é falar sobre a dicotomia civilizado/primitivo – considerando que a sociedade não-índia são os civilizados e os índios são os primitivos5 –, no dicionário encontramos a definição de primitivo da seguinte maneira: “Que é o primeiro a existir; que precede. /Que tem a simplicidade, o caráter das primeiras eras.”, este então de maneira alguma podem ou devem ter acesso aos bens

3 José de Alencar, romancista brasileiro, difundiu em suas obras o mito do bom selvagem, para saber mais, ler: http://www.portuguesdobrasil.net/pdf/mito_bom_selvagem.pdf

4 Segundo Arruti (1997), podemos chamar a essa ideia romantizada sobre o indígena como o “sentimento de tutela”.

5 Os conceitos de civilizado e primitivo já caíram em desuso há algum tempo, porém, pressuponho que ainda é preciso falar sobre eles quando o assunto é o índio no imaginário nacional.

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22 a 26 de Outubro de 2012213

CULTURA INDÍGENA, ESCOLA E TEORIA OUTSIDER:UM ESTUDO SOBRE A ESTIGMATIZAÇÃO DO INDÍGENA NUMA ESCOLA DE MARINGÁ

de consumo que a sociedade não-índia possui.

Sendo assim, o índio enquanto primitivo não condiz com a cidade, este só é indígena enquanto mantido o estado de primitivo, de simplicidade, como marco zero da humanidade, sendo a cidade o local da civilização, daquele que não mais se encontra no estado primitivo, encontrar um indígena na cidade leva muitas pessoas a pensarem no fim da cultura indígena.

No caso da cidade de Maringá, ao fazer compras na principal feira livre, às quartas-feiras pela tarde ou aos sábados pela manhã, ou ainda, ao passear pelas principais ruas e avenidas da cidade, encontrar com indivíduos provenientes de comunidades indígenas vendendo o seu artesanato pode desencadear alguns sentimentos: de que índio não gosta de trabalhar e vive na mendicância, de que são falsos índios, afinal de contas, porque e pra que precisam do dinheiro?

O ÍNDIO: EXTERMINADO NO PASSADO

Outra visão sobre os indígenas apresentada por alunos e entrevistados no geral, condiz com a maioria dos estudantes e indivíduos da sociedade não-índia, a de que são habitantes do passado, estão presentes apenas nas aulas de história situados entre os conteúdos: período do descobrimento do Brasil, colonização territorial e a contribuição dos costumes culturais indígenas para formação da identidade nacional, ora como simples coadjuvantes no processo de colonização do Brasil, ora como vítimas do processo que foi chamado de “descobrimento” do Brasil:

“Os índios são pessoas que habitavam as terras brasileiras antes dos portugueses colonizarem o Brasil, eles receberam esse nome porque os portugueses queriam chegar às Índias, e quando chegaram ao Brasil acharam que tinham chegado lá e por isso chamaram as pessoas de índios.” (aluno)

Ora como vítimas da ganância portuguesa:

“O que eu aprendi sobre os índios desde a 4ª série, é que no início os colonizadores encontraram os índios em algumas aldeias e quiseram levar eles como escravos, mas os índios não se adaptaram ao trabalho escravo.” (aluno)

Ou ainda como se tivessem sido todos exterminados e não existissem mais:

“Os índios foram pouco a pouco desaparecendo, com a chegada dos Brancos sua cultura foi praticamente extinta e seu habitat quase completamente tomado.”

(aluno)

Certamente, não podemos considerar estes depoimentos como inverdades contidas nos livros didáticos de história, porém, há a preocupação de que quando nossos alunos aprendem somente o passado de massacre e extermínio das sociedades indígenas, acontece a disseminação da ideia de que estes hoje, não existam mais. E ao falar da existência destes indivíduos, não

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perdidos no espaço ou no tempo, mas bem próximos a nós, surge um outro discurso o da aculturação.

“ELES ESTÃO TODOS ACULTURADOS”

DISTÂNCIA ENTRE TEORIA CIENTÍFICA E SENSO COMUM

Ao desmistificar aos nossos alunos a ideia deste índio folclorizado pela história e literatura brasileiras, ou quando apresentamos números sobre as suas crescentes populações, ou ainda quando recebem a notícia de que há indígenas estudando nas universidades, utilizando computadores, televisores, automóveis, morando em casas como as nossas, não mais em aldeias, não mais em ocas feitas de barro, os discursos históricos sobre o indígena enquanto sinônimo de pureza ou de exterminado pelos portugueses durante a colonização dão lugar a outro discurso também já superado pelas Ciências Sociais, em especial pela Antropologia, o discurso da aculturação.

A teoria da aculturação foi difundida inclusive entre estudiosos do assunto, no começo do século XX, acreditava-se que o constante e ampliado contato com os brancos poderiam extinguir as sociedades indígenas, isto se daria pelo movimento de aculturação, segundo Cardoso de Oliveira (1976), aculturação seria um processo pelo qual um grupo étnico se incorpora noutro, perdendo sua peculiaridade cultural e sua identificação étnica anterior.

No entanto, desde a década de 80, estudos antropológicos no que diz respeito as relações interétnicas (BARTH, 2000; SAHLINS, 1997; OLIVEIRA, 1998; NOVAES, 1993 ) não admitem mais a aculturação e/ou assimilação e até mesmo a ideia de cultura mundial dada através da globalização como concepção para o futuro. Isto é, nas palavras de Sahlins (1997), “a cultura não é um objeto em vias de extinção” aliás, para o autor, admitir que o sistema capitalista e os processos advindos da globalização são capazes de “aculturar” e/ou “assimilar” outras culturas é admitir que existe uma superioridade cultural entre os povos.

Contudo, mesmo com a superação de alguns conceitos antropológicos que tendiam ao fim da cultura indígena, ao ministrar a disciplina de Antropologia6 para o terceiro ano do Ensino Médio, e a experiência de um mini-curso oferecido para professores da rede estadual de ensino encontrei uma resposta dominante: eles estão “aculturados”.

“Características próprias os índios podem ate ter tido algum tempo atrás, é quase impossível não incorporar o termo aculturação a sua cultura étnica. Talvez muitos dos brasileiros não valorizem os povos indígenas pelo fato de quererem ser incorporado a nossa sociedade e maneira de viver. Ressignificação de objetos

6 O conteúdo programático idealizado para aulas de Sociologia foram divididas mais ou menos da seguinte maneira: os primeiros anos o conteúdo seria mais voltado para a Sociologia, os segundos anos para Ciência Política e os terceiros anos para a Antropologia.

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ou costumes não e a melhor forma de justificar o fato de índios hoje estarem ao nosso meio. Bom, não sei, a única coisa que pode se afirmar é que os tempos são outros.” (aluno)

Considero que o principal motivo para que o termo aculturação ainda esteja presente na fala da sociedade englobante é de que a apropriação e utilização de bens materiais produzidos pela modernidade, pelos indígenas, fazem com que estes percam suas características tradicionais, transformando assim as suas culturas, especificamente em culturas do homem branco/moderno. Isso porque a apropriação dos objetos da sociedade não-índia pelos indígenas é sinal de que perderam a sua cultura:

“Como a cultura indígena foi atropelada pela européia, algumas tribos tiveram que se adaptar para sobreviverem. Hoje em dia os índios já possuem roupas estilizadas, aparelhos eletrônicos como celulares, computadores, televisores e muitos índios frequentam faculdades para se infiltrar no mercado de trabalho. Para se ter uma idéia da nossa influencia, as tribos estão cada vez mais perto das nossas cidades e o convívio entre eles e nos esta cada vez mais forte.” (aluno)

Esse discurso faz parte de uma ideia difundida na sociedade, de que a globalização faria com que certas culturas perdessem as suas particularidades transformando todas as culturas do mundo numa monocultura, justificado pela premissa de que tradicional e moderno só podem ser pensados em oposição e não em complementaridade (CANCLINI, 2008). Segundo Canclini (2008), a globalização não é um simples processo de homogeneização, mas de reordenamento das diferenças e desigualdades, o que justifica a aplicação do tema diversidade cultural nas escolas como um dos grandes desafios da atualidade, isto é, não cabe mais às escolas o discurso de que somos todos iguais, pois este não atende mais a multiculturalidade presente em nossa sociedade. Prova disso está no movimento pela luta e implantação de escolas específicas para povos indígenas e trabalhadores rurais.

No entanto, objeto privilegiado entre os antropólogos, os estudos culturais parecem relegados apenas aos estudiosos do assunto7. Muitos professores da rede de ensino deixam de oferecer ao aluno a oportunidade de conhecer a Antropologia, alguns deles inclusive, mostraram desconhecer a produção acadêmica referente à temática proferindo também o discurso da “aculturação”:

“Eu não consigo acreditar que o movimento de globalização não vá acabar com a cultura indígena, vemos cada vez mais no nosso dia-a-dia a incorporação dos modernismos, a mundialização do “americanismo” está cada vez mais sendo incorporada na nossa cultura, e os índios estão aderindo a tudo isso” (professor em mini-curso)

7 . Tema para uma outra discussão, acredito ser necessário uma maior aproximação entre Antropologia e Educação. Muitos saem da graduação em Ciências Sociais e vão dar aula no Ensino Médio, em conversa com estes professores, alguns admitiram não ver importância em tal disciplina.

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Neste sentido, mesmo havendo obrigatoriedade da inserção dos estudos da cultura indígena na Lei n°11.645/08, os professores da rede de ensino não estão devidamente capacitados para tal. Sendo assim, qual a problemática que esses discursos causam aos grupos indígenas?

O ÍNDIO CLASSIFICADO COMO ACULTURADO É UM OUTSIDER?

A rotulação como outsider possui dois sentidos que são compreendidos por Becker como interacionismo: aquele que estipula a regra e aquele que sofre essa imposição. Becker discute a necessidade de estudarmos não somente as regras e imposições que se daria num único sentido, o daqueles que rotulam os outsiders, mas sim o movimento contrário que essa imposição causa.

Segundo Becker (2008), há a imposição de regras dadas por determinado grupo, o desvio é dado como falhas ao obedecer regras deste grupo, alguém que falha ao obedecer determinada regra é considerado como um desviante. Para este trabalho, vou considerar a sociedade não-índia como o grupo que impõe as regras para os indígenas, isso porque a imposição de regras se dá principalmente através das disputas políticas dos grupos que compreendem o todo, e a regra imposta para obtenção aos direitos concedidos aos indígenas é de que estes devem ser sobretudo considerados índios, para ser indígena, este deve se apresentar não como é, mas como o grupo impositor visualiza que estes devam ser.

Ao final das aulas sobre Cultura Indígena8, levei os alunos do terceiro ano do Ensino Médio para conhecerem a Associação Indigenista de Maringá�, houve uma breve explicação sobre o histórico da instituição e a dinâmica administrativa, logo após, alguns índios da etnia Guarani, moradores da Associação e estudantes da Universidade Estadual de Maringá, fizeram a apresentação de uma dança Guarani. Reconheço que, as impressões relatadas após a visita, não foram surpreendentes porém foram desanimadoras, ao indagar sobre a visita, um aluno se manifestou:

Ahh professora, eu fiquei decepcionado com o que vi, não dá pra falar que eles não estão aculturados, frequentam a universidade, falam português, usam “havaianas”, shorts e camisetas, não são mais índios, perderam a cultura indígena, são como nós, e sendo como nós, porque tem tratamento diferenciado em relação ao vestibular, ou recebem bolsa auxílio para deixarem suas aldeias e frequentarem a universidade? E outra, mil reais de bolsa, é uma boa grana, já que não pagam aluguel, dá pra viver bem. (aluno)

A impressão relatada por este aluno não é surpreendente porque durante toda a sua vida escolar ele foi educado a perceber o indígena tal como ele é nos livros de história ou nos romances da literatura, ninguém mais o apresentou tal como ele é ou vive hoje, as suas dificuldades

8 Cabe ressaltar que as aulas tiveram como referencial teórico produções sobre o contato interétnico, além de conceitos antropológicos como cultura, alteridade, etnocentrismo, identidade étnica, preconceito, etnicidade, ressignificação cultural através dos objetos e os movimentos de resistência indígena.

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de acesso a cidadania, ou a luta por suas terras, ter esse sentimento de desapontamento, de frustração é compreensível, principalmente para os que ainda mantém a imagem romantizada do indígena já descrita neste trabalho. Contudo, é desanimadora, pois os indígenas terão que continuar lutando por seus direitos, e terão que se enquadrar as regras e imposições da sociedade não-índia para que sejam respeitados.

Um grande exemplo de como se dá a dinâmica entre indígenas e não-indígenas está no quarto capítulo do livro “Jogo de Espelhos – Imagens da representação de si através dos outros”, intitulado de “A Fabricação das Identidades”, da autora Sylvia Caiuby Novaes (1993)9, a autora discorre sobre os efeitos que essa imposição de regras e valores causam entre os indivíduos de comunidades indígenas. Utiliza como exemplo o Primeiro Encontro dos Povos Indígenas no Brasil, realizado em Brasília, em junho de 1982, que reuniu mais de trezentos líderes indígenas representantes de várias comunidades, evento ao qual esteve presente.

Segundo Novaes (1993), há a necessidade de fazer com que indígenas de comunidades distintas se apropriem de uma identidade indígena irreal, idealizada pelo não índio, para que façam ouvir suas reivindicações e valer os seus direitos frente aos representantes da sociedade nacional, “os índios do nordeste compareceram ao evento de cocares, tacapes e outros adereços “típicos de índio”, muitos dos quais não são mais utilizados cotidianamente” (NOVAES, 1993, p. 65). Há também a necessidade de apropriação da categoria genérica de índio como forma de articulação “cada um falava enquanto representante de uma nação específica. Mas foi enquanto “índios” que eles conseguiram se organizar e apresentar suas reivindicações ao governo e à sociedade de um modo geral.” (NOVAES, 1993, p. 67).

Além dessas observações, a autora nos chama ainda a atenção para a necessidade dos indígenas de se mostrarem capazes de assumir o discurso do não-índio, como se precisassem demonstrar que são capazes de dominar os vários códigos do mundo moderno, no intuito de desfazer a imagem do índio como incapaz. Neste sentido, os líderes indígenas relatavam sobre os índices de produção de arroz dos Xavantes, os Têrenas citavam passagens da Bíblia, reivindicavam máquinas para agricultura, frisando a possibilidade de um desenvolvimento compatível com o desenvolvimento do não-índio. Era necessário mostrarem aos não-índios que eram capazes de serem iguais, mas que, no entanto, queriam mesmo era o direito à diferença.

O tempo todo e não apenas através de suas falas, era como se dissessem: “Vejam, podemos ser iguais a vocês, podemos dominar todas as regras do mundo não índio, podemos reivindicar os nossos direitos de acordo com o vosso costume. Mas vejam também que somos diferentes, que esta diferença é real e deve ser respeitada”. (NOVAES, 1993, p. 66).

Portanto, não basta aos indígenas se dizerem índios, é preciso que estes se organizem

9 Novaes é Professora Doutora do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo.

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e se mostrem de acordo com as regras e imposições da sociedade nacional. E é neste jogo de interações que só é considerado índio aquele se utilizam do simulacro, da imitação do branco como estratégia de desreferencialização . Novaes (1993), faz referência aos estudos de Carlo Ginzburg que ajuda a compreender o modo pelo qual os índios representam a sua identidade para o mundo exterior tendo como modelo a imagem que fazem do branco – e também da apropriação do índio irreal, estereotipado, aquele imaginado pela nossa sociedade (ao fazerem isso, não há espaços para críticas pela descaracterização cultural) criando sinais diacríticos que permitem com que estes tenham a possibilidade de reivindicarem por seus direitos e de romperem com o passado colonialista a que foram submetidos.

No entanto, pressuponho que esta estratégia não leva a valorização da cultura indígena e dos próprios indígenas como cidadãos mas, ao isolacionismo cultural, como exemplo disso, existe a elaboração e implantação das escolas específicas para indígenas, no caso do Paraná a Escola Indígena se dividem em, escolas bilíngue Kaingang e Guarani, recentemente está sendo discutida a implantação de uma escola bilíngue para os Xetá, é claro que essas conquistas são de suma importância, porém, ao meu ver, a escola deveria ser capaz de valorizar toda e qualquer diferença, para que não reproduza as desigualdades sociais entre os diferentes, sendo capaz de acolher a todos, e também ao indígena. Penso que, ao sairmos da discussão sobre identidade, e passarmos a discutir sobre hibridação, como propõe Nestor G. Canclini, talvez a valorização da diversidade cultural nos processos escolares e a longo prazo na sociedade nacional, possa finalmente acontecer.

DISCUTINDO A HIBRIDAÇÃO

Com o advento da globalização um falacioso discurso foi difundido entre as sociedades, a de que as culturas se transformariam numa só, acabando com as especificidades culturais de cada povo. O que vimos, porém, foi outro movimento, um movimento em que esses povos reivindicavam pelo direito de manter as suas tradições e subsídios para tal, além de também exigirem o direito a apropriação e acesso aos bens materiais produzidos pela modernidade como descrito no capítulo anterior, no exemplo que Novaes nos dá sobre os índios das etnias Têrena e Xavante reivindicam por máquinas que auxiliem na produção de arroz.

Segundo Canclini (2008), os processos globalizadores acentuam a interculturalidade moderna quando criam mercados de bens materiais e dinheiro, mensagens e migrantes. Porém, há um grande desafio em aceitar a pluralidade das inúmeras e diversas tradições, no caso dos indígenas a apropriação desses bens materiais, bem como o acesso aos mercados e ao dinheiro é um dos principais argumentos da sociedade não-índia para que os direitos dos povos indígenas não sejam garantidos.

Acredito que é de comum acordo entre os brasileiros, mesmo porque isso foi difundido

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nos processos escolares, de que os indígenas foram os primeiros habitantes do Brasil, de que muitos foram massacrados e exterminados, e de que há um forte desejo de proteger enquanto sinônimo de alteridade, de origem, as comunidades indígenas que restaram. Porém, acredito que também é de comum acordo que os direitos a esses povos só podem ser garantidos e atendidos quando estes se apresentam tal como eram, tal como foram, negando-lhes ao direito de acesso a quaisquer produtos que não sejam o arco e a flecha.

Neste sentido, talvez a maneira como trabalhamos alguns conceitos sobre as especificidades étnicas possa contribuir com a manutenção das idéias citadas acima. Segundo Canclini (2008), transferir o conceito da hibridação biológica para as formas culturais é um dos caminhos para sairmos dos discursos biologísticos e essencialistas da identidade, da autenticidade e da pureza cultural, dando conta das formas particulares de conflito geradas na interculturalidade recente em meio à decadência de projetos nacionais de modernização.

De acordo com o autor, o conceito de hibridação para as formas culturais são “processos socioculturais nos quais estruturas ou práticas discretas, que existiam de forma separada, se combinam para gerar novas estruturas, objetos e práticas” (CANCLINI, 2008, Introdução à edição de 2001, p. XIX). A hibridação surge da criatividade individual e coletiva na vida cotidiana e no desenvolvimento tecnológico. Esta interessa tanto os setores hegemônicos como os populares que querem se apropriar dos benefícios da modernidade o que leva a relativização da identidade. A redução da hierarquia dos conceitos de identidade e heterogeneidade em benefício da hibridação tira o suporte das políticas de homogeneização fundamentalista ou simples reconhecimento (segregado) da “pluralidade das culturas”.

“A hibridação como processo de interseção e transação é o que torna possível que a multiculturalidade evite o que tem de segregação e se converta em interculturalidade. As políticas de hibridação serviriam para trabalhar democraticamente com as divergências, para que a história não se reduza a guerra entre culturas, podemos viver em estado de guerra ou em estado de hibridação” (CANCLINI, 2008, Introdução à edição de 2001, p. XXVII).

Neste sentido, Canclini (2008), nos alerta que os processos de hibridação devem ser estudados situando-os em relações estruturais de causalidade e dar-lhes capacidade hermenêutica, ou seja, de torná-lo útil para interpretar as relações de sentido que se constroem nas misturas. Esta deve compreender, explicar as “misturas culturais” e não apenas descrevê-las. Para isso, devemos compreender as estratégias de entrada e de saída da modernidade, sendo a hibridação o processo ao qual é possível ter acesso e abandonar a mesma, bem como estar excluídos ou subordinados a este processo. Desta maneira poderemos entender as posições dos sujeitos a respeito das relações interculturais.

Neste caso, em se tratando de indígenas, o tão falacioso discurso de aculturação cairia por terra, pois os índios não passariam a ser considerados índios porque se mantém ligado

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exclusivamente às tradições, isto é, quando a sociedade não índia, entender os processos de entrada e saída da modernidade através da hibridação, entenderá que a necessidade dos povos indígenas de interseção e interação com a sociedade não-índia, é uma questão de sobrevivência, cidadania e não uma questão de homogeneização cultural.

Sendo assim, é necessário reivindicar a valorização da diversidade, da heterogeneidade cultural. Para isso, elejo o espaço escolar como o principal meio para disseminar uma nova visão sobre os indígenas, compreendendo que, ao valorizarmos a diversidade cultural, toda e qualquer diferença poderá ser respeitada.

CONCLUSÃO

Trazer a teoria outsider para avaliação dos grupos indígenas através de depoimentos e das impressões deixadas por alunos, funcionários e professores durante o ano letivo de 2010 é de certa maneira uma tentativa de compreender a relação entre cultura e desigualdades sociais. Ao criar regras e impô-las aos indivíduos de comunidades indígenas estamos dizendo a eles: as regras são nossas, e para você ter acesso aos seus direitos é preciso obedecê-las.

Neste sentido, quando alguns discursos ainda são percebidos entre alunos, professores e funcionários, entende-se que a escola também é reprodutora dos processos de exclusão a que alguns grupos são submetidos. Acredito que, quando alguém é eleito outsider, sendo desviante das condutas normalizadas pelo meio em que vive, por seu convívio social, as suas chances de sucesso escolar diminuem, pois obter o sucesso escolar é sobretudo uma adequação às regras, sendo esta também uma forma de hibridação.

Canclini (2008) nos faz a seguinte pergunta como democratizar a capacidade de hibridação, de combinar repertórios multiculturais que a época global expande? A resposta também vem de Canclini, esta depende das ações políticas.

Sendo assim, a obrigatoriedade da inserção dos estudos culturais sobre a cultura indígena, através da Lei n° 11.645/08 já é o começo de uma ação política para valorização da multiculturalidade brasileira. Porém, para efetivação da mesma é preciso que os estudos relacionados às comunidades indígenas cheguem até a escola, como isso está acontecendo e se está acontecendo já é assunto para outra discussão10.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARRUTI, J. M. A. A Emergência dos “Remanescentes”: notas para o diálogo entre os indígenas e quilombolas. In: Mana. Estudos de Antropologia Social. V. 3, n° 2. Rio d Janeiro: PPGAS/UFRJ, out. 1997.

10 Tema da minha dissertação de mestrado.

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BARTH, F. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Org. Tomke LASK - Os grupos étnicos e suas fronteiras. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria. pp. 25-67, 2000.

BRASIL. (2008), Lei nº 11.645. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em <http: www.planalto.gov.br>.

BECKER, Howard, S. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. RJ. Zahar. 2008.

CANCLINI, Nestor, G. Culturas Híbridas - estratégias para entrar e sair da modernidade. Tradução de Ana Regina Lessa e Heloísa Pezza Cintrão. São Paulo: EDUSP, 2008.

CARDOSO DE OLIVEIRA, R. Do Índio ao Bugre: O Processo de Assimilação dos Têrena. 2. ed. Rio De Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora S.A., 1976.

NOVAES, Sylvia Caiuby. Jogo de espelhos. São Paulo: Edusp. 1993.

OLIVEIRA, João Pacheco de. Uma etnologia dos "índios misturados"? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais. Mana [online]. 1998, vol.4, n.1, pp. 47-77.

SAHLINS, Marshal. O “pessimismo sentimental” e a experiencia etnografica: por que a cultura nao e um “objeto” em extincao (parte I e II). Mana. Rio de Janeiro. V.3 n.1 e 2. p. 41-74 e p. 103-150, 1997.

OUTRAS FONTES:

Dicionário do Aurélio. Online: <http://www.dicionariodoaurelio.com/>. Acesso em 10/01/2010.

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SOCIOLOGIA NA EJA: DA TEORIA À PRÁTICA

Fabiana Virgínio da Rocha

Graduada em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Maringá (UEM); Pós-graduada em Docência do Ensino Superior pelo Instituto Paranaense de Ensino e Faculdade Maringá; Pós-graduanda em Educação Profissional e de Jovens e Adultos pelo Instituto Paranaense de Ensino e Faculdade de Tecnologia América do Sul. Endereço eletrônico: [email protected]

Resumo: O estudo apresenta como objetivo geral analisar as metodologias e estratégias de ensino de Sociologia na Educação de Jovens e Adultos. Esta pesquisa exploratória de cunho bibliográfico discute, portanto, as práticas metodológicas no ensino de sociologia para jovens e adultos. Sistematiza o conteúdo programático da referida disciplina e apresenta propostas de técnicas para o seu ensino na EJA de modo que o educando possa desenvolver uma consciência crítica da sociedade. Contudo vemos que a conscientização, enquanto atitude crítica dos homens na história é o que pode transformar a sociedade e o ensino de sociologia por meio de suas práticas contribui de forma significativa na formação de sujeitos autônomos e reflexivos.

Palavras-chave: Educação de jovens e adultos; Prática docente; Sociologia.

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SOCIOLOGIA NA EJA: DA TEORIA À PRATICA

INTRODUÇÃO

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino da educação básica, nas suas etapas fundamental e média, assegurada por lei, conforme a legislação atual, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96 (BRASIL, 1996). Atende às pessoas que, por alguma razão, não puderam concluir os estudos na época adequada e representa uma possibilidade para efetivar o desenvolvimento de todos os indivíduos, de todas as idades. Esse processo constitui-se uma grande responsabilidade social e educacional e cabe ao professor na sua função de mediador do conhecimento, ter uma base sólida de formação para planejar suas ações pedagógicas.

A função social de uma instituição escolar é a de trabalhar conhecimento científico, este é um compromisso social, e esta ação tem que ter por objetivo a formação do ser do homem, o que, portanto envolve o processo de humanização. Fato que nos leva a refletir: qual o tipo de homem estamos formando? O nosso trabalho docente é para formação ou alienação? Quais metodologias aplicar para formar um cidadão crítico?

É pensando nisto que vemos a importância de discutir e analisar as metodologias e estratégias de ensino de Sociologia na Educação de Jovens e Adultos (EJA), priorizando ações que envolvam a escolarização dos mesmos respeitando o perfil destes alunos.

A sistematização do conteúdo programático e as técnicas de ensino da disciplina devem visar o desenvolvimento de uma consciência crítica da realidade. Uma vez que “[...] o ser do homem, a sua existência, não é dado pela natureza, mas é produzida pelos próprios homens” (SAVIANI, 2005, p. 225).

Neste sentido ressaltamos que o ensino de sociologia é importante para formação do ser do homem e também para o resgate da cidadania em nosso país, enquanto ciência a Sociologia desenvolve um pensamento crítico sobre a sociedade. Essa disciplina deve realmente contribuir para isso na medida em que fornece informações acerca da estrutura e das relações sociais e cria um espaço privilegiado na escola para discussões de suma importância para o indivíduo e a sociedade.

Sua maior contribuição, no entanto, não está apenas na “formação da cidadania” ou numa pretensa “conscientização” do povo alienado do seu modo de inserção nas relações sociais. É na descoberta de nossa participação numa rede de relações, no entendimento de como a nossa personalidade está relacionada à linguagem, aos gestos, às atitudes, aos valores, à nossa posição na estrutura da sociedade – assim como Dumont (1992, p. 57) nos leva a refletir, analisando que o indivíduo de “ontem” torna-se social, não mais “ele e os outros, mas ele em meio aos outros”– que está a relevância para o ensino dessa ciência. Ensinar sociologia é, antes de tudo, desenvolver uma nova postura cognitiva no indivíduo e este é o aspecto humano essencial dessa disciplina.

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22 a 26 de Outubro de 2012224

FABIANA VIRGÍNIO DA ROCHA

Considerando também que a Educação de Jovens e Adultos (EJA), enquanto modalidade da Educação Básica adquire um papel fundamental na formação integral dos sujeitos, agregando-lhes elementos e valores que lhes proporcionem a emancipação e a afirmação de sua identidade cultural. Assumindo assim um compromisso social com a formação humana e acesso à cultura geral, a partir de metodologias adequadas de conhecimentos científicos, tecnológicos e sócios – históricos de modo que os educandos participem política e produtivamente das relações sociais, com o comportamento ético e compromisso político, através do desenvolvimento da autonomia intelectual e moral.

Dessa forma os estudos relativos às metodologias e estratégias de ensino em Sociologia para a Educação de Jovens e Adultos contemplam a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96, em seu artigo 37, que define “a educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no Ensino Fundamental e Médio na idade própria”. Restabelecendo um direito constitucional historicamente negado a esta população que apresenta uma diversidade cultural, política e social peculiar (BRASIL, 1996).

Assim, o estudo deste artigo foi efetivado a partir de reflexões sobre a realidade que se apresenta, na qual o educando deve ser visto como sujeito sócio-histórico-cultural, com conhecimentos, experiências acumuladas e que possui seu próprio tempo de formação a ser respeitado.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA DISCIPLINA DE SOCIOLOGIA: SISTEMATIZAÇÃO TEÓRICA

A ciência sociológica enquanto discurso e enquanto prática é fruto de um período de grandes transformações sociais, industrial e política. Acontecimentos como a Revolução Francesa de 1789, a Revolução Industrial, em processo desde o século XVII e a Revolução Científica consolidada com o Iluminismo no século XVIII, garantiram as condições para o desenvolvimento da Sociologia.

Desde os seus primórdios, com Auguste Comte (1798-1857), a Sociologia, se ocupa do estudo das questões sociais, e adquire com Karl Marx (1818-1883) uma concepção revolucionária de transformação. Em plena metade do século XIX, Marx (1985) distingue, na evolução do capitalismo, dois tipos de transformação: um progressivo, de desenvolvimento das forças produtivas, outro revolucionário, provocado pela contradição entre o desenvolvimento das forças produtivas e o sistema institucional.

A noção de “revolução” tem um sentido, nas sociedades modernas, de transformação social e exprime o modelo moderno da experiência histórica, direcionada para um futuro novo, onde este conceito adquire também o sentido de “emancipação”, passando do domínio político-jurídico limitado para o domínio social. Dessa forma a “revolução” designa, desde o século XIX,

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o processo de uma transformação que poderá ser aplicada ao domínio social, à industrialização ou à transformação tecnológica, além de designar transformações políticas e sociais decisivas, assim como inovações cientificamente importantes.

A concepção de transformação também pode ser vista como um processo do simples ao complexo, do homogéneo ao heterogêneo, da passagem das sociedades de tipo “militar” às sociedades de tipo “industrial”. Entretanto, Durkheim (1858-1917) não adere à teoria evolucionista, mas mantém a ideia da passagem à complexidade, a transformação da solidariedade mecânica em solidariedade orgânica. Evoluções, revoluções e mutações constituem, pois, diferentes formas de transformações sociais.

Vemos, portanto que desde os anos 70 do século XX uma sociologia “dinâmica” (BALANDIER, 1997) se afasta do paradigma estruturalista (LÉVI-STRAUSS, 1970) para se dedicar ao estudo das transformações sociais. Assim, temas como a descolonização, a formação de novas nações, os movimentos revolucionários, são matéria de estudos sociológicos. Balandier por exemplo estuda as condições da descolonização na África e as transformações do sistema político-econômico colonial até à autonomia política.

Conferindo uma importância central aos conflitos e às relações de poder e de dominação a ação política pode ser entendida como o tipo de ação cujo objetivo é a realização de transformações sociais e os estudos das mesmas estão ligados frequentemente ao estudo do desenvolvimento econômico.

Os estudos sociológicos analisam a diversidade de causas (os conflitos, as crenças, as transformações demográficas, científicas e técnicas, ou ideológicas) dado a multiplicidade das transformações (políticas, militares, institucionais, econômicas, culturais, das condições de trabalho, do consumo ou ambientais). Neste sentido vemos a divisão sistemática dos conteúdos no ensino de sociologia orientados pelas Diretrizes Curriculares (2008):

Quadro 1: Conteúdos Básicos Para Disciplina De Sociologia

CONTEÚDOS BÁSICOS PARA DISCIPLINA DE SOCIOLOGIAConteúdo

EstruturanteConteúdos Básicos

1. O Surgimento da Sociologia e Teorias Sociológicas

*Formação e consolidação da sociedade capitalista e o desenvolvimento do pensamento social;*Teorias sociológicas clássicas: Comte, Durkheim, Engels e Marx, Weber.*O desenvolvimento da sociologia no Brasil.

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2. Processo de Socialização e as Instituições Sociais

*Processo de Socialização;*Instituições sociais: Familiares; Escolares; Religiosas;*Instituições de Reinserção(prisões, manicômios, educandários, asilos, etc.)

3. Cultura e Indústria Cultural

*Desenvolvimento antropológico do conceito de cultura e sua contribuição na análise das diferentes sociedades;*Diversidade cultural;*Identidade;*Indústria cultural;*Meios de comunicação de massa;*Sociedade de consumo;*Indústria cultural no Brasil;*Questões de gênero;*Cultura afro-brasileira e africana;*Culturas indígenas.

4. Trabalho, Produção e Classes Sociais

*O conceito de trabalho e o trabalho nas diferentes sociedades;*Desigualdades sociais: estamentos, castas, classes sociais*Organização do trabalho nas sociedades capitalistas e suas contradições;*Globalização e Neoliberalismo;

5. Poder, Política e Ideologia

*Formação e desenvolvimento do Estado Moderno;*Democracia, autoritarismo, totalitarismo;*Estado no Brasil;*Conceitos de Poder;*Conceitos de Ideologia;*Conceitos de dominação e legitimidade;*As expressões da violência nas sociedades contemporâneas.

6. Direito, Cidadania e Movimentos Sociais

*Direitos: civis, políticos e sociais;*Direitos Humanos;*Conceito de cidadania;*Movimentos Sociais;*Movimentos Sociais no Brasil;*A questão ambiental e os movimentos ambientalistas;*A questão das ONG’s.

Fonte: Paraná (2008)

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METODOLOGIAS DE ENSINO EM SOCIOLOGIA

Para trabalhar na perspectiva da diversidade cultural, respeitando os três eixos articuladores da EJA: cultura, trabalho e tempo, temos que ir além de reconhecer que os alunos possuem diferenças físicas e culturais. Precisamos efetivar uma pedagogia da valorização das diferenças, defendendo uma educação questionadora dos conceitos essencialistas tratando-os como categorias socialmente construídas no decorrer dos discursos históricos. Ressaltando que a diferença e a diversidade não podem ser tratadas como sinônimos de desigualdades uma vez que são fatores que enriquecem a cultura.

Na Sociologia, devemos atentar especialmente para a proposição de problematizações, contextualizações, investigações e análises, gerando encaminhamentos que podem ser realizados a partir de diferentes recursos, como a leitura de textos sociológicos, textos didáticos, textos jornalísticos e obras literárias.

Esses encaminhamentos podem, também, ser enriquecidos se lançarmos mão de recursos audiovisuais que, assim como os textos, também são passíveis de leitura. A utilização de filmes, imagens, músicas e charges constitui importante elemento para que os alunos relacionem a teoria com sua prática social, possibilitando a construção coletiva dos novos saberes.

As DCE orientam que a pesquisa decampo, quando viável, deve ser proposta de maneira que articule os dados levantados à teoria estudada, propiciando um efetivo trabalho de compreensão e crítica de elementos da realidade social do aluno (PARANÁ, 2008).

O educando deve ser colocado como sujeito de seu aprendizado, realizando a articulação constante entre as teorias sociológicas e as análises, problematizações e contextualizações propostas. Essa prática permite que os conteúdos estruturantes dialoguem constantemente entre si e permitindo também que o conhecimento sociológico dialogue com os conhecimentos específicos das outras disciplinas que compõem a grade curricular da Educação Básica.

Em se tratando do papel do professor vemos que a necessidade que temos de mobilizar o pensamento para a aprendizagem reafirma que na organização do ensino, não tratamos apenas da organização lógica do conteúdo, mas também do modo de fazer corresponder o objeto do ensino com os motivos, desejos e necessidades do aluno. Destacamos que as necessidades de cada aluno, devem ser problematizadas pelo professor. O mesmo deve estimular a pergunta, a reflexão crítica sobre a própria pergunta, o que se pretende com esta ou com aquela pergunta em lugar da passividade em face das explicações discursivas.

O fundamental é que professor e aluno saibam que a postura deles é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto um fala o outro ouve. O professor quando consegue, enquanto fala, trazer o aluno até a intimidade do movimento do seu pensamento, esta contribuindo no processo de humanização do ser do homem. Ao ensinar devemos compreender

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que a educação é uma forma de intervenção no mundo.

Dessa forma, a educação precisa ser vista como uma condição na preparação dos jovens não só para o mercado de trabalho, mas para sua vivência dentro da sociedade. Fazer a reparação desta realidade inscrita em nossa história social e na vida de tantos indivíduos é um imperativo e uma das finalidades da EJA.

PROPOSTAS DE TÉCNICAS PARA O ENSINO DE SOCIOLOGIA NA EJA

De acordo com a Lei 9394/96 dos princípios e fins da Educação Nacional Art. 2ª A educação é dever da família e do Estado e é inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tendo por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, visando seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1996).

A proposta para organização metodológica das práticas pedagógicas de EJA deve levar em consideração três eixos articuladores que deverão estar intrinsecamente ligados: cultura, trabalho e tempo. A cultura, eixo principal norteará a ação pedagógica, pois dela emanam todas as manifestações humanas, entre elas, o trabalho e o tempo.

Considerando os três eixos articuladores que fundamentam a organização curricular e orientações metodológicas, entendemos que o currículo deverá estar articulado à realidade a qual o educando se encontra, viabilizando um processo integrador dos diferentes saberes, a partir da contribuição das diferentes áreas do conhecimento.

Para tanto devemos desenvolver ações pedagógicas que aperfeiçoem o processo de ensino e aprendizagem, melhorando o desempenho de professores e alunos.

Os temas abordados pela Sociologia podem ser tratados de forma interdisciplinar, para explicar melhor os fenômenos sociais na sua totalidade. A realidade social é pluridimensional e, por isso, susceptível de ser abordada de diferentes maneiras (GAMELAS,2002). Nesta perspectiva o “intercâmbio de saberes” se faz necessário visto a complexidade e complementaridade do conhecimento.

O diálogo entre as disciplinas permite que as investigações realizadas numa área do conhecimento possa ser fundamental para outra, influenciando significativamente na produção e socialização do conhecimento no processo de ensino-aprendizagem. Desse modo o papel da interdisciplinaridade na escolarização de jovens e adultos contribui para que o homem se produza enquanto ser social e também enquanto sujeito e objeto do conhecimento.

A interdisciplinaridade é um processo metodológico de construção do conhecimento pelo sujeito com base em sua relação com o contexto, com a realidade, com sua cultura. Tudo isso problematizado pela situação do real e sistematizado pelo conhecimento teórico.

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Assim, cabe ao professor trabalhar com uma visão integrada da realidade o entendimento mais profundo da sua área de formação e também apropriar-se das múltiplas relações conceituais que sua área de formação estabelece com outras áreas.

Na Sociologia esta prática pode ser concretizada pelo professor ao trabalhar os conteúdos com fundamentação teórica e diálogo com outras ciências. O conceito de “raça” discutido em aulas sobre “Diversidade Cultural” pode ser trabalhado em conjunto com disciplinas como a Biologia e a História. Os demais conteúdos da Sociologia também podem ser abordados nesta perspectiva para que o aluno desenvolva um conhecimento efetivo que contribua para sua prática social.

Além disto, hoje em dia podemos identificar várias tecnologias que podem nos auxiliar no processo de educação como a internet, TV multimídia entre outros. O uso do computador e a internet têm facilitado esse novo processo de aprendizagem. Segundo Moran (2007, p.3) “a Internet traz a flexibilidade de acesso junto com a possibilidade de interação e participação”. Porém devemos levar em conta que não são todos que tem acesso a essas tecnologias.

Entretanto nas escolas públicas já podemos contar com algumas dessas tecnologias como laboratórios de informática, TV Paulo Freire, DVD etc. Os alunos demonstram grande interesse por esse tipo de aula pois agrupa mobilidade com a tradição de aprender. Para o professor também é satisfatório uma vez que a aula se torna mais atraente e interativa com os recursos áudios-visuais.

A escola neste contexto deve atuar como emancipadora da plena cidadania e não como espaço de reprodução de desigualdades. Temos, portanto a necessidade de utilizar recursos que promovam um efetivo aprendizado. Os objetos de aprendizagem como as ferramentas interativas apoiam o aprendizado de conceitos específicos incrementando e ampliando o processo cognitivo dos educandos.

A consolidação da teoria com a prática auxilia na formação do pensamento crítico, o aluno tem que apropriar-se da realidade humanizada, ele necessita aprender, dominar, desenvolver e adquirir conhecimentos para posicionar-se criticamente.

De acordo com as DCE a escola deve incentivar a pratica pedagógica fundamentada em diferentes metodologias, valorizando concepções de ensino, de aprendizagem (internalização) e de avaliação que permitam aos professores e estudantes conscientizarem-se da necessidade de uma educação emancipadora.

Assim não é a escola que pode transformar a sociedade, a escola, por meio de suas praticas pedagógicas, humaniza o homem e o torna capaz de transformar a sociedade.

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CONCLUSÃO

O trabalho docente tem que ter uma conotação na formação do ser do homem, que deve ser humanizado com o conhecimento científico para o seu desenvolvimento.

As metodologias e estratégias de ensino de Sociologia devem, portanto, extrapolar o senso comum e ampliar a visão de mundo até então construída, sem perder de vista que o tempo de permanência no processo educativo terá um significado próprio e totalmente individualizado a ser respeitado e trabalhado.

Vemos também que é indispensável aprofundar-nos cada vez mais em estudos e ações que possam aperfeiçoar o processo de ensino e aprendizagem, melhorando o desempenho de professores e alunos, em uma perspectiva que forneça subsídios para o tratamento da diversidade na educação de forma contextualizada e que possa garantir um efetivo aprendizado.

Assim o ensino de Sociologia na EJA atende aos objetivos das Diretrizes Curriculares da Educação Básica, que visa um currículo que enfatiza a escola como um espaço de socialização de conhecimentos que contribuam para a critica as contradições sociais, políticas e econômicas presentes nas estruturas das sociedades contemporâneas.

Ressaltamos que de acordo com as DCE a escola deve incentivar a pratica pedagógica fundamentada em diferentes metodologias, valorizando concepções de ensino, de aprendizagem (internalização) e de avaliação que permitam aos professores e estudantes conscientizarem-se da necessidade de uma educação emancipadora.

Dessa forma, a escola cumprirá com a sua função social que é a de trabalhar conhecimento cientifico contribuindo no processo de humanização, uma vez que é um espaço que pode viabilizar a construção de novas praticas para desconstruir preconceitos e discriminações arraigadas na vida social. Dessa forma contribuímos para uma mudança de postura social e formação cidadã do educando da EJA.

REFERÊNCIAS

ABRANTES, Wanda Medrado. A didática da educação básica de jovens e adultos: uma construção a partir da pratica do professor. 241p. Dissertação (Mestrado). Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1991

BALANDIER, G. A desordem: elogio do movimento. Rio de Janeiro: Bertrant Brasil, 1997.

BOURDIEU, P; PASSERON, J. C. A reprodução. Elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975.

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BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. – 5.ed. – Brasília : Câmara dos Deputados, Coordenação Edições Câmara, 2010.

DURKHEIM, É. As regras do método sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

DUMONT, Louis. Homo hierarchicus: o sistema de castas e suas implicações. São Paulo: EDUSP, 1992.

GASPARIN, J. L. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2005.

GAMELAS, Paula. Interdisciplinaridade. In: Dicionário de Sociologia. Porto Editora, 2002. Disponível em <http://www.esas.pt/dfa/sociologia/interdisciplinaridade.htm> Acesso em 20 out. 2012.

LÉVI-STRAUSS, Claude. Antropologia estrutural. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1970.

LOURENÇO, Júlio César. Finalidades, Metodologias e Perspectivas do Ensino de Sociologia no Ensino Médio. Revista Habitus: revista eletrônica dos alunos de graduação em Ciências Sociais - IFCS/UFRJ, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 67-84, dez. 2008. Semestral. Disponível em <http://www.habitus.ifcs.ufrj.br/6finalidades.htm>. Acesso em: 07 set. 2012.

PARANÁ. Diretrizes Curriculares da Educação Básica. Disponível em <http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/dce_socio.pdf>. Acesso em: 07 set. 2012

PICONEZ, Stela Conceição Bertholo. Educação escolar de adultos: possibilidades de reconstrução de conhecimentos no desenvolvimento do trabalho pedagógico e suas implicações na formação de professores. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo. São Paulo, 1995.

MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. Vol. II. São Paulo: DIFEL, 1985.

MORAN, José Manuel. A educação que desejamos: novos desafios e como chegar lá. Campinas, SP: Papirus, 2007.

SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas, SP: Autores Associados, 2005.

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RESUMOS SIMPLES - GRUPO DE TRABALHO II EDUCAÇÃO E ENSINO EM DEBATE: PERSPECTIVAS PARA AS

CIÊNCIAS SOCIAIS

A educação nos limites da simples razão: implicações da lei 10.639 no sistema educacional pernambucano

Pedro Germano ..........................................................................................................................................................................233

Educação e Cultura nos escritos do padre Manoel da Nóbrega (1517-1570)

Ferdnando Marcus Ornellas ...................................................................................................................................................234

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A EDUCAÇÃO NOS LIMITES DA SIMPLES RAZÃO: IMPLICAÇÕES DA LEI 10.639 NO SISTEMA

EDUCACIONAL PERNAMBUCANO

Pedro Germano

Graduando em Ciências Sociais pela UFPE, bolsista PIBID Sociologia (CAPES), pesquisador do NERP (Núcleo de estudos das religiosidades populares) e membro do NEAB (Núcleo de estudos afro-brasileiros) ambos vinculados à UFPE

Graduando em História pela Faculdade de Formação de Professores de Nazaré da Mata

Resumo: O presente artigo discorre sobre as políticas educacionais do século XXI, em especifico sobre a Lei nº 10.639 que altera a lei nº 9.394, de dezembro de 2006 e torna obrigatório o ensino de História e cultura afro-brasileira. O ensino no Brasil é marcado, desde os tempos coloniais, pela ideologia das classes dominantes que marginalizam minorias da participação política, econômica, cultural e renegam seu papel na construção da nação, contribuindo assim para que o quadro de desigualdades se acentue e estas sejam tidas como naturais. O racismo é uma das praticas agudas dessa desigualdade, analiso aqui como essas desigualdades foram produzidas no contexto histórico e se presentificam na atualidade e o papel que cabe a educação e a escola para desmistificar essa pratica, desconstruindo ideologias hegemônicas e formando cidadãos que esteja hábeis a conviver com as diferenças raciais, respeitando os pontos básicos de nossa constituição, a saber: cidadania e dignidade da pessoa humana. Como referencial teórico utilizei a vasta bibliografia sobre relações raciais no Brasil dos autores que pensaram um projeto de nação para o Brasil enquanto estado soberano. Acerca das implicações da Lei nº 10.639 e suas reverberações no ambiente escolar fiz entrevistas com professores da rede privada e pública de ensino para obter informações sobre as possibilidades e dificuldade que os mesmos sentem em trabalhar com a temática que a Lei implica. Concluo então que mesmo com validação da Lei ainda há deficiência em diversos pontos que impedem o pleno funcionamento desta.

Palavras-chave:

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EDUCAÇÃO E CULTURA NOS ESCRITOS DO PADRE MANOEL DA NÓBREGA (1517-1570)

Ferdnando Marcus Ornellas

Acadêmico do curso de História da Universidade Estadual de Maringá (UEM)

Resumo: Este trabalho discute sobre a educação e cultura no olhar do padre Manoel da Nóbrega (1517-1570), primeiro superior dos jesuítas no Brasil Colônia do século XVI. As missões da Companhia de Jesus estabeleceram suas bases na América com o objetivo de resgatar a influência da Igreja Católica na Europa Ocidental. Os jesuítas tinham por objetivo cristianizar os índios, e com isso, torna-los cidadãos portugueses. Esses religiosos usaram alguns elementos dos costumes indígenas, como a língua. Portanto houve trocas culturais entre Jesuítas e indígenas. O padre Serafim Leite foi um dos estudiosos que se empenharam em retratar a vida dos jesuítas na colônia, e em sua obra editada em cinco volumes, a Monumenta Brasiliae, possui 38 cartas do padre Manoel da Nóbrega, e constitui a principal fonte de pesquisa para esta pesquisa.

Palavras-chave: