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Grafismo Natural

um studiolo de formas

Samuel Henrique Wenceslau

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC),apresentado ao Colegiado de Graduação

em Artes Visuais da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Artes Visuais.

Habilitação: Artes GráficasOrientador: Professor Amir Brito Cadôr

Escola de Belas Artes da UFMGBelo Horizonte, 2013

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Para

Ângela

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Ao Criador e a Espiritualidade Amiga

pela proteção e sintonia.

Aos Mestres:

Amir Brito Cadôr, Marcelo Drummond

pela orientações

e Fernanda Goulartpela confiança e reconhecimento

do meu trabalho.

Aos familiares e amigos pelo apoio. A Cida e a todos que me enviaram

exemplares da natureza.

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QuintalCasa VerdeTrês PedrasAlém dos Meus GridsEspaçosOrgamentos

I Quintal

I Natureza à MãeII Studiolo

Referências BibliográfiasIconografica

121620223032

ColetoColeçãoObjeto Orgânico

II Coleto424650

Orgânico GráficoGeotrima OrgânicaGrafismo NaturalDesenho VivoFruto

III Grafismo Natural5866678294

9697

Anexo98V.2

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QuintalI

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Sempre esteve ali, até onde consigo lembrar sempre o via. Na verdade ele estava ali antes mesmo da gente chegar. Quando criança eu nunca lhe dei muita atenção, lembro que nele eu brincava, mas não tínhamos nenhuma relação especial. Pra ir a rua passava por ele todos os dias, saía e entrava correndo sem o olhar, e nem precisava, eu sabia tudo sobre ele e acho que ele também me observava, rapidamente o conferia com o olhar procurando algo novo ou me certificando de que nada havia mudado. Nos dias sem rua, ficava com ele, usava seus espaços. Um pouco autoritário pegava qualquer coisa dele que completasse um dos meus projetos fantásticos.

Mais tarde, um pouco maior, levava algunsamigos para nos divertir e usávamos seu pequeno espaço pra fazer qualquer coisa. Por um longo tempo ele também recebeu um fusca que quase cobria toda sua área.

Quintal

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De todo esse espaço, havia uma parte central, o coração de tudo. Uma parte protegida e um tanto diferente. Encostada na parede dos muros vizinhos e cercada por uma barreira de tijolos, limitava um espaço mais alto que seu restante, acima do nível do chão de cimento. Parecia uma piscina de terra, onde plantas em vasos e latas boiavam ao sol, mas era canteiro. Lembro-me da minha mãe sempre lá entrar e ajeitar as coisas, cortar, arredar, limpar, manter a ordem que não fazia muito sentido pra mim, e ao sair voltava cheia de casos e planos de mudanças.

Minha casa mudou aos poucos, e o chão de cimento sumiu. Foi crescendo um refina-mento em todo o restante que só não pegou a piscina, canteiro. Aumentaram os vasos, as latas e os baldes, e tudo se amontoou. Durante duas décadas ele se transformou várias vezes, plantas morreram e novas

apareceram. Uma dança incessante de folhagens.

Apenas um lado da casa fica perto dele. Eu mudei de quarto e hoje fico do seu lado. Basta olhar para o lado e posso vê-lo pela janela, dá pra conferir tudo sem pressa. Hoje entro nele como minha mãe fazia e com intimidades diferentes, eu e ela mantemos a ordem.

Minha mãe sempre diz que um dia vai reformá-lo, o transformar em um garboso jardim, mas acho que na verdade gostamos dele assim, um emaranhado de verde, uma piscina de terra. Penso que precisamos de seu inacabado, de lhe arrumar, ajeitar e trocar. Ele precisa da gente assim como precisamos nos preocupar com ele.

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Outro dia destampamos a cabeça de Cipriano. Lá dentro

só tinha árvore árvore árvoreNenhuma ideia sequer. Falaram que

ele tinha predominâncias vegetais do que platônicas. Isso era.

(BARROS, Manuel. Memórias Inventadas: A Infância).

Casa Verde Cresci numa cidade de interior, rodeada de verde. Era quase impossível olhar por qualquer janela e não ver uma montanha ou uma árvore robusta. Assim como em minha casa, cultivar plantas sempre foi algo natural e importante. Em toda casa, se não houves-se um pedaço de terra verde, havia vasos.

Sempre que possível íamos a campo, passeios e caminhadas religiosas eram um dos pretextos para andar sobre os morros da cidade. Eu e minha mãe sempre voltávamos desses passeios carregados de coisas, mu-das, pedras e galhos que mais tarde fariam parte de nosso acervo familiar.

O fascínio pelas formas das plantas foi tomando espaço aos poucos. Regá-las ou as trocar de vaso era uma maneira de me aproximar delas, observar sua estrutura, o jeito como as raízes se assentavam no vaso, e como seus galhos se entortavam

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procurando sol. Eu conhecia as plantas mais pela forma que pelo nome ou se servia para isso ou aquilo. Diferente da minha mãe ou minha avó, eu não conversava com plantas, havia certo distanciamento emocional entre elas e eu, conseguia ficar horas olhando para as raízes das mudas antes de colocá-las no vaso, eu queria a forma.

Uma vez na escola plantamos feijão em po-tinhos com algodão e água, foi fascinante ver como ele se transformava, ia criando raízes, um desenho único gravado lentamente entre o algodão. Fiz inúmeras vezes a mesma coisa, 2, 3, 5 de uma vez, sem me importar com o destino das mudas.

Mais tarde conheci a arte do Bonsai e me encantei. A forma como se guia e controla as formas, acentuando cada vez mais os as-pectos das falsas árvores, me fez reafirmar o gosto por tudo aquilo. Comecei então a jun-

tar e colecionar plantas, quanto mais tortas e diferentes melhor. Nas plantas da minha casa procurava identificar e entender cada curva e como elas começavam. Era como um desenho vivo, em constante mudança, em conversa com o ambiente.

Acompanhei fielmente a hera da parede que sorrateiramente e silenciosa cobriu cada tijolo do muro. A adaptação dela as imperfeições do concreto era perfeita. Em pouco tempo se via um tapete vivo que suavizou a paisagem.

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Tijolos invadidos por raízes de plantas.

Coroas de abacaxi são colocadas nos buracos do muro e brotam.

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Folhagem colocada próxima ao muro abandona seu vaso pra viver nele.

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Sempre observei três pedras em cima da TV da sala. Três pedras de formatos peculiares, organizadas de forma linear. Pedras escuras de cantos arredondados, cortadas por cama-das de cores terrosas que parecem listras. Uma parece pirâmide, a outra um sapatinho, e a terceira parece pedra mesmo.

Nunca questionei o porquê das pedras em cima da TV, organizadas daquela forma. As pedras eram do meu pai e isso bastava. Algumas vezes ajudando na limpeza da casa, passava pelas três pedras, ao limpá-las sentia sua forma e as observava, colocando de volta no mesmo lugar e posição.

Três Pedras

As pedras agradaram meu pai. Ao coletá-las ele desviou o destino

natural delas, criando uma narrativa particular. Guardá-las acima da TV

por tanto tempo criou uma relação de intimidade, ao ponto de nomeá-las

e relacioná-las com objetos e formas já conhecidas. Além de seu significado

familiar, as pedras também são uma evidência do colecionismo.

Gerar uma história e identificar as pedras pelas suas formas

faz delas objetos únicos.

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Há poucos dias indaguei meu pai sobre as pedras e ele me disse que as três pedras ele havia coletado quando a casa estava sendo construída. As pedras estavam na areia comprada para a construção, areia de rio.

No extremo oriente, na antiguidade, nasce uma forma de apreciação de pedras, mais tarde a terminação Suiseki é adota definitivamente no Japão para identificar esta forma de arte. Ligada à religião e espiritualidade, valoriza aspectos como lon-gevidade e imortalidade. Formadas através do tempo pelo vento e pela água, as pedras são objetos raros, esculpidos pela natureza. SUI quer dizer "'água" e SEKI, "pedra". As pedras paisagens. Geralmente parecidas com montanhas e ilhas, são coladas em bandejas extremamente rasas, sendo preenchida com água, areia, pedriscos ou musgo.

Fonte: www.atelierdobonsai.com.br/Suiseki.php

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Além dos Meus Grids

Os primeiros trabalhos foram feitos sem nenhum preparo técnico, coletei as folhas ainda verdes e colei no papel, fui construindo montagens/desenhos que mostravam uma estrutura pré-determinada pela proposta de um trabalho acadêmico. A dificuldade no ma-nuseio, de aproximar as folhas a uma forma geométrica, gerou deformidades e revelou aspectos particulares à imagem.

A proposta era digitalizar as colagens e isso me fez estruturá-las com um pensamento bidimensional, desde a escolha de elementos mais planos e menos densos e também na sobreposição das folhas.

“Usar as folhas em meu trabalho foi uma escolha totalmente intuitiva.

A busca por uma linguagem pessoal me impulsionou a descobrir algo que já fazia

parte de mim. Colar as folhas no papel me trazia um frescor e um sentimento inovador, minhas certezas gráficas se

desconstruíam. A sensação de lidar com algo precioso, se misturava com

o deslumbre ingênuo de umadescoberta pessoal.”

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Cores e formatos foram selecionados por afinidades estéticas e pessoais. As formas estruturais das plantas me ajudavam na escolha do posicionamento, eu não apenas encaixava as folhas e galhos no espaço, mas escolhia qual forma se entendia melhor com ele, feito um quebra cabeça, como se nas variadas folhas existisse a peça correta.

Nas montagens seguintes interferi nas folhas antes de colar, separando as estrutu-ras e expondo suas formas que ganharam maior contraste. Os cabos e hastes também eram modelados circunscrevendo e sepa-rando áreas preenchidas.

No mesmo processo de separação de pétalas e folhas, comecei a misturar no mesmo espaço os vários tipos, criando texturas carregadas de formas e inacabadas, sem controlar os elementos que saíam dos limites.

Sobrepondo as folhas, formaram-se áreas maciças, criando diferentes tons nas partes em comum. Com essas áreas maciças a contra forma ganhou destaque, transformando o amontoado de folhas em uma nova forma orgânica.

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O processo de digitalização era a finalização do trabalho. Planificar a imagem, transfor-má-la em arquivo, e novamente encontrar com os habituais caminhos digitais, agora potencializados pela imagem. O escâner, equipamento pelo qual passaram todas as colagens, não as limitou e sim potencializou uma série de desdobramentos.

A imagem digital já não é mais uma cópia, mas a fotografia de um estado irreversível,

registro de instantes únicos, carregados de sentido. As variações de um mesmo

elemento formam uma família, próxima em características, mas nunca idêntica. São

indivíduos singulares e autônomos.

Espaços

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Em cada imagem se vê espaços, um lugar inacessível ao toque. Os ciscos e pedaços

que se soltaram das folhas se juntam aos desfoques causados pelo vidro do escâner,

nos contando de um espaço presente na imagem, na junção das superfícies.

O contato das folhas com o vidro do escâ-ner nivelou ainda mais as imagens criando novos aspectos. Folhas dobradas, rasgadas e amassadas se revelaram na tela do compu-tador. O que eu tinha agora eram cópias fiéis de um momento, de um tempo circunscrito. Paralelamente, o processo de desidratação das folhas coladas sobre o papel não parava.

As dobras e os relevos imagináveis já não estão mais ali, mas olhar nos

permite passear por esses espaços, observá-los, admirá-los.

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Orgamentos³ Sempre gostei de ornamentos e adornos, mesmo antes de saber o que isso signifi-cava. Hoje é clara a ligação dessa admira-ção com o gosto pelas formas orgânicas. Olhar as plantas e suas curvas me mostra complexidade e uma beleza ímpar, desenhos primorosos e elegantes estruturas. As flores lado a lado constroem uma textura viva, sozinhas, são como leves pingentes feitos um a um.

Comecei a fazer as padronagens a partir de um projeto específico: produzir padrões e vinhetas para compor um livro². Com o mesmo processo das colagens utilizei além de folhas, flores e pequenos ramos,

¹Foi a primeira vez que me deparei com um acervo de flores e folhas. A coleção

da Favita (Flávia Andrade Goulart), autora do livro, era um costume antigo.

Com elas se decoravam cartões, acredito que por isso as folhas precisavam estar

bem secas e planas. Fiquei encantado com a forma cuidadosa e carinhosa como eram mantidas e guardadas, isso, me fez pensar na forma como guardava minhas

colagens. Penso que ela já não fazia mais cartões, e mesmo sem função elas

permaneciam guardadas com zelo. Vi em outra pessoa a mesma vontade que eu tinha de estar perto dessas formas,

guardá-las e de maneira intensa foi ativado em mim uma vontade

abafada de colecionar.

²Livro Conversas Com A SaudadeAutora: Flávia Andrade Goulart.

³Termo inventado.

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peças raras de uma coleção¹ primorosa. Par-te desta coleção foi entregue a mim, diversas folhas e flores em diferentes estados de de-composição, lâminas preciosas e frágeis. Um acervo de anos, guardado em livros. Esta-vam bem achatadas e praticamente intactas, todas as pétalas e estruturas se mantinham. Um trabalho feito com paciência e tempo, o que fazia dessa coleção ainda mais rara.

Num processo intuitivo, selecionei as peças da coleção e as digitalizei. Com as imagens digitais, fui aproximando cada elemento e construindo modulos, que multiplicados formaram padrões exclusivos.

Essa coleção pertencia à autora do livro onde as padronagens seriam colocadas, havia então uma maior preocupação em manter o mesmo pensamento visual da coleção, não perder a identidade passada pela autora ao guardar e posicionar cada peça. Mas o processo também fazia parte de mim, era impossível não dialogar. E algumas folhas e flores coletadas por mim se mesclaram as padronagens.

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padronagens, 2011, digitalização de folhas e flores.

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padronagens, 2011, digitalização de folhas e flores.

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ColetoII

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Coleto Após os primeiros trabalhos com as folhas, comecei uma coleta intensa e reveladora. No início a ideia era criar um repertório de variadas formas, e meu olhar se voltou intensamente para as folhas e flores ao meu redor. As primeiras peças do acervo foram coletadas em meu próprio quintal.

A coleta se expandiu, além do meu quintal eu estava atento em todos os lugares que passava. Não havia momento certo e não era programado, em qualquer lugar poderia encontrar uma flor exótica ou uma folha seca retorcida. Durante o processo da coleta outros elementos me chamavam a atenção e logo havia no acervo, sementes, caroços, cascas, gravetos e formas que desconhecia.

Sem nenhum critério específico e pré-deter-minado a seleção dos materiais acontecia pura e simplesmente pelo gosto e afeto pelas formas encontradas. O valor e a beleza

As marcas das folhas são como segredos.

Elas te contam de um tempo vencido.

Elas unem os três tempos.

Um passado intacto de um presente corrente.

Faz-te prever um suposto final, incerto.

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de cada peça se mediam pelos seus aspec-tos materiais. Dificilmente uma folha intacta chamava a atenção, queimaduras, marcas, cortes e torções eram o mais valorizado de se encontrar. Não me interessava um acervo asséptico, mas em alguns casos, se a forma ou textura se sobressaísse à matéria, as coletava ainda verdes. Minha coleta não era científica eu estava a procura de exemplares únicos, de características inéditas.

O arquivamento desse material foi feito de forma analógica, sem cuidados técnicos de conservação. Folhas, flores, brotos e ramos eram guardados em livros e papéis que os pressionavam, ajudando na desidratação e na planificação dos elementos. Já os galhos e sementes eram armazenados em caixas, elementos maiores esperavam por lugares adequados, nesse tempo novas característi-cas surgiam na própria matéria de cada peça e o processo de desidratação era acelerado.

O registro dos elementos era feito pelo escâner, mantendo o mesmo processo feito nas primeiras colagens, até mesmo os elementos mais volumosos passavam por caminho igual.

Construí um grande repertório de imagens digitais, com a desidratação, os elementos passavam por várias fases, mudanças nas cores, texturas e formas. Com isso eu tinha várias imagens de um mesmo objeto, o registro de uma mudança material particular que continuava a acontecer a todo o mo-mento. Meu desejo era registrar todas aque-las mudanças, a transformação do corpo e da existência daquelas estruturas. A cada visita ao acervo, novos aspectos surgiam e mais registros eram produzidos.

II

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Os elementos coletados são sempre potentes. Sua matéria carrega o registro

de uma temporalidade única, de uma experiência marcada pela junção de fatores

do seu ambiente. Tornam-se gabaritos de momentos efêmeros, seu corpo e superfície se fundem com as marcas desenhadas em sua matéria. Deslocá-los do seu ambiente

natural é interferir neste ciclo, é guiar o desenho para outro caminho. E continuar

seu desenho natural em outro meio.

O processo iniciado no momento da coleta se estende por toda sua vida matérica. Guardar estes elementos é revelar seu

passado através de sua matéria. Examinar manchas e formas atípicas

é escutar sua fala por imagens.

Eternizar essas imagens em arquivos digitais é prender pra sempre seus respiros, mapear as várias faces de um mesmo indi-

víduo. Neste momento se ramifica planos a partir da matéria, o elemento segue en-

quanto a imagem se estabiliza. De alguma forma as imagens digitais também possuem

um pouco de toda essa vida que se esvazia.

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II

O elemento matérico é o gabarito perdido de toda a produção, ciente da impossibilida-

de de retornar. A imagem digital por sua vez é autônoma, é matéria e também se perde no tempo, se torna seu próprio referencial.

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Coleção Quando coletar e guardar se tornou uma prática constante eu meu processo, a ne-cessidade de rever e organizar todo aquele material foi imediata.

O acervo, formado de arquivos digitais e materiais se expandia a cada dia. Além da minha própria coleta comecei a receber elementos de amigos e conhecidos. Ao falar sobre o assunto sempre havia alguém com uma planta diferente em casa ou que tinha visto alguma semente estranha pela rua.

Registrar todos esses elementos e seus vários estados me fez construir um extenso acervo digital, quase sempre com duas ou mais imagens de um mesmo elemento. O crescimento desse acervo aumentou a importância da forma, e logo a coleta ficou mais exigente. A idade dos elementos tam-bém os deixava cada vez mais raros.

Admitamos que nossos objetos cotidianos sejam com efeito os obje-tos de uma paixão, a da propriedade

privada, cujo investimento afetivo não fica atrás em nada àquele das pai-

xões humanas, paixão cotidiana que frequentemente prevalece sobre

todas as outras, que por vezes reina sozinha na ausência das outras.

(BAUDRILLARD, Jean. Sistema dos Objetos, p. 93).

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Alguns novos elementos passaram a integrar a coleção, pedras, conchas e outras formas da natureza. A coleção agora não era apenas uma consequência do trabalho, fazia parte dele.

Os elementos não eram coletados apenas para serem utilizados, digitalizados ou ob-servados, mas para fazer parte de um grupo seleto. Mais que um corpo dotado de forma e textura, eles se tornaram objetos carregados de sentido e alma, ligados a mim.

Os objetos nesse sentido são, fora da prática que deles temos, num dado momento, algo diverso, profundamente relacionado com o individuo, não unicamente um corpo material que resiste, mas uma cerca mental onde reino, algo de que sou o sentido, uma propriedade, uma paixão. - (BAUDRILLARD, Jean. Sistema dos Objetos, p. 94).

A coleção passou a ser mais que um objeto de estudo, passou a ser uma paixão. Colecionar elementos únicos, peças raras produzidas pela natureza em momentos e lugares específicos.

II

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A coleção é infinita. Não existe um nume-ro ou qualidades que conclui a incessante procura. Assim como a entrada de objetos há também a saída. A matéria é corpo a fenecer e sua existência é finita, ciente disto a angústia é um fator presente na coleção. Mas esse processo é parte do trabalho, não cabe aqui interromper o processo de decomposição da matéria. A rotatividade de elementos a torna sempre renovada e potente por ser inacabada.

II

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Objeto Orgânico A coleção me permite revisitar esses objetos e a convivência com eles me torna íntimo de suas formas, convivendo com elas desde o momento da coleta, muitas vezes como próprio critério de seleção. Mesmo sabendo que existem elementos semelhantes na natureza, que não foram coletados, eles jamais se igualariam, as suas marcas não poderiam ser reproduzidas com exatidão. Os elementos se tornam indivíduos dotados de personalidade. São seres autônomos. O próprio momento da coleta, a forma como ela se deu, como eles foram encontrados, é uma experiência única entre o objeto e o coletor, essa vivência particular impede ainda mais qualquer chance de replicação.

Ao coletar a folha retiro dela sua função na-tural, seu processo biológico alterado a torna parte de um sistema visual particular. Suas definições biológicas são ignoradas e agora sua importância está na forma, na matéria,

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são classificados por suas alterações, mar-cas do tempo. A paixão pela matéria/objeto é intensa.

Um elemento na coleção nunca mantem o seu estado natural, de origem. Seja na coleta ou no processo de arquivamento suas características se transformam. Sua morfo-logia está ligada a sua função natural e essa forma uma vez alterada deixa de cumprir tal função. Existe ai uma abstração desses ele-mentos durante a posse, que talvez permita chamá-los de objeto.

A posse jamais é a de um utensílio, pois este me devolve ao mundo, é sempre a de um abjeto abstraído de sua função e relacionado ao individuo. Neste nível todos os objetos possuídos participam da mes-ma abstração e remetem uns aos outros na medida em que somente rementem ao indivíduo. Constituem-se pois em sistema graças ao qual o indivíduo tenta reconstruir um mundo, uma totalidade privada.

(BAUDRILLARD, Jean. Sistema dos Objetos, p. 94).

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Grafismo Natural

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Orgânico e Gráfico

A partir da primeira experiência com folhas, as colagens, eu continuei produzindo outros

trabalhos focando as formas orgânicas. Ainda sem saber o que procurava, explorei

principalmente forma e textura, quase sem-pre utilizando meios digitais no processo.

Observando esses trabalhos consegui refletir e fazer ligações visuais e poéticas

que se aproximavam do conceito de Grafismo Natural, criado por mim para

auxiliar na titulação dos trabalhos.

Experimentei vários materiais com o pro-cesso de digitalização. Minha intenção era propor questionamentos sobre a utilização de formas orgânicas nos habituais processos gráficos de produção de imagem. Como se comportavam formas tão arredondadas e imprevisíveis e como melhor transportar sua materialidade e seu volume nos formatos digital e impresso.

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Uma folha por mais planificada que esteja ainda carrega relevos, formados pela sua própria estrutura e por efeitos externos. Esse relevo ao ser digitalizado cria texturas, que alteram a intensidade da cor destas áreas. As áreas mais baixas desfocadas se diferenciam das mais altas e o resultado de toda a textura da matéria é aumentado neste processo.

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Alguns elementos são encontrados totalmente secos e sua modelagem se torna

quase ou impossível, conservando assim sua forma de origem. Sendo mais volumosos ao

ser digitalizados pelo escâner, a distância entre o objeto e o equipamento é maior em algumas áreas. A sombra projetada

reproduz a tridimensionalidade existente durante o registro, gravada pra sempre

na imagem bidimensional.

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Folhas fora do processo de desidratação e com aspectos conservados também foram

utilizadas. A vivacidade da matéria ajuda no processo de planificação. Suas cores

intactas apresentam um maior contraste no desenho da superfície, facilitando a

observação de diferentes grafismos.

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Geometria Orgânica

Tendo o orgânico como o oposto do geo-métrico, na tentativa de tensionar e refletir sobre a impossibilidade das duas definições formais, utilizei elementos naturais para criar estruturas que apresentasse um pensamento geométrico.

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Elementos de tonalidade mais escura contrastam com o branco, destacando mais

seu contorno do que aspectos superficiais de sua matéria. Esse formato mais simples se

assemelha a formas geométricas.

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A repetição do mesmo elemento tem o objetivo de evidenciar ainda mais essas ca-racterísticas. Assim como nos ornamentos,

o agrupamento desses elementos formam desenhos simétricos, ordenando as composi-

ções e suavizando as irregularidades.

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colagens digitais , 2011, digitalização de elementos orgânicos

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Grafismo Natural

Observando folhas em diversos estados físicos, comecei a encontrar nelas aspectos gravados pelos fatores do ambiente e do tempo. Manchas, marcas e queimaduras construindo desenhos e formando texturas singulares que somados às próprias caracte-rísticas da matéria, apresenta Grafismos.

As plantas e elementos da natureza adap-tam a seu ambiente, um aspecto Natural que está ligado a sua sobrevivência e pre-servação no ambiente, alterado ou não pelo homem. Esse processo também modifica sua morfologia padrão criando novas leituras formais.

Unidos ou não, este dois aspectos resultam no que chamo Grafismo Natural, desenho poético carregado de experiência e imprevisí-vel. Percebo que existe ai um novo segmento gerador de imagem que se torna significativo através do meu olhar.

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observatório I, 2012, madeira, vidro, folha de taioba e lampada incandescente

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Durante as coletas encontrei elementos que apresentam grande quantidade de informações em sua matéria, texturas, manchas e cortes.

A sua digitalização, apesar de potente, é uma experiência distante daquela vivenciada na observação direta da matéria. Peças maiores também ficavam limitadas pelas restrições no espaço do escâner, não permitindo a visão de todo o conjunto. Isso me fez repensar o processo de extração visual desses elementos.

Textura

A princípio a folha de taioba em corren-te ressecamento foi colada entre duas

chapas de vidro, onde seus dois lados se tornam expostos e acessíveis ao olhar.

Para reforçar e intensificar a analise da grande gama de informações que

a folha carregava, construí estruturas iluminadas que facilitaram e trouxe

a tona mais facilmente todo esplendor de seus grafismos.

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Observando estruturas naturais maiscomplexas como raízes e galhos, encontrei transformações em sua estrutura.

O caminho encontrado pelas plantas para se adaptar ao ambiente cria formas únicas e totalmente naturais. Mesmo as plantas em vasos procuram uma maneira de melhor comportar suas raízes. Comecei então a procurar outras formas de registro para captar esses desenhos.

Linhas

Ao fotografar as raízes de uma planta, extrapolei o contraste produzido pela

câmera, destacando o desenho formado por suas raízes ainda verdes, a maneira particu-

lar como elas se espalham criaram formas singulares, um desenho composto de linhas finas e grossas, como a estrutura de um rio

que se faz pelo curso natural da água.

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fotografia, 2013, raízes sobre papel

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Na parreira vemos o desenho formado por seus galhos, a forma como ela se prende

a estrutura de arame, criando uma trama natural.

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Trabalhei com vários tipos de registro onde criei imagens utilizando a matéria dos

elementos naturais. A forma de construir e manipular essas imagens dependia

diretamente do elemento natural, de sua forma ou textura. Mesmo modificando essas

formas durante os processos de registro, parte das características da imagem

sempre se referenciava nos aspectos fornecidos pela matéria

A vontade de transformar e manipular totalmente as formas já tão conhecidas por

mim me fez descobrir no desenho um caminho autoral de construção visual.

Desenho Vivo

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série brotos, 2011, nanquim e pincel atômico sobre papel, A5.

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Estudos em pequenos formatos começaram a surgir. Aos poucos foi tomando forma e

sentido. Sem me preocupar em manter uma identidade visual próxima a dos trabalhos

anteriores, testei diferentes maneiras de criar estruturas naturais no desenho.

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Utilizando quase sempre a linha, o desenho crescia naturalmente e junto com o traço,

texturas e estruturas variadas.

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Observando os primeiros desenhos, sele-cionei tipos de traços que mais se asseme-lhavam as plantas, tanto na forma como no crescimento estrutural.

Desta vez, os desenhos foram feitos em tamanho maior, onde pude observar o com-portamento do traço em grande volume.O desenho feito com linhas permite que a forma se construa aos poucos, gradativa-mente, crescendo em torno dele mesmo, semelhante ao crescimento natural das plantas. As linhas também permitem a criação de volumes, de áreas mais concentradas e mais vazadas, assim como texturas variadas.

Após o início do desenho é impossível iden-tificar por onde o processo começou, suas estruturas são entrelaçadas e se espalham de forma intuitiva e natural. O desenho é um misto de referências visuais obtidas por mim através de todo o processo da pesquisa.

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série brotos, 2013, pincel atômico sobre papel, 47x64cm

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série brotos, 2013, pincel atômico sobre papel, 47x64cm

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série brotos, 2013, pincel atômico sobre papel, 47x64cm

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Os exemplares aqui encontrados são únicos. Não se trata de representa-

ções e ilustrações científicas, onde apresentam uma estrutura intacta,

saudável e com todas suas características representadas.

O que vemos nos variados registro da matéria e no desenho, são espécies

irregulares com características anormais. Tanto exemplares digita-lizados como os criados no desenho são dotados de particularidades, o que os tornam raridades dentro de uma espécie e não a representação

geral delas. O que se vê em um, nem sempre se vê em todos.

A imagem tem vida. Durante seu crescimento surgem outras es-

pécies. Aspectos que se repetem e se ramificam, se tornando autônomos e

gerando novas espécies híbridas.

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Relatar o meu trabalho me fez voltar no tempo. Recontar esta trajetória revelou novos questionamentos. Foi como andar novamente pelos mesmos lugares e sentir de novo experiências de dúvida e prazer, foi como olhar de vários ângulos todos os lados, perceber a importância de cada caminho no processo criativo. Textos e reflexões autorais se mesclam ao campo formal da pesquisa, assim como a poética do trabalho que vai de encontro a formalidades gráficas.

Falar sobre meu quintal, minha casa e minha infância, revelou a mim a importância de minhas experiências particulares, e como elas interferem na minha produção artística. O lugar onde nasci e cresci, estará para sem-pre interligados e presentes nas imagens que produzo. Encontrei no meu quintal meu objeto de estudo, minha pesquisa e minha paixão. Explorá-lo é como catalisar sua beleza e a devolver a ele e ao mundo.

Hoje meu quintal cresceu, está bem maior, se expande em imagens.

Cada desenho que faço é uma planta nova no canteiro. Ele não é

mais apenas um lugar físico pelo qual mantenho grande carinho,

mas um terreno infinito, uma cerca mental, onde crescem as alegrias,

as descobertas e as angústias.

É quintal de plantas, de objetos, de formas e desenhos.

É quintal de memórias.

Fruto

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A coleção, um dos mais importantes acon-tecimentos de toda a produção, também se expandiu, em tamanho, importância e com-plexidade, alterando também a coleta que não se resume mais no ato físico. Rever todo meu acervo refinou o modo de guardá-lo, de pensar o registro e a extração de imagens dos elementos/objetos. Agora no Studiolo tenho amostras catalogadas, primorosas e elegantes.

Repensar o desenho me ajudou a vê-lo como parte comum em todo o processo. Trata-se de um pensamento que perpassa e se integra às formas aqui apresentadas. Assumir a linha como uma fórmula, me per-mitiu aproximar de uma experiência natural, sentir o tempo e os ritmo das plantas.

Organizar os conteúdos me fez entender a organicidade do processo de surgimento dos trabalhos. Uma temática que se ramifica, se

interliga e se renova. Imagens infinitas, de vontades próprias.

Mais que um registro reflexivo da minha produção artística, “Grafismo Natural - um studiolo de formas” é também minha contri-buição para as Artes Gráficas. A sinalização de um caminho, uma área de pesquisa que se reforça aqui, para mim e para os que compartilham da mesma paixão pelas formas da natureza.

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Referências Bibliográficas

• MUNARI, Bruno; Design e comunicação visual: contribuição para uma metodologia didática. Tradução de Daniel Santana. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

• BLOM, Philipp; Ter e manter. Tradução de Berilo Vargas. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2003.

• BAUDRILLARD, Jean. O sistema dos objetos. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002.

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Iconografia

• Andy Goldsworthy

• Frans Krajcberg

• Joan Fontcuberta

• Karl Blossfeldt

• Sandra Cinto

• William Morris

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Sementes, eu adoro sementes, são limpas, puras, tem vida. Cada uma de um jeito,

rudes, ásperas, porém com um mistério que me encanta, são de Deus. Outras têm brilho, parecem envernizadas, por isso gosto tanto.

Sementes me lembram da infância, cresci numa aldeia, vivia pelos campos, pés no

chão, terra fina e fria.

As pedras às vezes me machucavam e me chamavam a atenção, suas formas, texturas,

cores variadas. São lindas, lembram bichos, gente, é mistério, que o tempo escreve e

nós não entendemos.

As raízes e os cipós são intrigantes, chegam a dar medo, como tocá-las? Às vezes tenho

a sensação de poder sobre elas, ó engano, são sábias, o segredo está na essência, longe do meu alcance, mas mesmo assim as amo.

Ah! E as árvores, suas formas... Quantas vezes eu cai da que me servia de gangorra,

talvez tudo isso tenha despertado em mim o desejo de cultivá-las. Agora em minha casa

quero tê-las perto de mim.

Natureza à Mãe

As folhas são encantadoras, suas formas lembram a triste geometria, as texturas, algumas ásperas, que chegam a bulir com a pele, mas seus desenhos e contornos me fascinam, as exóticas me intrigam. Pobre homem que por mais que se esforce, jamais criará beleza igual.

A natureza me inspira a retratar o belo, o misterioso, é amor. A arte nasce da nossa observação, o desejo de representar, seja no papel, no barro, na madeira, até em nós mesmos. É o olhar sincero que nos leva a ser audaciosos, quando ainda não entende-mos sua existência em nossa vida.

Dentro do possível ofereço as plantas, flores e pedras um lugar em minha casa, meu co-ração. Ao criador e a natureza meu profundo respeito.

Ângela Maria Wenceslau

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Samuel Wenceslau