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GOVERNO DO PARANÁ

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE

MARIA EUNICE ALVES DE OLIVEIRA

O GÊNERO DISCURSIVO FÁBULA NA PRÁTICA DA SALA DE AULA

JACAREZINHO / PR

2012

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MARIA EUNICE ALVES DE OLIVEIRA

O GÊNERO DISCURSIVO FÁBULA NA PRÁTICA DA SALA DE AULA

Artigo apresentado à Universidade Estadual do

Norte do Paraná, como requisito parcial para

conclusão do Programa de Desenvolvimento

Educacional – PDE, da Secretaria Estadual de

Educação do Paraná - SEED, sob a orientação

da Profª. Me. Patrícia Cristina de Oliveira Duarte.

JACAREZINHO / PR

2012

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O GÊNERO DISCURSIVO FÁBULA NA PRÁTICA DA SALA DE AULA

Autora: Maria Eunice Alves de Oliveira1

Orientadora: Patrícia Cristina de Oliveira Duarte2

RESUMO: O presente trabalho apresenta uma proposta de trabalho pedagógico, que visa à formação de um leitor competente, de forma lúdica e prazerosa, via gênero discursivo fábula nas quintas séries do Ensino Fundamental. Como sabemos, a leitura, infelizmente, é uma prática cultural mais relacionada ao contexto escolar. Além disso, as crianças perdem, logo cedo, o gosto pela leitura. Em virtude disso, escolhemos a realizar nossa proposta de trabalho no 6º ano (5ª série). O reconhecimento de que os alunos da série em questão encontram-se em fase de mudanças significativas, especialmente pela passagem da quarta para a quinta série, ou seja, com a implantação do Ensino Fundamental de 09 anos no Estado do Paraná, do quinto para o sexto ano, a prática de ações comprometidas com a realidade desses alunos tendo em vista essas mudanças, evita possíveis rupturas provenientes do processo de adaptação. Quanto ao gênero eleito, a escolha está relacionada a sua ampla aceitação pelas crianças, uma vez que as fábulas nos falam, por meio de narrativas fictícias, sobre nossa realidade e situações cotidianas como se tivessem sido escritas especialmente para nós, através de uma linguagem simples e de fácil compreensão, mesmo que a moral da história exija uma reflexão profunda, desafiadora. É preciso, porém, que a leitura significativa seja privilegiada, pois se faz necessária para o desenvolvimento das estratégias que possibilitam ao aluno a compreensão e a percepção das informações implícitas. Com atividades simples pode-se despertar o espírito de iniciativa e criatividade dos alunos e estimulá-los a pensar e questionar a prática social. Nesse sentido, a implementação do estudo, procurou desenvolver atividades integradas de leitura, escrita e análise linguística.

Palavras-chave: Leitura Significativa; Formação do Leitor; Gênero Discursivo

Fábula; Plano de Trabalho Docente.

1 Professora de Língua Portuguesa na Rede Estadual de Educação Básica do Estado do Paraná

desde 1984. Graduação em Letras pelas Faculdades Integradas de Marília. E-mail: [email protected]

2 Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Maringá. Doutoranda em Estudos da Linguagem

na Universidade Estadual de Londrina. Graduada em Letras pela Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Jacarezinho. Professora efetiva do Centro de Letras, Comunicação e Artes da Universidade Estadual do Norte do Paraná. E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO

Para que possamos nos integrar ao mundo, às diferentes culturas, e interagir

como sujeito crítico e criativo, é fundamental saber ler e escrever e exercer essa

ação com o fascínio de descobrir o mundo a cada dia. Como a leitura é a prática

cultural mais diretamente ligada à escolaridade, a formação de um leitor competente

exige práticas pedagógicas significativas, envolventes, dinâmicas e permanentes,

visto que a formação de leitores é uma tarefa extensiva, para a vida toda.

No ambiente escolar, o desenvolvimento de uma proposta de trabalho com

gêneros discursivos específicos pode ter a duração de semanas ou meses, todavia

trará contribuições permanentes para a autonomia pedagógica de todos os sujeitos

envolvidos. Para tanto, é preciso planejar, prever, buscar a sintonia de objetivos com

o coletivo escolar, dividir responsabilidades, adquirir conhecimentos teóricos

pertinentes ao tema em questão, aprender a trabalhar em grupo, controlar o tempo,

refletir coletivamente sobre os resultados obtidos.

A oportunidade de participar do Programa Estadual de Educação, PDE,

constituiu-se como um privilégio profissional e pessoal, pois estávamos diante da

realização de um sonho em elaborar e efetivar uma Proposta Pedagógica com um

tempo específico de dedicação aos estudos. Nessa reaproximação com a

universidade e por meio da nossa orientadora de pesquisa apropriamo-nos de um

embasamento teórico adequado para desenvolver o trabalho com atividades

integradas de leitura, escrita e análise linguística com o gênero discursivo “Fábula”

em conformidade com os cinco passos da proposta metodológica de Gasparin

(2009).

O PDE também nos oportunizou a socialização da nossa proposta com

professores de diferentes regiões do nosso Estado por intermédio do Grupo de

Trabalho em Rede. Na interação possibilitada pelo ambiente de aprendizagem

virtual, apropriamo-nos de depoimentos de educadores que foram inseridos no

desenvolvimento do presente trabalho, como também na produção deste texto.

Com o GTR aproximamo-nos de forma efetiva dos recursos tecnológicos e

constatamos o quanto essas ferramentas podem incrementar as ações pedagógicas,

no atual contexto educacional, uma vez que vão de encontro ao perfil dos alunos, às

suas preferências, ao seu estilo de vida.

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Ao socializar nosso trabalho com os professores participantes do Grupo de

Trabalho em Rede, evidenciamos que os mesmos mostraram-se comprometidos

com a proposta de educar para a autonomia utilizando o conhecimento que foi

produzido na interação com seus alunos, num processo de mediação pedagógica,

para resolver com propriedade problemas surgidos no contexto social.

Ao traçarmos nossa linha de trabalho na escola, levamos em consideração a

dificuldade de levar nossos alunos a fazerem da leitura um ato de prazer. Como os

sujeitos dessa pesquisa se encontram numa fase da vida entre a infância e a

adolescência, precisávamos eleger um gênero agradável, ou seja, que trouxesse

uma dose de ludismo e comicidade na sua interpretação. Devido aos fatores citados,

a escolha do gênero fábula pareceu-nos o mais apropriado.

As fábulas nos falam, por meio de narrativas fictícias sobre nossa realidade e

circunstâncias do dia a dia como se tivessem sido escritas especialmente para nós.

Por essa razão, a mensagem implícita nas suas entrelinhas, nunca é antiquada, mas

sim, atual. Ela faz uma abordagem das situações cotidianas por meio de uma

linguagem simples, de fácil compreensão mesmo que a moral da história exija uma

reflexão profunda, desafiadora. Por reunir todas essas condições, o gênero fábula é

apropriado para todos os tempos, todas as culturas, todas as classes de pessoas de

todas as idades.

Na disciplina de Língua Portuguesa, deve haver o compromisso com a

formação e o desenvolvimento do leitor, pois sabemos que quanto mais usamos a

língua materna, mais nos familiarizamos com a mesma e passamos a valorizá-la de

tal forma que sentimos prazer em utilizá-la com propriedade.

Na realidade escolar, constatamos que os alunos não têm contato sistemático

com bons materiais de leitura e também não participam de práticas nas quais ler é

indispensável. Portanto, a prática de ações comprometidas com a realidade dos

alunos, em momentos de mudanças significativas, evita as rupturas que acontecem,

em especial, na passagem da quarta para a quinta série do ensino fundamental.

No Estado do Paraná, com a implantação simultânea do Ensino Fundamental

de Nove Anos no presente ano letivo, houve uma mudança de denominação de

série para ano. Portanto, o que antes era quinta série, passou a ser sexto ano. Essa

mudança exige de todos os educadores das escolas que ofertam o Ensino

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Fundamental, anos finais, um novo olhar, uma vez que são alunos que têm um ano

a mais de escolaridade, mas que já sofreram as consequências de uma falha de

interpretação das leis referentes ao E. F. de nove anos, quando da sua implantação

nas escolas dos anos iniciais. Por todas essas condições que fogem ao objeto do

presente estudo, podemos afirmar que não aconteceu apenas uma mudança de

nomenclatura.

Como professores sabemos da importância de se dar atenção especial aos

alunos de quinta série, agora sexto ano, tendo em vista suas dificuldades de

adaptação, em consequência das mudanças no processo de ensino-aprendizagem,

com vistas a favorecer o desenvolvimento integral dos alunos e o sucesso desse

processo.

2 FORMAR BONS LEITORES COM O GÊNERO FÁBULA

Fundamentados na teoria dos gêneros discursivos proposta por Bakhtin

(2003), em consonância com a metodologia de Gasparin (2009), propomos

relacionar as concepções de linguagem, as teorias que lhe são subjacentes e a

prática do professor, em termos de ensino da língua materna.

Conceber a linguagem como forma de interação significa entendê-la como um

trabalho coletivo, como uma ação orientada para uma finalidade específica nos

diferentes grupos sociais. A linguagem, nesse contexto, é o local das relações

sociais em que falantes atuam como sujeitos. O diálogo, assim, de forma ampla, é

tomado como caracterizador da linguagem.

Consoante a visão dialógica de Bakhtin (1992), é na interação verbal,

estabelecida pela língua com o sujeito falante e com os textos anteriores e

posteriores, que a palavra torna-se real e ganha diferentes sentidos conforme o

contexto. Segundo as Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa -

DCEs (PARANÁ, 2008), pensar o ensino de Língua Portuguesa, a partir dos

postulados teóricos da concepção interacionista da linguagem,

requer que se considerem os aspectos sociais e históricos em que o sujeito está inserido, bem como o contexto de produção do

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enunciado, uma vez que os seus significados são sociais e

historicamente construídos. (PARANÁ, 2008, p. 49)

Bakhtin (2003) afirma que é por intermédio dos enunciados concretos e

únicos que o emprego da língua se efetua, tanto enunciados orais como os escritos.

Para o autor (2003), os diferentes modos de dizer de cada indivíduo são realizados a

partir das possibilidades oferecidas pela língua e só podem se concretizar por meio

dos gêneros discursivos, os quais são enunciados relativamente estáveis,

veiculados nas diferentes áreas de atividade humana.

Segundo o teórico, os gêneros discursivos são constituídos por três aspectos:

o conteúdo temático, que diz respeito à temática que pode ser abordada pelo

enunciador num dado gênero; o estilo, que diz respeito às escolhas linguístico-

expressivas que o enunciador faz no momento de enunciar, tendo sempre em mente

a imagem de seu interlocutor e a imagem que pensa que este tenha dele; e a

construção composicional, que remete às formas de organização textual, ou seja, as

regularidades presentes em cada gênero.

Para Bakhtin (2003, p.262), esses três elementos “estão indissoluvelmente

ligados no todo do enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de

um determinado campo da comunicação”; aspectos também intrinsecamente

associados às condições de produção: quem fala, para quem fala, com que

finalidade, em que época, local e suporte. O autor ainda chama a atenção para o

fato de que as formas composicionais não devem ser analisadas sem se levar em

conta a esfera e o gênero em que se dá a comunicação verbal, pois são estes dois

aspectos que acabam por conferir uma estabilidade “relativa” ao próprio gênero.

O teórico também salienta

a extrema heterogeneidade dos gêneros do discurso, nos quais devemos incluir as breves réplicas do diálogo cotidiano (...) o relato do dia-a-dia, a carta, o comando militar lacônico padronizado, a ordem desdobrada e detalhada, o repertório bastante vário, dos documentos oficiais e o diversificado universo das manifestações publicísticas (...) as variadas formas das manifestações científicas e todos os gêneros literários (BAKHTIN, 2003, p.262).

Para Bakhtin (2003), o gênero discursivo é heterogêneo porque são muitas as

suas manifestações e também porque eles se entrecruzam e se constroem

continuamente. Nessa mesma direção, Marcuschi (2002) ressalta que os gêneros

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existem em número ilimitado, variando em função da época, das culturas e das

finalidades sociais. Diante da heterogeneidade dos gêneros discursivos não há

como reduzi-los a uma lista fechada, pois, na verdade, constituem um inventário

aberto. Bakhtin considera que quanto melhor dominamos os gêneros, mais temos

condições de utilizá-los de forma adequada e competente. (Bakhtin, 2003).

Sendo assim, cabe ao professor decidir qual gênero deve ser ensinado e em

que nível de profundidade ele pode ser ensinado-aprendido. Nesse sentido, a

escolha da fábula para o trabalho nos sextos anos (5ª série) é bastante pertinente,

pois os gêneros pertencentes ao agrupamento da ordem do narrar (DOLZ:

SCHNEUWLY, 2004), por serem muito apreciados pelas crianças, constituem-se

gêneros discursivos privilegiados para o aprendizado em sala de aula, conforme já

dito anteriormente.

2.1 Aprofundando conhecimentos sobre as fábulas

A fábula é um gênero, cujo domínio de comunicação social é o da cultura

literária ficcional, que envolve a capacidade de mimesis da ação através da criação

de uma intriga no domínio do verossímil. (DOLZ: SCHNEUWLY, 2004).

Os gêneros pertencentes à ordem do narrar sempre estiveram presentes na

vida do ser humano, até mesmo em tempos remotos, quando ainda não se tinha

acesso à escrita, o homem já fazia uso de desenhos em cavernas, com o objetivo de

registrar a sua história, isto é, narrar. Partindo desse princípio, trabalhar com os

gêneros da ordem do narrar se faz, realmente, necessário no contexto escolar, já

que narrar é uma prática inerente a todo ser humano.

A fábula é um desses tipos de história que são contadas há mais ou menos

2.800 anos. A tradição sustenta que esse gênero surgiu no Oriente, sendo

particularmente desenvolvido por um escravo chamado Esopo, que viveu no século

VI a.C., na Grécia antiga. (FERNANDES, 2001).

Segundo a autora, geralmente, elas apresentam uma cena vivida por animais,

plantas ou objetos que falam e agem como se fossem seres humanos. É relevante

notar que a característica mais marcante das fábulas é justamente o fato de que as

personagens são sempre animais que vivenciam ações do cotidiano dos humanos.

Eles não são reconhecidos pelos nomes que sequer aparecem, mas por uma

característica que lhes é peculiar. Assim, identificamos a raposa com a esperteza, o

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leão com a realeza, o lobo com a força, o cordeiro com a ingenuidade, o burro com a

estupidez, a formiga com o trabalho, a cigarra com o ócio e tantas outras relações

que, ao longo dos séculos, são cristalizadas e fortalecidas.

As fábulas são histórias “contadas ou escritas para dar um conselho, para

alertar sobre algo que pode acontecer na vida real, para transmitir algum

ensinamento, para fazer alguma crítica, uma ironia etc.” (FERNANDES, 2001, p. 18).

Por isso, nesse gênero, a moral aparece sempre no final da história e já vem

marcada linguisticamente pela expressão “moral da história”. Todavia, a moral pode

também vir no início ou no meio da história, ou pode aparecer na fala de um

personagem. É uma espécie de resumo da intenção do fabulista ao contar

determinada história e serve para mostrar que a fábula tem sua origem nas

conversas das pessoas, pois é como se o fabulista falasse com seu ouvinte ou leitor,

aconselhando ou criticando uma situação, ou até mesmo fazendo uma gozação.

Há de se levar em conta que assim como o conceito de moral muda com o

passar do tempo, também as fábulas irão mudar as noções de moral que são nelas

veiculadas. Evidentemente, a estrutura do texto não sofre alterações, apenas o

conteúdo. Na maioria das fábulas, a moral da história vem destacada com um tipo

de letra diferente e separada do restante do texto.

Ao ler uma fábula, não há como deixar de observar o seu tom jocoso. Nesse

gênero, há sempre uma situação ridícula, engraçada, irônica ou cômica que nos faz

rir da personagem que foi má, ou foi lograda por sua estupidez ou por se achar

extremamente inteligente e esperta.

Ao término da leitura de uma fábula, há sempre um sorriso no rosto do leitor,

um sorriso que não chega a ser uma gargalhada. O que se aprende com as fábulas

está ligado à ironia da situação e o sorriso é meio desconfiado. O leitor se coloca na

situação que acaba de vivenciar e, com isso, questiona o seu próprio

comportamento e até que ponto não estaria agindo como a personagem má lograda.

Nesse sentido, as fábulas, para as crianças, equivaleriam à comédia para os

adultos: o tom moralizante e zombeteiro é o mesmo, assim como a piscadela de

advertência que se pode ler nas entrelinhas.

Essa característica de educar divertindo ou de divertir educando, é bem

própria da fábula: é o ludismo e a aprendizagem que vão lado a lado. A presença

dos animais garante o necessário distanciamento do gênero humano, pois tanto as

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virtudes, quanto os vícios, são alegorizados. A diversão disfarça o didatismo das

fábulas.

Por todas essas características é que as fábulas são histórias tão populares,

conhecidas por muitas pessoas no mundo inteiro, recontadas de boca em boca, de

pai para filho, desde a época de Esopo. Por serem histórias que falam de

acontecimentos da vida, que na maioria das vezes, têm mais de uma forma de ser

entendido, o arranjo entre a história e a moral da história pode ter muitas variações,

assim como são muitas as situações de produção.

Nesse viés, surgem as diferentes versões para uma mesma história.

Fernandes (2001, p. 36) afirma que “os fabulistas podem contar uma mesma história

para pessoas diferentes, num tempo diferente, de um modo diferente e com

intenções também diferentes”. De acordo com a intenção de Esopo, de aconselhar e

de ensinar, suas fábulas apresentam a moral da história bem clara.

Uma das características da fábula é a disputa entre os personagens, de

alguém querer enganar o outro para conseguir algo. Às vezes, as personagens

fazem alguma coisa que causa prejuízo a si mesmas. Há, também, situação de

conflito entre o querer e o poder.

No Brasil, um dos escritores mais importantes que reescreveu antigas

fábulas, criando novas também, foi Monteiro Lobato. Seus primeiros livros dirigidos

às crianças foram publicados em 1921 (século XX). Além dele, vários outros

escritores escreveram e reescreveram fábulas como: Ruth Rocha, José Paulo Paes.

(FERNANDES, 2001).

Monteiro Lobato usa, em alguns casos, os provérbios – dizeres que fazem

parte do conhecimento popular e que a gente repete sem saber quem inventou –

para ser mais bem aplicado ao conhecimento, sendo mais indireto e engraçado.

Diante dessas considerações, para que as fábulas aplicadas sejam objetos de

ensino, de fato, é preciso que a leitura significativa seja privilegiada, pois se faz

necessária para o desenvolvimento das estratégias que possibilitem ao aluno a

compreensão e a percepção das informações implícitas.

Nesse sentido, o trabalho proposto tem a intenção de resgatar a leitura em

sala de aula de maneira lúdica, propiciando aos alunos os estímulos que, muitas

vezes, faltam no ambiente familiar. Assim, o presente artigo procura desenvolver

atividades integradas de leitura, escrita e análise linguística, via gênero discursivo

fábula, em consonância com a proposta metodológica de Gasparin (2009).

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3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O Projeto O Gênero Discursivo Fábula na Prática da Sala de Aula teve como

objetivo oferecer subsídios práticos para que os alunos analisassem textos

pertencentes ao gênero fábula e desenvolvessem os conhecimentos relacionados à

língua e ao saber enciclopédico, necessários para a compreensão textual,

destacando a intertextualidade.

Para a realização desse trabalho optamos pela pesquisa-ação, de abordagem

qualitativa e descritiva, a qual nos pareceu mais adequada para produzir melhorias

no processo de ensino e aprendizagem no espaço restrito da sala de aula,

possibilitando uma proximidade maior com nossos alunos. Os sujeitos da pesquisa

foram os alunos de uma turma de sexto ano do ensino fundamental de um colégio

estadual do município de Andirá.

O planejamento de uma pesquisa-ação é dotado de uma flexibilidade

apropriada aos processos educacionais, uma vez que os mesmos precisam ser

sempre redefinidos, reorganizados, conforme as circunstâncias. Na sala de aula, por

exemplo, o professor, junto com os alunos participantes, precisam sempre redefinir

as ações pedagógicas em busca de um resultado eficaz, efetivo, como fruto de uma

implementação bem planejada.

O material pedagógico elaborado para a implementação no colégio alvo desta

pesquisa foi uma Unidade Didática, tendo como finalidade apresentar contribuições

a um ensino-aprendizagem mais contextualizado de língua portuguesa.

Nessa unidade didática, elaboramos uma proposta pedagógica, a partir da

análise realizada sobre o gênero discursivo fábula. Dessa forma, propomos

algumas sugestões didáticas, relativas ao gênero em pauta, a serem trabalhadas no

sexto ano do Ensino Fundamental. As atividades foram elaboradas sob a

perspectiva da teoria enunciativa bakhtiniana junto à transposição didática versada

por Gasparin (2009). A estrutura de base do Plano de Trabalho Docente (PTD)

utilizado na elaboração do material em questão encontra-se disponível, em forma de

quadro explicativo, no Anexo I, do livro Uma didática para a pedagogia histórico-

crítica, de João Luiz Gasparin.

Apresentamos sugestões didáticas na Unidade Didática, no entanto, não com

a pretensão de torná-las modelos ou receitas, mas como uma possibilidade de

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efetivo trabalho de leitura com o gênero fábula. Isso por entendermos que todo

professor traz em sua práxis uma criatividade que o estimula a realizar adaptações

necessárias ao fazer uso das atividades sugeridas para adequar a proposta aos

seus objetivos, motivações e, principalmente, às especificidades de seus alunos.

3.1 Plano de Trabalho Docente e o gênero fábula

3.1.1 Prática social inicial

O primeiro passo do método dialético de trabalho docente-discente proposto

por Gasparin (2009), o qual parte da prática, vai à teoria e retorna à prática,

caracteriza-se como uma preparação, uma mobilização do aluno para a construção

do conhecimento escolar, ou seja, uma primeira leitura da realidade, um contato

inicial com a temática a ser estudada. É a Prática Social Inicial, a qual pode ser

organizada pelo professor de acordo com os seguintes procedimentos: - Listagem

do conteúdo e objetivos; - Título da unidade: objetivo geral; - Tópicos do conteúdo:

objetivo específico para cada item; - Vivência do conteúdo: o que o aluno já sabe e o

que gostaria de saber mais.

Na Prática Social Inicial, momento inicial, o primeiro passo do método

dialético proposto por Gasparin (2009), o professor faz uma abordagem do assunto

sem apresentar o conteúdo propriamente dito, para conhecer sua prática social

imediata a respeito do conteúdo curricular proposto. É momento de ouvir sobre a

prática inicial mediata, ou seja, aquela prática que não depende diretamente do

indivíduo, mas sim das relações sociais como um todo. O conhecimento dessas

duas dimensões do conteúdo é uma forma básica de criar interesse por uma

aprendizagem significativa e uma prática docente também significativa.

Em relação ao nosso tema de estudo, propomos a seguinte abordagem:

“Você já deve ter lido ou ouvido histórias com animais que falam, sentem inveja,

ciúmes, preguiça, e tantas outras características dos seres humanos, não é?”.

Nesse diagnóstico inicial, o professor deve respeitar os diferentes níveis de

conhecimento que o aluno traz consigo para a escola. É a visão sincrética do aluno,

um conhecimento desordenado como percepção do senso comum, empírica, um

tanto confusa, mas de certa forma natural para o aluno por ser a sua visão de

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mundo. Nessa relação pedagógica dialógica, o docente situa-se à realidade de

maneira mais clara e mais sintética que os alunos, evidentemente.

Com as hipóteses dos alunos listadas, o professor anuncia o conteúdo a ser

trabalhado e pode pedir aos mesmos que relatem uma das fábulas lembradas. Na

sequência, o docente estabelece um diálogo com os alunos sobre o assunto e usos

que fazem dele na prática cotidiana. Isso para descobrir o que os alunos já sabem e

o que gostariam de saber a mais sobre o gênero fábulas, no caso específico.

A Prática Social Inicial é uma contextualização do conteúdo. Nesse momento

promove-se uma conscientização do que acontece na realidade social em relação à

temática a ser trabalhada, ocasião em que o professor evidencia que todos os

assuntos que são desenvolvidos em sala de aula já estão presentes na prática

social, fazendo parte da mesma.

Depois de fazer essa contextualização, sugere-se que o professor apresente

o conteúdo, no caso, o gênero fábula, a organização textual das fábulas, como

também as marcas de linguagem (linguístico-enunciativas), que contribuem para a

construção de efeitos de sentido do texto.

De acordo com Gasparin (2009, p.23), “ouvir os alunos possibilita ao

professor tornar-se um companheiro: gera confiança e possibilita também que a

relação entre educador e educandos caminhe no sentido da superação da

contradição, da dicotomia que possa existir entre eles”.

Vale lembrar que, na perspectiva da pedagogia histórico-crítica, podemos

utilizar, entre outras, duas formas de encaminhar as atividades, ou seja, pelo

“anúncio dos conteúdos” e “Vivência cotidiana dos conteúdos”. (GASPARIN, 2009,

p. 24-26).

O anúncio dos conteúdos realiza-se na prática quando se informa aos alunos

quais tópicos e subtópicos serão abordados nas próximas aulas. Procede-se então a

uma listagem de temas, conteúdos e respectivos objetivos. Esse procedimento

auxilia os alunos a assumirem o encaminhamento do processo de ensino e

aprendizagem.

A vivência cotidiana dos conteúdos é o momento em que os alunos,

estimulados e orientados pelo professor, são desafiados a mostrar tudo o que

sabem sobre o tema apresentado. Assim, faz-se um levantamento sobre a vivência

prática e cotidiana dos alunos em relação ao conteúdo a ser trabalhado, pois os

alunos demonstram o que já sabem teoricamente sobre esse mesmo conteúdo,

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antes que a escola o sistematize. Nesse ponto do trabalho o professor deve procurar

mobilizar, predispor os alunos para a construção do conhecimento, inclusive

aproveitar a curiosidade dos alunos, suas indagações e dúvidas como um convite

para que juntos, professor e alunos, ultrapassem o cotidiano, o imediato, o aparente,

indo além do proposto, do conhecido, do programado.

Constatando que a imaginação dos alunos não tem limites, durante o

desenvolvimento das atividades de oralidade, percebemos o interesse e o

entusiasmo dos alunos em narrar histórias, vividas ou idealizadas, que fizeram parte

da sua vida até o presente momento.

3.1.2 Problematização

A problematização é o segundo passo do método dialético de construção do

conhecimento, elemento chave entre a prática e a teoria, fundamental para o

encaminhamento de todo o processo de trabalho docente-discente. Nesse momento

inicia-se o trabalho com o conteúdo sistematizado, um desafio, ou seja, é a criação

de uma necessidade para que o aluno, por meio de sua ação, busque o

conhecimento. O professor suscita situações-problema que estimulam o raciocínio e

o processo de busca do aluno para a solução dessas situações, para a

aprendizagem significativa (GASPARIN, 2009).

Consoante Gasparin (2009), todo conteúdo listado na Prática Social Inicial

deve ser transformado em perguntas e/ou questões problematizadoras,

classificando-as nas diversas dimensões que o tema comporta, tais como: científica,

conceitual, cultural, social, histórica, econômica, política, religiosa, estética, filosófica,

doutrinária, legal, psicológica, entre outras.

Dentre as dimensões que podem ser estudadas de acordo com o conteúdo,

com o grupo de alunos e com os objetivos, selecionamos a dimensão conceitual, a

dimensão histórico-cultural e a dimensão social do gênero fábula para o trabalho em

sala de aula.

No trabalho com a dimensão conceitual do gênero fábula foi proposto aos

alunos que, primeiramente, procurassem no dicionário o significado da palavra

fábula. Na sequência que fizessem uma pesquisa no dicionário/enciclopédia, com

mais um colega de classe, para buscar a diferença entre fábula e conto de fadas,

registrando tudo por escrito para posterior discussão em sala de aula.

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Na dimensão histórico-cultural interrogamos: - Qual a origem das fábulas? As

fábulas são textos antigos que, em sua origem, não eram escritos para crianças. A

quem se destinavam, então, essas histórias? Por que as fábulas existem até hoje?

Concluídas essas etapas do trabalho, passamos a dimensão social do

conteúdo, levantando as seguintes propostas: - Pesquise sobre a vida e obra de

fabulistas que fizeram parte da história e que você considera importante. - Por que a

fábula é importante na sociedade?

De acordo com Gasparin (2009, p.47), “o importante, nesse momento, é que

os alunos se conscientizem de que problematizar significa questionar a realidade,

pôr em dúvida certezas, levantar questões acerca das evidências, interrogar o

cotidiano, o empírico, o conteúdo escolar”.

Frente aos aspectos arrolados, concordamos com Gasparin (2009),

entendendo que a instrumentalização é o caminho, por meio do qual o conteúdo

sistematizado é posto à disposição dos alunos para que o apreendam, recriem-no e,

ao incorporá-lo, transformem-no em instrumento cultural para a transformação da

realidade.

3.1.3 Instrumentalização

Sempre orientados por Gasparin (2009), partimos para o terceiro passo do

método dialético proposto pelo autor. Nesse momento, conforme já posto, o

conteúdo sistematizado é colocado à disposição dos alunos para que o apreendam,

o recriem e, ao incorporá-lo, transformem-no em instrumento cultural para a

transformação da realidade. O conhecimento começa a ter sentido para todos os

participantes dessa proposta pedagógica, que, como sujeitos da aprendizagem,

estão sendo confrontados com o objeto do conhecimento.

Ainda em Gasparin (2009), encontramos que

Os sujeitos aprendentes e o objeto da sua aprendizagem são postos em recíproca relação através da mediação do professor numa relação triádica, marcada pelas determinações sociais e individuais que caracterizam os alunos, o professor e o conteúdo. (GASPARIN, 2009, p. 51).

Nessa perspectiva, os três elementos pedagógicos são condicionados por

vários aspectos: subjetivos, objetivos, culturais, políticos, econômicos, de classes,

do meio de vivência. A aprendizagem, então, assume as feições dos sujeitos que

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aprendem e do conteúdo de conhecimento apresentado pelo professor que ensina.

(GASPARIN, 2009).

Como a ordenação dos passos do método dialético não é linear, ao organizar

a instrumentalização, cada tópico do conteúdo listado na Prática Social Inicial é

transcrito para esta nova fase, a fim de que aspectos do conhecimento anterior se

juntem ao novo e, assim continuamente, num processo de construir conhecimentos,

por meio de aproximações sucessivas, sejam aprendidas novas dimensões do

conteúdo.

As ações pedagógicas desenvolvidas para garantir que os alunos se

apropriassem do conhecimento em pauta partiram de uma exposição dialogada com

os alunos em que abordamos a origem do gênero fábula, explicando que

antigamente esse gênero discursivo não era contado para criança e sim para

transmitir ensinamentos para os adultos.

Além da exposição dialogada, os alunos foram levados ao Laboratório de

Informática do colégio para pesquisarem sobre fábulas e aproveitarem o

componente visual da internet pertinente ao gênero em questão, riquíssimo

fornecedor de elementos necessários para satisfazer a curiosidade natural dos

alunos nessa fase da escolaridade.

Chamou-nos a atenção o fato de os alunos perceberem que uma mesma

fábula apresenta diferentes versões. Explicamos a todos que isso é possível porque

elas podem ser adaptadas de acordo com os leitores a quem se destinam, à época

em que são escritas e à intenção de quem escreve.

3.1.4 Catarse

De acordo com Gasparin (2009), a catarse é o quarto passo do método

dialético de construção do conhecimento escolar, cuja operação fundamental é a

síntese, ou seja, por meio da apropriação de novos instrumentos teóricos e práticos,

os alunos são capazes de elaborar uma síntese mental sobre o tema, uma

expressão elaborada da nova forma de entender a prática social. É a demonstração

teórica do ponto de chegada, do nível superior alcançado pelos alunos.

Este é o momento em que ocorre a síntese mental, por parte do educando,

dos conteúdos trabalhados. Essa síntese expressa a dimensão do aprendizado do

aluno. É a hora de elaborar questionamentos de avaliação sobre o conteúdo da

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unidade, classificadas conforme as dimensões levantadas na fase da

problematização. Também podem ser propostas produções de textos ou outras

práticas avaliativas do conteúdo, envolvendo as dimensões que foram estudadas.

Foi solicitado aos nossos alunos que respondessem algumas questões

relativas ao gênero fábula seguidas de uma proposta de produção de texto, como

apresentado na sequência.

Indagamos: - O que é fábula? Em relação a essa pergunta, destacamos

algumas respostas dos alunos:

“Fábula é uma história que as pessoas usam para mostrar pra todo mundo o que é certo e o que é errado nas atitudes humanas, mas usando animais como se fosse gente como a gente, pra ensinar sem magoar ninguém.” “As fábulas dão uma lição pra todos nós, porque elas trazem uma moral e só quem faz o bem é que se sai bem no final.” “Nas fábulas os animais são como as pessoas, porque eles falam, trabalham, têm sentimentos, fazem o bem ou o mal. Nessas histórias, os que são bons têm um final feliz.”

Das respostas dadas para a 2ª pergunta “- Existe uma função social para a

fábula? Qual (is)?”, destacamos:

“Com as fábulas nós vemos que fazer o mal não traz felicidade.” “Na vida em sociedade cada um deve contribuir para o bem de todos.” “Todos que trabalham têm mais benefícios.” “Se você quer ter uma vida tranquila tem que fazer por merecer”. “A esperteza nem sempre não é uma coisa boa quando alguém só pensa nele mesmo”. “Não podemos julgar pelas aparências.” “Muitas vezes nos enganamos com as pessoas”.

Na sequência, apresentamos aos alunos a seguinte proposta:

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Agora que você já sabe muitas coisas a respeito das fábulas, você vai produzir

a sua própria fábula. Como vimos durante nosso estudo, os fabulistas (autores

das fábulas) elaboram os textos com a finalidade de transmitir uma lição de

moral, isto é, um ensinamento. A fábula que você vai produzir deve evidenciar

o quanto a preguiça é prejudicial à vida das pessoas. Para isso, imagine a

seguinte situação: seu pai e sua mãe não querem mais trabalhar. É isso

mesmo! Eles cansaram da rotina e decidiram que não vão mais trabalhar. Você

consegue imaginar o que aconteceria na sua casa se tal situação realmente

acontecesse? Pensando nisso, escreva uma fábula para chamar a atenção dos

seus pais sobre as consequências que a atitude deles vai trazer para a vida da

família. Lembre-se, você não pode colocar pessoas como personagens. O

tempo e o lugar devem ser expressos de forma vaga. Você pode aproveitar os

conhecimentos adquiridos nas várias versões da fábula A Formiga e a Cigarra

e fazer mais uma versão para essa história, encaixando a situação descrita

acima. O que você acha? Depois que seu texto estiver pronto, faça uma

ilustração para deixar a fábula mais interessante. Você pode pedir a ajuda dos

colegas para fazer isso. Então, mãos à obra!

A questão intrigou a todos, motivando-os a uma reflexão crítica e criativa

devido à possibilidade de reinventar uma fábula por meio de elementos muito

próximos a todos. Apesar de uma dificuldade aparente, os resultados foram

satisfatórios, como podemos observar nesta amostra:

“Em uma casa pequena, modesta e confortável, vivia uma família de

coelhinhos muito feliz. Nessa casa não faltava nada porque o coelho pai

trabalhava em um restaurante há muitos anos e ganhava bem. A mãe coelha

só trabalhava em casa e cuidava dos filhos. Tinha comida para todos, roupas

e até um carrinho pra levar as crianças para a escola que ficava um pouco

longe. A vida era bem tranquila. Um dia, o pai coelho chegou em casa muito

triste e falou:

_ Meu patrão me despediu porque estou ficando muito preguiçoso e

não estou fazendo meu serviço direito. Os clientes do restaurante estão

reclamando. O que vamos fazer agora?

O tempo foi passando, os coelhinhos foram crescendo, o inverno

chegou e, como o pai coelho não sabia e nem queria fazer mais nada, o

dinheiro para comprar as coisas que precisavam, foi acabando.

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A mãe coelha deu uma sugestão:

_ Vamos vender o carro.

Mas, o dinheiro acabou logo e as despesas eram muitas. As crianças

precisavam de roupas maiores e mais quentes, comer mais porque no frio dá

mais fome. Ficavam gripados e tinham que comprar remédios. Como ir para a

escola com aqueles uniformes pequenos e a pé, na neve, já que nem as

botas de neve serviam mais. Todos ficaram muito tristes, mas não perderam o

amor que tinham uns pelos outros. Até que um dia, a família de coelhos

recebeu uma carta de um parente distante que queria abrir um restaurante e

precisava de um gerente. O pai coelho ficou animado. Não pensaram duas

vezes. Foram embora pra cidade grande cuidar dos negócios do tio coelhão.

Então, a vida voltou ao normal e todos ficaram felizes”.

Esse exemplo de síntese expressou que o aluno entendeu que por meio do

trabalho é que garantimos uma vida digna, com benefícios em todos os aspectos,

como, no exemplo, moradia, saúde, educação e alimentação de qualidade,

transporte, vestimentas.

Podemos observar também que a fábula criada pelo aluno traz um narrador,

personagens, diálogos, tempo, espaço e acontecimento. Isso demonstra que ele

aprendeu a construção composicional do gênero.

A expressão prática dessa nova síntese não se esgotou na produção dessas

fábulas. Apresentamos esses trabalhos no mural do colégio para o coletivo interno

da escola e convidamos os pais para conhecer a produção escrita e visual de seus

filhos. Mesmo sendo uma atividade simples, ela despertou o espírito de iniciativa e

criatividade dos alunos, pois os fez pensar e questionar a prática social.

3.1.5 Prática social final do conteúdo

Essa prática representa o nível de desenvolvimento atual do aluno, ou seja, o

ponto de chegada do processo pedagógico, o qual, na perspectiva histórico-crítica é

o retorno à Prática Social, em que “professor e alunos modificaram-se em relação a

suas concepções sobre o conteúdo que reconstruíram”. (GASPARIN, 2009, p.143).

Nessa fase, para concretizar a compreensão do conteúdo na prática, exige-se

uma ação real do sujeito que aprendeu, uma aplicação em que sejam explícitas as

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intenções do aluno sobre o uso do conteúdo em sua vida cotidiana, na perspectiva

da transformação social.

Na conclusão da presente proposta de trabalho, os alunos apresentaram

dramatizações, reconhecendo o valor da fábula no meio cultural e no processo de

ensino e aprendizagem.

Para professor e alunos, é a nova maneira de compreender a realidade e de

posicionar-se na mesma. Juntos, vão elaborar um plano de ação com o conteúdo

trabalhado, assumindo com o grupo, as ações que vão desempenhar assumindo um

compromisso com a transformação da prática social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Consideramos que o trabalho com a oralidade, leitura e a escrita realizado

com os alunos da 5ª Série/ 6º ano favoreceu o processo de ensino e aprendizagem,

uma vez que a aprendizagem foi construída numa dinâmica em que a cooperação e

criatividade eram complementadas com a mediação do professor.

O professor é quem deve criar condições para que o conhecimento adquirido

seja contextualizado, portanto, significativo para os alunos propiciando assim, que a

aprendizagem realmente aconteça.

O desinteresse que muitos professores afirmam existir por parte dos alunos

em relação à leitura, de uma forma geral, possivelmente é reflexo da falta de

vivência de uma cultura leitora no ambiente familiar e escolar.

Mesmo enfrentando tantos desafios que se apresentam no contexto escolar,

temos diante de nós, educadores, possibilidades reais de estimular a criatividade e a

comunicação dos alunos quando interagimos com os mesmos numa sintonia de

objetivos, sem medo de ousar e utilizar o que mais nos aproxima.

Conscientes da simplicidade da proposta implementada no colégio de nossa

atuação, nosso objetivo maior foi sempre a busca pela qualidade pedagógica de

todas as ações desenvolvidas, o que foi conquistado e revelado no interesse e

envolvimento dos alunos.

Ressaltamos que essa proposta é apenas um pequeno passo para o retorno

dos alunos ao prazer em realizar a leitura dos textos de forma consciente e

autônoma, visando ao enriquecimento de seu universo cultural.

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