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Governo do Estado de Pernambuco
Governador: Paulo Henrique Saraiva Cmara
Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade - Semas
Secretrio: Srgio Lus de Carvalho Xavier
Secretrio Executivo: Carlos Andr Vanderlei Vasconcelos Cavalcanti
Gerente Geral de Desenvolvimento Sustentvel: Paulo Teixeira
Agncia Estadual de Meio Ambiente - CPRH
Diretor Presidente: Eduardo Elvino Sales de Lima
Diretor de Recursos Florestais: Walber Allan de Santana
Diretor de Controle de Fontes Poluidoras: HellderHallender Cruz Nogueira
Diretor de Gesto Territorial e Recursos Hdricos: Nelson Maricevich
Diretor Tcnico Ambiental: Paulo Camaroti
Equipe Tcnica
Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade - Semas
Andrea Olinto
Eliane Basto
GianninaCysneiros
Luiz Costa
Rafael Siqueira
Rodolfo J. V. Arajo
Sidney Vieira
Agncia Estadual de Meio Ambiente CPRH
Carlos Moror
Liana Melo
Mara Braga
Raoni Luna
Apoio Tcnico
Adriane Mota
Fotos
CPRH, Daniel Lippi, Marcus Vinicius, Sidney Vieira & Simone Marques
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PROPOSTA DE CRIAO DA REA DE PROTEO AMBIENTAL
MARINHA RECIFES SERRAMBI
SUMRIO
APRESENTAO ................................................................................................
INTRODUO ......................................................................................................
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1. OBJETIVOS ..................................................................................................... 11
2.JUSTIFICATIVA.................................................................................................. 13
3. DESCRIO DA REA MARINHA .................................................................. 19
4. CARACTERIZAO DA REA PROPOSTA .................................................... 23
4.1. Localizao e limites ........................................................................... 26
4.2. Aspectos do Meio Fsico ..................................................................... 29
4.3. Aspectos do Meio Bitico .................................................................... 40
4.4. Conectividade Ecossistmica ............................................................. 48
4.5. Aspectos do Meio Socioeconmico ................................................... 51
5. PROPOSIO DA CATEGORIA DE MANEJO ............................................... 62
6. SISTEMA DE GESTO INTEGRADO .............................................................. 65
REFERNCIAS .................................................................................................... 69
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APRESENTAO
Pernambuco, assim como o Brasil, surgiu para o mundo pela costa litornea. So 187
quilmetros de ambiente praial, onde o processo de colonizao e ocupao do Estado se
deu beira-mar, e segue at hoje, tendo como base um modelo de desenvolvimento
econmico que impulsionou grandes alteraes, presses, tenses e degradao no
territrio, com efeito cumulativo ao longo do tempo e espao.
O nosso litoral, com beleza cnica impar, um dos mais densamente povoados do Brasil.
a que quase metade da populao pernambucana mora, se alimenta, trabalha, produz,
se movimenta e se diverte. Apesar de sua resilincia, a vida marinha e estuarina de nosso
litoral j demonstra fortes sinais de esgotamento.
Sob o desafio de harmonizar a economia e a ecologia, o Governo de Pernambuco vem
formulando estratgias inovadoras de polticas pblicas ambientais interconetadas que
priorizam a conservao da biodiversidade e do ambiente marinho, visando o
desenvolvimento sustentvel do territrio.
Nesse sentido, a SEMAS e a CPRH vm submeter Sociedade, por meio de Consulta
Pblica, esta proposta tcnica, amplamente debatida com os diversos setores
interessados ao longo dos ltimos 6 meses, e que prope o processo de criao da
primeira Unidade de Conservao Estadual exclusivamente em ambiente marinho a
APA Marinha Recifes Serrambi.
Desenvolvida no mbito do Grupo Tcnico da SEMAS/CPRH, essa proposta tem o
objetivo de integrar e ordenar os mltiplos usos dos 84 mil hectares marinhos situados no
litoral sul pernambucano, envolvendo os municpios de Ipojuca, Sirinham, Rio Formoso e
Tamandar, em harmonia com a conservao dos ecossistemas costeiros.
Desejamos, assim, estimular a dinmica positiva de aes e de compartilhamento de
reponsabilidades em defesa do ambiente marinho do litoral sul de Pernambuco, que
sem dvida um smbolo e orgulho para os pernambucanos, com algumas das praias mais
belas do litoral brasileiro.
Srgio Lus de Carvalho Xavier
Secretrio de Meio Ambiente e Sustentabilidade - SEMAS
Eduardo Elvino Sales de Lima
Diretor Presidente da Agncia Estadual de Meio Ambiente - CPRH
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INTRODUO
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INTRODUO
O litoral pernambucano, um dos mais densamente povoados do Brasil, apresenta
grande beleza cnica, rica biodiversidade e fortes presses de uso pelas populaes
humanas. Moradias, veraneio, turismo, pesca, atividades nuticas, reas porturias, plos
industriais, entre outras atividades socioeconmicas, so alguns dos usos que incidem na
regio costeira e geram impactos diretos ou indiretos na rea marinha.
Tendo em vista a fragilidade dos ambientes costeiros e marinhos e a importncia
de sua conservao, estes usos precisam ocorrer na perspectiva da sustentabilidade,
visando manuteno e o equilbrio da biodiversidade e a perenidade dos servios
ecossistmicos e ambientais, como o provimento de alimentos, lazer e oxignio.
Os ambientes costeiros e marinhos so considerados como reas prioritrias para
a conservao, contempladas em diversos documentos tcnico-cientficos e diretrizes de
polticas ambientais, em mbito internacional, nacional e estadual, inclusive com
recomendaes de criao de Unidades de Conservao (UCs).
Alguns exemplos so a Conveno da Diversidade Biolgica (ONU, 1992);
Conveno de Zonas midas de Importncia Internacional (Conveno RAMSAR, 1971);
reas Prioritrias para a Conservao, Uso Sustentvel e Repartio de Benefcios da
Biodiversidade Brasileira (MMA, 2007); Atlas Recifes de Corais em Unidades de
Conservao Brasileira (MMA/SBF, 2003); Plano de Ao Nacional PAN Peixe-Boi
(MMA, 2010), Atlas da Biodiversidade de Pernambuco (SECTMA, 2002); e a Poltica da
Pesca Artesanal (SEMAS, 2015).
Neste sentido, observa-se que as Unidades de Conservao apresentam-se como
uma importante estratgia para a proteo dos ambientes, tendo em vista que a partir de
sua criao os diversos segmentos atuantes na rea so envolvidos no planejamento e na
definio de aes de conservao, preservao e estmulo aos usos sustentveis das
reas protegidas.
Em Pernambuco h apenas trs Unidades de Conservao estaduais que
contemplam reas marinhas em parte de seus territrios: a APA Fernando de Noronha; a
APA de Santa Cruz, no litoral norte; e a APA de Guadalupe, no litoral sul. Estas,
entretanto, respondem por partes terrestres, alm de suas pores marinhas.
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Sendo assim, o Estado de Pernambuco h anos vem amadurecendo a
necessidade e oportunidade de proteger seu ambiente marinho, e neste momento
apresenta esta proposta de criao da rea de Proteo Ambiental (APA) Marinha
Recifes Serrambi que, sendo aprovada, ser a primeira UC exclusivamente marinha de
Pernambuco.
Esta proposta abrange cerca de 83 mil hectares de rea marinha no litoral sul do
Estado, apresentando conexo com outras Unidades de Conservao em seu entorno,
com potencial para ser trabalhada a gesto com viso integrada do territrio, fortalecendo
a bioconectividade, a manuteno dos estoques pesqueiros e as prticas sustentveis.
O indicativo de Unidades de Conservao no litoral sul de Pernambuco
evidenciou-se em 2006, quando foi apresentado CPRH o Estudo de Impacto Ambiental
(EIA) da Refinaria Abreu e Lima (RENEST - Ipojuca), que apontou a importncia de
criao de um mosaico de UCs marinhas e estuarinas no litoral pernambucano. Em 2013
a SEMAS e a CPRH discutiram sobre a questo e iniciaram a elaborao de uma
proposta, que veio a ser apresentada em 2014 em Consulta Pblica e na reunio do
Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA/PE). Esta foi a proposta de criao da
APA Marinha Pernambuco, que abrangeria todo o litoral pernambucano, e que no foi
aprovada, por ser uma rea muito ampla. No sentido de trabalhar a proposio de criao
de UCs costeiro-marinhas em reas mais especficas, em 2015 a CPRH lanou o Edital
n01/2015, visando o apoio a projetos para definio de reas para criao de UCs, mas
este edital no teve nenhum projeto aprovado.
Em 2016 a SEMAS e a CPRH avaliaram as principais problemticas costeiras e
oportunidades para a criao de UCs no litoral pernambucano, definindo por trabalhar
uma proposta para o litoral sul, em rea com significativa presena de recifes de corais,
espcies ameaas e usos diversos. Neste sentido, em 2017 foi criado um Grupo de
Trabalho com servidores da SEMAS e da CPRH, para a elaborao da proposta da APA
Marinha Recifes Serrambi.
O processo de criao desta Unidade de Conservao ocorreu no perodo de
fevereiro a setembro de 2017, contando com as etapas de elaborao da Proposta
Tcnica e os debates com a sociedade. Este processo foi bastante participativo, tendo
sido realizadas 19 reunies para a socializao e discusso da proposta junto aos
segmentos sociais, contando com o envolvimento dos diversos atores institucionais e da
sociedade civil. Aps as reunies especficas, foi tambm realizada uma Oficina, contando
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com representantes dos diversos segmentos juntos.
Ainda integrante do processo de compartilhamento das informaes e de escuta da
sociedade, foi disponibilizado no site da SEMAS e da CPRH o Resumo Executivo da
Proposta de Criao da APA MAR, o Registro das Reunies com os Atores Sociais e o
Relatrio da Oficina, alm de ter sidodisponibilizado um e-mail para sugestes, dvidas e
interaes sobre a proposta.
O processo participativo visou ampliao do conhecimento sobre a proposta, a
obteno de sugestes e o amadurecimento coletivo da mesma. Contou-se com a
participao de instituies de ensino e pesquisa, Organizaes da Sociedade Civil,
comunidades locais, pescadores, veranistas e as trs esferas do poder pblico, nos
municpios relacionados: Tamandar, Rio Formoso, Sirinham, Ipojuca e Recife. A partir
das apresentaes e discusses realizadas junto sociedade, foram incorporadas
diversas contribuies na Proposta Tcnica.
Assim, a proposta de criao da APA Marinha Recifes Serrambi visa conciliar os
diversos usos da rea, em consonncia com a proteo dos ecossistemas costeiros e
marinhos, potencializando os usos sustentveis do ambiente.
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1. OBJETIVOS
Contituem objetivos da rea de Proteo Ambiental Marinha Recife Serrambi:
I. Proteger a biodiversidade dos ambientes costeiro e marinho, com nfase nas
espcies endmicas, raras e ameaadas de extino, considerando suas
caractersticas e dinmicas ecossistmicas.
II. Garantir a conservao do ambiente recifal, com sua fauna, flora, formao
geolgica e funes ecossistmicas.
III. Garantir a conectividade entre os diversos ambientes, visando conservao da
biodiversidade, recuperao dos estoques pesqueiros e manuteno dos servios
ambientais e ecossistmicos.
IV. Conciliar e ordenar os diversos usos dos ambientes costeiro e marinho,
considerando atividades pesqueiras, nuticas, manejo de reas, turismo e demais
atividades socioeconmicas, compatiblizando-as com a conservao ambiental.
V. Fortalecer a pesca artesanal, incentivando o manejo sustentvel dos recursos
naturais.
VI. Fortalecer o turismo sustentvel, incentivando boas prticas na implantao de
atividades tursticas e o turismo de base comunitria.
VII. Apoiar atividades de pesquisa, produo e sistematizao de conhecimentos
sobre a biodiversidade, aspectos socioambientais e de gesto da rea, entre outros,
valorizando os saberes cientficos e empricos.
VIII. Estimular a participao social, por meio de educao ambiental, prticas
sustentveis e desenvolvimento de estratgias de conservao e preservao.
IX. Garantir a manuteno da paisagem dos ambientes costeiro e marinho.
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2.JUSTIFICATIVA
A proposta de criao da Unidade de Conservao APA Marinha Recifes Serrambi
est fundamentada, sobretudo, na importncia da conservao dos ecossistemas costeiro
e marinho, da potencializao de usos sustentveis do ambiente e da mediao de
conflitos de usos na rea em questo.
Nessa rea so encontrados recifes costeiros, recifes profundos, paleocanais,
pradarias de fanergamas e a conectividade com esturios, constituindo um mosaico de
grande importncia para diversas espcies marinhas, que durante o seu ciclo de vida se
desenvolvem em diferentes ambientes, demonstrando assim uma interconectividade
(FERREIRA & MAIDA, 2006; FALCO, 2012).
Associado a isso, Ray &Grassle (1991) referem-se aos ecossistemas costeiro e
marinho tropicais como os mais ricos e, ao mesmo tempo, os menos conhecidos do
planeta, sobretudo no que se refere biodiversidade. Essas constataes reforam a
importncia do estabelecimento de estratgias para a conservao, a realizao de
pesquisas e a sistematizao de informaes sobre esse ambiente - elementos estes que
devem ser potencializados com a criao da APA Marinha ora proposta.
A criao da APA Marinha Recifes Serrambi corrobora tambm para o atendimento
meta estabelecida na Conveno de Diversidade Biolgica, assinada durante a
conferncia das Naes Unidas durante a Rio 92, da qual o Brasil signatrio. Esta
Conveno um tratado da Organizao das Naes Unidas voltado para a conservao
e proteo da biodiversidade, e objetiva viabilizar at 2020 um percentual mnimo de 10%
das zonas costeiras e marinhas conservadas em reas. Esta deciso segue o
reconhecimento mundial da importncia dos ecossistemas costeiros e marinhos como
fonte de recursos pesqueiros, outros recursos vivos e minerais, manuteno do clima,
proteo da costa, controle de inundaes, usos recreativos, tursticos, paisagsticos,
dentre outros.
Em 1999, com base no Diagnstico Socioambiental do Setor Sul do Litoral
Pernambucano, foi institudo por meio do Decreto 21.972/99 o Zoneamento Ecolgico-
Econmico Costeiro ZECC. Este indica metas ambientais, das quais destacam-se para a
Zona Martima que os recursos marinhos devem ser manejados de forma sustentvel e os
recifes conservados e protegidos e com seu uso ordenado. Alm disso, estabelece como
atividades a serem incentivadas: pesquisa para definir capacidade de suporte dos recifes;
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elaborao do zoneamento e regulamentao do uso dos recifes; ecoturismo marinho;
tecnologia de pesca adequada ao uso sustentvel dos estoques pesqueiros; mecanismos
de fiscalizao para o efetivo cumprimento das leis; e regulamentao e controle da pesca
de arrasto do camaro.
Observa-se ainda que a proposta de criao desta APA est em consonncia com os
estudos e documentos tcnico-cientficos que indicam esse ambiente costeiro e marinho como
rea prioritria para a conservao, conforme alguns relacionados a seguir.A Portaria n.
9/2007, do Ministrio do Meio Ambiente, sobre reas Prioritrias para a Conservao, Uso
Sustentvel e Repartio de Benefcios da Biodiversidade Brasileira (Figura 1), considera a
zona costeira como de extrema e muito alta importncia biolgica e estabelece como uma de
suas diretrizes que as reas marinhas devem ser criadas e geridas visando conservao da
biodiversidade e recuperao dos estoques pesqueiros (MMA, 2007).
Figura 1 - Mapa das reas prioritrias para a conservao, uso sustentvel e repartio dos benefcios da biodiversidade brasileira.
Fonte: MMA (2017).
Outra importante ferramenta que subsidia as aes do Poder Pblico na Zona
Costeira o Macrodiagnstico da Zona Costeira e Marinha - MACRO, instrumento de
gesto do territrio que rene informaes em escala nacional sobre as caractersticas
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fsico-naturais e socioeconmicas da costa (Figura 2). Sua finalidade orientar aes de
planejamento territorial, conservao, regulamentao e controle dos patrimnios natural e
cultural, servindo tambm como um referencial terico para diferentes segmentos da
sociedade que atuam na Zona Costeira, alm de apoio para elaborao de estudos e
pesquisas (MMA, 2008).
O MACRO destaca a importncia da conservao da biodiversidade costeira e
marinha em relao diversidade de espcies, incluindo as que compem os estoques
pesqueiros (peixes, crustceos e moluscos), alm das algas, dos corais e espcies de
mamferos, aves e quelnios. Merecem destaque os mamferos da ordem Sirenia, onde, no
mundo inteiro, h registro de apenas quatro espcies, das quais duas ocorrem no Brasil,
sendo apenas uma delas marinha, o peixe-boi-marinho (Trichechus manatus), mamfero
aqutico mais ameaado de extino do Brasil, que ocorre no litoral pernambucano.
Figura 2 - Mapa Macrodiagnstico da Zona Costeira Marinha / Biodiversidade.
Fonte: MMA (2008).
Nesse contexto, destaca-se a relevncia das formaes recifais para a conservao
da vida marinha. Tal importncia pode ser ilustrada a partir de estudos de Floeter et al.
(2001), que citam a ocorrncia no Brasil, de cerca de 350 espcies de peixes associados
s formaes recifais e com alto grau de endemismo, o que caracteriza os recifes
brasileiros como reas prioritrias para conservao. Ao mesmo tempo, observa-se que os
ecossistemas recifais encontram-se cada vez mais vulnerveis, devido aos impactos
causados pelas mudanas climticas, poluio e sobre-explotao (sobretudo para lazer e
pesca), que ameaam a biodiversidade destes ambientes, como a ictiofaunarecifal.
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Em relao aos aspectos geomorfolgicos, a rea objeto da Unidade de
Conservao caracterizada pela presena de recifes de arenito (beach rocks), que
formam at 3 linhas paralelas costa, e recifes orgnicos (coralneos e alglicos), que
apresentam morfologia irregular e localizam-se prximo praia, ocorrendo de forma mais
expressiva nos trechos entre as praias de Porto de Galinhas e Ponta de Serrambi
(CPRH,1999).
De acordo com o Atlas Recifes de Corais em Unidades de Conservao Brasileira
(MMA/SBF, 2003),os recifes coralneos so considerados o ecossistema marinho de
maior biodiversidade do mundo, tanto em mbito local quanto em mbito regional e global.
Constam como ecossistema prioritrio em diversos atos e convenes internacionais, a
exemplo da Conveno de Zonas midas de Importncia Internacional (Conveno
RAMSAR). Os recifes coralneos foram ainda considerados, no relatrio Reviso Global
das Prioridades para Inventrio de Zonas midas e dos Recursos Provindos dessas reas,
como um dos ecossistemas mais vulnerveis do planeta, ameaado por perda e
degradao de habitat. Nesse documento sugere-se que sejam adotadas providncias
urgentes para assegurar a conservao e uso racional desses ambientes.
Do ponto de vista biolgico, a rea da Unidade de Conservao proposta apresenta
ecossistemas costeiro e marinho tropicais, que so considerados dos mais ricos do
planeta, por conta da grande diversidade de vidas que abriga nos seus diversos
ambientes.
Em relao aos aspectos socioeconmicos, observa-se que a rea costeira e
marinha tem grande relevncia sobretudo para a atividade pesqueira, para o veraneio e
para o turismo atividades essas que so bastente exploradas na rea proposta para a
APA MAR. Neste sentido, este ambiente provedor de alimentos, gerao de renda, lazer
e contemplao, constituindo-se estes tambm como importantes servios ambientais da
rea.
A criao da APA Marinha Recifes Serrambi contribuir para garantir, a partir da
conectividade entre as reas marinhas adjacentes protegidas, o livre fluxo de organismos
durante o seu ciclo biolgico. A conectividade pode ser definida como corredores
ecolgicos ou ligaes entre habitats adjacentes. Desse modo, a conectividade dentro e
entre reas protegidas importante para manter a diversidade, os estoques pesqueiros e
especialmente para manter a resilincia ecolgica (GREEN et al, 2014).
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Apesar de toda a relevncia ambiental e socioeconmica evidenciada e corroborada
pelos estudos e documentos que apontam esta como uma rea prioritria para a
conservao, alguns impactos so observados. A perda de praia recreativa devido ao
avano das construes; o uso de veculos motorizados na faixa de areia; o trfego de
lanchas e motos aquticas de forma desordenada, pondo em risco a integridade fsica dos
banhistas; alm do pisoteamento dos corais, da pesca predatria e da poluio, advinda
sobretudo dos rios que desembocam no mar, constituem ameaas ao equilbrio ambiental
e biodiversidade marinha.Neste sentido, h de se ressaltar ainda que a criao de
Unidades de Conservao constitui-se como uma das mais eficientes estratgias de
conservao, tendo em vista que ao serem criadas, o territrio definido como unidade
protegida passa a ser trabalhado de forma mais estratgica. A partir do aprofundamento do
olhar para a realidade da Unidade, observando-se suas potencialidades e ameaas, tendo
em vista seus objetivos de manejo, so traados mecanismos para a gesto. Salienta-se,
entre outros, a importncia do envolvimento dos diversos segmentos atuantes na rea, a
partir da criao do Conselho Gestor; a elaborao participativa do Plano de Manejo e a
criao de melhores condies para o incentivo a prticas sustentveis no territrio.
Portanto, a criao da APA Marinha Recifes Serrambi representa uma ao do Poder
Pblico Estadual que visa atender urgente necessidade de harmonizar as demandas
sociais, econmicas e ambientais observadas nessa rea do litoral sul pernambucano,
mostrando-se necessria para fomentar o planejamento e gesto ambiental voltados
sustentabilidade dos recursos naturais desse ambiente costeiro emarinho e, sobretudo,
para garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado para a atual e futuras
geraes.
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3. DESCRIO DA REA MARINHA
No Brasil, a Zona Marinha assume uma configurao espacial definida por um
conjunto de leis e decretos publicados pelo Governo Federal, decorrentes de acordos
internacionais assinados pelo Brasil, entre os quais se destaca a Conveno das Naes
Unidas sobre o Direito do Mar (MMA, 2010).
O territrio nacional marinho compreende uma rea aproximada de 3,5 milhes de
km2, integrada pelo mar territorial brasileiro, que abrange 12 milhas nuticas de largura
(22,2 quilmetros) a partir da linha de costa; pelas ilhas costeiras e ocenicas; pela
plataforma continental, que compreende o solo e o subsolo das reas marinhas, que se
estendem alm dos limites do mar territorial; e pela zona econmica exclusiva. Esta ltima
medida a partir do limite exterior das 12 milhas do mar territorial at 200 milhas nuticas
em relao costa (370 quilmetros), incluindo as reas em torno do Atol das Rocas, dos
arquiplagos de Fernando de Noronha e de So Pedro e So Paulo e das ilhas de
Trindade e Martin Vaz, situadas alm do citado limite martimo (MMA, 2008 e 2010) (Figura
3).
Figura 3 Extenso do Territrio Marinho do Brasil.
Fonte: MULTIMAR (2017).
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A plataforma continental representa a extenso do continente no mar, ou seja, a
parte submersa da rea continental. Apresenta-se bastante plana, desde a zona de praia
at a borda da plataforma, onde a declividade se acentua bruscamente. O carter amplo e
plano resultou das atividades de eroso e deposio de sedimentos, intimamente ligadas
aos sucessivos avanos e regresses das guas do mar em relao aos continentes,
associadas s pocas de aumento e diminuio da cobertura de gelo do planeta (Manso et
al., 2003; Camargo, 2016) (Figura 4).
Figura 4 Margem Costeira com destaque para Plataforma Continental.
Fonte: The Delaware & Lehigh National Heritage Corridor (2017).
No Nordeste, a plataforma continental possui largura entre 36 e 55 km e a sua
quebra regio onde esta termina e se inicia a regio do talude acontece entre 40 e 80m
de profundidade, sendo constituda, basicamente, por fundos irregulares e formaes de
algas calcrias. Uma caracterstica notvel, especialmente entre Natal e Aracaju, a
barreira de recifes costeiros que a margeia. As guas do Atlntico Sul, ao largo do
Nordeste brasileiro, pela ausncia de grandes rios e predominncia das guas quentes da
Corrente Sul Equatorial, propiciam umacondio favorvel formao de ambientes
recifais, suportando uma grande diversidade biolgica (MMA, 2008 e 2010, Camargo,
2016).
Em Pernambuco, a plataforma continental apresenta guas relativamente quentes,
salinidade elevada e cobertura sedimentar composta por sedimentos terrgenos e
carbonticos biognicos. O litoral do Estado apresenta uma diversidade de feies
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morfolgicas e ambientes que contemplam a ocorrncia de terraos marinhos, recifes,
depsitos de praias, manguezais e esturios (Dominguez et al., 1990; Manso et al., 2003).
Os recifes constituem uma base de grande relevncia para as complexas
comunidades costeiras e marinhas, pois so importantes agregadores de organismos,
elevando a biodiversidade marinha e reciclando a matria orgnica, sendo um dos mais
produtivos ecossistemas marinhos. De grande importncia ecolgica, social e econmica,
so considerados um dos mais antigos e ricos ecossistemas do planeta (Jales et al., 2012).
A maioria dos ambientes recifais na costa pernambucana se constitui de corpos
alongados e descontnuos, com o eixo maior paralelo costa. As dimenses individuais
desses corpos recifais podem chegar a 10 km de comprimento e a 1 km de largura; e as
guas circundantes podem chegar a 10 m de profundidade. A localizao e a morfologia
geral desses corpos recifais sugerem uma estreita relao com os bancos de arenito que
lhes esto associados (Dominguez et al., 1990) (Figura 5).
Figura 5 Ambientes Recifais (em verde) na rea da APA Marinha Recifes Serrambi.
Fonte: Adaptado de: Diretoria de Hidrografia e Navegao DHN, Marinha do Brasil.
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4. CARACTERIZAO DA REA PROPOSTA
A rea proposta est inserida na Zona Costeira de Pernambuco, instituda pela Lei
n. 14.258/2010, que se estende do municpio de Goiana, ao norte, no limite com o Estado
da Paraba, at o municpio de So Jos da Coroa Grande, ao sul, na divisa com o Estado
de Alagoas. Possuindo uma costa de 187 km de extenso, abrange uma faixa martima de
12 milhas nuticas (considerada mar territorial) e uma zona costeira com faixa terrestre
composta por 21 municpios (figura 6), onde se concentra uma populao de 3.921.857
habitantes (IBGE, 2010).
Figura 6 - Setorizao da Zona Costeira e destaque para a rea proposta.
Fonte: Ag. Condepe/Fidem (2009).
Na Zona Costeira de Pernambuco encontra-se uma multiplicidade de ecossistemas
produtivos e ricos em biodiversidade, que incluem segmentos de plancies recobertas por
coqueirais, remanescentes da Mata Atlntica, esturios com extensos manguezais, croas,
ilhas, restingas, recifes de arenitos e de corais. Alm disso, a bioconectividade entre o
ambiente recifal, o ecossistema manguezal e pradarias de fanergamos ocorrentes na
rea muito contribuem para a reproduo de espcies marinhas e aumento dos estoques
pesqueiros.
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No entanto, as presses humanas nos ambientes marinhos tm provocado efeitos
negativos recorrentes, como a perda de biodiversidade e habitats e, consequentemente,
provocando diminuio dos recursos naturais, declnio da pesca, poluio de praias,
aumento dos processos erosivos, entre outros danos (MMA, 2008).
No litoral sul de Pernambuco crescente o nmero de pessoas que buscam
desfrutar de sua grande beleza paisagstica e riqueza sociocultural, alm da sua
exuberante biodiversidade, destacando-se como um importante polo turstico do Estado.
Por outro lado, ao longo dos anos, foram instalados diversos empreendimentos
imobilirios, como condomnios, resorts e redes hoteleiras, alm de outros equipamentos
de grande porte, como o Complexo Industrial Porturio de Suape, impondo a coexistncia
destes com atividades pesqueiras, tursticas, de esportes nuticos, entre outras (Figura 7).
Esses diversos usos provocam forte presso sobre os ambientes marinhos, complexos e
ao mesmo tempo vulnerveis, apontando para um cenrio que evidencia a necessidade
da interveno do poder pblico, no sentido de proteger e ordenar os usos nessas reas.
Figura 7 Atividades e usos da rea. A) Pesca no ambiente recifal. B) Pesca e mergulho subaqutico. C) Barcos de pequeno porte para pesca ou turismo. D) Uso de jetski como recreao
nutica. E) Passagem de grandes embarcaes comerciais para a regio Porturia.
Fotos: Sidney Vieira
A B
C D E
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4.1. LOCALIZAO E LIMITES
A rea proposta para ser a primeira rea de Proteo Ambiental exclusivamente
marinha do Estado de Pernambuco, a APA Marinha Recifes Serrambi, se situa a
aproximadamente 70 km ao sul da cidade do Recife e est inserida na plataforma
continental do litoral sul pernambucano, abrangendo o mar territorial defrontante com os
municpios de Ipojuca, Sirinham, Rio Formoso e Tamandar, abrangendo uma rea
marinha total de 84.036,79 ha (oitenta e quatro mil e trinta e seis hectares e setenta e nove
ares) (Figura 8).
Figura 8 rea proposta e municpios relacionados com a APA Marinha Recifes Serrambi.
Fonte: Raoni Luna - CPRH, 2017
Seu limite, a norte, definido pelas coordenadas E= 279196,9347m e
N=9055982,5695m, na linha de costa de Pernambuco, instituda pelo Decreto Estadual n.
42.010/2015 (poro sul da praia de Maracape, cerca de 500m ao norte do pontal) e
seguindo perpendicularmente no sentido leste, oceano adentro, a mesma latitude, por
aproximadamente 18 milhas nuticas, at as coordenadas E=311810,4550m e
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N= 9055982,5695m, onde encontra-se com a isbata de 500 metros no talude continental,
definida pela CPRM / ANP no ano de 2013.
A oeste, limita-se com a linha de costa de Pernambuco na extenso litornea do
municpio de Ipojuca, correspondente aos trechos sul da praia de Maracape, pontal de
Maracape, Enseadinha, Ponta de Serrambi, praia das Cacimbas, seguindo at encontrar-
se com os limites marinhos norte da APA de Guadalupe (Estadual), na praia de Toquinho,
no esturio da Barra de Sirinham. A partir deste ponto, a rea proposta segue margeando
os limites norte e leste da rea marinha da APA Guadalupe, at a sua interseco com o
limite norte da APA Costas dos Corais (Federal), nas coordenadas E= 275906,4433m e N=
9035785,3322m.
Seu limite a leste definido pelo contorno do talude continental na regio,
determinado pela isbata de 500 metros, localizado a, aproximadamente, 18 a 21 milhas
nuticas da linha de costa.
A sul, limitada pela coordenada E= 275906,4433m e N= 9035785,3322m e segue
margeando o limite norte da APA Costas dos Corais, adentrando ao mar, at a coordenada
de interceptao da isbata de 500 metros, E= 305768,4334m e N= 9026324,0538m
(Figura 9).
Figura 9 rea proposta para criao da APA Marinha Recifes Serrambi e sua conexo com as APAs Guadalupe (Estadual) e Costa dos Corais (Federal) e outras Unidades de Conservao do
seu entorno.
Fonte: Raoni Luna - CPRH, 2017
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28
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4. 2 ASPECTOS DO MEIO FSICO
4.2.1 CLIMA
Por conta de sua localizao, o Litoral Sul de Pernambuco tem clima tropical mido,
com chuvas de inverno antecipadas no outono - clima As (pseudo tropical) da
Classificao de Koeppen (KOEPPEN, 1948). Relativamente bem distribudas ao longo do
ano, as chuvas so provocadas, sobretudo, pelos ciclones da Frente Polar Atlntica que
atingem o litoral nordestino com maior vigor no perodo de outono-inverno, sendo os
meses de maio, junho e julho os mais chuvosos e outubro, novembro e dezembro os mais
secos (CPRH, 2003).
As temperaturas mdias anuais apresentam uma variao entre 25C e 30C, no
apresentando variaes expressivas. As temperaturas mais elevadas so observadas
durante os meses mais secos. No perodo mais chuvoso a reduo da temperatura no
to significativa, apresentando uma mdia de 23C (Manso, 2003).
O regime de ventos em toda a regio costeira caracteriza-se por ser bastante
regular, em sua sazonalidade, soprando em 90% do tempo do setor E-SE, com
velocidades mdias de 3 a 5 m/s. Os ventos alsios de sudeste e as brisas marinhas
exercem grande influncia nas condies climticas da rea, ora minimizando, ora
maximizando os efeitos trmicos advindos da insolao (Manso, 2003).
4.2.2 HIDROGRAFIA
Quanto hidrografia, considerando que a Unidade de Conservao proposta no
inclui poro continental, sero aqui mencionados os aspectos relativos aos municpios
relacionados em seu entorno imediato, que apresentam forte interface com a APA Marinha
Ipojuca, Sirinham, Rio Formoso e Tamandar.
As bacias hidrogrficas que drenam a rea so todas originadas na vertente leste do
Planalto da Borborema. Nestas bacias a drenagem se faz, segundo uma orientao geral,
de oeste para leste, e desguam diretamente no Oceano Atlntico. Os baixos cursos
dgua se fazem sobre terrenos sedimentares que constituem a regio costeira,
apresentando certa regularidade de fluxo, sendo supridos por duas fontes hdricas:
pluviomtrica e subterrnea. A hidrografia do trecho est constituda, principalmente, pelos
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30
rios Maracape e Formoso (rios litorneos), Sirinham (rio translitorneo) e Aquir (rio
litorneo) (CPRH, 2003; Manso, 2003).
Os rios litorneos, embora de dimenses reduzidas, desempenham importante papel
na manuteno dos ecossistemas e das comunidades do espao em apreo. Incluem-se,
nessa categoria, os rios Maracape e Formoso.
O rio Maracape, tambm localizado no municpio de Ipojuca, nasce prximo PE-
060, em terras do Engenho Todos os Santos, dali seguindo para sudeste at a Plancie
Costeira, que percorre no sentido norte-sul, ladeado por manguezais e restingas, at a
desembocadura no Pontal de Maracape (CPRH, 2003).
O rio Formoso nasce na poro noroeste do municpio de mesmo nome, em terras
do Engenho Vermelho, onde esto localizadas as cabeceiras de seus dois formadores - os
riachos Vermelho e Serra dgua - cuja confluncia se d a montante da sede do Engenho
Changuazinho. A partir desse ponto, j com o nome de rio Formoso, dirige-se para
sudeste, passando pela cidade homnima. Trs quilmetros a jusante desta, o referido rio
alcana a Plancie Costeira dominada por seu amplo esturio que se dilata a nordeste e
norte atravs dos vrios braos constitudos pelos rios Goiana, dos Passos, Porto das
Pedras e Lemenho.
Com seus largos canais, esses rios engendram uma trama compacta de mangues e
salgados que, a oeste, nordeste e norte, se estendem at o sop dos morros e colinas que
bordejam a Plancie Costeira e, a leste, confinam com os terraos marinhos atuais.
Prximo desembocadura, localizada entre a Ponta de Guadalupe e a Praia dos
Carneiros, o rio Formoso recebe o Ariquind e seu afluente Unio - dois importantes
componentes de sua bacia (CPRH, 2003).
O rio Sirinham nasce na Serra do Alho, no municpio de Camocim de So Flix,
com o nome Riacho Tanque das Piabas. Toma, inicialmente, a direo sul e, a seguir, a
direo geral sudeste, cortando os municpios de Bonito, Barra de Guabiraba, Corts,
Ribeiro, Gameleira, Rio Formoso e Sirinham, em cujo litoral desgua aps compor, com
seus vrios braos (rios Arrumador, Trapiche, Aquir, alm do prprio Sirinham), um
amplo e complexo esturio. Neste, se encontram algumas lagoas, numerosas ilhas, um
extenso manguezal com sua variada fauna e cerca de 17 ilhas que so utlizadas por
pescadores que, alm da captura de espcies do mangue e do rio, praticam agricultura de
subsistncia (CPRH, 2003; Manso, 2003).
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31
4.2.3 RELEVO SUBMARINO
De forma geral, a rea proposta para a criao da APA Marinha Recifes Serrambi
apresenta uma regularidade quanto ao seu relevo e composio do fundo marinho,
observando-se a presena de bancos arenosos alinhados linha de costa em reas
frontais desembocadura dos rios Maracape, Sirinham e Formoso, os quais esto
relacionados a antigas barreiras areno-recifais formadas quando o nvel do mar estava
mais baixo. Estes bancos se encontram localizados a uma profundidade mdia de 10 m,
estendendo-se por quase toda a rea (Dominguez et al., 1990; CPRH, 2003; Manso,
2003).
Do ponto de vista de distribuio dos sedimentos, a rea possui o fundo ocenico
formado por areias mdias (30%), areias grossas (24%) e lamas (20%). A fonte principal
de sedimentos para a rea o continente, com constituintes quartzosos predominantes.
Porm, ocorre a presena significativa de sedimentos carbonticos biognicos formados
por fragmentos de algas calcrias e conchas e carapaas de animais marinhos (CPRH,
2003; Manso, 2003; Manso et al., 2003, Jales et al., 2012).
Outra caracterstica importante do relevo submarino para a rea a presena de
antigos canais submersos (paleocanais). H cerca de 20 mil anos, quando o nvel do mar
era muito mais baixo do que o atual, a plataforma continetal da regio (hoje submersa) era
a continuidade das terras emersas do continente e de seus rios e canais. Com o gradual
aumento do nvel do mar, essas terras, rios e canais foram se tornando parte do fundo
marinho. Atualmente, dois antigos canais submersos so identificados na rea proposta: o
canal das Campas (nomeado assim pelos pescadores da regio) e o canal do Meio (Figura
10). Ambos so estudados pela sua possvel associao com a bacia hidrogrfica do Rio
Sirinham (Camargo, 2016).
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32
Figura 10 No quadro vermelho, destaque para os dois paleocanais presentes
na rea proposta para a APA Marinha Recifes Serrambi.
Fonte: Adaptado de CAMARGO (2016).
4.2.4 OCEANOGRAFIA
Segundo levantamentos realizados para a regio, pelos autores CPRH (2003);
Manso (2003), Manso et al. (2003) e a Diretoria de Hidrografia e Navegao DHN, da
Marinha do Brasil, as mars apresentam amplitude e perodo que as classificam nas
categorias de mesomarssemidiurnas, com amplitude mdia de sizgia de 2,0 m e de
quadratura com 0,7 m e respondem primariamente ao forante astronmico.
A temperatura e a salinidade das guas da plataforma continental demonstram um
ciclo sazonal bem definido, apresentando temperatura superficial de 27 a 29C e salinidade
variando entre 37 (no perodo seco) e 28 (no perodo chuvoso). Esses valores
apresentam flutuaes prximas costa, devido influncia dos rios costeiros (Manso,
2003).
As correntes de mars, fluviais e litorneas que atuam na rea agem alterando a
sedimentao e a configurao da forma da costa e de suas praias. Tratando-se de uma
regio de mesomar, as correntes de mar exercem grande influncia, principalmente
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33
quando esto associadas ao perodo de ventos de sudeste e s mars de sizgia. Esta
associao produz intenso processo erosivo em todo o litoral.
Os padres de velocidade de corrente tanto na zona externa dos recifes de arenitos
quanto nas reas entre os recifes e a praia, so da ordem de 0,4 a 0,6 m/s e 0,1 a 0,2 m/s,
respectivamente (Manso, 2003; Manso et al., 2003, Manso et al., 2006).
O litoral pernambucano se caracteriza por ter uma costa com faixa praial estreita,
uma vez que o aporte de sedimento continental mais escasso devido sua evoluo
tectnica, permitindo apenas a formao de rios costeiros ou pequenos rios
translitorneos. Os rios so importantes fornecedores de sedimentos para as regies
litorneas. Na costa do Estado a distribuio dos sedimentos nas praias ocorre de forma
heterognea, predominando as praias de areia mdia intercaladas com algumas praias de
areia fina e raros trechos de areia grossa.
Essa variao, entre outros fatores, devido s diferentes fontes de sedimento que
chegam s praias, dinmica das ondas, s correntes costeiras, forma e dinmica de
cada praia e ao processo de deposio do sedimento atuante em cada trecho do litoral. Na
rea de costa sul, adjacente APA Recifes Serrambi, por exemplo, existe a influncia do
Rio Una, marcada pela presena de cascalhos e baixos teores de carbonatos (< 4,1%) nos
sedimentos das praias da rea, como Vrzea do Una e Praia do Porto (PEREIRA et al., no
prelo).
As praias, de maneira geral, apresentam um perfil transversal com uma forma mais
ou menos cncava. Sua inclinao, basicamente, varia em funo do gro da areia que as
constituem e das caractersticas das ondas que nelas chegam. O ngulo que a onda chega
praia (junto com a velocidade e direo dos ventos) atua de maneira significativa no
desenho da zona costeira, uma vez que este determina o sentido da corrente litornea e o
transporte de areia ao longo do litoral (Manso, 2003; Mallmann et al., 2014).
Estudos recentes, realizados por Pereira e seus colaboradores (2015), a partir de
uma srie de levantamentos de dados histricos de 21 anos (1992 2014) e uma srie
mais atual de um ano (2012 2013), constataram uma predominncia de altura
significativa de onda (Hs) entre 1,5 2,0 m e mdia anual de 1,8 m 0,2; um perodo de
onda (Tp) anual de 10s 0,4 e predominncia de 6s a 10s; e com a direo de onda
variando entre NE e SSE e mdia anual de LSE. O levantamento destes dados tambm
evidenciou uma forte influncia sazonal sobre o clima de ondas.
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34
4.2.5 VULNERABILIDADE EROSO COSTEIRA E MUDANAS CLIMTICAS
De acordo com os resultados das pesquisas globais, Pernambuco um dos estados
mais vulnerveis do Brasil aos efeitos das mudanas do clima. Enquanto na rea litornea
vem sendo intensificado o processo erosivo nas praias, com ameaa iminente ao
patrimnio pblico e privado, a regio do serto e agreste padece do fenmeno das secas.
Na Regio Metropolitana do Recife estes efeitos podem ser agravados pelo aumento
mdio do nvel do mar, tendo em vista a alta densidade populacional do litoral, o percentual
elevado de impermeabilizao do solo e as baixas altitudes da rea costeira (entre 2 e
4m), o que acarreta em grande risco para as cidades.
J no interior, de acordo com os critrios nacionais, o Estado de Pernambuco
possuiu 135 municpios nas reas suscetveis desertificao (ASD), onde vivem, de
acordo com o censo demogrfico de 2000, 2.622.519 milhes de habitantes. Este quadro
pode levar a processos migratrios, deslocando as populaes afetadas para os centros
urbanos que esto em reas costeiras, sobrecarregando os ambientes e servios nesta
regio e agravando ainda mais a condio socioeconmica e ambiental da costa e,
principalmente, marinha (SEMAS, 2011).
Devido grande ocupao das cidades nas reas costeiras, grande parte da costa
brasileira vem sofrendo processos de eroso acelerada, tanto em setores urbanizados
como naqueles ainda no ocupados. Em Pernambuco, dados do Censo/IBGE (2010),
apontam para concentraes urbanas costeiras com aproximadamente 44,58% da
populao do Estado, num espao fsico equivalente a 4,53% do territrio de Pernambuco.
As mudanas climticas podem desencadear ou agravar o fenmeno da eroso
acelerada, ao provocar mudanas no nvel do mar, na distribuio das chuvas e na
freqncia direcional e intensidade dos ventos - fatores que afetam a hidrodinmica, o
balano e a disperso dos sedimentos ao longo da costa. Mudanas na descarga slida de
rios e na frequncia direcional de ondas, no s nas ltimas dcadas como tambm nas
escalas histrica e geolgica, podem acelerar os processos de eroso e/ou avano da
zona costeira, acarretando em grandes prejuzos s cidades costeiras, e biodiversidade
costeira e marinha (SEMAS, 2011).
O aumento de temperatura, provocado pela potencializao do efeito estufa, tem
como causa principal a concentrao de CO2 na atmosfera, sobretudo aps a Revoluo
Industrial, pelo aumento da queima do carvo e do petrleo, entre outros fatores. Esse
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35
excesso dos GEEs (Gases do Efeito Estufa) atinge tambm os ambientes aquticos,
agravado pelas mudanas em correntes, ventos e aumentos de temperaturas, formando
verdadeiros bolses ou piscinas quentes nos oceanos.
Deste modo, os oceanos esto ficando mais cidos e quentes, provocando um
processo de deteriorao de corais e conchas de moluscos, o branqueamento dos recifes
coralneos e arenticos e o empobrecimento dos nutrientes. Consequentemente ocorre a
perda de biodiversidade marinha associada a estes processos e tantos outros
relacionados, como antecipao da primeira maturao sexual em peixes e mamferos
aquticos, mudanas de rotas migratrias, entre outros.
Estudos e levantamentos atuais sobre mudanas climticas, ndices de
vulnerabilidade costeira, descrio do clima de ondas e modelagem numrica das ondas
esto disponveis no Atlas da Vulnerabilidade Eroso Costeira e Mudanas Climticas
em Pernambuco (PEREIRA et al., 2015). Esse estudo classifica a vulnerabilidade atual s
mudanas climticas, para a regio litornea fronteiria rea proposta para a APA
Recifes Serrambi, em trechos com intensidade baixa ou moderada. No mesmo
documento, o litoral sul do Estado considerado o que possui maior extenso de costa
com classificao de intensidade baixa (48%).
Com relao s ondas que atingem o litoral pernambucano, constatou-se, a partir
de uma srie histrica de 1992 a 2014, uma altura significativa da onda (Hs) mdia anual
em torno de 1,8 m 0,2 m e uma predominncia de direo de incidncia entre NE e
SSE com direo mdia anual LSE. Tanto a altura significativa quanto a direo de
incidncia apresentaram variabilidade sazonal (Pereira et al., 2015).
Ao longo do litoral sul pernambucano, de Ipojuca a So Jos da Coroa Grande, a
presena dos recifes na costa mantm sua funcionalidade como obstculos eficazes
ao de ondas incidentes durante a mar baixa. Apenas em certos locais so observados
focos de alta energia prximos praia: em Ipojuca, no norte da praia de Sirinham, e na
poro mais ao norte da praia dos Carneiros, em Tamandar. Durante a mar alta, como
esperado, estes focos se mantm, porm com maior intensidade, e outros novos surgem
e aumentam a incidncia de ondas na praia. Vale destacar que alm das variaes
abruptas da batimetria causadas pelos recifes e bancos de arenito, as modificaes
sofridas pelas ondas se tornam mais complexas devido geomorfologia da costa (Pereira
et al., 2015).
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36
De forma geral, o litoral sul de Pernambuco apresenta uma geologia/geomorfologia
que favorece zonas de mais baixa energia de onda e pontos de intensa difrao e
refrao, em relao ao restante do litoral do estado. Estudos realizados por Pereira e
seus colaboradores (2015) mostraram que os focos de maior energia de onda seguem o
padro atual e continuam na poro mais ao norte de cada baa, como ocorre nas praias
do Cupe e Maracape, em Ipojuca, e na praia dos Carneiros, em Tamandar. Estes
mesmos estudos tambm evidenciam que, a partir de um eventual aumento de 0,5 m no
nvel do mar, os recifes de Porto de Galinhas e Maracape, em Ipojuca, j perderiam
grande parte da funo de proteo da linha de costa e as ondas em torno de 2 m de
altura incidiriam diretamente sobre a praia.
Por outro lado, os recifes de corais de Tamandar a So Jos da Coroa Grande
mostraram a cada cenrio de mar alta que, mesmo em condies extremas de aumento
relativo do nvel do mar (ARNM) e altura de ondas, os mesmos no deixam de interferir
na propagao de ondas incidentes, mas permitem a passagem de ondas de maior
energia que chegam praia em alguns pontos. A variao do ARNM tem papel
importante na alterao da funo dos recifes e bancos de arenito ao longo da costa, o
que favorece a intensificao dos focos de alta energia j existentes e maior ocorrncia
dos mesmos junto praia.
4.2.6 NAUFRGIOS
A rea proposta para a criao da APA Marinha no s possui feies e
caractersticas naturais propcias atividade de mergulho, como tambm abriga estruturas
artificiais que se incorporaram ao meio ambiente, passando a ser espaos habitados pela
vida marinha, formando locus e paisagens atrativas para o mergulho esportivo
contemplativo. So os naufrgios acidentais e artificiais, sendo estes ltimos
deliberadamente afundados com o propsito de se tornarem recifes artificias e,
consequentemente, pontos de atrao de espcies marinhas e de mergulhadores.
A rea da APA Recifes Serrambi possui dois naufrgios artificiais: o ferry boat
Gonalo Coelho (Figura 11) e o rebocador Marte (Figura 12). A regio ainda possui um
naufrgio acidental, o Galeo Serrambi (Figura 13), que provavelmante se trata de um
veleiro de carga (um galeo) afundado por volta de 1700.Logo, trata-se tambm de um
possvel stio arqueolgico.
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Figura 11 Naufrgio artificial Gonalo Coelho(36 m de profundidade mxima, 0835S e 03454O, 15 km da praia de Serrambi).
Fonte: Carvalho, 2017.
Figura 12 Naufrgio artificial Marte (33 m de profundidade mxima, 0835S e 03454O, 12 km da praia de Serrambi).
Fonte: Carvalho, 2017.
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Figura 13 Naufrgio Galeo Serrambi (35 m de profundidade mxima, 0835S e 03454O, 9 km da
praia de Serrambi).
Fonte: Carvalho, 2017.
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4.3. ASPECTOS DO MEIO BITICO
4.3.1. FLORA
A regio costeira do Brasil compreendida entre o estado do Cear e o norte do
estado do Rio de Janeiro abriga a flora de algas mais diversificada do pas. A exuberante
biodiversidade marinha observada, em especial no litoral nordestino, est diretamente
associada s condies ambientais, como temperaturas elevadas e constantes, salinidade,
entre outras. Associa-se tambm a uma extensa rede de substratos favorveis ao
desenvolvimento da biota, como as formaes recifais e os fundos de algas calcreas
(Figura 14), essenciais para a formao de recifes de corais, servindo ainda como
substrato para outras algas e plantas, alm de estabelecer micro-habitats e nichos para
invertebrados (BASSO, 1996; BARBERA, 2003; BJRKETAl., 1995). Apesar de crescerem
sobre os mais diversos substratos, as algas marinhas bentnicas encontram nos recifes,
um dos melhores habitats para o seu desenvolvimento (BERNER, 1990).
Na costa pernambucana so registradas aproximadamente 355 espcies de flora
marinha, segundo pesquisas realizadas no ano de 2011. A flora da regio apresenta uma
marcada diversidade, representada pela ocorrncia de algas tpicas da regio tropical,
como Gracilaria, Bryothamnion, Dictyota, Dictyopteris, Caulerpa, Udotea, Halimeda, entre
outras (MALLMANN, 2011).
Figura 14- Banco de algas calcreas
Fonte: ICMBio (2017)
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Nos diferentes ecossistemas a cadeia trfica tem incio com os produtores, representados
no ambiente marinho pelas micro e macroalgas (Figura 15). Ests, embora ocupem uma
poro relativamente pequena dos oceanos, contribuem diretamente com o equilbrio dos
ecossistemas marinhos, por apresentarem alta produtividade primria costeira, devido
sua biomassa concentrada, alm de desempenharem um papel fundamental na cadeia
trfica (LITTLER, 1984).
Figura 15 - Alga vermelha Janiaadhaerens
Fonte: ALGABASE (2017)
Os recifes de corais, juntamente com as florestas tropicais, so considerados uma
das mais antigas e diversas comunidades naturais do planeta. Essa enorme diversidade
de vida pode ser mensurada pela constatao de que uma em cada quatro espcies
marinhas vive nos recifes de coral. As caractersticas singulares do ambiente recifal,
associada grande importncia da comunidade planctnica nesses ecossistemas, tm
despertado o interesse crescente em estudos na rea, sobretudo buscando avaliar a
capacidade produtiva da comunidade fitoplanctnica (FURNAS et al.,1990; CHARPY &
CHARPY-ROUBAUD, 1990; BLANCHOT & CHARPY,1997; FEITOSA & PASSAVANTE,
2004; FONSECA et al.,2002; MACHADO et al., 2007; FEITOSA & BASTOS, 2007;
MAYAL et al., 2009).
No litoral do Nordeste, principalmente entre os estados do Cear e da Paraba, a
explorao de espcies de interesse econmico, como as algas vermelhas dos gneros
Gracilaria e Hypnea uma atividade relevante. A coleta e a comercializao dessas algas
podem constituir importantes recursos para as comunidades locais, devido sua potencial
utilizao na alimentao humana e de outros animais, alm de servirem como matria-
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42
prima para a produo industrial de ficocolides (polissacardeos que em solues
aquosas se comportam como gel), como as agaranas, carragenanas e alginatos
(OLIVEIRA FILHO, 1998;VIDOTTI& ROLLEMBERG, 2013). Estudos realizados na rea
proposta para a criao da APA Recifes Serrambi apontam alta diversidade e boa
distribuio das espcies fitoplanctnicas, associada ausncia de eutrofizao
(PEREIRA & ACCIOLY, 1988; JALES et al, 2013).
Uma importante representante da flora dessa rea o capim-agulha
(Halodulewrightii), fanergama marinha que ocorre no Brasil, desde o litoral do Piau at o
litoral de Santa Catarina (MAGALHES, 2001). Os prados de capim-agulha, alm de
servirem como habitat para vrias espcies, exerce importante papel no controle da
hidrodinmica na regio costeira, atravs da estabilizao do sedimento (PINTO, 2008).
Essa fanergama marinha (figura 16) tambm representa uma das principais fontes de
alimento do peixe-boi marinho, juntamente com espcies de algas, como
Gracilariacornea, Hypneamusciformes e Soliera sp., alm de folhas de mangue
(Avicennianitida, Rhizophoramangle e Lagunculariaracemosa) (ALVES , 2013; BEST &
TEIXEIRA, 1982; PALUDO, 1997). De hbito alimentar herbvoro, esses animais precisam
ingerir grande quantidade de alimento, comendo todo dia 8 a 13% do seu peso corporal
(BEST, 1981).
Figura 16. Detalhe do peixe-boi se alimentando do capim marinho ou capim agulha (HalodulewrightiiAscherson)
Fonte: Fundao Mamferos Aquticos (2017)
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Estas informaes evidenciam a importncia da conservao da flora marinha para
a manuteno da biodiversidade, incluindo espcies de fauna, a dinmicas ecossitmicas
e sua constituio para gerao de renda e alimentos para a sociedade.
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4.3.2. FAUNA
Os diversos ambientes que compem a costa sul pernambucana, com esturios,
pradarias de fanergamos, recifes costeiros, recifes profundos e a quebra da plataforma,
possibilitam que diversas espcies completem o seu ciclo de vida nessa regio, fazendo
com que essa rea apresente grande diversidade de invertebrados e vertebrados
marinhos,(Figura 17). Para essa rea relatada a ocorrncia de cerca de 15 espcies de
corais, diversos porferos e anmonas, mais de 600 espcies de moluscos, cerca de 740
espcies de crustceos, alm de equinodermos e cerca de 200 espcies de peixes
recifais. Destaca-se ainda a ocorrncia de mamferos aquticos, como golfinhos e peixes-
bois marinhos. Nessa rea podemos encontrar ainda tartarugas marinhas, que se utilizam
das praias arenosas para fazer desovas (FLOETER & GASPARINI, 2001; TABARELLI &
SILVA,2002).
Figura 17. Representantes da biodiversidade do litoral sul de Pernambuco.
Fontes: Daniel Lipi; Marcus Vincius; Sidney Vieira; Google imagens.
Os peixes-bois normalmente apresentam maior ocorrncia em reas marinhas
com extensos esturios conservados, enquanto que golfinhos e tartarugas ocorrem,
sobretudo, em reas com formaes recifais. Tais aspectos demonstram a importncia
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vital de proteo e manejo adequado desses ecossistemas para garantir um futuro
sustentvel s populaes ameaadas pelo desenvolvimento costeiro urbano.
Na regio de abrangncia da APA MAR, alm da ocorrem espcies de interesse
econmico, como os peixes cavala(Scomberomoruscavalla); cioba(Lutjanusanalis);
guarajuba(Carangoidesbartholomaei); dourado(Coryphaenahippurus); tainha/sauna(Mugil
spp.), camurim/robalo(Centropomusspp), agulha(Hemiramphus brasiliensis),
sardinhas(Anchoaspinifer,Centengraulisedentulus,Sardinellaaurita,Sardinella brasiliensis);
crustceos como camares (Penaeusspp), lagostas (Panulirus spp.), entre
outros.Ocorrem tambmalgumas espcies marinhas consideradas em estado de risco ou
ameaadas de extino,comoo mero (Epinephelusitajara) (Figura 18),cavalos-marinhos
(Hippocampuserectus, Hippocampusreidi),o peixe-boi (Trichechusmanatus) (Figura 19),
entre outras, o que refora a importncia de proteo da referida rea (LESSA &
NBREGA, 2000; MMA, 2014).
Fig.18. Peixe mero em ambiente natural.
Foto: Marcus Vincius
Fig.19. Peixe-boi em seu ambiente natural.
Fonte: Fundao Mamferos Aquticos (2017)
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4.4. CONECTIVIDADE ECOSSISTMICA
Estudos recentes demonstram a importncia de se garantir a conectividade entre reas
marinhas protegidas e adjacentes, no sentido de possibilitar o fluxo de organismos ao longo
do seu ciclo biolgico (FALCO, 2012). Assim, a conectividade entre as Unidades de
Conservao de grande importncia para a proteo da biodiversidade marinha, sendo
fundamental a criao de mais reas protegidas, a fim de garantir o livre curso dos indivduos
entre as Unidades. Conectividade refere-se tambm s ligaes ecolgicas associadas aos
habitats adjacentes e distantes (Figura 19), dentro e entre reas protegidas, sendo
importantes para manter a biodiversidade, os estoques dos recursos pesqueiros e
especialmente a resilincia ecolgica (GREEN, 2014).
A existncia de paleocanais na rea pretendida para a criao da APA Marinha amplia
e evidencia a bioconectividade, a partir do uso por diversos organismos, dessas feies
geomorfolgicas, caracterizadas por canais profundos, que surgiram h cerca de 20 mil
anos. So exemplos algumas espcies de peixes que fazem agregao reprodutiva na
quebra da plataforma e se utilizam desses canais para a locomoo entre os ambientes
marinhos que compem o mosaico de ecossistemas formados pelo talude, recifes
submersos, recifes costeiros, pradarias de fanergamos e esturios (figura e 20)
(CAMARGO,2016).
Figura 20- Esquema ilustrando a conectividade entre os prados de Fanergamos, manguezais, recifes de corais e a quebra da plataforma continental.
Fonte: Modificado a partir de Mumby et al, 2004.
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Figura 21 A - Peixe em deslocamento no paleocanal. B Peixes na regies prximo ao paleocanal.
Fonte: Joo Camargo
Alguns estudos demonstram que reas marinhas protegidas mais extensas
oferecem maior proteo biodiversidade (GREENET al, 2014; HALPERN, 2010). Uma
rede de Unidades de Conservao permite maximizar a conectividade entre UCs
individuais, garantindo a funcionalidade ecolgica e a produtividade da rea protegida e
do entrono. Tambm de grande importncia a demarcao de reas fechadas dentro
das reas protegidas, para servirem como refgios para o desenvolvimento da fauna
marinha e a recuperao de estoques pesqueiros, constituindo-se como distribuidor de
indivduos e possibilitando uma atividade pesqueira mais sustentvel (HALPERN et al.,
2010; HARRRISON et al., 2012).
Desta forma, a conectividade entre os ecossistemas marinhos representa um
importante argumento para a implantao de novas reas marinhas protegidas. Vale
ressaltar que a rea proposta para a criao da APA Marinha Recifes Serrambi contgua
aos limites da rea marinha da APA de Guadalupe e da APA Costa dos Corais, cumprindo
tambm com essa perspectiva de bioconectividade, a partir do mosaico de Unidades de
Conservao. Nos limites com a rea terrestre, a APA MAR tambm apresenta
conectividade com a APA Estuarina dos Rios Sirinham e Maracape, apresentando
potencial para o fluxo de diversas espcies que passam parte de sua vida nos
manguezais, que so considerados berrios e importantes reas de alimentao para a
maior parte das espcies marinhas.
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4.5. ASPECTOS DO MEIO SOCIOECONMICO
A rea proposta para a criao da APA Marinha Recifes Serrambi, localizada no
Litoral Sul do Estado, engloba em sua retaguarda os municpios de Ipojuca, Sirinham, Rio
Formoso e Tamandar. A rea marinha, que inclui em torno de dezoito milhas nuticas,
abriga expressivo ecossistema recifal, que junto s belezas cnicas da orla martima,
servem de atrativo atividade turstica e de veraneio, cujas contribuies so essenciais
s economias locais.
O litoral sul de Pernambuco apresenta-se como o principal plo de desenvolvimento
turstico do Estado. Suas guas transparentes e mornas, suas paisagens, a tranquilidade e
a infraestrutura turstica atraemmilhares de visitantes de todo o Brasil e de outros pases.
Especificamente na parte do litoral relacionada rea proposta para a criao da APA
Marinha, observa-se que algumas praias so bastante utilizadas por turistas e veranistas,
sobretudo no perodo de setembro a fevereiro, como o pontal de Maracape, Enseadinha,
Serrambi e Toquinho. Alguns trechos, entretanto, so formados por praias quase virgens,
por no possurem loteamentos de casas de veraneio, nem servios de apoio ao turismo.
Outro uso bastante comum na rea a prtica da pesca artesanal. Estas duas
atividades tusimo e pesca ocorrem de forma complementar na regio litornea. Embora
algumas vezes ocorram confitos de interesses de usos da rea costeiro-marinha, essas
atividades socioeconmicas predominantes devem ser trabalhadas na perspectiva de usos
sustentveis, a partir de ordenamentos e estmulos a boas prticas de manejo.
As APAs marinhas, que so reas constitudas de bens de uso comum, possibilitam
um manejo integrado e ecossistmico dos diversos usos, de modo a permitir a conciliao
das atividades tradicionais, como a pesca e o turismo sustentvel (MMA, 2007).
Ao mesmo tempo, essas potencialidades convivem lado a lado com atividades
industriais e porturias, atreladas a setores estratgicos para o desenvolvimento estadual.
O quadro econmico dos quatro municpios representa uma contribuio de cerca de
5,67% do Produto Interno Bruto (PIB), em valores correntes do Estado de Pernambuco
(CONDEPE-FIDEM, 2013).
A rea marinha, do ponto de vista econmico, importante para o transporte
martimo, o turismo e a pesca, bem como tem potencial mineral, energtico, bioqumico e
farmacolgico. Em contraponto, observa-se poluio oriunda de fontes terrestres
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relacionadas ao desenvolvimento e ao adensamento daocupao humana, como a
deposio irregular de resduos slidos, efluentes domsticos e industriais, sem
tratamento, com agrotxicos e vinhoto. Verificam-se tambm outros fatores que podem
gerar degradao,como o turismo desordenado, transporte martimo e pesca predatria,
causando ameaas biodiversidade, ao equilbrio ambiental e qualidade das praias,entre
outros impactos significativos, reais ou potenciais.
Observa-se que alguns desses impactos que se refletem na rea da APA proposta
so decorrentes de usos que ocorrem no seu entorno, tendo em vista que a rea toda
marinha. Neste caso, alguns conflitos diretos so reduzidos, tendo em vista que no
acontecem na rea proposta alguns dos impactos e conflitos tpicos de Unidades de
Conservao que possuem reas no continente. oportuno, portanto, o estabelecimento
de estratgias especficas para a gesto do ambiente marinho, que tambm possui seus
fatores de presses antrpicas e de degradao ambiental.
Vale salientar que a rea proposta para a criao da referida Unidade de
Conservao toda constituda de bens de uso comum, no abrangendo terrenos
privados, por se tratar de reas de praia e de mar. O principal desafio refere-se
necessidade de um manejo integrado das atividades que acontecem na rea direta e
indiretamente relacionadas APA, de forma que permita a conciliao das atividades
tradicionais, como a pesca artesanal, com o turismo e o trfego de embarcaes, entre
outros usos.
4.5.1. POPULAO E EXPANSO URBANA
A populao residente nos quatro municpios situados na retaguarda da APA
Marinha proposta (Ipojuca, Sirinham, Rio Formoso e Tamandar) abrange quase 4
milhesde habitantes, com densidade demogrfica em torno de 900 hab/km2, o que
representa a maior densidade do Estado, concentrando 56% da populao urbana de
Pernambuco. Com uma populao total de 163.799 habitantes (IBGE, 2010), os
municpiosdetm 4,17% do contingente demogrfico da Zona Costeira de Pernambuco
(Tabela 1).
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Tabela 1 Caracterizao da rea e populao dos municpios envolvidos, comparados aos dados
da capital pernambucana, da Zona Costeira e do Estado
Fonte: IBGE(2014)
Apesar de ter ocorrido aumento na populao costeira na regio Nordeste no
perodo de 1991 a 2010, em Pernambuco foi verificada uma reduo da taxa demogrfica
dessa populao, passando de 1,74% ao ano para 1,01% no perodo compreendido entre
os anos 2000 a 2010.
Ao mesmo tempo em que foi observada uma reduo do crescimento da zona
costeira, ocorreu um crescimento populacional no interior (de 0,76% para 1,09%),
provavelmente em funo das novas polticas de fortalecer a interiorizao da economia do
Estado, mantendo, no entanto, a tendncia de reduo do crescimento populacional do
Estado (de 1,18% para 1,06% nos mesmos perodos).
A acelerao do processo de expanso urbana da da orla martima, a partir dos anos
setenta, tem como fator principal a descoberta das praias do Litoral Sul como opo de
veraneio e lazer de fim de semana, da classe mdia e mdia alta do ncleo metropolitano
e dos centros urbanos de porte mdio, em fuga das praias de Recife e municpios vizinhos
j, naquela dcada, submetidas a acelerado processo de adensamento populacional.
Foi o perodo que houve a implantao, ao longo de toda orla, dos loteamentos de
veraneio, dentre os quais figuram: Braslia, Las Vegas, Campas I, II e III, Alvorada, Praia
Tamandar e Anaizabela, em Tamandar; Aver-o-Mar, Praia do Guaiamum e Praia de
Sirinham, em Sirinham; Marinas do Aquir, Enseada de Serrambi e Ponta de Serrambi,
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54
em Ipojuca. A ocupao desses loteamentos tem lugar a partir da dcada de oitenta e
ocorre em ritmo acelarado, envolvendo, com freqncia, aterro de mangue, maceis e
gamboas, destruio de dunas e privatizao de trechos da praia atravs de muros,
rampas e outras construes que impedem o acesso pblico a essas reas (CPRH,2003).
4.5.2 VETORES DE DINAMIZAO ECONMICA E DEMOGRFICA E INDICADORES
SOCIOECNMICOS
Nas ltimas duas dcadas, consolidou-se como principal vetor de dinamizao
econmica e demogrfica dessa regio litornea a explorao turstica e imobiliria para
casas de veraneio. Observa-se que os investimentos pblicos canalizados atravs do
Prodetur-Nordeste qualificam seletivamente as redes de infra-estrutura, de equipamentos e
servios tursticos para um mercado de padro nacional e internacional. A promoo
turstica e imobiliria de agentes nacionais e estrangeiros garantida com a implantao
de complexos hoteleiros, resorts, parques temticos, clubes privados, loteamentos,
condomnios horizontais e verticais, para atender a diferentes nichos de mercado, alm de
transformar, gradativamente, a paisagem litornea em mercadoria.
O outro vetor de dinamizao da economia e crescimento demogrfico no litoral sul
de Pernambuco o Complexo Industrial Porturio de Suape (CIPS), que reflete resultados
econmicos expressivos a partir de investimentos de grande magnitude, onde se destacam
o Estaleiro Atlntico Sul e Promar, a Refinaria Abreu e Lima, a Petroqumica de Suape e a
Citepe, alm de toda a cadeia logstica relacionada. A expanso e consolidao desseplo
industrial impulsionou tambm um expressivo aumento do nmeo de habitantes, sobretudo
em Ipojuca.
Em funo do CIPS, nota-se que Ipojuca apresenta um PIB (Produto Interno Bruto,
que soma, em valores monetrios, de todos os bens e servios finais produzidos numa
determinada regio, durante um determinado perodo) significativamente alto, assim como
o salrio mdio do trabalhador formal, sobretudo quando comparado com os demais
municpios(Tabela 2).
O ndice de Desenvolvimento Humano - IDH, calculado pelo IPEA e FJP/PNUD,
expresso no Atlas do Desenvolvimento Humano, se presta a comparar o nvel de
desenvolvimento humano alcanado em diferentes regies, por meio de uma metodologia
de clculo que incorpora dados de renda (PIB per capita), longevidade (esperana de vida
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ao nascer) e educao (alfabetizao e taxa de matrcula), adotada como padro pela
Organizao das Naes Unidas (ONU, 2003).
Tabela 2 Recortes socioeconmicos dos municpios envolvidos, comparados capital pernambucana e ao Estado.
Fonte: Dados municipais - Fonte: IBGE (2014)
Pases, estados e municpios com IDH entre 0,500 e 0,799 so considerados de
mdio desenvolvimento humano. De acordo com a Agncia Condepe/Fidem (2009), tanto
o Estado de Pernambuco, quanto a capital Recife, como os municpios da rea em questo
(que integram a proposta da APA Marinha) se enquadram nesta categoria de IDH(Tabela
2).
As redes de abastecimento de gua e de esgotamento sanitrio, que tambm
representam fator de desenvolvimento socioeconmico, apresentam uma situao des-
favorvel nos municpios envolvidos, quando comparado com a mdia da capital do
Estado. H uma distribuio desigual da rede nos domiclios urbanos dos municpios na
rea, alm de possuir a oferta inadequada desse servio (Ag.Condepe/Fidem, 2009).
Excetuando Ipojuca, que tem 50% dos domiclios urbanos atendidos com sistema de
esgoto, os municpios de Rio Formoso e Sirinham possuem cerca de 30% e Tamandar
apresenta apenas 17,9% dos domiclios com esgotamento. Tal situao tem gerado,
inclusive, srios problemas de poluio dos rios da regio, que desaguam na rea
proposta para a APA Marinha.
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Fora dos limites diretos da rea de abrangncia da APA (no seu entorno) esto
previstas as atividades de explorao de leo e gs nas bacias petrolferas offshore que
iro transcorrer em reas distantes da costa, superiores isbata de 500m, que
configuram o Mar Territorial da Zona Costeira de Pernambuco (Figura 22).
Cabe destacar que apesar do progresso da tecnologia de segurana operacional na
explorao e transporte de petrleo, a eventual explorao num entorno to aproximado da
rea proposta para a APA Marinha poder gerar impactos ambientais de grande magnitude
associados a srios riscos de acidentes com difcil remediao. Caso a prospeco e
explorao de petrleo e gs de fato venham a ocorrer nesses blocos, fundamental que
sejam implantados programas de monitoramento ambiental das praias, que geralmente
so estabelecidos como condicionantes do processo de licenciamento ambiental.
Figura 22. Blocos de petrleo: em laranja, blocos de possvel explorao de petrleo localizados prximo rea poposta para a criao da APA Marinha (poligonal em traado branco).
Fonte: ANP (2017)
4.5.3. PESCA ARTESANAL
A pesca artesanal caracterizada pelo trabalho familiar e comunitrio, utilizando
tcnicas tradicionais para a captura do pescado, tais como: coleta manual, vara de pesca,
linha e anzol, tarrafa, redes de cerco, de emalhe, de arrasto e armadilhas. As embarcaes
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predominantemente utilizadas so jangadas, canoas, baiteras e barcos motorizados de
pequeno porte. realizada com fins comerciais e de subsistncia e gera alternativa de
renda e de provimento de alimentos para milhares de pessoas. A atividade pesqueira inclui
os diversos atos que compem a cadeia produtiva, como captura,
transporte, beneficiamento, armazenamento e comercializao dos recursos pesqueiros.
No Brasil, os pescadores artesanais so responsveis pela metade de toda a
produo pesqueira, enquanto que em Pernambucoesta proporo chega a 70%. De
acordo com dados do antigo Ministrio da Pesca e Aquicultura (MPA), o Estado ocupa a
15 posio nacional na produo de pescados. O levantamento feito pelo MPA em 2012
apontou que Pernambuco possua ento 13.128 pescadores profissionais cadastrados no
Registro Geral da Pesca. A quantidade real de pescadores, entretanto, tende a ser bem
maior, tendo em vista que muitos no possuem suas carteiras de pescadores e, portanto,
no entram nesta contagem oficial. Registra-se ainda que em 2010 a pesca
especificamente em ambiente marinho em Pernambuco foi responsvel pela produo de
10.918,3 toneladas de pescado (SEMAS, 2015).
A atividade pesqueira na rea proposta para a APA MAR Recifes Serrambi, no litoral
sul pernambucano, desenvolvida em uma grande diversidade de ecossistemas costeiros
e marinhos, como na plataforma continental, na quebra do talude, nos paleocanais, nos
recifes de corais e nos esturios, compreendendo variados habitats. Diversas populaes
de organismos marinhos comercialmente explorveis se utilizam destes habitats, fazendo
com que haja uma concentrao da atividade da pesca artesanal nesses ambientes.
A pesca praticada no mar de dentro, no mar de fora e na rea estuarina. A
pesca de mar de dentro a pesca costeira, realizada na regio protegida pelos arrecifes,
em geral com pequenas embarcaes - principalmente jangadas - ou mesmo
desembarcada. A pesca de mar de fora ocorre em reas mais distantes da costa at a
regio do talude continental, chamada popularmente de paredes, onde se pratica
sobretudo a pesca de linha, a qual captura peixes nobres, a exemplo da cioba. Esta
uma pesca artesanal mais capitalizada, utilizando embarcaes de madeira ou fibra, a
motor (PEDROSA, 2016).
Apesca estuarina, realizada geralmente com o apoio de pequenas embarcaes,
uma pesca que demanda menos capital, por no exigir grandes deslocamentos e
compreender coletas manuais, entre outras formas de pesca. As mulheres so os grandes
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atores da regio estuarina, onde catam seus mariscos, sururus e outros moluscos
(PEDROSA, 2016).
O retrato da pesca artesanal apresentado no Diagnstico Socioeconmico da Pesca
Artesanal do Litoral de Pernambuco (Instituto Oceanrio, 2010), analisa as atividades das
comunidades pesqueiras dos quatro municpios que esto na retaguarda da rea proposta
para a APA Marinha. Juntos, Ipojuca, Sirinham, Rio Formoso e Tamandar respondem
por 9,37% da captura estadual, onde as principais modalidades (e apetrechos) de pesca
praticadas na regio e os tipos e volumes de pescado esto destacados na Tabela 3.
Tabela 3 Recortes da caracaterizao da Pesca Artesanal
1 Os apetrechos extrapolam 100% em funo damarcaode mais de uma opo
Fonte: Instituto Oceanrio, 2010.
Observa-se que as principais espcies pescadas na rea da APA proposta so
tainha, sauna, sardinha, camaro, lagosta, guarajuba e agulha, ocorrendo tambm a pesca
da cavala, cioba, dourado, guaba, bagre e robalo.
Com base nas informaes apresentadas na tabela 3, h de se considerar que parte
da atividade pesqueira destes municpios realizada fora da rea da APA proposta,
sobretudo em Rio Formoso e Sirinham, destacadamente no que se refere s
pescas/capturas tpicas de esturios, como o caso dos caranguejos, siris, ostras e
sururus. Entretanto, vale ressaltar que estas reas estuarinas esto inseridas em outras
Unidades de Conservao contguas APA proposta, reforando a bioconectividade entre
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estes ambientes, que j protegem legalmente os manguezais, como o caso da APA de
Guadalupe e a APA de Sirinham, alm da APA Estuarina dos Rios Sirinham e
Maracape.
A pesca artesanal considerada uma importante atividade socioeconmica nesta
regio litornea, que sustenta uma grande cadeia produtiva. Esta cadeia exige complexos
mecanismos logsticos entre a produo e o consumidor final, em funo das dificuldades
nos processos de conservao e comercializao, sendo que s vezes algumas espcies
de pescado passam por at quatro vendedores at atingir o consumidor final, elevando o
preo do produto na ponta e diminuindo, consequentemente, o preo pago ao pescador
na praia. Por sua natureza especfica, depende das condies climticas, oceanogrficas,
biolgicas e de mercado (PEDROSA, 2016).
De acordo com o Diagnstico realizado pelo Instituto Oceanrio (2010), que contou
com informaes fornecidas pelos pescadores, atravs de entrevistas, so apresentados a
seguir dados quanto destinao do pescado obtido nos quatro municpios em questo.
Observa-se que nos municpios de Ipojuca e Rio Formoso a maior parte da produo
do pescado destinada venda direta ao consumidor, enquanto que no municpio de
Sirinham a maior parte do pescado vai para o peixeiro - atravessador. Destaca-se que em
Ipojuca, onde h grande movimentao de turistas e veranistas, a comercializao direta
para o consumidor final facilitada por este fator. Em Tamandar, a distribuio do
pescado equitativa entre o consumo prprio e o consumidor final.
Dados apresentados por Pedrosa (2016) afirmam queem Sirinham a maior parte da
produo pesqueira entregue a atravessadores, muitos dos quais da prpria comunidade
e donos de barcos, enquanto que em Tamandar a maioria dos produtos so
comercializados diretamente aos consumidores ou no entreposto de comercializao da
Colnia.
Como j destacado anteriormente, o acelerado processo de explorao turstica e
imobiliria no litoral modificou a dinmica da atividade pesqueira a partir da dcada de
setenta, na medida que promoveu o afastamento dos pescadores de seus locais de
moradia tradicionais, prximos ao mar. Este deslocamento dificulta tambm o acesso aos
seus locais de trabalho e guarda de suas jangadas e materiais de pesca, que compem a
logstica de sua atuao.
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Muitas vezes ocorre tambm o afastamento do pescador da prpria atividade
pesqueira, pois atrados pela possibilidade de melhoria de renda, alguns deixam suas
funes e se tornam caseiros, comerciantes, jangadeiros, alm de outras atividades
absorvidas pelos empreendimentos e iniciativas tursticas. Dessa forma, observa-se que a
atividade pesqueira artesanal atualmente praticada por alguns pescadores de forma
exclusiva e outras vezes de forma conjugada com outras atividades, de maneira a
possibilitar a complementao de renda.
Em face a esse cenrio, cabe ressaltar que a criao dessa rea marinha protegida
visa no s a conservao da biodiversidade dos oceanos, mas tambm a manuteno e a
recuperao dos estoques pesqueiros e, por consequncia, o fortalecimento da pesca
artesanal sustentvel. Esta tem incontestvel importncia socioeconmica - no apenas
como fator de gerao de trabalho e renda para a populao litornea, como tambm
como fornecedora de protena animal para o consumo humano.
No mbito das polticas pblicas, vale salientar que o Governo de Pernambuco, por
meio da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS), instituiu em 2015 a
Poltica da Pesca Artesanal do Estado de Pernambuco (Lei no 15.590/2015), e que desde
ento esta Poltica passou a ser coordenada pela SEMAS, em conjunto com o Comit
Gestor da Pesca Artesanal. Este Comit um rgo paritrio, composto por
representantes do poder pblico e da sociedade civil, destacadamente representantes do
segmento pesqueiro, que teve como primeira misso a construo participativa da
regulamentao da Poltica, finalizada em 2017, e agora possui a responsabilidade de
implement-la.
A interface das Unidades de Conservao e das aes do Estado quanto gesto
dos ambientes costeiros e marinhos com a Poltica da Pesca Artesanal imediata e
permanente. Inclusive, de acordo com o seu artigo 6, as UCs so consideradas um dos
instrumentos da referida Poltica. Tanto as Unidades de Conservao devem estabelecer
estratgias para fortalecer a pesca artesanal e ampliar os estoques pesqueiros, quanto
fomentar a prtica da pesca de forma sustentvel essencial para a manuteno da
biodiversidade das UCs. Neste sentido, envolver os pescadores no processo de criao e
gesto da APA Marinha Recifes Serrambi fundamental, tendo em vista que estes so um
dos principais usurios das praias e oceanos.
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5. PROPOSIO DA CATEGORIA DE MANEJO
De acordo com o Sistema Estadual de Unidades de Conservao(SEUC - Lei
Estadual n. 13.787/2009), a rea de Proteo Ambiental (APA) uma categoria de
Unidade de Conservao que pertence ao grupo de Uso Sustentvel. Conforme o artigo 7
do SEUC, o objetivo bsico das UCsque fazem parte deste grupo compatibilizar a
conservao da natureza com o uso sustentvel de parcela de seus recursos naturais.
Desta forma, a categoria APA permite usos diretos e indiretos, a exemplo da pesca, turismo
e veraneio, que so os principais usos observados na rea proposta para a criao da APA
Marinha Recifes Serrambi, no litoral sul de Pernambuco.
De acordo com o disposto no artigo 15 do SEUC,
APA uma rea, em geral, extensa, com certo grau de ocupao humana, dotada de atributos abiticos, biticos, estticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem estar das populaes humanas; tem comoobjetvos bsicos proteger a diversidade biolgica e os recursos hdricos, disciplinar o processo de ocupao do solo, preservar paisagens notveis e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (Lei Estadual n. 13.787/2009, art. 15).
A rea proposta para a criao da APA Marinha Recifes Serrambi delimita um
territrio de importncia regional, onde se faz necessrio fomentar o planejamento e
gesto ambiental voltados sustentabilidade. Considerando a vulnerabilidade e fragilidade
do ambiente costeiro-marinho e a presena de diversos usos consolidados, tais como a
pesca, o turismo e o lazer, a compatibilizao destes usos com a proteo dos
ecossistemas marinhos e costeiros de fundamental importncia para o desenvolvimento
sustentvel da regio.
Esses aspectos, ressaltados pelas caractersticas de mltiplos usos desta rea to
abrangente, levam inviabilizao de uma Unidade de Conservao de qualquer categoria
do grupo de Proteo Integral, que s permitiriam o uso indireto dos recursos naturais.
Conforme j bastante mencionado, na rea marinha proposta existem usos diretos
de recursos naturais, ou seja, atividades humanas que obtm produtos, servios e
benefcios da natureza atravsda apropriao e/ou consumo dos recursos naturais, a
exemplo da pesca, alm da forte ocorrncia da atividade de turismo e veraneio. Esses
fatores ratificam a necessidade de aes de disciplinamento e ordenamento dos diversos
usos, os quais no deveroser proibidos, mas compatibilizados com os objetivos de
conservao da rea.
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Dentre as demais Unidades de Conservao de Uso Sustentvel, uma categoria que
chegou a ser mencionada pelos atores sociais como possibilidade durante a oficina
integrante do processo de criao da UC foi a Reserva Extrativista (RESEX). Na ocasio,
discutiu-se sobre as caractersticas desta categoria e chegou-se concluso de que esta
no seria uma opo vivel, tendo em vista que a rea apresenta mltiplos usos, usurios
e interesses; e que a categoria RESEXprev a concesso de uso da rea s populaes
extrativistas tradicionais, tendo como objetivos bsicos proteger os meios de vida e a
cultura dessas populaes, e assegurar o uso sustentvel dos recursos naturais da
Unidade (art. 21 do SEUC).
Observam-se ainda dois outros fatores que corroboram para que esta rea marinha
no tenha vocao para a criao de uma RESEX. Um que a RESEX precisa ser criada
a partir de uma demanda da comunidade tradicional interessada, o que no se aplica neste
caso. Outro que, embora existam Reservas Extrativistas em reas marinhas, h diversos
relatos de que quando ocorrem em reas onde h diversos usos, a gesto geralmente
bastante conflituosa. Ressalta-se ainda que um dos principais objetivos da APA Marinha
proposta justamente a conciliao dos diversos usos da rea, reconhecidamente de
vocao e prtica consolidadas no s para a pesca, mas tambm para o turismo e
veraneio.
Assim, dentre as categorias de Uso Sustentvel, a categoria APA mostrou-se a mais
adequada para esta rea. A implantao desta Unidade de Conservao dever promover
o zoneamento e o ordenamento dos diversos usos, a serem planejados e efetivados de
forma participativa, envolvendo os diversos atores sociais interessados, incluindo todos os
usurios da rea. Dever tambm buscar viabilizar medidas mitigadoras para as presses
antrpicas consideradas degradadoras e/ou impactantes ao ecossitema marinho e