gestao publica e a relacao publico privado na saude
DESCRIPTION
Gestao Publica e a Relacao Publico Privado Na SaudeTRANSCRIPT
-
GESTO PBLICA E RELAO PBLICO-PRIVADA NA SADE
PUBLIC MANAGEMENT AND THE PUBLIC-PRIVATE RELATIONSHIP IN
THE HEALTH CARE SYSTEM
GESTIN PBLICA Y LA RELACIN PBLICO-PRIVADA EN LA SALUD
CESAR VIEIRA
Instituto Brasileiro para Estudo e Desenvolvimento do Setor Sade
Resumo
Este artigo sintetiza os elementos essenciais dos sistemas de sade em geral. Depois se
agrupam os sistemas de sade de alguns pases, conforme a predominncia pblica ou
privada no financiamento e na prestao dos servios. Em seguida se analisam algumas
caractersticas pblico-privadas do sistema de sade brasileiro, antes e depois da criao do
Sistema nico de Sade e do Sistema de Sade Suplementar. Logo, se consideram a
regulao e o financiamento do sistema de sade, dois elementos estratgicos para o seu
funcionamento, tambm enfatizando as relaes pblico-privadas. Finalmente, so feitas
algumas concluses preliminares, apontando possveis tendncias da evoluo futura destas
relaes no sistema de sade brasileiro.
Palavras chaves: SUS. Sade Suplementar. Financiamento.
Abstract
This article summarizes the essential elements of health systems in general. Then group the
health systems of some countries on public or private predominance in the financing and
delivery of services. Then we analyze some public-private characteristics of the Brazilian
health system, before and after the creation of the Unified Health System and
Supplementary Health System. Therefore, consider the regulation and financing of the
health system, two strategic elements for its operation, also emphasizing public-private
relations. Finally, we made some preliminary conclusions, pointing possible trends of the
future development of these relations in the Brazilian health system.
Keywords: SUS. Supplementary Health. Funding
Resumen
Este artculo resume los elementos esenciales de los sistemas de salud en general. Entonces
grupo los sistemas de salud de algunos pases sobre predominio pblico o privado en la
financiacin y prestacin de servicios. A continuacin se analizan algunas caractersticas
-
86
sectores pblico y privado del sistema de salud brasileo, antes y despus de la creacin del
Sistema de Salud Brasileo y el Sistema de Salud Suplementaria. Pronto considerar la
regulacin y el financiamiento del sistema de salud, dos elementos estratgicos para su
funcionamiento, destacando tambin las relaciones pblico-privadas. Por ltimo, hemos
hecho algunas conclusiones preliminares, apuntando posibles tendencias del futuro
desarrollo de estas relaciones en el sistema de salud brasileo.
Palabras clave: SUS. Salud Suplementaria. Financiamiento.
Introduo
Desde a sua criao baseada na Constituio Federal de 1988, o Sistema nico de
Sade do Brasil (SUS) tem contado com uma gesto pblica de trs nveis, exercida pelos
governos federal, estaduais e municipais. Mas, para a sua operao, o SUS depende de uma
grande variedade de instituies pblicas e privadas. Elas se dedicam pesquisa, ao
desenvolvimento dos recursos humanos e da infra-estrutura assistencial da sade,
produo e distribuio de equipamentos, medicamentos e outros insumos, assim como
prestao de servios e gesto das redes e unidades ateno.
O SUS tem como sua principal responsabilidade atender as necessidades de sade
de toda a populao brasileira. Entretanto, cerca de 25% desta populao so tambm
cobertos pelo Sistema de Sade Suplementar (SSS).1
Um terceiro grupo, cuja dimenso total ainda no se conhece, constitudo por
servidores pblicos ativos e inativos, tanto civis como militares, dos poderes executivo,
legislativo e judicirio nos trs nveis de governo, bem como seus respectivos dependentes.
A cobertura deste grupo realiza por prestadores pblicos ou privados de servios de
sade, atravs dos sistemas de ateno patrocinados pelas entidades em que estes cidados
trabalham ou trabalharam, os quais no fazem parte seja do SUS ou do SSS.
A complexa estrutura do sistema de sade brasileiro (SUS, SSS e os outros
sistemas) funciona com uma grande variedade de relaes pblico-privadas, que deve ser
levada em conta na sua gesto, tanto pblica como privada.
Este captulo comea com uma sntese dos elementos essenciais dos sistemas de
sade em geral. Depois se agrupam os sistemas de sade de alguns pases, conforme a
predominncia pblica ou privada no financiamento e na prestao dos servios. Em
seguida se analisam algumas caractersticas pblico-privadas do sistema de sade
brasileiro, antes e depois da criao do SUS e do SSS.
Logo se consideram a regulao e o financiamento do sistema de sade, dois
elementos estratgicos para o seu funcionamento, tambm enfatizando as relaes pblico-
privadas. Finalmente, so feitas algumas concluses preliminares, apontando possveis
tendncias da evoluo futura destas relaes no sistema de sade brasileiro.
1www.ans.gov.br
-
87
Elementos essenciais dos sistemas de sade
Qualquer sistema nacional de sade conta com os seguintes elementos essenciais
para sua constituio e operao:
a) o macro-contexto, dado pelas caractersticas scio-polticas e econmicas do pas a que pertence este sistema de sade;
b) a sociedade, composta por diferentes extratos socioeconmicos, dos quais so obtidos recursos para financiar o sistema de sade e entre os quais se distribuem os
servios e produtos proporcionados pelo mesmo;
c) os financiadores pblicos e privados que recebem os recursos proporcionados pela sociedade e remuneram, em diferentes formas, a produo de servios e de
insumos para a sade;
d) os produtores pblicos e privados de servios e insumos recursos humanos, medicamentos, equipamentos, conhecimentos e outros para o sistema de sade e, finalmente;
e) o estado - atravs dos seus poderes executivo, legislativo e judicirio que define polticas, legisla, regula e judicializa a respeito dos demais elementos e do
funcionamento do sistema de sade.
Devido a esta estrutura complexa, a organizao e a operao dos sistemas de sade
necessitam da participao e cooperao de diferentes atores pblicos e privados. Este
fenmeno se observa com diferentes matizes em praticamente todos os sistemas nacionais
de sade pelo mundo.
Considerando apenas a natureza pblica ou privada de dois desses elementos o financiamento e a produo de servios podemos ter uma viso bem clara da tipologia dos sistemas de sade de alguns pases.
Conforme demonstra a Tabela 1 abaixo, em alguns pases, tanto a prestao como o
financiamento dos servios so predominantemente pblicos. J no segundo grupo, a
prestao e o financiamento dos servios so predominantemente privados. No terceiro
grupo o financiamento predominantemente privado mas a prestao predominantemente
pblica. Finalmente, no quarto grupo o financiamento predominante pblico enquanto a
prestao predominantemente privada.
Possivelmente a palavra mais forte na caracterizao destes grupos seja
predominantemente, indicando que no existe qualquer pas nos quais o financiamento ou a prestao de servios sejam quimicamente puros, tanto pblicos como privados. Desta
forma, parece mais razovel considerar que todos os pases do mundo dispem de alguma
forma de combinao pblico-privada, seja no financiamento ou na prestao dos
respectivos servios de sade.
-
88
Tabela 1 - Sistemas nacionais de sade segundo o tipo predominante de financiamento e
prestao de servios2
Financiamento
Prestao de servios
Pblica
Privada
Pblico
Cuba
Inglaterra
Portugal
Rssia
Argentina
Canad
Frana
Uruguai
Privado
Albnia
ndia
Mxico
Nicargua
Brasil
China
Estados Unidos
Venezuela
No caso brasileiro, a maior parte dos servios de sade prestada por profissionais
e estabelecimentos privados, mesmo no caso do SUS. E recursos privados contribuem mais
que os recursos pblicos para o financiamento do sistema de sade brasileiro.3 Na seo
final deste captulo se apresentam informaes adicionais a respeito deste financiamento.
A distribuio regional dos recursos de sade no Brasil muito desbalanceada e
inequitativa. Por exemplo, o pas dispe de uma mdia nacional de 1,95 mdicos por mil
habitantes. Entretanto, a Regio Norte que tem menos recursos - conta tem apenas 0,98 mdicos por mil habitantes, enquanto a Regio Sudeste que a mais rica do pas desfruta de 2,61mdicos por mil habitantes.4
O Sistema Pblico de Sade antes e depois do SUS
Antes da criao do SUS, o Sistema Pblico de Sade no Brasil era constitudo por
uma grande variedade de instituies e estabelecimentos, distribudas entre os trs nveis de
governo.
A nvel federal pelo menos quatro ministrios Sade, Previdncia Social, Educao e Defesa dispunham de organismos e estabelecimentos dedicados prestao de servios a diferentes grupos de populao. O Ministrio da Sade contava ainda com a
Fundao SESP5 e o DNERu6. J o Ministrio da Previdncia Social dispunha de vrios
2WHO, WHO/EURO 3 OPS/OMS 4IBGE 5 Fundao Servios Especiais de Sade Pblica 6 Departamento Nacional de Endemias Rurais
-
89
IAPs7 e do FUNRURAL8, que depois foram incorporados ao INAMPS9. Grande parte dos
servios da Previdncia era prestada por estabelecimentos e profissionais privados.
O Ministrio da Educao conjugava as universidades federais com suas faculdades
da rea da sade e respectivos hospitais universitrios. Alm disso, regulava e
supervisionava as universidades e faculdades privadas e estaduais, muitas das quais
tambm contavam com seus hospitais universitrios. Enquanto isto, no mbito do
Ministrio da Defesa tinham hospitais e servios de sade, dedicados ateno de militares
do Exrcito, da Marinha e da Aeronutica.
A nvel estadual se encontravam as Secretarias de Sade, os Institutos de
Previdncia Estaduais e algumas universidades, com os respectivos hospitais, ambulatrios,
centros de sade e outras unidades. Finalmente, nos municpios principalmente de grande
porte, havia secretarias de sade e hospitais municipais, assim como centros e unidades de
sade.
Nos ltimos 25 anos, nosso pas tem desfrutado de um rico processo legislativo em
relao com a sade, tanto a nvel nacional como igualmente nos estados e municpios.
Conforme se pode ver na Tabela 2 abaixo, este processo se inicia em 1988 com a nova
Constituio Federal, que deu uma definio bsica inovadora da sade como direito de
todos e dever do estado.
Dois anos depois foi aprovada outra lei tratando da estrutura, operao e
administrao do SUS. Em 1993 o INAMPS foi extinto por outra lei, que alm disso
transferiu ao SUS os servios de sade at ento prestados pela Previdncia Social.
Somente uma dcada aps a aprovao da Cosntituio Federal que se aprovou a lei
criado o Sistema de Sade Suplementar, constitudo por entidades que de fato j operavam
no pas, algumas delas por vrias dcadas.
Tabela 2 - Legislao Relevante para a Evoluo do SUS10
Ano
Ato
Contedo principal
1988
Constituio Federal
Sade como direito de todos e dever do Estado
1990
Lei 8.080
Organizao, funcionamento e gesto do SUS
1993
Lei 8689
Extino do INAMPS
1998
Lei 9656
Criao do Sistema de Sade Suplementar
1999
Lei 9782
Criao da Anvisa
7 Institutos de Aposentadoria e Penso 8 Fundo de Assistncia ao Trabalhador Rural 9 Instituto de Assistncia Mdica da Previdncia Social 10www.saude.gov.br/saudelegis
-
90
2000
Lei 9961
Criao da ANS
2001
Portaria MS-373
NOAS sobre regionalizao e descentralizao
2003
Decreto 4726
Nova estrutura do MS e respectivas secretarias
2004
Lei 8142
Criao da Hemobrs
2011
Lei 12.550
Criao da EBSERH
2011 Decreto 7508 Regulamentao da Lei 8080/90
Continuando este processo, foram criadas duas agncias regulatrias de uma
importncia estratgica para o sistema de sade: a ANVISA11 em 1999 e a ANS12 em 2000.
Depois foram aprovados novos instrumentos tratando dos processos de regionalizao e
descentralizao, assim como da reestruturao do Ministrio da Sade.
Alguns anos depois foi criada a Hemobrs, uma empresa estatal vinculada ao
Ministrio da Sade e dedicada produo de insumos transfusionais, medicamentos e
outros itens para a ateno a pacientes de doenas do sangue.13Posteriormente, foi criada a
EBSERH, uma empresa estatal vinculada ao Ministrio da Educao, destinada gesto
dos hospitais das clnicas das universidades federais que optarem por contar com o servio
desta empresa14.
Atravs de um contrato celebrado com estas universidades, a empresa atuar para
modernizar a gesto dos hospitais participantes, preservando e reforando seu papel
estratgico como centros de formao de profissionais da sade e de ateno sade da
populao, integralmente no mbito do SUS. E os hospitais universitrios aderentes
EBSERH tornam-se partes integrantes desta empresa estatal.
Finalmente se menciona o decreto 7508 regulamentando a lei 8080 sobre a
organizao, funcionamento e gesto do SUS. Um dos contedos inovadores deste decreto
responsabiliza os gestores dos diferentes nveis de governo para mapear os servios e
recursos dos sistemas pblico e privado que esto disponveis para a ateno das
respectivas populaes.
Tambm durante este perodo ocorreram diversas experincias inovadoras no
Sistema Pblico de Sade de Minas Gerais. At o final dos anos 1960s, a Secretaria
Estadual de Sade dispunha de vrios hospitais pblicos dedicados ateno de urgncias e
emergncia, assim como outros especializados na ateno de pacientes com hansenase,
outras doenas transmissveis e problemas psiquitricos.
11 Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria 12 Agncia Nacional de Sade Suplementar 13 http://www.hemobras.gov.br/site/conteudo/empresa.asp 14 http://ebserh.mec.gov.br
-
91
No comeo dos anos 1970s, estes hospitais foram incorporados a trs fundaes FEAMUR, FEAL e FEAP15 - especializadas na ateno a estes problemas. Mas, em 1977,
estas fundaes e seus respectivos hospitais foram incorporados FHEMIG, uma nova
fundao que hoje conta com uma rede de 20 hospitais - onze dos quais em Belo Horizonte
e nove em outros municpios mineiros com um total de 2.800 leitos16. Tambm nos anos 1970s, a Secretaria adotou inovaes significativas na gesto do
seu corpo de funcionrios. Alm da maioria de funcionrios estatutrios, vrios outros
foram contratados como celetistas atravs de um convnio inicialmente com o ETRA17,
depois PRODEMGE 18 . Posteriormente, estes funcionrios celetistas passaram a ser
contratados pela FUNED 19 . Depois da promulgao das novas constituies federal e
estadual, os funcionrios das fundaes estaduais voltaram a se tornar estaturios. Mas
atualmente a Secretaria contrata empresas privadas para a prestao de servios sobretudo
de apoio, atravs de funcionrios terceirizados.
Outro exemplo bem expressivo da inovao na gesto dos estabelecimentos de
sade pode ser visto na constituio de Parcerias Pblico-Privadas, atravs das quais
entidades privadas, sobretudo filantrpicas, assumem a gesto de hospitais pblicos.
Estas entidades, denominadas OSS 20 ou OSCIP 21 , parecem apresentar resultados
operacionais melhores que os hospitais pertencentes s entidades pblicas e privadas
signatrias destes acordos.
Um caso bastante ilustrativo deste tipo de parceria pode ser visto na construo e
operao do Centro de Especialidades Mdicas, numa parceria entre o IPSEMG22, a Santa
Casa e a Secretaria Municipal de Sade de Belo Horizonte23. Esta parceria entre as trs
entidades conseguiu concluir a construo deste centro que esteve paralisada durante vrios
anos e agora gerencia a operao do mesmo de uma maneira bastante eficiente.
Uma outra experincia de PPP inovadora tem a ver com a construo e gesto do
Hospital Municipal do Barreiro da PBH. A parceria pblico-privada do municpio dever
ser encarregada apenas da construo e gesto deste hospital, ficando a prestao dos
servios mdico-hospitalares sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Sade.
Recentemente, a Prefeitura submeteu considerao da Cmara Municipal um projeto de
lei transformando esta parceria num SSA Servio Social Autnomo24. Este um modelo de gesto ainda pouco conhecido, que j est sendo utilizado no Hospital Sara Kubitschek e
em outros hospitais nos estados de So Paulo, Paran e Rio de Janeiro.
15
Fundaes Estaduais de Assistncia Mdica de Urgncia, Leprocomanial e Psiquitrica. 16 www.fhemig.mg.gov.br 17
Escritrio Tcnico de Racionalizao Administrativa 18 Companhia de Processamento de Dados - posteriormente de Tecnologia de Informao - de Minas Gerais 19 Fundao antes Instituto - Ezequiel Dias 20Organizao Social da Sade 21Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico 22Instituto de Previdncia dos Servidores do Estado de Minas Gerais 23www.santacasabh.org.br/ver/cem.html 24 http://www.cmbh.mg.gov.br/search/node/PFL%201130/14
-
92
O Sistema de Sade Suplementar
Criado pela Lei 9656/98, o SSS engloba diferentes tipos de operadoras de planos e
seguros de sade, grande parte das quais j vinham funcionando no Brasil h vrios anos.
De fato, algumas delas so at mesmo originadas em entidades que j funcionavam desde
os tempos do Brasil colonial.
Conforme se pode ver na Tabela 3, as Santas Casas, que operam no Brasil desde a
poca do seu descobrimento, deram origem s operadoras filantrpicas de planos de sade.
Por outro lado, as mutualidades - que foram trazidas ao nosso pas desde o sculo XIX por
migrantes europeus e do oriente deram origem s atuais seguradoras, operadoras de medicina de grupo e auto-gestoras. Finalmente, as cooperativas de trabalho, sobretudo
agrcolas, originaram o Sistema UNIMED, nascido em 1967 na UNIMED-Santos.
Tabela 3 - Origens das operadoras do SSS
Origens Incio Operadoras
Santas Casas 1500s Filantrpicas
Mutualidades 1800s Seguradoras
Medicina de Grupo
Auto-gestoras
Cooperativas
1967 Sistema UNIMED
Graas ao seu crescimento considervel nos ltimos anos, o SSS hoje cobre cerca de
25% da populao nacional. Conforme pode ser visto na Tabela 4, dentre os tipos de
operadoras as cooperativas so as que possuem o maior nmero de beneficirios e realizam
as maiores despesas com servios de sade. O nmero das cooperativas um pouco menor
que o das operadoras de medicina de grupo, que so o segundo grupo em termos de
beneficirios e despesas com servios de sade.
Tabela 4 - Caractersticas do Sistema de Sade Suplementar, 201325
Operadoras Nmero Beneficirios* Despesas**
Cooperativas 322 18,2 32,8
Medicina de Grupo 358 17,3 26,7
Seguradoras 12 6,8 18,1
25www.ans.gov.br
-
93
Auto-gestoras 207 5,3 11,4
Filantrpicas 84 1,4 3,5
Odontolgicas 403 19,5 1,8
Total 1386 68,5 94,3
* Em milhes **R$ bilhes
A quantidade de seguradoras bem menor que os demais tipos de operadoras. Em
compensao, o nmero de seus beneficirios e suas despesas por seguradora so bem
maiores que aqueles das demais operadoras.
As auto-gestoras e filantrpicas possuem nmeros considerveis de operadoras, mas
seus beneficirios e suas despesas so menores que aqueles apresentados pelas
cooperativas, medicinas de grupo e seguradoras.
Finalmente, as operadoras odontolgicas so as mais numerosas no SSS, assim
como seus beneficirios, que devem tambm ser cobertos pelas demais operadoras de
planos mdico-hospitalares.
Conforme antecipado na Introduo deste captulo, um grupo populacional ainda
no quantificado constitudo por servidores pblicos civis e militares dos trs nveis de
governo, ativos ou inativos, bem como seus dependentes. Alm do seu direito
constitucional cobertura pelo SUS, este grupo de fato coberto por planos de sade
financiados pelos respectivos empregadores. Ditos planos no fazem parte do SSS nem,
por suposto, do SUS. Na Tabela 5 podem ser vistos alguns destes planos.
Tabela 5 - Alguns planos de sade em rgos do setor pblico26
Poderes
Planos de Sade
Executivo
GEAP-Ministrios, FIOSADE, IPSEMG, BEPREM27
Foras Armadas: FUSEX, FUSMA, PLASA, SISAU-PMMG
Universidades: CASU-UFMG, CAURJ-UFRJ, Ressarcimento-UFJF
Legislativo
SIS-Senado, PRO-SADE-Cmara, ALMG-GSA
Judicirio
STF-MED, AMAGIS-SADE, SINDOJUS-MG
26 Com base na informao das pginas eletrnicas das entidades mencionadas. 27Em convnio com a UNIMED-BH
-
94
A Regulao do Sistema de Sade
Nos anos recentes o Brasil tem avanado consideravelmente na regulao da
organizao e do funcionamento de seu sistema de sade. Uma expresso muito relevante
destes avanos foi a criao da ANVISA em 1999 e da ANS um ano depois.
Conforme se pode verificar no seu portal 28 , a ANVISA desempenha um vasto
elenco de atividades de proteo sade, focada em alimentos, medicamentos, produtos
para a sade, sangue, hemoderivados, servios de sade e outros itens, atravs de diferentes
aes de vigilncia, fiscalizao e regulao do comrcio.
Enquanto isto, a ANS exerce um importante papel em relao ao SSS, utilizando
vrios instrumentos normativos, regulatrios e avaliativos, tanto das operadoras como dos
seus planos e seguros de sade.29 Apesar de ter sido criada dez anos depois do SUS, o
modelo regulatrio da ANS parece ser muito mais completo que aquele do sistema pblico.
Tabela 6 -Regulao dos assuntos da sade no SUS e no SSS
Tema SUS SSS
Servios MS, SES, SMS ANS
Profissionais Conselhos Federais e Estaduais
Insumos ANVISA, MS, SES, SMS
Unidades ANVISA, MS, SES, SMS
Financiamento MS, SES, SMS ANS
Apesar destes avanos positivos, a regulao dos assuntos da sade no Brasil ainda
bastante complexa. Conforme a Tabela 6 acima, os servios de sade no mbito do SUS e
o seu financiamento so regulados pelo Ministrio da Sade e pelas Secretarias Estaduais e
Municipais de Sade. Enquanto isto, tanto os servios no mbito do SSS como seu
financiamento so regulados pela ANS.
28portal.anvisa.gov.br 29www.ans.gov.br
-
95
O dilogo e a cooperao entre estes dois sistemas regulatrios parece ainda
necessitar de um grande esforo, para aumentar a harmonizao e a coordenao entre
ambos. Enquanto isto no ocorre, profissionais e estabelecimentos atuando no SUS e no
SSS so submetidos a dois modelos regulatrios insuficientemente articulados entre si para
a prestao dos mesmos servios de sade.
Alm disso, todos os profissionais de sade no pas so regulados pelos respectivos
Conselhos Federais e Regionais (estaduais). Esta regulao est focada em cada uma das
profisses, no existindo ainda um dilogo entre os conselhos das distintas profisses para
construir uma viso harmnica do trabalho multi-profissional em sade.
A regulao dos insumos e unidades prestadoras de servios de sade tanto no sistema pblico como no privado - exercida pela ANVISA, pelo Ministrio da Sade e
pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Sade. Aqui parece haver mais dilogo e
colaborao entre estes reguladores quanto aos insumos e unidades de sade. Entretanto o
dilogo dos reguladores de insumos e unidades de sade ainda precisa aumentar bastante
em direo aos reguladores dos profissionais, servios e financiamento de sade.
Um outro aspecto bem importante tem a ver com o relacionamento entre as
coberturas populacionais dos sistemas pblico e privado de servios de sade. Na Tabela 7
abaixo se apresentam exemplos de trs pases que so bem significativos a respeito deste
assunto.
Tabela 7 - Separao ou superposio dos Sistemas de Sade30
Chile: FONASA ISAPRES
Colmbia: Regime Subsidiado Regime Contributivo
Brasil: SUS SSS
30 OPS/OMS 2012
-
96
No caso do Chile, h uma ntida separao das populaes cobertas pelo sistema
pblico FONASA31 - e pelo sistema privado - ISAPRES32. Devido a esta separao, qualquer pessoa pode ser coberta apenas por um destes sub-sistemas. Entretanto, as listas
de servios prestados por estes sub-sistemas so completamente iguais, conforme assegura
a iniciativa AUGE.33
O caso seguinte da Colmbia apresenta caractersticas semelhantes s do Chile. As
populaes cobertas pelo Regime Subsidiado (sistema pblico) ou pelo Regime
Contributivo (sistema privado) so completamente separadas. Mas ambos sistemas prestam
os mesmos servios s respectivas clientelas.34
Enquanto isto, o Brasil tem uma experincia completamente diferente dos dois
outros pases. Neste pas h uma superposio entre os dois sub-sistemas, permitindo que,
pelo menos, uma parte da populao seja coberta por ambos sistemas. Esta superposio da
cobertura dos grupos populacionais de diferentes nveis de renda pelos diferentes
segmentos do sistema de sade brasileiro pode ser vista com mais detalhes na Tabela 8
abaixo. Segundo ela, a populao de baixa renda utiliza os servios de ateno primria,
mdia e alta complexidade prestados pelo SUS. Alm disso, compra sobretudo
medicamentos para complementar a ateno prestada pelo SUS.
Tabela 8 - Uso provvel dos sub-sistemas de sade no Brasil por nvel de renda dos
usurios
Renda
SUS
SSS
Gasto direto
Baixa
APS, mdia e alta
complexidade
---
Medicamentos
Complemento ao SUS
Mdia
Alta complexidade
APS e Mdia
complexidade
Medicamentos
Complemento ao SSS
Alta
Alta complexidade
APS e Mdia
complexidade
Muito uso
Enquanto isto, os usurios de mdia e alta renda utilizam servios de ateno
primria e mdia complexidade prestados pelo SSS, consumindo ainda servios de alta
31 Fundo Nacional de Sade 32 Institues de Sade Previsional 33 Acesso Universal a Garantias Explcitas 34OPS/OMS
-
97
complexidade prestados pelo SUS. A populao de mdia renda gasta na aquisio de
medicamentos em complemento ateno do SSS. E a populao de alta renda utiliza
muito o gasto direto para adquirir servios e insumos no providos pelos dois sub-sistemas.
O Financiamento do Sistema de Sade
Atualmente, o Brasil destina cerca de 8,5% do PIB para o financiamento do seu
sistema de sade, sendo 56,3% provenientes de fontes privadas e 43,7% de fontes
pblicas.35Uma parte do financiamento privado da sade no Brasil corresponde a despesas
das famlias com servios e insumos, correspondendo a cerca de 7,2% do gasto familiar
total. Entre os 40% de mais baixa renda da populao, 74,2% deste gasto se destina
compra de medicamentos no cobertos pelo SUS. J entre os 10% de mais alta renda
42,3% deste gasto tem a ver com despesas relativas a planos de sade.36
Existe ainda uma considervel superposio do financiamento dos servios de sade
no pas. Conforme demonstrado na figura abaixo, os gastos com servios financiados pelo
SUS so os mais volumosos se comparados com os gastos dos demais. Entretanto, estes
gastos se superpem com os gastos financiados pelo SSS e por aqueles outros planos de
sade mencionados na Tabela 5. Por outra parte, existe tambm uma considervel
superposio dos gastos das famlias com os gastos do SUS, do SSS e dos outros planos.
35 OPS/OMS 36IBGE
SUS
Gasto
Privado
SSS Outros
Planos
Superposio dos Sistemas de Sade no Brasil
Gasto
Privado
Sade Suplementar
Outros
Planos
SUS
-
98
Por estes motivos as relaes pblico-privadas relativas ao financiamento do
sistema de sade brasileiro tambm merecem uma ateno especial para o desenvolvimento
e a sustentabilidade deste sistema.
Outra questo de crucial importncia para a utilizao do financiamento setorial diz
respeito s diferentes formas de incentivo e remunerao aos prestadores de servios no
pas. A Tabela 9 sumariza as principais formas utilizadas na remunerao de apenas dois
tipos de prestadores, ou seja, profissionais e hospitais.
Os profissionais so remunerados atravs de vrias modalidades, como salrio,
unidade ou pacote de servios, procedimento, contrato formal ou informal e, mais
recentemente, qualidade do desempenho ou resultado da ateno. Estas modalidades
incentivam diferentes condutas do mesmo profissional na ateno a pacientes sofrendo o
mesmo problema de sade.
A maioria dos profissionais de sade brasileiros remunerada por alguma
combinao destas formas de pagamento, que incentiva diferentes condutas de ateno a
problemas semelhantes. possvel, assim, imaginar a dificuldade para que estes
profissionais mantenham um mnimo de coerncia nas condutas de atendimento aos seus
pacientes com os mesmos diagnsticos.
Tabela 9 Formas de remunerao dos prestadores de servios de sade
Prestadores
Formas de remunerao
Profissionais
Salrio
Unidade de servio
Procedimento
Pacote de servios
Contrato formal ou informal
Remunerao por desempenho ou resultado
Hospitais
Dirias, procedimentos e outros servios
Pacote de servios
Oramento financeiro
Remunerao por desempenho ou resultado
Algo semelhante acontece no caso dos hospitais, tambm em consequncia dos
diferentes incentivos ateno de casos semelhantes, causados pela remunerao por
diria, procedimento, pacote, oramento ou remunerao por desempenho ou resultado. Um
hospital que atenda a pacientes com o mesmo problema de sade, mas que sejam cobertos
-
99
pelo SUS, pelo SSS, pelos outros planos ou sejam pacientes particulares, necessita dispor
de diferentes enfoques e instrumentos de gesto, para se adequar a cada uma das
modalidades de remunerao adotadas por estas entidades. Podemos, ento, imaginar como
a simultaneidade destas modalidades de ateno e remunerao cada uma levando em conta diferentes itens da ateno hospitalar pode tornar bem complexa tanto a operao como a gesto dos hospitais.
Algumas Concluses Preliminares
Nos ltimos 35 anos o sistema de sade brasileiro vem experimentando mudanas
significativas na sua organizao, financiamento, operao e gesto. Estas mudanas
podem ser sintetizadas da seguinte forma:
criao do SUS em 1980s, sem levar em conta a natureza pblico-privada j existente no sistema de sade do pas;
dez anos depois surge o SSS como suplementar ao SUS, mas sem afetar a unicidade deste, apesar dos usurios e prestadores conviverem com os dois sistemas;
durante este perodo persistem outros sistemas ou planos de sade sobretudo no mbito do setor pblico - mas que no fazem parte seja do SUS ou do SSS - assim
como a ateno a pacientes particulares;
mais recentemente comea a se considerar uma alternativa para o Brasil, tratando de combinar e harmonizar os subsistemas pblico e privados;
Sade, superando as limitaes e consolidando os avanos dos subsistemas hoje existentes.
Um dos requisitos para a viabilidade e o sucesso desta perspectiva de evoluo diz
respeito construo de novas formas de relao pblico-privada na sade. Assim como de
mecanismos e instrumentos que assegurem uma operao eficiente, efetiva e equitativa das
mesmas.
Temos, portanto, um desafio crucial pela frente, cuja superao exigir a parceria dos
diferentes atores setoriais, das instncias do estado e da sociedade. E devemos tambm
buscar o apoio de organizaes internacionais, assim como de outros pases cujos sistemas
de sade j tenham alcanado objetivos semelhantes aos que estamos buscando. Adiante e
sucesso, portanto, com este processo de construo do nosso novo sistema de sade.
Referncias Bibliogrficas
ANS, www.ans.gov.br
ASAP, Aliana para a Sade Populacional, www.asapsaude.org.br
IBGE, Uma anlise das condies de vida da populao brasileira 2013,www.ibge.gov.br
-
100
OPS/OMS, Sade nas Amricas 2007 e 2012, www.opas.org.br
Ministrio da Sade, Portal da Sade, portalsaude.saude.gov.br
WHO, World Health Report 2010, www.who.int
WHO/EURO, European Health Report 2009, www.euro.who.int