gestao publica e a relacao publico privado na saude

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GESTÃO PÚBLICA E RELAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA NA SAÚDE PUBLIC MANAGEMENT AND THE PUBLIC-PRIVATE RELATIONSHIP IN THE HEALTH CARE SYSTEM GESTIÓN PÚBLICA Y LA RELACIÓN PÚBLICO-PRIVADA EN LA SALUD CESAR VIEIRA Instituto Brasileiro para Estudo e Desenvolvimento do Setor Saúde [email protected] Resumo Este artigo sintetiza os elementos essenciais dos sistemas de saúde em geral. Depois se agrupam os sistemas de saúde de alguns países, conforme a predominância pública ou privada no financiamento e na prestação dos serviços. Em seguida se analisam algumas características público-privadas do sistema de saúde brasileiro, antes e depois da criação do Sistema Único de Saúde e do Sistema de Saúde Suplementar. Logo, se consideram a regulação e o financiamento do sistema de saúde, dois elementos estratégicos para o seu funcionamento, também enfatizando as relações público-privadas. Finalmente, são feitas algumas conclusões preliminares, apontando possíveis tendências da evolução futura destas relações no sistema de saúde brasileiro. Palavras chaves: SUS. Saúde Suplementar. Financiamento. Abstract This article summarizes the essential elements of health systems in general. Then group the health systems of some countries on public or private predominance in the financing and delivery of services. Then we analyze some public-private characteristics of the Brazilian health system, before and after the creation of the Unified Health System and Supplementary Health System. Therefore, consider the regulation and financing of the health system, two strategic elements for its operation, also emphasizing public-private relations. Finally, we made some preliminary conclusions, pointing possible trends of the future development of these relations in the Brazilian health system. Keywords: SUS. Supplementary Health. Funding Resumen Este artículo resume los elementos esenciales de los sistemas de salud en general. Entonces grupo los sistemas de salud de algunos países sobre predominio público o privado en la financiación y prestación de servicios. A continuación se analizan algunas características

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Gestao Publica e a Relacao Publico Privado Na Saude

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  • GESTO PBLICA E RELAO PBLICO-PRIVADA NA SADE

    PUBLIC MANAGEMENT AND THE PUBLIC-PRIVATE RELATIONSHIP IN

    THE HEALTH CARE SYSTEM

    GESTIN PBLICA Y LA RELACIN PBLICO-PRIVADA EN LA SALUD

    CESAR VIEIRA

    Instituto Brasileiro para Estudo e Desenvolvimento do Setor Sade

    [email protected]

    Resumo

    Este artigo sintetiza os elementos essenciais dos sistemas de sade em geral. Depois se

    agrupam os sistemas de sade de alguns pases, conforme a predominncia pblica ou

    privada no financiamento e na prestao dos servios. Em seguida se analisam algumas

    caractersticas pblico-privadas do sistema de sade brasileiro, antes e depois da criao do

    Sistema nico de Sade e do Sistema de Sade Suplementar. Logo, se consideram a

    regulao e o financiamento do sistema de sade, dois elementos estratgicos para o seu

    funcionamento, tambm enfatizando as relaes pblico-privadas. Finalmente, so feitas

    algumas concluses preliminares, apontando possveis tendncias da evoluo futura destas

    relaes no sistema de sade brasileiro.

    Palavras chaves: SUS. Sade Suplementar. Financiamento.

    Abstract

    This article summarizes the essential elements of health systems in general. Then group the

    health systems of some countries on public or private predominance in the financing and

    delivery of services. Then we analyze some public-private characteristics of the Brazilian

    health system, before and after the creation of the Unified Health System and

    Supplementary Health System. Therefore, consider the regulation and financing of the

    health system, two strategic elements for its operation, also emphasizing public-private

    relations. Finally, we made some preliminary conclusions, pointing possible trends of the

    future development of these relations in the Brazilian health system.

    Keywords: SUS. Supplementary Health. Funding

    Resumen

    Este artculo resume los elementos esenciales de los sistemas de salud en general. Entonces

    grupo los sistemas de salud de algunos pases sobre predominio pblico o privado en la

    financiacin y prestacin de servicios. A continuacin se analizan algunas caractersticas

  • 86

    sectores pblico y privado del sistema de salud brasileo, antes y despus de la creacin del

    Sistema de Salud Brasileo y el Sistema de Salud Suplementaria. Pronto considerar la

    regulacin y el financiamiento del sistema de salud, dos elementos estratgicos para su

    funcionamiento, destacando tambin las relaciones pblico-privadas. Por ltimo, hemos

    hecho algunas conclusiones preliminares, apuntando posibles tendencias del futuro

    desarrollo de estas relaciones en el sistema de salud brasileo.

    Palabras clave: SUS. Salud Suplementaria. Financiamiento.

    Introduo

    Desde a sua criao baseada na Constituio Federal de 1988, o Sistema nico de

    Sade do Brasil (SUS) tem contado com uma gesto pblica de trs nveis, exercida pelos

    governos federal, estaduais e municipais. Mas, para a sua operao, o SUS depende de uma

    grande variedade de instituies pblicas e privadas. Elas se dedicam pesquisa, ao

    desenvolvimento dos recursos humanos e da infra-estrutura assistencial da sade,

    produo e distribuio de equipamentos, medicamentos e outros insumos, assim como

    prestao de servios e gesto das redes e unidades ateno.

    O SUS tem como sua principal responsabilidade atender as necessidades de sade

    de toda a populao brasileira. Entretanto, cerca de 25% desta populao so tambm

    cobertos pelo Sistema de Sade Suplementar (SSS).1

    Um terceiro grupo, cuja dimenso total ainda no se conhece, constitudo por

    servidores pblicos ativos e inativos, tanto civis como militares, dos poderes executivo,

    legislativo e judicirio nos trs nveis de governo, bem como seus respectivos dependentes.

    A cobertura deste grupo realiza por prestadores pblicos ou privados de servios de

    sade, atravs dos sistemas de ateno patrocinados pelas entidades em que estes cidados

    trabalham ou trabalharam, os quais no fazem parte seja do SUS ou do SSS.

    A complexa estrutura do sistema de sade brasileiro (SUS, SSS e os outros

    sistemas) funciona com uma grande variedade de relaes pblico-privadas, que deve ser

    levada em conta na sua gesto, tanto pblica como privada.

    Este captulo comea com uma sntese dos elementos essenciais dos sistemas de

    sade em geral. Depois se agrupam os sistemas de sade de alguns pases, conforme a

    predominncia pblica ou privada no financiamento e na prestao dos servios. Em

    seguida se analisam algumas caractersticas pblico-privadas do sistema de sade

    brasileiro, antes e depois da criao do SUS e do SSS.

    Logo se consideram a regulao e o financiamento do sistema de sade, dois

    elementos estratgicos para o seu funcionamento, tambm enfatizando as relaes pblico-

    privadas. Finalmente, so feitas algumas concluses preliminares, apontando possveis

    tendncias da evoluo futura destas relaes no sistema de sade brasileiro.

    1www.ans.gov.br

  • 87

    Elementos essenciais dos sistemas de sade

    Qualquer sistema nacional de sade conta com os seguintes elementos essenciais

    para sua constituio e operao:

    a) o macro-contexto, dado pelas caractersticas scio-polticas e econmicas do pas a que pertence este sistema de sade;

    b) a sociedade, composta por diferentes extratos socioeconmicos, dos quais so obtidos recursos para financiar o sistema de sade e entre os quais se distribuem os

    servios e produtos proporcionados pelo mesmo;

    c) os financiadores pblicos e privados que recebem os recursos proporcionados pela sociedade e remuneram, em diferentes formas, a produo de servios e de

    insumos para a sade;

    d) os produtores pblicos e privados de servios e insumos recursos humanos, medicamentos, equipamentos, conhecimentos e outros para o sistema de sade e, finalmente;

    e) o estado - atravs dos seus poderes executivo, legislativo e judicirio que define polticas, legisla, regula e judicializa a respeito dos demais elementos e do

    funcionamento do sistema de sade.

    Devido a esta estrutura complexa, a organizao e a operao dos sistemas de sade

    necessitam da participao e cooperao de diferentes atores pblicos e privados. Este

    fenmeno se observa com diferentes matizes em praticamente todos os sistemas nacionais

    de sade pelo mundo.

    Considerando apenas a natureza pblica ou privada de dois desses elementos o financiamento e a produo de servios podemos ter uma viso bem clara da tipologia dos sistemas de sade de alguns pases.

    Conforme demonstra a Tabela 1 abaixo, em alguns pases, tanto a prestao como o

    financiamento dos servios so predominantemente pblicos. J no segundo grupo, a

    prestao e o financiamento dos servios so predominantemente privados. No terceiro

    grupo o financiamento predominantemente privado mas a prestao predominantemente

    pblica. Finalmente, no quarto grupo o financiamento predominante pblico enquanto a

    prestao predominantemente privada.

    Possivelmente a palavra mais forte na caracterizao destes grupos seja

    predominantemente, indicando que no existe qualquer pas nos quais o financiamento ou a prestao de servios sejam quimicamente puros, tanto pblicos como privados. Desta

    forma, parece mais razovel considerar que todos os pases do mundo dispem de alguma

    forma de combinao pblico-privada, seja no financiamento ou na prestao dos

    respectivos servios de sade.

  • 88

    Tabela 1 - Sistemas nacionais de sade segundo o tipo predominante de financiamento e

    prestao de servios2

    Financiamento

    Prestao de servios

    Pblica

    Privada

    Pblico

    Cuba

    Inglaterra

    Portugal

    Rssia

    Argentina

    Canad

    Frana

    Uruguai

    Privado

    Albnia

    ndia

    Mxico

    Nicargua

    Brasil

    China

    Estados Unidos

    Venezuela

    No caso brasileiro, a maior parte dos servios de sade prestada por profissionais

    e estabelecimentos privados, mesmo no caso do SUS. E recursos privados contribuem mais

    que os recursos pblicos para o financiamento do sistema de sade brasileiro.3 Na seo

    final deste captulo se apresentam informaes adicionais a respeito deste financiamento.

    A distribuio regional dos recursos de sade no Brasil muito desbalanceada e

    inequitativa. Por exemplo, o pas dispe de uma mdia nacional de 1,95 mdicos por mil

    habitantes. Entretanto, a Regio Norte que tem menos recursos - conta tem apenas 0,98 mdicos por mil habitantes, enquanto a Regio Sudeste que a mais rica do pas desfruta de 2,61mdicos por mil habitantes.4

    O Sistema Pblico de Sade antes e depois do SUS

    Antes da criao do SUS, o Sistema Pblico de Sade no Brasil era constitudo por

    uma grande variedade de instituies e estabelecimentos, distribudas entre os trs nveis de

    governo.

    A nvel federal pelo menos quatro ministrios Sade, Previdncia Social, Educao e Defesa dispunham de organismos e estabelecimentos dedicados prestao de servios a diferentes grupos de populao. O Ministrio da Sade contava ainda com a

    Fundao SESP5 e o DNERu6. J o Ministrio da Previdncia Social dispunha de vrios

    2WHO, WHO/EURO 3 OPS/OMS 4IBGE 5 Fundao Servios Especiais de Sade Pblica 6 Departamento Nacional de Endemias Rurais

  • 89

    IAPs7 e do FUNRURAL8, que depois foram incorporados ao INAMPS9. Grande parte dos

    servios da Previdncia era prestada por estabelecimentos e profissionais privados.

    O Ministrio da Educao conjugava as universidades federais com suas faculdades

    da rea da sade e respectivos hospitais universitrios. Alm disso, regulava e

    supervisionava as universidades e faculdades privadas e estaduais, muitas das quais

    tambm contavam com seus hospitais universitrios. Enquanto isto, no mbito do

    Ministrio da Defesa tinham hospitais e servios de sade, dedicados ateno de militares

    do Exrcito, da Marinha e da Aeronutica.

    A nvel estadual se encontravam as Secretarias de Sade, os Institutos de

    Previdncia Estaduais e algumas universidades, com os respectivos hospitais, ambulatrios,

    centros de sade e outras unidades. Finalmente, nos municpios principalmente de grande

    porte, havia secretarias de sade e hospitais municipais, assim como centros e unidades de

    sade.

    Nos ltimos 25 anos, nosso pas tem desfrutado de um rico processo legislativo em

    relao com a sade, tanto a nvel nacional como igualmente nos estados e municpios.

    Conforme se pode ver na Tabela 2 abaixo, este processo se inicia em 1988 com a nova

    Constituio Federal, que deu uma definio bsica inovadora da sade como direito de

    todos e dever do estado.

    Dois anos depois foi aprovada outra lei tratando da estrutura, operao e

    administrao do SUS. Em 1993 o INAMPS foi extinto por outra lei, que alm disso

    transferiu ao SUS os servios de sade at ento prestados pela Previdncia Social.

    Somente uma dcada aps a aprovao da Cosntituio Federal que se aprovou a lei

    criado o Sistema de Sade Suplementar, constitudo por entidades que de fato j operavam

    no pas, algumas delas por vrias dcadas.

    Tabela 2 - Legislao Relevante para a Evoluo do SUS10

    Ano

    Ato

    Contedo principal

    1988

    Constituio Federal

    Sade como direito de todos e dever do Estado

    1990

    Lei 8.080

    Organizao, funcionamento e gesto do SUS

    1993

    Lei 8689

    Extino do INAMPS

    1998

    Lei 9656

    Criao do Sistema de Sade Suplementar

    1999

    Lei 9782

    Criao da Anvisa

    7 Institutos de Aposentadoria e Penso 8 Fundo de Assistncia ao Trabalhador Rural 9 Instituto de Assistncia Mdica da Previdncia Social 10www.saude.gov.br/saudelegis

  • 90

    2000

    Lei 9961

    Criao da ANS

    2001

    Portaria MS-373

    NOAS sobre regionalizao e descentralizao

    2003

    Decreto 4726

    Nova estrutura do MS e respectivas secretarias

    2004

    Lei 8142

    Criao da Hemobrs

    2011

    Lei 12.550

    Criao da EBSERH

    2011 Decreto 7508 Regulamentao da Lei 8080/90

    Continuando este processo, foram criadas duas agncias regulatrias de uma

    importncia estratgica para o sistema de sade: a ANVISA11 em 1999 e a ANS12 em 2000.

    Depois foram aprovados novos instrumentos tratando dos processos de regionalizao e

    descentralizao, assim como da reestruturao do Ministrio da Sade.

    Alguns anos depois foi criada a Hemobrs, uma empresa estatal vinculada ao

    Ministrio da Sade e dedicada produo de insumos transfusionais, medicamentos e

    outros itens para a ateno a pacientes de doenas do sangue.13Posteriormente, foi criada a

    EBSERH, uma empresa estatal vinculada ao Ministrio da Educao, destinada gesto

    dos hospitais das clnicas das universidades federais que optarem por contar com o servio

    desta empresa14.

    Atravs de um contrato celebrado com estas universidades, a empresa atuar para

    modernizar a gesto dos hospitais participantes, preservando e reforando seu papel

    estratgico como centros de formao de profissionais da sade e de ateno sade da

    populao, integralmente no mbito do SUS. E os hospitais universitrios aderentes

    EBSERH tornam-se partes integrantes desta empresa estatal.

    Finalmente se menciona o decreto 7508 regulamentando a lei 8080 sobre a

    organizao, funcionamento e gesto do SUS. Um dos contedos inovadores deste decreto

    responsabiliza os gestores dos diferentes nveis de governo para mapear os servios e

    recursos dos sistemas pblico e privado que esto disponveis para a ateno das

    respectivas populaes.

    Tambm durante este perodo ocorreram diversas experincias inovadoras no

    Sistema Pblico de Sade de Minas Gerais. At o final dos anos 1960s, a Secretaria

    Estadual de Sade dispunha de vrios hospitais pblicos dedicados ateno de urgncias e

    emergncia, assim como outros especializados na ateno de pacientes com hansenase,

    outras doenas transmissveis e problemas psiquitricos.

    11 Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria 12 Agncia Nacional de Sade Suplementar 13 http://www.hemobras.gov.br/site/conteudo/empresa.asp 14 http://ebserh.mec.gov.br

  • 91

    No comeo dos anos 1970s, estes hospitais foram incorporados a trs fundaes FEAMUR, FEAL e FEAP15 - especializadas na ateno a estes problemas. Mas, em 1977,

    estas fundaes e seus respectivos hospitais foram incorporados FHEMIG, uma nova

    fundao que hoje conta com uma rede de 20 hospitais - onze dos quais em Belo Horizonte

    e nove em outros municpios mineiros com um total de 2.800 leitos16. Tambm nos anos 1970s, a Secretaria adotou inovaes significativas na gesto do

    seu corpo de funcionrios. Alm da maioria de funcionrios estatutrios, vrios outros

    foram contratados como celetistas atravs de um convnio inicialmente com o ETRA17,

    depois PRODEMGE 18 . Posteriormente, estes funcionrios celetistas passaram a ser

    contratados pela FUNED 19 . Depois da promulgao das novas constituies federal e

    estadual, os funcionrios das fundaes estaduais voltaram a se tornar estaturios. Mas

    atualmente a Secretaria contrata empresas privadas para a prestao de servios sobretudo

    de apoio, atravs de funcionrios terceirizados.

    Outro exemplo bem expressivo da inovao na gesto dos estabelecimentos de

    sade pode ser visto na constituio de Parcerias Pblico-Privadas, atravs das quais

    entidades privadas, sobretudo filantrpicas, assumem a gesto de hospitais pblicos.

    Estas entidades, denominadas OSS 20 ou OSCIP 21 , parecem apresentar resultados

    operacionais melhores que os hospitais pertencentes s entidades pblicas e privadas

    signatrias destes acordos.

    Um caso bastante ilustrativo deste tipo de parceria pode ser visto na construo e

    operao do Centro de Especialidades Mdicas, numa parceria entre o IPSEMG22, a Santa

    Casa e a Secretaria Municipal de Sade de Belo Horizonte23. Esta parceria entre as trs

    entidades conseguiu concluir a construo deste centro que esteve paralisada durante vrios

    anos e agora gerencia a operao do mesmo de uma maneira bastante eficiente.

    Uma outra experincia de PPP inovadora tem a ver com a construo e gesto do

    Hospital Municipal do Barreiro da PBH. A parceria pblico-privada do municpio dever

    ser encarregada apenas da construo e gesto deste hospital, ficando a prestao dos

    servios mdico-hospitalares sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Sade.

    Recentemente, a Prefeitura submeteu considerao da Cmara Municipal um projeto de

    lei transformando esta parceria num SSA Servio Social Autnomo24. Este um modelo de gesto ainda pouco conhecido, que j est sendo utilizado no Hospital Sara Kubitschek e

    em outros hospitais nos estados de So Paulo, Paran e Rio de Janeiro.

    15

    Fundaes Estaduais de Assistncia Mdica de Urgncia, Leprocomanial e Psiquitrica. 16 www.fhemig.mg.gov.br 17

    Escritrio Tcnico de Racionalizao Administrativa 18 Companhia de Processamento de Dados - posteriormente de Tecnologia de Informao - de Minas Gerais 19 Fundao antes Instituto - Ezequiel Dias 20Organizao Social da Sade 21Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico 22Instituto de Previdncia dos Servidores do Estado de Minas Gerais 23www.santacasabh.org.br/ver/cem.html 24 http://www.cmbh.mg.gov.br/search/node/PFL%201130/14

  • 92

    O Sistema de Sade Suplementar

    Criado pela Lei 9656/98, o SSS engloba diferentes tipos de operadoras de planos e

    seguros de sade, grande parte das quais j vinham funcionando no Brasil h vrios anos.

    De fato, algumas delas so at mesmo originadas em entidades que j funcionavam desde

    os tempos do Brasil colonial.

    Conforme se pode ver na Tabela 3, as Santas Casas, que operam no Brasil desde a

    poca do seu descobrimento, deram origem s operadoras filantrpicas de planos de sade.

    Por outro lado, as mutualidades - que foram trazidas ao nosso pas desde o sculo XIX por

    migrantes europeus e do oriente deram origem s atuais seguradoras, operadoras de medicina de grupo e auto-gestoras. Finalmente, as cooperativas de trabalho, sobretudo

    agrcolas, originaram o Sistema UNIMED, nascido em 1967 na UNIMED-Santos.

    Tabela 3 - Origens das operadoras do SSS

    Origens Incio Operadoras

    Santas Casas 1500s Filantrpicas

    Mutualidades 1800s Seguradoras

    Medicina de Grupo

    Auto-gestoras

    Cooperativas

    1967 Sistema UNIMED

    Graas ao seu crescimento considervel nos ltimos anos, o SSS hoje cobre cerca de

    25% da populao nacional. Conforme pode ser visto na Tabela 4, dentre os tipos de

    operadoras as cooperativas so as que possuem o maior nmero de beneficirios e realizam

    as maiores despesas com servios de sade. O nmero das cooperativas um pouco menor

    que o das operadoras de medicina de grupo, que so o segundo grupo em termos de

    beneficirios e despesas com servios de sade.

    Tabela 4 - Caractersticas do Sistema de Sade Suplementar, 201325

    Operadoras Nmero Beneficirios* Despesas**

    Cooperativas 322 18,2 32,8

    Medicina de Grupo 358 17,3 26,7

    Seguradoras 12 6,8 18,1

    25www.ans.gov.br

  • 93

    Auto-gestoras 207 5,3 11,4

    Filantrpicas 84 1,4 3,5

    Odontolgicas 403 19,5 1,8

    Total 1386 68,5 94,3

    * Em milhes **R$ bilhes

    A quantidade de seguradoras bem menor que os demais tipos de operadoras. Em

    compensao, o nmero de seus beneficirios e suas despesas por seguradora so bem

    maiores que aqueles das demais operadoras.

    As auto-gestoras e filantrpicas possuem nmeros considerveis de operadoras, mas

    seus beneficirios e suas despesas so menores que aqueles apresentados pelas

    cooperativas, medicinas de grupo e seguradoras.

    Finalmente, as operadoras odontolgicas so as mais numerosas no SSS, assim

    como seus beneficirios, que devem tambm ser cobertos pelas demais operadoras de

    planos mdico-hospitalares.

    Conforme antecipado na Introduo deste captulo, um grupo populacional ainda

    no quantificado constitudo por servidores pblicos civis e militares dos trs nveis de

    governo, ativos ou inativos, bem como seus dependentes. Alm do seu direito

    constitucional cobertura pelo SUS, este grupo de fato coberto por planos de sade

    financiados pelos respectivos empregadores. Ditos planos no fazem parte do SSS nem,

    por suposto, do SUS. Na Tabela 5 podem ser vistos alguns destes planos.

    Tabela 5 - Alguns planos de sade em rgos do setor pblico26

    Poderes

    Planos de Sade

    Executivo

    GEAP-Ministrios, FIOSADE, IPSEMG, BEPREM27

    Foras Armadas: FUSEX, FUSMA, PLASA, SISAU-PMMG

    Universidades: CASU-UFMG, CAURJ-UFRJ, Ressarcimento-UFJF

    Legislativo

    SIS-Senado, PRO-SADE-Cmara, ALMG-GSA

    Judicirio

    STF-MED, AMAGIS-SADE, SINDOJUS-MG

    26 Com base na informao das pginas eletrnicas das entidades mencionadas. 27Em convnio com a UNIMED-BH

  • 94

    A Regulao do Sistema de Sade

    Nos anos recentes o Brasil tem avanado consideravelmente na regulao da

    organizao e do funcionamento de seu sistema de sade. Uma expresso muito relevante

    destes avanos foi a criao da ANVISA em 1999 e da ANS um ano depois.

    Conforme se pode verificar no seu portal 28 , a ANVISA desempenha um vasto

    elenco de atividades de proteo sade, focada em alimentos, medicamentos, produtos

    para a sade, sangue, hemoderivados, servios de sade e outros itens, atravs de diferentes

    aes de vigilncia, fiscalizao e regulao do comrcio.

    Enquanto isto, a ANS exerce um importante papel em relao ao SSS, utilizando

    vrios instrumentos normativos, regulatrios e avaliativos, tanto das operadoras como dos

    seus planos e seguros de sade.29 Apesar de ter sido criada dez anos depois do SUS, o

    modelo regulatrio da ANS parece ser muito mais completo que aquele do sistema pblico.

    Tabela 6 -Regulao dos assuntos da sade no SUS e no SSS

    Tema SUS SSS

    Servios MS, SES, SMS ANS

    Profissionais Conselhos Federais e Estaduais

    Insumos ANVISA, MS, SES, SMS

    Unidades ANVISA, MS, SES, SMS

    Financiamento MS, SES, SMS ANS

    Apesar destes avanos positivos, a regulao dos assuntos da sade no Brasil ainda

    bastante complexa. Conforme a Tabela 6 acima, os servios de sade no mbito do SUS e

    o seu financiamento so regulados pelo Ministrio da Sade e pelas Secretarias Estaduais e

    Municipais de Sade. Enquanto isto, tanto os servios no mbito do SSS como seu

    financiamento so regulados pela ANS.

    28portal.anvisa.gov.br 29www.ans.gov.br

  • 95

    O dilogo e a cooperao entre estes dois sistemas regulatrios parece ainda

    necessitar de um grande esforo, para aumentar a harmonizao e a coordenao entre

    ambos. Enquanto isto no ocorre, profissionais e estabelecimentos atuando no SUS e no

    SSS so submetidos a dois modelos regulatrios insuficientemente articulados entre si para

    a prestao dos mesmos servios de sade.

    Alm disso, todos os profissionais de sade no pas so regulados pelos respectivos

    Conselhos Federais e Regionais (estaduais). Esta regulao est focada em cada uma das

    profisses, no existindo ainda um dilogo entre os conselhos das distintas profisses para

    construir uma viso harmnica do trabalho multi-profissional em sade.

    A regulao dos insumos e unidades prestadoras de servios de sade tanto no sistema pblico como no privado - exercida pela ANVISA, pelo Ministrio da Sade e

    pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Sade. Aqui parece haver mais dilogo e

    colaborao entre estes reguladores quanto aos insumos e unidades de sade. Entretanto o

    dilogo dos reguladores de insumos e unidades de sade ainda precisa aumentar bastante

    em direo aos reguladores dos profissionais, servios e financiamento de sade.

    Um outro aspecto bem importante tem a ver com o relacionamento entre as

    coberturas populacionais dos sistemas pblico e privado de servios de sade. Na Tabela 7

    abaixo se apresentam exemplos de trs pases que so bem significativos a respeito deste

    assunto.

    Tabela 7 - Separao ou superposio dos Sistemas de Sade30

    Chile: FONASA ISAPRES

    Colmbia: Regime Subsidiado Regime Contributivo

    Brasil: SUS SSS

    30 OPS/OMS 2012

  • 96

    No caso do Chile, h uma ntida separao das populaes cobertas pelo sistema

    pblico FONASA31 - e pelo sistema privado - ISAPRES32. Devido a esta separao, qualquer pessoa pode ser coberta apenas por um destes sub-sistemas. Entretanto, as listas

    de servios prestados por estes sub-sistemas so completamente iguais, conforme assegura

    a iniciativa AUGE.33

    O caso seguinte da Colmbia apresenta caractersticas semelhantes s do Chile. As

    populaes cobertas pelo Regime Subsidiado (sistema pblico) ou pelo Regime

    Contributivo (sistema privado) so completamente separadas. Mas ambos sistemas prestam

    os mesmos servios s respectivas clientelas.34

    Enquanto isto, o Brasil tem uma experincia completamente diferente dos dois

    outros pases. Neste pas h uma superposio entre os dois sub-sistemas, permitindo que,

    pelo menos, uma parte da populao seja coberta por ambos sistemas. Esta superposio da

    cobertura dos grupos populacionais de diferentes nveis de renda pelos diferentes

    segmentos do sistema de sade brasileiro pode ser vista com mais detalhes na Tabela 8

    abaixo. Segundo ela, a populao de baixa renda utiliza os servios de ateno primria,

    mdia e alta complexidade prestados pelo SUS. Alm disso, compra sobretudo

    medicamentos para complementar a ateno prestada pelo SUS.

    Tabela 8 - Uso provvel dos sub-sistemas de sade no Brasil por nvel de renda dos

    usurios

    Renda

    SUS

    SSS

    Gasto direto

    Baixa

    APS, mdia e alta

    complexidade

    ---

    Medicamentos

    Complemento ao SUS

    Mdia

    Alta complexidade

    APS e Mdia

    complexidade

    Medicamentos

    Complemento ao SSS

    Alta

    Alta complexidade

    APS e Mdia

    complexidade

    Muito uso

    Enquanto isto, os usurios de mdia e alta renda utilizam servios de ateno

    primria e mdia complexidade prestados pelo SSS, consumindo ainda servios de alta

    31 Fundo Nacional de Sade 32 Institues de Sade Previsional 33 Acesso Universal a Garantias Explcitas 34OPS/OMS

  • 97

    complexidade prestados pelo SUS. A populao de mdia renda gasta na aquisio de

    medicamentos em complemento ateno do SSS. E a populao de alta renda utiliza

    muito o gasto direto para adquirir servios e insumos no providos pelos dois sub-sistemas.

    O Financiamento do Sistema de Sade

    Atualmente, o Brasil destina cerca de 8,5% do PIB para o financiamento do seu

    sistema de sade, sendo 56,3% provenientes de fontes privadas e 43,7% de fontes

    pblicas.35Uma parte do financiamento privado da sade no Brasil corresponde a despesas

    das famlias com servios e insumos, correspondendo a cerca de 7,2% do gasto familiar

    total. Entre os 40% de mais baixa renda da populao, 74,2% deste gasto se destina

    compra de medicamentos no cobertos pelo SUS. J entre os 10% de mais alta renda

    42,3% deste gasto tem a ver com despesas relativas a planos de sade.36

    Existe ainda uma considervel superposio do financiamento dos servios de sade

    no pas. Conforme demonstrado na figura abaixo, os gastos com servios financiados pelo

    SUS so os mais volumosos se comparados com os gastos dos demais. Entretanto, estes

    gastos se superpem com os gastos financiados pelo SSS e por aqueles outros planos de

    sade mencionados na Tabela 5. Por outra parte, existe tambm uma considervel

    superposio dos gastos das famlias com os gastos do SUS, do SSS e dos outros planos.

    35 OPS/OMS 36IBGE

    SUS

    Gasto

    Privado

    SSS Outros

    Planos

    Superposio dos Sistemas de Sade no Brasil

    Gasto

    Privado

    Sade Suplementar

    Outros

    Planos

    SUS

  • 98

    Por estes motivos as relaes pblico-privadas relativas ao financiamento do

    sistema de sade brasileiro tambm merecem uma ateno especial para o desenvolvimento

    e a sustentabilidade deste sistema.

    Outra questo de crucial importncia para a utilizao do financiamento setorial diz

    respeito s diferentes formas de incentivo e remunerao aos prestadores de servios no

    pas. A Tabela 9 sumariza as principais formas utilizadas na remunerao de apenas dois

    tipos de prestadores, ou seja, profissionais e hospitais.

    Os profissionais so remunerados atravs de vrias modalidades, como salrio,

    unidade ou pacote de servios, procedimento, contrato formal ou informal e, mais

    recentemente, qualidade do desempenho ou resultado da ateno. Estas modalidades

    incentivam diferentes condutas do mesmo profissional na ateno a pacientes sofrendo o

    mesmo problema de sade.

    A maioria dos profissionais de sade brasileiros remunerada por alguma

    combinao destas formas de pagamento, que incentiva diferentes condutas de ateno a

    problemas semelhantes. possvel, assim, imaginar a dificuldade para que estes

    profissionais mantenham um mnimo de coerncia nas condutas de atendimento aos seus

    pacientes com os mesmos diagnsticos.

    Tabela 9 Formas de remunerao dos prestadores de servios de sade

    Prestadores

    Formas de remunerao

    Profissionais

    Salrio

    Unidade de servio

    Procedimento

    Pacote de servios

    Contrato formal ou informal

    Remunerao por desempenho ou resultado

    Hospitais

    Dirias, procedimentos e outros servios

    Pacote de servios

    Oramento financeiro

    Remunerao por desempenho ou resultado

    Algo semelhante acontece no caso dos hospitais, tambm em consequncia dos

    diferentes incentivos ateno de casos semelhantes, causados pela remunerao por

    diria, procedimento, pacote, oramento ou remunerao por desempenho ou resultado. Um

    hospital que atenda a pacientes com o mesmo problema de sade, mas que sejam cobertos

  • 99

    pelo SUS, pelo SSS, pelos outros planos ou sejam pacientes particulares, necessita dispor

    de diferentes enfoques e instrumentos de gesto, para se adequar a cada uma das

    modalidades de remunerao adotadas por estas entidades. Podemos, ento, imaginar como

    a simultaneidade destas modalidades de ateno e remunerao cada uma levando em conta diferentes itens da ateno hospitalar pode tornar bem complexa tanto a operao como a gesto dos hospitais.

    Algumas Concluses Preliminares

    Nos ltimos 35 anos o sistema de sade brasileiro vem experimentando mudanas

    significativas na sua organizao, financiamento, operao e gesto. Estas mudanas

    podem ser sintetizadas da seguinte forma:

    criao do SUS em 1980s, sem levar em conta a natureza pblico-privada j existente no sistema de sade do pas;

    dez anos depois surge o SSS como suplementar ao SUS, mas sem afetar a unicidade deste, apesar dos usurios e prestadores conviverem com os dois sistemas;

    durante este perodo persistem outros sistemas ou planos de sade sobretudo no mbito do setor pblico - mas que no fazem parte seja do SUS ou do SSS - assim

    como a ateno a pacientes particulares;

    mais recentemente comea a se considerar uma alternativa para o Brasil, tratando de combinar e harmonizar os subsistemas pblico e privados;

    Sade, superando as limitaes e consolidando os avanos dos subsistemas hoje existentes.

    Um dos requisitos para a viabilidade e o sucesso desta perspectiva de evoluo diz

    respeito construo de novas formas de relao pblico-privada na sade. Assim como de

    mecanismos e instrumentos que assegurem uma operao eficiente, efetiva e equitativa das

    mesmas.

    Temos, portanto, um desafio crucial pela frente, cuja superao exigir a parceria dos

    diferentes atores setoriais, das instncias do estado e da sociedade. E devemos tambm

    buscar o apoio de organizaes internacionais, assim como de outros pases cujos sistemas

    de sade j tenham alcanado objetivos semelhantes aos que estamos buscando. Adiante e

    sucesso, portanto, com este processo de construo do nosso novo sistema de sade.

    Referncias Bibliogrficas

    ANS, www.ans.gov.br

    ASAP, Aliana para a Sade Populacional, www.asapsaude.org.br

    IBGE, Uma anlise das condies de vida da populao brasileira 2013,www.ibge.gov.br

  • 100

    OPS/OMS, Sade nas Amricas 2007 e 2012, www.opas.org.br

    Ministrio da Sade, Portal da Sade, portalsaude.saude.gov.br

    WHO, World Health Report 2010, www.who.int

    WHO/EURO, European Health Report 2009, www.euro.who.int