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OS FUNDAMENTOS DA GEOMORFOLOGIA ILUSTRADOS COM PAISAGENS DO RIO GRANDE DO SUL Capítulo III Geomorfologia Histórica:Geomorfogênese e Superfícies de Erosão. 1. Introdução. 2. Modelos conceituais de desenvolvimento das paisagens. 3. Superfícies de erosão. 4. Geomorfogênese e Superfícies de Erosão no Rio Grande do Sul.

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OS FUNDAMENTOS DA GEOMORFOLOGIA ILUSTRADOS COM

PAISAGENS DO RIO GRANDE DO SUL

Capítulo III

Geomorfologia Histórica:Geomorfogênese e Superfícies de Erosão.

1. Introdução.

2. Modelos conceituais de desenvolvimento das paisagens.

3. Superfícies de erosão.

4. Geomorfogênese e Superfícies de Erosão no Rio Grande do Sul.

1. Introdução

A geomorfogênese é a parte da geomorfologia que estuda as paisagens do ponto

de vista temporal, seqüencial ou histórico, procura estabelecer os grandes traços da

história erosiva dos continentes. É um complemento da Geomorfologia Global.

Ordena os estágios de desenvolvimento das paisagens que precederam as formas

atuais, isto é, concentra a pesquisa na gênese das paisagens ao nível de megaformas e

em longos prazos de desenvolvimento. Junto com a Tectônica de Placas, estas

hipóteses, algumas de cunho seqüencial e cíclico, favorecem o razoável entendimento

do desenvolvimento das megaformas da paisagem. O principal conceito relacionado à

geomorfogênese é o de superfície de erosão, tão importante em Geomorfologia,

como é a noção de discordância em Estratigrafia. Ambos significam planos de

tempo referenciais onde os processos deposicionais não atuaram, no primeiro

caso, no desenvolvimento das paisagens (superfícies de erosão), e no segundo, no das

bacias sedimentares (discordâncias).

São cinco os principais modelos conceituais geomorfológicos que sintetizam o

desenvolvimento das paisagens. No passado estas concepções eram tidas como

antagônicas, atualmente são encaradas como pontos de partida ideais que se

complementam na tentativa de estabelecer a cronologia de denudação em determinada

área dos continentes, objetivo principal da Geomorfologia Histórica.

2. Modelos conceituais de desenvolvimento das paisagens.

1. Modelo Cíclico de Peneplanação Davis (1899)

2. Modelo Acíclico de Penck (1924)

3. Modelo Cíclico de Pediplanação King ( 1940)

4. Modelo Acíclico de Etchplanação Budel (1966)

5. Modelo Acíclico de Equilíbrio Dinâmico Hack (1960)

Modelo Cíclico de Peneplanação

Nesta hipótese, elaborada pelo geógrafo americano Willian Morris Davis (1899),

admite-se que, na medida em que os vales fluviais se alargam, há progressivo

decréscimo da declividade das encostas, isto é, os processos de denudação causam

gradual rebaixamento vertical, da paisagem, com o predomínio de formas convexas

das vertentes, figura 3. 1.

Fig. 3. 1 – Esquema ideal, ilustra em perfil os principais aspectos do desenvolvimento

da paisagem por “down wearing” (rebaixamento vertical). Modificado de Summerfield

(1991)

A paisagem inicial é originada por rápido soerguimento. Os processos de denudação são

condicionados pelo nível de base (nível do mar). Há diminuição progressiva dos

divisores de água e rebaixamento dos pisos dos vales. A forma final é uma superfície

erosiva quase plana, o Peneplano. Predominam vertentes convexas.

O desenvolvimento convexo das vertentes em paisagens do Rio Grande do Sul é comum

principalmente no Planalto Médio, Depressão Periférica e Escudo. A figura 3.2 é uma

paisagem do Escudo, o Cerro da Angélica, Caçapava do Sul, com vertentes convexas.

Fig. 3. 2 – Paisagem desenvolvida por rebaixamento vertical e declínio progressivo dos

ângulos das encostas, vertentes convexas. Cerro da Angélica, Escudo Sul Riograndense,

Caçapava do Sul, RS.

No estágio de juventude, após rápido episódio de soerguimento vertical de um setor do

continente, a paisagem original está praticamente preservada, os vales são encaixados,

predomina a erosão vertical dos rios, os divisores de água são largos e amplos. O

estágio maduro é considerado quando ocorre alargamento dos vales por erosão lateral e

movimentos de massa. Surgem muitos e miúdos divisores de água com topos

arredondados, onde se verifica considerável rebaixamento vertical e pouco da paisagem

original é preservada. Finalmente, durante largo espaço de tempo, ocorre a velhice, em

que a paisagem é reduzida a uma planície erosiva ondulada, com alguns morros

testemunhos residuais sustentados pelas rochas mais resistentes. Este relevo terminal do

ciclo de erosão é denominado peneplano e os processos que levam a ele são

denominados processos de peneplanação . Os perfis dos vales se desenvolvem ao longo

do tempo com suavização das vertentes que adquirem progressivamente formas

convexas

A elaboração do modelo em estágios ideais de desenvolvimento das paisagens,

proposto pela primeira vez por Davis, ordenados em um ciclo de erosão generalizado,

ao longo do tempo e a longo prazo, é importante ponto de partida para o estudo e

entendimento seqüencial das formas.

Modelo Acíclico de Walter Penck (1924)

O geólogo alemão Walter Penck (1924), argumentou, baseado em observações

de campo, que a maioria das encostas não se suavizam ao se desgastarem pelos

processos de denudação, como postulava a hipótese de peneplanação de Davis. Segundo

Penck, as características geométricas das encostas são controladas principalmente pelas

relações da taxa de soerguimento (variável) com os processos de denudação.

Penck visualizou o soerguimento acompanhado de denudação, resultando uma

superfície de nível ou Plano Primário. Em uma primeira fase, o soerguimento é mais

rápido que a denudação, as formas das vertentes são convexas, os talvegues dos vales

são fundos e estreitos, figura 3.4.

Fig. 3. 4 – Acima, corte longitudinal em paisagem onde o soerguimento e

denudação são síncronos, mas com taxas relativas variáveis. No centro, esquema de

soerguimento dômico síncrono com os processos de denudação, vista panorâmica .

Abaixo, secção transversal idealizada, interpretação “cíclica” de Davis (1932), das

idéias de Penck. Modificado de Summerfield (1991) e Von Engeln (1948).

Em um segundo estágio a taxa de denudação se equilibra com a taxa de

soerguimento resultando vertentes retilíneas e talvegues dos vales mais abertos. Por

fim, a denudação predomina sobre o soerguimento, os vales ficam bem abertos e as

vertentes são côncavas. A superfície resultante é denominada “Endrumpf”.

O limite entre as vertentes com formas diferentes, causadas por soerguimentos

diferenciais, foi denominado por Penck como “knikpunkten”, diferente do “nickpoint”

de Davis, este significando limites entre rochas de diferentes resistências.

Modelo Cíclico de Pedimentação – Pediplanação, King (1962).

O modelo conceitual cíclico proposto por King (1962) é a primeira aproximação da

Geomorfologia com a moderna Tectônica de Placas. A premissa fundamental do

modelo conceitual de Lester King, baseado em observações das paisagens da África,

América do Sul e Austrália, é que rochas resistentes aos processos de denudação são

consumidas lateralmente (back wearing”) , formando escarpas com perfil característico,

figura 3.5, particularmente nos grandes escarpamentos espalhados pelos continentes.

Fig. 3. 5 - – Modelo conceitual de denudação cíclica por recuo lateral paralelo

de escarpas. Exemplo ilustrativo da margem passiva leste do Brasil, modificado de

Maia e Bezerra (2014). Abaixo formas primitivas resultantes da ruptura do continente

Gondwana, propostas por King (1962).

Notar que neste modelo são incluídos os depósitos correlativos da denudação, junto à

Costa, os quais possibilitam a datação absoluta dos eventos de denudação no

Continente, bem como registam os processos denudacionais desenvolvidos no

Continente.

A hipótese de Lester King do recuo paralelo de escarpas, se ajusta razoavelmente às

grandes escarpas de margens passivas em diferentes estágios de desenvolvimento que se

espalham pelos continentes. É o modelo atual mais coerente com a Geomorfologia

Global, associada às concepções geotectônicas desenvolvidas na teoria da Tectônica de

Placas que vem sendo aperfeiçoada desde a década de 60 do século passado, quando

surgiu e se firmou como paradigma fundamental da Geologia.

A comparação da concepção cíclica de desenvolvimento das paisagens a longo prazo

concebida por Lester King, com a concebida por Davis, em termos de relação forma do

relevo com tempo, chega a resultados opostos aos propostos por Davis, ou seja, o

estágio de velhice ou peneplanação do ciclo de Davis, coincide com o pediplano de

idade mais recente no modelo de King e o estágio de juventude, com o pediplano

cimeira de idade mais antiga, figura 3.6.

Fig. 3. 6 – Concepção do desenvolvimento do relevo a longo prazo em escarpas de

margens passivas, por recuo paralelo destas. Acima é colocada a nomenclatura dos

estágios de desenvolvimento do relevo a longo prazo proposta por Davis. Notar que os

resultados são opostos aos de Lester King, no que se refere às idades relativas das

superfícies de erosão. Modificado de Summerfield (1991)

As correspondentes declividades das encostas dependem das propriedades físicas dos

materiais componentes. As escarpas retrocedem paralelamente a estas declividades,

figura, 3.7.

Fig. 3. 7 – Elementos de uma escarpa recuada em rochas resistentes, segundo a

concepção de recuo lateral “back wearing”, King (1962).

Rochas resistentes, capazes de desenvolver face livre são

susceptíveis a processos de pedimentação – pediplanação com recuo paralelo

das vertentes, geram pedimentos e pediplanos a partir de um relevo escarpado inicial

com os seguintes elementos:

A. Encosta superior de lavagem ou crista de forma convexa suave , onde

predominam processos de intemperismo e movimentos de massa

lentos do tipo rastejo.

B. Face livre ou escarpa, sub vertical formada por rocha dura onde

predominam processos rápidos de queda e rolamento de rochas e regolito

C. Encosta constante ou vertente de detritos, formada por material

proveniente da encosta superior de lavagem e da face livre. O ângulo de

pendente desta encosta depende do tipo de material detrítico. É em torno

de quarenta e cinco graus quando ocorrem depósitos de tálus. Neste

setor predominam movimentos de massa rápidos como fluxos de

detritos , escorregamentos rotacionais e transacionais

D. Encosta inferior de lavagem ou pedimento contígua a vales aluviais de

rios, superfície erosiva quase plana onde predominam processos de

intemperismo e movimentos de massa lentos do tipo rastejo.

E. A atuação conjunta destes processos leva a um perfil final de vales com

forma côncava.

A forma fundamental gerada pelo recuo paralelo de encostas dos vales é o

pedimento e ocorre frontalmente aos maiores escarpamentos. Cada pedimento, à

medida que o relevo é consumido pode juntar-se a um seu vizinho, para formar

extensas superfícies erosivas quase planas, denominadas pediplano, com ocasionais

testemunhos de rochas mais resistentes, denominadas inselbergues ou morros ilha,

figura 3.8.

Fig.3. 8 – À esquerda insebergue ou “morro ilha” sobrante em pedimento. Ao lado,

insebergue com vertentes côncavas em pediplano resultante do recuo paralelo das

escarpas do Planalto. Manuel Viana, RS. Abaixo, fases de desmantelamento do relevo

por recuo paralelo de escarpas.

Modelo Acíclico de Etchplanação.

O geólogo Julius Budel (1966) elaborou hipótese do desenvolvimento a longo

prazo das paisagens que é satisfatória para entender os processos que ocorrem no setor

denominado por King, encosta superior de lavagem ou crista, onde predominam os

processos de intemperismo, A, figura 3.7.

A figura 3.9 representa espesso regolito em divisor de águas passível de

desenvolvimento por processos de etchplanação.

Fig. 3. 9. - Superfície de intemperismo, na encosta superior de lavagem, (A,

figura 6). Espesso regolito desenvolvido no granito Viamão, Viamão, RS.

A noção fundamental desta concepção é o de dupla superfície de

aplainamento, composta pela superfície atual do relevo e pela superfície basal de

intemperismo, no contato inferior do regolito com a rocha basal, figura 3. 10.

Fig. 3. 10 – Espesso regolito desenvolvido pela alteração de vulcanitos ácidos na

encosta superior de lavagem, Planalto dos Campos Gerais, Bom Jesus, RS. Notar a

superfície basal de intemperismo abrupta e irregular, contato regolito – rocha.

Em regiões mais ou menos planas, cobertas por espessos regolitos residuais

onde predominam grandemente os processos de intemperismo químico,

principalmente em extensos planaltos de rochas cristalinas plutônicas ou vulcânicas,

expostas a climas tropicais úmidos, os processos de denudação ocorrem

simultaneamente, através dos eventos erosivos de remoção de material detrítico da

superfície e por dissolução química pela água subterrânea , no chamado front de

intemperismo ou superfície basal de intemperismo, situado no contato inferior do

regolito com a rocha inalterada. A combinação dos processos de superfície com os que

atuam no front de intemperismo em sub superfície, produz um “etchplano” ou uma

etchsuperfície. Os processos que atuam neste modelo de desenvolvimento do relevo

são chamados processos de etchplanação, figura 3. 11.

Fig. 3. 11 – Modelos ideais de diversas situações de etchplanos na superfície

superior de lavagem, modificado de Thomas (1960).

Onde predomina o intemperismo sobre a erosão formam-se etchplanos com regolito

laterítico. A superfície basal de intemperismo não aflora, (A). Onde predominam os

processos erosivos de superfície, em fase inicial, ocorrem etchplanos parcialmente

dissecados com raras exposições da rocha basal (B). A medida que os processos

erosivos continuam, pode-se passar para etchplanos dissecados, com exposição da

superfície basal de intemperismo (C), etchplanos dissecados com incisões da drenagem

no regolito(D) e superfície basal de intemperismo com incisões da drenagem e resíduos

do etchplano, (E).

Modelo Acíclico de Equilíbrio Dinâmico Hack (1960)

Paisagem independente do tempo.

O modelo de equilíbrio dinâmico de Hack foi uma reação ao pensamento evolucionista

impregnado na noção de Davis de Ciclo de Erosão. As paisagens podem ser melhor

entendidas em termos de equilíbrio dinâmico. Rejeitando a ideia da mudança

progressiva da forma da paisagem através do tempo, Hack retomou a idéia de Gilbert

focada no ajustamento contínuo entre força e resistência. Ele argumentou que em

paisagens que sofreram longo período de denudação deverá haver um ajustamento

contínuo entre os controles litológicos e processos de superfície predominantes. No caso

ideal em que o nível de base, processos e litologias permanecem constantes através do

tempo, a forma da superfície não muda e toda a paisagem é rebaixada a uma taxa

constante. Relevos, ângulos de encosta são ajustados de tal maneira que cada unidade de

área descarrega a mesma carga de sedimentos. Regiões de rochas resistentes têm relevo

enrugado e escarpado, enquanto que litologias não resistentes tem relevos rebaixados e

encostas suaves. É um modelo de equilíbrio estável, figura 3.12.

Fig. 3. 12 – Esquema ideal do equilíbrio dinâmico, paisagem independente do tempo.

Rochas duras ressaltam na paisagem, rochas friáveis aparecem rebaixadas na paisagem.

Modificado de Casseti (2000).

Avaliação dos modelos de desenvolvimento das paisagens a longo prazo

Os modelos são generalizações abstratas ideais que auxiliam a visualização do

desenvolvimento histórico das paisagens. Devem ser considerados como pontos de

partida ou guias para estudos concretos de geomorfologia e tomados como

complementares, antes que excludentes.

O modelo de recuo paralelo de escarpas por processos de pedimentação –

pediplanação é o mais abrangente, pode ser aplicado sempre que o relevo residual

apresentar escarpas.

O modelo de rebaixamento vertical do relevo e suavização progressiva das

vertentes por processos de peneplanação é apropriado para análise de paisagens onde

ocorre ausência de escarpas e afloram rochas e regolitos de baixa resistência. O modelo

que leva em conta processos de etchplanação é viável para análise de paisagens

esculpidas em rochas cristalinas cobertas por espessos regolitos em climas tropicais.

O modelo de equilíbrio dinâmico é adequado para o estudo de paisagens

independentes do tempo, por exemplo, no mapeamento de rochas a partir de suas

propriedades geomorfológicas, usando a Aerointerpretação.

As superfícies de erosão mais antigas, são policíclicas e poligenéticas,

provavelmente foram modeladas com a participação do conjunto dos processos

evocados nos três principais modelos de desenvolvimento das paisagens,( Davis, e

King, Budel).

3. Superfícies de erosão

O conjunto de peneplanos, pediplanos e etchplanos que ocorrem concretamente

em diversos níveis topográficos da paisagem são denominados genericamente de

Superfícies de Erosão.

Estas superfícies de erosão são fatos da paisagem, (impossível nega-las).

Assumem importância em geomorfologia por representarem planos de tempo.

Funcionam nas paisagens como as discordâncias nas bacias sedimentares. Nestas, as

discordâncias mais antigas estão na parte inferior do empilhamento das rochas da bacia

enquanto que, as superfícies de erosão mais velhas geralmente ocorrem na parte

superior, cimeira do relevo, por isto estas também são chamadas Superfícies de

Cimeira. Superfícies erosivas enterradas e exumadas são consideradas discordâncias.

A principal característica das velhas superfícies de erosão, além de situarem-se na

cimeira do relevo, é serem policíclicas, isto é, foram moldadas em mais de um ciclo

de erosão e poligenéticas, foram objeto de diferentes climas.

A nível mundial, Lester King foi o precursor do mapeamento, empilhamento

seqüencial e correlação das superfícies de erosão. Desenvolveu principalmente o seu

trabalho na África do Sul, figura 3.13. Mapeou superfícies de erosão na costa e interior

do Brasil Oriental, King (1956) Coerente com o esquema de desenvolvimento das

paisagens, relacionado à teoria da deriva dos continentes, correlacionou as superfícies

de erosão do Brasil com as correspondentes no continente africano.

Fig. 3. 13 – Superfícies de erosão da África do Sul. Modificado de Holmes (1970). A

superfície mais antiga, Gondwana tem sua idade inicial anterior ao rift do Atlântico, as

demais têm idade inicial posterior a este evento de referência e têm como nível base de

erosão, os Oceanos Atlântico e Índico.

No Brasil o estudo regional das superfícies de erosão, em sua fase inicial, foi

feito principalmente por Fernando de Almeida e Aziz Ab’ Saber e João José Bigarella.

O segundo pesquisador estabeleceu o esquema da geomorfogênese e superfícies

de erosão do Rio Grande do Sul em um de seus trabalhos referência, Participação das

Superfícies de Aplainamento nas Paisagens do Rio Grande do Sul (1969).

4. Geomorfogênese e Superfícies de Erosão do Rio Grande do Sul

A história de denudação no Rio Grande do Sul está registrada nas paisagens por um

esquema de superfícies de erosão com distribuição geográfica, posição topográfica e

compartimentação bem definidos. A sua cronologia relativa foi elaborada, pela primeira

vez, pelo geomorfólogo brasileiro Aziz Nacib Ab’ Saber em (1969)

A figura 3.14, vide localização, é uma secção morfo – lito - estratigáfica esquemática

que ilustra as superfícies de erosão desenvolvidas no Rio Grande do Sul. O relevo do

Estado é compartimentado em duas superfícies de erosão cimeira Planálticas mais

antigas, policíclicas e poligenéticas, desenvolvidas a partir da formação da margem

passiva da Placa Sul Americana, no Soerguimento do Uruguai, denominadas

respectivamente por Ab’Saber Superfície de Vacaria, no flanco deste e Superfície de

Caçapava no seu núcleo, ver figura 2. 32, capítulo Geomorfologia Global.

Embutida nestas e mais nova, ocorre a Superfície Inter Planáltica da Campanha,

dominante nas paisagens do Rio Grande do Sul e, principalmente na Depressão

Periférica, formada pelo consumo das antigas superfícies cimeira.

As superfícies originadas por deposição sedimentar, Planícies Fluviais e Planície

Costeira são as mais recentes das paisagens do Rio Grande do Sul

Fig. 14 – Secção Esquemática NE – SW,( ver localização) ilustrando as superfícies de

erosão do Rio Grande do Sul, antigas Planálticas de Cimeira e novas Interplanálticas

Embutidas. Modificado de Ab’ Saber (1969).

Além de posições altimétricas características estas superfícies de aplainamento

apresentam localizações específicas relativas à mega estrutura Domo Uruguai – SW da

África, figura 3.15.

Fig. 3. 15 – Superfícies de erosão e deposição do Rio Grande do Sul e seu

posicionamento em relação ao Mega Domo Uruguai – SW da África.

A Superfície de Vacaria ocorre no flanco do meio Domo Uruguai cujo limite é o rio

Uruguai o qual apresenta padrão regional semi anelar e características de drenagem

disruptiva. Esta superfície de erosão cimeira, a mais velha que ocorre no Rio Grande do

Sul, com idade Paleógina ou pré Paleógina (Ab’ Saber 1969) foi parcialmente

consumida por recuo paralelo de escarpas através de processos erosivos e de

movimentos de massa rápidos por Pedimentação - Pediplanação, a partir das escarpas

primitivas cujo paleo espaço atualmente são a Superfície de Vacaria degradada, as

superfícies mais novas, da Campanha, Planícies Fluviais e Planície Costeira . Na

encosta superior de lavagem, reverso da momoclinal correspondente ao flanco do meio

domo, foi e está sendo degradada principalmente por rebaixamento vertical por

processos de peneplanação – etchplanação com predomínio de intemperismo e

movimentos de massa lentos.

Os processos de denudação atuam sobre rochas vulcânicas, basaltos e riolitos, figura

3.16.

Fig. 3. 16 – Superfície Cimeira Vacaria esculpida em rochas ígneas vulcânicas, riolítos

e basaltos. Planalto dos Campos Gerais, São Francisco de Paula, RS. Esta superfíce está

preservada a leste e degradada a oeste, no flanco do Soerguimento do Uruguai. Acima, à

direita, vista aérea generalizada da Superfície de Vacaria. Notar a escarpa que

corresponde ao limite atual de erosão da margem passiva em Ombreira de Rifte, início

da Serra do Mar. Imagem Google Earth. À esquerda vista panorâmica de campo da

Superfície de Erosão Vacaria.

A Superfície Cimeira de Caçapava foi e está sendo consumida no núcleo do

Soerguimento do Uruguai - SW da África, principalmente por processos erosivos e de

movimentos de massa Pedimentação – Pediplanação a partir das bordas dos relevos e

por Peneplanação – Etchplanação, na encosta superior de lavagem onde predominam

processos de intemperismo e movimentos de massa lentos. O seu paleo espaço é

ocupado pelas superfícies mais novas, da Campanha, Planícies Fluviais e Planície

Costeira.

Os processos de denudação atuaram e atuam sobre variados tipos de rochas ígneas,

sedimentares e metamórficas do Escudo, mas principalmente sobre rochas ígneas

plutônicas, granitos, no núcleo do meio Domo Uruguai , figura 3.17.

Fig 3. 17 – No horizonte Superfície Cimeira de Caçapava preservada em rochas ígneas

plutônicas, granitos . Em primeiro plano Superfície Interplanáltica da Campanha

escavada pelo consumo da Superfície de Caçapava. Planalto Sul Riograndense,

Caçapava do Sul, RS. Ao lado, vista aérea geral da Superfície de Caçapava. Imagem

Google Earth.

A idade inicial da superfície cimeira de Vacaria é aventada como Cretácio Superior

(120 milhões de anos) e a de Caçapava como Terciário Inferior (60 milhões de anos),

Ab’ Saber (1969).

Os restos destas duas velhas superfícies cimeira policíclicas e poligenéticas formam o

teto topográfico atual das paisagens do Rio Grande do Sul.

A partir do consumo destes relevos primitivos formou-se uma superfície interplanáltica

mais nova, a Superfície da Campanha cuja idade inicial é colocada no Terciário

Médio, a partir de 40 milhões de anos, Ab Saber (1969) subdividida em dois níveis

Superfície da Campanha Nova e Superfície da Campanha Velha (Ab’ Saber 2000).

A grande parte das paisagens atuais do Rio Grande do Sul é representada por esta

superfície erosiva.

Pela ampla predominância de vertentes convexas sem faces escarpadas e pelo seu

desenvolvimento preferencial, mas não absoluto, em rochas sedimentares mais ou

menos friáveis, possivelmente predominam processos de peneplanação e etchplanação

na gênese das paisagens da Superfície da Campanha.

O grande evento associado ao desenvolvimento desta superfície de erosão , onde ela é

mais característica, foi e está sendo a escavação da Depressão Periférica Gaúcha,

associada principalmente ao desenvolvimento das bacias de drenagem dos rios Jacuí e

Ibicuí. Circunda o núcleo do meio Domo Uruguai e delimita-o do seu flanco, este

ocupado principalmente pelo Planalto Vulcânico da Formação Serra Geral.

Embutidas na Superfície da Campanha ocorrem Superfícies de Deposição Aluviais e

Planície Costeira, pleistocênicas e holocênicas, associadas aos depósitos atuais e sub

atuais dos sistemas de drenagem e da dinâmica litoral figura 3. 18.

Fig. 3. 18 - No horizonte Superfície Interplanáltica da Campanha esculpida em rochas

sedimentares, arenitos. Em primeiro plano, Superfície Aluvial de Deposição Recente

embutida na Superfície da Campanha. Rio Ibicuí, Manuel Viana, RS,. Ao lado, vista

aérea geral da Superfície da Campanha. Imagem Google Earth.

A idade inicial das superfícies deposicionais recentes é colocada a partir do Pleistoceno

(1 milhão de anos).