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Cadernos Lab. Xeolóxico de Laxe Coruña. 2005. Vol. 30, pp. 39-56 ISSN: 0213-4497 Geologia estrutural e geotecnia do maciço granítico do Alto da Cabeça Santa (NW de Portugal): implicações para a gestão do georrecurso da pedreira da Mimosa Structural geology and geotechnics of the Alto da Cabeça Santa granitic rock-mass (NW Portugal): implications for the georesources management of Mimosa quarry Abstract This work presents the results of the structural geology, geomorphology and geotechnics studies of block delimitation of a granitic rock mass. For this characterisation, the scanline sampling technique of disconti- nuities has been applied to the study of free rock mass faces from Mimosa granitic quarry (Alto da Cabeça Santa, Penafiel; NW Portugal). For that purpose, the surrounding area of the open quarry as well as select- ed granitic outcrops were studied using the following tools: surface geological/geomorphological mapping, structural geology and geotechnics/geomechanics techniques. So, a morphotectonic analysis of topograph- ic map and geological survey has then been carried out. In addition, the evaluation methods of field data for discontinuities sets and the statistical characterisation of their orientation, spacing and extension are also presented. The results achieved at different scales are compared in order to detect the presence of a multi- scale fracture network pattern. The use of these techniques for understanding the rock mass block delimi- tation may contribute to improve the sustainable management of the georesources from Mimosa granitic quarry. Key words: discontinuities, scanline sampling technique, structural geomorphology/geology, geotechnics, NW Portugal. (1) Departamento de Engenharia Geotécnica, Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP). Rua do Dr. António Bernardino de Almeida, 431, 4200-072 Porto, Portugal. (e-mail: [email protected]) (2) Mota-Engil: Engenharia e Construção, S.A., Porto. Portugal. (3) Centro de Minerais Industriais e Argilas (MIA) da Universidade de Aveiro. Portugal. (4) Departamento de Geografia (GEDES), FLUP, Universidade do Porto. Portugal. (5) Departamento de Geologia, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e Laboratório de Tectonofísica e Tectónica Experimental (LATTEX). Portugal. 1,3 1,3 2,1 ; TEIXEIRA, J. 3 ; GOMES, A. 4 ; CHAMINÉ, H. I. ; VIEIRA, A. R. & FONSECA, P. E. 5 SANTOS PEREIRA, C. M.

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Cadernos Lab. Xeolóxico de LaxeCoruña. 2005. Vol. 30, pp. 39-56

ISSN: 0213-4497

Geologia estrutural e geotecnia do maciçogranítico do Alto da Cabeça Santa (NW de

Portugal):implicações para a gestão do georrecurso da

pedreira da Mimosa

Structural geology and geotechnics of the Alto daCabeça Santa granitic rock-mass (NW Portugal):implications for the georesources management of

Mimosa quarry

Abstract

This work presents the results of the structural geology, geomorphology and geotechnics studies of blockdelimitation of a granitic rock mass. For this characterisation, the scanline sampling technique of disconti-nuities has been applied to the study of free rock mass faces from Mimosa granitic quarry (Alto da CabeçaSanta, Penafiel; NW Portugal). For that purpose, the surrounding area of the open quarry as well as select-ed granitic outcrops were studied using the following tools: surface geological/geomorphological mapping,structural geology and geotechnics/geomechanics techniques. So, a morphotectonic analysis of topograph-ic map and geological survey has then been carried out. In addition, the evaluation methods of field datafor discontinuities sets and the statistical characterisation of their orientation, spacing and extension are alsopresented. The results achieved at different scales are compared in order to detect the presence of a multi-scale fracture network pattern. The use of these techniques for understanding the rock mass block delimi-tation may contribute to improve the sustainable management of the georesources from Mimosa graniticquarry.

Key words: discontinuities, scanline sampling technique, structural geomorphology/geology, geotechnics,NW Portugal.(1) Departamento de Engenharia Geotécnica, Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP). Rua do Dr. AntónioBernardino de Almeida, 431, 4200-072 Porto, Portugal. (e-mail: [email protected])(2) Mota-Engil: Engenharia e Construção, S.A., Porto. Portugal.(3) Centro de Minerais Industriais e Argilas (MIA) da Universidade de Aveiro. Portugal.(4) Departamento de Geografia (GEDES), FLUP, Universidade do Porto. Portugal.(5) Departamento de Geologia, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e Laboratório de Tectonofísica eTectónica Experimental (LATTEX). Portugal.

1,3 1,3 2,1; TEIXEIRA, J.3;GOMES, A.4

; CHAMINÉ, H. I. ; VIEIRA, A. R.& FONSECA, P. E.5

SANTOS PEREIRA, C. M.

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INTRODUÇÃO GERAL

Em estudos de caracterização geotécnica e geo-mecânica de maciços fracturados a contribuição dageologia e da geomorfologia são de extrema impor-tância nas várias fases de qualquer projecto de enge-nharia de maciços rochosos (e.g., TERZAGHI,1965; ROCHA, 1981; VIDAL ROMANÍ & TWI-DALE, 1999). Com efeito, a habitual complexidadedas unidades geológicas, no que se refere à diversi-dade dos tipos de litologias, à sua heterogeneidade egrau de alteração e ainda às superfícies de desconti-nuidades que as intersectam, reflecte-se em termosde estabilidade e de condições hidrogeológicas deum dado maciço rochoso. De facto, as ferramentasgeológicas e geomorfológicas fl cartografia geoló-gica e geomorfológica, geologia e geomorfologiaestrutural, hidrogeologia e fotogeologia fl quandoaplicadas à prospecção geológico-geotécnica e geo-mecânica, perspectivadas num enquadramentogeológico/geomorfológico regional actualizado, emque se valorizam os trabalhos à escala local baseadosem critérios técnico-científicos (e.g., ISRM, 1978,1981; CFCFF, 1996; HOEK, 2000; GONZÁLEZde VALLEJO et al., 2002), serão concerteza umaferramenta de excelência, dentro dos seus limites deactuação e de competência, em estudos de naturezaaplicada. Esta dicotomia fl geociências versus pros-pecção geológico-geotécnica fl tem sido ampla-mente abordada em trabalhos aplicados conformeestá patente nas preocupações de muitos autores(e.g., CARVALHO, 1984; CRUZ & OLIVEIRASILVA, 1991; DINIS da GAMA et al., 1992;CHAMINÉ & GASPAR, 1995; AFONSO et al.,1999; CHAMINÉ et al., 2001; LISBOA &OLIVEIRA, 2003).

O trabalho em questão pretende caracterizar ascondicionantes geológico-geotécnicas do maciçorochoso da pedreira granítica da Mimosa. Estapedreira está situada no lugar do Alto da CabeçaSanta na Freguesia de Peroselo (Concelho dePenafiel, Distrito do Porto; NW de Portugal) eencontra-se, actualmente, em fase de exploraçãopela empresa MOTA-ENGIL, S.A. O georrecurso gra-nítico em questão é explorado pela empresa parafins vários ligados à construção civil e obras públi-cas, tais como brita, “tout-venant”, enrocamento ebalastro.

ENQUADRAMENTO GEOMORFO-LÓGICO E GEOLÓGICO REGIONAL

A pedreira da Mimosa insere-se na bacia hidro-gráfica do Rio Douro, estando compreendida entreos paralelos 40º20’ e 40º10’ de Latitude Norte e osmeridianos 08º43’ e 08º40’ de Longitude Oeste. Apedreira da Mimosa situa-se na vertente ocidentaldo maciço granítico de Cabeça Santa (fig. 2), o qualassume uma orientação geral NNE-SSW. Este maci-ço apresenta, grosso modo, uma forma elipsoidal,alongada e constitui destacado relevo na região(441m). O bordo Oeste desta elevação constituiráuma importante escarpa de falha regional, a qual ébem patente na geometria alongada do corpo graní-tico, na deformação do material granítico junto aesse bordo e, sobretudo, no lineamento morfotectó-nico rectílineo aproveitado pela Ribeira das Lajes.

A morfologia local é marcada pela geometriados acidentes tectónicos que serão os principais res-ponsáveis pelo arranjo regional do relevo. Destaca-se um conjunto de falhas com direcções N-S aNNE-SSW que individualizam vários blocos mon-tanhosos e que explicam o traçado rectilíneo daribeira de Camba, assim como, o seu vale encaixadojunto da foz. Este condicionamento tectónico tam-bém se manifesta na ocorrência de nascentes ter-mais, com águas mineralizadas, o que em parte reve-la uma circulação lenta e profunda (CALADO,2001). Obliquamente a esta direcção temos linea-mentos NW-SE que determinam a disposição emblocos escalonados de topo aplanado e que sãoquase exclusivamente entalhados pela rede hidro-gráfica secundária, a qual corresponde nalgunscasos a vales de fractura alinhados, típicos do mode-lado granítico (DAVEAU, 1988).

Tal como noutras regiões graníticas do Nortede Portugal a morfologia desta área é marcada pelaconservação de superfícies de aplanamento, separa-das por vertentes abruptas, quer se trate de flancosdas elevações quer das vertentes dos vales. Por isso,os cursos de água apresentam um traçado geométri-co que resulta da sua adaptação às faixas deesmagamento de falhas (BRUM FERREIRA, 1979).Merece também alguma ênfase, as áreas deprimidasde fundo aplanado, de dimensão quilométrica e defraca incisão pela rede hidrográfica, sendo o alvéolode Perozelo e o corredor Oldrões-Paredes exemplos

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desse contexto geomorfológico. Estas formascomuns em substrato granítico correspondem avariações na natureza da rocha ou ao entrecruza-mento de fracturas que facilitam a penetração deágua e a alteração subsequente (BRUM FERREI-RA, 1978). Os alvéolos estão quase sempre ligadosà presença de rochas cristalinas e/ou cristalofilinas,o que sugere que a alteração diferencial terá sidodeterminante na geração destas formas.

O maciço granítico de Penafiel faz parte de umafaixa de granitóides variscos, com orientação geralNW-SE, que se estendem desde o Alto Minho até àsBeiras. Do ponto de vista geotectónico insere-se naZona Centro-Ibérica (ZCI) do Maciço Ibérico(PEREIRA et al., 1989; DIAS et al., 2000). O mate-rial-rocha presente na pedreira da Mimosa (fig. 1) écomposto por granitos monzoníticos porfiróides,de duas micas essencialmente biotíticos associados aestruturas de idade Varisca (MEDEIROS et al.,1980; PEREIRA et al., 1989). A área da pedreira élimitada a Norte por granitos porfiróides, de grãogrosseiro de duas micas, essencialmente biotíticosque ocupam uma faixa de orientação NW-SE, aSudeste por granitos monzoníticos de duas micas,essencialmente biotíticos e, finalmente, a Oeste porgranodioritos e raros quartzodioritos biotíticos(MEDEIROS et al., 1980).

Em termos hidrogeológicos regionais a área éconstituída por um meio fracturado com uma con-

dutividade hidráulica variando entre 1 e 3l/s.km2

(PEDROSA, 1999). No local da pedreira, a drena-gem da escorrência superficial é condicionada pelosvários sistemas de fracturas e influenciada pelaausência de uma zona de alteração mais espessa,pelo que no processo de drenagem o escoamentosuperficial poder-se-á sobrepor à infiltração.

Da análise da Carta Neotectónica de PortugalContinental (CABRAL & RIBEIRO, 1988) consta-ta-se que o sector em estudo se enquadra próximo asistemas de mega-descontinuidades tectónicas comactividade neotectónica importante, com orientaçãogeral NNE-SSW a N-S. A divisão regulamentar deli-mita o território português em quatro zonas poten-cialmente sísmicas que por ordem decrescente derisco sísmico, são designadas por A, B, C e D(segundo o Regulamento de Segurança e Acçõespara Estruturas de Edifícios e Pontes, aprovadopelo Decreto-Lei nº235/83, de 31 de Maio, inRSAEEP, 2000), definindo o tipo de construção

aconselhável em cada zona (RSAEEP, 2000 e, maisrecentemente, no âmbito do Euro-código 8;SOUSA OLIVEIRA et al., 1999). O Concelho dePenafiel encontra-se incluído na zona D, onde seadmite não serem de recear os efeitos dos sismosnas construções, muito embora se tenham já verifi-cado alguns epicentros de sismos históricos e ins-trumentais (RIBEIRO & CABRAL, 1992;CABRAL, 1995) nas proximidades da região.Contudo, a sismicidade da região Minhota é mode-rada, com sismos de magnitude inferior ao grau 5,mas com frequência acima da média para o territó-rio português (SOARES de CARVALHO, 1992;CABRAL, 1995). Este facto denuncia que a neotec-tónica se mantém activa, existindo mesmo indíciosgeomorfológicos que confirmam uma actividadetectónica recente para a região.

ESTUDO DA COMPARTIMENTAÇÃODO MACIÇO ROCHOSO DA MIMOSA

Considerações iniciais

O presente trabalho foi desenvolvido em duasfases complementares, a saber: uma primeira fase,referente ao trabalho de campo, enquadrada na fasede reconhecimento geológico e geomorfológicoestrutural e de prospecção geológico-geotécnica e,uma segunda fase, ligada ao processamento, análisee interpretação dos dados para uma caracterizaçãoda compartimentação do maciço rochoso, as quaisforam perspectivadas na geotecnia e geomecânicado maciço rochoso. Assim, neste trabalho, são refe-ridos de uma forma sucinta os métodos e as técni-cas para tratamento dos dados de terreno, visando adefinição das famílias de descontinuidades, bemcomo a caracterização estatística das suas atitudes(recorrendo, na medida do possível, à terminologiae às recomendações propostas pela ISRM (1978,1981), e pelo CFCFF, 1996). Apresentam-se, ainda,os resultados do estudo da rede de fracturaçãoregional, com base na análise morfoestrutural demapas topográficos e dos reconhecimentos geológi-cos locais. Comparam-se os resultados obtidos àmega e macroescala no sentido de averiguar a pre-sença de um padrão de fracturação com dimensãomulti-escala. Por fim, discute-se a utilidade destametodologia e das técnicas associadas para aconceptualização de um modelo geotécnico-geomecâ-

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Fig. 1 – Enquadramento geológico regional da área da Cabeça Santa (Pedreira da Mimosa).

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nico em meio fracturado. Para o efeito, apresenta-se,ainda que de uma forma sumária, a técnica de amos-tragem linear aplicada a faces expostas em diferen-tes taludes rochosos, bem como os métodos de tra-tamento geológico-geotécnico das descontinuida-des.

A aplicação da técnica de amostragem linear emfaces expostas do material-rocha para a caracteriza-ção da compartimentação do maciço poderá, certa-mente, contribuir para uma melhor gestão do geor-recurso do Alto da Cabeça Santa (fig. 1). O trabalhoexploratório de SANTOS PEREIRA (2004) apontaos principais constrangimentos geológico-geotécni-cos e o estudo que, ora se apresenta, permite avan-

çar com uma caracterização geológico/geomorfoló-gica estrutural e geotécnica do maciço da Pedreirada Mimosa.

Material e métodos

A região na qual se situa a pedreira da empresaMOTA-ENGIL,S.A., em Penafiel, é por excelênciauma área onde predominam rochas graníticas. Dereferir que os granitos extraídos desta pedreira, e deoutras na região, se destinam essencialmente a obrasde construção civil e obras públicas. De um modogeral, pode-se considerar, numa abordagem mera-mente qualitativa, que o material-rocha da pedreira

Fig. 2 – Esboço geomorfológico da região da Cabeça Santa (o perímetro da área ocupada pelas diversas pedreiras está deacordo com a Carta Militar de Portugal, folha 124, à escala 1/25.000, edição de 1998).

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da Mimosa apresenta um grau de fracturação eleva-do a muito elevado, de tal modo que está vocaciona-da para a extracção de agregados para a construçãocivil e obras públicas. As características geológico-estruturais do maciço, resultantes da intensidade dadeformação (frágil) e do grau de alteração (especial-mente do bordo Oeste do maciço), acarretam fortesrestrições à extracção deste litótipo granítico tendoem vista, por exemplo, o mercado de rocha orna-mental. De referir que esta pedreira antes de perten-cer à empresa MOTA-ENGIL, S.A. era propriedade deuma empresa com características artesanais, a qualse dedicava, fundamentalmente, à produção decubos de granito para obras rodoviárias (MOTA &COMPANHIA, 2003). Na área envolvente regista-se uma grande proliferação de pedreiras, muitasdelas actualmente em laboração, as quais são res-ponsáveis por importantes repercussões sócio-eco-nómicas e ambientais na região (MENDES, 2000).

Na impossibilidade, do ponto de vista prático,de estudar exaustivamente a compartimentação domaciço rochoso na totalidade da área envolvente dapedreira da Mimosa, optou-se por realizar esse estu-do a partir de uma amostragem que fosse represen-tativa de todo o maciço. Dado que a amostragem,do ponto de vista cartográfico, deve ser realizada, depreferência, sobre as superfícies expostas de taludescom características lineares (i.e., dispostos segundodirecções definidas por vias de comunicação, ferro-viária ou rodoviária), adoptou-se a técnica daamostragem linear.

A técnica de amostragem linear consiste, basica-mente, na colocação de uma fita graduada em facesexpostas do maciço e no registo de algumas caracte-rísticas (geométricas e mecânicas) de todas as des-continuidades por ela intersectadas. Uma descriçãometodológica da técnica encontra-se, por exemplo,em BRADY & BROWN (1985) e em CHAMINÉ& GASPAR (1995). Na sua aplicação à área domaciço granítico da pedreira da Mimosa optou-sepela colocação de uma fita graduada (em metros)nos taludes a serem cartografados a, aproximada-mente, 1.50m do solo. Para cada talude (ou painel)analisado, depois de colocada a fita graduada a par-tir da origem de cada linha de amostragem, foramcartografadas de uma forma sistemática todas asdescontinuidades (diaclases e, mais raramente,falhas e/ou estruturas filonianas) que intersectavamessa linha de amostragem. Cada uma das desconti-nuidades foi descrita e registada nas fichas de levan-

tamento segundo a classificação geotécnica da BGD(“Basic Geotechnical Description of Rock Masses”)proposta pela ISRM (1981).

Para cada descontinuidade que intersectava alinha de amostragem foram registadas as seguintesgrandezas (e.g., PRIEST & HUDSON 1981;PRIEST, 1983; BRADY & BROWN, 1985; ISRM,1981; LAMAS, 1989; CHAMINÉ & GASPAR,1995): i) D - distância à origem da fita graduada; ii)L - semi-comprimento exposto, ou seja, o compri-mento visível da intersecção da descontinuidadecom a face exposta de rocha, apenas para um doslados da fita graduada; iii) T - tipo de terminaçãoque apresenta a extremidade da descontinuidade (R- na rocha; D - noutra descontinuidade; O - obscu-ra); iv) atitude da descontinuidade (direcção einclinação) medida junto ao ponto de intersecção dalinha de amostragem com a descontinuidade; v) C -curvatura, numa escala de 1 a 5, em que 1 represen-ta superfícies planas e 5 superfícies muito curvas; vi)R - rugosidade, numa escala de 1 a 5, representando1 uma superfície lisa e 5 uma superfície muito rugo-sa; vii) diversas características das descontinuidades,tais como abertura, tipo de preenchimento, presen-ça de água, entre outras.

Os dados recolhidos no terreno, referentes àtécnica de amostragem linear, foram objecto de umtratamento adequado para posterior interpretação eanálise, permitindo a definição de diversas famíliasde descontinuidades. O estabelecimento das dife-rentes famílias para os painéis cartografados foiconseguido através da elaboração de diagramasestruturais fl diagramas de contorno estrutural ediagramas de rosetas, tendo-se utilizado para o efei-to o programa geoinformático “StereoNet for

Windows version 3.03” (Geological Softwareâ, 1992-1995).

Os parâmetros geológico-geotécnicos determi-nados para a caracterização das descontinuidades domaciço foram, essencialmente, os seguintes: a atitu-de, o espaçamento, a continuidade ou persistência, opreenchimento e a rugosidade. Procedeu-se, tam-bém, a uma inventariação e caracterização prelimi-nar das condições hidrogeológicas do maciço.

O levantamento das atitudes das descontinuida-des foi efectuado em seis painéis (fig. 3) distribuídoscom diversas orientações, de modo a caracterizar, namedida do possível, toda a área do maciço (longitu-dinal e transversalmente) de exploração da Mimosa.

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Contudo, foram encontradas dificuldades do pontode vista operacional no levantamento de um maiornúmero de diaclases devido, por um lado, a uma ins-tabilidade permanente da maioria dos taludes, e poroutro lado, por ter ocorrido um grande escorrega-mento, com ca. 250m de extensão e segundo umaorientação estrutural aproximada de N40ºE.

Descrição geológica e geotécnica local

O enquadramento geológico local do maciçointrusivo da Mimosa é composto pela fácies de gra-nito porfiróide de grão grosseiro, de duas micas,essencialmente biotítico (MEDEIROS et al., 1980).Macroscopicamente, as rochas da unidade geológicaem estudo apresentam um grão grosseiro, cor cin-zenta e, por vezes, apresentam uma foliação fluidalmaterializada pelos megacristais de feldspato e dosfilossilicatos. Este litótipo apresenta uma boahomogeneidade textural, quer quanto à granularida-de quer quanto à cor.

Tendo em conta a disposição do corpo graníti-co, de forma rectilínea e alongada, cujos limitesestão, inequivocamente, controlados do ponto devista tectónico ao longo de, pelo menos, duas deze-nas de quilómetros, é possível presumir que a intru-são foi condicionada estruturalmente ao longo delineamentos tectónicos profundos, tal como se podedepreender da análise do padrão da rede de fractu-ração regional e local. A deformação frágil do maci-ço caracteriza-se por um diaclasamento relativamen-te pouco espaçado, apresentando as diaclases maiscomuns a orientação média N30º-40ºE.

O material-rocha granítico apresenta uma textu-ra cristalina, granulometria uniforme, e com algumaorientação fluidal dos megacristais de feldspato edos filossilicatos. O maciço em causa pode ser con-siderado, em termos de qualidade geológico-geotéc-nica, como muito fracturado e, em algumas zonas,com um grau de alteração muito acentuado. Porexemplo, no painel 1 observa-se nitidamente o evo-luir do estado de alteração de uma zona onde apedreira apresenta um estado do material-rocharelativamente são [W1-2] (coincidente com o eixo

do corpo granítico), para uma zona lateral do eixoda massa granítica muito tectonizada e com um graude alteração evidente, podendo ser considerado, emalguns tramos do talude, um saibro granítico [W5].

Grau de alteração

No caso em estudo, o estado de maior alteraçãode rocha granítica (W4-5, segundo a classificação da

ISRM, 1978, 1981 e da GSE, 1995) confina-se auma estreita faixa superficial (não ultrapassando,regra geral, um metro de espessura). Na proximida-de das descontinuidades (quer sub-verticais quersub-horizontais), e em zonas de maior densidade defracturação ou esmagamento, a alteração caracteri-za-se pela ocorrência de pontuações ferruginosas,resultantes da oxidação dos minerais ferromagnesia-nos (particularmente da biotite), conferindo global-mente ao material-rocha uma tonalidade amarelada.As zonas limítrofes do afloramento caracterizam-se,por vezes, por uma intensa alteração, exibindo gra-nito desagregado e mesmo arenizado (tipo saibro,W4-5).

Na quase totalidade da pedreira pode-se consi-derar que estamos em presença de um granitomedianamente alterado (W3), exceptuando as zonas

limítrofes que apresentam um estado de alteraçãomuito evoluído, ou seja, o material-rocha encontra-se muito decomposto (W4-5). Convém salientar que

foram cartografadas no maciço áreas pouco altera-das (W1-2), especialmente, no material-rocha aflo-

rante no eixo do corpo granítico (por exemplo,painel 3).

Caracterização das descontinuidades: anáálise da fracturação

Foram efectuados levantamentos geológico-geotécnicos em seis painéis com diferentes orienta-ções de modo a caracterizar da melhor forma possí-vel o maciço, quer transversal quer longitudinalmen-te. Um dos maiores constrangimentos encontradosaquando do levantamento de campo, prendeu-secom o facto de a pedreira estar em plena laboração,pelo que as linhas de amostragem foram selecciona-das em função das frentes disponíveis e os levanta-mentos tiveram que ser realizados, por vezes, numcurto espaço de tempo. A ocorrência de um enormeescorregamento numa zona da pedreira consideradavital para o presente estudo, situada entre os painéis2 e 5, impossibilitou a caracterização daquela zona.

O tratamento dos dados recolhidos no terreno,referentes à técnica de amostragem linear, foi feito

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Fig. 3 – Enquadramento geológico local da Pedreira da Mimosa.

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recorrendo a diagramas geológico-estruturais (dia-gramas de contorno estrutural e diagramas de rose-tas), os quais permitiram a definição do número defamílias de descontinuidades e, sobretudo, da famí-lia dominante, da sua atitude, do seu espaçamento eda sua persistência. Para além disso, considerou-sea caracterização, do ponto de vista geotécnico egeomecânico, de famílias por painel em troçoshomogéneos e para toda a pedreira.

Da análise dos diagramas estruturais das atitu-des das descontinuidades (diaclases), medidas deforma sistemática, nos seis painéis estudados, resul-taram as seguintes considerações (quadro 1; fig. 4):

Painel 1 (n= 59; orientação do painel N110ºE):existência de uma família de diaclases predomi-nante com orientação N20º-30ºE; subvertical;registou-se ainda a ocorrência de descontinuida-des sub-horizontais com ligeiro pendor paraSW;Painel 2 (n= 38; orientação do painel N200ºE):predominância da família de diaclases N30º-40ºW; subvertical;Painel 3 (n= 29; orientação do painel N50ºE):predominância da família de diaclases N20º-30ºE; subvertical; neste painel assume algumaimportância a família N45ºW; subvertical;Painel 4 (n= 18; orientação do painel N120ºE):predominância da família de diaclases N30º-40ºW; subvertical; existência de uma outra famí-lia subvertical com azimute N40ºE-N50ºE;Painel 5 (n= 7; orientação do painel N30ºE):dado o número reduzido de descontinuidadeslevantadas, optou-se por não efectuar a projec-ção dos diagramas estruturais. Contudo, pelaanálise da ficha de levantamento constata-se umdomínio das descontinuidades com o azimuteN30º-40ºE;Painel 6 (n= 231; orientação do painel N170ºE):predominância da família de diaclases N30º-40ºE; subvertical; neste painel assume algumaimportância a família N40ºW; subverti-cal.

Da análise do estereograma geral e do diagramade rosetas geral, nos quais foram projectadas todas asdescontinuidades medidas nos painéis, resultaram asseguintes conclusões:

uma família de diaclases principal com orienta-ção média N30ºE; subvertical;

uma família de diaclases com orientação N40ºW;subvertical;

uma família de descontinuidades sub-horizon-tais com características cisalhantes, inclinando ligei-ramente para SW.

Espaçamento

O sistema de diaclases de orientação N30ºE aN40ºE (em regra, subverticais) é o que apresentamenor espaçamento. Verifica-se pela análise que,para qualquer dos painéis amostrados, a intensidadede fracturação é (segundo os critérios da ISRM,

1978, 1981), regra geral, F4-5, ou seja, a distância

entre diaclases varia entre 6 e 20cm (próximas), comalguma tendência para F3 (20-60cm, i.e., mediana-

mente afastadas),.Foi também estimado um parâmetro geomecâ-

nico que se denominou factor de fracturação(CHAMINÉ et al., 2001). Este factor resulta darazão entre o número de diaclases medidas e o com-primento do painel amostrado. A aplicação destefactor corrobora a intensidade de fracturação referi-da anteriormente (quadro 1, fig. 5). Além disso, pelaobservação e cartografia das linhas de amostragemda pedreira da Mimosa o padrão geral da rede defracturação assemelha-se, segundo a classificação dePALMSTRÖM (1995), a uma geometria prismática.

A ISRM (1981) sugere o estabelecimento de umíndice dimensional – Ib (“Block Size Index”) para

representar as dimensões médias dos blocos domaterial-rocha. Este índice é dado pela média doscomprimentos dos três lados do sólido em questão,i.e.: Ib=(e1+e2+e3)/3, sendo o parâmetro ei o

espaçamento médio entre descontinuidades damesma família. No caso do maciço da Mimosa, o Ibresultante é 3.16.

A ISRM (1981) propõe ainda o estabelecimentode um outro índice volumétrico, o Jv, que é dado

pela soma do número de descontinuidades pormetro cúbico, para cada família. A linha de amostra-gem recomendada é de, pelo menos, 5 a 10m(PALMSTRÖM, 1995; PALMSTRÖM & SINGH,2001). Os resultados do índice volumétrico (Jv)

podem ser correlacionáveis com o tamanho dosblocos. PALMSTRÖM (1995) refere o parâmetro Jvcomo o somatório do número de descontinuidadespor unidade de comprimento para todas as famíliasde descontinuidades aflorantes numa dada área das

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unidades geológicas interessadas para uma dadaobra. A expressão simplificada é (PALMSTRÖM,1995): Jv= 1/e1 + 1/e2 + 1/e3, representando e1,

e2 e e3 o espaçamento médio de cada família de

descontinuidades. No caso do maciço da Mimosa,com três famílias de descontinuidades principais, asquais apresentam espaçamentos médios de 1.5m,3m e 5m, ter-se-ia um Jv= 1.2. Desta forma, o maci-

ço poder-se-ia classificar, segundo a ISRM (1981),como constituído por blocos grandes.

Continuidade ou persistência

As diaclases mais frequentes no maciço têmuma atitude média N30ºE; subvertical e são tam-bém as mais contínuas no terreno. A observação dapersistência das descontinuidades foi efectuada emduas dimensões, correspondentes à intersecção dasdiaclases com a superfície de exposição sub-hori-zontal e subvertical (nas frentes de desmonte). Asua persistência em todos os painéis amostrados étambém superior à dos restantes sistemas de diacla-samento.

Constata-se, em todos os painéis estudados, queas diaclases mais abundantes são aquelas que apre-sentam uma continuidade planar mais acentuada. Asfaixas sub-horizontais de material-rocha (cataclasi-tos) com um grau de esmagamento assinalável apre-sentam também uma grande continuidade, inter-rompendo sistematicamente as descontinuidades(verticais e subverticais) pertencentes às outrasfamílias.

Preenchimento

No maciço estudado encontraram-se algunsfilonetes de quartzo, em regra geral, com a orienta-ção geral N30ºE; subvertical. Registaram-se, igual-mente, preenchimentos argilosos em algumas dasdiaclases.

Rugosidade

No maciço em estudo, a rugosidade dominantecorresponde a um tipo em que as paredes das des-continuidades não são perfeitamente lisas, mas tam-bém nãosão visíveis estruturas fibrosas (e.g., estrias de falhas) que possamimpedir ou facilitar a movi-mentação relativa de blocos.

Caracterização geomecânica local

No que diz respeito às características mecânicasdo maciço, embora as características de resistênciaao corte do maciço rochoso sejam essencialmentedependentes das descontinuidades, é de grande uti-lidade o conhecimento da resistência à compressãodo material-rocha. A determinação da resistência àcompressão uniaxial é determinada, em geral, a par-tir de ensaios de laboratório ou de campo (e.g.,ISRM, 1981; KATZA et al., 2000; AL-HARTHI,2001; KAHRAMAN, 2001; KAHRAMAN et al.,2002). A determinação do índice de resistência àcarga pontual, recorrendo à determinação da dure-za com o esclerómetro portátil ou martelo de Schmidt(SCHMIDT, 1951), pode conduzir à estimativa dovalor da resistência uniaxial.

O esclerómetro portátil consiste, em traçosgerais, num aparelho que permite um ensaio decampo que avalia a dureza do material-rocha atravésda medição do ressalto de uma massa de aço quan-do percutida sobre a superfície da rocha. As condi-ções gerais para o ensaio de campo serem válidasassentam nos seguintes pontos, a saber: limpeza dazona do ensaio, verificação da ausência de fissuras eeliminação da patine de rocha meteorizada. Na exe-cução do ensaio, o aparelho foi posicionado perpen-dicularmente à superfície estrutural a ser ensaiada.Em função da dureza (ou resistência) da rocha, amassa de aço sofre maior ou menor ressalto; segui-damente, o valor é registado numa escala (0-100) doaparelho. Registaram-se 10 percussões com o mar-telo e eliminaram-se os 5 valores mais baixos, tendo-se considerado, por fim, o valor médio destas medi-ções. Finalmente, recorre-se ao ábaco de Miller(ISRM, 1978) para determinar a resistência à com-pressão simples a partir da dureza de Schmidt e dadensidade média da rocha (a densidade determinada

para o granito das Mimosas é de 26 KN/m3;MOTA & COMPANHIA, 2003).

No trabalho de campo (fig. 5) foi utilizado oesclerómetro portátil do tipo L, da marca PRO-CEQ, SA (Zurich, Switerzland), do Laboratório deMecânica das Rochas do Departamento deEngenharia Geotécnica (ISEP). Pela análise dosresultados do (quadro 2) constata-se que nas zonasdo maciço menos alteradas (W1-2) os valores de

resistência uniaxial à compressão variam em média

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Fig. 4 – Diagramas estruturais: diagramas de contorno estrutural (rede de igual-área, hemisfério inferior) e diagramas deroseta.

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entre 150-170 MPa; por seu turno, nas zonas maisalteradas (W3 a W4-5) o ensaio apresenta valores de

resistência média de cerca de 70 MPa. Os resultadosglobais alcançados estão de acordo com os valorespreliminares avançados no relatório da MOTA &COMPANHIA (2003), bem como corroboram, emtermos qualitativos, o estado de deformação domaciço.

CONCLUSÕES

Com o presente trabalho pretendeu-se, sobretu-do, dar ênfase à aplicação da técnica de amostragemlinear em superfícies expostas de descontinuidadesnum maciço rochoso granítico. Assim, foi efectuadoum levantamento sistemático de descontinuidades

na pedreira da Mimosa para o estudo da comparti-mentação do maciço. A técnica de amostragemlinear descrita, bem como o tratamento dos dadosde terreno são de aplicação simples, sendo ummétodo de execução expedita e que permite obterimportantes informações sobre a compartimenta-ção do maciço.

No caso vertente, pretende-se que constitua umponto de partida com vista à optimização dos dia-gramas de fogo principalmente nas suas direcçõesprincipais. Uma vez que nos diagramas de fogo éusual ter-se a frente livre perpendicular à direcçãoda família principal de descontinuidades (neste caso,o azimute médio N30ºE) sugere-se como orienta-ção preferencial da frente de trabalho para odesmonte, com recurso a explosivos, o azimuteN120ºE. Com efeito, esta direcção será a mais favo-

Quadro 1 - Síntese das características geológicas e geomecânicas dos painéis estudados (Pedreira da Mimosa).

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Fig. 5 – Aspectos geológicos e geotécnicos observados na Pedreira da Mimosa. A) Superfície planar materializado poruma falha regional, localizada no painel 5, com orientação média N40ºE; B, C) Aspectos da fracturação e deformaçãointensa do maciço da Mimosa; D) Vista frontal do escorregamento (22.05.2004) das bancadas compreendidas entre opainel 2 e 5, segundo uma orientação N40ºE, correspondendo ao alinhamento estrutural materializado por uma falha,com a mesma atitude, observada no painel 5 (ver foto A); E) Ensaio esclerométrico, visando o estudo da resistência àcompressão uniaxial; F) Exemplificação da técnica de amostragem linear para o estudo da compartimentação do maciço.

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rável a considerar, embora se saiba, que não é pos-sível desmontar apenas nesta direcção, pelo menosem tempos mais próximos, pois a pedreira estánuma fase de definição de painéis não sendo, porisso, possível tal imposição.

A aplicação da técnica de amostragem linearaplicada à caracterização da compartimentação demaciços rochosos fracturados poderá, assim, contri-buir para aperfeiçoar uma gestão racional e susten-tável dos georrecursos graníticos, especialmente osdo Norte de Portugal e da Galiza, tendo em vista asua exploração para fins vários, tais como a rochaornamental, a brita, o “tout-venant”, o enrocamen-to e o balastro.

AGRADECIMENTOS

São devidos agradecimentos à empresa MOTA-ENGIL, SA a possibilidade de realização e a divulga-ção dos principais resultados dos estudos desenvol-vidos na pedreira da Mimosa, ao abrigo de umaparceria com o Departamento de EngenhariaGeotécnica do ISEP. Os agradecimentos são exten-sivos ao Eng. Eduardo Guimarães (MOTA-ENGIL,

SA), pela disponibilidade demonstrada no apoio àrealização deste trabalho, bem como na cedência dematerial bibliográfico inédito sobre a pedreira. Porfim, os autores estão gratos aos EngenheirosGeotécnicos H. Costa e H. Rodrigues pelo apoionos levantamentos de campo. São devidos agradeci-mentos à Dra. M. J. Afonso (ISEP) pela leitura à pri-meira versão do manuscrito original. Um agradeci-mento especial ao Professor A. Diogo Pinto (IST,Lisboa) e ao Eng. C. Mendonça Arrais (ISEP, Porto)pela revisão crítica ao manuscrito.

Recibido:1/6/2005Aceptado: 14/7/2005

Quadro 2 - Resultados da resistência à compressão recorrendo ao esclerómetro portátil, no granito da Pedreira daMimosa.

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