geografia - pré-vestibular impacto - organização do espaço indígena ii

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JACKY31/01/08 A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO INDIGENA II. Frente: 01 Aula: 02 PROFº: FRANCO A Certeza de Vencer FAÇO IMPACTO - A CERTEZA DE VENCER!!! Fale conosco www.portalimpacto.com.br ENSINO MÉDIO - 2008 1. O espaço geográfico indígena: reciprocidade entre o ser humano e o meio Com o mercantilismo e os capitalismos comercial e industrial, iniciou-se um processo de agressão e destruição da natureza nunca vistos no decorrer da história. Esse modo de produção, que implicou o aniquilamento de ecossistemas, provocou grandes desequilíbrios ecológicos t gerando mudanças climáticas, extinção de espécies animais e vegetais e uma profunda desarmonia entre o ser humano e a natureza. Já a relação dos grupos indígenas com seu espaço em geral foi sempre tão harmoniosa que permitiu a eles conhecê-lo profundamente. Isso lhes forneceu, ao longo de milénios, os conhecimentos necessários para a preservação não só das plantas e animais de que se alimentam como também dos elos da cadeia de um ecossistema, conseguindo assim manter seu equilíbrio e sua integridade. Alguns estudos realizados sobre os Caiapó, tribo do sul do Pará pertencente ao tronco linguístico Jê, e os Kuikuru, do alto Xingu, mostram o conhecimento que possuem, por exemplo, do uso do solo e do clima. ELes cultivam a terra sem prejuízo do ecossistema, cxa-tamente o contrário do que fazem os brancos. No modo de vida das diversas culturas indígenas, não ocorre degradação do meio ambiente de forma irreversível, a exemplo do que ocorre nas sociedades industrializadas. Como poderíamos explicar tal falo? Pelo menos três razões contribuem para esclarecer a questão: a ausência da noção de propriedade privada da terra, o conhecimento da diversidade biológica e ecológica, e a concepção de natureza como fonte de vida. 1.1. A ausência da noção de propriedade privada da terra A "posse" de um determinado território é considerada válida pelos indígenas a partir do uso que dele fazem, sem perder de vista a dimensão coletiva dessa utilização, ou seja, a terra é considerada um bem coletivo, pertencente a toda a comunidade, sem necessidade de demarcação de fronteiras ou limites rígidos. Em última análise, os diversos grupos indígenas fazem uma apropriação simbólica da terra, o que faz com que a posse não seja meramente material, orientada por objetivos ou interesses tão somente pragmáticos ou técnicos, como considerada pela sociedade nacional pautada em valores ocidentais. 1.2. O conhecimento da diversidade biológica e ecológica O conhecimento da diversidade biológica ou biodiversidade {variedade de espécies da fauna e da flora) e da diversidade ecológica (variedade de ecos-sistemas) resulta de séculos de uma história de convivencia harmoniosa desenvolvida entre os indígenas e o meio físico circundante. Subjacente a seus métodos de agricultura, caça e coleta, além das práticas de cura, encontra-se a noção implícita da preservação da natureza enquanto provedora das necessidades de sobrevida da coletividade. Essas sociedades podem contribuir para a ampliação e manutenção da diversidade de espécies animais e vegetais, estendendo a atual discussão acerca da biodiversidade para a da sócio diversidade. Hoje a medicina volta-se aos conhecimentos dos in- dígenas sobre as propriedades preventivas e curativas de múltiplas espécies vegetais e derivados animais. Trata-se de um patrimônio de inestimável valor, o que torna a preservação da integridade física e cultural dos indígenas uma necessidade, muito ao contrário da atitude que se teve para com eles ao longo da história. 1.3. A concepção de natureza como fonte de vida Antes de mais nada, cabe esclarecer que as relações entre as sociedades indígenas e a natureza não se pautam exclusivamente pelo conhecimento da biodiversidade ou por técnicas de manejo florestal. Tão importante quanto isso é o envolvimento que os indígenas têm com o meio ambiente, tornando-o parte integrante de suas vidas e de sua dinâmica social. Nas relações homem-meio que estabelecem, prevalece a reciprocidade, na qual se descarta a possibilidade de o primeiro dominar o segundo, como se dá nas relações baseadas na ótica "civilizada". Na dinâmica social desses grupos, o objetívo do uso da terra é obter do meio apenas os recursos necessários para sua subsistência (produção de valor de uso) sem visar a geração de excedentes de produção para serem comercializados {produção de valor de troca}. Em sua relação com o território que habitam, a natureza constitui fonte de vida, e não fonte de lucro. "Há quem elabore um raciocínio simplista e pérfido de hectares por índios viventes em reservas, comparando o seu pedaço percentual de terras com a parcela que caberia a cada brasileiro caso se dividisse o território total do Brasil pela população total do país, sem levar em conta que a maior parte das terras rurais estão nas mãos de poucos privilegiadas brasileiros e que mais de 70% da nossa população encontram-se em cidades de todos os portes [...]. A ideia vitoriosa das reservas indígenas destina-se à proteção de comunidades herdeiras da pré-história, vivendo uma proto-história incômoda, devido aos assédios de grupos humanos rústicos, empurrados por capitalistas vorazes para dentro da territorialidade indígena." Aziz Nacib Ab'Saber A Amazónia: da discurso à práxis. p. 171 e 177,

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Page 1: Geografia - Pré-Vestibular Impacto - Organização do Espaço Indígena II

JACKY31/01/08

A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO INDIGENA II.

Frente: 01 Aula: 02

PROFº: FRANCO A Certeza de Vencer

FAÇO IMPACTO - A CERTEZA DE VENCER!!!

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1. O espaço geográfico indígena: reciprocidade entre o ser humano e o meio

Com o mercantilismo e os capitalismos comercial e industrial, iniciou-se um processo de agressão e destruição da natureza nunca vistos no decorrer da história. Esse modo de produção, que implicou o aniquilamento de ecossistemas, provocou grandes desequilíbrios ecológicost gerando mudanças climáticas, extinção de espécies animais e vegetais e uma profunda desarmonia entre o ser humano e a natureza.

Já a relação dos grupos indígenas com seu espaço em geral foi sempre tão harmoniosa que permitiu a eles conhecê-lo profundamente. Isso lhes forneceu, ao longo de milénios, os conhecimentos necessários para a preservação não só das plantas e animais de que se alimentam como também dos elos da cadeia de um ecossistema, conseguindo assim manter seu equilíbrio e sua integridade.

Alguns estudos realizados sobre os Caiapó, tribo do sul do Pará pertencente ao tronco linguístico Jê, e os Kuikuru, do alto Xingu, mostram o conhecimento que possuem, por exemplo, do uso do solo e do clima. ELes cultivam a terra sem prejuízo do ecossistema, cxa-tamente o contrário do que fazem os brancos.

No modo de vida das diversas culturas indígenas, não ocorre degradação do meio ambiente de forma irreversível, a exemplo do que ocorre nas sociedades industrializadas. Como poderíamos explicar tal falo?

Pelo menos três razões contribuem para esclarecer a questão: a ausência da noção de propriedade privada da terra, o conhecimento da diversidade biológica e ecológica, e a concepção de natureza como fonte de vida.

1.1. A ausência da noção de propriedade privada da terra

A "posse" de um determinado território é considerada válida pelos indígenas a partir do uso que dele fazem, sem perder de vista a dimensão coletiva dessa utilização, ou seja, a terra é considerada um bem coletivo, pertencente a toda a comunidade, sem necessidade de demarcação de fronteiras ou limites rígidos. Em última análise, os diversos grupos indígenas fazem uma apropriação simbólica da terra, o que faz com que a posse não seja meramente material, orientada por objetivos ou interesses tão somente pragmáticos ou técnicos, como considerada pela sociedade nacional pautada em valores ocidentais. 1.2. O conhecimento da diversidade biológica e ecológica

O conhecimento da diversidade biológica ou biodiversidade {variedade de espécies da fauna e da flora) e da diversidade ecológica (variedade de ecos-sistemas) resulta de séculos de uma história de convivencia harmoniosa desenvolvida entre os indígenas e o meio físico circundante.

Subjacente a seus métodos de agricultura, caça e coleta, além das práticas de cura, encontra-se a noção implícita da preservação da natureza enquanto provedora das necessidades de sobrevida da coletividade.

Essas sociedades podem contribuir para a ampliação e manutenção da diversidade de espécies animais e vegetais, estendendo a atual discussão acerca da biodiversidade para a da sócio diversidade.

Hoje a medicina volta-se aos conhecimentos dos in-dígenas sobre as propriedades preventivas e curativas de múltiplas espécies vegetais e derivados animais. Trata-se de um patrimônio de inestimável valor, o que torna a preservação da integridade física e cultural dos indígenas uma necessidade, muito ao contrário da atitude que se teve para com eles ao longo da história. 1.3. A concepção de natureza como fonte de vida

Antes de mais nada, cabe esclarecer que as relações entre as sociedades indígenas e a natureza não se pautam exclusivamente pelo conhecimento da biodiversidade ou por técnicas de manejo florestal. Tão importante quanto isso é o envolvimento que os indígenas têm com o meio ambiente, tornando-o parte integrante de suas vidas e de sua dinâmica social. Nas relações homem-meio que estabelecem, prevalece a reciprocidade, na qual se descarta a possibilidade de o primeiro dominar o segundo, como se dá nas relações baseadas na ótica "civilizada".

Na dinâmica social desses grupos, o objetívo do uso da terra é obter do meio apenas os recursos necessários para sua subsistência (produção de valor de uso) sem visar a geração de excedentes de produção para serem comercializados {produção de valor de troca}. Em sua relação com o território que habitam, a natureza constitui fonte de vida, e não fonte de lucro.

"Há quem elabore um raciocínio simplista e pérfido de hectares por índios viventes em reservas, comparando o seu pedaço percentual de terras com a parcela que caberia a cada brasileiro caso se dividisse o território total do Brasil pela população total do país, sem levar em conta que a maior parte das terras rurais estão nas mãos de poucos privilegiadas brasileiros e que mais de 70% da nossa população encontram-se em cidades de todos os portes [...]. A ideia vitoriosa das reservas indígenas destina-se à proteção de comunidades herdeiras da pré-história, vivendo uma proto-história incômoda, devido aos assédios de grupos humanos rústicos, empurrados por capitalistas vorazes para dentro da territorialidade indígena."

Aziz Nacib Ab'Saber A Amazónia: da discurso à práxis. p. 171 e 177,

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FAÇO IMPACTO - A CERTEZA DE VENCER!!!

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2008

Eles criam, assim, espaços geográficos pelo fato de serem presença humana no meio natural e nele interferirem, muito embora num grau muito menor do que as sociedades portadoras de uma dinâmica social mercantil (colonização portuguesa) ou industrial (sociedade brasileira atual). Esses espaços geográficos, na medida em que se constituem em guardadores da história da evolução dos grupos que os criaram e mantém com ele laços afetivos, são, portanto portadores da identidade destes.

TEXTO COMPLEMENTAR I Organização espacial comum presente na grande maioria dos

territórios indígenas do Brasil Frequentemente, as famílias indígenas brasileiras en-contram-se associadas aos espaços das aldeias, for-mando aldeamentos pequenos, que abrigam entre 30 e 100 pessoas, embora possam ser encontradas aldeias maiores, com 400 ou 500 indivíduos. Circundando as aldeias, geralmente são encontradas as roças familiares, produzidas segundo o sistema de "coivara"*, ou seja, pequenos lotes onde a vegetação é derrubada e queimada para o plantio de um produto principal que fornece o suprimento de carboidratos* ao grupo (milho, mandioca, batata-doce ou inhame), assim como alimentos que incrementam a dieta. Entre os indígenas a terra é um bem comum, mas a roça pertence sempre à família que a trabalhou, o que desmístífica o ideia de que vigora entre todos os grupos indígenas a propriedade coletiva de uma roça, desiludin-do os que pretendiam encontrar entre eles exemplos de "sociedades comunistas". O espaço que circunda as aldeias é entrecortado por roças de maior ou menor produtividade e por terrenos de mata de densidade variado, as chamadas capoeiras, formadas pela vegefação nativa que brota após as roças. Por último, para além das roças e capoeiras, há um território de mata densa utilizado para caça e coleta. Percorrido continuamente, esse espaço guarda "marcas" significativas para o grupo, tanto de sua história coletiva como da história pessoal de cada integrante.

TEXTO COMPLEMENTAR II A Mandioca

"A mandioca é uma das mais importantes plantas alimentícias descobertas pelos índios. Acredita-se que ela tenha sido domesticada há quatro ou cinco mil anos passados, na Amazônia. Hoje, além da América do Sul, a mandioca é cultivada na Ásia, África, Oceania, América Central e do Norte. • Ela nasce em solos pobres, apresenta grande resistência às pragas, pode permanecer guardada na própria terra por longos períodos e apresenta grande valor proteico (...) uma vez retirada da roça, a mandioca brava é descascada e ralada. Depois deve ser prensada num tipiti* para extrair o suco venenoso que ela contém. Esse suco é armazenado e dele se faz o tucupi*. A massa que daí resulta é peneirada e torrada em fornos de cerâmica ou de ferro. Com essa massa faz-se a farinha ou bolo de beiju. A massa é também utilizada na preparação de bebidas fermentadas e não-fermentadas." (Joana A. F. Silva. Economia de subsistência e projetos de desenvolvimento econômico em áreas indígenas. In: Aracy Lopes da Silva & Luís Donisete Benzi (irupioni, or^s, A temática iriíttgeiia nu fscoín. p. 362.)

IMAGENS PARA ANÁLISE

A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO INDÍGENA