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Boletim Nº 01 - Junho 2020
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Município de Feira de Santana
Produzido em 08/06/2020
O Portal GEOCOVID-19 apresenta dados e projeções da COVID-19 para todos os municípios do Brasil. Este
primeiro relatório apresenta uma análise dos dados da cidade de Feira de Santana - Bahia, por ser o município
sede da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). A UEFS, a partir do Programa de Pós-graduação
em Modelagem em Ciências da Terra e do Ambiente (PPGM), idealizou e coordena o Portal. Esta iniciativa
começou com pesquisadores da startup GEODATIN, do Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Computação (PGCC), da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e do Laboratório de Biossistemas da
UFBA (Labbios), com divulgação de dados e projeções da Bahia e de seus municípios. Desde o mês de Abril,
com apoio do projeto MAPBIOMAS e da startup Solved, o Portal passou a divulgar dados e projeções de
todos municípios e unidades da federação do Brasil e conta com pesquisadores de múltiplas áreas do
conhecimento.
DADOS DE CASOS DE COVID-19
O primeiro caso confirmado de COVID-19 em Feira de Santana foi registrado em 06/03/2020, tendo sido o
primeiro registrado no Estado da Bahia. Em 05/06/2020, Feira de Santana tinha 719 CASOS CONFIRMADOS
de COVID-19 e 6 ÓBITOS por COVID-19 de acordo com os dados do repositório Brasil.IO1construído com
base em dados de boletins das Secretarias de Saúde dos Estados. A partir dos dados obtidos do Brasil.IO, o
Portal GEOCOVID-19 apresenta casos confirmados e óbitos por COVID-19 para todos municípios e unidades
da federação do Brasil.
Com base no portal GEOCOVID-19, na Figura 1, é apresentada a evolução de casos confirmados para Feira
de Santana de 06/03/2020 até 05/06/2020. Observa-se um crescimento exponencial, característico desta
epidemia, mas que passou por diferentes taxas de crescimento de casos ao longo do tempo, como
evidenciaremos mais adiante neste Boletim.
Além disso, é possível notar também que houve variações bruscas nos dados em alguns momentos, o que
pode ser atribuído à qualidade dos dados devido ao processo de notificação e metodologia de contagem na
fonte primária, a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB). Particularmente, nota-se uma queda de
casos reportados entre o dia 18/05/2020 com 213 casos e o dia 19/05/2020 com 187 casos, que pode ser
explicada pela mudança de metodologia de confirmação de casos, com nova etapa de validação pelos
municípios, conforme publicado no Boletim Epidemiológico COVID-19 Nº 56 - 19/05/2020 da SESAB2.
1 Um projeto de iniciativa de voluntários para tornar acessíveis os dados brasileiros de interesse público, ver https://brasil.io 2 Boletim disponível em http://www.saude.ba.gov.br/2020/05/19/bahia-tem-11-013-casos-confirmados-de-covid-19-e-326-obitos
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Figura 1. Casos confirmados de COVID-19 em Feira de Santana (dados da SESAB obtidos pelo Brasil.IO).
A Figura 2 apresenta o histórico do número de casos novos diários, obtido pela subtração do número de casos
acumulados em dias adjacentes, uma vez que o boletim da SESAB não informa casos novos diários . Nota-
se que a queda de casos acumulados indicada entre 18 e 19/05 geram um valor negativo irreal para casos
novos.
A qualidade e acesso aos dados de COVID-19, de fato, representam um desafio para análises e estudos mais
detalhados da epidemia. A análise realizada pela Open Knowledge Brasil (OKB), descrita no Boletim #83 da
instituição, ressalta que há dados conflitantes entre fontes oficiais diferentes e “ao menos 12 deles (44%)
apresentaram algum tipo informação conflitante, seja oriunda de suas próprias fontes, ou em relação aos
dados publicados pela União”. Para minimizar os problemas de qualidade dos dados, é importante que as
fontes oficiais sejam mais transparentes, divulgando metodologias de coleta, validação e divulgação dos
dados, disponibilizando inclusive microdados de forma acessível para ampliar as possibilidades de análises
por pesquisadores e por qualquer cidadão ou instituição.
3 BOLETIM #8 - TRANSPARÊNCIA COVID-19 https://transparenciacovid19.ok.org.br/boletins
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Figura 2. Casos novos, obtido pela diferença de casos confirmados de COVID-19 em Feira de Santana,
após os 10 casos iniciais (Fonte dos dados: SESAB, através do Brasil.IO).
Para comparação entre fontes diferentes de dados, são apresentados na Figura 3, dados coletados de casos
confirmados dos boletins individuais da Secretaria Municipal de Saúde de Feira de Santana (SMS/FSA) e
dados da SESAB obtidos pelo Brasil.IO. Observa-se algumas lacunas nos dados oriundos da SMS/FSA, pois
os boletins são divulgados apenas em dias úteis. Neste aspecto alguns dados complementares foram
coletados diretamente dos Hotsites4,5 mantidos pela SMS/FSA e que divulgou dados parciais em alguns dias,
como finais de semana. Nota-se que os números das duas fontes de dados estiveram bastante similares até
meados do mês de Maio, após este período apresentaram divergências mais significativas. Apesar disso, as
duas curvas de evolução apresentam comportamento similar em termos da criticidade da evolução
epidemiológica. De todo modo, estas diferenças revelam divergências importantes em dados de importância
crítica para monitoramento e atuação frente à pandemia.
Este comparativo foi realizado apenas para análise neste documento, sendo que o Portal GEOCOVID-19 é
alimentado exclusivamente por dados dos boletins estaduais. Mas, chama atenção que os dados não são
similares nos últimos dias.
4 https://www.combateaocoronavirus.feira.br 5 http://www.feiradesantana.ba.gov.br/coronavirus
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Figura 3. Comparativo de casos confirmados de COVID-19 em Feira de Santana
(dados da SESAB obtidos pelo Brasil.IO e dados da SMS/Feira de Santana).
A partir dos dados de casos confirmados, realizamos também uma análise da variação destes casos ao longo
do tempo para identificar períodos de aceleração ou desaceleração da epidemia em Feira de Santana. A taxa
de variação dos casos confirmados acumulados foi de 68,78% (293 novos casos) apenas nos últimos 7 dias
(426 casos em 29/05/2020 a 719 casos em 05/06/2020) e nos 7 dias anteriores a variação foi de 71% (178
novos casos, 248 casos em 22/05/2020 a 426 casos em 29/05/2020).
A Figura 4 apresenta as taxas de variação semanal de casos em Feira de Santana, evidenciando que, após
um período de crescimento com taxas semanais abaixo de 32% entre meados de Abril e início de Maio (4
semanas, semana 17/04/2020 até semana 08/05/2020), ocorreu um forte crescimento na semana seguinte
(semana 15/05/2020), acima de 82%. Com a mudança metodológica da SESAB de apresentação de casos
confirmados, em meados de Maio, há uma aparente redução da taxa de crescimento no início da segunda
metade de Maio (semana 22/05/2020), mas isso não se manteve nas semanas seguintes (29/05/2020 e
05/06/2020) com taxas próximas de 70%. Logo, esta queda na semana de 22/05/2020 poderia ser atribuída
a mudanças metodológicas de divulgação de dados pela SESAB, e pode não corresponder a uma efetiva
desaceleração da transmissão de epidemia.
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Figura 4. Variação semanal de casos confirmados de COVID-19 em Feira de Santana, após os 10 casos iniciais
(Fonte dos dados: SESAB, via Brasil.IO).
Para aprofundar a análise da velocidade de crescimento dos casos de COVID-19 em Feira de Santana,
realizamos uma regressão otimizada6 por trechos do conjunto de dados de casos confirmados para identificar
o tempo de duplicação de casos a cada trecho. O tempo de duplicação é uma medida utilizada em
epidemiologia para avaliar a velocidade de propagação de uma epidemia.
Utilizando os dados da SESAB, identificamos que houve velocidades de propagação diferentes de epidemia
de COVID-19 em Feira de Santana, conforme Figura 5. Houve um momento inicial com duplicação de casos
a cada 6,3 dias de 29/03 até 10/04 mas houve grande desaceleração em seguida com tempo de duplicação
de 31,8 dias até 29/04. A partir de então a epidemia acelerou com tempo de duplicação de 21 dias até 15/05
e depois tempo de duplicação de 10,9 dias até 05/06.
6 Para identificar o momento de início e de fim de cada um dos 4 trechos, assim como os coeficientes das retas, foi utilizado um método de otimização automática por mínimos quadrados destes parâmetros. A quantidade de trechos foi fixada em 4.
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Figura 5. Tempo de duplicação de casos de casos confirmados de COVID-19 em Feira de Santana, em diferentes
períodos, após os 10 casos iniciais (Fonte dos dados: SESAB, através do Brasil.IO).
Observação: O gráfico é semi-log para visualizar relação exponencial como linear.
Utilizando dados da SMS/FSA, encontramos um padrão semelhante (Figura 6), com datas semelhantes de
início dos trechos, porém comparativamente o tempo de duplicação é menor, indicando que os dados
municipais evidenciam uma velocidade maior de propagação (ver Tabela 1). Feira de Santana, portanto,
encontra-se em um momento não só de crescimento de casos confirmados de COVID-19, mas também de
aceleração da propagação da doença.
Este padrão de aceleração pode ocorrer tanto pela propagação da doença quanto pela ampliação da testagem
da população, que releva números mais próximos da realidade, uma vez que a sub-notificação diminui.
Ressaltamos que a testagem, identificação isolamento e rastreamento de todos os casos de COVID-19 são
medidas essenciais de combate à epidemia.
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Figura 6. Tempo de duplicação de casos de casos confirmados de COVID-19 em Feira de Santana, em diferentes
períodos, após os 10 casos iniciais (Fonte dos dados: SMS/FSA, coleta nossa).
Tabela 1. Comparativo do tempo de duplicação (dias) de casos de casos confirmados de COVID-19
em Feira de Santana, em diferentes períodos, após os 10 casos iniciais
(Fonte dos dados: SESAB, através do Brasil.IO).
Intervalo
SESAB (Brasil.IO) SMS/FSA
início dias para duplicar início dias para duplicar
1 30/03 6,3 dias 29/03 6,6 dias
2 10/04 31,8 dias 11/04 20,6 dias
3 29/04 21,0 dias 01/05 13,3 dias
4 15/05 10,92 dias 16/05 8,5 dias
A Figura 7 apresenta a evolução no número de óbitos acumulados na cidade de Feira de Santana, que teve
o primeiro e segundo óbitos registrados apenas após 43 e 69 dias, respectivamente, desde a confirmação do
primeiro caso. Este quantitativo evoluiu mais rapidamente nos últimos dias, tendo a cidade registrado no dia
05/06/2020 o 6º óbito segundo a SESAB e o 16º óbito segundo a SMS-FSA. Neste contexto, a Tabela 2
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apresenta um comparativo das estatísticas de mortalidade para Feira de Santana, para a capital, Salvador, e
para todo o estado da Bahia. Considerando que Feira de Santana registrou o primeiro caso do estado e
analisando-se em termos relativos ao tamanho populacional, a cidade tem apresentado uma baixa
mortalidade, sendo consideravelmente inferior àquela registrada na capital e no estado como um todo. Esta
constatação ainda necessita de maior investigação para identificar suas possíveis causas.
Figura 7. Número de óbitos de COVID-19 em Feira de Santana.
(dados da SESAB obtidos pelo Brasil.IO e dados da SMS/Feira de Santana).
Tabela 2. Estatísticas de mortalidade (Dados extraído do Brasil.IO em 05/06/2020; *Segundo a SMS/FSA).
Local Óbitos Acumulados
Casos Acumulaos
Mortalidade População Óbitos/100 mil-hab
Feira de Santana
6 16*
719 919*
0,83% 1,74%*
614.872 0,97 2,60*
Salvador 558 15.173 3,67% 2.872.347 19,43
Bahia 819 26.419 3,10% 14.873.064 55,06
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PROJEÇÕES DA EPIDEMIA
A partir dos dados atuais, o portal GEOCOVID-19 realiza ajustes de um modelo matemático epidemiológico7
denominado SEIHURD que estima, para cada município, a dinâmica populacional na propagação do contágio.
Para cada dia de projeção do modelo, utilizamos também a rede de fluxo intermunicipal para estimar a
propagação dos casos entre os municípios, baseado no censo de fluxos do IBGE (2016). Os parâmetros deste
modelo são constantemente atualizados para ajuste aos dados da série temporal da epidemia no Brasil. É
importante enfatizar que os resultados do modelo representam apenas uma simplificação das características
gerais do fenômeno, não apresentando um caráter preditivo absoluto, porém ajudam a conhecer cenários
possíveis para os municípios.
São considerados 2 cenários para as projeções: com intervenções de fluxos e sem intervenções de fluxos.
Os cenários são obtidos considerando variações dos valores das taxas de transmissão da doença e do fluxo
intermunicipal. A taxa de transmissão (conhecido em modelos epidemiológicos β) está relacionada com
quantas novas pessoas são infectadas em cada momento e o fluxo intermunicipal está relacionado ao
deslocamento de pessoas entre municípios. Os cenários projetados são parametrizados da seguinte maneira:
Cenário I, SEM intervenções → a taxa de contaminação (β) de cada município é aumentada em 50%
(condições similares às encontradas no início da pandemia, antes das medidas de mitigação) e o
fluxo é mantido igual ao fluxo observado no censo de 2016;
Cenário II, COM intervenções → a taxa é mantida igual à atualmente ajustada (mantém-se a taxa atual
de transmissão, influenciada pelas medidas já implementadas neste momento) e o fluxo é reduzido
em 50% do fluxo observado no censo de 2016. Além disso, acrescentamos uma redução de 95% do
fluxo entre cidades da Bahia em que foram decretadas medidas mais restritivas, como a suspensão
de transporte coletivo intermunicipal.
Em um cenário COM intervenções de fluxo, mantendo-se as medidas atuais, o município de Feira de Santana
poderá ter em torno de 3300 casos casos acumulados em 30 dias (Figura 8). Já em um cenário SEM
intervenções de fluxo, com relaxamento das medidas de distanciamento social e movimentação entre
municípios, o município de Feira de Santana poderá ter mais de 12.000 casos casos acumulados em 30 dias .
De fato, é esperado que um cenário de menor controle do contágio entre pessoas leve á uma quantidade
maior de casos de COVID-19. Ampliar a taxa de contaminação (Cenário I) em relação à taxa atual de Feira
de Santana (Cenário II) poderá levar à 3,6 vezes mais casos acumulados em 30 dias. Por outro lado, mesmo
7 Trata-se de um modelo com uso de equações diferenciais ordinárias (EDO) para oito compartimentos: Suscetíveis, Expostos, Infectados assintomáticos, infectados sintomáticos, Hospitalizados em leitos ambulatoriais, Hospitalizados em leitos de UTI, Recuperados e Óbitos. Além disso, considera-se a difusão em rede de fluxos de pessoas destes compartimentos entre municípios do Brasil. Para mais detalhes, veja https://sites.google.com/view/informe-geocovid-19/.
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no Cenário II, mantendo-se as medidas atuais, há aumento do número de casos acumulados em 30 dias,
indicando que a taxa de contaminação ainda está acima da desejada.
Figura 8. Projeção de casos acumulados entre 5 e 30 dias após dia 05/06/2020, a partir do
modelo de projeção do portal GEOCOVID-19.
Lembramos que a taxa de contaminação não é fixa, ela depende da quantidade de contatos que uma pessoa
infectada tem com outras pessoas susceptíveis (não contaminadas) assim como da probabilidade de um
contato assim gerar uma infecção de fato. Desse modo, a quantidade de novos casos depende
fundamentalmente dessa taxa.
Para a análise do crescimento de casos ativos em Feira de Santana, apresentamos na Figura 9 projeções de
casos ativos8 em ambos os cenários. Em um cenário SEM intervenções, em aproximadamente 50 dias, o
município de Feira de Santana poderá ter mais de 14 mil casos ativos. Por outro lado, em um cenário COM
intervenções, em aproximadamente, 90 dias, poderia haver em torno de 5 mil casos ativos. Verifica-se assim
que as medidas atuais de intervenção podem ser capazes de levar a um menor número número de casos
ativos e o pico será alcançado em tempo mais distante. Este tempo extra no cenário com intervenções pode
ser importante para permitir que o sistema de saúde tenha mais tempo para adequação de sua capacidade
de atendimento. Contudo, embora bem menor do que o cenário sem intervenções, o número de casos ainda
é considerado muito alto.
8 Nosso modelo considera como caso ativo uma pessoa infectada capaz de contaminar pessoas susceptíveis.
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Figura 9. Projeção de casos ativos entre 5 e 180 dias após dia 05/06/2020, a partir de
modelo de projeção do portal GEOCOVID-19.
A demanda de leitos de UTI e de enfermaria para pacientes de COVID-19 em ambos os cenários é
apresentada na Figura 10. Para estas projeções, o modelo assume que parte dos infectados prossegue para
hospitalização demandando leitos de enfermaria ou leitos de UTI9. Em um cenário SEM intervenções, a
demanda por leitos de enfermaria poderá ser de 1.800 leitos, enquanto a demanda de leitos de UTI poderá
ser acima de 1.000 leitos para pacientes de Feira de Santana. Por outro lado, em um cenário COM
intervenções, esta demanda pode ser reduzida para próximo de 700 leitos de enfermaria e 400 leitos de UTI.
Assim, a demanda de leitos hospitalares é menor no cenário com intervenções, acarretando menor déficit de
leitos e minimizando o número de óbitos por falta de atendimento.
Conforme dados disponíveis no Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde10, Feira de Santana possui
76 leitos de UTI Adulto (SUS e não SUS), sendo 20 leitos de UTI para COVID-19 sendo 10 no Hospital
Clériston Andrade e 10 no Hospital Mater Dei. Isto indica que o município está muito longe de conseguir
atender a demanda que poderá surgir com estes cenários de expansão da epidemia.
9 Mais detalhes na descrição do modelo, ver nota 7. 10 Dados do CNES - Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, acesso em 08/06/2020, URL http://cnes2.datasus.gov.br/Index.asp
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Figura 10. Projeção de demanda de leitos de UTI e enfermaria entre 5 e 30 dias após dia 05/06/2020,
a partir de modelo de projeção do portal GEOCOVID-19.
Os cenários apresentados nas projeções simulam duas possibilidades. Em um cenário, as medidas atuais de
intervenção para controle da pandemia são mantidas e, assim, a taxa atual de contaminação é mantida como
está. No outro cenário, há aumento da taxa de contaminação pela suspensão de medidas de intervenção. Em
ambos cenários visualizamos projeções com aumento de casos da pandemia nos próximos meses, mas o
cenário COM intervenções indica um quantitativo menor de casos totais e no pico, conduzindo à uma menor
demanda do sistema de saúde. Mesmo assim, ambos os cenários apontam pelo crescimento do número de
casos e ainda períodos de muitas semanas de duração da epidemia no município. Portanto, com as
intervenções atuais há uma estratégia de mitigação da epidemia, mas não sua efetiva supressão.
Conforme importante relatório da Imperial College11, ambas estratégias, de mitigação e de supressão, podem
ser adotadas para combate da epidemia de COVID-19. “As estratégias diferem quanto ao objetivo de reduzir
o número de reprodução, R, para abaixo de 1 (supressão) - e, assim, fazer com que os números de casos
diminuam - ou apenas para abrandar a propagação reduzindo R [mitigação], mas não para abaixo de 1”. Isto
é, intervenções menos rigorosas podem diminuir o total de casos e a velocidade da epidemia, mas são
11 Imperial College COVID-19 Response Team. (2020) Report 9: Impact of non-pharmaceutical interventions (NPIs) to reduce COVID-19 mortality and healthcare demand. 16 March 2020. URL: https://www.imperial.ac.uk/media/imperial-college/medicine/mrc-gida/2020-03-16-COVID19-Report-9.pdf
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necessárias intervenções mais rigorosas (supressão) para de fato reduzir os casos de forma rápida, de
maneira que a epidemia não se prolongue no tempo.
De fato, resultados de projeções para a Bahia realizadas por pesquisadores da Rede CoVida12, indicam que
uma forte redução da taxa de contaminação (entre 50% e 75% de redução) pode levar à redução de novos
casos da doença. Uma redução da taxa de contaminação pode ser obtida, como já indicado, pela redução da
quantidade de contatos que uma pessoa infectada tem com outras pessoas susceptíveis (não contaminadas),
com o distanciamento social efetivo por todos e isolamento rápido de infectados. Adicionalmente, pode-se
alcançar a redução da probabilidade de um eventual contato gerar uma infecção de fato, por exemplo, pelo
uso adequado de máscaras e pela higienização das mãos com água e sabão ou álcool 70%, com maior
efetividade e universalidade. Quando medidas rigorosas e efetivas de supressão são rapidamente
implementadas é possível obter um número de reprodução R menor do que 1, levando à queda do número
de casos e um tempo de duração da epidemia menor do que em cenários sem intervenções ou somente com
intervenções de mitigação.
O RISCO DOS PROCESSOS DE FLEXIBILIZAÇÃO MAL PLANEJADOS
O prolongado período de restrição à circulação de pessoas exigido pela pandemia traz, naturalmente, uma
pressão cada vez maior pela retomada das atividades econômicas e do convívio social. Em diversos lugares
do mundo, e o Brasil não é exceção, experiências de retomada têm sido executadas com variados graus de
preparação e sucesso.
Na Bahia, nenhuma cidade efetivamente implementou alguma forma de restrição mais forte que se possa
considerar como análogo ao ‘lockdown’, e mesmo as medidas de intervenção em vigor tendem a apresentar
efetividade insatisfatória, seja pela adesão insuficiente ou inadequada pela população e empresas, seja pela
fiscalização limitada do cumprimento das medidas. Isso, além de outros fatores, têm dificultado seriamente a
redução do contágio com a desejável queda sustentada do número de casos ativos. Ainda assim, mesmo
sem queda do número de casos ativos, algumas das maiores cidades têm iniciado a abertura de partes
maiores de seu comércio, autorizado o funcionamento de templos, re-abertura de parques e locais públicos,
e permitido a circulação mais livre de pessoas e a retomada dos contatos sociais.
Dois casos bastante emblemáticos na Bahia são os de Feira de Santana e IIhéus. A primeira, apesar de ter a
maior população do interior do estado e de ter registrado seus primeiros casos bem no início (06/03 contra
25/03), foi superada em casos por Ilhéus em meados de Abril. Enquanto Feira de Santana parecia abrigar um
número de casos relativamente bem comportado, num ritmo em que dobraria em aproximadamente 31 dias
(ver Figura 5), os casos confirmados em Ilhéus dobravam a cada 6,4 dias (Figura 12).
12 Oliveira J.F., et al., Rede CoVida Modelling Task-force. (2020) Evaluating the burden of COVID-19 on hospital resources in Bahia, Brazil: A modelling-based analysis of 14.8 million individuals. pre-print medRxiv 2020.05.25.20105213; doi: https://doi.org/10.1101/2020.05.25.20105213
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Figura 12. Tempo de duplicação de casos de casos confirmados de COVID-19 em Ilhéus, em diferentes períodos,
após os 10 casos iniciais (Fonte dos dados: SESAB, através do Brasil.IO).
Observação: O gráfico é semi-log para visualizar relação exponencial como linear.
A Prefeitura de Feira de Santana decidiu então autorizar a reabertura de várias atividades do comércio em
21/04, mas sem a implementação de outras medidas efetivas de controle da taxa de contaminação. Por volta
de 10 dias depois, a cidade iniciou um processo de aceleração do crescimento do número de casos
detectados e encontra-se em ritmo que, se continuado, resultará em quase 8 vezes mais casos num período
de 31 dias. Na prática, exatos 30 dias após a reabertura do comércio, houve um crescimento de cerca 300%
(de 61 para 240 - dados da SESAB) no número de casos confirmados na cidade e um contingente de cerca
de 500 pacientes aguardando resultados de exames (segundo boletim epidemiológico da SMS/FSA em
21/05/2020).
Nesse período, ao final de Abril, Ilhéus apresentou alguma melhora no controle da taxa de contaminação,
com tempo de duplicação de casos confirmados ao longo da maior parte de Maio equivalente a cerca de 20
dias. Assim, com a desaceleração do crescimento em um município e a aceleração no outro, Feira de Santana
alcançou o número absoluto de casos de COVID-19 de Ilhéus na primeira semana de Junho (ver Figura 13).
Embora números relativos de casos sejam diferentes, dado o tamanho das populações, a comparação das
trajetórias epidemiológicas ilustra como a aplicação ou flexibilização de medidas de intervenção afetam a
epidemia.
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Figura 13. Casos confirmados de COVID-19 em Ilhéus e Feira de Santana
(Fonte dos dados: SESAB, através do Brasil.IO).
Desde o dia 25/05, Ilhéus encontra-se em ritmo que aponta dobra de casos a cada 17 dias, bastante pior do
que Feira de Santana quando de sua experiência de reabertura, que foi abortada após um mês, em 21/05.
Ainda assim, na primeira semana de Junho, quando ocorreram 5 óbitos por COVID-19, a Prefeitura de Ilhéus,
autorizou no dia 03/06 o retorno às atividades do comércio, sendo que na semana anterior já havia autorizado
o funcionamento dos templos religiosos.
Ressaltamos que o controle da epidemia não depende somente do fechamento do comércio, e também não
se trata de uma dicotomia de abrir comércio versus não abrir comércio. A suspensão do atendimento
presencial em estabelecimentos comerciais leva à redução de parte dos contatos sociais entre pessoas, mas
esta deve ser somente uma das intervenções dentro de uma estratégia mais ampla. A atividade comercial
poderá e deverá ser retomada de forma gradual e monitorada na existência de condições minimamente
necessárias (que devem envolver forte redução da taxa de contaminação e redução da ocupação de leitos,
além de outros indicadores) para que a abertura possa ser realizada de modo seguro.
O controle da epidemia depende também da aumento do isolamento social para além da visita aos
estabelecimentos comerciais. Em Ilhéus, como em Feira de Santana, os índices de isolamento têm sido
decrescentes. Na Figura 14, é apresentado o índice de isolamento social do estado da Bahia, a partir de
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dados agregados e anônimos fornecidos em parceria pela InLoco13. É possível verificar que houve um
aumento do isolamento social na Bahia no final de Março, mas desde então há um comportamento
decrescente do índice, embora não tenha retornado ao nível pré-pandemia. O isolamento social nos níveis
atuais contribui, em parte, para a diminuição da taxa de contaminação, mas não é suficiente para que
possamos ter uma redução real do número de novos casos. Devem portanto ser implementadas medidas de
intervenção que aumentem este índice para, possivelmente, alcançarmos a supressão da epidemia.
Figura 14. Índice de isolamento social para o estado da Bahia.
(Fonte: dados fornecidos pela InLoco e disponibilizados na plataforma GEOCOVID-19).
A suspensão de atividades que ampliam contatos sociais, sejam em estabelecimentos e instituições, sejam
em eventos ou reuniões em ambientes residenciais ou públicos, além de restrições à aglomerações em
qualquer local até mesmo em transporte público e nos locais de atividades essenciais, contribuem para o
isolamento social, mas outras medidas podem ser somadas. Uma estratégia de testagem, isolamento de
infectados, e rastreamento de contatos de infectados tem sido utilizada de forma efetiva por muitos países
para contribuir para o controle da pandemia. Soma-se também o uso de máscaras e outras proteções, de
forma adequada e com vigilância, assim como medidas de higiene com ampla disponibilidade.
Os dados, as análises e as ponderações levantadas neste primeiro número do Boletim GEOCOVID-19
chamam à reflexão não apenas os gestores e os moradores de Feira de Santana, mas demonstram a urgência
13 A InLoco é uma empresa especializada em inteligência a partir de dados de localização. Por meio de análise do comportamento de geolocalização de 60M de brasileiros (sem identificação, com anonimato, garantindo privacidade), a InLoco construiu um índice de isolamento social para auxiliar na luta contra a COVID-19 (https://www.inloco.com.br/pt/covid-19)
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Universidade Estadual de Feira de Santana
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Boletim Nº 01 - Junho 2020
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de medidas rápidas e efetivas que possam minorar os impactos da pandemia, da necessidade da manutenção
e até a ampliação do distanciamento social, que além de poupar vidas, ajuda na possibilidade de colapso do
sistema de saúde, ainda precário. Uma estratégia de mitigação que somente reduza a velocidade de
crescimento dos casos não é suficiente, é necessária uma estratégia imediata de supressão que possa levar
em pouco tempo à diminuição do número de novos casos diários, o que contribuiria para passarmos logo pelo
pico da epidemia com o menor número de vítimas por COVID-19 e com retomada da atividade econômica,
como outras cidades do mundo já conseguiram. A efetividade desta estratégia depende de uma união e
compromisso das instituições públicas, instituições privadas e todos os cidadãos do município de Feira de
Santana.
Comitê do portal GEOCOVID e do Boletim GEOCOVID
Angelo Loula (UEFS)
Rodrigo Calumby (UEFS)
Gesil Amarante (UESC)
Joselisa Chaves (UEFS)
Jocimara Lobão (UEFS)
Washington Rocha (UEFS)
André Paternostro (CDM Group Consultoria)
José Garcia (UFBA)
Mateus Silva (UFBA)
Elaine Barbosa (UFBA)
Diego Costa (Geodatin)
Cesar Diniz (Solved)
Soltan Galano (Geodatin)
Raphael Rosário (UFBA)
José Gabriel Castro (UFBA)