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DESIGN, EDUCAÇÃO E INOVAÇÃO
GABRIELA WÜRZIUS ZAMBENEDETTI
O DESIGN E A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: PROPOSTA DE
DIRETRIZES PARA ANÁLISE DE PROJETOS EXTENSIONISTAS EM
COMUNIDADES DE BAIXA RENDA
Porto Alegre
2016
GABRIELA WÜRZIUS ZAMBENEDETTI
O DESIGN E A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: PROPOSTA DE DIRETRIZES PARA
ANÁLISE DE PROJETOS EXTENSIONISTAS EM COMUNIDADES DE BAIXA
RENDA
Dissertação submetida ao Programa de Mestrado do Centro Universitário Ritter dos Reis como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Design. Orientador: Prof. Dr. André Luis Marques da Silveira
Porto Alegre
2016
AGRADECIMENTOS
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) por apoiar
a realização do Mestrado em Design no Centro Universitário Ritter dos Reis.
Ao meu orientador Dr. André Luis Marques da Silveira pelas trocas e insights, pela
dedicação, confiança e paciência. E por me apresentar a extensão universitária.
Aos professores da banca de qualificação e defesa, Dr. Vinicius Gadis Ribeiro e Dra
Karine de Mello Freire, pelas contribuições e pela disponibilidade.
Aos estudantes, participantes e principalmente aos professores protagonistas dos
projetos Design Social Aplicado (Uniritter) e Design no Bairro (UFRGS) pela
contribuição para a realização desta pesquisa.
Aos professores e colegas de mestrado, pelos ensinamentos e inspiração,
especialmente à amiga para a vida Tâmisa Trommer.
As minhas amigas e brisas Ana Berger e Carol Eichenberg pelo apoio incessante e
por momentos incríveis de inspiração diária.
A minha família, pelo amor incondicional e pelo apreço ao conhecimento.
Ao Joel Silbermann, por inspirar-me a ser minha melhor versão.
Ao conhecimento e ao mistério da existência.
“Water is fluid, soft, and yielding. But water will
wear away rock, which is rigid and cannot
yield. As a rule, what is fluid, soft, and yielding
will overcome what is rigid and hard. This is
another paradox: what is soft is strong.”
(Lao Tzu, Tao Te Ching)
RESUMO
A extensão universitária é parte indissociável do ensino e da pesquisa, formando uma
tríade que sustenta a atuação da universidade. A extensão deve ser um processo
interdisciplinar e dialógico feito de trocas entre saberes acadêmicos e populares e
também espaço para que as instituições de Ensino Superior desempenhem sua
função social. Este trabalho propõe um quadro de diretrizes baseado no referencial
teórico para análise de projetos extensionistas, contemplando: princípios da extensão,
dimensões de ensino-aprendizagem na extensão e abordagens de design com
valores extensionistas. Em um segundo momento, com o intuito de confrontar a
prática com as diretrizes propostas pelo quadro de análise, investigou-se um projeto
extensionista de design em comunidade de baixa renda protagonizado por
professores e estudantes de graduação de uma instituição de Ensino Superior do Rio
Grande do Sul. A metodologia teve enfoque qualitativo e a coleta de dados se deu
sobretudo através de entrevistas semiestruturadas com docentes, discentes e
pessoas de uma instituição envolvidas nas ações. Nota-se que, em projetos
extensionistas realizados em comunidades carentes, estudantes e professores
conhecem dificuldades vividas por boa parte da população. Há um ganho pessoal que
ultrapassa as situações de aprendizagem na sala de aula e toca questões existenciais
importantes para formação profissional, convivência coletiva e exercício da cidadania.
Quanto às práticas participativas no design, percebe-se que o seu emprego enfrenta
certa falta de atenção, assim como limitações por vezes complexas devido aos
cenários problemáticos em que acontecem os projetos. Concluiu-se que as diretrizes
propostas se concentram mais fortemente nas trocas de conhecimento, nas questões
de participação e no impacto dos projetos extensionistas na vida dos estudantes, dos
professores e, em menor medida, dos participantes nas ações. Finalmente, ressalta-
se na extensão a oportunidade de professores e estudantes realizarem projetos na
área do design social, aumentando a potência para transformações sociais positivas
no mundo.
Palavras-chave: Educação para o Design. Design Social. Extensão Universitária.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Fontes para coleta de dados ................................................................... 22
Figura 2 – Desenho da pesquisa .............................................................................. 23
Figura 3 – Articulações para fortalecer ações de extensão universitária .................. 33
Figura 4 – Dimensões da aprendizagem discente na extensão universitária ........... 38
Figura 5 – Interdependência entre arte, produção e sociedade. .............................. 47
Figura 6 – Modelo de matriz de organização............................................................ 63
Figura 7 – Mapa de atores do DSA .......................................................................... 66
Figura 8 – Fluxo do projeto ....................................................................................... 67
Figura 9 – Registros de projetos do DSA ................................................................. 68
Figura 10 – Comunicação do DSA em rede social ................................................... 69
Figura 11 – Inputs de participação no processo do DSA .......................................... 99
Figura 12 – Palavras para a experiência extensionista no DSA ............................. 101
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Diretrizes orientadoras das ações na extensão universitária ................. 31
Quadro 2 – Tendências Pedagógicas ...................................................................... 34
Quadro 3 – Diretrizes gerais para ação de extensão para quadro de análise .......... 43
Quadro 4 – Diretrizes para o ensino-aprendizagem para quadro de análise ........... 44
Quadro 5 – Diretrizes para o design na extensão .................................................... 58
Quadro 6 – Especificação das entrevistas ............................................................... 61
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
ESPM Escola Superior de Propaganda e Marketing
FAE Faculdade Anglicana de Erechim
FAI Faculdade dos Imigrantes
FAL Faculdade América Latina
FEEVALE Federação de Estabelecimentos de Ensino Superior em Novo
Hamburgo/Centro Universitário Feevale
FSG Faculdade da Serra Gaúcha
IES Instituição de Ensino Superior
IFSUL Instituto Federal Sul-Rio-grandense
IPA Instituto Metodista de Porto Alegre/Rede Metodista de Educação do Sul
MEC Ministério da Educação
PPC Projeto Pedagógico de Curso
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
UCPEL Universidade Católica de Pelotas
UCS Universidade de Caxias do Sul
UFPEL Universidade Federal de Pelotas
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFSM Universidade Federal de Santa Maria
UNIJUÍ Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
ULBRA Universidade Luterana do Brasil
UNIFRA Centro Universitário Franciscano
UNIRITTER Centro Universitário Ritter dos Reis
UNISINOS Universidade do Vale do Rio dos Sinos
UNIVATES Centro Universitário Univates
UPF Universidade de Passo Fundo
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13
1.1 JUSTIFICATIVA ............................................................................................... 14
1.2 QUESTÃO DE PESQUISA .............................................................................. 16
1.3 OBJETIVOS ..................................................................................................... 16
1.3.1 Objetivo Geral .......................................................................................... 16
1.3.2 Objetivos específicos ............................................................................. 17
1.4 PRESSUPOSTOS DA PESQUISA .................................................................. 17
2 METODOLOGIA .................................................................................................... 18
2.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ........................................................ 18
2.1.1 Referencial teórico .................................................................................. 18
2.1.2 Estudo qualitativo ................................................................................... 19
2.2 COLETA DE DADOS ....................................................................................... 21
2.3 ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................... 22
2.4 DESENHO DA PESQUISA .............................................................................. 23
2.5 ASPECTOS ÉTICOS ....................................................................................... 23
3 A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NO BRASIL ....................................................... 24
3.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NO BRASIL 26
3.2 AS POLÍTICAS NACIONAIS DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA ..................... 30
3.3 PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA EXTENSÃO ........................ 34
3.3.1 Aprendizagem, trabalho comunitário e participação na extensão ..... 37
3.4 CATEGORIAS DA REVISÃO TEÓRICA .......................................................... 42
4 VALORES EXTENSIONISTAS NO DESIGN ......................................................... 46
4.1 DESIGN SOCIAL ............................................................................................. 47
4.2 DESIGN CENTRADO NO HUMANO E PRÁTICAS PARTICIPATIVAS DE
PROJETO .............................................................................................................. 51
4.2.1 Os papeis do designer em práticas participativas ............................... 56
4.3 DIRETRIZES DA REVISÃO TEÓRICA ............................................................ 58
5 O ESTUDO QUALITATIVO ................................................................................... 60
5.1 DELIMITAÇÃO DA UNIDADE DE ANÁLISE ................................................... 60
5.2 COLETA, ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS .................................... 60
5.3 RELATO DO ESTUDO QUALITATIVO ............................................................ 63
5.3.1 O Projeto Design Social Aplicado .......................................................... 63
5.3.2 Quanto às diretrizes gerais para ação na extensão universitária ....... 69
5.3.3 Quanto ao processo de ensino-aprendizagem na extensão ............... 79
5.3.4 Quanto às diretrizes para a prática extensionistas de design ............ 92
5.3.5 Palavras representativas da experiência extensionista .................... 101
5.4 OBSERVAÇÕES SOBRE O EMPREGO DO QUADRO DE DIRETRIZES .... 102
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 104
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 110
APÊNDICE A — Instrumento de coleta de dados para entrevista — Professores
................................................................................................................................ 115
APÊNDICE B — Instrumento de coleta de dados para entrevista — Estudantes
................................................................................................................................ 117
APÊNDICE C — Instrumento de coleta de dados para entrevista — Comunidade
................................................................................................................................ 118
13
1 INTRODUÇÃO
O entendimento histórico da extensão universitária está ligado a sua função
social. Essa função se modificou ao longo das décadas, iniciando como transferência
de conhecimento e evoluindo para troca de saberes baseada em metodologias
participativas. No Brasil, um país marcado por desigualdades sociais, as atividades
extensionistas têm um papel fundamental ao buscarem estabelecer um diálogo e um
fazer relevante entre academia e comunidade.
Segundo Nogueira (2005), a extensão é uma prática que interliga ensino e
pesquisa com as demandas sociais, possibilita a formação de profissionais cidadãos
e facilita a produção de conhecimentos para a superação de desigualdades sociais.
Nesses termos, a atividade de extensão é considerada, em suas palavras, "um
instrumento incomparável de mudança" para a universidade e para a sociedade.
Este trabalho propõe a criação de um quadro de diretrizes de extensão
universitária para avaliar a atuação extensionista de graduações em design. Para
tanto, reflete sobre os princípios da extensão, as dimensões de ensino-aprendizagem
na extensão e o valor da ação extensionista no âmbito do design, a partir de uma
perspectiva dialógica para o desenvolvimento social e econômico de comunidades de
baixa renda.
O quadro de diretrizes para análise de projetos de extensão no design foi
proposto a partir de uma revisão teórica de literatura. Na sequência, procedeu-se com
o estudo de um projeto extensionista de design desenvolvido por uma instituição de
Ensino Superior do Rio Grande do Sul com o intuito de confrontar a prática
extensionista observada com as diretrizes identificadas.
A metodologia desta pesquisa é de natureza qualitativa e divide-se em duas
etapas: uma de construção do referencial teórico e do quadro de análise e outra de
estudo qualitativo. Apresenta-se a revisão teórica em duas grandes seções: na
primeira (capítulo 3), denominada Extensão Universitária no Brasil, abordam-se os
principais momentos da extensão no Brasil e discutem-se políticas extensionistas e
processos de ensino-aprendizagem de maior destaque nesse cenário. A segunda
seção da parte teórica (capítulo 4) busca Valores Extensionistas no Design,
apresentando abordagens de design que se aproximam dos valores da prática
14
extensionista. No término de cada seção da revisão teórica apresentam-se categorias,
designadas como diretrizes no corpo do trabalho e respectivas subcategorias
adaptadas da teoria para a composição do quadro de análise.
A segunda parte da pesquisa (capítulo 5) trata do relato do estudo qualitativo,
estruturado conforme as diretrizes propostas no quadro de análise. Finaliza-se com
observações sobre o emprego do quadro de diretrizes. Como encerramento, o
capítulo 6 apresenta as considerações finais.
Esta dissertação vincula-se à linha de pesquisa Design, Tecnologia e Educação
do Programa de Pós-Graduação em Design do Centro Universitário Ritter dos Reis –
rede Laureate International Universities. A linha investiga os processos cognitivos
empregados na geração de ideias em projetos, pesquisa possibilidades de articulação
entre as várias disciplinas que compõem a formação do designer e desenvolve novos
métodos e técnicas para o ensino de Design na modalidade presencial e à distância.
1.1 JUSTIFICATIVA
O modo sistêmico de perceber a realidade revelou uma conexão entre
diferentes campos do saber e entre os problemas que enfrentam. Os problemas de
design, em particular, foram reconhecidos como um modelo diverso e mais amplo do
que o de problemas técnicos, caracterizados por aceitar um processo linear de
definição e solução. Isso porque um problema de design é naturalmente
interdisciplinar e potencialmente universal em seu escopo: qualquer área da
experiência humana pode ser matéria para um projeto de design (BUCHANAN, 1992).
O design é uma atividade propositiva que atua por meio de projetos, sendo
consequentemente pragmático. Não se vincula só e necessariamente a objetivos
econômicos e empresariais, mas também apresenta habilidades úteis para projetos
de natureza social. Como afirma Bonsiepe (2012, p. 36), o designer não deve se
contentar apenas com uma postura crítica, mas deve ser capaz de "[...] traduzir sua
postura contra o status quo em uma proposta projetual viável", intervindo na realidade
com o propósito de mudá-la.
Ao considerar o design uma atividade projetual, capaz de contemplar práticas
participativas através das quais o designer socializa suas ferramentas, bem como um
15
campo com atuações especialmente voltadas às questões sociais, revelam-se
cruzamentos interessantes entre o design e a extensão. Ressalta-se, pois, a
oportunidade de investigar a atuação do design em projetos extensionistas, sobretudo
com comunidades de baixa renda.
A extensão, destinada a socializar e construir conhecimento com a
comunidade, já está consagrada legalmente como uma das finalidades da
Universidade. No entanto, há um esforço a ser feito para tornar as práticas de
extensão cada vez mais coerentes com seus valores.
É apontado que a prática extensionista deva buscar o desenvolvimento da
autonomia ao invés do assistencialismo ou da prestação de serviços pontuais.
Posturas remediadoras geralmente não contemplam o desenvolvimento da autonomia
das populações menos favorecidas e suas ações não se estendem sobre a causa dos
problemas, trazendo apenas soluções paliativas. A esse respeito, Thiollent (2003, p.
62) afirma:
Hoje, estudantes e professores têm uma informação muito superficial sobre o que já representou, em décadas passadas, a extensão e o trabalho universitário extra muros em geral. A extensão é frequentemente vista como uma atividade simples e limitada — como, por exemplo, um cursinho avulso, uma consultoria em empresa privada, um atendimento comunitário imediato — para a qual não é preciso problematizar ou construir significados, discutir tendências ideológicas, nem conhecer metodologias específicas.
Destaca-se que a afirmação acima foi feita há mais de uma década; portanto,
seria adequado investigar se esse quadro de desconhecimento ainda persiste.
Acredita-se ser interessante para o desenvolvimento do eixo da extensão que
professores e estudantes conheçam seu significado histórico, conquista de um
processo de reflexão e esforços por parte de docentes, discentes e representantes do
poder público em favor da sua valorização.
Uma busca inicial no banco de periódicos da Capes revela uma escassez de
publicações sobre a temática na área do design. Nenhum resultado de publicação foi
obtido ao se utilizar a opção de busca avançada para título e as palavras-chave design
e extensão e então design e extensionista. Buscando-se em periódicos exclusivos da
temática extensão, identificaram-se alguns artigos que relatam experiências de
projetos extensionistas realizados por professores e estudantes de design.
16
Considerando o cenário descrito, deseja-se contribuir para essa temática de
investigação através da proposta de um quadro de diretrizes para análise e reflexão
quanto à prática extensionista no Design.
1.2 QUESTÃO DE PESQUISA
Em uma perspectiva ampliada, questiona-se sobre como os cursos de Design
atuam em relação ao objetivo da prática extensionista (a troca entre os saberes
acadêmico e popular) bem como diante dos atuais desafios da extensão universitária.
Deseja-se investigar como tópicos importantes da extensão são considerados em
projetos extensionistas com a atuação do design.
Sendo assim, o presente trabalho busca subsídios para avaliar a atuação do
design na extensão universitária, mais especificamente nos projetos com
comunidades de baixa renda, delineando a questão de pesquisa:
Quais diretrizes para a atuação do design na extensão universitária devem ser
observadas?
1.3 OBJETIVOS
Nas subseções a seguir, o objetivo geral e os objetivos específicos da pesquisa
são apresentados.
1.3.1 Objetivo Geral
Conceber um quadro de diretrizes de extensão universitária referente aos
princípios da extensão, às dimensões de ensino-aprendizagem na extensão e, por
fim, às abordagens do design mais alinhadas à extensão. Refletir sobre a escolha das
diretrizes ao utilizar esse quadro para avaliar um projeto representativo da atuação de
professores e estudantes dos cursos de graduação em Design na extensão
universitária em comunidades de baixa renda na cidade de Porto Alegre, Rio Grande
do Sul.
17
1.3.2 Objetivos específicos
1) Investigar a história e o papel da extensão universitária no Brasil com o intuito
de identificar seus princípios e orientações atuais;
2) refletir sobre o processo de ensino-aprendizagem, com o intuito de identificar
teorias alinhadas à extensão universitária;
3) identificar valores extensionistas presentes em abordagens teóricas de design;
4) descrever as diretrizes propostas para a pesquisa apresentando um quadro ao
término de cada capítulo da revisão teórica;
5) efetuar estudo qualitativo de um projeto extensionista, considerando o quadro
de diretrizes desenvolvido.
1.4 PRESSUPOSTOS DA PESQUISA
Pressupõe-se que o processo extensionista é dialógico, interdisciplinar e
pautado por metodologias participativas. A extensão se apresenta como um processo
diferenciado que amplia as possibilidades de ensino-aprendizagem da sala de aula
para um contexto que proporciona mais autonomia aos estudantes, priorizando a
construção de competências através de ações para resolução de problemas do
mundo real. Em especial quando trabalha com comunidades de baixa renda, a
extensão universitária torna-se um espaço para a construção da cidadania por meio
do contato com questões sociais relevantes.
Portanto, nos projetos extensionistas protagonizados por professores e alunos
das graduações em design, esses pressupostos devem estar presentes e refletidos
na escolha das abordagens projetuais e das estratégias de ensino.
18
2 METODOLOGIA
A presente pesquisa visa investigar, a partir de um enfoque qualitativo, de
caráter descritivo, a atuação dos cursos de graduação em Design na extensão
universitária, particularmente em trabalhos com comunidades de baixa renda, com o
intuito de confrontar a prática com achados teóricos reelaborados em um quadro de
diretrizes de análise a ser validado.
A abordagem qualitativa é empregada quando não há controle das variáveis,
sendo que o fenômeno é complexo e acontece em um contexto real (FLICK, 2009). A
pesquisa qualitativa é apoiada por uma série de técnicas interpretativas e reflexivas e
seu resultado tende a variar de acordo com a lente e sensibilidade do pesquisador,
que busca compreender a dinâmica das relações sociais. Baseia-se em poucas, mas
significativas, amostras para aprofundar a compreensão do problema, e a coleta de
dados geralmente acontece por meio de observações, entrevistas e relações com o
campo (FLICK, 2009).
2.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O estudo é dividido em duas etapas principais: construção do referencial teórico
e estudo qualitativo. A seguir, descreve-se cada uma das etapas.
2.1.1 Referencial teórico
No primeiro momento do estudo foi construído o referencial teórico para a
elaboração de um quadro de diretrizes através da identificação de temáticas
importantes na extensão universitária e sua relação com a prática do design. Flick
(2009) considera a revisão de literatura uma oportunidade para obter inspiração e
utilizar o conhecimento fornecido para verificar afirmações, questões emergentes e
discussões atuais sobre o tema estudado.
Trata-se de uma pesquisa predominantemente bibliográfica de dados
secundários em que foram consultados livros, artigos, dissertações e teses. A principal
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fonte para a obtenção de artigos, dissertações e teses foi o portal de periódicos da
Capes, uma biblioteca virtual que reúne produções nacionais e internacionais.
Inicialmente, buscou-se um entendimento amplo sobre a Extensão
Universitária: histórico, legislação e seus principais fundamentos. Além das fontes do
portal de periódicos, foram consultados o documento da Política Nacional de Extensão
Universitária, desenvolvido pelo Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições
de Educação Superior Públicas Brasileiras (FÓRUM..., 2012), bem como outras fontes
que abordam a temática (SILVA; CÂNDIDO, 2014; SÍVERES, 2013; NOGUEIRA,
2005; THIOLLENT et al., 2003; FARIA, 2001; FREIRE, 1977).
Logo após esse entendimento inicial, discorre-se sobre abordagens de design
cujas posturas de projeto, de acordo com o entendimento particular da temática, mais
se aproximam de valores extensionistas, tais como como a interação dialógica e a
interdisciplinaridade. O principal objetivo é identificar abordagens coerentes com o
fazer extensionista e, posteriormente, valer-se de tais dados para refletir sobre as
escolhas projetuais dos casos estudados.
Para tanto, são estudados conceitos de Design Centrado nas Pessoas
(KRIPPENDORFF, 2000), Design Social (MARGOLIN; MARGOLIN, 2004;
BONSIEPE, 2011; BRAGA, 2011), e Design Participativo (SANDERS; STAPPERS,
2008; SANDERS, 2008;). Por fim, discute-se os papeis do designer nesses contextos
diferenciados de projeto.
Ao término de cada capítulo da revisão teórica são apresentadas as diretrizes
encontradas na teoria, que compõem o quadro de análise proposto no trabalho. Os
tópicos explorados no referencial teórico que vieram a compor o quadro na forma de
diretrizes referem-se às principais dimensões destacadas na questão de pesquisa:
extensão, ensino-aprendizagem e design.
2.1.2 Estudo qualitativo
Maxwell (2005) observa que o estudo qualitativo é interativo e influenciado pelo
contexto de pesquisa. O seu planejamento, portanto, deve considerar a interação
constante entre diferentes componentes (teorias, questões de pesquisa, objetivos,
métodos).
20
Um levantamento documental prévio foi realizado a fim de definir a instituição
para o estudo qualitativo. Conforme Sampieri et al. (2013), a análise documental serve
para que o pesquisador obtenha informações preliminares sobre um contexto de
estudo. A pesquisa bibliográfica e a documental fornecem instrumentos para
aprofundar a investigação.
Esse procedimento deu-se através de um mapeamento de dados sobre
projetos de design disponíveis para acesso público em sites de IES e pelo contato por
e-mail com as pró-reitorias dessas instituições. Foi feita uma busca no portal online
das instituições e em anais de eventos de Extensão promovidos por essas
universidades no ano de 2014. Também se acessou, na Plataforma Lattes, o currículo
dos professores responsáveis pelos projetos para cruzamento das informações. Os
dados foram organizados em uma planilha com as informações contendo título,
instituição, participantes, temática e descritivo.
A pesquisa incluiu as instituições de ensino superior situadas no Rio Grande
do Sul que ofereceram curso de design no ano de 2015, totalizando 21 instituições
identificadas como universo da amostra. São elas: UFRGS, UNISINOS, UNIRITTER,
ESPM, FEEVALE, UNIVATES, UNIJUÍ, UFPEL, UNIFRA, FSG, UCS, UFSM,
ULBRA, FACULDADE AMÉRICA LATINA, IFSUL, FAE, FAI, SENAC, IPA, UPF e
UCPEL. Destas, 17 instituições foram identificadas através do Ranking Universitário
Folha 2014 (FOLHA, 2014), uma avaliação anual do ensino superior do Brasil feita
pela Folha de S. Paulo. As demais (UCPEL, IPA, UPF e SENAC) foram adicionadas
por conhecimento da pesquisadora.
Dentre os projetos levantados através do mapeamento preliminar, escolheu-
se o projeto Design Social Aplicado: UniRitter & FGBS, do Centro Universitário Ritter
dos Reis (Uniritter) para o estudo qualitativo.
O critério de seleção da amostra é justificado principalmente pela conveniência
(FLICK, 2009), que prioriza a facilidade de acesso e a estratégia de menor esforço,
em caso de limite de tempo e de recursos. No entanto, cabe observar que esse projeto
também se mostrou representativo da atuação do design na extensão, pois teve o
maior número de relatos e publicações em eventos de Extensão Universitária no ano
de 2014, quando comparado aos demais.
21
2.2 COLETA DE DADOS
A coleta de dados aconteceu a partir da pesquisa documental e de entrevistas
semiestruturadas com representantes de três grupos que atuam nos projetos:
professores, estudantes e integrantes da comunidade. Segundo Sampieri et al.
(2013), as entrevistas semiestruturadas seguem um roteiro de perguntas, mas
também permitem que o entrevistador proponha outras questões para obter maiores
informações sobre determinados conceitos.
O levantamento documental preliminar forneceu uma visão geral, bem como
serviu para identificar os casos a serem estudados. Foram fontes de dados: anais de
eventos de extensão disponíveis na Internet através das páginas das instituições
amostra; o currículo Lattes dos professores envolvidos; o e-mail respondido pelas pró-
reitorias. Além disso, foi feita uma análise dos documentos do projeto entregues à
Propex para endossar as informações obtidas nas entrevistas.
As entrevistas semiestruturadas aconteceram com participantes de três grupos
diferentes: professores, estudantes e comunidade. O objetivo foi coletar três pontos
de vista sobre a mesma vivência.
O principal objetivo desse procedimento é identificar sinais de como o design
atua em relação às diretrizes propostas pelo quadro de análise criado. No conteúdo
das entrevistas, buscam-se recursos para testar o quadro proposto com o conteúdo
estudado na revisão teórica.
Na figura 1 observam-se as fontes de evidência da coleta de dados.
22
Figura 1 – Fontes para coleta de dados
Fonte: elaborada pela autora.
Os instrumentos para coleta de dados das entrevistas podem ser visualizados
nos apêndices A, B e C.
2.3 ANÁLISE DOS DADOS
Segundo Maxwell (2005), uma das opções para a análise de dados na pesquisa
qualitativa são as estratégias de categorização, ou criação de códigos. Através dessa
estratégia, os dados coletados podem ser “rearranjados” em categorias para facilitar
comparações e desenvolver conceitos teóricos.
Gibbs (2009) aponta que os códigos ajudam a pensar sobre o texto e interpretá-
lo. Por meio da codificação, é estabelecida “uma estrutura de ideias temáticas” em
relação ao texto que está sendo analisado. As categorias representadas pelos códigos
podem tanto estar baseadas em dados da investigação como também podem ser
construídas antes da coleta de dados através de estudos de conceitos teóricos.
No caso desta pesquisa, a codificação é baseada em conceitos que,
selecionados do referencial teórico, resultaram na proposta de um quadro de diretrizes
para análise. Dessa forma, os dados do projeto DSA são analisados sobretudo pelo
uso desse quadro.
23
2.4 DESENHO DA PESQUISA
Apresenta-se, a partir das informações anteriores, um esquema que permite
visualizar um desenho da pesquisa (Figura 2):
Figura 2 – Desenho da pesquisa
Fonte: elaborada pela autora.
2.5 ASPECTOS ÉTICOS
A coleta de dados do presente trabalho apenas teve início após avaliação e
aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Ritter dos Reis1,
por envolver pessoas na investigação. Sendo assim, afirma-se com segurança a
privacidade dos sujeitos envolvidos e procede-se o estudo de maneira ética.
1 CAAE 48957215.0.0000.5309
24
3 A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NO BRASIL
Esta seção aborda a extensão universitária no Brasil. Entenda-se, neste
estudo, o uso da palavra universidade, por vezes, como sinônimo de instituições de
ensino superior (IES).
Após uma breve introdução à tríade ensino, pesquisa e extensão, que
conceitualmente formam as bases da universidade brasileira, e às primeiras
manifestações da extensão universitária propriamente dita, é apresentado um
histórico dos momentos mais decisivos para a evolução do conceito, da legislação e
da prática de extensão no Brasil. Em seguida, destacam-se direcionamentos da
Política Nacional de Extensão Universitária (FÓRUM…, 2012) considerados subsídios
para o estudo qualitativo. Por fim, como tópicos considerados importantes e
observados como recorrentes na teoria a respeito da prática extensionista, discutem-
se a aprendizagem, o trabalho comunitário e a metodologia participativa na extensão.
As primeiras ideias de universidade como espaço de preservação e,
principalmente, de criação de conhecimento datam do século XIII. Nessa época,
reivindicava-se o direito do livre pensar, que se somou à ideia de universidade como
um bem público e democrático na época da Revolução Francesa, no século XVIII.
Atualmente, a universidade passa por um momento de transformação e de
necessidade de participar no desenvolvimento social através da abertura para os
fluxos crescentes de conhecimento que acontecem fora dos seus limites institucionais.
Panizzi (2006) aponta que "[...] a universidade não é somente uma instituição
social, mas também um bem público a serviço da sociedade (e que se afirma por sua
capacidade de representação cultural, intelectual e científica)". De fato, uma formação
que se pretende completa não pode estar isolada do social, pois o sujeito não se
constrói sozinho: vive em um conjunto de inter-relações e interações coletivas. Ao par
disso, Silva (2013, p.111) complementa que, embora a universidade faça parte da
realidade social, "[...] sua existência diz respeito muito mais ao futuro do que ao
presente", pois através de novos conhecimentos é capaz de criar outras realidades.
Em razão de constantes mudanças sociais, a universidade passou por algumas
adaptações, embora ainda hoje predomine um modelo pedagógico semelhante ao que
servia às necessidades do trabalho na época da Revolução Industrial. Mudanças
25
aceleradas pelo aumento da complexidade e novos modos de trabalho, somadas a
um padrão demográfico de envelhecimento populacional e baixas taxas de
mortalidade e fecundidade desafiam a estabilidade da universidade como único local
de formação e acesso ao conhecimento (PANIZZI, 2006).
Frente a isso, propostas como a educação continuada, que oferece formações
aos indivíduos já no mercado de trabalho, e a extensão universitária ganham
relevância porque pressupõem um envolvimento maior da universidade com a
sociedade e oxigenam as práticas acadêmicas. A noção de universidade como um
bem público a serviço da sociedade, exposta por Panizzi (2006), conflui com o
propósito da atividade extensionista, a saber, a troca entre os saberes acadêmico e
popular quando a universidade atua fora de seus próprios muros.
A extensão universitária é parte de uma tríade que sustenta as atividades das
instituições de ensino superior, a chamada tríade ensino-pesquisa-extensão. Esses
três domínios, por sua vez, são marcados pelo princípio da indissociabilidade que tem
como papel mantê-los interligados buscando unidade entre teoria e prática.
Segundo Rays (2003), a indissociabilidade é um processo de relações múltiplas
que busca unir teoria e prática. Portanto, a extensão, "processo educativo interativo"
que faz uso da ação comunicativa, necessita interagir criticamente através do ensino
e da pesquisa; esses três elementos, por conseguinte, devem operar de forma
complementar.
A extensão universitária surgiu na Inglaterra, durante a segunda metade do
século XIX, como atividade ligada à educação continuada no formato de cursos
destinados à população que não frequentava a universidade. Logo foi adotada
também em instituições americanas, no formato de prestação de serviços para as
áreas rural e urbana. A exemplo desses dois modelos surge a extensão no Brasil entre
as décadas de 1910 e 1920 (NOGUEIRA, 2005).
No contexto da América Latina, a extensão universitária teve participação
marcante no Movimento Estudantil que ocorreu em Córdoba, na Argentina, a partir de
1918. Esse movimento, liderado pelos estudantes, foi responsável por difundir as
Universidades Populares, nas quais os jovens atuavam em atividades extensionistas
colocando em prática conhecimentos em prol da justiça social. Os estudantes
passaram a considerar as ações extensionistas como obrigações da universidade, de
26
modo que esta deveria trabalhar para transformar a sociedade e para melhorar a vida
da população. No Brasil, as Universidades Populares foram vivenciadas a partir dos
anos 30, com a criação de salas de leitura em bairros populares e outras ações
culturais, atingindo seu auge com os movimentos estudantis dos anos 60 (ROCHA,
2001).
Em um país como o Brasil, marcado por desigualdades sociais, as atividades
extensionistas têm um papel fundamental ao buscarem dialogar e criar um fazer
relevante entre academia e comunidade, impulsionando melhorias sociais. O conceito
de extensão no contexto brasileiro foi construído a partir de uma série de eventos
históricos que culminaram em uma legislação própria e em políticas de apoio a essa
atividade.
3.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NO BRASIL
O entendimento histórico da extensão universitária está ligado a sua função
social. Essa prática nasceu da necessidade de uma relação de reciprocidade entre a
universidade e a sociedade, levando o ensino e a pesquisa acadêmica aos interesses
da comunidade, inicialmente em formato de cursos e aulas oferecidos ao púbico
externo.
O surgimento de práticas de extensão no Brasil coincide com a criação do
ensino superior, no início do século XX. As primeiras atividades de natureza
extensionista aconteceram através de cursos e conferências na antiga Universidade
de São Paulo, em 1911, e de prestações de serviços da Escola Superior de Agricultura
e Veterinária de Viçosa na década de 1920. Essas atividades demonstram uma
preocupação, por parte da universidade, em difundir o conhecimento ali criado,
estendendo-o, dessa forma, para a comunidade (FÓRUM..., 2012).
A extensão é normatizada pela primeira vez pelo decreto 19.851 de 11 de abril
de 1931, no Estatuto da Universidade Brasileira e, em 1961, foi incorporada à primeira
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que regularizava o sistema de
educação brasileiro. Nesse período, a extensão era vista como difusão de
conhecimento a partir de cursos e palestras com o objetivo de aumentar o nível cultural
da população.
27
O conceito de extensão universitária vem se modificando ao longo das
décadas. As suas concepções iniciais enfatizavam a transferência de conhecimento
das instituições de ensino superior para a sociedade, que aparece passiva com o
papel de receber o que a universidade oferece. Portanto, ao invés de construir junto
com a comunidade, a ideia inicial de extensão residia em construir para a comunidade.
Muitas atividades extensionistas foram (e ainda são) criticadas pelo seu caráter
assistencialista, pois ações pontuais e de duração limitada muitas vezes são vistas
como filantropia de caráter paliativo. Nogueira (2001) relata que após o golpe militar o
governo utilizou-se de propostas extensionistas de forma assistencialista para
promover ideais de desenvolvimento e segurança em projetos como os CRUTAC
(programa voltado a população rural, com alguns resultados positivos) e o Projeto
Rondon, instituído por decreto em 1968.
O objetivo central desses projetos era colocar os estudantes em contato com a
realidade brasileira para motivar seu engajamento no desenvolvimento social e
nacional. No projeto Rondon, um dos problemas relatados pelos participantes foi o
caráter pontual das ações e a falta de vínculo com as universidades, visto que os
estudantes retornavam com questões sobre a sociedade brasileira que estavam
distantes do conhecimento dos professores.
Naquele momento, há um retorno de discussões sobre a extensão
primeiramente como missão social e difusão cultural e, posteriormente, nos anos 70,
como instrumento de política social. Em 1968, com a promulgação da Lei Básica da
Reforma Universitária (Lei n. 5.540/68), instituiu-se a extensão universitária
obrigatória. O artigo 20 estabeleceu que “[...] as instituições de ensino superior
estenderão à comunidade, sob a forma de cursos e serviços especiais, as atividades
de ensino e os resultados da pesquisa que lhe são inerentes”. O artigo 40 determina
que as instituições de ensino superior, "[...] por meio de suas atividades de extensão
proporcionarão aos seus corpos discentes oportunidades de participação em
programas de melhoria das condições de vida da comunidade e no processo geral de
desenvolvimento” (NOGUEIRA, 2005).
No início da década de 1970, algumas medidas foram importantes para
institucionalizar e redefinir a extensão universitária. Uma delas foi a criação da
Coordenação das Atividades de Extensão (CODAE), em 1974, vinculada ao
28
Departamento de Assuntos Universitários DAU/MEC. Com a criação da CODAE, o
MEC assume a coordenação nacional da extensão e, em 1975, apresenta o Plano de
Trabalho de Extensão Universitária, primeira política de extensão universitária
brasileira.
O Plano de Trabalho de Extensão Universitária foi influenciado pelas ideias do
educador Paulo Freire sobre a importância de valorizar a sabedoria popular e trazê-la
à universidade. Embora esse educador estivesse oficialmente censurado, suas ideias
eram representadas através de outros termos que as encobriam. Freire (1977)
problematiza o termo extensão, refletindo sobre o sentido de estender algo a alguém,
de transmitir, de doar, de invadir etc. O termo extensão expressaria um traço de
superioridade, pois estende e entrega um conhecimento pronto. Ao contrário dessa
origem, o termo Extensão deveria ser visto como comunicação, como intercâmbio
entre saberes e como processo dialógico entre sujeitos.
Freire (1977), portanto, afirma que o conhecimento só existe quando há uma
relação de comunicação em que ambas as partes são sujeitos. O conhecimento, pois,
é resultado da relação entre saberes, de confrontos e buscas e, portanto, de
comunicação. Assim sendo, a população não deve ser o objeto que recebe, e sim o
sujeito que participa de uma relação dialógica. Através dessas ideias centrais, a
Extensão Universitária passou a ser discutida como prática participativa de troca de
saberes entre universidade e sociedade.
A partir da década de 1980, então, a prática de extensão é repensada ao par
de uma outra ideia de universidade que redefine suas práticas e valoriza sua função
social. O caráter assistencialista foi questionado em favor da concepção de extensão
como um processo de troca de saberes que integra o ensino e a pesquisa e que apoia
os movimentos sociais (NOGUEIRA, 2005). Como consequência dessa
reestruturação foi criado, em 1987, o Fórum de Pró-Reitores de Extensão das
Universidades Públicas (FORPROEX), que trouxe um conceito que passou a fazer
parte do Plano Nacional de Extensão:
A Extensão Universitária é o processo educativo, cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade. A Extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará na sociedade a oportunidade de elaboração da praxis de um conhecimento acadêmico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido
29
àquele conhecimento. Esse fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, terá como consequências a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional, a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade. Além de instrumentalizadora deste processo dialético de teoria/prática, a Extensão é um trabalho interdisciplinar que favorece a visão integrada do social. (Plano Nacional de Extensão, 2000).
Dentre os objetivos do Plano Nacional de Extensão estão: assegurar a relação
bidirecional entre universidade e sociedade para que se atendam aos problemas
sociais urgentes; estimular atividades de caráter interdisciplinar; valorizar os
programas de extensão em rede entre instituições; criar condições para a participação
da universidade na criação de políticas públicas; e incentivar inovação e
conhecimento, ampliando o acesso ao saber e o desenvolvimento tecnológico e social
do país (NOGUEIRA, 2005).
Conforme essa definição, a extensão tem o papel não somente de democratizar
o conhecimento, mas também de buscar uma participação da comunidade na troca e
produção de saberes, inserindo a pesquisa acadêmica na realidade brasileira e
permitindo que os cidadãos se tornem sujeitos na construção do conhecimento e não
sejam apenas objetos de estudo ou de transmissão de conhecimento. Assim, a
extensão deve ser uma prática que interligue ensino e pesquisa com as demandas
sociais, possibilite a formação de profissionais cidadãos e forneça as bases da
produção de conhecimentos para a superação de desigualdades sociais, sendo
considerada um instrumento incomparável de mudança para a universidade e para a
sociedade (NOGUEIRA, 2005).
Em consequência dessas definições, consta na Constituição de 1988 a
“indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão” (Art. 207), ficando estabelecido
que “[...] as atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio
financeiro do poder público” (Art. 213, § 2º). A partir de tal reformulação, diversas
iniciativas se seguiram e, em 1996, em resposta à indissociabilidade entre Ensino,
Pesquisa e Extensão prevista na Constituição, a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB) (Lei n. 9.394/1996) determina a Extensão Universitária
como uma das finalidades da Universidade (Art. 43) e apresenta a possibilidade de
apoio financeiro do Poder Público, incluindo-se bolsas de estudo (Artigos 44, 52, 53 e
77) (FÓRUM..., 2012).
30
Dando continuidade, o Plano Nacional de Educação 2001-2010 (Lei n. 10.172)
ressalta a tríade ensino, pesquisa e extensão e institui que "[...] no mínimo, 10% do
total de créditos exigidos para a graduação no ensino superior no país será reservado
para a atuação de estudantes em atividades extensionistas" (Meta 23) (FÓRUM…,
2012, p. 9).
Atualmente, a extensão já está consagrada legalmente como uma das
finalidades da Universidade, destinada a trocar conhecimento com a comunidade e a
atender demandas sociais. As políticas de extensão universitária visam propor
diretrizes e orientações para contornar as dificuldades de alinhar a prática à teoria
extensionista.
3.2 AS POLÍTICAS NACIONAIS DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
De acordo com Nogueira (2005), a extensão universitária teve três políticas
importantes ao longo de sua trajetória. A primeira delas foi o Plano de Trabalho de
Extensão Universitária, de 1975, influenciado pelas ideias de Paulo Freire, divulgado
pelo MEC e executado pelo CODAE. As outras duas foram criadas após a constituição
do Fórum de Pró-Reitores das Universidades Públicas (FORPROEX). São elas: o
Programa de Fomento à Extensão Universitária (PROEXTE) (primeira edição 1993) e
o Plano Nacional de Extensão Universitária (1998). Todas elas são apoiadas pelo
Ministério da Educação e Cultura (MEC).
Esta seção aborda principalmente a Política Nacional de Extensão
Universitária, redigida em 2012 pelo FORPROEX, que se apresenta como um
fortalecimento e um acréscimo ao Plano Nacional de Extensão Universitária. Também
se destacará o documento Extensão Universitária: Revisão e Sistematização
(FÓRUM…, 2007), em que se apresentam as áreas temáticas, as linhas e as ações
de extensão em maiores detalhes. O principal objetivo é conhecer diretrizes propostas
para a extensão universitária brasileira e derivar categorias para as análises
posteriores da etapa de pesquisa.
A Política Nacional de Extensão Universitária (FÓRUM..., 2012) apresenta
cinco diretrizes orientadoras para a criação e implementação de ações na extensão
universitária. São elas: Interação Dialógica, Interdisciplinaridade e
31
Interprofissionalidade, Indissociabilidade Ensino-Pesquisa-Extensão, Impacto na
Formação do Estudante e Impacto e Transformação Social.
No Quadro 1 essas diretrizes foram sintetizadas conforme os eixos por que
(motivos pelos quais a diretriz existe) e como (formas indicadas para realizá-la), a fim
de facilitar a compreensão.
Quadro 1 – Diretrizes orientadoras das ações na extensão universitária
O que Por que Como
Interação Dialógica Superar o discurso da hegemonia acadêmica através de alianças com organizações sociais. Não estender, mas sim construir conhecimento com a sociedade.
Metodologias que estimulem a participação e a democratização do conhecimento, bem como a participação da comunidade em ações nos espaços das universidades.
Interdisciplinaridade e Interprofissionalidade
Superar a dicotomia entre o holismo que generaliza e a especialização que fragmenta.
Integrar modelos, conceitos e metodologias de diversas áreas do conhecimento. Construir alianças interorganizacionais e interprofissionais.
Indissociabilidade Ensino-Pesquisa-Extensão
Vincular ações de extensão ao processo de formação de pessoas (ensino) e de geração de conhecimento (pesquisa).
Extensão e Ensino: Sala de aula como espaço em que se (re)constrói o processo histórico-social. No eixo pedagógico estudante-professor-comunidade o estudante exerce papeis de tutor, pedagogo e orientador.
Extensão e Pesquisa: Ações orientadas por metodologias participativas permitem a aproximação com as comunidades. Incorporar pós-graduação. Fortalecer a produção acadêmica.
Impacto na Formação do Estudante
Enriquecer a experiência discente em termos teóricos e metodológicos. Materializar os compromissos éticos das IES. Na extensão o estudante amplia referências e tem contato com grandes questões sociais.
Flexibilização curricular. Projeto pedagógico adequado com definição do orientador, dos objetivos e das competências envolvidas, bem como das formas de avaliação. Diálogo entre as instituições envolvidas.
Impacto e Transformação Social
Atuar pelos interesses da maioria da população, pelo desenvolvimento social e local. Evitar a mercantilização das atividades universitárias e a alienação cultural.
Privilegiar linhas de atuação. Considerar abrangência e relevância das ações. Atuar com efetividade na solução dos problemas.
32
Fonte: elaborada pela autora com base em FÓRUM... (2012).
Apresentadas essas diretrizes, questiona-se até que ponto elas estão
presentes no planejamento das ações de extensão que são desenvolvidas pelas IES.
Embora o FORPROEX se dirija às universidades públicas, as demais IES são
chamadas a aderirem à política, pois isso denota um compromisso com a extensão
universitária.
Para que a extensão seja potencializada, é necessário que ela se torne
frequente no cotidiano da vida acadêmica e que as normas e políticas existentes
sejam efetivadas. O FORPROEX (FÓRUM…, 2012) cita três articulações que podem
contribuir para o fortalecimento da extensão universitária, bem como para o combate
à exclusão e à desigualdade social: articulação com as políticas públicas, o que pode
contribuir na sua implementação e avaliação, bem como para o fortalecimento de
programas e projetos sociais; articulação com os movimentos sociais que buscam
combater a desigualdade, através de uma relação horizontal; e articulação com os
setores produtivos, contribuindo para o desenvolvimento econômico e social do país.
Tais articulações podem ser visualizadas na Figura 3, envolvendo fundamentalmente
interação dialógica, interdisciplinaridade e interprofissionalidade.
33
Figura 3 – Articulações para fortalecer ações de extensão universitária
Fonte: elaborada pela autora com base em FÓRUM..., 2012.
Em acréscimo a tais determinações, a articulação com políticas públicas inclui
ainda três eixos integradores: Áreas Temáticas, Território e Grupos Populacionais. O
eixo Áreas Temáticas (FÓRUM..., 2007) orienta as ações extensionistas para oito
áreas que constituem a maior parte das políticas sociais: Comunicação, Cultura,
Direitos Humanos e Justiça, Educação, Meio Ambiente, Saúde, Tecnologia e
Produção e Trabalho. O eixo Território prioriza a integração espacial das ações de
extensão para combater efeitos negativos como a pobreza urbana e a desigualdade.
O eixo Grupos Populacionais, por fim, pretende integrar as ações em grupos
populacionais específicos, em especial os excluídos e em situação de vulnerabilidade
social.
Considerados os direcionamentos da Política Nacional de Extensão
Universitária, buscou-se um entendimento maior sobre tópicos importantes para este
estudo e recorrentes na literatura relacionada à prática extensionista. São eles:
processo de ensino-aprendizagem, trabalho comunitário e metodologias
participativas.
34
3.3 PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA EXTENSÃO
Para muitos, a aprendizagem é um processo biológico que provoca uma
transformação qualitativa na estrutura mental daquele que aprende. Outros
consideram a aprendizagem um processo pelo qual competências (conhecimentos,
habilidades e atitudes) são adquiridas ou modificadas através do ensino (formal, não
formal e informal).
Levando isso em conta, a aprendizagem pode ser analisada a partir de
diferentes abordagens ou perspectivas. Libâneo (2002) apresenta abordagens que
chama de tendências pedagógicas, classificadas em liberais ou progressistas
conforme a relação da instituição com questões sociais e políticas. O autor propõe
abordagens pedagógicas organizadas em duas grandes tendências, sintetizadas no
Quadro 2.
Quadro 2 – Tendências Pedagógicas
TENDÊNCIA LIBERAL
Liberdade e interesses individuais; propriedade privada dos meios de produção; sociedade de classes. Propaga a ideia de igualdade de oportunidades, mas não considera a desigualdade de condições.
Tradicional Ensino para realização pessoal. Nenhuma relação com a realidade social. Preponderam as regras e o cultivo intelectual.
Renovada progressivista Ensino centrado no aluno, trabalho em grupo. Processos cognitivos valem mais que conteúdo. Aprender fazendo. Chamada também de escola nova, tem como maior expoente Anísio Teixeira. Atualmente apresenta-se como métodos ativos de ensino.
Renovada não-diretiva Os problemas psicológicos importam mais que os sociais; aula é uma terapia. Ensino centrado no aluno, trabalho em grupo. Conteúdos têm pouca importância.
Tecnicista Formar recursos humanos transmitindo informações objetivas. O conhecimento é apenas o observável, não a subjetividade. Ensinar é condicionar o comportamento.
TENDÊNCIA PROGRESSISTA
Através de uma análise crítica da realidade, defendem as finalidades sociopolíticas da educação.
Libertadora Educação é prática social; questiona a realidade. Baseada no
35
diálogo, os conteúdos devem estar ligados à realidade dos educandos. Geralmente relacionada ao ensino não-formal, tem como maior expoente Paulo Freire.
Libertária O mais importante são as experiências do coletivo, em especial formas de participação crítica em discussões e cooperativas. Matérias são opcionais. Recusa qualquer forma de autoridade, sendo o professor um conselheiro.
Crítico-social dos conteúdos Os conteúdos são o mais importante; mas conteúdos concretos, ligados à realidade social. Aprender implica processar informações e entender as próprias experiências. Considera o conhecimento prévio dos alunos.
Fonte: elaborada pela autora com base em Libâneo (2002).
Tendo em vista o que foi exposto sobre a extensão universitária, percebe-se
uma maior identificação com as tendências progressistas, pois uma das
características do fazer extensionista é seu viés de atuação política e social. Não há,
na discussão sobre práticas de extensão, qualquer pretensão alheia aos interesses
coletivos e às formas de exercer a cidadania. Na medida em que a extensão defende
a relação horizontal entre sujeitos que, juntos, buscam melhorias sociais através da
participação e do diálogo, o seu processo de aprendizagem está mais relacionado
com a tendência progressista libertadora. Vale ressaltar o fato de a mudança
conceitual no significado dessa atividade dever-se às ideias de Paulo Freire, as quais
trouxeram uma nova visão à prática extensionista e ajudaram a moldar os seus valores
que persistem até hoje.
Anastasiou e Alves (2006) defendem que, em um mundo cada vez mais
complexo, feito de constantes mudanças no tecido social, não faz sentido manter as
mesmas práticas docentes do século passado, baseadas na memorização como
operação principal. Para enfrentar os desafios impostos por essa complexidade, deve-
se evoluir para meios de ensino participativo.
Ao planejar a aula, portanto, as autoras afirmam que o professor deve escolher
as ferramentas mais adequadas para que os estudantes se apropriem do
conhecimento. No processo de apropriação, efetivam-se diversas construções
mentais (como por exemplo comparação, observação, imaginação, interpretação,
críticas, planejamento, tomada de decisão etc.). Logo, a aprendizagem, aqui, não se
36
limita ao conteúdo, mas também é um processo coletivo de construção de saberes
por meio de operações mentais desenvolvidas pelas ações.
Novas práticas e estratégias docentes implicam inserir evolução,
espontaneidade, criatividade e construção conjunta em ações de criação coletiva, de
experimentação e de reflexão em forma de oficinas pedagógicas que possibilitem a
construção coletiva da aula. Assim, pode-se transitar do assistir ao fazer aulas em um
desenvolvimento crescente da autonomia (ANASTASIOU; ALVES, 2006). Com efeito,
a ação extensionista pode ser espaço de experimentação de novas formas de ensinar
e aprender, bem como de articulações pedagógicas que enriquecem a aprendizagem.
As ações que fazem parte dessa ideia de processo coletivo de aprendizagem
através de operações mentais podem tanto abrir espaço para que se construam
conhecimentos, como também exigir a mobilização daqueles já existentes para a
interação em situações específicas. Nesse sentido, Perrenoud (1999) defende uma
abordagem de aprendizagem por competências, relacionadas à capacidade de
mobilizar recursos cognitivos (entre eles, conhecimentos) durante a vivência no
mundo real. São aprendizados construídos que permitem enfrentar diversas situações
complexas e inéditas.
Ou seja, competências são construídas com o uso do conhecimento na prática,
quando se multiplicam as situações de interação. Isso implica aprender a identificar
os conhecimentos pertinentes para uma determinada situação, mobilizando-os
através da capacidade de relacionar conhecimentos prévios com os novos problemas
enfrentados.
Isso posto, nota-se na extensão uma oportunidade de construir competências,
tanto por parte do estudante quanto do professor e até mesmo da comunidade, pois
vivencia-se uma situação na qual conhecimentos profissionais e pessoais são
mobilizados para resolver um problema real (social e/ou de projeto). Como afirma
Perrenoud (1999, p. 17), para desenvolver competências deve-se "[...] trabalhar mais,
correr novos riscos, cooperar, projetar-se e questionar-se". E a extensão pode ser o
momento ideal para isso.
37
3.3.1 Aprendizagem, trabalho comunitário e participação na extensão
Síveres (2013) acrescenta à compreensão geral de extensão universitária a
importância de entendê-la também como um processo de aprendizagem, ressaltado
no princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, pois aprender é
uma constante em todos os elementos da tríade. Sobre o processo de aprendizagem
na extensão, reflete:
[...] situado nas fronteiras institucionais e sociais, abre horizontes para um conhecimento mais criativo e inovador, fortalecendo um percurso mais compreensivo que informativo, mais reflexivo que transferidor de conhecimentos, mais produtivo que armazenador, mais invenção que enquadramento, mais possibilidades que certezas, mais sentido que direção, mais interdisciplinaridade que disciplinaridade, mais complexidade que simplificação, mais sujeitos que expectadores, mais vivências que exigências (SÍVERES, 2013, p. 30).
Observa-se que considerar a extensão como uma possibilidade de
aprendizagem amplia os espaços formativos (na universidade restritos às salas de
aula, bibliotecas e laboratórios) e, consequentemente, as formas de aquisição de
conhecimento. Pode-se dizer que a experiência extensionista agrega uma dimensão
de autonomia e de pró-atividade, uma vez que os atores exercem papeis ativos nos
projetos, atuando como sujeitos do próprio processo de aprendizagem.
A partir de uma pesquisa realizada em 2012 com estudantes universitários
brasileiros envolvidos em atividades extensionistas, Costa et al. (2013) identificaram,
em suas falas, três categorias para a aprendizagem na extensão: aprendizagem para
a formação profissional (aprendizagem conceitual); aprendizagem para a convivência
coletiva e inclusão social (aprendizagem procedimental); e aprendizagem para
aquisição e/ou mudança de valores e construção cidadã (aprendizagem atitudinal).
Na aprendizagem para a formação profissional, os estudantes entram em
contato com a realidade da profissão, identificam novas áreas de atuação e,
principalmente, conseguem relacionar teoria e prática através de vivências
significativas também para o crescimento pessoal. A aprendizagem para a
convivência coletiva e inclusão social ressalta o trabalho em equipe, a colaboração, a
troca e a convivência com culturas diferentes; também apresenta possibilidades
concretas de encontrar soluções para os problemas diários. Por último, a
aprendizagem para aquisição e/ou mudança de valores e construção cidadã oferece
38
espaço para o exercício da cidadania e atuação frente aos problemas sociais, e
também acrescenta o olhar da necessidade de se colocar no lugar do outro.
Figura 4 – Dimensões da aprendizagem discente na extensão universitária
Fonte: elaborada pela autora com base em Síveres (2013) e Costa et al. (2013).
A Figura 4, chamada de Dimensões da Aprendizagem Discente na Extensão
Universitária, apresenta uma síntese dos conceitos identificados. Afirma-se que a
experiência extensionista propicia essas três dimensões de aprendizagem em
especial na vivência com comunidades e culturas externas à instituição. Embora uma
experiência reforce as diferentes dimensões em maior ou menor grau, pode-se
considerar que acontecem em paralelo e não são excludentes entre si.
É interessante observar que uma atividade proposta pode enfatizar um ou outro
tipo de aprendizagem; por isso, a integração constante entre ensino e extensão deve
ser sempre consciente. Em relação aos projetos estudados, indaga-se como essas
dimensões são viabilizadas nos cursos de design, inclusive nos seus PPCs.
A formação acadêmica deve ser crítica e diversificada, ir além da forma
tradicional de transmissão de conteúdo em sala de aula e oportunizar ao estudante o
protagonismo na sua própria formação. Deve criar condições para que o estudante
possa desenvolver a capacidade de aprender de forma independente e permanente,
39
pois o conhecimento na sociedade contemporânea está sempre em rápido
crescimento. Para tanto, é necessário um processo de aprendizagem que priorize a
interação com a realidade, o diálogo e as atitudes reflexivas. E observa-se que a
extensão universitária é uma forma de dar espaço a esse tipo de aprendizagem
(FÓRUM…, 2006).
No fazer extensionista conceitua-se a sala de aula como espaço em que se
participa do processo social em sua complexidade, o que valoriza novas formas de
aprender. Especialmente em trabalhos que envolvem atuação em comunidades
externas, um novo eixo pedagógico é observado:
O eixo pedagógico “estudante–professor” é substituído pelo eixo “estudante–professor–comunidade”. O estudante, assim como a comunidade com a qual se desenvolve a ação de Extensão, deixa de ser mero receptáculo de um conhecimento validado pelo professor para se tornar participante do processo. Dessa forma, ele se torna também o tutor (aquele que apoia o crescimento possibilitado pelo conhecimento), o pedagogo (aquele que conduz, de mãos dadas, o processo de conhecimento) e o orientador (aquele que aponta a direção desse processo) (FÓRUM…, 2012, p. 18).
Permitir aos estudantes que desenvolvam e protagonizem, junto com
professores, atividades para solução coletiva de problemas do mundo real ultrapassa
a formação técnica e inclui uma formação cidadã e humana. O contato e as relações
com pessoas e realidades diferentes através do trabalho em comunidades inspiram a
reflexão e o senso de justiça e igualdade.
Deste modo, Abranches (2014) ressalta o trabalho comunitário como uma das
possibilidades da extensão. Nesse tipo de projeto, busca-se intervir diretamente nas
comunidades para propor melhorias, partindo sempre de um conhecimento prévio
sobre a comunidade e sua cultura local através de diagnósticos e conversas com
moradores. As ações contínuas devem ser priorizadas em detrimento das pontuais,
com foco em ações educativas para o empreendedorismo, formação política, resgate
da cultura local, participação e desenvolvimento.
Além disso, a mesma autora sugere alguns parâmetros para a realização das
atividades, entre os quais destacam-se: as decisões em relação aos trabalhos devem
ser coletivas; a equipe deve procurar uma comunicação efetiva com a comunidade;
antes das atividades deve-se fazer uma apresentação sobre extensão universitária e
sobre a proposta, com espaço para sugestões e expectativas da comunidade; as
40
ações realizadas devem ter continuidade por meio da criação de grupos locais
multiplicadores; etc.
Atualmente, priorizam-se práticas participativas através das quais os cidadãos
atuam como sujeitos na construção de saberes; deste modo, além da socialização do
conhecimento, é preciso também construi-lo em conjunto com a comunidade para que
ele se torne relevante (OLIVEIRA et al., 2012). Nesse ponto, Thiollent (2003) atenta
para a importância das metodologias participativas nos trabalhos de extensão com as
comunidades externas. Sobre a atividade extensionista e a metodologia participativa,
aponta:
A visão "comercial" da extensão universitária reduzida à prestação de serviços está sendo questionada. Principalmente nas universidades públicas, está em construção uma nova extensão posta a serviço da sociedade, dentro de uma visão compromissada de atuação, concretizada em iniciativas sociais e solidárias. Para isso, a elaboração de projetos de extensão requer subsídios da metodologia participativa (THIOLLENT, 2003, p. 65).
A ideia de extensão como prestação de serviços, ou seja, como ação pontual
para clientes externos tem sido repensada principalmente por conta da inexistência
de efeitos a longo prazo. Isso porque melhorias duradouras ultrapassam resultados
temporários e demandam envolvimento da comunidade e mudança de atitude,
somente possíveis através da participação.
Na metodologia participativa, uma das formas mais utilizadas é a pesquisa-
ação, na qual pesquisa e ação acontecem ao mesmo tempo e o pesquisador é agente
da mudança. Essa pesquisa reúne diversos métodos e técnicas da pesquisa social
com os quais se trabalha em um ambiente participativo para a coleta de informação,
cuja principal fonte é a fala dos interlocutores. Procura-se resolver um problema em
conjunto através da construção coletiva de modos de pensar e de estratégias de ação
(THIOLLENT, 2003).
No decorrer do projeto, a participação deve ser facilitada e fortalecida. É
importante que se crie um espaço de comunicação onde todos tenham voz, facilitando
a aceitação e estimulando a motivação dos participantes. Pode-se constatar uma
evolução na participação quando há alguma forma de empoderamento dos atores em
relação às ações, ou seja, quando as pessoas têm atitudes que mostram autonomia
e pró-atividade nas tarefas (THIOLLENT, 2003).
41
Outra questão importante para as práticas participativas é estar atento ao
referencial cultural do projeto e aos efeitos das informações geradas durante o
percurso. O referencial cultural dá significado às atividades, então pensadas levando
em conta a participação de todos em ações que respeitam a sabedoria popular, a
cultura local e o diálogo. As informações e os resultados gerados no projeto, por sua
vez, devem fazer sentido dentro do referencial cultural e da vida dos participantes; os
condutores do projeto devem estar atentos a esse aspecto para evitar a alienação e a
ausência de sentido dos resultados (THIOLLENT, 2003).
O FORPROEX (FÓRUM…, 2012, p. 18) afirma que as metodologias
participativas são a principal base da extensão: "Apenas ações extensionistas com
esses formatos permitem aos atores nelas envolvidos a apreensão de saberes e
práticas ainda não sistematizados e a aproximação aos valores e princípios que
orientam as comunidades [...]", pois é na participação que se vivenciam novas
possibilidades de ação e se incorpora o conhecimento de atitudes criativas e pró-
ativas. A participação também dá sentido aos resultados, uma vez que estes são
alcançados através de um entendimento construído de forma coletiva.
Silva (2013) entende que o elemento de participação identifica o conceito de
cidadania em um cenário de qualificação dos processos democráticos. Entrevistas
com estudantes que participaram de projetos de extensão indicaram uma certa
dificuldade em definir a palavra cidadania. A cidadania tem relação com o:
[...] processo de participação do indivíduo na consolidação da ordem social, que ele almeja para si e para suas relações com os outros. Refere-se, então, ao dever de participar e ao direito de ser atendido por ter participado. Nesse sentido, a cidadania exige que os indivíduos conheçam a sociedade em que estão inseridos, que sejam capazes de criar interesses universais e que se motivem para a ação entre iguais e diferentes [...] (SILVA, 2013, p. 118).
O autor acrescenta, ainda, que a cidadania se desenvolve sobremaneira na
sociedade civil e nos movimentos que dela emergem; e é exatamente a sociedade
civil que deve ser o principal espaço de atuação da extensão universitária. Contribui-
se para o exercício da cidadania, então, quando o estudante extensionista tem a
oportunidade de protagonizar ações participativas na sociedade através de desafios,
de oportunidades e da interação com a cultura da qual faz parte.
42
Alicerçada em metodologias participativas e no trabalho comunitário, a
extensão universitária pode ser uma oportunidade para o estudante vivenciar o
potencial social do conhecimento que adquire em sala de aula e nas aulas de projeto,
assim como um suporte para a motivação intrínseca nas atividades acadêmicas. Afinal
de contas, esse tipo de atividade traz um propósito maior do que a formação técnica
somente voltada ao mercado de trabalho, pois possui um sentido de relevância social
e autonomia que amplia a ideia de atuação profissional.
3.4 CATEGORIAS DA REVISÃO TEÓRICA
No decorrer do capítulo, foram identificadas duas categorias para a composição
do quadro de diretrizes proposto neste estudo. Acredita-se que essas categorias e
suas respectivas subcategorias contemplam os principais tópicos identificados na
revisão teórica deste capítulo. As categorias compõem o quadro por meio do qual são
analisadas as falas dos atores entrevistados na próxima etapa do estudo qualitativo.
Objetiva-se identificar, na fala dos atores, como os acontecimentos estão relacionados
a tais diretrizes durante os projetos.
O primeiro quadro baseia-se nas diretrizes orientadoras das ações de extensão
apresentadas no Quadro 1 (p. 31), sugeridas pelo Fórum de Pró-Reitores de Extensão
(FÓRUM…, 2012). Acredita-se que representam os principais valores da prática
extensionista. O conteúdo apresentado foi acrescido de uma interpretação particular
que reelaborou sua descrição.
Observa-se que nem todos os tópicos apresentados no primeiro quadro foram
contemplados como categorias (Quadro 3). O tópico impacto na formação do
estudante se sobrepõe a questões de ensino-aprendizagem que também serão
consideradas para a análise. Quanto ao tópico impacto e transformação social, trata-
se de uma dimensão complexa merecendo um estudo mais aprofundado que não se
inclui no escopo do presente trabalho. Na sequência, apresenta-se o segundo quadro
de diretrizes (Quadro 4) oriundo deste capítulo, que busca verificar o processo de
ensino-aprendizagem na extensão.
43
Considerando o que foi visto até agora, sistematizado nas diretrizes propostas
nos Quadros 3 e 4, questiona-se: Quais práticas e abordagens de projeto melhor
traduzem e representam os valores da extensão universitária?
Quadro 3 – Diretrizes gerais para ação de extensão para quadro de análise
1) DIRETRIZES GERAIS PARA A AÇÃO EXTENSIONISTA
Esta categoria é adaptada das diretrizes orientadoras para a criação e implementação de ações na
extensão universitária, sugeridas pelo Fórum de Pró-Reitores de Extensão no documento Política Nacional
de Extensão Universitária (FÓRUM..., 2012). Trata-se de conceitos importantes para a prática
extensionista que representam seus principais valores.
O que Por que Como
1.1) Interação Dialógica
Deve-se superar o discurso da hegemonia do conhecimento acadêmico em favor de um posicionamento dialógico que proporcione espaços efetivos de comunicação e troca de conhecimentos acadêmicos e populares. O conhecimento não deve ser apenas estendido, mas construído junto com a sociedade em uma via de mão dupla. Privilegiar a troca e a continuidade das ações em vez do assistencialismo.
Dessa forma, o eixo de pesquisa é enriquecido com questões sociais, e igualmente o é o eixo de ensino a partir do contato dos estudantes com a realidade e diversidade social e cultural. Ao mesmo tempo, as comunidades têm a oportunidade do contato com conhecimentos que ficariam restritos aos participantes da vida acadêmica. Por último, as trocas pessoais entre todos os atores são aprofundadas pela interação oportunizada pela participação.
Utilizar metodologias que estimulem a participação e a democratização do conhecimento, bem como a apropriação da autoria dos atores sociais, assim como sua presença em ações nos espaços das universidades.
Promover momentos de troca de conhecimento como oficinas, eventos culturais, aulas, sessões de cocriação e seminários de discussão que envolvam igualmente universidade e comunidade. Construir espaços de diálogo e cocriação durante os projetos que permitam o entendimento dos propósitos de projeto e discussões conjuntas sobre possíveis soluções. Construir alianças com organizações sociais a fim de garantir a continuidade das ações.
1.2) Interdisciplinaridade e Interprofissionalidade
É preciso ultrapassar a dicotomia entre o holismo que generaliza e a especialização que fragmenta, considerando a dimensão complexa e sistêmica da realidade. Enriquecer as vivências e os resultados dos projetos extensionistas com a integração de conhecimentos de diversas áreas. Integrar dimensões acadêmica, profissional e social.
Integrar modelos, conceitos e metodologias de diversas áreas do conhecimento. Construir alianças interorganizacionais e interprofissionais. Envolver estudantes e professores de diversos cursos nos projetos, permitir o contato com profissionais do mercado e do terceiro setor.
44
1.3) Interação entre ensino, pesquisa e extensão
Buscando o princípio da indissociabilidade, deve haver um esforço para que se vinculem ações de extensão ao processo de formação de pessoas (ensino) e de geração de conhecimento (pesquisa). Isso permite que se alcance maior unidade entre teoria e prática. A articulação com o ensino e com a pesquisa promove a interação crítica do eixo extensão com a sociedade. A sala de aula é ampliada para um espaço em que se participa do processo histórico-social e essa atuação oportuniza aos estudantes o desenvolvimento de outras competências.
Existindo um eixo pedagógico composto por estudantes, professores e comunidade abre-se espaço para que o estudante também exerça papeis de tutor, pedagogo e orientador.
Promover ações orientadas por metodologias participativas permitem a apreensão de saberes e a aproximação com as comunidades. Incorporar pós-graduação em projetos de extensão. Fortalecer a produção acadêmica, relacionar prática com teoria.
Fonte: elaborada pela autora.
Quadro 4 – Diretrizes para o ensino-aprendizagem para quadro de análise
2) DIRETRIZES PARA O ENSINO-APRENDIZAGEM NA EXTENSÃO
A partir da afirmação de que a extensão, como eixo vinculado ao ensino e à pesquisa, constitui um espaço
de protagonismo no processo de aprendizagem que possibilita aos sujeitos desempenharem papeis ativos
nos projetos (SÍVERES, 2013), esta categoria apresenta diretrizes a respeito do ensino-aprendizagem nas
ações extensionistas. Considerar a extensão como uma possibilidade de aprendizagem amplia os espaços
formativos e, consequentemente, as formas de aquisição de conhecimento. Três dos quatro tópicos tratam
da aprendizagem discente sobre formação profissional, convivência coletiva e exercício da cidadania,
derivados das categorias identificadas por Costa et al. (2013) em entrevistas com estudantes universitários
brasileiros que participaram de projetos de extensão. Ainda, o terceiro tópico, exercício da cidadania, vale-
se da ideia de trabalho comunitário na extensão posta por Abranches (2014) e também inclui a diretriz
orientadora impacto na formação do estudante, apresentada no Quadro 1 (p. 31), sugerida pelo Fórum de
Pró-Reitores de Extensão (FÓRUM…, 2012). O quarto tópico, por fim, baseado em Anastasiou e Alves
(2006), busca avaliar como os professores extensionistas conduzem o processo de aprendizagem nos
projetos e identificar estratégias de ensino adotadas.
O que Por que Como
2.1) Formação profissional (aprendizagem conceitual)
Dar ao estudante a oportunidade de entrar em contato com a realidade da profissão ao mesmo tempo em que vivencia o potencial social do conhecimento que adquire na sala de aula. Nesse processo ocorre a construção de competências pela mobilização de conhecimentos da graduação para a resolução de problemas reais. Identificar novas áreas de atuação e relacionar teoria e prática com vivências
Atividades devem estar relacionadas de alguma forma ao cenário profissional. Estabelecer parcerias com profissionais da área.
45
significativas também para o crescimento pessoal.
2.2) Convivência coletiva
Oportunidade de trabalhar em equipe, vivenciar a colaboração e a convivência com culturas diferentes. Identificar possibilidades concretas de solução para problemas diários.
Fomentar o trabalho em equipe e momentos de diálogo. Explorar papeis durante os diferentes momentos dos projetos. Oportunizar a troca com o usuário e com profissionais de instituições parceiras.
2.3) Exercício da cidadania e inclusão social
Uma das principais características da ação extensionista é um viés político e social que leva em conta interesses coletivos e formas de atuação cidadã. Naturalmente, deve-se atentar para favorecer projetos que promovam o contato com grandes questões sociais e a resolução coletiva de problemas do mundo real. Ser cidadão é fazer valer seus direitos e ao mesmo tempo estar disposto a lutar pelos direitos do próximo. Conviver com a diferença, conhecer outras realidades sociais. Sentir-se parte atuante do mundo real. Dessa forma, além da formação técnica abre-se espaço para que aconteça uma formação cidadã e humana.
O trabalho com comunidades de baixa renda enseja uma atuação significativa frente a problemas sociais. O contato com pessoas e realidades diferentes inspira reflexões importantes para o senso de igualdade e justiça social. Nesse tipo de projeto, busca-se intervir nas comunidades para propor melhorias, partindo sempre de um conhecimento prévio da cultura local proveniente de conversas com os próprios moradores. As ações devem priorizar a continuidade e o desenvolvimento de atitudes empáticas, educativas e inclusivas.
2.4) Estratégias de ensino
Para enfrentar os desafios da complexidade, deve-se evoluir para meios de ensino participativo, pois não faz mais sentido manter as práticas baseadas principalmente em memorização e modelos expositivos. É necessária a compreensão da aprendizagem não apenas centrada no conteúdo, mas também baseada em um processo coletivo de construção de competências e saberes através de ações. A ação extensionista pode ser espaço de experimentação de novas formas de ensinar e aprender, bem como de articulações pedagógicas que enriquecem a aprendizagem.
Ao planejar a aula, o professor deve escolher as ferramentas mais adequadas para que os estudantes se apropriem do conhecimento desenvolvendo a autonomia. Possibilitar a construção coletiva da aula e dar espaço para criatividade, espontaneidade, evolução e experimentação.
Fonte: elaborada pela autora.
46
4 VALORES EXTENSIONISTAS NO DESIGN
Este capítulo busca uma aproximação do design com a extensão universitária
no que concerne seus valores, qualidades importantes das principais diretrizes que
orientam suas práticas. Identificam-se, assim, posturas de projeto possivelmente mais
alinhadas a tais diretrizes para a construção do quadro de análise. Em outras palavras,
o principal objetivo deste capítulo é identificar abordagens teóricas coerentes com o
fazer extensionista e, posteriormente, valer-se de tais achados para analisar e refletir
sobre as escolhas projetuais dos casos estudados.
Na sua acepção mais ampla, o design pode ser considerado uma prática
projetual para resolver problemas complexos utilizando-se de uma abordagem
interdisciplinar e de uma visão sistêmica, apoiada por uma cultura de projeto
(GALISAI; BORBA; GIORGI, 2008). Não se vincula só e necessariamente a objetivos
econômicos ou empresariais, pois também oferece habilidades para trabalhar com
projetos de natureza social (HASLINGER, 2007).
O design é uma atividade propositiva que atua através do projeto, sendo
consequentemente pragmática. Como afirma Bonsiepe (2012, p. 36), o designer não
deve se contentar apenas com uma postura crítica, mas deve ser capaz de "[...]
traduzir sua postura contra o status quo em uma proposta projetual viável", intervindo
na realidade com o propósito de mudá-la.
É nesse sentido que os valores do design se aproximam daqueles da extensão,
cuja missão é ser ação participativa entre saberes acadêmicos e populares. Sendo o
design um campo com vertentes voltadas às questões sociais, bem como um modo
de atividade projetual que muitas vezes se utiliza de práticas participativas envolvendo
equipes interdisciplinares e compartilhamento de ferramentas de projeto, ressalta-se
o seu papel como uma direção interessante para a extensão universitária.
Deste modo, serão abordados a seguir os tópicos de design social e
democracia, design centrado no humano e práticas participativas de projeto.
47
4.1 DESIGN SOCIAL
Flusser (2007) afirma que o design é caracterizado pela arte de projetar e criar
cultura. O projeto pode se destacar por duas vias: a via negativa, quando se torna um
problema e um obstáculo para as pessoas, e a via positiva, que resolve os problemas
e traz liberdade para o mundo da cultura. Projetar, então, implica assumir
responsabilidade.
A primeira manifestação de responsabilidade social no design pode ser
identificada no movimento Arts and Crafts (Artes e Ofícios), no século XIX, inspirado
pelo pensamento do professor e poeta inglês John Ruskin, que condenava as
condições desumanas às quais eram submetidos os operários e a degradação
ambiental causada pela produção industrial. Quem liderou o movimento foi o artista e
designer William Morris, ao perceber que havia uma relação interdependente entre a
arte, o sistema social e a produção fabril (Figura 5).
Figura 5 – Interdependência entre arte, produção e sociedade.
Fonte: elaborada pela autora.
Por consequência dessa interação, Morris defendeu que não havia como
separar a arte da moral, da política e da sociedade, sendo a qualidade de um objeto
medida pela unidade entre projeto e execução e pelo bem-estar do trabalhador. Para
48
ele, a cobiça e a tirania comercial eram os maiores culpados pela má qualidade dos
produtos (CARDOSO, 2008). Morris foi um dos pioneiros na área do design e um dos
primeiros engajados em causas sociais. Por esses termos, o Arts and Crafts pode ser
considerado o embrião de um design com preocupações sociais (BRAGA, 2011).
Nos anos 1970, o designer Victor Papanek abriu novamente as discussões
sobre design socialmente responsável quando lançou o livro Design para o mundo
real. Já na abertura do texto, ele afirma que poucas profissões são mais danosas que
a do design industrial. Segundo Papanek (2006), os designers haviam se tornado uma
raça perigosa ao projetarem supérfluos que não atendiam às reais necessidades das
pessoas e só enchiam os terrenos de lixo com materiais e processos poluentes.
O mesmo autor apresenta, ainda, a profissão de designer como uma
ferramenta para criar objetos e modificar ambientes, o que demandaria uma alta
responsabilidade social e moral, um conhecimento cuidadoso das pessoas e maior
consciência por parte das próprias pessoas sobre o processo de design. Seguindo
esse raciocínio, o autor complementa:
O design deve se tornar uma ferramenta inovadora, altamente criativa e interdisciplinar que responda às reais necessidades do homem. Deve ser mais orientada pela pesquisa, e nós devemos parar de contaminar a terra com estruturas e objetos pobremente projetados. (2006, p. x, tradução nossa).
Um dos problemas apontados por Papanek (2006) era a omissão em relação
ao contexto social em que o design atuava, temática não abordada em nenhum livro
sobre design naquela época. Embora existam críticas ao tom excessivamente moral
e à falta de orientações sobre como resolver problemas sociais, o livro é aclamado
por trazer à tona uma discussão sobre responsabilidade social no design, que mais
tarde faria parte da trajetória do chamado Design Social.
Ao longo das últimas décadas aconteceram discussões acerca de um modelo
social de design a fim de pensar a atuação do designer em projetos com causas
sociais, para além de trabalhos destinados ao mercado. Esse modelo social veio a ser
chamado de Design Social e entendido como uma área de atuação que se dedica a
disseminar valores e a buscar melhorias sociais.
Lima e Martins (2011, p. 115) defendem o design social como uma “abordagem
de projeto” motivacional, participativa e de consequências sociais envolvida na
49
promoção de valores sustentáveis, sociais e culturais. Lima et al. (2009) sustentam
que o design social atua na sociedade através de projetos cujo objetivo é solucionar
problemas sociais. Dessa forma, ultrapassa objetivos unicamente econômicos para
beneficiar toda a sociedade.
Segundo Margolin e Margolin (2004), alternativas de prática de design que vão
além de objetivos comerciais e de mercado têm recebido pouca importância. É
afirmado que enquanto o design para o mercado dispõe de um extenso e fértil material
teórico, apesar de existirem soluções de baixo custo para problemas em comunidades
pobres, “pouco se tem pensado sobre as estruturas, métodos e objetivos do Design
Social” (p. 43).
A partir dessa premissa, os autores justificam a importância da participação de
designers em projetos sociais alegando que o design atua em alguns domínios que
impactam o ser humano (são eles: o biológico, psicológico, cultural, social, natural e
físico-espacial). Finalmente, fazem sugestões para desenvolver um modelo prático de
Design Social, envolvendo entendimento do contexto, literatura da área de assistência
social e participação em equipes interdisciplinares (MARGOLIN; MARGOLIN, 2004).
Cipolla e Bartholo (2014) apontam que o design socialmente responsável
também implica a ação no próprio contexto em que se vive e o estabelecimento de
relações dialógicas com as pessoas que compartilham essa vivência. Os autores
apresentam uma visão da trajetória do design socialmente responsável e culminam
em uma convergência entre seus marcos conceituais históricos e as seis principais
características do conceito recente de design de transformação (transformation
design) cunhado por Burns et al. (2006), que é baseado na abordagem de design
centrado no humano. Essas características são: definir e redefinir o briefing junto a
usuários e stakeholders; colaboração entre disciplinas; empregar técnicas de design
participativo; construir capacidade, não dependência; projetar para além de soluções
tradicionais; criar mudança expressiva. Dessas colocações, verifica-se a ligação entre
design social, design centrado no humano e design participativo, que serão discutidos
na sequência.
Uma das diferenças entre o trabalho de assistência e serviço social e a
abordagem dialógica para o design socialmente responsável trazida por Cipolla e
Bartholo (2014) é que o primeiro frequentemente busca soluções para problemas já
50
claramente formulados, enquanto a última aborda problemas ainda não estruturados
e explora processos dialógicos que ajudem os participantes a definirem seus próprios
problemas de projeto.
Há alguns anos, um texto escrito por Bruce Nussbaum (2010) sobre ações de
design para desenvolvimento social iniciou um debate nas redes sociais da área (THE
DESIGN OBSERVER GROUP, 2010). Nussbaum pergunta se o design humanitário
seria o novo imperialismo. Embora muitos tenham considerado o texto provocativo,
ele propõe uma reflexão importante ao questionar algumas ações de designers em
países periféricos. Além disso, apresenta casos em que os designers externos levam
uma solução a uma comunidade sem conhecimento suficiente da cultura local.
Enquanto tais designers apresentam-se como benfeitores, as comunidades rejeitam
a solução, pois aquilo não faz sentido para sua realidade. Uma abordagem dialógica
poderia evitar esse tipo de situação, pois requer o envolvimento da comunidade desde
o início, no processo de entendimento do problema que enfrentam, até a elaboração
de soluções de forma conjunta.
Bonsiepe (2012) apresenta conceitos interessantes para se pensar a atuação
do design social e a questão trazida por Nussbaum: democracia, humanismo projetual
e alteridade. Ele define a democracia no sentido de "[...] redução da heteronomia,
entendida como subordinação a uma ordem imposta por agentes externos" (p. 20) e
de viabilização da participação das populações desfavorecidas. Como oposto de
heteronomia, tem-se a autonomia: autodesenvolvimento que traz em si, ao mesmo
tempo, liberdade e responsabilidade (FREIRE, 2011).
O autor também defende o que chama de "humanismo projetual", ou seja, as
capacidades projetuais utilizadas em projetos emancipatórios e inclusivos. Os
designers devem formar uma consciência crítica em relação à exclusão social e
podem aprender a traduzir projetualmente um discurso crítico.
Nesse ponto, entre algumas virtudes para o design, Bonsiepe (2012) cita a
alteridade, cujo valor reside no respeito ao outro e a outras culturas, evitando posturas
"messiânicas etnocentristas". A alteridade relaciona-se com questões de autonomia,
identidade, participação e autoexpressão.
Considerando esses pontos, entende-se que o projeto extensionista (e
qualquer projeto que pretenda fazer design social), de maneira ideal, não deve
51
acontecer arbitrariamente de fora (agentes externos) para dentro (comunidade), e sim
dentro e fora simultaneamente, de modo que as definições devem partir de ambos os
lados. Designers e comunidades devem trabalhar juntos e priorizar a interação
dialógica, evitando uma posição impositiva ou paternalista.
Nesses casos, a noção de design centrado no humano e as metodologias
participativas têm um papel importante para democratizar o projeto e colocar no
centro, como sujeitos, aqueles mais impactados pelas soluções: as pessoas da
comunidade.
4.2 DESIGN CENTRADO NO HUMANO E PRÁTICAS PARTICIPATIVAS DE
PROJETO
O foco no ser humano emergiu quando os produtos foram percebidos além da
forma e função, pois eram, acima de tudo, práticas sociais e simbólicas às quais as
pessoas reagiam. O design centrado no objeto, que favorecia conceitos técnicos como
funcionalidade e durabilidade, sem refletir propriamente sobre características
humanas e culturais, deu lugar ao paradigma de design centrado no humano, ocupado
em entender em primeiro lugar as necessidades das pessoas e a forma como
experienciam e interpretam os artefatos (KRIPPENDORFF, 2000).
Segundo a interpretação da IDEO (2015), o design centrado no humano é um
processo que inicia com a compreensão das necessidades das pessoas através da
construção da empatia e resulta em soluções novas que funcionam em contextos
culturais e econômicos específicos. Tem relação com a geração de muitas ideias,
construção de protótipos, compartilhamento com as pessoas para as quais se projeta
e eventualmente gera inovação.
Em 2009, a IDEO lançou o Human-Centered Design (HCD) Toolkit (Toolkit de
Design Centrado no Humano) para ajudar pessoas que trabalham no setor público a
resolverem problemas sociais, principalmente em países em desenvolvimento. O HCD
Toolkit apresenta o processo de design centrado no humano dividido em três fases:
Hear (ouvir as pessoas), Create (criar soluções) e Deliver (entregar soluções). Em
2015, a empresa lançou uma versão atualizada desse Toolkit, chamada Field Guide
52
to HCD (guia de campo para o design centrado no humano), disponível para download
gratuito (IDEO, 2016).
Steen (2012) propõe a compreensão do design centrado no humano como:
[...] um processo no qual pessoas diferentes participam e se movem entre o outro e o eu, e entre abertura e fechamento. Vejo o design centrado no ser humano como um frágil encontro entre pessoas, como um encontro que pode ser bonito, e como um encontro que pode facilmente se romper (STEEN, 2012, p. 74, tradução nossa).
Steen (2012) coloca as dificuldades inerentes a este processo, pois reconhecer
o outro pode ser difícil. Os praticantes de abordagens de design centrado no humano
não escapam desta dificuldade, pois as pessoas, em geral, tendem a ver o outro como
objeto de seus próprios interesses. Então, durante um projeto, é natural que os
métodos e habilidades próprios dos designers (seu "eu"), os façam apropriar-se do
que veem e ouvem de usuários e colaboradores (o "outro") de uma forma que seja
pertinente em relação aos próprios interesses.
Dar-se conta dessas tensões já é uma forma de atenuá-las. A questão é
encontrar um equilíbrio entre o ato de abrir-se e compreender o outro e o de colocar-
se no projeto. Cumpre dizer que os métodos de design têm igual influência no
movimento entre o outro e o eu e entre abertura e fechamento (STEEN, 2012).
A mudança crescente da relação entre o designer e o usuário afirma a
importância de se atuar em situações do mundo real, isto é, aquelas que não existem
só para os designers, mas também para as outras pessoas. A evolução desse
pensamento para processos mais abertos e colaborativos também reconhece
situações em que as pessoas devem participar desde o início até o fim do processo
de design, passando por todas as fases junto com o designer (HO; D. K.; LEE; Y. C.,
2012).
Por consequência, a extensão do projeto para a participação alimenta uma
cultura construída colaborativamente e apoiada pela prática projetual. A oportunidade
de (re) projetar dá autonomia aos usuários e motivação intrínseca para o
engajamento; portanto, “[...] a atividade projetual é intrinsecamente motivadora, é uma
atividade humana por natureza. Ela não é privilégio de uma profissão”. Caminha-se
para uma sociedade em que as práticas projetuais tornam-se amplamente distribuídas
53
(KRIPPENDORFF, 2000, p. 90-91). Com isso, o design dá espaço a novas formas de
operar e retoma com mais força metodologias participativas de projeto.
O design participativo teve início na Escandinávia entre os anos 1970 e 1980
em um contexto de empoderamento dos trabalhadores e democratização do espaço
de trabalho. Os trabalhadores queriam participar do desenvolvimento das tecnologias
que eles mesmos usariam, pois eram forçados a adotar novos sistemas com os quais
não estavam habituados. Alguns pesquisadores, ao buscarem uma forma participativa
que desse certo, levando em conta a falta de conhecimento tecnológico dos
trabalhadores, voltaram-se para a pesquisa-ação e para os métodos etnográficos,
realizando diversos experimentos nos contextos de trabalho em um projeto chamado
UTOPIA. Desse projeto surgiram abordagens para o design participativo (SPINUZZI,
2005).
Spinuzzi (2005) aponta a diferença entre design centrado no usuário e design
participativo: no primeiro, a pesquisa e a solução de design são a favor dos reais
interesses do usuário, o que não implica necessariamente uma participação, enquanto
no último, as pessoas impactadas participam inclusive da fase de ideação para a
concepção da solução e são, de fato, parte da equipe de projeto. Por exemplo, o
Human-Centered Design Toolkit (IDEO, 2016), mencionado anteriormente, prevê
durante a primeira fase (Hear) uma imersão inicial para conhecer a realidade dos
impactados no projeto e construir empatia através de métodos qualitativos de
pesquisa. Na segunda fase (Create), a ideia é que a equipe de design considere um
posicionamento empático sobre as informações coletadas para pensar soluções, o
que pode ou não ser precedido de um workshop de coprojetação envolvendo a
comunidade. Ainda nessa fase, coletam-se feedbacks e avança-se para a fase de
entrega (Deliver). O processo, aqui, pode ser considerado mais centrado nas decisões
da equipe de design do que na participação da comunidade, constituindo mais uma
abordagem de design centrado no humano (ou no usuário) do que de design
participativo.
O objeto de estudo do design participativo é o conhecimento tácito dos
envolvidos no processo e a eventual criação de ferramentas para auxílio na
materialização desse conhecimento de difícil apreensão (SPINUZZI, 2005). Segundo
Nonaka e Takeuchi (1995), o conhecimento tácito envolve duas dimensões: a técnica
54
(habilidade, saber fazer) e a cognitiva (modelos mentais e crenças). Valoriza-se a
intuição, o insight, os valores, as emoções e a dimensão simbólica do conhecimento.
O design participativo visa dar condições de autêntica decisão aos usuários, e
isso é viabilizado através das atividades participativas de pesquisa e da coprojetação,
ou codesign. Codesign é o uso da criatividade colaborativa dentro de um processo de
design em que designers e não designers trabalham juntos (SANDERS; STAPPERS;
2008). Ele requer habilidades de design que envolvem motivar a colaboração e
construir visões e cenários compartilhados (MANZINI, 2014).
Codesign é frequentemente usado como um termo que inclui processos
abertos de design participativo e cocriação. Exige flexibilidade para permitir a geração
e a coleta de conteúdo criativo de diferentes formas – pois agora outros atores
participam, com seus próprios modos de conhecer – e também exige suportes
(plataformas e ferramentas para organizar a criatividade) que ajudam a avançar no
processo (CRUICKSHANK; COUPE; HENNESSY, 2013).
Além de flexibilidade e suporte, a coprojetação requer um esforço especial de
comunicação e empatia entre os atores participantes do projeto. Considerando a
participação de diversas pessoas com seus modos particulares de ser e estar no
mundo, Ho e Lee (2012) atentam para o conceito de intersubjetividade no codesign
como a dimensão das relações empáticas e dialógicas que permitem a cada membro
entender e valorizar o outro, bem como à equipe trabalhar como um grupo, em relação
igualitária.
Esses autores apresentam um modelo com três tipos de relação intersubjetiva:
Eu-Isso (I-It), Isso-Tu (It-Thou) e Eu-Tu (I-Thou). A relação Eu-Isso é considerada de
tipo instrumental, que pode levar à deterioração da qualidade das relações humanas.
Por sua vez, no momento Isso-Tu se dá a construção da empatia, importante para o
ato comunicativo e para a colaboração durante o projeto. Por fim, o momento Eu-Tu
pressupõe uma relação de igualdade, necessária para levar a momentos de diálogo.
Tal modelo de relações intersubjetivas é indicado para funcionar como um "[...] guia
conceitual para que os designers se habilitem a construir espaços comunicativos nos
quais diálogos igualitários são possíveis e, como resultado, estendam o impacto da
participação em design para o desenvolvimento social". (HO; LEE, 2012, p. 71).
55
A respeito desse modelo, Cipolla e Bartholo (2014) argumentam que o
momento Eu-Tu deve ser o mais fomentado na abordagem dialógica por eles proposta
para o design socialmente responsável. Dessa forma, os autores apresentam um
modelo de atuação em que o designer deve estar completamente presente no
contexto ao mesmo tempo em que se valorizam relações de inclusão através do
diálogo (momento Eu-Tu). Para eles, deve-se ir além das relações de empatia do
momento Isso-Tu, valorizadas no design centrado no humano, pois tais momentos
não são suficientes para promover a inclusão necessária.
Não por acaso, espaços comunicativos no processo de codesign são
considerados por Ho e Lee (2012) uma "necessidade metodológica", uma vez que se
propõem a ver as pessoas como sujeitos mais ativos na construção de novas
narrativas, com atitude mais aberta no levantamento de suposições e ideias. Um
modelo para a construção desses espaços resultaria em um arranjo mais participativo
dos membros da comunidade; portanto, em uma forma mais democrática e dialógica
de conduzir o processo de codesign.
Com relação aos procedimentos de prática e pesquisa em design, Sanders
(2008) propõe a existência de dois modelos mentais: o modelo especialista (expert
mindset) e o modelo participativo (participative mindset). A diferença fundamental é
que no primeiro modelo projeta-se para consumidores em um processo unilateral, no
qual o designer é o único especialista; por outro lado, no modelo participativo projeta-
se com as pessoas, pois são também consideradas especialistas e cocridoras no
projeto.
Mover-se do modelo especialista para o modelo participativo requer uma
mudança cultural. O fato de considerar os usuários não como sujeitos que reagem às
criações, mas como cocriadores reforça o princípio básico do design participativo de
que todas as pessoas são criativas e podem ter boas ideias se forem fornecidos meios
para isso (SANDERS, 2008).
Vale destacar o estudo de caso comparativo de Freire, Borba e Diebold (2011).
Os autores compararam o trabalho de designers em dois grupos produtivos a partir
dos dois mindsets propostos por Sanders (2008). No primeiro caso, conduzido pelo
mindset especialista, o produto criado pela equipe de designers gerou valor de
mercado, porém não engajou o grupo, pois as artesãs não se viam no produto e,
56
portanto, não se sentiram motivadas a dar continuidade à produção. O segundo caso,
por sua vez, conduzido por um mindset participativo e pela perspectiva de serviços,
permitiu que se criasse um valor social através da participação ativa da comunidade
e das rápidas prototipagens. Esse estudo sugere que a abordagem participativa é
mais efetiva do que a especializada para fomentar autonomia e processos de
inovação social em grupos produtivos de artesanato de baixa renda.
Apesar de a cocriação permitir aos usuários participarem do processo, isso não
os coloca no papel do designer, que deve ser definido e explorado durante o processo.
Os papeis do designer não são fixos, mas mudam conforme as necessidades da
equipe formada e suas competências (RAIJMAKERS; THOMPSON; PERIK, 2012).
4.2.1 Os papeis do designer em práticas participativas
A atividade projetual democratiza-se; porém, o designer continua a
desempenhar um papel fundamental para a prática projetual do futuro. Designers têm
habilidades relevantes em níveis maiores de escopo e complexidade. Na presença de
um grande volume de informação e atores envolvidos, "[...] muitos designers são bons
em pensamento visual, conduzir processos criativos, encontrar informação que falta,
e em tomar decisões necessárias na ausência de informações completas"
(SANDERS; STAPPERS, 2008).
De fato, ampliam-se as competências exigidas de designers que trabalham em
processos colaborativos de projeto. Dessa forma, o conhecimento especializado
(baseado em habilidades técnicas), foco do ensino tradicional de design, não é
suficiente para responder a tais necessidades. É preciso formar o designer como um
generalista, além de especialista. Isso significa combinar conhecimento específico em
design com conhecimento mais amplo oriundo de outras disciplinas, pois cada
disciplina traz seu próprio conhecimento que pode ser usado no projeto
(RAIJMAKERS; THOMPSON; PERIK, 2012).
Ao trabalhar com diversas áreas, um dos desafios do designer é valorizar as
expertises dos participantes de forma que estes colaborem para o projeto. Portanto, o
designer também desempenha o papel de incluir o conhecimento das pessoas no
projeto, permitindo, assim, que elas possam dar a melhor contribuição possível. Além
57
disso, deve-se valorizar cada contribuição, sendo interessante documentá-las
(CRUICKSHANK; COUPE; HENNESSY, 2013). Pode-se dizer, portanto, que esse
papel desempenhado opera uma espécie de gestão do conhecimento para o projeto.
Além de contribuir com o próprio conhecimento, o designer deve coletar e refinar as
ideias dos outros participantes.
Além da gestão do conhecimento, Cruickshank, Coupe e Hennessy (2013)
identificaram, no caso Beyond the Castle, a necessidade de um dos designers da
equipe operar como uma espécie de gestor do processo de codesign. Suas tarefas,
no caso mencionado, foram focar na organização do processo, mapear a visão dos
outros designers para alinhá-las ao longo do projeto, definir os objetivos gerais e,
quando necessário, configurar as atividades do processo. Em suma, coube a ele a
avaliação constante ao longo do projeto e a necessária competência (ou sensibilidade)
de saber contribuir ou desafiar pressupostos no momento certo.
Um papel importante e – já amplamente mencionado – é o de mediador ou
facilitador. Sanders e Stappers (2008) referem-se ao designer no papel de facilitador
desenvolvendo e adaptando ferramentas projetuais que facilitam a expressão criativa
dos participantes e ajudando a interpretar dados, visualizá-los e dar forma às ideias.
Somando-se a isso, o papel de facilitação do designer também pode compreender
uma habilidade de comunicação que instiga e inicia “conversas empáticas” e
conexões entre os atores envolvidos. (RAIJMAKERS; THOMPSON; PERIK, 2012).
Em suma, os principais papeis identificados na atuação de designers em
processos colaborativos são: gestão do conhecimento, visualização, organização e
condução do processo, representação de ideias e facilitação. Com tal diversidade de
papeis, é possível inferir que a atuação dos alunos em práticas extensionistas com
abordagens participativas de design, mais do que naquelas de modelo mental
especialista, reforça o eixo pedagógico estudante-professor-comunidade (FÓRUM...,
2012) ao ampliar as possibilidades de aprendizagem. Na medida em que os
estudantes assumem papeis de liderança e mediação, é demandado que suas
competências projetuais sejam combinadas à complexidade das relações sociais e
comunicacionais necessárias para que a participação aconteça.
58
4.3 DIRETRIZES DA REVISÃO TEÓRICA
Utilizando como substrato os valores extensionistas em abordagens de design
identificados neste capítulo, são propostas diretrizes para análise de práticas
extensionistas de design, apresentadas e descritas no quadro 5.
Essa diretriz permite compreender como o design pode se colocar em relação
à prática projetual na extensão universitária, ou seja, quais as abordagens que devem
ser priorizadas, e qual a relação dessa prática com os valores da extensão
universitária.
Quadro 5 – Diretrizes para o design na extensão
3) DIRETRIZES PARA A PRÁTICA EXTENSIONISTA NO DESIGN
Esta categoria apresenta diretrizes para abordagens de design mais alinhadas ao contexto da extensão.
Em primeiro lugar, verifica objetivos de design social nos projetos extensionistas, obviamente em razão
da relação com a solução de problemas sociais inerente a essa abordagem. O segundo tópico de
investigação é o design centrado no humano, que busca entender, em primeiro lugar, as necessidades
das pessoas e a forma como experienciam e interpretam os artefatos, ultrapassando o design centrado
no objeto e suas características funcionais e técnicas (KRIPPENDORFF, 2000). Por fim, o último tópico
identifica práticas participativas de projeto, pois como visto em Thiollent (2003) e observado pelo
FORPROEX (FÓRUM..., 2012), as metodologias participativas devem ser priorizadas sempre que
possível na prática extensionista. Equivalências a essas metodologias, no campo do design, podem ser
verificadas no design participativo e no codesign, que inserem o usuário como sujeito ativo em alguma
parte ou durante todo o processo.
O que Por que Como
3.1) Design Social Buscar melhorias sociais e democráticas, como aumento da participação e da autonomia das populações menos favorecidas. Visão crítica do contexto social. Buscar práticas emancipatórias e inclusivas e considerar questões de sustentabilidade.
Priorizar o solucionamento de problemas sociais. Construir capacidade, não dependência, dando conhecimento projetual para que a própria comunidade consiga resolver seus problemas. Empregar práticas participativas. Atender demandas a partir de ONGs e outras organizações sociais. Promover discussões sobre questões sociais.
3.2) Design Centrado no Humano
Colocar as pessoas no centro do projeto, e não os objetos ou mesmo a solução. Projetar pelas reais necessidades das
Buscar entender as pessoas e o contexto em que vivem. Colocar-se no lugar do outro, construir empatia. Ouvir histórias. Compartilhar ideias e soluções em busca de
59
pessoas e compartilhar as soluções.
feedbacks.
3.3) Práticas participativas de projeto
Além de socializar o conhecimento, é preciso construí-lo em conjunto com a comunidade. Considerar o conhecimento das pessoas da comunidade nos projetos. Construir espaços comunicativos. Motivar a colaboração e construir visões e cenários compartilhados.
Metodologias participativas devem ser priorizadas sempre que possível. Empoderar comunidades com ferramentas de projeto, incluí-los nos processos de ideação. Promover oficinas de trabalho em conjunto e construir ferramentas para auxiliar na materialização do conhecimento dos participantes.
Fonte: elaborada pela autora.
60
5 O ESTUDO QUALITATIVO
Desenvolvido o referencial teórico e o quadro de diretrizes, apresenta-se o
estudo qualitativo, que investiga um projeto extensionista de design. Inicia-se
retomando brevemente a unidade de análise. Esta é posteriormente apresentada de
acordo com as falas e os documentos acessados. Também se descreve como foi a
condução das entrevistas, relatam-se os achados das entrevistas organizados
segundo as categorias propostas e, por fim, apresentam-se observações sobre o
emprego do quadro de análise.
5.1 DELIMITAÇÃO DA UNIDADE DE ANÁLISE
Dentre os projetos levantados por um mapeamento preliminar, escolheu-se o
projeto Design Social Aplicado: UniRitter & FGBS, do Centro Universitário Ritter dos
Reis (Uniritter) para investigação aprofundada.
O critério de seleção da unidade de análise é justificado principalmente pela
amostragem de conveniência (FLICK, 2009), que prioriza a facilidade de acesso e a
estratégia de menor esforço, no caso de limite de tempo e de recursos. No entanto,
esse projeto também se mostrou representativo da atuação do design na extensão
quando foi feito o levantamento documental preliminar. Verificou-se que, em relação
aos demais projetos, teve maior quantidade de publicações mapeadas a partir de
eventos de extensão no ano de 2014, bem como considerou-se um projeto já
consolidado, visto que possui mais de dois anos de existência.
O projeto DSA é apresentado com detalhes na seção 6.3.1, no relato do estudo,
logo após a apresentação dos procedimentos de coleta e organização dos dados.
5.2 COLETA, ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
Conforme explicitado na metodologia da pesquisa, a coleta de dados deu-se
principalmente por meio de entrevistas semiestruturadas com três grupos:
professores, estudantes e comunidade (chamados de participantes). Foram
61
considerados membros do grupo participantes todos de fora da universidade que
tiveram alguma participação no projeto.
Para aumentar o grau de anonimato dos entrevistados, empregou-se apenas o
gênero masculino, comumente utilizado em generalizações, no relato do estudo.
As entrevistas aconteceram presencialmente e por meios eletrônicos, via
conversa de áudio pelo aplicativo WhatsApp, de forma a se adequarem à
disponibilidade e preferência dos entrevistados. Também houve uma pesquisa
documental para complementar as informações coletadas.
Todos os professores e estudantes do projeto DSA haviam participado pelo
menos no último semestre (2015/2) e participam de um grupo de discussões privado
na rede social Facebook. Três estudantes entrevistados tem dois anos de participação
no projeto. Um dos professores foi o idealizador do projeto, que iniciou no ano de
2013, e o outro entrou um ano depois, e o projeto conta somente com esses dois
professores no momento, apenas com participações eventuais de outros professores.
Os professores foram entrevistados presencialmente e os encontros tiveram duração
de cerca de 60 minutos.
Quanto aos participantes da comunidade, dificuldades de acesso por diversas
razões limitaram as entrevistas para um número reduzido de falantes. Além disso, os
participantes entrevistados podem ser considerados intermediários entre a equipe de
design e a comunidade diretamente afetada pelas ações de extensão, pois são
funcionários dos Bancos Sociais, instituição parceira do projeto. No entanto, um ponto
positivo é o maior contato com os integrantes do DSA em relação a outros envolvidos.
A seguir, apresenta-se o número de entrevistados e os meios utilizados para a
realização da entrevista:
Quadro 6 – Especificação das entrevistas
Design Social Aplicado
GRUPO NÚMERO DE ENTREVISTADOS
MEIO
62
Professores 2 presencial (2)
Estudantes 7 presencial (2)
WhatsApp (5)
Participantes (comunidade)
2 presencial (2)
Total de entrevistados: 11
Fonte: elaborada pela autora.
Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra pela
pesquisadora. Contudo, como observado por Gibbs (2009), a transcrição por si só é
uma mudança de meios envolvendo a transformação de dados (de conteúdo de áudio
para conteúdo escrito) que pode se dar de várias maneiras; portanto, faz-se
necessário definir a forma mais adequada para cada estudo em particular. Assim, para
facilitar a leitura, optou-se por corrigir abreviações e suprimir cacoetes verbais
contidos na fala, como por exemplo "né", "entende?", "assim", "então", "hum", desde
que sua supressão não comprometesse o sentido da frase.
Após a transcrição das falas, iniciou-se a sua organização e interpretação no
quadro de diretrizes proposto com a construção do referencial teórico. Foi construída
a seguinte matriz para organizar as falas nas dimensões de diretrizes (Figura 6):
63
Figura 6 – Modelo de matriz de organização
Fonte: elaborada pela autora.
Durante a leitura e organização, houve um esforço interpretativo para que todo
o conteúdo das entrevistas fosse posicionado dentro de algum dos quadros. Após a
interpretação e categorização das falas, procedeu-se a síntese do conteúdo através
de frases curtas explicativas para as citações, mantendo o mesmo modelo de
organização da matriz anterior. Ainda após esse procedimento, as falas abordando o
mesmo assunto dentro de cada subcategoria foram justapostas para dar início ao
relato.
5.3 RELATO DO ESTUDO QUALITATIVO
Apresenta-se o relato do estudo qualitativo e seus comentários conforme as
diretrizes de extensão determinadas no referencial teórico (quadros 3, 4 e 5).
5.3.1 O Projeto Design Social Aplicado
O projeto Design Social Aplicado: UniRitter & FGBS é viabilizado através de
uma parceria firmada desde 2011 entre a UniRitter e a Fundação Gaúcha dos Bancos
64
Sociais (FGBS). A FGBS é uma iniciativa do Conselho de Responsabilidade Social e
Cidadania da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (FIERGS) para efetivar
ações de responsabilidade social na indústria gaúcha. O projeto dos Bancos Sociais
se propõe a transformar o desperdício em benefício social com a oferta de excedentes
industriais e de cursos de capacitação e treinamento a comunidades carentes.
Também busca inserir técnicas de Gestão Empresarial no terceiro setor.
Criada em dezembro de 2003, a FGBS afirma em seu site atender
mensalmente 380 instituições do terceiro setor. O projeto conta com 14 Bancos:
Banco de Alimentos, Banco de Computadores, Banco de Gestão e Sustentabilidade,
Banco de Livros, Banco de Órgãos e Transplantes, Banco de Materiais de Construção,
Banco de Medicamentos, Banco de Mobiliários, Banco de Projetos Comunitários,
Banco de Refeições Coletivas, Banco de Resíduos, Banco de Tecido Humano, Banco
de Vestuários e Banco de Voluntários. Os Bancos recebem excedentes das indústrias,
que são reformados ou utilizados em novos produtos e distribuídos a instituições
assistenciais, creches e escolas de comunidades carentes. O projeto dos Bancos
Sociais fica em um complexo de 10.000 m2. Alguns Bancos, como o Banco de Livros
e o Banco de Mobiliários, ocupam depósitos que chegam a 700 m2.
O curso de Design da UniRitter tem parceria com a FGBS desde 2011, com
dois outros projetos de extensão desenvolvidos nos dois anos anteriores ao projeto
Design Social Aplicado (DSA), o qual teve início em 2013.
A proposta do DSA é projetar espaços de leitura utilizando materiais totalmente
reaproveitados oriundos dos Bancos Sociais para instituições carentes como creches,
postos de saúde e presídios. As solicitações para os espaços de leitura vêm do Banco
de Livros, que dispõe de livros em bom estado cujas edições foram atualizadas e por
isso são doados pelas editoras. Os livros são selecionados pelo perfil do público a ser
atendido. A equipe do DSA também utiliza materiais dos demais Bancos,
principalmente do Banco de Mobiliários, do Banco de Materiais de Construção, do
Banco de Vestuários e do Banco de Computadores para projetar os espaços.
O DSA atualmente conta com 8 bolsistas e outros alunos voluntários, além de
dois professores permanentes. A FIERGS disponibilizou uma sala para a equipe ao
lado do Banco de Mobiliários, e a instituição tem convênio com táxis que levam os
65
estudantes até o local. A equipe trabalha na sala duas vezes por semana e também
faz visitas e imersões nos locais atendidos.
Como visto na análise documental, o projeto DSA justifica-se com a afirmação
da relevância das contribuições do design no desenvolvimento de soluções alinhadas
às necessidades dos Bancos e também das comunidades carentes atendidas.
Menciona o design para excelência, inovação e sustentabilidade. Seus principais
objetivos são: fortalecer a parceria entre UniRitter e FGBS através do design aplicado
à inovação, sustentabilidade e responsabilidade social para que se promova a
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e o desenvolvimento social;
humanizar ambientes de convivência para melhorar a qualidade de vida das pessoas
atendidas nas instituições parceiras dos Bancos Sociais; realizar imersões na FGBS
para identificar oportunidades de atuação; pesquisar sobre processos e novas
tecnologias fabris para o desenvolvimento de produtos; realizar visitas às instituições
para ampliar a percepção da equipe quanto as necessidades apontadas; buscar
soluções integradas com materiais e processos dos Bancos; produzir, testar e discutir
protótipos de artefatos projetados; acompanhar e documentar o uso dos artefatos
projetados.
Conforme o documento do projeto submetido à Pró-Reitoria de Extensão, o
método aplicado nos projetos consiste em: (a) entendimento do usuário e do ambiente
(entrevistas, observações, pesquisa desk, registros fotográficos, etc.), (b) definição de
objetivos, justificativa e cronograma (o que, como, por que, para quem, quando), (c)
pesquisa de referências, (d) suporte teórico, (e) definição de requisitos (recursos,
antropometria, processos, materiais, custos, restrições, sustentabilidade etc.), (f)
geração de alternativas (moodboards, brainstormings, protótipos), (g) definição,
detalhamento e execução. Nesse documento não consta nenhuma referência teórica.
Os estudantes entrevistados também não relatam contato com teorias, e gostam do
projeto por ser majoritariamente prático.
Na entrevista com o Professor A, contudo, foram mencionadas duas
referências principais como ponto de partida para a criação do método do DSA. Uma
da área da engenharia e a outra do design, mais voltada à abordagem de design
centrado no usuário. O Professor A informa ter utilizado o Toolkit HCD da IDEO e
66
posteriormente adaptado para um método próprio que melhor contempla as
necessidades específicas do projeto.
Considerando o contexto do projeto e o que foi informado nas entrevistas,
foram identificadas as principais instituições que atuam no DSA (Figura 7):
Figura 7 – Mapa de atores do DSA
Fonte: elaborada pela autora.
Observa-se a atuação de quatro cursos da Uniritter, assim como a participação
mais intensa de dois Bancos da FIERGS que, por sua vez, é a ponte entre as
instituições e a universidade.
Com o conteúdo das entrevistas, foi possível mapear a dinâmica dos projetos
protagonizados pelo DSA em parceria com os Bancos Sociais. Foram identificadas
uma etapa de solicitação e seis etapas de trabalho: visita, desenvolvimento do projeto,
aprovação, divisão de tarefas, montagem e inauguração, como demonstrado na
Figura 8.
O DSA mantém uma pasta compartilhada no Google Drive com acesso liberado
para todos os integrantes. Essa pasta contém todos os projetos desenvolvidos e
permite que um mesmo conteúdo, até mesmo um arquivo de texto ou apresentação
de slides, seja acessado em qualquer lugar por diversas pessoas ao mesmo tempo.
Os professores compartilharam essa pasta com a autora da pesquisa para fins de
análise documental. Nesse material, constam mais de 20 projetos realizados, entre
eles duas creches, cinco postos de saúde e cinco penitenciárias. Os projetos
costumam durar de um a dois meses e geralmente mais de um projeto acontece ao
67
mesmo tempo. As Figuras 9 e 10 apresentam registros fotográficos de alguns desses
projetos.
Figura 8 – Fluxo do projeto
Fonte: elaborada pela autora.
68
Figura 9 – Registros de projetos do DSA
Fonte: página do projeto no Facebook (Disponível em: <https://www.facebook.com/DSA-UniRitter-466455216825739/>)
Um dos estudantes (Aluno B) é responsável pela comunicação do projeto. Ele
alimenta a fanpage no Facebook, edita e grava vídeos e cria peças gráficas. É notável
na comunicação compartilhada na fanpage do DSA um chamado para a ação
manifestado em frases como: "Execute suas ideias", "Acreditar e fazer", "Faça!", "Faça
com amor". O chamado para a leitura, o conhecimento e a doação de livros também
aparece com frequência. Apresentam-se abaixo algumas imagens compartilhadas.
69
Figura 10 – Comunicação do DSA em rede social
Fonte: página do projeto no Facebook (Disponível em: <https://www.facebook.com/DSA-UniRitter-466455216825739/>)
As fotos utilizadas para a criação das artes são todas dos projetos executados
pela equipe. A proposta de "Plante essa ideia", por exemplo, veio da horta de cano de
PVC projetada para o posto de saúde UPA Lomba do Pinheiro.
A seguir apresenta-se o relato do estudo baseado na interpretação das
entrevistas pelo quadro de diretrizes proposto para a análise.
5.3.2 Quanto às diretrizes gerais para ação na extensão universitária
Uma das primeiras questões do instrumento de entrevistas se referia ao
conceito de extensão universitária. Com base nas reflexões de Thiollent (2003) em
70
relação ao desconhecimento de alunos e professores sobre extensão universitária,
desejou-se saber o que a extensão significava para os universitários participantes dos
projetos. Foi possível identificar esse desconhecimento especialmente da parte dos
alunos, o que deixou clara a ausência de discussões sobre o que significa um projeto
de extensão.
O Professor A relata ter aprendido durante sua vida acadêmica que a extensão
é mais do que a promoção de cursos, é uma troca, é "[...] o envolvimento da
universidade com a sociedade que de alguma forma houvesse uma interação, não só
uma entrega". O Professor B vê a extensão como o saber acadêmico posto em prática,
no mundo real, dando à comunidade acesso a um conhecimento que ficaria restrito
aos muros da universidade. Também vê como uma oportunidade de professores e
alunos envolvidos desenvolverem um conhecimento prático e uma consciência maior
da realidade e do espaço compartilhado em que vivem. Por fim, relatando sua
experiência extensionista no DSA, afirma:
A extensão dá um crescimento absurdo para uma universidade [...]. A gente cresceu muito como pessoa, como ser humano, com o próprio conhecimento acadêmico, de conhecer ser humano. E o aluno sai com uma visão de processo muito diferente, ele sai do papel, sai com uma carcaça mais dura de realidade [...]. A gente faz muita coisa pela extensão, porque a gente quer que a extensão cresça e atinja mais pessoas. É o que eu estou fazendo pela minha cidade, pelo meu espaço. O que a gente faz pelo nosso entorno, pelo entorno da universidade. [...]. Se a gente for pensar o que se poderia fazer, tudo é difícil, mas eu sempre digo para os meus alunos, nada é impossível. (Professor B)
Nessa fala, destaca-se também a questão das relações humanas como um
aprendizado que se soma ao conhecimento acadêmico formal posto em prática.
Quanto aos estudantes, nenhum tinha certeza sobre o conceito de extensão
universitária. Para 5 dos 7 alunos entrevistados do projeto DSA, a extensão é vista
como uma oportunidade de colocar em prática o que se aprende na sala de aula:
Não sei [...]. Mas acho que é tu poder colocar em prática aquilo que tu aprendeu, e aprender mais coisas além daquilo que tu já aprendeu e realmente desenvolver e de repente conseguir até buscar um caminho, um foco. Para mim o mais importante da extensão é isso. (Aluno D)
Outro estudante (Aluno E) também descreve a extensão como uma forma de
"humanizar o universitário" para as questões sociais vivenciadas ao conhecer a
realidade brasileira.
71
Fica evidente que não há uma introdução formal ao conceito. Provavelmente
os estudantes também tenham uma vaga ideia do funcionamento do chamado tripé
ensino, pesquisa e extensão. A imagem que a maioria tem da extensão como um
momento de colocar em prática conteúdos da graduação, também expressada por um
dos professores, reforça o caráter predominantemente prático do projeto, que também
pode ser notado na comunicação compartilhada na rede social Facebook.
5.3.2.1 Interação dialógica
O primeiro tópico observado quanto às diretrizes da extensão é a interação
dialógica, que trata dos processos de comunicação, de diálogo e de troca de
conhecimento. Busca-se compreender como acontecem as relações entre os
diferentes atores, como conduzem seus diálogos e questões e qual o nível de
interação entre eles.
O Professor A afirma que o DSA trabalha com engajamento social porque para
eles é importante entender se as pessoas valorizam o que está sendo feito, e, caso
engajadas em algum ponto do processo, se isso faz com que se vejam mais donas da
solução. Um ano depois, se possível, voltam aos espaços para ver como o projeto
está. Segundo o Professor B, voltaram a três projetos, e dois estavam intactos.
Todos os envolvidos acabam ajudando em algum momento, tanto os
profissionais dos Bancos Sociais, como os diretores e funcionários das instituições e
até os reais usuários dos espaços de leitura, mas essa ajuda (dos usuários) é restrita
ao início (visita de imersão) e ao final do projeto (montagem).
O primeiro que solicita o projeto é uma pessoa da comunidade atendida. Devido
ao grande número de demandas, o Banco de Livros precisa escolher quais instituições
serão atendidas pelo DSA. Para o Participante A, funcionário da FGBS que seleciona
os projetos atendidos pelo design, esses momentos são os de maior dificuldade, pois
gostaria que o DSA tivesse condições de atender a todos. Nas visitas, sempre vai
alguém dos Bancos Sociais junto com a equipe de design.
O Professor B chama a atenção para as diferenças de percepção entre o
administrativo, que geralmente é responsável por passar uma solicitação de projeto,
e as reais necessidades de quem realmente trabalha no espaço das instituições (no
72
caso do posto de saúde, por exemplo, os profissionais que ficam na recepção fazendo
o atendimento ao público): "Acho que eles nunca sentaram lá na recepção para saber
as reais necessidades daquele espaço. Às vezes nos pedem um espaço de leitura
infantil, mas quando vamos ver não tem crianças lá".
Observa-se que esse descompasso de percepção e comunicação torna a visita
de imersão ainda mais importante, pois é a única oportunidade que a equipe tem,
antes de propor soluções, de observar e conversar com quem realmente vive o dia a
dia nos espaços.
Nota-se também uma dificuldade de comunicar o projeto para quem trabalha
nos espaços, e isso acaba gerando mal-entendidos. O Professor B relembra
momentos em que os funcionários das instituições pensaram que o DSA resolveria
questões de infraestrutura, como instalação de ar-condicionado e toldos, ignorando o
trabalho feito unicamente com materiais reutilizados.
Porque geralmente as pessoas entendem mal o projeto social [...]. Então tem coisas que a gente fica bem chateado. E aí tu tens que chamar e dizer "olha, acho que tu podes ir até a Fundação, conhecer melhor o projeto". Porque às vezes as pessoas não entendem que tudo o que está ali foi alguém que descartou, que ia para o lixo." (Professor B)
Outra dificuldade com os funcionários das instituições é a compreensão de que
os livros doados para os espaços podem (e devem) ser levados. O Professor B
acredita que esse papel educativo seja da FGBS; no entanto, a equipe de design
eventualmente acaba se envolvendo nessa questão.
Uma proposta educativa de apresentação poderia ser acrescida ao projeto dos
ambientes com a finalidade de superar essas dificuldades de comunicação. Por
exemplo, um material gráfico informativo poderia ser feito pelos estudantes e entregue
na primeira visita ou, na falta de recursos de impressão, uma apresentação em meio
digital poderia ser feita e colocada à disposição das instituições. Ou ainda, um
alinhamento da fala de apresentação do projeto com os entrevistados poderia oferecer
alguma ajuda.
Uma falta de clareza sobre o papel do DSA na Fundação também é relatada,
pois muitas vezes os profissionais dos Bancos consideram os integrantes do DSA
como funcionários. Os professores afirmam se tratar de duas formas diferentes de
pensar, pois na Fundação pensa-se como indústria, chão de fábrica, diferente de
73
universidade. Com exceção desse detalhe da comunicação, criou-se, com o tempo,
uma relação de confiança entre as duas partes. Com isso, os integrantes do DSA
ganharam mais autonomia no projeto, embora muitos alunos entrevistados tenham
mencionado as dificuldades burocráticas inerentes aos processos da FGBS.
Há uma interação constante da equipe de design com os funcionários dos
Bancos Sociais, em especial do Banco de Livros e do Banco de Mobiliários, onde se
localiza a sala na qual os alunos trabalham duas vezes por semana. O Participante A
conta que a parceria com o DSA é diferente dos projetos anteriores com a participação
do Design da Uniritter, pois dessa vez eles precisavam de uma atuação mais prática,
que trabalhasse diretamente com as instituições atendidas pela FGBS, o que não
acontecia anteriormente. Dessa forma, alguns espaços de doação antes padronizados
hoje têm um complemento de design para projetar os ambientes, com a pretensão de
tornar mais agradável a experiência das pessoas que convivem no local.
Junto ao Participante A, acontecem diversas discussões sobre o conceito de
projeto e os estudantes costumam chamá-lo para mostrar diagnósticos e avaliações
da visita de entendimento, compartilhar ideias e pedir sugestões. O participante afirma
que ele, o Participante B e a equipe têm discussões produtivas sobre os projetos e
que muitas vezes o conceito acaba se reformulando devido às conversas conjuntas.
Normalmente as coisas caminham juntas. À medida que eles vão fazendo eles vão nos mostrando, e a gente já vai remodelando, a coisa caminha meio em paralelo. Então tudo isso a gente acaba fazendo essa troca juntos. Eles sugerem coisas que daqui a pouco eu digo assim “acho que isso não pode ser assim” [...] “tem que cuidar que a cor tem que ser diferente para o bebê, porque o bebê só enxerga algumas cores, a criança maior já enxerga outras”. Então, por exemplo, essa parte pedagógica eles não têm, e é onde a gente entra. (Participante A)
O referido participante afirma ser esse momento de troca um dos que mais
aprecia no projeto. Também menciona o papel positivo das inaugurações, pois é
importante que se reconheça o trabalho dos alunos, e esse reconhecimento é
significativo para todas as partes. Ele também gosta de ver como os alunos são
empolgados pelos projetos a ponto de continuarem voluntariamente e valoriza a
amizade criada com o grupo.
Todos os alunos consideram a troca com os profissionais da FGBS positiva e
essencial. O Aluno D qualifica a relação como uma parceria em que os funcionários
74
dos Bancos realmente se envolvem no projeto e se esforçam para fazer o melhor
possível. Além do Participante A, há uma troca intensa com o Participante B,
funcionário do Banco de Mobiliário responsável por construir o mobiliário dos projetos.
Os alunos fazem o desenho e mostram para ele, que não só encabeça a produção,
mas também explica sobre o necessário para construir e ensina os estudantes a
utilizarem ferramentas de marcenaria. O Professor B afirma ainda que o Participante
B ajuda a agilizar os processos dos projetos.
Ao falar sobre sua relação com a equipe do DSA, o Participante B menciona
ter sido "insuportável" um projeto anterior de design em que não havia participação e
os projetos apenas beneficiavam os interesses da equipe de design, e não eram
destinados a ajudar uma comunidade. No caso do DSA, considera que a equipe está
ajudando nas demandas que antes executavam sozinhos e por isso hoje conseguem
entregar projetos mais completos. Atenta para os atritos entre projetistas e executores
e ressalta a importância da aprendizagem pela execução dos projetos, pois lembra de
situações nas quais os alunos insistiram em soluções cuja realização não era
tecnicamente possível, devendo ser adaptadas. Mencionou também as diferenças
entre linguagens de projeto (desenhos técnicos, especificações de medidas) que
vivenciou com a equipe. Afirma ter aprendido a dialogar e trabalhar em equipe por
conta da convivência mais próxima com grupo do DSA.
Ao mesmo tempo em que os profissionais aprendem sobre um projeto de
design, os estudantes aprendem a colocar seus projetos em prática e a utilizar as
ferramentas de marcenaria disponíveis no pavilhão do Banco de Mobiliário.
Então além de todo o ferramental de design que eles (estudantes) têm no sentido de ferramentas de projeto, eles usam equipamentos, eles mesmos vão nas oficinas aqui da Ritter e lá dos Bancos Sociais. Eles têm acesso, eles podem construir, pintar, e eles trabalham junto com os profissionais, e isso é uma relação positiva, de ganho para todos os lados. (Professor A)
Os estudantes mencionaram dois momentos de contato com usuários que
foram marcantes. Um deles foi no projeto de uma creche, onde as crianças se
mostravam muito animadas com o novo espaço e no dia da inauguração fizeram
cartões e cantaram músicas de agradecimento. O Aluno C compartilha a satisfação
pelo projeto: "A gente chorou um monte nessa inauguração, foi demais, a gente nunca
vai esquecer dessa inauguração. Eu tenho fotos até. O único projeto que eu tenho
75
fotos é esse, porque realmente foi muito legal". Os presídios foram outros locais que
proporcionaram um contato especialmente marcante. Os alunos contam que na
penitenciária tiveram a oportunidade de conversar com alguns apenados que
auxiliaram no dia da montagem e se mostraram orgulhosos e agradecidos de terem
participado do projeto. Os curtos diálogos que tiveram com os detentos foram
suficientes para gerar reflexão nos estudantes, como observado na categoria de
ensino-aprendizagem.
O Aluno G afirma que os momentos mais marcantes acontecem quando
percebem que estão ajudando alguém, que todo o esforço para projetar e fazer o
melhor possível valeu a pena, pois as pessoas estão valorizando o que foi criado e
mostrando que isso fez diferença para elas. Sobre isso, o Aluno E afirma: "Eu já estou
há bastante tempo no DSA e teve vários projetos que foram lindos [...] principalmente
nos espaços em que as pessoas realmente queriam o projeto, tu via a felicidade delas
em receber o projeto". Uma motivação para fazer o melhor indo além do esforço
mínimo necessário para realizar os projetos permeia a fala dos alunos entrevistados
com expressões sobre "fazer o melhor possível" e "tornar o projeto cada vez melhor".
Verificam-se interações consideráveis, havendo uma relação de igualdade e de
trocas entre os integrantes da universidade e da instituição parceira. As dificuldades
de comunicação indicam alguma fragilidade nos diálogos tanto entre DSA e FGBS
(creditada a diferenças na forma de pensar de universidade e de indústria) como
também entre DSA e instituições. A relação entre as pessoas que trabalham juntas
mostra-se interativa, em especial entre os alunos, professores e profissionais dos
Bancos Sociais. Por fim, o contato com as pessoas beneficiadas pelos projetos gera
momentos marcantes de feedback, não necessariamente de troca, que parecem estar
entre os acontecimentos mais importantes para a motivação intrínseca dos
estudantes.
5.3.2.2 Interdisciplinaridade e interprofissionalidade
O tópico "interdisciplinaridade e interprofissionalidade" pretende identificar
iniciativas que promovam a interdisciplinaridade e as alianças interprofissionais e
interorganizacionais, dessa forma enriquecendo as ações extensionistas.
Segundo as informações das entrevistas, o projeto DSA atualmente conta com
76
estudantes dos três bacharelados em design (Design de Produto, Design Gráfico e
Design de Moda), com estudantes da Arquitetura, e já teve interação com estudantes
de Jornalismo na parte de edição de conteúdo e vídeo. Os professores relatam planos
de envolver outros cursos da universidade e incluir mais professores.
O Professor B conta que as trocas com a participação de alunos da arquitetura
amadureceram o projeto. Segundo ele, é preciso oportunizar uma "mistura" cada vez
maior entre os cursos.
Eu acho o campo de design muito amplo. Qualquer um pode trabalhar no design, o design tem uma abertura muito grande para novas possibilidades. Quanto mais o envolvimento com disciplinas que tu não tens domínio, parece que melhor o cara fica. É impressionante. (Professor B)
A interação entre os três cursos (Moda, Produto e Gráfico) funciona muito bem.
Trata-se de uma relação interdisciplinar que promove soluções mais criativas do que
se os estudantes trabalhassem somente com os colegas de curso. Conforme o
Professor B, "da interação entre os três saem coisas bárbaras". Os graduandos do
design também aprendem com os alunos da arquitetura (montar apresentações, fazer
plantas e medições), e vice-versa (experimentação e prototipagem).
Por ser um projeto de extensão que envolve vários cursos, eu aprendi muita coisa do produto, do gráfico, até do jornalismo que eu não aprenderia, tipo a editar um vídeo. Na moda a gente não aprende esse tipo de coisa. (Aluno B)
O Aluno C relata que a equipe trabalha muito bem. Apesar de serem de áreas
diferentes, compartilham as tarefas igualmente. O Aluno D afirma que há uma divisão
de tarefas conforme as áreas, mas também compartilham os papeis. A parte de
conceituação é sempre no grande grupo. Vê como um ponto positivo da extensão a
oportunidade de trabalhar com outras áreas e aprender como podem acrescentar ao
próprio trabalho.
Isso é uma coisa que eu acho da extensão, que eu notei que foi muito legal é poder trabalhar com outras áreas. Uma coisa que acontece na arquitetura é que tu te forma e vai trabalhar só com arquitetos. E como faz falta trabalhar com designers junto, como o conceito melhorava, foi bem bom. (Aluno D)
Para os professores, uma das maiores contribuições do design para a extensão
é justamente sua natureza interdisciplinar, a capacidade do design de inovar e agregar
77
diferentes pessoas e disciplinas nos projetos.
Quanto à interprofissionalidade e às alianças com organizações, já foi
mencionado que o projeto DSA é uma parceria entre a Uniritter e a FGBS. Apesar de
o trabalho do DSA ser exclusivamente dedicado às demandas dos Bancos Sociais,
estes têm uma série de parcerias institucionais das quais a equipe de design se
beneficia.
Por exemplo, o Participante A conta que o Banco de Livros construiu uma
parceria com a Secretaria de Segurança Pública do Estado para que nenhum presídio
seja inaugurado no Estado sem ter um espaço já na planta destinado para leitura. Ele
considera essa uma das maiores conquistas alcançadas. Também existe hoje uma
legislação de remissão de pena pela leitura que se originou no RS e eles estão
fazendo o projeto piloto em cinco presídios da região metropolitana. Hoje o Banco de
Livros também atende 120 postos de saúde e tem um convênio com a Secretaria de
Saúde para que todos os postos de saúde de Porto Alegre tenham espaços de leitura
para usufruto da população durante as longas esperas por atendimento.
Além desses projetos, o Banco de Livros já conquistou diversas premiações,
construiu campanhas de arrecadação de livros e conquistou um espaço na Feira do
Livro, tudo isso sem nenhum recurso financeiro. O DSA ajuda na ambientação do
stand na Feira. Em parceria com o DSA, também estão finalizando um projeto que
colocará livros na Rodoviária à disposição de quem vai viajar.
[...] a gente parte da premissa que sonho que é sonhado em parcerias acaba virando realidade. Acho que é bem isso, esse projeto do Design, é um sonho que buscou parceiros e que encontrou as pessoas certas para desenvolver esse sonho e tornar ele realidade. (Participante A)
Os estudantes de forma geral reconhecem a importância da parceria para o
projeto DSA. O Aluno A afirma que a relação com os Bancos Sociais é "bem
essencial". A demanda é passada pelo Banco de Livros, trabalham com o Banco de
Mobiliário para construir as estruturas dos ambientes, onde também têm uma sala no
pavilhão, e o Banco de Alimentos fornece o almoço.
Além de envolver mais cursos, os professores pretendem ampliar o projeto para
um caminho de geração de renda e de cooperativas com uma ONG que fica próxima
da universidade. Acreditam que essa frente de trabalho conseguiria acrescentar
78
continuidade e impacto maiores às ações. Também pensam em envolver outras
instituições para o fortalecimento do projeto.
Percebe-se que os alunos têm uma troca frutífera com outras áreas graças à
mistura de quatro cursos da universidade, além do ganho na qualidade dos projetos.
Os professores mencionam o design como uma disciplina naturalmente aberta à
interdisciplinaridade e reconhecem que as soluções são mais criativas quando
diferentes cursos trabalham juntos. As alianças interorganizacionais, por sua vez,
proporcionam o contato dos estudantes e professores com questões da realidade do
país e oportunizam que se trabalhe em projetos para melhorar a vida na cidade em
que vivem.
5.3.2.3 Relação entre ensino, pesquisa e extensão
O tópico "relação entre ensino, pesquisa e extensão" pretende identificar de
que forma os projetos de extensão vinculam suas ações aos processos de formação
de pessoas (ensino) e de geração de conhecimento (pesquisa).
Segundo as falas de professores e alunos, as atividades da extensão utilizam
e desenvolvem competências trabalhadas no eixo ensino. Foi constatado o uso de
ferramentas e técnicas de projeto como brainstorming, pesquisa de referências,
sketches, entrevistas e observações. Para materializar as ideias, os alunos também
fazem uso de softwares de desenvolvimento específicos do design e aprendem
técnicas de prototipagem, como marcenaria. Há uma ênfase na execução e na relação
com o cliente final (instituições), o que complementa o ensino de projeto da sala de
aula, naturalmente mais voltado ao processo do que ao resultado.
O Professor A afirma utilizar temas dos projetos do DSA e do projeto paralelo
de pesquisa nas disciplinas que ministra em sala de aula, por vezes incluindo a classe
no desenvolvimento de soluções como a criação de algum produto, por exemplo um
pufe que foi criado para uma penitenciária.
A maioria das disciplinas ou abarcam temas das situações muito semelhantes das que são executadas nos projetos extensionistas e de pesquisa ou são utilizadas nos projetos. (Professor A)
Os estudantes das disciplinas já tiveram a oportunidade de visitar esses locais
e de ver os produtos que desenvolveram sendo realmente produzidos e inseridos em
79
um ambiente. Ele também chama estudantes dos projetos para contarem experiências
em sala de aula.
Quanto ao eixo pesquisa, todos fazem relatórios e escrevem artigos relatando
as experiências principalmente para Salões de Extensão e para a SEPesq (Semana
de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação da Uniritter). Além de artigos, escrevem
relatórios e participam de prêmios.
O Professor A desenvolve um projeto de pesquisa em paralelo, seguindo a
mesma linha social do DSA. São separados, mas em alguns momentos os objetivos
podem se unir. Da mesma forma, há um esforço de incluir esse projeto nas disciplinas
pois, segundo ele, isso traz motivação para os alunos:
Muitos alunos que estão no projeto de pesquisa vão nas disciplinas e mostram como estão desenvolvendo seus trabalhos, as ferramentas que estão usando, as tecnologias [...]. Então eles já enxergam que aquilo ali é útil e que eles têm que correr um pouco atrás. E isso tem funcionado muito bem. Eles compram coisas, eles vão atrás, acabam se motivando muito mais.
Um dos estudantes (Aluno A) conta ter conhecido e se interessado pelo projeto
em uma apresentação na SEPesq. A participação nessa semana de pesquisa do
último ano foi divulgada na página do DSA no Facebook.
De acordo com os relatos, o projeto de extensão promove uma formação
prática e se utiliza do conhecimento ensinado nas disciplinas. Existe também um
esforço em levar para a sala de aula os projetos desenvolvidos na extensão e na
pesquisa. O contato direto com o usuário e a oportunidade de ver as ideias aplicadas
no mundo real é um fator motivador para os estudantes.
5.3.3 Quanto ao processo de ensino-aprendizagem na extensão
Considerando-se a extensão um espaço de protagonismo no processo de
aprendizagem que amplia as formas de aquisição de conhecimento e abre espaço
para outras maneiras de construir competências, procura-se investigar como acontece
o processo de ensino-aprendizagem no DSA com relação aos tópicos propostos pelo
quadro de análise.
80
5.3.3.1 Estratégias de ensino
Em razão do aumento da complexidade das relações e do fluxo de
informações, não faz sentido limitar as atividades de ensino a memorização e modelos
expositivos. A aprendizagem não deve ser apenas centrada no conteúdo, mas
também baseada em um processo coletivo de construção de competências e saberes
através de ações.
Em termos teóricos e metodológicos, os estudantes parecem se relacionar com
poucas referências. Percebe-se que o trabalho no projeto é muito prático, com
discussões sobre o andamento dos projetos e sobre a relação de equipe.
O método utilizado origina-se de um modelo proposto pelo Professor A. Com
base na abordagem de HCD e em processos da engenharia, criou-se um método
próprio, de acordo com as necessidades específicas no trabalho do DSA. Os
estudantes apropriaram-se completamente desse método, que é utilizado como
modelo para orientar o processo. O Professor A o descreve como um método "iterativo
e flexível", que proporciona um caminho para os estudantes com uma "visão holística"
do projeto, ao mesmo tempo em que fornece opções para a escolha das ferramentas
que acharem mais adequadas e possibilita iterar durante o processo.
Os estudantes utilizam ferramentas de imersão (entrevistas, medição e plantas
do espaço), de ideação (brainstorming), fazem pesquisa desk para conhecer melhor
o contexto, pesquisa de referências para inspiração e constroem um relatório que
contém desde o briefing até a solução para cada projeto. A equipe utiliza uma
apresentação padrão que fica na nuvem, pelo Google Drive, possibilitando um
conteúdo online que pode ser acessado por todos em qualquer lugar e construído em
conjunto em tempo real. Os estudantes criaram um modelo inicial de apresentação
com base no método, orientados pelos professores. Agora tornou-se um padrão
utilizado tanto para documentação do processo como também para apresentações
em semanas de pesquisa.
Um dos objetivos alcançados pelos professores foi o desenvolvimento da
autonomia dos estudantes durante os projetos. Tanto pela fala dos alunos quanto dos
docentes, fica claro o reconhecimento de uma evolução no trabalho do DSA, que
partiu de um modelo sustentado e evoluiu para um modelo orientado pelos
professores. Inicialmente, os professores envolviam-se da mesma forma que os
81
alunos em todas as fases dos projetos. Aos poucos, os estudantes foram se
apropriando do processo e assim desenvolveram autonomia na realização das
tarefas, ficando os professores na posição de orientadores, e não mais de executores.
Os professores fazem acompanhamento dos projetos, dando retorno em todas as
fases e, se necessário, retomando o caminho e o método com os estudantes.
Tem outro ponto que eu consegui trabalhar junto com eles que é eles assumirem os projetos como se fossem deles. Até tem uma palavrinha que eu uso que até foi um dos estudantes que falou sobre isso, que é ownership [...] Então muitas vezes eu saio, como eu fui viajar para apresentar, e os alunos continuam fazendo, continuam buscando resultados e eles têm um senso crítico de resultado do projeto muito dentro do real. (Professor A)
Professores e estudantes afirmam que a equipe atual adquiriu autonomia nos
projetos a ponto de os alunos serem somente orientados e desenvolverem tudo
sozinhos, desde a imersão do início até os momentos de inauguração.
[...] mas em projetos novos eles não necessariamente vão na visita, porque a gente tem total liberdade, a gente já conhece o projeto, então eles não precisam ir na visita. Mas eles vão uma vez por semana na Fundação para nos dar um suporte, ver o que a gente precisa, o que pode ser feito, nos dar alguma ideia, mas basicamente todo o projeto é feito por nós e o professor só vai para nos auxiliar mesmo. (Aluno B)
O sentimento de ownership (propriedade) mencionado pelo Professor A é
expressado na fala de muitos estudantes. É ressaltada a autonomia durante o projeto
e nas tomadas de decisão, vista como um ponto positivo pelos alunos. Essa relação
parece ter uma correlação com uma consciência expressa de união e trabalho em
equipe.
Há dois anos no projeto, o Aluno C afirma que a equipe conquistou a maior
autonomia no último ano e considera isso um acontecimento positivo. Antes disso, os
professores precisavam atuar ativamente nos projetos. Atualmente, os professores
oferecem apoio constante, mas são os alunos que tomam decisões e desenvolvem os
projetos. Sempre houve um incentivo dos professores para atitudes pró-ativas dos
estudantes.
O Aluno G conta que no início os professores praticamente faziam parte das
equipes e executavam o mesmo trabalho que os alunos, mas sempre deixando claro
que eles deveriam seguir adiante com o projeto e os professores deveriam ficar com
o papel de orientação e apoio. Agora que o grupo ganhou mais independência, os
82
professores costumam acompanhar os projetos pelo Google Drive através de uma
planilha de registro de atividades que é preenchida em todos os encontros.
Muitas vezes se trabalha com mais de um projeto ao mesmo tempo. Os grupos
responsáveis pelo desenvolvimento de cada projeto são organizados pelos próprios
alunos, mas os professores orientam para que procurem uma divisão que contemple
habilidades diferentes. Os professores pedem que as equipes tenham um líder
responsável por elas, mas o Aluno G afirma não gostar muito dessa abordagem,
prefere que todos sejam iguais no projeto. Relata que o grupo consegue trabalhar
melhor com os professores afastados do que quando estavam sempre junto.
O Aluno F coloca como um ponto positivo os professores prezarem pela
convivência tranquila da equipe, enfatizando sempre a importância de se ter prazer e
conviver bem no trabalho.
Essa é uma questão bem legal do DSA. Os professores prezam muito pela tranquilidade da equipe, para que todo mundo se dê bem. Então isso é uma coisa que eles sempre frisam, que é pro pessoal se manter sempre em paz um com o outro para não gerar conflito, porque o objetivo do DSA é exatamente o oposto, não é tornar aquilo uma coisa maçante e chata. (Aluno F)
O Professor B afirma que alunos com "perfil social" são priorizados na escolha
da equipe, pois eles devem estar dispostos a enfrentar limitações que os projetos
sociais impõem e lidar com situações precárias nas instituições atendidas. Acredita
que os alunos que buscam o DSA já têm esse perfil. De acordo com as entrevistas,
de fato, boa parte dos estudantes relatou ter tido interesse no projeto por conta do seu
viés social. Muitos tiveram alguma participação em trabalhos voluntários ou alguma
vontade de participar de trabalhos sociais. Ambos os professores também
compartilham um histórico em trabalhos voluntários e atuação em projetos sociais.
Contudo, chamou a atenção um estudante que entrou no projeto sem se
importar com o caráter social, o Aluno G, há dois anos no projeto. Relata seu interesse
inicial como apenas estar envolvido em algo, pois no momento não sabia bem o que
seguir. Ele afirma que a experiência no DSA tem ajudado na definição do seu caminho
profissional e que o design social hoje tem um peso importante nas escolhas projetuais
e na sua maneira de ver o mundo.
83
Visto isso, interpela-se até que ponto o critério do perfil social para a seleção
dos alunos deve ser considerado, já que o contato com questões sociais poderia
sensibilizar os mais indiferentes a essas questões, gerando consequências positivas.
Uma das regras do DSA é que os alunos só devem utilizar o que está disponível
nos Bancos, não podem comprar material. Para o Aluno D, isso é uma dificuldade,
mas faz parte do processo. É necessário adaptar os projetos de acordo com as
possibilidades de materiais disponíveis, então muitas vezes acabam acontecendo
mudanças na hora da execução.
Os profissionais dos Bancos Sociais entram junto no esforço de tornar os
projetos realidade da melhor forma possível. O Participante A mostra uma
preocupação em direcionar os estudantes para as atividades que sejam mais
adequadas para cada perfil. Conversam constantemente com os professores para que
consigam identificar o que cada um tem de melhor e direcioná-los da forma mais
adequada. O Participante B, profissional do Banco de Mobiliário, tacitamente utiliza
uma forma didática de ensinar os estudantes a partir de tentativa e erro. Tem a
sabedoria de deixá-los tentar construir uma solução, mesmo sabendo desde o início
que não dará certo.
Pela exploração deste tópico, reconhece-se uma proposta de ensino
predominantemente baseada na prática e na experimentação, o que é visto com um
destaque positivo pelos alunos. A restrição criada pelo trabalho com materiais
reaproveitados é útil para o pensamento criativo e para a improvisação. O processo
de desenvolvimento da autonomia é notório nos relatos e caminha ao lado do
sentimento de pertencimento. Finalmente, a ênfase no prazer e na tranquilidade do
trabalho em equipe se sobressai como uma estratégia consoante com valores de
convivência social e ao mesmo tempo interessante para o ensino das novas gerações,
que buscam o prazer em todas as esferas da vida.
5.3.3.2 Formação profissional
O ensino para formação profissional na extensão é oportuno para proporcionar
o contato dos estudantes com a realidade da profissão ao mesmo tempo em que
vivenciam o potencial social dos conhecimentos aprendidos na sala de aula. Esse
84
ambiente é propício para a construção de competências através da mobilização de
conhecimentos da graduação na resolução de problemas reais.
O Professor A comenta que os estudantes têm a oportunidade de colocar em
prática o que aprendem em sala de aula, e aprendem ainda mais com a experiência
dos professores e da comunidade. Além de praticarem com ferramentas de projeto,
os estudantes trabalham junto com profissionais das oficinas da Uniritter e também
dos Bancos Sociais onde aprendem a construir, pintar e utilizar equipamentos.
O mesmo professor afirma que cada lugar exige um projeto diferente, porque
eles trabalham focados na experiência. Isso também é afirmado pelo Aluno B quando
menciona que cada projeto é uma experiência diferente, e que isso enriquece a
aprendizagem de uma forma que a graduação não proporciona. De fato, a construção
de competências está mais presente no caso da diversidade de projetos, pois exige
mobilizar o mesmo conhecimento de diferentes formas.
Além do foco na experiência, a singularidade dos projetos também se dá pela
necessidade da reutilização e pelo trabalho com restrições, que demandam
criatividade. Conforme o Aluno E, o projeto exige que "se pense muito" do início ao
fim, porque precisam de criatividade para lidar com as restrições dos Bancos Sociais
e para entregar um "bom design". O Aluno F define como uma forma diferente de
projetar:
Na sala de aula a gente costuma projetar meio que o que vem à nossa cabeça, como uma atividade bem acadêmica mesmo, e não tem limitação. Não tem limitação de custo muitas vezes, não tem limitação de material, não tem limitação de basicamente nada. E no DSA a gente faz o processo inverso: a gente vê o que tem disponível e, a partir disso, a gente projeta. Então é uma outra forma de projetar que é totalmente diferente. (Aluno F)
Esse certamente é um dos pontos mais característicos do DSA. O trabalho com
reaproveitamento possibilita um momento oportuno para reflexões sobre práticas
sustentáveis que se estendem para a vida pessoal e profissional. Isso foi exposto
especialmente por dois estudantes do curso de Design de Moda que afirmaram ter
tido seu primeiro contato com questões sociais na cadeia de produção da sua área
quando entraram no DSA.
Porque uma coisa, no meu caso, é comprar um tecido pronto e fazer uma roupa. Outra coisa é a gente achar um tecido que se ajuste às condições do local para fazer uma almofada, e isso tudo com o que nós temos lá disponível
85
pra nós. É bem diferente, tu não faz só o que tu gosta, tu faz mais, e isso te deixa mais forte para enfrentar as tuas dificuldades. (Aluno E)
Os alunos relatam ter utilizado e aprimorado conhecimentos da graduação e
desenvolvido habilidades novas, algumas delas pelo contato com pessoas de outros
cursos. Foram citadas como habilidades a imersão, quando se utilizam técnicas de
entrevista e observação, o uso de ferramentas de marcenaria e de softwares,
liderança, edição de vídeos, trabalho em equipe. O Aluno C ainda afirma ter aprendido
a correr atrás do que precisa ser feito e a tomar decisões rapidamente para resolver
situações que não se apresentam em projetos de graduação.
Essa coisa de jogo de cintura, de resolver as coisas na hora, de dar um jeito. Porque na faculdade a gente vê tudo na teoria e parece tudo fácil. Tudo acontece, tudo é maravilhoso. Mas na hora de pôr em prática nem sempre tudo acontece do jeito que a gente planeja [...]. Por mais que tu faça um trabalho de projeto na faculdade não é a mesma coisa. Sempre funciona às mil maravilhas e na vida real não é assim. (Aluno C)
O Participante A diz ter aprendido principalmente a trabalhar com
reaproveitamento, e isso é bastante útil dado o seu contexto de trabalho, pois tudo o
que os Bancos recebem é doação. Além desse aspecto, relata que o trabalho com a
equipe do DSA acrescentou algum conhecimento de composição dos espaços, de
layout e de cores.
Esse reaproveitamento, soluções com coisas que a gente recebe e não sabe o que fazer com elas. Isso para mim foi muito marcante mesmo. E eles próprios chegam com ideias que a gente nunca vai imaginar, nunca [...]. Aí eu fico pensando, nossa, isso nunca me passou pela cabeça. Isso para mim é muito bacana, aprendi muito. (Participante A)
O caráter prático do projeto e o fato de se projetar para o mundo real é
evidenciado pelos alunos como um acréscimo ao conteúdo trabalhado em aula e um
ponto forte do trabalho no DSA.
Essa questão de aplicar o projeto na realidade a gente nunca tem dentro da sala de aula. A gente faz um projeto e apresenta para o professor, talvez alguma criança ou outro tenha testado mas aquilo vai ficar guardado para sempre. E esse projeto [do DSA] na verdade vai estar ali para todo mundo. Acho que isso de aprender na prática, aplicar, ver como as pessoas estão recebendo aquilo, isso é mais importante. (Aluno A)
Ocasiões em que se colocam conhecimentos em prática pelo trabalho com
restrições fomentam competências úteis para quando o estudante entrar no mercado
de trabalho. Ainda, o contato com profissionais e estudantes de áreas diferentes e a
atuação frente a problemas sociais revelam outros horizontes de atuação profissional.
86
5.3.3.3 Convivência coletiva
A convivência coletiva implica o trabalho em equipe, a colaboração e a relação
com a diversidade. A extensão ainda permite que os estudantes identifiquem
possibilidades concretas de solução coletiva para problemas do dia a dia e o trabalho
em equipe exige que se debatam ideias e que se aprenda a ouvir o outro.
O Professor A relata a vivência compartilhada através de uma comunhão de
objetivos que vão além do ensino e atingem o desejo pessoal de construir uma
sociedade mais justa. Ambos os professores mencionam uma transformação positiva
nos estudantes que passam pelo projeto e a criação de situações que impactam
significativamente nas decisões da vida pessoal dos integrantes.
O que eu busco é que tanto eu quanto os estudantes que estamos trabalhando no projeto tenhamos uma relação de compartilhamento, de construção de uma sociedade mais justa, mais humana, e isso a gente tem conseguido e ainda conseguido levar para outras comunidades. A gente tem feito um trabalho muito bom, mas é pouco ainda em relação ao que se deveria fazer para se conquistar um país melhor, mais justo para todos, mas a gente está construindo. E os estudantes que passaram por aqui se transformam, dá para perceber que algo muda neles, que tem alguma situação que não é de ensino, que é uma coisa pessoal. Tem coisas que a gente não consegue ensinar. Acontece. (Professor A)
O projeto extensionista proporciona uma convivência mais próxima entre
professores e alunos, diferente do contato na sala de aula. Como comenta o Professor
B, na sala de aula cada pessoa está preocupada com seus problemas e a convivência
coletiva e a proximidade da relação não são tão acentuadas. Embora haja o
reconhecimento da docência na graduação, as questões humanas vivenciadas no
projeto de extensão aprofundam os laços entre estudantes e professores e tornam as
relações mais significativas para ambos os lados.
O DSA resgatou muita coisa da minha história acadêmica. E essa equipe que a gente tem… em sala de aula a gente tem a contrapartida, tu és valorizado como professor e tudo, mas ali tu tens uma recompensa que é além: "Hoje eu fiz a minha parte como cidadão, fiz a minha parte como pessoa" [...]. Eles acabam tendo uma relação com o mundo real que a faculdade não te dá. É um galpão gigante e que se tu tens criatividade podem sair coisas fantásticas de lá. Temos muita sorte, vemos que tem alunos que se transformam no processo. A gente mais ganha com eles, eles sempre nos agradecem, mas a gente acaba tendo sorte por ter eles. É uma troca super boa. Eles nos chamam de profes amigos, acaba sendo uma relação muito maior, temos uma relação muito boa com os alunos. (Professor B)
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O ganho pessoal pronunciado da experiência extensionista atinge tanto
professores quanto alunos. Certamente o esforço dos professores em dar autonomia,
valorizar o senso de propósito e destacar a entrega pessoal é um motivador para a
união da equipe e para o trabalho que desenvolvem. Igualmente, a natureza do
trabalho social gera um impacto no estudante que ultrapassa a formação acadêmica
e técnica, despertando reflexões pessoais.
Os aprendizados mais citados pelos alunos envolvem o contato com o usuário
e com os colegas de equipe. Como boa parte dos entrevistados, o Aluno C considera
lidar com pessoas o principal aprendizado. Tanto com as da equipe de design quanto
com os usuários, que demandam uma maneira certa de aproximação e uma
sensibilidade que só se aprende na prática. Ele tem a consciência que no DSA as
decisões tomadas em grupo interferem na vida das pessoas. Isso demanda uma
responsabilidade que é ainda maior atualmente, pois trabalha-se de forma mais
independente dos professores.
E outra coisa é uma capacidade de entender o próximo e poder se expressar de uma maneira com o próximo. São coisas que querendo ou não tu não aprende na faculdade, que tu só aprende na vida mesmo, colocando em prática. Nesse projeto de extensão é legal isso que tu pode pôr em prática e ainda tem esse plus de aprender a conviver com as pessoas, a conviver realmente em grupo [...]. E na faculdade tu não aprende, porque é diferente, lá tu decide sobre um trabalho para entregar para a faculdade e deu. E ali tu está decidindo sobre como isso vai interferir na vida das pessoas, então a responsabilidade é maior e a discussão é mais séria. (Aluno C)
Ao mesmo tempo, o mesmo aluno percebe um apoio diferenciado dos
professores que ajuda a perder o medo de errar e permite que o aprendizado e a
experiência sejam maiores do que em um estágio convencional. Isso permite
desenvolver uma confiança interessante para a atuação no mercado de trabalho.
A importância do contato com o usuário fica clara nos depoimentos dos
estudantes. Apresenta-se como uma característica que se destaca no processo de
projeto do DSA, configurando um aprendizado marcante.
Tudo foi muito importante, eu fiquei bem feliz de ter participado. E acho que o contato com o usuário foi o mais importante de tudo, fez muita diferença para a gente [...]. Meu maior aprendizado foi o respeito com o usuário. O real usuário, não ficar imaginando uma coisa, quando na verdade ele precisa outra coisa. E também a questão de como o espaço se relaciona com o usuário e ele com o espaço. E também trabalhar em equipe, com pessoas de outras áreas, foi bem rico, eu nunca tinha feito isso. (Aluno D)
88
O foco no usuário foi particularmente importante para ampliar a visão de projeto
dos alunos, bem como para o desenvolvimento de uma sensibilidade diante das
situações que as pessoas vivenciam no mundo real.
Em relação aos profissionais dos Bancos Sociais, destaca-se uma relação de
parceria e um esforço visível para viabilizar o andamento do projeto. Os profissionais
que trabalham junto com a equipe de design demonstram a importância que dão ao
projeto.
[...] com o pessoal da Fiergs também acho que o que mais marca, o que tu mais aprende, é a boa vontade de fazer sempre o melhor e sempre em equipe [...]. O aprendizado maior é o de assumir um compromisso e fazer o melhor. (Aluno F)
O Participante B ressalta ter aprendido a dialogar e a conviver melhor por conta
do trabalho em equipe que inevitavelmente acontece nos projetos com a participação
do DSA. Mostra-se motivado com a oportunidade de ensinar o que sabe aos
estudantes e ver que são eles que mais aprendem.
Com eles eu estou aprendendo mais o diálogo, a convivência, de montar um ambiente, essa parte. E acho que eles estão aprendendo mais do que eu estou aprendendo com eles. Essa parte me dá mais um up, tipo eles me passam um projeto, no mesmo dia eu já concluo ele [...]. Tu vê que eles chegam e já veem e nossa, aquilo ali te dá uma alegria de ver, primeiramente que eles estão vendo o projeto deles sendo concluído e que não é impossível. E também ao mesmo tempo eu estou vendo o reconhecimento do meu trabalho. (Participante B)
O Participante A comenta sobre a motivação marcante da equipe de design:
Porque eles desenham aquilo com uma vontade, com uma gana de entregar isso para a população que isso emociona as pessoas das instituições [...]. Eu acho que o que marca mesmo é essa alegria e essa vontade de fazer o seu melhor. Isso para mim é uma marca inquestionável deles. (Participante A)
A percepção mútua da vontade de fazer o "melhor possível" fica clara nos
relatos e aparenta inspirar universitários e profissionais dos Bancos Sociais. A
convivência coletiva na extensão, neste caso, parece gerar um sentimento de
pertencimento destacado pelo senso de propósito social compartilhado pelos atores.
Verificou-se que o espaço da extensão aproximou professores e estudantes,
fortalecendo vínculos e dando mais segurança para o desenvolvimento da autonomia.
Os projetos também permitiram uma compreensão maior da coletividade e a
percepção de situações vivenciadas no mundo real, principalmente em favor de uma
atenção especial às pessoas impactadas pelos projetos.
89
5.3.3.4 Exercício da cidadania e inclusão social
Uma das principais características da ação extensionista é seu viés político e
social que leva em conta os interesses coletivos e as organizações sociais. A extensão
apoiada pelo trabalho comunitário incita o contato com grandes questões sociais e a
resolução coletiva de problemas reais. Exercer a cidadania é sentir-se parte atuante
do mundo real.
Chama atenção dos professores a transformação dos alunos no processo e a
apropriação dos projetos como uma questão pessoal, mais do que acadêmica ou
profissional.
A gente entrega os alunos para o mundo muito diferentes, isso eu tenho total certeza [...]. Quando vemos, eles já estão caminhando sozinhos. A grande maioria deles acaba tendo um processo de apropriação que acaba virando uma meta pessoal, uma coisa muito maior. (Professor B)
Percebe-se que o propósito social manifestado na vontade de ajudar o próximo
ocasiona uma união maior do grupo. Os estudantes acreditam no propósito do projeto
e desejam que ele cresça e se torne "cada vez melhor".
O grupo em si é muito bom, eu acredito que são pessoas que estão ali por um mesmo propósito, eles estão ali para fazer alguma coisa legal para o próximo. (Aluno B)
Mas não são só os alunos que se transformam no processo. Os professores
vivenciam uma troca mais intensa do que na sala de aula, como já observado, e
também são impactados pelas situações que surgem durante os projetos. O Professor
B lembra das visitas a lugares precários e de situações pouco corriqueiras. Conta ter
se emocionado durante a inauguração de uma creche e ter ficado abalado em uma
visita a uma casa de detenção para doentes mentais.
Juntar as pessoas no mesmo espaço, cada um com seus sonhos [...]. Então o DSA mexe muito com a gente, questão humana. De pensar eu estou na minha casinha, no meu conforto e as pessoas às vezes vagando nos espaços [...]. Tu tens vontade de fazer mais e mais e mais e mais e mais. Tive a oportunidade de entrar em uma penitenciária que é uma coisa tri tabu para a nossa sociedade [...]. Se um daqueles presos pegar um livro já está bom. (Professor B)
Muitos estudantes mencionaram o sentimento do ganho pessoal em aplicar
habilidades de design em prol do social como o fator mais importante para que
continuem no projeto. O Aluno G, por exemplo, que quando entrou "não se importava"
90
com questões sociais, hoje vê na prática do design social o motivo de permanência
por mais de dois anos no projeto.
No DSA meio que engloba tudo, porque a gente está dentro de uma grande empresa, que são os Bancos Sociais que é enorme, e a gente faz projetos em grupo e o diferencial acho que é justamente o social, tu se importar. Se tu não se importa com o próximo, se tu não se entrega a isso, tu não vai se dar bem. Tu tem que gostar, não adianta eu não me importar com a experiência do usuário, não me importar com a pessoa, querer fazer parte do projeto porque não vai dar certo, porque é tudo focado na pessoa, tipo, o que ela vai sentir naquele ambiente, o que ela vai levar para casa. Então eu acho que é esse o diferencial, o social, que fez eu ficar no DSA [...] achei melhor continuar nele do que fazer um estágio. (Aluno G)
Os estudantes em geral reconhecem a importância de fazer alguma diferença
positiva na vida das pessoas, por menor que seja. Dois estudantes também
mencionaram que não se importam tanto com a bolsa, as horas complementares ou
a nota, mas o mais importante para eles é estarem ajudando alguém, trabalhando com
design social.
Eu gosto de poder fazer alguma diferença, mesmo que pouca, na vida das pessoas. Tipo uma criança que vai numa penitenciária visitar os pais e, quando ela está na biblioteca, naquele espaço que a gente criou, ela esquece daquelas coisas ruins que ela teve que passar até chegar a ver a mãe. Ela esqueceu aquele mundo por um segundo e está lá, mexendo com um livro. Eu gosto do resultado, de fazer aquilo que, por menos tempo que seja, fez a diferença um pouquinho na vida das pessoas. (Aluno G)
E como isso de fato afeta, para nós parece uma coisa pequena, é uma ação pequena em termos do que se pode fazer em ações no mundo, mas que afeta direto e isso me marcou bastante. (Aluno E)
O retorno nos momentos de entrega, nas cerimônias de inauguração, parece
ser um fator motivacional, de acordo com a fala geral dos entrevistados. Para eles, o
agradecimento e o valor que as pessoas atendidas dão aos projetos é uma
experiência gratificante que faz o esforço valer a pena.
Outro estudante se diz agradecido por participar do projeto, principalmente por
ter desenvolvido um olhar empático em relação ao próximo.
Pensar no sentimento, pensar no ser humano mesmo e não só nas pessoas. Acho que isso foi o principal crescimento que o projeto deu para mim, na minha vida. Ver as pessoas com outros olhos, ver realmente o ser humano, a pessoa humana e não as outras coisas. (Aluno C)
A extensão deve permitir o contato do estudante com grandes questões sociais
que impactam na sua formação. No caso do DSA, os projetos nos presídios foram
91
especialmente destacados pelos estudantes, que ficaram bastante surpreendidos
pelo contato com os detentos do regime semiaberto.
E depois que tu visita uma penitenciária e conversa com aquelas pessoas que estão lá, tu enxerga eles de uma outra maneira. Eu sei que eles cometeram um crime e estão lá pagando por algo que fizeram, mas eles não deixam de ser pessoas. Eles não precisam ser tratados como animais como às vezes a gente pensa, porque eles não são. Eles são pessoas, que têm sentimentos [...]. Então a oportunidade de ter esse contato, que eu nunca pensei que ia ter na minha vida, de realmente conversar e conhecer essa realidade eu nunca vou esquecer e vai ser sempre marcante para mim. (Aluno C)
A equipe do DSA teve a oportunidade de conversar com alguns detentos que
ajudaram a carregar os móveis e a preparar o espaço para a montagem, e com outros
que pertenciam a um grupo de artesanato de dentro do presídio. O Aluno B afirma ter
aprendido melhores formas de contato com todo o tipo de usuário, em especial, ter
desenvolvido uma sensibilidade maior para lidar com pessoas em situação de
vulnerabilidade social.
Um dos estudantes admira o trabalho feito nos Bancos Sociais, principalmente
as aulas oferecidas às comunidades de baixa renda, que estavam sempre cheias.
Outro estudante afirma a importância de dar acesso às pessoas, pois percebeu que
os espaços e os livros oferecidos ajudam a criar um interesse pela leitura que
inicialmente não é visível.
Uma coisa que eu percebi foi que as pessoas precisam mesmo é ter acesso. Tendo um livro, tendo um espaço bonito elas se sentem valorizadas, elas se sentem felizes, ficam agradecidas com isso. (Aluno E)
O Participante A destaca uma fala do presidente do Banco de Livros durante
uma inauguração no presídio da cidade de Guaíba:
Em Guaíba, quando a gente entregou o espaço de leitura, eu me lembro uma das falas do presidente do Banco de Livros que dizia assim: "Vocês estão presos por uma grade, mas o livro dá a oportunidade de vocês passarem por essa grade e ganharem o mundo. Então utilizem isso, se apropriem desse espaço para que vocês possam ganhar o mundo mesmo sem sair do lugar".
Por fim, o DSA proporciona trabalhar com valores de sustentabilidade,
ensinando os estudantes que "não é necessário comprar coisas novas para fazer
projetos incríveis" (Aluno E), é possível usar a criatividade para trabalhar com o que
se tem.
92
Professores e alunos da universidade visitam creches, postos de saúde e
presídios e entram em contato com uma realidade mais cruel do que estão habituados.
Conhecem situações enfrentadas por uma boa parte da população brasileira.
Claramente, devido à natureza social dos projetos, aos lugares carentes que
apresentam uma outra realidade e ao retorno das pessoas impactadas pelos projetos,
esse tipo de situação toca em questões pessoais, de existência, importantes para a
construção da cidadania.
5.3.4 Quanto às diretrizes para a prática extensionistas de design
Identificam-se abordagens de design mais alinhadas ao contexto da extensão.
Essas abordagens, somadas, prezam pela solução de problemas sociais, pelo foco
na empatia para reconhecer as necessidades das pessoas e pelas práticas
participativas de projeto.
5.3.4.1 Design social
O design social é uma abordagem que prioriza a resolução de problemas
sociais. Nesses processos, visa-se à democracia com o aumento da participação e da
autonomia das populações menos favorecidas através de práticas e soluções
inclusivas. Também são considerados os valores de sustentabilidade e cidadania.
Mesmo no nome, o projeto estudado ressalta a abordagem do design social.
Uma particularidade do DSA que chama atenção é o trabalho com custo zero e com
materiais 100% reaproveitados. Esse fato por si já inclui um princípio relevante de
design social na identidade do projeto.
O fato de trabalharem apenas com reaproveitamento de materiais eleva a
complexidade dos projetos, pois as restrições são muito maiores. É uma dificuldade
intencional do projeto que as soluções devam ser criadas apenas com o que há
disponível nos Bancos Sociais, exigindo o emprego de uma boa porção de
criatividade. Os professores observam que os alunos têm desenvolvido a capacidade
de projetar com essas limitações, atingindo bons resultados. Os alunos expressam
reconhecer essa dificuldade, mas acreditam que seja parte do projeto.
93
O que faz mais diferença é a questão de tu ser mais humano, tu pensar mais em reutilizar as coisas, que tu não precisa comprar coisas novas para fazer projetos incríveis. Esse tipo de coisa faz bastante diferença. (Aluno E)
Além do fator intrínseco de sustentabilidade, fala-se em humanizar os espaços
e melhorar a experiência das pessoas que usufruem dos ambientes. Para o Professor
B, humanizar seria trazer a dignidade que muitas vezes falta nos lugares; por exemplo,
nos postos de saúde que sofrem com a precariedade da infraestrutura e cujos
funcionários trabalham com um alto nível de stress. Reconhece que são situações
complexas. Segundo o Professor A e o Participante A, o objetivo final dos projetos é
promover bem-estar para as pessoas atendidas.
Os lugares que o DSA atende geralmente têm carência de infraestrutura e de
atenção do poder público. São instituições com ambientes muitas vezes precários que
solicitam ajuda dos Bancos Sociais e se dispõem a ajudar no que for preciso para o
andamento do projeto. Foi relatado que as pessoas dessas instituições costumam se
envolver ativamente na arrecadação dos materiais e na montagem dos ambientes e
se mostram agradecidas na inauguração dos espaços. O Participante B reconhece as
mudanças positivas trazidas pela renovação dos espaços:
Eles tornam o pesado no agradável. Essa é a parte legal deles. De uma parede preta eles fazem uma parede colorida. Vai mudar o ambiente, vai mudar o clima, vai trazer a felicidade para a pessoa que está ali dentro. (Participante B)
E não é só a revitalização do espaço físico que ajuda no bem-estar das
populações beneficiadas com os projetos. A intenção principal para a construção
desses espaços é a do acesso aos livros e consequente incentivo à leitura. Para o
Participante A, o livro tem o papel de construir cidadãos e de fazer as pessoas
pensarem. O Aluno C tem especial estima pela oportunidade de trabalhar com os
profissionais do Bancos de Livros, principalmente por ter visto na prática o potencial
de mudança que existe nos livros:
Eles mostraram para a gente que o livro realmente pode mudar a vida das pessoas. Porque quando a gente vai nos projetos e larga os livros que eles indicaram, a gente nem larga os livros nos locais destinados direito que as pessoas já estão pegando, perguntando se podem levar para casa, enfim. Esse contato que o pessoal dos Bancos conseguiram passar para a gente… a gente já tem essa noção que o livro pode mudar, mas tu ver isso na prática é sempre diferente. (Aluno C)
O Aluno E, por sua vez, comenta ser importante favorecer o contato das
pessoas com a possibilidade da leitura.
94
Me chamou a atenção que, pelo que eu vi, os brasileiros realmente gostam de livros, só que é difícil o acesso, eles irem a uma biblioteca [...]. Então trazer esses livros ao acesso das pessoas é muito legal. Ver como eles realmente querem levar aqueles livros para ler, inclusive as crianças. (Aluno E)
Da intenção de construir cidadania através do livro nota-se outra relação direta
com os propósitos do design social. Pode-se falar em inclusão social através da leitura
e em construir capacidade ao invés de dependência por meio do mundo que se abre
para quem se propõe a ler.
O Aluno G conta que o design social o fez despertar para questões importantes
da profissão com as quais não havia tido contato na graduação. Ele se vê como uma
pessoa mais correta atualmente e pretende incluir essas práticas na vida profissional.
[...] principalmente o design social que antes de eu entrar eu não tinha nenhuma noção e não me importava muito. E agora eu tenho certeza que alguma coisa da minha profissão vai ser relacionada ao design social. Isso a gente não aprende na sala de aula. [...] o DSA fez com que eu me interessasse mais pelo design social e tentasse colocar isso dentro do design de moda, que é uma coisa muito importante. Tipo, várias coisas, toda a cadeia da moda, trabalho escravo e tudo mais, o design social abriu meu olho e agora eu sinto que sou uma pessoa mais correta. (Aluno G)
Esse mesmo aluno define o design social como o uso dos conhecimentos da
graduação para desenvolver projetos que ajudem a melhorar a vida das pessoas.
Pegar os recursos que tu aprendeu na faculdade e fazer com que isso ajude alguém de uma maneira. Pensar na experiência do usuário, pensar no próximo. Tipo, não pensar no lucro total, não só uma cadeia de produção, mas uma cadeia que ajude o próximo, que melhore a vida das pessoas. Isso que importa, tu quer melhorar a vida das pessoas de alguma maneira, nem que seja um pouquinho. (Aluno G)
Para o futuro, os professores querem aumentar cada vez mais o impacto social
do DSA. Pretendem expandir o projeto para a criação de cooperativas de geração de
renda que sejam sustentáveis em seus negócios.
O trabalho com propostas sustentáveis, o propósito de humanização dos
espaços e o incentivo à leitura apresentam, em definitivo, valores importantes de
design social. Os relatos dos estudantes, em especial do Aluno G, expressam o
potencial do design social em gerar reflexões sobre consequências sociais e
ambientais da profissão e buscar por práticas éticas.
5.3.4.2 Design centrado no humano
O projeto orientado pela forma e função dos objetos cede espaço a atitudes
projetuais centradas nas pessoas. O design centrado no humano busca entender, em
95
primeiro lugar, as necessidades das pessoas e a forma como vivenciam o mundo.
Este tópico busca indícios dessa proposição na fala dos entrevistados.
Enquanto o contexto e o nome do DSA envolvem o design social, o método
utilizado no projeto tem origem no design centrado no humano. Além da referência de
engenharia, o Professor A conta ter iniciado no projeto fazendo uso do Toolkit HCD
da IDEO. Ele justifica a escolha pelo viés social do projeto e pela vontade de
desenvolver um trabalho do qual a comunidade goste e se aproprie.
Dessa forma, o processo de projeto é centrado na experiência do usuário. Isso
faz com que cada caso seja diferente, pois trabalha-se em favor dessa experiência,
que é variável.
O princípio é o mesmo, de oportunizar bem-estar para as pessoas que são atendidas. A gente trabalha voltado para a experiência do usuário, então para uns é incentivo à leitura, para outros é conforto, para outros é mobilidade [...]. Então é uma preparação voltada para essa pessoa que está lá. A gente vai sempre pensando em oportunizar uma ótima experiência para essas pessoas. (Professor A)
O Professor B identifica uma dissonância entre as demandas enviadas pelos
diretores das instituições e as reais necessidades vividas por quem convive
diariamente no espaço.
Porque a gente vai lá e escuta os diretores de uma instituição. E eles têm uma visão do espaço que não tem absolutamente nada a ver com aquele espaço. Acho que eles nunca sentaram lá na recepção para saber as reais necessidades daquele espaço. Às vezes nos pedem um espaço de leitura infantil, mas quando vamos ver não tem crianças lá. Então é trazer o mais próximo da realidade, tentar amenizar o máximo o tempo de espera de qualquer relação que aquele espaço está oferecendo [...]. (Professor B)
Graças às visitas de imersão e ao foco nas pessoas, esses pontos podem ser
corrigidos e o DSA pode propor soluções mais próximas da realidade dos que
realmente convivem no ambiente e das suas reais necessidades. O Aluno B observa
que a equipe direciona toda a atenção para o usuário. Enquanto estão nas visitas,
observam o que as pessoas mais precisam e buscam inserir no projeto. As temáticas
exploradas na criação do conceito têm relação com o ambiente e principalmente com
o usuário.
O Aluno A explica que a criação do conceito varia conforme o público. Se é
para crianças, tendem a algo mais lúdico, se são adultos, algo mais sóbrio. As
decisões são tomadas em conjunto pela equipe de projeto. Sentam, fazem um
96
brainstorming para definir o conceito e conversam também sobre as possibilidades de
mobiliário e sobre o que pode ser bom em cada caso particular.
O Aluno D relaciona a humanização de um espaço na penitenciária com design
centrado no usuário:
A penitenciária é modulada, então é tudo a mesma coisa, as cores são as mesmas, sem nenhuma preocupação com o usuário em si. E as pessoas que estão chegando lá não são pessoas que só passaram por coisas fáceis. Elas precisam de um espaço que as acolha, porque depois vão entrar em um espaço pesado. Então acho que humanizar é isso, entender o usuário que está utilizando aquele espaço e saber o que fazer para que ele se sinta melhor ali. Aquele usuário em específico, não como se fosse para qualquer um. Pensar realmente no usuário. (Aluno D)
O projeto da sala de visitas na penitenciária tinha como principal objetivo
humanizar o espaço. Os integrantes do DSA visitaram o espaço, fizeram medições e
conversaram com quem frequentava o espaço. Humanizar, portanto, é entender o
usuário e, a partir desse entendimento, projetar soluções específicas que tragam bem-
estar.
Como relatado na seção de aprendizado para a convivência coletiva, o grande
aprendizado da maior parte dos estudantes foi entender que o usuário é a parte central
do projeto.
Porque na verdade a gente analisa muito o usuário daquele ambiente. Então se vai ser num posto de saúde, "ah, essas pessoas ficam muito tempo em pé", então precisamos de mais lugares para eles sentarem. A gente pega temas que tem relação com o ambiente e principalmente com o usuário. (Aluno B)
O contato com o usuário mostra-se uma qualidade importante do projeto que
muda a visão de projeto dos estudantes. Desde a metodologia até as falas, torna-se
evidente que a abordagem de design centrado no humano prevalece nas práticas
projetuais do DSA. Resta saber como é a participação nos processos.
5.3.4.3 Práticas participativas de projeto
As metodologias participativas devem ser priorizadas sempre que possível na
ação extensionista. Uma equivalência a essas metodologias, no campo do design, é
o design participativo, que envolve o usuário como sujeito ativo em alguma parte ou
durante todo o processo. Assim sendo, pretende-se identificar em que nível de
participação o projeto estudado se encontra.
97
Os entrevistados afirmam ter contato com os usuários em três momentos do
projeto, durante as três visitas que acontecem a cada local atendido: na primeira visita
de imersão, na montagem e na entrega (inauguração). Conversam com o usuário na
primeira visita, que é a única oportunidade de contato antes do desenvolvimento do
projeto. Nesse momento já se busca investigar o que as pessoas esperam e que tipo
de solução seria melhor.
Com a ideia escolhida, mandam uma proposta para aprovação dos Bancos
Sociais e das pessoas das instituições que demandaram o projeto. Os funcionários
dos locais costumam se envolver ativamente na montagem e na compra de materiais,
e a população muitas vezes ajuda. O Professor A defende que essa participação ajuda
a criar um senso de apropriação dos espaços por parte da comunidade:
E depois eles vão usufruir desse espaço, mas eles se sentem mais proprietários desse espaço porque eles também tiveram que participar da montagem, às vezes de compra de materiais, tinta, coisas assim. (Professor A)
O Aluno B conta que costumam conversar mais com os funcionários dos locais
do que com a população, mas esse contato também acontece, como expressado na
fala do Aluno D:
Na penitenciária aconteceu de a gente poder ir dentro, conversar com alguns detentos para entender qual era o lugar deles lá. Até porque eles faziam vários trabalhos manuais e a gente até pensou em usar isso no projeto para que as pessoas quando chegassem lá vissem o trabalho deles. (Aluno D)
Junto com observações, buscam conhecer a realidade do espaço, os fluxos e
a relação do usuário com o ambiente. As pessoas costumam se surpreender
positivamente com o projeto.
Trabalham em conjunto com os funcionários dos Bancos Sociais,
especialmente do Banco de Mobiliário, pavilhão onde fica a sala do DSA e são
construídos os móveis dos projetos, e do Banco de Livros, de onde vêm as demandas
e são selecionados os livros para cada espaço. O Aluno C complementa que precisam
muito deles e têm um relacionamento muito bom. Com os profissionais do Banco de
Mobiliário, as discussões são a respeito do que é possível ser feito em termos
técnicos. Já com os profissionais do Banco de Livros, as discussões costumam ser
sobre o conceito de cada projeto. Sobre esse momento, o Participante A, do Banco
de Livros relata o que mais gosta no projeto:
98
Eu gosto quando eles chegam e vem e discutem, vem para mostrar o projeto e perguntam assim, "o que tu achas? o que tu pensas?". E aí também te obriga a refletir sobre aquilo. Porque como eu disse, eu não entendo nada de design. Mas eu entendo que eu quero ter um espaço bonito, agradável e convidativo, isso eu entendo. Então para que a gente chegue nisso, a gente precisa travar essas discussões. Mas eu gosto muito quando eles vêm e me mostram os projetos, e também quando eles vão inaugurar. A felicidade deles entregando os espaços, isso é maravilhoso. E aí vai o presidente do banco de livros, o diretor, enfim. Eles se sentem muito reconhecidos. Isso eu acho que é importante para qualquer um, para eles, para nós e para o próprio presidente. É bem bacana. (Participante A)
Nas falas, é possível perceber que os profissionais dos Bancos Sociais se
sentem valorizados com os momentos de troca. Esse sentimento aumenta o apreço
pela atuação do DSA. Ao citar 5 palavras que representam a sua vivência no projeto,
o Participante B, do Banco de Mobiliários, relata:
Eu sinto prazer em ajudar eles porque eu sei que ajudando eles vão ter mais animação com o projeto, porque às vezes eles vêm "será que é possível", e quando eles veem que está pronto, é satisfação. A minha vontade, que aumenta vendo a intenção deles. A satisfação de ver as coisas prontas, o ambiente montado. A gratificação também, tu ver ter o retorno pra ti, as pessoas agradecendo, e eles vendo… nossa, olha ali que ele projetou e eu conclui. Se ele não projetar, eu não vou concluir daquela forma [...]. E o reconhecimento, nada como o reconhecimento [...]. Um simples obrigado já... de pensar também que da mesma forma que eles me ajudam, eu ajudo eles. A gente se sente um pouco mais importante [...]. Isso é muito legal. (Participante B)
Depois de um ano, a equipe procura voltar aos lugares para ver como está o
projeto. O Aluno F comenta que normalmente os espaços são bem conservados
"porque o pessoal tem muito respeito e agradecimento pelo que o DSA faz".
De acordo com os dados coletados, os momentos de participação foram
posicionados nas etapas do processo (Figura 11).
99
Figura 11 – Inputs de participação no processo do DSA
Fonte: elaborada pela autora.
A figura apresenta dois diferentes tipos de participação:
1) Inputs (unilaterais): são momentos de contato com as pessoas em que a equipe
recebeu entradas de informação, no caso incluem-se a coleta de informações
na fase de imersão, os pareceres das instituições quanto a aprovação dos
100
projetos e o feedback dos usuários na inauguração. Considera-se que não
houve uma troca expressiva de conhecimentos e vivências, nem houve a
intenção para fazê-la. Entretanto, acredita-se que essa forma menor de
participação possa, porventura, vir a gerar essa troca, especialmente na fase
de imersão em que se tem contato direto e se conversa com as pessoas.
2) Inputs com troca (bilaterais): quando, além da entrada de informação, houve
alguma troca relatada entre a comunidade e a equipe. Incluem-se trocas que
acrescentam tanto para a vivência profissional como também para a vida
pessoal. Os relatos de trocas puderam ser observados nos momentos de
ideação entre a equipe e os profissionais dos Bancos e nos momentos da
montagem, especialmente entre a equipe e pessoas que se encontravam na
fila de espera do posto de saúde, detentos das casas prisionais e funcionários
dessas instituições. Se apenas a troca projetual fosse considerada, esses
inputs com troca estariam presentes apenas na fase de ideação.
Ressalta-se que essas considerações são resultado da interpretação dos
dados das entrevistas. Não representam a complexidade das relações na realidade.
A proposta aqui é apenas iniciar uma reflexão sobre os momentos de participação
com o apoio da representação visual.
Os tipos de inputs identificados podem ser localizados no modelo de relações
intersubjetivas de Ho e Lee (2012), citado na seção 4.2 da revisão de literatura. Os
inputs unilaterais parecem representar momentos em que a relação Isso-Tu (It-Thou)
predomina, pois se produzem conexões empáticas. Ao passo que os inputs com troca,
qualificados pelo diálogo, destacam-se como momentos Eu-Tu (I-Thou).
Da mesma forma, na figura são observados os caminhos de projeto durante o
processo, se iterativos ou sequenciais. Os caminhos iterativos, identificados nas três
primeiras fases do processo, assinalam uma maior possibilidade de transitar pelo
processo e voltar etapas, caso se faça necessário. Já os caminhos sequenciais são
lineares e geralmente seguirão a sequência das etapas.
O fato de engajarem os participantes em momentos como a montagem dos
espaços auxilia na aceitação das propostas, embora essa participação não aconteça
no momento da criação de soluções. Por mais que haja um trâmite de aprovação das
101
ideias pelas instituições, a fase de criação é vivida apenas pela equipe de design, com
participação posterior mais ativa dos profissionais da FGBS. Como foi estudado, o
ideal nos projetos extensionistas é sempre um envolvimento pleno das comunidades
impactadas pelos projetos.
Seria interessante pensar em formas de vivenciar o processo de ideação com
os usuários. Os workshops de coprojetação relacionados à abordagem de design
centrado no humano, mencionados na seção 4.2, poderiam ser uma boa iniciativa.
Possivelmente a maior dificuldade de implementar práticas participativas intensas seja
o contexto da maioria dos projetos, visto que atendem instituições com questões
sociais complexas e problemáticas, como os presídios e os postos de saúde. Isso
posto, percebe-se que o emprego pleno de metodologias participativas nem sempre
será possível nos projetos de design na extensão.
5.3.5 Palavras representativas da experiência extensionista
A última pergunta do instrumento de entrevistas solicitava que os entrevistados
escolhessem cinco palavras que representassem a experiência vivida no projeto.
Seguem abaixo as respostas, organizadas com a ferramenta Wordle.
Figura 12 – Palavras para a experiência extensionista no DSA
Fonte: desenvolvida pela autora a partir da ferramenta Wordle (disponível em: <Wordle.net>).
102
O tamanho das palavras está relacionado à frequência. As palavras menores
foram citadas uma vez, as de tamanho médio, duas vezes, e as de tamanho maior,
três vezes. Nota-se que as palavras mais citadas foram criatividade, solidariedade e
respeito.
Tendo em vista que a maior parte das palavras vêm dos estudantes (pois são
a maioria entrevistada), é possível refletir sobre as possíveis diferenças entre as
palavras presentes nessa figura em relação a palavras que descreveriam experiências
em um projeto de sala de aula ou um projeto de estágio no mercado.
5.4 OBSERVAÇÕES SOBRE O EMPREGO DO QUADRO DE DIRETRIZES
Este trabalho identificou diretrizes para a ação na extensão universitária no
contexto de ensino-aprendizagem do design. Entende-se que essas diretrizes
sistematizam princípios gerais, enfoques para o ensino-aprendizagem e perspectivas
teóricas para a ação do Design na extensão universitária. Nesse sentido, elas devem
ser pensadas como um material de apoio ao avaliador, proponente ou participante de
um projeto extensionista. Elas podem ser utilizadas para proceder-se uma avaliação
por uma pessoa externa ao projeto ou uma reflexão dos atores quanto as práticas de
ação adotadas.
Destaca-se que essa proposição tem três dimensões principais de análise: dos
princípios gerais para a ação extensão, do protagonismo no processo de ensino-
aprendizagem e das práticas participativas, centradas no humano e de cunho social
no âmbito do design. Essas dimensões foram consideradas na construção do quadro
e constituíram as três categorias de análise com seus tópicos particulares (Diretrizes
gerais para a ação extensionista, Diretrizes para o processo de ensino-aprendizagem
na extensão e Diretrizes para a prática extensionistas no Design).
Durante a construção do quadro de diretrizes, os tópicos de cada categoria
foram testados na matriz onde se posicionaram as falas dos entrevistados (Figura 6,
p. 61). Esse processo possibilitou algumas mudanças positivas. Segundo Gibbs
(2009), na codificação baseada em conceitos, ou seja, categorias que surgem de
algum referencial anterior à coleta de dados (neste caso, do referencial teórico), o
103
pesquisador deve ajustar as categorias durante a análise caso outras formas de
categorizar se mostrem mais efetivas para o texto.
Por exemplo, inicialmente haviam sido consideradas todas as cinco diretrizes
orientadoras de ações de extensão do Quadro 1 (p. 31) para constituírem o quadro de
análise. No momento da organização e interpretação das falas, contudo, algumas
modificações se fizeram necessárias. O tópico "impacto na formação do estudante"
apresentava sobreposições com questões de ensino-aprendizagem já consideradas
e, por essa razão, foi suprimido. O tópico "impacto e transformação social", por sua
vez, mostrou-se mais complexo do que aparentava e, portanto, concluiu-se que para
verificar essa questão é necessário um estudo mais detalhado. Alguns tópicos da
parte de ensino-aprendizagem também sofreram modificações expressivas depois de
testados.
Ainda que uma mesma citação possa conter mais de uma dimensão
interpretativa, casualmente cabendo em mais de um tópico de análise, verifica-se a
efetividade das categorias quando essas sobreposições não acontecem. Dessa
forma, no presente estudo, as sobreposições puderam, em geral, ser evitadas após
as modificações relatadas. Ainda, praticamente todo o conteúdo expressado nas
entrevistas foi incluído com sucesso no quadro de diretrizes.
Considera-se na escolha das dimensões para comporem as categorias
subsídios satisfatórios para o propósito da investigação. O relato completo de cada
uma delas pôde ser feito e todo o conteúdo das entrevistas foi considerado. Como
objetivo futuro, deseja-se testar esse quadro no estudo de outros projetos
extensionistas de design.
104
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A extensão universitária é apresentada como uma forma de oxigenar as
práticas acadêmicas e enfrentar a complexidade crescente do tecido social. Uma
formação acadêmica completa deve considerar o conhecimento presente em outras
esferas da sociedade, pois os fluxos de informação que incluem temas de ensino e de
pesquisa não estão restritos apenas à universidade. Destaca-se a importância da
extensão para viabilizar o cumprimento do papel social da universidade, que deve
trabalhar a serviço da sociedade.
A esses apontamentos sucedeu-se uma série de questionamentos sobre o
futuro da universidade e o papel potencial do design na extensão universitária. Os
problemas que o mundo enfrenta hoje são mais complexos daqueles das civilizações
passadas, inclusive os problemas de ordem social e educacional. Precisa-se chegar
a soluções novas e isso exige pensamento criativo e contribuições interdisciplinares.
Nesse cenário, o design ocupa uma posição potencialmente relevante, uma vez que
é interdisciplinar por natureza e sustentado pelo processo criativo. Pode-se afirmar
que no design se criam produtos culturais e se desencadeiam ações e experiências
que podem gerar um impacto social significativo, levando à inovação.
Práticas que socializam a cultura de projeto, por exemplo, podem proporcionar
aos atores sociais acesso a ferramentas úteis para a ação positiva no contexto em
que vivem. Uma destacada característica do processo de muitos designers é a
reflexão contínua sobre o problema de projeto, no mesmo tempo em que propostas
são colocadas em prática. Os sucessivos reenquadramentos do problema projetual
consideram um contexto de complexidade que exige a ação reflexiva e interdisciplinar.
Nesse ponto, acredita-se que a exploração do problema durante o processo criativo
não origina somente um produto final, mas também pode transformar a visão de
mundo da pessoa envolvida no processo, aprimorando-a (vide Honing Theory, de
Liane Gabora). Esses aspectos indicam uma capacidade interessante de trabalhar
inovativamente sobre os problemas sociais.
O design pode contribuir também em projetos protagonizados por outras
graduações e áreas do conhecimento, haja vista ser um campo interdisciplinar que
pode desempenhar papeis como facilitação de diálogos, visualização, geração e
105
representação de ideias. Essas e outras particularidades do design podem exercer
um papel interessante em projetos de extensão universitária.
Lembrando o que estabelece a Lei Básica de Reforma Universitária, que institui
a extensão universitária obrigatória (Lei n. 5.540/68), em seus artigos 20 (“[...] as
instituições de ensino superior estenderão à comunidade, sob a forma de cursos e
serviços especiais, as atividades de ensino e os resultados da pesquisa que lhe são
inerentes”) e 40 ("[...] por meio de suas atividades de extensão proporcionarão aos
seus corpos discentes oportunidades de participação em programas de melhoria das
condições de vida da comunidade e no processo geral de desenvolvimento”),
constatou-se que as vinte e uma (21) IES do mapeamento preliminar para a escolha
da unidade de estudo têm poucos projetos extensionistas em comunidades de baixa
renda divulgados na área do design. Na maioria das instituições, foi mapeado apenas
um projeto dessa natureza. Algumas instituições sequer tinham projetos divulgados.
Além disso, ainda menor foi a quantidade de projetos extensionistas na pós-
graduação.
Frente a isso, salienta-se um cenário profícuo ainda não explorado pelos cursos
de design. Dado que as virtudes da área, em parte mencionadas anteriormente,
podem fomentar a qualidade de interferir na realidade com o propósito de gerar
transformações positivas, seria socialmente desejável uma atuação extensionista
mais forte dos cursos de design.
Após refletir sobre as questões mencionadas e ainda outras, chegou-se,
finalmente, à questão de pesquisa desta dissertação: Quais diretrizes para a atuação
do design na extensão universitária devem ser observadas?
Partiu-se do pressuposto de que o processo extensionista deve ser dialógico,
interdisciplinar e pautado por metodologias participativas. Também se considerou a
extensão um processo de ensino-aprendizagem diferenciado em que se constroem
competências através de ações para resolução de problemas do mundo real.
Especialmente quando acontece em comunidades de baixa renda, abre-se espaço
para a construção da cidadania no contato com questões sociais relevantes.
Além da questão acima formulada, durante o transcurso da investigação, a
seguinte questão se apresentou: Quais práticas e abordagens de projeto melhor
traduzem os valores da extensão universitária?
106
Seguiu-se uma investigação quanto às abordagens de design que melhor se
alinhavam aos princípios gerais da extensão e quanto a perspectivas teóricas de
ensino-aprendizagem na extensão.
Ao construir o referencial teórico e posteriormente o quadro de diretrizes para
análise, foram consideradas três dimensões presentes na questão de pesquisa: 1)
princípios gerais da extensão, 2) enfoques para o ensino-aprendizagem e 3)
perspectivas teóricas para a ação do Design na extensão universitária. Consoante a
isso, o quadro de análise foi composto por três grupos de diretrizes: "diretrizes para a
ação extensionista", "diretrizes de ensino-aprendizagem na extensão" e "diretrizes
para a ação do design na extensão".
O quadro foi construído principalmente com base em: Fórum… (2012); Síveres
(2013); Costa et al. (2013); Abranches (2014); Anastasiou e Alves (2006); Perrenoud
(1999); Thiollent (2003); Krippendorff (2000); Bonsiepe (2012); Spinuzzi (2005);
Sanders e Stappers (2008). No entanto, todas as referências citadas no texto, de uma
forma ou de outra, auxiliaram na reflexão sobre os tópicos.
Esse quadro de diretrizes foi utilizado para análise no estudo qualitativo
realizado em torno de um projeto extensionista de design; neste caso, a unidade de
estudo escolhida foi o projeto Design Social Aplicado: UniRitter & FGBS (DSA). Os
dados investigados provêm majoritariamente das entrevistas realizadas com
professores, estudantes e participantes da comunidade, sendo o respectivo conteúdo
analisado com base em cada uma das diretrizes.
A respeito das diretrizes para a ação extensionista, durante a análise dos dados
ressaltou-se a existência de um desconhecimento quanto ao conceito de extensão
universitária, especialmente da parte dos estudantes, para os quais a ação
extensionista é, em grande medida, uma oportunidade de colocar em prática os
conhecimentos da graduação. Essa percepção traduz um predomínio de atuação
prática, avaliado pelos estudantes como um dos pontos fortes do DSA.
Constatou-se que as interações dialógicas com a comunidade acontecem de
forma mais acentuada entre a equipe de design e os profissionais dos Bancos Sociais
participantes nos projetos. Esses momentos de diálogo mostram-se oportunos para
que os participantes se aproximem do processo de projeto e, ao mesmo tempo,
sintam-se reconhecidos e valorizados no seu papel. Quanto aos alunos, observou-se
107
que os momentos de entrega dos espaços seguidos do feedback dos usuários
desencadeiam uma motivação intrínseca para o trabalho.
O progressivo crescimento da interdisciplinaridade no DSA, com a soma de
quatro cursos, parece ter sido responsável por favorecer o contato com novos
conhecimentos, enriquecendo as vivências e os resultados dos projetos. Não por
acaso, para a área do design que é naturalmente interdisciplinar, quanto maior o
acesso a visões de cenário diferenciadas, mais próximo de uma visão de
complexidade estará o percurso de projeto. Em termos práticos, quanto mais recursos
são envolvidos, maior será o ganho para o processo e para as soluções dos problemas
de projeto.
Quanto à relação entre os eixos extensão, ensino e pesquisa, identificou-se um
empenho do Professor A para integrar os temas do DSA e de outros projetos de
pesquisa em disciplinas da graduação. Por outro lado, a ênfase na prática e na
experimentação, a relação dos estudantes com os usuários no mundo real e as
restrições do trabalho com reaproveitamento complementam o ensino de projeto na
sala de aula.
Relatos dos estudantes sobre o processo na fase de ideação sugerem que
apenas uma ferramenta de geração de ideias é utilizada, um tipo de brainstorming.
Essa fase poderia ser explorada a fim de unir ainda mais o ensino com o processo
projetual extensionista vivenciado pelos alunos, que é completo. Metodologia,
processo e noções de convergência e divergência e teste de novas ferramentas de
projeto poderiam ser assuntos discutidos e explorados pelos estudantes na forma de
breves oficinas com o envolvimento dos profissionais dos Bancos Sociais. Isso
reforçaria o eixo pedagógico estudante-professor-comunidade, ampliando os papeis
exercidos pelos estudantes.
Pelos relatos dos integrantes do DSA, presencia-se a extensão como um
processo coletivo de construção de competências através de ações que permitem
experiências para a formação profissional, convivência coletiva e construção da
cidadania. Há um enfoque na prática, na experimentação, na autonomia e na
criatividade pelo trabalho com materiais reutilizados, sendo o foco no usuário uma das
principais regras para a ação.
108
Sobre o emprego de abordagens de design por parte do DSA, identificou-se a
predominância de dois dos três tópicos para o design na extensão: design social e
design centrado no usuário. O tópico do design social destacou-se por contemplar
valores caros à abordagem, tais quais a sustentabilidade, a humanização dos espaços
e o incentivo à leitura, além do foco em setores sociais com carência de recursos. O
relato do Aluno G expressa o potencial que o design social tem de levar reflexão à
prática do design, considerando-se consequências sociais e ambientais da profissão
e prezando-se pela ética. Na experiência com projetos de design social, estudantes e
professores conhecem dificuldades vividas por boa parte da população. Há um senso
de propósito e um ganho pessoal que ultrapassam as situações de aprendizagem na
sala de aula e tocam questões existenciais importantes para a convivência coletiva, a
inclusão social e o exercício da cidadania.
Quanto às práticas participativas, verificou-se que não há estruturas
intencionais de suporte à profusão da participação. Os inputs com troca parecem
ocorrer de forma pouco elaborada, ainda que sejam momentos quase sempre
marcantes para os envolvidos. Cumpre dizer que, além de dinâmicos e relativamente
curtos, boa parte dos projetos desenvolvidos pelo DSA ocorrem em contextos
problemáticos, como postos de saúde e presídios, dificultando, sem dúvida, a criação
de situações de participação, todavia, talvez pudessem ser reforçadas na fase de
ideação. Frente a isso, percebe-se que o emprego de metodologias participativas no
design enfrenta certa falta de atenção, assim como limitações por vezes complexas
devido aos cenários em que se dão os projetos.
Considerando o que foi relatado, julga-se que através do quadro de diretrizes
foi possível analisar pontos importantes para projetos extensionistas de design.
Contudo, o tópico "impacto e transformação social", retirado das diretrizes da
categoria de extensão por razão da sua complexidade, mereceria uma atenção
especial em investigações sobre a atuação do design na extensão, visto que as
melhorias sociais são um dos objetivos das ações extensionistas. Nesse sentido, seria
adequado que os projetos desenvolvessem formas de avaliar essa questão.
Sendo assim, considera-se que as diretrizes propostas nesta pesquisa se
concentram mais fortemente nas trocas de conhecimento, nas questões de
participação e no impacto dos projetos extensionistas na vida dos estudantes,
109
professores e, em menor medida, dos participantes nas ações. Para a avaliação
desses quesitos, o quadro pareceu satisfatório. Atenta-se, enfim, para a necessidade
de se testar e rever o instrumento de entrevistas, que deve sofrer ajustes para um
melhor alinhamento com as diretrizes finais que foram definidas.
Além da proposição e teste do quadro de diretrizes, este trabalho intentou
contribuir para as reflexões gerais sobre a convergência entre extensão universitária
e design, tema que merece atenção mais acentuada. Finalmente, ressalta-se na
extensão a oportunidade de professores e estudantes realizarem projetos na área do
design social, aumentando no mundo a potência para transformações sociais
positivas. Sem dúvida, ao deparar-se com o desenvolvimento e ascensão do design
social como abordagem de projeto, Victor Papanek ficaria mais satisfeito pois veria os
designers projetando para o mundo real.
110
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115
APÊNDICE A — INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS PARA ENTREVISTA —
PROFESSORES
// Sobre o projeto => PROPOSTA/EQUIPE
1. Qual a história do projeto? Como aconteceu de você participar? 2. Há participação dos estudantes de qual nível? 3. Como ocorre a seleção dos estudantes? 4. Existe bolsas ou outro tipo de benefício financeiro para os estudantes? 5. Qual é o perfil dos alunos que participam?
// Sobre a Extensão => POLÍTICA/TOMADA DE CONSCIÊNCIA
1. O que a extensão universitária significa para você? 2. Como o projeto se liga às áreas temáticas e linhas de extensão estabelecidos
pelo FORPROEX? 3. Quais são os critérios adotados (por você ou pela instituição) para avaliar o
projeto? 4. Existe uma prestação de contas desses resultados? 5. Como ocorre a divulgação do projeto na sociedade?
// Processo e metodologias => METODOLOGIA DE PROJETO
1. Como ocorre o processo de trabalho (como se desenvolve o projeto na prática)?
2. Qual(is) o(s) método(s) que é(são) adotado(s)? Existe algum material de apoio? 3. Existe uma definição de papeis e responsabilidades aos participantes? Quais? 4. Como o processo é documentado e por quem? 5. Estas informações estão à disposição dos participantes? 6. Na sua opinião, que práticas poderiam ser acrescidas ou modificadas no
projeto? // Contato com a comunidade => PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE
1. Como chegam as demandas? 2. Há alguma conversa inicial com a comunidade sobre o propósito do projeto e
da atividade de extensão? Existem estratégias de sensibilização? 3. Eles participam de alguma decisão quanto aos direcionamentos do projeto? 4. Eles são envolvidos em algum processo de pesquisa? E de criação?
// Articulação de conhecimentos => INTERCÂMBIO DE SABERES
1. De que forma acontecem trocas entre saberes acadêmicos e populares no projeto?
2. O conhecimento popular é articulado de alguma forma nas práticas de design?
116
3. E quanto ao conhecimento do design, é socializado de algum modo para a comunidade? Como?
4. Me conte um momento em que aconteceu uma troca de conhecimentos. // Percepções pessoais => EXPERIÊNCIA PESSOAL
1. O que você mais gostou no projeto (o que aprendeu)? 2. Qual foi sua maior dificuldade? 3. Se pudesse mudar ou melhorar alguma coisa, o que mudaria? 4. Para você, qual a maior contribuição da atuação do Design na Extensão? 5. Diga 5 palavras que representam a sua experiência com o projeto.
117
APÊNDICE B — INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS PARA ENTREVISTA —
ESTUDANTES
- Idade, sexo, curso, semestre, quanto tempo de projeto Primeiro contato com a atividade de Extensão - MOTIVAÇÕES PARA PARTICIPAÇÃO
1. Como ficou sabendo do projeto? O que te levou a participar? 2. Você sabe o que significa um projeto de extensão? 3. Sabe qual o papel da extensão universitária? 4. Como acontece a integração da equipe?
Processo de projeto - METODOLOGIA DE PROJETO
1. Como é a atuação dos professores (até onde eles participam, como eles ajudam)?
2. Vocês seguem alguma metodologia ou abordagem de projeto? Qual? 3. Existe algum material de apoio? (livros, manuais, vídeos, toolkits…) 4. Como a equipe se organizou para desenvolver o projeto? 5. E como acontece o processo de criação? Vocês priorizaram os referenciais
culturais da comunidade? Contato com a comunidade - PARTICIPAÇÃO E TROCA COM A COMUNIDADE
1. Como é o contato com as comunidades para quem vocês projetam, há alguma conversa inicial coletiva?
2. Eles são envolvidos em algum processo de pesquisa? E de criação? 3. Me conte um momento em que você aprendeu algo na troca com a
comunidade. 4. O que mais chamou a atenção no contato e na relação entre vocês (equipe)
com eles? Articulação de conhecimentos - INTERCÂMBIO DE SABERES
1. Em que momentos do projeto os conhecimentos da graduação foram úteis? 2. Sobre a relação entre os trabalhos da faculdade e a prática com clientes
externos, qual o ganho de participar desse tipo de projeto? 3. O que você aprendeu que não aprenderia na sala de aula?
Percepções pessoais - OPINIÕES
1. O que você mais gosta no projeto? 2. Qual foi sua maior dificuldade? 3. Se pudesse mudar ou melhorar alguma coisa, o que mudaria? 4. Diga 5 palavras que representam a sua experiência com o projeto.
118
APÊNDICE C — INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS PARA ENTREVISTA —
COMUNIDADE
- Idade, sexo, profissão Primeiro contato com a atividade de Extensão - MOTIVAÇÕES PARA PARTICIPAÇÃO
1. Como ficou sabendo do projeto? 2. O que te levou a participar? 3. Sabe o que significa Extensão universitária? 4. Por que esse projeto é importante?
Contato com a equipe de design - SENSIBILIZAÇÃO
1. Sobre o contato com a equipe de design, houve alguma conversa inicial coletiva?
2. Como a equipe foi apresentada a vocês e vocês apresentados à equipe? 3. Me conte um momento em que você aprendeu algo na troca com a equipe. 4. O que mais chamou a atenção no contato e na relação entre vocês
(comunidade) com eles? Articulação de conhecimentos - PARTICIPAÇÃO NO PROCESSO
1. Como foi a sua participação no projeto? 2. Que momentos do seu dia a dia você tem contato com o tema do projeto? 3. O que você aprendeu participando do projeto? Participaria de outro? 4. O que você pensa sobre design hoje que antes não pensava?
Percepções pessoais - OPINIÕES
1. O que você mais gosta no projeto? 2. Qual foi sua maior dificuldade? 3. Se pudesse mudar ou melhorar alguma coisa, o que mudaria? 4. Diga 5 palavras que representam a sua experiência com o projeto.