fundamentos teóricos do pensamento matemático

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Fundamentos Teóricos do Pensamento Matemático Ana Márcia Fernandes Tucci de Carvalho Magna Natália Marin Pires Marilda Trecenti Gomes

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    Fundao Biblioteca NacionalISBN 978-85-387-0159-0

    Fundamentos Tericosdo Pensamento Matemtico

    Fundamentos Tericosdo Pensamento Matemtico

    Ana Mrcia Fernandes Tucci de CarvalhoMagna Natlia Marin PiresMarilda Trecenti Gomes

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  • Fundamentos Tericosdo Pensamento Matemtico

    Ana Mrcia Fernandes Tucci de CarvalhoMagna Natlia Marin PiresMarilda Trecenti Gomes

    2010

  • Mestre em Educao pela Universidade Federal do Paran (UFPR). Especialista em Educao Matemtica pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Licenciada em Matemtica pela UEL.

    Magna Natlia Marin Pires

    Mestre em Educao pela Universidade Federal do Paran (UFPR). Especialista em Educao Matemtica pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Graduada em Matemtica pelo Centro de Estudos Supe-riores de Londrina, em Qumica pela Fundao Faculdade Estadual de Filosofia, Cincias e Letras de Cornlio Procpio e em Cincias pela Univer-sidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho.

    Marilda Trecenti Gomes

    Doutora em Educao Matemtica pela Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho. Mestre em Matemtica pela Universidade Esta-dual de Campinas (Unicamp). Bacharel em Matemtica pela Unicamp.

    Ana Mrcia Fernandes Tucci de Carvalho

  • Sumrio

    Resoluo de problemas ....................................................... 15

    O que um problema? ............................................................................................................ 17

    Etapas para resoluo de problemas ................................................................................. 22

    A construo do conceito de nmero .............................. 31

    Classificao ................................................................................................................................ 31

    Seriao......................................................................................................................................... 33

    Correspondncia equivalncia numrica ..................................................................... 34

    Materiais que podem ser utilizados para as operaes de classificao e seriao ........................................................................................................... 36

    Conhecimento lgico-matemtico .................................... 45

    Conhecimento fsico ................................................................................................................ 45

    Conhecimento social ............................................................................................................... 45

    Conhecimento lgico-matemtico ..................................................................................... 46

    Abstrao emprica e abstrao reflexiva ......................................................................... 47

    O jogo ............................................................................................................................................ 49

    O desenvolvimento histrico do sistema de numerao decimal ................................................................. 55

    A inveno da base ................................................................................................................... 57

    Base 10 .......................................................................................................................................... 57

    O aparecimento do zero ......................................................................................................... 60

  • Discusso de processos e desenvolvimento histrico de algoritmos de algumas operaes fundamentais ....................................................... 69

    Ideias das quatro operaes fundamentais .................... 81

    Ideias da adio ......................................................................................................................... 81

    Ideias da subtrao ................................................................................................................... 82

    Mtodo da compensao na subtrao ........................................................................... 84

    Processo curto da diviso ....................................................................................................... 84

    Ideias da multiplicao ............................................................................................................ 86

    Ideias da diviso ......................................................................................................................... 86

    Compreenso dos nmeros racionais: fraes .............. 95

    Operaes com fraes ........................................................................................................... 97

    O conceito de fraes aplicado a todos contnuos .....................................................100

    O conceito de fraes aplicado a todos discretos .......................................................101

    Alguns obstculos ...................................................................................................................102

    Os decimais ..............................................................................109

    Comparao entre decimais ...............................................................................................111

    Operaes com decimais .....................................................................................................112

    A construo do pensamento geomtrico ...................123

    Alguns fatos histricos ..........................................................................................................123

    Sentido das medidas .............................................................137

    Grandezas mensurveis e no-mensurveis ................................................................140

    As medidas nas primeiras sries do Ensino Fundamental........................................140

    rea e permetro ....................................................................149

  • O pensamento algbrico .....................................................159

    Histrico ......................................................................................................................................159

    Concepes da lgebra ........................................................................................................160

    A lgebra nas sries iniciais do Ensino Fundamental ................................................162

    Atividades que colaboram no desenvolvimento do pensamento algbrico ....163

    Conceitos fundamentais da proporcionalidade .........175

    Grandezas diretamente proporcionais ............................................................................177

    Grandezas inversamente proporcionais .........................................................................178

    A proporcionalidade nas sries iniciais ...........................................................................179

    Introduo Estatstica ........................................................189

    Avaliao em Matemtica ...................................................201

    Aprender sem medo: o relacionamento afetivo entre aquele que ensina e aquele que aprende .........217

    O domnio afetivo ...................................................................................................................217

    O significado do afeto............................................................................................................221

    Desenvolver a dimenso afetiva ........................................................................................222

    A linguagem matemtica e os (des)encontros com a linguagem cotidiana ................................................229

    O problema da agncia de viagens linguagem natural versus linguagem matemtica .........................................................................................................230

    Os desencontros da linguagem matemtica ................................................................232

    Questes para refletir sobre a linguagem matemtica .............................................234

    Os problemas da soluo:dificuldades com a metodologia da resoluo de problemas ......243

    Os desafios da metodologia da resoluo de problemas ........................................243

    Problemas com a metodologiada resoluo de problemas ....................................244

  • Outras questes .......................................................................................................................248

    Sugestes de problemas ......................................................................................................249

    A Geometria Plana e a Geometria Espacial: o que vemos e o que vivemos ...........................................257

    Os povos antigos j sabiam .................................................................................................257

    Os problemas que encontramos hoje: dificuldades dos alunos e dos professores.....................................................................258

    Possibilidades metodolgicas e pedaggicas ..............................................................262

    Por que (1) x (1) = 1?: operaes com os nmeros inteiros ...............................269

    Nmeros relativos ...................................................................................................................269

    Por que (1) x (1) = 1? ..........................................................................................................272

    Gabarito .....................................................................................283

    Referncias ................................................................................297

  • Apresentao

    Caro EstudanteEssa obra aborda diversos contedos matemticos que so trabalhados

    nas sries iniciais do Ensino Fundamental. A inteno das autoras fazer uma reflexo, junto aos futuros professores destas sries, de forma a possibilitar a com-preenso de conceitos e significados presentes nos referidos contedos.

    O livro composto por vinte captulos.

    O primeiro captulo intitulado Resoluo de Problemas, discute uma estra-tgia de ensino que recomendado por currculos do mundo inteiro.

    O segundo captulo, A Construo do Conceito de Nmero, apresenta as operaes de classificao e seriao como fundamentais no processo de cons-truo do conceito de nmero.

    O terceiro captulo, Conhecimento Lgico-Matemtico, define conheci-mento fsico, conhecimento social e finalmente o conhecimento lgico-mate-mtico; aborda tambm a questo da abstrao emprica e a abstrao reflexiva, fatores importantes na construo de relaes.

    O quarto captulo, intitulado como O Desenvolvimento Histrico do Siste-ma de Numerao Decimal, aborda o sistema de numerao que usamos fazendo um breve relato do seu desenvolvimento histrico.

    O quinto captulo, Discusso de Processos e Desenvolvimento Histrico de Algoritmos de Algumas Operaes Fundamentais, mostra algumas formas de somar e multiplicar utilizadas por povos da antiguidade.

    O sexto captulo, Ideias das Quatro Operaes Fundamentais, chama a ateno do professor para as diferentes ideias que cada operao pode assumir, fator importante na construo do conhecimento matemtico.

    No stimo captulo, Compreenso dos Nmeros Racionais: Fraes, discu-te o conceito de fraes e procura justificar os procedimentos algortmicos das operaes realizadas com fraes.

    O oitavo captulo, Os Decimais, apresenta o nmero com vrgula e aborda as operaes fundamentais neste campo numrico.

    No nono captulo A Construo do Pensamento Geomtrico, so apresen-tados alguns elementos histricos da Geometria, apresenta esse campo da Mate-mtica valorizando a explorao de objetos e ambientes naturais.

  • O dcimo captulo, Sentido das Medidas, faz uma abordagem privilegiando o sig-nificado de medir, apresenta algumas unidades bsicas, associando-as com a utilizao no dia-a-dia.

    O dcimo primeiro captulo, intitulado rea e Permetro, apresenta a diferena entre esses dois conceitos e explora a rea de algumas figuras geomtricas.

    O dcimo segundo captulo, O Pensamento Algbrico, apresenta as vrias fases do desenvolvimento da lgebra e sugere caminhos para a abordagem desse contedo desde as sries iniciais do Ensino Fundamental.

    O dcimo terceiro captulo, Conceitos Fundamentais da Proporcionalidade, discu-te vrias estratgias de resoluo que podem ser utilizadas para resoluo de questes que envolvem esse contedo.

    O dcimo quarto captulo, intitulado Introduo Estatstica, apresenta as fases do mtodo estatstico assim como tabelas e grficos, elementos essenciais na aborda-gem desse assunto.

    O dcimo quinto captulo, Avaliao em Matemtica, procura fazer uma aborda-gem construtiva da avaliao e discute vrios instrumentos de avaliao.

    Os cinco ltimos captulos discutem questes que, de algum modo, podem difi-cultar o ensino-aprendizagem da Matemtica.

    O dcimo sexto captulo Aprender sem Medo, discute o relacionamento afetivo entre aquele que ensina e aquele que aprende. O dcimo stimo captulo, intitulado A Linguagem Matemtica e os (Des)Encontros com a Linguagem Cotidiana, mostra como essas duas formas de comunicao podem ser interpretadas pelos alunos.

    O dcimo oitavo captulo, Os problemas da Soluo, apresenta algumas dificulda-des com a metodologia de resoluo de problemas.

    O dcimo nono captulo, A Geometria Plana e a Geometria Espacial, apresenta pro-blemas mais comuns encontrados por estudantes quando estudam esses contedos.

    O vigsimo e ltimo captulo, Por que (-1) x (-1) =1? aborda operaes com nme-ros inteiros e discute algumas dificuldades encontradas para demonstrar alguns resulta-dos nesse campo da matemtica.

    Ao tratar das questes descritas anteriormente, o objetivo que voc, futuro pro-fessor, possa se embasar teoricamente para poder desenvolver a educao matemtica na sala de aula.

    As Autoras

  • Magna Natlia Marin Pires Marilda Trecenti Gomes

    [...] o verdadeiro prazer em estudar Matemtica o sentimento de alegria que vem da

    resoluo de um problema quanto mais difcil o problema, maior a satisfao.

    Thomas Butts

    Se pretendemos tornar a Matemtica til e prazerosa, acreditamos que a resoluo de problemas, uma das tendncias da educao matemtica, um excelente caminho para alcanarmos esse objetivo.

    A resoluo de problemas deve ser o ponto central de ateno do pro-fessor de Matemtica e os problemas devem ser o ponto-chave para o desenvolvimento dos contedos curriculares. Por meio dos problemas, os estudantes podem:

    investigar e compreender os contedos matemticos;

    desenvolver e aplicar estratgias para a resoluo dos mesmos;

    relacionar a Matemtica com situaes cotidianas;

    ver a Matemtica de forma atraente e desafiadora.

    Polya (1994) afirma que a resoluo de problemas foi a coluna verte-bral da instruo matemtica desde o Papiro de Rhind.

    Educadores matemticos acreditam ser necessrio que os alunos se tornem capazes de propor e resolver problemas, conhecer tcnicas diver-sas, compreender as implicaes matemticas de um problema, trabalhar em grupo para resolv-lo, aplicar ideias matemticas a problemas abertos, acreditar na importncia da resoluo de problemas para a real aprendiza-gem da Matemtica e na importncia desta para a vida cotidiana.

    Resoluo de problemas

  • 16

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Pretende-se que os alunos aprendam a valorizar a Matemtica, sentindo-se seguros em fazer Matemtica e em resolver problemas de todas as categorias. Que esses alunos possam comunicar-se por meio dessa cincia, aprender a ra-ciocinar matematicamente, formular hipteses e argumentar a validez de uma hiptese.

    Resolver problemas a razo principal de se aprender e ensinar Matemtica. por meio dessa prtica que se inicia o aluno no exerccio de pensar matemati-camente e nas aplicaes da Matemtica na Educao Bsica. Resolver proble-mas o processo de reorganizar conceitos e habilidades, aplicando-os a uma nova situao, atendendo a um objetivo. Ao resolver problemas, o aluno desen-volve determinadas estratgias que, em geral, se aplicam a um grande nmero de situaes. Dante (1995, p. 84) salienta que:

    aprender a resolver problemas matemticos deve ser o maior objetivo da instruo matemtica. Certamente outros objetivos da Matemtica devem ser procurados, mesmo para atingir o objetivo da competncia em resoluo de problemas. Desenvolver conceitos matemticos, princpios e algoritmos atravs de um conhecimento significativo e habilidoso importante. Mas o significado principal de aprender tais contedos matemticos ser capaz de us-los na construo das solues das situaes-problema.

    Ensinar a resolver problemas requer que o professor coloque os alunos frente a diferentes situaes. Ele deve encoraj-los a pensar por si mesmos, a levanta-rem suas prprias hipteses e a test-las, a discutirem com seus colegas como e por que determinada estratgia resolve ou no o problema.

    importante, tambm, que o professor considere dois fatores que desempe-nham papel fundamental na resoluo de problemas: os conceitos e as habilida-des da criana para encontrar a soluo. Esses fatores so construdos de acordo com o repertrio de problemas previamente resolvidos, da a importncia dos alunos resolverem uma variedade de problemas.

    Ao propor essas questes, o professor deve estar atento aos problemas mate-mticos que no tm como objetivo encontrar uma resposta numrica e, mesmo que se encontre essa resposta, apenas um ponto intermedirio nesse processo. Assim, essencial uma interpretao ou uma anlise da questo a ser resolvida.

    s vezes, um problema requer simplesmente que o aluno desenvolva um sis-tema de organizao dos dados de uma forma adequada ou que se traduza uma situao matemtica em uma linguagem mecnica eficiente. Ou ento o pro-blema exige que se crie uma unidade de medida ou um instrumento de maior preciso do que os dados pelos modelos usuais de medida.

  • Resoluo de problemas

    17

    O que um problema?Saviani (1999) coloca que uma questo por si s no caracteriza um proble-

    ma, mesmo que sua resposta seja desconhecida. O que caracteriza um problema aquela questo cuja resposta, alm de no ser conhecida, deseja-se conhecer.

    Em outras palavras, para que uma situao seja um problema, necessrio que o sujeito:

    esteja ciente dessa situao;

    esteja interessado em resolver essa situao;

    no tenha elementos necessrios para proceder diretamente.

    Para o professor realizar um trabalho coerente com a proposta da resoluo de problemas, necessrio que conhea a classificao de questes matemticas a seguir, segundo Butts (1980).

    Exerccios de reconhecimentoEsse tipo de exerccio verifica apenas se o estudante reconhece ou relembra

    um fato, uma definio ou um teorema.

    Exemplos:

    a) Assinale os desenhos que representam figuras planas.

    1 23 4

    Resposta: 1, 4.

    b) Circule os nmeros pares:

    95 160 12 355 1 002 501 2

    Resposta: 160, 12, 1 002, 2.

  • 18

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Exerccios algortmicosPodem ser resolvidos com um algoritmo especfico ou executando-se um

    procedimento passo a passo.

    Exemplos:

    a) Arme e efetue:

    32,7 + 1,34 =

    Resposta:

    32,7

    34,04

    + 1,34

    b) Resolva a seguinte equao do 1. grau:

    y + 4 8y = 23

    Resposta:

    7 y = 23 4

    7 y = 19

    y = 7

    19

    y = 7

    19

    Problemas de aplicaoNessa categoria, esto os tradicionais problemas de palavras cujas solues

    requerem que o estudante:

    faa a formulao simblica do problema;

    manipule essa formulao com algoritmos ou outros procedimentos j conhecidos, para ento obter a resposta.

  • Resoluo de problemas

    19

    Exemplos:

    a) Mame foi feira e gastou R$4,00 com verduras e R$5,00 com frutas. Com quanto voltou para casa se saiu com R$10,00?

    Resposta:

    Estratgia 1

    R$4,00 + R$5,00 = R$9,00

    R$10,00 R$9,00 = R$1,00

    Estratgia 2

    Chamaremos de X a quantidade de dinheiro que sobrou

    x + 5 + 4 = 10

    x + 9 = 10

    x = 10 9

    x = 1

    Ela voltou para casa com R$1,00.

    b) O dobro de um nmero somado a 7 igual a 13. Qual esse nmero?

    Resposta:

    Chamaremos o tal nmero de x.

    2 x + 7 = 13

    2 x = 13 7

    2 x = 6

    x = 26

    x = 3

    O nmero 3.

  • 20

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Problemas em abertoUm problema em aberto no contm, no enunciado, uma estratgia para sua

    resoluo. Porm, apresenta muitas vantagens, como a abordagem de diversos contedos matemticos num nico problema.

    Exemplos:

    a) Numa sala, com bancos de dois lugares, a diretora da escola reuniu um grupo de estudantes. Pediu que se sentassem de dois em dois nos ban-cos. Feito isso, sobraram 15 estudantes em p. Para que ningum ficas-se em p, a diretora pediu que os estudantes se sentassem de trs em trs nos bancos. Dessa forma, nenhum estudante ficou em p, mas cinco bancos ficaram vazios. Finalmente, ela pediu que os meninos se sentas-sem de dois em dois, ocupando a metade dos bancos, e que as meninas ocupassem a outra metade dos bancos, sentando-se de trs em trs. As-sim, nenhum estudante ficou em p e nenhum banco ficou vazio.

    Quantos so os estudantes? Quantas so as meninas? Quantos so os meninos? Quantos so os bancos?

    Resposta:

    Chamaremos de x o nmero de bancos e de y o nmero de estudantes.

    2 x + 15 = y2 . 30 + 15 = y60 + 15 = yy = 75 estudantes

    2 x + 15 = y3 x 15 = y

    2 x + 15 = 3 x 1515 = 3x 2x 1515 + 15 = xx = 30 bancos

    Tomemos H como meninos e M como meninas.

    H = 2

    2 x

    H = 2

    2 . 30

    H = 2

    60

    H = 30

    M = 2

    3 x

    M = 2

    3 . 30

    M = 2

    90

    M = 45

    30 meninos e 45 meninas, total de 75 alunos e 30 bancos.

  • Resoluo de problemas

    21

    b) O gavio chega a um pombal e diz:

    Adeus, minhas cem pombas!

    As pombas respondem em coro:

    Cem pombas no somos ns, com mais dois tantos de ns e com voc, meu caro gavio, cem pssaros seremos ento!

    Quantas pombas esto no pombal?

    Resposta:

    Estratgia 1

    100 1 = 99 (subtramos o gavio).

    99 : 3 = 33 (dividimos por 3 porque so a quantidade de pombas mais 2 tantos, ou seja, 3).

    Estratgia 2

    Chamaremos de x a quantidade de pombas que estamos procurando:

    x + 2 x + 1 = 100

    3 x = 100 1

    3 x = 99

    x = 3

    99

    x = 33

    Esto no pombal 33 pombas.

    importante ressaltar que a classificao dos problemas depende tambm do conhecimento do resolvedor. O problema das pombas, que foi apresentado anteriormente, pode ser classificado como problema de aplicao se o resolve-dor encontrar a soluo utizando uma equao do primeiro grau, por exemplo; porm, se o resolvedor utilizar outra estratgia, ele pode ser considerado como um problema em aberto.

  • 22

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Situaes-problemaNessa categoria no esto os problemas em si, mas situaes nas quais um

    dos passos principais identificar o problema inerente para, num passo se-guinte, resolv-lo. Outro passo importante testar se a soluo encontrada satisfatria. Caso no seja, o problema deve ser retomado e revisto, ou um novo problema deve ser identificado, e o processo deve ter continuao at que a soluo ideal se apresente.

    Exemplos:

    a) Esboce um estacionamento.

    b) Apresente a distribuio de alimentos para a merenda escolar de uma semana.

    Nota-se que as questes das duas primeiras categorias (exerccios de reconhecimento e exerccios algortmicos) exigem muito pouco dos alunos, no permitindo a explorao dos conhecimentos que eles trazem, nem o desenvol-vimento de sua criatividade. Dessa maneira, devem ser exploradas com menor intensidade, podendo ser utilizadas nos casos em que o professor deseja saber se o aluno conhece fatos especficos do contedo.

    Os problemas das trs ltimas categorias (problemas de aplicao, problemas em aberto e situaes-problema) permitem uma desenvoltura maior dos alunos, possibilitando ao professor uma viso mais abrangente do conhecimen-to deles.

    As categorias problemas em aberto e situaes-problema so as que mais pos-sibilitam reflexes, discusses e, consequentemente, aprendizado significativo.

    O conjunto de problemas encontrado nos livros de Matemtica no suficien-temente extenso, nem variado o bastante para dar ao aluno um conjunto adequa-do de questes. O professor pode complementar esses problemas com outros inventados por ele mesmo ou retirados de livros paradidticos ou peridicos da rea. Assim, pode organizar seu prprio repertrio, extenso e variado, com o objetivo de se preparar para o trabalho com problemas criativos e reais.

    Etapas para resoluo de problemasSegundo Polya (1994), para se obter sucesso na resoluo de problemas

    necessrio observar as seguintes etapas:

  • Resoluo de problemas

    23

    1. compreender o problema;

    2. elaborar um plano;

    3. executar o plano;

    4. fazer a verificao ou o retrospecto.

    Em cada etapa, o professor pode fazer questionamentos ou consideraes que ajudem os alunos na resoluo dos problemas, conforme os exemplos a seguir.

    Compreender o problema:a) O que se pede no problema?

    b) Quais so os dados e as condies do problema?

    c) possvel fazer uma figura, um esquema ou um diagrama?

    d) possvel estimar a resposta?

    Elaborar um plano:a) Qual o seu plano para resolver o problema?

    b) Que estratgia voc tentar?

    c) Voc se lembra de um problema semelhante que pode ajud-lo a resol-ver este?

    d) Tente organizar os dados em tabelas e grficos.

    e) Tente resolver o problema por partes.

    Executar o plano:a) Execute o plano elaborado, verificando-o passo a passo.

    b) Efetue todos os clculos indicados no plano.

    c) Execute todas as estratgias pensadas, obtendo vrias maneiras de resol-ver o mesmo problema.

  • 24

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Fazer retrospecto ou verificao:a) Examine se a soluo obtida est correta.

    b) Existe outra maneira de resolver o problema proposto?

    c) possvel usar o mtodo empregado para resolver problemas semelhan-tes?

    Desse modo, em uma aula de resoluo de problemas, o professor deve fazer o papel de incentivador e moderador das ideias geradas pelos alunos. Agindo assim, os alunos participam ativamente, fazendo Matemtica, e no passiva-mente, observando a Matemtica ser feita pelo professor.

    Uma grande descoberta resolve um grande problema, mas h sempre uma pitada de descoberta na resoluo de qualquer problema. Este pode ser modesto, mas se desafiar a curiosidade e puser em jogo as faculdades inventivas, quem o resolver por seus prprios meios experimentar a tenso e gozar o triunfo da descoberta. Experincias tais, numa idade susceptvel, podero gerar o gosto pelo trabalho mental e deixar, por toda a vida, a sua marca na mente e no carter. (POLYA, 1994, p. 48)

    O professor deve apresentar aos alunos problemas desafiadores, reais e interessantes, que no sejam resolvidos diretamente por um ou mais algoritmos. necessrio, tambm, que seja dado um tempo razovel para que leiam e compre-endam o problema, certificando-se de que foi entendido por todos. Infelizmente, uma das maiores dificuldades do aluno ao resolver um problema o momento de leitura e compreenso do texto.

    Deve-se criar, entre os alunos, um clima de busca, explorao e descoberta, deixando claro que o mais importante para obter a resposta correta pensar e trabalhar no problema durante o tempo necessrio para resolv-lo.

    O professor precisa trabalhar no sentido de focalizar, enfatizar e valorizar a anlise do problema, os procedimentos que podem levar soluo e reviso da soluo obtida, e no, simplesmente, enfatizar a resposta correta.

    Acertar a resposta no , necessariamente, o mais importante na resoluo de problemas. bom para o aluno saber o que fez e como fez, e por que sua ao foi apropriada ou no. Isso deve ser parte integrante da etapa de retrospecto e verificao da resoluo.

    Primordialmente, deve-se incentivar os alunos a pensar. Assim, a funo de orientador e facilitador da aprendizagem realizar-se- mais facilmente, poden-do-se perceber como pensam e encaminham a soluo do problema, que es-

  • Resoluo de problemas

    25

    tratgias tentam usar, que dificuldades precisam superar etc. O professor, dis-cretamente, pode propiciar aos alunos ideias brilhantes, fazendo com que se lembrem de fatos e os utilizem adequadamente. importante proporcionar ao aluno a satisfao de t-las obtido. Alunos resolvedores de problemas se sentem seguros e, em geral, demonstram grande interesse pela Matemtica.

    Texto complementar

    Sobre a resoluo de problemas(BURIASCO, 1995, p. 1)

    Uma das atuais grandes tendncias da Educao Matemtica a resolu-o de problemas, assim chamada porque considera que o estudo da Ma-temtica resolver problemas. Segundo ela, o ensino da Matemtica deve ser desenvolvido sempre partindo de problemas. Examinemos o quadro abaixo:

    Esquema de aula

    na tendncia tradicional

    Esquema de aula

    na tendncia de resoluo de problemasO professor explica a matria (teoria).

    O professor apresenta um problema escolhido por ele ou pelo(s) aluno(s).

    O professor mostra exemplos. Os alunos tentam resolver o problema com o conhe-cimento que possuem.

    O professor prope exerccios semelhantes aos exemplos dados para que os alunos resolvam.

    Quando os alunos encontram algum obstculo (falta de algum contedo necessrio para a resoluo do problema), o professor apresenta, de alguma forma, esse contedo.

    O professor (ou um aluno) resolve no quadro-de-giz os exerccios.

    Resolvido o problema, os alunos discutem sua so-luo; se necessrio, com a ajuda do professor. Essa discusso envolve todos os aspectos da resoluo do problema, inclusive os do contedo necessrio.

    O professor prope aos alunos outros exerccios j no to se-melhantes aos exemplos que ele resolveu.

    O professor apresenta outro problema escolhido por ele ou pelo(s) aluno(s).

  • 26

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Esquema de aula

    na tendncia tradicional

    Esquema de aula

    na tendncia de resoluo de problemas

    O professor (ou um aluno) resolve os exerccios no quadro-de-giz.

    O professor prope problemas, se for o caso, ou mais exerccios.

    Correo dos problemas e dos exerccios.

    O professor comea outro assunto.

    De acordo com essa tendncia, o prazer em estudar Matemtica a ale-gria de resolver um problema, de sorte que, quanto maior a dificuldade na resoluo, maior a satisfao.

    Na proposta de ensinar Matemtica por meio da resoluo de problemas, uma das questes mais importantes como apresentar um problema, de modo que os alunos:

    queiram resolv-lo;

    compreendam e retenham o contedo envolvido na sua resoluo.

    Se o estudo da Matemtica resolver problemas, ento incumbncia do professor, nas aulas de Matemtica, ensinar a arte de resolv-los.

    Dicas de estudoLer o livro: Didtica da Resoluo de Problemas de Matemtica

    Autor: Luiz Roberto Dante.

    Editora: tica.

    A obra explora um pouco sobre a teoria de Resoluo de Problemas e depois apresenta uma coletnea de problemas interessantes que podem ser trabalha-dos desde a pr-escola.

  • Resoluo de problemas

    27

    Atividades1. Classifique os seguintes problemas segundo as categorias de Thomas Butts.

    a) Quantas lajotas quadradas, de 30cm de lado, preciso para ladrilhar uma varanda de 10m de comprimento por 6m de largura?

    b) Construa, em um material parte, a maquete de um campo de futebol.

    c) Utilizando medidas inteiras, encontre dez retngulos que tenham per-metro igual a 80cm.

    d) O tringulo que possui um ngulo de 90 chamado:

    e) Quais so os valores de n para 7n + 4 > 8?

    2. Dez moedas esto dispostas formando um tringulo, como na figura I. Movi-mentando apenas trs moedas, obtenha a formao triangular da figura II.

    Figura I Figura II

  • 28

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    3. O nmero 30 pode ser expresso por 5 x 5 + 5. Agora, expresse:

    a) o nmero 100, usando quatro vezes o algarismo 9;

    b) o nmero 34, usando quatro vezes o algarismo 3;

    c) o nmero 31, usando somente o algarismo 3, quantas vezes queira.

  • Resoluo de problemas

    29

  • Magna Natlia Marin Pires Marilda Trecenti Gomes

    Os nmeros so frequentemente utilizados no nosso dia-a-dia. Mas, afinal, o que nmero?

    As concepes de nmero variam de acordo com as diferentes escolas matemticas. Consideremos o conceito de nmero como resultado da sn-tese da operao de classificao e da operao de seriao, um nmero a classe formada por todos os conjuntos que tm a mesma proprieda-de numrica e que ocupam um lugar numa srie considerada tambm a partir da propriedade numrica. Assim, a classificao e a seriao se fundem no conceito de nmero.

    Essa anlise nos permite compreender o processo por meio do qual as crianas constroem este conceito to importante o de nmero. A com-preenso desse processo pode garantir aos professores as decises did-ticas a serem tomadas ao ensinarem seus alunos de acordo com as suas necessidades e caractersticas psicolgicas.

    Mas o que a operao de classificao e a de seriao?

    ClassificaoA classificao uma operao lgica, fundamental no desenvolvimen-

    to do pensamento, de forma que sua importncia no se refere apenas sua relao com o conceito de nmero, pois intervm na construo de todos os conceitos que constituem a estrutura intelectual humana.

    Classificar juntar por semelhanas e separar por diferenas.

    Podemos exemplificar uma operao de classificao quando dizemos gosto de ces, pois estamos juntando animais que apresentam certas

    A construo do conceito de nmero

  • 32

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    qualidades, separando-os de outros que no as tm como os gatos. Um outro exemplo pode ser cidades paranaenses. Nesse caso, estou juntando cidades que esto localizadas no estado do Paran, e separando daquelas localizadas em outros estados.

    Nos dois exemplos acima, estamos classificando a partir de um universo, e esse universo j implica um ato classificatrio, porque difere de outros universos que no so, no caso, nem de ces, nem de cidades paranaenses. Nessa exem-plificao, o termo separar ou juntar no de forma efetiva ou visvel, mas de forma interiorizada, pois no juntamos realmente, tampouco separamos.

    No realizamos o ato classificatrio apenas de forma interiorizada, mas de forma efetiva, concreta, como quando separamos em uma estante livros e revis-tas, ou alimentos nas prateleiras da geladeira, roupas nas gavetas.

    A pertinncia e a incluso so dois outros tipos de relao que aparecem na classificao, alm das semelhanas e diferenas. A pertinncia a relao estabelecida entre cada elemento e a classe da qual ele faz parte. A pertinn-cia est fundamentada na semelhana. Dizemos que um elemento pertence a uma classe quando se parece com os demais elementos dessa mesma classe em funo do critrio de classificao adotado.

    A incluso a relao que se estabelece entre cada subclasse e a classe da qual esta uma parte, de tal forma que se pode verificar que a classe tem mais elementos que a subclasse. Na incluso hierrquica, compreende-se que inclui um em dois, dois em trs e assim por diante. Outro exemplo de incluso que rosas e jasmins incluem-se na classe de flores.

    E qual a relao das operaes de classificao e seriao e o conceito de nmero?

    A classificao se fundamenta na qualidade dos objetos, ou seja, nas suas propriedades qualitativas. Adultos quando pensam no nmero sete, por exem-plo, podem estar pensando em sete casas, sete pessoas, sete balas, ou seja, sete qualquer coisa, incluindo sete coisas que podem ser diferentes entre si, como um homem, uma mulher, um lpis, uma flor, uma mesa, uma rgua e um gato.

    Ao pensar em um nmero, estamos fazendo classificao, ou seja, estabelecen-do semelhanas e diferenas e, nesse caso, separando todos os conjuntos que tm sete elementos dos conjuntos que no tm sete elementos. No caso do nmero, buscamos semelhana entre os conjuntos e no entre os elementos. Juntamos os conjuntos que so equivalentes em sua propriedade numrica. Assim, no im-

  • A construo do conceito de nmero

    33

    porta se h ou no semelhana qualitativa entre os elementos que constituem o conjunto, importando apenas a equivalncia numrica entre os conjuntos que constituem a classe que estamos pensando a dos infinitos conjuntos de sete ele-mentos. A classe de todos os conjuntos de sete elementos constitui o nmero 7.

    SeriaoSeriar ordenar diferenas, estabelecer relaes entre elementos que dife-

    rem em certos aspectos.

    A seriao, assim como a classificao, constitui aspecto importante do pensamento lgico.

    Normalmente, seriam os sons de acordo com o timbre, ordenando-os do mais agudo ao mais grave; cdulas de valores diferentes, de menor valor para a que vale mais; veculos com diferentes datas de produo, do mais antigo ao mais moderno etc. Podemos fazer isso na ordem crescente ou decrescente.

    A seriao tem como propriedades fundamentais a transitividade e a recipro-cidade. Quando se estabelece uma relao entre um elemento de uma srie e o seguinte e deste com o posterior, pode-se deduzir a relao entre o primeiro e o ltimo elemento dessa srie. Dizemos que essa uma relao de transitividade. Exemplo: se um veculo A mais antigo que B, e B mais antigo que C, ento A mais antigo que C. A concluso pode ser feita a partir das relaes que estabe-lecemos anteriormente.

    Na propriedade de reciprocidade, cada elemento de uma srie tem uma re-lao tal com o elemento imediato que, ao inverter a ordem da comparao, tal relao tambm se inverte. Se A um automvel mais antigo do que o autom-vel B, ento B um automvel mais moderno que o A. As seriaes, assim como as classificaes, tambm podem ser realizadas de forma interiorizada.

    Ao seriarmos um nmero, o que estamos seriando? Estamos seriando classes de conjuntos, e no elementos ou conjuntos particulares, estabelecendo uma relao entre as classes de tal forma que, se ordenadas na ordem crescente, a classe do quatro estar antes da classe do cinco e esta antes da classe do seis, que por sua vez estar antes da classe do sete e assim por diante. Se ordenadas na ordem decrescente, a classe do sete estaria antes da classe do seis e esta, antes da classe do cinco etc.

  • 34

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    O conceito de nmero se deriva das operaes lgicas de classificao e seriao, no se reduzindo apenas a uma delas. O importante que a fuso da classificao e da seriao se apresenta no caso do conceito de nmero. No en-tanto, no terreno qualitativo, no se seria e se classifica ao mesmo tempo.

    Segundo Piaget, (apud KAMII,1986) o nmero uma construo mental. Ele construdo pela repetida adio de 1, e com isso a adio j est includa na construo numrica pela criana. A teoria do nmero, segundo o autor citado, entendida no contexto epistemolgico no qual ele trabalhou.

    Piaget percebeu elementos verdadeiros e no-verdadeiros tanto na corren-te dos racionalistas, como na corrente dos empiristas. Para a primeira corrente, a razo mais poderosa do que a experincia sensorial; para os empiristas, o conhecimento tem sua fonte fora do indivduo e interiorizado por meio dos sentidos.

    Em seus estudos, Piaget dava importncia tanto informao sensorial como razo, mas recaiu sobre o racionalismo. Nas suas pesquisas com crianas, sentiu-se motivado a provar a inadequabilidade do empiricismo, apresentando provas de conservao nas crianas, (por exemplo, prova de conservao numrica). Piaget contrrio teoria que diz que o conceito de nmero possa ser ensinado por transmisso social (para mais detalhes, ver KAMII, 1986).

    Correspondncia equivalncia numricaA correspondncia biunvoca ou termo a termo a operao por meio da

    qual se estabelece uma relao um a um entre elementos de dois ou mais con-juntos com a inteno de compar-los quantitativamente.

    Segundo Duhalde e Cuberes (1998), por meio da resoluo de problemas do cotidiano que se constri o aprendizado significativo da Matemtica. dessa forma que se constri o conceito de nmero. A utilidade do nmero est ligada aos seus aspectos de cardinalidade e de ordinalidade:

    a quantidade de elementos de uma coleo se refere cardinalidade, na qual a ao de correspondncia, sem a necessidade de contagem, coloca esse conjunto em correspondncia a outro conjunto;

    o lugar que o nmero ocupa dentro de uma srie ordenada se refere ordinalidade, sendo necessria uma ordem que permite a contagem.

  • A construo do conceito de nmero

    35

    O desenvolvimento do conceito de nmero pode se dar por meio da ao de contar, que tem grande importncia na educao matemtica das crianas, sendo que, para concretizar o processo de contar, indispensvel recorrer srie numrica oral e srie numrica escrita. Muitas so as crianas que, em idade pr-escolar, contam at cem. No entanto, no descobriram que cem significa duas vezes cinquenta, um dcimo de mil, dez vezes dez etc. As crianas, nessa fase, segundo as autoras citadas anteriormente, passam por trs etapas:

    na primeira, a criana se expressa de forma oral;

    a segunda etapa se refere aos aspectos algortmicos da escrita a criana descobre as regras da sucesso oral e escrita;

    na terceira, as crianas comeam a construir agrupamentos de dez, perce- bem as regras do sistema posicional de numerao e valor posicional.

    As crianas, desde muito pequenas, por volta dos dois anos de idade, so capazes de contar at dois, trs, ou pouco mais. No entanto, s vezes, quando prosseguem na contagem, comum omitirem alguns nmeros. As crianas variam nessa contagem de acordo com o meio socioeconmico e cultural no qual vivem. Certas crianas, ao contar at vinte e nove, dizem, para o prximo nmero, vinte e dez, e assim por diante. Se forem corrigidas, podero continuar dizendo trinta e um, trinta e dois e sucessivamente, assim como usam dez e um, dez e dois, para os nmeros onze e doze, respectivamente.

    A criana que diz que quatro maior que trs pode estar fazendo uso da srie oral, percebendo que o que vem depois sempre maior que o anterior, podendo ser capaz de comparar conjuntos prximos. A srie oral tambm permite separar uma quantidade da outra.

    Quando solicitado que separem quatro dos oito objetos de um conjunto, as crianas, normalmente, contam todos e nem sempre conseguem cumprir a tarefa, uma vez que para isso precisariam deter-se quantidade solicitada, assinar um nome da srie a cada um dos objetos e reter o processo no momento em que alcana a quantidade solicitada.

    s vezes, ao solicitar a uma criana que conte um conjunto de elementos, possvel que ela conte um, dois, trs, e assim por diante at o ltimo. Porm, quando perguntado quantos so os objetos, ela inicia a contagem novamente sem dizer que so seis, por exemplo, quantificando o conjunto solicitado. Nesse caso, designa cada objeto com o nome de um nmero, no se dando conta do princpio de cardinalidade.

  • 36

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Pode-se dizer que uma criana conta corretamente quando estabelece a cor-respondncia um a um, mantm a ordem das palavras numricas, conta cada objeto uma s vez sem omitir nenhum e considera que o ltimo nmero men-cionado representa a quantidade total de elementos do conjunto, independen-do da ordem em que os elementos foram enumerados.

    Materiais que podem ser utilizados para as operaes de classificao e seriao

    Usualmente crianas costumam colecionar pedrinhas, conchinhas, tam-pinhas, etc. Muitas vezes elas, naturalmente, classificam e/ou seriam algumas dessas colees.

    Um dos materiais adequados para a operao de classificao so os chama-dos Blocos Lgicos.

    Div

    ulga

    o:

    Tro

    lolo

    .

    Disponvel em:

    Blocos lgicosAs peas que constituem o material conhecido como blocos lgicos so peas

    com 4 caractersticas:

    cor,

    tamanho,

    espessura e

    forma geomtrica.

  • A construo do conceito de nmero

    37

    Os blocos lgicos tm peas nas cores: vermelha, amarela e azul. Elas ainda so de dois diferentes tamanhos: a grande e a pequena. Possuem duas espes-suras, a grossa e a fina. Relativo s formas geomtricas, o conjunto dos blocos lgicos possui peas nas formas: retangular, circular, triangular e retangular.

    Os blocos lgicos so constitudos de peas com esses 4 atributos: 3 cores, 2 espessuras, 2 tamanhos e 4 formas; tm num total 48 peas, pois combinados esses atributos podemos representar o nmero de peas por:

    3 x 2 x 2 x 4 = 48

    As crianas aprendem melhor por meio de suas prprias aes e, assim, podem classificar as peas dos blocos lgicos quanto a sua cor, quanto a sua espessura, forma e tamanho. comum observar crianas classificando, ou seja, juntando as peas que tm cantos e separando-as das peas circulares porque estas no tm cantos, isto , daquelas que no tm vrtices.

    As crianas devem ser estimuladas por professores ou adultos a classificar outros objetos, uma vez que a operao de classificao, assim como a opera-o de seriao, proporciona papel fundamental na construo do pensamento lgico, portanto, na construo do conceito de nmero.

    Outros objetos j citados tambm podem ser utilizados para proporcionar s crianas a condio de realizarem a operao de classificao, como: botes, pedrinhas, tampinhas etc. importante solicitar s crianas que classifiquem objetos e depois que expliquem qual foi o critrio que utilizaram para essa clas-sificao. As crianas podem classificar um mesmo conjunto de objetos usando diferentes variveis (atributos).

    As conchas, botes, pedrinhas etc. podem ser utilizadas para realizar seria-o. Esses materiais podem ser ordenados na forma crescente ou decrescente de tamanho, aspereza, ou outra propriedade. Quando as crianas esto desen-volvendo tais atividades, tm a possibilidade de construir conhecimento social, ao aprender o nome do tipo de rochas; fsico, ao sentir a aspereza, peso etc; e conhecimento lgico-matemtico, ao reconhecer sua cor, por exemplo.

    O que professores no devem esquecer que as crianas, ao ingressarem na escola, j construram muitos conhecimentos, que devem ser levados em conta. A criana traz consigo conhecimentos informais e cabe escola estabelecer re-lao cognitiva com esses conhecimentos previamente construdos. papel da

  • 38

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    escola contribuir para que a criana construa significados, faa generalizaes, comparaes, enfim, a escola deve ser um lugar onde a criana sinta prazer, pois l ela tem a possibilidade de reinventar e descobrir.

    Crianas iniciam a construo do conceito de nmero ainda quando bem pequenas, e na escola esse processo tem continuidade. As oportunidades de realizarem as operaes de classificao e seriao ofertadas pelos professores proporcionam s crianas uma das grandes realizaes que a de contar quan-tidades. Sempre se observa como enorme a alegria das crianas quando estas aprendem a ler e escrever, e no diferente quando aprendem a contar.

    Acreditamos que os conhecimentos relativos Matemtica so para todos e que eles auxiliam nas relaes feitas por aqueles que os construram com os demais conhecimentos das demais reas do conhecimento.

    Texto complementar

    Prova de conservao do nmeroConservao do nmero a habilidade de deduzir (por meio da razo)

    que a quantidade da coleo permanea a mesma quando a aparncia em-prica dos objetos muda1 (INHELDER; SINCLAIR; BOVET apud KAMII, 1986).

    MtodoMateriais1.

    20 fichas vermelhas

    20 fichas azuis

    Procedimento2.

    a) Igualdade

    1 Pela descrio dada, as entrevistas podem parecer padroni zadas. Cada entrevista deve ser adaptada ao assunto em particular, especial-mente com referncia compreenso dos termos usados em quantificao.

  • A construo do conceito de nmero

    39

    O pesquisador coloca uma fila de 8 fichas azuis (no mnimo 7)2 e pede criana que ponha o mesmo nmero de fichas vermelhas, dizendo ponha tantas fichas vermelhas quanto as azuis que coloquei (exata-mente o mesmo nmero, nem mais nem menos).

    A resposta da criana registrada em seu relatrio. Se necessrio, co-locam-se as fichas azuis e vermelhas na correspondncia uma a uma e pergunta-se criana se h igual nmero de fichas azuis e vermelhas.

    b) Conservao

    O pesquisador modifica a disposio diante dos olhos atentos da criana, espaando as fichas de uma das filas ou pondo-as juntas, como mostra a figura:

    Azul

    Vermelho

    As prximas perguntas so: H o mesmo nmero de fichas azuis e vermelhas, ou h mais aqui (azuis) do que aqui (vermelhas)? Como voc sabe?

    c) Contra-argumentao

    Se a criana deu a resposta certa ento a pessoa diz: Olhe como essa linha comprida. Outra criana disse h mais fichas aqui porque essa fila mais comprida. Quem est certa, voc ou a outra criana?

    Se, por outro lado, a criana deu a resposta errada, a pessoa lembra da igualdade inicial: Mas voc no se lembra que pusemos antes as fichas azuis em frente de cada vermelha? Outra criana disse que h o mesmo nmero de vermelhas e azuis agora. Quem voc acha que est certa, voc ou a outra criana?

    2 Piaget se referiu a pequenos nme ros at 4 ou 5 como nmeros perceptuais, porque nmeros pequenos como oo e ooo podem facil-mente ser diferenciados numa olhada. Contudo, quando so apresentados 7 objetos impossvel distinguir ooooooo s por percepo.

  • 40

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    DescobertasNo estgio I, a criana no consegue fazer um conjunto com o mesmo 1. nmero. desnecessrio dizer que ela tambm no consegue conser-var a igualdade dos dois conjuntos. Algumas crianas puseram todas as fichas vermelhas linearmente como mostra a figura (a). Elas s pa-raram de coloc-las porque as fichas acabaram. A figura (b) mostra a resposta melhor elaborada dentro do estgio I. As crianas que fazem isso no colocam o mesmo nmero, mas cuidadosamente usam as ex-tremidades da fichas como um critrio para decidir a igualdade das duas quantidades. Quando as crianas ainda no construram as pri-meiras estruturas mentais do nmero, usam o melhor critrio no qual puderam pensar; no caso, as extremidades das duas filas.

    a) azul

    vermelho

    b) azul

    vermelho

    extremidade extremidade

    No estgio II, 4-5 anos de idade, a criana pode fazer um conjunto que 2. tem o mesmo nmero, mas no consegue conservar a igualdade.3 Quan-do a pesquisadora lhe faz a pergunta sobre essa conservao ela diz, por exemplo: H mais vermelhas porque as azuis esto todas espremidas.

    No estgio III as crianas so conservadoras. Elas do respostas corre-3. tas para todas as questes, no so influenciadas por contrassugesto e do um ou mais dos seguintes argumentos para explicar por que acham que as duas filas tm a mesma quantidade:

    3 As idades mencionadas so aproximadas. Variam com a estrutura cultural e educacional das crianas.

  • A construo do conceito de nmero

    41

    H o mesmo nmero de fichas azuis e vermelhas que antes porque no tirou nenhuma ficha, elas esto apenas amontoadas (argumento--identidade).

    Pudemos pr todas as fichas vermelhas como estavam antes, assim no h nem mais azuis nem vermelhas (argumento-reversibilidade).

    Aqui as vermelhas formam uma fila mais comprida, mas h espao en- tre elas; assim, d no mesmo (argumento-compensao).

    Conservao no uma coisa que se consegue da noite para o dia e en- tre os estgios II e III h um estgio intermedirio. Crianas nesse est-gio do a resposta correta a apenas uma das perguntas quando se faz uma fila mais comprida e subsequentemente a outra mais comprida, ou eles hesitam e/ou continuam mudando de ideia (h mais azuis..., no, mais vermelhas, ...h a mesma coisa...). Mesmo quando estas crianas do respostas certas, no conseguem justific-las adequadamente.

    Por que difcil para a criana a conservao no estgio II e por que ela consegue isso mais tarde? Para responder a essa pergunta precisamos dis-cutir a concepo de nmero de Piaget no contexto da distino que ele fez entre trs tipos de conhecimentos: fsico, lgico-matemtico e social (con-vencional). Ele os classificou de acordo com suas fontes bsicas e modos de estruturao. Nmero um exemplo de conhecimento lgico-matemtico. Discutiremos o aspecto lgico-matemtico do nmero, primeiro comparan-do com o conhecimento fsico e depois com o social (convencional).

    Conhecimento fsico e lgico-matemtico so os dois tipos principais de conhecimentos tidos por Piaget. Conhecimento fsico o conhecimento dos objetos na realidade externa. A cor e o peso de uma ficha so exemplos de propriedades fsicas que fazem parte dos objetos e podem ser notadas pela observao. Saber que uma ficha cair quando a jogamos no ar tambm um exemplo de conhecimento fsico.

    Conhecimento lgico-matemtico, por outro lado, consiste em relaciona-mentos feitos pelo indivduo. Por exemplo, quando nos mostram uma ficha vermelha e uma azul e notamos que so diferentes; essa diferena um exemplo do fundamento do conhecimento lgico-matemtico. Na verdade, podemos observar as fichas, mas a diferena entre elas no. A diferena

  • 42

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    uma relao criada mentalmente pelo indivduo que faz o relacionamento entre os dois objetos. A diferena no est na ficha vermelha ou na azul e se uma pessoa no puser os dois objetos dentro dessa relao, a diferena no existir para ela.

    Outros exemplos de relaes que o indivduo pode fazer entre as fichas: semelhana, igualdade em peso e dois. Tanto certo dizer que as fichas so semelhantes como diferentes. A relao que um indivduo faz depende dele. Sob um certo ponto de vista, as fichas so diferentes e, sob outro, so semelhantes. Se o indivduo quiser comparar peso, pode dizer que as fichas so iguais (em peso). Se ele quiser ver os objetos numericamente dir que so dois. Pode-se observar as duas fichas, mas no o 2. Nmero uma relao criada mentalmente pelo indivduo4.

    A criana segue adiante para construir o conhecimento lgico-matemti-co coordenando as simples relaes que ela criou antes entre os objetos. Por exemplo, coordenando as relaes igual, diferente e mais, a criana se torna capaz de deduzir que h mais fichas no mundo do que somente fichas verme-lhas, da mesma forma que h mais animais do que vacas. Da mesma forma, coordenando a relao entre 2 e 2 ela deduz que 2 + 2 = 4 e 2 x 2 = 4.

    Piaget, assim, reconheceu fontes externas e internas de conhecimento. A fonte do conhecimento fsico (assim como social) e em parte,5 externa ao indivduo. A fonte de conhecimento lgico-matemtico, ao contrrio, in-terna. Essa afirmao ser esclarecida pela discusso sobre dois tipos de abs-trao atravs dos quais a criana constri o conhecimento fsico e lgico- -matemtico.

    4 Eu digo que 2 no um bom nmero para ilustrar a natureza lgico-matemtica do nmero. Piaget fez uma distino entre nmeros perceptuais e nmeros. Nmeros perceptuais so nmeros pequenos, at 4 ou 5, que podem ser distinguidos por percepo, sem neces-sitar da estrutura lgico-matemtica. At alguns pssaros podem ser treinados para distinguir entre oo e ooo. Con tudo, a distino entre ooooooo e oooooooo impossvel por percepo. Nmeros pequenos maiores do que 4 ou 5 so chamados nmeros elementares. O tra-balho de conservao descrito acima usa 7 ou 8 objetos e envolve nmero elementar. Embora 2 seja um nmero perceptual, tambm pode ser um nmero lgico-mate mtico para um adulto que j construiu o sistema inteiro de n meros lgico-matemticos. Escolhi o nmero 2 nesse exemplo apesar do problema de nmeros perceptuais porque, com 2 fichas, posso ilustrar outros relacionamentos simples, tais como dife rente, igual e igual em peso.5 Meu motivo para dizer em parte se torna claro quando discuto os termos abstrao emp rica e reflexiva.

    Dicas de estudoLer o livro: A Criana e o Nmero.

    Autora: Constance Kamii.

  • A construo do conceito de nmero

    43

    Editora: Papirus.

    A autora apresenta uma anlise fundamentada na teoria de Piaget sobre as relaes da criana com o nmero.

    Atividades1. Discuta como a classificao e a seriao se fundem no conceito de nmero.

    Registre as concluses.

    2. Quais so as propriedades fundamentais da seriao? Exemplifique cada uma usando o conjunto dos nmeros naturais.

    3. Qual a relao existente entre a cardinalidade e a ordinalidade dos nmeros na construo do conceito de nmero?

  • Magna Natlia Marin Pires Marilda Trecenti Gomes

    As crianas adquirem o conhecimento lgico-matemtico por um pro-cesso de construo, ao, de dentro para fora. Esse processo no se d por internalizao, de fora para dentro, e, segundo Piaget (apud KAMII,1995), no se d por transmisso social. Piaget distingue trs tipos de conhecimen-tos para que se compreenda melhor o conhecimento lgico-matemtico.

    Conhecimento fsicoRefere-se aos objetos do mundo exterior. As propriedades fsicas de

    um objeto, como um boto: sua cor e seu peso so conhecimentos emp-ricos, adquiridos por meio da observao. Saber que esse boto pode cair de suas mos ao solt-lo, tambm um exemplo de conhecimento fsico.

    Kamii (1995) afirma que a fonte do conhecimento fsico est apenas em parte nos objetos, porque, mesmo para ler uma cor de um objeto, faz-se necessria uma estrutura lgico-matemtica. Para distinguir a cor verme-lha num objeto, precisa-se de uma estrutura que faa pensar nas demais cores, e delas distinguir o vermelho.

    Conhecimento socialSegundo Kamii e Declark (1986), o Natal, dia 25 de dezembro, exem-

    plo de um conhecimento social, pois apenas uma das convenes esta-belecidas socialmente. Uma cadeira chamar-se cadeira tambm exem-plo de conhecimento social.

    A caracterstica principal do conhecimento social, segundo o episte-mlogo Jean Piaget, que sua natureza preponderantemente arbitr-ria (KAMII, 1995, p. 21). Arbitrrio, porque alguns povos o comemoram, enquanto outros no. Portanto, no h qualquer relao de natureza fsica

    Conhecimento lgico-matemtico

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    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    ou lgico-matemtica entre o objeto e a sua denominao. Conhecimentos como estes so passados pela transmisso de uma pessoa para outra ou entre pessoas de diferentes geraes.

    Para construir conhecimentos sobre o mundo fsico, uma criana precisa de es-trutura lgico-matemtica, necessitando tambm dessa estrutura para adquirir co-nhecimentos sociais. No poderamos pensar em Natal sem classific-lo em relao aos demais dias do ano. Outro exemplo de construo social, citado por Kamii, a distino que as crianas fazem ao usar certas palavras, pois aprendem, pela trans-misso social, que no so socialmente aceitas e, portanto, no devem us-las.

    Conhecimento lgico-matemticoNa concepo de Piaget, diferentemente dos outros conhecimentos, o conhe-

    cimento lgico-matemtico consiste em relaes criadas pelo sujeito. Ele exem-plifica esse conhecimento com a diferena constatada quando nos deparamos com duas contas, uma vermelha e outra azul. Essa diferena criada mentalmente quando o indivduo relaciona os objetos. A diferena no est na conta vermelha nem na azul. Ele percebe a diferena porque as coloca uma em relao outra.

    Pode-se dizer que essas duas contas so parecidas, se for levado em consi-derao seu peso. Porm, tambm possvel dizer que so diferentes, se forem consideradas as cores das contas. Tanto correto dizer que elas so parecidas quanto que so diferentes, dependendo das relaes estabelecidas pelos sujei-tos. Se o objetivo numrico, observa-se que so duas, e nmero uma relao criada mentalmente pelo indivduo.

    Para Piaget (apud GARDNER, 1994), todo conhecimento e, em particular, o conhecimento lgico-matemtico, deriva das nossas aes sobre o mundo. A base para todas as formas lgico-matemticas de inteligncia depende inicial-mente da manipulao de objetos. No entanto, essas aes tambm se realizam mentalmente e so internalizadas depois de algum tempo.

    O objetivo das pesquisas de Jean Piaget (1896-1980), em Psicologia do Desen-volvimento e Epistemologia Gentica, segundo Brito e Garcia (2001), foi o de veri-ficar o desenvolvimento do conhecimento. Piaget descreveu o desenvol vimento cognitivo em termos lgico-matemticos, utilizando um mtodo clnico e crti-co. Observou, em situaes experimentais e ambientes naturais, sujeitos desde a infncia at a adolescncia. Com seus estudos, Piaget percebeu que o conheci-mento se desenvolve mediante uma construo progressiva das estruturas lgi-

  • Conhecimento lgico-matemtico

    47

    cas, embora a lgica e a forma de pensar da criana e do adulto sejam diferentes. Todo seu estudo tem origem em pressupostos biolgicos bem determinados, que se relacionam com os conceitos de adaptao, organizao, formao de es-trutura e a tendncia de autorregulao dos seres vivos. O estudo no foi apenas uma analogia entre o desenvolvimento biolgico e o desenvolvimento cogniti-vo. Para Piaget, o desenvolvimento cognitivo se produz por meio da adaptao dos organismos ao meio. O autor utiliza o termo invariantes para os processos constantes encontrados durante o desenvolvimento, ou seja, para a adaptao e a organizao. Devido tendncia biolgica dos seres vivos autorregulao, so desenvolvidos certos mecanismos adaptativos envolvendo novas organiza-es, que levam a uma mudana interna, alm das novas interaes com o am-biente, chamadas de assimilao e acomodao.

    A assimilao o processo por meio do qual os esquemas internos so apli-cados sobre o objeto. Esse objeto passa a ser conhecido pelo indivduo somente quando for assimilado por um ou mais esquemas. A acomodao consiste na modificao dos esquemas internos como resultado de uma experincia ativa com os objetos, levando em conta qualidades particulares destes. No apenas Piaget mas tambm outros tericos da cognio alegam que entre o meio e as respostas do indivduo existem estruturas que determinam os comportamentos deste. Esquemas, operaes e estruturas so conceitos estabelecidos por Piaget seguindo essa mesma linha. So esses trs elementos que, quando mudam, despregam-se e se reorganizam durante o desenvolvimento, dando origem s nossas possibilidades intelectuais.

    Piaget descreveu a sequncia das etapas pelas quais os seres humanos passam durante seu desenvolvimento cognitivo. Essas etapas seguem as mesmas sequn-cias em todos os seres, embora no se deem necessariamente na mesma faixa etria. Uma nova forma de organizao cognitiva, ou seja, nova estrutura, implica numa mudana de etapa e tambm maior equilbrio forma superior de adaptao.

    Abstrao emprica e abstrao reflexiva

    Abstrao empricaPara Piaget, a abstrao de nmero muito diferente da abstrao de cor dos

    objetos, chamada por ele de abstrao emprica ou simples. Para a abstrao de nmero, usou o termo abstrao reflexiva.

  • 48

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Na abstrao emprica, a criana se concentra numa certa propriedade do objeto e ignora as demais. Ao centrar-se na cor, acaba deixando de lado peso, material do qual feito etc.

    Abstrao reflexiva ou construtivaA abstrao reflexiva, diferentemente da abstrao emprica, envolve a cons-

    truo de uma relao entre objetos. Relaes no tm uma existncia na re-alidade externa. A abstrao reflexiva uma construo verdadeira feita pela mente, e no uma concentrao sobre um determinado objeto. No entanto, na realidade psicolgica da criana, uma no existe sem a outra. A relao de dife-rente no existe se a criana no observar diferentes propriedades nos objetos. O mesmo acontece com a relao cinco, que no poderia ser construda se a criana pensasse que objetos separados se comportam como gotas de gua que juntas formam um todo novamente.

    Como dito anteriormente, a construo do conhecimento fsico s possvel porque a criana possui uma estrutura lgico-matemtica que possibilita novas observaes em relao ao conhecimento que ela j tem. Para uma criana re-conhecer que um peixe vermelho, ela precisa reconhecer e diferenciar o ver-melho de outras cores e o peixe de outros objetos. Portanto, para que ela seja capaz de ler fatos da realidade externa, precisa de estrutura lgico-matemtica construda pela abstrao reflexiva ou construtiva.

    A abstrao reflexiva no se manifesta independente da abstrao emprica no perodo sensrio-motor e pr-operacional. Mais tarde, isso se torna possvel se ela construir o nmero por abstrao reflexiva, podendo operar com nmeros e fazer 3 + 3 e 3 x 2 tambm por abstrao reflexiva.

    Os dois tipos de abstraes at agora apresentados podem parecer sem grande importncia enquanto uma criana est aprendendo nmeros pequenos e at dez. No entanto, quando ela aprende nmeros como 999 e 1 000 quando j no dispe desses nmeros de objetos ou fotografias, a situao fica mais difcil. Assim, por meio de abstrao reflexiva, a criana constri relaes, nmeros so aprendidos, e ento pode entender nmeros bem maiores, apesar de no t-los visto antes.

    O ensino da Matemtica, ao longo dos anos, vem priorizando os conheci-mentos fsicos e sociais, deixando um pouco de lado o conhecimento lgico- -matemtico, cuja fonte interna. Considera-se que para aprender numerao,

  • Conhecimento lgico-matemtico

    49

    basta observar quantidades e escrever os numerais correspondentes, repetidas vezes. O conhecimento lgico-matemtico evolui quanto mais relaes o indi-vduo consegue coordenar. No caso do nmero, necessria a coordenao das relaes de ordenao mentalmente.

    Por outro lado, as pesquisas mostram quanto conhecimento matemtico que a criana traz para a escola acaba no sendo aproveitado, pelo professor, para faz-la avanar. Muitas vezes, professores tm em sala alunos que trabalham vendendo balas ou frutas, acostumados a calcular, que esquecem sua experin-cia no momento de fazer exerccios mecnicos.

    Por inexperincia, os adultos se esquecem de que a Matemtica, como a lin-guagem, so construes humanas de muitos anos. E com um ambiente prop-cio reflexo que o aluno ser capaz de tirar melhor proveito das aulas.

    Para o conhecimento lgico-matemtico, so grandes as vantagens do jogo em grupo, na sala de aula, tanto do industrializado como do produzido artesanal-mente, e uma atividade ldica e agradvel normalmente sempre ser bem-vinda para as crianas. Muitos professores concordam em utilizar o jogo, mas apenas para lazer, depois de terminados os chamados trabalhos de aula, esquecendo--se de seu lado educativo.

    O jogoPropicia diversificao na abordagem dos diferentes assuntos. H vrios jogos envolvendo nmeros e as quatro operaes matemticas, possibili-tando diversas maneiras de interagir com esses objetos do conhecimento.

    Estimula o pensamento, uma vez que para participar no basta estar pre- sente, mas estar atento s situaes que se renovam a cada momento. Embora a criana apresente um comportamento mais individualista, no deixa de ajudar os amigos, mesmo querendo chegar sempre em primeiro lugar, enquanto que as maiores procuram estratgias cada vez mais ela-boradas para vencer.

    Promove a socializao a partir das regras, mesmo as mais simples, desti- nadas a crianas com menos experincia. Durante o jogo acontecem dis-cusses, debates, troca de ideias, confronto de opinies, numa verdadeira situao de interao, e tomam-se decises que colaboram para a cons-truo do conhecimento.

  • 50

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Permite avanos na construo do nmero, sempre que envolve quanti- dades variadas, contando-as, comparando-as, ordenando-as, estabele-cendo correspondncia, identificando suas formas de representao e fazendo operaes.

    Em alguns casos, obriga ao registro de pontos, permitindo que os alunos encontrem a melhor forma de elabor-lo, demonstrando todo o conheci-mento que possuem.

    Texto complementar

    Os Blocos LgicosOs Blocos Lgicos, material pedaggico geralmente feito de madeira,

    composto por 48 peas com as seguintes especificaes:

    forma quadrada grande grossa vermelhaforma quadrada grande grossa amarelaforma quadrada grande grossa azul

    forma quadrada grande fina vermelhaforma quadrada grande fina amarelaforma quadrada grande fina azul

    forma quadrada pequena grossa vermelhaforma quadrada pequena grossa amarelaforma quadrada pequena grossa azul

    forma quadrada pequena fina vermelhaforma quadrada pequena fina amarelaforma quadrada pequena fina azul

    forma triangular grande grossa vermelhaforma triangular grande grossa amarelaforma triangular grande grossa azul

    forma triangular grande fina vermelhaforma triangular grande fina amarelaforma triangular grande fina azul

    forma retangular grande grossa vermelhaforma retangular grande grossa amarelaforma retangular grande grossa azul

    forma retangular grande fina vermelhaforma retangular grande fina amarelaforma retangular grande fina azul

    forma retangular pequena grossa verme-lhaforma retangular pequena grossa amarelaforma retangular pequena grossa azul

    forma retangular pequena fina vermelhaforma retangular pequena fina amarelaforma retangular pequena fina azul

    forma circular grande grossa vermelhaforma circular grande grossa amarelaforma circular grande grossa azul

    forma circular grande fina vermelhaforma circular grande fina amarelaforma circular grande fina azul

  • Conhecimento lgico-matemtico

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    forma triangular pequena grossa vermelhaforma triangular pequena grossa amarelaforma triangular pequena grossa azul

    forma triangular pequena fina vermelhaforma triangular pequena fina amarelaforma triangular pequena fina azul

    forma circular pequena grossa vermelhaforma circular pequena grossa amarelaforma circular pequena grossa azul

    forma circular pequena fina vermelhaforma circular pequena fina amarelaforma circular pequena fina azul

    Dicas de estudoLer o livro: Blocos Lgicos.

    Autora: Ursula Marianne Simons.

    Editora: Vozes.D

    ivul

    ga

    o Vo

    zes.

    A autora apresenta muitos exerccios com os Blocos Lgicos que estimulam a verbalizao e a argumentao lgica da criana.

    Atividades1. Diferencie os trs tipos de conhecimentos apresentados no texto, exemplifi-

    cando cada um deles.

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    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    2. Em relao s peas lgicas, quantas so as formas? Quantas so as cores? Quantas so as espessuras? Quantos so os tamanhos? Isso auxilia na deter-minao do nmero de peas?

  • Conhecimento lgico-matemtico

    53

  • Magna Natlia Marin Pires Marilda Trecenti Gomes

    Houve um tempo em que o homem no sabia contar e, ainda hoje, al-gumas tribos indgenas contam com apenas dois nomes de nmeros. Eles utilizam dois-um para expressar o trs e dois-dois para expressar o quatro. Quando querem expressar muitos, apontam para sua cabea como sinal de inmeros, tal qual o nmero de fios de cabelo da cabea. A ideia de nmero no concebida como abstrao, e , portanto, para eles bastante confusa. Tribos como essas no percebem que conjuntos de, por exemplo, cinco cavalos, cinco flechas, cinco peixes apresentam uma caracterstica comum, que ser cinco.

    O homem de pocas remotas apenas percebia o espao ocupado pelos seres e objetos vizinhos e, por isso, estabelecia diferena entre a unidade, o par e muitos. O um e o dois foram os primeiros conceitos numricos concebidos pelo homem. Segundo Ifrah (1989), o um se referia ao homem ativo e sua obra de criao; o dois, ao feminino, ao masculino e tambm simetria aparente do corpo humano. Outros significados eram atribudos a esses dois nmeros usados nas sociedades primitivas.

    Inmeras civilizaes retratam, por meio de sua lngua e escrita, as limi-taes primitivas da contagem. O significado dos nmeros um, dois e trs quase sempre se referiam ao singular, a um par e a muitos, respectivamen-te, como j mencionado anteriormente.

    Estudos do comportamento humano demonstram que, no desenvol-vimento da criana, encontram-se essas etapas do desenvolvimento da inteligncia da humanidade; portanto, a criana, inicialmente, tambm percebe apenas o um, o dois e a pluralidade.

    Embora contar seja um atributo exclusivo do ser humano, pesquisas mostram que possvel notar o senso numrico de certos pssaros, como o caso do corvo, o qual demonstra a percepo de at quatro objetos.

    O desenvolvimento histrico do sistema de numerao decimal

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    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    No difcil constatar que, quando o homem se depara com uma quantidade de objetos, esta rapidamente percebida se no ultrapassar trs ou quatro itens. Quando ultrapassa, o homem precisa fazer a contagem, porque nossa viso global no distingue, num golpe de vista, quantidades maiores. Dependendo da posio que os objetos so colocados, podem-se perceber outras quantidades, mas nunca muito maiores do que quatro objetos.

    Vrias civilizaes, ao representarem quantidades, faziam traos verticais, cr-culos, pontos e outros sinais. Algumas delas juntavam para formar grupos de trs unidades. No entanto, quando houve a influncia dos cinco dedos da mo, os agrupamentos passaram a ser de cinco em cinco. Esses agrupamen-tos eram de um trao vertical para o um, dois para o dois, trs para o trs, quatro para o quatro; e quatro traos verticais e um horizontal cortando-os, para indicar cinco unidades.

    Para o dez, usavam dois grupos da representao utilizada para o cinco. Ifrah (1989) afirma que mais uma vez fica clara a ideia de que a percepo do homem no vai alm do nmero quatro.

    A correspondncia termo a termo auxiliou na contagem. O princpio da cor-respondncia das pedrinhas para cada ovelha utilizadas pelos pastores, o rosrio de contas para auxiliar as pessoas a fazerem as oraes, os entalhes na madeira para os carneiros e ns na corda j eram demonstraes do emprego da corres-pondncia biunvoca.

    Eram utilizadas, tambm, partes do corpo para expressar quantidades duran-te a contagem, como dedo, pulso, cotovelo, ombro etc. Essas civilizaes podem desconhecer um determinado nmero; no entanto, so capazes de representar a quantidade correspondente quando se deparam com situaes que exigem essa prtica.

    Alguns indgenas conseguiram chegar a nmeros relativamente elevados, mesmo sem o conhecimento deles, porque utilizavam a associao de partes do corpo e objetos concretos. Exemplo: peles de animais e partes do corpo que, numa combinao, expressavam nmeros maiores.

  • O desenvolvimento histrico do sistema de numerao decimal

    57

    Nesses ltimos exemplos, j no se estava mais utilizando correspondncia termo a termo, prosseguindo assim um desenvolvimento na forma de contar e representar a contagem por meio de agrupamentos.

    A inveno da baseFoi a partir da distino entre o nmero cardinal e o nmero ordinal que o

    homem fez a abstrao dos nmeros. Contas, conchas, pedrinhas etc. deixaram de ser simples instrumentos materiais para serem smbolos numricos. A seguir, o homem passou a conceber conjuntos mais extensos e, dessa forma, deparou-se com outras e novas dificuldades, pois para representar nmeros maiores no era possvel multiplicar indefinidamente pedras, ns nas cordas etc. Dedos e outras partes do corpo no eram suficientes para representar quantidades extensivas. Surge, ento, a ideia de bases, uma forma fcil de representar os nmeros.

    Base 10Muito diferentes dos pastores primitivos, os pastores da frica Ocidental, no

    muito tempo atrs, contavam o rebanho colocando uma concha num fio de l branca at o dcimo animal do rebanho. Quando chegavam ao dcimo, desman-chavam esse colar de conchas e colocavam uma concha num fio de l azul. Isso se relaciona com a ideia de dezena. Recomeavam, a partir da, a colocar uma concha para cada animal na l branca novamente, at atingir o vigsimo animal. Quando isso acontecia, desfaziam esse colar e colocavam a segunda concha no fio de l azul. Procediam assim at obter dez conchas no fio de l azul. Ento, des-faziam esse colar e colocavam uma concha num fio de l vermelha (centena).

    Dessa maneira, podemos perceber que a forma de raciocinar desses pastores era muito diferente da forma dos pastores primitivos. A ideia bsica est na uti-lizao de agrupamentos por dezenas e centenas. Assim, cada concha colocada no fio de l branca representava uma unidade, cada concha colocada no fio de l azul representava dez unidades (dezena) e cada concha colocada no fio de l vermelha representava cem unidades, o que equivale a dez dezenas, ou uma centena, tcnica essa, hoje, chamada de emprego da base dez.

  • 58

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    So vrias as lnguas que, para designar os nmeros superiores a dez, utilizam--se da composio correspondente a dez-um, dez-dois, dez-trs e assim suces-sivamente, at o nmero dezenove. Para o vinte, utilizam dois-dez; para o trinta, trs-dez, at chegar ao noventa. Para o nmero duzentos usam dois-cem etc.

    Atualmente, utilizamos o sistema de numerao indo-arbico, de base dez. Os smbolos empregados por esse sistema so 1, 2, 3, 4, 5 ,6, 7, 8, 9 e 0. Os nove primeiros smbolos representam as unidades e o ltimo a ideia de ausncia. por isso que dez representado por 10, o que representa uma dezena e zero unidades.

    Vejamos outros exemplos:

    Quinze representado por 15, um grupo de 10 (ou uma dezena) e mais cinco unidades.

    Trinta e oito representado por 38, trs grupos de 10 (ou trs dezenas) e mais oito unidades.

    3 dezenas = 10 + 10 + 10 = 30

    30 + 8 = 38

    Noventa e nove representado por 99, nove grupos de 10 (ou nove deze- nas) e mais nove unidades.

    9 dezenas = 10 + 10 + 10 + 10 + 10 + 10 + 10 + 10 + 10 = 90

    90 + 9 = 99

    Se acrescentarmos 1 quantidade 99, temos que utilizar mais uma ordem: 100.

    Cem representado por 100, um grupo de grupo de 10 (ou uma cente- na).

    Cento e quarenta e seis representado por 146, um grupo de grupo de 10 (ou uma centena), mais quatro grupos de 10 (ou quatro dezenas) e seis unidades.

    1 centena = 100

    4 dezenas = 10 + 10 + 10 + 10 = 40

    100 + 40 + 6 = 146

  • O desenvolvimento histrico do sistema de numerao decimal

    59

    Essa mesma ideia est presente quando utilizamos outras ordens.

    Segundo Ifrah (1989, p. 59), foram mesmo os dez dedos que impuseram ao homem a ideia de grupos por feixes de dez. O autor afirma que, se a natureza tivesse feito o homem com seis dedos em cada mo, por certo a base utilizada hoje seria a base doze; ou se tivssemos quatro dedos em cada mo, como o caso das rs, nosso sistema de numerao seria fundado na base oito.

    Algumas civilizaes tiveram sistemas de numerao fundados em outras bases, como o caso do sistema sexagesimal dos babilnios; da base vintesimal dos ioruba, da Nigria, de alguns povos da frica Central e outros; da contagem duodecimal (12) dos sumrios etc.

    Desses povos, ainda restam nos nossos dias vestgios de seus sistemas de nu-merao, como o caso da medida de tempo em horas, minutos, segundos e das medidas de arcos e ngulos em graus, minutos e segundos. Sumrios e depois babilnios utilizaram a base sessenta. No se conhece a real origem desse sistema de numerao; no entanto, segundo alguns historiadores, essa base foi usada em funo do nmero de dias do ano ser, aproximadamente, 360, dando origem diviso do crculo em 360, que poderia ser dividido em seis partes iguais, fazendo coincidir a mesma medida para o arco correspondente ao sexto do crculo e medida do seu raio.

    Outra possibilidade da origem da base sessenta vem da possvel combinao das doze falanges dos dedos da mo direita e os cinco dedos da mo esquerda, mas no se tem confirmao dessa hiptese.

    Em uma ou outra base, a descoberta fundamental do princpio de base repre-sentou grande importncia na histria das civilizaes, favorecendo inmeras criaes, invenes e revolues em diversos campos, como na economia, em trocas comerciais etc.

    A inveno dos algarismos denominados arbicos foi um dos grandes aconte-cimentos na histria da humanidade, comparado ao domnio do fogo. Segundo Ifrah (1989), a escrita e a inveno desses algarismos contriburam para modifica-es na existncia humana. A inveno dos algarismos, segundo o mesmo autor,

    surgiu para permitir uma notao perfeitamente coerente de todos os nmeros e para oferecer a qualquer um (mesmo aos espritos mais fechados aritmtica) a possibilidade de efetuar qualquer tipo de clculo sem ter de recorrer a acessrios como a mo, contador mecnico ou a tbua de contar. (1989, p. 131)

  • 60

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Vale lembrar que a inveno do zero, muito mais tarde, tornou realizvel cl-culos que at ento no eram possveis de ser feitos.

    A humanidade j tinha passado por diferentes experincias para tentar repre-sentar e manipular os nmeros, antes de chegar aos algarismos que vieram a ser to eficazes os algarismos arbicos.

    Antes do emprego de tais algarismos, o homem utilizou marcas em placas de argila mole, em que diferentes sinais representavam diferentes ordens de seus sistemas de numerao. Placas com esses registros, chamadas calculi, foram en-contradas em muitos stios arqueolgicos do Oriente Prximo.

    No entanto, essa forma de representao ainda era precria e precisava ser aprimorada. Muitas formas, usando sistema de base, foram empregadas pelas ci-vilizaes ao longo da histria. Algumas civilizaes utilizaram-se do sistema de numerao no-posicional, o que levava a no importar a posio dos smbolos para representar um nmero, como o caso da civilizao egpcia.

    Mais tarde (sculos IX-VIII a.C.), gregos e romanos desenvolveram seus siste-mas de numerao bem mais evoludos, mas ainda complicados quando se pre-tendia operar com tais representaes. O sistema romano era regido pelo princ-pio da adio, pois sua justaposio de smbolos implicava na soma dos valores correspondentes a esses smbolos. Posteriormente, os romanos acabaram com-plicando o seu sistema de numerao, quando introduziram a regra segundo a qual todo signo numrico colocado esquerda de um algarismo de valor supe-rior era dele retirado. Por exemplo, o quatro era expresso por IV, ou seja, cinco menos um (princpio da subtrao). A pouca praticidade do sistema romano o fez ficar em plano inferior ao sistema que surgiu muito tempo depois, na ndia.

    O aparecimento do zeroDos trs povos que descobriram o princpio de posio babilnios, chineses

    e maias, utilizando uma quantidade bem menor de smbolos apenas os babi-lnios e os maias inventaram o zero. Mas esse novo smbolo ainda no vinha representar a ausncia de unidades. Fez-se, ento, com que esses trs sistemas posicionais permanecessem imprprios prtica das operaes aritmticas.

    Foi na ndia, por volta do sculo V d.C., que nasceu o ancestral do sistema de numerao praticado hoje. Foi proclamado pelos rabes, mas surgiu no norte da ndia.

  • O desenvolvimento histrico do sistema de numerao decimal

    61

    Essa civilizao j utilizava os nove primeiros algarismos, que correspondem hoje a 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, desde o sculo III a.C., que, erradamente, denomina-mos arbicos. At que se chegasse ao sistema tal como hoje, houve muito de-senvolvimento. Existiu poca em que, para expressarem nmeros grandes, eles os exprimiam por extenso, o que os ajudou a descobrir o princpio posicional e o zero. Diferentemente do que fazemos hoje, para trs mil, setecentos e nove, escreviam: nava sapata sata ca trisahasra (nove, setecentos e trs mil). Para as potncias de dez, escrevia-se o seguinte:

    10 dasa, 100 sata, 1 000 sahasra, 10 000 ayuta

    Assim, para escrever 51 636, escreviam 6, 3 dasa, 6 sata, 1 sahasra, 5 ayuta. Porm, no era suficiente, e novos avanos eram necessrios. Foi ento que as-trnomos e matemticos, para escrever 7 629, passaram a expressar-se por meio de um enunciado do gnero nove, dois, seis, sete, e essa numerao oral os fez perceber uma escrita posicional, que representa 9 + 2 x 10 + 6 x 100 + 7 x 1 000. Assim um, um representava uma unidade e uma dezena o 11 de hoje. Ao ex-pressar o nmero 205, perceberam que no bastava dizer cinco, dois. Dessa ma-neira, comearam a utilizar a palavra sunya, que quer dizer vazio. Dessa forma, 205 era enunciado da seguinte forma: cinco, vazio, dois, pois como maias e ba-bilnios, haviam acabado de inventar o zero. Isso se deu por volta do sculo V desta era.

    Para as unidades de 1 a 9, dispunham de algarismos distintos e independen-tes e j conheciam o princpio de posio e tambm o zero. Como os nmeros eram expressos em snscrito, lngua hindu, precisavam agora ser representados apenas por smbolos.

    Esse sistema de numerao foi expandido alm das fronteiras da ndia e, devido ao comrcio de seda, especiarias e marfim com a China, atingiu outros povos.

    Sbios, que tambm eram poetas, buscaram na natureza e na mitologia ins-pirao para os smbolos, que podem enumerar grandes listas de significados para cada um deles. Assim, as tbuas numricas ou astronmicas eram guarda-das na memria com maior segurana. A forma grfica dos algarismos hindus ficou ainda, durante muitos sculos, pouco precisa, e copistas cometiam erros ao transcrever certos smbolos. Foi ento que o ritmo das palavras-smbolo em forma de verso ajudou a eliminar os erros da transcrio. Por outro lado, esses smbolos foram ganhando maior definio e, aos poucos, chegaram ao que hoje toda a humanidade utiliza.

  • 62

    Fundamentos Tericos do Pensamento Matemtico

    Texto complementar

    A lenda de Sessa(IFRAH, 1989, p. 288-292)

    Para provar a seus contemporneos que um monarca, por mais poderoso que seja, no nada sem seus sditos, um brmane hindu, chamado Sessa, inventou um dia o jogo de xadrez.

    Quando esse jogo foi apresentado ao rei das ndias, este ficou to maravi-lhado com a sua engenhosidade e a grande variedade de suas combinaes que mandou chamar o brmane para recompens-lo pessoalmente:

    Quero recompensar-te por tua extraordinria inveno disse o rei.

    Escolhe tu mesmo a recompensa e a recebers imediatamente. Sou su-ficientemente rico para realizar teu desejo mais absurdo.

    O sacerdote pediu que o rei lhe desse um pouco de tempo para pensar em sua resposta. E, no dia seguinte, espantou a todos com a incrvel mods-tia de seu pedido.

    Meu bom soberano exclamou ele , queria que me dsseis a quan-tidade de trigo necessria para encher as 64 casas de meu tabuleiro. Um gro para a primeira, dois para a segunda, quatro para a terceira, oito para a quarta, dezesseis para a quinta, e assim por diante. Em resumo, queria que fosse colocado em cada casa o dobro de gros que na casa precedente.

    No acredito que sejas to tolo a ponto de me fazer um pedido to mo-desto! exclamou o rei, surpreso. Poderias ofender-me com um pedido to indigno de minha benevolncia e to desprezvel diante do que eu poderia oferecer-te. Mas que seja! Se este o teu desejo, meus servidores traro teu saco de trigo antes do cair da noite.

    O brmane sorriu e deixou o palcio.

    tarde, o soberano se lembrou da promessa e se informou com seu ministro para saber se o louco Sessa tinha tomado posse de sua magra recompensa.

  • O desenvolvimento histrico do sistema de numerao decimal

    63

    Soberano disse o alto dignitrio , vossas ordens esto sendo executa-das. Os matemticos de vossa augusta corte esto determinando o nmero de gros que devem ser dados ao sacerdote.

    O semblante do rei se obscureceu. Ele no estava habituado a uma execu-o to morosa de suas ordens.

    noite, antes de se deitar, o rei insistiu uma vez mais para saber se o br-mane j recebera seu saco.

    rei disse o ministro, hesitante , os matemticos ainda no chega-ram ao fim de suas operaes. Esto trabalhando sem descanso e esperam terminar sua tarefa antes do amanhecer.

    preciso notar que os clculos se revelaram muito mais longos do que se pensava. Mas o rei no quis saber de nada, e ordenou que o problema fosse resolvido antes de seu despertar.

    Mas, no dia seguinte, esta ordem ainda ficou sem efeito, o que incitou o monarca enfurecido a despedir os calculadores.

    Nesse momento, um dos conselheiros do monarca interveio:

    soberano, tendes razo de despedir estes calcul