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FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL THEORETICAL BASIS FOR ENVIRONMENTAL RECHSSTAAT Germana Parente Neiva Belchior João Luis Nogueira Matias RESUMO O presente artigo é fruto de debates realizados no grupo de pesquisa intitulado “Novas perspectivas para um velho direito: a propriedade e o meio ambiente”, desenvolvido entre o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará e o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, financiado pelo CNPQ. A crise ambiental que ora se enfrenta acarreta o comprometimento da própria sobrevivência humana. Assim, na medida em que a sociedade reclama por anteparos, em virtude dos problemas ecológicos, o Direito e o Estado precisam se manifestar com o intuito de tentar resolver ou, pelo menos, elaborar possíveis soluções. O objetivo desta pesquisa, portanto, é analisar o princípio da solidariedade como fundamento teórico-constitucional do Estado de Direito Ambiental e a sustentabilidade como marco axiológico-constitucional do novo paradigma estatal. Pretende-se, outrossim, rediscutir os elementos constitutivos (soberania, território, povo e finalidade) da Teoria Geral do Estado para adequá-los ao Estado de Direito Ambiental, haja vista que o Estado e o Direito precisam assumir um papel de estimular ou desestimular condutas ambientalmente desejáveis na missão de combater a crise ambiental e lutar pela sobrevivência da humanidade. A metodologia desta pesquisa é bibliográfica, descritiva e exploratória. Constata-se que a necessidade da construção do Estado de Direito Ambiental implica em mudanças profundas na estrutura da sociedade e na atividade estatal, com o intuito de apontar caminhos e buscar alternativas para a superação da atual crise ambiental. PALAVRAS-CHAVES: CRISE AMBIENTAL; ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL; SOLIDARIEDADE; SUSTENTABILIDADE. ABSTRACT This paper is an outcome of the debates held at the research group "A new outlook on an old right: property and environment", an initiative which receives funding from the National Council for Scientific and Technological Development (CNPq) and that is carried out by the Master of Laws Programme of Ceará State Federal University and the Postgraduate Programme in Law of Santa Catarina State Federal University. The environmental crisis in progress may jeorpardize human life. In this sense, and as society demands protection against environmental problems, Law and States are urged to act in order to try to face the environmental challenge or, at least, to forge possible solutions for tackling the environmental issues. This essay intends to exam the solidarity 2284

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FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL

THEORETICAL BASIS FOR ENVIRONMENTAL RECHSSTAAT

Germana Parente Neiva Belchior João Luis Nogueira Matias

RESUMO

O presente artigo é fruto de debates realizados no grupo de pesquisa intitulado “Novas perspectivas para um velho direito: a propriedade e o meio ambiente”, desenvolvido entre o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará e o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, financiado pelo CNPQ. A crise ambiental que ora se enfrenta acarreta o comprometimento da própria sobrevivência humana. Assim, na medida em que a sociedade reclama por anteparos, em virtude dos problemas ecológicos, o Direito e o Estado precisam se manifestar com o intuito de tentar resolver ou, pelo menos, elaborar possíveis soluções. O objetivo desta pesquisa, portanto, é analisar o princípio da solidariedade como fundamento teórico-constitucional do Estado de Direito Ambiental e a sustentabilidade como marco axiológico-constitucional do novo paradigma estatal. Pretende-se, outrossim, rediscutir os elementos constitutivos (soberania, território, povo e finalidade) da Teoria Geral do Estado para adequá-los ao Estado de Direito Ambiental, haja vista que o Estado e o Direito precisam assumir um papel de estimular ou desestimular condutas ambientalmente desejáveis na missão de combater a crise ambiental e lutar pela sobrevivência da humanidade. A metodologia desta pesquisa é bibliográfica, descritiva e exploratória. Constata-se que a necessidade da construção do Estado de Direito Ambiental implica em mudanças profundas na estrutura da sociedade e na atividade estatal, com o intuito de apontar caminhos e buscar alternativas para a superação da atual crise ambiental.

PALAVRAS-CHAVES: CRISE AMBIENTAL; ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL; SOLIDARIEDADE; SUSTENTABILIDADE.

ABSTRACT

This paper is an outcome of the debates held at the research group "A new outlook on an old right: property and environment", an initiative which receives funding from the National Council for Scientific and Technological Development (CNPq) and that is carried out by the Master of Laws Programme of Ceará State Federal University and the Postgraduate Programme in Law of Santa Catarina State Federal University. The environmental crisis in progress may jeorpardize human life. In this sense, and as society demands protection against environmental problems, Law and States are urged to act in order to try to face the environmental challenge or, at least, to forge possible solutions for tackling the environmental issues. This essay intends to exam the solidarity

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principle as a theoretical and constitutional basis for Environmental Rechtsstaat and sustainability as the axiological and constitutional landmark of the new paradigm to be adopted for sovereign states in this moment of human history. This research also intends to promote new discussions on the elements of state (territory, people, sovereignty and purpose), in order to adapt them to the idea of Environmental Rechtsstaat, taking into account that Law and States need to take responsibility for stimulating patterns of environment-friendly behaviour, which are very desirable in the mission to fight environmental crisis and to guarantee the survival of humankind. The methodology adopted in this research is bibliography-based, descriptive and exploratory. The conclusion is that building the Environmental Rechtsstaat requires deep changes in the structures of society and in State activities, always taking into consideration the final purpose of searching for alternatives of solutions for the environmental crisis.

KEYWORDS: ENVIRONMENTAL CRISIS; ENVIRONMENTAL RECHSTAAT; SOLIDARITY; SUSTAINABILITY.

INTRODUÇÃO

O presente artigo é fruto de debates realizados no grupo de pesquisa intitulado “Novas perspectivas para um velho direito: a propriedade e o meio ambiente”, desenvolvido pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, financiado pelo CNPQ.

O processo acelerado de desenvolvimento, com raízes no lucro a qualquer preço, no laissez-faire econômico e na concepção liberal de propriedade privada, tem acarretado um descompasso entre o homem e o meio ambiente. Por conta disso, o meio ambiente encontra-se na pauta do dia e o Direito Ambiental vem se revelando como um dos ramos da Ciência do Direito que mais tem chamado atenção dos operadores e da academia jurídica.

A crise ambiental que ora se enfrenta acarreta o comprometimento da própria sobrevivência humana. Assim, na medida em que a sociedade reclama por anteparos em virtude dos problemas ecológicos, o Estado é convocado a desempenhar um novo papel, voltado a resolver ou, pelo menos, elaborar possíveis soluções. É o que fundamenta a tese do Estado de Direito Ambiental, amparada no princípio da solidariedade e no valor sustentabilidade.

A metodologia utilizada é de natureza bibliográfica, descritiva e exploratória. O objetivo desta pesquisa, portanto, é analisar o princípio da solidariedade como fundamento teórico-constitucional do Estado de Direito Ambiental e a sustentabilidade como marco axiológico-constitucional do novo paradigma estatal. Pretende-se, igualmente, rediscutir os elementos constitutivos (soberania, território, povo e finalidade) da Teoria Geral do Estado para adequá-los ao Estado de Direito Ambiental, haja vista que o Estado e o Direito precisam assumir um papel de estimular ou desestimular condutas ambientalmente desejáveis na missão de combater a crise ambiental e lutar pela sobrevivência da humanidade.

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1 A CRISE AMBIENTAL E A NECESSIDADE DE TRANSFORMAÇÕES DO ESTADO E DO DIREITO

Ao analisar a evolução do Estado, percebe-se que há sempre um marco histórico que provoca a ruptura de um modelo anterior: as Revoluções Liberais, na passagem do Absolutismo para o Estado Liberal; a Revolução Industrial que marca o nascimento do Estado Social; o combate aos regimes totalitários e a efetividade dos direitos sociais, que faz surgir o Estado Democrático de Direito, assim como a dimensionalidade dos direitos fundamentais.

Não há como se estudar o Estado sem considerar o Direito. Apesar de serem institutos distintos, estão plenamente interligados, um dando suporte ao outro. Acerca da relação entre Estado e Direito, manifesta-se Wolkmer:

O Estado configura-se como uma organização de caráter político que visa não só a manutenção e coesão, mas a regulamentação da força em uma formação social determinada. Esta força está alicerçada, por sua vez, em uma ordem coercitiva, tipificada pela incidência jurídica. O Estado legitima seu poder pela segurança e pela validade oferecida pelo Direito, que, por sua vez, adquire força no respaldo proporcionado pelo Estado. [1]

Na lição de Maluf, “o Estado é uma organização destinada a manter, pela aplicação do Direito, as condições universais de ordem social. E o Direito é o conjunto das condições existenciais da sociedade, que ao Estado cumpre assegurar”. [2] Pode-se dizer que o Direito é o discurso que legitima o poder do Estado.

Um novo modelo de Estado implica, conseqüentemente, em um novel papel do Direito. Mas o que, de fato, marca a passagem do Estado Democrático de Direito para o Estado de Direito Ambiental é a crise ecológica que ora se enfrenta devido ao processo da civilização hodierna, vinculado à globalização e ao desenvolvimento em todas as esferas. Trata-se do que Leite intitula de sociedade de risco, como se extrai dos seus ensinamentos:

É inegável que atualmente estamos vivendo uma intensa crise ambiental, proveniente de uma sociedade de risco, deflagrada, principalmente, a partir da constatação de que as condições tecnológicas, industriais e formas de organização e gestões econômicas da sociedade estão em conflito com a qualidade de vida. Parece que esta falta de controle de qualidade de vida tem muito a ver com racionalidade do desenvolvimento econômico do Estado, que marginalizou a proteção do meio ambiente. [3]

O Relatório Bruntdland, também chamado de “Nosso futuro comum”, proferido em 1987, da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas, reconhece a dependência existencial do homem em relação à biosfera. O referido documentou tornou pública, global e urgente a adoção de instrumentos que levem os Estados a enfrentar a crise ecológica por conta da escassez dos recursos naturais percebida em nível planetário.

Acerca do tema, assinala Silva:

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O problema da tutela jurídica do meio ambiente manifesta-se a partir do momento em que a sua degradação passa a ameaçar não só o bem-estar, mas a qualidade de vida humana, se não a própria sobrevivência do ser humano. [...] o direito à vida, como matriz de todos os direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. [...] ele é um fator preponderante, que há de estar acima de quaisquer outras considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao direito de propriedade e como as de iniciativa privada.[4]

Vê-se, por conseguinte, que crise se agrava com os efeitos do desenvolvimento científico e tecnológico, ao aumentar os impactos ao meio ambiente que acaba se revelando como condição para a própria existência humana.

Há, todavia, um outro viés da crise que vem sendo levantado por filósofos e teólogos, ao defender que esta não se limita aos aspectos de cunho físico, químico e biológico do meio ambiente. É uma crise da própria civilização, da humanidade. Assim alerta Boff:

Precisamos de um novo paradigma de convivência que funde uma relação mais benfazeja para com a Terra e inaugure um novo pacto social entre os povos no sentido de respeito e preservação de tudo o que existe e vive. Só a partir desta mutação faz sentido pensarmos em alternativas que representem uma nova esperança.[5]

Não há dúvidas de que a crise de valores espirituais e culturais reflete nos hábitos predatórios que compromete a vida das futuras gerações, demandando uma transformação no Estado e no Direito, que têm como objetivo principal manter a ordem social. É necessário um novo papel do Estado, na medida em que a intervenção estatal baseada na regulação sancionatória clássica não vem sendo suficiente como mecanismo de proteção ao meio ambiente.

Em relação ao Direito, mister destacar que este não exerce tão-somente a função tradicionalmente repressiva, mas também, como já defendido por Bobbio[6], uma função promocional, em que o Estado assume o papel de encorajador (e premiador) ou desencorajador de condutas. Assim, o Estado e o Direito precisam assumir um papel de estimular ou desestimular condutas ambientalmente desejáveis na missão de combater a crise ambiental e lutar pela sobrevivência da humanidade.[7]

2 A ECOLOGIZAÇÃO DO DIREITO E A EMERGÊNCIA DE UM ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL

Diante da problemática ambiental suscitada, as Constituições modernas, seguindo a tendência mundial após a Convenção de Estocolmo, passaram a alocar o direito ao meio ambiente ecologicamente como um direito fundamental na medida em que ele se torna imprescindível para a promoção da dignidade da pessoa humana. Além da ordem interna, são vários os tratados internacionais de direitos humanos que elencam o meio ambiente sadio como um direito natural dos povos, sendo inconteste a solidariedade entre as nações.

O meio ambiente revela-se como complexo, possuindo a natureza jurídica de um direito-dever. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e, por conseguinte, o dever de preservá-lo cabe também a todos.

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Ao tratar dos direitos fundamentais de terceira geração, Bobbio ressalta a importância do meio ambiente ao afirmar que “ao lado dos direitos, que foram chamados de direitos de segunda geração, emergiram hoje os chamados direitos de terceira geração [...] O mais importante deles é reivindicado pelos movimentos ecológicos: o direito de viver num ambiente não poluído”. [8]

No entanto, da mesma forma que o meio ambiente é um direito fundamental, há um imenso rol de direitos fundamentais eleitos pelo constituinte, estando todos no mesmo patamar, uma vez que não existe hierarquia, a priori, entre eles, segundo Alexy. [9] No caso de conflito, deverá ser utilizado o princípio da proporcionalidade para fazer o sopesamento dos bens e valores envolvidos, respeitado o núcleo essencial dos demais. O peso do meio ambiente é deveras elevado, pois, na lição de Silva, “não há possibilidade da concretização dos demais direitos fundamentais sem o direito ao meio ambiente, que se traduz em última análise como o próprio direito à vida. [...] O direito ao meio ambiente configura-se, portanto, como a matriz de todos os demais direitos fundamentais”. [10]

Portanto, embora não haja hierarquia dos direitos fundamentais no âmbito dogmático-jurídico, haverá uma ordenação relativa no caso concreto tendo como peso maior o meio ambiente, o que não implica que referida premissa irá obrigatoriamente se perpetuar ao final da resolução. Ou seja, no campo pragmático, deverá ser verificado, no momento da aplicação, o peso dos valores e bens envolvidos dentro de cada direito que está em jogo no caso concreto. E como não poderia deixar de ser, o meio ambiente tem (e deve ter) influência na solução, uma vez que é a partir dele que surgem os demais direitos fundamentais, como o direito à vida. A justificativa é simples: não há vida (assim como os outros direitos) se não existir planeta.

A primariedade do ambiente, para alguns, é absoluta, uma vez que “se encontra acima de qualquer outro direito posto que diz respeito à garantia à vida”. [11] Entretanto, não se coaduna com a tese totalitária, uma vez que o sopesamento deve ser feito no caso concreto, dependendo dos outros direitos fundamentais envolvidos. [12]O que se defende é uma primariedade relativa, ou seja, inicial do meio ambiente, premissa esta que deve estar obrigatoriamente na pré-compreensão do intérprete ao analisar o caso concreto.

O meio ambiente ecologicamente equilibrado assume tamanha importância que acaba se mostrando como um direito horizontal na medida em que interfere sobre os demais ramos do direito: privado e público. Caracteriza-se, ainda, como um direito de integração, que penetra em todos os ramos da ciência jurídica para neles introduzir a idéia ambiental. [13]

Partindo da premissa de que o direito ao meio ambiente equilibrado é a luz de todos os direitos fundamentais e da existência de uma nova ordem pública ambiental, é que se defende o fenômeno da Ecologização do Direito, fazendo com que “muitos institutos jurídicos (preexistentes) sejam renovados e muitos institutos jurídicos (novos) sejam criados dentro do ordenamento”.[14] Há, por conseguinte, necessidade de reformulação da própria epistemologia jurídica, do Estado e, conseqüentemente, da Hermenêutica Jurídica.

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O fortalecimento do status material do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado nas legislações infraconstitucionais,[15] os infortúnios ambientais crescentes e a ecologização do Direito demandam uma transformação emergencial do papel do Estado. É nesta direção que Nunes Júnior se manifesta:

Isso implica o surgimento de um novo Estado e de uma nova cidadania, que têm plena consciência da devastação ambiental, planetária e indiscriminada, provocada pelo desenvolvimento, aspirando assim a novos valores como a ética pela vida, o uso racional e solidário dos recursos naturais, o equilíbrio ecológico e a preservação do patrimônio genético. [16]

Nesse sentido, a cada dia aumenta o número de adeptos de um novo modelo de Estado, que emerge a partir do redimensionamento do papel do Estado na sociedade, em prol de um meio ambiente sadio. Destaca Canotilho que o Estado Constitucional Ecológico foi defendido, inicialmente, pelo alemão Rudolf Steinberg, em sua obra “Der Ökologische Verfassungsstaat”. [17] [18]No Brasil, o Estado de Direito Ambiental vem sendo fortemente sustentado por Machado, Leite, Benjamin, Morinaro, dentre outros. [19]

Molinaro sustenta que é melhor caracterizá-lo como Estado Socioambiental e Democrático de Direito[20], onde todos se obrigam, por conta do art. 225, da Constituição Federal de 1988, em manter o equilíbrio e a salubridade do ambiente. Como conseqüência, defende o autor:

[...] a garantia de um ´mínimo existencial ecológico´ e o mandamento da ´vedação da degradação ambiental´, núcleo e objeto do princípio de proibição de retrogradação socioambiental, constituem, entre outras, condições estruturantes de um Estado Socioambiental e Democrático de Direito.[21]

A formulação do Estado de Direito Ambiental, segundo Canotilho, impõe que o Estado, “além de ser um Estado de Direito, um Democrático e um Estado Social, deve também modelar-se como um Estado Ambiental.” [22] Já Capella propõe que o Estado de Direito deve ser construído para efetivar o princípio da solidariedade econômica e social para alcançar um desenvolvimento sustentável. [23]

Há quem defenda, como Leite, que o referido paradigma de Estado é fictício e abstrato, sendo uma tarefa de difícil consecução ou até mesmo uma utopia. [24]No entanto, a abstratividade que lhe é pertinente não pode diminuir a importância da sua discussão. Afirma o autor que “a definição dos pressupostos de um Estado de Direito do Ambiente serve como “meta” ou “parâmetro” a ser atingido, trazendo à tona uma série de discussões que otimizam processos de realização de aproximação do Estado ficto.”[25]

A própria expressão da balança segurada pela deusa Thémis, símbolo universal do Direito, reflete a fórmula do Estado de Direito Ambiental. De um lado da balança, há o “Democrático”, que significa o princípio da legitimidade, onde há o reconhecimento do poder pelos que estão sendo governados. Traz a idéia de poder consentido, em prol do valor justiça. No outro, visualiza-se o “de Direito”, já que é um Estado que deve

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respeitar o princípio da juridicidade, marcado pelo valor segurança jurídica. [26] E o “Ambiental” é visualizado no suporte da balança. Afinal, qual é a balança que pode ousar em cumprir com seu objetivo, ou seja, equilibrar, se não tiver um suporte, uma base fundante que a torna sólida e segura? Assim, o “Ambiental”, ao ser esse suporte, traz o princípio da solidariedade, tendo como valor a sustentabilidade. Em outras palavras, se o meio ambiente são for sadio e equilibrado haverá o comprometido de toda a balança, e por que não dizer, de toda a ordem jurídica.

É interessante destacar que o Estado de Direito Ambiental continua sendo um Estado de Direito e um Estado Democrático ao possuir três valores-base: justiça, segurança jurídica e sustentabilidade. O que ocorre são acréscimos de novo princípio e valor-base, implicando numa visão holística e sistêmica, ou seja, partindo do todo, do “meio”, para buscar efetivar os demais elementos.

A supremacia das normas constitucionais, como já defendia Hesse [27] em sua principiologia constitucional clássica, tendo um conteúdo axiológico, impõe a releitura dos direitos fundamentais em perspectiva que efetive os valores escolhidos pelo legislador.

Diante desse tripé axiológico fundamental (justiça, segurança jurídica e sustentabilidade), é que se propõe a construção do Estado de Direito Ambiental. O princípio da solidariedade e o valor sustentabilidade irradiam toda a ordem jurídica por conta da Ecologização do Direito.

A necessidade da construção do Estado de Direito Ambiental implica em mudanças profundas na estrutura da sociedade e na atividade estatal, com o objetivo de apontar caminhos e buscar alternativas para a superação da atual crise ambiental. Impõe-se, outrossim, a rediscussão dos elementos que integram o Estado, adequando-os ao novo paradigma estatal.

3 O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE COMO FUNDAMENTO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL[28]

A superação histórica do jusnaturalismo demonstra que o Direito não tem como se justificar por fundamentos abstratos e metafísicos de uma razão subjetiva. Por outro lado, a crise do positivismo jurídico ensina que há um longo caminho entre Direito e norma jurídica e que a ética e moral, próprias de uma sociedade em constante transformação, não têm como permanecer distantes da ciência jurídica. Nenhum dos dois movimentos consegue mais atender de forma satisfatória às demandas sociais.

Inaugura-se, por conseguinte, um novo período intitulado de pós-positivista[29], onde ocorre a superação dialética da antítese entre positivismo e jusnaturalismo, com a distinção das normas jurídicas em regras e princípios, tendo como conteúdo os valores. Além da normatividade alcançada pelos princípios, percebe-se que os valores fazem parte das ciências sociais, e, por conseqüência, do Direito, amadurecendo a tridimensionalidade de Reale.

O que importa ser destacado, no momento, é que os princípios jurídicos no atual contexto histórico do pós-positivismo são o espelho da ideologia da sociedade e dos

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valores acolhidos na ordem jurídica. Objetivam dar unidade e harmonia ao sistema, além de serem guias do intérprete. [30] [31] Os princípios, segundo Canotilho:

[...] são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex: princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex: princípio do Estado de Direito).[32]

Interessante, ainda, mencionar, que os princípios não precisam estar positivados de forma expressa na ordem jurídica para ter validade. Não há como o rol dos princípios ser taxativo, na medida em que eles sinalizam os valores e anseios da sociedade, que estão em constante transformação. Por conseguinte, limitá-los à ordem jurídica positiva é impossível, pois não se tem como engessar a sociedade. [33]

Uma vez verificada a relevância dos princípios jurídicos, em especial, do seu status de norma jurídica, resta analisar o princípio da solidariedade que estrutura o núcleo fundante do Estado de Direito Ambiental.

O princípio da solidariedade foi um dos lemas da Revolução Francesa, só que na roupagem de fraternidade, de fundamento comunitário e universal. No entanto, o Estado Liberal não conseguiu superar o caráter individualista do ideal burguês, e o Estado Social teve dificuldade de romper a distância entre a igualdade formal e a material, embora preocupado com os direitos sociais. O ressurgimento da solidariedade, entretanto, deu-se a partir da segunda metade do século XX, período do Segundo Pós-Guerra, com a promulgação de Constituições que têm como núcleo fundamental a dignidade da pessoa humana.

O contexto histórico do final do século XX e do início do século atual só confirma o que Rousseau já proclamava em sua bandeira revolucionária, marcando o nascimento de direitos transindividuais, que ultrapassam a esfera individual e coletiva da dignidade humana. Nesse sentido, o Estado de Direito Ambiental é galgado na solidariedade humana, sendo uma nova tarefa e meta a ser seguida pelo Estado hodierno.

A crise ambiental não ocorre de formada isolada, o que leva a constatar que a dignidade da pessoa humana não pode ser vista tão-somente no indivíduo, mas também em uma dimensão coletiva em sentido geral. Por conseguinte, traz à baila direitos que perpassam a esfera privada e se subordinam a interesses da maioria em prol do bem-estar social, em virtude da titularidade ser indefinida ou indeterminável. Assim, o princípio da solidariedade surge como instrumento que obriga que referidos direitos devam ser garantidos às gerações futuras.

Acerca do tema, Nunes Júnior manifesta-se no sentido de que “A finalidade do Estado Liberal é a liberdade e do Estado Social é a igualdade. Já o Estado Ambiental tem uma finalidade mais ampla: a solidariedade (centrada em valores que perpassam a esfera individualista própria do Estado Liberal)”.[34]

Conforme já dito, o meio ambiente sadio é condição para a vida em geral. E para que ocorra o equilíbrio ecológico, é necessário um esforço conjunto, de todas as esferas do corpo social, assim como do Poder Público, com o intuito de formar uma união de forças multilaterais no sentido de minimizar os impactos ambientais.

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A Constituição Federal de 1988 trata do princípio da solidariedade como objetivo da República em seu artigo 3º, I, ao prever a "construção de uma sociedade livre, justa e solidária." No inciso IV do mesmo artigo, visualiza-se outro objetivo que comprova a preocupação do constituinte originário com a solidariedade, ao estabelecer a "erradicação da pobreza e da marginalização social e a redução das desigualdades sociais e regionais". Como se vê, os dispositivos estabelecem um novo marco normativo-constitucional, ao consolidar a solidariedade como princípio da Carta Magna.[35]

Ainda no Texto Constitucional, o art. 225, núcleo do ambientalismo constitucional, cuida da solidariedade ao impor ao Poder Público e à coletividade o dever de proteger o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Não há duvidas de que o dever fundamental está diretamente relacionado ao princípio da solidariedade por dividir os encargos e responsabilidades na equidade geracional.

Outrossim, o citado princípio encontra guarida em tratados internacionais de direitos humanos de matéria ambiental ratificados pelo Estado brasileiro, em virtude da cláusula de abertura do §2º, do art. 5º, da Constituição Federal.[36]

Ao utilizar a metáfora da balança do Estado de Direito Ambiental, o “Ambiental”, por estar no suporte, traz o princípio da solidariedade, tendo como valor a sustentabilidade, pois se o meio ambiente não for sadio e equilibrado haverá o comprometimento de toda a balança, ou seja, da ordem jurídica em geral. Na lição de Leite:

Não se pode adotar uma visão individualista e sem solidariedade sobre as responsabilidades difusas e globais sobre a proteção ambiental. Trata-se de um pensamento equivocado dizer que os custos da degradação ambiental devem ser repartidos por todos em uma escala global que ninguém sabe calcular. [...] Portanto, somente com a mudança para responsabilidade solidária e participativa dos Estados e dos cidadãos com os ideais de preservação ecológica, é que se achará uma luz no fim do túnel.[37]

Insta observar, todavia, que embora referido princípio seja a matriz do Estado de Direito Ambiental, este não tem como atuar de forma isolada na ordem jurídica, haja vista que o Estado Ambiental continua sendo um Estado Democrático de Direito. A única (e fundamental) diferença são os acréscimos de novo princípio e valor-base, implicando numa visão holística entre os elementos já existentes. Assim, o princípio da solidariedade atuará de forma conjunta com o princípio da legitimidade (“Democrático”) e o princípio da juridicidade (“Direito”), além de outros que incorporam valores eleitos pelo constituinte.

A solidariedade torna fundamental a coexistência do ser humano em um corpo social, construindo um conjunto de relações intersubjetivas e sociais que se dá na comunidade estatal. O princípio da solidariedade, portanto, é o marco jurídico-constitucional do Estado de Direito Ambiental, uma vez que se manifesta como um novo viés normativo-axiológico que estrutura o novel paradigma estatal, assim como se irradia por toda a ordem jurídica em um processo de dialética.

4 A SUSTENTABILIDADE COMO MARCO-AXIOLÓGICO CONSTITUCIONAL DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL

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A visão antropocêntrica dos recursos naturais visando o lucro a qualquer preço deixou marcas inimagináveis no meio ambiente. Os recursos naturais não são fontes inesgotáveis, o que reforça a tese de que o ambiente sadio é condição para a vida em geral. É da colisão do crescimento econômico a todo custo através da utilização dos recursos naturais de forma irracional que acontecem inúmeros danos ao meio ambiente, colocando em risco a sobrevivência das espécies no planeta, inclusive a humana e a manutenção do equilíbrio ecológico.

Desta sorte, a utilização dos recursos naturais com vistas à promoção de atividades econômicas deve estar vinculada a um desenvolvimento planejado e responsável, com o intuito de evitar ou até mesmo diminuir as possibilidades de risco ambiental. É o que se denomina de sustentabilidade, revelando-se como um conceito sistêmico vinculado à continuidade da vida humana. Envolve aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais da sociedade.

Apesar da íntima ligação entre os termos, desenvolvimento sustentável não se confunde com sustentabilidade. Aquele é o meio para se alcançar o último. Ou seja, é preciso desvendar o caminho de uma forma de desenvolvimento ecologicamente correto para então se buscar a sustentabilidade nas suas mais variadas formas.

Em linhas gerais, o principio do desenvolvimento sustentável visa à manutenção das bases vitais da produção e reprodução ao garantir uma relação satisfatória entre o homem e o meio ambiente. Assim, as futuras gerações podem ter o direito de desfrutar dos recursos que hoje estão à disposição.

O conceito de desenvolvimento sustentável foi tratado pela primeira vez no Relatório “Nosso Futuro Comum” (Relatório Bruntdland) da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987, ao afirmar que os direitos sociais básicos possuem vinculação ao meio ambiente sadio. Se os direitos sociais mínimos, como saúde, educação, moradia, etc., já eram de difícil implementação no Estado Social, a sua efetivação se torna ainda mais árdua com o esgotamento do modelo desenvolvimentista adotado nos últimos tempos.[38]

Referido documento da ONU assevera, ainda, que o novo modelo de desenvolvimento deverá atender às necessidades das gerações presentes, mas sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras saciarem os seus próprios anseios.

No entanto, o primeiro tratado internacional (leia-se de natureza jurídica vinculante) a tratar do tema foi a Declaração do Rio, proferida em 1992, ao sustentar em seu Princípio 3 que o “direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas eqüitativamente as necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras". Sobre o tema, manifesta-se Soares:

Na verdade, o conceito de desenvolvimento sustentável, pedra de toque da ECO-92 e de todo direito internacional do meio ambiente que se seguiria àquela Conferência da ONU, realiza uma junção perfeita entre equilíbrio do meio ambiente e todos os aspectos da vida do homem em sociedade, inclusive sua dignidade e aspirações por uma vida sem privações. No fundo, tal conceito representa o reconhecimento de que o homem também é um componente do meio ambiente, cuja preservação (por incrível que pareça

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dizer, dadas as outras prioridades que se têm conferido aos animais e vegetais, até o presente!) é manifestamente superior a quaisquer outras formas de vida na Terra. [39]

Como se vê, a fórmula do desenvolvimento sustentável se dá por meio de um tripé, ou seja, são três elementos que o integram e devem ser considerados de forma conjunta: desenvolvimento econômico, equidade social e equilíbrio ambiental. Assim, o desenvolvimento sustentável preconiza que não só as presentes gerações, mas também as futuras, devam suprir suas necessidades em termos econômicos, sociais e ambientais. Referida espécie de desenvolvimento é a prova de que o Estado de Direito Ambiental não se trata da superação total dos modelos anteriores. É o redimensionamento de institutos, princípios e valores passados que devem ter agregados em sua estrutura o princípio da solidariedade e o desenvolvimento sustentável.

Ilustra Mascarenhas que desenvolvimento não se confunde com crescimento, na medida em que este prioriza a acumulação de capital sobre os demais componentes do processo, além de possuir um sentido mais limitado, vinculando-se à seara econômica. Tratando ainda do tema, afirma a autora que o desenvolvimento sustentável

[...] busca um equilíbrio da natureza considerando os componentes da ordem sócio-econômica. A prática do desenvolvimento sustentável passa necessariamente pela mudança de atitudes, pois as conseqüências dos danos ambientais têm ultrapassado as fronteiras dos países, muitas vezes, causando impactos distantes do lugar em que os danos aconteceram. [40]

Percebe-se que o princípio da solidariedade está obrigatoriamente consubstanciado no conceito de desenvolvimento sustentável. Isto se deve pela titularidade difusa do meio ambiente, pois esta ultrapassa o plano dos interesses individuais das pessoas per si (transindividual) ou grupo, caracterizando-se por sua indivisibilidade. Seu objeto diz respeito a todos os membros da sociedade, ao mesmo tempo em que não é destinado a alguém exclusivamente por ser indivisível e possuir titulares indeterminados, cuja relação entre estes tem origem em uma situação de fato.

No direito brasileiro, referido princípio é visualizado no art. 4º, I, da Lei 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, ao estabelecer como um dos seus objetivos a “compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico”.

A Constituição “esverdeada”, de 1988, ao seguir a tendência mundial, aborda o desenvolvimento sustentável no caput, do art. 225, quando da colocação expressa e impositiva ao Poder Público e à coletividade do dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.

O desenvolvimento sustentável deve buscar alternativas econômicas e sociais que causem a menor ofensa possível ao meio ambiente, a fim de manter uma equidade geracional. Assim leciona Millaré:

Dentro da visão ambiental, o desenvolvimento sustentado está diretamente relacionado com o direito a manutenção da qualidade de vida através da conservação dos bens ambientais existentes no nosso planeta. Exatamente por isso, o texto maior estabelece a regra de que o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado não é apenas dos

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habitantes atuais, mas também dos futuros e potenciais, enfim, das próximas gerações.[41]

Entretanto, não há óbice ao desenvolvimento de atividades econômicas, mesmo porque a Carta Maior firma a garantia da livre iniciativa. Contudo, tal garantia não é passível de verificação quando põe em questão a disposição de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, vez que é bem essencial à dignidade da pessoa humana e, em conseqüência, à vida com qualidade, desta e das gerações que estão por vir.

No entanto, esse desenvolvimento há de ser sustentável, sendo exercido mediante uma consciência sistêmica e racional ao estabelecer um ponto de equilíbrio entre o homem e a natureza. Dessa forma, defende-se um convívio saudável, ecologicamente equilibrado, garantindo ao homem de hoje e ao de amanhã uma sadia qualidade de vida.

O modelo do desenvolvimento sustentável traz à baila discussões que envolvem o direito, meio ambiente e a economia, por meio de um movimento intitulado de Análise Econômica do Direito. [42] Explica Battesini que as relações entre a atividade econômica e o meio ambiente são “complexas e multifacetárias e, em ambiente globalizado, permeadas por componente dinâmico caracterizado pela elevada mobilidade de pessoas, bens, capitais e informações através do mundo”. [43] [44]

É necessária, por conseguinte, uma política ambiental para a introdução e adoção de posturas e procedimentos menos agressivos ao meio ambiente, objetivando o desenvolvimento sustentável.[45] Os instrumentos econométricos da Análise Econômica do Direito podem ser utilizados para a formação e estruturação e bom funcionamento das técnicas do Direito Ambiental.[46]

A busca de um equilíbrio entre desenvolvimento sustentável, crescimento econômico e a utilização de recursos naturais exigem um planejamento adequado onde há limites de sustentabilidade.

A sustentabilidade como novo valor-base do Estado de Direito Ambiental (juntamente como a justiça e a segurança jurídica já existentes no Estado Democrático de Direito) impõe uma visão holística e sistêmica, ou seja, partindo do todo, do “meio”, para buscar efetivar os demais elementos.

Nesse sentido, a sustentabilidade é o marco axiológico-constitucional captado de forma indutiva da crise ambiental. É um valor que nasce da realidade e que penetra em todos os ramos de conhecimento, inclusive nas ciências jurídicas. A ordem jurídica deve ser relida no sentido de efetivá-lo, amadurecendo, portanto, o Estado de Direito Ambiental.

5 ELEMENTOS INTEGRANTES DO ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL

Apesar de várias discussões no âmbito do estudo da Teoria do Estado, a doutrina clássica, segundo Dallari[47], aponta quatro elementos integrantes do conceito de Estado: soberania, território, povo e finalidade.[48] [49] No que concerne à noção de ordem jurídica, o citado autor alega que esta já se encontra implícita, uma vez que ao se analisar uma sociedade geral, deduz-se que ela é uma ordem jurídica.[50]

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Uma vez verificada a necessidade da construção do Estado de Direito Ambiental, é mister analisar suas características fundantes, a fim de amadurecer o fundamento teórico do novo paradigma estatal.

5.1 Soberania

De acordo com Maluf, “soberania é uma autoridade superior que não pode ser limitada por nenhum outro poder”. [51] Quanto à inclusão da soberania como um elemento autônomo do Estado, Maluf destaca que tal fato é impossível, na medida em que esta se compreende no exato conceito de Estado. Ou seja, “Estado não-soberano ou semi-soberano não é Estado”.[52]

A soberania releva o mais alto poder do Estado, a qualidade de poder supremo, manifestando-se em dois momentos distintos: a interna e a externa. Acerca do tema, ensina Bonavides:

A soberania interna significa o imperium que o Estado tem sobre o território e a população, bem como a superioridade do poder político frente aos demais poderes sociais, que lhe ficam sujeitos, de forma mediata ou imediata. A soberania externa é a manifestação independente do poder do Estado perante os outros [...].[53]

Sobre a soberania interna, Reale explica que esta se revela o "poder de organizar-se juridicamente e de fazer valer dentro de seu território a universalidade de suas decisões nos limites dos fins éticos de convivência".[54] É a centralização do poder para a eliminação de conflitos internos, como no caso de guerra civil, com o objetivo de manter a paz e a ordem.

Destarte, percebe-se que a soberania pode ser concebida como sinônimo de independência (âmbito externo) quando se deseja afirmar que não há submissão a qualquer potência estrangeira, assim como expressão de poder jurídico mais elevado (âmbito interno), ao significar que, dentro dos limites da jurisdição do Estado é ele que tem o poder de decisão em última instância. [55]

Ao analisar a historicidade da soberania, constata-se que a primeira obra teórica a discipliná-la foi “Les Six Livres de la Republique”, em uma tradução livre, “Os Seis Livros da República”, do francês Jean Bodin, publicada em 1576. Esclarece Dallari que para Bodin “a soberania é o poder absoluto e perpétuo de uma República, palavra que usa tanto em relação aos particulares quanto em relação aos que manipulam todos os negócios de estado de uma República”. [56]

Ao se manifestar como um poder absoluto, a soberania não é limitada nem em poder, nem pelo cargo, nem por tempo certo. Não existiria uma limitação terrena, mas tão-somente uma divina e espiritual, uma vez que, em relação às leis divinas e naturais, “todos os príncipes da Terra estão sujeitos e não está em seu poder contrariá-las, se não quiserem ser culpados de lesar a majestade divina, fazendo guerra a Deus [...] São essas, portanto, as únicas limitações do poder soberano”.[57] Além de absoluta, Bodin defendia que a soberania era um poder perpétuo, uma vez que não poderia ser exercida com tempo certo de duração.

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Cerca de dois séculos depois, Rousseau caracterizou a soberania na sua obra “O Contrato Social”, em 1762. Para o teórico suíço, a soberania é inalienável, por ser o exercício da vontade geral, não podendo esta se alienar e nem mesmo ser representada por quem quer que seja. Além disso, ela é indivisível, na medida em que só a vontade só é geral se houver a participação do todo. [58] [59]

Percebe-se, pois, que vigorava o caráter absoluto da soberania, refletindo na forma organizacional do Estado autocrático nos limites de seu território e nas relações que mantinha com seus pares.

Nesse sentido, atenta Madruga Filho[60] que o conceito de soberania surgiu para legitimar o poder político dos reis e príncipes, resultante das lutas travadas em oposição às interferências externas (Papa e o Imperador) e internas (senhores feudais), em troca da observância de normas internacionais, que regulamentavam a convivência com os demais poderes soberanos. Ainda nessa linha, ressalta Venilto Júnior, que “o surgimento histórico do conceito de soberania significou a negação de subordinação ou limitação do Estado por qualquer outro poder, passando este a encerrar um poder supremo e independente”. [61]

A soberania hoje se releva, segundo Dallari e Bonavides, em uma concepção jurídico-política ou culturalista, possuindo quatro características: ela é una, indivisível, inalienável e imprescritível. A unidade se dá porque não se admite a convivência de mais de uma soberania em um mesmo Estado. Já a indivisibilidade ocorre, uma vez que, além da unidade, é inadmissível a existência de várias partes separadas da soberania. De acordo com Soares, trata-se de uma “qualidade do Estado, é um superlativo que não pode dividir-se, mas que apenas tolera junto de si outros poderes do mesmo gênero”.[62]

Outrossim, a soberania é inalienável, pois aquele que a detém desaparece quando ficar sem ela. Por fim, a imprescritibilidade é fundamental porque a soberania jamais seria superior se tivesse prazo certo de duração. Para Dallari, “todo poder soberano aspira a existir permanentemente e só desaparece quando forçado por uma vontade superior”. [63]

Ocorre, entretanto, que o conceito de soberania, outrora irrestrito, evoluiu, assumindo uma concepção mais relativizada, por imposição da nova dinâmica internacional. O Estado, que se restringia ao exercício de funções públicas e de administração da coisa pública, passa a intervir em assuntos econômicos[64], assumindo responsabilidades típicas da esfera privada. Com isso, mitiga-se o conceito clássico de soberania, impondo seu redimensionamento.

A flexibilização do conceito de soberania, conforme os ensinamentos de Fonseca, “não significa que a soberania do ente de direito público externo (Estado estrangeiro ou organismo internacional) esteja derrogada. Houve apenas um recuo. Ficou somente limitada e restringida, como permite o Direito”. [65] Ainda acerca do tema, ilustra Madruga Filho:

Seria pelo menos ingênuo, se não fosse equivocado, conceber a soberania como um poder ilimitado, seja interna ou externamente. O soberano, mesmo identificado na figura do povo ou da nação e agindo dentro das fronteiras do território que lhe é reconhecido

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sem disputas, deve observar limites. O poder constituinte originário, face do poder soberano empregado na constituição dos Estados e dos princípios norteadores da convivência nacional, não pode tudo. A discricionariedade do soberano ao constituir um Estado há de respeitar limites, tanto nas suas relações exteriores (com outros Estados, no âmbito de espaços internacionais ou frente a nacionais de outros Estados), como frente às minorias que, sendo parte integrante do povo que habita o território, estão excluídas do comando do poder soberano exercido pela maioria.[66]

Assim, a soberania vinculada internamente não se coaduna mais ao estágio alcançado pelos Estados. Deve haver uma evolução da mesma para que seja possível uma adaptação às tendências da sociedade internacional. Na lição de Paupério, “a soberania do Estado não pode ser estática: tem que ser dinâmica, no sentido de se tornar capaz de adaptar à variedade das circunstâncias que se abrem, constantemente, na vida dos povos”. [67] E o meio ambiente se revela um problema emergencial que os povos enfrentam, dinamizando a soberania.

Ao tratar da tutela ambiental, a Declaração de Estocolmo, de 1972, prevê como princípio 21 que os Estados possuem de acordo com a Carta das Nações Unidas e com os princípios do direito internacional, o direito soberano de explorar seus próprios recursos em suas políticas ambientais, defendendo a imunidade de jurisdição. No entanto, referido princípio é relativizado quando a mesma Declaração de Estocolmo, assim como a Declaração do Rio ratificam o direito de exclusividade de exploração dos recursos naturais dentro do seu território, mas ressaltam que os Estados devem assumir responsabilidade de garantir que as atividades dentro de sua jurisdição não venham a lesar o meio ambiente alheio, ou seja, de outro país. [68] [69]

Ora, tal afirmação promove a limitação da soberania dos Estados, tanto interna, como externamente, uma vez que condiciona que o dano ambiental deve permanecer in locu. Entretanto, como saber que o impacto causado no meio ambiente é meramente local? A natureza não conhece os limites políticos, geográficos, jurídicos e territoriais impostos pelo Estado, motivo pelo qual se suscitam tensões entre as soberanias.

Hodiernamente, por conta da globalização, as fronteiras não conseguem definir de forma clara a delimitação da soberania, uma vez que se vive em uma civilização genuinamente transnacional. [70] Por conta disso, Bonavides observa que as ideologias produzem imensa solidariedade entre os indivíduos de países diferentes que acabam por estreitá-los num vínculo de consciência mais sólido do que a própria nacionalidade.[71]

Trata-se exatamente do caso da solidariedade que envolve o meio ambiente ao impor a cooperação entre os povos. Os meios de comunicação em massa possibilitam a formação da opinião pública da comunidade internacional, que, por conseguinte, exerce pressão nas ações do Estado. Assim, novas autoridades passam a adentrar nas esferas de poder, limitando a soberania estatal. A crise ambiental vem provocando uma consciência na comunidade internacional, convertendo-se em pressão interna e externa nos Estados que força os governos a aderirem à proteção ambiental. [72]

Para tentar adequar a soberania às questões ambientais globais, Kiss e Shelton explicam que a ONU proclama o princípio da responsabilidade comum, mas diferenciada,

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retratando que cada Estado deve proteger o meio ambiente dentro do exercício da sua soberania, uma vez que não existem fronteiras quando se trata de questões ecológicas. [73] Mas não seria justo, em virtude do desenvolvimento de cada país, que todos os Estados tivessem os mesmos deveres e obrigações de preservação ambiental.

Sem dúvidas, a atual crise ambiental é global, mas o mesmo não ocorre com sua governança. Os instrumentos internacionais não pretendem (e nem poderiam) anular a soberania, mas buscam apenas criar mecanismos de gestão e de responsabilidade conjunta para a defesa do meio ambiente, difundindo a solidariedade entre os povos.

A respeito das dificuldades existentes para a proteção ambiental, observa Leite que os obstáculos para a implementação do meio ambiente são enormes, haja vista atingir uma dimensão planetária, exigindo instrumentos que transcendem o interior do Estado de Direito e, por reflexo, a sua soberania. Ressalta, ainda, o autor:

Ao que parece, uma internacionalização das políticas de crescimento poderia ser um instrumento para deter a perda do patrimônio ambiental. Observe-se, porém, que este instrumento levaria a uma transferência de soberania aos Estados, tornando-se uma árdua tarefa em face do sistema vigente na sociedade organizada.[74]

Logo, soberania e meio ambiente são conceitos que se limitam reciprocamente, mas são compatíveis quanto à sua formação constituinte. A soberania deve continuar a existir, uma vez que permanece como um elemento indispensável do conceito de Estado. O que há é a cooperação entre os institutos, nascendo instrumentos internacionais que obrigam juridicamente cada Estado de promover meios eficazes da tutela ambiental.

Ponto importante que merece ser destacado é que um Estado, ao assinar um tratado internacional de defesa do meio ambiente[75], não tem obrigação de ratificá-lo, ou seja, não implica a integração do tratado ao ordenamento jurídico interno.[76] Não obstante a imposição jurídica, que só ocorre com a recepção formal do pacto, constata-se a obrigação moral, com a pressão na comunidade internacional, refletindo em um compromisso voluntário dos Estados acerca da preservação ambiental.

Por conta disso, o princípio da solidariedade que funda o Estado de Direito Ambiental promove uma rediscussão do conceito de soberania, à medida que o meio ambiente motiva a tomada de consciência solidária do destino do planeta e dos perigos que a ameaçam a sobrevivência da humanidade.

5.2 Território

Até o século XIX, todos os pensadores que buscaram construir um conceito de Estado, de Platão a Hegel, nunca consideraram o território de forma particular, nem o incluíram como elemento existencial do aparato estatal, apesar de reconhecerem a importância que os fatos geográficos têm para o cotidiano do Estado.[77]

Assim, o território só veio a ser considerado como parte integrante do Estado com o Estado Moderno, da mesma forma que ocorreu com a soberania. Esta só pode ser exercida dentro de uma limitação de espaço com o objetivo de assegurar a eficácia do poder e a estabilidade da ordem, o que leva Dallari a observar que “a afirmação da

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noção de território foi uma decorrência histórica, ocorrendo quando os próprios fatos o exigiram”. [78]

Apesar de algumas divergências em torno do tema, Dallari expõe alguns aspectos fundamentais sobre os quais há um relativo consenso na doutrina. O primeiro diz respeito ao fato de que não existe Estado sem território. A sua perda temporária não desnatura o Estado, que continua a existir enquanto não se tornar definitiva a impossibilidade de reintegrá-lo. Uma segunda característica é que o território delimita a ação soberana do Estado, de onde se tira o princípio da impenetrabilidade (ou territorialidade), apesar de haver algumas exceções impostas pelo Direito Internacional, mas que não abalam a soberania. Por fim, destaca o autor que além do território ser elemento constitutivo do Estado, âmbito da sua ação soberana, é objeto de direitos de interesses deste, considerado no seu conjunto.[79]

O território, portanto, é a base especial do poder jurisdicional do Estado, onde se exerce o poder coercitivo estatal. É composto, segundo Soares, “pela terra firme, incluindo o subsolo e as águas internas (rios, lagos e mares internos), pelo mar territorial, pela plataforma continental e pelo espaço aéreo”. [80]

Ponto interessante acerca do estudo é a sua limitação, ou seja, a partir de que momento se finda o território de um Estado e passa a começar o do outro. Sobre as fronteiras, estas eram divididas em naturais, fixadas por acidentes geográficos, e as artificiais, estabelecidas por meio de tratados internacionais. Ocorre que com os atuais recursos técnicos da aerofotogrametria, não há praticamente linha de fronteira que não esteja precisamente delimitada.[81] [82]

No entanto, o que importa esclarecer é que muito do que foi analisado pela Teoria do Estado em relação ao território precisa ser reavaliado por conta do meio ambiente e do novo Estado de Direito Ambiental. Os impactos do homem no meio ambiente extrapolam o conceito geopolítico de território. Um dano ambiental não fica limitado ao local da sua realização. Há o desaparecimento das fronteiras nacionais à medida que os Estados não mais limitam as atividades dos indivíduos.

Por conseguinte, da mesma forma que ocorre com a soberania, o conceito de território é redimensionado, ao invocar a responsabilidade e cooperação dos Estados na defesa do meio ambiente dentro da sua limitação territorial formal. Utiliza-se também como fundamento o princípio 21 da Declaração de Estocolmo e o princípio 2 da Declaração do Rio ao asseverarem que aos Estados é permitida a exploração dos recursos naturais dentro do seu território, conquanto que os mesmos tenham responsabilidade de garantir que referida exploração, que representa o exercício da soberania, não venha a gerar impacto negativo no meio ambiente de outro Estado.

O Estado de Direito Ambiental, galgado no princípio da solidariedade, tendo como valor-base a sustentabilidade, impõe que haja uma consciência e responsabilidade não apenas de forma interna, dentro da delimitação territorial estatal, na exploração sustentada dos recursos naturais. Referida mobilização deve ocorrer em todos os Estados, de forma conjunta e global, uma vez que, como visto, os danos causados ao meio ambiente não respeitam as fronteiras impostas pela Teoria do Estado e pelo Direito Internacional Público.

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5.3 Povo

O vocábulo “povo” tem diversas acepções e gera vários sentidos em virtude do seu uso excessivo, muitas vezes com um caráter emotivo ou apelativo. A primeira observação feita por Bonavides é a diferença entre povo e população. Segundo o autor:

Todas as pessoas presentes no território do Estado, num determinado momento, inclusive estrangeiros e apátridas, fazem parte da população. É por conseguinte a população sob esses aspecto um dado essencialmente quantitativo, que independe de qualquer laço jurídico de sujeição ao poder estatal. Não se confunde com a noção de povo, porquanto nesta, fundamental é o vínculo do indivíduo ao Estado através da nacionalidade ou cidadania. [83]

Como se extrai do entendimento acima, população é um conceito puramente demográfico e estatístico, carecendo de juridicidade. Além disso, população também é utilizada do ponto de vista econômico e reflete em questões políticas, como a relação do coeficiente populacional com a variável de grandeza ou miséria de um Estado.[84]

Outro ponto que pode provocar equívocos é a relação entre povo e nação, uma vez que são conceitos distintos, porém relacionados. A idéia de nação surgiu no século XVIII com o objetivo de ser, ilustra Dallari, “a expressão do povo como unidade homogênea”,[85] adquirindo grande prestígio durante a Revolução Francesa. Assim, tanto a nação como a nacionalidade devem ser utilizadas para indicar uma comunidade histórico-cultural, não sendo conveniente para o sentido de povo que integra o Estado.[86]

Existem, como se vê, dimensões políticas, jurídicas e sociológicas para o conceito de povo. No entanto, para ser elemento do Estado o que há de ser considerado é o conceito jurídico que trata de todos aqueles que têm cidadania. Nos ensinamentos de Bonavides, “a cidadania é a prova de identidade que mostra a relação ou vínculo do indivíduo com o Estado. É mediante essa relação que uma pessoa constitui fração ou parte de um povo”. [87]

Por conta disso, Soares assevera que povo “em sentido democrático, pressupõe a totalidade dos que possuem o status da nacionalidade, os quais devem agir, conscientes de sua cidadania ativa, segundo idéias, interesses e representações de natureza política”. [88]

A cidadania, portanto, é elemento fundamental para delimitação do povo, e, conseqüentemente, do Estado. Sobre o tema, destaca Cortina:

A cidadania é um conceito mediador porque integra exigências de justiça e, ao mesmo tempo, faz referência aos que são membros da comunidade, une racionalidade da justiça com o calor do sentimento de pertença. Por isso, elaborar uma teoria da cidadania ligada às teorias da democracia e justiça, mas com autonomia relativa diante delas, seria um dos desafios de nosso tempo.[89]

O princípio da solidariedade, que ocupa um dos pilares do Estado de Direito Ambiental, encontra-se na essência da cidadania, sendo indispensável para a existência humana.[90] O povo há de ser solidário naquilo que sua participação implique em um êxito comum.

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E não há maior interesse comum do que a própria sobrevivência, o que torna indispensável um meio ambiente sadio.

É inconteste que a defesa e a proteção do meio ambiente exigem solidariedade, pois não importa se tão-somente um Estado, um município ou uma região tenha consciência ambiental na orientação de suas políticas públicas. É sabido que muitos locais, dentro de um mesmo país, sofrem as conseqüências pelo desrespeito à natureza, mesmo sabendo que, muitas vezes, não contribuíram diretamente para o impacto negativo no meio ambiente. É preciso, portanto, que todos estejam unidos e solidários em uma causa que demanda participação de todo povo.

O homem, na condição de cidadão (e integrante do povo), torna-se titular do direito ao ambiente equilibrado e também sujeito ativo do dever fundamental de proteger o ambiente. O Estado de Direito Ambiental, ao emanar como valor-base a sustentabilidade, originada do princípio da solidariedade, exige uma nova concepção de cidadania, intitulada de cidadania ambiental, com uma participação ativa do povo na qualidade de sujeito do direito-dever do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

5.4 Finalidade

O Estado, por sua natureza, não poderia ser uma instituição alheia à finalidade. Assim, ilustra Maluf que o Estado é o meio destinado à realização dos fins da comunidade. São exatamente esses fins que determinam a sua organização e que traçam as diretrizes de sua atividade.[91] Observa, ainda, Dallari que “é impossível chegar-se a uma idéia completa do Estado ter a consciência de seus fins”.[92]

O Estado, como sociedade política, possui um fim geral, constituindo-se em meio para que os indivíduos e demais sociedades possam atingir seus respectivos fins particulares. E qual seria, afinal, esse fim geral? Dallari ressalta que a finalidade do Estado é “o bem comum, entendido este como o conceituou o Papa João XXIII, ou seja, o conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana”. [93]

Ao adequar a idéia supracitada de bem comum ao Estado, percebe-se que a figura estatal deve buscar o bem comum de um povo específico dentro de um território delimitado. E o instrumento para alcançá-lo, sem dúvidas, é a soberania.

No Estado de Direito Ambiental, a finalidade ou meta básica deverá ser o meio ambiente sadio, uma vez que este é condição para a vida humana, e conseqüentemente, para outros fins que porventura venham (e devam) existir, como a equidade social e o desenvolvimento econômico. Ademais, ao ter como tarefa-chave o ambiente ecologicamente equilibrado, o Estado vai ser o meio, ou seja, o instrumento através do qual os demais membros da sociedade poderão buscar seus fins particulares.

CONCLUSÃO

A preservação do meio ambiente é valor fundamental na sociedade contemporânea. É mister que ocorra a compatibilidade da proteção ao meio ambiente com a produção de bens para o atendimento das necessidades materiais, mormente em um sistema capitalista e globalizado. Deve ser ponderado que não há riqueza se não existir vida e

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não existe vida se não houver planeta. Ou seja, o meio ambiente sadio acaba sendo a condição para a efetivação do próprio Direito.

A crise ambiental demanda atitudes emergenciais, o que pressupõe um novo papel do Estado e, consequentemente, do Direito. O Estado de Direito Ambiental é um paradigma estatal possível, não obstante a dificuldade de efetivá-lo, com elementos integrantes sólidos e adequados, tendo como fundamento teórico-constitucional o princípio da solidariedade e como marco axiológico-constitucional a sustentabilidade.

Deve ser observado, ainda, que o Estado de Direito Ambiental continua sendo um Estado Democrático de Direito ao possuir três valores-base: justiça, segurança jurídica e sustentabilidade. O que ocorre são acréscimos de novo princípio e valor-base, implicando numa visão holística e sistêmica, ou seja, partindo do todo, do “meio”, para buscar efetivar os demais elementos.

A solidariedade e a sustentabilidade implicam uma rediscussão dos elementos da Teoria Geral do Estado. Verifica-se que o Estado “esverdeado” exerce sua soberania (que não é mais absoluta por conta da globalização e da crise ambiental) no seu território (com a responsabilidade de preservar o meio ambiente, uma vez que não existem fronteiras para o dano ecológico), a fim de atingir a finalidade do bem comum (que deve ter como meta inicial a vida sadia e ecologicamente equilibrada) para o seu povo (que deverá também exercer uma cidadania ambiental, uma vez que é titular do direito-dever do meio ambiente sadio).

A construção do Estado de Direito Ambiental provoca mudanças profundas na estrutura da sociedade e na atividade estatal, com o objetivo de apontar caminhos e buscar alternativas para a superação da atual crise ambiental. Com o novo paradigma, institutos antigos são redimensionados e outros são criados, podendo-se falar hoje, por exemplo, de cidadania ambiental, devido processo ambiental, justiça ambiental, dimensão ecológica da dignidade da pessoa humana e hermenêutica jurídica ambiental.

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[1] WOLKMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 74.

[2] MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva: 1998, p.1.

[3] LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: uma difícil tarefa. In: Inovações em Direito Ambiental. LEITE, José Rubens Morato (org.). Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2000, p.13.

[4] SILVA, José Afonso da Silva. Direito Ambiental Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 65.

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[5] BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes, 1999, p. 17-18.

[6] BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccacia Versiani. São Paulo: Manole, 2007, p. 43-45.

[7] MATIAS, João Luis Nogueira; BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Direito, Economia e Meio Ambiente: a função promocional da ordem jurídica e o incentivo a condutas ambientalmente desejadas. In: NOMOS: Revista do Curso de Mestrado em Direito da UFC, v. 27, jul./dez., 2007, Fortaleza, p. 155-176.

[8] BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 6.

[9] ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 255.

[10] SILVA, Solange Teles da. Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado: avanços e desafios. In: Revista de Direito Ambiental, a. 12, n. 48, out./dez., p. 225-245, Revista dos Tribunais: São Paulo, 2007, p. 230.

[11] OLIVEIRA, Helli Alves de. Intervenção estatal na propriedade privada motivada pela defesa do ambiente. Revista Forense, v. 317, p. 141, 1992 apud BENJAMIM, Antônio Herman. Constitucionalização do ambiente e Ecologização da Constituição Brasileira. In Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (orgs.). São Paulo: Saraiva, 2007, p. 98.

[12] Afirma Nunes Júnior que se deve afastar “a visão ambiental “totalitária”, voltada para a proteção maximalista do meio ambiente em detrimento de outros direitos fundamentais”. NUNES JUNIOR, Amandino Teixeira. O Estado Ambiental de Direito. Revista de Informação Legislativa, Distrito Federal: Senado Federal, p. 295-307, a. 41, n. 163, jul./set. 2004, p. 298.

[13] O Direito Ambiental é transdisciplinar, atuando de forma vertical e horizontal, ao invadir todas as esferas do Direito. São várias as disciplinas específicas como Direito Constitucional Ambiental, Direito Econômico Ambiental, Direito Tributário Ambiental, Direito Processual Ambiental, Direito Penal Ambiental, dentre outros. Na seara privada, vislumbra-se a função ambiental da propriedade e as limitações ao seu direito, o meio ambiente do trabalho, o meio ambiente e a produção intelectual, além de outros temas, como a natureza jurídica do crédito de carbono e o Direito Empresarial, etc.

[14] NUNES JUNIOR, op. cit., p. 299.

[15] A título de exemplo, pode-se mencionar a Lei n. 9.735/99 que dispõe sobre a educação ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental, abordando os princípios, objetivos e deveres do Poder Público, instituições educativas, órgãos administrativos ambientais, meios de comunicação, empresas e a sociedade em geral. A lei define, em seu art. 1º, a educação ambiental como processo evolutivo e social, essencial à sadia qualidade de vida e sua sutentabilidade.

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No que tange à função ambiental da propriedade, o Código Civil atual, em seu art. 1228, aloca o equilíbrio ecológico de forma autônoma, fora da função social da propriedade, comprovando o status material do direito fundamental ao meio ambiente equilibrado. O legislador foi além, ao impor uma função ecológica nova, gerando outras obrigações ao proprietário de qualquer bem, além daquelas já previstas com a função social. O novo dispositivo trata de uma norma geral do direito de propriedade, seja ela intelectual, virtual, empresária, etc., todas estão submetidas à função ambiental, em perfeita consonância com o direito fundamental ao equilibro ecológico e com o Estado de Direito Ambiental. BELCHIOR, Germana Parente Neiva; MATIAS, João Luis Nogueira. A função ambiental da propriedade. Trabalho apresentado no XVII Congresso Nacional do CONPEDI em Brasília. Aguardando a publicação nos Anais do Evento.

[16] NUNES JUNIOR, op. cit., p. 297.

[17] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional Ambiental Português: tentativa de compreensão de 30 anos das gerações ambientais no direito constitucional português. In: Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (org.). São Paulo: Saraiva, 2007, p. 6.

[18] O lusitano Santos, desde 1994, já defendia que “a edificação de um Estado de Ambiente importa a transformação global, não só dos modos de produção, mas também dos conhecimentos científicos, dos quadros de vida, das formas de sociabilidade e dos universos simbólicos e pressupõe, acima de tudo, uma nova paradigmática com a natureza, que substitua a relação paradigmática moderna”. SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. Porto: Afrontamento, 1994, p. 42.

[19] CANOTILHO, op. cit., p. 149-154.

[20] Segundo Molinaro, “um Estado Socioambiental e Democrático de Direito decorre do princípio da unidade de sua Constituição, que alberga um Estado-Ambiental, fundado numa tríade principal (Prinzipientrias), ou se preferido, um conjunto triásico de princípios: princípio da precaução (Vorsorgeprinzip); princípio [de responsabilidade] causal (Verursacherprinzip); princípio da cooperação (Kooperationsprinzip)”. MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 104-105.

[21] MOLINARO, op. cit., p. 103.

[22] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito público do ambiente. Coimbra: Faculdade de Direito de Coimbra, 1995.

[23] CAPELLA, Vicente Bellver. Ecologia: de las razones a los derechos. Granada: Ecorama, 1994, p. 248.

[24] LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e Estado. In: Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (org.). São Paulo: Saraiva, 2007, p. 49.

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[25] LEITE, op. cit., p. 151.

[26] Aqui se deve ter o cuidado para não confundir com princípio da legalidade, pois se pode ter a falsa idéia que o compromisso é somente com as leis, o que não é verdade. O Direito não se limita apenas às regras, uma vez que o Pós-Positivismo traz à baila o caráter normativo dos princípios, cujos conteúdos se manifestam por meio dos valores. É o Direito por regras e princípios, defendido por Alexy, Dworkin, Canotilho e Bonavides.

[27] HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: SAFE, 2001.

[28] A doutrina vem apontando princípios estruturantes do Estado de Direito Ambiental como o princípio da prevenção, princípio da precaução, princípio da responsabilização, princípio da participação, princípio do desenvolvimento sustentável e princípio do poluidor-pagador. No entanto, ao analisar todos esses princípios, percebe-se que a solidariedade acaba estando inserida seja de forma transversal ou direta em todos os demais. Por conta disso, é que o princípio da solidariedade é o fundamento teórico-jurídico do Estado de Direito Ambiental, o que não exclui, por conseguinte, os demais.

[29] Na lição de Barroso, “o pós-positivismo é a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da chamada nova hermenêutica constitucional, e a teoria dos direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da dignidade humana.” BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, v. 1, n. 6, setembro, p. 1 – 32, 2001. Disponível em www.direitopublico.com.br. Acesso em 20 de fevereiro de 2009, p. 19.

[30] BARROSO, op. cit., p. 20.

[31] Diante da sua atual importância, Barroso resume que os princípios desempenham três papéis distintos na ordem jurídica, a saber, “a) condensar valores; b) dar unidade ao sistema; c) condicionar a atividade do intérprete”. Idem, p. 20.

[32] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 2000, p. 1124.

[33] Os princípios nascem de um movimento jurídico de indução, ou seja, do individual para o geral, emanando a justiça. A doutrina e, em especial, a jurisprudência realizam referido processo de abstração na teorização e aplicação do Direito. Vê-se que, neste momento, eles já são normas jurídicas, condensando valores e orientando o intérprete, uma vez que o Direito não só a lei, como queria o Positivismo Jurídico. Com a sua reiterada aplicação e permanência no seio social, o legislador, a fim de lhe garantir também segurança jurídica, ampara-o em uma lei, ou na própria Constituição, por meio de um raciocínio jurídico por dedução.

[34] NUNES JÚNIOR, Venilto Paulo. O conceito de soberania no século XXI. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, ano 11, n. 42, jan./mar. 2003, p. 300.

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[35] Interessante, ainda, mencionar que o princípio da solidariedade também está previsto no preâmbulo da Constituição Federal ao asseverar que os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna. Embora o preâmbulo careça de juridicidade, trata-se de uma carta de intenções do constituinte que não deixa de ser uma norma moral que manifesta os ideais e valores da sociedade.

[36] A Declaração do Rio, de 1991, e a Declaração da Biodiversidade Biológica, de 1992, são alguns dos instrumentos internacionais incorporados à ordem jurídica interna que obrigam a aplicação do princípio da solidariedade em escala planetária, com sua incidência em todas as nações, povos e grupos humanos da mesma geração, assim como da futura.

[37] LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: uma difícil tarefa. In: Inovações em Direito Ambiental. LEITE, José Rubens Morato (org.). Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2000, p. 18-19.

[38] COMISSÃO MUNDIAL SOBRE O MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1991, p. 46.

[39] SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 77.

[40] MASCARENHAS, Luciane Martins de Araújo. Desenvolvimento Sustentável: Estudo de Impacto Ambiental e Estudo de Impacto de Vizinhança. Curitiba: Letra da Lei, 2008, p. 30.

[41] MILLARÉ, Édis. Direito do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.171.

[42] A Análise Econômica do Direito é um movimento acadêmico que pretende abordar o direito sob a perspectiva econômica. “A perspectiva econômica é crucial para a análise da eficiência das normas jurídicas ou para o estudo do efeito das normas regras na distribuição da riqueza ou renda. Trata-se de reconhecimento de que o direito influencia e é influenciado pela economia”. MATIAS, João Luis Nogueira; BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Direito, Economia e Meio Ambiente: a função promocional da ordem jurídica e o incentivo a condutas ambientalmente desejadas. In: NOMOS: Revista do Curso de Mestrado em Direito da UFC, v. 27, jul./dez., 2007, Fortaleza, p. 157.

[43] BATTESINI, Eugênio. Da teoria econômica à prática jurídica: origem, desenvolvimento e perspectivas dos instrumentos tributários de política ambiental. Caderno do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGDir./UFRGS. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, v. III, n. VI, p. 125-142, maio, 2005, p. 125-126.

[44] A atuação do Estado em questões ambientais é defendida pela análise econômica, a partir dos modelos Pigou e Coase. Segundo Pigou, a poluição é custo imposto aos demais pelos produtores (externalidade negativa), que o mercado não tem força de

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internalizar, ou seja, que o mercado não consegue que tal custo seja assumido apenas pelo seu causador, necessitando a atuação do Estado. Já Coase sustenta que a atividade estatal deve ser guiada para evitar o surgimento de externalidades, garantindo, assim, a eficiência da completa internalização dos efeitos externos pelos sujeitos de mercado. COASE, Ronald. The firm, the market and the law. Chicaco: University of Chicago Press, 1988, p. 133 e ss.

[45] BATTESINI, op. cit., p. 132.

[46] MATIAS, João Luis Nogueira; BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Direito, Economia e Meio Ambiente: a função promocional da ordem jurídica e o incentivo a condutas ambientalmente desejadas. In: NOMOS: Revista do Curso de Mestrado em Direito da UFC, v. 27, jul./dez., 2007, Fortaleza, p. 161.

[47] DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 72

[48] Explica Bonavides que quem melhor revela os elementos do Estado é Duguit, dividindo-os em ordem formal e material. Na ordem formal, há o poder político na sociedade, que surge do domínio dos fortes sobre os mais fracos. No âmbito da ordem material, há a população, o povo e a nação, bem como o território. Afirma o professor da Universidade Federal do Ceará que o único ponto que merece crítica na teoria de Duguit é o poder implicar sempre a dominação dos mais fracos pelos mais fortes. Argumenta no sentido de que “admitir essa dominação por inerente a todo ordenamento estatal, isto é, por fato sociológico incontrastável, equivaleria decerto a excluir a possibilidade de um Estado eventualmente acima das classes sociais e dotado de características neutrais que pudessem em determinadas circunstâncias convertê-lo no juiz ou disciplinador correto e insuspeito de arrogantes interesses rivais”. BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 71

[49] Consoante Maluf, o Estado compõe-se de três elementos: população, território e governo. Para o autor, “a condição do Estado perfeito pressupõe a presença concomitante e conjugada desses três elementos, revestidos de características essenciais: população homogênea, território certo e inalienável e governo independente”. A soberania estaria incluída no elemento governo. MALUF, op. cit., p. 23.

[50] DALLARI, op. cit., p. 72.

[51] MALUF, op. cit., p. 29.

[52] Ibidem, p. 29.

[53] BONAVIDES, op. cit., p. 119.

[54] REALE, Miguel. Teoria do direito e do Estado. 2. ed. São Paulo: Martins, 1960, p. 127.

[55] DALLARI, op. cit., 84.

[56] Ibidem, p. 77.

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[57] Ibidem, p. 77.

[58] Ibidem, p. 78.

[59] Vontade geral não se confunde com vontade de todos. A vontade geral é a expressão de toda a coletividade, enquanto a vontade de todos é aquela de grupos, minorias, o que nem sempre traduz na vontade geral. Segundo Rousseau, a legítima vontade soberana é, portanto, a geral.

[60] MADRUGA FILHO, Antenor Pereira. A renúncia à imunidade de jurisdição pelo estado brasileiro e o novo direito da imunidade de jurisdição. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 22.

[61] NUNES JÚNIOR, Venilto Paulo. O conceito de soberania no século XXI. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, ano 11, n. 42, jan./mar. 2003, p. 145.

[62] SOARES, Mário Lúcio Quintão. Teoria do Estado: novos paradigmas em face da globalização. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 102.

[63] DALLARI, op. cit., p. 81.

[64] O Estado, além de organizar e representar a comunidade nacional, passa a interessar-se pelo seu desenvolvimento econômico, por meio de incentivos à iniciativa privada e da celebração de contratos comerciais de variadas espécies, atraindo capitais e tecnologia estrangeiros.

[65] FONSECA, Vicente José Malheiros da. A imunidade de jurisdição e as ações trabalhistas. Revista do TRT da 8ª Região. Belém, v. 36, n. 70, jan./jun. 2003, p. 45.

[66] MADRUGA FILHO, op. cit., p. 23.

[67] PAUPÉRIO, Arthur Machado. O conceito polêmico de soberania. In: STELZER, Joana (org.). União européia e supranacionalidade: desafio ou realidade? Curitiba: Juruá, 2000, p. 76.

[68] SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e. Direito Ambiental Internacional: meio ambiente, desenvolvimento sustentável e os desafios da nova ordem mundial. 2. ed. Rio de Janeiro: Thex, 2002, p. 52.

[69] De acordo com Princípio 2 da Declaração do Rio, de 1992: “Os Estados, em conformidade com a Carta das Nações Unidas e os princípios de direito internacional, têm o direito soberano de explorar seus recursos de acordo com suas próprias políticas ambientais e desenvolvimentistas, e a responsabilidade de assegurar que as atividades sob sua jurisdição ou controle não causem dano ao meio ambiente de outros Estados ou de áreas além dos limites da jurisdição nacional”.

[70] MATTOS, Adherbal Meira. Direito, Soberania e Meio Ambiente. Rio de Janeiro: Destaque, 2001, p. 35.

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[71] BONAVIDES, op. cit., p. 143.

[72] MACHADO, Flávio Paulo Meirelles. Soberania e meio ambiente: a adequação do Direito Internacional às novas necessidades de gestão ambiental e os mecanismos da ONU para resolução de conflitos. In: PRISMAS: Dir., Pol. Pub. E Mundial., Brasília, v.4, n.1, p.123-150, jan.jul., 2007, p. 128.

[73] KISS, Alexandre; SHELTON Dinah. Developments and Trends in International Environmental Law. Genebra: UNITAR, 199, p. 97.

[74] LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: uma difícil tarefa. In: Inovações em Direito Ambiental. LEITE, José Rubens Morato (org.). Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2000, p.15.

[75] Vale lembrar que todo tratado internacional de matéria ambiental é de direitos humanos, uma vez que o meio ambiente sadio é um direito humano, imprescindível à dignidade humana, conforme explicitado na Declaração de Estocolmo, de 1972. Assim, a incorporação de pactos ambientais no ordenamento jurídico interno deve obedecer ao mesmo procedimento dos tratados de direitos humanos.

[76] A partir da introdução, pela Emenda Constitucional n. 45, de 30 de dezembro de 2004, do §3º do artigo 5º no texto da Constituição Federal, abriu-se a possibilidade de que os tratados de direitos humanos sejam submetidos a um procedimento diferenciado de incorporação legislativa, que consiste na aprovação de seu texto, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos de votação, por três quintos dos votos dos respectivos membros, ou seja, equivalentes às emendas constitucionais. A preocupação do constituinte derivado era, aparentemente, dirimir controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais sobre a hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos, já existentes pela interpretação do §2º, do art. 5º, CF/88 (cláusula de abertura). No entanto, referido dispositivo veio trazer mais polêmica sobre a matéria, gerando problemas de interpretação a respeito da eficácia, aplicabilidade e integração desses tratados no ordenamento jurídico brasileiro. Após nova redação, segundo Portela, passam a existir duas categorias de tratados de direitos humanos: os materialmente constitucionais e os material e formalmente constitucionais. Insta ressaltar que todo tratado de direitos humanos, uma vez ratificado, passa a ter status materialmente constitucional, em virtude do §2º, art. 5º. Caso os mesmos tenham alcançado o referido quorum do §3º, passarão a ser considerados também como formalmente constitucionais. No caso de conflito com as demais normas constitucionais, defende o autor a aplicação do princípio da norma mais favorável aos direitos humanos. PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Tratados Internacionais de Direitos Humanos: Análise à luz do Princípio da Prevalência dos Direitos Humanos nas Relações Internacionais do Brasil. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará: 2007, p. 171-175 e 237-240.

[77] SOARES, op. cit., p. 119.

[78] DALLARI, op. cit., p. 86.

[79] DALLARI, op. cit., p. 89-90.

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[80] SOARES, op. cit., p. 125.

[81] DALLARI, op. cit., p.91.

[82] O tema, apesar de interessante, não poderá ser aqui aprofundado, uma vez que adstrito ao Direito Internacional, que não se trata do objeto do presente estudo.

[83] BONAVIDES, op. cit., p. 72.

[84] Ibidem, p. 72.

[85] DALLARI, op. cit., p. 95.

[86] Ibidem, p. 96.

[87] BONAVIDES, op. cit., p. 82.

[88] SOARES, op. cit., p. 154.

[89] CORTINA, Adela. Cidadãos do mundo: para uma teoria da cidadania. Tradução de Silvana Cobucci Leite. São Paulo: Edições Loyola, 2005, p. 27-28.

[90] Ainda na lição da autora espanhola, a solidariedade se plasma em pelo menos dois tipos de realidades pessoais e sociais. A primeira se dá na relação entre pessoas que participam com o mesmo interesse de determinada coisa, uma vez que do esforço de todas elas depende o êxito da causa comum. E em um segundo momento, a solidariedade está na atitude de uma pessoa que se interessa por outras e se esforça pelos empreendimentos ou assuntos dessas outras pessoas. Na primeira situação, explica Cortina que a solidariedade “é indispensável para a própria sobrevivência e a de todo o grupo”. Já na segunda, “não é indispensável para a própria sobrevivência, porque posso sobreviver mesmo que os outros pereçam, no entanto, o que é muito duvidoso é que possa sobreviver bem”. CORTINA, op. cit., p. 190-191.

[91] MALUF, op. cit., p. 317.

[92] DALLARI, op. cit., p. 103.

[93] Ibidem, p. 108.

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