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1 1 Fundação Getulio Vargas Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV DIREITO RIO) Projeto: História do CEPED Entrevistado: Marcílio Marques Moreira Local: Rio de Janeiro/RJ Entrevistadores: Gabriel Lacerda, Camila Duarte e Tânia Abrão Rangel Transcrição: Joana Medrado Data da transcrição: Término: 22 de março de 2010 Entrevista: 01.10.2009 T.R. – Projeto pesquisa CEPED, Rio de Janeiro, 1º de outubro de 2009, vamos entrevistar o Dr. Marcílio Marques Moreira. Estão presentes Gabriel Lacerda, Camila Duarte e Tânia Rangel. Bom, boa tarde professor Marcílio. M.M. – Boa tarde. T.R. - Primeiro agradecer a sua participação em colaborar com a gente na pesquisa. A gente começa incialmente pegando informações gerais a seu

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Fundação Getulio Vargas

Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV DIREITO RIO)

Projeto: História do CEPED

Entrevistado: Marcílio Marques Moreira

Local: Rio de Janeiro/RJ

Entrevistadores: Gabriel Lacerda, Camila Duarte e Tânia Abrão Rangel

Transcrição: Joana Medrado

Data da transcrição: Término: 22 de março de 2010

Entrevista: 01.10.2009

T.R. – Projeto pesquisa CEPED, Rio de Janeiro, 1º de outubro de 2009, vamos

entrevistar o Dr. Marcílio Marques Moreira. Estão presentes Gabriel Lacerda,

Camila Duarte e Tânia Rangel. Bom, boa tarde professor Marcílio.

M.M. – Boa tarde.

T.R. - Primeiro agradecer a sua participação em colaborar com a gente na

pesquisa. A gente começa incialmente pegando informações gerais a seu

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respeito. Então nome completo, data de nascimento e um breve histórico da

carreira.

M.M. - Bom, meu nome é Marcílio Marques Moreira, nascido no Rio de Janeiro

em 25 de novembro de 1931. Os cursos primário e secundário foram em

Viena, Rio de Janeiro, Budapeste e Berna. Depois disso fez concurso para a

Faculdade de Direito em 1951, tendo se diplomado em 1956, em Direito.

T.R. - Isso aqui no Rio.

M.M. - No Rio de Janeiro, na UERJ, quer dizer, naquela época era...

G.L. - UEG?

M.M - Ainda não era UEG, ainda não. Porque era a Universidade do Distrito

Federal, e depois é que virou Universidade do Estado da Guanabara, e depois

UERJ, não é? E no ano seguinte fiz concurso para o Instituto Rio Branco, de

onde me formei em dezembro de 1954. Em 56, ainda antes de ser formado em

Direito, mas já no Rio Branco, lecionei a cadeira de Direito Internacional na

Universidade Cândido Mendes. Em 1957, fui nomeado terceiro secretário da

embaixada do Brasil, em Washington, onde me inscrevi na Universidade de

Georgetown para cursar a Graduate School of Government, tendo recebido o

M.A. em Ciência Política em 1963. Minha tese foi sobre aspectos sócio-políticos

do desenvolvimento econômico, muito inspirada em Max Weber, que é

também uma das predileções do nosso Trubek, David Trube., Aliás aqui nessa

dedicatória ele lembra isso.

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T.R. - Aí já nessa época tinha essa preocupação sua com a questão do

desenvolvimento econômico...

M.M. - Já.

T.R. - E políticas públicas, não é?

M.M. - Extamente, exatamente. Separei aqui, e eu ia publicar e acabei não

publicando no Brasil. Mas está aqui. "Some social polical preconditions of

economic growth".

T.R. - E aí nesse seu trabalho, quais são as suas conclusões assim sobre essa

questão do ....

M.M. - Aqui dou importancia às instituições, aos valores, às ideologias e à

liderança.

T.R. - Ah, tá.

M.M. - No desenvolvimento econômico, quer dizer. Primeiro, padrões de

valores, não é? Depois o problema das ideologias e o problema da liderança,

de modo que isso passou a ser um dos temas de conversa com o David Trubek.

T.R. - E aí, esse problema na verdade acaba estando vinculado ao aspecto...

porque assim, não sei se eu estou entendendo de maneira correta, mas nesse

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primeiro momento, que o senhor analisa a questão do desenvolvimento

econômico e percebe essa falta de liderança e tudo, isso vai estar valendo para

o país de maneira geral, mas vai estar valendo também para a área do ensino

jurídico também.

M.M. - Também. Porque sendo weberiana a tese é portanto...

T.R. - Institucional.

M.M. - Institucional e não marxista. Quer dizer, enquanto no Brasil, todo um

grupo de pensadores, o que se traduz nas políticas públicas, davam muita

importância ao investimento e ao desenvolvimento econômico material, a tese

enfatizava a importância dos valores, das ideologias e da liderança para esse

processo. Então é a importância das idéias, portanto, também do próprio

Direito.

T.R. - Ah, que interessante. E aí é nesse momento que o senhor se aproxima

então de David Trubek?

M.M. - É, a aproximação com David Trubek, voltando um pouco para ...

G.L. - Estávamos em Georgetown.

M.M. - Voltando um pouco para Georgetown, aí em fevereiro de 1962, o

Ministro do Trabalho André Franco Montoro, faz uma conferência em

Georgetown, em que ele defende a idéia de que salário não é renda, o que foi

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recebido com certa perplexidade pelos americanos, wages are not income,

uma coisa assim... Mas antes da conferência, Alberto Venâncio Filho andando

conosco em volta da universidade onde tinhamos chegado muito cedo,

derrapou no gelo e quebrou o pé. [riso]

G.L. - O Venâncio estava lá em que condição?

M.M. - Ele estava em Washington, como membro da Comitiva do Professor

Carlos Chagas, participando de uma Conferência da Aliança para o Progresso

sobre Educação, Ciência e Cultura.. E aí nós tivemos que abrigá-lo em meu

porão, por uns 15 dias, e ele ficou lendo os livros que eu estava preparando

para a tese [riso]. Já nos conhecíamos, , mas esse convívio mais intimo não

programado aumentou muito os laços entre nós. Ao mesmo tempo, em 1958,

eu tinha conhecido, a pedido do embaixador Amaral Peixoto, três professores

que vieram ao Brasil pela Fundação Ford: professor Carlson, um professor

cujo nome eu não me lembro, e um outro professor, este de Harvard, Lincoln

Gordon.. Iniciei, aí, longa amizade com Lincoln Gordon. Em 1960, uma vez

eleito Kennedy, eu sugeri ao nosso embaixador, Alfredo Bernardes, e ele

concordou, que eu fosse passar quinze dias em Harvard para captar o quê o

Kennedy estava preparando para o seu governo. Então aí eu estive com o

Gordon, e outros – Mc Clelland, por exemplo, que chamava atenção para o

papel dos padrões de valores, no processo de desenvolvimento.. E fiquei muito

amigo do Lincoln Gordon, tanto que em 61, já em 61, quando Jânio renuncia e

Jango, que se encontrava na China, viaja para Paris, e de lá chama o Carlos

Alfredo Bernardes, é aquele negócio: "por favor, diga ao governo americano

que eu estou voltando, mas não tenho nenhuma idéia contrária, anti-

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americanas". E Bernardes pede a mim para eu comunicar isso ao Gordon, que

entrementes tinha sido envolvido na Aliança para o Progresso e tinha sido

nominated, quer dizer, indicado para ser embaixador no Brasil.

T.R. – Ah, então o Gordon depois se torna embaixador dos Estados Unidos

aqui?

M.M. – No Brasil. Então nessa época ele era embaixador aqui. E então ele

sempre me convidava para todos os eventos da Embaixada, e assim conheci o

grupo que estava trabalhando na Embaixada e na USAID, que eram três

advogados: Jerome Levinson, que era o mais antigo,era um pouco o senior

deles, David Trubek e Peter Hornbostel. [silêncio]

T.R. – E como é que surge essa idéia do CEPED, nisso?

M.M. – Essa idéia surge exatamente de um almoço, que, eu não tenho certeza

se foi... Na Rua do Ouvidor, eu tenho certeza. Então, um dia o Trubek disse que

precisava conversar comigo, e marcamos um almoço. Há dois restaurantes no

fim da Rua do Ouvidor: um era o “Cabaça Grande” e o outro é o “Rio Minho”.

Eu não tenho certeza se foi em um ou foi no outro, mas em um dos dois foi. E

aí o Trubek me falou que, enfim, ele era responsável pelos assuntos jurídicos,

com o Levinson, na Embaixada e na USAID, que achava que um dos problemas

que ele via no Brasil era...

G.L. – Nessa ocasião, você ocupava que função no Brasil?

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M.M. – Nesssa ocasião eu era diretor da Copeg - Companhia Progresso do

Estado da Guanabara. Mas eu já tinha sido anteriormente, tinha trabalhado

três anos no BNDES, onde era assessor geral de relações internacionais, então

eu tinha um contato muito estreito com a embaixada, e a embaixada naquela

época financiava o BNDES através da PL480, da Agricultura. Eles vendiam

trigo para o Brasil, e o Brasil pagava em moeda local, e eles emprestavam essa

moeda local. [risos]

G.L. – Era o famoso Acordo do Trigo.

M.M. – É, do Trigo PL. Four hundred and eighty, quatrocentos e oitenta eu

acho, não é?

T.R. – Mas aí nessa época o senhor continuava vinculado ao Itamaraty, não?

Tinha saído?

M.M. – Eu tinha sido, como é que se chama? Convocado, agregado.

T.R. – Ah, estava como se fosse emprestado?

M.M. – Emprestado, exatamente. Emprestado, mas estava no serviço público

ainda. Na Copeg, na época o governador, aí já do Estado da Guanabara, era o

Negrão de Lima. O Trubek ainda, há dois meses atrás, jantando aqui, lembrou

que dessas conversas nasceram dois projetos: o CEPED e o projeto da

urbanização das favelas, através de uma companhia que nós fundamos para

esse fim. Chamava-se Companhia de Desenvolvimento de Comunidades –

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Codesco. As duas coisas são quase contemporâneas, nasceram quase juntas.

CEPED nasceu em 1966. Nesse mesmo ano em janeiro, quer dizer, foi o

primeiro ano, no segundo mês do Negrão de Lima, uma das medidas que ele

tomou tinha sido cancelar o feriado de São Sebatião, dia 20 de janeiro. E aí

caiu uma chuva, uma coisa louca, e no ano seguinte se repetiu de novo, cairam

prédios inteiros, em Laranjeiras, morreu muita gente.

G.L. – A família inteira de um dos irmãos de Nelson Rodrigues.

M.M. – É exatamente. E aí eu fui com o Armando Mascarenhas que era o

presidente da Copeg para o Palácio Laranjeiras, conversar com o Presidente –

naquela época, as coisas eram mais fáceis que era o General Castelo Branco e o

chefe de gabinete era meu amigo, Luis Viana. E aí, só para dar exemplo de

como eram mais fáceis, as coisas naquela época: houve a reunião, depois o

Luis Viana disse: “você vai para o telex, e dá as instruções ao Roberto Campos,

o que que tem que fazer para conseguir ajuda dos Estados Unidos, eram,

sobretudo, vacinas que o pessoal estava preocupado, vacinas contra a tifo.

Bom, dito isso, no almoço, com o Trubek e o Hornbostel, falaram-me dessa

idéia de, de certa maneira melhorar o ensino jurídico dando-lhe mais

praticidade, sobretudo mais objetividade, digamos assim. E Trubek a quem ele

deveria procurar. Então eu falei em dois grupos: José Luis Bulhões Pedreira,

Alberto Venâncio e Antônio Bulhões de Carvalho, e o grupo jurídico da Light.

T.R. – Por que o grupo da Light? O que é que eles tinham de diferente assim os

dois grupos?

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M.M. – Ah, o grupo da Light era... então aí vamos voltar de novo, eu falei do

Max Weber e do impacto, mas eu estive em Washington, além de Georgetown,

eu fiz três mestrados práticos. Um com o Amaral Peixoto sobre política, um

com o Walter Moreira Sales sobre finanças e outro com Roberto Campos,

sobre economia. Roberto Campos e Miguel Ozório de Almeida. Mas voltando

ao Brasil.

T.R. – Esses mestrados eles foram uma... eram institucionais...

M.M. – Não, eram todos mestrados entre aspas.

T.R. – Eram pessoas com quem o senhor tinha um contato, não é? Era lá na

Embaixada mesmo?

M.M. – É. É, os três foram meus embaixadores. Desde o primeiro, que foi o

Amaral Peixoto, eu tinha uma relação muito estreita com eles, não é? Até os

meus colegas se queixavam dessa relação. [risos] Todos os embaixadores...

Então os mestrados são entre aspas. Mas voltando ao Brasil, eu fui trabalhar

com o Santiago Dantas. Então, eu considerei isso um doutorado. E o Santiago

era o homem que tinha escrito, vocês devem conhecer, ou não - o Gabriel

conhece -, o famoso artigo sobre a Renovação do Ensino do Direito.

T.R. – O senhor trabalhava com o professor San Tiago, como?

M.M. – Ele era Ministro da Fazenda.

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T.R. – Ah, tá e aí o senhor estava no governo e aí...

M.M. – Eu estava na Embaixada em Washington, eu vim ao Brasil a pedido do

Roberto Campos para preparar a visita do presidente Kennedy.

G.L. – Você era embaixador, já?

M.M. – Não, não.

T.R. – Ele era terceiro secretário.

M.M. – É, naquela época eu devia ser segundo secretário. E Roberto Campos

pediu para eu trazer para o Brasil, enfim, o que ele tinha preparado como

documentos básicos para essa conversa no Brasil, entre Kennedy e João

Goulart. O João Goulart tinha estado nos Estados Unidos e foi muito bem

recebido lá. Mas, havia vários problemas, então ele disse, ao invés de mandar

pelo correio, você leva. Quando eu cheguei aqui, estourou a crise de Cuba,

então o Kennedy cancelou a visita. Mas aí o Carlos Alfredo Bernardes,

Secretário Geral do Itamaraty, disse: “Você está chegando com notícias de

Washington? Temos esse problema de Cuba e tem uma pessoa que eu acho

que gostaria muito de ouvir isso. Vamos hoje à noite à casa de San Tiago

Dantas”. Lá fui eu para a casa de San Tiago Dantas, aí começamos a ter uma

série de reuniões preparatórias de não sei o quê, mas, enfim, ele estava

estudando, e escolheu três pessoas para esse grupo, para liderar, que foram

depois nomeados Secretários de Estado, que era uma coisa que existia naquela

época, uma figura jurídica que não existe mais, que era o Antônio Dias Leite, o

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embaixador Oscar Fernandes e José Luis Bulhões Pedreira, que eu tinha

conhecido em Washington, porque quando o Santiago foi a Washington, foi

depois, foi em 1963, Bulhões Pedreira o acompanhava mas então San Tiago

também teve muita influência teórica, porque ele trabalhou muito o tema de

renovação do Direito, e eu tive uma relação muito estreita, com San Tiago,

tanto que...

T.R. – E essa reuniões com San Tiago discutiu-se o ensino jurídicou ou eram

mais amplas?

M.M. – Não, não. Era um programa de desenvolvimento.

T.R. – Ah, tá, era mais uma reforma institucional assim.

M.M. – É. Porque ele estava trabalhando naquela época sobre dois temas. Um

era chamado

“reformas de base”. Nas publicações sobre reformas de base, ele se refere à

reforma agrária e também á reforma monetária. Reforma monetária era um

plano de estabilização, para debelar a inflação, já crônica. Mas ele também, e é

preciso lembrar isso, ele foi o relator da lei de Diretrizes e Bases da Educação,

então a reforma da educação também era foco do programa de reformas,. Já

tinha feito o discurso pela renovação do Direito e pela renovação do ensino do

Direito e então...

G.L. – Esse discurso é de quando? A gente tem esse discurso...

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T.R. – A gente tem é de... é dessa época início de 60 final do anos 50 por aí.

G.L. – O discurso de paraninfo. Bem isso foi publicado lá pela Fundação

também em um caderno.

T.R. – No caderno, é.

M.M. – Foi publicado quando? Crise brasileira.

G.L. – Esse é o que a gente tem lá. É de 55.

M.M. – Mas tem um que chama-se “Pela renovação do Direito”, “Pela

renovação do ensino jurídico”.

G.L. – Essa aqui é o que a gente tem lá, não é?

T.R. – É. A gente pode tirar cópia disso e depois a gente traz para o senhor?

M.M. – Pode.

G.L. – Não perde não, hein?

M.M. - Era “Pela renovação do Direito”, cadê?

G.L. – Esse é o discurso de paraninfo, de 1955. Discurso da faculdade nacional,

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de 55.

T.R. – É eu lembro que foi na década de 50, mas 55 é a metade.

G.L. – Santiago, eu conheci o Santiago na qualidade de tio de um amigo meu.

M.M. – Acho que foi porque foi publicado aqui em Palavras de um Professor,

com o prefácio do Venâncio. Olha: “Discurso de posse, pela renovação do

direito”. É esse aí. Esse como é que é?

G.L. – Esse aqui é: “Educação jurídica e a crise brasileira de 55”.

M.M. – “Renovação do Direito”, esse é um título importante também. “Novos

rumos do Direito”, veio depois, “Novos rumos do Direito”. “Educação jurídica e

a crise brasileira”.

T.R. – É, que é esse aí.

M.M. – É. É, são esses aí. Estão reproduzidos aqui. Se quiserem.

T.R. – Esse aqui é bom a gente adquirir porque ele deve estar ainda no

mercado esse aqui.

M.M. – Está tá, eu acho que está sim.

G.L. – “Palavras de um professor”, de San Tiago Dantas”

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T.R. – Da Editora Forense.

M.M. – Bom, então estamos ainda no.... você perguntou por quê? José Luis

Bulhões Pedreira...

G.L. –Por que você escolheu o José Luis e a Light para indicar ao Trubek, como

sendo os ideais para desenvolver o projeto?

M.M. – É, é. O José Luis porque ele...

T.R. – Vocês trabalharam juntos não é?

M.M. – Trabalhamos juntos na gestão San Tiago, como Ministro da Fazenda E,

enfim, criamos uma relação muito boa.....A Light porque, o serviço jurídico da

Light era em si um centro de pensamento do Direito. Estava lá o Lamy, estava

lá o Caio Tácito, estava lá o Rubem Fonseca antes, e também o Roberto Paulo

Cesar de Andrade...

G.L. – Almílcar Falcão?

M.M. – É, é. O próprio Galotti era jurista.

G.L. – Tinha aquele outro que dizem que escreveu o Ato institucional número

1, não é? O ...

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M.M. – O Chico, Chico...

G.L. – Não, o Chico escreveu o de 37, o do ato 1, um outro nome famosíssimo

também na Light.

M.M. – Era um grupo muito, muito... Com o Trubek, teve muitas conversas

também o Roberto Paulo Cezar de Andrade, advogado. Com quem ele tinha

discutido exatamente o empréstimo para a Light. Então eram os dois...

G.L. – O Roberto a gente pode botar na lista de entrevistados também que eu

não botei, bote lá, Roberto Paulo Cezar de Andrade. Me esqueci.

M.M. – É, é. Porque eu tenho até um e-mail do Trubek que diz que... Porque o

Trubek... quer dizer aí essas ligações, trabalhava com o José Luis, com um

advogado chamado Ferreira. O primeiro nome do Ferreira qual era?

G.L. – Hamílton?

M.M. – Hamílton Ferreira. Que, por sua vez, era vizinho em Petrópolis do

Roberto Paulo Cezar de Andrade. E o Trubek alugou a casa do Hamílton para

passar as férias lá. Mas trabalhar, passar férias, quer dizer, mas não para

tomar férias, no período de férias, com as crianças e tal. E todo dia, descia, de

carro, com o Roberto Paulo Cezar de Andrade, conversando sobre Direito. E

ele, nesse mês, disse que aprendeu tanto de Direito brasileiro, nessas

conversas, do que por qualquer outro meio. Então você está vendo os dois

focos: Hamílton Ferreira trabalhando com o José Luiz, o Roberto Paulo

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trabalhando na Light, vizinhos, e o Trubek no meio. E então é uma coisa...

T.R. – E aí essa aproximação do Trubek, porque o Trubek representava o

governo americano, não é? Com essa idéia de reformar o ensino jurídico no

Brasil, como é que isso foi visto em geral pela sociedade brasileira, que nessa

época tinha já uma... ao mesmo tempo que queria uma aproximação, queria a

afirmação da própria identidade nacional, não é?

M.M. – É, mas por que é que o governo americano pensava isso, não sei, “por

que” talvez não seja a palavra, mas qual é o contexto? O contexto é justamente

aquilo que me levou a Harvard em dezembro de 1960, janeiro de 61, que é a

Aliança para o Progresso. Qual era a idéia da Aliança para o Progresso? Era a

Reforma Institucional, a importância das instituições, sendo o Direito uma

instituição, compreendeu? Então eles estavam procurando exatamente

reforçar a instituição do Direito no Brasil, renová-la e tinha antecedentes, o

San Tiago falava muito nisso, e o San Tiago era muito amigo de José Luis e

então você vê que há toda uma trama, uma...

T.R. – Uma junção não é?

G.L. – Interligação.

M.M. – É uma trama [riso] é uma palavra que talvez tenha um certo traço

pejorativo, é uma rede...

G.L. – Um tecido.

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M.M. – Hoje chamaria tecido.

T.R. – E aí quando o senhor coloca o Trubek com esses dois ramos da

advocacia, o senhor continua acompanhando esse desenrolar?

M.M. – É, continuo, não por muito tempo, mas continuo. Por quê? Porque,

entrementes, também em Washington, nos visitou uma missão da UERJ. Não,

minto. Uma missão de médicos, em que estava um médico, Américo Piquet

Carneiro, que é tio do João Geraldo Piquet Carneiro. E que era uma pessoa

extremamente dedicada, e a partir de, enfim, desde que eu cheguei aqui, 64,

65, e me chamou várias vezes para procurar algum tipo de apoio para a

Universidade que estava precisando de... e me levava ao reitor da

universidade e eu acabei tendo um contato muito grande com a universidade

desde 65 - eu era formado por ela. Em 68 eu acabei me tornando professor e

diretor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ. Mas isso já foi

depois não é? Mas isso para dar a idéia de que eu estava acompanhando via

UERJ, ao mesmo tempo tinha sido criado o Ipea no Brasil, em 64. O João Paulo

dos Reis Veloso me convidou até para ser o Diretor Geral e depois para ser o

Presidente do Ipea, que eu não aceitei. Mas esse convite veio junto com um

convite da Fundação Getúlio Vargas para... porque como o Ipea pagava pouco,

enfim, era um pacote. Então eu tinha relações com a UERJ, a Fundação,

sobretudo com o Simões Lopes. Acabei em 92 membro do Conselho Diretor,

mas, enfim, já naquela época.

T.R. – Aí, então, na verdade, acaba que nesse momento da implementação,

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vamos assim dizer, do CEPED fica sendo uma junção entre a FGV, a UERJ e o

Ipea também, ou não?

M.M. – Não, não, o Ipea não.

T.R. – O Ipea não entra nisso.

M.M. – Não, não.

T.R. – Estava próximo.

M.M. – Mas eu digo que estava havendo uma certa renovação, o IPEA inovou

no ramo da Economia.

G.L. – Agora voltando mais para a pergunta que a Tânia fez, quer dizer, o

Trubek deu a idéia, conversou com você, você indicou pessoas da área de

Direito que poderiam conduzir isso?

M.M. – É.

G.L. – Mas então, você estava dizendo, você indicou – pode voltar na minha

intervenção eu não estou...

T.R. – Não, está tranquilo.

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G.L. – Eu me meto nessas coisas...você indicou, perguntado quem você teria

indicado, pessoas ligadas ao Direito, capazes de conduzir um programa na

linha imaginada pelo Trubek, você indicou o José Luis e o pessoal da Light? Aí

a Tânia pergunta, você acompanhou isso, o que é que eles fizeram?

M.M. – É, eu acompanhei, mas não...

T.R. – No dia-a-dia.

M.M. – No dia-a-dia. Mas como eu era também muito amigo do Venâncio e...

G.L. – O Venâncio trabalhava com o José Luis naquela ocasião?

M.M. – O Venâncio já trabalhava com o José Luis, mas tinha trabalhado na

Light.

T.R. – Também.

M.M. – Quando ele teve um problema de saúde, o Rubem Fonseca que se

tornaria o grande escritor, o ajudou e ele acabou indo para o escritório do

José Luis, que o acolheu muito bem, também.

T.R. – O senhor fala que de uma primeira reunião com o Trubek e de que dessa

parceria surgiram dois projetos, o CEPED e depois a criação da companhia de

desenvolvimento de comunidades , dedicada à urbanização de favelas.

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M.M. – É, a criação da Codesco.

T.R. – E aí como é que começa a criar forma, sair do papel essa idéia do

CEPED? Assim, quais os primeiros atos? Eles chegam a criar uma associação?

Isso fica ligado...

M.M. – Não, não, acho que eles procuraram... o Caio Tácito, que acho era

diretor da Escola de Direito, não é? Depois reitor, ele foi meu reitor, porque

naquela época era João Lyra, acho que ele sucedeu, não sucedeu...quem

sucedeu era o que era professor de Introdução à Ciencia do Direito, como é

que chama?

G.L. – Da UERJ?

M.M. – Da UERJ, é.

T.R. – O Hermes Lima era da UFRJ, não é?

M.M. – Não, era o Professor Oscar Tenório que foi o meu reitor na UERJ.

T.R. – Ah, então em 68 quando o senhor estava como diretor do instituto, o

reitor era o Caio Tácito? Já em 68?

M.M. – Não, em 68 ainda era o João Lyra Filho.

T.R. – Era o João Lyra. O senhor fica na UERJ até quando?

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M.M. – Bom, eu sou professor...

T.R. – Até hoje.

M.M. – Foi a única aposentadoria que eu tive. Dos outros lugares todos, eu fui

pedindo demissão...

G.L. –Do Itamaraty...

M.M. – Do Itamaraty também,

T.R. – Olha que legal.

M.M. – E então eu fico ligado a.... e ao mesmo tempo surge esse outro projeto

que é o da Companhia de Desenvolvimento de Comunidades, tocado pela

Copeg, quer dizer, iniciado na Copeg o programa, aí nós começamos realmente

por um programa de pesquisa. E aí a Copeg contratou mais ou menos uns

cinco grupos de estudos. Isso é importante porque é a tal renovação

institucional. Um a faculdade de medicina da UERJ que era dirigido pelo

Américo Piquet Carneiro que então fez uma pesquisa de saúde em três favelas.

Isso veio a ser o embrião do Departamento de Medicina Social da UERJ.

T.R. – Ah, que legal.

M.M. – O professor Moisés Skzlo, hoje Professor de Epidemologia da

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Universidade Federal do Rio de Janeiro, e editor da revista americana de

epidemiologia, o que não é pouco, American Journal of Epidemiology, um

editor brasileiro. Quando ele tomou posse na Academia Nacional de Medicina,

declarou em seu discurso, que a primeira pesquisa de medicina social que

empreendera, fora financiado pela Copeg.

G.L. – Quer dizer, você está amarrando aqui, e eu quero chegar no roteiro da

entrevista, você está amarrando a ideologia cepediana como sendo a aplicação

ao ramo do Direito de um contexto maior...

M.M. – De renovação institucional.

G.L. – Renovação institucional, weberiano, por oposição à onda marxista, você

está fazendo um grande... a sua lente zoom está aberta sobre esse grande foco.

M.M. – Isso, isso.

G.L. – Agora, apertando um pouco o foco da lente zoom, quer dizer, como é que

você fazia? Eu me lembro do seu cunhado, o José Eduardo dizer, é um projeto

e a definição era sua - estou induzindo – destinado a tornar os advogados

pessoas úteis ao país [riso]. Mas como é que aperta o foco, e como é que o

grupo criador, e o grupo que especulava isso, imaginavam o treinamento

jurídico do advogado? Que idéias aplicada ao treinamento de advogados ao

ensino do Direito podiam ser úteis a esse projeto maior de angulação maior da

lente zoom focalizando. Era o que? Metodologia, era aproximação? A pergunta

aqui no questionário era: qual ou quais a seu ver as idéias básicas do

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programa em termos de metodologia de ensino, em termos de conceito de

Direito, em termos de papel do advogado na sociedade? Essa é exatamente a

pergunta que estava no roteiro. No foco mais estreito, não no foco amplo que...

M.M. – É, em termos de metodologia, basicamente tentar ao menos adotar no

Brasil o ensino por casos, não é? O estudo de casos, então você teria que criar

casos, e nessa época também, quer dizer, aí talvez haja diferença de um ano,

eu fui convidado pela Fundação Getulio Vargas para dar um curso sobre

projetos imobiliários, quer dizer, usando casos concretos da COPEG de

financiamentos imobiliários, quer dizer, é sempre aquela mesma idéia de

renovação e...

T.R. – É, na Copeg, só para a gente fechar, o senhor tinha falado de cinco

grupos, um foi esse da medicina, o outro foi dessa parte imobiliária que o

senhor está falando agora, não é?

M.M. - É, é. Um foi de medicina, o outro foi um grupo de arquitetos, era um

arquiteto extremamente inteligente, brilhante, chamado Carlos Nelson, que

teve muito impacto, morreu muito cedo, foi no início da epidemia da AIDS,

mas era um... e outra arquiteta chamada Maria Silvia Wanderley. Esse foi o

segundo. Depois um sobre artesanato, que foi a... lembrei do filho que é o João

Emanuel, a Lelia Coelho Frota, poeta, grande conhecedora de artesanatos e

arte primeva, que descobriu coisas fantásticas. Tinha um outro... e teve um

que não conseguiu, apesar de eu ter convidado uma das pessoas também que

eu achava mais preparadas para isso, não conseguiu avançar, que é o

professor Ebert Vianna Chamoun, que seria o problema dos títulos de

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propriedade, de enfim, os favelados daquela época poderem ter o título de

propriedade de suas casas. Quarenta e dois anos depois, eles ainda não tem a

propriedade. Domingo passado eu fui lá, até com o arcebispo do Rio e

perguntei a eles, a respeito que me disseram: “nós continuamos sem o título”.

E me disseram: “e agora há um movimento dos que não querem mais o título”.

Eu disse: por quê? Porque vão ter que pagar IPTU, vão ter pagar uma conta

maior de luz, uma conta maior de água, essas coisa.... Você vê que é toda uma

contradição, não é? Mas então, como ia dizendo, essa idéia da renovação

institucional. Especificamente era idéia do caso, não é? Que já tinha em si a

semente de ser uma coisa mais prática porque você exigia do advogado um

novo conceito de tomada de decisão.

T.R. – E aqui uma pergunta, o senhor...

M.M. – Porque quando se apresenta o caso, eles tem que defender aquele caso,

e então decidir de que maneira vão defender, e você tem toda uma dinâmica,

não é assim uma aula, uma conferência dada.

T.R. – Na sua formação jurídica aqui no Brasil, a aula que o senhor teve era

essa mais expositiva?

M.M. – É verdade.

T.R. – E aí a que o senhor teve em Georgetown era mais essa de casos, ou não?

M.M. – Não. Não porque eu fiz o curso de teoria política, então não era de

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casos.

T.R. – Mas ainda assim tinha uma discussão?

M.M. – Sim, tinha, quer dizer, tanto que vários cursos, talvez a maioria, não sei,

eram seminários que eu me lembro que o professor dizia “o máximo são doze

pessoas” exatamente porque era um seminário que privilegiava...

G.L. – Debate.

M.M. – Debate, diálogo.

T.R. – E aí nisso o senhor já sente esse choque da metodologia pessoalmente?

M.M. – É, então, tudo acontece na mesma época. Nessa época também, eu fui

convidado para ser professor no Instituto Rio Branco, em 1964, e aí eu

introduzi o método de seminário, quer dizer, eu não posso de repente ser

professor de... então, eu organizei primeiro dois seminários, um seminário

sobre política internacional e um sobre economia internacional. Depois fui, até

o Instituto Rio Branco mudar para Brasília, eu fui professor de Pensamento

Político, na base de seminários, os alunos é que davam as aulas de certa

maneira. E para isso eu tive que, eu indicava dez, era um reading seminar, eles

eram obrigados a ler e eu solicitei ao Instituto Rio Branco que comprassem

dez exemplares cada, de dez livros seminais, para todos poderem ler . Houve

um certo frisson naquela época, porque isso foi em 64, 65 e o livros que eu

indiquei foram, entre outros O Manifesto Comunista de Marx [risos]

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G.L. – Era perigoso. Em 65.

M.M. – Imperialismo, último estágio do capitalismo, do Lenin, e evidentemente

o Max Weber também e o Alexis de Toqueville, mas já o método não era de

casos, mas era um método muito mais ativo em que...

T.R. – Existia um diálogo, não é?

G.L. – É, agora o método isso que é importante registrar, e aqui eu estou

perguntando, não briga comigo não. O método era apenas uma das coisas de

uma ideologia maior...

M.M. – Exatamente, exatamente.

G.L. – Isso o Marcílio foi muito claro, no início. É uma visão global de

institucionalizar, de desenvolver, não apenas crescer, mas desenvolver via

institucionalização, via instituições, via lideranças etc e tal. Agora

especificamente no campo do Direito, no campo do ensino do Direito, qual é o

caminho para dar esse direcionamento maior diretamente relacionado ao

ensino do Direito? Quer dizer, você disse, o estudo pelo método do caso

oposto ao método expositivo ajuda nessa direção. Quê outras idéias havia de

como o Direito, enquanto instituição social, pode ajudar a um movimento

maior de colaborar para uma mudança institucional da sociedade? Alguma

idéia específica do Direito, do advogado?

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M.M. – Olha, está um pouco ligado ao quadro mais amplo, que é a idéia

weberiana de que as idéias têm uma força para mudar, aquela idéia do livro

magno...

T.R. – É porque através dessa...

M.M. - A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo.

T.R. – É, porque com a mudança da ideologia, você consegue mudar o

comportamento, e mudar a cultura não é? E aí você...

M.M. – É, e a idéia das instituições. Por isso que também em um dos papers,

um seminário lá em Georgetown que eu fiz foi sobre Maurice Hauriou que é o

mestre da escola institucionalista francesa. Está vendo? Então aqui tem a

definição de instituição e aquela idéia que foi muito importante para isso que

é... A instituição se define por uma “ideia clara da obra a realizar”.

T.R. – É, bem interessante.

M.M. – Então, tinha uma obra a realizar, que era a renovação do Direito, e a

preparação do advogado para uma obra de renovação da sociedade, que é o

grande tema do San Tiago...

T.R. – E que está vivo até hoje.

G.L. – Deixa eu ver se eu entendi bem . Não é renovar o advogado, é renovar o

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advogado como agente do Direito para renovar o novo Direito.

M.M. – Um novo Direito, é.

G.L. – Essa que é a idéia, que você percebe, que é a idéia diretriz.

T.R. – Ou seja, e essa renovação não passava somente pela parte do Direito

privado empresarial, ela entrava também pela parte do Direito publico, não é?

M.M. – Do Direito Público também, porque eram as políticas públicas, e

também o Direito empresarial porque o Trubek, por exemplo, tinhamos visto

que, como ele tinha que fazer muito essas... ele que era o encarregado desses

contratos da USAID, como o que fez com a Light, que alguns conheciam direito

contratual-empresarial e outros realmente eram muito deficientes.

G.L. – Aqui leva caminho para a próxima pergunta...

M.M. – E aí tem um outro livro aqui.

T.R. – Então vamos lá. [riso]. Voltando aqui então um pouquinho, essa questão

da formação do CEPED não tinha esse viés meramente privado, não é? Tinha o

viés também de pensar a política pública?

M.M. – Também, tanto que o diretor do curso não era um advogado comercial,

de Direito Comercial, um especialista, mas sim do Direito Administrativo,

portanto, do Direito Público que era o Caio Tácito, porque o advogado da

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empresa, para poder agir, sobretudo no Brasil daquela época e ainda de hoje,

em que nós temos um Estado muito onipresente, muito regulador, ele tem que

entender de Direito Tributário e de Direito Societário, que é a grande área de

José Luis Bulhões Pedreira, do direito das sociedades. Ainda agora, foi lançado

há um mês atrás um livro chamado Direito das Companhias, co-coordenado

pelo José Luis e pelo Lamy, começando , evidentemente com o José Luis

ainda vivo e com um grupo grande de advogados. Mas essa mesma idéia,

perpassava o problema da renovação da sociedade. Eu estou chamando a

atenção para este outro livro do San Tiago, Figuras de Direito, com prefácio

meu, que então essas idéias estão aqui, e então, por exemplo, “O Cayru

protagonista de uma época” e “Rui Barbosa: renovação da sociedade” e então

toda a idéia de que – que era um idéia de San Tiago – que era... San Tiago era

um reformador, não era um revolucionário, no Brasil ainda havia aquela idéia

da revolução brasileira enquanto o San Tiago era um renovador, quer dizer,

era um homem inclusive do Direito Civil, ramo do Direito que privilegia as

conquistas aluvionais, conquistas progressivas e cumulativas.

T.R. – Interessante. Aí a gente passa para de que forma... No desenvolvimento

do CEPED o senhor não participou ativamente mas acompanhava, não é?

M.M. – É, verdade.

T.R. – E como é que o senhor via isso, o andamento do CEPED, a relação que o

senhor teve na época em que foi implementado. Então eles montaram um

curso, não é? E começaram a dar aulas, então montaram as turmas e...

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M.M. – É, e eu vi que era um grupo muito bom, tanto que depois grande parte

deles foram para o exterior para Yale, como o Jorge Hilário …

G.L. – Não Jorge Hilário foi para Standford.

M.M. – Ah, foi para Standford?

G.L. – Eu fui para Harvard, Joaquim foi para Harvard, Álvaro Pessoa, Álvaro

Pessoa é genro do...

M.M. – Do Piquet.

G.L. – Do Piquet, quem fez CEPED, [riso].

M.M. – [riso] É, Álvaro, exatamente.

G.L. – Álvaro foi para Yale.

M.M. – É, Yale.

T.R. – Então essa ida dos professores e de alunos para o exetrior era parte do

programa...

M.M. – Fazia parte do...

T.R. – E era entendido como um aprimoramento até, não é?

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M.M. – Exatamente. E chamaram aquele professor de Harvard...

G.L. – Steiner.

M.M. – O Steiner que era uma pessoa muito interessante.

G.L. – É o Steiner é inteligentíssimo. Você lembra também...esse é um cara que

eu quero retraçar que eu não sabia o papel do Keith Rosenn no início do

CEPED?

M.M. – [silencio] O Keith Rosenn...

G.L. – Da Flórida, aquele autor que tem toda a sociologia do jeito, o jeito

revisited.

M.M. – O Rosenn, Keith Rosenn com dois “n”, não é?

G.L. – É. Você tem alguma uma idéia de qual era o papel, porque eu não sei

ainda, não tracei ainda, é um dos caras que eu vou entrevistar. Não toca

nenhum sino para você?

M.M. – Não, toca muitos sinos, eu inclusive estive lá com ele depois mais tarde.

Ele compara, porque depois, as coisas depois vão acontecendo, não é? Tanto

que eu acho que o impacto do CEPED ele não é imediato, ele é...

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G.L. – É, esse é que é o tema maior, eu não sei se já podemos...

T.R. – É mais para frente.

M.M. – É, mais para frente

G.L. – Se já podemos entrar nele, é porque esse é o grande tema e você agora

nos ajudou imensamente na formulação inicial. Agora não sei se a gente já

pode passar esse tema...

T.R. – Já.

G.L. – Então liga aí o gravador.

T.R. – Já está ligado.

G.L. – Que é exatamente o impacto do CEPED, quer dizer, eu estou retomando

aquela “Keith Rosenn fala com Marcílio Marques Moreira, só me vem isso”.

Marcílio Marques Moreira apresenta Keith Rosenn a Caio Tácito, José Luis e

Lamy, organiza-se...

M.M. – Não, o Trubek que você está falando.

G.L. – É. O Trubek, conhecendo Lamy, José Luis, Venâncio, Caio Tácito organiza

um curso na Fundação Getúlio Vargas. Esse curso dura algum tempo, você

sabe como é que ele acabou o curso, quando é que acabou? Tem alguma

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informação sobre isso, ou você não acompanhou esse ponto?

M.M. – O próprio Trubek fala nisso, não é? Quer dizer, porque aí a USAID

deixou de financiar e, enfim, aí acabou um pouco, mas não morreu, você viu na

USAID...

G.L. – É o que eu quero saber mais é...

M.M. – E uma informação que eu recebi segunda-feira, do presidente da

Fundação Getúlio Vargas, que é interessante isso, o Ministério da Educação,

naquelas revisões que fazem, no Brasil consideram o melhor curso de Direito

no Brasil a UERJ e o segundo a Fundação Getúlio Vargas. Mas a UERJ aí na

frente, a pergunta é por quê? Ele disse não, porque a UERJ é capaz, até hoje é

quem consegue os melhores alunos por ser um curso que não se paga.

G.L. Mas no depois, a idéia a gente está mais ou menos balizado...

[FINAL DO ARQUIVO 01]

G.L. – ...eu estou interessado em determinar, e, em colher a sua impressão

sobre isso e o que você possa ter de informação sobre isso, é: até que ponto

aquele cursinho feito na Fundação Getúlio Vargas, e pela UERJ, dentro

daqueles objetivos maiores, gerou frutos que duram até hoje, quer dizer, o que

é que ficou daquele curso? Quais são as conseqüências? Que impacto ele

produziu no mundo da educação do Direito e da formação dos advogados no

Brasil, se é que você percebe alguma?

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M.M. – Bom, evidentemente ele não foi capaz de talvez criar uma massa crítica,

mas criou sim uma massa, embora não crítica, criativa, que criou toda uma

nova mentalidade, que está aí até hoje. Quer dizer, um novo tipo de advogado

com essa idéia inclusive do auto... Quer dizer, renovar a sociedade, mas

começar a se renovar a si mesmo, os seus conhecimentos. Aí seria o mestrado

lá na UERJ, hoje tem o mestrado e o doutorado pelo CEPED, e ainda é

considerada a melhor universidade de Direito.

G.L. – É, eu acho que já temos aqui...

M.M. – E os próprios dois cursos, eu acho que esses dois do... são um pouco a

idéia...

T.R. – Os dois é o do...

M.M. – É o do Rio e de São Paulo.

T.R. – Ah, os dois da Fundação Getúlio Vargas.

G.L. – Mas você não tem lembrança? Quer dizer, eu lembro de cursos, o curso,

por exemplo também neto do CEPED, na CVM, é a última coisa que eu lembro.

M.M. – É a própria CVM.

G.L. – O primeiro curso, a primeira turma da ...

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M.M. – Porque o Jorge Hilário foi para a CVM, então...

T.R. – Então conseguiu de alguma maneira, eu posso concluir que o CEPED de

alguma maneira, naquele momento, ele consegue iniciar um projeto de

reforma institucional também?

M.M. – Institucional também, é.

G.L. – É, eu acho que a frase que ele disse, quer dizer, “não chegou a criar uma

massa crítica”, mas criou um núcleo.

M.M. – É, um núcleo, que é uma elite e aí a minha diferença com o Trubek. O

Trubek, em um desses artigos aqui, faz uma espécie de mea-culpa, que ele foi

para Harvard, aí com o Mangabeira Unger, então criaram a escola crítica, a

Sociologia crítica do Direito, não é? E chegaram a conclusão que eles eram

autoritários e queriam uma renovação via elite. Mas aí você vê o San Tiago

dizendo que o povo tem que ter o seu papel, mas a elite tem que ser a grande

renovadora, quer dizer é uma idéia...

G.L. – Eu acho que aqui... este, a meu ver é o tema daqui para frente muito da

pesquisa quer dizer, exatamente nós estamos, devagar nos aproximando do

ponto de especulação e de criação, a entrevista está perfeitamente... eu aqui

não tenho mais nada não, você tem alguma coisa ainda aí Tânia?

T.R. – Não é mais isso. Só a última dúvida, porque a gente vai bater depois

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nessa questão da elite bastante, naquele momento você tinha consciência de

que se estava formando uma elite? Mas a elite com esse viés do San Tiago, ou

seja, uma elite com capacidade transformadora?

M.M. – De renovação, é.

T.R. – Não uma elite que quer meramente se impor, não é?

G.L. – Uma elite que dá, e não uma elite que toma.

M.M. – É, que está dentro desse outro trabalho aqui, que é a elite que possa

tomar uma liderança renovadora do processo.

T.R. – E aí a gente volta para a questão de liderança sua, já no seu mestrado

analisado não é?

M.M. – É.

G.L. – Tenho a sensação de que avançamos bastante.

T.R. – Não, bastante. Então tá.

M.M. – E acho que ele não... não é a mesma história do San Tiago, quer dizer,

ali foram plantadas sementes. O próprio CEPED, naquela sua fase áurea de

sete anos, acho que foi mais ou menos isso, não viu serem colhida os frutos,

mas os frutos ocorreram sim, e acho que nessas várias manifestações

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acabaram criando sim, todo uma... e de certa maneira uma massa, ainda não

crítica, mas muito mais forte, que são esses dois cursos hoje de São Paulo e do

Rio, não é? O Ary Osvaldo e... da mesma maneira o outro ramo, que é a

Companhia Progresso do Estado da Guanabara e a Companhia de

Desenvolvimento de Comunidades, eu acho interessante que já há 40 anos a

gente usou uma palavra politicamente correta que é comunidades e não...

favela, aquilo acabou sendo a semente do favela-bairro.

G.L. – Eu vou fazer uma pergunta aqui...

M.M. – E o prefeito daqui, aliás os dois prefeitos que não se amam muito, que é

o Conde e o Cesar Maia, ambos sim em discurso e tudo, tem dito isso, que a

CODESCO foi a semente dos programas de hoje quer dizer essas coisas... mas

isso aconteceu trinta anos depois.

G.L. – Eu vou fazer uma pergunta que parece que não tem nada a ver com isso

aqui, mas pode ter muito mais a ver do que a gente pode perceber a primeira

vista. Por que o San Tiago Dantas não foi aprovado como Primeiro Ministro do

governo João Goulart? Eu lembro que ele tentou, ele pleiteou e não foi

aprovado pelo Congresso.

M.M. – Eu acho que foi o próprio Jango que o sabotou, eu acho...

G.L. – Você acha? Quer dizer, por que essa resistência... Você acabou de dizer

aqui uma coisa muito importante: o San Tiago era a favor da elite, era um

homem da elite e era a favor da transformação e da transformação gradual.

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Com ele ser a favor da transformação, ele despertava tremendas reações na

dreita tradicional...

M.M. – É, na direita e na esquerda.

G.L. – E na esquerda também. E esse momento de ele ser primeiro ministro,

tem a ver com todo esse debate institucional.

M.M. – Sem dúvida.

G.L. – Você...

T.R. – Quer encaminhar alguma coisa?

G.L. – Pode falar, você tem o direito de perguntar também.

C.D. – Eu queria perguntar para o senhor, se pelo que o senhor disse, o CEPED

ele tinha não só o intuito de mudar a cabeça do advogado, mas mudar a

instituição e levar isso para um órgão publico para mudar, para que houvesse

uma mudança das instituições públicas? Ele tinha esse cunho? Até porque o

senhor falou que o próprio Caio Tácito era professor de Direito Administrativo

e era quem coordenava.

M.M. – Eu acho que sim, é aquela idéia da renovação institucional, que estava

no cerne também de toda a Aliança para o Progresso e de toda a política do

Kennedy, não é?

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G.L. – Essa realmente era a idéia. Você ia terminar a pergunta que estava

fazendo sobre o SanTiago?

T.R. – Isso. É sobre essa questão, ou seja, o San Tiago ele tem uma ideologia de

que é possível mudar o país, mudar a instituição e que essa reforma se inicia

com a elite, mas uma elite no sentido de, na verdade é uma elite no sentido

que até Platão dizia, não é? Não é a elite meramente que tem o poder pelo

poder, mas é a elite que vai ter o poder, vai ter o conhecimento, e aí, óbvio, por

isso não é todo mundo que tem, são poucos, e aí essa elite com conhecimento

e poder consegue então transformar a instituição, não é?

M.M. – É, exatamente, é a idéia do Pareto, da elite que se renova que se... e esse

é o texto mais atual do SanTiago, que se chama “Rumos da Revolução

brasileira” e ele já bastante doente, ele acaba o discurso dele em 63, quando

foi homenageado com Homem de Visão, e diz: “é do ajustamento perfeito

entre o povo que nos testemunha todos os dias sua vitalidade e as elites

capazes de se modernizarem que sinceramente espero ver surgir como que

por eletrólise essa realidade que pressentimos: o novo Brasil”. Isso, acho que

resume exatamente a idéia.

T.R. – O que se passava não é? É bem interessante.

M.M. – E a mesma idéia que ele tem na “Renovação do Direito”, quer dizer, a

“renovação do ensino do Direito, que é uma idéia reformadora, tanto que ele

chama a atenção que Rui Barbosa foi no fundo um reformador, quer dizer, ele,

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na visão de San Tiago, Rui Barbosa representava a ascensão da classe média

que tinha trazido a República e então que estava modernizando o país, por

que aquela mudança...

T.R. – É, isso no final do século...

M.M. – XIX.

T.R. – XIX, e aí já quase ainda no final do XX vem o Santiago falando: “agora

precisa de uma outra reforma”, não é?

M.M. – É exatamente.

G.L. – Muito bem, eu acho que foi...

M.M. – Versus a idéia da revolução, ou do desenvolvimento via crescimento

econômico, que iria criar um novo embate no fim da década de 60, depois do

CEPED, começo de 70, porque aí veio o...

T.R. – O próprio Roberto Campos, que foi muito forte nisso, não é?

M.M. – Veio dos Estados Unidos, estudando na Universidade de Chicago, o

depois presidente do Banco Central, como é que ele chama?

G.L. – Denio? Denio Nogueira?

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M.M. – Não, é depois o...

G.L. – Octávio Gouveia de Bulhões?

M.M. – Não, não, o Otávio não chegou a ser. Esse que está na Fundação ainda,

na área de Relações Internacionais, como é que ele chama? Agora me escapou.

É Carlos Geraldo Langoni que veio com toda a idéia da educação, como o

motor do desenvolvimento transformador, a educação. E aí, houve uma coisa

trágica, porque, como ele tinha relações muito estreitas com, primeiro com os

Estados Unidos, você já perguntou isso uma vez, e com os militares, achou-se

que aquilo era uma ideia autoritária e retrógrada que ele vinha com uma

ideologia para... e por isso que o pessoal atacava aquele outro programa da

USAID, que está ligado a isso, que era o programa da educação, vocês lembram

disso? O acordo da educação, da USAID, que provocava passeatas de

estudantes contra e tal.

G.L. – Eu fui casado com uma socióloga que no meio da revolução toda discutia

Marx na minha casa e ficavam... Eram contra o Mobral.

M.M. – Contra o Mobral, contra o...

G.L. – Contra o Mobral. Eu dizia: “espera aí, [riso] o Mobral está

alfabetizando...”

T.R. – Você tinha muito isso na época, não é? Essa ideologia era forte, o que

vem dos Estados Unidos não interessava, tinha que ser contra.

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G.L. – O Mobral é ruim, embora ele pegue a pessoa que não sabe ler e ensine...

M.M. – O mais estranho é que eu, Langoni, que ficou na Fundação, que ainda

fala muito aí, que foi presidente do Banco Central na época do Delfim...

T.R. – É depois a gente vê no google, [riso] é fácil.

C.D. – Vou ver no google.

M.M. – É fácil, você vê aí no google. Ele entrou na Fundação, mas ele tinha esse

lado, realmente de estar muito ligado aos militares, então um grupo grande

saiu da Fundação, foi para a PUC e fundou, enfim, reforçou a escola de

economia, passou a ser realmente...

T.r. – Ah, que daí vem a nova escola de Economia da PUC, não é?

M.M. – Da PUC é. Mas, nesse ínterim, se perdeu a prioridade da educação. Que

até hoje o Brasil não tem, quer dizer.... porque isso seria uma mini-semente,

quer dizer, a educação jurídica, mas havia toda a idéia de reformar a educação

em si.

G.L. – É transformar a educação de um processo de reprodução de um

conhecimento, que é dado, para um processo de criação de conhecimento, a

educação indagativa.

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M.M. – É, é. Deixa eu ver aqui.

C.D. – São os presidentes todos

T.R. – É o Ernane Galvêas?

G.L. – Galvêas!

M.M. – Não, não. Ernane Galvêas não.

C.D. – Rui Aguiar da Silva Lemos?

M.M. – Presidente do Banco Central, é.

T.R. – É, a gente tem aqui o Denio Chagas Nogueira, de 65 à 67, depois o Rui

Aguiar da Silva Leme de 67 à 68. De 68 à 74 o Ernane Galvêas.

M.M. – Está errado!

T.R. – Depois de 74 à 79 o Paulo Hortênsio Pereira Lira.

M.M. – Está errado!

G.L. – Paulo Lira, pai do Ricardo.

T.R. – Isso está na página do Banco Central. [riso]

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C.D. – Ministério da Fazenda, olha.

M.M. – Do Ministério da Fazenda, mas não é do Banco Central.

C.D. – Então, mas é a galeria dos presidentes do Banco Central do Brasil.

G.L. – Não achou quem ele estava procurando?

M.M. – O Ernane Galvêas era o Ministro da Fazenda...

G.L. – Mas pode ter sido depois, não é?

C.D. – Bom, essa é a página do ministério, olha, a galeria dos presidentes,

presidentes do Banco Central.

G.L. – Gustavo Franco, é esse que você estava procurando?

T.R. – Não, Gustavo Franco vai para a PUC, mas é antes dele.

M.M. – Não, não.

C.D. / G.L – Loyola, Persio Arida.

T.R. – Não, Persio Arida é bem recente.

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C.D. – Pedro Sampaio, Paulo Cesar Ximenes, essa página...

T.R. – Depois do Galvêas? Eu pensei que fosse esse.

G.L. – Ernane Galvêas foi Ministro da Fazenda.

M.M. – É, e ele foi Presidente do Banco Central do Galvêas

T.R. – Tem o Langoni...

M.M. – Langoni!

C.D. – De 80 à 83.

M.M. – É o Langoni, está certo. É o Langoni que escreveu a... agora eu vou

mostrar uma coisa para vocês.

G.L. – Anotou esse livro aqui?

C.D. – Eu já anotei. Eu vou pegar na FGV.

[silêncio]

M.M. – Que eu queria mostrar... no discurso do Kennedy, lançando a Aliança

para o Progresso, ele fala em espanhol: “Techo, trabajo e tierra, escuela y...”

mas está “escola”. E na declaração dos povos da América, de Punta del Este 1,

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está aqui: “eliminar o analfabetismo, e até 1970 garantir o mínimo de seis

anos de instrução primária”. Nós não chegamos. Agora estamos chegando lá.

“Modernizar e ampliar o ensino secundário, vocacional, tecnico e superior.

Acelerar a pesquisa pura e aplicada assim como aprimoração do pessoal

qualificado requerido pela sociedade em rápido desenvolvimento”.

T.R. – Olha, isso, é o que? É um pacto firmado pelos países americanos.

G.L. – Isso é a Aliança para Progresso.

T.R. – Em que ano foi? Em 60?

M.M. – É, é. É a declaração, a carta de Punta del Este, que é de 61. Agosto de 61.

G.L. – Marcílio, está sendo, todo esse trabalho, e a sua entrevista também,

como os americanos dizem illuminating. Eu estou resgatando uma parte de

uma coisa, que eu participei que nem um impetuoso, jovem, sem ter idéia do

que eu estava fazendo direito, mas é muito bom quando você vai ficando

velho, você começa a ver o que é que você fez na juventude, em vez de ser

estroinice, foi uma coisa maior do que você pensava. Você vai entendendo

aquilo que eu fazia, meio na intuição, meio no entusiasmo, meio naquela coisa

assim, mas você, seis ou sete anos mais velho que eu, você já tinha uma certa

compreensão, e está me trazendo de volta àquela coisa... eu estou emocionado

com esse projeto. Eu acho que está bom. Eu acho que por enquanto eu te

agradeço imenso.

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T.R. – Está ótimo, não, está muito bom sim.

G.L. – Então você vai transcrever isso, mandar para o Marcílio para...

T.R. – Obrigada.

[FINAL DO DEPOIMENTO]