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1 RESPONSABILIDADE SOCIAL – A EXTRAFISCALIDADE VISTA SOB O PRISMA DA FUNÇÃO SOCIAL NO DIREITO TRIBUTÁRIO. MÔNICA DE BARROS Graduada em Direito pela Faculdade Milton Campos, 2003. Especialista em Direito Tributário pela Faculdade Milton Campos, 2006. Mestranda em Direito Empresarial pela Faculdade Milton Campos Advogada 1. Notas introdutórias. O momento é de extrema riqueza. Até pouco tempo o que se apregoava era a soberania do mercado, com a independência total do Estado, aliás, este, enfraquecido pelas grandes corporações, pouco intervinha. Agora, com o mundo das finanças ruindo, os Estados voltaram a intervir no Sistema da Economia, portanto, este um exemplo que os sistemas devem se amoldar aos fatos sociais. Fato similar – certamente mais brando do que a crise atual – se deu com a pressão social ou perturbação social fez com que o Sistema Capitalista se amoldasse dentro de seu próprio “modus operandi”. Trata-se de uma reação do sistema capitalista a um incômodo ou perturbação socia l. Diante disso, o sistema traz para seu núcleo a “Demanda Social”, transformando esta num elemento do sistema, como um novo produto a ser vendido a RESPONSABILIDADE SOCIAL. Parte da doutrina afirma que a Responsabilidade Social se originou de sentimento de culpa. Segundo Artur Roman: “A Responsabilidade Social deve ser compreendida como parte da articulação das forças econômicas neoliberais que buscam amenizar os flagelos que elas mesmas criaram. Responsabilidade Social é, portanto, em um primeiro momento, alívio para consciência pesada das empresas.” Não parece que a análise possa ter tal superficialidade, mas certamente e, como dito anteriormente, o surgimento da responsabilidade social é uma forma do sistema econômico ou do regime político que hoje prevalece se amoldar aos fatos sociais ou à chamada pressão social. Destarte, a pressão social é lida pelo regime capitalista segundo a sua forma de entender esta pressão e sua forma de gerar as soluções, pois não se pode esperar que o sistema capitalista jamais gerasse um resultado distinto da forma como este sistema pensa. Não se pode esperar uma solução econômica para aquele que tem formação jurídica, pois o pensamento será

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RESPONSABILIDADE SOCIAL – A EXTRAFISCALIDADE VISTA SOB O PRISMA DA FUNÇÃO SOCIAL NO DIREITO TRIBUTÁRIO.

MÔNICA DE BARROS

Graduada em Direito pela Faculdade Milton Campos, 2003. Especialista em Direito Tributário pela Faculdade Milton Campos, 2006.

Mestranda em Direito Empresarial pela Faculdade Milton Campos Advogada

1. Notas introdutórias. O momento é de extrema riqueza. Até pouco tempo o que se

apregoava era a soberania do mercado, com a independência total do Estado, aliás, este, enfraquecido pelas grandes corporações, pouco intervinha. Agora, com o mundo das finanças ruindo, os Estados voltaram a intervir no Sistema da Economia, portanto, este um exemplo que os sistemas devem se amoldar aos fatos sociais.

Fato similar – certamente mais brando do que a crise atual – se

deu com a pressão social ou perturbação social fez com que o Sistema Capitalista se amoldasse dentro de seu próprio “modus operandi”. Trata-se de uma reação do sistema capitalista a um incômodo ou perturbação social. Diante disso, o sistema traz para seu núcleo a “Demanda Social”, transformando esta num elemento do sistema, como um novo produto a ser vendido a RESPONSABILIDADE SOCIAL.

Parte da doutrina afirma que a Responsabilidade Social se

originou de sentimento de culpa. Segundo Artur Roman: “A Responsabilidade Social deve ser compreendida como parte da articulação das forças econômicas neoliberais que buscam amenizar os flagelos que elas mesmas criaram. Responsabilidade Social é, portanto, em um primeiro momento, alívio para consciência pesada das empresas.”

Não parece que a análise possa ter tal superficialidade, mas

certamente e, como dito anteriormente, o surgimento da responsabilidade social é uma forma do sistema econômico ou do regime político que hoje prevalece se amoldar aos fatos sociais ou à chamada pressão social.

Destarte, a pressão social é lida pelo regime capitalista segundo a

sua forma de entender esta pressão e sua forma de gerar as soluções, pois não se pode esperar que o sistema capitalista jamais gerasse um resultado distinto da forma como este sistema pensa. Não se pode esperar uma solução econômica para aquele que tem formação jurídica, pois o pensamento será

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sempre no universo jurídico, portanto, uma solução dada pelo sistema capitalista somente pode ser de natureza capitalista.

Por isso, a responsabilidade social tornou-se um produto de

mercado, ou seja, passou a ser uma marca vendável, em que valoriza os produtos pela forma como a empresa que o fabrica se posta perante a sociedade. Como um produto, a responsabilidade social pode ter qualidade ou somente aparência – é preciso diferenciar! Gastos com publicidade maior do que com a própria atuação social demonstra que haverá maior aparência do que conteúdo e certamente não resolverá o amenizará a pressão social.

De início é preciso fazer uma distinção entre responsabilidade

social com a filantropia empresarial, pois esta é uma forma de compartilhar as riquezas com um sentimento de responsabilidade e motivações humanitárias1, baseia-se na caridade e na custódia, enquanto aquela se afasta da idéia de filantropia e pode ser encarada como gestão socialmente responsável.

Portanto, a releitura pelo capitalismo da mencionada pressão

social leva a diferentes resultados conforme o domínio que se analisa: - No mercado : neste caso o Sistema capitalista passa a avaliar os produtos e as empresas não somente pelo lucro, mas pela sua “consciência social” (consumidor como cidadão – rankings e tipos especiais de ações lançadas em bolsa); - Na empresa : a comunidade que a cerca e seus empregados devem ter condições mínimas de sobrevivência; - No Estado: deve servir de força-motriz para incentivar a atuação social. Nesta breve introdução podemos definir que a gestão socialmente

responsável é aquela que tem como um dos objetivos ter a empresa um caráter institucional, enfim, as empresas cuidando se seus empregados e da comunidade que as cerca como forma de melhorar o ambiente e, por conseqüência, a produtividade. Não se trata de caridade, mas de criar meios de desenvolvimento sustentável.

2. A responsabilidade social e a nova visão de empr esa no

domínio do Direito.

1 www.fiemg.com.br

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O Supremo Tribunal Federal já ditou que a livre iniciativa não será legítima enquanto exercida com o objetivo de puro lucro e realização individual do empresário, mas o será enquanto propiciar a justiça social inclusive no seu aspecto distributivo. (posicionamento do STF ADI QO319 DJ 30.4.93, Ministro Moreira Alves) .

Este o exato ponto que insere a questão ora analisada, ou seja,

no domínio do Direito Comercial, a bem do mundo atual, denominado Direito Empresarial, se constata, desde a origem, uma divisão entre os contratualistas e institucionalistas no conceito de empresa.

O primeiro grupo, os contratualistas, era representante do sistema

liberal capitalista, vislumbrava uma sociedade regida por um contrato livremente pactuado entre os sócios, cujo objetivo era a busca desenfreada pelo lucro, sem qualquer intervenção do Estado. A empresa vista como empresário, nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho2.

Posteriormente já na segunda metade do séc. XX, o

desenvolvimento tecnológico, a agilidade dos mercados de capitais e a necessidade de grandes investimentos acarretaram uma atenuação do contratualismo.

Nesse contexto, o interesse da sociedade não poderia se

restringir mais ao interesse dos sócios atuais, mas também abrangeria o dos futuros, assumindo relevância a própria preservação da empresa, pois somente assim poderia se captar recursos para retorno futuro. Portanto, o empresário já não poderia fazer de sua empresa o que bem entendesse, respondia aos investidores que acreditaram no seu negócio.

A empresa, portanto, transcende a figura do empresário; mas com

a criação de mecanismos de aproximação dos empregados do capital (stock-otions, Participação nos Lucros ou Resultados, criação de Entidades Fechadas de Previdência Complementar, etc.), bem como o clamor para que as empresas tenham mais responsabilidade no ambiente em que vivem, desvincula-se, de vez, a figura do empresário da empresa.

A empresa torna-se uma unidade institucional, onde a sociedade,

os empregados, os sócios e investidores devem conviver a bem de interesses individuais diversos, com um único interesse comum: a preservação da empresa gerando riquezas (lucros, salários, tributos) dentro de um contexto social e ambiental responsável.

2 COELHO, Fábio Ulhôa. Manual de direito comercial. 11.ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

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Enfim, o caminhar da humanidade trouxe tal conceito com uma

nítida acentuação do caráter institucionalista da empresa, prevalecendo o interesse da sociedade na preservação da unidade empresarial. Poderíamos afirmar, com bom grau de certeza, que o princípio da preservação das empresas foi a leitura da responsabilidade social dentro do Direito.

A questão é bem tratada por Arnold Wald:

No decorrer do século XX, o espírito associativo se desenvolveu e as empresas não são mais necessariamente individuais ou familiares, abrindo-se o respectivo capital em todos os países, inclusive no Brasil. Por outro lado, empregados e executivos passaram a participar mais ativamente da empresa, numa mudança ligada à profissionalização dos executivos e às novas técnicas de administração que repercutem na psicologia de comando, que se torna menos autoritário e mais consensual. Na própria gestão e no controle da empresa estabeleceu-se um novo equilíbrio de poderes entre acionistas e controladores, minoritários, administradores e empregados. As novas características da gestão, a maior sofisticação das técnicas utilizadas na produção e a progressiva robotização estão mudando o nível educacional, social e econômico dos trabalhadores das empresas masi modernizadas e sua relação com os detentores do capital.

Desapareceu o ‘patrão de direito divino’ que sobreviveu até o fim do século passado. A economia democratizou-se e passamos de uma sociedade piramidal, que refletia a organização militar e a própria estrutura jurídica kelseniana, para uma sociedade baseada nas redes e na comunicação via internet que domina a ‘era do acesso’. Surgiu, assim, e passou a dominar o mundo a chamada ´governança corporativa’.

A revolução empresarial justifica, pois, que a empresa não mais se identifique exclusivamente com o seu proprietário ou controlador, mas represente também a sua diretoria, seus executivos, seus técnicos, seus trabalhadores, ou seja, as equipes e os equipamentos que constituem o todo. Tal fato também decorre de não mais se considerar como únicos fatores de produção o capital e o trabalho, mas de se incluir, entre os mesmos, dando-lhe a maior relevância, o saber, ou seja, a tecnologia, que assegura a produtividade da empresa e na realidade o seu presente e o se futuro, abrangendo tanto as técnicas industriais e comerciais como a própria gestão3. Assim, três são os pilares que envolvem o estudo da empresa nos

dias atuais: o empresário, o estabelecimento e a atividade exercida. A teoria da empresa se firmou sobre estes três pilares - a empresa, o empresário e o estabelecimento empresarial.

Esta evolução pode ser facilmente percebida pela confrontação

do antigo Código Civil (1916), com um caráter predominantemente patrimonial

3 WALD, Arnauld. O empresário, a empresa e o Código Civil. In O Novo Código Civil – Estudos em Homenagem ao Professor Miguel Reale/Ives Gandra da Silva Martins Filho, Gilmar Ferreira Mendes, Domingos Franciulli Netto, coordenadores – São Paulo: LTr, 2003

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e individualista, prevalecendo, devido ao momento histórico de sua elaboração, o princípio "pacta sunt servanda" no novo Código Civil (2002).

Com efeito, após algumas décadas da promulgação do Código de

1916, iniciaram-se as tentativas de reforma. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, verificou-se a necessidade de adaptar referido projeto à nova realidade social, imposta pela referida Constituição.

Em 1999 o projeto de reforma retornou à Câmara dos Deputados,

onde ganhou a redação atual e foi definitivamente aprovado, em 06 de dezembro de 2001, sendo promulgado em 10 de janeiro de 2002, entrando em vigor em 10 de janeiro de 2003.

A unificação do direito privado no Código Civil de 2002 trouxe à

tona a preocupação com a preservação das empresas, sua função social, a necessidade de uma mudança comportamental e institucional nesse segmento importante da economia, e deu origem a edição de legislação baseada nos princípios da recuperação de empresas, seja judicial ou extrajudicial.

Como dito, para unificação do Direito Privado o Código Civil de

2002 baseou-se em três princípios orientadores, aplicáveis ao direito como um todo, são eles; a Socialidade, a Eticidade e a Operabilidade.

A socialidade pode ser definida como a sobreposição dos valores

coletivos aos valores os individuais. Na eticidade encontramos o rigorismo normativo que confere ao juiz o poder de suprir as lacunas da lei ao proferir decisões baseadas nos valores éticos. Já a operabilidade, tem como finalidade dar efetividade às normas jurídicas buscando critérios simples e objetivos para definição dos institutos jurídicos. A operabilidade, por exemplo, possibilitou a reunião do Direito comercial e civil e, via de conseqüência, a criação de um Direito Empresarial social, dinâmico e concreto.

As lições de Miguel Reale resumem o novo eixo que se funda a

empresa no Ordenamento Jurídico Pátrio:

Como se depreende do exposto, na empresa, no sentido jurídico deste termo, reúnem-se e compõem-se três fatores, em unicidade indecomponível: a habitualidade no exercício de negócios, que visem à produção ou à circulação de bens ou de serviços; o escopo de lucro ou resultado econômico; a organização ou estrutura estável dessa atividade.

(...) Dessarte, o tormentoso e jamais claramente determinado conceito de

‘ato de comércio’ é substituído pelo de ‘empresa’, assim como a categoria de ‘fundo de comércio’ cede lugar à de ‘estabelecimento. Consoante justa ponderação de René Savatier, a noção de ‘fundo de comércio’ é um concepção jurídica envelhecida e superada, substituída com vantagem pelo conceito de

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estabelecimento, ‘que é o corpo de um organismo vivo’, ‘todo o conjunto patrimonial organicamente grupado para a produção (La Théorie dês Obligations, Paris, 1967, p. 124)4 Vale reproduzir alguns dos dispositivos do Código Civil de 2002

que bem enfatizam a questão acima posta: Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. Art. 970. A lei assegurará tratamento favorecido, diferenciado e simplificado ao empresário rural e ao pequeno empresário, quanto à inscrição e aos efeitos daí decorrentes. Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados. Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. Parágrafo único. Ressalvam-se as disposições concernentes à sociedade em conta de participação e à cooperativa, bem como as constantes de leis especiais que, para o exercício de certas atividades, imponham a constituição da sociedade segundo determinado tipo. Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas. Art. 1.009. A distribuição de lucros ilícitos ou fictícios acarreta responsabilidade solidária dos administradores que a realizarem e dos sócios que os receberem, conhecendo ou devendo conhecer-lhes a ilegitimidade. Art. 1.011. O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios. § 1o Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou

4 REALE, Miguel. O Projeto de Código Cvil. São Paulo. Saraiva. 1986. pp. 98-99.

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suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação. § 2o Aplicam-se à atividade dos administradores, no que couber, as disposições concernentes ao mandato. Art. 1.022. A sociedade adquire direitos, assume obrigações e procede judicialmente, por meio de administradores com poderes especiais, ou, não os havendo, por intermédio de qualquer administrador. Art. 1.023. Se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária. Art. 1.024. Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais. Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. Art. 1.143. Pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza. Art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento. Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subseqüentes à transferência. Parágrafo único. No caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato. Art. 1.148. Salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante.

Art. 1.149. A cessão dos créditos referentes ao estabelecimento transferido produzirá efeito em relação aos respectivos devedores, desde o momento da

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publicação da transferência, mas o devedor ficará exonerado se de boa-fé pagar ao cedente. Nessas notas introdutórias sobre o assunto que se pretende

abordar, o que parece de maior relevo é notar que o Direito não pode ficar atrofiado frente às mudanças sociais; pelos seus mecanismos próprios o Direito se aperfeiçoa com as mudanças na sociedade, introjetando os novos conceitos no Ordenamento Jurídico Pátrio para que estes ganhem lógica no Sistema Jurídico.

Nesse sentido, basta no momento dizer que a empresa não mais

significa o empresário, nem tampouco somente a unidade de produção (estabelecimento), é mais do que isso, estes são componentes do novo conceito de empresa, mas ao empresário e ao estabelecimento se unem os prestadores de serviços, os empregados, a sociedade e o Estado, com interesses ou pressupostos iniciais distintos (lucro, produção, oportunidade de mercado, empregabilidade, responsabilidade social e ambiental, arrecadação tributária), que possuem uma rota comum para que o interesse de cada qual se satisfaça: a preservação da empresa, enquanto unidade institucional.

Novamente Arnold Wald: A visão realista do mundo contemporâneo considera que não há mais como distinguir o econômico do social, pois ambos os interesses se encontram a se compatibilizam na empresa, núcleo central da produção e da criação da riqueza, que deve beneficiar tanto o empresário como os empregados e a própria sociedade de consumo. Não há mais dúvida que são os lucros de hoje que, desde logo, asseguram a sobrevivência da empresa e a melhoria dos salários e que ensejam a criação dos empregos de amanhã; (...) Uma vez ultrapassada a concepção do Estado-Providência, com a falência das instituições de previdência social e a redução do papel do Estado nas áreas que não são, necessária e exclusivamente, de sua competência, amplia-se a missão da empresa, como órgão intermediário entre o Poder Público e o Estado. É ela a criadora de empregos e a formadora de uma mão-de-obra qualificada, produtora de equipamentos mais sofisticados, sem os quais a sociedade não pode progredir, bem como a interlocutória ágil e dinâmica que dialoga constantemente com os consumidores dos seus produtos e com o Poder Público. 3. O objeto do direito tributário e os valores que o cercam. Pois bem, uma mudança fundamental como a acima retratada no

conceito de empresa e na sua função social não poderia passar impune pelo Direito Tributário, por isso, mister estudar o objeto de estudo no direito

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tributário, bem como os princípios e valores que regem este ramo do Direito5. O Prof. Valter Lobato, em sua Dissertação de Mestrado6

demonstra a complexidade do Direito Tributário e suas preocupações este ramo:

É onde o poder tramita de forma intensa, ora abarcando interesses de arrecadação para manutenção de um modelo econômico; ora abarcando interesses de determinados setores econômicos. Se voltarmos os olhos para todos os elementos (não jurídicos) que cercam o Direito Tributário jamais conseguiremos extrair qualquer segurança, previsibilidade ou conhecimento. Citamos Michel Bouvier, cujas lições nos foram trazidas pela Professora Misabel7: “O imposto, desde suas origens, foi representado de duas formas básicas: como instrumento de submissão ou ainda como meio de solidariedade do grupo social. Foi através da imagem de um Estado-nação unificado, de fronteiras bem definidas, que se construiu uma simbologia fiscal largamente aceita, a de que se realiza o bem comum por meio do imposto. Tal visão não é mais a atual. O mundo atual é composto, descrente, desencantado. A concepção fortemente individualista dos anos oitenta e a tese de uma fiscalidade mínima favorecem o retorno da lógica do imposto-troca. O corporativismo se reforça, reclama e obtém privilégios fiscais que se traduzem em múltiplos tipos de alívios ideais. Essa onda corporativista está na origem de uma série de favores e regimes derrogatórios, tomados notadamente em direção do setor econômico e financeiro, que dão à fiscalidade nacional e local atual a estrutura de um verdadeiro mosaico. .............................................................................................................. Em tal quadro, o poder fiscal se tornou um jogo para os múltiplos centros de decisão públicos e privados que formam o tecido social, enquanto ele é cada vez menos um atributo de um poder universal, representado até agora pelo Estado. Os organismos profissionais (sindicatos patronais ou de empregados), as associações profissionais de interesses de tal ou qual parte da população, as coletividades territoriais, as instituições internacionais, todos intervêm de maneira ativa no processo de decisão fiscal, reivindicam a fiscalização de certa renda ou o poder de modular a carga fiscal, ou criá-la, suprimi-la ou modificá-la.

5 Neste sentido TORRES, Ricardo Lobo, Os Direitos Humanos e a Tributação. Imunidade e Isonomia, Rio de Janeiro, Renovar, 1999 e DERZI, Misabel in BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de tributar. 7ª ed., atualizada por MISABEL DERZI. Rio de Janeiro. Forense. 1999. E ainda Kaus Tipke: “...o que num caso concreto é igual ou desigual não se pode estabelecer abstratamente ou de modo geral, mas apenas através de recurso ao sistema e aos princípios de determinado ramo jurídico. Assim, no direito penal, importa abranger todos os criminosos, nada importando se eles são ricos ou pobres. No direito militar, importa abranger as pessoas capazes; os doentes podem ser tratados de modo diferente de como se tratam os sadios. No direito tributário a capacidade de contribuição fiscal e econômica desempenha um papel especial. Quem não tem essa capacidade deve ser tratado de modo diversos de como se trata o que a tem” (TIPKE, Klaus, Princípio da Igualdade e Idéia de Sistema no Direito Tributário, in “Direito Tributário – Estudos em homenagem ao Professor Ruy Barbosa Nogueira, Editora Saraiva. São Paulo, 1984, pg.; 520) 6 Os tributos destinados ao custeio da Seguridade Social – A busca do equilíbrio de suas fontes. Dissertação de Mestrado, não-publicada. UFMG:2004. 7 Apud , Misabel Abreu Machado, Pós-Modernismo e Tributos: complexidade, descrença e corporativismo, In Revista Dialética de Direito Tributário, n. 100, pgs. 65/80

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Assim presenciamos um retorno à Idade Média, com extrema diversificação da arrecadação, associada a inúmeras diferenças de estatutos.” (Cf. op. cit. p. 225-226). Especialmente no Brasil, mesmo com tantos princípios constitucionais, mesmo com tantas proteções no Texto Maior, o Direito Tributário não foi capaz de dar respostas eficientes à sociedade brasileira; não conseguiu construir uma valoração de princípios, nem tampouco uma construção científica de conceitos. Há anos e anos não conseguimos pacificar as mais básicas, diríamos necessárias, conceituações, tais como: ônus da prova, presunção de veracidade do ato administrativo-tributário, decadência, prescrição, espécies de tributos, conceito de renda, de faturamento, etc. e etc. A sociedade brasileira cobra – com justiça – uma maior estabilização das questões tributárias; a doutrina cobra de nossos Tribunais uma maior estabilidade em nossas relações. O Direito Tributário ainda não é visto, pelos agentes internos, como forma de melhoria da competitividade do Brasil; como forma inesgotável de consolidação do Estado Democrático de Direito. É certo que o Direito Tributário não é fim em si mesmo, mas tem sido meio de arrecadação para fins não tão nobres, em um ciclo já retratado anteriormente. Longe de atingir a profundidade que consta da Dissertação acima

mencionada, é certo que o Direito Tributário busca se cercar de princípios que lhe são peculiares, traçando-os como diretriz do sistema e para equacionar a difícil missão de: a) dar cabo à competência tributária posta no Texto Constitucional; b) ditar os limites de exercício desta competência para que ela não rompa a cerca do abuso.

Enfim, o Direito Tributário visa, antes de tudo, regular senão a

relação jurídica entre os contribuintes e o Estado. Novamente as lições de Valter Lobato:

Aliás, a inserção da relação jurídica, em qualquer ramo do Direito, busca exatamente esta igualdade de tratamento, busca a proteção contra o poder (sempre no ambiente do Estado Democrático de Direito, pois no arbítrio – como vimos – sempre imperará o caráter instrumental do direito e não seus valores). Veja no Direito do Trabalho, onde impera (e às vezes se deturpa) o princípio da hipossuficiência do empregado; ou mesmo a proteção que é dada ao Consumidor na relação com os fornecedores de bens e serviços. O Direito, portanto, tem que estar sempre limitando o poder8, valorando a segurança e justiça. Conquanto, o Direito Tributário vem regular a relação jurídica havida entre os contribuintes e o Estado e este ‘regular’ se dá pelo Direito Posto e pelos princípios e valores que regem o Sistema. No mesmo caminhar o Prof. Sacha Calmon: “Qual é, então, o objeto do Direito Tributário?

8 "Tout pouvoir sans contrôle rend fou." Alain (1868-1951)

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O de regular o relacionamento entre Estado e contribuinte, tendo em vista o pagamento e o recebimento do tributo. Certos autores dizem que o Direito Tributário regula uma parcela da atividade financeira do Estado, qual seja, a de receber tributos. Esta é uma visão autoritária e estática. Em verdade, o Direito Tributário regula e restringe o poder do estado de exigir tributos e regula os deveres e direitos dos contribuintes, isonomicamente. Seu objeto é a relação jurídica travada entre o Estado e o contribuinte. (...) O Direito Tributário cuida especificamente das receitas derivadas do patrimônio particular transferidas para o tesouro público mediante ‘obrigações tributárias’ previstas em lei. A ênfase do Direito Tributário centra-se na relação jurídica e não na atividade estatal de obtenção de receitas. Não é o Direito do Estado, é a relação jurídica entre sujeitos de direito sob os auspícios da legalidade e da igualdade”9. Portanto, nas palavras do Mestre Sacha, o Direito Tributário

regula a relação tributária, que deve estar pautada pela legalidade e algumas regras-princípios, que não admitem maiores ilações (legalidade, anterioridade, não-surpresa, irretroatividade, etc.) e outros princípios mais fluídos que visam trazer o elemento Justiça e Igualdade ao ramo .

Ainda trazendo as lições do Professor Sacha Calmon: Pensamos

que se o Direito é piramidal, podemos descrevê-lo do ápice para a base ou da base para o ápice. Por isso que as normas jurídicas extraem validez de uma norma que lhes está imediatamente acima. A norma que está no topo é justamente a constitucional. Ela é que confere validez às demais normas do sistema, até as mais ínfimas, os regulamentos e as instruções normativas das autoridades administrativas. Subir ou descer a pirâmide normativa, tanto faz.”10

Nesse sentido, a norma constitucional tem como função primeira, no sistema tributário, limitar o poder, inclusive o poder do Estado, a bem dos princípios e garantias fundamentais. Eis as palavras do saudoso Ministro Orozimbo Nonato no RE 18.331 (RF 145/164-169):

...o poder de taxar não pode chegar à desmedida de poder de destruir, uma vez que aquele somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade de trabalho, de comércio e de indústria e com o direito de propriedade. É um poder, em suma, cujo exercício não deve ir até o abuso, o excesso, o desvio, sendo aplicável, ainda aqui, a doutrina do détounement de pouvoir E o Ministro Celso de Mello: O poder absoluto exercido pelo Estado, sem quaisquer restrições e controles,

9 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro, Curso de Direito Tributário Brasileiro, Forense, 3a edição, pg. 32

10 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro, Curso de Direito Tributário Brasileiro, Forense, 3a edição, pg. 34/35

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inviabiliza, numa comunidade estatal concreta, a prática efetiva das liberdades e o exercício dos direitos e garantias individuais ou coletivos. É preciso respeitar, de modo incondicional, os parâmetros de atuação delineados no texto constitucional. Uma Constituição escrita não configura mera peça jurídica, nem é simples estrutura de normatividade e nem pode caracterizar um irrelevante acidente histórico na vida dos Povos e das Nações. Todos os atos estatais que repugnem à Constituição expõem-se à censura jurídica - dos Tribunais, especialmente - porque são írritos, nulos e desvestidos de qualquer validade. - A Constituição não pode submeter-se à vontade dos poderes constituídos e nem ao império dos fatos e das circunstâncias. A supremacia de que ela se reveste - enquanto for respeitada - constituirá a garantia mais efetiva de que os direitos e as liberdades não serão jamais ofendidos. Ao Supremo Tribunal Federal incumbe a tarefa, magna e eminente, de velar por que essa realidade não seja desfigurada." (Ementa do Ac un do STF Pleno - ADIn 293-7600-DF - medida liminar - Rel. Min. Celso de Mello - julgada em 06.06.90, DJU de 16.04.93, p. 6.429 e IOB nº 10/93, p. 193, texto 1/6203.)

Pois bem, esta norma constitucional que segura a relação

jurídico-tributária, como mencionado anteriormente, possui valores, princípios e princípios-regra para dar a fluidez necessária à evolução do Sistema, mas cercar os eventuais abusos que possam ser cometidos11.

Assim, a Norma Constitucional Tributária se funda na busca da

Capacidade Contributiva para uma tributação mais justa e Segurança Jurídica para uma tributação mais certa. Estes são princípios (valores) norteadores do Sistema Tributário Nacional.

Finalmente, as palavras do Professor Ricardo Lobo Torres: “Os princípios representam o primeiro estágio de concretização dos valores jurídicos a que se vinculam. A justiça e a segurança jurídica começam a adquirir concretude normativa e ganham expressão escrita.”12 4. O princípio da Capacidade Contributiva Segundo Regina Helena Costa “O conceito de capacidade

contributiva, ainda que o termo que o expressa padeça de ambigüidade e da imprecisão característica da linguagem do direito positivo, pode ser singelamente definido como a aptidão, da pessoa colocada na posição de destinatário legal tributário, numa obrigação cujo objeto é o pagamento de

11 A Professora Misabel Derzi, nas anotações à obra de Aliomar Baleeiro “Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar”, arrola mais de 36 princípios, incluindo as imunidades ditas como “...meras especializações ou explicações dos direitos e garantias individuais”, lembrando que nem mesmo o art. 5o do Texto Constitucional que arrola os princípios é taxativo: “Os direitos e garantias expressos nessa Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. 12 TORRES, Ricardo Lobo, op. cit., pg. 79

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imposto, para suportar a carga tributária sem o perecimento da riqueza lastreadora da tributação.”13

Pode-se afirmar que a capacidade contributiva é uma derivação

do princípio da igualdade e também pode ser enquadrado como um subprincípio da isonomia quando tratamos especificamente de impostos.

Para Geraldo Ataliba e Cléber Giardino (citados por COSTA,

1996): “O princípio traduz-se na exigência de que a tributação seja modulada, de modo a adaptar-se à riqueza dos contribuintes.” A Constituição Federal de 1988, nos termos do art. 145, §1º,

restabeleceu a norma que expressamente consagrava, na Constituição Federal de 1946, o princípio da capacidade contributiva.

Segundo Valter Lobato: O princípio da capacidade contributiva ganhou concretude e força no texto constitucional de 1988, passando a servir como instrumental necessário à preservação e à concretização dos valores e direitos fundamentais descritos acima, ou seja, sem o correto entendimento do dever de respeitar a capacidade de contribuir daquele a quem a norma se direciona, certamente prejudicadas estarão a igualdade, a propriedade e o não confisco, este último como já dito, ponto de equilíbrio entre a capacidade contributiva, o não confisco e a extrafiscalidade.14 Neste sentido importante também as lições de Eduardo Maneira

(citado por Lobato, 2004):

O princípio da capacidade contributiva é aquele que confere consistência lógica e legitimidade à tributação. Adam Smith de há preceituava que “os súditos de cada Estado devem contribuir o máximo possível para a manutenção do governo, em proporção às suas respectivas capacidades, isto é, em proporção ao rendimento de que cada um desfruta, sobre a proteção do Estado’. É que só podem tributar fatos reveladores de capacidade econômica, isto é, o Estado, na sua necessidade de arrecadar, busca a riqueza onde a riqueza se encontra.Identificam-se duas correntes doutrinárias no tocante ao conteúdo ou à natureza desse princípio. A primeira corrente, que entende o princípio da capacidade contributiva, natureza pragmática, de orientação, porém não

13 COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva. 2ª. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996 14 LOBATO, Valter Souza; COÊLHO, Sacha Calmon Navarro (orientador). Os tributos destinados ao custeio da seguridade social a busca do equilíbrio de suas fontes. 2004. 394 fls. enc. Dissertação (Mestrado em Direito Tributário) – Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2004.

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coercível, e a segunda corrente, que atribui natureza jurídica ao princípio, isto é conteúdo de regra jurídica que vincula o legislador ordinário, obrigando-o a eleger como fatos tributáveis, aqueles que revelem alguma forma de riqueza. Rubens Gomes de Souza, Pontes de Miranda, A.D. Giannini, dentre outros filiam-se à corrente pragmática, Aliomar Baleeiro, Emílio Giardina, Misabel Derzi e outros mais, à corrente que atribuem eficácia jurídica ao princípio. Assim, do ponto de vista jurídico a capacidade contributiva

significa que um sujeito é titular de direitos e obrigações e a legislação tributária irá definir a capacidade em seu âmbito. Portanto, a tributação deve sempre guardar coerência e ser graduada de acordo com a capacidade contributiva, o que infelizmente não ocorre no Brasil, inundado por uma carga tributária regressiva que afeta os salários de maneira muito forte e o consumo, deixando de lado os grandes patrimônios. Urge realizar a reforma tributária!

Neste sentido se manifestou Elisabeth Lewandowski Libertuci: A capacidade contributiva não é apenas um princípio constitucionalizado a partir de 1988. Muito menos é princípio direcionado aos impostos. É o princípio fundamental que confere fundamento de validade a todas as espécies tributárias. Aos impostos, é causa de fundamento de validade; às taxas é elemento de graduação; e às contribuições sociais é critério de dimensionamento. Enquanto princípio fundamental constitucional, a inobservância nos moldes aqui delimitados (causa para impostos, graduação de taxas e dimensionamento para contribuições sociais), deflagram na patologia da inconstitucionalidade.15 Mas a capacidade contributiva deve ir mais além para atingir a

necessidade de contribuir. Destarte, voltando ao tema que o trabalho se propôs, certamente o Princípio da Preservação das Empresas tem lugar seguro na Capacidade Contributiva. Vejam as lições do Prof. Sacha Calmon:

Em primeiro lugar o princípio da capacidade contributiva, quando apresenta-se constitucionalizado, tem por destinatário o órgão legislativo, fautor da lei fiscal. É, assim, materialmente, norma sobre como fazer lei. Sendo assim, se a lei oferecer o Princípio da incapacidade contributiva genericamente, da-se de uma hipótese de inconstitucionalidade material, por isso que inexiste fundamento material de validez da lei. Neste caso, o judiciário pode declarar a inconstitucionalidade da lei, tanto nos encerros de uma ação direta de inconstitucionalidade (controle concentrado), quando no bojo de uma ação comum, incidenter tantum (controle difuso) (...)

15 AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do; ROSAS, Roberto; VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Princípios Constitucionais Fundamentais – estudos em homenagem ao professor Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Lex Editora S.A., 2005, pág 361

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O que precisa ficar bem claro é que o princípio da capacidade contributiva não é dispositivo programático, noção de resto superadíssima pelo moderno constitucionalismo, senão princípio constitucional de eficácia plena conferente de um direito público subjetivo ao cidadão-contibuinte, oponível ao legislador.16 Misabel Derzi (citada por LOBATO, 2004) demonstra a distinção

que alguns autores fazem da capacidade econômica objetiva para a capacidade econômica subjetiva. Na primeira destaca-se o dever do legislador “a tão somente eleger como hipóteses de incidência de tributos aqueles fatos que, efetivamente, sejam indícios de capacidade econômica. Daí se inferir a aptidão abstrata e, em tese para concorrer aos gastos públicos da pessoa que realiza tais fatos indicadores de riqueza”.

Por outro lado a capacidade econômica subjetiva tem aplicação

obrigatória, além da escolha da hipótese de incidência; “refere-se á concreta e real aptidão de determinada pessoa (considerados seus encargos obrigatórios pessoais e inafastáveis) para o pagamento de certo imposto”.

Lembrando a peculiaridade de nosso Sistema Tributário, com a

competência quase exaustivamente posta no texto constitucional a Professora ressalta a importância do legislador, pois, mesmo tendo a CF elencado os fatos que supostamente seriam indicadores de riqueza e, portanto, passíveis de tributação, caberá à legislação infraconstitucional o papel, de depuração deste signo presuntivo de riqueza, na busca da capacidade econômica, sob pena de, não o fazendo deixar pela metade o importante princípio para a justiça tributária.

5. A Extrafiscalidade no Direito Tributário. O Direito Tributário não deve ter somente o intuito de arrecadar,

pois um sistema justo e coerente deve ser indutor de crescimento e redutor das desigualdades sociais.

Um sistema tributário mal posto pode agravar questões

relacionadas à empregabilidade, proteção ao meio ambiente, perda da soberania dos Estados-Membros, sendo o inverso também verdadeiro, por isso, a Fiscalidade dos países pode afetar, negativa ou positivamente, diversos outros fatores de convivência social ou domínios sociais e econômicos.

5.1. A Extrafiscalidade e a Responsabilidade Social .

16 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9ª. ed. Rio de Janeiro: Forense,2005

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Como visto anteriormente, nas notas introdutórias deste trabalho, a responsabilidade social no sistema do Direito foi lida dentro de dois princípios básicos: capacidade contributiva e função social da propried ade.

Também vimos que cabe ao Estado propiciar meios para que esta

responsabilidade social da empresa (que deve atingir os seus empregados e a comunidade que a cerca) deve ser induzida e incentivada pelo Estado, através da extrafiscalidade.

Perante a comunidade o Estado pode induzir a responsabilidade

social através de alguns mecanismos: a) meio ambiente. Na proteção do meio ambiente, o Estado pode

incentivar as empresas a buscar meios alternativos, menos poluentes, para suas atividades, através de reduções nos tributos indiretos (na comunidade européia, por exemplo, a empresa não tem direito de crédito quando adquire alguns produtos considerados altamente poluentes), além de ter uma legislação coercitiva daqueles que infringem a lei. É preciso fazer a separação. Coerção para quem infringe a lei e estímulo para quem vai além do texto legal.

b) cultura e educação. Neste domínio já existem leis específicas

para incentivar a produção cultural e os esportes (Lei Rouanet, ICMS de Minas Gerais, por exemplo), onde o Estado permanece como o financiador, mas a empresa opera, dá contrapartida e recebe o retorno na imagem (empresa como operadora de uma atuação social-cultural). Muito ainda pode ser feito neste campo, pois atualmente tais leis ainda elitizam ou priorizam a imagem sobre o conteúdo. No campo educacional, o Texto Constitucional é claro ao determinar que aqueles que investem em educação devem ser desonerados dos tributos, na medida em que se subrogam na função do Estado:

Art. 6o São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 26, de 2000) Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 195. § 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre:

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a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; Os mecanismos são postos, bem como os ditames

constitucionais. Basta a sua aplicação. Lado outro, na parte do empregado, novamente, existem os

dispositivos legais, coercitivos e impositivos (segurança, irredutibilidade salarial, etc.) que devem ser obedecidos pela empresa como obrigação legal e não têm relação com a função social ou a responsabilidade social, como queiram.

Contudo, o próprio desenvolvimento do conceito de salários

demonstra que a tributação sobre eles criou uma forma de atuação na responsabilidade social, novamente, quando a empresa subroga-se no papel estatal. Senão vejamos.

O Texto Constitucional é claro ao delimitar a competência para

criar contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários: Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) b) a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) c) o lucro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (...) § 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I. Por força da remissão feita, a expansão das fontes de custeio da

previdência somente poder-se-ia dar mediante lei complementar, bem como seguir os demais ditames transcritos acima.

Significa dizer que a Constituição Federal foi extremamente clara

ao ordenar que as fontes da Previdência Social seriam (i) dos empregadores, incidente sobre a folha de “salários” (ampliada para folha de pagamentos após a EC 20/98), o faturamento e o lucro; (ii) dos trabalhadores; (iii) sobre a receita

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de concursos de prognósticos. Tudo que for criado fora destas fontes necessita-se de lei complementar.

Estamos aqui a tratar do conceito de REMUNERAÇÃO. Nesse compasso, por serem as contribuições verdadeiros

tributos, aplicam-se a elas os princípios da legalidade, irretroatividade fiscal e não surpresa do contribuinte (anterioridade ou lapso de 90 dias), bem como são aplicáveis as normas gerais do direito tributário (Código Tributário Nacional), neste caso vale a citação do artigo 110 do CTN:

“A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias” Não se trata de interpretar a Constituição a partir do CTN,

contudo, o dispositivo acima é quase uma redundância, ou seja, não pode o legislador, buscando ampliar seu campo de competência, ir além do que o constituinte lhe delimitou e se assim o fez, tomou como base os conceitos existentes à época.

Isto posto , não pode vir a Fiscalização alterar conceitos já

solidificados em nossas vidas e no próprio Texto Constitucional do significado de SALÁRIO. O Direito nada mais é do que um retrato da vida social e jamais pode criar ficções que ultrapassam o bom senso. Salário é contraprestação dos serviços realizados.

O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n°

166.772-9/210, em 12.05.94, relatado pelo Ministro Marco Aurélio, demonstrou que a expressão empregador/folha de salá rios deve ser interpretada em seu sentido técnico (quando o Governo Federal desejou estender o conceito de empregador àquele que contrata serviços de autônomos).

Nesse compasso, inicialmente detínhamos o conceito de que o

que era PARA prestação dos serviços não se tratava de salário, mas instrumental para o exercício da função; o que era PELA prestação dos serviços poderia ser considerado como forma de remuneração.

“Para que determinado fornecimento seja considerado como salário utilidade, faz mister que não tenha por fim a sua utilização no local de trabalho para a prestação dos serviços contratados. E que, neste caso, a utilidade constitui um meio necessário ou conveniente para a realização dos serviços e não um rendimento do empregado proveniente do trabalho realizado; equiparando-se

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aos mecanismos e instrumentos de trabalho, indispensáveis ao funcionamento da empresa, não podendo, por conseguinte, substituir como utilidade vital para o trabalhador o salário a que faz jus pela prestação dos serviços contratado. Por isto mesmo na lei brasileira, tornou-se expresso que: “não são considerados como salário para os efeitos previstos neste artigo, os vestuários, equipamentos, e outros acessórios fornecidos ao empregado e utilizados no local de trabalho, para prestação dos respectivos serviços (Parágrafo 2º do Art. 458, citado)” 17 Contudo, no evoluir dos tempos e das formas de remuneração,

tais conceitos não bastaram, surgindo a distinção do que é contraprestação e do que é indenização, sendo que este último, por se tratar de reposição de um patrimônio perdido, não pode fazer parte da remuneração.

“Indenizações diferem dos salários pela sua finalidade, que é a reparação de danos ou o ressarcimento de gastos do empregado, como as diárias e ajudas de custo, as indenizações adicionais de dispensa, etc.”18 “Como vimos, ao analisar as correntes sobre a natureza jurídica do salário, este é uma retribuição devida e paga diretamente pelo empregador ao empregado, de forma habitual, pelos serviços prestados e pelo fato de encontrar-se à sua disposição. Já a indenização é uma importância devida na relação de emprego quando há perda ou lesão de um direito provocada de forma dolosa ou culposa pelo empregador ou seus prepostos, ou, ainda, pelo fato de desenvolver ele atividade de risco, à luz do art. 927, parágrafo único, do Código Civil de 2002.”19 “Há, entretanto, no contexto da relação de emprego um universo talvez ainda mais diversificado e amplo de parcelas econômicas pagas ao trabalhador sem caráter salarial: parcelas que, embora entregues pelo empregador a seu empregado, não o são com qualidade e objetivo contraprestativos, sendo transferidas efetivamente com distintas natureza e finalidades jurídicas. Trata-se, assim, de parcelas econômicas que não se integram ao salário obreiro não tendo o efeito expansionista circular tão próprio aos salários; por isso não produzem os reflexos clássicos a qualquer verba de natureza salarial. (...) A tipologia construída de acordo com a natureza jurídica do instituto classifica tais figuras não salariais em parcelas de natureza indenizatória, parcelas de natureza meramente instrumental... (...) De outro lado, há as indenizações construídas a outros títulos, seja para ressarcir direito trabalhista não fruído em sua integralidade, seja para reparar garantia jurídica desrespeitada, seja em face de outros fundamentos normativamente tidos como relevantes. Neste segundo grande grupo estão a

17 Arnaldo Sussekind In Instituições de Direito do Trabalho, Ltr, 11ª Edição, página 336 18 Amauri Mascaro Nascimento, Curso de Direito do Trabalho, pg. 427 19 BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p.706

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indenização de férias não gozadas, de aviso prévio indenizado, a indenização por tempo de serviço...”20 Portanto, as parcelas pagas PARA a prestação de serviços e as

de natureza indenizatória estavam fora do campo de incidência dos encargos trabalhistas e previdenciários.

Mas além deles, entendeu o legislador que aqueles outros

“benefícios” de natureza assistencial e não salarial também não deveriam integrar a remuneração.

Com efeito, quando o particular se subroga no dever do ESTADO

tem que ser desonerado dos encargos salariais e tributos. Não podemos nos esquecer que as contribuições previdenciárias ora tratadas são tributos finalísticos, ou seja, arrecadas com determinado fim, assim, se o fim já é cumprido pela empresa/empregadora, não há sentido na arrecadação. Esta a ratio das isenções que cercam o tema:

"Como a isenção, no mundo de hoje, não deve ser concedida como favor ou privilégio de mão beijada, pois a todos incumbe o dever de contribuir para a manutenção dos serviços públicos, há de compreender-se que ela é dirigida à consecução dum fim determinado e específico de interesse social a cargo de quem a concede. Esse fim revela a ratio juris"21 Nesse compasso, não incide contribuições previdenciárias na

licença remunerada, no complemento ao auxílio-doença ou na aposentadoria por invalidez ou mesmo nas contribuições para a Previdência Privada, pois está a empresa se “sub rogando” no dever estatal, conforme nos ensina o Professor Wladimir Novaes Martinez22:

“Circunvizinha do tema, à mesma conclusão chegou Maria Wilma de ª S. Resende, da Consultoria Geral do Ministério da Previdência Social - MPS, quando decidiu pela não-incidência de contribuição sobre o atendimento à saúde, oferecido pela empresa (Parecer CJ/MPS 141/91). Não ignorava tratar-se de ganho habitual, mas considerou o fato de se tratar de prestação securitária antecipada pelo particular. (...) Nas duas conjunturas reproduzidas, a empresa sub-rogou-se no dever do Estado de ministrar a seguridade social. E, por via de consequência, não se justifica tal oferecimento vir a se constituir em hipótese de incidência da exação previdenciária. Faz parte integrante da natureza da contribuição, a sua finalística. Atendido diretamente o objetivo da Previdência Social, em condições ideais, dada a proximidade gerada pelo contrato de trabalho, entre quem

20 DELGAGO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 4ª ed. São Paulo: LTr, 2005. P. 696, 697. 21 In Direito Tributário Brasileiro, 10ª ed., Forense, pg. 587 22 Revista Dialética de Direito Tributário, 25, pg. 132

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enseja a proteção e o protegido, não tem cabimento subtrair-se, do próprio montante, parcela a ser utilizada na sua consecução. Não respeita a lógica sedimentadora da construção do ordenamento científico da seguridade social: portanto, tal raciocínio deve ser estendido (e estimulado) a todas as prestações laborais com cunho previdenciário, principalmente quando o acréscimo operado fica fazendo parte indissociável da pessoa humana e puder ela, todo o tempo contar com ele. (...) Além de excepcionar o valor correspondente às ferramentas de trabalho (letra o) nos seus itens p e q, a Instrução Normativa SPS 2/94 exclui do conceito os benefícios postos à disposição pela empresa, entre os quais a assistência à saúde (letra t). Na esteira lógica, não só de estimulá-las e incentivá-las, acostando-se à determinação constitucional de divisão dos encargos, como em virtude de posicionar-se diante do escopo exacional da contribuição” A lição do Eminente Professor Wladimir Martinez é de tamanha

clareza que sequer nos permite qualquer acréscimo, exceto enfatizar que a jurisprudência pacificada dos tribunais admite que não integra o salário-de-contribuição a assistência médica “e outras similares”, a previdência privada, etc. Por isso que mesmo antes da lei consagrar a não int egração de tais valores na remuneração, a jurisprudência já o fazia .

Conforme dito anteriormente, os conceitos em Direito Tributário

devem respeitar o sentido técnico posto em outros ramos, pois este conceito que foi aprisionado pelo Constituinte para delimitar as competências.

Ora, no Direito do Trabalho não existem discussões sobre o tema.

Dita a CLT: Art. 457 - Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber. (Redação dada pela Lei nº 1.999, de 1.10.1953) § 1º - Integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador. (Redação dada pela Lei nº 1.999, de 1.10.1953) § 2º - Não se incluem nos salários as ajudas de custo, assim como as diárias para viagem que não excedam de 50% (cinqüenta por cento) do salário percebido pelo empregado. (Redação dada pela Lei nº 1.999, de 1.10.1953) § 3º - Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que fôr cobrada pela emprêsa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada a distribuição aos empregados. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967) Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações "in natura" que a empresa, por fôrça do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o

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pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967) § 1º Os valôres atribuídos às prestações "in natura" deverão ser justos e razoáveis, não podendo exceder, em cada caso, os dos percentuais das parcelas componentes do salário-mínimo (arts. 81 e 82). (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967) § 2o Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador: (Redação dada pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) I – vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos empregados e utilizados no local de trabalho, para a prestação do serviço; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) II – educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo os valores relativos a matrícula, mensalidade, anuidade, livros e material didático; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) III – transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro-saúde; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) V – seguros de vida e de acidentes pessoais; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) VI – previdência privada; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) VII – (VETADO) (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) (...) Quando da promulgação da lei 10.243/2001, o I. Autor Octavio

Bueno Magano já se pronunciava23:

O quarto item diz respeito à assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro saúde. Na análise do preceito em foco, cumpre trazer desde logo à tona o conceito de assistência médica, a saber, programa de serviços técnicos outorgados ao indivíduo com o fito de melhorar, conservar ou restabelecer sua saúde física ou mental24. Do conceito acima enunciado, tira-se a ilação de que a assistência médica não possui caráter salarial e sim assistencial. E sobre o assunto a Justiça do Trabalho já se pronunciou de

forma definitiva: “CEE. Serviços Assistenciais. Os serviços assistenciais fornecidos pela empresa (médico, odontológico e laboratorial) não se constituem em salário ‘in natura’. Decorrem de liberalidade da empresa, que objetiva facilitar a assistência médica a seus empregados e dependentes. Trata de prestação de

23http://www.facs.br/revistajuridica/edicao_agosto2001/convidados/LEI%20N%BA%2010.243,%20DE%2019.6.2001.doc 24 Asistencia medica a los trabajadores, Stilon de Piro, M., in Enciclopedia de Medicina, Higiene y Seguridad del Trabajo, Madrid, Instituto Nacional de Prevision en nombre de la Oficina Internacional del Trabajo, 1974, vol. I, p. 201.

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caráter assistencial e não salarial, condicionada a um fato aleatório, qual seja, a necessidade de atendimento médico. Recurso a que se nega provimento”25. “Seguro de vida pago pela empresa não se traduz em salário utilidade com integração na remuneração. Constitui iniciativa louvável da empresa com objetivo preventivo e que nada acrescenta ao rendimento mensal do trabalhador. Em verdade se a empresa não oferece o benefício, dificilmente o empregado dele usufruirá por sua própria iniciativa, já que considerado gasto supérfluo por tradição”26. “O plano de assistência médica e o prêmio do seguro de vida com que a empresa contempla o trabalhador não erigem em salário 'in natura'. Tratam-se de benefícios previdenciários, por estarem ligados a um evento futuro e incerto: a doença ou o falecimento do empregado. Não integram, pois, o salário básico de cálculo dos demais títulos do contrato”27. “DESCONTO NO SALÁRIO. ARTIGO 462 DA CLT. Seguro de vida. Ao especificar os descontos permitidos, o artigo 462 da CLT não exclui outros, sempre que efetivados em benefício do empregado, tais como o seguro de vida, desde que com este concorde o trabalhador, quer expressa, quer tacitamente. A efetivação do desconto durante todo o lapso contratual sem que contra este se insurja o empregado evidencia sua anuência, não se cogitando de devolução das parcelas descontadas quando findo o contrato”28. No mesmo caminhar a Consultoria Jurídica da Previdência

Social já se pronunciou sobre a distinção das parcelas salariais e as assistenciais, num claro exemplo que estas últimas devem ser induzidas pelo Estado:

“Incidência da cobrança de contribuição para Seguridade Social sobre a assistência prestada por serviço médico próprio das empresas, ou por elas conveniadas. Descabimento da inclusão do valor desse atendimento no conceito de salário-de-contribuição em face da precisão do conceito na legislação vigente a partir da Lei nº 8.212, de 24.07.91”29. Cabe destacar o que consta do Parecer:

25 1ª T., mv - RO-4.109/88, julg. em 19.07.89, ementa oficial, in Repertório IOB de Jurisprudência, Trabalhista e Previdenciário, 1ª quinzena d fevereiro/90, nº 3/90, p. 39, ementa nº 2/3401. Vide no mesmo sentido: “Não se caracteriza como salário ‘in natura’, a assistência médica prestada pela empresa. O caráter de tal benefício é de seguro social e não salarial”. (TRT-10ª Reg., RO-914/83, Ac. TP, 1.227/84, 25.6.84, Rel. Juiz Libânio Cardoso, in Revista LTr 49-4/442). 26 TRT-2ª Reg., RO-02910197110, Ac. 3ª T. 02930155390, Rel. Juiz Francisco Antônio de Oliveira, DJSP 15.06.93, p. 142, in Ferrari, Irany e Martins, Melchíades Rodrigues, Julgados Trabalhistas Selecionados, São Paulo, LTr, 1995, vol. III, p. 662, ementa nº 2312. 27 TRT-2ª Reg., proc. 02970294847, 4ª Turma, Ac. 02980326849, Rel. Sérgio Winnik, DOE/TRT-2ª Reg., nº 46 de 30/06/98, p. 55. 28 TRT-15ª Reg., 5ª T., ac. 812147/96, Rel. Eliana F. Toledo, DJSP 24.06.96, p. 53, “in” Jornal Trabalhista, 30.09.96, nº 627, p. 1051. 29 Parecer MPS/CJ/Nº 107, DE 14.9.92, publ. DOU I, de 13.11.92, p. 1570

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5. A saúde é matéria de ordem pública. O art. 196 da Constituição Federal estabelece que a saúde e um direito de todos e dever do estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doenças e de outros agravo,e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 6. O Poder público, portanto, em sua atividade administrativa, deve ser norteado pelo interesse público em estimular toda ordem de mecanismo propícios à realização da saúde. Esta responsabilidade, todavia, cabe não só poder público; também a sociedade incube substancial parcela de participação no financiamento e viabilização deste objetivo. 7. Tendo em vista as diretrizes constantes na matriz constitucional, passamos a analisar se os serviços médicos postos à disposição dos empregados no âmbito da empresa ou mediante convênios, devem ser valorados para integrar o conceito de salário-de-contribuição, sofrendo a incidência da contribuição para a seguridade social. O conceito de salário-de-contribuição da lei nº 8212, de 24/07/91 está posto no art. 28, nos seguintes termos: “Art. 28-Entende-se por salário-de-contribuição: I - para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração efetivamente recebida ou creditada a qualquer título, durante o mês,em uma ou mais empresas, inclusive os ganhos habituais sob a forma de utilidades, ressalvado o disposto no §8º e respeitados os limites dos §§ 3º,4º e 5º deste artigo. 9. De pronto, verifica-se que nem o serviço médico prestado pela própria empresa,nem aquele conveniado, constituem importância efetivamente recebidas ou creditadas em favor dos empregados durante o mês, muito menos configuram ''ganhos habituais sob a forma de utilidades''. 10. Na hipótese do serviço médico oferecido pela própria empresa, por ato de liberalidade e colaboração com poder público em matéria de saúde do trabalhador,somente quando o empregado utiliza esporadicamente o serviço,há um acréscimo eventual em sua remuneração. 11. Ora, tudo quanto recebe o empregado do empregador é salário ou remuneração normal, excluídos os acréscimos eventuais. Para ser integrantes da remuneração, a vantagem /auferida deve ser habitual, em virtude do contrato de trabalho ,seja paga pelo empregador ,seja por terceiros. O eminente jurista Amauri Mascaro Nascimento, a propósito do tema, ensina; ''Nem sempre as utilidades fornecidas pelo empregador ao empregado têm natureza de salário. E preciso distinguir, são salariais as utilidades fornecidas gratuitamente e continuamente. Não são salariais as utilidades recebidas pelo empregado onerosamente, isto é, pelas quais ele paga. Mesmo não onerosas, não são salariais as utilidades eventualmente desfrutadas pelo empregado.’’ (In Iniciação ao Direito do Trabalho’’, LTr, SP, 15ª. Edição, 1990, p.302) 12. Por não constituir um ingresso normal com que conta o trabalhador para subsistência, porquanto só quando eventualmente utilizada por ele há um ganho efetivo, a assistência médica prestada pela própria empresa não se identifica com a remuneração devida, revestindo-se inquestionalmente, de autonomia conceitual. 13. Não sendo remuneração, nem ganho habitual sob a forma de utilidade, não integra o salário-de-contribuição. 14. No caso específico de convênio de assistência médica, em que participam a empresa, seus empregados e a instituição que presta os serviços, há que se considerar a inexistência do fator gratuidade do serviço para o empregado, que, necessariamente, arca com parcela de custeio.

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15. As partes, empresa e empregados, se solidarizam em benefício de ambos, num contrato de natureza civil, onde há adesão expressa e voluntária para o custeio da prestação médica. Não há que se falar em salário indireto, dado o tipo de ajuste, oneroso para o empregado, o que retira a índole salarial do negócio jurídico. 16. A assistência médica conveniada, pois, nos temos retratados, não integra o salário-de-contribuição, por não integrar a remuneração do empregado nem, tampouco, constituir ganho habitual sob a forma de utilidade, pela ausência do fator gratuidade do serviço. 17. Há que se considerar, ainda, a hipótese da empresa custear totalmente os planos de saúde para seus empregados e respectivos dependentes. 18. Neste caso a empresa não mantém plano de saúde especificamente para um empregado, mas para a massa de trabalhadores que lhe presta serviços, não se trata, pois de ‘’remuneração paga ou creditada a qualquer título’’ pela empresa a seu empregado, pois a serviço médico não se traduz em valor pecuniário por ele recebido. 19. Trata-se, na verdade, de prestação assistencial, sendo socialmente injusto para a empresa atribuir-lhe caráter salarial, e economicamente desencorajador de iniciativas similares. 20. As prestações de natureza assistencial são bem delineadas pelo eminente jurista Hugo Gueiros Bernardes in ‘’Direito do Trabalho’’ vol. I, LTr, SP, 1989, p. 240, quando ensina que as prestações de natureza assistencial escapam a retributividade e a comutatividade inerentes ao salário. 21. Em assim sendo, as prestações assistenciais, freqüentes na área de saúde, não constituem remuneração do empregado, não sofrendo valoração para os fins de incidência da contribuição previdenciária. 22. Por outro lado, cumpre considerar que o ato de valorar o atendimento médico, hospitalar ou ambulatorial prestado por serviços próprios das empresas, ou por elas conveniadas, a fim de integrar o conceito de salário-de-contribuição, funcionaria como fator de desestímulo para o empregador melhorar as condições de trabalho do empregado. Não se pode dar um tratamento legal pior ao empregador que não se limita a cumprir os conteúdos mínimos da legislação do trabalho e que favorece o empregado, oferecendo-lhe benefícios além da lei. 22. Em conseqüência das razões ora articuladas, o parecer MTPS/CJ/nº 141/91 deverá ser revogado, para que seja adotada a orientação do presente pronunciamento.E o parecer, s.m.j. À consideração de v. Exa. Brasília, 14/09/92. Maria Wilma de A. S. Resende. Assistente jurídico. À vista do parecer MPS/CJ/Nº 107/92, emitido pela Dra. Maria Wilma de A. S. Resende, revogo o parecer MTPS/CJ/Nº 141/91. Em 19/09/92 Railda Saraiva - Consultora Jurídica.”

Por todo o acima exposto, é preciso que as máquinas de arrecadação entendam, o que ainda não ocorre, que as parcelas ditas assistenciais são formas de extrafiscalidade a incentivar as empresas a cumprir uma função social e, por isso, não podem integrar o conceito de salário para fins tributários.

6. Conclusões.

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Portanto, resta dizer que a responsabilidade social tem sua leitura no direito, especialmente no direito tributário, pelos princípios da capacidade contributiva e pela função social da propriedade, o que significa que a empresa não pode ser misturada ou vista somente sob a ótica do empresário, este deve ser tributado em seus lucros, enquanto a empresa – como fonte geradora de riquezas – também deve ser tributada, mas com a utilização da extrafiscalidade para lhe induzir a um papel social que lhe cabe.

Destarte, repetindo os ditames iniciais, a responsabilidade social

somente pode se concretizar se houver uma pressão social sobre: - o mercado : neste caso o Sistema capitalista passa a avaliar os

produtos e as empresas não somente pelo lucro, mas pela sua “consciência social” (consumidor como cidadão – rankings e tipos especiais de ações lançadas em bolsa). A Sociedade deve exigir que as empresas cumpram mais do que o papel de auferir lucros.

- a empresa : a comunidade que a cerca e seus empregados

devem ter condições mínimas de sobrevivência. - o Estado: deve servir de força-motriz para incentivar a atuação

social. O presente trabalho teve a intenção de abordar este último

aspecto, ou seja, cabe ao Estado não se isolar da empresa, sob pena de perder sua soberania e ser por ela substituído. Por isso, o Direito Tributário pode e deve servir de instrumento para realização ou indução do crescimento econômico e redução das desigualdades sociais. Capacidade contributiva, necessidade de contribuir e função social da propriedade devem ser as diretrizes para um sistema que seja menos regressivo, tribute mais o patrimônio e menos a renda dos assalariados e consumo dos menos abastados. A responsabilidade social não pode ser vista como uma dádiva dos empresários, pois neste caso será cortada quando assim desejarem, mas uma diretriz do Estado a ditar para a sociedade.

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7. Bibliografia 7.1. Livros completos

AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do; ROSAS, Roberto; VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Princípios Constitucionais Fundamentais – estudos em homenagem ao professor Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Lex Editora S.A., 2005. BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, COELHO, Fábio Ulhôa. Manual de direito comercial. 11.ed. São Paulo: Saraiva, 1999. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva. 2ª. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996. DERZI, Misabel in BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de tributar. 7ª ed., atualizada por MISABEL DERZI. Rio de Janeiro. Forense. 1999 DELGAGO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 4ª ed. São Paulo: LTr, 2005 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas. 3ª. ed revista e ampliada. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2006

TORRES, Ricardo Lobo, Os Direitos Humanos e a Tributação. Imunidade e Isonomia, Rio de Janeiro, Renovar, 1999

7.1. Monografias, dissertação e teses:

LOBATO, Valter Souza; COÊLHO, Sacha Calmon Navarro

(orientador). Os tributos destinados ao custeio da seguridade social a busca do equilíbrio de suas fontes. 2004. 394 fls. enc. Dissertação (Mestrado em Direito Tributário) – Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.