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Na virada do século, a UNESCO criou uma ”Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI”, coordenada por Jacques Delors, cujo relatório “Educação, um Tesouro a Descobrir” foi publicado em 1999. A Comissão propôs 4 pilares para a Educação no Século XXI:
Aprender a conhecer Aprender a fazer Aprender a ser Aprender a viver juntos
Aprender a conhecer envolve dominar os instrumentos do conhecimento, e não simplesmente adquirir um conjunto de saberes. Significa autonomia para aprender, com uma atitude crítica e atenta: o aprender a pensar e a tirar conclusões.
Aprender a fazer envolve saber aplicar os conhecimentos adquiridos. Contudo, no mundo moderno, o fazer é cada vez mais imaterial: as atividades rotineiras são executadas por máquinas e computadores. Significa mobilizar as habilidades cognitivas para a capacidade de resolver problemas e atuar de forma competente em situações de incerteza.
Aprender a ser está relacionado ao desenvolvimento pessoal de uma forma mais ampla, envolvendo inteligência, criatividade, sensibilidade, responsabilidade e espiritualidade. Visa à capacidade de autonomia, com discernimento e responsabilidade pessoal.
Aprender a viver juntos tem a ver com o reconhecimento dos outros, com o desenvolvimento da tolerância e do respeito à diversidade. Envolve a capacidade de cooperar, de evitar conflitos ou saber resolvê-los pacificamente.
Na época, já se sabia que o mercado de trabalho havia mudado substancialmente e exigia outras habilidades.
Levy, F., and Murnane, R.J. (2004). The New Division of Labor: How Computers Are Creating the Next Job Market. Princeton, NJ: Princeton University Press.
Tarefas que requerem comunicação complexa (obtenção de informações críticas e sua interpretação) Tarefas que requerem pensamento especializado (identificação e solução de problemas) Tarefas manuais rotineiras (linhas de montagem)
Tarefas cognitivas rotineiras (escrituração, arquivamento)
Por outro lado, o PISA (Programme for International Student Assesment) da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), em 2003, mostrava uma situação pouco cômoda.
Porcentagem de estudantes em cada nível de proficiência na escala de resolução de problemas do PISA 2003
SOURCE: Organization for Economic Cooperation and Development (2005). Problem Solving for Tomorrow’s World: First Measures of Cross-Curricular Competencies from PISA 2003, http: //dx.doi.org/10.1787/9789264006430-en.
O Conselho Nacional de Pesquisas (NRC) dos EUA tem realizado, periodicamente, encontros para discutir os aspectos educacionais das habilidades necessárias no Século XXI
Em 2009, o comitê do NRC definiu como importantes três conjuntos de habilidades básicas:
Habilidades cognitivas: resolver problemas não rotineiros, pensamento crítico e sistêmico. Envolvem processos e estratégias cognitivos, conhecimento (literacia da informação) e criatividade. Habilidade intrapessoais: autodesenvolvimento e autocontrole, abertura intelectual, gerência do tempo, adaptabilidade, funcionamento executivo (flexibilidade, iniciativa e metacognição ou a capacidade de refletir sobre suas ações e fazer os ajustes necessários) Habilidades interpessoais: comunicação complexa, habilidades sociais, trabalho em equipe, sensibilidade cultural e tolerância à diversidade, responsabilidade e capacidade de liderança.
Notar que essas competências sempre foram valiosas para o indivíduo, ou seja, elas não apareceram subitamente ou são importantes apenas nos dias de hoje. No entanto, a Sociedade atual espera que todos os estudantes (ou uma ampla maioria) atinjam um grau de bom desempenho nessas capacidades, que antigamente não eram tão necessárias na educação e no mercado de trabalho
Ao invés de simplesmente lembrar, compreender e aplicar, hoje é preciso saber analisar, avaliar e criar. Além disso é preciso desenvolver o compromisso, a força de vontade e a determinação de atingir os objetivos.
Existe uma considerável superposição entre as habilidades identificadas pelas comissões da UNESCO e do NRC.
Por outro lado, a maior parte dessas habilidades constituem o que a Neuropsicologia classifica como “Funções Executivas”: O conjunto de habilidades e capacidades que nos que permitem executar as ações necessárias para atingir um objetivo. Nelas se incluem a identificação de metas, o planejamento de comportamentos e a sua execução, além do monitoramento do próprio desempenho, com a flexibilização das ações, até que o objetivo seja consumado. Elas devem assegurar, além disso, que as normas sociais sejam respeitadas, num padrão comportamental considerado apropriado para um determinado contexto ou situação.
As funções executivas (FE) são coordenadas por uma região do cérebro conhecida como área pré-frontal.
Essa região é nova, do ponto de vista evolutivo e desenvolve-se tardiamente no ciclo vital.
Funções diferentes distribuem-se por diferentes regiões da área pré-frontal
Região dorsolateral: memória operacional, planejamento, flexibilização comportamental Lesões: perseveração e comportamento estímulo-dependente
Região medial: atenção, monitoramento dos erros, motivação Lesões: apatia, mutismo, dificuldades atencionais
Região orbitofrontal: avaliação de riscos, controle social. Lesões: desinibição e perda do “insight”
As FE se desenvolvem mais rapidamente nos anos pré-escolares, paralelamente ao crescimento dos circuitos neuronais do córtex pré-frontal, que as suportam, mas continuam a se aperfeiçoar até a idade adulta (com outro período crítico na adolescência).
Performance on the NIH Toolbox DCCS Test across age groups
Source: Zelazo, P. D. and Carlson, S. M. (2012), Hot and Cool Executive Function in Childhood and Adolescence: Development and Plasticity. Child Development
Perspectives. doi: 10.1111/j.1750-8606.2012.00246.x
Nas experiências de laboratório, costumam ser estudadas três funções básicas de controle, a memória operacional, a inibição de respostas e a flexibilidade na execução de tarefas.
A designação “Funções Executivas” é um nome genérico, que abrange várias habilidades distintas.
Inserir vídeo 1
Source: Moffitt T E et al. PNAS 2011;108:2693-2698
O gradiente de autocontrole tem consequências que persistem ao longo da vida.
A região pré-frontal é um centro coordenador dos processos cognitivos e emocionais
Um aspecto importante da regulação do comportamento está relacionado à obtenção de gratificações
No processo de tomada de decisão são levadas em conta as necessidades e as oportunidades, os custos e os benefícios
No desenvolvimento das habilidades intrapessoais, Howard Gardner sugere que observemos três parâmetros:
As capacidades (skill) As metas (“hill”) A vontade (will)
Haveria, ainda, dois estágios: o do aprendiz e o do mestre. Só atingem o estágio de mestre aqueles que sabem definir suas metas numa agenda pessoal própria: têm iniciativa, criatividade e perseverança, tolerância e maturidade. Os educadores têm por função ajudar o aprendiz a atingir o estágio de mestre.
S. Moran & H. Gardner, 2007 - “Hill, Skill, and Will” Executive Function from a Multiple –Inteligences Perspective. In: L. Meltzer, Executive Function in Education: From Theory to Practice. Guilford Press.
As habilidades interpessoais começam a desenvolver-se muito cedo, integradas por um conjunto de estruturas nervosas que são conhecidas hoje pela designação de “cérebro social”.
Uma habilidade social básica é a de identificação de faces humanas e sua expressão emocional
Nuances nas expressões emocionais podem não ser percebidas de forma adequada pelos adolescentes e isso pode estar relacionado com dificuldades emocionais, como conflitos com colegas, autoridades e com os pais.
S-J Blakemore, 2008 Nature Reviews Neuroscience 9 (267-277)
Source: L.A Thomas et al. 2007 Developmental Science 10 (547-558)
Adolescentes mostram intensa ativação em áreas cerebrais relacionadas com a detecção das emoções.
Uma habilidade muito importante na interação social é a atribuição de estados mentais, capacidade conhecida como “teoria da mente”, ou mentalização. A compreensão de intenções já se faz aos 18 meses (pode-se brincar de “faz de conta”). Aos cinco anos (ou até mais cedo) a criança já imagina que uma pessoa irá procurar um objeto no lugar em que ela a pôs, apesar de ele ter sido deslocado– sem o seu conhecimento – para outro lugar.
Crianças com autismo não conseguem descrever as “intenções” das figuras em A.
S-J Blakemore, 2008 Nature Reviews Neuroscience 9 (267-277)
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Nature Reviews | Neuroscience
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Development of recognition of conspecifics during
adolescence. Some of the earliest empirical studies on cog-
nitive development during adolescence investigated the
effect of puberty on face recognition in girls and produced
a surprising result. Performance on face-recognition
tasks improved steadily during the first decade of life, but
this was followed by a decline at approximately age 12
(REF. 50). Puberty (rather than age per se) was implicated
in this decline, as a later study showed that mid-pubertal
girls performed worse than prepubertal or postpubertal girls
matched for age51. A more recent study also found evi-
dence of a pubertal ‘dip’ on a match-to-sample task in
which participants ranging from 10 to 17 years of age had
to match emotional faces to emotion words52. A 10–20%
increase in reaction time on the match-to-sample task
was found in children of pubertal age (10–11-year-old
girls and 11–12-year-old boys) compared with younger
children. Performance then improved, regaining its
earlier level at approximately 16–17 years of age. Whether
this dip can be replicated, whether it is specific to face
processing and what causes it are questions that remain
to be answered.
A number of functional neuroimaging studies have
investigated the neural correlates of facial-expression
recognition from childhood to adulthood. An fMRI
study reported increased activity in a number of lateral
and superior prefrontal regions (bilaterally for girls, right
sided for boys) in response to fearful faces in individuals
between the ages of 8 and 15 years (REF. 53). Thus, frontal
activity increased between childhood and adolescence
in this study. In a different study, adolescents (aged 9–17
years) showed activation of the ACC and left OFC during
passive viewing of fearful faces (relative to neutral faces),
whereas adults (aged 25–36) did not54. When attention was
directed to a non-emotional aspect of fearful faces, activ-
ity in the ACC was higher in adolescents than in adults
(FIG. 3). Therefore, in this study, frontal activity tended to
decrease between adolescence and adulthood. In addition
the findings indicate that, whereas adults modulate brain
activity based on attention demands, adolescents modu-
late activity based on the emotional nature of a stimulus.
This suggests that the neural basis of the ability to pay
attention to a non-salient stimulus (in this case, the nose
of a fearful face) in the presence of emotionally evocative,
attention-grabbing stimuli (the eyes of a fearful face) is
still undergoing maturation between adolescence and
adulthood.
To summarize, there is some indication that, not-
withstanding potential sex differences (BOX 2), activity in
parts of the frontal cortex during face-processing tasks
increases between childhood and adolescence and then
decreases between adolescence and adulthood.
So far, few studies have investigated the development
of the neural substrates of biological-motion processing.
However, a recent study indicated that activity in the STS,
which is associated with biological-motion perception,
increased with age in children aged 7–10 years (REF. 55).
Development of mentalizing ability during adolescence.
Although there is no strong evidence that performance
in mentalizing tasks changes during adolescence, fMRI
studies of mental-state attribution have shown that
frontal-cortex activity decreases between adolescence
and adulthood. A recent fMRI study investigated the
development of our ability to perceive communica-
tive intent, using a task in which participants had to
decide whether a speaker was being sincere or ironic56.
Understanding irony requires the ability to separate the
literal meaning of a comment from its intended mean-
ing. In children/young adolescents (aged 9–14 years), the
mPFC and left inferior frontal gyrus were more active
during this task than they were in adults (aged 23–33).
The authors interpreted the increased mPFC activity in
young adolescents as a reflection of the need to resolve
the discrepancy between the literal and the intended
meaning of an ironic remark. The region of the mPFC
that was more active in young adolescents than in adults
(Montreal Neurological Institute (MNI) coordinates
–8, 58, 20), as well as the region in which activity was sig-
nificantly negatively correlated with age over the whole
group of participants (MNI coordinates –2, 44, 32), lies
in the dorsal mPFC, an area that is consistently activated
by mentalizing tasks in adults32,33 (FIG. 2; green dots).
A similar region of the dorsal mPFC was found to
be more active in adolescents than in adults in an fMRI
study that involved thinking about one’s own inten-
tions57. Adolescents (aged 12–18 years) and adults (aged
Figure 2 | Activation of the medial prefrontal cortex
(mPFC) during mentalizing tasks decreases during
adolescence. The yellow shaded area indicates a section
of the dorsal mPFC that is activated in studies of
mentalizing: Montreal Neurological Institute ‘y’
coordinates range from 30 to 60; ‘z’ coordinates range from
0 to 40 (REF. 32). The coloured dots indicate voxels in which
altered activity is observed between late childhood and
adulthood during participation in social-cognition tasks.
The red dot represents an area of activation that is higher
in adolescents than in adults during the animations task
described in BOX 1 (REF. 59). The green dots represent areas
of activation that are higher in adolescents than in adults
during an irony-comprehension task56. The blue dots
represent areas of activation that are higher in adolescents
than in adults during intention understanding57. The yellow
dots represent areas of activation that are higher in
children than in adults in a self–other evaluation task58. The
blue lines indicate approximate borders between
Brodmann areas, which are numbered on the diagram.
Figure modified, with permission, from REF. 32 (2006)
Macmillan Publishers Ltd.
REVIEWS
270 | APRI L 2008 | VOLUM E 9 www.nature.com/reviews/neuro
© 2008 Nature Publishing Group
S-J Blakemore, 2008 Nature Reviews Neuroscience 9 (267-277)
As atividades de mentalização ativam o córtex pré-frontal. Nos adolescentes isso ocorre de uma forma que é diferente da que ocorre em adultos.
Inserir vídeo 2
A capacidade de fazer inferência sobre os estados mentais tem sido estudada com o uso de jogos, como o “Ultimato”.
Na adolescência, observa-se um aumento da capacidade estratégica para obter a gratificação. Nesta fase da vida, o aumento da complexidade das relações sociais impõe uma demanda sobre os circuitos e o aperfeiçoamento continua.
No Ultimato, a generosidade passa cada vez mais a ser dosada pela capacidade do parceiro para retaliar. Na infância (6-9 anos), a tendência dominante é seguir regras de reciprocidade.
Estudos de neuroimagem mostram mudanças profundas no cérebro, que ocorrem na época da adolescência.
Nesta fase da vida o próprio córtex se torna menor, o que se deve, provavelmente, à eliminação de sinapses. O desbastamento sináptico pode tornar os circuitos mais eficientes, eliminando conexões pouco funcionais.
Na adolescência são nítidas mudanças no córtex pré-frontal.
S-J Blakemore, 2008 Nature Reviews Neuroscience 9 (267-277)
Será que é possível intervir no desenvolvimento das funções executivas?
Uma das características do nosso sistema nervoso é a sua plasticidade, que é o substrato da aprendizagem.
E. A. Maguire et al. PNAS 2000 vol. 97 no. 8 (4398–4403)
O hipocampo de taxistas londrinos altera o seu tamanho, em função do tempo de trabalho naquela atividade.
As técnicas de neuroimagem mostram que o Cérebro se modifica visivelmente pela aprendizagem, pela interação com o ambiente.
Um artigo recente na revista SCIENCE lista algumas intervenções educacionais visando as funções executivas em crianças
Jogos computadorizados (COGMED)
Abordagens curriculares (Montessori)
Meditação, Yoga, Artes Marciais
ALGUNS EXEMPLOS:
Simulação de problemas e de situações Simulação de ambientes de trabalho Possibilidade de trabalho interativo com a
comunidade global Acesso a dados originais Acesso a instrumentos de pesquisa
As modernas tecnologias podem ser um poderoso instrumento para atingir os objetivos educacionais de uma aprendizagem profunda:
De uma forma geral, o Currículo pode e deve ser planejado e desenvolvido de forma a gerar as capacidades executivas necessárias ao mundo contemporâneo:
o estabelecer metas e ser capaz de persegui-las
o identificar as questões relevantes, planejar as atividades e decompô-las em
sub-tarefas factíveis
o buscar a informação, utilizando os recursos existentes
o identificar erros, discrepâncias e a falta de lógica
o organizar criticamente a informação, fazendo avaliações e generalizações
o identificar e corrigir os próprios lapsos nas diversas disciplinas acadêmicas
o saber expor, debater e discutir ideias, examinar abordagens alternativas e tirar
conclusões
o desenvolver flexibilidade e criatividade, lidar de forma construtiva com
ambiguidades, incertezas, diferenças e novidades
o desenvolver a tolerância e respeitar os limites éticos