fontes franciscanas - frei josé carlos pedroso.pdf

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  • O QUE SO FONTES?

    Todos sabemos que a melhor gua a que se pode beber na fonte, sem ter passado por reservatrios, encanamentos, tratamentos.

    Para qualquer estudo de valor histrico, tambm fundamental ir buscar as informaes nas suas fontes. Falando em Fontes Franciscanas, queremos saber qual a melhor forma de ter informaes genuinas sobre So Francisco de Assis e o movimento franciscano.

    Foi s no fim do sculo XIX que se comeou a trabalhar o material franciscano a partir de fontes garantidas. Antes disso, era comum usar uma metodologia popular, que s visava a divulgao.

    I - Fontes

    Fontes histricas so documentos de qualquer tipo em que possamos descobrir de maneira direta os fatos passados pelos quais estamos interessados.

    s vezes tambm so importantes documentos indiretos, que so antigos e se basearam nas fontes. Nesse caso, no falamos em fontes mas em subsdios. Mas os subsdios adquirem valor de fontes se os documentos mais antigos em que foram baseados tiverem sido perdidos.

    II - Tipos de Fontes

    H dois tipos principais de Fontes: os vestgios e os testemunhos. Os vestgios foram deixados inconscientemente; os testemunhos foram deixados por pessoas que quiseram passar alguma coisa para a histria.

    1. Vestgios so, por exemplo, objetos (como ossos, utenslios, armas...) ou tradies (como instituies, usos, costumes...) ou mesmo escritos (como acordos polticos, anotaes pessoais ou comerciais...).

    2. Testemunhos podem ser mudos, orais ou escritos. Em geral so mais claros e reveladores mas podem no ser to originais, porque ns sempre julgamos e selecionamos o que comunicamos.

    Testemunhos mudos so, por exemplo, os monumentos, os ritos que se instituiram para preservar a histria. Testemunhos orais so, por exemplo, mitos, provrbios, cnticos...

    Os testemunhos escritos costumam ser os mais importantes e so constitudos geralmente por narrativas, documentrios ou expresses de atividades artsticas.

  • III - As fontes franciscanas

    Neste caderno, vamos falar s de documentos escritos, dividindo-os em trs grandes sees: os Escritos de So Francisco, as Biografias e as Crnicas:

    A. Escritos de So Francisco: Vamos dar a lista completa e a apresentao a partir da pgina 5.

    B. Biografias: Vamos dar a lista completa e apresentao das mais importantes a partir da pgina 17.

    C. Crnicas: Damos a lista e a apresentao das mais importantes a partir da pgina 59.

    Primeira Parte

    OS ESCRITOS DE SO FRANCISCO

    Apresentao geral

    Introduo

    Os Escritos de So Francisco no devem ser entendidos como um programa apresentado por ele, como definies do que ele pensava e queria que os outros pensassem. No temos que entend-lo abstratamente, porque ele no um intelectual. O que escreveu o transbordamento do que ele sentia diante de Deus e das pessoas. A Deus ele celebra, aos homens, ele exorta.

    Nesses escritos, ns auscultamos, apalpamos, entramos em contato com a sua experincia viva, com a sua personalidade, com as suas intenes. assim que encontramos nele uma proposta de vida.

    Mas claro que no poderemos ficar s com os Escritos. Todas as Fontes, mesmo exigindo uma leitura atenta e crtica, so necessrias para entendlo no seu tempo, na sua terra; um tempo e uma terra que ele viveu como intensamente seus. E todos os outros estudos que nos ajudem a conhecer o homem medieval tambm so fundamentais.

    Nesta seo, queremos oferecer uma viso breve mas de conjunto sobre todos os Escritos. Cada um deles tem que ser lido, meditado, rezado, assimilado. Mas cada um deles tornase muito reduzido se no for bebido e vivido no conjunto de todos os outros.

    Quais so?

    Os Escritos de So Francisco que possumos hoje so pouco mais de trinta. Podemos dizer que so trinta e oito. H diversas maneiras de agrup-los e de cont-los. Propomos a seguinte:

  • A. Exortaes (so 3):

    1. Admoestaes

    2. Testamento

    3. Cntico "Ouvi, pobrezinhas!"

    B. Textos de proposta de vida fraterna ou legislativos (so 6):

    4. Regra no bulada

    5. Regra bulada

    6. Regra para os Eremitrios

    7. Forma de Vida para Santa Clara

    8. ltima Vontade para Santa Clara

    9. Fragmentos de outra Regra no bulada

    C. Cartas (so 11):

    10. Primeira Carta aos Fiis

    11. Segunda Carta aos Fiis

    12. Primeira Carta aos Custdios

    13. Segunda Carta aos Custdios

    14. Primeira Carta aos Clrigos

    15. Segunda Carta aos Clrigos

    16. Carta a toda a Ordem

    17. Carta a um Ministro

    18. Carta aos governadores dos povos

    19. Carta a Frei Leo

    20. Carta a Santo Antnio

    D. Oraes (so 10):

    21. Orao diante do crucifixo

    22. Exortao ao Louvor de Deus

    23. Louvores para todas as Horas

  • 24. Ofcio da Paixo

    25. Exposio sobre o Pai Nosso

    26. Bno a Frei Leo

    27. Louvores a Deus Altssimo

    28. Saudao B. Virgem Maria

    29. Saudao s Virtudes

    30. Cntico de Frei Sol

    E. Fragmentos em outros livros

    31. Bno a Frei Bernardo

    32. Bno a Santa Clara

    33. Testamento de Sena

    34. Ditado da V. e Perfeita Alegria

    35. Carta a Frei Jacoba

    36. Carta aos Bolonhenses

    37. Carta aos Frades Franceses

    38. Carta a Santa Clara sobre o jejum

    Mais adiante, vamos fazer uma apresentao de cada um desses escritos. Ficar explicado, ento, porque h outras maneiras de agrupar e contar os Escritos de So Francisco.

    No autnticos ou inseguros

    A ltima edio dos Escritos, feita por Caetano Esser em 1976, apresenta como duvidosos ou seguramente no autnticos 24 textos antes j atribudos a So Francisco. Pertencem a este grupo: as cartas a Frei Agnelo de Pisa, a Frei Bernardo, a Frei Elias, condessa Joana, ao eremitrio de Porto Vegla; as oraes "Absorbeat" (que as Fonti Francescane italianas consideram autntica), "Sancta dei Genitrix Maria", a "Orao simples pela paz" (que surgiu na Frana em 1914) e outras oraes, mas principalmente a "Regra dos irmos e irms da penitncia", que anteriormente tinha sido inclucluda pelo prprio Esser no seu livrinho dos Opsculos.

  • Histria dos Escritos

    Como que os Escritos de So Francisco chegaram at ns? Alguns tm uma documentao muito antiga, outros constam de colees medievais. E outros foram descobertos h bem pouco tempo.

    Vamos apresent-los em trs grupos: 1) os testemunhos mais antigos; 2) as colees medievais; 3) Outras descobertas.

    1. Os testemunhos mais antigos

    a) Autgrafos

    Trs dos Escritos de So Francisco chegaram at ns como saram de suas mos. Dois, a Bno a Frei Leo e os Louvores a Deus Altssimo, esto nos dois lados de um mesmo pergaminho, conservado e exposto na Baslica de So Francisco em Assis. Um terceiro, a Carta a Frei Leo, est exposto na catedral de Espoleto. So pergaminhos pequenos, que Frei Leo guardou consigo at o fim da vida.

    b) O cdice B. 24 da Biblioteca Vallicelliana em Roma

    Pertencia Abadia beneditina do Subiaco e contm um missal em que se transcreveu (entre os anos de 1219 e 1238) a Primeira Carta aos Clrigos. o cdice mais antigo com um escrito de So Francisco. Contm o sinal "tau com a cabea", como a bno a Frei Leo.

    c) Um sermo de 1231

    Pregando aos universitrios de Paris, no dia 13 de julho de 1231, um dominicano citou a Admoestao 6, atribuindo-a explicitamente a So Francisco.

    2. As colees medievais

    H quatro colees antigas, j estudadas por Paul Sabatier (1858-1928) e Sofrnio Clasen OFM (+1975):

    a) O cdice 338 de Assis

    Pertencia ao Sacro Convento de Assis e foi seqestrado em 1810, passando a pertencer ao governo italiano, que, desde 1981, permitiu que voltasse a ser guardado no convento.

    Foi escrito por frades do Sacro Convento antes de 1279, no tempo do Ministro geral Alberto de Pisa ou no de Haimo de Faversham.

    b) A Compilao de Avinho

  • Tambm conhecida como coleo Fac secundum exemplar, pelo seu prlogo. o trabalho de um frade que, por volta do ano 1340, reuniu informaes sobre So Francisco que no constavam na Legenda Maior.

    c) O grupo da Porcincula

    So oito manuscritos feitos por copistas profissionais, provenientes de conventos da estrita observncia na Itlia central. So do sec. XIV, um deles certamente de antes de 1370.

    d) O grupo do norte ou da provncia de Colnia

    So 11 manuscritos, tambm feitos por copistas profissionais, mas de fora de Ordem: cnegos regulares ou crucferos da Rennia ou dos pases baixos. So do fim do sec. XIV ou do comeo do XV.

    Ao todo, esses quatro grupos somam uns trinta cdices, que constituem a base de quase todos os outros manuscritos conhecidos.

    Todas essas colees apresentam as Admoestaes, a Segunda Carta aos Fiis, a

    Carta a toda a Ordem e a Saudao s Virtudes. As trs primeiras do tambm a Regra Bulada e o Testamento.

    Assis, Avinho e Norte do tambm a Regra para os Eremitrios e os Louvores para dizer em todas as Horas. Avinho e Porcincula trazem a Bno a Frei Leo e a Saudao a B.V.Maria. Assis e Avinho do o Ofcio da Paixo e o Canto de Frei Sol. S Avinho traz a Orao diante do Crucifixo e a Carta a Santo Antnio. S Porcincula tem a Carta a um Ministro e a Regra no Bulada. Avinho d um pedacinho do cap. 16 da Regra no Bulada.

    3) Outras descobertas

    H tambm algumas colees conservadas em cdices do sec. XIV e XV. A mais importante est guardada no Antonianum de Roma. Em Oxford guardam o cdice 525, escrito entre 1384 e 1385. Na biblioteca Guarnaci, de Volterra est o cdice 225. Na biblioteca Vallicelliana de Roma est o cdice B131. Numerosos manuscritos do s um ou dois Escritos, em geral a Regra Bulada e o Testamento. Todos esses pergaminhos foram descobertos nos ltimos anos do sec. XIX ou no sculo XX.

    Ouvi Pobrezinhas s foi encontrado em 1976.

    Edies impressas

    Nos tempos modernos, as edies dos Escritos de So Francisco esto ligadas ao nome de alguns estudiosos que as publicaram. Vamos apresentar: 1) Lucas Wadding, 2) Paulo Sabatier, 3) Lemmens e Boehmer; 4) Caetano Esser

  • 1. Lucas Wadding

    Desde a inveno da imprensa, publicaramse Escritos de So Francisco.

    Mas no eram colees sistemticas nem estudos crticos.

    A primeira edio organizada foi feita em 1623 por Lucas Wadding, o frade irlands que publicou os Annales Minorum. Foi ele quem usou pela primeira vez a palavra Opsculos, depois amplamente adotada. Opsculos quer dizer "obrinhas", por isso ns preferimos falar sempre em Escritos de So Francisco.

    O livro de Wadding tinha 710 pginas de tamanho gigante. Ele recolheu junto com os escritos propriamente ditos tambm discursos, alocues, exortaes, oraes. Era uma edio preciosa mas confusa. Em quase trs sculos, teve muitas tradues e muitos resumos, at que os editores modernos se dedicaram a estudar o que era mesmo autntico e o que era apcrifo.

    Em 1748, Frei Manuel de So Boaventura publicou em Portugal uma coleo chamada Polyanthea seu Florilegium Seraphicum, em que incluiu o texto de Wadding.

    A primeira traduo de Escritos de So Francisco deve ser uma francesa de 1632. As italianas comearam a aparecer no fim do sec. XVIII. No sec. XIX, multiplicaram-se em quase todas as lnguas ocidentais.

    2. Paulo Sabatier

    No final do sculo XIX, quando o mundo ocidental estava mergulhado no positivismo e no laicismo, Paulo Sabatier, um pastor protestante francs, discpulo de Renan, fez surgir uma nova primavera ao publicar uma Vida de So Francisco, em 1893. Ele se entregara a estudos cientficos dos pergaminhos que falavam de So Francisco e revolucionou as buscas franciscanas, j ento bastante insatisfeitas com o trabalho de Wadding, por incluir em p de igualdade obras legtimas e tantos outros escritos inseguros ou certamente esprios.

    As sucessivas publicaes de Sabatier, sempre amplamente acolhidas ou discutidas, animaram outros estudiosos a sair em campo para rever os Escritos de So Francisco e suas Fontes histricas. A Questo Franciscana movimentou muita gente em toda a Europa.

    Foi assim que nasceram as primeiras edies crticas dos Escritos, amplamente esperadas. Mas isso s foi acontecer no comeo do sculo XX.

    3. Lemmens e Boehmer (1904)

    Em menos de quatro meses, em 1904, foram publicadas duas edies crticas: a de Lemmens e a de Boehmer.

  • O franciscano Leonardo Lemmens publicou o seu Opuscula sancti patris Francisci Assisiensis sec. codices mss, emendata et denuo edita a PP. Collegii S. Bonaventurae ad Claras Aquas, em Quaracchi, perto de Florena. Trabalhou em cima do cdice 338 de Assis comparando-o com outros manuscritos, em nmero bastante reduzido, todos pertencentes ao grupo da Porcincula. Como se limitou aos escritos em latim, nem incluiu o Cntico de Frei Sol, cujo original era em italiano e estava no cdice 338.

    Heinrich Boehmer era um leigo, tido como um dos mais qualificados estudiosos da Universidade de Tubingen. A obra saiu dentro das Analekten zur Geschichte des Franciscus von Assisi. Tinha 146 pginas, sem contar as 72 de introduo. Apresenta a histria dos Escritos, a edio de Wadding e distingue os diversos escritos do Santo. Usou principalmente os manuscritos da coleo de Avinho, 60 cdices. Para ele, a Regra da Ordem Terceira j no era documento autntico.

    Depois dessas duas edies crticas, o nmero de escritos de So Francisco ficou bastante reduzido, mas seguro. interessante que as duas obras foram feitas independentemente mas coincidiram em quase tudo. E preciso reconhecer que a colaborao de Sabatier, com suas pesquisas e publicaes, foi muito grande.

    4. Caetano Esser OFM.

    A edio crtica (1976-1989)

    Nos primeiros decnios deste sculo, os pesquisadores encontravam praticamente um manuscrito franciscano por ms: ou das fontes histricas ou dos Escritos. Estavam empenhados em resolver a Questo Franciscana. O resultado foi um conhecimento cada vez melhor dos Escritos.

    Quem mais se destacou no estudo dos Escritos e das origens franciscanas foi Caetano Esser OFM (1913 - 1978), da Provncia de Colnia. Fez uma tese de doutorado sobre o Testamento. Para isso, comparou um por um todos os pergaminhos que traziam o Testamento. Descobriu assim a dependncia entre os diversos cdices e estabeleceu as bases para uma edio crtica. Continuou a estudar todos os Escritos de So Francisco.

    Em 1968, o Conselho Plenrio da OFM encarregou uma comisso de preparar uma edio crtica. Ela publicou seus trabalhos em 1972: reuniu 196 cdices que continham os Escritos, sem contar mais 56 que s tinham a Regra no Bulada e o Testamento. E Esser continuou seus estudos.

    Em 1976, como em 1904, saram duas edies crticas, mas, desta vez, as duas feitas por franciscanos. Uma foi a de Esser, outra de Frei Joo Boccali, OFM, que publicou uma concordncia dos Escritos de So Francisco e de Santa Clara.

    A obra de Esser foi editada em alemo, com uma tiragem bem reduzida. Em 1978, saiu uma edio menor, em latim, reduzindo o aparato crtico ao mnimo,

  • para ser usada pelos alunos. Serviu de base para numerosas tradues nas lnguas modernas.

    Para ter uma idia de como se faz uma edio crtica

    O fundamental estudar todos os pergaminhos antigos para chegar a estabelecer um texto seguro, isto , o mais prximo possvel do que foi escrito no tempo de So Francisco.

    A gente poderia dizer que "quanto mais velho o pergaminho, mais prximo do texto verdadeiro". Mas esse princpio, embora vlido, o que faz com que o cdice 338 de Assis seja muito respeitado, no sempre garantido. Um documento mais recente pode ter copiado mais fielmente um texto antigo que uma cpia intermediria. Por isso, s para se ter idia, vejamos algumas regras que foram estabelecidas:

    1. Quando um texto, comparado com outro, mostra que foram feitas correes para que o latim ficasse mais certo ou se livrasse de expresses italianas, a gente confia mais no texto sem correes.

    2. Quando um texto foi corrigido ficando mais parecido com uma frmula quase decorada, por exemplo, pela leitura constante da Regra e do Testamento, prefervel a forma diferente.

    3. A Ordem mudou bastante. s vezes, os copistas no entendiam mais algumas coisas sobre uma vida fraterna ou costumes antigos e corrigiam de acordo com os costumes de seu tempo. Um bom conhecimento da histria pode ajudar a restabelecer o texto corrigido, encontrado em algumas cpias.

    4. s vezes as correes foram feitas porque a linguagem teolgica de Francisco e seus companheiros anterior Escolstica. Ento mais antigo o texto menos correto, ou com linguagem certamente mais antiga.

    5. So Francisco usava uma prosa despojada, normalmente sem belezas de estilo. Entre um pergaminho que tem um texto mais bonito e outro com linguagem mais rude, preciso ficar com o menos bonito.

    A edio de Esser

    Esser apresentou os Escritos de So Francisco em ordem alfabtica. Mas claro que a ordem alfabtica dos ttulos em latim torna-se completamente diferente nas outras lnguas. Como tambm no d para usar a ordem cronolgica, porque no se sabe exatamente a data em que foi redigido cada escrito, h diversas tentativas de distribuir os Escritos por grupos, como ns fizemos (exortaes, legislativos, cartas...) mas mesmo isso no fcil.

    Na edio de Esser h uma seo de "Opsculos ditados". Trata-se de escritos cuja redao no conhecida atravs de manuscritos que os apresentem

  • como tais. Esto s nas fontes biogrficas, como notcia: o autor diz que So Francisco ditou algum tema e coloca o assunto, sem pretender dizer que o texto era exatamente aquele: garante-se que o assunto autntico, no o texto com todas as suas palavras. O problema que, nessa base, poderiam ser colecionados muitos outros ditos e palavras de So Francisco. Preferimos chamlos de "Fragmentos encontrados em outros livros".

    Mas preciso saber que a maior parte dos Escritos foi mesmo ditada. So Francisco sabia mal o latim e chamava frades que soubessem escrever. Mas depois ele revia, corrigia e, por isso, textos como o Testamento ou o Cntico de Frei Sol, certamente ditados, podem ser aceitos como escritos por ele. De maneira ampla, o importante saber que os Escritos que apresentamos so mesmo de So Francisco, ainda que vrios possam ter uma colaborao de alguns de seus companheiros. Em geral, cada palavra foi aceita por ele, que era cuidadoso nessas questes.

    Em 1989, Frei Engelbert Grau OFM fez uma segunda edio da obra de Esser (que tinha morrido em 1978). As novidades so um ndice bibliogrfico, a apresentao do Ouvi pobrezinhas (que s foi encontrado em 1976) e uma nova maneira de apresentar a Primeira Carta aos Fiis.

    Uma nova edio

    Em 1995 as "Edizioni Porziuncola", de Assis, apresentaram uma preciosa contribuiopara os estudiosos. So FONTES FRANCISCANI, isto as Fontes Franciscanas em latim. Um s volume, com 2.581 pginas em papel bblia traz todas as Fontes mais importantes, com preciosas introdues atualizadas. Esto includos at os Actus Beati Francisci et sociorum eius e tambm os Escritos, a Legenda e o Processo de Santa Clara. Est prometido um novo volume com as Crnicas e os outros Documentos que ficaram faltando.

    Os que podem ler os textos na lngua original e na verso crtica no precisam mais estar juntando livros, s vezes raros, nas bibliotecas. Neste caderno, essa nova edio foi imensamente til

    1. Admoestaes - Trata-se de uma coleo de 28 textos curtos (s a primeira um pouco maior) que tem ampla presena nos manuscritos medievais. Uma das Adm foi o primeiro texto de Francisco citado fora da Ordem (1231) por um frade dominicano. Lembra-se que Francisco costumava fazer alocues a todos os frades nos captulos gerais. Algumas destas admoestaes podem provir desses captulos, mas no todas. Do n 1 ao 13 os temas so variados; do 14 ao 28 formam o que se chama de "bemaventuranas franciscanas". Provavelmente so textos que s foram falados por So Francisco e que foram preservados porque algum tomou nota. at possvel que tenha sido algum de fora da Ordem (pensa-se em um cisterciense secretrio do Card. Hugolino) porque usa expresses como prelado, servo de Deus, etc. que no eram comuns no meio franciscano.

    As Admoestaes so um bom resumo da proposta espiritual de So Francisco.

  • 2. Testamento - Depois da Regra Bulada, o Testamento o documento melhor e mais amplamente documentado de So Francisco. Ningum duvida de sua autenticidade. O prprio ttulo Testamento procede do texto do Santo. Sabe-se que So Francisco o ditou em seus ltimos dias, depois de ter discutido vrios pontos com os frades. Ele queria que fosse lido sempre depois da Regra, e isso sempre foi feito. Mas, desde o incio, houve discusses a respeito do valor obrigatrio desse documento. J Gregrio IX declarou, em 1230, que o Testamento no era obrigatrio. Mas no h dvida de que ele expressa de maneira muito candente o pensamento do Santo sobre a sua prpria vida e a que Deus lhe havia inspirado para os Frades Menores.

    3. "Ouv, Pobrezinhas" - Este documento foi encontrado em 1976, logo depois que saiu o livro de Esser, pelo Frei Joo Boccali, que seguiu as indicaes de duas clarissas estudiosas e o localizou no mosteiro das clarissas de So Fidncio em Novaglie. Boccali deulhe o nome de "Palavras de Exortao". Dois anos depois, publicou um estudo crtico, ao qual se seguiram outros. J se tinha conhecimento desse cntico pelo Espelho da Perfeio (90) e mais ainda pela Legenda Perusina (45). So Francisco o comps para Santa Clara e suas Irms "com canto" logo depois de compor o Cntico de Frei Sol.

    4. Regra no Bulada - s vezes tambm chamada de Primeira Regra, deixando-se o nome de Segunda Regra para o que estamos denominando Regra Bulada. Na verdade, no foi a primeira. Alguns chamam de Proto-regra ou Regra Primitiva a que foi aprovada por Inocncio III em 1210. A Regra no bulada a verso final que resultou em 1221, depois que os captulos gerais foram acrescentando modificaes Regra Primitiva, para se adequar vida de uma fraternidade que no parava de crescer. o maior dos escritos de So Francisco. Ele certamente o autor, mas teve ampla colaborao de todos os frades reunidos nos captulos gerais. Tratase de um documento vivo, ardoroso, cheio de oraes e de citaes bblicas. imprescindvel para se conhecer o pensamento de Francisco e de seus primeiros companheiros sobre a Ordem que estava comeando.

    5. Regra bulada - Damos-lhe esse nome porque foi aprovada pela bula "Solet annuere" de Honrio III (1223). Nunca houve dvidas quanto autenticidade nem quanto ao texto desta Regra. So numerosssimos os manuscritos medievais que a trazem, mas nem precisamos deles: temos o pergaminho original da bula, que inclui a Regra, e est guardado em Assis (com muitas fotocpias modernas espalhadas por nossos conventos). Nos arquivos do Vaticano tambm ficou uma cpia, com pequenas diferenas devidas a falhas dos amanuenses. a Forma de Vida que vale deste 1223 para todos os Frades Menores e, por isso, amplamente conhecida por todos os franciscanos, que a sabem de cor.

    6. Regra para os Eremitrios - J consta no cdice 338 de Assis e est bem representada em muitos cdices. No tinha ttulo. Esse foi dado de acordo com o contedo. Deve ter sido escrita entre os anos de 1217 e 1220. Mais tarde, como a Ordem deixou de ter eremitrios do tipo considerado neste documento (por eremitrios entendiam pequenos conventinhos) os copistas tentaram fazer correes para o que no estavam entendendo. Pode ser considerado um

  • complemento grande Regra. um magnfico documento sobre a vida fraterna e a vida de orao.

    7. Forma de Vida para Santa Clara - S temos este documento porque Santa Clara o copiou no captulo VI de sua Regra. Tambm fez uma referncia a ele no seu Testamento. Foi dado por Francisco logo no comeo da fundao das Irms Pobres, provavelmente em 1212 ou pouco depois. muito curto, mas pode ser realmente o miolo da proposta de Francisco: as Irms deviam viver o Santo Evangelho integrando-se na vida da Trindade. E Francisco promete cuidar delas como de seus irmos. interessante observar a semelhana entre essa forma de vida e a antfona a Nossa Senhora que faz parte do Ofcio da Paixo.

    8. ltima Vontade para Santa Clara. Este outro escrito de So Francisco que s conhecemos porque Santa Clara o introduziu o captulo VI de sua Regra. Deve ter sido escrito nos ltimos dias de vida do Santo, mais ou menos na poca em que enviou sua bno a Santa Clara. uma forte exortao vida em pobreza. Em 2Cel 204, Celano fala desse documento.

    9. Fragmentos de outra Regra no bulada - J em 1904, Boehmer fazia notar que havia diversas citaes da Regra de So Francisco que eram certamente anteriores Regra Bulada mas tambm no constavam exatamente na Regra no bulada. Ele colocou alguns logo depois de sua apresentao da Regra no bulada. Na realidade, so at mais numerosos. Podemos encontr-los em trs fontes: 1. O cdice da catedral de Worchester, a "Explicao da Regra" escrita por Hugo de Digne entre 1245 e 1255 e a "Vida Segunda", de Celano.

    10. Carta a um Ministro - um documento conhecido desde o fim do sec. XIV, porque Bartolomeu de Pisa faz vrias citaes, sem nunca colocar o texto inteiro. Wadding apresentou mais de uma verso, sem deixar nada claro. Foi uma surpresa quando os estudiosos comearam a encontrar cdices que davam a carta completa. Algumas publicaes foram feitas antes de 1900, por Eduardo de Alenon e Paulo Sabatier. No se sabe quem o ministro que recebeu a carta, mas ela costuma ser datada com bastante segurana antes de 1223 e at mesmo antes de 1221, mas no pode ser muito anterior. um belssimo escrito sobre a misericrdia, que nos faz conhecer bem de perto So Francisco.

    11. Primeira Carta aos Fiis - Foi Paulo Sabatier quem publicou pela primeira vez este Escrito, no ano de 1900. Ele o achara no Cdice de Volterra. Deulhe o nome de Verba vitae et salutis (Palavras de vida e de salvao) e disse que se tratava de um primeiro esboo do Escrito hoje conhecido como Segunda Carta aos Fiis (que ainda no tinha sido publicado naquele tempo). Lemmens e Boehmer aceitaram o escrito mas disseram que se tratava de um resumo posterior. Esser conseguiu provar que se tratava realmente de uma primeira verso, mais antiga, da outra e lhe deu esse nome de "Carta aos Fiis - primeira recenso", corrigindo o ttulo dado por Sabatier. Essa primeira verso, bem de acordo com o que dizem o Annimo Perusino (41) e a Legenda dos Trs Companheiros (60), escrita no plural, pelos frades, com So Francisco.

  • um belssimo e simples documento que fala dos que fazem e dos que no fazem penitncia.

    Na segunda edio da obra de Esser, Grau aproveitou estudos feitos por Pazzelli e mostrou que, de fato, no se trata de uma Carta mas de um "louvor" a Deus pelos que fazem penitncia: os que chamamos de Irmos e Irms da Penitncia. E que o ttulo de Sabatier estava correto.

    12. Segunda Carta aos Fiis - Wadding publicou esta carta dividida em duas, baseandose em um manuscrito. Mas hoje temos muitos outros manuscritos, inclusive do sec. XIII, que do o texto como uma nica carta. Sua autenticidade aceita. Talvez se possa situar a primeira recenso por volta de 1212 e esta por volta de 1222. Bem mais longa, esta nos faz pensar em como a Regra primitivados Frades Menores foi se transformando na Regra no bulada: na medida em que aumentava o nmero dos Irmos e Irms da Penitncia e em que as dificuldades iam aparecendo, a Carta foi crescendo. fcil perceber como muitos trechos novos foram colocados para esclarecer quanto aos erros dos ctaros, que deviam influenciar muitos irmos. A diviso em doze captulos e os subttulos certamente no so originais.

    13. Primeira Carta aos Custdios - Era um escrito completamente desconhecido at 1902, quando foi publicado por Sabatier, que o encontrara no cdice de Volterra. W. Goetz quis ver nele uma compilao da Carta aos Clrigos, da II aos Custdios e da Carta aos Governadores dos povos. Mas, ao encontrar a Primeira aos Clrigos no Missal do Subiaco, constatou que a Primeira aos Custdios tambm era autntica. Foi reconhecida nas edies de Lemmens e Boehmer (1904). A Segunda Carta aos Custdios faz uma aluso a ela. O assunto sobre a Eucaristia. Parecem evidentes sua conexo com a "Sane cum olim" de Honrio III (1219) e tambm sua linguagem prescolstica. Custdios, nesse tempo, eram todos os superiores da Ordem dos Frades Menores.

    14. Segunda Carta aos Custdios - Foi bastante discutida mas, hoje em dia, sua autenticidade aceita. Foi publicada pela primeira vez por Wadding em 1623. Ele estava fazendo uma traduo em latim de uma carta que recebera em espanhol, mas que, por sua vez, tinha sido traduzida do latim, porque se conservava outrora em Saragoa um manuscrito que era venerado como autgrafo. Por isso, temos a certeza de que o texto no o original. Mas o assunto fcil de aceitar, tanto pelo estilo de So Francisco, como pelo tema e mais ainda porque cita a Carta aos Clrigos, a Carta 1 aos Custdios e a Carta aos governadores dos povos. Tambm se dirige a todos os superiores da Ordem e tambm fala da Eucaristia. Podese demonstrar que uma segunda verso, um tanto modificada, da primeira.

    15. Primeira Carta aos Clrigos - J recordamos que o cdice B24 (por Esser chamado RV2) contm a Primeira Carta aos Clrigos copiada em um missal beneditino. o texto mais antigo que possumos (entre 1219 e 1238) fora os autgrafos. Esta Carta um dos escritos de So Francisco estudados mais a fundo. Tem uma base nos relatos de LP 18 e EP 56 (So Francisco andava com uma vassoura para limpar as igrejas, falava com os clrigos) e no seu

  • amor Eucaristia, documentado tambm no Testamento, na 1 Adm etc. Alguns estudiosos s levam em considerao esta primeira carta, eliminando a segunda, que dizem ter muito poucas diferenas (Isso j muda a maneira de contar os Escritos).

    16. Segunda Carta aos Clrigos - Caetano Esser distingue a primeira recenso (a do missal beneditino), da segunda, que est em quase todos os outros manuscritos. Acha que as diferenas so poucas mas importantes. Levanta a hiptese de que a primeira date do perodo entre o Conclio de Latro e a viagem de Francisco ao Egito (1215-1219), e que a segunda seja posterior a 1220, quando o Papa Honrio III publicou sua carta "Sane cum olim"; Francisco teria gostado e reformado um pouco sua primeira carta incluindo algumas expresses do papa.

    17. Carta a toda a Ordem - Na edio de Wadding (1623) esta carta est dividida em trs partes e tem trs ttulos. Por isso, mesmo nas edies de 1904 ela ainda aparece com o nome de Carta ao Captulo Geral. Ou ento se dizia que era "a todos os frades". Mas este o documento mais documentado de todos os Escritos de So Francisco, depois da Regra bulada e do Testamento. Esser livrou-a de todas as dvidas e lhe deu o nome de Carta a toda a Ordem, autorizado por alguns manuscritos. o texto mais bem escrito de So Francisco, com um latim muito bom, o que mostra que os secretrios devem ter ajudado bastante. Um precioso documento sobre a Eucaristia.

    18. Carta aos governadores dos povos - No foi encontrado nenhum cdice medieval para esta carta. A nica fonte uma cpia que, segundo a tradio, foi levada para Saragoa por Frei Joo Parenti, quando foi ministro provincial da Espanha no tempo de So Francisco. Mas ela aceita como autntica. Tem que ser entendida no conjunto de outras circulares que ele escreveu quando voltou do Egito, entre 1220 e 1224. Ele estava muito doente e quase cego. Sabendo que no podia mais fazer pregaes por toda parte, decidiu comear um apostolado novo, por escrito. Impressionado com os muezins muulmanos que convidavam o povo cinco vezes por dia para a "shalat", Francisco solicita aos governantes que se faam patrocinadores dos louvores de Deus por um anncio vespertino. Podia at estar pensando em um sinal ecumnico que unisse cristos e muulmanos.

    19. Carta a Frei Leo - Est conservada na catedral de Espoleto, em um pergaminho autgrafo. No h manuscritos que a tenham copiado. A primeira cpia conhecida de 1604, quando levaram o pergaminho para comparar com o do Bilhete a Frei Leo, que contm a Bno e os Louvores a Deus Altssimo. Wadding copiou- a em 1623. No h dvida quanto autenticidade: bem o estilo de Francisco, numa linguagem bastante incorreta. Mas fala ao corao, "como uma me". Parece que, durante sculos, esse texto foi usado como uma relquia, para dar bnos. Em 1860, quando foi supresso o convento dos conventuais em Espoleto, onde era guardada, passou para a catedral. Um proco, em 1895 queria vend-la aos americanos. Falloci Pulignani levou a questo ao Papa Leo XIII, que deu uma penso anual de 200 liras ao proco para ficar com a relquia no Vaticano. Depois, deu-a de novo catedral de Espoleto.

  • 20. Carta a Santo Antnio - A autenticidade desta carta s comeou a ser discutida depois que Sabatier insistiu em que So Francisco se opunha aos estudos. Em geral o texto aparece em pergaminhos independentes ou nas vidas de Santo Antnio, no em colees. Depois das edies de 1904 foram achados muito pergaminhos. interessante ler 2Cel 163, onde se fala dessa carta, e tambm a Adm. 7, que fala dos estudos. A Carta cita a RB, por isso tem que ser posterior a 1223. Mas no pode ser posterior a 1224/5, quando Santo Antnio foi para a Frana. Ele deve ter pedido antes o escrito de So Francisco.

    21. Orao diante do crucifixo - Em geral aparece solta nos manuscritos, sendo mais comum nos ligados coleo de Avinho. Quase sempre se diz que Francisco rezou essa orao quando o Crucificado pediu que reformasse sua casa. conhecido o texto italiano como original. Alguns quiseram por em dvida sua autenticidade, perguntando quando So Francisco a teria composto e escrito. Hoje se pensa, geralmente, que ele j estava fazendo essa orao no tempo anterior a So Damio: e foi a resposta espontnea que lhe veio aos lbios ou ouvir Jesus. interessante que Frei Marcos de Lisboa j apresenta uma traduo em portugus em 1556 e at diz que o Crucifixo falou depois que Francisco rezou a orao.

    22. Exortao ao Louvor de Deus - Esta orao de So Francisco no estava nem nos "Opsculos" de Wadding (1623) nem entrou nas edies crticas de Lemmens e Boehmer (1904). Mas foi aceita por Esser (1976). O prprio Wadding colocou-a nos seus Annales Minorum (1625), dizendo que copiara uma informao de Frei Mariano de Florena. Tambm foi encontrado um manuscrito do sec. XV que d um testemunho paralelo e muito interessante: A exortao foi escrita pelo prprio So Francisco em uma tbua que servia de piso do altar em um seu eremitrio. Ele mandou pintar algumas criaturas na tbua e depois escreveu o texto. Mais tarde tiraram a tbua e a expuseram como um quadro. Frei Mariano viu e copiou. A outra cpia (cdice N7) tambm foi feita assim.

    23. Louvores para todas as Horas - No h dvidas quanto autenticidade desses louvores que So Francisco rezava antes das horas cannicas: esto em muitos manuscritos. A orao final certamente original dele. Os outros louvores, como so feitos com textos litrgicos muito conhecidos, em geral nem foram copiados por inteiro nos manuscritos. Todo mundo os sabia de cor e os copistas muitas vezes se limitaram a dar as palavras iniciais. Por isso difcil reconstituir com segurana o texto original.

    24. Ofcio da Paixo - uma preciosa coleo de quinze Salmos e uma antfona de Nossa Senhora que So Francisco fez para celebrar todos os dias, paralelamente ao Ofcio Divino, o mistrio de Jesus Cristo. Treze dos Salmos so elaborao dele, usando principalmente trechos de Salmos bblicos. Esse "Ofcio" no est contido em muitos pergaminhos medievais, mas no h dvidas quanto a sua autenticidade. Os pergaminhos no davam um ttulo. Wadding inventou esse de "Ofcio da Paixo do Senhor", que foi aceito por Lemmens e Boehmer. Na realidade, So Francisco celebra tambm a Pscoa e todo o mistrio de Jesus. Alguns autores achavam que era um texto sem

  • importncia, porque feito com retalhos de Salmos conhecidos. Mas justamente a que est sua importncia: qual a seleo feita pelo Santo. A Legenda de Santa Clara (30) diz que ela "aprendeu o Ofcio da Cruz feito por So Francisco e o recitava com igual afeto". um dos melhores escritos para demonstrar a identificao de Francisco com Jesus Cristo.

    25. Exposio sobre o Pai-nosso - Houve muitas discusses a respeito deste Escrito. Dizia-se que, naquele tempo, eram muito comuns essas parfrases sobre o Pai-nosso, alis conhecidas desde Orgenes e outros santos Padres. Na realidade, ainda no foi descoberto nenhum texto de outros autores realmente parecido com este de Francisco. No uma exposio sobre o Pai-nosso, uma orao ampliada, em que ele vai acrescentando tudo que tem no corao. Tambm no faz parte dos Louvores para todas as horas, como alguns afirmavam e Esser esclareceu definitivamente.

    26. Bno a Frei Leo - Este texto e o seguinte esto nos dois lados de um pergaminho de uns 10 X 14 cms. com a letra original do Santo. O pergaminho est guardado em um relicrio, na baslica de Assis, pelo menos desde 1338. Depois do Cntico de Frei Sol, foram os escritos que mais mereceram estudos dos especialistas. interessante ler 2Cel 49 (e o paralelo LM 9,9) para conhecer sua histria. A bno, muito conhecida, uma adaptao de Nm 6,24-26.

    27. Louvores a Deus Altssimo - O texto autgrafo (no bilhete a Frei Leo) est um pouco estragado pelo uso, mas o que nele no pode ser lido completa-se pela ampla tradio dos manuscritos medievais. uma das expresses mais bonitas e arrebatadas das oraes de louvor de So Francisco e de seu amor ao Deus Trindade.

    28. Saudao Bem-aventurada Virgem Maria - As Fontes, desde 2Cel 198 e EP 55 falam da grande devoo de So Francisco por Nossa Senhora. Esta "saudao", que talvez fosse melhor chamar de "lauda" no consta nos pergaminhos do sec. XIII, embora seja abundantemente testificada a partir do sec. XIV. Mas nunca ningum colocou em dvida sua autenticidade. A idia que Nossa Senhora uma "Virgem feita igreja" baseia-se na teologia patrstica, que alimentava a liturgia conhecida e vivida por So Francisco. Muitos manuscritos escreveram "virgem perptua", mas o pensamento da lauda est construdo em cima do "Virgem feita igreja".

    29. Saudao s Virtudes - A primeira referncia a este escrito est em 2Cel 189, onde recebe o nome de "Louvores sobre as virtudes". Mas a sua presena abundante nos cdices medievais e no h nenhuma dvida da autenticidade. tpico de Francisco chamar as virtudes de irms ou senhoras e mais tpico ainda o seu uso das palavras corpo, carne, esprito e mundo. Vrios manuscritos ligam este escrito Saudao Virgem Maria, falando em "virtudes com as quais foi ornada a Santa Virgem e deve ser ornada a alma".

    30. Cntico de Frei Sol - Este cntico, amplamente conhecido hoje em dia, certamente uma das obras mais estudadas de So Francisco, e no h nenhuma dvida sobre sua autenticidade. J h referncias preciosas em 1Cel

  • 80, em 2Cel 165, em Legenda Maior 8,6. No Espelho da Perfeio interessante ler desde o n. 115 at o n.120, que d o texto. Mas o melhor texto o do Cod. 338 de Assis. J no sec. XIV muitos pergaminhos davam o texto completo, independente de outros escritos.

    31. Bno a Frei Bernardo - Uma bno dada por So Francisco, no leito de morte, ao seu primeiro frade, Bernardo de Quintavale. O episdio muito conhecido, especialmente por Legenda Perusina 107-8 e EP 107, mas tambm bom ver 2Cel 48.

    32. Bno a Santa Clara - O episdio conhecido em quase todas as fontes que falam da bno a Frei Bernardo. Vem logo em seguida. O texto melhor est em EP 108. No se deve confundir esta bno com as "palavras de exortao" ou "Ouvi, pobrezinhas", nem com a "ltima vontade".

    33. Testamento de Sena - Encontramos o episdio e o assunto do Testamento em EP 87 e em LP 17. Vrias outras fontes do sec. XIV falam disso. Os estudiosos o aceitam como autntico porque ningum apresentaria um outro Testamento de So Francisco se a base histrica no fosse segura, uma vez que o grande Testamento j era to discutido. O texto mais seguro Legenda Perusina 17.

    34. Ditado da Perfeita Alegria - conhecido no cap. 8 dos Fioretti, baseado no cap. 7 dos Actus. Os dois so certamente enfeitados. Wadding publicou um texto mais antigo. Depois, foi encontrada no pergaminho conhecido como cod FN, uma verso mais rude, que aceita como mais antiga. Sabatier defendeu-a. interessante ler 2Cel 125 e a Adm 5 para confrontar.

    35. Carta a Frei Jacoba - Est em 3Cel 37. Sua autenticidade sempre foi aceita e temos o relato em Legenda Perusina 101 e Espelho da Perfeio 112. Os Actus chegam a dar todo o texto, mas evidententemente uma elaborao posterior. Ficamos com Celano.

    36. Carta aos Bolonhenses - S est na Crnica de Toms de Ecleston, que cita um relato de Frei Martinho de Barton: So Francisco escreveu uma carta, em mau latim, aos bolonhenses predizendo um terremoto. O assunto tido como autntico.

    37. Carta aos Frades Franceses - Tambm s testemunhada na Crnica de Toms de Ecleston. Francisco escreve aos ministros e aos frades da Frana, exortando-os a louvar a Santssima Trindade.

    38. Carta a Santa Clara sobre o jejum - A gente sabe que essa carta existiu porque Santa Clara fala nela em sua 3CtIn. Refere-se a um escrito e a conselhos e mandamentos do Santo. Parece que estava tudo em um nico pergaminho. No temos o texto.

  • Segunda Parte

    AS BIOGRAFIAS DE SO FRANCISCO

    Apresentao geral

    Fazer uma biografia quer dizer escrever (grfein) a vida (bos) de algum. J os antigos gregos e romanos escreveram biografias, julgando que era importante que se soubesse como tinha sido a vida de algumas pessoas ilustres.

    Mas as biografias mudaram muito dos primeiros tempos para os nosso dias. Demorou para que fosse crescendo um esprito crtico que veio a exigir que os autores das biografias fizessem uma pesquisa cientfica, apresentando datas exatas e tentando provar todas as afirmaes que fazem.

    Nos primeiros tempos, a nica coisa que se queria saber era que bons exemplos determinada personalidade tinha deixado para os que vieram depois.

    Nesse sentido, o cristianismo conheceu, quase que desde os primeiros sculos, o que at se convencionou chamar de "hagiografia", ou vida de santo: hgios, em grego, quer dizer santo.

    bom notar que, no incio, nunca se escreveu uma biografia de Jesus. Os evangelhos do muitas notcias sobre ele, mas nenhum teve a pretenso de contar em ordem a sua vida.

    Entre as vidas de santos mais antigas, podemos destacar a de Santo Anto abade, que foi escrita pelo famoso santo Atansio de Alexandria. Outra que sempre foi conhecida a autobiografia de Santo Agostinho, contida em seu livro "As Confisses". Depois dessas, marcaram poca a vida de So Martinho de Tours, escrita por Sulpcio Severo e a vida de So Bento, patriarca do monaquismo ocidental, escrita por So Gregrio Magno. Um santo pouco anterior a So Francisco e que teve sua vida escrita foi So Bernardo de Claraval, que encontrou seu bigrafo em Guilherme de Saint Thierry.

    Todas essas vidas famosas serviriam de modelo aos que contaram a histria de So Francisco ainda no seu sculo, ou pouco depois.

    Os hagigrafos queriam edificar o leitor. No tinham nenhum escrpulo de inserir fatos da vida de um santo na vida de outro. O que importava era que o leitor tambm resolvesse ser santo.

    Hoje em dia, valorizamos as hagiografias pelo que contaram sem querer: tudo que referem sobre os costumes e a maneira de pensar do tempo importante como vestgio histrico.

    Foi s por volta do ano de 1607 que os famosos Bolandistas comearam a publicar as Acta Sanctorum, as primeiras informaes biogrficas sobre os

  • santos que, embora ainda no fossem cientficas, tinham a preocupao de s apresentar fatos pesquisados e possivelmente comprovados.

    Um trabalho cientfico com a histria de So Francisco, Santa Clara e o movimento franciscano, s comeou a aparecer no fim do sec. XIX. Ns, neste caderno de Fontes Franciscanas, e nesta seo de biografias, estamos apresentando apenas os livros que foram escritos nos sculos XIII e XIV e que trazem informaes para a biografia de So Francisco.

    Em alguns casos, a pesquisa feita pelos autores consistiu em narrar fatos que eles mesmos presenciaram ou foram presenciados por pessoas com quem puderam conversar. Em outros casos, a pesquisa limitouse a juntar em "compilaes" o que j tinha sido contado por outros.

    Evidentemente, cada autor foi marcado por sua prpria histria, pelos fatos que estavam acontecendo quando escreveu, pela finalidade que teve ao preparar o seu livro. Por isso, depois de apresentar uma lista completa das fontes biogrficas de So Francisco no seu sculo, vamos ter o cuidado de estudar cada um dos principais livros, apresentando o autor, o seu tempo, os motivos que o levaram a escrever.

    Trs grupos de biografias

    Podemos dividir as fontes biogrficas em trs grupos, de acordo com trs grandes personalidades que se ocuparam em contar a vida de So Francisco: Frei Toms de Celano, que entrou na Ordem em 1215, conheceu So Francisco, e foi encarregado de escrever as primeiras biografias; So Boaventura, que no chegou a conhecer o santo mas teve oportunidade de falar com muitos que o conheceram e, alm disso, como um competente doutor da Igreja, escreveu a biografia que foi oficial por muitos sculos; Frei Leo, companheiro e secretrio de So Francisco nos momentos mais importantes.

    O grupo celanense

    1. Toms de Celano escreveu:

    1a. Vida I de So Francisco. Que ele trabalhou em 1228 e apresentou ao papa Gregrio IX no comeo de 1229. Essa biografia esteve perdida de 1266 at 1768.

    1b. Legenda ad usum chori. Um resumo da Vida I, feito em 1230, para os frades lerem no coro.

    1c. Vida II de So Francisco. Que ele escreveu entre 1246 e 1247. Tambm esteve perdida entre 1266 e 1806.

    1d. Tratado dos Milagres (3Cel). Foi escrito entre 1250 e 1252 e tambm esteve perdido de 1266 at 1899.

    1f. Tambm se atribui a Toms de Celano a Legenda de Santa Clara Virgem.

  • Nota: quando dizemos que alguns livros ficaram perdidos foi porque o Captulo Geral da Ordem, celebrado em 1263, em Pisa, adotou a Legenda Maior de So Boaventura como biografia oficial, e o Captulo Geral de Paris (1266) mandou eliminar todas as outras.

    2. Juliano de Spira escreveu:

    2a. Um Officium rythmicum, com msica, para festejar So Francisco. Continha dados da I Celano e foi composto entre 1231 e 1232.

    2b. Uma Vida de So Francisco, escrita na mesma poca, entre 1231 e 1232 e tambm dependente de I Celano.

    3. Henrique de Abranches, um cnego, no franciscano, escreveu em 1230 uma Legenda Sancti Francisci versificata. Baseada nas informaes de I Celano, era dividida em 14 livros e abrangia 2.585 versos hexmetros, o tipo clssico de poesia histrica.

    4. Joo de Celano (ou de Ceprano), possivelmente um irmo de Toms de Celano, escreveu a legenda Quasi stella matutina (Como a estrela da manh), entre os anos 1235 e 1240, mas essa foi perdida e ainda no a encontraram.

    O grupo bonaventuriano

    1. So Boaventura Fidanza, de Bagnoreggio, escreveu:

    1a. A Legenda Maior Sancti Francisci, em que ele trabalhou de 1260 a 1263.

    1b. A Legenda minor ad usum chori. Um resumo que ele preparou na mesma poca para os frades lerem no coro.

    2. Bernardo de Bessa escreveu:

    Um Liber de Laudibus Sancti Francisci, entre 1280 e 1285. Bernardo foi secretrio de So Boaventura.

    O grupo leonino

    1. A Carta dos Trs Companheiros de Grcio, de 11 de agosto de 1246. Costuma ser publicada como introduo ao livro seguinte.

    2. A Legenda dos Trs Companheiros, que bastante posterior, podendo ser situada entre os anos 1290 e 1310.

    3. O Sacrum Commercium (nome completo Sacrum commercium Beati Francisci cum domina paupertate). A data de sua composio discutida, mas deve ter sido escrito entre 1260 e 1270.

  • 4. Os Dicta beati Aegidii assisiensis (Ditos de Frei Egdio). No sabemos quando se comps o livro, mas sabemos que Frei Egdio morreu aos 23 de maro de 1262.

    5. O Annimo perusino (nome correto: De inceptione Ordinis minorum), escrito provavelmente entre 1266 e 1270.

    6. A Legenda perusina (tambm conhecida como Legenda antiqua, Flores trium sociorum, Scripta Leonis ou Compilatio assisiensis. Ficou conhecida como Legenda perusina porque foi descoberta no cdice 1046 de Perusa. Deve ter sido escrita entre 1290 e 1311.

    7. O Speculum perfectionis, datado de 1318.

    8. Os Actus beati Francisci et sociorum eius, em 76 captulos, escritos entre 1327 e 1340.

    9. Os Fioretti de So Francisco, em 53 captulos, uma traduo italiana feita a partir dos Actus Beati Francisci em 1380 ou 1396.

    Observaes gerais

    1. No pertence a nenhum desses trs grupos mas tambm uma fonte biogrfica a Carta de Frei Elias, que o Vigrio Geral da Ordem escreveu em 1226 como uma circular anunciando aos frades do mundo inteiro que So Francisco tinha morrido.

    2. Algumas dessas biografias so compilaes annimas. Nos secs. XIII e XIV eram muito comuns essas obras no originais mas compostas de textos alheios. O Espelho de Perfeio, por exemplo, consta de 124 captulos, dos quais: um deriva da 1Cel; 29 da 2Cel; 90 de uma coleo precedente de lembranas dos primeiros companheiros [talvez a que foi transmitida pela "Legenda Perusina"]; dois so originais; dois no identificados mas com ressonncias de fontes conhecidas.

    3. O captulo de Pdua (1276) autorizou a recomear as pesquisas e publicaes a respeito de So Francisco. Assim, no ficamos s com a Legenda Maior.

    Toms de Celano

    1. A grande obra de Celano

    Com o nome de Frei Toms de Celano conhecemos cinco livros nas Fontes Franciscanas. A Vida I (1Cel), a Vida II (2Cel), o Tratado dos Milagres (3Cel), a Legenda Chori (4Cel) e o a Legenda de Santa Clara Virgem. No vamos falar, aqui, da Legenda de Santa Clara, que estudamos amplamente nas Fontes Clarianas.

  • A Primeira Vida foi escrita a pedido do Papa Gregrio IX em 1228 e apresentada ao pontfice no dia 25 de fevereiro de 1229. Por ordem do Captulo Geral de Paris, em 1266, foi lanada ao fogo, com todos os exemplares de obras escritas sobre So Francisco antes da Legenda Maior de So Boaventura. S veio a ser encontrada de novo em 1768, graas aos estudiosos bolandistas.

    Em 1230, Celano escreveu tambm uma verso abreviada da Primeira Vida, que se chamou Legenda ad usum chori, e foi usada pelos frades at 1263.

    A Vida Segunda foi escrita em 1247, aproveitando material apresentado pelo ministro geral Crescncio de Iesi, que o tinha pedido a toda a Ordem. Dessa vez, Toms de Celano trabalhou com uma equipe, encarregando-se, porm, da redao final. A Vida Segunda, destruda em 1266, s foi reencontrada em 1806.

    O Tratado dos Milagres foi escrito por ordem do ministro geral Joo de Parma, entre os anos 1250 e 1253. Tambm foi destrudo em 1266 e s foi reeencontrado em 1899. Esses quatro livros tiveram sua primeira edio crtica publicada em 1941, no vol. X da Annalecta Franciscana.

    2. Quem foi Toms de Celano?

    O primeiro bigrafo de So Francisco nasceu por volta de 1185 na cidadezinha de Celano, nas montanhas dos Abruos, no longe de Roma. Acolhido na Ordem em 1215, pelo prprio So Francisco, como ele conta (1Cel 57) foi para a Alemanha como missionrio em 1221, como se l no n. 19 da Crnica de Jordo de Jano.

    Deve ter entrado na Ordem j muito preparado, porque sua maneira de escrever demonstra muito bons conhecimentos literrios e um amplo domnio do latim. No foi sem motivo que papas e superiores recorreram a ele.

    Em 1223 foi nomeado custdio de Worms, Mogncia, Colnia e Espira, como diz Jordo de Jano no n. 30, e passou a vice provincial da Alemanha, na ausncia de Cesrio de Espira. provvel que estivesse em Assis em 1228 para a canonizao de So Francisco. Parece que pertenceu a uma equipe de copistas que a Ordem manteve em Assis.

    Passou uns trinta anos trabalhando na biblioteca do Sacro Convento, em Assis, e dando assistncia s Clarissas de Tagliacozzo, nas Marcas de Ancona. Em 1256, assim acreditam muitos crticos, completou a Legenda de Santa Clara Virgem. Pelo estilo, h quem lhe atribua tambm a autoria da bula de canonizao de Santa Clara.

    possvel que Joo de Celano, autor da Quasi stella matutina, fosse seu irmo.

    Tem-se como certo que morreu em 1260, e est sepultado em Tagliacozzo.

  • Quadro Geral da Primeira Biografia

    de Toms de Celano

    Na Introduo, divide o trabalho em trs partes.

    A primeira parte (1-87) abrange os primeiros dezoito anos da converso de Francisco.

    1. Sua vida v (1-2): "A mo de Deus o transformou...".

    2. Deus lhe apresenta suas armas (3-5): "para que... liberte o seu povo".

    3. Francisco abraa o Reino de Deus (6-7).

    4. Renuncia ao dinheiro, famlia e bens (8-15).

    5. No queria negar nada a ningum (16-17).

    6. No queria ser um ouvinte surdo do Evangelho (18-22).

    7. Francisco recebia a todos (23-31).

    8. Francisco era um modelo para os frades (32-54).

    9. Francisco foi missionrio para o mundo inteiro (55-61).

    10. Francisco fez muitos milagres (62-70).

    11. Sua vida simples (71-83).

    12. Sua maior aspirao era seguir a Cristo (84-87).

    A segunda parte (88-118): fala dos dois ltimos anos de Francisco.

    0. Introduo (88-90): Sua sabedoria, renovao da vida evanglica.

    1. A sabedoria divina revela sua paixo (91-93).

    2. As chagas (94-96): "no costumava revelar a ningum..." .

    3. Dores fsicas (97-98): "o homem exterior... vai se consumindo...".

    4. Fiel Igreja (99-101).

    5. Francisco ensina os irmos (102-104): "Comecemos, irmos... ".

    6. Sua enfermidade e morte em Assis (105-111).

    7. Depois de sua morte (112-118).

    A terceira parte (119-151): a concluso.

    1. A canonizao (119-126)

    2. Os milagres (127-150)

    Eplogo (151)

  • 3. Objetivo da Vida Primeira

    Celano quis mostrar Francisco como um renovador da Igreja. Para ele, Francisco, "tomado pelo novo e especial esprito" (6), era "o novo soldado de Cristo" (9), que dirigia os "novos discpulos de Cristo" (34, 38), os "primeiros e melhores frutos" da "vinha escolhida", "que a mo do Senhor tinha plantado havia pouco neste mundo" (74). Esse "homem do outro mundo" (82), dizia at o fim: "Vamos comear a servir a Deus, meus irmos, porque at agora fizemos pouco ou nada" (103). Celano est sempre lembrando a novidade de Francisco. A idia de "soldado de Cristo" uma reminiscncia da vida de So Martinho de Tours.

    Essa "novidade" pode ser apreciada nos nmeros 10, 11, 18, 26, 33, 37, 41, 92, 85, 89, 98, 114, 119, 121 e 122. Apresentamos um trecho interessante que est na segunda parte:

    Como um dos rios do paraso, este novo evangelista dos ltimos tempos irrigou o mundo inteiro com as fontes do Evangelho e pregou com o exemplo o caminho do Filho de Deus e a doutrina da verdade. Nele e por ele, o mundo conheceu uma alegria inesperada e uma santa novidade: a velha rvore da religio viu reflorir seus ramos nodosos e raquticos. Um esprito novo reanimou o corao dos escolhidos e neles derramou a uno de salvao ao surgir o servo de Cristo como um astro no firmamento, irradiando uma santidade nova e prodgios inauditos. Por ele renovaram-se os antigos milagres, quando foi plantada no deserto deste mundo, com um sistema novo mas maneira antiga, a videira frutfera, que d flores com o suave perfume das santas virtudes e estende por toda parte os ramos da santa religiosidade (1Cel 89).

    4. Circunstncias em que foi escrita a Vida I

    Tem um valor especial o conhecimento das circunstncias em que se tornaram disponveis os testemunhos usados pelo hagigrafo e tambm as circunstncias em que ele escreveu.

    Celano foi encarregado de escrever a Legenda para que se conhecesse o novo santo: So Francisco morreu em 1226; no ano seguinte, seu amigo Hugolino foi eleito papa (Gregrio IX) e o canonizou no dia 16 de julho de 1228, em Assis.

    O autor trabalhou com recordaes pessoais e testemunhos de pessoas que julgava dignas de f. Como esteve na Alemanha desde 1221, foi pelos testemunhos que soube dos ltimos fatos.

    O santo tinha passado o ano de 1223 trabalhando para redigir uma verso da sua Regra que pudesse ser aprovada pelo papa. Sabe-se que muitos irmos temiam que ele fizesse uma regra mais rgida. Acabou conseguindo a sua aprovao no dia 29 de novembro de 1223, pela bula Solet annuere, do Papa Honrio III. Pouco depois, foi celebrar o Natal em Greccio, na comemorao que ficou famosa.

  • Apresentou a Regra bulada aos frades no captulo de Pentecostes de 1224. Foi o mesmo captulo que enviou os primeiros frades para a Inglaterra e Santo Antnio de Lisboa para a Frana, como pregador e professor de teologia.

    Pouco depois, em agosto, Francisco foi para o Alverne, onde teria a experincia do Crucificado em setembro. Ainda encontrou foras para sair em misso, indo pregar nas Marcas de Ancona no inverno de 1224-1225. Em maro de 1225 recolhe-se a So Damio, onde fica at maio e escreve o Cntico de Frei Sol.

    Nesse meio templo, uma sublevao em Roma obrigava o papa Honrio III a sair da cidade e se refugiar em Rieti, de junho de 1225 a fevereiro de 1226. Francisco acolhido em Rieti pelo cardeal Hugolino e se submete a um doloroso tratamento dos olhos.

    Aos 3/12/1224, Honrio III autoriza missas pblicas nas capelas franciscanas. Aos 7/10/1225, manda franciscanos e dominicanos como missionrios.

    Logo no comeo de 1226, o papa d dois documentos sobre as misses: permite que os frades usem dinheiro, vistam as roupas prprias do lugar e at que alguns sejam bispos. Em abril, Francisco vai para Sena, onde escreve o pequeno testamento. Em julho-agosto passa por Cortona e volta para Assis. Escreve o Testamento e morre pouco depois. Frei Elias escreve sua circular.

    Em 1227, Hugolino foi eleito papa, Joo Parenti foi feito ministro geral e Santo Antnio provincial. Juliano de Espira, que era corteso de Lus VIII, entrou na Ordem. No dia 8 de setembro, os cruzados vo para o Oriente levando uma praga que quase acaba com as tropas. Uma das vtimas o landgrave da Turngia, marido de Isabel da Hungria.

    Na Pscoa de 1228, o povo de Roma se rebela, obrigando Gregrio IX a ficar fora da cidade at 1230. Entre junho e julho, estando em Perusa, o papa aproveita para completar a causa de canonizao de Francisco. Nessa ocasio, confirmou o Privilgio da Pobreza para Santa Clara e, provavelmente, encarregou Celano de escrever a legenda. Nesse mesmo ano, Isabel de Hungria entra na Ordem da Penitncia em Eisenach.

    Nos ltimos anos, a Ordem, que j tinha mais do que cinco mil frades, comeara a dar sinais de diviso interna. Mas a primeira biografia, dirigida a toda a Igreja, no os leva em considerao.

    5. Fontes da Primeira Biografia

    No Prlogo, dizendo que ia contar a vida de Francisco, Celano declara:

    Procurei apresentar pelo menos o que ouvi de sua prpria boca, ou soube por testemunhas de confiana. Fiz isso por ordem do glorioso papa Gregrio, conforme consegui, embora em linguagem simples.

  • No d para saber o que ele ouviu da boca de Francisco. S faz uma referncia a seu relacionamento com o santo, quando agradece a Deus por ter sido recebido com um grupo de letrados e nobres (1Cel 56-57). Mas em geral em se tm a sua narrativa da canonizao (1228) como trabalho de uma testemunha ocular.

    Entre as testemunhas "dignas de confiana" podemos ver o prprio papa (73-75, 99, 100, 118 e 121-126), Frei Elias (98, 105, 108, 109), Frei Bernardo (24, 30, 102), Frei Leo (6, 50, 102), Frei Ricrio (49-50), e Frei Rufino (95).

    Tambm podemos pensar que Celano usou como fontes as atas da canonizao, ainda que ele d a entender, no n. 124, que nem foi feito um processo. Alm disso, deve ter usado a bula "Mira circa nos" de 19 de julho de 1228, e a Carta de Frei Elias.

    6. A cronologia de So Francisco

    O Prlogo da Vida 1 comea dizendo:

    Quero contar a vida e os feitos de nosso bem-aventurado pai Francisco. Quero faz-lo com devoo, guiado pela verdade e em ordem, porque ningum se lembra completamente de tudo que ele fez e ensinou.

    Esse "ordenadamente" aparece no texto latino como "seriatim", isto , em srie, em ordem cronolgica. E, de fato, uma das maiores colaboraes que recebemos de Celano foi darnos uma cronologia bsica para a vida de So Francisco.

    Para marcar as datas, ele se baseia sempre na converso de So Francisco, um fato que os historiadores situam entre junho de 1205 e junho de 1206, relacionando a converso de Francisco com sua expedio militar Aplia.

    O comandante do exrcito papal em que Francisco se arrolou para buscar a glria era Gualter de Brienne e hoje se sabe que ele morreu em junho de 1205. Francisco deve ter sido informado desse fato quando estava a caminho, em Espoleto. Foi a que ele se perguntou: "Quem pode mais, o senhor ou o servo?"e comeou a mudar o rumo da vida.

  • Cronologia de So Francisco segundo a Primeira Celano

    Ano

    1181-2

    1205

    1206-24

    1206-24

    1207-08

    1209-10

    1211

    1212

    1213-14

    1219

    1223

    1224-26

    1224

    1224

    1226

    1226

    1226

    1228

    Acontecimento

    nascimento

    comea a converso

    Tema 1 de Cel. 1a parte

    carne sem descanso

    repara a Porcincula

    passa o imperador

    vai para a Sria

    recebe Santa Clara

    vai para a Espanha

    vai para Damieta

    Natal em Greccio

    Tema 2 de Cel. 2a parte

    Alverne

    revelao de sua morte

    doente em Sena

    morte

    morte

    canonizao

    . Texto

    ...quase at os vinte cinco anos...

    ...quase at os vinte e cinco anos...

    ...at o ano 18 ano de sua converso...

    ...durante dezoito anos...

    ...no terceiro ano de sua converso...

    ...por ali, naquele tempo...

    No sexto ano depois da converso...

    ...quase seis anos depois da converso..

    Passado no muito tempo...

    No dcimo terceiro ano da converso...

    ...trs anos antes da gloriosa morte...

    ...ltimos dois anos de sua vida...

    ...dois anos antes de entregar sua alma...

    ...s mais dois anos nesta vida...

    Seis meses antes de sua morte...

    ...tendo completado vinte anos...

    ...decorridos vinte anos desde suaconverso

    ...no segundo ano do pontificado..

    Nmero

    2

    2

    88

    97

    21

    43

    55

    18

    56

    57

    84

    88

    94

    108-109

    105

    88

    109, 119

    126

    7. Observaes sobre a Primeira Biografia de Celano

    A Vida I de Toms de Celano considerada uma publicao "oficial" por ter sido feita a pedido do papa e para ser conhecida em toda a Igreja, com a imagem de santo que se tinha oficialmente . Ele, de fato, segue o modelo das hagiografias antigas, alm de usar o "cursus", uma espcie de melodia rtmica comum nas leituras que se faziam oficialmente na igreja.

    Mas o seu trabalho muito srio, o melhor que se podia esperar de um "historiador" no seu tempo. A principal diferena talvez seja a de envolver tudo na novidade da proposta franciscana.

    Tendo dividido a obra em trs partes, deu importncia maior aos anos de 1225 a 1226. Mas, justamente a, reconhece que seu trabalho no completo e pode ser aperfeioado por outros (1Cel 88).

  • Soube dar conta da tarefa de apresentar um santo cuja vida serviria para edi ficar os fiis. Podemos supor que o prprio papa tenha indicado a Celano quais as virtudes de Francisco que ele devia ressaltar, pois destaca a simplicidade e lembra (1Cel 73) que Hugolino ficou admirado principalmente por essa qualidade do santo.

    Talvez tenha tido que defender essa sua posio, porque, no n. 189 da 2Cel, explica amplamente o que entendia por simplicidade de So Francisco.

    A Vida I trata da simplicidade nos nmeros 26, 27, 32, 44, 45, 48, 49, 50, 69, 72, 73, 75, 78, 80, 83, 84, 91, 99, 104, 114, 119, 120 e 125.

    Tambm ressalta muito a humildade, do santo e de seus companheiros, nos nmeros 17, 18, 29, 30, 31, 33, 34, 38, 39, 48, 54, 58, 77, 83, 84, 85, 93, 98, 101, 103, 122.

    Mas fala muito menos da pobreza (19, 26, 31, 35, 39, 51, 75, 76, 85, 99, 117), talvez porque se dirige aos cristos em geral e no aos franciscanos.

    8. A "Legenda ad usum chori"

    Era apenas um resumo da Vida I feito para os frades lerem nas suas celebraes. No d nenhuma informao nova mas compendia muito bem a experincia religiosa do homem que se apaixonou por Deus, pela criao, e experimentou tudo que Jesus "tinha feito na carne".

    O texto latino publicado na AF X em 1941 e reapresentado nas "Fontes Franciscani" foi reconstrudo pelos estudiosos de Quaracchi a partir de onze manuscritos, inclusive o 338 de Assis.

    9. A "Vida II" de Celano

    No Captulo Geral de Gnova, em outubro de 1244, foi decidido que se pedisse a colaborao de todos os frades para complementar a biografia de So Francisco. O geral ento eleito, Frei Inocncio Grizzi de Iesi, mandou uma circular pedindo que mandassem "tudo que pudessem saber de verdade sobre a vida os sinais e os prodgios de So Francisco".

    As respostas devem ter sido muitas, destacando-se, no nosso conhecimento, a colaborao que foi enviada de Grcio, aos 11 de agosto de 1246, pelos famosos "trs companheiros".

    Todo o material deve ter sido entregue pelo ministro geral a Frei Toms de Celano, para que escrevesse uma nova "Vita" de Francisco. O escritor deve ter trabalhado nessa tarefa em 1247.

    Apresentou uma obra em dois "livros", ou duas partes, que se diferenciam. A primeira, mais curta (1-25) obra pessoal de Celano, segue uma ordem cronolgica e refaz alguns pontos de "Vida I". A segunda (26-224), com a ajuda

  • de colaboradores, pois o autor demonstra ter mantido contato com os informantes, apresenta uma coleo bastante variada de

    episdios inditos que vo apresentando as virtudes, as vontades, os ditos e os feitos do santo, visando mostrar como os frades deviam viver.

    Queimada em 1266, a Vida II s foi descoberta e publicada por S. Rinaldi, em 1806. A edio crtica, apresentada pela AF X em 1941, s conseguiu trabalhar sobre dois cdices e mais algumas citaes de outros livros. Pode ser encontrada, em latim, nas "Fontes Franciscani".

    Todo o contedo da Vida II um excelente testemunho da imagem que se tinha de Francisco nesse tempo, vinte anos depois de sua morte, principalmente quanto aos problemas que estavam sendo vividos dentro da Ordem.

    10. A situao da Ordem

    Atravs dos comentrios apresentados dentro da prpria biografia, descobrimos que, mesmo reconhecendo todo o bem que Deus est realizando na Ordem, Celano est preocupado com alguns abusos:

    H frades que se vestem com panos finos e peles (69, 130) e at invejam os que tm coisas melhores (84). Alguns so imprudentes com as mulheres (112) e mesmo com as religiosas (207). H irmos que buscam os elogios das pessoas (139) e, entre eles, h cimes, ambio, disputas e dio (149), como crticas (182 e muito falatrio (162).

    H preguia no trabalho, no apostolado e na contemplao (162) e abusos at nos eremitrios (179). Os superiores so muito tolerantes (162), no corrigem os que erram e s querem mandar (173), deixando de ajudar os cados e feridos (177). H frades que se esquecem da humildade (194) na busca da cincia, visando o prprio proveito (195).

    No final, vai dizer a Francisco que:

    O pequeno rebanho j te segue com passo inseguro. Nossos pobres olhos ofuscados no suportam os raios da tua perfeio (221).

    Apesar disso, o autor acredita na sinceridade dos frades mesmo quando se queixa deles diante de Francisco.

    11. O Primeiro Livro da Vida II

    O primeiro "livro" da Vida II insiste na mesma apresentao de Francisco encontrada na Vida I, ainda que se esquea de sua juventude dissipada, mostrando-o como o mais santo dos fundadores.

    Francisco , agora, um jovem muito diferente daquele da Vida I, "criado pelos pais no luxo desmedido e na vaidade do mundo". "servo e amigo do

  • Altssimo", "filho da graa", admirado pela "honestidade e magnanimidade" (3). At imitou So Martinho (5) e, por amor aos pobres decidiu nunca negar nada que fosse pedido em nome de Deus (17).

    A viso do palcio (1Cel 5) iluminada por outra viso (2Cel 6); o abrao ao leproso iluminado pela orao que o faz trasnformar o amargo em doce (9). A cena da entrega da roupa ao pai (1Cel 15) volta mas agora ele declara: "Irei nu para o Senhor" , porque Cristo lhe basta.

    Na Vida I (18-19) reparar So Damio est mais ligado fundao das Irms Pobres, enquanto na Vida II (10-11) j Cristo que intervm para ele repare a Igreja de todo o mundo.

    interessante comparar a entrada de Frei Bernardo. Na Vida I (24), ele cumpre os conselhos conhecidos; na Vida II (15), abre os Evangelhos trs vezes com Francisco e Pedro Catani, em uma sugestiva cerimnia.

    A Porcincula passa de um lugar simplesmente muito santo (1Cel 106) a um centro de luz e salvao para os frades e para todo mundo (2Cel 18-20).

    Mas apresenta dois fatos novos muito importantes: o colquio de Francisco com o Crucifixo de So Damio e o sonho de Inocncio III, que viu o pobrezinho sustentando a igreja do Latro. So dois pontos escolhidos para mostrar a importncia de Francisco e de seu movimento na renovao da Igreja. Em 1247, essa verdade j podia ser reconhecida.

    No -toa que o primeiro livro termina contando que Francisco pediu um cardeal protetor ao Papa e que a isso se deve todo amor e cuidado que a Igreja sempre demonstrou para com os frades.

    Mas o mais importante observar desde o primeiro livro como Celano vai respondendo a duas grandes preocupaes da Ordem no seu tempo: conhecer os milagres de Francisco e, acima de tudo, conhecer suas verdadeiras intenes. Certamente porque j havia muitas situaes novas, muitos caminhos diferentes e muita discusso sobre o que ele ensinara. So pontos para ler com atento esprito crtico.

    bom reler o que ele deixou escrito no Prlogo:

    Este opsculo contm, em primeiro lugar, alguns fatos admirveis da converso de Francisco, que no foram colocados nas biografias anteriores porque no tinham chegado ao conhecimento do autor. Alm disso, queremos contar e explicar diligentemente qual foi a vontade boa, agradvel e perfeita do santo pai tanto em relao a si mesmo como aos seus, em toda a prtica da disciplina celeste e no esforo da perfeio, que sempre teve para com Deus em seus afetos e para com os homens em seus exemplos.

  • 12. O Segundo Livro da Vida II

    Na segunda parte, em 199 pargrafos, a Vida II deixa de seguir a ordem cronolgica e lembra, com episdios inditos, as virtudes, as vontades, os ditos, a ao do santo, com a inteno evidente que compor uma obra correspondente tica franciscana. Esses contos fazem pensar nas "flores" dos Trs Companheiros, mas no podem provir todos de Greccio.

    Para apresentar o trabalho da equipe de Celano, vamos resumir o contedo dos grandes temas:

    A. Esprito proftico: (27-54) "... no s sabia por revelao divina o que devia fazer, mas predizia muitas coisas com esprito proftico, penetrava os segredos dos coraes, estava informado das coisas ausentes, previa e contava coisas que deviam acontecer" (27).

    B. Pobreza (55-93): "...desprezou as mseras riquezas... e, ambicionando a mais alta glria, dedicou-se de todo corao pobreza" (55).56-59 pobreza das casas; 60-62 dos utenslios; 63-64 das camas; 65-68 contra o dinheiro; 69-70 das roupas; 71-79 a mendicncia; 80-81 renncia dos bens; 82 viso da pobreza; 83-93 compaixo com os pobres.

    C. Amor orao (94-101): "Afastado do Senhor pelo corpo, o homem de Deus, Francisco, procurava fazer seu esprito estar presente no cu" (94).

    D. Compreenso das Escrituras e valor de sua palavra (102-111): "no era pouco o que entendia das Sagradas Escrituras".

    E. Familiaridade das mulheres (112-114): "Mandava evitar totalmente o mel venenoso que a familiaridade com as mulheres" (112).

    F. Tentaes (115-118): "Na medida em que cresciam os mritos de Francisco, crescia tambm sua discordncia com a antiga serpente". Sua luta (119-124).

    G. Alegria espiritual (125-129): "tratava de viver sempre no jbilo do corao, conservando a uno do esprito e o leo da alegria" (125). - A falsa alegria (130-134). - Como escondia as chagas (135-139).

    H. Humildade (140-150): "Era humilde de presena, mais humilde de sentimento e muito mais humilde no modo de pensar" (140).

    I. Obedincia (151-154): "O Senhor me deu a graa de ser capaz de obedecer a um novio de uma hora tanto quanto ao mais antigo e mais discreto dos frades" (151).

    J. Bom exemplo (155-158): "... os frades menores foram enviados... para dar exemplos de luz aos pecadores envolvidos nas trevas" (155). - Contra a ociosidade (159-162).

  • K. Os ministros da Palavra (163-164): "foram escolhidos por um grande rei para transmitir aos povos as palavras que colhessem de sua boca" (163).

    L. Contemplao (165-171): "Reconhecia que todas as coisas clamavam: Quem nos fez timo" (165).

    M. Caridade (172-181): "... a caridade de Cristo fez dele um irmo ainda maior daqueles que foram distinguidos pela semelhana com o Criador" (172). - Contra a detrao (182-183).

    N. Descrio do Ministro (184-188): "quero traar para vs o retrato...

    O. A santa Simplicidade (189-195): "era o ideal a que desejava chegar o santo" (189).

    P. Devoes particulares (196-203): amor a Deus, a os anjos, a Maria, ao Natal, Eucaristia, relquias e cruz.

    Q. Relacionamento com as Senhoras Pobres (204-207): "No penseis que no as ame com perfeio. Se fosse crime ajud-las em Cristo, no seria crime maior t-las unido a Cristo?" (205).

    R. Recomendao da Regra (208-209): "Tinha um zelo ardente pela profisso e pela Regra" (208).

    S. Doenas (210-213): "Pregoeiro de Deus, seguiu os passos de Cristo no meio de trabalhos sem conta e de fortes sofrimentos, e no arredou o p... (210).

    T. Passamento (214-220): "Amou os seus at o fim e recebeu a morte cantando" (214).

    U. Orao dos companheiros (221-224).

    13. "Francisco" e as Mulheres

    Um exemplo interessante de como devemos fazer uma leitura crtica das biografias pode ser o das opinies sobre as mulheres que Celano atribui a Francisco.

    A seo "Contra a familiaridade das mulheres" (112-114) e mesmo a que trata das Senhoras Pobres (204-205) apresentam um Francisco contraditrio com o que lemos em seus escritos e em muitas outras passagens de sua vida. Ele parece at ter medo das mulheres, julgando sua companhia um "mel venenoso".

    preciso lembrar que Celano est escrevendo vinte anos depois da morte do santo, quando a comunidade do tem-po de Francisco se transformara em uma multido e, como capelo das Clarissas em Tagliacozzo, pode ter mesmo observado abusos por parte dos frades.

    Mais importante: ele est escrevendo no tempo mais quente da pendncia entre o papa e os superiores da Ordem por causa das Irms. Inocncio IV mandara, em 1245, que os frades assumissem o cuidado de todas as Clarissas do mundo. Por esse tempo, os mosteiros podiam ser cerca de duzentos. Como colocavam habitualmente um capelo e seu auxiliar, mais dois esmoleres,

  • teriam que destinar oitocentos frades para trabalhar nos mosteiros, cortando uma poro de oportunidades de misses e de estudos. Por isso, os superiores da Ordem resistiram quanto puderam. Em 1247, no mesmo ano em que Celano estava escrevendo, o Papa fez o ministro geral Crescncio de Iesi renunciar por causa disso. bem provvel que Celano estivesse expressando as idias dele pessoalmente e de alguns superiores da Ordem. Mas as atribuiu a Francisco, cuja autoridade era reconhecida por todos.

    14. Pessoas citadas na Vida II

    Uma observao interessante: escrita em 1247-48, a Vida II nunca cita pelo nome pessoas vivas, s as mortas. De So Francisco, que tinha morrido em 1226, ela fala 200 vezes; de Hugolino, morto em 1241, fala sete vezes. Frei Pacfico, que morreu em 1236, tambm mencionado sete vezes. Pedro Catani, lembrado seis vezes, tinha morrido em 1221; mas Frei Bernardo, morto em 1242, tambm lembrado seis vezes. Frei Silvestre , falecido em 1240, merece quatro menes, enquanto Frei Joo, o Simples, que no sabemos quando morreu, aparece trs vezes. Inocncio III, lembrado duas vezes, tinha morrido em 1216, enquanto o papa Honrio III, que terminou seus dias em 1227, s citado uma vez. Aparece tambm o nome de Frei Morico, que morreu em 1236.

    15. O "Tratado dos Milagres"

    Os frades e seus superiores gostavam de saber os fatos maravilhosos realizados na vida de So Francisco. Celano apresentou muitos na sua Vida II, mas os irmos continuaram a pedir mais. Ele conta que Joo de Parma, que foi feito ministro geral em 1247, lhe escreveu diversas vezes pedindo esses milagres. Foi por isso que publicou o "Tratado dos Milagres" (3Cel) entre os anos de 1250 e 1254.

    O Tratado s conhecido integralmente por um cdice (que traz tambm a Vida II) encontrado em 1899 quando foi feito um leilo da Biblioteca de Baldassare Boncompagni e que est hoje no Instituto Histrico dos Capuchinhos. A primeira edio foi feita por Van Ortroy. Temos o texto em latim na AF X (1941) reeditado nas "Fontes Franciscani".

    um livro importante por mostrar como o culto de Francisco estava espalhado pela Europa poucos anos depois de sua morte. Mas, alm de glorificar o Santo e seu movimento, documenta um momento histrico atribulado e difcil, em que a Ordem sofre ataques externos por parte do clero secular e ameaas internas pelas idias joaquimistas.

    Insiste em identificar Francisco com Cristo, falando especialmente dos estigmas e continua a mesma viso dos outros livros - a novidade de Francisco:

    ... repentinamente, despontou na terra um homem novo (cf. Ef 4,24) e ao sbito aparecimento de um novo exrcito, os povos se encheram de estupor diante dos sinais da renovada era apostlica (3Cel 1).

  • 16. Concluses sobre Celano

    Como a obra de Celano a mais antiga e a primeira que estamos estudando, bom recapitular e aclarar alguns pontos:

    1. Na medida em que foi sendo redescoberto, Celano causou primeiro entusiasmo e depois desconfiana. Acusaram-no, no fim do sec. XIX, de ter feito uma obra literria de fico s para passar a viso oficial dos poderosos da Igreja. A influncia dos modelos hagiogrficos era mesmo inegvel.

    2. Hoje, depois de tantas discusses e estudos, ns sabemos que a obra de Celano fundamental. Na prtica, todos os outros bigrafos de So Francisco dependeram dele e as suas informaes, de maneira geral, so seguras. At So Boaventura, apesar de ter dar uma nova interpretao ao conjunto, usou intensamente a obra de Celano.

    3. Mas claro que preciso ler com esprito crtico. No um livro moderno, tem mais de setecentos anos. A Vida I quer exaltar o santo; a Vida II tambm quer defender posies. bom lembrar que ningum consegue escrever histria totalmente objetiva, isenta: a "histria" sempre uma "leitura" pessoal.

    4. Grande parte do valor da obra de Celano est nas informaes indiretas que nos deu. Ele um homem do tempo de Francisco e dos primeiros companhei-ros e mostra como se vivia, como se pensava e falava, mesmo sem querer passar explicitamente essas coisas.

    5. Mesmo Santa Clara, que pode ter sido uma colaboradora de Celano, pois teria informaes preciosas, leu a obra de Celano, a Vida I quando tinha apenas 34 dos 60 anos que haveria de viver.

    6. At 1266, isto , nos primeiros quarenta anos depois da morte de Francisco, Celano foi a referncia bsica para a histria do Santo. E continua a ser. Ele marcou para sempre a viso de Francisco como "um outro Cristo".

    So Boaventura

    1. A "Legenda Maior"

    A "Vida de So Francisco de Assis" publicada em 1263 ficou conhecida como Legenda Maior. So Boaventura, que tinha sido eleito ministro geral em 1257, no captulo de Roma, encarregou-se de escrever uma nova vida de So Francisco no captulo de Narbona (o mesmo que publicou as primeiras constituies franciscanas), em 1260. Apresentou-a Ordem no captulo de Pisa, em 1263, j em 34 cpias (uma para cada provncia) bem revistas e j acompanhada por uma Legenda ad usum chori, que ficou conhecida como "Legenda Menor".

  • O livro deve ser posterior ao dia 23 de abril de 1262, porque fala da morte de Frei Egdio, que ocorreu nesse dia.

    Por oposio aos trabalhos de Toms de Celano, ficou conhecido tambm, nos primeiros tempos, como "Legenda Nova", considerando-se os livros de Celano como "Legenda Antiqua".

    Na verdade, apesar de se apresentar como novidade, historicamente uma compilao de fatos tirados das biografias anteriores. Mas se apresenta numa reinterpretao to interessante que pode ser tida como um resumo de espiritualidade. Teve tanto xito que o captulo de Paris, em 1266, mandou queimar todas as outras "vidas" de So Francisco ento existentes. A Legenda Maior sempre foi amplamente reproduzida e traduzida.

    Sua edio crtica foi publicada em 1941, no vol. X da Annalecta Franciscana e est disponvel no volume "Fontes Franciscani", de 1995.

    2. O autor

    Joo Fidanza nasceu em Bagnorregio, perto de Viterbo, na Itlia, em 1221. Muito jovem, foi mandado para estudar em Paris. Em 1240, sendo j "mestre em artes", comeou a teologia. Entrou na Ordem provavelmente em 1243, impressionado por seus mestres franciscanos. Em 1248 obteve a licena para lecionar teologia. Por volta de 1250 obteve o bacharelato em Bblia e por volta de 1253 passou a ser catedrtico. Aos 2 de fevereiro de 1257, recomendado pelo geral resignatrio, Joo de Parma, foi eleito ministro geral no captulo de Roma.

    Em 1265, foi nomeado bispo de York, mas conseguiu que o papa voltasse atrs. Em 1273, foi eleito cardeal e sagrado bispo de Albano, para dirigir o Conclio de Lio em companhia de Santo Toms de Aquino.

    Seu colega dominicano morreu em 7 de maro. Sobrecarregado de trabalho, Boaventura no resistiu e morreu no dia 14 de julho de 1274. Sucedeu-lhe como ministro geral Frei Jernimo de scoli, que depois foi papa com o nome de Nicolau IV (1288-1292).

  • ESQUEMA DE LEGENDA MAIOR

    Introduo

    Prlogo

    1. Sua vida no mundo

    2. Converso definitiva e restaurao de trs igrejas

    3. Fundao da Ordem e aprovao da Regra

    4. Progresso da Ordem sob sua direo e confirmao da Regra

    A. Via Purgativa

    5. Austeridade de vida e como as criaturas lhe proporcionam consolo (o prmio por sua austeridade exterior e interior o domnio sobre a natureza).

    6. Humildade e obedincia, favores com que Deus o cumulava (o prmio por imitar Jesus Cristo pobre conseguir o domnio sobre os demnios).

    7. Amor pobreza e intervenes miraculosas nas necessidades (o prmio pela pobreza nas coisas e mesmo no conhecimento sua confiana na Providncia).

    B. Via Iluminativa

    8. Seu sentimento de compaixo e o amor que as criaturas lhe devotavam (o prmio por estar integrado com Deus, consigo mesmo, com o prximo e com as criaturas e o domnio sobre as aves e os outros animais).

    9. Fervor de sua caridade e desejo do martrio (o prmio por viver o amor de Deus, de Nossa Senhora, dos anjos e dos apstolos, por seu desejo de martrio, so as chagas).

    10. Zelo na orao e poder de sua prece (o prmio por viver sempre entregue orao foi ter visto Jesus menino presente em Greccio).

    C. Via Unitiva

    11. Conhecimento das Escrituras e esprito de profecia (o prmio por sua dedicao s sagradas Escrituras foi a unio com a sabedoria eterna).

    12. Eficcia de sua pregao e poder de curar (o prmio por sua dedicao pregao foi ter sido um enviado de Deus).

    13. Os sagrados estigmas (o prmio por sua unio com Cristo crucificado foi obter os sete sinais da cruz, prova de que chegou perfeio evanglica).

    Concluso

    14. Sua admirvel pacincia e morte

    15. Sua canonizao e trasladao de seus restos mortais

    Alguns milagres realizados aps a morte de So Francisco

  • 3. O Livro

    O trabalho de So Boaventura certamente riqussimo, como literatura e como teologia, embora suas idias possam estar bem longe do que Francisco e seus companheiros viveram de fato: ele escreveu e trabalhou para que a Ordem mudasse. Tinha desenvolvido sua teologia da vida espiritual no livro "As trs Vias", em que apresentava os passos para chegar a Deus: pirificao, iluminao e unio. Na mesma poca, trabalhara no livro "Itinerario da Mente a Deus", en que mostraba a vida contemplativa de Francisco crescendo en sete degraus que simbolizavan as asas do Serafim. Na sua Legenda, procurou mostras como isso aconteceu na vida de So Francisco. Alm do esquema que mostramos no quadro abaixo, em que acompanha as trs vias, So Boaventura tambm aproveita os sete degraus apresentando sete episdios da vida de Francisco relacionados com a cruz (LM 13,10). Mas Francisco tambm apresentado, desde o Prlogo, como o "Anjo do sexto selo". S isso j mostra como forte a linguagem simblica na Legenda Maior, alis repleta de aluses bblicas e litrgicas, de figuras e de smbolos, que o tornam um pouco compacto.

    O livro no pode ser entendido como uma narrativa histrica atual. Alm do mais, ele parece querer tirar So Francisco das contingncias histricas e coloc-lo fora do tempo. Pode ter sido influenciado por sua fonte principal, a Vida II de Celano, mas ele mesmo diz:

    "A histria nem sempre segue a ordem cronolgica dos fatos. A fim de evitar confuso, preferi ser mais sistemtico. Por isso, ora agrupei acontecimentos que se deram em tempos diferentes, mas se referiam a assuntos semelhantes, ora separei outros que ocorreram ao mesmo tempo, mas se referiam a assuntos diferentes" (LM, prlogo).

    Mesmo afirmando que visitou os lugares em que o santo viveu e que conversou com pessoas do seu tempo, a maior parte dos fatos narrados pela Legenda Maior so tirados de Celano. Apresentamos, no quadro ao lado, uma lista do que, de fato, pode ser considerado original de Boaventura.

    Pontos originais na L. Maior

    2,6: cura de um doente pelo beijo nos ps.

    4,6: Clara suas Irms

    4,7: um sarraceno admira a pobreza

    4,8: a cura e vocao de Frei Morico

    5,2: o desejo do cu ajuda a suportar o frio

    5,5: conselhos para tratar com as mulheres

    5,8: doente dos olhos por muito chorar

  • 5,12: luz que ilumina na escurido da noite

    7,11: conserta a casa de um mdico

    7,13: ajuda uns marinheiros

    8,5: ajuda os pobres

    8,7: histrias de cordeiros

    8,9: Silencia os pssaros em Veneza

    8,10: os pssaros do Alverne

    9,2: jejum por amor a Cristo

    9,3: devoo aos santos

    9,8: Francisco e o sulto

    10,4: envolto numa nuvem resplandecente

    10,7: licena para o Natal em Greccio

    11,1: Francisco e os estudos

    11,4: avisa um cavaleiro sobre sua morte

    12,5: o estudante e a andorinha

    12,6: o barco anda sozinho

    12,9: dois milagres novos

    12,10: dois milagres em favor de cegos

    13,4: dvida sobre revelao das chagas

    13,7: milagres relacionados s chagas

    13,8: testemunhas das chagas

    13,9: louvor das chagas

    13,10: as sete manifestaes da cruz

    14,2: agradecimento pelas doenas

    15,1: o programa espiritual de Francisco

    15,4: testemunhas das chagas em Assis

    15,7: o exame dos milagres do santo

    4. O Joaquimismo

    Para compreender melhor a obra de So Boaventura, vamos lembrar que foi escrita em um momento em que muitos frades eram acusados de "joaquimistas".

  • Joaquim de Fiore foi um abade do sul da Itlia, que viveu de 1135 a 1202. Ficou muito conhecido por suas profecias, em que dividia a histria em grandes eras:

    A Era do Pai abrangia todo o tempo antes de Cristo. Foi governada pela lei e a atitude fundamental era a obedincia servial. A virtude era o temor de Deus. Seus responsveis eram os sacerdotes.

    A Era do Filho devia chegar at 1260. Governada pela graa, tinha como atitude fundamental a obedincia filial: A virtude era a f e os responsveis eram a hierarquia com o clero secular.

    A Era do Esprito Santo comearia em 1260. Regida pelo amor, sua atitude fundamental seria a liberdade. A virtude era o amor e os responsveis seriam os religiosos.

    No ltimo decnio antes de 1260, os religiosos estavam entusiasmados com essa proposta. Mas a hierarquia se sentiu ameaada e condenou a obra do francis cano Geraldo de Borgo San Donino, que publicara Joaquim de Fiore. Tambm fez Joo de Parma renunciar, em 1257.

    Apresentando So Francisco como "Anjo do sexto Selo", So Boaventura faz dele a figura central dessa histria. Na Legenda Maior, mostra que ele foi um "homem do outro mundo", "quase angelical", o "anglico Francisco".

    5. Situao histrica em que foi escrita a Legenda Maior

    So Boaventura se encarregou de escrever a sua biografia de So Francisco justamente no ano de 1260, em que devia comear a terceira era joaquimista. Em toda a dcada anterior, a Ordem tinha sofrido violentos ataques de fora, principalmente por parte da Unive