fmup - mecanismos de adaptação ao exercício físico

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  • 8/7/2019 FMUP - mecanismos de adaptao ao exerccio fsico

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    Faculdade de Medicina da Universidade doPorto

    Servio de Fisiologia

    Aula Terico-Prtica

    MECANISMOS DE ADAPTAO AO EXERCCIOFSICO

    Texto de Apoio

    Alexandre Lima Carneiro

    Tiago Lopes

    Prof. Doutor Adelino Leite Moreira

    Porto, Ano Lectivo 2002

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    NDICE:

    !" INTRODUO ......................................................................................................................... Pg. 3

    !" ADAPTAES AO EXERCCIO ................................................................................................ Pg. 3

    Adaptaes musculares agudas .................................................................................. Pg. 4

    Adaptaes musculares crnicas ................................................................................ Pg. 8

    Adaptaes cardiovasculares e pulmonares agudas ....... ........................................ Pg. 10

    Adaptaes cardiovasculares crnicas ..................................................................... Pg. 15

    Adaptaes hormonais ................................................... ............................................. Pg. 18

    !" BENEFCIOS DO EXERCCIO ..................................................................................................Pg. 18

    !" PRESCRIO DO EXERCCIO .................................................................................................Pg. 22

    !" RISCOS DO EXERCCIO ......................................................................................................... Pg. 24

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    Introduo

    A actividade fsica regular considerada desde h muito como um componente preponderante de um

    estilo de vida saudvel. Recentemente, esta ideia tem sido reforada por novas evidncias cientficas que

    associam positivamente a actividade fsica regular a um vasto rol de benefcios na sade fsica e mental. No

    obstante esta evidncia, bem como a aceitao aparentemente generalizada da importncia da actividade

    fsica, milhes de pessoas optam por um estilo de vida sedentrio.

    luz dos conhecimentos actuais, um grupo de especialistas designado pela Centers for Disease

    Control and Prevention (CDC) e a American College of Sports Medicine (ACSM) desenvolveu um

    mensagem de sade pblica concisa e clara no que diz respeito actividade fsica, visando a sua

    implementao, cada vez mais generalizada, no quotidiano do mundo ocidental. Esta mensagem preconiza

    que todos os adultos devem acumular 30 minutos ou mais de actividade fsica de intensidade moderada na

    maior parte, ou de preferncia todos, os dias da semana, j que esta prtica regular acarreta benefcios

    significativos, irrefutveis para a sade.

    Actividade fsica definida como qualquer movimento corporal produzido pelos msculos

    esquelticos que implica dispndio de energia. A actividade fsica moderada a actividade efectuada com

    uma intensidade de 3-6 METs (taxa metablica durante a realizao de trabalho/ taxa metablica em

    repouso) o equivalente a marcha (caminhar em passo rpido) a 5-6.7 kph para a maior parte dos adultos

    saudveis.

    Esta definio de actividade fsica est intimamente relacionada, mas difere, das definies de

    exerccio fsico e de forma fsica (physical fitness).

    O exerccio fsico um subsetde actividade fsica, definido como um movimento corporal planeado,

    estruturado e repetitivo efectuado para manter ou melhorar um ou mais componentes da forma/capacidade

    fsica.

    A forma fsica (physical fitness) um conjunto de atributos inatos ou adquiridos que se relacionam

    com a capacidade de realizar actividade fsica.

    Adaptaes fisiolgicas ao exerccio

    A expresso exerccio fsico aplica-se a uma variedade de actividades fsicas, que diferem

    largamente quanto sua intensidade, durao e quanto s capacidades exigidas para a sua prtica. No

    entanto, todas elas consistem de uma srie de aces musculares que conduzem a uma alterao do estado

    basal do organismo. Esta modificao visa o fornecimento de energia ao tecido muscular envolvido e a

    manuteno da homeostasia local e sistmica. Estas mudanas constituem adaptaes que no tm apenas

    um carcter imediato (agudo), mas tambm retardado (crnico) e que tornam possvel no s a sobrevivncia

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    do organismo durante o decorrer do exerccio, mas que tambm o preparam para solicitaes posteriores,

    reparando os tecidos danificados e aumentando a sua capacidade funcional.

    O aumento das necessidades dos msculos envolvidos num exerccio suprido pelo aumento do

    aporte local por parte dos sistemas cardiovascular, respiratrio, endcrino e nervoso. Existem mltiplos

    sistemas de sinalizao que pem em contacto os tecidos perifricos com os orgos centrais, determinando

    uma alterao quase imediata da sua funo. Estas respostas constituem as adaptaes agudas do organismo

    ao exerccio e tm por objectivo a manuteno da capacidade funcional e a sobrevivncia do indivduo

    durante a durao do mesmo. No fim do exerccio, para alm das respostas agudas, que visam um retorno

    rpido a um estado de equilbrio mais prximo do basal, so sobretudo importantes, as adaptaes crnicas

    ao exerccio. Estas adaptaes visam a reparao do organismo aps uma agresso fsica, qumica e

    metablica, procurando tambm aumentar a sua capacidade de sobreviver perante uma agresso da mesma

    natureza no futuro. Estas alteraes ocorrem tanto ao nvel dos msculos envolvidos no exerccio como nos

    sistemas que os sustm, demorando horas/dias/semanas a estabelecerem-se.

    Adaptaes musculares agudas ao exerccio

    O tecido muscular esqueltico est envolvido no exerccio de uma forma voluntria na medida em

    que o praticante escolhe a forma, a direco e a intensidade com que executa os seus movimentos. Pode

    orientar o seu esforo de acordo com os resultados que visa obter e com o feedback sensorial que recebe,

    nomeadamente as sensaes tcteis, proprioceptivas e de fadiga local e sistmica. No entanto, no toma

    conscincia individual dos msculos envolvidos num determinado movimento, dos seus sinergistas ou

    antagonistas ou da forma como se processa a utilizao das suas fibras musculares. Neste papel assumem

    importncia fulcral os mecanismos de memria motora que permitem associar de uma forma automtica

    movimentos elementares, compondo tarefas complexas. Os mecanismos desta aprendizagem so dinmicos

    (processam-se desde a nascena) extremamente complexos e ultrapassam o mbito deste texto. Na sua

    gnese de salientar a funo desempenhada pelos orgos proprioceptivos musculares e tendinosos (fusos

    neuromusculares e orgos de Golgi) que, por serem sensveis ao estiramento e tenso respectivamente,permitem controlar a fora com que se realizam os movimentos, adequando-a resistncia encontrada e aos

    limites estruturais dos tecidos.

    A adaptao muscular aguda a um aumento da resistncia passa pelo aumento da frequncia, do

    nmero e do tipo de fibras musculares recrutadas. Compreende-se facilmente que aumentando o nmero de

    unidades motoras em despolarizao em dado momento e a frequncia com que se d essa despolarizao

    produz-se um maior encurtamento/desenvolvimento de fora muscular. No entanto, este recrutamento

    ordenado. Numa dada unidade motora, todas as fibras contraem-se ou relaxam-se sincronamente, de acordo,

    com o estado de excitao/inibio do motoneurnio correspondente. Este estado depende do balano dasaferncias excitatrias/inibitrias que sobre ele actuam num dado momento. Simultaneamente, impossvel

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    contrair simultaneamente todos as fibras de um determinado msculo, mesmo em esforo mximo, pois o

    aumento de tenso intramuscular e sobretudo da tenso que se exerce sobre os tendes e o estiramento dos

    msculos antagonistas, determina a inibio parcial dos motoneurnios- agonistas. Este um mecanismo

    de segurana que limita e uniformiza a tenso e potencia a resistncia muscular permitindo que ocorram

    ciclos de actividade/descanso entre as suas fibras. Todavia a percentagem mxima de fibras que possvel

    recrutar a um dado momento varia entre indivduos e parece contribuir para a sua inclinao gentica para

    actividades de fora ou resistncia.

    Os primeiros motoneurnios a serem recrutados so aqueles mais facilmente despolarizados, ou seja

    aqueles para que necessrio um estmulo menor para atingir um potencial de aco. O principal factor de

    que depende esta sensibilidade a sua superfcie de membrana, ou mais simplesmente as suas dimenses.

    Como os motoneurnios mais pequenos enervam unidade motoras constitudas por fibras mais pequenas esta

    situao traduz-se na activao primria das fibras musculares do tipo I. De seguida, so activadas fibras de

    maiores dimenses, dos tipos I, IIa e IIb sucessivamente, contribuindo para uma gradao crescente da fora

    desenvolvida at ser atingido o objectivo ou o limite muscular. A partir do momento em que atingido o

    limiar de despolarizao das fibras maiores as fibras mais pequenas encontram-se em constante activao. O

    recrutamento portanto incremental. Um maior desenvolvimento de fora significa, simultaneamente, a

    possibilidade de vencer uma resistncia maior ou de executar um movimento mais rapidamente. Com o

    recrutamento de fibras de maiores dimenses no s aumenta a superfcie contrctil como tambm diminui a

    carga por unidade contrctil o que permite que o ciclo das ponte cruzadas se efectue mais rapidamente,

    resultando velocidades de contraco mais elevadas.

    O princpio de recrutamento de fibras de acordo com o tamanho explica no s a sequncia, mas

    tambm algumas propriedades da funo muscular. Como para cargas ligeiras recrutado um reduzido

    nmero de fibras de pequenas dimenses do tipo I possvel suster esse esforo durante um perodo

    prolongado sem que surja fadiga. O pequeno nmero de fibras permite que as fibras que a um dado momento

    se encontram em esforo sejam eventualmente substitudas por outras que anteriormente se encontravam

    em repouso. Por outro lado, as caractersticas das fibras do tipo I permitem que as suas necessidades

    energticas sejam supridas pela fosforilao oxidativa optimizando o gasto de ATP e minimizando a

    produo de cido lctico. Inversamente, para esforos mximos ou submximos a necessidade derecrutamento das fibras tipo IIb implica o predomnio da produo de energia pela via glicoltica, com baixo

    rendimento energtico e rpida instalao da fadiga muscular.

    O tempo de exerccio exige paralelamente uma adaptao por parte da funo muscular

    nomeadamente no que diz respeito s fontes de energia. Durante os primeiros abalos (milissegundos) a

    energia disponibilizada de uma forma imediata pelo ATP que se encontra na citoplasma da clula em

    condies basais. Este existe em quantidades insuficientes para a manuteno do esforo, pelo que o msculo

    recorre aos fosfatos de alta energia contidos na fosfocreatina (que reage com o ADP, formando ATP). O

    sistema creatina/fosfocreatina responsvel pelo transporte de equivalentes energticos do interior damitcondria para o citoplasma. Neste perodo, a acumulao de ADP no citoplasma (alguns segundos) leva a

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    um aumento da actividade das enzimas da via glicoltica, que atravs da oxidao da glicose a piruvato e

    deste a lactato (via glicoltica) obtm rapidamente grandes quantidades de energia custa de um elevado

    consumo de glicose e glicognio, com baixo rendimento energtico (2 molculas de ATP) e com produo

    de cido lctico. Um exerccio de elevada intensidade pode, nestas condies, durar no mximo 60-90s aps

    o que a acidificao do meio, as alteraes hidroelectrolticas locais e a baixa da glicose disponvel

    conduzem fadiga muscular. Para exerccios de intensidades mais moderadas, so activadas vias

    metablicas que a curto prazo no realizam tantos equivalentes energticos, mas que so viveis durante

    mais tempo e so mais eficientes. Dependendo da intensidade do exerccio, ele poder prolongar-se

    indefinidamente. A fosforilao oxidativa satisfaz as necessidades energticas sobretudo das fibras tipo I e

    IIa, permitindo que mantenham a sua actividade por um longo perodo de tempo. Numa primeira fase, a

    glicose transformada em piruvato, este transportado para o interior da mitocndria e pela aco da

    desidrogenase do piruvato transformado em acetil-coA. Este por sua vez participa na via dos cidos

    tricarboxiclicos, em que oxidado at CO2 e H20. O oxignio funciona como aceitador final de electres na

    cadeia de oxidaes/redues mitocondrial em que so sucessivamente oxidados o NADH + H+, o NAPH +

    H+ e os citocromos. A energia dessas reaces usada para criar um gradiente electroqumico atravs da

    membrana interna da mitocndria, que por sua vez fornece a energia para produzir ATP. Por esta razo, se

    designa esta via por aerbia, em contraste com a anterior para a qual o oxignio no era necessrio, sendo

    portanto conhecida como via anaerbia. medida que a glicose consumida no citoplasma, a clula recorre

    ao glicognio intracelular e glicose plasmtica. Com a diminuio destes pools o fgado reage subida de

    glicagina (estimulada no pncreas pela queda da glicemia) disponibilizando o glicognio armazenado nesse

    orgo. Simultaneamente, a nvel perifrico ocorre mobilizao dos cidos gordos armazenados a nvel dos

    adipcitos, com a sua libertao para a circulao. Os cidos gordos so uma fonte a longo prazo de energia

    sob a forma de acetil-coA para as clulas musculares, especialmente para as do tipo I.

    O fluxo sanguneo ao tecido muscular sofre necessariamente um aumento em situaes de exerccio.

    Em condies de repouso, os vasos musculares encontram-se sob o controlo (tono) predominante do sistema

    nervoso simptico, ou seja permanecem em vasoconstrio. Existem inmeros esfncteres pr-capilares,

    constitudos por msculo liso que impedem parcialmente o fluxo sanguneo no leito vascular muscular. Em

    repouso, o tono simptico influenciado principalmente pela informao proveniente dos baroreceptoresperifricos, nomeadamente do seio carotdeo. Um aumento de presso neste receptor leva a uma queda no

    tono simptico muscular, originando um grau de vasodilatao. O leito vascular muscular pela sua extenso

    desempenha um papel importante na regulao da presso arterial. Numa situao de exerccio, a resposta

    central ao incio do mesmo uma descarga simptica pela libertao sistmica (supra-renal) e local de

    adrenalina e noradrenalina respectivamente. A noradrenalina, actuando sobre receptores e , produz

    principalmente vasoconstrio, enquanto que a adrenalina tem para, baixas doses, uma aco

    predominante, induzindo vasodilatao. Em doses mais elevadas produz igualmente vasoconstrio. Nos

    msculos directamente envolvidos no exerccio, contudo, os factores locais de regulao vascularsobrepem-se aos factores neurais. Os metabolitos produzidos, o aumento da presso parcial de CO2, uma

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    eventual hipxia locais, as perdas de potssio para o meio extracelular, acidificao do mesmo e a libertao

    de adenosina actuam directamente sobre o msculo liso vascular relaxando-o. O sangue assim

    efectivamente desviado da circulao esplnquica, cutnea e dos leitos dos msculos inactivos para as

    regies de maior consumo de energia, oxignio e de maior produo de metabolitos. Existem outros leitos

    particulares, como o cerebral, cardaco, pulmonar e muscular respiratrio, que possuem mecanismos prprios

    de regulao que impedem a queda excessiva do fluxo sanguneo. O fluxo sanguneo muscular pode

    aumentar cerca quinze a vinte vezes. Em determinados exerccio, especialmente os isomtricos e os

    isotnicos ps-carregados realizados contra resistncias elevadas, a contraco muscular intensa, exerce uma

    presso sobre os vasos que pode conduzir sucessivamente interrupo do fluxo venoso e depois arterial.

    Em exerccios com cargas menores, a contraco muscular sucessiva exerce uma aco de bomba sobre o

    leito vascular, favorecendo o retorno venoso. O aumento do retorno venoso um importante factor

    determinante da funo cardaca durante o exerccio pelo efeito de pr-carga exercido.

    O aumento das necessidades de consumo de oxignio pelo msculo durante o exerccio reflecte-se

    no aumento do gradiente deste gs do exterior para o interior da clula, o que favorece a sua difuso. No

    interior da clula (especialmente nas fibras tipo I) a mioglobina funciona simultaneamente como reserva e

    como transportador de oxignio. A traduo imediata do consumo de oxignio fenmeno o aumento da

    diferena arteriovenosa de oxignio, que se reflecte nas trocas gasosas pulmonares. Nas condies que se

    estabelecem durante o exerccio, as trocas so facilitadas pelo desvio da curva de dissociao da

    oxihemoglobina. A produo de CO2 e de cido lctico, o aumento de temperatura e a acumulao de 2,3-

    bifofoglicerato nos eritrcitos desviam a curva para a direita, o que se traduz numa maior dissociao entre o

    oxignio e a hemoglobina para qualquer presso parcial.

    comum constatar que no fim de um exerccio os membros envolvidos manifestam algum grau de

    edema e de rubor. Tal deve-se no s ao aumento de fluxo sanguneo mas tambm a uma perda de fludos

    para o espao extracelular secundrio ao aumento da osmolaridade do mesmo e ao aumento da presso

    hidrosttica nos capilares (maior fluxo sanguneo muscular). O aumento da presso osmtica extracelular

    segue-se perda de ies, sobretudo potssio, para aquele espao, no contexto de sucessivos potenciais de

    aco em que a repolarizao se d custa da perda deste io para o exterior. Paralelamente, h um uptake

    passivo de sdio para o interior da clula, por razes idnticas. Nas clulas o balano hidroelectroltico favorvel absoro de volumes de gua considerveis. Este fenmeno verifica-se para quaisquer

    intensidades de exerccio, invertendo-se apenas se a durao do mesmo extremamente longa. O aumento de

    potssio plasmtico na sequncia do exerccio um fenmeno complexo e que no depende apenas do efluxo

    muscular e da contraco de volume plasmtico.

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    Adaptaes musculares crnicas ao exerccio

    As adaptaes crnicas estruturais visam por um lado aumentar a resistncia mecnica dos tecidos e

    por outro aumentar a sua capacidade funcional. importante compreender que, aps o trmino de um dado

    exerccio, o msculo se encontra num estado debilitado, com leses microscpicas mltiplas, especialmente

    ao nvel da membrana celular e do citosqueleto. O ambiente bioqumico tambm ele agressivo na medida

    em que permanecem desequilbrios electrolticos e metablicos locais nos msculos utilizados. No caso de

    ocorrer leso celular extensa com perda de integridade da membrana plasmtica previsvel a morte celular

    e a substituio do segmento de tecido muscular atingido por mioblastos ou fibrose dependendo da

    integridade ou ruptura da membrana basal, respectivamente. Os detritos celulares activam clulas com

    competncia imunolgica para o local da leso originando uma resposta inflamatria aguda, que culmina

    com a digesto desses detritos. A resposta inflamatria a responsvel pelas dores musculares do dia

    seguinte. Neste contexto fcil compreender a importncia da recuperao muscular antes da aplicao de

    um novo estmulo. De uma forma terica podemos afirmar que o exerccio deve ser aplicado como um

    frmaco, ou seja, devemos procurar a dose mnima capaz de estimular a resposta ptima e admnistr-la

    em perodos tais que permitam a recuperao do organismo e a minimizao dos efeitos laterais.

    No msculo esqueltico, a resposta aplicao de cargas que representem uma % elevada da fora

    mxima a hipertrofia. Esta ocorre no s a nvel das clulas musculares, mas tambm a nvel do tecido

    conjuntivo que o constitui, nomeadamente os tendes. Este processo no resto exclusivo do tecido

    muscular ocorrendo igualmente a nvel sseo, cardaco e na generalidade dos tecidos plsticos. Ao contrrio

    da maioria destes tecidos, o msculo esqueltico no , pelos menos de uma forma significativa, capaz de

    aumentar o nmero de clulas que o constitui. O aumento do nmero de clulas seria uma forma de distribuir

    a carga por um maior nmero de elementos celulares. O msculo distribui a carga por uma maior rea de

    seco. O aumento da rea de seco faz-se custa do aumento do contedo do msculo em protenas

    contrcteis (miosina, actina, troponina,...) e do aumento do nmero de ncleos que o constitui (visto ser um

    tecido sincicial). As estruturas responsveis pela transmisso da fora aumentam tambm tendendo para a

    normalizao da tenso por rea de seco. A nvel celular, esta transmisso efectua-se pelos chamados

    complexos de adeso focal, que so um conjunto de protenas (integrinas, adesinas) que faz a ligao entre oscitosqueletos de clulas adjacentes e entre estes e a matriz extracelular. O aumento das dimenses das clulas

    musculares, reflecte-se num aumento global da massa do msculo constituindo o fenmeno de hipertrofia. O

    chamado treino de fora diz respeito a um conjunto de exerccios de curta durao (20-120s), que so

    realizados com percentagens elevadas da fora mxima para um dado grupo muscular. Este tipo de treino

    favorece sobretudo uma resposta hipertrfica com aumento do dimetro global das fibras, mas sobretudo das

    fibras tipo II. Paralelamente parece haver no haver alterao da densidade capilar, mas ocorre uma

    diminuio da densidade mitocondrial muscular, por aumento quantitativo da maquinaria contrctil no

    acompanhado pelo crescimento dos outros elementos. Ocorre um aumento da concentrao das enzimasenvolvidas no metabolismo glicoltico, como por exemplo a desidrogenase do lactato, da miocnase e da

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    hexocnase com uma diminuio paralela da actividade enzimtica oxidativa. As fibras do tipo IIb ao longo

    do tempo sofrem transformaes na sua expresso proteica e assumem fentipos intermedirios ou mesmo o

    das fibras IIa.

    O referido aumento do nmero de ncleos da clula muscular resultado da fuso das clulas

    musculares adultas com mioblastos provenientes da activao de clulas satlite. Estas clulas existem no

    interstcio do tecido muscular e tm, em parte, a mesma origem embrionria, mas permanecem quiescentes e

    indiferenciadas. Mediante a leso muscular com libertao de factores de crescimento locais parcrina (IGF,

    FGF, NO) sofrem activao e contribuem para a reparao das fibras, fundido-se com elas. controverso o

    papel que podero ter na gnese de novas fibras, sendo possvel afirmar que a ser verdade tal acontecimento

    no muito frequente na vida adulta. Os mesmos factores de crescimento acima mencionados e produzidos

    pelos prprios micitos e pelos fibroblastos so um dos estmulos para a snteses de protenas contrcteis.

    Eles actuam ligando-se a protenas de membrana que actuando como receptores transmembranares fazem a

    ligao com segundos mensageiros. Estes segundos mensageiros so tipicamente cnases da serina ou da

    treonina, que fosforilam uma sequncia de protenas intracelulares, culminando na expresso de

    protooncogenes. Estes genes (fos, jun, myc) regulam a progresso do ciclo celular nas clulas capazes de

    diviso, mas no caso particular dos micitos induzem a sntese das protenas contrcteis e das protenas

    responsveis pelas vias metablicas prevalentes no exerccio em questo (actina, miosina, troponina,

    tropomiosina). tambm notrio o desenvolvimento do retculo sarcoplasmtico que acompanha a

    hipertrofia da maquinaria contrctil. As propriedades contrcteis do msculo hipertrofiado so em geral

    semelhantes s do msculo no treinado, apresentando no entanto um desenvolvimento de fora inferior por

    rea de seco. Esta aparente queda compensado pelo aumento extraordinrio do dimetro mdio das

    fibras. O tempo at ao desenvolvimento do pico de tenso permanece inalterado com o treino sendo inferior

    do que, por exemplo, aquele exibido pelos atletas de resistncia. O aumento da maquinaria contrctil parece

    ocorrer separadamente do desenvolvimento do aparelho oxidativo o que justifica no s um diminuio da

    densidade mitocondrial, mas da das prprias enzimas oxidativas e da mioglobina.

    A prpria leso estrutural que o msculo sofre durante o exerccio parece ser importante para o

    processo de crescimento. At certo ponto, as descontinuidades da membrana parecem permitir a passagem de

    clcio do meio extracelular para o meio intracelular em grandes quantidades, o que poder desempenhar umprocesso de activao de mecanismos intracelulares de sinalizao dependentes do clcio. Estas

    descontinuidades so uma consequncia directa do stress mecnico sobre a parede e parecem desempenhar

    um papel no crescimento no s deste tecido, mas tambm do endotlio e dos msculos liso e cardaco.

    Se as alteraes estruturais assumem um particular importncia na adaptao ao treino de fora,

    conferindo, atravs da hipertrofia, um aumento das capacidades mecnicas, outras adaptaes adquirem

    particular importncia face a outros tipos de treino. O designado treino de resistncia induz uma resposta

    adaptativa que passa sobretudo pelas propriedades metablicas do tecido muscular. Estruturalmente verifica-

    se uma discreta atrofia das fibras do tipo II e uma transformao fenotpica que as aproxima das fibras tipo I(expresso de isoformas lentas de miosina). Nestas ltimas particularmente evidente o aumento da

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    densidade capilar e mitocondrial. O aumento da densidade capilar proporciona no s uma maior superfcie

    de troca com o sangue, mas sobretudo prolonga o tempo de trnsito do mesmo, uma vez que a velocidade do

    fluxo no sistema arterial est muito aumentada durante o esforo. Os capilares neoformados distibuem-se

    preferencialmente em redor das reas do msculo que contm fibras oxidativas. A actividade oxidativa

    parece ser um importante estmulo para a expanso do leito vascular. As enzimas responsveis pela via

    aerbia, ou seja aquela que fornece a maioria da energia nos exerccios de resistncia, aumentam

    quantitativamente. Nos msculos treinados possvel encontrar actividade aumentada da desidrogenase do

    succinato, da desidrogenase do NADH, da rectudase do citocromo c e da oxidase do citocromo, entre outras.

    Desenvolve-se uma maior capacidade oxidativa dos cidos gordos e dos corpos cetnicos. O contedo

    proteico da fraco mitocondrial aumenta significativamente. O desenvolvimento da maquinaria oxidativa

    vantajosa no propriamente pelo aumento da capacidade oxidativa total do msculo, ou seja, pelo aumento

    da sua capacidade de consumir oxignio, mas antes por criar uma reserva homeosttica. Por este conceito

    entende-se que, existindo um maior nmero de mitocndrias e enzimas da via aerbia, possvel obter a

    mesma actividade oxidativa com um estmulo menor. Este estmulo que constitudo nomeadamente pela

    acumulao de ADP, AMP, Pi e amnia (um produto da actividade da deaminase do adenilato sobre o AMP)

    no citoplasma, pode, se suficientemente intenso, activar a via glicoltica. Retardando a sua activao a clula

    consegue satisfazer as suas necessidades usando os cidos gordos como fonte de energia a longo prazo,

    retardando a depleo de glicose celular, a acidificao citoplasmtica e subida plasmtica dos nveis de

    lactato. Para a mesma intensidade de treino, um indivduo treinado exibe uma menor produo de lactato, um

    maior consumo de cidos gordos e uma mais lenta depleo de glicose e glicognio. As adaptaes

    metablicas e estruturais acima descritas so rapidamente reversveis (algumas semanas) com a paragem do

    treino muscular. A rapidez da reversibilidade parece ser inversamente proporcional durao do perodo de

    treino, ao longo do qual se adquiriram as adaptaes.

    As modificaes oxidativas diferem conforme o tipo de fibra muscular considerado. Elas so mais

    evidentes nas fibras tipo IIb, que no seu estado no treinado tm uma actividade oxidativa reduzida. Com o

    treino tornam-se do ponto de vista enzimtico e mitocondrial muito semelhantes ao padro das fibras tipo I.

    O fentipo das fibras est intimamente relacionado com o padro de actividade dos motoneurnios que

    inervam a unidade motora a que pertencem. Com a alterao da frequncia de activao e do padro derecrutamento, durante o treino, so induzidas alteraes na expresso proteica.

    Adaptaes cardiovasculares e respiratrias agudas ao exerccio

    A funo do sistema cardio-respiratrio conduzir o oxignio, nutrientes e hormonas at aos tecidos

    perifricos, retirando simultaneamente os subprodutos do metabolismo. Durante a prtica de um exerccio

    em resposta ao aumento do ritmo metablico do tecido muscular, este sistema acompanha esse aumento de

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    funo. Posteriormente e com as adaptaes crnicas do tecido muscular, surge a necessidade de evoluo do

    sistema de forma a poder suprir exigncias crescentes.

    do conhecimento geral que durante o exerccio, os seus praticantes sentem um desconforto

    proporcional intensidade e que resulta da taquicardia e taqui/polipneia que se instalam. O ritmo cardaco

    encontra-se principalmente sob controlo central que exerce a sua funo pelos nervos cardacos autonmicos,

    sendo o tono predominante o da diviso parassimptica. Os centros de controlo localizam-se no crtex

    frontal, tlamo e regies posterolaterais do hipotlamo. Estes centros determinam as respostas cardacas

    ansiedade, excitao, estados emocionais e no caso do hipotlamo a mudanas de temperatura. No contexto

    do exerccio, a resposta cardaca tem origem em reflexos mediados por mecano, baro e quimioreceptores.

    Antes do incio do exerccio possvel observar um aumento nos sinais vitais, que depende de eferncias

    corticais que dizem respeito expectativa da actividade que vai ser realizada e que inibem a actividade

    vagal. Todavia a componente principal da resposta cardiovascular tem um incio coincidente com o do

    exerccio e depende por um lado de uma activao central do sistema simptico e por outro de reflexos com

    origem em quimio e mecanorreceptores perifricos ao nvel dos msculos envolvidos.. Ambos tipos de

    receptores enviam impulsos atravs de fibras nervosas aferentes dos grupos III (pouco mielinizadas) e IV

    (amielnicas). Os mecanorreceptores so sensveis tenso e ao estiramento e os quimioreceptores

    respondem produo local de metabolitos musculares. A activao central e as aferncias perifricas

    determinam o aceleramento da freq. cardaca, aumento da contractilidade cardaca e vasoconstrio

    generalizada, proporcionalmente intensidade e durao do exerccio e quantidade de massa muscular

    envolvida. A vasoconstrio no afecta todos os territrios poupando o cerebral, o coronrio e o dos

    msculos activos, ocorrendo nestes dois ltimos um aumento do fluxo. A nvel cutneo inicialmente e pelos

    mesmos mecanismos d-se vasoconstrio, que se inverte com o incio dos mecanismos compensadores do

    aumento da temperatura corporal secundrio actividade muscular (sudao). Para intensidades de exerccio

    muito elevadas o desvio do fluxo para o tecido muscular pode originar vasoconstrio cutnea tardia.

    O dbito cardaco depende de duas componentes: a frequncia cardaca e o volume de ejeco. Em

    situaes de esforo o dbito aumenta em quantidade varivel mas proporcional s necessidades, ao nvel de

    treino do indivduo e sobretudo custa do aumento da frequncia cardaca. Enquanto que esta pode aumentar

    dos valores de repouso de 60-100 batimentos por minuto para cerca do dobro ou mesmo triplo, (Freq.cardaca mxima220-idade) o aumento do volume de ejeco no ultrapassa normalmente os 10-35%.

    Paralelamente d-se o aumento do retorno venoso, secundrio s contraces sucessivas dos msculos

    activos que ajudam a propulsionar o sangue das veias para o lado direito do corao. O aumento da

    amplitude dos movimentos inspiratrios, reduz a presso intratorcica e facilita igualmente o enchimento

    cardaco. Apesar do aumento do volume que chega ao corao, atravs do aumento do dbito cardaco a

    presso de enchimento cardaco e a presso ventricular telediastlica permanecem constantes. Por essa razo

    at intensidades de exerccio mximas ou submximas, o mecanismo de Frank-Starling no contribui para o

    aumento do dbito cardaco. A sua contribuio importante apenas para o ajuste da funo cardaca aoincio do esforo, sendo secundria quando atingido um steady-state. As observaes feitas anteriormente

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    relativamente ao dbito cardaco dizem respeito aos exerccios classificados como de resistncia. Os

    exerccios que envolvem contraces isomtricas ou isotnicas ps-carregadas contra uma elevada

    resistncia induzem igualmente um aumento da frequncia cardaca, mas que no to marcado. No se

    verifica uma subida do volume de ejeco. De igual forma o retorno venoso no est aumentado pois as

    contraces sustentadas que acompanham estes exerccios no exercem um efeito de bomba sobre o volume

    vascular venoso dos msculos envolvidos. Pode-se dizer que o aumento do dbito cardaco que

    acompanharia o aumento da frequncia cardaca contrariado pelo aumento da ps-carga, ou seja, das

    presses vasculares perifricas (efeito das massas musculares em contraco sustentada). As ansas presso

    volume do ventrculo esquerdo demostram sobretudo um deslocamento para a direita, com aumento

    concomitante das presses mximas e mnimas.

    Nas junes venoauriculares de ambos os lados do corao existem receptores sensveis presso

    que determinam simultaneamente reflexos com efeitos opostos: o reflexo de Bainbridge e o reflexo

    barorreceptor. Uma infuso de fludos ou no contexto do exerccio, um aumento do retorno venoso

    estimulam estes receptores, que enviam impulso centriptamente pelo nervo vago at aos centros

    vasomotores. As vias eferentes so simultaneamente os sistemas simpticos e parassimpticos cardacos. A

    resposta final, aumento ou diminuio do ritmo cardaco depende do estado de contraco ou expanso do

    volume plasmtico. A contraco conduz taquicardia e a expanso bradicardia. O estiramento das paredes

    das aurculas tem ainda o efeito da libertao local de peptdeo natriurtico auricular, que tem uma aco

    vasodilatadora dos vasos de resistncia e de capacitncia, para alm de um efeito diurtico e natriurtico

    renal. Os barorreceptores localizados no arco artico e seio carotdeo regulam a presso arterial, exercendo

    na actividade cardaca um efeito no sentido oposto variao da presso arterial. As subidas da mesma

    levam activao parassimptica e diminuio do ritmo e vice-versa. O ritmo cardaco tambm alvo de

    regulao por quimioreceptores, que participam paralelamente na regulao da resposta ventilatria. A

    estimulao destes quimioreceptores por exemplo por uma subida da PaCO2 conduz estimulao do centro

    vagal no bolbo, do que resulta uma queda do ritmo cardaco. Este efeito no entanto encontra-se em equilbrio

    com a resposta ventilatria uma vez que esta estimulado pelos mesmos quimioreceptores nas mesmas

    condies. A hiperventilao condiciona hipocapnia e activao de mecanorreceptores pulmonares sensveis

    ao estiramento que por sua vez enviam aferncias ao mesmo centro vagal. A sua aco a inibio domesmo, do que resulta o aceleramento da freq. cardaca. A regulao exercida pelos quimioreceptores tem

    portanto duas componentes, sendo o efeito global atenuado e o resultado uma pequena variao da

    frequncia cardaca.

    O aumento do dbito cardaco parece ser o principal responsvel pelo aumento da presso arterial

    que se observa durante o exerccio. Este aumento proporcional intensidade do exerccio e resistncia

    aplicada pelas razes j apontadas. Para exerccios de resistncia as resistncias vasculares perifricas sofrem

    um decrscimo, que resulta da vasodilatao dos territrios musculares activos. Evidentemente os exerccios

    isomtricos ou isotnicos com elevada ps-carga induzem um aumento global das resistncias vascularesperifricas e logo da presso arterial. Contudo, esta no parece atingir valores considerados perigosos, no se

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    encontrando contra-indicados os exerccios referidos para indivduos saudveis ou mesmo com patologia

    coronria. Em ambos os casos, o aumento da presso arterial verifica-se sobretudo custa do componente

    sistlico que por sua vez resulta de um maior volume de ejeco (nos exerccios de resistncia) e no de um

    aumento da velocidade de ejeco.

    A intensidade e a durao do exerccio podem-se prolongar enquanto o organismo tem a capacidade

    de responder s necessidades dos msculos. Existem limites individuais quantidade sangue oxigenado que

    pode chegar num dado perodo de tempo aos tecidos activos. Como ao nvel do mar e para qualquer

    intensidade de exerccio os pulmes de um indivduo normal so capazes de manter o sangue completamente

    oxigenado, a limitao no de natureza pulmonar. De facto o valor de consumo mximo de oxignio

    (medido como a diferena de oxignio entre o ar inspirado e expirado) atinge-se antes da intensidade

    mxima de exerccio. Este valor conhecido como VO2mx. O corao por outro lado atinge um dbito

    cardaco mximo, a partir do qual no possvel aumentar. Se esse dbito no permite satisfazer as

    necessidades musculares de oxignio, verifica-se rapidamente uma acumulao local de metabolitos

    acompanhada de um desconforto e mesmo dor. medida que as fibras musculares insuficientemente

    nutridas se fatigam vo sendo recrutadas outras fibras que normalmente no estariam em funcionamento para

    aquela carga. Por fim, so recrutadas fibras de contraco rpida, assumindo a via anaerbia um papel

    progressivamente maior na produo muscular de energia. Exausta esta capacidade temporria, o praticante

    tem de, no mnimo, reduzir a intensidade do exerccio.

    Durante o exerccio, especialmente no seu incio e quando atingido o dbito cardaco mximo,

    (VO2mx), o fornecimento de oxignio aos msculos insuficiente, criando-se uma dvida de oxignio.

    No incio do exerccio, no existe um emparelhamento perfeito entre o aporte e o consumo de oxignio. Esta

    deficincia imediata suplantada a nvel energtico pelo desvio da via metablica para a anaerobiose, mas

    eventualmente tem de ser compensada. No final do exerccio o ritmo cardaco e respiratrio permanecem

    elevados durante algum tempo em virtude da necessidade de equilibrar a energia total dispendida com aquela

    produzida pelos mecanismos oxidativos. Para o processo de recuperao essencial que clula regresse ao

    seu estado basal e aos seus nveis iniciais de metabolitos e a dvida de oxignio representa a energia

    dispendida nesse processo.

    Aps o trmino do exerccio, a frequncia cardaca baixa rapidamente, pois cessa a activaosimptica cortical. No regressa no entanto imediatamente aos valores basais. A presso arterial sofre uma

    mudana no mesmo sentido mas estabiliza em valores inferiores aos normais durante um breve perodo. Este

    fenmeno deve-se vasodilatao dos territrios musculares previamente activos, pois ainda permanecem

    neles os factores metablicos e vasoactivos.

    A regulao do sistema pulmonar e respiratrio possui uma caracterstica intrnseca que o distingue

    do anteriormente descrito. O seu controlo simultaneamente voluntrio e automtico. O controlo exercido

    pelas necessidades metablicas sobrepe-se evidentemente vontade durante o exerccio, mas possvel, at

    certo ponto, conscientemente controlar o padro respiratrio. O controlo automtico tem sede em ncleoslocalizados na ponte, mais propriamente na rea respiratria bulbar e no centro pneumotxico.

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    Na mesma regio, esto situados os quimioreceptores centrais, mais exactamente na superfcie

    ventrolateral do bolbo, que so responsveis por cerca de 75% da resposta ventilatria a aumentos de Pa

    CO2. Os restantes 25% so da responsabilidade dos quimioreceptores perifricos localizados nos corpos

    carotdeos. Subidas do PaCO2 entre os 40mm Hg e os 100mm Hg levam a um rpido aumento do ritmo e do

    volume respiratrio. A sensibilidade ao CO2 varia de acordo com o estado de alerta do indivduo e com a

    concentrao de hidrogenio no LCR. Durante o sono e na alcalose as resposta so menores e vice-versa. Em

    condies basais a PaO2 no um determinante importante para o ritmo respiratrio e a principal varivel

    determinante da ventilao a Pa CO2. Quando o nvel de PaO2 se aproxima dos nveis de hipxia os nveis

    de radicais livres de oxignio nos corpos carotdeos caem e desencadeiam a activao dos quimioreceptores

    a presentes. Nessa situao a resposta ventilatria exponencial face queda dos nveis de PaO2. O limiar

    de sensibilidade PaO2 por sua vez dependente dos nveis de PaCO2. Quando este sobe os

    quimioreceptores tornam-se mais sensveis ao oxignio arterial. So igualmente importantes

    quimioreceptores venosos, especialmente pelo facto de poderem detectar alteraes no CO2 e O2 venoso, j

    que a nvel arterial estas s se verificam em exerccios extenuantes. Existem tambm mecanorreceptores, no

    s a nvel muscular perifrico, mas tambm no sistema cardiovascular, nas circulaes pulmonar e sistmica.

    As variaes de temperatura durante o esforo sensibilizam os quimioreceptores para os nveis gasosos.

    No decorrer do exerccio o aumento do dbito cardaco direita, acomodado pela elevada

    distensibilidade e pela baixa resistncia da rede vascular pulmonar e a presso de perfuso pulmonar sobe

    apenas moderadamente. So recrutados capilares pulmonares pelos quais no existe circulao significativa

    durante o repouso o que leva ao aumento da superfcie disponvel para trocas gasosas e a uma razo

    ventilao/perfuso mais favorvel. A expanso do espao morto anatmico, secundria diminuio da

    presso pleural inspiratria (torna-se mais subatmosfrica) e dilatao das vias areas compensada pela

    melhor razo vent/perf que diminui o espao morto fisiolgico. Para intensidades de exerccio inferiores

    mxima os valores do pH arterial, PaO2 e PaCO2 mantm-se praticamente inalteradas em relao a situaes

    de repouso. Paralelamente observa-se uma queda do pH, O2 e uma subida do CO2 venoso, que contudo

    inteiramente compensada a nvel pulmonar. Os mecanismos normais de regulao da ventilao,

    especialmente os receptores sensveis ao CO2 mantm os nveis dentro normalidade aumentando o volume

    corrente e a freq. respiratria proporcionalmente ao exerccio. Quando se atingem intensidades prximas domximo, o dbito cardaco no acompanha a subida das necessidades oxidativas das clulas musculares e

    estas comeam a produzir a sua energia pela via anaerbia. Um dos produtos finais desta via cido lctico,

    que altera o pH sanguneo. O nvel exertivo em que se estabelece a produo de quantidades de cido lctico

    tais que se desenvolve um nvel sustentado de acidose metablica designa-se limiar anaerbio. Ultrapassado

    este limiar observa-se uma resposta quase explosiva ao exerccio com taquicardia e taqui/polipneia

    marcadas. Os nveis arteriais de O2 sofrem um aumento, assim como o volume de CO 2 no ar expirado ao

    passo que os nveis de PaCO2 sofrem uma queda. Obviamente apesar da queda do CO 2, a respirao no

    uma compensao efectiva para um desequilbrio metablico e este nvel de actividade desencadeiarapidamente a fadiga.

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    Adaptaes cardiovasculares crnicas

    Para alm da j referida angiognese capilar que ocorre a nvel muscular, o sistema cardiovascular

    sofre transformaes que o tornam mais capaz, a longo prazo, de sustentar o tecido muscular em graus de

    actividade progressivamente maiores. Actualmente a fisiologia do exerccio centra muita da sua ateno

    sobre as particularidades destas adaptaes uma vez que o sistema em causa sede de patologia muito

    prevalente. Esta abordagem tem as suas origens no incio do sculo com o estudo da performance dos atletas

    em provas de resistncia e com a pesquisa de ferramentas que a permitissem avaliar e tornar previsvel com

    base em princpios fisiolgicos. Foi ento desenvolvida a tcnica do clculo do VO2mx. individual, que

    mais tarde se veio a revelar como um bom instrumento e para avaliar a funo cardaca (dbito cardaco).

    Mais tarde com os estudos epidemiolgicos que vieram revelar a crescente incidncia das doenas

    cardiovasculares e da sua associao com os estilos de vida, a performance no exerccio tem vindo a ser

    interpretada como um reflexo da sade cardiovascular.

    O consumo mximo de oxignio durante o exerccio calculado como a diferena do contedo entre

    oxignio entre o ar inspirado e o ar expirado. igualmento possvel calcul-lo pelo produto do dbito

    cardaco pela diferena arteriovenosa de O2. Quando consideramos a origem e o destino que esse oxignio

    tem aps abandonar os espaos alveolares, vemos que existe uma srie de sistemas entre os pulmes e as

    mitocndrias musculares que podem limitar a quantidade de oxignio que possvel transportar num dado

    perodo de tempo. Apesar de a nvel pulmonar existir uma barreira fsica constituda por pelas paredes dos

    alvolos e dos capilares, durante o exerccio, o gradiente de oxignio entre o sangue venoso e o ar alveolar

    aumenta, assim como h uma melhor distribuio da perfuso face ventilao. Estes dois ltimos factores

    contribuem para que ao nvel do mar os pulmes sejam capazes de saturar todo o sangue que percorre a sua

    rede vascular, em qualquer situao. Nestas condies o sistema pulmonar no constitui uma limitao no

    consumo de oxignio. Todavia, indivduos altamente treinados possuem um dbito cardaco altamente

    elevado, tanto do lado esquerdo como do lado direito do corao, resultando um fluxo sanguneo

    extremamente rpido pelos capilares pulmonares, com perda de capacidade de saturao. Nestes casos

    excepcionais o VO2mx. encontra-se parcialmente limitado pela funo pulmonar. De seguida, encontramos

    o sistema de bomba cardaco, cuja responsabilidade a propulso do sangue para o organismo, adequando oaporte ao consumo de oxignio. Aqui encontramos a verdadeira limitao para o consumo mximo de

    oxignio. Apesar de poder aumentar o seu dbito custa da frequncia e do volume de ejeco o sistema

    ventricular estabiliza num plateau a partir do qual no possvel bombear mais sangue por unidade de

    tempo. Quando consideramos o tecido muscular observamos que quando se atinge o VO2mx., j se

    ultrapassou o limiar anaerbio, o que pode ser interpretado como uma insuficincia no aporte do oxignio

    que determina o recrutamento da via anaerbia. De facto o tecido muscular capaz de consumir mais

    oxignio do que aquele que lhe chega durante um exerccio de resistncia que envolva grandes grupos

    musculares. Estudos recentes mostram que mesmo em condies ptimas o msculo no usa todo o seupotencial oxidativo. Apesar das barreiras fsicas e enzimticas que possam existir a este nvel, o tecido

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    muscular no constitui portanto um limite para a quantidade de oxignio consumvel. Conclumos portanto

    que na maior parte das circunstncias o VO2mx. uma boa forma de estudo do dbito cardaco mximo,

    que constitui o seu principal factor limitante.

    O problema surge quando tentamos correlacionar a funo cardaca com a performance nos exerccio

    de resistncia. Perante um grupo populacional heterogneo podemos estimar quais os melhores potenciais

    atletas de resistncia pelo clculo do seu VO2mx. Mas quando nos debruamos sobre indivduos com

    valores de VO2mx. similares encontramos diferenas no seu desempenho. O VO2mx. est longe de ser o

    nico ndice determinante do desempenho. Por outro lado a sua aplicao est restrita ao campo dos

    exerccio de resistncia. posta em causa hoje a aplicao destes testes que tanto se generalizaram nas

    ltimas dcadas, pois tm sido apontados factores de ordem gentica para a evoluo do VO2mx. com o

    trino, que no reflectem necessariamente a evoluo do desempenho global com o treino. Quando se

    acompanha o treino de indivduos previamente sedentrios verifica-se uma rpida evoluo do VO2mx. nos

    primeiros meses de treino, que estagna posteriormente, apesar de ntida progresso na actividade.

    A grande razo para as limitaes apontadas o papel limitado do aumento do dbito cardaco para a

    performance nos exerccios de resistncia. So igualmente importantes as adaptaes musculares e

    perifricas, que passam pelo aumento da capilaridade, da densidade mitocondrial e enzimtica e pela

    capacidade de recrutar mais fibras musculares para o mesmo movimento (distribuio da carga oxidativa por

    mais mitocndrias). O ltimo factor encontra-se ele prprio relacionado com a evoluo tcnica na execuo

    do exerccio que influencia a economia do movimento. Este termo classifica a eficincia mecnica, ou seja, o

    custo em oxignio de um movimento, ou srie de movimentos. Todos estes factores e certamente outros

    ainda no descritos so importantes para a adaptao no cardiovascular aos exerccios de resistncia.

    Actualmente possvel encontrar outras ferramentas que nos do uma viso mais global e completa.

    A percentagem do VO2mx. no limiar do lactato uma informao sobre qual intensidade de exerccio que

    possvel sustentar, sem recorrer via anaerbia. Este valor combina simultaneamente informao sobre o

    sistema cardiovascular e muscular, ao mesmo tempo que a sua evoluo acompanha mais proximamente a da

    desempenho com o treino a longo prazo.

    O dbito cardaco por sua vez o reflexo de um conjunto de modificaes estruturais cardacas.

    Cronicamente o seu aumento faz-se custa do aumento da complacncia dos ventrculos, do efeito de pr-carga e da diminuio das resistncias perifricas. Permanece controverso o eventual papel do aumento

    crnico da contractilidade intrnseca do miocrdio, embora existam evidncias da alterao da cintica do

    clcio com o treino.

    As situaes de treino que sujeitam o corao a elevados volumes de enchimento, volumes de

    ejeco e dbitos cardacos conduzem ao aumento das dimenses ventriculares e do volume telediastlico

    (em esforo e repouso), sem alteraes na espessura da parede. Embora a diferena entre atletas treinados e

    indivduos sedentrios no exceda os 10% no dimetro ventricular, traduz-se num aumento de volume de

    33%. Em algumas semanas, o msculo cardaco adapta-se a uma subida da sua carga de trabalho mantendoconstante a tenso sobre a parede de acordo com a lei de LaPlace, atravs da dilatao global das camras

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    cardacas. Os exerccio isomtricos e similares induzem outro padro de hipertrofia. O corao responde

    exposio a ps-cargas elevadas aumentando a espessura da parede irrespectivamente das dimenses das

    camras cardacas. Tal como a nvel muscular esqueltico no se considera a hiperplasia cardaca um

    fenmeno frequente.

    Os exerccios de resistncia causam um aumento progressivo e proporcional intensidade do

    trabalho cardaco, ou seja, da frequncia, tenso parietal e velocidade de encurtamento, que simultaneamente

    so os maiores determinantes do consumo de oxignio pelo miocrdio. Para acomodar estas exigncias o

    fluxo vascular coronrio acompanha aguda e cronicamente a evoluo da intensidade do trabalho cardaco. A

    rede vascular coronria sede de angiognese a nvel dos pequenos e grandes vasos, do que resulta uma

    subida da densidade capilar cardaca e uma acomodao de um maior fluxo.

    Se agudamente o papel da pr-carga secundrio na adaptao ao exerccio fisco mais incerto o

    seu papel a longo prazo.O treino desencaderia uma expanso do volume de sangue circulante que apesar

    pequena do ponto de vista quantitavo parece ser vantajosa durante o exerccio. Esta vantagem mais

    evidente em indivduos treinados, especialmente os de nvel atltico que praticam no infrequentemente a

    prtica da carga de volume. A expanso artificial do volume plasmtico (auto-transfuso) condiciona um

    aumento do desempenho do esforo, que a traduo de um maior VO2mx. e volume de ejeco. A razo

    para este fenmeno parece ser um aumento da reserva diastlica, por aumento da compliance cardaca nos

    indivduos treinados.

    O papel da ps-carga no desempenho cardaco facilmente compreendido se tivermos em

    considerao que um determinante essencial do dbito cardaco. Se este ltimo parmetro aumentasse

    isoladamente, sem as concomitantes alteraes perifricas, a subida rpida de ps-carga limitaria a sua

    utilidade. por isso relevante a dilatao do leito vascular muscular durante o exerccio que acomoda o

    aumento do fluxo arterial e diminui as resistncias perifricas. Uma importante modificao induzida pelo

    treino por isso o crescimento dos capilares musculares e as alteraes da regulao do tono arteriolar. Em

    indivduos treinados estes factores actuam concertadamente reduzindo a ps-carga para nveis que no

    seriam possveis para o mesmo dbito cardaco, em pessoas inactivas.

    Ao contrrio do que seria de esperar observando os fenmenos agudos, os atletas no possuem

    maiores frequncias cardacas em esforo. A frequncia cardaca mxima permanece a mesma ou diminuiligeiramente. Um ponto importante que para o mesmo esforo, ou mais correctamente, para o mesmo

    consumo de oxignio, a sua frequncia cardaca substancialmente inferior de indivduos no treinados.

    Em repouso frequente apresentarem valores que se podem classificar como bradicardia. Estas diferenas

    reflectem as alteraes na regulao autonmica que no esto ainda completamente esclarecidas. Com o

    efeito do treino, a remoo parassimptica que parcialmente responsvel pela maior frequncia cardaca em

    exerccio torna-se menos marcada durante a actividade. Em repouso existe igualmente um acentuar do tono

    parassimptico. Os nveis de catecolaminas circulantes e no tecido cardaco no sofrem alterao quando so

    comparadas situaes de idntica percentagem relativa do esforo mximo. O ritmo de descarga intrnseco(aps bloqueio adrenrgico e colinrgico) do tecido pacemaker do nodo SA torna-se menor e por razes

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    desconhecidas todos os tecidos pacemaker aumentam a sua frequncia de descarga quando estirados. Pensa-

    se que nestas condies se atenua a resposta cronotrpica positiva ao estiramento. Outro mecanismo

    proposto para explicar a bradicardia em repouso o efeito de feedback negativo exercido pelos

    barorreceptores carotdeos perante o aumento do dbito cardaco.

    Adaptaes hormonais

    No contexto do crescimento celular desempenha tambm um importante papel o ambiente hormonal.

    Ocorre um pulso de libertao de hormona de crescimento aps o exerccio, em resposta directa ao mesmo

    ou a uma eventual queda dos nveis de glicemia. A hormona de crescimento actua localmente no por efeitos

    directos, mas principalmente pela induo da produo local e heptica de IGF (insulin-like growth factor).

    O IGF actua sobre receptores prprios promovendo o crescimento celular. A hormona tirideia actua atravs

    de receptores citoplasmticos que so depois transportados para o ncleo ligando-se directamente a regies

    do DNA activadoras da transcrio. Para alm de efeitos partilhados sobre outros tecidos como o aumento de

    consumo de energia e de produo de calor, conduz ao aumento do turnover proteica, com predomnio do

    catabolismo, aumenta a expresso de receptores -adrenrgicos e aumenta as velocidades de contraco e

    relaxamento muscular. A testosterona e seus derivados pela sua aco anablica, igualmente dependente de

    receptores citoplasmticos, justifica as diferenas no desenvolvimento e na resposta ao treino entre o sexo

    masculino e feminino.

    Os corticoides endgenos so libertados em resposta a situaes de stress, das quais o exerccio um

    exemplo. Para valores de VO2 de 65% do mximo atinge-se o pico de libertao de cortisol, que no final do

    exerccio desempenha funes catablicas, lipoltcas e neoglicolticas.

    Benefcios do exerccio

    Efeitos do Exerccio

    Existe, actualmente, consenso geral ao nvel das autoridades mdicas e de sade pblica relativamente

    ao axioma de que nveis reduzidos de actividade fsica no trabalho e no tempo de lazer (associados

    comummente com os estilos de vida modernos da sociedade ocidental) aumentam o risco de eventos fatais e

    no fatais de doena aterosclertica coronria (CAD), bem como a mortalidade por outras causas. Diversos

    estudos nos E.U.A. durante a dcada passada relataram de um modo consistente que aproximadamente 80%

    da populao adulta americana tinha actividade fsica insuficiente e, portanto, incompatvel com os

    benefcios de sade que esta pode acarretar. Deste modo, a American Heart Association (AHA), a ACC, aCenters for Disease Control and Prevention, a ACSM, os National Institutes of Health e o US Surgeon

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    General declararam que um estilo de vida sedentrio constitui um factor de risco coronrio major,

    modificvel. Outros factores de risco so o tabaco, a hipertenso arterial, nveis plasmticos elevados de

    lipoprotenas de baixa densidade (LDL), nveis plasmticos reduzidos de lipoprotenas de elevada

    densidade (HDL), nveis plasmticos elevados de triglicerdeos, a obesidade, a diabetes mellitus,

    factores trombognicos e o estado ps-menopusico. O exerccio aerbico regular tem um impacto

    favorvel nestes factores de risco, bem como um efeito independente noutros factores.

    Muitos estudos epidemiolgicos e observacionais evidenciaram uma relao inversa entre a actividade

    fsica e/ou forma fsica/fitness e o risco de doena aterosclertica coronria (CAD), bem como de um enfarte

    do miocrdio fatal ou no fatal. luz destas evidncias estabeleceu-se o consenso de que necessrio um

    mnimo de 30 minutos de actividade fsica de intensidade moderada (contnua ou somatrio de perodos de

    10 minutos) a maior parte dos dias (de preferncia todos) da semana para reduzir o risco de eventos de

    doena aterosclertica coronria (CAD). Isto equivale a cerca de 1,5 milhas por dia de marcha rpida (passo

    rpido) com dispndio energtico de 150 kcal por dia para um indivduo de estatura mdia.

    Vrios estudos epidemiolgicos e experimentais tambm identificaram mltiplos mecanismos

    biolgicos que ajudam a explicar os efeitos aparentes da actividade fsica e capacidade cardiorespiratria

    contra a CAD. Estes efeitos podem ser classificados da forma seguinte:

    Efeitos antiaterognicos

    Efeitos antitrombticos

    Alterao da funo endotelial Alteraes funcionais autonmicas

    Efeitos anti-isqumicos

    Efeitos antiarrtmicos

    Efeitos Antiaterognicos

    O exerccio regular tem efeitos benficos directos e indirectos sobre a aterosclerose coronria. A

    actividade fsica associa-se a CAD menos severa, dimetros maiores do lmen das artrias coronrias eprogresso reduzida da aterosclerose. Muitos destes efeitos benficos parecem dever-se atenuao de

    factores de risco coexistentes pelo exerccio tais como:

    reduo da adiposidade, particularmente nos indivduos com excesso de gordura abdominal

    e na metade superior do corpo;

    diminuio da presso sangunea elevada;

    reduo dos nveis plasmticos elevados de triglicerdeos (e do colesterol LDL);

    aumento dos nveis plasmticos de colesterol HDL;

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    aumento da sensibilidade insulina e consequente uso de glicose, reduzindo o risco de

    diabetes mellitus tipo 2.

    Efeitos Antitrombticos

    A maior parte dos eventos clnicos major de CAD so acompanhados de trombose coronria. Estudos

    recentes evidenciam que a prtica regular de exerccio afecta favoravelmente este processo, em particular, o

    sistema fibrinoltico.

    A actividade fsica determina uma melhoria significativa dos ndices hemostticos, com uma reduo

    dos nveis plasmticos de fibrinognio, um aumento do activador do plasminognio tecidual activo e uma

    reduo do inibidor do activador do plasminognio. O exerccio de curto e longo termo afecta tambm a

    activao plaquetria. Esta importante nos mecanismos patofisiolgicos dos sndromes coronrios instveis

    e enfarte agudo do miocrdio (EAM). A informao actual sugere que o exerccio de curto termo pode levar

    a um aumento da actividade plaquetria, especialmente nos indivduos sedentrios; contudo, o exerccio de

    longo termo, regular pode reduzir ou abolir esta resposta.

    Funo Endotelial

    O endotlio vascular tem um papel importante na regulao do tono arterial e na agregao plaquetria

    local, em parte atravs da libertao de xido ntrico e outros factores derivados do endotlio. Esta libertao

    estimulada por vrios mecanismos, incluindo o aumento do shear-stress devido a aumentos de curto e

    longo termo do fluxo sanguneo. A vasodilatao dependente do endotlio no est ntegra em indivduos

    com aterosclerose coronria e em doentes com factores de risco coronrios como a hipercolesterolmia,

    diabetes mellitus, hbitos tabgicos e hipertenso arterial. Estudos recentes demonstram que o exerccio

    aerbio melhora a funo endotelial.

    Funo Autonmica

    O equilbrio entre os tonos simptico e parassimptico modula a actividade cardiovascular. Uma

    actividade simptica exacerbada parece associar-se com um risco aumentado de eventos cardacos,

    particularmente em indivduos com patologia cardaca prvia. Vrios estudos demonstraram que indivduos

    treinados fisicamente e em boa forma fsica apresentavam actividade parassimptica superior daqueles que

    estavam fisicamente descondicionados.

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    Efeitos Anti-isqumicos

    Existem vrios mecanismos pelos quais o exerccio de resistncia pode melhorar o equilbrio relativo

    entre o suprimento e as necessidades miocrdicas de oxignio, resultando deste facto um efeito anti-

    isqumico. O aumento da capacidade metablica e a melhoria da performance mecnica do miocrdio so

    adaptaes resultantes do exerccio de resistncia. A diminuio da frequncia cardaca e da presso

    sangunea sistlica durante o exerccio submximo reduzem o trabalho miocrdico, diminuindo deste modo

    as necessidades e as exigncias miocrdicas de oxignio no que diz respeito ao fluxo sanguneo coronrio.

    Nos doentes com CAD isto permite realizar maior trabalho antes de atingir o limiar de isquemia. Alm disso,

    a diminuio da frequncia cardaca induzida pela prtica corrente de exerccio permite uma distole mais

    prolongada, permitindo uma melhor perfuso do miocrdio pelo fluxo coronrio.

    Efeitos Antiarrtmicos

    Existe um risco acrescido de fibrilao ventricular durante o exerccio vigoroso/extenuante na

    presena de CAD. Contudo, a melhoria do balano entre o suprimento e as necessidades miocrdico de

    oxignio, bem como a reduo do tono simptico e da libertao de catecolaminas induzidos pela actividade

    fsica regular de moderada intensidade, atenuam o risco de fibrilao ventricular. Isto pode explicar a baixa

    taxa de morte sbita cardaca observada em indivduos fisicamente activos com CAD ou elevado risco de

    CAD.

    Hipertenso

    Dois estudos de cohort demonstraram que o exerccio regular reduz a incidncia de hipertenso

    arterial. Alm de prevenir a hipertenso, o exerccio regular diminui a presso sangunea em indivduos

    hipertensos. Estudos randomizados revelaram que o actividade fsica regular diminui as presses sistlica e

    diastlica em cerca de 10 mmHg e 7,5 mmHg, respectivamente.

    Diabetes Mellitus

    A actividade fsica tem efeitos benficos no metabolismo da glicose e na sensibilidade insulina.

    Assim, determina um aumento da sensibilidade insulina, um decrscimo da produo de glicose pelo

    fgado, um maior nmero de clulas musculares esquelticas que usam mais glicose em detrimento do seu

    uso pelas clulas do tecido adiposo e a reduo da obesidade. O efeito da actividade fsica independente,

    mas potenciado pela diminuio de peso.

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    Obesidade

    A prtica regular de exerccio fsico contribui de um modo importante para a perda de peso, apesar do

    seu efeito ser varivel. No existe uniformidade no que respeita quantidade de exerccio necessria para

    prevenir o ganho de peso ou a sua recorrncia, apesar de se pensar que estes nveis sero muito superiores s

    doses recomendadas de actividade fsica. A maioria dos estudos neste campo revelam apenas uma perda

    modesta de peso (aproximadamente 2-3 kg) no grupo que praticava exerccio. Contudo, quando era

    adicionada dieta/plano alimentar ao programa de exerccio, a mdia de perda de peso foi de 8,5 kg, enquanto

    que o cumprimento apenas de um programa de dieta resultou numa diminuio de peso inferior (5,1 kg). Por

    sua vez, no grupo de indivduos em estudo no submetidos aos programas de exerccio e dieta verificou-se

    um aumento mdio do peso de cerca de 1,7 kg. Estes dados suportam no s a importncia da dieta, mas

    tambm do exerccio fsico nos programas de emagrecimento.

    A composio corporal e a distribuio do tecido adiposo correlacionam-se com a mortalidade

    cardiovascular. Estes dois factores de risco cardiovascular so atenuados pela prtica de exerccio fsico. Os

    homens e as mulheres activos fisicamente apresentam um ratio cintura-anca/waist-to-hip mais favorvel, ou

    seja, menor obesidade central relativamente aos indivduos sedentrios. Geralmente, o objectivo o

    gasto/dispndio calrico, que mais facilmente atingido atravs da prtica de exerccio de moderada

    intensidade (marcha rpida e andar de bicicleta), durante largos perodos de tempo, de modo frequente. Este

    tipo de exerccio deve envolver um compromisso de longo termo por parte do indivduo de forma a atingir e

    manter a perda de peso.

    Lpidos

    Uma meta-anlise de 95 estudos concluiu que o exerccio leva a uma reduo de 6,3% no colesterol

    total, 10,1% no colesterol LDL e 13,4% no ratio colesterol total/colesterol HDL e a um aumento de 5% no

    colesterol HDL. A intensidade de treino requerida para atingir uma melhoria modesta no perfil lipdico

    muito inferior quela necessria para perder peso e melhorar a forma fsica/fitness fsico. De facto os nveis

    de colesterol HDL parecem aumentar em funo de um vasto espectro de intensidades de exerccio. Umestudo recente demonstrou que a adio de um programa de exerccio a uma dieta originava redues

    significativas do colesterol LDL, que a dieta por si s no conseguia produzir. Nestes doentes os nveis de

    triglicerdeos eram normais e no sofriam qualquer alterao com o exerccio. Contudo, em doentes com

    hipertrigliceridemia pode ocorrer um decrscimo de cerca de 15-30%, particularmente naqueles que

    apresentam insulino-resistncia.

    Apesar destes estudos sugerirem uma melhoria do perfil lipdico com a actividade fsica, estes efeitos

    so relativamente modestos. No entanto, estas alteraes podem ter efeitos favorveis no risco

    cardiovascular, com excepo para os indivduos com dislipidemias de raz gentica, nas quais o exercciono exerce quaisquer alteraes nos nveis de colesterol.

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    Prescrio do exerccio

    Qualidade e Quantidade de Exerccio Necessrias para Atingir Efeitos Benficos

    Qualquer actividade fsica deve ser avaliada em termos de intensidade, frequncia, durao, modo e

    progresso. A dose refere-se quantidade total de energia dispendida em actividades fsicas que requerem

    movimento muscular repetitivo (usualmente exprime-se em kilojoules ou kilocalorias). A intensidade pode

    ser definida em termos absolutos ou relativos. A intensidade absoluta reflecte a taxa de dispndio de energia

    durante o exerccio e usualmente expressa em METs. A intensidade relativa refere-se percentagem

    relativa da capacidade aerbica mxima que mantida durante o exerccio e expressa como uma

    percentagem da frequncia cardaca mxima ou percentagem de VO2mx. Por exemplo, a marcha rpida a 4,8

    km/h tem uma intensidade absoluta de cerca de 4 METs. Em termos relativos, esta intensidade considerada

    ligeira para uma pessoa saudvel de 20 anos de idade, mas representa uma elevada intensidade para um idoso

    de 80 anos de idade.

    A intensidade de actividade necessria para melhorar o condicionamento fsico varia nos diferentes

    indivduos e pode ser to baixa como 40% de VO2mx durante 20 minutos, 3 vezes por semana. Contudo, a

    relao da intensidade do exerccio com a sua durao sugere que o exerccio de menor intensidade requer

    mais tempo para aumentar a capacidade funcional do que o exerccio de intensidade mais elevada. De um

    ponto de vista simultneo de sade e condicionamento, a maior vantagem da prtica de exerccio de

    moderada intensidade o menor nmero de complicaes associadas, enquanto o exerccio vigoroso tem a

    vantagem de atingir resultados num menor perodo de tempo e permitir um aumento mais relevante do

    condicionamento cardiovascular.

    Pensa-se que ser necessrio um limiar de intensidade para atingir benefcios, apesar de no se

    conhecer o valor exacto e este poder variar de indivduo para indivduo. Actualmente, considera-se, no

    entanto, que a intensidade do exerccio associada a efeitos benficos para a sade pelo menos moderada, ou

    seja, o equivalente a marcha rpida. Deste modo, parece que a quantidade de exerccio mais importante

    para a sade do que a prtica de exerccio de intensidade elevada. Apesar do exerccio vigoroso acarretar

    maiores benefcios, o treino de elevada intensidade associa-se tambm a um maior nmero de lesesortopdicas e maiores taxas de desistncia quando comparado com programas de treino de baixa ou

    moderada intensidade. Deste modo as recomendaes actuais so direccionadas com vista a minimizar os

    riscos e aumentar os benefcios.

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    Riscos do Exerccio

    O exerccio tem riscos e benefcios. Actualmente acredita-se que os benefcios do exerccio

    ultrapassam em grande escala os seus riscos; portanto deve encorajar-se a prtica de exerccio fsico com as

    devidas prudncias.

    Apesar de vrios factores afectarem o risco do exerccio, so trs os mais importantes a idade, a

    existncia de doena cardiovascular e a intensidade do exerccio.

    Morte Cardaca Sbita

    Rara em indivduos aparentemente saudveis. Em indivduos com menos de 40 anos de idade a morte

    sbita cardaca normalmente devida a doena cardaca congnita, enquanto a causa mais comum nos

    indivduos com mais de 40 anos a CAD.

    Os indivduos com doena cardaca parecem ter um risco acrescido de morte sbita cardaca durante o

    exerccio vigoroso (como jogging) do que os indivduos saudveis. Contudo, com programas judiciosos, a

    actividade fsica claramente benfica, determinando uma diminuio na mortalidade nos indivduos

    fisicamente activos relativamente aos que adoptam um estilo de vida sedentrio.

    Enfarte Agudo do Miocrdio (EAM)

    O EAM outro risco associado com a prtica de exerccio. Cerca de 4-20% dos EAM ocorrem durante

    ou logo aps o exerccio. Contudo o risco relativo ajustado parece ser maior nos indivduos que no praticam

    exerccio regularmente e que apresentam uma vida exclusivamente sedentria. Esta relao inversa entre

    actividade fsica regular e EAM de grande importncia clnica porque os profissionais de sade devem

    considerar sempre a capacidade funcional de cada indivduo quando consideram o ratio risco/benefcio do

    exerccio fsico. hoje claro que os indivduos menos activos fisicamente tm um risco acrescido de sofrer

    um EAM durante a prtica de exerccio, relativamente aos que praticam exerccio fsico regularmente.

    Leses Musculoesquelticas

    As leses musculoesquelticas so comuns e incluem leses directas - contuses, entorses, rupturas - eleses indirectas artrite e dores lombares. Os exerccios de menor impacto (marchar, andar de bicicleta,

    nadar) causam menos stress nos ossos e articulaes, enquanto os exerccios de impacto elevado (correr,

    dana aerbica) provocam impacto repetido ao nvel dos joelhos, tornozelos e ps. Vrios estudos indicam

    que a intensidade e a natureza do impacto na actividade fsica so os factores mais importantes que

    determinam a frequncia de leses.