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7 Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola Fluxos de matéria e energia no reservatório solo N° 5 – Novembro 2003 Origem e formação da litosfera Para melhor entender os fenôme- nos ambientais, é de fundamental im- portância raciocinar com base nos ci- clos biogeoquímicos. Ou seja, as ocorrênci- as devem ser sempre interpretadas conside- rando-se os importan- tes fluxos de matéria e energia, os quais ocor- rem dinamicamente entre os três grandes compartimentos regu- ladores: litosfera, hi- drosfera e atmosfera. Embora para fins didáticos, muitas vezes, as questões ambientais sejam discutidas de forma compartimenta- lizada, não se pode esquecer que constantemente há fluxos (trocas) de energia e matéria entre esses reserva- tórios. Há cerca de cinco bilhões de anos, nosso planeta era uma bola de mine- rais fundidos e incandescentes como a lava dos vulcões. Em seguida, ini- ciou-se um lento processo de resfria- mento dessa massa incandescente, com formação das primeiras rochas e da atmosfera, sendo esta devida à aglomeração de gases ao redor do planeta. Foi então que, submetida a uma pres- são atmosférica 300 ve- zes maior que a atual, a água conseguiu passar para o estado líquido, acumular-se em deter- minadas regiões e inici- ar o processo cíclico de precipitação, evapora- ção, formação de nu- vens e novas precipitações, as quais ocorrem até hoje. A atmosfera daquela época pos- suía composição química diferente da atual. Era muito mais corrosiva em con- seqüência das contínuas erupções vul- cânicas, lançando ao espaço enormes quantidades de gás carbônico, enxo- fre e cloro, os quais se transformaram em ácidos carbônico, sulfúrico e clorí- drico, respectivamente. Estes compos- tos, dissolvendo-se nas águas da chu- va, transformavam-na em um líquido extremamente corrosivo (Branco e Cavinatto, 1999). Assim, ao mesmo tempo em que as chuvas permitiram o resfriamento das rochas superficiais, as quais se solidificavam, iniciou-se um duplo pro- cesso de desgaste e desagregação dessas: a abrasão e o ataque quími- co. Estes processos, aliados ao calor escaldante do dia e forte frio à noite, levaram à quebra das rochas em pe- daços de diferentes granulometrias tais como pedras, cascalho, areia e ar- gila. Ao longo do tempo, rochas sedi- mentares formadas no fundo dos oceanos vieram à superfície e o con- trário também ocorreu. Sedimentos que já estavam na superfície, inclusive formando solos férteis cobertos de flo- restas, afundaram, em conseqüência de movimentos tectônicos, e foram re- cobertos, posteriormente, por novas rochas sedimentares ou mesmo vul- cânicas. Tal processo originou grandes depósitos de plantas e microrganis- mos fossilizados. Fluxos de matéria e energia no reservatório solo: André Henrique Rosa e Julio Cesar Rocha Este trabalho apresenta aspectos importantes da litosfera como origem e formação, composição, classificação, propriedades físico-químicas, fertilidade, manejo e degradação decorrentes de ações antrópicas. Traz uma abordagem diferenciada, contextualizando fenômenos ambientais que ocorrem no solo, utilizando conceitos de contínuos fluxos de matéria e energia entre os demais reservatórios – hidrosfera e atmosfera. Apresenta aspectos da ciência do solo, sempre com uma visão global do ponto de vista ambiental. litosfera, solo, química do solo, manejo, ações antrópicas “… pois a chuva voltando pra terra traz coisas do ar…” Raul Seixas / Paulo Coelho Para melhor entender os fenômenos ambientais, é de fundamental importância raciocinar com base nos ciclos 2-01-solos.p65 17/10/03, 08:00 7

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  • 7Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola Fluxos de matria e energia no reservatrio solo N 5 Novembro 2003

    Origem e formao da litosfera

    Para melhor entender os fenme-nos ambientais, de fundamental im-portncia raciocinar com base nos ci-clos biogeoqumicos.Ou seja, as ocorrnci-as devem ser sempreinterpretadas conside-rando-se os importan-tes fluxos de matria eenergia, os quais ocor-rem dinamicamenteentre os trs grandescompartimentos regu-ladores: litosfera, hi-drosfera e atmosfera.

    Embora para fins didticos, muitasvezes, as questes ambientais sejamdiscutidas de forma compartimenta-lizada, no se pode esquecer queconstantemente h fluxos (trocas) deenergia e matria entre esses reserva-trios.

    H cerca de cinco bilhes de anos,nosso planeta era uma bola de mine-rais fundidos e incandescentes comoa lava dos vulces. Em seguida, ini-

    ciou-se um lento processo de resfria-mento dessa massa incandescente,com formao das primeiras rochas eda atmosfera, sendo esta devida aglomerao de gases ao redor do

    planeta. Foi ento que,submetida a uma pres-so atmosfrica 300 ve-zes maior que a atual, agua conseguiu passarpara o estado lquido,acumular-se em deter-minadas regies e inici-ar o processo cclico deprecipitao, evapora-o, formao de nu-

    vens e novas precipitaes, as quaisocorrem at hoje.

    A atmosfera daquela poca pos-sua composio qumica diferente daatual. Era muito mais corrosiva em con-seqncia das contnuas erupes vul-cnicas, lanando ao espao enormesquantidades de gs carbnico, enxo-fre e cloro, os quais se transformaramem cidos carbnico, sulfrico e clor-drico, respectivamente. Estes compos-tos, dissolvendo-se nas guas da chu-

    va, transformavam-na em um lquidoextremamente corrosivo (Branco eCavinatto, 1999).

    Assim, ao mesmo tempo em queas chuvas permitiram o resfriamentodas rochas superficiais, as quais sesolidificavam, iniciou-se um duplo pro-cesso de desgaste e desagregaodessas: a abraso e o ataque qumi-co. Estes processos, aliados ao calorescaldante do dia e forte frio noite,levaram quebra das rochas em pe-daos de diferentes granulometriastais como pedras, cascalho, areia e ar-gila.

    Ao longo do tempo, rochas sedi-mentares formadas no fundo dosoceanos vieram superfcie e o con-trrio tambm ocorreu. Sedimentosque j estavam na superfcie, inclusiveformando solos frteis cobertos de flo-restas, afundaram, em conseqnciade movimentos tectnicos, e foram re-cobertos, posteriormente, por novasrochas sedimentares ou mesmo vul-cnicas. Tal processo originou grandesdepsitos de plantas e microrganis-mos fossilizados.

    Fluxos de matria e energia no reservatrio solo:

    Andr Henrique Rosa e Julio Cesar Rocha

    Este trabalho apresenta aspectos importantes da litosfera como origem e formao, composio, classificao,propriedades fsico-qumicas, fertilidade, manejo e degradao decorrentes de aes antrpicas. Traz uma abordagemdiferenciada, contextualizando fenmenos ambientais que ocorrem no solo, utilizando conceitos de contnuos fluxosde matria e energia entre os demais reservatrios hidrosfera e atmosfera. Apresenta aspectos da cincia do solo,sempre com uma viso global do ponto de vista ambiental.

    litosfera, solo, qumica do solo, manejo, aes antrpicas

    pois a chuva voltando pra terra trazcoisas do ar Raul Seixas / Paulo Coelho

    Para melhor entenderos fenmenos

    ambientais, de fundamental

    importncia raciocinarcom base nos ciclos

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    Estes fsseis vieram a constituir asjazidas de carvo e de petrleo, hojeutilizadas como combustveis ou fon-tes de energia. Alm desses materiais,retiram-se do subsolo inmeros mine-rais, que constituem matria-primapara a indstria, tais como ferro, enxo-fre e mangans.

    Todo esse lento processo cclico deformao dos solos e sua associaocom microrganismos e plantas levoumilhes de anos para se concretizar epermitiu o crescimento dos vegetais emterra firme pois, at ento, devido at-mosfera altamente inspita, viviam so-mente nos mares, que ocupavam amaior parte da superfcieterrestre (Jardim, 2001;Rodrigues, 2001). Comoconseqncia, surgi-ram, tambm, os primei-ros animais terrestrescriando, com os vege-tais e o solo, estruturase sistemas cclicos cadavez mais complexos, os quais consti-tuem a natureza terrestre atual.

    O solo pode ser representado comoum ciclo natural do qual participam frag-mentos de rochas, minerais, gua, ar,seres vivos e seus detritos em decom-

    to intimamente misturados, permitin-do a ocorrncia de reaes e consti-tuindo um ambiente adequado para avida vegetal (Malavolta, 1976).

    FFFFFase slidaase slidaase slidaase slidaase slida

    A frao mineral da fase slida resultante da desagregao fsica dasrochas. Portanto, possui dimensesbem menores, porm com composi-o qumica idntica da rocha-meda qual se originou.

    A frao orgnica constituda pelaporo do solo formada de substn-cias provenientes de plantas e animaismortos, bem como produtos interme-dirios da degradao biolgica feitapor bactrias e fungos. O material or-gnico de fcil decomposio trans-formado em gs carbnico, gua esais minerais.

    Nos solos frteis, com densa vege-tao, existe uma complexa faunaconstituda de pequenos mamferos,tais como ratos e outros roedores, eminsculos protozorios, minhocas,insetos e vermes, os quais tm funomuito importante na triturao, aera-o, decomposio e mistura da ma-tria orgnica no solo.

    posio. Estes resultam de fatores cli-mticos no decorrer do tempo e da ati-vidade combinada de microrganismos,decompondo restos de animais/vege-tao, respectivamente. Desta forma, osolo considerado resultado dasinteraes entre os compartimentoslitosfera, hidrosfera, atmosfera e bios-fera. Os principais processos que leva-ram sua formao so apresentadosna Figura 1.

    Composio dos solos

    Os solos possuem trs fases sli-da, lquida e gasosa cujas propores

    relativas variam de solopara solo e, num mes-mo solo, com as condi-es climticas, a pre-sena de plantas e ma-nejo. Em geral, na com-posio volumtricaporcentual de um solo,que apresenta condi-

    es timas para o crescimento deplantas, verificam-se 50% de fase sli-da (45% de origem mineral e 5% org-nica), 25% de fase lquida e 25% de fasegasosa. Os quatros componentes (mi-neral, orgnico, lquido e gasoso) es-

    Figura 1: Processo de formao do solo.

    O solo consideradoresultado das interaesentre os compartimentos

    litosfera, hidrosfera,atmosfera e biosfera.

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    FFFFFase lquidaase lquidaase lquidaase lquidaase lquida

    Representa a chamada soluo dosolo: uma soluo de eletrlitos qua-se em equilbrio, que ocorre no soloem condies de no-saturao deumidade. E isto assim porque agua do solo contm numerosos ma-teriais orgnicos e inorgnicos, que fo-ram dissolvidos da fase slida.

    As principais caractersticas doconceito de soluo do solo so:a) constitui uma parte maior do fator

    de intensidade no fornecimento denutrientes para as plantas;

    b) o meio para a maioria dos pro-cessos qumicos e biolgicos queocorrem no solo;

    c) o principal meio para o movimen-to de materiais no solo.Sempre que chove, ou quando se

    pratica a irrigao, as guas seinfiltram, preenchendo os espaosexistentes entre as partculas de solo.A quantidade de gua absorvida de-pende da permeabilidade do solo, poisquando esta pequena, a maior parteda gua escorre pela superfcie emdireo aos vales e rios, carregandoconsigo grandes quantidades de se-dimentos e elementos nutritivos. Estefenmeno natural chamado de ero-so e est ilustrado na Figura 2.

    O fluxo de matria e energia e asimportantes inter-relaes entre os trs

    grandes reservatrios (atmosfera,hidrosfera e litosfera) podem serexemplificadas pela gua da chuva.Esta, ao se formar na atmosfera, jconstitui uma soluo de vrias subs-tncias absorvidas do ar. Quando hprecipitao, alm das diversas esp-cies trazidas da atmosfera, ao atraves-sar as camadas de solo, a gua dachuva passa a transportar outras subs-tncias antes de chegar s razes. Nosolo, a capacidade da gua para tam-bm dissolver diferentes substncias ainda bastante aumentada pelapresena do gs carb-nico, resultante da respi-rao das razes e dosmicrorganismos.

    A Tabela 1 resumedados compilados sobrea composio da solu-o do solo. V-se quetodos os macronutrien-tes, exceto o fsforo, ge-ralmente esto presen-tes em concentraes da ordem de10-3 a 10-4 mol L-1. Em geral, o fsforotem menor concentrao, de 10-5 a10-6 mol L-1.

    Todos esses elementos qumicosexistem em quantidades limitadas nosolo. Nos ambientes naturais, tais ele-mentos so continuamente reciclados.Isto , medida que so absorvidos pe-las razes, so novamente depositadosna superfcie por meio da queda cont-nua de folhas, frutos, ramos e outraspartes vegetais. Ou, participam de umciclo biogeoqumico maior, transferindo-se para outros compartimentos comoa hidrosfera e/ou a atmosfera.

    FFFFFase gasosaase gasosaase gasosaase gasosaase gasosa

    Outra caracterizao da dinmicade fluxos entre os compartimentos(litosfera, atmosfera e hidrosfera) aconstatao de que a fase gasosa dosolo apresenta, qualitativamente, osmesmos componentes principais pre-sentes no ar atmosfrico. Entretanto,do ponto de vista quantitativo, podehaver grandes diferenas, conforme severifica na Tabela 2. Ou seja, devido respirao das razes e dos microrga-nismos e decomposio da matria

    orgnica e de reaesocorridas no solo, hconsumo de O2 e libe-rao de CO2 comconstantes alteraesnos fluxos entre oscompartimentos e,conseqentemente, acomposio do ar dosolo no fixa.

    O ar circulante nointerior do solo a fonte de oxigniopara a respirao das clulas dasrazes, bem como dos microrganismose pequenos animais produtores dehmus. A maioria das plantas cultiva-das requer solos bem arejados paraatingir mximo desenvolvimento radi-cular. De modo geral, os sintomas defalta de oxignio (amarelecimento dasfolhas, por exemplo) aparecem quan-do a concentrao de O2 nos espaosporosos est muito abaixo de 15%. Poroutro lado, parece no haver benef-cio em se aumentar tal concentraoacima de 21% (Branco e Cavinatto,1999).

    Figura 2: Foto ilustrativa do processo deeroso em solos (http://www.vidagua.org.br/bauru_ambiental/solobauru.shtm).

    Tabela 1: Concentrao tpica da soluo do solo*.

    Elementos Solos em geral / 10-3 mol L-1 Solos cidos / 10-3 mol L-1

    Nitrognio (N) 0,16 - 55 12,1

    Fsforo (P) 0,001 - 1 00,007

    Potssio (K) 0,2 - 10 00,7

    Magnsio (Mg) 0,7 - 100 01,9

    Clcio (Ca) 0,5 - 38 03,4

    Enxofre (S) 0,1 - 150 00,5

    Cloro (Cl) 0,2 - 230 01,1

    Sdio (Na) 0,4 - 150 01,0

    Fonte: (MALAVOLTA, 1976).*Nota: os elementos encontram-se no solo como componentes de substncias, ou espciesqumicas, tais como nitratos, fosfatos, ons Mg+2, ons Ca2+ etc.

    O ar circulante no interiordo solo a fonte de

    oxignio para arespirao das clulas

    das razes, dosmicrorganismos epequenos animais

    produtores de hmus.

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola Fluxos de matria e energia no reservatrio solo N 5 Novembro 2003

    CLASSIFICAO DOS SOLOS

    Atualmente, na maior parte do mun-do utilizado o sistema de classifica-o denominado gentico-natural, oqual baseado nas caractersticas e fa-tores que levaram formao do solo.A Tabela 3 mostra as diferentes carac-

    tersticas dos principais tipos de solosencontrados no Estado de So Paulo.

    Os latossolos foram formados sobao de lavagens alcalinas, em regiesquentes e midas florestadas. Isto de-terminou a perda de parte de slica(eluviao) do material original, perma-necendo os xidos de ferro e de alu-mnio. A argila silicatada presente acaolinita.

    Litossolos so solos jovens, poucodesenvolvidos e de pequena espessu-ra, assentados diretamente sobre asrochas consolidadas ou, s vezes, aflo-rando a superfcie.

    Os regossolos caracterizam-se porserem solos profundos, porm em in-cio de formao arenosa e, portanto,com drenagem excessiva. Apresentam

    camada superficial mais escurecida,devido presena de matria orgnica.

    Solos formados sob excesso degua, em condies de aerao defi-ciente, so denominados hidromr-ficos. Estes solos de colorao acin-zentada so geralmente cidos, po-bres em clcio e magnsio e possu-em acmulo de matria orgnica nascamadas superficiais.

    Solos podzlicos e podzolizadosso formados por processo de lava-gens cidas sobre material de origemarenosa, em regies midas e flores-tadas. Como conseqncia das lava-gens, as argilas so arrastadas para ointerior do solo, ficando as camadassuperficiais mais arenosas como, ilus-trado na Figura 3.

    Tabela 3: Limites de variao dos constituintes de alguns solos do Estado de So Paulo*.

    Solos pH C (%) N (%)K+ Ca2+ Mg2+ H+ Al3+

    equiv. mg trocvel / 100 g de terra

    Latossolos 4,00-6,10 0,42-4,08 0,03-0,38 0,04-0,77 0,17-06,25 0,10-2,42 2,58-9,49 0,25-3,40Podzlicos 4,10-7,60 0,28-2,51 0,03-0,21 0,03-0,50 0,63-22,19 0,11-2,46 1,05-5,16 0,00-4,89Hidromrficos 3,80-5,60 0,82-3,31 0,06-0,29 0,04-0,07 0,76-01,16 0,60-0,77 4,61-6,23 2,08-3,40Litossolos 4,30-5,10 1,15-3,12 0,18-0,41 0,20-0,78 0,79-27,17 1,18-8,42 0,00-6,27 0,00-7,06Regossolos 4,50-5,30 0,33-0,93 0,03-0,07 0,02-0,06 0,14-1,56 0,02-0,44 1,25-1,42 0,54-1,86

    *Adaptada de Malavolta (1976)

    Figura 3: Caractersticas de perfil de solos podzlicos da bacia do Rio Negro-AM.Foto feita durante coleta de amostras de solo.(Projeto FAPESP 00/13517-1)

    Tabela 2: Composio mdia dos principaiscomponentes presentes no ar atmosfricoe no ar do solo.

    Ar Componentes / (%)

    O2 CO2 N2Atmosfrico 21 0,03 72

    No solo 19 0,90 79

    Fonte: Malavolta (1976)

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    PPPPPerererererfil do solofil do solofil do solofil do solofil do solo

    O solo no formado apenas pelacamada superficial de alguns centme-tros a qual o agricultor cultiva, mastambm por outras camadas abaixodessa. Em geral, as caractersticas dosolo variam com a profundidade porcausa da maneira pela qual ele se for-mou ou depositou, devido s diferen-as de temperatura, teor de gua, con-centrao de gases (particularmenteCO2 e O2) e movimento descendentede solutos e de partculas. Ou seja, osfluxos de material formam diferentescamadas (denominadas horizontes),que podem ser identificadas a partir doexame de uma seco vertical do solo,que chamada perfil do solo (Figura4). Os horizontes diferenciam-se pelaespessura, cor, distribuio e pelosarranjos das partculas slidas e po-ros, distribuio de razes e outras ca-ractersticas, que resultam da interaode fatores influenciadores na formaodo solo. A caracterizao mais deta-lhada dos horizontes permite identifi-car, classificar e planejar o uso maisadequado do solo.

    Os horizontes so designados porletras maisculas. Assim, as letras A,B, e C representam os principais hori-zontes do solo. As letras O e R sotambm utilizadas, paraidentificar um horizonteorgnico em solos mine-rais e a rocha inalterada,respectivamente. Deacordo com Malavolta(1976), as principais ca-ractersticas dos horizon-tes que um solo podeconter so:a) Horizonte O hori-

    zonte orgnico commatria orgnica fresca ou em de-composio. Em condies de mdrenagem esse horizonte deno-minado H.

    b) Horizonte A resultante do acmulode material orgnico misturadocom material mineral. Geralmenteapresenta colorao mais escura,devido ao material orgnico humifi-cado. Em solos onde h eluviao(perda de parte da argila) muito in-tensa, forma-se uma camada decores claras com menor concentra-

    o de argila abaixo do horizonteA. Essa camada caracteriza o hori-zonte denominado E.

    c) Horizonte B caracterizado peloacmulo de argila, fer-ro, alumnio e poucamatria orgnica. denominado de hori-zonte de acmulo ouiluvisal. O conjuntodos horizontes A e Bcaracteriza a parte dosolo que sofre influn-cia das plantas e dosanimais.d) Horizonte C ca-

    mada de material no consolidado,com pouca influncia de organis-mos, geralmente apresentandocomposio qumica, fsica e mine-ralgica similar do material ondese desenvolve o solo.

    e) Rocha R rocha inalterada, que po-der ser, ou no, a rocha matriz apartir da qual o solo se desenvol-veu.

    Propriedades fsico-qumicas dos solos

    As propriedades fsico-qumicasdos solos so devidas principalmente elevada superfcie especfica e altareatividade apresentada pelos compo-nentes da frao argila. Esta, geral-mente constituda por minerais se-cundrios, xidos de ferro e alumniocristalinos ou amorfos e matria org-nica. Tm tamanhos iguais ou inferio-res a 4 m, carter coloidal e carga l-quida negativa saturada por ctions di-versos. De modo geral, estas caracte-rsticas so devidas a certas proprie-dades estruturais da fase dispersa,como tamanho, forma e rea superfi-cial das partculas. Portanto, devidoaos diferentes mecanismos de forma-o admite-se que a carga total nega-tiva dos solos seja constituda por doiscomponentes. Um constante, chama-do de carga permanente e outro va-rivel denominado de dependente depH. O silte (partculas de dimetro de62,0-4,0 m) e a areia (partculas dedimetro de 200-62 m), so menoseficientes nos processos qumicos,pois so constitudos de partculasmais grosseiras de minerais primriose quartzos.Figura 4: Camadas de um perfil genrico de solo (Adaptada de Rodrigues, 2001).

    As propriedades fsico-qumicas dos solos so

    devidas principalmente elevada superfcieespecfica e alta

    reatividade apresentadapelos componentes da

    frao argila.

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola Fluxos de matria e energia no reservatrio solo N 5 Novembro 2003

    Capacidade de troca catinicaCapacidade de troca catinicaCapacidade de troca catinicaCapacidade de troca catinicaCapacidade de troca catinica(CTC) de solos(CTC) de solos(CTC) de solos(CTC) de solos(CTC) de solos

    definida como a quantidade dections, que so adsorvidos reversivel-mente por unidade demassa de material secoe expressa a capacida-de do solo de trocarctions. A quantidadede ctions dada pelonmero de cargas po-sitivas (centimol oumilimol) e a massa desolo seco, geralmente100 g ou 1 kg. Os valores encontra-dos para minerais argilosos variam de1 150 centimol kg-1, enquanto a CTCpara a matria orgnica pode atingir400 centimol kg-1, devido ao grandenmero de grupos oxigenados, parti-cularmente carboxlicos (COOH), osquais podem se ligar e trocar ctions(Baird, 2001; Rocha e Rosa, 2003).

    Do ponto de vista de fertilidade dossolos, so desejados valores elevadosde CTC, pois maiores quantidades dections podem ser armazenadas e,posteriormente, cedidas aos vegetaisatravs de reaes de troca inica (flu-xos entre reservatrios).

    Acidez do soloAcidez do soloAcidez do soloAcidez do soloAcidez do solo

    De acordo com o conceito deBronsted e Lowry, cida uma subs-tncia que tende a ceder prtons (onshidrognios, H+) a uma outra. Base qualquer substncia que tende a acei-tar prtons. Quando em soluo aquo-sa, o cido se ioniza gerando H+ e onion correspondente:

    H2OH A H+ + A

    cido prton nion

    Diz-se que os H+ produzidos (se-gundo membro da equao) corres-pondem acidez ativa, e o HA no pri-meiro membro indica a acidez poten-cial. Quanto mais a reao tende paraa direita, maior a atividade em H+ emais forte o cido. Em meio aquoso,o H+ est sempre hidratado e, por isso,predomina como hidrnio, H3O

    + (H2O+ H+ H3O

    +). , entretanto, muito

    mais comum, embora menos rigoro-so, falar-se em H+ que em H3O

    +.No caso de cidos fortes a acidez

    ativa aproxima-se da potencial. Porm,em se tratando de cidos fracos, a

    acidez ativa menorque a potencial. Poresse motivo, no segun-do caso, a medio daacidez total no ofereceindicao da acidez ati-va. A noo de que ossolos cidos podiam serneutralizados com car-gas (carbonatos de cl-

    cio e de magnsio misturados comargila) j era conhecida dos gauleses,gregos e romanos. Plnio escreveusobre ela no primeiro sculo da eracrist (Branco e Cavinatto, 1999).

    Admite-se hoje que a acidez dosolo constituda de duas fraes:a) frao trocvel corresponde prin-

    cipalmente aos ons alumnioadsorvidos nos complexos de tro-ca e

    b) frao titulvel corresponde prin-cipalmente a H+ que se encontraligado covalentemente a compos-tos da matria orgnica (gruposcarboxlicos e fenlicos) e, possi-velmente ao alumnio ligado aoscomplexos argila-matria orgnica.Como a frao titu-

    lvel devida aos onsAl+3 e H3O

    + fortementeretidos aos minerais daargila e matria orgnica,evidenciando-se somen-te por extrao em pHmais elevado, pode-seaceitar que, nas condi-es normais dos solos,os ons alumnio so osprincipais responsveispela acidez (Baird, 1999).

    Fertilidade do solo

    O conceito de fertilidade do solotambm est intimamente relacionadocom os vrios fluxos de matria e ener-gia no ambiente. So vrias as reaesqumicas que ocorrem entre as subs-tncias presentes no solo e na gua,bem como as trocas de substnciasentre os seres vivos, as razes, as par-tes areas das plantas e as partculas

    minerais de solo. Destes processos re-sulta a formao de componentes se-cundrios responsveis por um esta-do de equilbrio, seja em nvel fsico-qumico (como por exemplo, a estabi-lidade do pH, ou equilbrio cido/base),qumico ou biolgico.

    Outra constatao do fluxo dinmi-co de energia e matria entre os gran-des reservatrios reguladores , porexemplo, o fato dos quatro principaiselementos qumicos componentes dosvegetais serem obtidos pela planta apartir do reservatrio atmosfera. Agua da chuva (H2O), indispensvel aqualquer processo biolgico, tam-bm fornecedora de hidrognio. Ocarbono e o oxignio so retirados doar, o primeiro, no processo de fotos-sntese e o segundo, no processo derespirao. Finalmente, o nitrogniotambm absorvido do ar por algu-mas bactrias fixadoras localizadasnas razes e, posteriormente, disponi-bilizado para as plantas.

    Para o crescimento da planta, comexceo desses quatro elementos prin-cipais, todos os demais (macro emicronutrientes) devem encontrar-se nosolo. Portanto, os vegetais conseguemdesenvolver-se em cada ambiente medida que encontram no solo os ele-mentos que lhe so indispensveis.

    Mesmo nos solos fr-teis, os elementos es-senciais aos vegetaisno so inesgotveis.Por isso, aps utiliza-o pelas plantas, es-ses elementos partici-pam de ciclos biogeo-qumicos voltando aosolo, (e/ou atmosfera ehidrosfera) para queeste se mantenha frtil

    e a vida vegetal tenha continuidade. Sepor algum motivo (por exemplo, quei-madas, eroso etc.) os ciclos forem in-terrompidos, o solo vai se tornando pro-gressivamente estril ou improdutivo.

    Participam dos ciclos biogeoqumi-cos vrios microrganismos decom-positores, que habitam o solo e so es-senciais para o processo de fertilizao.Ao decompor vegetais e animais mor-tos ou seus excrementos, a populaode decompositores produz uma mat-ria gelatinosa, de colorao amarelo-

    O cultivo do solo iniciou-se h cerca de dez mil

    anos com os Sumrios, naMesopotmia, s margensdos rios Tigre e Eufrates

    (atualmente onde selocaliza o Iraque).

    Com o tempo, verificou-se que a interveno

    humana na constituio eestrutura fsica do solo

    poderia aumentar aprodutividade.

    A este processo,atualmente, d-se o nome

    de manejo do solo.

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    castanha, denominada hmus, de im-portncia fundamental como fornece-dora dos elementos qumicos ciclados.

    Interaes soloInteraes soloInteraes soloInteraes soloInteraes solo-planta-planta-planta-planta-planta

    Durante seu desenvolvimento a par-tir de uma semente, a planta estendesuas razes para o interior do solo for-mando um aglomerado de minsculosfilamentos, distribudos em vrias dire-es, constituindo a rizosfera. A raiz temformas tortuosas, adquiridas duranteseu crescimento, medida que vai pe-netrando no solo e desviando-se dosgros e das partculas de terra, buscan-do encontrar gua, oxignio e nutrien-tes. Tambm, para absorver o mximode minerais do solo, as razes produ-zem substncias que ajudam a solu-bilizar os minerais, modificando-os qui-micamente e causando alteraes denatureza qumica no solo.

    Produtividade do solo e lei do mnimo

    A produo de vegetais por reade solo denominada produtividade.Num sentido ecolgico, a produtivida-de de uma rea refere-se produototal de matria vegetal (produo pri-mria), seguida da produo de ani-mais herbvoros (produ-o secundria) e daproduo de animaispredadores (produoterciria).

    Na primeira metadedo sculo XIX, o qumicoalemo Justus von Liebig(1803 1873) props aLei do mnimo ou Lei deLiebig. Verificou que o ele-mento essencial que seencontra em menor dis-ponibilidade no ambien-te limita o crescimento dovegetal. Alguns aspectos importantesda Lei proposta por Liebig so (Brancoe Cavinatto, 1999):1) a limitao do crescimento do ve-

    getal d-se por falta, e no por ex-cesso, de um elemento componen-te do ambiente;

    2) o fator em mnimo o elemento quese encontra em quantidades mni-mas em relao s necessidadesda planta;

    3) os microelementos ou micronu-trientes, os quais entram na com-posio das plantas em quantida-des mnimas, tambm podem con-trolar seu cresci-mento e

    4) atualmente, sabe-se que a lei deLiebig no est as-sociada apenas ssubstncias qumi-cas dissolvidas nosolo, mas tambmaos ciclos biogeoqumicos, aoscomponentes qumicos do ar (p.e.gs carbnico) e aos fatores fsicos,como luz, temperatura, umidade,etc

    Manejo do solo e atividades antrpicas

    No decorrer dos anos a populaoaumentou significativamente. No incio,poucos homens viviam sobre a terra eeles andavam pelas savanas em pe-quenos grupos, como pastores e/oucaadores. Posteriormente, o homemaprendeu a utilizar o ambiente paraobter benefcios e conforto. Entre osfatores mais importantes para o desen-volvimento humano esto o aprendi-zado para domar e criar animais, e

    plantar para seu bene-fcio. Assim, o homempassou de caadornmade a sedentrio,pois havia necessida-de de esperar pelascolheitas (Rocha et al.,1996).

    O cultivo do soloiniciou-se h cerca dedez mil anos com osSumrios, na Me-sopotmia, s mar-gens dos rios Tigre eEufrates (atualmente

    onde se localiza o Iraque). Depois, hcerca de oito mil anos iniciaram-se asplantaes no vale do Rio Nilo, no Egi-to (Rodrigues, 2001). Ou seja, o ser hu-mano percebeu que a agricultura nasmargens frteis dos rios alcanava pa-dres de produtividade suficientespara sustentar populao mais nume-rosa (Magnoli e Arajo, 1996). Essafertilidade nos vales era devida aosconstantes ciclos de cheias e vazan-

    tes dos rios, que trocavam matria or-gnica e nutrientes com o solo. O serhumano primitivo tambm observouque as terras escuras, constitudas de

    um material gelatinoso emacio unindo as partcu-las (o hmus), associavapartculas com maior di-metro, tornando o solomais poroso e permevel.Com o tempo, verificou-se que a interveno hu-mana na constituio e

    estrutura fsica do solo podia aumen-tar a produtividade. A este processo,atualmente, d-se o nome de manejodo solo.

    Os progressos obtidos quanto aomanejo do solo so muitos. Entretan-to, atualmente, com melhor conheci-mento dos ciclos biogeoqumicos edas interaes entre os trs grandescompartimentos, sabe-se que vriasprticas agrcolas de manejo utilizadasno passado causam impactos am-bientais irreversveis aos solos, comoexemplo, infertilidade, eroso e perdade produtividade. Por falta de informa-o ou por razes histricas, muitasvezes o agricultor se nega a mudar deuma prtica agrcola aprendida comseus antepassados, para outra maisadequada ao tipo de solo da sua pro-priedade. Experimentos agrcolas re-centes indicam que o manejo do solodeve variar de uma regio para outra,de acordo com o clima e a naturezado solo (www.cnpdia.embrapa.br).

    Arao/revolvimento do soloArao/revolvimento do soloArao/revolvimento do soloArao/revolvimento do soloArao/revolvimento do solo

    H tempos remotos os processosde arao e revolvimento profundo desolos duros e/ou congelados de climastemperados ou frios so utilizados paradesagregar particulados, permitindopenetrao de gua (nutrientes) e arnecessrios para o desenvolvimentoda planta. Entretanto, para climas tro-picais (por exemplo, no Brasil) estesprocessos podem no ser adequados.Com o revolvimento, os microrganis-mos to importantes nos processos detroca entre solo, gua e atmosfera fi-cam mais expostos na superfcie e osefeitos da intensidade de luz e do for-te calor podem diminuir suas ativida-des. Uma vez revolvido, o solo tam-

    Em 1840, o qumicoalemo Justus von Liebigobservou a relao entreo crescimento de plantase a utilizao de fezes de

    animais como adubo.Desde ento, para

    atender demanda cadavez maior por

    alimentao, a adubaotem sido utilizada no

    manejo de solos.

    Hoje, no mundo inteiro,procura-se descobrirquanto os sistemas

    agrcolas contribuempara o seqestro (fixao

    no solo) de carbono.

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    bm fica sujeito ao arraste maior denutrientes por guas de chuvas (cau-sa infertilidade) e, dependendo dascondies do terreno, o perigo de ero-so eminente. Alm disso, sabe-seatualmente que o revolvimento podefacilitar a transferncia do carbono re-tido no solo para a atmosfera, na for-ma de dixido de carbono (CO2).

    AdubaoAdubaoAdubaoAdubaoAdubao

    Em 1840, o qumicoalemo Justus von Liebigobservou a relao entreo crescimento de plantase a utilizao de fezes deanimais como adubo.Desde ento, para aten-der demanda cada vezmaior por alimentao, aadubao tem sido utili-zada no manejo de so-los. Ela tem no s a fi-nalidade de modificarquimicamente a compo-sio do solo de manei-ra a fornecer planta oselementos necessrios, mas tambma de condicion-lo fisicamente.

    Entretanto, a adubao sem acom-panhamento tcnico agrcola, planeja-mento de culturas de acordo com atopografia do terreno e conhecimentoprvio do tipo de solo tem causadovrios impactos ambientais e prejuzosfinanceiros ao agricultor. Alm desalinizar o solo, a aplicao de fertili-zantes pode causar a eutrofizao demananciais devido lixiviao de fer-tilizantes aplicados em solos revolvi-dos, ocorrida principalmente em po-ca de chuvas.

    Atualmente, uma das alternativassugeridas a utilizao de adubo or-gnico ou organomineral. Este, ao con-trrio dos fertilizantes sintticos, con-tm alta porcentagem de hmus, con-tribuindo para a fixao de nutrientese re-estruturao fsica do solo. Den-tre as diversas formas de adubao or-gnica com custo/benefcio atrativos etimos resultados tcnicos para solose plantas, a adubao verde de maisfcil aplicao e menor custo. Ela ba-seia-se praticamente no plantio rotativode plantas leguminosas entre as sa-fras e, at poucos anos, sugeria-se a

    incorporao da biomassa verde aosolo via revolvimento. Com o melhorconhecimento dos ciclos biogeoqu-micos (por exemplo, caracterizao deperdas de carbono e CO2 do solo paraa atmosfera), tem-se sugerido que,aps o corte, a massa verde produzi-da pelas leguminosas seja mantida nasuperfcie do solo sem revolvimento,para decomposio natural por micror-ganismos aerbicos (Figura 5).

    Qual a imporQual a imporQual a imporQual a imporQual a impor tnciatnciatnciatnciatnciado manejo do solodo manejo do solodo manejo do solodo manejo do solodo manejo do solopara o seqestro depara o seqestro depara o seqestro depara o seqestro depara o seqestro decarbono?carbono?carbono?carbono?carbono?

    O aumento da con-centrao de gasescomo CO2, CH4 e N2Ona atmosfera tem sidorelacionado ao efeitoestufa. A queima decombustveis fsseis a principal causa des-se aumento, especial-mente pela emisso deCO2. A agricultura con-

    tribui para a emisso ou o seqestrodestes gases, dependendo do efeito domanejo sobre o contedo de matriaorgnica do solo (MOS). Quando o ba-lano entre a taxa de adio de resdu-

    os vegetais ao solo (determinada pelosistema de cultura) e a taxa de perdade MOS (determinada principalmentepelo manejo do solo) for positivo, ocor-rer aumento da MOS. Neste caso, osolo atuar como um dreno de CO2 at-mosfrico diminuindo o efeito estufa.Ao contrrio, se o balano for negativo,ocorrer reduo da MOS e o solo con-tribuir para o aumento do efeito estu-fa. Assim, prticas de manejo que acu-mulem MOS podero contribuir paraaumentar a qualidade do solo e, tam-bm, para o seqestro de CO2 atmos-frico (Pilon et al., 2001).

    Hoje, no mundo inteiro, procura-sedescobrir quanto os sistemas agrcolascontribuem para o seqestro (fixaono solo) de carbono. No Brasil, aEmbrapa Solos tem feito medies daquantidade de carbono no solo noperfil entre 0 e 60 cm, buscandoquantificar a massa de carbono. Dessaforma, possvel medir em diferentesecossistemas o estoque de carbonosob, por exemplo, plantio conven-cional, adubao verde e solo nocultivado. Estes estudos so partede uma avaliao da contribuiodos diferentes tipos de manejo desolo para o seqestro de carbono(www.cnps.embrapa.com.br).

    Figura 5: Exemplo de adubao verde. A biomassa resultante das leguminosas deixadana superfcie do solo para decomposio natural da matria orgnica (Elo informativo,2002).

    A utilizao de gua doRio So Francisco, para

    irrigar plantaesfrutferas na regio

    nordestina, pode serconsiderada como umaexportao de gua na

    forma de frutas (melo emelancia tm mais de90% de gua), de uma

    regio h temposcomprovada com

    problemas de secas!

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    IrIrIrIrIrrigaorigaorigaorigaorigao

    Considerando-se que a quantida-de de gua na terra constante e quea populao tem aumentado em pro-pores assustadoras, a gua j considerada como um bem natural devalor incalculvel. Neste aspecto, doponto de vista ambiental, outra ques-to importante em relao ao manejodo solo refere-se irri-gao. Embora na an-tiguidade no se co-nhecesse o efeito dosfluxos de energia e ma-tria entre os reservat-rios, reconhecia-se adependncia direta en-tre disponibilidade degua no solo e produti-vidade. Hoje, sabe-seque isto devido s ca-ractersticas da guaem atuar no transporte, dissoluo edisponibilidade de nutrientes para asplantas. Em solos com escassez degua como, por exemplo, no Nordes-te brasileiro e alguns pases rabes,tem sido utilizada a irrigao mecni-ca, que consiste em captar gua demananciais, utilizando bombas, e dis-tribu-la nas lavouras. Sem acompa-nhamento tcnico-cientfico, este tipode manejo tem causado grandes pre-juzos aos mananciais, devido suc-o de excessivas quantidades degua. Com o volume bombeado nocompatvel com a vazo do manancial,toda vida aqutica fica comprometida,devido falta dgua e conseqenteassoreamento.

    Recentemente tem-se discutido aviabilidade e/ou possibilidade de trans-por gua do Rio So Francisco paraatender demanda bsica em partesda regio nordeste e, ainda, utilizaressa gua para irrigar culturas de fru-tas, como melo e melancia, para finsde exportao. Tal utilizao pode serconsiderada como uma exportao degua na forma de frutas (melo e me-lancia tm mais de 90% de gua), deuma regio h tempos comprovadacom problemas de secas! Este umexemplo de impacto ambiental causa-do pela falta de viso ambiental inte-grada entre os reservatrios litosfera ehidrosfera.

    Outro tipo a ferti-irrigao, queconsiste no aproveitamento de efluen-tes de esgotos urbanos tratados comofonte de gua e de hmus para a agri-cultura. Neste caso, embora a reutili-zao de gua tenha sido amplamen-te recomendada como forma de aten-der s demandas cada vez maiores, necessrio ter um monitoramentoconstante da presena de espcies

    metlicas potencialmen-te txicas e de microrga-nismos patognicosnesses efluentes.

    PPPPPesticidasesticidasesticidasesticidasesticidas/////herbicidasherbicidasherbicidasherbicidasherbicidas

    Devido ao grandecrescimento popula-cional, para atender demanda alimentciatem sido necessrio uti-lizar pesticidas/herbi-

    cidas na agricultura. Atualmente, di-fcil imaginar a produo de alimentossem o uso de pesticidas, pois estesprodutos melhoram a produtividadeagrcola podendo, s vezes, diminuiros preos dos alimentos e da mo deobra. Denominam-se pesticidas todasas substncias de origem natural ousinttica utilizadas no controle e/ou eli-minao/diminuio de pragas (inse-tos, ervas daninhas etc.), que causamprejuzos na produo de alimentos,ou transmitem enfermidades aos se-res humanos e a outros organismos.Os herbicidas so substncias qumi-cas empregadas para controlar ou ma-tar plantas daninhas, as quais se de-

    senvolvem juntamente com as cultu-ras. Quando sintetizados pelo ser hu-mano, os pesticidas/herbicidas soconsiderados substncias estranhasao ambiente e podem ser chamadastambm de xenobiticas.

    Embora sejam conhecidos impac-tos ambientais causados pela aplica-o de pesticidas, parece certo queeles ainda continuaro sendo um com-ponente indispensvel s muitas ativi-dades agrcolas (Toscano et al., 2000).Aps a aplicao e atuao nas cultu-ras, o pesticida pode permanecer nosolo por muito tempo, mantendo ouno seu efeito biolgico. Assim, im-portante conhecer seu comportamen-to no solo para prever se o pesticidavai causar algum dano a esse meio eaos demais reservatrios que co-exis-tem (hidrosfera e atmosfera).

    O comportamento do herbicidadepende das propriedades fsico-qu-micas e biolgicas do solo, bem comode fatores climticos. Os trs proces-sos bsicos que podem ocorrer comos pesticidas no solo so reteno,transformao e transporte. A Figura6 mostra alguns fatores envolvidos nocomportamento de herbicidas no solo(Lavorenti, 1999).

    O processo de reteno tende asegurar a molcula de herbicida,impedindo-a de se mover. Pode serreversvel ou irreversvel e afetar os pro-cessos de transformao e transportedo herbicida no ambiente.

    A transformao refere-se a mudan-as na estrutura qumica das molcu-las do herbicida e determina se e por

    Figura 6: Esquema genrico da interao entre herbicida e solo (Fonte: Lavorenti, 1999).

    Embora sejamconhecidos os muitosimpactos ambientais

    causados pela aplicaode pesticidas, parececerto que eles ainda

    continuaro sendo umcomponente

    indispensvel s muitasatividades agrcolas.

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    quanto tempo tais molculas podempermanecer intactas no ambiente(Lavorenti, 1999).

    O processo de trans-porte, determinado pelomovimento das molcu-las do herbicida no solo, fortemente influencia-do pela umidade, tem-peratura, densidade, ca-ractersticas fsico-qu-micas do solo e do her-bicida.

    No caso de pesticidas, s vezes,apenas uma pequena porcentagem daquantidade aplicada atinge o objetivodesejado. Grande parte transporta-da por ventos, chuvas e aportada emoutros reservatrios, como atmosferae recursos hdricos. Para minimizar osimpactos ambientais, a aplicao depesticidas deve sempre ser feita comorientao tcnica agronmica, quan-to aos cuidados durante a aplicao,dosagem necessria, poca e condi-es climticas favorveis (chuvas,temperatura, umidade, evapotrans-pirao, irradiao solar, velocidade edireo do vento etc.).

    Ocupao e mineraoOcupao e mineraoOcupao e mineraoOcupao e mineraoOcupao e minerao

    O ideal seria que o solo fosse tam-bm ocupado com planejamento urba-no adequado. Infelizmente, por falta deplanificao, muitas metrpoles estohoje edificadas em reas de difcil es-coamento pluvial, onde ocorre comple-ta impermeabilizao dos solos (cober-tura com asfalto e cimento), provocan-do enchentes nos rios e freqentesinundaes de cidades (Figura 7).

    Os problemas antrpicos causa-dos ao solo devidos s atividades deminerao tambm so freqentes(Figura8). A explorao de minriosdeve sempre ter como base funda-mental o preceito do uso sustentvel,ou seja, considerar tambm o bem es-tar das geraes futuras. Para tal,deve-se utilizar tcnicas menos des-trutivas e recuperar as reas degrada-das pelos impactos inerentes causa-dos pelas atividades mineradoras. Avegetao atua como um importantefator de proteo aos solos, permitin-do a maior infiltrao das guas e evi-tando o arraste da camada superficial

    e mais frtil do solo para os mananci-ais. Se o desmatamento ocorrer emreas de recargas de aqferos e/ou

    em matas ciliares, asconseqncias serodanosas e os efeitosdos impactos am-bientais sero sentidosrapidamente, resultan-do no rebaixamento donvel do lenol freticoe assoreamento dosmananciais.

    possvel recuperar um solo con- possvel recuperar um solo con- possvel recuperar um solo con- possvel recuperar um solo con- possvel recuperar um solo con-taminado?taminado?taminado?taminado?taminado?

    Existem algumas tecnologias que

    permitem a recuperao ou remediao(do ingls, remediation) de solos conta-minados e/ou degradados. Estas ba-seiam-se nas propriedades qumicas desubstncias e/ou processos fsicos queso utilizados para reteno, mobili-zao ou destruio de um determina-do contaminante presente no solo (Moerie Salvador, 2003; Baird, 1999). Podemser aplicadas in situ, isto , no lugar dacontaminao ou ex situ, ou seja, primei-ramente removendo a matria contami-nada para outro local.

    Bioremediao a utilizao deorganismos vivos, especialmente mi-crorganismos, para degradar poluen-tes ambientais. Para que uma tcnicade bioremediao funcione efetiva-

    Figura 7: Enchente ocorrida em Santo Andr/SP. (Registrada pelos reprteres J. B. Ferreirae K. Tamanaha, Janeiro de 1997.)

    (http://www.semasa.com.br/scripts/display.asp?idmenu=113&idnot=305)

    Figura 8: Atividade Mineradora.(Sistema de gesto ambiental da minerao Serra doSossego, Paraupeba, Par http://www.ksnet.com.br/paginas/servicos/mineracao1.htm)

    Existem algumastecnologias que

    permitem a recuperaoou remediao (do

    ingls, remediation) desolos contaminados e/ou

    degradados.

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    mente, os resduos devero ser e es-tar susceptveis degradao biolgi-ca. Alm disso, as condiesambientais, tais como pH, temperatu-ra e nvel de oxignio devem ser ade-quadas para a atua-o dos microrganis-mos.

    Recentemente, afitoremediao, isto ,o uso de vegetaopara a descontami-nao in situ de solos e sedimentos,eliminando metais e poluentes orgni-cos, tem se tornado uma tecnologiaemergente (Baird, 1999).

    Consideraes finais

    Diferentes partes do sistema bio-fsico do planeta Terra esto relaciona-das intrinsecamente, e em equilbriodinmico, com os trs grandes reser-vatrios litosfera, hidrosfera e atmos-fera. Este conceito implica que, se esseequilbrio for deslocado por algum im-pacto, o ambiente sempre reagir deforma a atingir outro estado de equil-brio, trocando matria e energia entreos reservatrios.

    Neste contexto, o reservatrio solosempre foi importante, tanto para a es-pcie humana como para grande partedos seres vivos, quanto ao fornecimen-to de alimentos e extrao de matrias-primas necessrias sobrevivncia.Devido ao crescimento demogrfico, o

    Figura 9: Exemplo de remediao de solo ex situ, em que o solo contaminado transferidopara outro local, onde ser feito o tratamento (Fonte: Silvestre e Marchi, 2003).

    ser humano tem desenvolvido e aprimo-rado tcnicas de reconhecimento, ma-nejo, conservao e melhoramento dossolos (www.cnpdia.embrapa.br). Entre-tanto, estes precisam ser protegidos

    atravs do uso susten-tado, alicerado em pla-nejamento adequado.Se estas aes forempraticadas de maneiraequilibrada com os ou-tros reservatrios, o re-

    curso natural solo no ser esgotado e/ou degradado, evitando o comprometi-mento das futuras geraes.

    Agradecimentos

    Os autores agradecem FAPESP,ao CNPq e CAPES por bolsas deestudo e suporte financeiro.

    Andr Henrique Rosa, Bacharel em Qumica, Mestree Doutor em Qumica Analtica pelo Instituto de Qumicada UNESP. Estgios Doutoral e Ps-Doutoral emQumica Ambiental no Institute of Spectrochemistry andApplied Spectroscopy (ISAS), Dortmund-Alemanha. Professor Assistente Doutor no Curso de EngenhariaAmbiental da UNESP (Unidade Diferenciada deSorocaba/Iper), [email protected]. Julio CesarRocha, terminou Bacharelado e Licenciatura naFFCLRP-USP, em 1980 e fez Mestrado em QumicaAnaltica no IQ-UNICAMP, em 1983. Contratado peloInstituto de Qumica de Araraquara-UNESP, desde1984,onde ministra aulas das Disciplinas de QumicaAnaltica e Qumica Ambiental. Terminou o Doutoradoem Qumica Analtica nessa instituio, em 1987. Fez2 anos de estgio de Ps Doutoramento no ISAS emDortmund Alemanha (1991-92). Foi Diretor da Divisode Qumica Ambiental da SBQ (1996-97) e temformado diversos mestres e doutores na especialidadeQumica Ambiental ([email protected]).

    O ideal seria que o solofosse tambm ocupado

    com planejamentourbano adequado.

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