filosofia modernidade terra explica que essacienciaecultura.bvs.br/pdf/cic/v56n3/a29v56n3.pdf · de...

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61 Immanuel Kant é considerado um dos mais importantes filósofos do pensamento ocidental. Duzentos anos após sua morte, em 1804, suas obras continuam sendo pensadas co- mo a expressão filosófica da moder- nidade. A partir de Kant, o homem torna-se o centro daquilo que pode ser conhecido, sendo a medida de todo o saber. Uma revolução no mundo do conhecimento que o pró- prio filósofo assemelha à “revolução copernicana”, referindo-se à teoria de Copérnico (1473-1543), a partir da qual o Sol passa a ocupar o centro do universo, e não mais a Terra, con- cepção anterior sobre o lugar deste planeta no sistema gravitacional. Kant nasceu em Königsberg, em 22 de abril de 1724. Sem nunca ter deixado essa pequena cidade da Prússia, o filósofo alemão ini- ciou seus estudos no Colégio Fri- dericianum rumo à Universidade de Königsberg, na qual tornou-se professor catedrático depois da apresentação de sua Dissertação so- bre a forma e os princípios do mun- do sensível e do mundo inteligível, em 1770. “Na filosofia, a modernidade está inscrita na forma pela qual Kant analisa as condições de possibilidade dos três campos da cultura separa- dos uns dos outros”, afirma Ricardo Terra, filósofo da Universidade de São Paulo (USP). Isso é observado nas três principais obras kantianas: Crítica da razão pura (1781), no do- mínio do teórico, no âmbito do co- nhecimento, da ciência; Crítica da razão prática (1788), no plano da ação, dos costumes; e a Crítica da faculdade de julgar (1790), no âmbi- to do belo, da arte. MODERNIDADE Terra explica que essa noção de modernidade aplicada às obras de Kant está relacionada à caracterização da modernidade cultural, estabelecida pelo sociólo- go alemão Max Weber. Na con- cepção weberiana, o processo de modernização da cultura ocorre com a quebra da articulação entre o saber, a ética, o direito e a arte, por um lado, em contraposição à teologia e à metafísica. “Antes des- se processo, passava-se de uma es- fera para outra sem sobressaltos. Por exemplo, a religião, de certa maneira, interferia nos domínios da ciência, da ética e da estética. Kant toma esses domínios como sendo independentes”, diz o filó- sofo da USP. Alexandre Zarias FILOSOFIA A REVOLUÇÃO PACÍFICA DE KANT Em 2005, no período de 4 a 9 de setembro, a USP será a sede do X Congresso Kant Internacional, cujo tema principal é “Direito e Paz na Filosofia de Kant”. Pela primeira vez, o Brasil recebe este congresso internacional, que é o mais importante no ciclo de debates sobre as idéias do filósofo alemão. Realizado a cada cinco anos, sempre na Alemanha, com duas exceções, quando ocorreu nos Estados Unidos, o congresso vem ao hemisfério sul como reconhecimento internacional dos estudos realizados no Brasil e também como uma forma de estabelecimento de contato dos pensadores europeus com outros centros de estudos. Para Ricardo Terra, um dos organizadores do X Congresso, a filosofia kantiana oferece elementos de várias ordens para pensarmos questões atuais, num cenário internacional de conflitos como o de hoje. “A máxima kantiana, com referência ao direito cosmopolita de que os direitos humanos, quando violados em qualquer parte, têm seus efeitos sentidos no mundo inteiro, ainda é válida”, conclui Terra. Maiores informações sobre o X Congresso Internacional Kant, estão no site da Sociedade Kant Brasileira (http://www.ufrgs.br/kantcongress/sociedadekant/). DIREITO E PAZ

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Immanuel Kant é considerado umdos mais importantes filósofos dopensamento ocidental. Duzentosanos após sua morte, em 1804, suasobras continuam sendo pensadas co-mo a expressão filosófica da moder-nidade. A partir de Kant, o homemtorna-se o centro daquilo que podeser conhecido, sendo a medida detodo o saber. Uma revolução nomundo do conhecimento que o pró-prio filósofo assemelha à “revoluçãocopernicana”, referindo-se à teoriade Copérnico (1473-1543), a partirda qual o Sol passa a ocupar o centrodo universo, e não mais a Terra, con-cepção anterior sobre o lugar desteplaneta no sistema gravitacional. Kant nasceu em Königsberg, em22 de abril de 1724. Sem nuncater deixado essa pequena cidadeda Prússia, o filósofo alemão ini-ciou seus estudos no Colégio Fri-dericianum rumo à Universidadede Königsberg, na qual tornou-seprofessor catedrático depois daapresentação de sua Dissertação so-bre a forma e os princípios do mun-do sensível e do mundo inteligível,em 1770.“Na filosofia, a modernidade estáinscrita na forma pela qual Kantanalisa as condições de possibilidadedos três campos da cultura separa-dos uns dos outros”, afirma RicardoTerra, filósofo da Universidade deSão Paulo (USP). Isso é observado

nas três principais obras kantianas:Crítica da razão pura (1781), no do-mínio do teórico, no âmbito do co-nhecimento, da ciência; Crítica darazão prática (1788), no plano daação, dos costumes; e a Crítica dafaculdade de julgar (1790), no âmbi-to do belo, da arte.

MODERNIDADE Terra explica que essanoção de modernidade aplicada àsobras de Kant está relacionada àcaracterização da modernidadecultural, estabelecida pelo sociólo-go alemão Max Weber. Na con-cepção weberiana, o processo demodernização da cultura ocorrecom a quebra da articulação entreo saber, a ética, o direito e a arte,por um lado, em contraposição àteologia e à metafísica. “Antes des-se processo, passava-se de uma es-fera para outra sem sobressaltos.Por exemplo, a religião, de certamaneira, interferia nos domíniosda ciência, da ética e da estética.Kant toma esses domínios comosendo independentes”, diz o filó-sofo da USP.

Alexandre Zarias

FILOSOFIA

A REVOLUÇÃOPACÍFICA DE KANT

Em 2005, no período de 4 a 9 de setembro, a USP será a sede do X Congresso

Kant Internacional, cujo tema principal é “Direito e Paz na Filosofia de Kant”.

Pela primeira vez, o Brasil recebe este congresso internacional, que é o mais

importante no ciclo de debates sobre as idéias do filósofo alemão. Realizado

a cada cinco anos, sempre na Alemanha, com duas exceções, quando ocorreu

nos Estados Unidos, o congresso vem ao hemisfério sul como reconhecimento

internacional dos estudos realizados no Brasil e também como uma forma

de estabelecimento de contato dos pensadores europeus com outros centros

de estudos.

Para Ricardo Terra, um dos organizadores do X Congresso, a filosofia kantiana

oferece elementos de várias ordens para pensarmos questões atuais, num

cenário internacional de conflitos como o de hoje. “A máxima kantiana, com

referência ao direito cosmopolita de que os direitos humanos, quando violados

em qualquer parte, têm seus efeitos sentidos no mundo inteiro, ainda é válida”,

conclui Terra. Maiores informações sobre o X Congresso Internacional Kant,

estão no site da Sociedade Kant Brasileira

(http://www.ufrgs.br/kantcongress/sociedadekant/).

DIREITO E PAZ