filosofia como ferramenta do gestor - para ficar menos triste, irritado, enlouquecido

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106 HSM Management 100 • SETEMBRO-OUTUBRO 2013 hsmmanagement.com.br DOSSIÊ PESSOAL FILOSOFIA COMO FERRAMENTA DO GESTOR E mbora tenham alcançado um sucesso espe- tacular em tornar as pessoas mais ricas, as sociedades contemporâneas vêm estimulan- do os apetites individuais tão continuamen- te que acabam por anular parte dos ganhos obtidos. Quem afirma isso é o suíço Alain de Botton, uma das grandes referências da filosofia mundial, autor de livros como As Consolações da Filosofia, Desejo de Status, A Arquitetura da Felicidade e Os Prazeres e Des- prazeres do Trabalho (todos, ed. Rocco). “Nas sociedades avançadas, pagam-nos salários ele- vados que aparentemente nos fazem mais ricos, mas na verdade o ‘efeito de rede’ (quando o valor de algo aumen- ta à medida que mais pessoas o consomem) pode estar nos empobrecendo, ao encorajar expectativas ilimita- das e manter aberta a brecha entre o que queremos e o que podemos ter”, afirma ele, em entrevista exclusiva a HSM Management. Expectativas tão altas dificilmente podem ser satisfei- tas e o resultado é uma sociedade de pessoas “tristes, irritadas, enlouquecidas” –e, como consequência, tam- bém pouco produtivas. Para Alain de Botton e um número crescente tanto de filósofos como de economistas e con- sultores de empresas, a melhor solução para o problema tende a ser a filosofia como uso pessoal, que põe o dedo nas feridas individuais, fazendo cada um distanciar-se de seu quadro para compreendê-lo melhor e, então, real- mente encaixar-se. DIAGNÓSTICO: CARÊNCIA ENORME E PERMANENTE As vantagens alcançadas em 2 mil anos de civilização oci- dental são enumeradas por De Botton: aumento da ri- queza, provisão de alimentos, conhecimento científico, COMPREENDER O PAPEL DO TRABALHO NA VIDA E OLHAR MENOS O QUE O OUTRO TEM E MAIS PARA SI MESMO É A PRIMEIRA PROPOSTA DESTE DOSSIÊ PARA QUE OS GESTORES ENFRENTEM OS DESAFIOS PROFISSIONAIS QUE OS ESPREITAM, CONFORME REPORTAGEM QUE INCLUI ENTREVISTA EXCLUSIVA COM O FILÓSOFO SUÍÇO ALAIN DE BOTTON A reportagem é de Laura Babini, colaboradora de HSM MANAGEMENT, com a cooperação de Sílvio Anaz. PARA FICAR MENOS TRISTE, IRRITADO, ENLOUQUECIDO

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Materia da HSM sobre filosofia para gestores

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106 HSM Management 100 • setembro-outubro 2013 hsmmanagement.com.br

DOSSIÊ PESSOALFILOSOFIA COMO FERRAMENTA DO GESTOR

Embora tenham alcançado um sucesso espe-tacular em tornar as pessoas mais ricas, as sociedades contemporâneas vêm estimulan-do os apetites individuais tão continuamen-te que acabam por anular parte dos ganhos obtidos. Quem afirma isso é o suíço Alain de

Botton, uma das grandes referências da filosofia mundial, autor de livros como As Consolações da Filosofia, Desejo de Status, A Arquitetura da Felicidade e Os Prazeres e Des-prazeres do Trabalho (todos, ed. Rocco).

“Nas sociedades avançadas, pagam-nos salários ele-vados que aparentemente nos fazem mais ricos, mas na verdade o ‘efeito de rede’ (quando o valor de algo aumen-ta à medida que mais pessoas o consomem) pode estar nos empobrecendo, ao encorajar expectativas ilimita-das e manter aberta a brecha entre o que queremos e o que podemos ter”, afirma ele, em entrevista exclusiva a HSM Management.

Expectativas tão altas dificilmente podem ser satisfei-tas e o resultado é uma sociedade de pessoas “tristes, irritadas, enlouquecidas” –e, como consequência, tam-bém pouco produtivas. Para Alain de Botton e um número crescente tanto de filósofos como de economistas e con-sultores de empresas, a melhor solução para o problema tende a ser a filosofia como uso pessoal, que põe o dedo nas feridas individuais, fazendo cada um distanciar-se de seu quadro para compreendê-lo melhor e, então, real-mente encaixar-se.

DIAGNÓSTICO: CARÊNCIA ENORME E PERMANENTEAs vantagens alcançadas em 2 mil anos de civilização oci-dental são enumeradas por De Botton: aumento da ri-queza, provisão de alimentos, conhecimento científico,

COMPREENDER O PAPEL DO TRABALHO NA VIDA E OLHAR MENOS O QUE O OUTRO TEM E MAIS PARA SI MESMO É A PRIMEIRA PROPOSTA DESTE DOSSIÊ PARA QUE OS GESTORES ENFRENTEM OS DESAFIOS PROFISSIONAIS QUE OS ESPREITAM, CONFORME REPORTAGEM QUE INCLUI ENTREVISTA EXCLUSIVA COM O FILÓSOFO SUÍÇO ALAIN DE BOTTON

A reportagem é de Laura Babini, colaboradora de HSM MANAGEMENT, com a cooperação de Sílvio Anaz.

Para ficar menos triste, irritado, enlouquecido

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diversidade de bens de consumo, segurança física, ex-pectativa de vida e oportunidades econômicas. “Porém”, adverte ele, “menos evidente e mais desconcertante do que tudo isso é a maneira pela qual tais avanços mate-riais podem perder sentido com o crescimento dos níveis de ansiedade por status entre os cidadãos do Ocidente, agora mais preocupados do que nunca com o prestígio, a renda e o lucro.”

O sentimento de carência se mostra, além de imenso, permanente: o que alguém é e tem nunca é suficiente. A explicação do filósofo é que nosso sentimento sobre o limi-te apropriado para algo, como a riqueza e a estima, surge da comparação de nossa condição com a de um grupo de referência, formado por aqueles que consideramos nos-sos iguais. Se temos uma casa confortável e um trabalho prazeroso, mas descobrimos, em uma reunião de ex-alu-nos, que alguns de nossos velhos amigos (não há grupo de referência mais forte) estão vivendo em casas maio-res que a nossa, adquiridas com o rendimento que obtêm em ocupações mais sedutoras, provavelmente nos senti-remos infelizes.

“O sentimento de que poderíamos ser outro e não o que somos, gerado pelos ganhos superiores daqueles que consideramos iguais, nos provoca ansiedade e ressenti-mento”, explica De Botton.

NUNCA FOI ASSIMO filósofo suíço sustenta que vivemos em uma época di-ferente de todas as outras, uma vez que é a ideia de opor-tunidade individual que ocupa o primeiríssimo plano. “No passado, vivíamos e morríamos no mesmo degrau da es-cada social”, diz. “A ocupação de nossos pais determinava a nossa. Os mercados financeiros eram primitivos e não era fácil ter acesso ao capital. Os avanços tecnológicos

surgiam a cada 200 anos e as mudanças políticas eram ainda menos frequentes.”

Hoje, teoricamente, não há mais limites que não possam ser superados, e abundam nos jornais histórias de inicia-tivas de mudar, perseverança, trabalho duro e autorreali-zação. “Presume-se que tudo é possível para quem é cria-tivo e obstinado, e dar-se por satisfeito com uma condição modesta parece ser um grave erro ou até sinal de trans-torno mental.”

O que De Botton argumenta é que a realidade mostra o contrário: o êxito que altera a escada social é incomum, al-cançado apenas por alguns entre muitos. Diferentemente do que as notícias sugerem, explica ele, “a maioria dos ne-gócios fracassa; poucos filmes são bem-sucedidos; ape-nas algumas trajetórias profissionais são extraordinárias; corpos e rostos, em sua maior parte, não são belos nem perfeitos, e habitualmente essas pessoas estão quase sempre tristes e preocupadas”. E a tristeza decorre do fato de medirmos nossa condição com base em parâmetros profundamente irreais.

É por isso que, apesar de dizer-se ateu e vir de um lar culturalmente judeu, ainda que não religioso, De Botton se confessa identificado com uma ideia de Santo Agosti-nho: é pecado julgar um homem por sua condição ou po-sição social. “Podemos ser iguais perante a lei e as urnas, mas não há garantia de tratamento digno no escritório, na vida social ou nos âmbitos das burocracias governamental e comercial, especialmente nas grandes cidades, onde o respeito é uma commodity racionada e escassa e a indife-rença é a norma. Basta você colocar o pé em uma grande metrópole para que alguém lhe dispare a inevitável per-gunta: ‘O que você faz?’.”

O esnobismo tornou-se um fenômeno mundial, segun-do o filósofo: esnobe é “a pessoa que toma uma pequena

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parte do outro para fazer um julgamento completo sobre quem o outro é”. O tipo de esnobismo que se vê por aí é o que De Botton chama de “esnobismo ocupacional”, referindo--se às pessoas que “condicionam a atenção que nos darão a nossa carreira e a nossos bens materiais”. No entanto, ele não crê que as pessoas sejam particularmente mate-rialistas, e sim que a sociedade vincula certas recompen-sas emocionais com a aquisição de bens materiais. “Não são os bens materiais o que queremos, mas suas recom-pensas”, afirma.

ATITUDE EM RELAÇÃO AO TRABALHOEm seu livro Os Prazeres e Desprazeres do Trabalho, De Botton analisa por que trabalhamos, como trabalhar de maneira mais tolerável e o que é uma vida profissional com significado, entre outros temas.

“Estamos vivendo uma época estranha, com demissões, desemprego, globalização e rápidas transformações tec-nológicas, porém o aspecto mais extraordinário no campo do trabalho talvez seja psicológico mais do que econômico ou industrial”, analisa. “Tem a ver com nossa atitude em face do trabalho e, mais especificamente, com a ampla ex-pectativa de que o trabalho possa nos fazer felizes e ser o centro de nossa vida.”

Novamente, nem sempre foi assim. Durante milhares de anos, o trabalho era visto como uma obrigação inevi-tável, algo que devia ser feito o mais rápido possível e do qual se fugia recorrendo ao álcool ou à “intoxicação reli-giosa”. Aristóteles foi o primeiro de muitos filósofos a afir-mar que ninguém poderia ser livre se estava obrigado a ganhar a vida trabalhando. Ter um trabalho, qualquer que fosse, era similar à escravidão e negava toda possibilidade de grandeza ou excelência, aponta De Botton. E acrescen-ta: “A ideia de que o trabalho pode ser divertido teve de es-perar até o Renascimento para obter alguma adesão”. Gê-nios das artes como Rafael e Leonardo da Vinci mostraram que uma pessoa poderia sentir-se melhor fazendo um tra-balho extraordinário do que vivendo como um aristocrata ocioso e que o trabalho talvez fosse a maior das bênçãos.

De Botton relaciona essa mudança de perspectiva com aquela registrada em relação ao amor. Na era pré-moder-na, estava amplamente estabelecido que ninguém podia apaixonar-se e casar com o sujeito de sua paixão. O matri-mônio se realizava por razões puramente comerciais, para herdar a granja familiar ou garantir a continuidade dinás-tica, e o amor era reservado à amante, com o prazer des-vinculado das responsabilidades de criar os filhos. Então, vieram os novos filósofos do amor, advogando que era pos-sível casar-se com a pessoa amada.

Da mesma forma, pensadores como Adam Smith e Max Weber destacaram a importância do trabalho para o pro-gresso humano e muitos filósofos disseram ser possível trabalhar por dinheiro e também para transformar os so-nhos em realidade. “Herdamos essas duas crenças am-

SAIBA MAIS SOBRE ALAIN DE BOTTONProlífico autor que transita entre o romance e o ensaio, combinando ficção com não ficção, Alain de Botton abar-ca em suas obras uma diversidade de temas, não restritos à filosofia; pode falar de amizade e de amor, e também de viagens e arquitetura, por exemplo. Mas a questão essen-cial que atravessa seus escritos e conferências é a preo-cupação com a natureza humana: como vivemos, como nos apaixonamos e como podemos encontrar felicidade e satisfação em nossa vida cotidiana, pessoal e profissional.

De Botton nasceu na Suíça em 1969 e atualmente resi-de em Londres. Formou-se em história pela Cambridge University e começou a escrever muito jovem. Alcançou a fama mundial em 1997, com a obra Como Proust Pode Mudar Sua Vida (ed. Rocco), que marcou o início de sua bem-sucedida carreira de escritor. Assíduo colaborador de jornais e revistas, é membro do painel de literatura do conselho de artes da Inglaterra. Além disso, tem partici-pado da realização de documentários para a TV e ajuda a dirigir a própria produtora, a Seneca Productions. Recen-temente contribuiu para a criação de organizações como The School of Life e Living Architecture, empresa que constrói casas para aluguel de veraneio no Reino Unido com base em projetos ousados de arquitetos renomados que proponham outros modos de vida.

Foto: Mathias Marx

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biciosas: que uma pessoa pode apaixonar-se e casar-se (com o sujeito por quem se apaixonou) e ter um trabalho que traga bons momentos. Mais ainda: tornou-se impos-sível pensar que alguém pode ser feliz sem o trabalho.”

O fato é que essas ambiciosas ideias sobre o trabalho, embora tragam ganhos, também fazem várias vítimas. “Pense na quantidade de empreendedores que perderam tudo porque desejaram excessivamente”, diz De Botton. Ele explica: “A ideia de lançar um novo negócio é a chave da moderna noção de realização, introduzida na socie-dade por meio dos admiráveis perfis de empreendedo-res de alta importância e associada a um relativo silêncio sobre os fracassos e os não muito raros suicídios entre os menos afortunados”.

O filósofo complementa esse conceito: “A probabilida-de de alcançar o ponto mais alto na sociedade capitalista é hoje somente um pouco maior do que era há quatro sécu-los a probabilidade de ser aceito na nobreza francesa –e a época aristocrática era mais amável, porque nela não se equiparava cruelmente uma vida normal a um fracasso”.

O leitor pode observar isso com uma reflexão simples: se alguém crê sinceramente que o trabalho pode ser tudo em sua vida, o que faz quando se sente insatis-feito ou é demitido? “Se as coisas no trabalho vão mal, nós nos sentimos infelizes, entre outras coisas, porque nossa promessa mais profunda de felicidade foi frustra-da”, afirma De Botton.

O PARADOXO DE TRABALHARAlguns filósofos já apontaram que é imenso o dano causa-do pela crença de que o trabalho é virtuoso. Por exemplo, o filósofo e matemático britânico Bertrand Russell defen-deu, no começo do século 20, a ideia de que o caminho para a felicidade está na redução organizada do trabalho. Não à toa, nas empresas é comum encontrar pessoas ansiosas pelas férias, confirmando a observação de Aristóteles de que, para muitos, a felicidade depende do lazer e que tra-balhamos apenas para ter momentos de ócio. Além disso, a palavra “trabalho” vem do latim “tripalium”, técnica de tortura em que um condenado era preso a três paus finca-dos no chão.

De todo modo, o trabalho é paradoxal. O filósofo brasi-leiro Mario Sergio Cortella afirma que as sociedades oci-dentais herdaram as duas visões de trabalho –como sofri-mento e como realização. “As sociedades escravagistas, como foram a sociedade grega clássica, a sociedade ro-mana e, por herança, as sociedades ocidentais, tiveram a ideia do trabalho como castigo ou indignidade. O escrava-gismo pressupõe que há uma distinção entre aqueles que têm direito ao esforço meramente intelectual e de direção e outros que precisam suar o corpo.”

No entanto, com a reforma luterana e calvinista, quan-do passou a ter força a ideia de que o trabalho dignifica o homem, colocando-o como ferramenta de salvação, isso

mudou. O problema é que agora chegamos a uma situa-ção de “laborlatria”, como Cortella denomina a percepção do trabalho como um ponto de referência exclusivo. “A ‘la-borlatria’ é a adoração do trabalho a ponto de este não ser mais algo que realiza, e sim algo que escraviza e fere”, diz o filósofo brasileiro. Por isso, ele procura fazer uma distin-ção entre trabalho e emprego: “Emprego é fonte de renda e trabalho é fonte de vida”.

Para o filósofo e economista francês radicado no Bra-sil Jean Bartoli, o trabalho vai sempre oscilar entre as duas dimensões, de realização e de sofrimento, e o dia a dia o comprova. “Por mais que você goste de seu tra-balho, em determinados momentos há coisas que o li-mitam, atrapalham e pesam. De outro lado, em uma si-tuação de trabalho difícil, sofrida, você tem momentos de realização e alegria por algo bem-feito. Vivemos as duas dimensões.”

AUTOAJUDA X AUTO PRESERVAÇÃOCompreendido o papel protagonista e polêmico do traba-lho em nossa vida, os filósofos têm se dedicado a estu-dar caminhos para estarmos “um pouco menos tristes, irritados e enlouquecidos e alcançarmos certa sabedoria e calma no mundo atual”, como diz Alain de Botton. Em geral, trata-se de medidas que os céticos se apressam em rotular de “autoajuda”, mas que também podem ser vis-

tas como uma decisão mais profunda em prol da vida com qualidade e dignidade.

Em comum, essas medidas levam a pessoa a olhar menos para o outro e mais para si mesma. Dois dos prin-cipais pontos que De Botton tem desenvolvido giram em torno de uma reaproximação da religião e de uma forma diferente de educação, que reclassifica o conhecimen-to humano.

Utilidade da religião. Algumas das mais interessantes reflexões de De Botton encontram-se nesse front. “Em

TENDE A SER DANOSA A CRENÇA DE qUE O TRABALHO é VIRTUOSO. MUITOS TRABALHAM SÓ PARA TER MOMENTOS DE ÓCIO, qUANDO SE é FELIz, SEGUNDO ARISTÓTELES

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vez de limitar a questão aos grupos de fanáticos religio-sos enfrentando um grupo de ateus fanáticos, tomo um caminho diferente. Acredito que, mesmo para quem é ateu ou não religioso, é possível considerar as religiões esporadicamente úteis, interessantes e reconfortantes e pensar em importar algumas de suas ideias e práticas para o campo secular.”

O filósofo suíço sugere que, em vez de zombar das re-ligiões, devemos entender que as ideias do mundo re-ligioso podem ser úteis para melhorar a qualidade de vida e satisfazer a necessidade humana de conexão e transcendência. “Alguém pode ser indiferente às dou-trinas da Trindade cristã e ao Caminho Quíntuplo budis-ta e ainda assim estar interessado no modo pelo qual as religiões geram um espírito de comunidade, fazem uso da arquitetura e da arte, inspiram viagens, treinam a mente e encorajam a gratidão diante da beleza da pri-mavera”, afirma.

Novo modelo de ensino. Uma das realizações mais polê-micas de Alain de Botton é a The School of Life (a escola da vida), um tipo de universidade ideal, “onde se tem a opor-tunidade de escapar das pressões comerciais e examinar as grandes questões da vida, em um ambiente cheio de gente fascinante, para se tornar uma pessoa melhor, mais sábia e interessante”.

Ele imaginava que qualquer universidade era assim, até ingressar em uma e descobrir que as universidades cum-prem a função de treinar as pessoas para uma carreira específica ou oferecer rudimentos em temas como lite-ratura ou história. Para ele, o distanciamento em relação às religiões explica o problema. “Monastérios e seminá-rios preocupavam-se em oferecer um aprendizado prático para a vida; buscavam salvar sua alma, ensinar-lhe a ser bom e sábio. Em uma sociedade mais secular, a ideia do correto e do incorreto, ou do bom e do mau, infelizmente nos envergonha.”

Em 2008, o filósofo juntou-se a um grupo de acadêmi-cos, artistas e escritores e decidiu criar, no centro de Lon-dres, a The School of Life. “No currículo de nossa escola, não se encontram temas como filosofia, francês, história ou os ‘clássicos’, mas cursos sobre morte, matrimônio, es-colha de carreira, ambição, envelhecimento ou ‘mudar seu mundo’. Com o tempo, aprende-se sobre livros e ideias que as universidades tradicionais oferecem.”

Da mesma forma, a livraria da The School of Life eli-minou as categorias tradicionais, como “ficção” ou “his-tória”, e reclassificou as obras de acordo com proble-

mas particulares: “para os que se preocupam durante a noite” ou “como ser feliz estando casado”, por exemplo. De Botton chama essa livraria de “remédio para a alma” e descreve sua The School of Life como uma modesta tenta-tiva de mudar a maneira pela qual se pratica o ensino em quase todo o mundo, capacitando as pessoas a tornar a vida mais administrável e interessante.

A The School of Life promove cursos no Brasil desde abril deste ano, onde é liderada por uma prima do filósofo, Jackie.

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LIÇõES DE ALAIN DE BOTTON, ENTRE A FILOSOFIA E AAUTOAJUDA

1 Não viva se comparando com seus colegas. Concentre-se em sua zona de conforto e tenha anseios realistas.

2 Resgate as boas práticas de campos como a religião e estenda-as à empresa.

3 Trabalhe para se tornar uma pessoa melhor.

EM VEz DE zOMBAR DAS RELIGIõES, DEVE-SE ENTENDER qUE SUAS IDEIAS SÃO úTEIS PARA MELHORAR A qUALIDADE DE VIDA E SATISFAzER NECESSIDADES HUMANAS, COMO A CONEXÃO