ficha tÉcnica - artigo19 · 2021. 1. 18. · análise para entender como o estado brasilei-ro...
TRANSCRIPT
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FICHA TEacuteCNICA
RealizaccedilatildeoARTIGO 19
Pesquisa e textoGabriel Rechiche Maria Tranjan Thiago Firbida
ColaboraccedilatildeoGizele Martins Juacutelia Cruz Silvia Chocarro
RevisatildeoDeacutebora Prado Denise Dora
Diagramaccedilatildeo e ArteCaacutessio Abreu
ATENCcedilAtildeO
Esse natildeo eacute um relatoacuterio exaustivo Novas informaccedilotildees e alteraccedilotildees poderatildeo ser acrescentadas conforme aprofundamento dos casos envio de novos relatos e avanccedilo das investigaccedilotildees oficiais Informaccedilotildees sobre os casos inseridos neste e nos outros relatoacuterios anuais de Violaccedilotildees agrave Liberdade de Expressatildeo da ARTIGO 19 estatildeo disponiacuteveis no portal violacoesartigo19org
Licenccedila da obraCC 30 BY-SA
Link da licenccedilahttpscreativecommonsorglicensesby-sa30deedpt_BR
Capiacutetulo 1
Introduccedilatildeo 04
Capiacutetulo 2
Contexto internacional 06
Capiacutetulo 3
Panorama geral da violecircncia contra comunicadores 10
Capiacutetulo 4
A desinformaccedilatildeo como risco agrave sauacutede puacuteblicaataque a comunicadores cobrindo a crise da Covid-19 19
Capiacutetulo 5
O papel da comunicaccedilatildeo comunitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento de seus territoacuterios 21
Capiacutetulo 6
O papel do estado na intensificaccedilatildeo das violaccedilotildees contra comunicadores 27
O discurso puacuteblico de autoridades e a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees contra comunicadores 28
O mecanismo de proteccedilatildeo brasileiro e a obrigaccedilatildeo do Estado de proteger comunicadores em situaccedilatildeo de risco 31
O combate agrave impunidade e a obrigaccedilatildeo de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores 35
O papel das autoridades puacuteblicas no combate agrave impunidade 38
Capiacutetulo 7
Conclusotildees 41
Capiacutetulo 8
Recomendaccedilotildees 43
Capiacutetulo 9
Nota Metodoloacutegica 47
SUMAacuteRIO
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CAPIacuteTULO 1
INTRODUCcedilAtildeO
Desde 2012 a ARTIGO 19 produz este Rela-toacuterio de monitoramento das graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo no Brasil O cenaacuterio de violecircncia contra comunicadores no paiacutes eacute preocupante haacute deacutecadas e este monitora-mento contribui para jogar luz na sistematici-dade dessa violecircncia Nesse sentido sempre compreendemos que mais do que apresentar nuacutemeros e graacuteficos sobre a violecircncia eacute funda-mental entender que esses nuacutemeros represen-tam vidas de pessoas reais Pessoas com sua histoacuteria suas relaccedilotildees seus interesses sua perspectiva de futuro Infelizmente em muitos casos apresentamos vidas e trajetoacuterias que foram interrompidas E tudo isso em nome de um objetivo central o silecircncio O silecircncio que permite arbitrariedades que fatos sejam dis-torcidos e manipulados que o poder corrompi-do se imponha sobre os direitos que deveriam organizar a vida em sociedade Eacute contra isso que lutamos e porque continuamos a publicar este Relatoacuterio todos os anos
A violecircncia contra comunicadores como bem se sabe eacute uma violaccedilatildeo dupla viola os direitos individuais das pessoas que sofrem a violecircn-cia e ao mesmo tempo viola o direito coletivo agrave informaccedilatildeo que toda a sociedade possui E eacute justamente esse duplo impacto que procu-ramos entender neste relatoacuterio quais satildeo os mecanismos que reproduzem essa loacutegica de ataque contra certos indiviacuteduos para impedir que informaccedilotildees circulem livremente na so-ciedade A quem e a que interessa cercear a pluralidade de vozes
Estamos cientes que esses mecanis-mos satildeo complexos e diversos e natildeo preten-demos capturaacute-los e analisaacute-los de maneira exaustiva em um soacute relatoacuterio inclusive porque os cenaacuterios poliacutetico e social que sustentam esses mecanismos de violecircncia continuam se intensificando e complexificando ano a ano no Brasil e no mundo
Neste relatoacuterio apresentamos os da-dos das graves violaccedilotildees contra comunica-
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dores homiciacutedios tentativas de assassinato e ameaccedilas de morte que ocorreram em 2019 e dados preliminares do primeiro semestre de 2020 No entanto a cada ano cresce a convic-ccedilatildeo de que focar a anaacutelise somente nessas vio-laccedilotildees mais graves de atentados diretos con-tra a vida de comunicadores natildeo eacute suficiente para compreender o contexto de violecircncia As violaccedilotildees mais extremas e graves satildeo um as-pecto importante desse contexto mas a loacutegica da violecircncia contra comunicadores tambeacutem utiliza violaccedilotildees aparentemente mais sutis mas que tecircm um impacto enorme na limitaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo E que corroboram para a perpetuaccedilatildeo das violaccedilotildees e da impu-nidade que concorrem para os desfechos mais graves e ateacute fatais
Entre esses outros tipos de violaccedilotildees tecircm se destacado nos uacuteltimos anos as agres-sotildees digitais contra comunicadores que mui-tas vezes satildeo realizadas de maneira massiva e impactando a sauacutede a seguranccedila pessoal e a proacutepria disposiccedilatildeo de continuar atuando no campo Ainda que essas violaccedilotildees digitais se-jam realizadas por uma diversidade de atores nos uacuteltimos dois anos destaca-se o papel que o grupo poliacutetico que hoje ocupa a Presidecircncia da Repuacuteblica tem na intensificaccedilatildeo dessas violecircn-cias O que vemos satildeo violaccedilotildees sistemaacuteticas cometidas por altas autoridades do Estado que servem de sinalizaccedilatildeo para que ataques digi-tais massivos busquem deslegitimar desquali-ficar e silenciar comunicadores que produzam mateacuterias criacuteticas ao Presidente da Repuacuteblica e seu grupo poliacutetico
Nesse sentido retomamos as obriga-ccedilotildees que o Estado brasileiro assumiu perante a comunidade internacional como acircngulo de anaacutelise para entender como o Estado brasilei-ro ativamente viola a liberdade de expressatildeo no paiacutes Assim entendemos que a violaccedilatildeo das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir tem servido para (re)construir uma poliacutetica de censura no paiacutes Se natildeo aquela censura insti-tucional mais formal que conhecemos no pe-riacuteodo da ditadura militar com fechamento de veiacuteculos e legislaccedilatildeo de censura certamente uma censura informal mas ainda assim arti-culada por autoridades puacuteblicas e muitas ve-
zes por meios institucionais tendo tambeacutem efeitos deleteacuterios para a liberdade de expres-satildeo e o direito agrave informaccedilatildeo no paiacutes
Para compreender essa construccedilatildeo da censura tambeacutem eacute fundamental perceber para aleacutem da accedilatildeo direta de autoridades puacutebli-cas contra a liberdade de expressatildeo o cenaacute-rio mais estrutural de desigualdade social e de concentraccedilatildeo econocircmica e poliacutetica dos meios de comunicaccedilatildeo Assim cientes de que nossa metodologia de monitoramento de casos de violaccedilatildeo pode ainda natildeo visibilizar todos os setores sociais fundamentais para a garantia da liberdade de expressatildeo trazemos tambeacutem uma anaacutelise do papel da comunicaccedilatildeo comu-nitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento da pluralidade de vozes e da luta por direitos e resistecircncia de territoacuterios e comunidades pelo paiacutes
Essas perspectivas de anaacutelise aqui apresentadas apresentam uma parte do pro-blema e estamos cientes de que haacute ainda pontos ausentes neste estudo mas que satildeo igualmente importantes para entender a violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo como os recortes de gecircnero e raccedila que impactam o trabalho de comunicadoras de vaacuterios perfis no paiacutes e as especificidades da violecircncia digital como forma de ataque a mulheres co-municadoras Temos que avanccedilar no enten-dimento de como o vigilantismo do Estado afeta o trabalho de comunicadores e como um processo de criminalizaccedilatildeo cada vez mais intenso coloca em risco esse trabalho Temos que entender melhor o papel da crescente militarizaccedilatildeo (e milicializaccedilatildeo) no silencia-mento de comunidades e territoacuterios por meio de violaccedilotildees massivas e sistemaacuteticas que acontecem e natildeo alcanccedilam o mesmo tipo de visibilidade das violaccedilotildees sofridas por outros setores sociais diante das discriminaccedilotildees es-truturais que ainda operam no paiacutes Essas e outras questotildees afetam muitas pessoas e gru-pos que estatildeo na luta pela defesa de direitos inclusive o direito de existir e viver de maneira livre e plena e que contribuem para garantir a pluralidade de vozes e o direito agrave informaccedilatildeo da sociedade A ARTIGO 19 se compromete a estar ao seu lado nessa luta
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CAPIacuteTULO 2
CONTEXTO INTERNACIONAL
Em outubro de 2020 a ARTIGO 19 publicou o seu Relatoacuterio Global de Expressatildeo1 onde ana-lisa a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo em todo o mundo Segundo o relatoacuterio a liberdade de expressatildeo atingiu seu menor patamar no mundo todo em 20 anos com cerca de 39 bi-lhotildees de pessoas 51 da populaccedilatildeo mundial vivendo em paiacuteses onde a garantia deste direi-to estaacute em crise A queda foi puxada por restri-ccedilotildees crescentes em paiacuteses com grandes popu-laccedilotildees como a China Iacutendia Turquia Ruacutessia Bangladesh e Iratilde e por retrocessos e quedas
alarmantes em paiacuteses como o Brasil Estados Unidos Hungria e Tanzacircnia
A meacutetrica do Relatoacuterio Global de Ex-pressatildeo rastreia a liberdade de expressatildeo em todo o mundo Ela reflete natildeo apenas os direi-tos da miacutedia de comunicadores e defensores de direitos humanos e ambientais mas qual o espaccedilo existente para todos noacutes - como pes-soas e membros de organizaccedilotildees - nos expres-sar comunicar e saber Olhamos como cada pessoa eacute livre para se comunicar on-line pro-testar ensinar e acessar informaccedilotildees para ga-
1 Veja o sumaacuterio executivo do relatoacuterio aqui
httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files202010SumarioExecutivoGxR_PTpdf
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
33
entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
39
Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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CAPIacuteTULO 8
RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
1
Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
FICHA TEacuteCNICA
RealizaccedilatildeoARTIGO 19
Pesquisa e textoGabriel Rechiche Maria Tranjan Thiago Firbida
ColaboraccedilatildeoGizele Martins Juacutelia Cruz Silvia Chocarro
RevisatildeoDeacutebora Prado Denise Dora
Diagramaccedilatildeo e ArteCaacutessio Abreu
ATENCcedilAtildeO
Esse natildeo eacute um relatoacuterio exaustivo Novas informaccedilotildees e alteraccedilotildees poderatildeo ser acrescentadas conforme aprofundamento dos casos envio de novos relatos e avanccedilo das investigaccedilotildees oficiais Informaccedilotildees sobre os casos inseridos neste e nos outros relatoacuterios anuais de Violaccedilotildees agrave Liberdade de Expressatildeo da ARTIGO 19 estatildeo disponiacuteveis no portal violacoesartigo19org
Licenccedila da obraCC 30 BY-SA
Link da licenccedilahttpscreativecommonsorglicensesby-sa30deedpt_BR
Capiacutetulo 1
Introduccedilatildeo 04
Capiacutetulo 2
Contexto internacional 06
Capiacutetulo 3
Panorama geral da violecircncia contra comunicadores 10
Capiacutetulo 4
A desinformaccedilatildeo como risco agrave sauacutede puacuteblicaataque a comunicadores cobrindo a crise da Covid-19 19
Capiacutetulo 5
O papel da comunicaccedilatildeo comunitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento de seus territoacuterios 21
Capiacutetulo 6
O papel do estado na intensificaccedilatildeo das violaccedilotildees contra comunicadores 27
O discurso puacuteblico de autoridades e a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees contra comunicadores 28
O mecanismo de proteccedilatildeo brasileiro e a obrigaccedilatildeo do Estado de proteger comunicadores em situaccedilatildeo de risco 31
O combate agrave impunidade e a obrigaccedilatildeo de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores 35
O papel das autoridades puacuteblicas no combate agrave impunidade 38
Capiacutetulo 7
Conclusotildees 41
Capiacutetulo 8
Recomendaccedilotildees 43
Capiacutetulo 9
Nota Metodoloacutegica 47
SUMAacuteRIO
4
CAPIacuteTULO 1
INTRODUCcedilAtildeO
Desde 2012 a ARTIGO 19 produz este Rela-toacuterio de monitoramento das graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo no Brasil O cenaacuterio de violecircncia contra comunicadores no paiacutes eacute preocupante haacute deacutecadas e este monitora-mento contribui para jogar luz na sistematici-dade dessa violecircncia Nesse sentido sempre compreendemos que mais do que apresentar nuacutemeros e graacuteficos sobre a violecircncia eacute funda-mental entender que esses nuacutemeros represen-tam vidas de pessoas reais Pessoas com sua histoacuteria suas relaccedilotildees seus interesses sua perspectiva de futuro Infelizmente em muitos casos apresentamos vidas e trajetoacuterias que foram interrompidas E tudo isso em nome de um objetivo central o silecircncio O silecircncio que permite arbitrariedades que fatos sejam dis-torcidos e manipulados que o poder corrompi-do se imponha sobre os direitos que deveriam organizar a vida em sociedade Eacute contra isso que lutamos e porque continuamos a publicar este Relatoacuterio todos os anos
A violecircncia contra comunicadores como bem se sabe eacute uma violaccedilatildeo dupla viola os direitos individuais das pessoas que sofrem a violecircn-cia e ao mesmo tempo viola o direito coletivo agrave informaccedilatildeo que toda a sociedade possui E eacute justamente esse duplo impacto que procu-ramos entender neste relatoacuterio quais satildeo os mecanismos que reproduzem essa loacutegica de ataque contra certos indiviacuteduos para impedir que informaccedilotildees circulem livremente na so-ciedade A quem e a que interessa cercear a pluralidade de vozes
Estamos cientes que esses mecanis-mos satildeo complexos e diversos e natildeo preten-demos capturaacute-los e analisaacute-los de maneira exaustiva em um soacute relatoacuterio inclusive porque os cenaacuterios poliacutetico e social que sustentam esses mecanismos de violecircncia continuam se intensificando e complexificando ano a ano no Brasil e no mundo
Neste relatoacuterio apresentamos os da-dos das graves violaccedilotildees contra comunica-
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dores homiciacutedios tentativas de assassinato e ameaccedilas de morte que ocorreram em 2019 e dados preliminares do primeiro semestre de 2020 No entanto a cada ano cresce a convic-ccedilatildeo de que focar a anaacutelise somente nessas vio-laccedilotildees mais graves de atentados diretos con-tra a vida de comunicadores natildeo eacute suficiente para compreender o contexto de violecircncia As violaccedilotildees mais extremas e graves satildeo um as-pecto importante desse contexto mas a loacutegica da violecircncia contra comunicadores tambeacutem utiliza violaccedilotildees aparentemente mais sutis mas que tecircm um impacto enorme na limitaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo E que corroboram para a perpetuaccedilatildeo das violaccedilotildees e da impu-nidade que concorrem para os desfechos mais graves e ateacute fatais
Entre esses outros tipos de violaccedilotildees tecircm se destacado nos uacuteltimos anos as agres-sotildees digitais contra comunicadores que mui-tas vezes satildeo realizadas de maneira massiva e impactando a sauacutede a seguranccedila pessoal e a proacutepria disposiccedilatildeo de continuar atuando no campo Ainda que essas violaccedilotildees digitais se-jam realizadas por uma diversidade de atores nos uacuteltimos dois anos destaca-se o papel que o grupo poliacutetico que hoje ocupa a Presidecircncia da Repuacuteblica tem na intensificaccedilatildeo dessas violecircn-cias O que vemos satildeo violaccedilotildees sistemaacuteticas cometidas por altas autoridades do Estado que servem de sinalizaccedilatildeo para que ataques digi-tais massivos busquem deslegitimar desquali-ficar e silenciar comunicadores que produzam mateacuterias criacuteticas ao Presidente da Repuacuteblica e seu grupo poliacutetico
Nesse sentido retomamos as obriga-ccedilotildees que o Estado brasileiro assumiu perante a comunidade internacional como acircngulo de anaacutelise para entender como o Estado brasilei-ro ativamente viola a liberdade de expressatildeo no paiacutes Assim entendemos que a violaccedilatildeo das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir tem servido para (re)construir uma poliacutetica de censura no paiacutes Se natildeo aquela censura insti-tucional mais formal que conhecemos no pe-riacuteodo da ditadura militar com fechamento de veiacuteculos e legislaccedilatildeo de censura certamente uma censura informal mas ainda assim arti-culada por autoridades puacuteblicas e muitas ve-
zes por meios institucionais tendo tambeacutem efeitos deleteacuterios para a liberdade de expres-satildeo e o direito agrave informaccedilatildeo no paiacutes
Para compreender essa construccedilatildeo da censura tambeacutem eacute fundamental perceber para aleacutem da accedilatildeo direta de autoridades puacutebli-cas contra a liberdade de expressatildeo o cenaacute-rio mais estrutural de desigualdade social e de concentraccedilatildeo econocircmica e poliacutetica dos meios de comunicaccedilatildeo Assim cientes de que nossa metodologia de monitoramento de casos de violaccedilatildeo pode ainda natildeo visibilizar todos os setores sociais fundamentais para a garantia da liberdade de expressatildeo trazemos tambeacutem uma anaacutelise do papel da comunicaccedilatildeo comu-nitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento da pluralidade de vozes e da luta por direitos e resistecircncia de territoacuterios e comunidades pelo paiacutes
Essas perspectivas de anaacutelise aqui apresentadas apresentam uma parte do pro-blema e estamos cientes de que haacute ainda pontos ausentes neste estudo mas que satildeo igualmente importantes para entender a violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo como os recortes de gecircnero e raccedila que impactam o trabalho de comunicadoras de vaacuterios perfis no paiacutes e as especificidades da violecircncia digital como forma de ataque a mulheres co-municadoras Temos que avanccedilar no enten-dimento de como o vigilantismo do Estado afeta o trabalho de comunicadores e como um processo de criminalizaccedilatildeo cada vez mais intenso coloca em risco esse trabalho Temos que entender melhor o papel da crescente militarizaccedilatildeo (e milicializaccedilatildeo) no silencia-mento de comunidades e territoacuterios por meio de violaccedilotildees massivas e sistemaacuteticas que acontecem e natildeo alcanccedilam o mesmo tipo de visibilidade das violaccedilotildees sofridas por outros setores sociais diante das discriminaccedilotildees es-truturais que ainda operam no paiacutes Essas e outras questotildees afetam muitas pessoas e gru-pos que estatildeo na luta pela defesa de direitos inclusive o direito de existir e viver de maneira livre e plena e que contribuem para garantir a pluralidade de vozes e o direito agrave informaccedilatildeo da sociedade A ARTIGO 19 se compromete a estar ao seu lado nessa luta
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CAPIacuteTULO 2
CONTEXTO INTERNACIONAL
Em outubro de 2020 a ARTIGO 19 publicou o seu Relatoacuterio Global de Expressatildeo1 onde ana-lisa a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo em todo o mundo Segundo o relatoacuterio a liberdade de expressatildeo atingiu seu menor patamar no mundo todo em 20 anos com cerca de 39 bi-lhotildees de pessoas 51 da populaccedilatildeo mundial vivendo em paiacuteses onde a garantia deste direi-to estaacute em crise A queda foi puxada por restri-ccedilotildees crescentes em paiacuteses com grandes popu-laccedilotildees como a China Iacutendia Turquia Ruacutessia Bangladesh e Iratilde e por retrocessos e quedas
alarmantes em paiacuteses como o Brasil Estados Unidos Hungria e Tanzacircnia
A meacutetrica do Relatoacuterio Global de Ex-pressatildeo rastreia a liberdade de expressatildeo em todo o mundo Ela reflete natildeo apenas os direi-tos da miacutedia de comunicadores e defensores de direitos humanos e ambientais mas qual o espaccedilo existente para todos noacutes - como pes-soas e membros de organizaccedilotildees - nos expres-sar comunicar e saber Olhamos como cada pessoa eacute livre para se comunicar on-line pro-testar ensinar e acessar informaccedilotildees para ga-
1 Veja o sumaacuterio executivo do relatoacuterio aqui
httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files202010SumarioExecutivoGxR_PTpdf
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
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CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
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A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
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A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
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8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
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A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
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A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
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A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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CAPIacuteTULO 8
RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
1
Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
Capiacutetulo 1
Introduccedilatildeo 04
Capiacutetulo 2
Contexto internacional 06
Capiacutetulo 3
Panorama geral da violecircncia contra comunicadores 10
Capiacutetulo 4
A desinformaccedilatildeo como risco agrave sauacutede puacuteblicaataque a comunicadores cobrindo a crise da Covid-19 19
Capiacutetulo 5
O papel da comunicaccedilatildeo comunitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento de seus territoacuterios 21
Capiacutetulo 6
O papel do estado na intensificaccedilatildeo das violaccedilotildees contra comunicadores 27
O discurso puacuteblico de autoridades e a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees contra comunicadores 28
O mecanismo de proteccedilatildeo brasileiro e a obrigaccedilatildeo do Estado de proteger comunicadores em situaccedilatildeo de risco 31
O combate agrave impunidade e a obrigaccedilatildeo de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores 35
O papel das autoridades puacuteblicas no combate agrave impunidade 38
Capiacutetulo 7
Conclusotildees 41
Capiacutetulo 8
Recomendaccedilotildees 43
Capiacutetulo 9
Nota Metodoloacutegica 47
SUMAacuteRIO
4
CAPIacuteTULO 1
INTRODUCcedilAtildeO
Desde 2012 a ARTIGO 19 produz este Rela-toacuterio de monitoramento das graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo no Brasil O cenaacuterio de violecircncia contra comunicadores no paiacutes eacute preocupante haacute deacutecadas e este monitora-mento contribui para jogar luz na sistematici-dade dessa violecircncia Nesse sentido sempre compreendemos que mais do que apresentar nuacutemeros e graacuteficos sobre a violecircncia eacute funda-mental entender que esses nuacutemeros represen-tam vidas de pessoas reais Pessoas com sua histoacuteria suas relaccedilotildees seus interesses sua perspectiva de futuro Infelizmente em muitos casos apresentamos vidas e trajetoacuterias que foram interrompidas E tudo isso em nome de um objetivo central o silecircncio O silecircncio que permite arbitrariedades que fatos sejam dis-torcidos e manipulados que o poder corrompi-do se imponha sobre os direitos que deveriam organizar a vida em sociedade Eacute contra isso que lutamos e porque continuamos a publicar este Relatoacuterio todos os anos
A violecircncia contra comunicadores como bem se sabe eacute uma violaccedilatildeo dupla viola os direitos individuais das pessoas que sofrem a violecircn-cia e ao mesmo tempo viola o direito coletivo agrave informaccedilatildeo que toda a sociedade possui E eacute justamente esse duplo impacto que procu-ramos entender neste relatoacuterio quais satildeo os mecanismos que reproduzem essa loacutegica de ataque contra certos indiviacuteduos para impedir que informaccedilotildees circulem livremente na so-ciedade A quem e a que interessa cercear a pluralidade de vozes
Estamos cientes que esses mecanis-mos satildeo complexos e diversos e natildeo preten-demos capturaacute-los e analisaacute-los de maneira exaustiva em um soacute relatoacuterio inclusive porque os cenaacuterios poliacutetico e social que sustentam esses mecanismos de violecircncia continuam se intensificando e complexificando ano a ano no Brasil e no mundo
Neste relatoacuterio apresentamos os da-dos das graves violaccedilotildees contra comunica-
5
Intr
oduccedil
atildeoCa
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dores homiciacutedios tentativas de assassinato e ameaccedilas de morte que ocorreram em 2019 e dados preliminares do primeiro semestre de 2020 No entanto a cada ano cresce a convic-ccedilatildeo de que focar a anaacutelise somente nessas vio-laccedilotildees mais graves de atentados diretos con-tra a vida de comunicadores natildeo eacute suficiente para compreender o contexto de violecircncia As violaccedilotildees mais extremas e graves satildeo um as-pecto importante desse contexto mas a loacutegica da violecircncia contra comunicadores tambeacutem utiliza violaccedilotildees aparentemente mais sutis mas que tecircm um impacto enorme na limitaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo E que corroboram para a perpetuaccedilatildeo das violaccedilotildees e da impu-nidade que concorrem para os desfechos mais graves e ateacute fatais
Entre esses outros tipos de violaccedilotildees tecircm se destacado nos uacuteltimos anos as agres-sotildees digitais contra comunicadores que mui-tas vezes satildeo realizadas de maneira massiva e impactando a sauacutede a seguranccedila pessoal e a proacutepria disposiccedilatildeo de continuar atuando no campo Ainda que essas violaccedilotildees digitais se-jam realizadas por uma diversidade de atores nos uacuteltimos dois anos destaca-se o papel que o grupo poliacutetico que hoje ocupa a Presidecircncia da Repuacuteblica tem na intensificaccedilatildeo dessas violecircn-cias O que vemos satildeo violaccedilotildees sistemaacuteticas cometidas por altas autoridades do Estado que servem de sinalizaccedilatildeo para que ataques digi-tais massivos busquem deslegitimar desquali-ficar e silenciar comunicadores que produzam mateacuterias criacuteticas ao Presidente da Repuacuteblica e seu grupo poliacutetico
Nesse sentido retomamos as obriga-ccedilotildees que o Estado brasileiro assumiu perante a comunidade internacional como acircngulo de anaacutelise para entender como o Estado brasilei-ro ativamente viola a liberdade de expressatildeo no paiacutes Assim entendemos que a violaccedilatildeo das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir tem servido para (re)construir uma poliacutetica de censura no paiacutes Se natildeo aquela censura insti-tucional mais formal que conhecemos no pe-riacuteodo da ditadura militar com fechamento de veiacuteculos e legislaccedilatildeo de censura certamente uma censura informal mas ainda assim arti-culada por autoridades puacuteblicas e muitas ve-
zes por meios institucionais tendo tambeacutem efeitos deleteacuterios para a liberdade de expres-satildeo e o direito agrave informaccedilatildeo no paiacutes
Para compreender essa construccedilatildeo da censura tambeacutem eacute fundamental perceber para aleacutem da accedilatildeo direta de autoridades puacutebli-cas contra a liberdade de expressatildeo o cenaacute-rio mais estrutural de desigualdade social e de concentraccedilatildeo econocircmica e poliacutetica dos meios de comunicaccedilatildeo Assim cientes de que nossa metodologia de monitoramento de casos de violaccedilatildeo pode ainda natildeo visibilizar todos os setores sociais fundamentais para a garantia da liberdade de expressatildeo trazemos tambeacutem uma anaacutelise do papel da comunicaccedilatildeo comu-nitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento da pluralidade de vozes e da luta por direitos e resistecircncia de territoacuterios e comunidades pelo paiacutes
Essas perspectivas de anaacutelise aqui apresentadas apresentam uma parte do pro-blema e estamos cientes de que haacute ainda pontos ausentes neste estudo mas que satildeo igualmente importantes para entender a violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo como os recortes de gecircnero e raccedila que impactam o trabalho de comunicadoras de vaacuterios perfis no paiacutes e as especificidades da violecircncia digital como forma de ataque a mulheres co-municadoras Temos que avanccedilar no enten-dimento de como o vigilantismo do Estado afeta o trabalho de comunicadores e como um processo de criminalizaccedilatildeo cada vez mais intenso coloca em risco esse trabalho Temos que entender melhor o papel da crescente militarizaccedilatildeo (e milicializaccedilatildeo) no silencia-mento de comunidades e territoacuterios por meio de violaccedilotildees massivas e sistemaacuteticas que acontecem e natildeo alcanccedilam o mesmo tipo de visibilidade das violaccedilotildees sofridas por outros setores sociais diante das discriminaccedilotildees es-truturais que ainda operam no paiacutes Essas e outras questotildees afetam muitas pessoas e gru-pos que estatildeo na luta pela defesa de direitos inclusive o direito de existir e viver de maneira livre e plena e que contribuem para garantir a pluralidade de vozes e o direito agrave informaccedilatildeo da sociedade A ARTIGO 19 se compromete a estar ao seu lado nessa luta
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CAPIacuteTULO 2
CONTEXTO INTERNACIONAL
Em outubro de 2020 a ARTIGO 19 publicou o seu Relatoacuterio Global de Expressatildeo1 onde ana-lisa a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo em todo o mundo Segundo o relatoacuterio a liberdade de expressatildeo atingiu seu menor patamar no mundo todo em 20 anos com cerca de 39 bi-lhotildees de pessoas 51 da populaccedilatildeo mundial vivendo em paiacuteses onde a garantia deste direi-to estaacute em crise A queda foi puxada por restri-ccedilotildees crescentes em paiacuteses com grandes popu-laccedilotildees como a China Iacutendia Turquia Ruacutessia Bangladesh e Iratilde e por retrocessos e quedas
alarmantes em paiacuteses como o Brasil Estados Unidos Hungria e Tanzacircnia
A meacutetrica do Relatoacuterio Global de Ex-pressatildeo rastreia a liberdade de expressatildeo em todo o mundo Ela reflete natildeo apenas os direi-tos da miacutedia de comunicadores e defensores de direitos humanos e ambientais mas qual o espaccedilo existente para todos noacutes - como pes-soas e membros de organizaccedilotildees - nos expres-sar comunicar e saber Olhamos como cada pessoa eacute livre para se comunicar on-line pro-testar ensinar e acessar informaccedilotildees para ga-
1 Veja o sumaacuterio executivo do relatoacuterio aqui
httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files202010SumarioExecutivoGxR_PTpdf
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
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CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
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NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
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CAPIacuteTULO 1
INTRODUCcedilAtildeO
Desde 2012 a ARTIGO 19 produz este Rela-toacuterio de monitoramento das graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo no Brasil O cenaacuterio de violecircncia contra comunicadores no paiacutes eacute preocupante haacute deacutecadas e este monitora-mento contribui para jogar luz na sistematici-dade dessa violecircncia Nesse sentido sempre compreendemos que mais do que apresentar nuacutemeros e graacuteficos sobre a violecircncia eacute funda-mental entender que esses nuacutemeros represen-tam vidas de pessoas reais Pessoas com sua histoacuteria suas relaccedilotildees seus interesses sua perspectiva de futuro Infelizmente em muitos casos apresentamos vidas e trajetoacuterias que foram interrompidas E tudo isso em nome de um objetivo central o silecircncio O silecircncio que permite arbitrariedades que fatos sejam dis-torcidos e manipulados que o poder corrompi-do se imponha sobre os direitos que deveriam organizar a vida em sociedade Eacute contra isso que lutamos e porque continuamos a publicar este Relatoacuterio todos os anos
A violecircncia contra comunicadores como bem se sabe eacute uma violaccedilatildeo dupla viola os direitos individuais das pessoas que sofrem a violecircn-cia e ao mesmo tempo viola o direito coletivo agrave informaccedilatildeo que toda a sociedade possui E eacute justamente esse duplo impacto que procu-ramos entender neste relatoacuterio quais satildeo os mecanismos que reproduzem essa loacutegica de ataque contra certos indiviacuteduos para impedir que informaccedilotildees circulem livremente na so-ciedade A quem e a que interessa cercear a pluralidade de vozes
Estamos cientes que esses mecanis-mos satildeo complexos e diversos e natildeo preten-demos capturaacute-los e analisaacute-los de maneira exaustiva em um soacute relatoacuterio inclusive porque os cenaacuterios poliacutetico e social que sustentam esses mecanismos de violecircncia continuam se intensificando e complexificando ano a ano no Brasil e no mundo
Neste relatoacuterio apresentamos os da-dos das graves violaccedilotildees contra comunica-
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Intr
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dores homiciacutedios tentativas de assassinato e ameaccedilas de morte que ocorreram em 2019 e dados preliminares do primeiro semestre de 2020 No entanto a cada ano cresce a convic-ccedilatildeo de que focar a anaacutelise somente nessas vio-laccedilotildees mais graves de atentados diretos con-tra a vida de comunicadores natildeo eacute suficiente para compreender o contexto de violecircncia As violaccedilotildees mais extremas e graves satildeo um as-pecto importante desse contexto mas a loacutegica da violecircncia contra comunicadores tambeacutem utiliza violaccedilotildees aparentemente mais sutis mas que tecircm um impacto enorme na limitaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo E que corroboram para a perpetuaccedilatildeo das violaccedilotildees e da impu-nidade que concorrem para os desfechos mais graves e ateacute fatais
Entre esses outros tipos de violaccedilotildees tecircm se destacado nos uacuteltimos anos as agres-sotildees digitais contra comunicadores que mui-tas vezes satildeo realizadas de maneira massiva e impactando a sauacutede a seguranccedila pessoal e a proacutepria disposiccedilatildeo de continuar atuando no campo Ainda que essas violaccedilotildees digitais se-jam realizadas por uma diversidade de atores nos uacuteltimos dois anos destaca-se o papel que o grupo poliacutetico que hoje ocupa a Presidecircncia da Repuacuteblica tem na intensificaccedilatildeo dessas violecircn-cias O que vemos satildeo violaccedilotildees sistemaacuteticas cometidas por altas autoridades do Estado que servem de sinalizaccedilatildeo para que ataques digi-tais massivos busquem deslegitimar desquali-ficar e silenciar comunicadores que produzam mateacuterias criacuteticas ao Presidente da Repuacuteblica e seu grupo poliacutetico
Nesse sentido retomamos as obriga-ccedilotildees que o Estado brasileiro assumiu perante a comunidade internacional como acircngulo de anaacutelise para entender como o Estado brasilei-ro ativamente viola a liberdade de expressatildeo no paiacutes Assim entendemos que a violaccedilatildeo das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir tem servido para (re)construir uma poliacutetica de censura no paiacutes Se natildeo aquela censura insti-tucional mais formal que conhecemos no pe-riacuteodo da ditadura militar com fechamento de veiacuteculos e legislaccedilatildeo de censura certamente uma censura informal mas ainda assim arti-culada por autoridades puacuteblicas e muitas ve-
zes por meios institucionais tendo tambeacutem efeitos deleteacuterios para a liberdade de expres-satildeo e o direito agrave informaccedilatildeo no paiacutes
Para compreender essa construccedilatildeo da censura tambeacutem eacute fundamental perceber para aleacutem da accedilatildeo direta de autoridades puacutebli-cas contra a liberdade de expressatildeo o cenaacute-rio mais estrutural de desigualdade social e de concentraccedilatildeo econocircmica e poliacutetica dos meios de comunicaccedilatildeo Assim cientes de que nossa metodologia de monitoramento de casos de violaccedilatildeo pode ainda natildeo visibilizar todos os setores sociais fundamentais para a garantia da liberdade de expressatildeo trazemos tambeacutem uma anaacutelise do papel da comunicaccedilatildeo comu-nitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento da pluralidade de vozes e da luta por direitos e resistecircncia de territoacuterios e comunidades pelo paiacutes
Essas perspectivas de anaacutelise aqui apresentadas apresentam uma parte do pro-blema e estamos cientes de que haacute ainda pontos ausentes neste estudo mas que satildeo igualmente importantes para entender a violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo como os recortes de gecircnero e raccedila que impactam o trabalho de comunicadoras de vaacuterios perfis no paiacutes e as especificidades da violecircncia digital como forma de ataque a mulheres co-municadoras Temos que avanccedilar no enten-dimento de como o vigilantismo do Estado afeta o trabalho de comunicadores e como um processo de criminalizaccedilatildeo cada vez mais intenso coloca em risco esse trabalho Temos que entender melhor o papel da crescente militarizaccedilatildeo (e milicializaccedilatildeo) no silencia-mento de comunidades e territoacuterios por meio de violaccedilotildees massivas e sistemaacuteticas que acontecem e natildeo alcanccedilam o mesmo tipo de visibilidade das violaccedilotildees sofridas por outros setores sociais diante das discriminaccedilotildees es-truturais que ainda operam no paiacutes Essas e outras questotildees afetam muitas pessoas e gru-pos que estatildeo na luta pela defesa de direitos inclusive o direito de existir e viver de maneira livre e plena e que contribuem para garantir a pluralidade de vozes e o direito agrave informaccedilatildeo da sociedade A ARTIGO 19 se compromete a estar ao seu lado nessa luta
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CAPIacuteTULO 2
CONTEXTO INTERNACIONAL
Em outubro de 2020 a ARTIGO 19 publicou o seu Relatoacuterio Global de Expressatildeo1 onde ana-lisa a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo em todo o mundo Segundo o relatoacuterio a liberdade de expressatildeo atingiu seu menor patamar no mundo todo em 20 anos com cerca de 39 bi-lhotildees de pessoas 51 da populaccedilatildeo mundial vivendo em paiacuteses onde a garantia deste direi-to estaacute em crise A queda foi puxada por restri-ccedilotildees crescentes em paiacuteses com grandes popu-laccedilotildees como a China Iacutendia Turquia Ruacutessia Bangladesh e Iratilde e por retrocessos e quedas
alarmantes em paiacuteses como o Brasil Estados Unidos Hungria e Tanzacircnia
A meacutetrica do Relatoacuterio Global de Ex-pressatildeo rastreia a liberdade de expressatildeo em todo o mundo Ela reflete natildeo apenas os direi-tos da miacutedia de comunicadores e defensores de direitos humanos e ambientais mas qual o espaccedilo existente para todos noacutes - como pes-soas e membros de organizaccedilotildees - nos expres-sar comunicar e saber Olhamos como cada pessoa eacute livre para se comunicar on-line pro-testar ensinar e acessar informaccedilotildees para ga-
1 Veja o sumaacuterio executivo do relatoacuterio aqui
httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files202010SumarioExecutivoGxR_PTpdf
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
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NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
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A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
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A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
1
Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
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Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
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TORTURA
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
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dores homiciacutedios tentativas de assassinato e ameaccedilas de morte que ocorreram em 2019 e dados preliminares do primeiro semestre de 2020 No entanto a cada ano cresce a convic-ccedilatildeo de que focar a anaacutelise somente nessas vio-laccedilotildees mais graves de atentados diretos con-tra a vida de comunicadores natildeo eacute suficiente para compreender o contexto de violecircncia As violaccedilotildees mais extremas e graves satildeo um as-pecto importante desse contexto mas a loacutegica da violecircncia contra comunicadores tambeacutem utiliza violaccedilotildees aparentemente mais sutis mas que tecircm um impacto enorme na limitaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo E que corroboram para a perpetuaccedilatildeo das violaccedilotildees e da impu-nidade que concorrem para os desfechos mais graves e ateacute fatais
Entre esses outros tipos de violaccedilotildees tecircm se destacado nos uacuteltimos anos as agres-sotildees digitais contra comunicadores que mui-tas vezes satildeo realizadas de maneira massiva e impactando a sauacutede a seguranccedila pessoal e a proacutepria disposiccedilatildeo de continuar atuando no campo Ainda que essas violaccedilotildees digitais se-jam realizadas por uma diversidade de atores nos uacuteltimos dois anos destaca-se o papel que o grupo poliacutetico que hoje ocupa a Presidecircncia da Repuacuteblica tem na intensificaccedilatildeo dessas violecircn-cias O que vemos satildeo violaccedilotildees sistemaacuteticas cometidas por altas autoridades do Estado que servem de sinalizaccedilatildeo para que ataques digi-tais massivos busquem deslegitimar desquali-ficar e silenciar comunicadores que produzam mateacuterias criacuteticas ao Presidente da Repuacuteblica e seu grupo poliacutetico
Nesse sentido retomamos as obriga-ccedilotildees que o Estado brasileiro assumiu perante a comunidade internacional como acircngulo de anaacutelise para entender como o Estado brasilei-ro ativamente viola a liberdade de expressatildeo no paiacutes Assim entendemos que a violaccedilatildeo das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir tem servido para (re)construir uma poliacutetica de censura no paiacutes Se natildeo aquela censura insti-tucional mais formal que conhecemos no pe-riacuteodo da ditadura militar com fechamento de veiacuteculos e legislaccedilatildeo de censura certamente uma censura informal mas ainda assim arti-culada por autoridades puacuteblicas e muitas ve-
zes por meios institucionais tendo tambeacutem efeitos deleteacuterios para a liberdade de expres-satildeo e o direito agrave informaccedilatildeo no paiacutes
Para compreender essa construccedilatildeo da censura tambeacutem eacute fundamental perceber para aleacutem da accedilatildeo direta de autoridades puacutebli-cas contra a liberdade de expressatildeo o cenaacute-rio mais estrutural de desigualdade social e de concentraccedilatildeo econocircmica e poliacutetica dos meios de comunicaccedilatildeo Assim cientes de que nossa metodologia de monitoramento de casos de violaccedilatildeo pode ainda natildeo visibilizar todos os setores sociais fundamentais para a garantia da liberdade de expressatildeo trazemos tambeacutem uma anaacutelise do papel da comunicaccedilatildeo comu-nitaacuteria e popular no combate agrave desinformaccedilatildeo e no fortalecimento da pluralidade de vozes e da luta por direitos e resistecircncia de territoacuterios e comunidades pelo paiacutes
Essas perspectivas de anaacutelise aqui apresentadas apresentam uma parte do pro-blema e estamos cientes de que haacute ainda pontos ausentes neste estudo mas que satildeo igualmente importantes para entender a violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo como os recortes de gecircnero e raccedila que impactam o trabalho de comunicadoras de vaacuterios perfis no paiacutes e as especificidades da violecircncia digital como forma de ataque a mulheres co-municadoras Temos que avanccedilar no enten-dimento de como o vigilantismo do Estado afeta o trabalho de comunicadores e como um processo de criminalizaccedilatildeo cada vez mais intenso coloca em risco esse trabalho Temos que entender melhor o papel da crescente militarizaccedilatildeo (e milicializaccedilatildeo) no silencia-mento de comunidades e territoacuterios por meio de violaccedilotildees massivas e sistemaacuteticas que acontecem e natildeo alcanccedilam o mesmo tipo de visibilidade das violaccedilotildees sofridas por outros setores sociais diante das discriminaccedilotildees es-truturais que ainda operam no paiacutes Essas e outras questotildees afetam muitas pessoas e gru-pos que estatildeo na luta pela defesa de direitos inclusive o direito de existir e viver de maneira livre e plena e que contribuem para garantir a pluralidade de vozes e o direito agrave informaccedilatildeo da sociedade A ARTIGO 19 se compromete a estar ao seu lado nessa luta
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CAPIacuteTULO 2
CONTEXTO INTERNACIONAL
Em outubro de 2020 a ARTIGO 19 publicou o seu Relatoacuterio Global de Expressatildeo1 onde ana-lisa a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo em todo o mundo Segundo o relatoacuterio a liberdade de expressatildeo atingiu seu menor patamar no mundo todo em 20 anos com cerca de 39 bi-lhotildees de pessoas 51 da populaccedilatildeo mundial vivendo em paiacuteses onde a garantia deste direi-to estaacute em crise A queda foi puxada por restri-ccedilotildees crescentes em paiacuteses com grandes popu-laccedilotildees como a China Iacutendia Turquia Ruacutessia Bangladesh e Iratilde e por retrocessos e quedas
alarmantes em paiacuteses como o Brasil Estados Unidos Hungria e Tanzacircnia
A meacutetrica do Relatoacuterio Global de Ex-pressatildeo rastreia a liberdade de expressatildeo em todo o mundo Ela reflete natildeo apenas os direi-tos da miacutedia de comunicadores e defensores de direitos humanos e ambientais mas qual o espaccedilo existente para todos noacutes - como pes-soas e membros de organizaccedilotildees - nos expres-sar comunicar e saber Olhamos como cada pessoa eacute livre para se comunicar on-line pro-testar ensinar e acessar informaccedilotildees para ga-
1 Veja o sumaacuterio executivo do relatoacuterio aqui
httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files202010SumarioExecutivoGxR_PTpdf
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
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PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
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NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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A re
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ccedilatildeo
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accedilotildee
sCa
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
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CAPIacuteTULO 2
CONTEXTO INTERNACIONAL
Em outubro de 2020 a ARTIGO 19 publicou o seu Relatoacuterio Global de Expressatildeo1 onde ana-lisa a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo em todo o mundo Segundo o relatoacuterio a liberdade de expressatildeo atingiu seu menor patamar no mundo todo em 20 anos com cerca de 39 bi-lhotildees de pessoas 51 da populaccedilatildeo mundial vivendo em paiacuteses onde a garantia deste direi-to estaacute em crise A queda foi puxada por restri-ccedilotildees crescentes em paiacuteses com grandes popu-laccedilotildees como a China Iacutendia Turquia Ruacutessia Bangladesh e Iratilde e por retrocessos e quedas
alarmantes em paiacuteses como o Brasil Estados Unidos Hungria e Tanzacircnia
A meacutetrica do Relatoacuterio Global de Ex-pressatildeo rastreia a liberdade de expressatildeo em todo o mundo Ela reflete natildeo apenas os direi-tos da miacutedia de comunicadores e defensores de direitos humanos e ambientais mas qual o espaccedilo existente para todos noacutes - como pes-soas e membros de organizaccedilotildees - nos expres-sar comunicar e saber Olhamos como cada pessoa eacute livre para se comunicar on-line pro-testar ensinar e acessar informaccedilotildees para ga-
1 Veja o sumaacuterio executivo do relatoacuterio aqui
httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files202010SumarioExecutivoGxR_PTpdf
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
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8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
1
Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
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rantir sua participaccedilatildeo social fiscalizar o poder puacuteblico e responsabilizar aqueles com poder Foram utilizados 25 indicadores em 161 paiacuteses para criar uma pontuaccedilatildeo global da liberdade de expressatildeo para cada paiacutes numa escala de 1 a 100 Estas pontuaccedilotildees colocam os paiacuteses em uma de cinco categorias
comparaccedilotildees realizadas o indicador caiu 18 pontos em um ano Com 46 pontos em um to-tal de 100 o Brasil estaacute com sua liberdade de expressatildeo em ldquoRestriccedilatildeordquo ocupando 94ordf posi-ccedilatildeo em um ranking de 161 naccedilotildees atraacutes de to-dos os paiacuteses da Ameacuterica do Sul com exceccedilatildeo da Venezuela Essa forte queda coloca o paiacutes muito proacuteximo de ser classificado como ldquoalta-mente restritordquo sinalizando um alerta para a sociedade brasileira sobre o cenaacuterio que estaacute agrave nossa frente em que ficaraacute ainda mais difiacute-cil reconstruir alguns dos pilares democraacuteticos que vem sendo derrubados no paiacutes O relatoacuterio indica que o decliacutenio acelerou com a chegada de Jair Bolsonaro agrave Presidecircncia da Repuacuteblica no iniacutecio de 2019 com uma queda de 28 em apenas um ano
2 Silvia Chocarro eacute a Coordenadora Global de Proteccedilatildeo da ARTICLE 19 silviachocarro
3 A Repoacuterteres Sem Fronteiras documentou a taxa mais baixa desde 2003
httpsrsforgennewsrsf-yearly-round-historically-low-number-journalists-killed-2019
O Comitecirc para proteccedilatildeo de jornalistas documentou o nuacutemeto de homiciacutedios mais baixo desde 2002
httpscpjorgreports201912journalists-killed-murdered-syria-mexico-impunity
4 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
5 Kaye David HRC 4449 Relatoacuterio do Relator Especial para promoccedilatildeo e proteccedilatildeo do direito da liberdade de
expressatildeo Doenccedila pandemia e a liberdade de opiniatildeo e expressatildeo httpswwwundocsorgAHRC4449
0 ndash 19 Em crise 20 ndash 39 Altamente restrito 40 ndash 59 Restrito 60 ndash 79 Pouco Restrito
80 ndash 100 Aberto
O Brasil estaacute em destaque negativo no relatoacute-rio apresentou a queda mais expressiva no in-dicador de liberdade de expressatildeo em todas as
O OLHAR INTERNACIONAL PARA A LIBERDADE DE EXPRESSAtildeO NO BRASILPor Silvia Chocarro2
A violecircncia contra jornalistas e comunicado-res continua a crescer ao redor do mundo Enquanto o ano de 2019 teve o menor nuacuteme-ro de homiciacutedios desde o comeccedilo dos anos 20003 outras formas de ataque passaram a se desenvolver Natildeo haacute duacutevidas de que a que-da no nuacutemero de assassinatos de jornalistas eacute uma boa notiacutecia mas devemos estar mais vigilantes que nunca na medida em que ato-res estatais e paraestatais passaram a usar outras estrateacutegias para silenciar estes profis-sionais Ao redor do mundo jornalistas estatildeo sendo confrontados a partir de asseacutedios legais
progressivos - casos que carecem de qualquer meacuterito e frequentemente satildeo protocolados para promover a auto censura dos comunica-dores bem como o abuso ou uso errocircneo do instituto da difamaccedilatildeo e das leis antiterroris-mo e de seguranccedila nacional4 A legislaccedilatildeo re-lativa agraves informaccedilotildees falsas ou fake news tem sido usada para restringir conteuacutedos natildeo favo-raacuteveis aos governos ainda mais no contexto da pandemia de Covid-195 Ser jornalista estaacute se tornando mais e mais perigoso durante a cobertura de protestos e eleiccedilotildees ou enquan-to cobrindo casos de corrupccedilatildeo ou relativos
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
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Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
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Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
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Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
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Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
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Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
ABUSO SEXUAL
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
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ao meio ambiente recursos naturais e direitos humanos incluindo direitos das mulheres e da comunidade LGBTQI+
A crescente tendecircncia global de cam-panhas de deslegitimaccedilatildeo e estigmatizaccedilatildeo de jornalistas por agentes poliacuteticos - fazendo uso inclusive de linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas e comunicadoras - requer atenccedilatildeo particular Esta inclui chefes de Esta-do como o presidente brasileiro Jair Bolsona-ro que pessoalmente realizou 10 ataques con-tra jornalistas por mecircs no ano de 2019 com sua aspereza direcionada especialmente aos ativistas do movimento indiacutegena e agraves mulheres negras6 O Brasil viu de fato a maior queda na liberdade de expressatildeo nos uacuteltimos dois anos de acordo com o Relatoacuterio Global de Expressatildeo da ARTIGO 19 que analisou 161 paiacuteses Como
destaca o relatoacuterio ldquodado o tamanho e a influ-ecircncia do Brasil essa queda livre dos direitos humanos tem um efeito significativo na regiatildeo como um todordquo7
O Brasil assim como outros Estados estaacute negligenciando seu dever de proteger jor-nalistas de acordo com a legislaccedilatildeo interna-cional de direitos humanos e o cumprimento de seus compromissos assumidos em diver-sas resoluccedilotildees das Naccedilotildees Unidas O Brasil co-lidera as resoluccedilotildees de seguranccedila de jor-nalistas no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas e portanto deve ser exemplo de sua aplicaccedilatildeo
Se os Estados implementassem suas obrigaccedilotildees e compromissos a violecircncia contra jornalistas cessaria Em resumo ao que o Bra-sil e outros Estados se comprometeram
Prevenir que ataques aconteccedilam
1Criar e manter um ambiente livre e seguro para jornalistas e profissionais da imprensa bem como para a sociedade civil que desempenha papel vital para a seguranccedila de jornalistas
2 Condenar todos os ataques contra jornalistas e a impunidade predominante
3Parar de desligitimar intimidar ou ameaccedilar a miacutedia e os jornalistas ou de usar linguagem misoacutegina contra mulheres jornalistas que minam a confianccedila na miacutedia
4Parar de fazer uso errocircneo de leis vagas para coibir a liberdade de expressatildeo incluindo as leis de difamaccedilatildeo leis sobre desinformaccedilatildeo ou legislaccedilatildeo antiterrorismo e anti extremismo
5Respeitar a liberdade dos jornalistas de ter acesso agrave informaccedilatildeo mantida pelas autoridades puacuteblicas
6 ARTIGO 19 Organizaccedilotildees denunciam governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
10 de Marccedilo de 2020 httpsartigo19orgblog20200310organizacoes-denunciam-governo-brasileiro-no
-conselho-de-direitos-humanos-das-nacoes-unidas
7 ARTIGO 19 Relatoacuterio Global de Expressatildeo 20192020 O estaacutegio da liberdade de expressatildeo ao redor do mundo
httpswwwarticle19orgwp-contentuploads202010GxR2019-20reportpdf
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
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SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
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Proteger jornalistas para minimizar o impacto dos ataques
1 Estabelecer mecanismos de resposta raacutepida contra ameaccedilas
2 Abordar o asseacutedio sexual e outras formas de violecircncia sexual e com vieacutes de gecircnero
3 Proteger a praacutetica legal de confidencialidade das fontes de jornalistas
4Garantir criptografia e anonimato e evitar fazer uso de teacutecnicas de vigilacircncia arbitraacuterias ou ilegais
5Aprimorar mecanismos de monitoramento e de captaccedilatildeo de informaccedilotildees inclusive as da sociedade civil
Processar os responsaacuteveis pelos ataques e providenciar reparaccedilatildeo
1Garantir nas investigaccedilotildees a conduta imparcial pronta completa independente e efetiva para todas as violecircncias ameaccedilas e ataques alegados
2 Adotar protocolos e meacutetodos de investigaccedilatildeo e persecuccedilatildeo sensiacuteveis agraves questotildees de gecircnero
3Apoiar o treinamento e conscientizaccedilatildeo do judiciaacuterio das forccedilas policiais e militares sobre os padrotildees internacionais sobre liberdade de expressatildeo e seguranccedila dos jornalistas
4Garantir que as viacutetimas e suas famiacutelias tenham acesso agrave resoluccedilatildeo apropriada bem como agrave compensaccedilatildeo e assistecircncia
Os Estados devem ser responsabilizados pelos compromissos assumidos Se eles falham estaacute em nossas matildeos erguer nossas vozes Eacute hora de responsabilizaacute-los
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
CAPIacuteTULO 3
PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
1
Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
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Graacutefico 1 ndash TIPOS DE VIOLACcedilAtildeO
AMEACcedilA DE MORTE32 CASOS
TENTATIVA DE ASSASSINATO4 CASOS
HOMICIacuteDIO2 CASOS
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PANORAMA GERAL DA VIOLEcircNCIA CONTRA COMUNICADORES
O periacuteodo que compreende o ano de 2019 e o primeiro semestre de 2020 seguiu em linhas gerais as tendecircncias de violecircncia contra co-municadores observadas nos anos anteriores com 38 graves violaccedilotildees sendo 27 em 2019 e 11 no primeiro semestre de 2020 Das 38 graves violaccedilotildees de todo o periacuteodo analisado foram 32 ameaccedilas de morte quatro tentativas de assassinato e dois homiciacutediosEm primeiro lugar destaca-se que dentro das categorias consideradas graves ndash homiciacutedio ameaccedila de morte e tentativa de assassinato ndash houve possibilidade de apuraccedilatildeo dessas 38
violaccedilotildees diretamente por nossos pesquisado-res Dessa forma haacute uma seacuterie de outros casos natildeo incluiacutedos nos nuacutemeros apresentados nes-se relatoacuterio por natildeo ser possiacutevel delimitar se a violaccedilatildeo foi decorrente do exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo Vale tambeacutem destacar que os dados do primeiro semestre de 2020 satildeo prelimina-res e existem outros casos que ainda estatildeo sendo investigados
Considera-se assim que o patamar dos uacuteltimos anos se manteve estaacutevel no que diz respeito a essas violaccedilotildees mais graves com uma meacutedia histoacuterica de 30 casos por ano es-
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
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Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
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Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
ABUSO SEXUAL
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
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ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
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pecialmente levando-se em conta que natildeo foi possiacutevel identificar qualquer indiacutecio de trajetoacute-ria de queda real de casos sendo que uma leve oscilaccedilatildeo de um ano para o outro eacute normal
Jaacute o nuacutemero de casos monitorados em geral ndash ou seja aleacutem dos mais graves ndash ul-trapassou a marca de 200 violaccedilotildees por ano acima do observado nas mensuraccedilotildees ante-riores Se podemos verificar uma leve reduccedilatildeo em casos de homiciacutedio a violecircncia contra comunicadores como um todo natildeo diminuiu Pelo contraacuterio cada vez mais os relatos de-monstram o aumento da violecircncia velada de difiacutecil denunciaccedilatildeo e a falta de amparo estatal para a proteccedilatildeo dos profissionais da impren-sa ndash o que por si soacute tambeacutem configura uma forma de violecircncia
Deve-se destacar tambeacutem que o pri-meiro semestre de 2020 foi marcado pela pandemia de Covid-19 pela crise poliacutetica e pelo marco de primeiro ano do governo do Pre-sidente Jair Bolsonaro Os dados de violaccedilotildees a comunicadores dessa forma satildeo reativos agrave conjuntura observada que indica a necessida-de do aprofundamento do debate e formulaccedilatildeo de estrateacutegias de proteccedilatildeo
Se os dados gerais de 2019 jaacute suge-riam que a violecircncia contra comunicadores au-mentou de forma geral 2020 intensifica essa percepccedilatildeo No primeiro semestre deste ano foram identificados ao menos 160 casos de violaccedilotildees contra jornalistas e comunicadores Assim em um semestre 2020 ultrapassou os casos registrados em todo ano de 2019
Nesse contexto se destaca o crescen-te atrito com comunicadores e veiacuteculos de imprensa gerado pelo Governo Federal agu-ccedilado pelo contexto da pandemia de Covid-19 e os embates relativos agrave divulgaccedilatildeo de dados sobre o viacuterus e sobre a inaccedilatildeo do governo fede-ral em elaborar poliacuteticas de contenccedilatildeo da dis-seminaccedilatildeo da doenccedila e reaccedilatildeo as crises Essa conjuntura tambeacutem foi marcada pelo aumento da violecircncia na esfera digital jaacute identificada nos dados relativos ao ano anterior
Cabe destacar que a observaccedilatildeo se-mestral pode ter apresentado impacto na cap-taccedilatildeo e construccedilatildeo dos dados considerando que houve menos tempo disponiacutevel para que
os casos fossem apurados com maior profun-didade No mesmo sentido eacute importante ob-servar que tanto nos dados do ano de 2019 quanto nos de 2020 haacute notaacutevel subnotificaccedilatildeo de casos perceptiacutevel na narrativa dos comuni-cadores e jornalistas contatados e na falta de notificaccedilatildeo e publicidade de casos que consi-deramos graves
A subnotificaccedilatildeo eacute marcada pela vul-nerabilidade cada vez maior colocada sobre os meios de comunicaccedilatildeo popular e comuni-taacuteria pela dificuldade em realizar denuacutencias pelas condiccedilotildees sociais de legitimidade das denuacutencias de mulheres negras e negros e da populaccedilatildeo LGBTQI+ e o impacto dessas na possibilidade de exercer a comunicaccedilatildeo e acessar a justiccedila e pela visiacutevel postura do Estado em deslegitimar o exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo e exercer como ator direto ou indi-reto a violecircncia contra comunicadores Estes pontos seratildeo aprofundados ao longo do rela-toacuterio para melhor compreensatildeo dos dados e tambeacutem pelo fato de que tais aspectos da vio-lecircncia contra comunicadores colocam novos desafios para a produccedilatildeo responsaacutevel de da-dos sobre essas violaccedilotildees Eacute de extrema rele-vacircncia que se compreenda que muitas vezes algumas narrativas natildeo satildeo alcanccediladas pelas estrateacutegias de captaccedilatildeo de dados aqui utili-zadas - o que natildeo significa que tais espaccedilos veiacuteculos e profissionais natildeo sofreram ataques em decorrecircncia do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
Considerando os desafios apresenta-das - o deslocamento dos ataques aos co-municadores para o meio digital e a atuaccedilatildeo negativa dos oacutergatildeos governamentais e agen-tes poliacuteticos frente aos direitos de liberdade de expressatildeo e acesso agrave informaccedilatildeo entre outros - se apresentam novas questotildees para os futuros monitoramentos e apuraccedilotildees de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res bem como a revisatildeo das categorias de violecircncia e de quantificaccedilatildeo de sua gravida-de Estes aspectos metodoacutegicos do presente Relatoacuterio devem servir como subsiacutedio para que se amplie o escopo de anaacutelise e se re-visem os paradigmas tradicionais de anaacutelise de midia e violecircncia contra comunicadores no Brasil e no mundo
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
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A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
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Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
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TORTURA
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
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Quem sofreu violaccedilotildees
Em primeiro lugar se faz necessaacuterio apresen-tar o que a ARTIGO 19 entende por comunica-dor para noacutes comunicadora ou comunicador eacute aquelae que exerce a comunicaccedilatildeo como atividade regular independente de remunera-ccedilatildeo e de certificaccedilatildeo acadecircmica ou profissio-nal O exerciacutecio da comunicaccedilatildeo dessa forma eacute compreendido a partir do direito humano da liberdade da expressatildeo natildeo sendo possiacutevel li-mitaacute-lo Jornalistas e repoacuterteres profissionais radialistas blogueiros repoacuterteres fotograacuteficos e cinematograacuteficos colunistas apresentado-res comunicadores populares e comunitaacuterios chargistas midiativistas entre outros satildeo o que aqui denominamos comunicadores
O perfil que mais sofreu graves viola-ccedilotildees foram os jornalistas e repoacuterteres - 22 dos 27 casos graves de 2019 e cinco dos 11 casos do iniacutecio de 2020 Em 2019 as demais viola-ccedilotildees foram cometidas contra radialistas 22 dos casos foram cometidos contra homens e 5 contra mulheres comunicadoras No ano de 2020 diversificou-se o perfil de comunicado-res alvejados pelas graves violaccedilotildees com ata-ques graves contra radialistas (3) colunistas (1) apresentadores (1) e blogueiros (1)
Dentre os comunicadores que relataram ter sofrido graves violaccedilotildees em 2019 17 (63) narraram ter sofrido violaccedilotildees anteriores sen-do estas em sua grande maioria ameaccedilas de morte ndash ou seja estes comunicadores sofre-ram por mais de uma vez graves violaccedilotildees indicando a falta de estrutura que lhes possi-bilite seguranccedila
A grande maioria dos comunicadores que sofreu grave violecircncia em 2019 buscou as autoridades (77) Destes 21 casos que che-garam agrave poliacutecia por meio de Boletim de Ocor-recircncia em 9 casos natildeo houve investigaccedilatildeo Ou seja em quase metade dos casos nos quais as autoridades foram acionadas natildeo houve res-posta efetiva
Somam-se aos dados a observaccedilatildeo de que dentre os comunicadores que sofre-ram graves violaccedilotildees apenas 2 passaram a receber proteccedilatildeo apoacutes a violaccedilatildeo sendo que ambos recebem proteccedilatildeo privada Portanto nenhum conta com proteccedilatildeo policial ou forne-cida pelo estado mesmo que a grande maio-ria natildeo esteja passando pela primeira violaccedilatildeo grave O risco e o medo na maioria dos relatos satildeo persistentes podendo influenciar no exer-
COMPREENDENDO AS GRAVES VIOLACcedilOtildeES DE DIREITOSAno de 2019 e 1ordm semestre de 2020
Graacutefico 2 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DA VIacuteTIMA EM 2019 E 2020
COLUNISTA1 CASO 1 AMEACcedilA DE MORTE
JORNALISTA OU REPOacuteRTER26 CASOS
RADIALISTA9 CASOS
APRESENTADOR1 CASO
BLOGUEIRO1 CASO
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HOMICIacuteDIOSAMEACcedilAS DE MORTE
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TENTATIVAS DE ASSASSINATOAMEACcedilAS DE MORTE
1 TENTATIVA DE ASSASSINATO
1 AMEACcedilA DE MORTE
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
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NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
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Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
comunicacaoartigo19org
wwwartigo19org
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ciacutecio da comunicaccedilatildeo e gerar autocensura ainda que estes natildeo relatem com frequecircncia a interrupccedilatildeo dos trabalhos como comunicador ou a produccedilatildeo do conteuacutedo que despertou a situaccedilatildeo de violecircncia
Olhando para o perfil das violaccedilotildees destaca-se o alto nuacutemero de ameaccedilas de mor-te Nos dados de 2019 e iniacutecio de 2020 fo-ram 32 ameaccedilas de morte para 2 homiciacutedios e 4 tentativas de assassinato De forma geral grande parte dos casos de ameaccedilas de morte registrados aqui contou com ameaccedilas muacutelti-plas multidimensionais e perpassadas pelo anonimato do ambiente digital e natildeo raro es-tes foram interpretados como lsquocoisa cotidianarsquo O Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 apontou ldquoa frequecircncia de ataques online e a quantidade de agressores eacute de difiacutecil mensuraccedilatildeo e identifica-ccedilatildeordquo como um dos desafios para a anaacutelise das
ameaccedilas de morte recebidas pelos comunica-dores A tendecircncia se repete e se amplifica em 2019 e pode ser analisada em conjunto com uma frequente banalizaccedilatildeo dessa forma de violecircncia seja pelos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo pelas autoridades pelo agres-sor ou pela sociedade civil
A classificaccedilatildeo dos casos enquanto violaccedilotildees graves segue o criteacuterio da percep-ccedilatildeo pessoal do comunicador sobre a violecircn-cia sofrida Quando natildeo foi possiacutevel estabele-cer contato com o comunicador para fins de apuraccedilatildeo do caso e qualificaccedilatildeo da anaacutelise natildeo houve a inclusatildeo do mesmo nos ca-sos aqui apresentados Os casos em que a violecircncia natildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ainda que cometida contra profissional do meio tambeacutem natildeo integram os dados deste relatoacuterio
Graacutefico 3 ndash MAPA DE GRAVES VIOLACcedilOtildeES EM 2019 E 2020
Onde aconteceram as violaccedilotildees
A regiatildeo Sudeste concentrou a maior parte das violaccedilotildees no periacuteodo analisado com 16 casos com destaque para os estados do Rio de Ja-neiro (6 casos incluindo um homiciacutedio) e Satildeo Paulo (8 casos) Ateacute entatildeo o Relatoacuterio de Viola-ccedilotildees soacute havia apurado casos no Rio de Janeiro
nos anos de 2014 (3 casos) e 2018 (2 casos) sendo expressivo o aumento da violecircncia con-tra comunicadores no estado no uacuteltimo ano Apenas em 2013 e 2014 os dados apontaram a regiatildeo Sudeste como sendo a mais violenta para a categoria Natildeo obstante as denuacutencias
MARANHAtildeOPIAUIacute
CEARAacuteRIO GRANDE DO NORTE
PARAIacuteBASERGIPE
PARAacuteRORAIMA
AMAZONASESPIacuteRITO SANTO
MINAS GERAISRIO DE JANEIRO
SAtildeO PAULOMATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSOPARANAacute
RIO GRANDE DO SUL
PARAGUAI
NORDESTE11 CASOS
NORTE5 CASOS
SUDESTE16 CASOS
CENTRO-OESTE3 CASOS
SUL2 CASOS
EXTERIOR1 CASO
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
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A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
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Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
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Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
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Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
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Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
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Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
ABUSO SEXUAL
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
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de violecircncia nesta regiatildeo satildeo crescentes como um todo - e natildeo somente contra comunicado-res - em meio agrave crise de seguranccedila puacuteblica
Na sequecircncia a regiatildeo que mais con-centra relatos de casos graves eacute a Nordeste totalizando 11 casos sendo nove casos de ameaccedila de morte e dois de tentativas de assas-sinato Apenas em 2013 e 2014 a regiatildeo teve indicadores mais baixos que estes no que tan-ge as violaccedilotildees graves Seguem a regiatildeo Norte com cinco casos Centro-Oeste com trecircs casos e Sul com dois casos
Da mesma forma que nas mensuraccedilotildees dos anos anteriores a maior parte das violaccedilotildees ocorreu em cidades pequenas8 totalizando 58 (22) das ocorrecircncias apuradas
Na sequecircncia temos as cidades gran-des com 29 (11) dos casos e as meacutedias com 13 (5) Nota-se que as violaccedilotildees cometidas em cidades grandes se dividem majoritaria-mente entre Rio de Janeiro e Satildeo Paulo em suas respectivas capitais restando apenas duas violaccedilotildees fora da regiatildeo (Aracajuacute ndash SE e Manaus - AM)
Quem cometeu as violaccedilotildees
Nos uacuteltimos anos os dados apontam para po-liacuteticos eleitos especialmente no acircmbito local como principais autores das graves violaccedilotildees contra comunicadores Em 2019 entretanto o cenaacuterio mudou o destaque de quem come-teu as violaccedilotildees estaacute no campo da violecircncia digital muitas vezes cometida sob anonimato ou por cidadatildeos comuns acumulando 13 ca-sos (34) Nesses casos eacute difiacutecil a identifica-ccedilatildeo do perfil do autor da violaccedilatildeo geralmente natildeo se enquadrando em nenhuma categoria tradicional Ainda que os poliacuteticos ocupem a segunda posiccedilatildeo eacute importante ressaltar
mais uma vez o crescimento das violecircncias na esfera da internet e das redes sociais que agora natildeo apenas se coloca como central nas violaccedilotildees menos graves como tambeacutem nas mais graves Conforme apresentado no Relatoacuterio de Violaccedilotildees de 2018 um traccedilo marcante dos ataques online eacute o fato deste ser voltado para a figura pessoal do comuni-cador em grande parte dos casos No periacute-odo observado neste relatoacuterio esse cenaacuterio se intensifica tomando a posiccedilatildeo de primeiro lugar do perfil do agressor dos ataques mais graves no ano
Graacutefico 4 ndash VIOLACcedilOtildeES POR PERFIL DO AGRESSOR EM 2019 E 2020
8 Utilizamos os criteacuterios do IBGE para classificar o tamanho das cidades Cidades pequenas satildeo as que tecircm menos de
100 mil habitantes cidades meacutedias entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades grandes mais de 500 mil habitantes
GRILEIRO FAZENDEIRO LATIFUNDIAacuteRIO2 CASOS
ATAQUES VIRTUAIS13 CASOS
POLIacuteTICOS6 CASOS
CRIME ORGANIZADO4 CASOS
NAtildeO FOI POSSIacuteVEL APURAR8 CASOS
AGENTES PUacuteBLICOS5 CASOS
13 AMEACcedilAS DE MORTE
6 AMEACcedilAS DE MORTE
5 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 1 TENTATIVA DE ASSASSINATO + 2 AMEACcedilAS DE MORTE
1 HOMICIacuteDIO + 3 TENTATIVAS DE ASSASSINATO + 4 AMEACcedilAS DE MORTE
2 AMEACcedilAS DE MORTE
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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CAPIacuteTULO 6
O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
35
8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
29 httpswwwcnmpmpbrportalimagesnoticiasimagensMinuta_Recomendacao_
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
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Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
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LISTA DE CASOS DE VIOLACcedilOtildeES GRAVES EM 2019 E INIacuteCIO DE 2020
Em 2019 apenas no caso de Romaacuterio Barros a apuraccedilatildeo se direcionou no sentido de identifi-car uma relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia O comunicador que atuava em seu proacuteprio portal de notiacutecias foi morto por trecircs tiros em frente a sua casa Ainda que a investigaccedilatildeo policial natildeo tenha indicado sus-peitos familiares e colegas destacam que o profissional natildeo tinha grandes desavenccedilas e que as mateacuterias de tom criacutetico sobre questotildees policiais e de poliacutetica local seriam a uacutenica coi-sa que efetivamente o colocava em risco natildeo sendo possiacutevel dissociar sua atuaccedilatildeo enquanto comunicador de sua morte
No primeiro semestre de 2020 foi re-gistrada uma ocorrecircncia de homiciacutedio O jorna-lista Lourenccedilo (Leo) Veras foi assassinado na cidade de Pedro Juan Caballero na divisa do Paraguai com o Brasil aos 52 anos O crime se-guiu um padratildeo comum em grande parte dos homiciacutedios de jornalistas e comunicadores satildeo assassinados em emboscadas por pistoleiros que fogem apoacutes a execuccedilatildeo O jornalista foi as-sassinado dentro de sua proacutepria casa casa en-quanto jantava com a famiacutelia por homens que invadiram a residecircncia e desferiram 12 tiros contra ele O jornalista jaacute havia sofrido diver-sas ameaccedilas tendo aparecido anteriormente em outros Relatoacuterios de Violaccedilotildees da ARTIGO 19 Estas aparentemente foram motivadas por suas coberturas sobre a atuaccedilatildeo do crime or-
ganizado na regiatildeo da fronteira Em depoimen-to para o documentaacuterio ldquoImpunidade calardquo9 o jornalista apontou as especificidades da vio-lecircncia contra jornalistas e comunicadores na regiatildeo fronteiriccedila e a ineficiecircncia do Estado brasileiro em garantir a liberdade de expressatildeo e de imprensa o profissional contava somente com proteccedilatildeo oferecida pelo poder puacuteblico Pa-raguaio - o que natildeo conseguiu no Brasil
No documentaacuterio Leo relata ldquoeu sou um dos jornalistas que estaacute ameaccedilado na regiatildeo de fronteira e sou protegido pelo governo paraguaio pela Justiccedila paraguaia com escolta policial 24 horas E jaacute do lado brasileiro a gente natildeo tem essa proteccedilatildeo O que a gente gostaria eacute que nos dois lados a gente pudesse estar protegido Vocecirc natildeo tem mais vida social a partir das ameaccedilas vocecirc tem um novo caminho pra manter a sua seguranccedila manter a seguranccedila da famiacutelia muda totalmente a sua vidardquo Apoacutes o assassi-nato sua famiacutelia segue recebendo a proteccedilatildeo da poliacutecia paraguaia
Em maio agentes da Poliacutecia Nacional do Paraguai prenderam o suposto mandante do homiciacutedio Waldemar Pereira Rivas cuja ficha criminal evidencia tambeacutem sua rela-ccedilatildeo com os grupos investigados por Leo Veras O suspeito nega envolvimento com o crime ainda que evidecircncias (natildeo confirmadas pelas autoridades) apontem que ele abrigou um dos
Homiciacutedios
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Romaacuterio Barros Repoacuterter 190619 MaricaacuteRJProduccedilatildeo de conteuacutedos criacuteticos sobre poliacutetica e seguranccedila puacuteblica local
Lourenccedilo (Leo) Veras Jornalista 120220Pedro Juan CaballeroParaguai
Investigaccedilatildeo sobre crime organizado
9 Assista aqui o minidocumentaacuterio ldquoImpunidade Calardquo da ARTIGO 19 httpsvimeocom144645397
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pistoleiros que matou Leo Veras apoacutes sua fuga do local da execuccedilatildeo A investigaccedilatildeo natildeo foi concluiacuteda e haacute suspeita de envolvimento de outros liacutederes de organizaccedilotildees criminosas no caso - alguns destes que tiveram suas identi-dades expostas agraves autoridades pelo jornalista Ainda que o suspeito tenha sido encontrado e detido seguem existindo muitos pontos em que faltam informaccedilotildees sobre o contexto do crime bem como sobre os suspeitos
As zonas fronteiriccedilas apresentam uma seacuterie de dificuldades no que tange agrave violecircncia contra jornalistas e comunicadores dificultan-do inclusive os procedimentos investigativos
e judiciais considerando a falta de jurisdiccedilatildeo sobre territoacuterio alheio Ainda assim se mostra necessaacuterio que o Estado brasileiro seja capaz de oferecer seguranccedila eficaz para os jornalis-tas que trabalham nestes contextos que por vezes satildeo afastados do seu paiacutes de origem e de seu conviacutevio social e familiar por medo de en-trar em territoacuterio nacional e consequentemen-te colocar sua integridade em risco Haacute que se destacar que continua se tratando de episoacutedio no qual o Estado brasileiro falhou em oferecer seguranccedila para o jornalista jaacute ameaccedilado ainda que um dos suspeitos tenha sido detido pelas autoridades paraguaias
Tentativas de assassinato
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Toni Reis Radialista 170119 SindrolacircndiaMSInvestigaccedilatildeo sobre maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico municipal
Joatildeo Marcolino Neto Blogueiro 190520 CarauacutebasRNConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Paulinho Porto Radialista 010520Alto do RodriguesRN
Conteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Vamberto Teixeira Radialista 090420 Sete LagoasMGConteuacutedo criacutetico agrave administraccedilatildeo municipal
Dos casos de tentativas de assassinato apu-rados em 2019 em apenas um se verificou a existecircncia de correlaccedilatildeo entre a atividade do comunicador e a violaccedilatildeo O atentado a Toni Reis aconteceu apoacutes uma denuacutencia sobre uso indevido do dinheiro puacuteblico municipal Natildeo eacute a primeira tentativa de assassinato que o co-municador sofre em 2015 dois tiros foram disparados contra a casa do mesmo tambeacutem apoacutes uma denuacutencia relacionada agrave maacute gestatildeo do orccedilamento puacuteblico da cidade Desta vez um galatildeo de gasolina foi arremessado em sua residecircncia ndash que tambeacutem eacute sede de seu veiacute-culo de comunicaccedilatildeo - ateando fogo no carro utilizado pelo comunicador e pela sua famiacutelia
No primeiro semestre de 2020 foram monitoradas trecircs ocorrecircncias de tentativa de assassinato Todas as trecircs possuem em comum
conteuacutedos criacuteticos agrave administraccedilatildeo municipal como possiacuteveis motivaccedilotildees da violecircncia
Joatildeo Marcolino Neto foi alvejado por tiros em Carauacutebas no Rio Grande do Norte enquanto conversava com alunos da escola em que ministra aulas Ainda que tenha sido grave o acontecido a atuaccedilatildeo das instacircncias de investigaccedilatildeo eacute lenta e expotildee o comunicador a risco desde o ocorrido Joatildeo jaacute sofreu novas ameaccedilas ainda que tenha informado agrave inves-tigaccedilatildeo a placa do carro em que os executores estavam no momento da violaccedilatildeo
Ateacute entatildeo fontes que acompanham o caso de perto acreditam no envolvimento do poder puacuteblico no caso Joatildeo foi ainda preso por denuacutencia de posse ilegal de arma de fogo e seus bens - incluindo aqueles usados no exer-ciacutecio de sua profissatildeo - foram apreendidos pela
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Poliacutecia Civil que os manteve em sua posse aleacutem do prazo legalmente determinado aguar-dando ateacute decisatildeo judicial para a liberaccedilatildeo dos mesmos O comunicador relata clima de gran-de inseguranccedila ao seu redor gerado pela ame-accedila sofrida e pelas retaliaccedilotildees posteriores
No dia primeiro de maio de 2020 Paulinho Porto retornava para casa apoacutes rea-lizaccedilatildeo de seu programa de raacutedio quando foi surpreendido por outro veiacuteculo do qual desce-ram homens que o agrediram e atearam fogo em sua moto dizendo que o radialista deveria parar de fazer criacuteticas agrave administraccedilatildeo do mu-niciacutepio de Alto de Rodrigues Os homens o co-locaram dentro do veiacuteculo em que estavam do
qual soacute conseguiu se libertar pulando do carro em movimento O comunicador jaacute havia sofri-do ameaccedilas anteriormente principalmente pelo meio digital O radialista seus colegas de profissatildeo e as instacircncias de investigaccedilatildeo natildeo apresentaram suspeitas sobre quem seriam os mandantes e executores do crime
Vamberto Teixeira teve sua casa alve-jada por tiros no comeccedilo de abril Os vizinhos conseguiram descrever para a poliacutecia caracte-riacutesticas dos atiradores e do carro que usaram para chegar no local mas as investigaccedilotildees natildeo tiveram ateacute entatildeo alguma conclusatildeo ou sus-peita sobre a autoria do crime O radialista rela-ta natildeo ter sido alvo de ameaccedilas anteriormente
Ameaccedilas de morte
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Adeacutecio Piran Jornalista 300819 Novo ProgressoPAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Alex Carvalho Radialista 031219 AracajuacuteSE Posicionamento poliacutetico
Carlos de Lannoy Repoacuterter 060419 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Cloacutevis Messerschmidt Jornalista 030919 IbirubaacuteRSInvestigaccedilatildeo de temas sensiacuteveis para a comunidade local
Deacutebora Alves Repoacuterter 260819 UruaraacutePAProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre a questatildeo ambiental
Deacutercio Alcacircntara Jornalista 121219Cacimba de DentroPB
Produccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a questatildeo educacional
Douglas Arauacutejo Jornalista 300119Castelo dos SonhosPA
Produccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Faacutebio Estrela Dantas Radialista 100219 SousaPB Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Faacutebio Pannunzio Jornalista 170719 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Glenn Greenwald Jornalista 090619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Gorete Videres Jornalista 280819 CajazeirasPBProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Ilton Santos Radialista 090519 MorrinhosCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Joatildeo Saconi Repoacuterter 140919 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a vida particular de poliacuteticos
Juca Kfouri Jornalista 100119 Satildeo PauloSP Posicionamento poliacutetico
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Foi possiacutevel apurar 25 ameaccedilas de morte con-tra comunicadores no ano de 2019 Vale desta-car que em 2018 foram incluiacutedas neste mesmo relatoacuterio 26 ameaccedilas sendo este o maior nuacute-mero desse tipo de violaccedilotildees jaacute registrada pela ARTIGO 19 e se identificou o aumento como proveniente dos nuacutemeros crescentes de ame-accedilas online Em 2019 a tendecircncia se manteacutem sendo que 36 (9) destas violaccedilotildees tiveram esse formato Durante os seis primeiros meses
de 2020 foi possiacutevel confirmar a correlaccedilatildeo de setes casos de ameaccedila de morte com o exer-ciacutecio da comunicaccedilatildeo Dentre essas destaca-mos que quatro foram feitas por meios digitais dificultando a apuraccedilatildeo de autoria - mas natildeo diminuindo os efeitos deste tipo de violaccedilatildeo na sensaccedilatildeo de inseguranccedila dos jornalistas e comunicadores que muitas vezes se sentem coagidos a natildeo continuar exercendo a profis-satildeo de forma livre
Viacutetima Perfil Data CidadeUF Aparente motivaccedilatildeo
Juliana Dal Piva Repoacuterter Abril19 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre documentaacuterio proacute-ditadura militar
Juliet Manfrin Repoacuterter 140319 CascavelPRProduccedilatildeo de conteuacutedo de denuacutencia sobre questotildees de seguranccedila puacuteblica
Justino Filho Radialista 100519 ImperatrizMAProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Leandro Demori Jornalista 100619 Rio de JaneiroRJProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Leandro Lima Jornalista 220419 MatupaacuteMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Maacutercio Bikanca Jornalista 291119 ParnaiacutebaPIProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Marcolino Borges Radialista 031219 ChoroacuteCEProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica municipal
Mauro Cezar Pereira Jornalista 2019 Satildeo PauloSP Produccedilatildeo de conteuacutedo esportivo
Mocircnica Bergamo Jornalista 2019 Satildeo PauloSPProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a gestatildeo puacuteblica federal
Renato Pantanal Jornalista 031219 ColnizaMTProduccedilatildeo de conteuacutedo criacutetico sobre a relaccedilatildeo entre latifundiaacuterios e poliacuteticos locais
Waslley Leite Repoacuterter 310519 VitoacuteriaESCobertura de questotildees de seguranccedila puacuteblica e crime organizado
Alex Braga Jornalista 230720 ManausAM Denuacutencias sobre a administraccedilatildeo estadual
Carlos Caldeira Jornalista 210720Candeias do JamariRO
Criacuteticas agrave administraccedilatildeo municipal
Djamila Ribeiro Colunista 270720 Ataque digital (SP)Denuacutencias e criacuteticas relacionadas agrave temaacutetica racial
Joatildeo Costa Radialista 062020 Ataque digital (PB) Criacuteticas ao Governo Federal
Luiz Bacci Apresentador 022020 Ataque digital (SP)Divugaccedilatildeo de conteuacutedo sensiacutevel em programa ao vivo
Rafael Ventura Jornalista 200520 Ribeiratildeo PiresSP Denuacutencia de crime relacionado agrave agente poliacutetico
Rafael Ventura Jornalista 052020 Ataque digital (SP) Cobertura relativa agrave pandemia de Covid-19
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CAPIacuteTULO 4
A DESINFORMACcedilAtildeO COMO RISCO Agrave SAUacuteDE PUacuteBLICA ATAQUE A COMUNICADORES COBRINDO A CRISE DA COVID-19
Eacute necessaacuterio destacar o contexto da pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas formas de ataque e nas estrateacutegias de proteccedilatildeo de jorna-listas e comunicadores A pandemia alimentou diversos debates sobre a importacircncia do traba-lho da imprensa na divulgaccedilatildeo de informaccedilotildees confiaacuteveis para a populaccedilatildeo - principalmente por meio de informativos sobre as medidas de contenccedilatildeo da disseminaccedilatildeo do viacuterus propostas pelas organizaccedilotildees nacionais e internacionais de sauacutede e sobre as estatiacutesticas federais e re-gionais de contaminaccedilatildeo e oacutebitos Assim en-tendemos que a miacutedia se tornou parte impres-cindiacutevel do combate agrave Covid-19 no Brasil
A conjuntura da pandemia se apre-sentou como um dos possiacuteveis motivos para a diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos de graves violecircncias contra comunicadores no primeiro semestre de 2020 quando comparados com os nuacutemeros semestrais de anos anteriores Considerando que as graves ameaccedilas aqui
monitoradas e apuradas em sua maioria natildeo satildeo passiacuteveis de execuccedilatildeo agrave distacircncia ou vir-tualmente - com exceccedilatildeo da ameaccedila de morte - haacute uma diminuiccedilatildeo do nuacutemero de casos que provavelmente estaacute relacionada ao contexto do isolamento social A confirmaccedilatildeo dessa hi-poacutetese no entanto depende de mais estudos e levantamentos
O deslocamento do trabalho jornaliacutesti-co para o ambiente domeacutestico com a adoccedilatildeo do home office por grande parte dos veiacuteculos de comunicaccedilatildeo bem como a necessidade de realizar cada vez menos saiacutedas - que por sua vez se tornaram mais caras com alta mo-vimentaccedilatildeo de recursos humanos e de sauacutede para garantir a integridade fiacutesica do comunica-dor que realiza a cobertura - e a inseguranccedila gerada pela possibilidade de contaminaccedilatildeo e pelo crescente nuacutemero de oacutebitos satildeo al-guns dos fatores que distanciaram boa parte dos profissionais do meio da comunicaccedilatildeo do
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trabalho de campo Assim os nuacutemeros de ca-sos mais graves diminuem uma vez que os jor-nalistas e comunicadores estiveram menos em espaccedilos puacuteblicos e consequentemente menos expostos agrave violecircncia que eacute empregada para silenciaacute-los
Nesse aspecto as medidas de higiene e assepsia voltadas para a contenccedilatildeo do viacuterus foram essenciais para garantir a sauacutede daque-les que tiveram que sair a campo durante o periacuteodo Natildeo obstante o periacuteodo da pandemia impocircs aos veiacuteculos de imprensa e trabalhado-res do campo da comunicaccedilatildeo a necessidade de pensar cada vez mais na seguranccedila e prote-ccedilatildeo do trabalho jornaliacutestico de forma holiacutestica indo para aleacutem das estrateacutegias de seguranccedila fiacutesica contra o viacuterus
O contexto do isolamento social e o deslocamento das atividades dos profissionais do campo da comunicaccedilatildeo para o meio digital apresentou tambeacutem a necessidade de priori-zar debates sobre a seguranccedila de jornalistas e comunicadores no meio virtual conside-rando evidente aumento dos ataques neste ambiente Durante o ano de 2019 foi possiacutevel registrar 44 ataques no meio digital dentre as 139 violaccedilotildees monitoradas no total Ainda que o aumento de 2019 jaacute seja marcante frente aos anos anteriores o primeiro semestre de 2020 permite observar intensificaccedilatildeo mais laten-te dessa forma de violecircncia dentre o total de 160 violaccedilotildees observadas no primeiro semes-tre 85 foram no meio digital Portanto nota-se que em apenas um semestre o ano de 2020 jaacute apresenta quase o dobro do nuacutemero ataques virtuais ocorridos em 2019
Da mesma forma pode-se inferir a partir da comparaccedilatildeo dos nuacutemeros coletados que o aumento expliacutecito do nuacutemero geral de casos entre um ano e outro eacute proveniente tam-beacutem de um aumento exponencial do nuacutemero de violecircncias cometidas online bem como pela sofisticaccedilatildeo nas ferramentas de captaccedilatildeo de dados sobre violecircncias nessa esfera
Foi possiacutevel identificar grande nuacutemero de violecircncias contra jornalistas e comunicado-res relacionadas agrave coberturas e conteuacutedos so-bre a pandemia 125 das 160 violaccedilotildees con-tra jornalistas e comunicadores registradas no
periacuteodo observado neste relatoacuterio foram moti-vadas por conteuacutedos sobre o Covid-19 Desde que foram confirmados os primeiros casos da doenccedila no Brasil a ARTIGO 19 passou a mo-nitorar os casos de ataques relacionados a co-berturas sobre a pandemia registrando ateacute o final de agosto ao menos 82 ataques Quase 10 destes casos ocorreram durante cobertu-ras em hospitais e comeacutercios que permanece-ram abertos contrariando Decretos municipais e estaduais bem como as poliacuteticas de preven-ccedilatildeo contra o viacuterus Estas em sua totalidade foram interrompidas por vezes contando com agressotildees fiacutesicas e verbais colocando em risco a seguranccedila dos jornalistas ali presentes
Os dados do monitoramento especiacutefi-co sobre ataques agrave imprensa e Covid-19 mos-tram ainda que 72 dos ataques registrados foram realizados diretamente por membros do Governo Federal pelo Presidente da Re-puacuteblica e poliacuteticos associados revelando um cenaacuterio em que o descreacutedito da informaccedilatildeo do trabalho da imprensa e as agressotildees contra jornalistas satildeo abertamente incentivadas por membros do atual mandato
No mesmo sentido lembramos dos momentos em que o Presidente negou medi-das para a proteccedilatildeo dos jornalistas e comuni-cadores que realizavam coberturas no Palaacutecio da Alvorada expocircs jornalistas agrave contaminaccedilatildeo dando entrevista sem maacutescara apoacutes testar po-sitivo para Covid-19 e acusou - diversas vezes - os meios de comunicaccedilatildeo de espalhar histeria e prejudicar a economia ao realizar a cobertura da pandemia O sentimento de desconfianccedila criado pelos agentes poliacuteticos ao redor do tra-balho informativo mobilizando narrativas sobre a pandemia e colocando em jogo a vida de mi-lhotildees de brasileiros atraveacutes da poliacutetica de desin-formaccedilatildeo eacute incompatiacutevel com a demanda ur-gente de melhoria da condiccedilatildeo brasileira frente agraves crises agravadas pela pandemia de Covid-19
Vale destacar que no contexto de de-sinformaccedilatildeo crescente e do incentivo por au-toridades puacuteblicas a uma relaccedilatildeo hostil com a imprensa o Brasil se tornou um dos paiacuteses mais afetados no mundo todo pela pandemia registrando mais de 160 mil mortes em novem-bro de 2020
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CAPIacuteTULO 5
O PAPEL DA COMUNICACcedilAtildeO COMUNITAacuteRIA E POPULAR NO COMBATE Agrave DESINFORMACcedilAtildeO E NO FORTALECIMENTO DE SEUS TERRITOacuteRIOSGizele Martins10
Em meados de marccedilo apoacutes as primeiras notiacutecias sobre o iniacutecio da pandemia do novo coronaviacuterus (Covid-19) no Brasil comunica-dores comunitaacuterios e populares de diversas favelas e periferias de todo o paiacutes se or-ganizaram e se mobilizaram para realizar a ldquoCampanha Coronaviacuterus nas Favelas e Peri-
feriasrdquo A Campanha nacional comeccedilou com a publicaccedilatildeo de um manifesto divulgado pe-las redes sociais Este documento escrito por diversas matildeos solicitava aos governan-tes uma seacuterie de medidas para prevenccedilatildeo cuidados e atenccedilatildeo baacutesica aos povos mais pobres do paiacutes11
10 Gizele Martins eacute comunicadora comunitaacuteria da MAREacute (RJ) Jornalista e mestre em educaccedilatildeo cultura e
comunicaccedilatildeo em periferias urbanas
11 Coronaviacuterus comunicadores de periferias e favelas se articulam para informar sobre pandemia
httpsalmapretacomeditoriasrealidadecoronavirus-comunicadores-de-periferias-e-favelas-se-articulam
-para-informar-sobre-pandemia
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No Rio de Janeiro o mesmo ocorreu comuni-cadores de diferentes favelas e periferias se mobilizaram para produzir informaccedilotildees sobre o novo viacuterus voltadas para o puacuteblico das favelas Os comunicadores perceberam que as informa-ccedilotildees veiculadas pelas miacutedias comerciais natildeo atendiam agrave realidade da favela afinal como la-var as matildeos constantemente se historicamente as favelas sofrem com a falta de abastecimento de aacutegua natildeo eacute mesmo12
Na Favela da Mareacute um conjunto de 16 favelas e com uma populaccedilatildeo de 140 mil moradores localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro a campanha nacional foi adaptada para a realidade local Mais de 20 coletivos de comunicaccedilatildeo educaccedilatildeo e artes se organiza-ram e fizeram nascer a Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute somando mais de 100 voluntaacuterios da proacutepria favela Ainda em marccedilo rapidamente este grupo montou um plano de comunicaccedilatildeo que conseguisse atender os mais diferentes puacuteblicos da favela 13
Na primeira semana a Frente de Mo-bilizaccedilatildeo da Mareacute tambeacutem lanccedilou uma cam-panha virtual para conseguir apoio financeiro jaacute que nenhum dos coletivos tinha qualquer quantia para colocar em praacutetica as inuacutemeras accedilotildees planejadas e emergenciais Com as pri-meiras doaccedilotildees o plano de comunicaccedilatildeo co-meccedilou a ser posto em praacutetica carros de som mais de 30 faixas e mais de mil cartazes foram colados pelos comeacutercios bares e igrejas a
cada semana Aleacutem disso aacuteudios artes de rua pelas paredes da favela cards e lives para as redes sociais foram feitas pelas 16 favelas da Mareacute com todas as informaccedilotildees revisadas por agentes de sauacutede da proacutepria localidade
O objetivo desde o iniacutecio foi o de infor-mar aos moradores da Mareacute sobre os cuidados os principais sintomas da Covid-19 orientar aos moradores de quando e como procurar o hospital mais proacuteximo Aleacutem disso as men-sagens em todos os canais alertavam para a importacircncia da essecircncia de ser favela dos mo-radores sempre lembrarem da solidariedade local Por exemplo na divisatildeo de aacutegua e aacutelcool
Com o passar do tempo a Frente Mareacute assim como os outros comunicadores que fizeram campanhas de comunicaccedilatildeo em suas favelas passou a sentir a necessidade de abraccedilar outros desafios jaacute que o nuacutemero de moradores enviando mensagens e dizendo que estavam com fome sem emprego apoio ou remeacutedios passou a crescer neste periacuteodo de pandemia Daiacute inicia-se a busca por apoio de cestas baacutesicas por doaccedilotildees de maacutescaras de aacutelcool EPIrsquos e tantas outras demandas que co-meccedilaram a surgir nas favelas
As novas demandas exigiram destes comunicadores mais organizaccedilatildeo e mais bus-cas por apoios reuniotildees com diversos sindi-catos organizaccedilotildees de direitos humanos e autoridades puacuteblicas para apoios poliacuteticos e de atenccedilatildeo agraves favelas foram feitas Reuniotildees
12 Em tempos de coronaviacuterus mais importante que higienizar as matildeos com aacutelcool em gel eacute lavaacute-las com aacutegua e
sabatildeo diversas vezes ao dia Esta eacute uma das principais recomendaccedilotildees da Organizaccedilatildeo Mundial da Sauacutede (OMS)
e do Ministeacuterio da Sauacutede para que a populaccedilatildeo consiga combater a pandemia em todo o mundo Mas a realidade
nas favelas do Rio de Janeiro estaacute muito distante do ideal para evitar a Covid-19 httpswwwbrasildefa
tocombr20200323favelas-do-rio-sofrem-com-falta-d-agua-e-populacao-fica-mais-vulneravel-a-coronavirus
12 dias sem soluccedilatildeo Moradores da Rocinha continuam sem aacutegua e a CEDAE natildeo tem previsatildeo do reabastecimen-
to - A equipe do Voz das Comunidades esteve no local conversando com os moradores que jaacute natildeo aguentam mais
viver nessa situaccedilatildeo httpswwwvozdascomunidadescombrdestaques12-dias-sem-solucao-moradores-da-ro
cinha-continuam-sem-agua-e-a-cedae-nao-tem-previsao-do-reabastecimento
13 Frente de Mobilizaccedilatildeo da Mareacute atua para minimizar os terriacuteveis efeitos da pandemia do Covid-19 nas
comunidades locais Somos mais de 50 voluntaacuterios engajados nessa luta entre moradoras e moradores
comunicadores populares assistentes sociais e profissionais das aacutereas de Educaccedilatildeo e Sauacutede Desde o iniacutecio do
mecircs de marccedilo o coletivo estaacute realizando uma grande campanha de comunicaccedilatildeo comunitaacuteria em todo o territoacuterio
local esclarecendo as pessoas sobre os sintomas da Covid-19 procedimentos de prevenccedilatildeo com ecircnfase na
urgecircncia do afastamento social Retirado da paacutegina httpswwwfrentemarecomsobrecampanha
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online com possiacuteveis apoiadores financeiros procura por editais aleacutem de visitas agraves cliacutenicas das famiacutelias tambeacutem fizeram parte dessa fase da pandemia O mais difiacutecil sem duacutevida foi li-dar com tantas pessoas doentes e outras que morreram no periacuteodo Eram muitas as famiacutelias procurando apoio para compra de remeacutedios para testes mas infelizmente tambeacutem para apoio nos enterros de seus parentes que mor-reram de Covid-19
Atualmente com a flexibilizaccedilatildeo por parte dos governantes as doaccedilotildees financeiras as-sim como as de cestas e materiais de higiene caiacuteram o que fez diminuir tambeacutem as accedilotildees locais na Mareacute em diversas outras favelas O difiacutecil eacute diminuir um trabalho como este sa-bendo que a pandemia ainda continua e que a populaccedilatildeo mais afetada do Rio eacute negra pobre e favelada - sem duacutevidas uma realidade tam-beacutem em outros estados brasileiros
Falta de financiamento equipamentos e censura satildeo
alguns dos principais desafios que comunicadores e comunicadoras
enfrentam historicamente no Rio de Janeiro e no Brasil
Nos paraacutegrafos acima foram mencionados al-guns exemplos de campanhas sobre a pan-demia do novo coronaviacuterus e que datildeo a di-mensatildeo do que foi e estaacute sendo realizar esse trabalho dentro dos locais empobrecidos como nas favelas do Rio de Janeiro Sabe-mos que o paiacutes inteiro teve comunicadores se organizando para trabalhar neste periacuteodo a comunicaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo interna Estes comunicadores junto aos seus tradicionais meios de comunicaccedilatildeo vecircm ao longo dos anos construindo memoacuterias fortalecendo ter-ritoacuterios e mobilizando ideais pensamentos e praacuteticas nos seus locais
Mas estes mesmos meios de comunicaccedilatildeo enfrentam cotidianamente enormes desafios falta de financiamento natildeo haacute cumprimendo de leis por parte dos governantes no que se refere agrave garantia da liberdade de expressatildeo falta de equipamentos de tecnologia acesso agrave internet sem contar nas ameaccedilas e censuras enfrentadas diariamente por muitos dos comu-nicadores comunitaacuterios
O Brasil que haacute algumas deacutecadas se declara como um paiacutes democraacutetico ainda natildeo teve coragem de enfrentar o debate sobre a democratizaccedilatildeo da comunicaccedilatildeo Poucas fa-miacutelias concentram poucas miacutedias comerciais
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ainda a atuaccedilatildeo das Unidades de Poliacutecia Pa-cificadora (UPPs) Satildeo poliacutecias ditas comu-nitaacuterias que estatildeo instaladas haacute mais de 10 anos em algumas favelas Por causa delas muitas raacutedios comunitaacuterias e raacutedios postes foram fechadas pelas autoridades e pelas poliacutecias por denunciarem as violaccedilotildees come-tidas pelas UPPs assim como ocorreu anos atraacutes na Favela Santa Marta localizada na Zona Sul do Rio14
14 Em 2010 o rapper e comunicador comunitaacuterio Fiell morador do Santa Marta favela localizada na Zona
Sul a primeira a receber a Unidade de Poliacutecia Pacificadora foi agredido por policiais da UPP Fiell e outros
comunicadores comunitaacuterios de outras favelas do Rio aleacutem de militantes de organizaccedilotildees de direitos humanos
que atuam na cidade inauguraram a Raacutedio Comunitaacuteria Santa Marta Todo o processo de construccedilatildeo da raacutedio foi
coletivo Festas assembleias reuniotildees e cursos de teacutecnicas de comunicaccedilatildeo e sobre a histoacuteria da comunicaccedilatildeo
popular e comunitaacuteria foram promovidos na favela
A raacutedio ficou logo conhecida pelos moradores A participaccedilatildeo era grande e denuacutencias sobre as violaccedilotildees
cometidas pela UPP eram divulgadas constantemente Natildeo por acaso Fiell foi agredido diversas vezes pela
poliacutecia local Depois de inuacutemeras violaccedilotildees e invasotildees da poliacutecia na sala em que funcionava a raacutedio a poliacutecia
federal conseguiu fechar a emissora Fiell foi levado preso pelos agentes de seguranccedila e ateacute hoje paga um valor
como multa por ter construiacutedo junto aos moradores uma raacutedio comunitaacuteria (Retirado do Livro Militarizaccedilatildeo e
Censura A luta por liberdade de expressatildeo na Favela da Mareacute Martins Gizele)
no paiacutes e quem faz comunicaccedilatildeo na favela ou em outros espaccedilos empobrecidos sofre com a falta de qualquer tipo de incentivo de atenccedilatildeo apoio valorizaccedilatildeo
No Rio de Janeiro por exemplo para aleacutem de todos estes problemas menciona-dos acima comunicadores ainda conviveram e convivem com as constantes ameaccedilas e censuras por parte do poder puacuteblico jaacute que dentro de muitas das favelas e periferias haacute
A CENSURA E A CRIMINALIZACcedilAtildeO
No Conjunto de Favelas da Mareacute o mesmo local que fez essa enorme campanha durante a pan-demia com a organizaccedilatildeo da Frente de Mobili-zaccedilatildeo da Mareacute neste ano de 2020 (trabalho que soacute foi possiacutevel porque haacute mais de 20 anos essa favela eacute referecircncia na construccedilatildeo de miacutedias co-munitaacuterias raacutedios TVs paacuteginas do Facebook miacutedias impressas etc) eacute a favela que nos uacutel-timos anos tambeacutem ficou marcada por sofrer inuacutemeras violaccedilotildees e ter muitos dos seus comu-nicadores comunitaacuterios ateacute mesmo ameaccedilados e algumas miacutedias comunitaacuterias fechadas
Nas miacutedias que satildeo produzidas e cir-culam na Mareacute historicamente satildeo trabalha-das mateacuterias direcionadas agrave cultura nordes-tina negra indiacutegena e o tema dos direitos
humanos eacute o que costuma estar mais presente por causa das constantes violaccedilotildees estatais Em suas pautas ao longo dos anos satildeo tam-beacutem tratadas a defesa da identidade local e a auto-estima dos moradores que pertencem ao conjunto de favelas O trabalho de mobilizaccedilatildeo local eacute outro destaque dos meios comunitaacuterios Todos estes veiacuteculos tecircm como caracteriacutestica a produccedilatildeo feita por moradores locais
Um dos piores periacuteodos para se fazer comunicaccedilatildeo comunitaacuteria na Mareacute foi durante os anos de 2014 e 2015 pois por causa da rea-lizaccedilatildeo da Copa do Mundo o governo brasileiro colocou o exeacutercito dentro dela Nesta eacutepoca qualquer evento cultural ficou proibido de ser realizado sem a permissatildeo do comandante
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churrasco na rua festa de aniversaacuterio jogo de futebol etc Foi uma ruptura no cotidiano dos moradores Como jaacute era habitual os comunica-dores comunitaacuterios comeccedilaram a relatar essas proibiccedilotildees culturais e tantas outras violaccedilotildees Fotos mateacuterias e viacutedeos foram produzidos quase que diariamente sobre cada fato As de-nuacutencias eram publicadas em sites blogs redes sociais nas paacuteginas do Jornal O Cidadatildeo do Mareacute Vive e em outras miacutedias da Mareacute Miacutedias nacionais e internacionais replicavam os con-teuacutedos Aleacutem disso parte destes relatos eram encaminhados a oacutergatildeos responsaacuteveis pela de-fesa dos direitos humanos15
Com o passar do tempo no entanto o exeacutercito interveio nas accedilotildees dos comunicado-res em 2014 e 2015 Os que jaacute estavam habitu-ados a realizar trabalhos ligados agrave comunicaccedilatildeo comunitaacuteria (como saraus rodas de conversas eou qualquer outro tipo de iniciativa que lidas-se com as questotildees que envolvessem os temas da favela e direitos humanos) passaram a so-frer perseguiccedilatildeo por parte do governo brasilei-ro que investiu e apoiou a invasatildeo do exeacutercito na Mareacute Neste periacuteodo soldados faziam visi-tas constantes aos locais em que funcionavam as miacutedias identificavam comunicadores nas ruas revistavam celulares ameaccedilavam e ateacute expulsaram comunicadores da Mareacute Ou seja a falta de apoio de financiamento a censura e a falta de liberdade de expressatildeo satildeo regras no nosso paiacutes Hoje temos no poder um governo de extrema direita que ameaccedila jorna-listas e comunicadores inclusive publicamen-
te Desde que o atual Presidente da Repuacuteblica Jair Bolsonaro ganhou as eleiccedilotildees ele direcio-na diversos ataques a jornalistas e aos meios de comunicaccedilatildeo de todo o paiacutes
Um relatoacuterio produzido pela organiza-ccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras em 2019 inti-tulado ldquoUm periacuteodo sombrio que se anunciardquo chama atenccedilatildeo para esses ataques ldquoAmea-ccedilas agressotildees assassinatos O Brasil continua sendo um dos paiacuteses mais violentos da Ameacuteri-ca Latina para a praacutetica do jornalismordquo O mes-mo relatoacuterio coloca o Brasil no 105ordm lugar entre os paiacuteses mais violadores do mundo16 Eacute pre-ciso garantir o direito agrave comunicaccedilatildeo e o natildeo fechamento de raacutedios comunitaacuterias O conte-uacutedo de denuacutencia sobre as violaccedilotildees do Estado agraves populaccedilotildees negras faveladas e perifeacutericas precisa continuar enquanto houver um Estado violador de direitos A liberdade de expressatildeo necessita deixar de ser um mito no paiacutes17 O governo precisa garantir esse direito para que comunicadores de favelas e periferias mante-nham as suas ferramentas de comunicaccedilatildeo ativas Eacute preciso que o Estado e a sociedade reconheccedilam e valorizem a comunicaccedilatildeo co-munitaacuteria uma comunicaccedilatildeo que natildeo eacute soacute vol-tada para a populaccedilatildeo mas eacute feita por e com as populaccedilotildees locais
Eacute perceptiacutevel a importacircncia destas miacutedias e dos comunicadores comunitaacuterios dentro das favelas e periferias do Rio e de todo o paiacutes Elas comunicam informam tra-balham a defesa da identidade e cultural va-lorizam a solidariedade e o trabalho local co-
15 Comissatildeo de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Anistia
Internacional Witness Artigo 19 Justiccedila Global Defensoria Puacuteblica do Rio de Janeiro
16 Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no paiacutes em decorrecircncia da sua atividade Na
maioria dos casos esses repoacuterteres locutores de raacutedio blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam
e investigavam toacutepicos relacionados agrave corrupccedilatildeo poliacuteticas puacuteblicas ou crime organizado particularmente em
cidades de pequeno e meacutedio porte em todo o paiacutes nas quais estatildeo mais vulneraacuteveis A eleiccedilatildeo de Jair Bolsonaro
em outubro de 2018 apoacutes uma campanha marcada por discursos de oacutedio desinformaccedilatildeo violecircncia contra
jornalistas e desprezo pelos direitos humanos eacute um prenuacutencio de um periacuteodo sombrio para a democracia e a
liberdade de imprensa O horizonte midiaacutetico ainda eacute bastante concentrado no Brasil sobretudo ao redor de
grandes famiacutelias (com frequecircncia proacuteximas da classe poliacutetica) O direito ao sigilo das fontes jaacute foi questionado em
diversas situaccedilotildees no paiacutes e muitos jornalistas e meios de comunicaccedilatildeo satildeo alvos de processos judiciais abusivos
(Relatoacuterio produzido pela organizaccedilatildeo Repoacuterteres Sem Fronteiras demonstra que o Brasil ocupa o 105ordm lugar no
Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2019)
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bram poliacuteticas puacuteblicas para os favelados etc Mas infelizmente eacute perceptiacutevel tambeacutem a perseguiccedilatildeo a estes meios e comunicadores jaacute que eles trazem uma contra-informaccedilatildeo sobre o que a miacutedia comercial veicula sobre as favelas aleacutem de denunciarem tambeacutem as constantes violaccedilotildees de direitos que as po-pulaccedilotildees pobres sofrem dentro destes terri-toacuterios marginalizados e criminalizados pelos
proacuteprios governantes e seus apoiadores Mas elas precisam resistir e continuar pois um trabalho como o que foi feito nos primeiros 6 meses da pandemia soacute foi possiacutevel porque estas mesmas miacutedias e seus comunicadores resistiram por tantos anos defendendo e pra-ticando uma comunicaccedilatildeo comunitaacuteria feita para e com as populaccedilotildees locais Ou seja ela necessita continuar
CAMPANHA CompartilheInformaccedilatildeo
CompartilheSauacutede
A campanha CompartilheInformaccedilatildeo CompartilheSauacutede surgiu num momento criacutetico e trouxe um alerta informaccedilatildeo de qualidade eacute essencial sobretudo num cenaacuterio de crise econocircmica poliacutetica social e de sauacutede
Por meio de uma chamada aberta em maio a ARTIGO 19 buscou apoiar accedilotildees de comunicaccedilatildeo popular perifeacuterica comunitaacuteria e autocircnoma e fortalecer uma rede de trocas neste momento criacutetico foram mais de 100 inscritos e ao final 23 iniciativas contempladas em 12 Estados brasileiros
Entre as inscriccedilotildees dezenas de accedilotildees potentes de coletivos organizaccedilotildees foacuteruns e movimentos que satildeo formados por comunicadores jornalistas radialistas estudantes e outros mdash todas empenhadas em apresentar perspectivas plurais sobre os impactos das crises e da pandemia e apontar caminhos para afirmar direitos compartilhando informaccedilatildeo e sauacutede
Neste momento de pandemia de Covid-19 e das crises agravadas no atual cenaacuterio 23 parceirosas envolvidos nesta campanha pelo direito agrave informaccedilatildeo na pandemia deixam um legado importante informaccedilatildeo confiaacutevel vem da pluralidade de vozes e da uniatildeo de iniciativas diversas em seu campo de atuaccedilatildeo localidades e territoacuterios
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O PAPEL DO ESTADO NA INTENSIFICACcedilAtildeO DAS VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
O Estado brasileiro por meio de sua parti-cipaccedilatildeo em organismos internacionais de direitos humanos assinatura de tratados e convenccedilotildees internacionais eacute responsaacutevel pe-rante a comunidade internacional17 pela ga-rantia efetiva dos direitos humanos no paiacutes Aleacutem disso esses padrotildees internacionais de direitos humanos tambeacutem encontram eco na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 e na legislaccedilatildeo nacional de garantia de direitos humanos Com base nessa responsabilidade assumi-da o Estado tem trecircs obrigaccedilotildees principais a cumprir a obrigaccedilatildeo de prevenir que vio-laccedilotildees aconteccedilam a obrigaccedilatildeo de proteger
comunicadores em situaccedilatildeo de risco e a obri-gaccedilatildeo de investigar processar e punir quando uma violaccedilatildeo ocorre
Essas obrigaccedilotildees satildeo balizas impor-tantes que nos ajudam a avaliar natildeo soacute a situ-accedilatildeo geral do direitos humanos no paiacutes mas o papel especiacutefico do Estado em reproduzir ou intensificar o cenaacuterio de violaccedilotildees de direitos quando assumiu o dever de atuar para garan-ti-los Assim ao analisarmos como o Estado brasileiro tem descumprido cada uma das vio-laccedilotildees podemos identificar quais as reformas institucionais mais urgentes para garantirmos a efetivaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no paiacutes
17 Existem diversos documentos de organismos internacionais que organizam esses padrotildees internacionais e que
informam a anaacutelise feita neste relatoacuterio Para referecircncia o principal documento utilizado aqui foi o relatoacuterio da
Relatoria Especial para Liberdade de Expressatildeo da Comissatildeo Interamericana de Direitos Humanos publicado em
2013 e que sistematiza uma anaacutelise dos padrotildees interamericanos de proteccedilatildeo a comunicadores httpswwwoas
orgptcidhexpressaodocspublicaciones20142008202920PROTECAO20JORNALISTAS20finalpdf
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Uma das obrigaccedilotildees internacionais do Estado brasileiro eacute a de prevenir que violaccedilotildees contra a liberdade de expressatildeo ocorram Segundo os padrotildees internacionais a obrigaccedilatildeo de prevenir engloba uma seacuterie de responsabilidades e prin-ciacutepios destacando-se as obrigaccedilotildees de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave prevenccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas de instruir as for-ccedilas de seguranccedila sobre o respeito aos meios de comunicaccedilatildeo de respeitar o direito de jornalis-tas ao sigilo de suas fontes de informaccedilotildees ano-taccedilotildees e arquivos pessoais e profissionais de manter estatiacutesticas precisas sobre a violecircncia contra jornalistas Esse conjunto de responsa-bilidades deve orientar tanto o desenvolvimen-to de poliacuteticas puacuteblicas quanto o proacuteprio com-portamento de autoridades puacuteblicas no que diz respeito ao trabalho de comunicadores
No entanto na praacutetica o que vemos eacute algo muito diferente o Estado brasileiro e auto-ridades puacuteblicas de alto escalatildeo natildeo soacute ignoram esses padrotildees baacutesicos mas sistematicamente os violam Um exemplo importante dessa viola-ccedilatildeo sistemaacutetica diz respeito agrave primeira e mais baacutesica responsabilidade dentro da obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees a obrigaccedilatildeo de adotar um discurso puacuteblico que contribua agrave preven-ccedilatildeo da violecircncia contra jornalistas
A importacircncia desse princiacutepio eacute tama-nha que aleacutem de padrotildees internacionais de direitos humanos haacute padrotildees nacionais que orientam autoridades puacuteblicas em como se comportar diante o trabalho de comunicado-res como eacute o caso da recomendaccedilatildeo nordm 07 de 13 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos que
recomenda que o tratamento dado a co-municadores por parte dos agentes puacutebli-cos siga diretrizes estabelecidas em nor-
mas internacionais e nacionais que visem garantir o respeito ao exerciacutecio profissio-nal a liberdade de expressatildeo liberdade de imprensa e o direito agrave informaccedilatildeordquo18
Com base nessa recomendaccedilatildeo central para garantir a prevenccedilatildeo a violaccedilotildees a ARTIGO 19 monitorou declaraccedilotildees puacuteblicas realizadas pelo Presidente da Repuacuteblica seus ministros seus filhos com mandatos eletivos e outros assessores proacuteximos desde que o Presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo em janeiro de 2019 No periacuteodo entre janeiro de 2019 e setembro de 2020 foram monitorados 449 ataques agressotildees ou declaraccedilotildees deslegiti-madoras contra comunicadores realizando seu trabalho de informar a populaccedilatildeo sobre assun-tos de interesse puacuteblico
A natureza dos ataques pode ser clas-sificada de diferentes maneiras A violaccedilatildeo mais comum identificada que representa 42 dos casos monitorados foi o uso de dis-curso estigmatizante que foram ataques em que comunicadores e veiacuteculos de miacutedia foram acusados de manipular o conteuacutedo jornaliacutestico produzido para tentar desestabilizar o governo ou deteriorar a imagem do Presidente Aqui estatildeo os casos de conteuacutedos chamados de mentirosos ou categorizados como lsquofake newsrsquo de forma geneacuterica sem que tenha sido apre-sentada qualquer evidecircncia disso bem como os momentos em que foram associados agrave par-cialidade maliciosa com uma postura poliacutetica--militante com objetivos escusos
Um outro tipo de violaccedilatildeo muito co-mum nesse conjunto de declaraccedilotildees monito-radas identificada em 38 do casos eacute a des-legitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa em que se vislumbra de forma ampla a associaccedilatildeo da imprensa e do trabalho jornaliacutestico a termos
O DISCURSO PUacuteBLICO DE AUTORIDADES E A OBRIGACcedilAtildeO DE PREVENIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
18 httpswwwgovbrmdhpt-bracesso-a-informacaoparticipacao-socialconselho-nacional-de-direitos-humanos-
cndhRecomendaon7tratamentodadoacomunicadoreserespeitoliberdadedeexpressopdf
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pejorativos e coloca em xeque a proacutepria natu-reza e importacircncia do trabalho jornaliacutestico
Aleacutem do crescente descreacutedito da po-pulaccedilatildeo nos meios de comunicaccedilatildeo e infor-maccedilatildeo causadas por esses tipos de violaccedilatildeo tanto a estigmatizaccedilatildeo quanto a deslegitima-ccedilatildeo do trabalho da imprensa criam um con-texto de desinformaccedilatildeo crescente uma vez que as informaccedilotildees trazidas ao puacuteblico pela imprensa acabam associadas a uma suposta estrateacutegia poliacutetica escusa que soacute produz in-formaccedilotildees falsas Aleacutem disso esse discurso contribui para o aumento da hostilidade social ao trabalho de jornalistas e comunicadores criando um ambiente que propicia a ocorrecircn-cia de violaccedilotildees mais graves como agressotildees fiacutesicas ameaccedilas de morte ou mesmo atenta-dos agrave vida de comunicadores
Esse cenaacuterio de incentivo ao aumento da hostilidade contra comunicadores eacute refor-ccedilado por outras violaccedilotildees monitoradas nessas declaraccedilotildees como a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador que corresponde a 23 dos casos aqui monitorados Isso acontece em si-tuaccedilotildees em que informaccedilotildees pessoais como nome imagem e ateacute contas pessoais de miacutedias sociais de jornalistas satildeo divulgadas associan-do natildeo soacute o conteuacutedo do trabalho do jornalista mas sua proacutepria identidade pessoal a caracte-riacutesticas negativas ou discriminatoacuterias
Pocircde-se observar que a exposiccedilatildeo de jornalista ou comunicador gerou quase na totalidade dos casos ataques em massa nas miacutedias sociais do mesmo Em alguns casos ocorreu vazamento de dados pessoais do jornalista eou de seus fa-miliares e amigos que por vezes tambeacutem foram alvejados por ataques nas redes Ainda eacute im-portante destacar que mesmo que a exposiccedilatildeo natildeo venha com qualquer menccedilatildeo ao exerciacutecio do trabalho jornaliacutestico haacute consequente des-qualificaccedilatildeo do trabalho do mesmo Em muitos casos - em especial na exposiccedilatildeo de mulheres jornalistas e comunicadoras - a praacutetica de ex-posiccedilatildeo esteve associada com a mobilizaccedilatildeo de conteuacutedos discriminatoacuterios como forma de natildeo somente expor mas dar um caraacuteter de in-significacircncia agrave pessoa exposta
Um dos casos emblemaacuteticos de expo-siccedilatildeo de jornalista e dos seus efeitos eacute o de Patriacutecia Campos Mello A jornalista - que jaacute ha-via sofrido ataques anteriores por suas cober-turas relacionadas agrave poliacutetica - foi exposta por Eduardo Bolsonaro durante a CPMI das Fake News quando o Deputado sugeriu que a pro-fissional teria se insinuado sexualmente para uma de suas fontes obter informaccedilotildees Na sequecircncia o Presidente Jair Bolsonaro disse em coletiva que a jornalista ldquoqueria dar o furo a qualquer custordquo Essas declaraccedilotildees geraram ataques em massa agrave profissional que teve
Graacutefico 5 ndash VIOLACcedilOtildeES NAS DECLARACcedilOtildeES DE AUTORIDADES
TOTAL449 CASOS
DISCURSO ESTIGMATIZANTE189 CASOS ~42
DESLEGITIMACcedilAtildeO DO TRABALHO DA IMPRENSA170 CASOS
~38
EXPOSICcedilAtildeO DE COMUNICADOR104 CASOS ~23
IMPEDIMENTO INFORMATIVO20 CASOS ~4
INTIMIDACcedilAtildeO INSTITUCIONAL8 CASOS
~2
MOBILIZACcedilAtildeO DE CONTEUacuteDOS DISCRIMINATOacuteRIOS8 CASOS
~2
OMISSAtildeO INSTITUCIONAL4 CASOS ~1
Alguns casos foram classificados
em mais de uma categoria
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suas redes sociais ocupadas por mensagens de cunho agressivo misoacutegino e por vezes ameaccedilador Este caso permite notar as de-correcircncias profundas da exposiccedilatildeo dos pro-fissionais da imprensa por agentes poliacuteticos cuja voz e opiniatildeo influencia e em alguma medida legitima ataques feitos por terceiros Destacamos ainda que as violecircncias que expotildeem mulheres jornalistas e comunicado-ras mobilizam discursos fundamentados nas desigualdades de gecircnero fazendo uso em grande parte das vezes de noccedilotildees sexuali-zantes e relacionadas agrave aparecircncia ou ataques a sua famiacutelia como forma de desestabilizar a profissional e deslegitimar o conteuacutedo por ela produzido
Dentre os 449 ataques registrados aproximadamente 23 (102) partiram do Presidente da Repuacuteblica que se manifestou de forma vexatoacuteria e incendiaacuteria contra a im-prensa por meio de postagens e transmissotildees ao vivo nas miacutedias sociais (60) coletivas de imprensa discursos e pronunciamentos (34) entrevistas (4) entre outros Dentre estas manifestaccedilotildees do Presidente 39 (40) apresentaram deslegitimaccedilatildeo do trabalho da imprensa Aleacutem dessas 39 (40) contaram com discurso estigmatizante sobre a miacutedia Em 13 (13) dos casos o Presidente expocircs jornalistas e comunicadores gerando ataques massivos contra estes nas redes sociais Em 12 (12) dos casos houve impedimento infor-mativo em 4 omissatildeo institucional e em 2
houve intimidaccedilatildeo institucional O presidente expressamente mobilizou conteuacutedos discrimi-natoacuterios nestes ataques em 3 dos casos
Os filhos de Jair Bolsonaro que tam-beacutem exercem mandatos eletivos e compotildeem o mesmo grupo poliacutetico figuraram como autores de quase metade (220) dos ataques Do total de violaccedilotildees registradas Eduardo Bolsonaro eacute autor de 24 Carlos Bolsonaro de 19 e Flaacutevio Bolsonaro 6 Os ministros indicados pelo presidente ainda que tenham sido exo-nerados e indicados de forma frequente figu-raram em 27 dos ataques (119)
Natildeo soacute jornalistas foram expostos in-dividualmente (23 do total de casos) por meio de acusaccedilotildees exposiccedilatildeo de fotos e de nomes - gerando em grande parte das vezes ataques virtuais em massa - como alguns veiacuteculos de comunicaccedilatildeo tambeacutem foram sistematicamente alvejados nesse pe-riacuteodo A Rede Globo e suas afiliadas foram nominalmente atacadas ao menos 114 vezes (25 dos casos) A Folha de Satildeo Paulo por sua vez teve 56 ataques registrados (12 dos casos) O jornal Estado de Satildeo Paulo foi atacado 22 vezes (5) Ao mesmo tempo ve-iacuteculos com a linha editorial mais proacutexima dos posicionamentos do Presidente foram men-cionados de forma positiva e natildeo violenta mostrando a direccedilatildeo da intervenccedilatildeo dos poliacute-ticos direcionadas aos veiacuteculos que tecircm feito uma cobertura criacutetica em relaccedilatildeo agraves accedilotildees do governo federal
Graacutefico 6 ndash AUTORES DAS VIOLACcedilOtildeES
~23PRESIDENTE JAIR BOLSONARO
102 CASOS
~27MINISTROS DO GOVERNO FEDERAL119 CASOS
~49FILHOS DO PRESIDENTE COM MANDATO ELETIVO220 CASOS
~2OUTROS8 CASOS
TOTAL449 CASOS
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Aleacutem de prevenir que violaccedilotildees aconteccedilam o Estado brasileiro tem a obrigaccedilatildeo de oferecer medidas de proteccedilatildeo a comunicadores que es-tejam em situaccedilatildeo de risco Nesse sentido o principal mecanismo criado no Brasil para ar-ticular medidas de proteccedilatildeo eacute o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal Criado em 2005 tambeacutem a partir da mobilizaccedilatildeo que se seguiu com o assassinato da missionaacuteria Dorothy Stang no Paraacute o foco do mecanismo sempre esteve no atendimento de defensores de direi-tos humanos com destaque para defensores de terra e territoacuterio Diferentemente de outros mecanismo importantes na regiatildeo como o da Colocircmbia e o do Meacutexico que haacute bastante tem-po previram o atendimento a comunicadores o mecanismo brasileiro soacute passou a incluir Co-municadores Sociais em seus escopo de aten-dimento em setembro de 2018 depois de anos de pressatildeo da sociedade civil organizada
Essa inclusatildeo no entanto tem um efeito mais simboacutelico de reconhecimento da situ-accedilatildeo de violecircncia sistemaacutetica sofrida por co-municadores jaacute que na praacutetica ela ainda natildeo se efetivou
Segundo informaccedilotildees obtidas pela ARTIGO 19 em reuniotildees com a equipe gestora do PPDDH nos quase dois anos desde que os comunicadores foram formalmente incluiacutedos como parte do programa somente dois comu-nicadores foram atendidos pela equipe federal do Programa Isso demonstra que existe um descolamento grande entre o cenaacuterio geral de hostilidade e violecircncia contra comunicadores e a atuaccedilatildeo do Programa para incidir nesse con-texto Aleacutem disso mesmo que houvesse uma inclusatildeo real de comunicadores as medidas de proteccedilatildeo jaacute oferecidas aos defensores de direitos humanos atendidos pelo programa satildeo consideradas bastante ineficientes e precaacuterias pela sociedade civil
O MECANISMO DE PROTECcedilAtildeO BRASILEIRO E A OBRIGACcedilAtildeO DO ESTADO DE PROTEGER COMUNICADORES EM SITUACcedilAtildeO DE RISCO
1920 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais histoacuterico funcionamento e criacuteticas
Em 12 de fevereiro de 2007 o Governo Fe-deral instituiu o Decreto 6044 que aprovou a Poliacutetica Nacional de Proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos (PNPDDH) e defi-niu prazo para elaboraccedilatildeo do Plano Nacional que se efetivaria apenas em novembro desse mesmo ano Tal plano deu origem ao manual de procedimentos dos programas de prote-ccedilatildeo no qual se encontram sistematizadas ldquoas formulaccedilotildees estrateacutegicas os procedimentos metodoloacutegicos e a estrutura operacional do
Programa Nacionalrdquo19 Segundo o Manual eacute objetivo do programa
[]proporcionar proteccedilatildeo e assistecircncia agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica grupo insti-tuiccedilatildeo organizaccedilatildeo ou movimento so-cial que promove protege e defende os Direitos Humanos e em funccedilatildeo de sua atuaccedilatildeo e atividades nessas circunstacircn-cias encontrar-se em situaccedilatildeo de risco e ou vulnerabilidaderdquo20
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Ao longo dos seus dez primeiros anos de exis-tecircncia o mecanismo contou somente com esse decreto firmado em 2007 para existir Desde 2009 o Projeto de Lei nordm 4575 trami-ta no Congresso para instituir o PPDDH como uma poliacutetica puacuteblica No entanto o texto se en-contra atualmente parado e sem expectativas de avanccedilos na tramitaccedilatildeo A uacuteltima accedilatildeo legis-lativa em relaccedilatildeo ao texto foi tomada em maio de 201121 Desde entatildeo vaacuterios requerimentos foram feitos para apreciaccedilatildeo do projeto inclu-sive pedindo regime de urgecircncia mas o projeto permanece parado
Em abril de 2016 em meio ao turbu-lento cenaacuterio de tramitaccedilatildeo do processo de impeachment a presidenta Dilma Rousseff assinou durante a Conferecircncia Nacional de Direitos Humanos o Decreto nordm 87242016 que trouxe mudanccedilas criacuteticas na estrutura do programa de proteccedilatildeo Em primeiro lugar o decreto restringiu o alcance do PPDDH a pessoas em situaccedilatildeo de ameaccedila Isso con-traria a resoluccedilatildeo 53144 da OEA e o proacute-prio manual de procedimentos do PPDDH elaborado pela Secretaria de Direitos Huma-nos (SDH) em parceria com a sociedade civil e outros oacutergatildeos puacuteblicos que determina que a proteccedilatildeo de defensoras e defensores deve ocorrer agrave pessoas ou grupos em situaccedilatildeo de risco e vulnerabilidade e natildeo apenas pesso-as em situaccedilatildeo de ameaccedila Aleacutem disso o de-creto tambeacutem criou o Conselho Deliberativo do PPDDH mas fixou somente a participaccedilatildeo de oacutergatildeos do Estado e excluiu a participaccedilatildeo da sociedade civil que luta desde o iniacutecio para que esse espaccedilo seja paritaacuterio Segun-do a nova composiccedilatildeo apenas dois membros do Ministeacuterio da Mulher Famiacutelia e Direitos Humanos e um membro do Ministeacuterio da Jus-ticcedila fariam parte do Conselho Deliberativo22 Recentemente gestores do Ministeacuterio da Mu-lher Famiacutelia e Direitos Humanos anunciaram
em reuniotildees da sociedade civil que preten-diam criar Grupos de Trabalho temaacuteticos que contariam com a participaccedilatildeo de organizaccedilotildees da sociedade civil Aleacutem de natildeo haver ateacute o momento um movimento concreto no sentido da criaccedilatildeo desses grupos a criaccedilatildeo deles natildeo resolve o problema de falta de participaccedilatildeo da sociedade civil no Programa jaacute que eles natildeo tem qualquer poder deliberativo e natildeo inci-dem diretamente sobre a gestatildeo do Programa onde estatildeo algumas das principais falhas ope-racionais e metodoloacutegicas Com participaccedilatildeo social toda a sociedade poderia se beneficiar com a experiecircncia teacutecnica da sociedade civil nesses temas assim como sua capilaridade no contato direto com defensores e comunicado-res em situaccedilatildeo de risco e suas comunidades Ou seja aleacutem de anti-democraacutetica esse afas-tamento limita a proacutepria eficaacutecia do Programa
Atualmente o PPDDH faz parte da estrutura do Ministeacuterios da Mulher da Famiacutelia e dos Direitos Humanos Embora a gestatildeo do mecanismo seja federal e haja uma Coordena-ccedilatildeo-Geral do Programa Nacional responsaacutevel por atender os casos em todo o territoacuterio bra-sileiro a estrutura do mecanismo foi pensada para que ele funcione tambeacutem em niacutevel esta-dual por meio de parcerias entre o governo federal os Estados e entidades da sociedade civil Nos Estados conveniados a atuaccedilatildeo do Programa ocorre por meio de equipes teacutecnicas estaduais das entidades executoras que satildeo conveniadas por meio das Secretarias de Es-tado Passados 15 anos da criaccedilatildeo do Progra-ma menos de um quarto dos Estados possuem Programas proacuteprios em atividade23 sendo que a maior parte do pais ainda eacute atendida exclusi-vamente pela equipe federal
Para o atendimento o mecanismo bra-sileiro requisita que os beneficiaacuterios tenham comprovada relaccedilatildeo com a defesa e promoccedilatildeo dos direitos humanos e que a haja nexo causal
21 httpwwwcamaragovbrproposicoesWebfichadetramitacaoidProposicao=422693
22 httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201610RPU-Defensorespdf
23 Estados com Programas ativos em 2020 MG PE CE MA PA RJ
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entre a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade e a atividade de defensor O Manual de Proce-dimentos do PPDDH entende por violaccedilatildeo que
A violaccedilatildeo caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatoacuteria agrave ativida-de pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organizaccedilatildeo e movimento social que se manifeste ain-da que indiretamente sobre familiares ou pessoas de sua convivecircncia proacutexima den-tre outras formas pela praacutetica de crimes tentados ou consumados tais como ho-miciacutedio tortura agressatildeo fiacutesica ameaccedila intimidaccedilatildeo difamaccedilatildeo prisatildeo ilegal ou arbitraacuteria falsa acusaccedilatildeo aleacutem de atenta-dos ou retaliaccedilotildees de natureza poliacutetica re-ligiosa econocircmica cultural de origem de etnia de gecircnero de orientaccedilatildeo sexual de cor e raccedila de idade dentre outras formas de discriminaccedilatildeo desqualificaccedilatildeo e crimi-nalizaccedilatildeo de sua atividade que ofenda a sua integridade fiacutesica psiacutequica ou moral a honra ou o seu patrimocircniordquo24
Dentre as diversas diretrizes do programa que podem ser consultadas da leitura do manual uma de suas principais missotildees eacute enfrentar as causas estruturantes dos conflitos Ou seja a dimensatildeo de proteccedilatildeo inclui centralmente o combate das causas que geraram a situaccedilatildeo de ameaccedila ou vulnerabilidade a que o defen-sor ou defensora de direitos humanos foi sub-metido sob pena de natildeo serem alcanccedilados os objetivos da poliacutetica
Eacute importante destacar ainda que ao contraacuterio de outros programas de proteccedilatildeo na esfera federal tal como o Programa de Proteccedilatildeo agrave Viacutetimas e Testemunhas Ameaccediladas (PROVI-TA) o PPDDH tem como tarefa prezar pela permanecircncia do defensor ou defensoras em seu territoacuterio bem como pela continuidade de suas atividades Para que isso seja alcan-ccedilado o PPDDH tem como diretriz o ldquoforta-lecimento do pacto federativo por meio da atuaccedilatildeo conjunta e articulada de todas as esferas de governo na proteccedilatildeo aos Defenso-res dos Direitos Humanos e na atuaccedilatildeo das causas que geram o estado de risco ou vul-nerabilidaderdquo25
As medidas de apoio previstas pelo Programa de Proteccedilatildeo tecircm trecircs dimensotildees atuar diretamente na seguranccedila e bem-es-tar dos defensores atendidos contribuir para promover a atuaccedilatildeo dos beneficiaacuterios na de-fesa dos direitos humanos e articular medidas que combatam as situaccedilotildees estruturais de conflito nos contextos onde esses defensores estatildeo inseridos
No entanto ao analisar casos atendi-dos pelo Programa podemos perceber que essa incidecircncia estrutural nas causas dos con-flitos que geram as violaccedilotildees nunca aconteceu ndash e natildeo haacute nenhum plano efetivo de construir medidas nesse sentido Neste contexto as me-didas que satildeo implementadas seguem sendo pouco efetivas para interromper o fluxo de vio-laccedilotildees como as contra comunicadores cuja perpetuaccedilatildeo vem sendo captada neste relatoacute-rio desde 2002
24 25 Manual de Procedimentos dos Programas de Proteccedilatildeo aos Defensores dos Direitos Humanos Secretaria
Especial de Direitos Humanos Brasiacutelia 2017 Paacutegina 13
Participaccedilatildeo da Sociedade Civil
A sociedade civil acompanha o mecanismo desde sua origem contribuindo inclusive para a sua criaccedilatildeo Nos dez primeiros anos de exis-tecircncia do mecanismo cinco organizaccedilotildees da sociedade civil participaram formalmente
da composiccedilatildeo da Coordenaccedilatildeo Nacional do mecanismo um espaccedilo paritaacuterio formado por oacutergatildeos puacuteblicos e organizaccedilotildees da sociedade civil que acompanhava e avaliava o desempe-nho do Programa de Proteccedilatildeo
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O uacuteltimo decreto que institui o desenho institu-cional atual do programa natildeo conta mais com a participaccedilatildeo da sociedade civil Na praacutetica esse decreto acabou com a coordenaccedilatildeo na-cional do PPDDH Mesmo diante do apelo de mais de 60 organizaccedilotildees a entatildeo Secretaria de Direitos Humanos natildeo corrigiu esse grave erro antes do afastamento da ex-Presidenta Dilma Rousseff Atualmente a sociedade civil tem feito incidecircncias por meio do Conselho Nacio-nal de Direitos Humanos buscando a garantia de continuidade dessa poliacutetica puacuteblica
A Sociedade Civil e os movimentos sociais articulados pelo Comitecirc Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) do qual a ARTIGO 19 faz parte sem-pre acompanharam de perto a execuccedilatildeo da poliacutetica encaminhando anualmente recomen-daccedilotildees ao governo federal para seu aprimora-mento26 Inclusive a coordenaccedilatildeo nacional do PPDDH conforme mencionado no item ante-rior era composta por cinco organizaccedilotildees da sociedade civil todas integrantes do CBDDH27 O Comitecirc destaca como principais problemas do mecanismo
1
A dificuldade na tramitaccedilatildeo para a aprovaccedilatildeo do PL 45752009 que regulamenta o PPDDH
2
A falta de implementaccedilatildeo do Plano Nacional de Proteccedilatildeo agraves Defensoras e Defensores
3
A necessidade de ampliaccedilatildeo da estrutura e do orccedilamento do PPDDH no acircmbito da SDH a fim de garantir a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos enquanto poliacutetica de Estado
4
A necessidade de criaccedilatildeo no acircmbito do PPDDH de um mecanismo de articulaccedilatildeo entre os diversos oacutergatildeos de Estado responsaacuteveis pelo enfrentamento das causas estruturais que geram as violaccedilotildees no contexto em que os defensores e defensoras estatildeo inseridos
5
A necessidade de implantaccedilatildeo de um plano de trabalho junto agraves instituiccedilotildees do sistema de Justiccedila e de seguranccedila puacuteblica voltado para o monitoramento e acompanhamento das accedilotildees judiciais e de inqueacuteritos policiais que envolvam defensoras e defensores seja para a apuraccedilatildeo das violaccedilotildees e ameaccedilas seja para garantir assessoria juriacutedica para os casos de criminalizaccedilatildeo da sua luta em defesa dos direitos humanos
6
A necessidade de ampliaccedilatildeo e desburocratizaccedilatildeo na parceria nos Estados federados para aleacutem da celebraccedilatildeo de convecircnios e buscar novas formas de execuccedilatildeo da poliacutetica de proteccedilatildeo agraves defensoras e os defensores
7
A necessidade de aperfeiccediloamento da metodologia de proteccedilatildeo no sentido de atender a grupos e comunidades pelas quais lutam as defensoras e os defensores em especial os povos e comunidades tradicionais
26 Exemplo de algumas cartas enviadas pelo comitecirc DDH com recomendaccedilotildees ao estado brasileira podem ser
acessadas nos seguintes links httpwwwglobalorgbrwp-contentuploads201603Carta
_comit--_05_2014pdf httpswwwecodebatecombr20121217carta-do-comite-brasileiro-de
-defensorases-de-direitos-humanos-a-ministra-da-secretaria-de-direitos-humanos httpwwwinescorgbr
noticiasnoticias-gerais2010novembrosociedade-civil-apresenta-recomendacoes-para-programa-de-protecao
-aos-defensores-as-de-dh
27 Terra de Direitos Justiccedila Global Movimento Nacional dos Direitos Humanos Comissatildeo Pastoral da Terra e
Conselho Indigenista Missionaacuterio
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8
A necessidade de articulaccedilatildeo de poliacuteticas sociais que atendam a dimensatildeo da proteccedilatildeo social das defensoras e dos defensores de direitos humanos inseridos no programa como assistecircncia meacutedica psicoloacutegica e previdenciaacuteria por exemplo
9
A necessidade de criaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo de unidades policiais especializadas para a proteccedilatildeo das defensoras e dos defensores de direitos humanos bem como oacutergatildeos e procedimentos especializados para o recebimento e processamento de denuacutencias apresentadas pelas defensoras e defensores de direitos humanos
10
A necessidade de criaccedilatildeo em caraacuteter emergencial um mecanismo do PPDDH especiacutefico para atender a demanda dos Estados da Amazocircnia e de Mato Grosso do Sul envolvendo oacutergatildeos nacionais e regionais
11
A necessidade de criaccedilatildeo de metodologia especiacutefica para atuar com defensoras de direitos humanos incorporando a perspectiva de gecircnero
12
A necessidade de construir uma metodologia especiacutefica para atender comunicadoras e comunicadores de modo a compreender as especificidades das violaccedilotildees que acontecem no contexto das violaccedilotildees ao direito agrave liberdade de expressatildeo
O COMBATE Agrave IMPUNIDADE E A OBRIGACcedilAtildeO DE INVESTIGAR PROCESSAR E PUNIR VIOLACcedilOtildeES CONTRA COMUNICADORES
Uma obrigaccedilatildeo fundamental do Estado eacute a de investigar processar e punir violaccedilotildees contra comunicadores Essa dimensatildeo eacute fundamen-tal para combater um dos principais aspectos que influenciam na reproduccedilatildeo do cenaacuterio de violaccedilotildees a impunidade em crimes contra co-municadores
A ARTIGO 19 em 2016 e 2018 publi-cou relatoacuterios28 especiacuteficos sobre a temaacutetica da impunidade nos casos de homiciacutedio con-tra jornalistas e comunicadores de forma que estes esforccedilos satildeo meios de atualizar dados conceitos e recomendaccedilotildees referentes a esse tipo de violaccedilatildeo agraves liberdades de expressatildeo e de imprensa Em primeiro lugar cabe diferen-ciar os conceitos de violaccedilatildeo agrave liberdade de
expressatildeo e execuccedilatildeo arbitraacuteria do comunica-dor O primeiro abrange toda accedilatildeo estatal ou natildeo que tenha interferecircncia na livre circulaccedilatildeo e disseminaccedilatildeo de conteuacutedos produzidos por estes profissionais A execuccedilatildeo por sua vez eacute o homiciacutedio doloso qualificado conforme tipi-ficado pela legislaccedilatildeo brasileira comumente praticado por motivo torpe e mediante embos-cada motivado por opiniotildees ou criacuteticas nega-tivas se tratando de crimes cometidos contra comunicadores Esta uacuteltima eacute tambeacutem uma forma de violaccedilatildeo agrave liberdade de expressatildeo em sua forma mais intensa - na qual se retira a vida e consequentemente a possibilidade de falar denunciar e criticar dos comunicadores Entendemos que a execuccedilatildeo arbitraacuteria de co-
28 httpsartigo19orgwp-contentblogsdir24files201811O-Ciclo-do-Silecircncio-Relatoacuterio-2018pdf
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municadores tem papel central no que tange a violaccedilatildeo e a restriccedilatildeo agrave liberdade de expres-satildeo de forma ampla Isso porque a execuccedilatildeo motivada pela publicaccedilatildeo de ideias opiniotildees e informaccedilotildees cria ambiente de inseguranccedila para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como um todo transcendendo a pessoa que foi alvejada e alcanccedilando comunicadores de todo o paiacutes a partir do medo A impunidade nesse contexto importa na intensificaccedilatildeo dessa inseguranccedila
considerando que natildeo somente o comunica-dor em questatildeo perdeu sua vida mas tambeacutem sua famiacutelia amigos e colegas de profissatildeo natildeo receberam qualquer resposta satisfatoacuteria do poder puacuteblico A morosidade do poder puacuteblico em oferecer respostas sobre a morte de jorna-listas e comunicadores bem como de oferecer proteccedilatildeo para aqueles ameaccedilados ou em risco implica assim no aprofundamento das viola-ccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo
Os anos de 2019 e 2020 atualizaccedilotildees emblemaacuteticas e novos casos
No periacuteodo de tempo observado nesse rela-toacuterio haacute que se destacar alguns casos rela-cionados agrave investigaccedilotildees de violecircncia contra jornalistas e impunidade sendo necessaacuterio atualizar o andamento de algumas investiga-ccedilotildees e processos relativos a execuccedilotildees come-tidas nos anos anteriores
Em maio de 2019 foi realizado novo julgamento de acusados pelo homiciacutedio de Manoel Leal de Oliveira 21 anos apoacutes sua mor-te O jornalista e proprietaacuterio do veiacuteculo lsquoA Re-giatildeorsquo foi assassinado na porta de sua casa em Itabuna (BA) em janeiro de 1998 As investiga-ccedilotildees do homiciacutedio do jornalista foram retoma-das em 2010 apoacutes o filho do jornalista Marcelo Leal e Unidade de Resposta Raacutepida (URR) da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) apresentarem o caso agrave Comissatildeo Interameri-cana de Direitos Humanos (CIDH) A Comissatildeo recomendou o pagamento de indenizaccedilatildeo agrave fa-miacutelia da viacutetima pelo estado e o restabelecimen-to das investigaccedilotildees A absolviccedilatildeo dos acusa-dos pelo Tribunal do Juacuteri em 2005 foi anulada apoacutes requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico sob a alegaccedilatildeo de que os jurados tinham conexotildees que prejudicaram sua imparcialidade No novo julgamento o Tribunal condenou Marcelo Sar-mento a 6 anos de prisatildeo pelo crime
O ano de 2019 tambeacutem foi marcado pelos julgamentos dos acusados pelo homiciacute-dio do radialista Jefferson Pureza morto em 17 de janeiro de 2018 em frente a sua residecircn-
cia em Edealina (GO) Em 04 de outubro de 2019 Leandro Cintra da Silva foi condenado a 14 anos de reclusatildeo pelo envolvimento no crime Natildeo obstante em 09 de dezembro de 2019 o Tribunal do Juacuteri absolveu outros dois acusados o ex-vereador Joseacute Eduardo Alves da Silva acusado de ser o mandante do assas-sinato e o caseiro Marcelo Rodrigues dos San-tos foram condenados apenas pela corrupccedilatildeo dos menores que praticaram o crime Os me-nores envolvidos jaacute cumpriram as respectivas medidas educativas
Em 17 de dezembro de 2019 o Juiz Jesseir Coelho de Alcacircntara da 3ordf Vara Crimi-nal dos Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribu-nal do Juacuteri pediu afastamento da presidecircncia do julgamento dos acusados do assassinato do radialista Valeacuterio Luiz O radialista foi assassi-nado em 05 de julho de 2012 apoacutes sair da raacutedio onde trabalhava em Goiacircnia (GO) Alegando motivos de foro iacutentimo o magistrado deu a en-tender que seu afastamento decorria de empe-cilhos colocados pelo proacuteprio Tribunal de Jus-ticcedila de Goiaacutes para a realizaccedilatildeo do julgamento Apoacutes o afastamento do Juiz o julgamento foi adiado por conta da pandemia de Covid-19
Jaacute em 2020 tivemos atualizaccedilotildees no caso do radialista Jairo de Sousa que foi assas-sinado no dia 21 de junho de 2018 ao chegar na raacutedio em que trabalhava em Braganccedila (PA) No dia 12 de setembro de 2020 Madson Aviz de Melo suspeito de envolvimento no homiciacute-
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dio foi preso na cidade de Boa Vista (RR) O acu-sado estava foragido com trecircs mandados de pri-satildeo preventivos decretados contra ele - um deles relativo ao assassinato do radialista O Ministeacuterio Puacuteblico do Paraacute ofereceu denuacutencia contra dez pessoas aleacutem de Madson por envolvimento no crime sendo que o acusado de ser mandante do assassinato eacute vereador Cesar Monteiro Gonccedilal-ves a quem o radialista tecia criacuteticas e denuacuten-cias sobre desvio de verbas puacuteblicas Este uacuteltimo teve sua prisatildeo preventiva revogada no primeiro semestre de 2019 a partir de habeas corpus
Em 22 de setembro de 2020 Elias Ma-luco condenado a 28 anos e 9 meses de prisatildeo pela morte de Tim Lopes foi encontrado enfor-cado na cela em que cumpria a pena O jornalis-ta foi assassinado em 02 de junho de 2002 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) apoacutes ser seques-trado e torturado por suspeitos de envolvimento com o traacutefico de drogas durante a realizaccedilatildeo de cobertura sobre traacutefico de drogas e abuso sexual de adolescentes na Vila Cruzeiro
Aleacutem das atualizaccedilotildees quanto agraves execu-ccedilotildees de anos anteriores eacute de suma importacircncia destacar novamente os casos de homiciacutedio cometidos nos anos de 2019 e 2020 de forma a indicar agraves autoridades responsaacuteveis a necessi-dade de que se apure com maior detalhamento e atenccedilatildeo os acontecidos e no mesmo sentido que o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo seja levado em consideraccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime
Em 2019 apenas o caso de Romaacuterio Barros foi registrado como homiciacutedio em que pode se vislumbrar a relaccedilatildeo entre o exerciacutecio da profissatildeo e a violecircncia No dia 19 de junho de
2019 o comunicador foi morto em frente a sua casa em Maricaacute (RJ) Passado mais de um ano da morte natildeo haacute respostas sobre o crime O caso segue sob a responsabilidade da Delegacia de Divisatildeo de Homiciacutedios de Niteroacutei Itaboraiacute Satildeo Gonccedilalo e Maricaacute (DHNISG) O inqueacuterito ainda natildeo apresentou resultados significativos e segue em segredo de justiccedila
O caso de Lourenccedilo Veras assassinado em sua casa na fronteira do Brasil com o Para-guai em janeiro de 2020 eacute emblemaacutetico no que tange a impunidade Ainda que tenha sido exe-cutado fora do territoacuterio brasileiro por mais de uma vez o jornalista foi ameaccedilado antes de sua morte e o governo brasileiro falhou em lhe ofere-cer qualquer tipo de proteccedilatildeo ainda que reque-rida A investigaccedilatildeo eacute conduzida pelas autorida-des paraguaias que identificaram e prenderam o aparente mandante da execuccedilatildeo Waldemar Pereira Rivas - e ainda ofereceram proteccedilatildeo para o jornalista antes de sua morte de forma oposta agraves autoridades brasileiras
Cabe mencionar por uacuteltimo que de 2018 para 2019 o Brasil subiu de posiccedilatildeo no ranking do ldquoIacutendice Global de Impunidaderdquo pro-duzido anualmente pelo Comitecirc de Proteccedilatildeo a Jornalistas (CPJ) O ranking analisa os andamen-tos de investigaccedilotildees de execuccedilotildees de comunica-dores no mundo todo Em 2019 o paiacutes passou a ocupar a nona posiccedilatildeo do iacutendice de impunida-de demonstrando que natildeo haacute melhoria no que tange o processamento e investigaccedilatildeo devida dos crimes graves cometidos contra a categoria importando em ampla agressatildeo agrave liberdade de expressatildeo no Brasil
Desafio do periacuteodo perfil das viacutetimas e exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime
Um ponto a ser explorado e melhor delimitado eacute quanto ao perfil das viacutetimas que exercem a comunicaccedilatildeo e a consequente dificuldade de aprofundar o real impacto do exerciacutecio da co-municaccedilatildeo como motivaccedilatildeo do crime Nos anos de 2018 e 2019 - marcados pela conjuntura de disputas poliacuteticas e eleitorais no paiacutes atravessa-das pelos novos usos da comunicaccedilatildeo atraveacutes
especialmente das redes sociais - por mais de uma vez o perfil de comunicadores assassina-dos coaduna a atuaccedilatildeo no meio jornaliacutestico agrave atuaccedilatildeo poliacutetica Por meio de preacute candidaturas candidaturas e mandatos alguns comunicado-res tiveram suas atuaccedilotildees profissionais preacutevias no campo da comunicaccedilatildeo confundidas com a trajetoacuteria de construccedilatildeo poliacutetica daquele sujeito
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As apuraccedilotildees desses casos demonstraram a di-ficuldade dos familiares e colegas em identificar se a violecircncia seria decorrente do exerciacutecio da comunicaccedilatildeo ou da atuaccedilatildeo e desempenho da viacutetima na poliacutetica Estes assim restaram preju-dicados na inserccedilatildeo neste relatoacuterio consideran-do que natildeo foi possiacutevel delimitar com certeza o quanto tal violaccedilatildeo esteve relacionada agrave liberda-de de expressatildeo e a sua restriccedilatildeo
Portanto em esforccedilos futuros de con-ceitualizaccedilatildeo monitoramento e apuraccedilatildeo eacute pre-ciso delimitar estas esferas e o impacto de tais mortes na inseguranccedila dos profissionais da co-municaccedilatildeo Aqui se considerou que a violaccedilatildeo teve relaccedilatildeo com o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo quando este fato foi confirmado por familiares
e colegas da viacutetima A incerteza quanto a este ponto portanto afastou alguns casos da inclu-satildeo neste relatoacuterio Natildeo obstante eacute preciso que as autoridades responsaacuteveis pela investigaccedilatildeo tenham o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como linha investigativa de forma a descartar essa possiacutevel motivaccedilatildeo a priori
No mesmo sentido haacute que se refletir sobre as noccedilotildees de lsquocomunicadorrsquo e o impacto da vida poliacutetica destes no exerciacutecio da comu-nicaccedilatildeo assim como o contraacuterio A a confusatildeo de motivaccedilotildees - muitas vezes beneacuteficas ao autor do crime pelo prejuiacutezo das investigaccedilotildees - satildeo desafios que devem ser enfrentados em observaccedilotildees futuras bem como na atuaccedilatildeo das instacircncias investigativas do Estado
O PAPEL DAS AUTORIDADES PUacuteBLICAS NO COMBATE Agrave IMPUNIDADE
Prevenccedilatildeo
Conforme apresentado neste capiacutetulo o Estado tem a obrigaccedilatildeo de prevenir violaccedilotildees Aleacutem dos elementos de prevenccedilatildeo jaacute apresentados haacute um outro bastante importante previsto nos padrotildees internacionais o combate agrave impunidade Assim em primeiro lugar eacute preciso que se leve em conta com mais seriedade as ameaccedilas de morte tenta-tivas de assassinato e outras formas de violecircncia cometidas contra os profissionais do campo da comunicaccedilatildeo
Em geral ano apoacutes ano as apuraccedilotildees de graves violecircncias demonstram a falta de respos-tas efetivas das autoridades para garantir a pro-teccedilatildeo dos comunicadores ameaccedilados restando a estes somente a possibilidade de contar com formas particulares e individuais de proteccedilatildeo - como por exemplo a contrataccedilatildeo de seguranccedila pessoal A inaccedilatildeo do Estado em garantir a segu-ranccedila destes por si soacute fere o direito de liberdade de expressatildeo e de imprensa considerando que a atuaccedilatildeo dos profissionais ameaccedilados muitas vezes eacute interrompida ou radicalmente modifica-
da como forma de se proteger O sentimento de inseguranccedila transcende a figura da viacutetima cau-sando impactos no exerciacutecio da profissatildeo de ou-tros jornalistas e comunicadores e portanto no direito da populaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo
Ao longo do anos foi possiacutevel verificar que na maior parte dos casos de homiciacutedio ha-viam violaccedilotildees anteriores como ameaccedilas de morte e tentativas de assassinato E foi justa-mente a falta de uma resposta efetiva a essas violaccedilotildees que permitiu que elas se intensificas-sem ateacute a mais extrema o homiciacutedio
O livre exerciacutecio da comunicaccedilatildeo tam-beacutem eacute abalado pela omissatildeo do Estado quando se consideram outras esferas de vulnerabilida-de nas quais o profissional estaacute inserido Isso porque a necessidade de se procurar formas al-ternativas de proteccedilatildeo requer a mobilizaccedilatildeo de recursos financeiros e humanos A falta de re-cursos pessoais e a falta de resposta do Estado dessa forma implicam em total fragilidade dos profissionais frente aos seus agressores
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Por uacuteltimo a carecircncia de atuaccedilatildeo do Estado no acircmbito da prevenccedilatildeo a partir da falta de respos-tas efetivas para inibiccedilatildeo de violecircncias futuras implica em cada vez maior subnotificaccedilatildeo de casos de violecircncia cometidos contra jornalistas e comunicadores Isso porque os proacuteprios pro-fissionais com o passar dos anos sem respos-tas passaram a naturalizar a violecircncia sofrida entendendo que ela natildeo seria de tanto risco ou importacircncia ou ainda que natildeo haveriam efeitos positivos em acionar as autoridades conside-
rando que estas falham em se mobilizar para ga-rantir proteccedilatildeo ou mesmo satildeo em muitos casos os agentes das violaccedilotildees
Em uma minoria dos casos foi possiacutevel identificar bons resultados a partir de respostas concretas e incisivas fornecidas pelas autorida-des A exceccedilatildeo entretanto natildeo implica em efei-tos positivos para a categoria de forma ampla jaacute estando consolidada a noccedilatildeo de que as au-toridades satildeo ineficientes em oferecer proteccedilatildeo para jornalistas e comunicadores ameaccedilados
Pressatildeo puacuteblica e acesso agrave informaccedilatildeo
Investigaccedilatildeo
Uma vez ocorrida a execuccedilatildeo de jornalistas e comunicadores eacute preciso que as autoridades adotem posturas proativas para dar respostas sobre a violaccedilatildeo apaziguando sentimentos de injusticcedila de sujeitos proacuteximos agrave viacutetima e a sensa-ccedilatildeo de inseguranccedila e impunidade experienciada pela categoria
Anualmente verificamos o despreparo das forccedilas policiais brasileiras para investigar os homiciacutedios contra comunicadores investigaccedilotildees lentas ainda que com a existecircncia de evidecircncias concretas sobre o crime falta de infraestrutura e abandono da hipoacutetese de motivaccedilatildeo relacionada ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo satildeo algumas falhas que pudemos identificar A falta de protocolo de como proceder em tais crimes eacute evidenciada pe-las diferentes respostas e formas de conduccedilatildeo da
investigaccedilatildeo nos mais diversos contextos do paiacutes Um ponto central de desigualdade considerando os diferentes Estados e regiotildees eacute o acompanha-mento das investigaccedilotildees pelo Ministeacuterio Puacuteblico conforme apresentado em relatoacuterios anteriores
Nesse sentido depois anos de incidecircn-cia da sociedade civil sobre o Ministeacuterio Puacuteblico em maio de 2018 foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico uma proposta de recomendaccedilatildeo29 que orienta promotores do paiacutes inteiro sobre procedimentos para tornar as investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores mais ceacuteleres e efetivas A proposta fundamen-tal no avanccedilo do combate agrave impunidade nesses crimes ainda natildeo foi aprovada pelo Conselho mesmo passados mais de dois anos desde sua apresentaccedilatildeo
Considerando que toda sociedade sofre os efeitos da impunidade - seja pela falta de responsabiliza-ccedilatildeo e pelo sentimento de injusticcedila seja por seus efeitos no trabalho jornaliacutestico e na circulaccedilatildeo de informaccedilotildees as respostas sobre as investigaccedilotildees nos casos de jornalistas e comunicadores devem ser oferecidas a populaccedilatildeo como um todo
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Ainda que seja compreensiacutevel a existecircncia de mecanismos como o ldquosegredo de justiccedilardquo nos ca-sos considerados sigilosos e que seja importante tomar cuidado para que natildeo haja o vazamento de informaccedilotildees pessoais de investigados o que pode ferir o direito agrave presunccedilatildeo de inocecircncia as autoridades ainda devem dar alguma resposta
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mesmo que geneacuterica sobre o contexto do crime e o andamento das investigaccedilotildees Os proacuteprios padrotildees internacionais aqui apresentados con-sideram a participaccedilatildeo e o acompanhamento do processo pela viacutetima ou seus familiares um direito essencial Eacute extremamente importante portanto o oferecimento de informaccedilotildees so-
bre o andamento da investigaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico Entretanto ao tentar realizar as apuraccedilotildees dos casos graves apresentados neste relatoacuterio foi possiacutevel verificar a sistemaacutetica falta de respostas - tanto para os colegas e familiares quanto para as organizaccedilotildees e sindicatos que buscam mais informaccedilotildees sobre o ocorrido
Boas praacuteticas investigativas
A partir da anaacutelise sobre impunidade que a ARTIGO 19 vem realizando em vaacuterios relatoacuterios ao longo dos uacuteltimos anos eacute possiacutevel elencar algumas boas praacuteticas investigativas que contri-buem para o combate agrave impunidade Essas boas praacuteticas satildeo em grande medida informadas pela anaacutelise de casos especiacuteficos de homiciacutedio de comunicadores nos uacuteltimos anos e particu-larmente de pontos identificados como barrei-ras centrais para o bom andamento das investi-gaccedilotildees Essas boas praacuteticas seriam
1
Raacutepida resposta policial no momento da ocorrecircncia com presenccedila no local do crime garantindo a integridade das provas e testemunhas
2
Empenho das autoridades evitando a morosidade entre os atos juriacutedicos e diligecircncias necessaacuterios para a investigaccedilatildeo
3
Engajamento de especialistas e peritos para o maior detalhamento das condiccedilotildees do crime bem como de suas possiacuteveis motivaccedilotildees
4
Atenccedilatildeo ao exerciacutecio da comunicaccedilatildeo como possiacutevel motivaccedilatildeo do crime com a investigaccedilatildeo pautada tambeacutem nos conteuacutedos recentes e de maior polecircmica produzidos pela viacutetima
5
Baixa rotatividade de autoridades uma vez evidenciado em estudos anteriores que a maior parte dos casos em que houve resoluccedilatildeo a investigaccedilatildeo foi conduzida pela mesma autoridade do comeccedilo ao fim
6
Garantia da imparcialidade das autoridades responsaacuteveis em especial nas violecircncias aparentemente relativas a conteuacutedos de denuacutencia sobre as forccedilas policiais e poliacuteticas locais
7
Acompanhamento ativo do Ministeacuterio Puacuteblico inclusive prezando e fiscalizando o ponto anterior
8
Atenccedilatildeo ao punitivismo e a busca pelos responsaacuteveis de forma isenta garantindo a celeridade da investigaccedilatildeo e do julgamento de forma que natildeo se estendam possiacuteveis periacuteodos de prisatildeo preventiva dos suspeitos
9
Oferecimento de respostas de proteccedilatildeo aos jornalistas ameaccedilados instruindo os profissionais inclusive quanto agrave possibilidade de se inscreverem no PPDDH bem como outros programas de proteccedilatildeo disponiacuteveis
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CAPIacuteTULO 7
CONCLUSOtildeES
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Com base em todos os diferentes tipos e as-pectos das violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo que analisamos neste relatoacuterio eacute evidente que o desafio de enfrentamento eacute enorme e com-plexo Mais do que isso esse desafio cresce com a conjunccedilatildeo de violaccedilotildees praticadas haacute deacutecadas que se perpetuam como as graves violaccedilotildees aqui apresentadas (homiciacutedios ten-tativas de assassinato e ameaccedilas de morte) a um leque de violaccedilotildees que estatildeo emergindo nos uacuteltimos anos como ataques digitais expo-siccedilatildeo puacuteblica de dados pessoais ou uma estra-teacutegia sistemaacutetica de articular discurso de oacutedio e uma induacutestria de desinformaccedilatildeo chegando aos mais altos postos da Repuacuteblica
Assim ainda que tracemos recomen-daccedilotildees de accedilotildees e de boas praacuteticas a cons-tante postura de membros do Governo Fe-deral de promover violaccedilotildees e desqualificar denuacutencias feitas por comunicadores importa na naturalizaccedilatildeo e banalizaccedilatildeo da violecircncia contra esses profissionais Isso soacute contribui para o aumento da hostilidade social ao tra-balho desses comunicadores aumentando sua inseguranccedila Aleacutem disso tambeacutem parece impactar no trabalho das autoridades inves-tigativas que falham em inserir o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo nas linhas investigativas e em oferecer respostas sobre o crime agraves famiacute-lias aos colegas das viacutetimas e agrave sociedade
aumentando ainda mais o cenaacuterio de com-pleta impunidade Ou seja ao inveacutes de am-pliar a seguranccedila e o incentivo a pluralidade de vozes na miacutedia estamos caminhando no sentido contraacuterio mdash com violaccedilotildees atraves-sando diferentes contextos de exerciacutecio da comunicaccedilatildeo
No limite a pergunta de fundo que nos orienta nas analises aqui apresentadas eacute em que medida a sistematicidade desse conjunto complexo de violaccedilotildees estaacute se consolidando e gerando alguma forma ampla de censura no paiacutes Infelizmente as evidecircncias apresentadas neste relatoacuterio indicam que essa censura mais ou menos formal estaacute avanccedilando e eacute hoje uma das tendecircncias que visualizamos no cenaacuterio poliacutetico e social do paiacutes
A promoccedilatildeo de um ambiente seguro para o exerciacutecio da comunicaccedilatildeo e da liberda-de de expressatildeo depende portanto da articu-laccedilatildeo das diversas esferas do poder puacuteblico tanto por meio de accedilotildees concretas de preven-ccedilatildeo proteccedilatildeo e combate agrave impunidade como por meio da legitimaccedilatildeo das demandas de comunicadores e da sociedade civil por segu-ranccedila e apoio no exerciacutecio de uma atividade que tem uma funccedilatildeo social primordial a ga-rantia do livre fluxo de informaccedilatildeo um dos pi-lares de qualquer sociedade que se pretenda democraacutetica livre e justa
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RECOMENDACcedilOtildeES
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AO GOVERNO FEDERAL
1
Autoridades federais devem seguir os padrotildees internacionais e as recomendaccedilotildees do Conselho Nacional de Direitos Humanos e se abster de fazer declaraccedilotildees puacuteblicas que constranjam o trabalho de comunicadores ou incentivem que ataques sejam realizados
2
Retomada da participaccedilatildeo da sociedade civil no Conselho Deliberativo do Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores Sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) organizando a estrutura de participaccedilatildeo social do Programa segundo as diretrizes recomendadas pela sociedade civil
3 Promoccedilatildeo da divulgaccedilatildeo do PPDDH de forma especiacutefica para comunicadoras e comunicadores
4
Revisatildeo das metodologias de proteccedilatildeo do PPDDH das equipes federais e estaduais considerando as especificidades dos comunicadores e comunicadoras e com participaccedilatildeo social efetiva nessa revisatildeo incluindo a contribuiccedilatildeo de comunicadoras e comunicadores
5
Desenvolver de forma constante estudos que visem identificar as causas e os focos principais da violecircncia contra comunicadores e elaborar recomendaccedilotildees a diferentes instacircncias governamentais para atuaccedilatildeo direta e estrateacutegica sobre tais causas e focos
6
Treinar funcionaacuterios e agentes puacuteblicos incluindo aqueles que trabalham para o cumprimento das leis sobre como oferecer uma resposta raacutepida e efetiva quando um comunicador eacute ameaccedilado e sobre qual eacute o procedimento adequado para encaminhar solicitaccedilotildees de medidas protetivas
7 Articular autoridades locais em todos os estados para que possam responder de maneira mais raacutepida a emergecircncias de seguranccedila de comunicadores
8 Incentivar as empresas jornaliacutesticas a oferecerem treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
9
Facilitar o trabalho de organizaccedilotildees da sociedade civil e de miacutedia que acompanham questotildees referentes aos direitos humanos reconhecendo a importacircncia desse trabalho como parte do processo de combate agraves violaccedilotildees e priorizando a transparecircncia nas relaccedilotildees com essas organizaccedilotildees para que elas possas acompanhar as iniciativas do Estado no combate a violecircncia contra comunicadores
10 Facilitar a vinda de Relatores Especiais de organismos internacionais para acompanharem a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil
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AO MINISTEacuteRIO PUacuteBLICO
1
Implementaccedilatildeo plena da recomendaccedilatildeo que prevecirc procedimentos especiacuteficos para dar celeridade e efetividade a investigaccedilotildees de crimes contra comunicadores apoacutes aprovaccedilatildeo pelo Conselho Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico
2
Cumprimento de sua prerrogativa constitucional de controle externo da atividade policial tanto para evitar o comportamento abusivo de policiais contra comunicadores em certos contextos como durante a cobertura de protestos sociais ou de abusos em favelas e periferias quanto para acompanhar a qualidade do inqueacuterito policial em crimes contra comunicadores desde o iniacutecio
3
Produccedilatildeo constante de informaccedilotildees puacuteblicas e sistematizadas sobre a situaccedilatildeo de casos de homiciacutedios de comunicadores no sistema de justiccedila nos moldes do relatoacuterio ldquoViolecircncia contra comunicadores no Brasilrdquo30 publicado em 2019 pelo CNMP
AO CONGRESSO NACIONAL
1
Aprovaccedilatildeo de marco legal que crie formalmente o Programa de Proteccedilatildeo a Defensores de Direitos Humanos Comunicadores sociais e Defensores Ambientais (PPDDH) seguindo os paracircmetros estabelecidos pelo padrotildees internacionais de direitos humanos e as recomendaccedilotildees e boas praacuteticas propostas pela sociedade civil inclusive com a determinaccedilatildeo de destinaccedilatildeo especiacutefica de recursos aos programas estaduais por meio da aprovaccedilatildeo do Projeto de Lei nordm 45752009
2 Fiscalizar a atuaccedilatildeo do poder executivo no cumprimento das obrigaccedilotildees de prevenir proteger e punir violaccedilotildees contra comunicadores e informar a sociedade da situaccedilatildeo por meio de audiecircncias puacuteblicas e outros procedimentos legislativos
30 httpswwwcnmpmpbrportalimagesPublicacoesdocumentos2019Violencia-contra-comunicadores
-no-Brasil-VERSAO-FINAL-pdf
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AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES INTERGOVERNAMENTAIS E Agrave COMUNIDADE INTERNACIONAL
1 Priorizar a proteccedilatildeo de comunicadores como uma parte de suas preocupaccedilotildees a respeito dos direitos humanos nas respectivas agendas
2
Auxiliar o Brasil a cumprir com suas obrigaccedilotildees internacionais sobre direitos humanos de acordo com a legislaccedilatildeo internacional incluindo o acompanhamento da implementaccedilatildeo de decisotildees relevantes e julgamentos de organismos internacionais de direitos humanos como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Comitecirc de Direitos Humanos das Naccedilotildees Unidas
3 Reforccedilar recomendaccedilotildees especiacuteficas sobre proteccedilatildeo a comunicadores e monitorar seu cumprimento junto ao Estado brasileiro por meio de mecanismos como a Revisatildeo Perioacutedica Universal
4 Fomentar a cooperaccedilatildeo internacional entre Estados no acircmbito de seguranccedila de comunicadores especialmente em situaccedilotildees de conflitos fronteiriccedilos
5 Comprometer-se a produzir relatoacuterios e informes temaacuteticos sobre a situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo que incluam informaccedilotildees atualizadas e detalhadas sobre o Brasil
6 Impulsionar que representantes de Relatorias Especiais realizem missotildees oficiais ao paiacutes
AgraveS ORGANIZACcedilOtildeES DA SOCIEDADE CIVIL E DE MIacuteDIA
1 Produzir dados consolidados sobre o tema e divulgar esse trabalho para que ele fortaleccedila outras iniciativas de entendimento e combate do problema nacional e internacionalmente
2 Dar visibilidade agraves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores de modo a contribuir para que a sociedade e o Estado tomem ciecircncia dos casos em tempo real
3 Para as organizaccedilotildees de miacutedia oferecer treinamentos de seguranccedila e autoproteccedilatildeo aleacutem de equipamentos seguros aos profissionais de comunicaccedilatildeo empregados ou freelancers
4 Continuar a monitorar a situaccedilatildeo da proteccedilatildeo dos comunicadores bem como da situaccedilatildeo da liberdade de expressatildeo no Brasil almejando que seus esforccedilos impulsionem o combate agraves violaccedilotildees
5 Acompanhar o andamento dos casos de crimes contra comunicadores cobrando informaccedilotildees oficiais das autoridades sobre as investigaccedilotildees
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CAPIacuteTULO 9
NOTA METODOLOacuteGICA
A ARTIGO 19 define a violaccedilatildeo ao direito agrave liberdade de expressatildeo como toda accedilatildeo por parte do Estado ou ator natildeo estatal que inter-fira de maneira direta ou indireta na livre cir-culaccedilatildeo de ideias opiniotildees ou informaccedilotildees A omissatildeo por parte do Estado a essas accedilotildees tambeacutem eacute considerada uma violaccedilatildeo agrave liberda-de de expressatildeo
O relatoacuterio se dedica aos casos sofridos por profissionais de comunicaccedilatildeo por entender que estes perfis exercem importantes ativida-des relacionadas aos direitos humanos que natildeo se restringem a liberdades individuais mas principalmente proporcionam uma dimensatildeo coletiva da liberdade de expressatildeo Reconhe-cendo a importacircncia dessas atividades para a sociedade e a necessidade de manutenccedilatildeo e efervescecircncia do debate puacuteblico a ARTIGO 19 monitora e registra violaccedilotildees de liberdade de expressatildeo sofridas por esses profissionais
O relatoacuterio de graves violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo de comunicadores refere-se aos ca-sos onde esse direito humano de expressar-se livremente foi intensamente violado com a in-tenccedilatildeo de colocar em risco a vida da viacutetima por meio dos seguintes crimes
HOMICIacuteDIOS TENTATIVAS DE ASSASSINATO
AMEACcedilAS DE MORTE
TORTURA
SEQUESTROS
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As informaccedilotildees apuradas detalhadas e anali-sadas no relatoacuterio dizem respeito somente agraves graves ocorrecircncias No entanto tambeacutem satildeo monitoradas outras formas menos graves de violaccedilotildees informaccedilotildees que tambeacutem servem de subsiacutedio para a produccedilatildeo do relatoacuterio e de anaacute-lises exploratoacuterias sobre o contexto em que es-sas graves violaccedilotildees acontecem e se perpetu-am A ARTIGO 19 desempenha trecircs etapas para a checagem e consolidaccedilatildeo das informaccedilotildees
Monitoramento mapeamento dos casos de violaccedilotildees e coleta das informaccedilotildees iniciais sobre cada ocorrecircncia a partir de mateacuterias jor-naliacutesticas publicadas por diversos perfis de ve-iacuteculos de comunicaccedilatildeo organizaccedilotildees sociais redes de correspondentes e pelas proacuteprias viacuteti-mas ou testemunhas dos casos
Registro completo detalhamento das in-formaccedilotildees mapeadas no monitoramento por meio da apuraccedilatildeo de cada caso por meio de entrevistas com as viacutetimas conhecidos e fami-liares das viacutetimas membros de organizaccedilotildees da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsaacuteveis pelos casos
Acompanhamento documentaccedilatildeo e anaacute-lise juriacutedica de alguns casos para avaliaccedilatildeo de possiacutevel accedilatildeo judicial ou encaminhamento para organizaccedilotildees parceiras e posicionamen-tos puacuteblicos alertando sobre os casos e co-brando as devidas accedilotildees do Estado
Na etapa de monitoramento foram coletados todos os tipos de violaccedilatildeo relacionados agrave liber-dade de expressatildeo descritas no protocolo O registro completo contempla somente os ca-sos graves ndash homiciacutedio tentativa de assassi-nato ameaccedila de morte tortura e sequestro Satildeo os nuacutemeros relacionados a essas catego-rias que foram sistematizados para a elabora-ccedilatildeo desse relatoacuterio
Tendo em vista que as ocorrecircncias coletadas no monitoramento realizado pela equipe do Programa de Proteccedilatildeo e Seguranccedila da ARTIGO 19 satildeo baseadas em sites de no-tiacutecias e de outras organizaccedilotildees da sociedade civil assim com alguns contatos diretos que recebemos de viacutetimas reconhecemos que a falta de contatos in loco nas diferentes regiotildees do paiacutes podem prejudicar uma coleta comple-ta de todos os casos ocorridos ao longo do ano Dessa maneira reconhecemos que apesar dos esforccedilos empreendidos haacute a possibilidade de existirem casos que natildeo chegaram ao nosso conhecimento e que o nuacutemero de violaccedilotildees agrave liberdade de expressatildeo sofridas por comuni-cadores pode ser ainda maior do que o consi-derado para a elaboraccedilatildeo deste relatoacuterio
IMPORTANTEA investigaccedilatildeo da ARTIGO 19 independe das investigaccedilotildees oficiais ndash que satildeo tomadas por noacutes como apenas uma possiacutevel versatildeo do fato Isso se faz necessaacuterio uma vez que os agentes puacuteblicos e policiais envolvidos podem ser parte interessada na violaccedilatildeo em questatildeo ou a proacutepria falta de estrutura frequentemente compromete a qualidade das investigaccedilotildees oficiais Por outro lado natildeo eacute intenccedilatildeo da ARTIGO 19 substituir ou concorrer com o trabalho de investigaccedilatildeo oficial Pelo contraacuterio demandamos a resoluccedilatildeo oficial dos casos e que os culpados sejam julgados e punidos conforme as leis do paiacutes
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ANAacuteLISE DOS DADOS
Para as anaacutelises dos dados levantados primei-ramente foi necessaacuterio identificar toda evidecircn-cia disponiacutevel que pudesse fortalecer e ajudar a sustentar a relaccedilatildeo direta entre os fatos o trabalho de comunicaccedilatildeo e as opiniotildees eou informaccedilotildees que possam ter sido expressadas pela viacutetima ou que ela planejava expressar
Feitas essas correlaccedilotildees utilizou-se o cruzamento de categorias de anaacutelise con-sideradas centrais para a caracterizaccedilatildeo das violaccedilotildees Dentre essas categorias destacam--se trecircs tipos as que caracterizam a viacutetima as que caracterizam o crime e as que caracteri-zam o autor
Para a caracterizaccedilatildeo da viacutetima levan-tou-se o perfil da atividade da viacutetima (jornalista ou repoacuterter radialista blogueiro apresentador e colunista) e o gecircnero
Para a caracterizaccedilatildeo do crime anali-sou-se o tipo de violaccedilatildeo (homiciacutedio tentativa de assassinato ameaccedila de morte tortura se-questro e abuso sexual) onde ocorreu (regiatildeo estado e dimensatildeo da cidade) e existecircncia de violaccedilotildees anteriores Sobre a dimensatildeo das ci-
dades segue-se a classificaccedilatildeo do IBGE cida-des pequenas (menos de 100 mil habitantes) meacutedias (de 100 a 500 mil habitantes) e gran-des (mais de 500 mil habitantes)
A caracterizaccedilatildeo do autor da violaccedilatildeo foi feita com a anaacutelise do perfil do possiacutevel man-dante e das provaacuteveis motivaccedilotildees O perfil do autor eacute o tipo de atividade que faz com que o possiacutevel mandante esteja ligado ao contexto da violaccedilatildeo com as seguintes possibilidades po-liacutecia poliacutetico crime organizado produtor rural ou extrativista empresaacuterio e agente puacuteblico
Aleacutem disso procurou-se levantar as provaacuteveis motivaccedilotildees ligadas ao exerciacutecio da liberdade de expressatildeo pela viacutetima que leva-ram o autor a cometer o crime Satildeo elas rea-lizaccedilatildeo de investigaccedilatildeo ou apuraccedilatildeo de infor-maccedilotildees realizaccedilatildeo de denuacutencias e emissatildeo de criacuteticas ou opiniatildeo
Caraterizada a violaccedilatildeo em suas di-ferentes dimensotildees procurou-se levantar o status de cada caso no sistema penal seja o inqueacuterito policial a investigaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou uma accedilatildeo penal na Justiccedila
apoio
ARTIGO 19 AMEacuteRICA DO SUL
+55 (11) 3057 0042
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