ficha informativa 2 pessoa e cultura

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MATERIAL DIDÁCTICO – FOLHA DE ROSTO PERSONA/PESSOA O conceito latino persona podia parecer equivalente ao conceito moderno de «indivíduo». No entanto, este conceito latino não atinge, de maneira nenhuma, o mesmo nível de generalidade o mesmo nível sintético que os conceitos actuais de «pessoa» e de «indivíduo». O conceito latino persona referia-se ainda a algo de muito específico, bem palpável. Referia-se, numa primeira fase, à máscara dos actores através das quais estes pronunciavam as suas palavras. Alguns eruditos tendem para a suposição de que a palavra persona derivaria do verbo personare, portanto «soar através de». Isto é possível, mas não passa de uma mera suposição. A partir do ponto de referência concreto da máscara, desenvolveram-se então variações de significado da palavra persona, que passou a designar, por exemplo, o papel de um actor ou o carácter da personagem por ele representada. Contudo, na Antiguidade Clássica, o conceito persona permaneceu neste grau de particularidade relativamente elevado, ou seja estagnou num grau de generalidade relativamente baixo quando comparado com o conceito actual de pessoa. A própria palavra individuum não existia no latim clássico. É evidente que os romanos antigos presumivelmente sabiam tão bem como todos os outros que cada pessoa tem as suas particularidades. Sabiam que Brutus se distinguia de César, e Octavius de Antonius, e sabiam também, certamente, de que forma se distinguiam. Mas nesta sociedade, ao que parece, as camadas que marcavam a língua, nomeadamente os portadores da linguagem escrita, não sentiam qualquer necessidade de um conceito universal abrangente que exprimisse que cada pessoa, independentemente do grupo a que ele ou ela pertencem, é um ser autónomo, único, distinto de todos os outros homens, e que ao mesmo tempo atribuísse, um elevado valor a uma tal singularidade. Nas

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Pessoa, Personalidade e Herança Genética

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MATERIAL DIDÁCTICO – FOLHA DE ROSTO

PERSONA/PESSOAO conceito latino persona podia parecer equivalente ao conceito moderno de

«indivíduo». No entanto, este conceito latino não atinge, de maneira nenhuma, o mesmo nível de generalidade o mesmo nível sintético que os conceitos actuais de «pessoa» e de «indivíduo». O conceito latino persona referia-se ainda a algo de muito específico, bem palpável. Referia-se, numa primeira fase, à máscara dos actores através das quais estes pronunciavam as suas palavras. Alguns eruditos tendem para a suposição de que a palavra persona derivaria do verbo personare, portanto «soar através de». Isto é possível, mas não passa de uma mera suposição. A partir do ponto de referência concreto da máscara, desenvolveram-se então variações de significado da palavra persona, que passou a designar, por exemplo, o papel de um actor ou o carácter da personagem por ele representada. Contudo, na Antiguidade Clássica, o conceito persona permaneceu neste grau de particularidade relativamente elevado, ou seja estagnou num grau de

generalidade relativamente baixo quando comparado com o conceito actual de pessoa. A própria palavra individuum não existia no latim clássico. É evidente que os romanos antigos presumivelmente sabiam tão bem como todos os outros que cada pessoa tem as suas particularidades. Sabiam que Brutus se distinguia de César, e Octavius de Antonius, e sabiam também, certamente, de que forma se distinguiam. Mas nesta sociedade, ao que parece, as camadas que marcavam a língua, nomeadamente os portadores da linguagem escrita, não sentiam qualquer necessidade de um conceito universal abrangente que exprimisse que cada pessoa, independentemente do grupo a que ele ou ela pertencem, é um ser autónomo, único, distinto de todos os outros homens, e que ao mesmo tempo atribuísse, um elevado valor a uma tal singularidade. Nas práticas sociais do mundo da Antiguidade Clássica, a identidade do Nós, do Vós e do Eles tinha ainda, comparada com a identidade do Eu, um papel demasiado importante para que pudesse surgir a necessidade de um conceito universal de pessoa singular enquanto ser quase desligado de qualquer grupo.

Persona, como o texto de Norbert Elias indica, nomeava a máscara que os actores romanos usavam e que servia tanto para conferir ao actor a aparência que o papel exigia, quanto para amplificar a sua voz, para que fosse claramente ouvida pelos espectadores. Na psicologia, persona designa o papel social, "a máscara", que uma pessoa apresenta/representa em sociedade.

A personalidade pode ser definida como o conjunto de características psicológicas (cognição, emoção, atitudes, valores sócio-morais e percepção de si próprio) relativamente estáveis, que distingue um indivíduo dos outros indivíduos, determinando a sua individualidade pessoal e social. Todas as pessoas têm uma personalidade, que, por sua vez, condiciona as suas relações interpessoais.

A formação da personalidade é um processo individual, complexo e gradual, que se dá a partir dos factores hereditários e de características construídas a partir das diferentes

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situações que os indivíduos vivenciam. Tudo o que ocorre na vida de uma pessoa influencia, em maior ou menor grau, a construção das características da sua personalidade. É por este motivo que costumamos dizer que as pessoas são o resultado da sua história.

A personalidade...é total Reúne um conjunto de características numa unidade coerenteé contínua Possui uma certa dose de estabilidade nas suas característicasé dinâmica Está em permanente evolução ao longo da vida.é individual Torna o indivíduo singular face aos demais.sofre influências internas e externas Uma construção pessoal feita em interacção com o ambiente.

Em diferentes épocas da História foi negada a uma parte dos seres humanos a sua humanidade. No período colonial, por exemplo, ocorreram discussões no seio da Igreja sobre se os negros e os índios teriam alma. Mais recentemente, na Alemanha nazi, os judeus foram assimilados à peste.

Carta a Adolfo Casais Monteiro, 13 de Janeiro de 1935

(…) Como escrevo em nome desses três?... Caeiro por pura e inesperada inspiração, sem saber ou sequer calcular que iria escrever. Ricardo Reis, depois de uma deliberação abstracta que subitamente se concretiza numa ode. Campos, quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê. 0 meu semi-heterónimo Bernardo Soares que aliás em muitas coisas se parece com Álvaro de Campos, aparece sempre que estou cansado ou sonolento, de sorte que tenha um pouco suspensas as qualidades de raciocínio e de inibição; aquela prosa é um constante devaneio. É um semi-heterónimo porque, não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela. Sou eu menos o raciocínio e a afectividade. A prosa, salvo o que o raciocínio dá de "ténue" à minha, é igual a esta, e o português perfeitamente igual; ao passo que Caeiro escrevia mal o português, Campos razoavelmente mas com lapsos como dizer "eu próprio" em vez de "eu mesmo", etc., Reis melhor do que eu, mas com um purismo que considero exagerado. (…)

A partir da carta de Fernando Pessoa responda:1. O que é um heterónimo?2. Quantos heterónimos são citados na carta e em que circunstâncias o autor assume cada um deles?

HERDEIROS DOS GENES

Uma parte da nossa personalidade nós trazemos connosco desde o nascimento, é a nossa herança genética. O corpo é a nossa natureza fisico-biológica. Todo o acto humano é, em algum grau, condicionado por mecanismos fisiológicos: sistema nervoso, glandular, etc. O organismo fornece a energia necessária para o indivíduo agir, ao mesmo tempo que determina a forma como se percebe e reage aos estímulos do mundo exterior. O determinismo biológico não controla totalmente o comportamento humano, é um facto, mas nem por isso deixa de impor certas predisposições para a acção, principalmente quando se trata de acções relacionadas com motivações básicas: fome, auto-preservação, prazer ou dor.

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Em biologia existe uma fórmula que estipula que:

Podemos, assim, considerar a personalidade de um indivíduo como uma conjugação entre o seu património genético e a influência ambiental a que foi submetido. Por outras palavras, um somatório daquilo que ele trouxe para a vida com aquilo que a vida lhe deu.

A discussão acerca da preponderância de elementos ambientais ou genéticos na génese da personalidade é antiga e, pelo menos nos próximos anos, permanecerá inconclusiva. Podemos, em termos de síntese, representar o grau de influência de cada um dos campos da seguinte forma:

1 - Influência Genética DirectaInfluência directa dos genes na formação da personalidade, com uma influência ambiental

muito restrita. São raros os indivíduos que se encontram nesta situação, a maioria relativo a casos de deficiência mental, como, por exemplo, a Trissomia 21 ou Síndrome de Down.

2 - Influência Genética IndirectaOs factores genéticos são responsáveis por traços marcantes da personalidade, mas a actuação do ambiente pode modificar o curso do desenvolvimento do indivíduo. A surdez pode influenciar uma dada personalidade, já que impõe uma série de limitações ao seu desenvolvimento, mas é necessário levar igualmente em conta o tipo de educação disponibilizada.

3 - Influência Ambiental GeralO espaço sociocultural a que pertence o indivíduo influencia o desenvolvimento de modalidades características da pessoa. As normas de convivência, os estímulos, a educação ou as oportunidades poderão determinar alguns traços peculiares.4 - Influência Ambiental Específica

Elementos ambientais relacionados com determinados aspectos do desenvolvimento da personalidade, como, por exemplo, desnutrição, alcoolismo, intoxicações, etc. Sem estes factos específicos, provavelmente a personalidade assumiria outro rumo.

Na realidade, o desenvolvimento da personalidade é uma conjunção de vários destes mecanismos de influência. Os genes podem definir tendências, mas são as experiências individuais que as moldam. A questão não é se um dado comportamento é herdado ou adquirido, mas antes perceber como os genes interagem com o ambiente. Biologia não é destino.

Os pais que possuem um nível de habilitações superiores, que são bem-sucedidos e que são saudáveis tendem a ter filhos que obtêm bons resultados nos testes escolares; mas não parece ter multa importância

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se uma criança é levada a trote a ver museus, ou se lhe batem, ou se frequentou a Head Start, ou se lê frequentemente, ou se fica estendida no chão em frente a televisão.Para os pais e para os especialistas em parentalidade que vivem obcecados com as últimas técnicas sobre a educação das crianças, estas notícias podem parecer demasiado moderadas. A realidade é que parece que, habitualmente, se sobrevaloriza a técnica. Mas isto não significa que os pais não são importantes. É bastante claro que são muito importantes. Aqui reside o enigma: até porque a maioria das pessoas quando compra um livro sobre parentalidade, já o faz demasiado tarde. Grande parte das coisas que são importantes já foram decididas há muito tempo - quem é, com quem se casou, que tipo de vida tem. Se é inteligente, trabalhador, se tem um nível elevado de habilitações literárias, se tem um bom ordenado e se é casado com alguém igualmente afortunado, então os seus filhos terão mais probabilidades de ter sucesso. [Da mesma forma, não é prejudicial ser honesto, pensar, amar e sentir curiosidade relativamente ao mundo.] Não interessa assim tanto o que faz como pai; mas sim quem é. Sob este ponto de vista, um pai dominador e hiperactivo é como o candidato político que acredita que o dinheiro ganha eleições, quando, na verdade, nem todo o dinheiro do mundo consegue fazer eleger um candidato se à partida os eleitores não gostarem dele.

No ensaio intitulado "The Nature and Nurture of Economic Outcomes", o economista Bruce Sacerdote debateu a relação entre a natureza e a educação estudando quantitativamente a longo prazo os efeitos da parentalidade. Utilizou três estudos sobre adopção, dois americanos e um britânico, contendo cada um deles dados detalhados sobre crianças adoptadas, sobre os seus pais adoptivos e sobre os seus pais biológicos. Sacerdote descobriu que os pais que adoptam crianças são, em geral, mais inteligentes, tem um nível mais elevado de educação e são mais bem pagos que os pais biológicos do bebé.

Mas as vantagens dos pais adoptivos tiveram muito pouca influência sobre os desempenhos escolares das crianças. Como também se pode ver pelos dados do ECLS, as crianças adoptadas têm fracos resultados nos seus testes escolares., por maior que fosse a Influência que os pais adoptivos pudessem exercer, esta é largamente excedida pela carga genética. Mas Sacerdote descobriu também que a falta de influência dos pais não se mantinha para sempre. Ao tornarem-se adultas, as crianças adoptadas tinham-se afastado nitidamente do destino que o seu QI teria feito prever. Comparando com as crianças das que, em igualdade de circunstâncias, não foram dadas para adopção, os adoptados apresentavam de longe maiores probabilidades de frequentar a faculdade, de ter um trabalho bem pago e de esperar até depois da adolescência para se casarem. Foi a 'influência dos pais adoptivos, concluiu Sacerdote, que fez a diferença.

Infelizmente, não foram poucas as vezes em que se recorreu às características biológicas para justificar e fomentar o ódio entre os seres humanos, como é possível observar no texto a seguir, sobre os judeus, escrito pelo biólogo Erwin Baur e o antropólogo Martim StammIer, dois cientistas alemães da época do nazismo.

Todo fazendeiro sabe que se abater os melhores animais, sem deixar que procriem, continuando a criar em vez disso espécimes inferiores, o seu gado vai inevitavelmente degenerar. Tal erro, que nenhum fazendeiro cometeria com os seus animais e plantas de cultivo, permitimos que em larga medida persista no nosso meio. Por consideração à nossa humanidade actual, devemos cuidar para que essas pessoas inferiores não se reproduzam. Simples operação executada em poucos minutos torna isso possível sem mais demora... Ninguém é mais favorável do que eu às novas leis de esterilização, mas devo repetir e insisti apenas um começo...

A extinção e a salvação são os dois pólos em torno dos quais gira todo o cultivo da raça, os dois métodos com os quais se tem que trabalhar... Extinção é a destruição biológica do

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hereditariamente inferior através da esterilização, da repressão quantitativa dos doentes e indesejáveis ( ... 1. A tarefa consiste em proteger o povo de uma reprodução excessiva de ervas daninhas.

Zygmunt Bauman, Modernidade e Holocausto, Rio de Janeiro, Jorge Zaahar, p. 94

O talento herda-se?MAFALDA SACCHETTI, filha do cantor Pauto de Carvalho

Tem 28 anos, estudou no Conservatório de Música de Lisboa durante três anos e no seu currículo já figura um álbum gravado, que dá pelo nome de 'Imprevisível', com 11 inéditos. Na forja está um segundo trabalho, que será “menos comercial que o primeiro e mais musical”. Mafalda ainda consegue ter tempo livre para se dedicar às dobragens e à coordenação de vozes para desenhos animados.

Ser filha do Paulo de Carvalho nunca me facilitou a vida, antes pelo contrário. As pessoas são muito mais críticas porque exigem de mim igual perfeição em relação ao meu pai. Talvez por isso tenha herdado também os inimigos dele.

Nunca ouvi o meu pai cantar em casa. Apenas ouvíamos música no carro. Ele gosta de assobiar e é o assobio mais bonito e afinado que conheço.

Aprendi com ele a tratar os músicos ao mesmo nível que eu! Nunca estão abaixo de mim, porque sem eles não faço nada.

O meu pai sempre me deu a entender que é uma profissão ingrata, por mais sucesso que se tenha ou por melhor que se seja.

Só consigo exteriorizar sentimentos através da música. Sou daquele tipo de pessoas que se lhe oferecem uma viagem às ilhas gregas permanece impávida e serena, mesmo que por dentro esteja radiante!

Adoro comer e cozinhar É uma das minhas grandes paixões, pois adoro gastronomias de todo o mundo. Sou óptima a fazer caril de frango ou gambas.

Acredito nas coincidências e que as coisas não acontecem por acaso. Sou muito esotérica, ligo aos signos, às cartas e às luas e acho que isso se reflecte no meu trabalho.

Gosto de beber um copo de vinho antes de entrar em palco; dá-me confiança, desinibe-me. É mais do que um ritual, é 'aquele quentinho'.

Cheguei a um ponto em que percebi que não dava para viver apenas da música e decidir tirar o curso de Design de Interiores, que, não sendo um trabalho permanente, permite-me trabalhar por projectos, como na música.