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1 Fevereiro/2020 Sessões de 1º a 29 de fevereiro de 2020 96 número

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Fevereiro/2020

Sessões de 1º a 29 de fevereiro de 2020

96 número

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Fevereiro de 2020

Compilação dos Informativos nos 964 a 967

Data de divulgação 10 de fevereiro de 2020

O Informativo por Temas apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo

Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por

assuntos.

SUMÁRIO

Direito Administrativo

Agentes Públicos

Julgamento de concessão de aposentadoria: prazo decadencial, contraditório e ampla defesa – 3

Contrato Administrativo

Prorrogação de contrato de concessão de ferrovia e serviço adequado

Servidores Públicos

Presunção de inocência e eliminação de concurso público – 4

Direito Constitucional

Conflito federativo

Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza e amortização de dívida pública

Controle de Constitucionalidade

Entidades desportivas de futebol: sanção política e autonomia – 2

ADI: cargo de datiloscopista e redenominação para perito papiloscopista – 2

ADI e revogação superveniente – 2

Quórum e modulação dos efeitos de decisão sem declaração de inconstitucionalidade de ato

normativo

Direitos Fundamentais

Suspensão de habilitação e direito ao trabalho

Legitimidade

Legitimidade de procuradores para interposição de recurso em ADI

Organização do Estado

Afastamento de norma e contrariedade à cláusula de reserva de plenário

Composição de órgão da Administração Pública estadual e participação de representante de

seccional da OAB

Organização dos Poderes

Ato do CNJ e competência do STF

Atuação de advogado como testemunha e sigilo profissional

Reclamação

Uso de algemas e fundamentação – 2

Subsídio

Subsídio vitalício e pensão por morte de ex-vereador

Direito Financeiro

FUNDEF

Repasses complementares do Fundef e princípio da colegialidade – 2

Direito Penal

Extinção da Punibilidade

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Prescrição penal e natureza constitucional

Legislação Penal Especial

Lei 8.137/1990, art. 2º, II: não recolhimento de ICMS declarado e tipicidade – 2

Execução provisória da pena: filho menor e prisão domiciliar – 2

Princípio da Insignificância

Paciente reincidente e absolvição pelo princípio da insignificância

Direito Previdenciário

Benefícios previdenciários

Art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991: “desaposentação” e “reaposentação”

Direito Processual Civil

Competência

Servidor público estatutário e competência

Honorários Advocatícios

Honorários advocatícios e recursos do Fundef – 2

Processo em geral

Sustentação oral e julgamento iniciado no Plenário Virtual

Reclamação

Reclamação: sistemática da repercussão geral e julgamento de REsp pelo STJ – 3

Recurso Extraordinário

Repercussão geral e suspensão nacional – 2

Direito Processual Penal

Colaboração Premiada

Colaboração premiada e exercício do direito de defesa – 2

Competência

Inquérito: declínio de competência e não encerramento de instrução processual – 2

Dosimetria da Pena

Ações penais em andamento e causa de diminuição da pena

Habeas Corpus

Transação penal e perda de objeto de habeas corpus

Prisão domiciliar: condenada com filho menor e decisão transitada em julgado

Inquérito

Súmula Vinculante 14 e direito à intimidade

Inquérito Policial

Inquérito policial: declinação da competência para a Justiça estadual e condução pela Polícia

Federal

Nulidades e Recursos em geral

HC: cabimento e ato de ministro do STF – 2

HC: execução provisória e art. 312 do CPP

HC: execução provisória e tribunal do júri

HC: execução provisória e art. 319 do CPP

HC: execução provisória e prisão preventiva

Prova

Crime de incêndio e fonte de prova

Direito Tributário

Imunidades Tributárias

Entidades beneficentes de assistência social e imunidade – 10

Limitações ao poder de tributar

Imunidade tributária e exportação indireta – 2

Responsabilidade Tributária

Responsabilidade tributária solidária de terceiros

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DIREITO ADMINISTRATIVO

Agentes Públicos

Julgamento de concessão de aposentadoria: prazo decadencial, contraditório e ampla defesa

– 3 Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas

estão sujeitos ao prazo de cinco anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de

aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas.

Com base nesse entendimento, o Plenário, em conclusão e por maioria, ao apreciar o Tema 445 da

repercussão geral, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia se o Tribunal de Contas

da União (TCU) deve observar o prazo decadencial de cinco anos, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999

(1), para julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria e a necessidade de

observância do contraditório e da ampla defesa (Informativos 955 e 966).

No caso, a aposentadoria foi concedida pelo órgão de origem em 1º.9.1995. Em 18.7.1996, o

processo administrativo chegou ao TCU. Em 4.11.2003, o TCU, ao analisar a legalidade da aposentadoria

do servidor público concedida há mais sete anos, constatou a existência de irregularidades e, por essa

razão, considerou ilegal o ato de concessão.

O Tribunal, seguindo sua jurisprudência dominante, considerou que a concessão de aposentadoria

ou pensão constitui ato administrativo complexo, que somente se aperfeiçoa após o julgamento de sua

legalidade pela Corte de Contas.

Nesses termos, por constituir exercício da competência constitucional (CF, art. 71, III) (2), tal ato

ocorre sem a participação dos interessados e, portanto, sem a observância do contraditório e da ampla

defesa.

Entretanto, por motivos de segurança jurídica e necessidade da estabilização das relações, é

necessário fixar-se um prazo para que a Corte de Contas exerça seu dever constitucional.

Diante da inexistência de norma que incida diretamente sobre a hipótese, aplica-se ao caso o

disposto no art. 4º do Decreto-lei 4.657/1942 (3), a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro

(LINDB).

Assim, tendo em vista o princípio da isonomia, seria correta a aplicação, por analogia, do Decreto

20.910/1932 (4).

Portanto, se o administrado tem o prazo de cinco anos para buscar qualquer direito contra a

Fazenda Pública, também deve-se considerar que o Poder Público, no exercício do controle externo, tem

o mesmo prazo para rever eventual ato administrativo favorável ao administrado.

Desse modo, a fixação do prazo de cinco anos se afigura razoável para que o TCU proceda ao

registro dos atos de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, após o qual se considerarão

definitivamente registrados.

Por conseguinte, a discussão acerca da observância do contraditório e da ampla defesa após o

transcurso do prazo de cinco anos da chegada do processo ao TCU encontra-se prejudicada. Isso porque,

findo o referido prazo, o ato de aposentação considera-se registrado tacitamente, não havendo mais a

possibilidade de alteração pela Corte de Contas.

Os ministros Gilmar Mendes (relator) e Alexandre de Moraes reajustaram os seus votos.

O ministro Edson Fachin acompanhou o relator quanto à parte dispositiva. Enfatizou, porém, que o

ato de concessão de aposentadoria é um ato simples e não complexo. Além disso, o prazo de cinco anos

inicia-se com a publicação do ato pelo órgão de origem e não da chegada do processo administrativo ao

TCU.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que deu provimento ao recurso extraordinário. Salientou que o

ato de concessão de aposentadoria pelo órgão de origem do servidor não é ato jurídico perfeito e acabado,

de modo que a Administração Pública não decai da possibilidade de proceder à análise da higidez do ato.

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(1) Lei 9.784/1999: “Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos

favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1º No

caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. § 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.”

(2) CF: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da

União, ao qual compete: (...) III – apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para

cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias

posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;” (3) Decreto-lei 4.654/1942: “Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes

e os princípios gerais de direito”.

(4) Decreto 20.910/1932: “Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da

data do ato ou fato do qual se originarem”.

RE 636553/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 19.2.2020. (RE-636553) (Informativo

967, Plenário)

Contrato Administrativo

Prorrogação de contrato de concessão de ferrovia e serviço adequado O Plenário, por maioria, indeferiu medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade

ajuizada contra os seguintes dispositivos: § 2º, do inciso II do art. 6º (1); §§ 1º, 3º, 4º e 5º do art. 25 (2); e

o § 2º do art. 30 (3), todos da Lei 13.448/2017.

A parte autora alega que os dispositivos impugnados contrariam o caput e o inciso XXI do art. 37

(4), e o parágrafo único e o inciso IV do art. 175 (5) da Constituição Federal (CF).

O Plenário afirmou que o art. 175, I, da CF (6) prevê que a lei disporá sobre as condições para a

prorrogação dos contratos de concessão.

Enfatizou que o inciso XII do art. 23 da Lei 8.987/1995 (7) estabelece que as condições para a

prorrogação devem ser disciplinadas no contrato de concessão, configurando-se como cláusula essencial,

marcada pela discricionariedade da Administração Pública e na supremacia do interesse público.

A norma dispõe sobre a contratação de termo predefinido, firmado a partir de licitação, cabendo à

Administração avaliar, excepcionalmente, com base nos parâmetros legais de atendimento ao interesse

público, a conveniência e a oportunidade da prorrogação.

Assinalou que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece a prorrogação do

prazo contratual no espaço de discricionariedade da Administração Pública à qual cabe analisar e concluir

sobre a oportunidade e a conveniência da prorrogação.

A prorrogação indefinida do contrato, porém, configura burla às determinações legais e

constitucionais quanto à licitação obrigatória para adoção do regime de concessão e permissão para

exploração de serviços públicos.

A Lei 13.448/2017 estabelece diretrizes gerais para a prorrogação e relicitação dos contratos de

parceria qualificados no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), nos termos da Lei 13.303/2016,

para os setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário da Administração Pública federal.

Não procede a alegação da autora de que a exigência posta no § 2º do inciso II do art. 6º da Lei

13.448/2017 importa em ofensa à eficiência e favorecimento de interesses particulares em detrimento do

interesse público.

Conforme se prescreve na norma impugnada, além de outras condicionantes, deve-se comprovar a

prestação de serviço adequado, consistente no cumprimento, pelo período antecedente de cinco anos

contado da data da proposta de antecipação da prorrogação, das metas de produção e de segurança

definidas no contrato, por três anos, ou das metas de segurança definidas no contrato, por quatro anos.

A definição legal de serviço adequado (Lei 8.987/1995, art. 6º, § 1º) expõe ser ele “o que satisfaz

as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na

sua prestação e modicidade das tarifas”. O serviço adequado é aquele que atende, quanto ao objeto

contratado, os índices de atendimento.

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A prorrogação contratual ao termo final do contrato ou a prorrogação antecipada devem ser

submetidas a consulta pública.

Para tanto, após o encerramento da consulta pública, encaminham-se ao Tribunal de Contas da

União (TCU) o estudo prévio, os documentos que comprovem o cumprimento das exigências de serviço

adequado e o termo aditivo de prorrogação contratual para avaliação final quanto à legitimidade e

economicidade da solução aventada.

O colegiado frisou que o § 2º do art. 8º da lei impugnada prevê a exigência de avaliação prévia e

favorável do órgão competente sobre “a adequação dos serviços”.

A condicionante legal prevista nesse diploma não é fator isolado para o deferimento da

prorrogação antecipada da concessão. Não há impedimento legal que o concessionário seja atestado

positivamente quanto aos critérios do serviço adequado e não o seja quanto aos demais.

O parâmetro temporal estabelecido na lei para o cumprimento do serviço adequado é objetivo.

O parâmetro temporal e material estabelecido pela norma impugnada não compromete a análise do

serviço adequado para fins de prorrogação antecipada contratual.

Na formulação dos contratos de concessão atualmente vigentes, as empresas concessionárias

celebraram contratos de arrendamento de bens com a Rede Ferroviária Federal S/A criada em 1957, pela

Lei 3.115/1957, e incluída no Programa Nacional de Desestatização pelo Decreto federal 473/1992.

A extinção dos contratos de arrendamento resulta na transferência não onerosa dos bens móveis,

operacionais e não operacionais, ao concessionário, conferindo-lhe a possibilidade de deles dispor, geri-

los e substituí-los. Tais bens passam, portanto, a integrar o contrato de parceria firmado entre o Poder

concedente e as concessionárias.

As normas versam sobre o deslocamento do acervo patrimonial para o contrato de concessão com

o fim de concretizar as respectivas obrigações. Os valores atinentes à titularidade serão considerados para

preservar a equação econômico-financeira do contrato.

Nesse contexto, trata-se de matéria a ser disciplinada pela autoridade reguladora competente para

promover a extinção dos contratos de arrendamento e a incorporação dos bens ao contrato de concessão,

nos termos do § 3º do art. 25 da lei em referência.

O prévio inventário dos bens móveis operacionais e não operacionais, objeto de transferência aos

concessionários, atende aos princípios basilares do direito administrativo constitucional – supremacia e

indisponibilidade do interesse público.

Considerou, por fim, que a transferência dos bens imóveis e móveis operacionais ou não, nos

termos das normas impugnadas, deve ser precedida de inventário, no qual especificados e referentes aos

extintos contratos de arrendamento.

Vencidos os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio, que concederam a medida cautelar para

suspender a eficácia dos dispositivos impugnados. Consideraram que a redução do prazo e o

abrandamento dos requisitos para avaliação da adequação do contrato, pela lei impugnada, aparenta estar

em confronto com os princípios constitucionais do art. 37 da CF.

(1) Lei 12.448/2017: “Art. 6º. A prorrogação antecipada ocorrerá por meio da inclusão de investimentos não previstos no

instrumento contratual vigente, observado o disposto no art. 3º desta Lei. (...) § 2º. A prorrogação antecipada estará, ainda,

condicionada ao atendimento das seguintes exigências por parte do contratado: II – quanto à concessão ferroviária, a prestação de

serviço adequado, entendendo-se como tal o cumprimento, no período antecedente de 5 (cinco) anos, contado da data da proposta de antecipação da prorrogação, das metas de produção e de segurança definidas no contrato, por 3 (três) anos, ou das metas de

segurança definidas no contrato, por 4 (quatro) anos.”

(2) Lei 12.448/2017: Art. 25. O órgão ou a entidade competente é autorizado a promover alterações nos contratos de parceria no setor ferroviário a fim de solucionar questões operacionais e logísticas, inclusive por meio de prorrogações ou

relicitações da totalidade ou de parte dos empreendimentos contratados. § 1º O órgão ou a entidade competente poderá, de comum

acordo com os contratados, buscar soluções para todo o sistema e adotar medidas diferenciadas por contrato ou por trecho ferroviário que considerem a reconfiguração de malhas, admitida a previsão de investimentos pelos contratados em malha própria ou

naquelas de interesse da administração pública. (...) § 3º Nos termos e prazos definidos em ato do Poder Executivo, as partes

promoverão a extinção dos contratos de arrendamento de bens vinculados aos contratos de parceria no setor ferroviário, preservando-se as obrigações financeiras pagas e a pagar dos contratos de arrendamento extintos na equação econômico-financeira

dos contratos de parceria. § 4º Os bens operacionais e não operacionais relacionados aos contratos de arrendamento extintos serão

transferidos de forma não onerosa ao contratado e integrarão o contrato de parceria adaptado, com exceção dos bens imóveis, que serão objeto de cessão de uso ao contratado, observado o disposto no § 2º deste artigo e sem prejuízo de outras obrigações. § 5º Ao

contratado caberá gerir, substituir, dispor ou desfazer-se dos bens móveis operacionais e não operacionais já transferidos ou que

venham a integrar os contratos de parceria nos termos do § 3º deste artigo, observadas as condições relativas à capacidade de transporte e à qualidade dos serviços pactuadas contratualmente.”

(3) Lei 12.448/2017: “Art. 30. São a União e os entes da administração pública federal indireta, em conjunto ou

isoladamente, autorizados a compensar haveres e deveres de natureza não tributária, incluindo multas, com os respectivos contratados, no âmbito dos contratos nos setores rodoviário e ferroviário. (...) § 2º Os valores apurados com base no caput deste

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artigo poderão ser utilizados para o investimento, diretamente pelos respectivos concessionários e subconcessionários, em malha

própria ou naquelas de interesse da administração pública”.

(4) CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também,

ao seguinte: (...) XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados

mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de

qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”

(5) CF: “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: (...) IV – a obrigação de manter

serviço adequado.”

(6) CF: “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I – o regime das empresas

concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as

condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;” (7) Lei 8.987/1995: “Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: (...) XII – às condições para

prorrogação do contrato;”

ADI 5991 MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 20.2.2020. (ADI-5991) (Informativo

967, Plenário)

Servidores Públicos

Presunção de inocência e eliminação de concurso público – 4 Sem previsão constitucionalmente adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital

de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito

ou a ação penal.

Com essa tese de repercussão geral (Tema 22), o Plenário, em conclusão de julgamento e por

maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia a possibilidade de se restringir a

participação em concurso público de candidato que respondia a processo criminal (Informativo 825).

Na espécie, foi inadmitida a participação de soldado da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF)

— acusado pela suposta prática do delito de falso testemunho — em seleção para o Curso de Formação

de Cabos no Quadro de Praças Policiais e Militares Combatentes (QPPMC). O ato de exclusão do

candidato foi fundamentado no edital de convocação do referido processo seletivo, que vedaria a

participação de concorrente “denunciado por crime de natureza dolosa”. Em sede de mandado de

segurança, o magistrado de piso assegurou a matrícula e a frequência do soldado no Curso de Formação.

Posteriormente, a decisão foi mantida pelo tribunal a quo no acórdão ora recorrido.

Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso (relator), que assentou a necessidade de

ponderação entre bens jurídicos constitucionais para a solução da controvérsia posta.

Assim, a questão não poderia ser solucionada a partir de um tradicional raciocínio silogístico, ou

dos critérios usuais para resolução de antinomias — hierárquico, de especialidade e cronológico —, haja

vista a existência de normas de mesma hierarquia indicando soluções diferentes.

Nessas situações, o raciocínio deve percorrer três etapas: a) identificar as normas que postulam

incidência na hipótese; b) identificar os fatos relevantes ou os contornos fáticos gerais do problema; e c)

harmonizar as normas contrapostas, calibrando o peso de cada qual e restringindo-as no grau mínimo

indispensável, de modo a fazer prevalecer a solução mais adequada à luz de todo o sistema jurídico.

Na espécie, de um lado, destaca-se o princípio da presunção de inocência [Constituição Federal

(CF), art. 5º, LVII], reforçado pelos princípios da liberdade profissional (CF, art. 5º, XIII) e da ampla

acessibilidade aos cargos públicos (CF, art. 37, I). De outro lado, ressalta-se o princípio da moralidade

administrativa (CF, art. 37, caput).

O ministro Roberto Barroso apresentou duas regras para a ponderação dos valores em jogo e a

determinação objetiva de idoneidade moral, quando aplicável ao ingresso no serviço público mediante

concurso. A primeira, apta a estabelecer parâmetro pelo qual se pode recusar a alguém a inscrição em

concurso público, é a necessidade de condenação por órgão colegiado ou de condenação definitiva. Há

analogia com a Lei da “Ficha Limpa” (LC 135/2010), critério que já foi aplicado mesmo fora da seara

penal.

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A segunda regra é a necessidade de relação de incompatibilidade entre a natureza do crime e as

atribuições do cargo. Nem toda condenação penal deve ter por consequência direta e imediata impedir

alguém de se candidatar a concurso público.

Entretanto, para concorrer a determinados cargos públicos, pela natureza deles, é possível, por

meio de lei, a exigência de qualificações mais restritas e rígidas ao candidato. Por exemplo, as carreiras

da magistratura, das funções essenciais à justiça — Ministério Público, Advocacia Pública e Defensoria

Pública — e da segurança pública.

O relator concluiu que a solução mediante o emprego dessas regras satisfaz o princípio da

razoabilidade ou proporcionalidade, visto que é: a) adequada, pois a restrição imposta se mostra idônea

para proteger a moralidade administrativa; b) não excessiva, uma vez que, após a condenação em segundo

grau, a probabilidade de manutenção da condenação é muito grande e a exigência de relação entre a

infração e as atribuições do cargo mitiga a restrição; e c) proporcional em sentido estrito, na medida em

que a atenuação do princípio da presunção de inocência é compensada pela contrapartida em boa

administração e idoneidade dos servidores públicos.

Para ele, a negativa de provimento ao recurso é reforçada pelo fato de ter havido a suspensão

condicional do processo. Não fosse o longo período entre o oferecimento da denúncia e a audiência de

suspensão condicional, provavelmente o processo criminal não estaria em curso no momento em que o

recorrido foi excluído do aludido curso.

Vencido o ministro Alexandre de Moraes, que deu provimento ao recurso para cassar a decisão do

tribunal a quo. A seu ver, o fato de se tratar de servidor público militar, submetido aos princípios da

hierarquia e da disciplina, demanda a análise diferenciada daquela cabível para a generalidade de

situações que envolvem concursos públicos. Além disso, não se cuida de vedação a acesso originário a

cargo público, e sim de procedimento interno de aferição de mérito funcional, de abrangência restrita,

porquanto envolve apenas o universo dos policiais militares da localidade.

O ministro salientou que a exigência de idoneidade moral, na carreira militar, é plenamente

legítima e consistente com o texto constitucional. O soldado deve acatamento integral da legislação que

fundamenta o organismo policial militar. Dessa maneira, o recorrido estava subordinado ao regulamento

interno de ascensão para cabo e, enquanto pendesse o processo, não poderia se inscrever no curso. Por

fim, afirmou a razoabilidade dessa previsão.

RE 560900/DF, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 5 e 6.2.2020. (RE-560900)

(Informativo 965, Plenário)

Parte 1 - Parte 2 -

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DIREITO CONSTITUCIONAL

Conflito Federativo

Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza e amortização de dívida pública

As receitas provenientes do adicional criado pelo art. 82, § 1º, do ADCT (1) não podem ser

computadas para efeito de cálculo da amortização da dívida do Estado. Os recursos devem, no entanto,

ser considerados para efeito de cálculo do montante mínimo destinado à saúde e à educação.

Com base nesse entendimento, o Plenário julgou parcialmente procedente pedido formulado em

ação cível originária para condenar a União a ressarcir os valores pagos a maior a título de amortização da

dívida pública nos exercícios de 2002, 2003 e 2004, mediante compensação da diferença com débitos

futuros.

No caso, Estado-membro ajuizou ação cível originária, com base no art. 102, I, f, da Constituição

Federal (CF) (2), objetivando a não inclusão dos valores destinados constitucionalmente ao Fundo

Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza (FECEP) na apuração da Receita Líquida Real (RLR),

sobre a qual é computado o total da dívida pública do estado com a União. Pretendia, ainda, a exclusão

desses recursos do cálculo do montante mínimo destinado à saúde e à educação.

Inicialmente, o Tribunal afastou a alegação de inconstitucionalidade formal das normas ordinárias

definidoras da RLR (Resolução do Senado Federal 69/1995 e Lei 9.496/1997), por não constituir matéria

sujeita à reserva de lei complementar.

Relativamente à inconstitucionalidade material, reputou relevante a articulação do Estado-

membro, notando-se a necessidade de observância do fundo criado, cuja base maior é a Constituição

Federal. Frisou que, ante dificuldades gerais, é comum desvirtuarem-se receitas, deixando-se de atender

às finalidades discriminadas em textos normativos, até mesmo de índole constitucional. A partir da

tomada de empréstimo de parcelas a compor o FECEP, chega-se ao comprometimento do arrecadado,

tendo em conta a dívida pública do estado e os valores a serem despendidos com saúde.

(1) ADCT: “Art. 82. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem instituir Fundos de Combate á Pobreza, com os

recursos de que trata este artigo e outros que vierem a destinar, devendo os referidos Fundos ser geridos por entidades que contem

com a participação da sociedade civil. § 1º Para o financiamento dos Fundos Estaduais e Distrital, poderá ser criado adicional de até

dois pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, sobre os produtos e serviços supérfluos e nas condições definidas na lei complementar de que trata o art. 155, § 2º, XII, da Constituição, não se aplicando, sobre

este percentual, o disposto no art. 158, IV, da Constituição.”

(2) CF: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: (...) f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre

uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;”

ACO 727/BA, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 13.2.2020. (ACO-727) (Informativo 966,

Plenário)

Controle de Constitucionalidade

Entidades desportivas de futebol: sanção política e autonomia – 2 O Plenário, por unanimidade, converteu o julgamento da medida cautelar em julgamento definitivo

de mérito e, em seguida, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta para declarar a

inconstitucionalidade do art. 40 da Lei 13.155/2015 na parte em que altera o art. 10, §§ 1º, 3º e 5º, da Lei

10.671/2003 (1). Manteve a vigência e a eficácia de todos os demais dispositivos impugnados em face de

sua compatibilidade com o texto constitucional (Informativo 937).

O art. 40 da lei impugnada estabelece o atendimento a requisitos de natureza fiscal (apresentação

de Certidão Negativa de Débitos) como critério técnico para a habilitação de entidade de prática

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desportiva, até mesmo com a possibilidade de rebaixamento de divisão às agremiações que não

cumprirem tais requisitos não desportivos (fiscais e trabalhistas) – os quais não apresentam nenhuma

relação com o desempenho esportivo da entidade.

Para o colegiado, o referido dispositivo legal falece de proporcionalidade e razoabilidade. Isso

porque essas previsões constituem formas de cobrança de tributos por intermédio de limitações

arbitrárias, com a utilização de meios gravosos e indiretos de coerção estatal destinados a compelir o

contribuinte inadimplente a pagar o tributo. Isso configura sanção política, o que afronta diversos

entendimentos sumulados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) (2).

Ademais, o Tribunal considerou que a imposição de decesso a categoria inferior da competição

esportiva acarreta a verdadeira morte civil do clube, diante dos imediatos e drásticos efeitos sobre as

receitas a serem por ele obtidas, como direitos de imagem, direito de arena e patrocínios. Há, em razão

disso, uma grave desproporcionalidade na consequência prevista na lei para o comportamento do clube.

Se eventual inadimplência do clube – que deve ser cobrada pelas vias normais – resultasse na sua

automática exclusão do campeonato do ano seguinte, isso inviabilizaria a percepção de seus rendimentos

e, consequentemente, o pagamento de suas dívidas. Também prejudicaria a União, que não receberia mais

os valores relativos a refinanciamentos ou a atuais tributos; os atletas e funcionários da entidade

esportiva, que não seriam mais pagos; e a própria ideia de fomentar o desporto.

Quanto aos demais artigos impugnados, o Plenário concluiu que a lei previu tratamento favorável

ao parcelamento e ao pagamento de débitos fiscais das entidades perante a União, e de obrigações

relativas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Dessa forma, a exigência de contrapartidas

por parte das entidades aderentes se afigura plenamente constitucional. A lei pretendeu, com isso,

promover a melhoria do padrão de gestão do futebol profissional, mas sem interferência na autonomia das

entidades assegurada pelo art. 217 da Constituição Federal (CF) (3).

Ressaltou, por fim, que a adesão a esse regime de cooperação se deu de forma voluntária pelos

clubes. Por ser uma adesão facultativa ao regime fiscal benéfico, não se poderia, portanto, admitir que

aqueles que aderiram obtivessem o refinanciamento de suas dívidas sem se submeter às regras de

contrapartida disciplinadoras de rigor financeiro e de gestão. Essas regras não constituem nenhuma

intervenção externa, haja vista que são os dirigentes eleitos da própria entidade que continuam a

administrar. Além do caráter voluntário da adesão, as exigências estabelecidas no Profut atenderam ao

princípio da razoabilidade, porquanto respeitadas as necessárias proporcionalidade, justiça e adequação

entre os dispositivos impugnados e as normas constitucionais protetivas da autonomia desportiva. O

legislador visou à probidade e à transparência da gestão do desporto e, sobretudo, à recuperação e à

manutenção dessas entidades desportivas, que, se tivessem prosseguido como estavam, não teriam

conseguido manter suas atividades. Registrou que dos vinte clubes profissionais de elite do futebol

brasileiro que aderiram ao programa dezenove possuem dívidas gigantescas.

(1) Lei 13.155/2015: “Art. 40. A Lei n. 10.671, de 15 de maio de 2003, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art.

10. (...) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em

razão de: I – colocação obtida em competição anterior; e II – cumprimento dos seguintes requisitos: a) regularidade fiscal, atestada

por meio de apresentação de Certidão Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União – CND; b) apresentação de certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS; e c) comprovação de

pagamento dos vencimentos acertados em contratos de trabalho e dos contratos de imagem dos atletas. (...) § 3º Em campeonatos ou torneios regulares com mais de uma divisão, serão observados o princípio do acesso e do descenso e as seguintes determinações,

sem prejuízo da perda de pontos, na forma do regulamento: I – a entidade de prática desportiva que não cumprir todos os requisitos

estabelecidos no inciso II do § 1º deste artigo participará da divisão imediatamente inferior à que se encontra classificada; II – a vaga desocupada pela entidade de prática desportiva rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo será ocupada por entidade de

prática desportiva participante da divisão que receberá a entidade rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo, obedecida a

ordem de classificação do campeonato do ano anterior e desde que cumpridos os requisitos exigidos no inciso II do § 1º deste artigo. (...) § 5º A comprovação da regularidade fiscal de que trata a alínea a do inciso II do § 1º deste artigo poderá ser feita mediante a

apresentação de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da

União – CPEND.” (2) Enunciado 70 da Súmula do STF: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança

de tributo. ”; Enunciado 323 da Súmula do STF: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento

de tributos. ”; Súmula 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.”

(3) CF: “Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um,

observados: I – a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II – a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de

alto rendimento; III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não profissional; IV – a proteção e o incentivo às

manifestações desportivas de criação nacional.”

ADI 5450 MC-Ref/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 18.12.2019. (ADI-5450)

(Informativo 964, Plenário)

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ADI: cargo de datiloscopista e redenominação para perito papiloscopista – 2

O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, conheceu de ação direta de

inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nela formulado, prejudicado o agravo regimental

interposto da decisão que indeferiu o pleito de medida cautelar.

A ação foi ajuizada em face do art. 3º da Lei Complementar (LC) 156/2010; do art. 1º, VI, do

Decreto 39.921/2013; e do art. 2º, §§ 1º a 3º, da Portaria GAB-SDS 1.967/2010, todos do estado de

Pernambuco (Informativo 932).

O art. 3º da lei complementar redenominou o cargo de datiloscopista policial para perito

papiloscopista, ainda no âmbito da polícia civil. Os demais dispositivos impugnados estabeleceram

sínteses das atribuições e prerrogativas institucionais do cargo de perito papiloscopista e matérias

relacionadas ao desempenho de suas atividades.

Prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux (relator), que, de início, assentou a existência de

competência concorrente para dispor sobre os peritos oficiais. Isso, porque o art. 24, XVI, da Constituição

Federal (CF) dispõe competir à União, aos estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre

organização, garantias, direitos e deveres dos policiais civis. Além disso, não verificou qualquer

antinomia entre as normas locais e as normas federais de regência.

Para o relator, a União exerceu sua competência legislativa ao aprovar a Lei 12.030/2009, que

objetiva aprimorar a disciplina do tema e garantir que a perícia oficial esteja inserida num arranjo

institucional adequado. Por ter caráter de norma nacional geral, aquela lei não esgotou as regras de

organização da polícia civil. É o que se depreende de seu art. 5º, que expressamente ressalvou a

necessidade de observância das disposições específicas da legislação de cada ente federado. A ressalva,

que consta também do art. 3º, sequer seria necessária, porquanto decorre da autoadministração dos

Estados-membros, consagrada no art. 25 da CF (1). Já a competência suplementar foi exercida pelo

legislador estadual por meio da LC 156/2010 e das disposições infralegais questionadas.

O ministro assinalou ainda que a Lei 12.020/2009 não foi exaustiva ao especificar peritos —

criminais, médico-legistas e odontolegistas — e não vedou que se lhes equiparassem os cargos de

datiloscopista ou papiloscopista. Informou que a expressão “perito criminal” alberga todos os peritos

oficiais que possuem a incumbência estatal de elucidar crimes e que é possível aventar rol bem mais

amplo de agentes que atuam como peritos oficiais, no qual se insere o auditor da Receita Federal, entre

outros. A exclusão dos servidores públicos papiloscopistas desse rol resultaria no encaminhamento de

suas conclusões a outro perito, muitas vezes sem a expertise necessária para referendar o trabalho.

Salientou, no ponto, que não pode haver qualquer caráter de subordinação de um perito a outro.

Afastou a alegação de usurpação de competência legislativa privativa da União em matéria

processual. Não há falar em interferência das normas estaduais no direito processual penal, porque se trata

de matéria relativa à organização administrativa da polícia civil que em nada altera a qualidade da prova

pericial.

Ademais, destacou que o Código de Processo Penal (CPP) não dispõe a respeito da profissão de

papiloscopista, datiloscopista ou da perícia datiloscópica, tampouco limita ou relaciona quais servidores

investidos de poder legal são considerados peritos oficiais. Além disso, se o próprio CPP admite a

realização de perícia por duas pessoas idôneas, na falta de perito, com maior razão os peritos

papiloscopistas e os datiloscopistas têm aptidão para exercer essas funções e integrar essa categoria.

O ministro observou que, a partir da Lei 11.690/2008, o CPP passou a exigir nível superior

também para o perito oficial, resguardando o exercício daqueles peritos que ingressaram antes da vigência

dessa lei (art. 159). Quanto a esse aspecto, sequer há conflito com o CPP, pois a LC 137/2008 do estado

de Pernambuco já exigia diploma de curso superior para os datiloscopistas policiais.

Verificou inexistir burla à necessidade de concurso público, visto que os papiloscopistas são

peritos oficiais que ingressaram nos quadros do cargo por meio de concurso público, ainda que,

anteriormente, possuíssem outra nomenclatura. Não houve, portanto, provimento derivado de cargo

público.

O relator afastou a arguição de transposição gradativa dos cargos em face do requisito mínimo de

investidura exigível para os peritos oficiais, que é ensino superior com formação específica. Consignou

que a exigência de diploma de curso superior já existia na redação original do art. 11 c/c art. 7º, VIII, da

LC pernambucana 137/2008. Como esses preceitos não foram objeto de impugnação, eventual declaração

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de nulidade dos dispositivos ora atacados restaria inócua para o fim de afastar o alegado provimento

derivado de cargo público.

Por coincidirem os requisitos de investidura, o aproveitamento dos ocupantes de cargos extintos

em cargos recém-criados se condiciona apenas à similitude de suas atribuições. No caso, não restaram

comprovadas as supostas alterações substanciais nas atribuições. De um lado, o art. 3º reserva aos

papiloscopistas as mesmas atividades antes exercidas pelos datiloscopistas, limitando-se a alterar a

denominação do cargo. De outro, o Decreto 39.921/2013 limita-se a descrever as atribuições conferidas a

esses profissionais por disposições legais prévias.

Em conclusão, o ministro Luiz Fux registrou que, independentemente da nomenclatura, os

profissionais exercem atividade específica condizente com o cargo de perito oficial, dado que se dedicam

a colher e analisar impressões deixadas pelas papilas dérmicas de quem haja tido contato com objetos

importantes para a apuração de fatos de relevo criminal.

O ministro Dias Toffoli acompanhou o relator por fundamento diverso e o ministro Alexandre de

Moraes, com a ressalva de entender ser inviável, à luz do regramento previsto na Lei 12.030/2009, o

enquadramento dos peritos papiloscopistas como peritos criminais.

Vencida, parcialmente, a ministra Rosa Weber, que conheceu da ação apenas quanto à lei

complementar pernambucana, e não no que atine aos atos secundários: decreto e portaria.

Vencido o ministro Edson Fachin, que julgou parcialmente procedente o pedido e acolheu a

pretensão de inconstitucionalidade material.

(1) CF: “Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios

desta Constituição. § 1º São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição. § 2º Cabe

aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de

medida provisória para a sua regulamentação. § 3º Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o

planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.”

ADI 5182/PE, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 19.12.2019. (ADI-5182) (Informativo 964,

Plenário)

ADI e revogação superveniente – 2 O Plenário, em conclusão de julgamento, resolveu questão de ordem para julgar prejudicado, por

perda superveniente de objeto, pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade. A ação foi

ajuizada contra decisão administrativa do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, tomada

em 7.12.94, mas posteriormente revogada (Informativo 305).

A decisão impugnada determinou o pagamento, a partir de abril de 1994, do reajuste de 10,94%,

correspondente à diferença entre o resultado da conversão da URV em reais, com base no dia 20 de abril

de 1994, e o obtido na operação de conversão com base no dia 30 do mesmo mês e ano, aos magistrados

da Justiça do Trabalho, inclusive juízes classistas, bem como aos servidores ativos e inativos do Tribunal.

O relator reajustou o voto.

ADI 1244 QO-QO/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.12.2019. (ADI-1244) (Informativo 964,

Plenário)

Quórum e modulação dos efeitos de decisão sem declaração de inconstitucionalidade de ato

normativo O Plenário, por maioria, resolveu questão de ordem suscitada pelo ministro Dias Toffoli

(Presidente) e fixou o quórum de maioria absoluta dos membros da Corte para modular os efeitos de

decisão em julgamento de recursos extraordinários repetitivos, com repercussão geral, nos quais não

tenha havido declaração de inconstitucionalidade de ato normativo.

Vencido, o ministro Marco Aurélio, que divergiu da formulação e do mérito da questão. Entendeu

não ser possível a mesclagem de julgamento da sessão virtual com a presencial. Além disso, não admitiu

a reabertura de julgamento concluído.

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Em seguida, o ministro Dias Toffoli proclamou o resultado do julgamento dos embargos de

declaração, ocorrido na sessão virtual de 11.10.2019 a 17.10.2019: “O Tribunal, por maioria, acolheu

parcialmente os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para reconhecer indevida a cessação

imediata do pagamento dos quintos quando fundado em decisão judicial transitada em julgado, vencida a

Ministra Rosa Weber, que rejeitava os embargos. No ponto relativo ao recebimento dos quintos em

virtude de decisões administrativas, o Tribunal, em razão de voto médio, rejeitou os embargos e,

reconhecendo a ilegitimidade do pagamento dos quintos, modulou os efeitos da decisão de modo que

aqueles que continuam recebendo até a presente data em razão de decisão administrativa tenham o

pagamento mantido até sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores.

Os Ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello proviam os embargos de declaração e modulavam

os efeitos da decisão em maior extensão. Ficaram vencidos, nesse ponto, os Ministros Marco Aurélio e

Rosa Weber. Por fim, o Tribunal, por maioria, também modulou os efeitos da decisão de mérito do

recurso, de modo a garantir que aqueles que continuam recebendo os quintos até a presente data por força

de decisão judicial sem trânsito em julgado tenham o pagamento mantido até sua absorção integral por

quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Rosa

Weber. Tudo nos termos do voto do Relator. Afirmaram suspeição os Ministros Luiz Fux e Roberto

Barroso”.

RE 638115 ED-ED/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 18.12.2019. (RE-638115)

(Informativo 964, Plenário)

Direitos Fundamentais

Suspensão de habilitação e direito ao trabalho É constitucional a imposição da pena de suspensão de habilitação para dirigir veículo automotor ao

motorista profissional condenado por homicídio culposo no trânsito.

Essa foi a tese de repercussão geral (Tema 486) fixada pelo Plenário ao dar provimento a recurso

extraordinário interposto contra acórdão que afastou a pena de suspensão de habilitação, prevista no art.

302 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) (1), aplicada em desfavor do recorrido. O tribunal a quo

reputou que a aplicação dessa sanção ao condenado que exerce profissionalmente a atividade de motorista

seria inconstitucional, por violar o seu direito ao trabalho.

O colegiado asseverou que inexiste direito absoluto ao exercício de atividade profissionais (CF,

art. 5º, XIII), sendo possível que haja restrição imposta pelo legislador, desde que razoável, como no caso.

Além disso, a medida é coerente com o princípio da individualização da pena (CF, art. 5º, XLVI)

e, também, respeita o princípio da proporcionalidade. A suspensão do direito de dirigir não impossibilita

o motorista profissional de extrair seu sustento de qualquer outra atividade econômica.

(1) CTB: “Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: Penas – detenção, de dois a quatro anos, e

suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. § 1º No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) à metade, se o agente: (...) IV - no exercício de sua profissão

ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros.”

RE 607107/MG, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 12.2.2020. (RE-607107) (Informativo

966, Plenário)

Legitimidade

Legitimidade de procuradores para interposição de recurso em ADI A Segunda Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental para, ao dar seguimento a

recurso extraordinário, reconhecer a legitimidade de procuradores para interposição de recursos em ação

direta de inconstitucionalidade (ADI).

O colegiado entendeu que, por ser uma decisão política, somente os legitimados no art. 103 da

Constituição Federal (CF) (1), ou, por simetria, os que previstos em constituição estadual, podem propor

ações diretas de inconstitucionalidade. Ressaltou, entretanto, que os atos de natureza técnica,

subsequentes ao ajuizamento da ação, devem ser empreendidos pelos procuradores da parte legitimada.

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Citou precedente do Supremo Tribunal Federal (STF), no sentido de que recursos em ação direta de

inconstitucionalidade podem até vir assinados pelo legitimado conjuntamente com o procurador, mas que

seria essencial a presença de advogado.

Vencido o ministro Edson Fachin (relator), que votou pelo não provimento do agravo por

considerar que se afigura inadmissível petição recursal assinada apenas por procuradores, sem que tenha

sido subscrita pela parte constitucionalmente legitimada.

(1) CF: “Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I – o

Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa de Assembleia

Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V – o Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI – o Procurador-

Geral da República; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.”

RE 1126828 AgR/SP, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Cármen Lúcia, julgamento

em 4.2.2020. (RE-1126828) (Informativo 965, Segunda Turma)

Organização do Estado

Afastamento de norma e contrariedade à cláusula de reserva de plenário

O afastamento de norma legal por órgão fracionário, de modo a revelar o esvaziamento da eficácia

do preceito, implica contrariedade à cláusula de reserva de plenário e ao Enunciado 10 da Súmula

Vinculante (1).

Com esse entendimento, a Primeira Turma negou provimento a agravo regimental interposto de

decisão monocrática que, ao prover recurso extraordinário, anulou o acórdão recorrido e determinou o

retorno dos autos ao tribunal de origem, a fim de que examine a apelação como entender de direito,

observado o art. 97 da Constituição Federal (CF) (2).

Na espécie, sem obedecer à cláusula de reserva de plenário, órgão fracionário de tribunal afastou a

incidência do artigo 272 do Decreto 2.637/1998, desobrigando a ora agravante de observar o quantitativo

de cigarros por embalagem definido pelo referido decreto, tendo-o como contrário ao princípio da livre

concorrência, versado no art. 170, IV, da CF (3).

O colegiado assinalou que a pretexto de interpretar, o órgão fracionário afastou a aplicação da

norma expressa, em desrespeito ao mencionado verbete.

(1) Enunciado 10 da Súmula Vinculante: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão

fracionário de Tribunal que embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público,

afasta sua incidência, no todo ou em parte.”

(2) CF: “Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.”

(3) CF: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim

assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) IV – livre concorrência;”

RE 635088 AgR-segundo/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 4.2.2020. (RE-635088)

(Informativo 965, Primeira Turma)

Composição de órgão da Administração Pública estadual e participação de representante de

seccional da OAB O Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta, para

declarar a inconstitucionalidade do trecho “e 1 (um) representante da Ordem dos Advogados do Brasil —

Seção RJ” (OAB/RJ) constante do art. 110 da Lei Complementar (LC) 69/1990, com a redação dada pelo

art. 4º da LC 135/2009, ambas do Estado do Rio de Janeiro (1).

O Tribunal depreendeu da leitura do preceito haver caráter impositivo na participação de

representante da OAB/RJ na composição da Corregedoria Tributária do Controle Externo, órgão

colegiado composto por três membros, a serem escolhidos pelo governador.

Aduziu ser possível que chefe do Poder Executivo estadual convide, em consenso com a OAB,

representante desta para integrar órgão da Administração. Entretanto, embora a norma questionada atenda

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a pleito da OAB/RJ, lei estadual não pode impor a presença de representante de autarquia federal em

órgão da Administração Pública local.

Vencidos os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski, que julgaram

a pretensão improcedente. Consideraram inexistir obrigatoriedade, e sim possibilidade de composição

híbrida do órgão por representante da OAB/RJ, por ela própria indicado. O ministro Alexandre de Moraes

reiterou, por fim, tratar-se de seccional, que faz parte da OAB, mas dentro dos limites do Estado-membro.

(1) LC fluminense 69/1990: “Art. 110. Integra a Corregedoria Tributária de Controle Externo num Colegiado composto por

3 (três) membros, sendo 1 (um) escolhido entre Fiscais de Rendas, ativos ou aposentados, 1 (um) entre Procuradores do Estado,

ativos ou aposentados e 1 (um) representante da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção RJ, a serem escolhidos pelo Governador

do Estado, o qual nomeará o Corregedor-Chefe da Corregedoria Tributária de Controle Externo entre aqueles, sendo que as decisões da Corregedoria sobre sindicância e processo administrativo disciplinar serão tomadas por maioria de votos dos membros presentes

do Colegiado.”

ADI 4579/RJ, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 13.2.2020. (ADI-4579) (Informativo 966,

Plenário)

Organização dos Poderes

Ato do CNJ e competência do STF A Primeira Turma decidiu afetar ao Plenário o julgamento de agravo regimental em petição

interposto contra decisão que não conheceu de ação originária e determinou a remessa dos autos ao juízo

de primeiro grau.

No caso, a ação foi ajuizada com o objetivo de desconstituir ato do Conselho Nacional de Justiça

(CNJ) que declarou vaga serventia extrajudicial em razão de o titular não ter sido aprovado em concurso

público.

Pet 4770 AgR/DF, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 17.12.2019. (Pet-4770) (Informativo

964, Primeira Turma)

Atuação de advogado como testemunha e sigilo profissional A Segunda Turma julgou improcedente reclamação ajuizada em face de decisão proferida por juiz

de Direito nos autos de processo em trâmite no juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher,

em que foi determinada audiência de inquirição de testemunhas com o arrolamento de advogado que

atuara no mesmo processo como patrono de sua cliente.

O reclamante alegava desrespeito ao que decidido, pela Turma, no Inq 4.296 AgR.

No ponto, o colegiado esclareceu que o acórdão paradigma manteve decisão monocrática que

autorizava a intimação de advogado para sua oitiva como testemunha no processo, de modo que não há

incompatibilidade com a decisão reclamada.

Em seguida, a Turma, por empate, concedeu habeas corpus de ofício para reconhecer a

inadmissibilidade do testemunho do advogado no processo examinado, declarando a ilicitude do ato e

determinando o desentranhamento da prova considerada inadmissível.

Explicou que, no acórdão paradigma, afirmou-se que, em princípio, a intimação do advogado para

comparecer perante a autoridade não parece em desacordo com a lei, mas ele somente poderia optar por

depor se liberado do sigilo profissional pela cliente anteriormente defendida. Assim, como naquele

momento e nos limites daquela via, inexistia comprovação da manifestação da ex-cliente sobre a questão,

manteve-se a intimação para o depoimento. Ademais, ressaltou-se que eventual invalidade do depoimento

poderia ser apreciada no futuro.

Portanto, assentou-se que o advogado somente poderia optar por depor se liberado do sigilo

profissional por sua ex-cliente. Não foi a situação que envolveu a decisão reclamada, entretanto.

Salientou que, nos termos do art. 7º, XIX, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil

(EOAB), é direito do advogado recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou

deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando

autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional.

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Ademais, o sigilo profissional do advogado, externo ou interno, tal qual o do médico, é ponto

central das normas deontológicas e legais que regulam a profissão.

Desse modo, ainda que se deva estruturar um processo penal efetivo, que tenha meios para

assegurar a investigação e a produção das provas de um modo a possibilitar uma decisão mais informada

possível, existem critérios de admissibilidade de provas que se embasam em premissas fundamentais para

proteção de direitos fundamentais e contenção de abusos.

Caracterizam-se, assim, regras legais de exclusão probatória fundadas em limites lógicos, políticos

e epistemológicos, que restringem de certa maneira a busca pela verdade e a reconstrução dos fatos

passados.

Diante desse quadro, embora o sigilo profissional possa acarretar a supressão de informações

potencialmente pertinentes ao caso, trata-se de premissa fundamental para o exercício efetivo do direito

de defesa, no que diz respeito à defesa técnica.

A relação entre cliente e advogado depende de confiança, para que o réu possa descrever todos os

fatos e elementos pertinentes sem medo de que isso possa ser posteriormente contra ele utilizado.

O sigilo profissional é um direito do indivíduo ao prestar informações ao advogado para o

exercício de sua representação perante os órgãos pertinentes. Desse modo, para que o testemunho possa

ser prestado pelo profissional, faz-se necessário o consentimento válido do interessado direto na

manutenção do segredo.

Portanto, o advogado não pode testemunhar sobre fatos de que tomou conhecimento em razão de

seu ofício, como para o exercício de sua atuação profissional a partir da narração apresentada pelo cliente

e eventuais documentos por ele entregues.

Frisou que, nos termos do art. 25 do EOAB, o sigilo profissional é inerente à profissão, impondo-

se o seu respeito, salvo grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado se veja afrontado

pelo próprio cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo, porém sempre restrito ao interesse da

causa.

Porém, da leitura do caso em exame, depreende-se que o advogado arrolado como testemunha teve

seus poderes como patrono da interessada expressamente revogados, vedando-se sua atuação no caso.

Além disso, requereu-se que devolvesse qualquer documento relacionado ao fato que a ele tivesse sido

entregue.

Evidente, portanto, que a cliente não liberou o advogado do dever de manter o segredo profissional

sobre as informações e documentos de que teve conhecimento em razão da atuação como defensor

técnico.

A ministra Cármen Lúcia e o ministro Edson Fachin não concederam a ordem de ofício.

Rcl 37235/RR. rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 18.2.2020. (Rcl-37235) (Informativo

967, Segunda Turma)

Reclamação

Uso de algemas e fundamentação – 2 A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto

contra decisão que negou seguimento a reclamação em que se requereu a decretação de nulidade de

julgamento do tribunal do júri por inobservância da Súmula Vinculante 11 do Supremo Tribunal Federal

(STF) (1) (Informativo 954).

No caso, durante julgamento em plenário, a juíza de direito presidente do tribunal do júri indeferiu

o pleito da defesa de retirada das algemas do reclamante. Determinou que, excepcionalmente, fosse o

acusado mantido algemado, na forma do que autoriza o referido verbete sumular, tendo em conta ofício

exibido pela escolta do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), o qual justificaria o uso de

algemas. O juízo de origem considerou, ainda, que os policiais federais responsáveis pela escolta, quando

consultados, afirmaram não poder opinar favoravelmente à retirada das algemas sem ferir o procedimento

recomendado pelo órgão a que pertencem, em relação ao réu custodiado em presídio federal de segurança

máxima.

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O tribunal de justiça local, em sede de apelação, afastou a apontada nulidade. Citou o

envolvimento do réu com milícias, bem como seus maus antecedentes e acautelamento em presídio de

segurança máxima.

O colegiado entendeu que a juíza de primeiro grau justificou devidamente a manutenção do uso

das algemas e que todas as circunstâncias fáticas exigiriam que o acusado estivesse algemado. Destacou

que o réu integra milícia, possui extensa folha de antecedentes criminais e foi transferido para presídio de

segurança máxima, em virtude da sua alta periculosidade, além da possibilidade de sua fuga ou de seu

resgate.

O ministro Roberto Barroso ressaltou, sobretudo, o que consignado pelo tribunal de justiça ao

decidir a matéria. Para ele, não se pode desconsiderar o que está nos autos do processo e na decisão do

juízo a quo. Salientou que a questão da periculosidade, ou não, do réu, é assunto de polícia e não de juiz.

Se a polícia informa que o réu é perigoso, o juiz, que, normalmente, entra em contato com o réu pela

primeira vez, tem de confiar na presunção de legitimidade da informação passada pela autoridade policial.

Fora dos casos de abuso patente, é preciso dar credibilidade àquele que tem o encargo de zelar pela

segurança pública, inclusive no âmbito do tribunal.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que proveu o agravo.

(1) Súmula Vinculante 11 do STF: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de

perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena

de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.”

Rcl 32970 AgR/RJ, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 17.12.2019. (Rcl-32970)

(Informativo 964, Primeira Turma)

Subsídio

Subsídio vitalício e pensão por morte de ex-vereador Lei municipal a versar a percepção, mensal e vitalícia, de “subsídio” por ex-vereador e a

consequente pensão em caso de morte não é harmônica com a Constituição Federal de 1988.

Essa é a tese do Tema 672 da Repercussão Geral fixada, por unanimidade, pelo Plenário ao negar

provimento a recurso extraordinário, declarando a não recepção, pela Constituição Federal de 1988, da

Lei 907/1984, do Município de Corumbá.

RE 638307/MS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 19.12.2019. (RE-638307) (Informativo

964, Plenário)

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Direito Financeiro

FUNDEF

Repasses complementares do Fundef e princípio da colegialidade – 2

O Plenário, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto de

decisão monocrática que entendeu ser procedente pedido formulado em ação cível originária, para

reconhecer o direito de Estado-membro a recalcular o valor mínimo nacional por aluno nos anos de 1998

a 2003, para fins de complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) (Informativo 947).

Ao rejeitar o argumento de ofensa ao princípio da colegialidade, sublinhou que o Supremo

Tribunal Federal (STF) reconheceu a infraconstitucionalidade da matéria em debate ao apreciar o RE

636.978 RG (Tema 422), sob a sistemática da repercussão geral. Esse entendimento cumulado com a

análise do assunto realizada sob o regime de recursos repetitivos (REsp 1.101.015), decorrente da

competência jurisdicional de uniformização da legislação federal do Superior Tribunal de Justiça (STJ),

são elementos, por si sós, capazes de ensejar a atuação monocrática sujeita à revisão do colegiado

mediante agravo interno e embargos de declaração.

Ademais, o STF, ao examinar em conjunto as ACOs 648, 660, 669 e 700, estabeleceu diretriz

jurisprudencial convergente com a da decisão impugnada. Na ocasião, foram firmadas as seguintes

orientações: a) o valor da complementação da União ao Fundef deve ser calculado com base no valor

mínimo nacional por aluno extraído da média nacional; e b) a complementação ao Fundef realizada a

partir do valor mínimo anual por aluno fixada em desacordo com a média nacional impõe à União o dever

de suplementação de recursos, mantida a vinculação constitucional a ações de desenvolvimento e

manutenção do ensino.

Naquela oportunidade, a Corte ainda delegou aos ministros relatores a faculdade de decidirem

monocraticamente as demais ações cíveis originárias que tratem da mesma matéria.

O Plenário também aduziu que a jurisprudência do STF propiciou assinalar a ilegalidade do

Decreto 2.264/1997, na medida em que extravasou da delegação legal oriunda do § 1º do art. 6º da Lei

9.424/1996 (1) e das margens de discricionariedade conferidas à Presidência da República, para fixar, em

termos nacionais, o valor mínimo por aluno.

Superado o entendimento de que a controvérsia é infraconstitucional, indicou a possibilidade de

aplicar-se o federalismo de cooperação do inciso III do art. 3º da Constituição Federal (CF) (2) e que veio

vertido no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), nomeadamente no § 4º

(3), incluído pela Emenda Constitucional (EC) 14/1996, ao cuidar da fixação de valor mínimo. Dessa

forma, nenhum aluno do ensino fundamental valerá mais ou menos dependendo de onde estiver no país.

Noutro passo, explicitou que o Tema 416 da repercussão geral (RE 635.347) versa sobre a forma

de pagamento de débito originado de erro no cálculo das verbas a serem repassadas pela União a título de

complementação ao Fundef. Esclareceu que, entretanto, o relator daquele feito não determinou a

suspensão nacional dos processos correlatos ao assunto, como autoriza o art. 1.035, § 5º, do Código de

Processo Civil (CPC).

Vencidos os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, que deram provimento ao agravo e

julgaram improcedente o pedido formulado na ação cível originária; e o ministro Marco Aurélio, que deu

provimento ao agravo para determinar o prosseguimento da ação.

(1) Lei 9.424/1996: “Art. 6º A União complementará os recursos do Fundo a que se refere o art. 1º sempre que, no âmbito

de cada Estado e do Distrito Federal, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. § 1º O valor mínimo anual

por aluno, ressalvado o disposto no § 4º, será fixado por ato do Presidente da República e nunca será inferior à razão entre a previsão da receita total para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental no ano anterior, acrescida do total estimado de

novas matrículas, observado o disposto no art. 2º, § 1º, incisos I e I.”

(2) CF: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;”

(3) ADCT: “Art. 60. Nos dez primeiros anos da promulgação desta Emenda, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios

destinarão não menos de sessenta por cento dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal, à manutenção e

ao desenvolvimento do ensino fundamental, com o objetivo de assegurar a universalização de seu atendimento e a remuneração

condigna do magistério. (...) § 4º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios ajustarão progressivamente, em um prazo

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de cinco anos, suas contribuições ao Fundo, de forma a garantir um valor por aluno correspondente a um padrão mínimo de

qualidade de ensino, definido nacionalmente.”

ACO 701 AgR/AL, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 18.12.2019. (ACO-701) (Informativo

964, Plenário)

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DIREITO PENAL

Extinção da Punibilidade

Prescrição penal e natureza constitucional A Primeira Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental para dar provimento a

recurso extraordinário e afastar o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.

No caso, o acórdão recorrido reconheceu a extinção da punibilidade do réu em decorrência da

prescrição da pretensão punitiva, tendo como marco interruptivo somente a sentença condenatória. A

decisão foi fundada no entendimento de que o acórdão que confirma a condenação, mas majora ou reduz

a pena, não constitui novo marco interruptivo da prescrição.

O colegiado reafirmou entendimento de que o acórdão, mesmo o confirmatório da condenação,

interrompe o curso da prescrição. Ademais, reputou constitucional a matéria atinente ao poder do Estado

na persecução penal, à luz do devido processo legal.

Nesse sentido, o ministro Roberto Barroso salientou que o sistema penal é concebido para proteger

bens jurídicos constitucionalmente relevantes. Portanto, sua mínima efetividade tem fundamento na

Constituição Federal, de modo que a questão debatida nos autos tem natureza igualmente constitucional.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que desproveu o agravo tendo em vista a natureza

infraconstitucional da controvérsia, uma vez que o tema é tratado no Código Penal.

RE 1241683 AgR/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 4.2.2020. (RE-1241683) (Informativo 965, Primeira Turma)

Legislação Penal Especial

Lei 8.137/1990, art. 2º, II: não recolhimento de ICMS declarado e tipicidade – 2

O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS

cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 (1).

Com essa orientação, o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a

recurso ordinário em habeas corpus e revogou a liminar anteriormente concedida (Informativo 963).

Na situação dos autos, sócios e administradores de uma empresa declararam operações de venda

ao Fisco, mas deixaram de recolher o ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de

Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação)

relativamente a diversos períodos. Por três vezes, a empresa aderiu a programas de parcelamentos da

Fazenda estadual, mas não adimpliu as parcelas. Os ora recorrentes foram denunciados pela prática do

delito previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e

contra as relações de consumo, e dá outras providências. Na primeira instância, o juízo os absolveu

sumariamente por considerar a conduta atípica. Em sede de apelação, o tribunal de justiça local afastou a

tese da atipicidade e determinou o regular prosseguimento do processo.

Ato contínuo, a defesa impetrou habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) (HC

399.109). Naquela Corte, a Terceira Seção, por maioria, asseverou ser inviável a absolvição sumária,

notadamente quando a denúncia descreve fato que contém a necessária adequação típica e não há

excludentes de ilicitude. Salientou que eventual dúvida quanto ao dolo de se apropriar deverá ser

esclarecida com a instrução criminal.

Daí a interposição do presente recurso ordinário, no qual se requeria a declaração da ilegalidade do

acórdão do tribunal de justiça, com o objetivo de restabelecer a sentença que os absolvia sumariamente.

Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso (relator), que estabeleceu três premissas, reputadas

importantes no equacionamento da matéria: (i) o Direito Penal deve ser sério, igualitário e moderado; (ii)

o pagamento de tributos é dever fundamental de todo cidadão, na medida em que ocorra o fato gerador e

ele exiba capacidade contributiva; e (iii) o mero inadimplemento tributário não deve ser tido como fato

típico criminal, para que seja reconhecida a tipicidade de determinada conduta impende haver um nível de

reprovabilidade especial que justifique o tratamento mais gravoso.

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Explicitou que o sujeito ativo do crime é o sujeito passivo da obrigação, que, na hipótese do ICMS

próprio, é o comerciante. O objeto do delito é o valor do tributo. No caso, a quantia transferida pelo

consumidor ao comerciante. A utilização dos termos “descontado” e “cobrado” é o ponto central do

dispositivo em apreço. Tributo descontado, não há dúvidas, refere-se aos tributos diretos. Já a expressão

“cobrado” abarca o contribuinte nos tributos indiretos. Portanto, “cobrado” significa o tributo que é

acrescido ao preço da mercadoria, pago pelo consumidor — contribuinte de fato — ao comerciante, que

deve recolhê-lo ao Fisco. O consumidor paga mais caro para que o comerciante recolha o tributo à

Fazenda estadual.

O ministro salientou que o valor do ICMS cobrado em cada operação não integra o patrimônio do

comerciante, que é depositário desse ingresso de caixa. Entendimento coerente com o decidido pelo

Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 574.706 (Tema 69 da repercussão geral), oportunidade na qual

assentado que o ICMS não integra o patrimônio do sujeito passivo e, consequentemente, não compõe a

base de cálculo do PIS e da Cofins.

Dessa maneira, a conduta não equivale a mero inadimplemento tributário, e sim à apropriação

indébita tributária. A censurabilidade está em tomar para si valor que não lhe pertence. Para caracterizar o

tipo penal, a conduta é composta da cobrança do consumidor e do não recolhimento ao Fisco.

Segundo o relator, além da interpretação textual do preceito, a interpretação histórica também

conduz à tipicidade da conduta. Na redação apresentada em substitutivo ao projeto de lei original, tratava-

se, em incisos separados, a hipótese de retenção e não recolhimento e a hipótese de cobrança no preço e

não recolhimento. No texto final aprovado, o dispositivo foi compactado sem a modificação do sentido da

norma. Fundiu os dois incisos em um só e dispôs os termos “descontado”, para o tributo retido na fonte, e

“cobrado”, para o incluído no preço.

De igual modo, a análise do direito comparado reforça essa compreensão. Em outras partes do

mundo, os delitos tributários inclusive são punidos de forma mais severa. O relator lembrou que a

Primeira Turma do STF concedeu pedido de extradição fundado em tipo penal análogo (Ext 1.139) e que

o STF já reconheceu a constitucionalidade do tipo penal em debate (ARE 999.425, Tema 937 da

repercussão geral).

Ao versar sobre a interpretação teleológica, o ministro Roberto Barroso observou que são

financiados, com a arrecadação de tributos, direitos fundamentais, serviços públicos, consecução de

objetivos da República. No País, o ICMS é o tributo mais sonegado e a principal fonte de receita própria

dos Estados-membros da Federação. Logo, é inequívoco o impacto da falta de recolhimento intencional e

reiterado do ICMS sobre o Erário. Considerar crime a apropriação indébita tributária produz impacto

relevante sobre a arrecadação.

Também a livre iniciativa é afetada por essa conduta. Empresas que sistematicamente deixam de

recolher o ICMS colocam-se em situação de vantagem competitiva em relação as que se comportam

corretamente. No mercado de combustíveis, por exemplo, são capazes de alijar os concorrentes que

cumprem suas obrigações.

O relator esclareceu que a oscilação da jurisprudência do STJ, ao afirmar a atipicidade da conduta

adversada, fez com que diversos contribuintes passassem a declarar os valores devidos, sem recolhê-los.

Houve uma “migração” do crime de sonegação para o de apropriação indébita e não é isso que o direito

deseja estimular.

No tocante às consequências do reconhecimento da tipicidade sobre os níveis de encarceramento

no País, aduziu que é virtualmente impossível alguém ser efetivamente preso pelo delito de apropriação

indébita tributária. A pena cominada é baixa, portanto, são cabíveis transação penal, suspensão

condicional do processo e, em caso de condenação, substituição da pena privativa de liberdade por

medidas restritivas de direito. Além disso, é possível a extinção da punibilidade se o sonegador ou quem

tenha se apropriado indevidamente do tributo quitar o que devido.

Assentada a possibilidade do delito em tese, o ministro assinalou que o crime de apropriação

indébita tributária não comporta a modalidade culposa. É imprescindível a demonstração do dolo e não

será todo devedor de ICMS que cometerá o delito. O inadimplente eventual distingue-se do devedor

contumaz. O devedor contumaz faz da inadimplência tributária seu modus operandi.

Por fim, consignou que o dolo da apropriação deve ser apurado na instrução criminal, pelo juiz

natural da causa, a partir de circunstâncias objetivas e factuais, tais como a inadimplência reiterada, a

venda de produtos abaixo do preço de custo, a criação de obstáculos à fiscalização, a utilização de

“laranjas”, a falta de tentativa de regularização de situação fiscal, o encerramento irregular de atividades

com aberturas de outras empresas.

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A ministra Rosa Weber acrescentou que a conduta eleita pelo legislador penal não exige, para sua

perfectibilização, o emprego de fraude ou simulação pelo contribuinte, nem qualquer omissão.

Vencidos os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que deram

provimento ao recurso, por considerarem a conduta atípica. Compreenderam estar-se diante de imputação

criminal pelo mero inadimplemento de dívida fiscal. O ministro Gilmar Mendes salientou que uma

interpretação constitucional do dispositivo deve levar em conta o animus de fraude do agente, sob pena

de fomentar-se uma política criminal arrecadatória. Ademais, inexiste apropriação de tributo devido por

terceiro, pois o tributo é devido pela própria empresa.

(1) Lei 8.137/1990: “Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: (...) II – deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo

ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres

públicos;”

RHC 163334/SC, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 18.12.2019. (RHC-163334)

(Informativo 964, Plenário)

Execução provisória da pena: filho menor e prisão domiciliar – 2 A Segunda Turma, em conclusão e por empate, deu provimento a agravo regimental em habeas

corpus e concedeu parcialmente a ordem para determinar ao juízo de origem que: a) proceda a nova

dosimetria da pena, para aplicar a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 (1),

em patamar a ser fixado motivadamente; e b) analise a possibilidade de abrandamento do regime inicial

de cumprimento da pena e a substituição da reprimenda por medidas restritivas de direitos. Ademais,

concedeu a ordem, de ofício, para revogar a prisão para execução provisória da pena decretada em

desfavor da paciente, e para autorizar o juízo de origem a analisar a eventual necessidade de aplicação de

medidas cautelares diversas (Informativo 940).

No caso, a paciente foi condenada, em regime inicial fechado, pelos crimes previstos nos arts. 33

(tráfico de drogas) e 35 (associação ao tráfico) da Lei 11.343/2006. A impetração sustentou, em suma,

que: a) a paciente foi condenada, pela prática dos crimes de tráfico de drogas e associação ao tráfico, à

pena de oito anos de reclusão, em regime fechado; b) está ausente o animus associativo, de modo que não

pode ser configurado o crime de associação para o tráfico e deve ser aplicado o redutor previsto no art.

33, § 4º, da Lei 11.343/2006; c) o regime mais gravoso foi fixado com base unicamente na hediondez do

delito; d) a paciente possui um filho de nove anos de idade, o que enseja o cumprimento da pena em

prisão domiciliar, em homenagem ao princípio da proteção integral da criança, previsto no art. 227 da

Constituição Federal (CF) (2); e e) a paciente é primária e possui residência fixa e trabalho lícito.

Prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes, que foi acompanhado pelo ministro Ricardo

Lewandowski. Anotou que a paciente foi condenada pelos delitos de tráfico de drogas e associação para o

tráfico juntamente com seu marido, em razão de terem sido encontrados entorpecentes em sua residência.

De acordo com a sentença condenatória, testemunhas apontaram que ela somente seguia as ordens

do marido, em uma relação de dependência. Ademais, a condenação, na medida em que não contemplou

o redutor previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, o fez somente em razão do delito de associação

para o tráfico, muito embora o cenário fosse de relação doméstica, em que a mulher é influenciada a

participar do tráfico. Não há, na hipótese, verdadeira organização criminosa.

A previsão da redução de pena contida no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 tem como

fundamento distinguir o traficante contumaz e profissional daquele iniciante na vida criminosa, bem

como do que se aventura na vida da traficância por motivos que, por vezes, confundem-se com a sua

própria sobrevivência e/ou de sua família. Assim, para legitimar a não aplicação do redutor é essencial

fundamentação corroborada em elementos capazes de afastar um dos requisitos legais, sob pena de

desrespeito ao princípio da individualização da pena e de fundamentação das decisões judiciais.

Nesse sentido, a habitualidade e o pertencimento a organizações criminosas deverão ser

comprovados, não valendo a simples presunção. Não havendo prova nesse sentido, o condenado fará jus à

redução de pena. Em outras palavras, militará em favor do réu a presunção de que é primário e de bons

antecedentes e de que não se dedica a atividades criminosas nem integra organização criminosa. O ônus

da prova, nesse caso, é do Ministério Público.

Assim, considerou preenchidas as condições da aplicação da redução de pena, por se estar diante

de ré primária, com bons antecedentes e sem indicação de pertencimento a organização criminosa.

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O ministro Ricardo Lewandowski destacou, ainda, que ela é mãe de criança menor de 12 anos, que

depende de seus cuidados, o que levaria à aplicação do precedente fixado pela Turma no HC 143.641, por

não se tratar de crime praticado com violência ou grave ameaça, tampouco cometido contra seu filho ou

dependente.

O ministro Edson Fachin (relator) e a ministra Cármen Lúcia votaram pela negativa de provimento

ao agravo.

(1) Lei 11.343/2006: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda,

oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda

que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15

(quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes,

não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”

(2) CF: “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao

respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão.”

HC 154694 AgR/SP, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento

em 4.2.2020. (HC-154694) (Informativo 965, Segunda Turma)

Princípio da Insignificância

Paciente reincidente e absolvição pelo princípio da insignificância A Primeira Turma, por maioria, deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus para

absolver, com base no princípio da insignificância, paciente, que possui antecedentes criminais por crimes

patrimoniais, da acusação de furto de um carrinho de mão avaliado em R$ 20,00 (vinte reais).

Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Luiz Fux, que votaram pelo não provimento do

recurso por entenderem que o furto de objeto de pequeno valor está tipificado no § 2º do art. 155 do CP

(1), de modo que não caberia aplicação do princípio da insignificância ao caso.

(1) CP: “Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: (...) § 2º Se o criminoso é primário, e é de

pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar

somente a pena de multa. ”

RHC 174784/MS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 11.2.2020. (RHC-174784) (Informativo 966, Segunda Turma)

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DIREITO PREVIDENCIÁRIO

Benefícios previdenciários

Art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991: “desaposentação” e “reaposentação”

O Plenário, em conclusão e por maioria, deu parcial provimento a embargos declaratórios em

recursos extraordinários para assentar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, até a

proclamação do resultado deste julgamento. Garantiu, também, o direito daqueles que usufruem de

“desaposentação” ou de “reaposentação” em decorrência de decisão transitada em julgado, até a

proclamação do resultado deste julgamento. Ademais, alterou a tese de repercussão geral (Tema 503),

que ficou assim redigida: “No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode

criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à

'desaposentação' ou à ‘reaposentação’, sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991"

(1).

O tema de fundo diz respeito à possibilidade de reconhecimento da “desaposentação”, consistente

na renúncia a benefício de aposentadoria, com a utilização do tempo de serviço ou contribuição que

fundamentou a prestação previdenciária originária, para a obtenção de benefício mais vantajoso em nova

aposentadoria. Na ocasião, o Plenário decidiu pela inexistência do direito à “desaposentação”

(Informativo 845).

Os embargantes alegaram omissão quanto ao fenômeno da “reaposentação”. Além disso, o

acórdão embargado também não contemplaria a modulação dos efeitos da decisão proferida.

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes. De início, salientou que, por ocasião do

julgamento de mérito, o Plenário fez a distinção entre os institutos da “desaposentação” e da

“reaposentação”, tema amplamente debatido. Ademais, salientou a desnecessidade de repetição dos

valores recebidos de boa-fé. Ressalvou, entretanto, que houve casos de segurados que tiveram o direito à

“desaposentação” e à “reaposentação” reconhecidos por decisões judiciais transitadas em julgado. Nessas

hipóteses, a decisão proferida em recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida deve

preservar o que foi firmado em caráter definitivo pelo Poder Judiciário, em respeito aos princípios da

segurança jurídica e da boa-fé.

Vencidos os ministros Edson Fachin, que acolheu os embargos em maior extensão, para

reconhecer omissão quanto ao fenômeno da “reaposentação” e admitir a possibilidade, desde que

cumpridos seus requisitos; e Marco Aurélio, que acolheu os embargos para prestar esclarecimentos sem

eficácia modificativa, no sentido da devolução dos valores anteriormente percebidos, mesmo que de boa-

fé.

No tocante à necessidade de preservação das decisões transitadas em julgado, ficaram vencidos os

ministros Dias Toffoli (relator), Gilmar Mendes e Luiz Fux, para os quais cabe a impugnação posterior da

coisa julgada inconstitucional. Nesse sentido, se a sentença se firmou com base em entendimento

reputado inconstitucional pelo STF, ela não poderá ser efetivada. Vencido, também, o ministro Marco

Aurélio, que acolheu os embargos apenas para prestar esclarecimentos.

Quanto à fixação do marco temporal do trânsito em julgado, ficaram vencidos os ministros

Alexandre de Moraes, Roberto Barroso e Cármen Lúcia, que consideraram como paradigma a data de

julgamento de mérito dos recursos extraordinários. Vencido, também, o ministro Marco Aurélio, que

acolheu os embargos apenas para prestar esclarecimentos.

Esse mesmo entendimento foi aplicado no julgamento do RE 661256 ED-segundos (Informativo

765).

(1) Lei 8.231/1991: “Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive

em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços: (...) § 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação

alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional,

quando empregado.”

RE 381367 ED/RS, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 6.2.2020. (RE-381367)

RE 827833 ED/SC, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 6.2.2020. (RE-827833) (Informativo 965, Plenário)

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Competência

Servidor público estatutário e competência

O Plenário, por maioria, conheceu de conflito de competência firmado entre a justiça do trabalho e

a justiça comum e declarou a competência da justiça comum para processar e julgar a causa. A demanda

envolve servidor público municipal, admitido mediante concurso, sob o regime da Consolidação das Leis

do Trabalho (CLT).

O colegiado entendeu que o vínculo do servidor com a municipalidade tem natureza jurídico-

administrativa. Trata-se, portanto, de servidor público estatutário, de modo que a justiça competente para

processar e julgar a causa é a comum.

Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator), Edson Fachin, Rosa Weber e Dias Toffoli, que

consideraram competente a justiça do trabalho para julgar o pleito, uma vez que a relação jurídica é

regida pela CLT.

CC 8018/PI, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em

19.12.2019. (CC-8018) (Informativo 964. Plenário)

Honorários Advocatícios

Honorários advocatícios e recursos do Fundef – 2

A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo em que se discutia a

possibilidade de retenção dos honorários advocatícios contratuais do valor a ser recebido por município

em execução de complementação de verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) (Informativo 937).

Na espécie, a União foi condenada a pagar a município as diferenças devidas e não repassadas a

título de complementação da transferência de recursos do Fundef. Na execução, o município requereu o

pagamento dos valores devidos relativos às diferenças e aos honorários de advogados. A União opôs

embargos sob o argumento de excesso de execução e desvinculação das verbas. Os embargos foram

julgados improcedentes, e a União interpôs apelação.

O tribunal regional federal negou provimento ao apelo. No que se refere à alegação de vinculação

do precatório a crédito do Fundo destinado exclusivamente à educação, decidiu que em nada afeta a

exigibilidade da dívida, porquanto descabe vincular judicialmente o valor do precatório a uma finalidade

específica (gasto com educação). A União deve fiscalizar a utilização dos recursos pelos instrumentos de

controle dos quais usualmente se vale nas vias administrativas. Quanto à possibilidade de retenção dos

valores a serem percebidos pelo município a título de honorários contratuais, reputou ser direito do

advogado a retenção, se requerida, mediante a juntada do contrato e antes da expedição do requisitório,

com base no art. 22, § 4º, da Lei 8.906/1994 (1).

No recurso extraordinário, a União alegou que o acórdão recorrido ofende a Constituição Federal

(CF) e, em especial, o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (2).

Prevaleceu o voto do ministro Marco Aurélio (relator) que reputou que a controvérsia está

circunscrita à análise da legislação infraconstitucional. Além disso, entendeu que o acolhimento das

razões recursais depende do reexame de fatos, o que é inviável em sede de recurso extraordinário.

Vencido os ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux, que deram parcial provimento ao agravo

para decotar os valores destinados ao pagamento das despesas com os honorários do montante global da

execução.

O ministro Alexandre de Moraes considerou que os prefeitos não podem contratar advogados

mediante acordos de percentuais das verbas do Fundef para pagamento de honorários, visto que os

recursos não pertencem aos prefeitos e possuem destinação específica. Para o ministro, o desvio é

inadmissível. Rememorou que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar a SL 1.186,

concedeu tutela de urgência para suspender o pagamento de honorários advocatícios com recursos do

Fundef.

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(1) Lei 8.906/1994: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários

convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. (...) § 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu

contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou.”

(2) ADCT: “Art. 60. Até o 14º (décimo quarto) ano a partir da promulgação desta Emenda Constitucional, os Estados, o

Distrito Federal e os Municípios destinarão parte dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento da educação básica e à remuneração condigna dos trabalhadores da educação, respeitadas as

seguintes disposições: (...)”

ARE 1107296 AgR/PE, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 11.2.2020. (ARE-1107296)

(Informativo 966, Primeira Turma)

Processo em geral

Sustentação oral e julgamento iniciado no Plenário Virtual O Plenário, por maioria, deferiu pedidos de sustentação oral no julgamento de ação direta de

inconstitucionalidade deslocado do Plenário Virtual (PV) para o físico.

Na espécie, o julgamento se iniciou no PV. Após o voto do ministro Alexandre de Moraes

(relator), o ministro Edson Fachin pediu vista dos autos. Houve a publicação da ata de julgamento no

Diário da Justiça Eletrônico (DJE) e a devolução do processo em ambiente virtual. Posteriormente, o feito

foi retirado do julgamento virtual e encaminhado para o presencial, em face de pedido de destaque

formulado por ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Prevaleceu o voto do ministro Marco Aurélio, que resolveu questão preliminar quanto à

possibilidade de permitir, no caso, as sustentações orais. Consignou que o julgamento se reinicia com o

deslocamento para a sessão física. Aduziu ainda que, como regra do próprio STF, os advogados somente

têm acesso ao que deliberado na sessão virtual depois de prolatados todos os votos.

A ministra Cármen Lúcia frisou que, na Segunda Turma, também se procede dessa maneira, ou

seja, quando deslocado para o ambiente presencial por destaque, o julgamento recomeça. O ministro

Ricardo Lewandowski salientou que a sustentação oral se insere dentro do direito à ampla defesa

constitucionalmente garantido e é uma prerrogativa do advogado.

Vencidos os ministros Alexandre de Moraes (relator), Luiz Fux e Dias Toffoli, que indeferiram os

pedidos de sustentação oral, porque já proferido voto no PV. O relator sublinhou a existência de prazo

para o requerimento de sustentação oral. O ministro Dias Toffoli, por sua vez, asseverou que as partes

têm até 48 horas, antes do início da sessão, para formular pedido de destaque do julgamento virtual.

ADI 4735/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 6.2.2020. (ADI-4735) (Informativo

965, Plenário)

Reclamação

Reclamação: sistemática da repercussão geral e julgamento de REsp pelo STJ – 3

A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, deu provimento ao agravo regimental para negar

seguimento a reclamação em que se discutia se a decisão do presidente de tribunal regional federal (TRF),

que inadmitiu recurso extraordinário ao reputá-lo prejudicado em face do julgamento de recurso especial,

teria descumprido a autoridade da decisão proferida, por ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), no

AI 816.086 (Informativos 951 e 962).

No caso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em agosto de 2010, deu provimento a recurso

especial (REsp) interposto pela Fazenda Nacional em desfavor dos contribuintes, ora reclamantes. Em

outubro de 2010, o referido AI foi provido pelo respectivo relator para admitir o recurso extraordinário

interposto pelos ora reclamantes e determinar a devolução dos autos ao tribunal de origem, a fim de que,

nele, fosse observado o disposto no art. 543-B e respectivos parágrafos do Código de Processo Civil

vigente à época (CPC/1973) (1). Na ocasião, o relator do AI indicou que a controvérsia jurídica versada

naquele feito coincidiria, em todos os seus aspectos, com a questão constitucional correspondente ao

Tema 311 da repercussão geral. A Fazenda interpôs agravo regimental contra esse ato decisório, o qual

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não foi conhecido. Em agosto de 2015, o presidente do TRF, com fundamento no acórdão do STJ,

declarou o prejuízo do mencionado recurso extraordinário, por superveniente perda de objeto. Contra esse

pronunciamento, foi ajuizada a presente reclamação. Em decisão monocrática, o então relator julgou

procedente a reclamação para cassar a decisão reclamada e determinar que o presidente do TRF

encaminhasse os autos do recurso extraordinário interposto pelos reclamantes a órgão colegiado daquela

corte a fim de que procedesse como entendesse de direito, realizasse ou refutasse juízo de retratação.

Compreendeu estar evidenciado o desrespeito à decisão proferida no aludido AI 816.086, uma vez que a

autoridade reclamada deixou de observar a determinação de que fosse aplicada, ao caso, a sistemática da

repercussão geral. Contra a decisão de procedência da reclamação, a União interpôs o agravo regimental.

A Turma concluiu que, à época, os ora reclamantes não interpuseram o recurso adequado contra a

decisão do presidente do TRF, que inadmitiu o recurso extraordinário em razão de sua prejudicialidade.

Dessa forma, a decisão reclamada do presidente do TRF, prolatada em 28.8.2015, transitou em julgado

antes do ajuizamento da reclamação, ocorrido em 2.8.2016. Como o juízo de admissibilidade recursal

possui natureza declaratória — tem eficácia ex tunc —, impõe-se a aplicação do art. 988, § 5º, CPC/2015,

segundo o qual é inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada

[Enunciado 734 da Súmula do STF (2)]. Em outras palavras, a interposição do recurso inadequado na

origem não operou o efeito recursal obstativo, de sorte que a coisa julgada se consumou antes do

ajuizamento da reclamação.

Além disso, o ato do STF, no qual determinada a devolução dos autos ao Tribunal de origem, para

que fosse observado o disposto no art. 543-B do CPC/1973, seria desprovido de cunho decisório e

eventual equívoco do STF não repristinaria o acórdão substituído pela decisão do STJ.

Vencido o ministro Alexandre de Moraes. Para ele, a decisão reclamada, ao inadmitir o recurso

extraordinário, tornou sem efeito decisão anterior que havia admitido o RE.

(1) CPC/1973: “Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a

análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto

neste artigo. § 1º Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte. § 2º Negada a existência de

repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos. § 3º Julgado o mérito do recurso

extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que

poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. § 4º Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal,

nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada. § 5º O Regimento

Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral.”

(2) Enunciado 734 da Súmula do STF: “Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se

alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal.”

Rcl 24810 AgR/MG, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 11.2.2020. (Rcl-24810) (Informativo 966,

Primeira Turma)

Recurso Extraordinário

Repercussão geral e suspensão nacional – 2 O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento ao agravo regimental

interposto contra decisão proferida nos autos de recurso extraordinário, paradigma de repercussão geral

(Tema 1.016), mediante a qual foi deferido pedido de suspensão nacional dos processos que envolvam

discussão sobre expurgos inflacionários dos planos econômicos em depósitos judiciais (Informativo 951).

O Tribunal manteve a decisão anteriormente proferida que assentava que, reconhecida a

repercussão geral, impende a suspensão do processamento dos feitos pendentes que versem sobre a

questão e tramitem no território nacional.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que deu provimento ao recurso. Para ele, o art. 1.035, § 5º, do

Código de Processo Civil (CPC) (1) confere poder extremado a um julgador. Por essa razão, o dispositivo

carece de razoabilidade, proporcionalidade, além de estar em conflito com a garantia constitucional do

cidadão de livre acesso ao Judiciário. Nesse sentido, o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal (CF) revela

que a lei não pode excluir do Judiciário lesão a direito ou ameaça de lesão a direito. Essa garantia encerra

a tramitação do processo de forma regular numa marcha que visa ao seu desfecho final.

(1) CPC: “Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário

quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo. (...) § 5º Reconhecida a

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repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos

pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional.”

RE 1141156 AgR/RJ, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 19.12.2019. (RE-1141156)

(Informativo 964, Plenário)

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

Colaboração Premiada

Colaboração premiada e exercício do direito de defesa – 2 A Segunda Turma, em conclusão de julgamento, deu provimento a agravo regimental para julgar

parcialmente procedente reclamação a fim de assegurar ao delatado o acesso às declarações prestadas por

colaboradores que o incriminem, já documentadas e que não se refiram à diligência em andamento que

possa ser prejudicada.

Nesta assentada, o ministro Ricardo Lewandowski (relator) reajustou o voto anteriormente

proferido (Informativo 937).

Inicialmente, o colegiado conheceu da reclamação. Embora seja meio de obtenção de prova, a

colaboração premiada é fenômeno complexo a envolver diversos atos com naturezas jurídicas distintas.

Em conjunto com o acordo, há elementos de prova relevantes ao exercício do direito de defesa e do

contraditório.

Em seguida, registrou que o terceiro delatado por corréu, em termo de colaboração premiada, tem

direito de ter acesso aos trechos nos quais citado, com fundamento no Enunciado 14 da Súmula

Vinculante (1). À luz do referido verbete, o acesso deve ser franqueado caso estejam presentes dois

requisitos. Um, positivo: o ato de colaboração deve apontar a responsabilidade criminal do requerente

(Inq 3.983). Outro, negativo: o ato de colaboração não deve referir-se à diligência em andamento (Rcl

24.116).

Isso porque a leitura do § 2º do art. 7° da Lei 12.850/2013 determina que, antes mesmo da retirada

do sigilo, será assegurado ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova

que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial,

ressalvados os referentes às diligências em andamento.

Com efeito, a jurisprudência da Segunda Turma garante o acesso a todos os elementos de prova

documentados nos autos dos acordos de colaboração, incluídas as gravações audiovisuais dos atos de

colaboração de corréus, com o escopo de confrontá-los, e não para impugnar os termos dos acordos

propriamente ditos (Rcl 21.258 AgR).

(1) Enunciado 14 da Súmula Vinculante: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos

elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia

judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.”

Rcl 30742 AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 4.2.2020. (Rcl-30742)

(Informativo 965, Segunda Turma)

Competência

Inquérito: declínio de competência e não encerramento de instrução processual – 2

Em conclusão de julgamento, a Segunda Turma negou provimento a agravo regimental interposto

de decisão proferida nos autos de inquérito, por meio da qual se declinou da competência para o

processamento e o julgamento do feito, com a consequente remessa ao Superior Tribunal de Justiça

(STJ).

O agravante sustentava a supressão do direito de recorribilidade em face da ordem de envio

imediato dos autos ao STJ sem que fosse aguardado o decurso do prazo recursal para defesa. Afirmava,

ainda, a necessidade da manutenção da competência no Supremo Tribunal Federal (STF) ao menos até o

oferecimento da denúncia, em função do avanço e da iminência do término das apurações,

supervisionadas, no âmbito desta Corte, há mais de cinco anos (Informativo 918).

O colegiado reafirmou a incompetência do STF para processar e julgar o feito. Inicialmente,

observou que a decisão recorrida atendeu às regras de publicidade impostas ao estabelecer a ciência

formal às partes, embora tenha determinado a imediata remessa do feito ao STJ.

Além disso, esclareceu ter sido cancelado o ato cartorário que, de forma equivocada, certificou o

decurso do prazo recursal. Como resultado das providências adotadas, assegurou-se ao investigado o

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exercício do direito de defesa e do contraditório por meio da interposição de recurso contra o declínio de

competência, o qual, no entanto, não possui efeito suspensivo, nos termos do art. 317, § 4º, do

Regimento Interno do STF (RISTF) (1).

Ato contínuo, assinalou inexistir prejuízo ao agravante, pois a determinação da imediata remessa

dos autos do inquérito ao juízo destinatário está em consonância com o novel entendimento do Plenário

firmado no julgamento da AP 937 QO. Nesse precedente, o STF resolveu questão de ordem no sentido

de fixar as seguintes teses: (i) o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos

durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) após o final da instrução

processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a

competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir

a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo, com o entendimento de

que essa nova linha interpretativa deve aplicar-se imediatamente aos processos em curso, ressalvados

todos os atos praticados e decisões proferidas pelo STF e pelos demais juízos com base na

jurisprudência anterior, conforme precedente firmado no Inq 687 QO.

A Turma asseverou que a pretensão do agravante foge aos parâmetros estabelecidos na AP 937

QO para auferir a prorrogação da jurisdição do STF, haja vista que o avançar das apurações deflagradas

no inquérito não detém, de modo algum, a potencialidade de interferir no declínio de competência

realizado.

Apesar da efetiva evolução das investigações, sob a supervisão do STF, não houve imputação

criminal formalizada pelo titular da ação penal contra o agravante nem encerramento da instrução

processual penal. Logo, o marco temporal relativo à data de apresentação das razões finais não foi

alcançado.

O ministro Gilmar Mendes complementou que a Corte tem entendido pela possibilidade de

imediata remessa dos autos às instâncias competentes, inclusive antes da publicação do acórdão ou do

trânsito em julgado, quando constatado o risco de prescrição. Na espécie, os fatos remontam a 2010,

razão pela qual a determinação da remessa imediata demonstra-se adequada para evitar a ocorrência de

prescrição antes do fim das investigações.

(1) RISTF: “Art. 317. Ressalvadas as exceções previstas neste Regimento, caberá agravo regimental, no prazo de cinco

dias de decisão do Presidente do Tribunal, de Presidente de Turma ou do Relator, que causar prejuízo ao direito da parte. (...) § 4º O agravo regimental não terá efeito suspensivo.”

Pet 7716 AgR/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 18.2.2020. (Pet-7716) (Informativo

967, Segunda Turma)

Dosimetria da Pena

Ações penais em andamento e causa de diminuição da pena A Primeira Turma deferiu habeas corpus para determinar a aplicação da causa de diminuição de

pena, prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 (1), a paciente condenada pelo crime de tráfico de

drogas, não obstante a existência de outra ação penal, pela prática do mesmo delito, ainda não transitada

em julgado.

O colegiado entendeu, com base no decidido no julgamento do RE 591.054, submetido à

sistemática de repercussão geral (Tema 129), que a existência de inquéritos policiais e processos

criminais sem trânsito em julgado não podem ser considerados como maus antecedentes para fins de

dosimetria da pena, de modo que o fato de a paciente ser ré em outra ação penal, ainda em curso, não

constitui fundamento idôneo para afastar a aplicação da causa de diminuição da pena.

(1) Lei 11.343/2006: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda,

oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena — reclusão de 5 (cinco) a 15

(quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no §

1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”

HC 173806/MG, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 18.2.2020. (HC-173806) (Informativo

967, Primeira Turma)

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31

Habeas Corpus

Transação penal e perda de objeto de habeas corpus A realização de acordo de transação penal não enseja a perda de objeto de habeas corpus

anteriormente impetrado.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma concedeu a ordem de habeas corpus para

determinar que o tribunal de justiça analise o mérito da impetração lá formulada.

No caso, de acordo com a inicial acusatória, o paciente foi denunciado pela prática de lesão

corporal culposa, com pedido de reparação de danos, por ter agido de forma negligente e descumprido as

regras técnicas de sua profissão.

Após o recebimento da denúncia, o Ministério Público ofereceu transação penal, medida aceita

pelo paciente.

A defesa, no entanto, já havia impetrado habeas corpus no tribunal, apontando a inépcia da

denúncia e a ausência de justa causa para a ação penal. Todavia, em razão da celebração do referido

acordo, o habeas corpus foi julgado prejudicado.

No presente writ, a defesa alega que o habeas corpus impetrado na origem deveria ter sido

conhecido, pois remanesce o interesse na apreciação das teses de inépcia da denúncia e de ausência de

justa causa, mesmo tendo sido celebrado o acordo de transação penal.

A Turma afirmou que, em razão dos riscos e problemas inerentes ao sistema negocial, o controle

realizado pelo julgador deve também abranger certa verificação sobre a legitimidade da persecução penal,

visto que o Estado não pode autorizar a imposição de uma pena em situações ilegítimas, como, por

exemplo, em quadros de manifesta atipicidade da conduta ou extinção da punibilidade do imputado.

Assim, não se pode permitir que o aceite à transação penal inviabilize o questionamento judicial à

persecução penal. Ou seja, não se pode aceitar que um habeas corpus, que, entre outros requerimentos,

aponta a atipicidade da conduta, seja declarado prejudicado em razão do aceite à barganha penal.

Ainda que os acordos penais pressuponham, corretamente, a voluntariedade do réu, ou seja, a sua

vontade não coagida no sentido de aceitar a imposição da pena proposta, há relevantes críticas ao sistema

de justiça negocial, em razão de possíveis abusos que viciam a voluntariedade do réu e podem ocasionar,

inclusive, o aceite ao acordo por pessoas inocentes.

Assinalou que se potencializa o risco de um cenário de pressões e coerções, que pode ocasionar a

fragilização da voluntariedade, o que, muitas vezes, não é devidamente analisado pelo Judiciário, se

ausente um mecanismo de devido controle do acordo.

Embora o sistema penal negocial possa acarretar aprimoramentos positivos em certas hipóteses, a

barganha no processo penal inevitavelmente gera riscos consideráveis aos direitos fundamentais do

imputado e deve ser estruturada de modo limitado, para evitar a imposição de penas pelo Estado de forma

ilegítima.

Nesse sentido, o controle judicial sobre o acordo é medida fundamental para a proteção efetiva de

direitos fundamentais, de modo a se autorizar o exercício do poder punitivo estatal somente em casos

legítimos para tanto. Deve-se, então, assentar a abrangência e os critérios para tal juízo de homologação

da barganha penal.

Ainda que o réu se conforme com a acusação e aceite a imposição da pena com o benefício

proposto, não se pode aceitar que o poder punitivo estatal seja exercido sem o devido controle judicial.

Por isso, em todos os casos, tanto em colaboração premiada como em transação penal ou suspensão

condicional do processo há a submissão para homologação judicial.

O controle judicial não pode ser meramente formal e mecânico, ao passo que a imposição de uma

pena pelo Estado, ainda que consentida pelo imputado, deve ocorrer de modo legítimo e em conformidade

com os direitos fundamentais previstos constitucional e convencionalmente.

Por óbvio, tal análise se dará de modo compatível com o momento em que ocorre e os limites

cognitivos da fase preliminar da persecução penal. Ou seja, não se espera que o julgador busque

fundamentar sua decisão em provas além de qualquer dúvida razoável, o que seria necessário para uma

sentença condenatória ao final do processo regular.

Contudo, na homologação do acordo penal, como a transação penal, o julgador precisa realizar

controle sobre a legitimidade da persecução penal, de modo que casos de manifesta atipicidade da

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conduta narrada, extinção da punibilidade do imputado ou evidente inviabilidade da denúncia por

ausência de justa causa acarretem a não homologação da proposta.

Pela própria lógica da legislação atual, a transação penal somente pode ser oferecida se não for

caso de arquivamento, ou seja, se houver potencial oferecimento de denúncia apta a ensejar o início do

processo penal. Não se pode admitir que a transação penal possa impor obrigações a imputado que nem

poderia ser submetido à persecução penal por ausência de justa causa ou atipicidade da conduta, por

exemplo.

A celebração do acordo, por si só, não afasta o interesse do imputado no habeas corpus.

Primeiramente, o descumprimento das cláusulas da transação penal permite o prosseguimento do

processo. Além disso, a transação penal somente pode ser oferecida uma vez a cada cinco anos, de

maneira a demonstrar interesse do paciente em sua desconstituição, por meio de eventual concessão da

ordem para o trancamento do processo. Por fim, inexiste qualquer disposição legal que imponha a

desistência a recursos ou ações em andamento, tampouco determine a renúncia ao direito de acesso à

Justiça.

A Turma registrou que, conquanto a Lei 9.099/1995 determine seja a transação ofertada antes da

denúncia, o que, em tese, significaria ausência de ação, neste caso concreto, a denúncia havia sido

oferecida e recebida pelo Juízo de origem, de modo a ensejar pretensão legítima a buscar o trancamento

do processo, ainda que se tenha anulado o ato precursor do processo.

Concluiu que, ainda que o cenário fosse diverso, o habeas corpus é meio legítimo para impugnar

a imposição de pena pelo Estado, em casos de manifesta ilegalidade. O ato de homologação do acordo é

momento em que o juiz de primeiro grau deve realizar o controle sobre a sua legalidade e a legitimidade

da potencial persecução penal. Portanto, tal ato igualmente pode ser objeto de habeas corpus para o

controle por tribunal superior.

O ministro Edson Fachin concedeu a ordem por outro fundamento. Pontuou que o habeas corpus

anteriormente impetrado não pode ser implicitamente afetado por uma transação penal sem cláusula geral

de renúncia.

HC 176785/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 17.12.2019. (HC-176785) (Informativo

964, Segunda Turma)

Prisão domiciliar: condenada com filho menor e decisão transitada em julgado

A Primeira Turma denegou habeas corpus em que se requeria a prisão domiciliar de condenada

pela prática de homicídio por decisão transitada em julgado, que tem filho com menos de doze anos de

idade.

Na espécie, a defesa sustentou a adequação da prisão domiciliar. Reportou-se ao HC 143.641, no

qual concedida a ordem em favor de todas as mulheres presas preventivamente que ostentem a condição

de gestantes, de puérperas ou de mães de crianças sob sua responsabilidade.

Prevaleceu o voto do ministro Marco Aurélio (relator), que reiterou a óptica veiculada ao indeferir

medida acauteladora. Nesse sentido, o disposto no art. 318 do Código de Processo Penal (CPP) (1) tem

aplicação em casos de prisão preventiva, sendo inadequado quando se trata de execução de título

condenatório alcançado pela preclusão maior.

O relator observou que, para ter-se a incidência do art. 117 da Lei 7.210/1984 [Lei de Execução

Penal (LEP)] (2) — cumprimento da sanção em regime domiciliar —, é indispensável o enquadramento

em uma das situações jurídicas nele contempladas. Apesar de comprovada a existência de filho menor, a

paciente foi condenada à pena de 26 anos em regime fechado. Portanto, não está atendido o requisito

primeiro de tratar-se de réu beneficiário de regime aberto.

(1) CPP: “Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: I – maior de 80

(oitenta) anos; II – extremamente debilitado por motivo de doença grave; III – imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV – gestante; V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade

incompletos; VI – homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.

Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.” (2) LEP: “Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando

se tratar de: I – condenado maior de 70 (setenta) anos; II – condenado acometido de doença grave; III – condenada com filho menor

ou deficiente físico ou mental; IV - condenada gestante.”

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HC 177164/PA, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 18.2.2020. (HC-177164) (Informativo

967, Primeira Turma)

Inquérito

Súmula Vinculante 14 e direito à intimidade A Primeira Turma, por maioria, negou provimento a agravo regimental em reclamação em que

discutida suposta afronta à Súmula Vinculante 14 do Supremo Tribunal Federal (STF) (1), em virtude de

a defesa do interessado não haver obtido acesso amplo e irrestrito aos elementos de prova já

documentados em inquérito policial, instaurado para apurar a prática de crime de lavagem de dinheiro por

diversos agentes.

No caso, a decisão agravada se baseou nas seguintes premissas: a) a investigação ocorre em

segredo de justiça; e b) o Relatório de Inteligência Financeira do Coaf (ao qual se pretende acesso

integral) menciona outros investigados, além do interessado. Desse modo, foi deferido o pedido do

reclamante quanto à extração de cópias do inquérito, com exceção de eventuais peças protegidas pelo

segredo de justiça, especialmente o relatório do Coaf, no que diz respeito a dados de terceiros.

A Turma ressaltou que o direito à privacidade e à intimidade é assegurado constitucionalmente, e

que é excessivo o acesso de um dos investigados a informações, de caráter privado de diversas pessoas,

que não dizem respeito ao direito de defesa dele, sob pretexto de obediência à Súmula Vinculante 14.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que proveu o agravo. Entendeu que o relatório do Coaf é um

documento único, e o reclamante está envolvido no episódio contido nesse documento. A Súmula

Vinculante 14 não faz distinção quanto aos documentos passíveis de acesso pela parte interessada,

exigindo apenas que estejam encartados nos autos.

(1) Sumula Vinculante 14 do STF: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de

prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam

respeito ao exercício do direito de defesa.”

Rcl 25872 AgR-AgR/SP, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 17.12.2019. (Rcl-25872)

(Informativo 964, Primeira Turma)

Inquérito Policial

Inquérito policial: declinação da competência para a Justiça estadual e condução pela

Polícia Federal A Primeira Turma indeferiu habeas corpus em que se buscava, dentre outras providências, o

reconhecimento da nulidade de todos os atos judiciais decorrentes de investigações conduzidas pela

Polícia Federal relativas a supostas infrações atribuídas ao paciente.

A defesa afirmava não configurada hipótese de atribuição da autoridade da Polícia Federal que

conduziu os inquéritos. Para tanto, reportou-se à Lei 10.446/2002, que versa sobre a atuação desse órgão

na repressão de crimes com repercussão interestadual ou internacional. Diziam configurado abuso na

atuação da referida autoridade e aludiam ao posterior afastamento do delegado federal responsável pelas

investigações.

O colegiado observou que o procedimento foi inicialmente instaurado pela Polícia Federal e

decorreu de requisição do Parquet correspondente, sendo destinado a investigar suposta prática de

crimes, em tese, afetos à competência da Justiça Federal. O declínio da competência para a Justiça

estadual, ante indícios da prática de delitos a ela sujeitos, a resultar na definição do juízo criminal de

determinada comarca, revela ter-se observado o figurino legal.

O inquérito policial constitui procedimento administrativo, de caráter meramente informativo e

não obrigatório à regular instauração do processo-crime. Visa subsidiar eventual denúncia a ser

apresentada, razão pela qual irregularidades ocorridas não implicam, de regra, nulidade de processo-

crime.

Uma vez supervisionados pelo juízo competente e por membro do Ministério Público revestido de

atribuição, pouco importa que os procedimentos investigatórios atinentes à operação desencadeada

tenham sido presididos por autoridade de Polícia Federal. O art. 5º, LIII, da Constituição da República, ao

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dispor que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, contempla o

princípio do juiz natural, não se estende às autoridades policiais, porquanto não investidas de competência

para julgar. Surge inadequado pretender-se a anulação de provas ou de processos em tramitação com base

na ausência de atribuição da Polícia Federal para conduzir os inquéritos.

A desconformidade da atuação da Polícia Federal com as disposições da Lei 10.446/2002 e

eventuais abusos cometidos por autoridade policial podem implicar responsabilidade no âmbito

administrativo ou criminal dos agentes. No caso, por não apresentarem qualquer repercussão no tocante à

validade jurídica das provas obtidas, não se mostram passíveis de caracterizar nulidade.

HC 169348/RS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 17.12.2019. (HC-169348) (Informativo

964, Primeira Turma)

Nulidades e Recursos em geral

HC: cabimento e ato de ministro do STF – 2 O Plenário, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto de

decisão denegatória de habeas corpus, impetrado contra ato do ministro Edson Fachin, relator da AC

4.388, que determinou a prisão preventiva do paciente (Informativo 951).

O colegiado esclareceu ter sido aplicada a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal

(STF) no sentido do não cabimento de habeas corpus com fundamento, por analogia, no Enunciado 606

da Súmula do STF (1).

O ministro Dias Toffoli destacou existirem propostas de alteração do RISTF, no sentido de

regulamentar o tema, uma vez que qualquer ato de ministro do STF é passível de revisão pelo colegiado,

por meio de agravo. Entretanto, pode haver situações urgentes decorrentes de atos abusivos (o caso

concreto não é uma delas), que podem implicar eventual impetração.

Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que deram provimento ao agravo.

(1) Enunciado 606: “Não cabe habeas corpus originário para o Tribunal Pleno de decisão de Turma, ou do Plenário,

proferida em habeas corpus ou no respectivo recurso.”

HC 162285 AgR/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 19.12.2019. (HC-162285)

(Informativo 964, Plenário)

HC: execução provisória e art. 312 do CPP A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão

monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça; revogou a medida cautelar anteriormente

deferida e concedeu a ordem, de ofício, para que o tribunal de origem verifique os requisitos do art. 312

do Código de Processo Penal (CPP) (1).

Na situação dos autos, o tribunal a quo determinou o início imediato do cumprimento das penas

impostas ao ora paciente, pois, à época, o Supremo Tribunal Federal entendia ser possível a execução

provisória.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para

afastar a execução provisória dos títulos condenatórios.

(1) CPP: “Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por

conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício

suficiente de autoria. Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º).”

HC 175405/PR, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento

em 17.12.2019. (HC-175405) (Informativo 964, Primeira Turma)

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HC: execução provisória e tribunal do júri A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão

monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça e revogou a medida cautelar anteriormente

deferida.

Na situação dos autos, o tribunal a quo determinou o início imediato do cumprimento da pena

imposta ao ora paciente, pois, à época, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendia ser possível a

execução provisória.

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que ponderou não ser hipótese de concessão

da ordem de ofício. Isso, porque o paciente foi julgado pelo tribunal do júri e, no exame do recurso,

mantida a condenação por homicídio qualificado. O ministro observou que a questão específica do júri

será apreciada pelo STF em repercussão geral.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para

afastar a execução provisória do título condenatório.

HC 175808/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento

em 17.12.2019. (HC-175808) (Informativo 964, Primeira Turma)

HC: execução provisória e art. 319 do CPP A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão

monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça; revogou a medida cautelar anteriormente

deferida e concedeu a ordem, de ofício, para que o tribunal de origem verifique os requisitos do art. 319

do Código de Processo Penal (CPP) (1).

Na situação dos autos, o tribunal a quo ordenou a execução provisória da pena imposta ao ora

paciente.

A Turma determinou que seja analisado se é caso de aplicação de medidas cautelares diversas da

prisão (CPP, art. 319), haja vista o paciente ter sido condenado em regime semiaberto.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para que

o paciente aguardasse, em liberdade, o trânsito em julgado do título condenatório.

(1) CPP: “Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas

condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares

quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de

novas infrações; III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente

ou necessária para a investigação ou instrução; V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o

investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII – internação provisória

do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou

semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX – monitoração eletrônica. § 1º (Revogado). § 2º (Revogado). § 3º (Revogado). § 4º A fiança será aplicada de acordo com as

disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.”

HC 175841/SC, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento

em 17.12.2019. (HC-175841) (Informativo 964, Primeira Turma)

HC: execução provisória e prisão preventiva A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão

monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça e revogou a medida cautelar anteriormente

deferida.

Na situação dos autos, o tribunal a quo determinou a execução provisória da pena de 22 anos de

reclusão, cominada ao ora paciente.

O colegiado observou que o juiz de piso decretou a prisão preventiva do acusado e, depois, vedou-

lhe o direito de recorrer em liberdade. Além disso, o tribunal de origem, apesar de ordenar a execução

provisória, repetiu a necessidade de garantia da ordem pública.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para

afastar a execução provisória do título condenatório.

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HC 176723/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 17.12.2019. (HC-176723) (Informativo 964, Primeira Turma)

Prova

Crime de incêndio e fonte de prova A Primeira Turma indeferiu a ordem em habeas corpus impetrado em favor de condenado pela

prática do delito descrito no art. 250, § 1º, I, do Código Penal (CP) (1) (causar incêndio com o intuito de

obter vantagem pecuniária).

A sentença condenatória registrou que a inércia do paciente em comunicar, oportunamente, a

ocorrência à autoridade policial inviabilizou a confecção da perícia pelo Instituto de Criminalística, ante o

desaparecimento dos vestígios da infração.

De acordo com a defesa, o título condenatório seria ilegal, pois fundado em prova inidônea. Nesse

sentido, o laudo elaborado por seguradora (vítima) não poderia ter sido utilizado como fonte probatória,

mas apenas o exame de corpo de delito. Além disso, a suposta desídia do paciente em comunicar a

ocorrência à autoridade policial não teria valor probatório.

O colegiado afirmou que o laudo elaborado de forma unilateral não constitui prova pericial, mas

documental, razão pela qual a validade como elemento de convicção não se submete à observância dos

requisitos previstos nos arts. 158 e seguintes do Código de Processo Penal (CPP). Assim, o laudo

produzido pela empresa seguradora vítima, por não se qualificar como perícia, não consubstancia prova

ilícita, surgindo passível de ser valorado pelo Juízo.

A materialidade do delito versado no art. 250, § 1º, I, do CP, cuja prática deixa vestígios, há de ser

comprovada, em regra, mediante exame de corpo de delito. Nos termos do art. 167 do CPP (2),

constatado o desaparecimento dos vestígios, mostra-se viável suprir a realização de exame por outros

meios de prova.

O paciente, orientado pelo Corpo de Bombeiros a registrar, imediatamente, ocorrência policial e

solicitar perícia técnica ao Instituto de Criminalística, permaneceu inerte durante sete dias. A não

elaboração de perícia oficial deu-se ante o desaparecimento dos vestígios do crime, considerada a demora

em registrar a ocorrência e a falta de preservação do local, tendo sido a materialidade do delito revelada

pela prova testemunhal, corroborada por cópias da apólice do seguro, aviso de sinistro, ocorrência

policial, relatório de regulação de sinistros, fotografias, laudos de averiguação e exame pericial. Levando

em conta a justificada inviabilidade da elaboração do exame de corpo de delito e a demonstração da

materialidade do crime por outros meios de prova, a incidência do previsto no art. 167 do CPP mostrou-se

adequada.

Também improcede a alegação de ter sido atribuído valor probatório à omissão do paciente em

proceder, oportunamente, ao registro da ocorrência. O fato de a impossibilidade da realização do exame

de prova pericial decorrer da inércia não significa haver-se apenado o comportamento omissivo. A

inexistência de obrigação legal de o paciente, em momento oportuno, comunicar a ocorrência à

autoridade policial não implica a inadmissibilidade processual de outros meios de prova que, produzidos

legitimamente, revelem a materialidade e a autoria do crime imputado.

(1) CP/1940: “Art. 250 - Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem: Pena -

reclusão, de três a seis anos, e multa. § 1º — As penas aumentam-se de um terço: I — se o crime é cometido com intuito de obter

vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio;” (2) CPP/1941: “Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova

testemunhal poderá suprir-lhe a falta.”

HC 136964/RS, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 18.2.2020. (HC-136964) (Informativo

967, Primeira Turma)

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DIREITO TRIBUTÁRIO

Imunidades Tributárias

Entidades beneficentes de assistência social e imunidade – 10 O Plenário, em conclusão e por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração para,

sanar os vícios identificados e, dessa forma, assentar a constitucionalidade do art. 55, II, da Lei

8.212/1991, na redação original e nas redações que lhe foram dadas pelo art. 5º da Lei 9.429/1996 e pelo

art. 3º da Medida Provisória 2.187-13/2001.

Além disso, a fim de evitar ambiguidades, o Tribunal conferiu à tese relativa ao Tema 32 da

repercussão geral a seguinte formulação: “A lei complementar é forma exigível para a definição do modo

beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF (1),

especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas” (Informativos

749, 844, 855, 914 e 938).

No caso, a embargante apontou obscuridade no acordão embargado e excessiva abrangência da

tese de repercussão geral no sentido de considerar que os requisitos para o gozo de imunidade tributária

devem estar previstos em lei complementar. Para ela, a tese de repercussão geral deveria se restringir ao

referido artigo declarado inconstitucional. Alegou, ainda, que o acordão e a tese fixada estavam em

conflito com o que foi decidido nas ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621, convertidas em arguições de

descumprimento de preceito fundamental, julgadas simultaneamente e em conjunto.

O colegiado ressaltou que, no julgamento em conjunto das quatro ações, de um lado, e do recurso

extraordinário, de outro, foram assentadas, a partir das mesmas manifestações, teses jurídicas

contraditórias.

Explicou que, nos acórdãos das ações objetivas, ficou consignado que aspectos meramente

procedimentais referentes à certificação, à fiscalização e ao controle administrativo são passíveis de

definição em lei ordinária, mas que é necessária a lei complementar para a definição do modo beneficente

de atuação das entidades de assistência social previstas no art. 195, § 7º, da Constituição Federal (CF),

principalmente no que diz respeito à instituição de contrapartidas a que elas devem atender.

Ocorre que, a partir das mesmas manifestações dos integrantes do colegiado, na mesma sessão de

julgamento, restou estampada, no acórdão do recurso extraordinário, a tese sugestiva de que toda e

qualquer normatização relativa às entidades beneficentes de assistência social, até mesmo sobre aspectos

meramente procedimentais, há de ser veiculada mediante lei complementar.

Dessa forma, ainda que sejam convergentes os resultados processuais imediatos – o provimento do

recurso extraordinário e a declaração de inconstitucionalidade dos preceitos impugnados nas ações

objetivas –, há efetivamente duas teses jurídicas de fundo concorrendo entre si. Não obstante ambas as

teses conduzirem ao mesmo resultado processual nos casos sob exame, é de fundamental importância a

definição do entendimento do colegiado sobre a seguinte questão: se há ou não espaço de conformação

para a lei ordinária no tocante a aspectos procedimentais.

Da leitura dos votos proferidos no julgamento embargado, é possível concluir que a maioria do

colegiado reconhece a necessidade de lei complementar para a caracterização das imunidades

propriamente ditas, admitindo, contudo, que questões procedimentais sejam regradas mediante legislação

ordinária.

Na condição de limitações constitucionais ao poder de tributar, as imunidades tributárias

consagradas na CF asseguram direitos que se incorporam ao patrimônio jurídico-constitucional dos

contribuintes. Assim, o emprego da expressão “são isentas”, no art. 195, § 7º, da CF, não tem o condão de

descaracterizar a natureza imunizante da desoneração tributária nele consagrada. Não há dúvida, portanto,

sobre a convicção de que a delimitação do campo semântico abarcado pelo conceito constitucional de

“entidades beneficentes de assistência social”, por inerente ao campo das imunidades tributárias, sujeita-

se à regra de reserva de lei complementar, consoante disposto no art. 146, II, da CF (2).

O Tribunal sublinhou, também, ser preciso definir a norma incidente à espécie, à luz do

enquadramento constitucional: se o art. 14 do Código Tributário Nacional (CTN) ou o art. 55 da Lei

8.212/1991.

Pontuou que, tal como redigida, a tese original de repercussão geral aprovada nos autos do RE

566.622 sugeria a inexistência de qualquer espaço normativo que pudesse ser integrado por legislação

ordinária, o que não se extraiu do cômputo dos votos proferidos. Por essa razão, foi apresentada nova

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formulação que melhor espelha o quanto decidido pelo Plenário e vai ao encontro de recente decisão da

Corte (ADI 1.802), em que se reafirmou a jurisprudência no sentido de reconhecer legítima a atuação do

legislador ordinário no trato de questões procedimentais desde que não interfira na própria caracterização

da imunidade.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que rejeitou os embargos de declaração. Entendeu que

não há qualquer vício inerente ao acordão impugnado.

Afastou a apontada abrangência da tese fixada, a qual, segundo o relator, decorreu da linha

argumentativa geral do voto condutor do acórdão quanto à impossibilidade de lei ordinária prever

requisitos para o gozo da imunidade tributária. Ressaltou que inexiste qualquer descompasso e que é

imprópria a alegação de ser a tese mais extensiva do que o entendimento adotado sob o ângulo da

repercussão geral. Ademais, o colegiado reconheceu a suficiência do Código Tributário Nacional (CTN)

para estabelecer os critérios para a concessão de imunidade tributária às entidades beneficentes de

assistência social.

Quanto à suposta contradição entre o que decidido no recurso extraordinário e a orientação

firmada nas ações diretas apreciadas em conjunto, concluiu que descabe suscitar, mediante embargos,

vícios externos ao ato impugnado. A mácula passível de saneamento deve ser interna, não alcançando

inconformismos alusivos ao resultado do julgamento.

(1) CF: “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei,

mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes

contribuições sociais: (...) § 7º São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.”

(2) CF: “Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;”

RE 566622 ED/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento em

18.12.2019. (RE-566622) (Informativo 964, Plenário)

Limitações ao poder de tributar

Imunidade tributária e exportação indireta – 2 A norma imunizante contida no inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal (CF) (1)

alcança as receitas decorrentes de operações indiretas de exportação caracterizadas por haver participação

negocial de sociedade exportadora intermediária.

Com essa tese de repercussão geral (Tema 674), o Plenário concluiu julgamento conjunto de

recurso extraordinário e de ação direta de inconstitucionalidade (ADI) nos quais se discutia o alcance da

mencionada imunidade, que preceitua não incidir contribuições sociais e de intervenção no domínio

econômico sobre as receitas decorrentes de exportação (Informativo 965).

O colegiado julgou procedente o pedido formulado na ADI, para declarar a inconstitucionalidade

do art. 170, §§ 1º e 2º, da Instrução Normativa (IN) da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB)

971/2009 (2). Além disso, deu provimento ao recurso extraordinário, a fim de reformar o acórdão

impugnado e conceder ordem mandamental, assentando a inviabilidade de exações baseadas nas

restrições presentes no art. 245, §§ 1º e 2º, da IN da Secretaria da Receita Previdenciária (SRP) 3/2005

(3), no tocante às exportações de açúcar e álcool realizadas por intermédio de sociedades comerciais

exportadoras.

Prevaleceram os votos dos ministros Alexandre de Moraes e Edson Fachin, relatores da ADI e do

recurso extraordinário, respectivamente.

Segundo o ministro Alexandre de Moraes, inexiste controvérsia a respeito da aplicação da aludida

imunidade sobre as receitas decorrentes de exportação direta, isto é, quando a produção é comercializada

diretamente com adquirente domiciliado no exterior. Discute-se apenas relativamente às receitas

decorrentes de exportação indireta, quando a produção é comercializada entre produtor e vendedor com

empresas constituídas e em funcionamento no Brasil que destinem os produtos à exportação. Para fins

didáticos, tais empresas podem ser ordenadas em duas categorias: (i) a primeira, composta por sociedades

comerciais regulamentadas pelo Decreto-Lei 1.248/1972, que possuem Certificado de Registro Especial,

chamadas habitualmente de trading companies; (ii) a segunda, formada com aquelas que não possuem o

referido certificado e são constituídas de acordo com o Código Civil (CCv).

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O relator da ADI aduziu que a Administração Tributária dispensa o mesmo tratamento a ambas.

Atualmente, ao adquirirem produtos no mercado interno para posterior remessa ao exterior, essas

empresas já gozam de benefícios fiscais relacionados ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); às

contribuições para o PIS/Pasep e a Cofins e ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

(ICMS).

Em seguida, asseverou que, em prestígio à garantia da máxima efetividade, a imunidade sobre as

receitas de exportação também deve ser aplicada à hipótese das exportações indiretas. Não se trata de dar

interpretação mais ampla e irrestrita para alargar o preceito. A regra da imunidade, diferentemente da

isenção, deve ser analisada do ponto de vista teleológico/finalístico do Sistema Tributário Nacional.

Dessa maneira, depreendeu que o escopo da imunidade contida no art. 149, § 2º, I, da CF é a

desoneração da carga tributária sobre transações comerciais que envolvam a venda para o exterior. É

evitar a indesejada exportação de tributos e permitir que os produtos nacionais se tornem mais

competitivos no exterior, contribuindo para a geração de divisas e o desenvolvimento nacional. Destacou

que a desoneração das atividades ligadas à exportação aparece como tendência explícita da CF, o que

pode ser comprovado por regras que disciplinam a imunidade do IPI e do ICMS. Considerada a finalidade

da norma imunizante, não há como simplesmente cindir as negociações realizadas no âmbito das

exportações indiretas, de modo a tributar as operações realizadas no mercado interno e imunizar

exclusivamente a posterior remessa ao exterior. Tributar a operação interna onera em verdade a

exportação inteira e fere inclusive a livre concorrência.

Não há razoabilidade em se excluir da imunidade a exportação indireta. A ideia da regra é permitir

o favorecimento para quem vai exportar. Impende levar em conta se a destinação final é a exportação.

Assim, o País lucra externamente, na balança comercial, e internamente, com a geração de renda e

emprego.

Por seu turno, o ministro Edson Fachin sublinhou que, em seu voto, analisou três tópicos para

responder à questão constitucional submetida à repercussão geral: (i) a desoneração da tributação na

cadeia produtiva exportadora; (ii) o regime jurídico da imunidade tributária; (iii) a exigibilidade de

contribuição previdenciária a ser paga pela agroindústria, definida na concepção ampla de produtor rural

(Lei 8.212/1991, art. 22A).

Nessa dimensão, a decisão retomou observações e ponderações sobre a dinâmica do comércio

internacional e sobre a aplicação do princípio do destino, realizadas nos julgamentos da ADO 25 e do RE

723.651, respectivamente.

O ministro Fachin realçou premissa segundo a qual a desoneração dos tributos que influa no preço

de bens e serviços deve estruturar-se, a princípio, em formato destinado à garantia do objeto, e não do

sujeito passivo da obrigação tributária. Irrelevante se promovida exportação direta ou indireta.

(1) CF: “art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e

de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o

disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. (...) § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: (...) I – não

incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;”

(2) IN RFB 971/2009: “Art. 170. Não incidem as contribuições sociais de que trata este Capítulo sobre as receitas decorrentes de exportação de produtos, cuja comercialização ocorra a partir de 12 de dezembro de 2001, por força do disposto no

inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001. § 1º

Aplica-se o disposto neste artigo exclusivamente quando a produção é comercializada diretamente com adquirente domiciliado no

exterior. § 2º A receita decorrente de comercialização com empresa constituída e em funcionamento no País é considerada receita

proveniente do comércio interno e não de exportação, independentemente da destinação que esta dará ao produto.”

(3) IN SRP 3/2005: “Art. 245. Não incidem as contribuições sociais de que trata este Capítulo sobre as receitas decorrentes de exportação de produtos, cuja comercialização ocorra a partir de 12 de dezembro de 2001, por força do disposto no inciso I do § 2º

do art. 149 da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001. § 1º Aplica-se o

disposto neste artigo exclusivamente quando a produção é comercializada diretamente com adquirente domiciliado no exterior. § 2º A receita decorrente de comercialização com empresa constituída e em funcionamento no País é considerada receita proveniente do

comércio interno e não de exportação, independentemente da destinação que esta dará ao produto.” (Revogada pela IN RFB

971/2009)

ADI 4735/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 12.2.2020. (ADI-4735)

RE 759244/SP, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 12.2.2020. (RE-759244) (Informativo 966,

Plenário)

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Responsabilidade Tributária

Responsabilidade tributária solidária de terceiros É inconstitucional lei estadual que disciplina a responsabilidade de terceiros por infrações de

forma diversa da matriz geral estabelecida pelo Código Tributário Nacional (CTN).

Com essa orientação, o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar

a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 18-C da Lei 7.098/1998, incluído pelo art. 13 da Lei

9.226/2009, ambas do Estado de Mato Grosso, que atribui responsabilidade tributária solidária por

infrações a toda pessoa que concorra ou intervenha, ativa ou passivamente, no cumprimento da obrigação

tributária, especialmente advogado, economista e correspondente fiscal.

Entendeu que a norma impugnada invadiu a competência do legislador complementar federal para

estabelecer normais gerais sobre a matéria. Além de ampliar o rol das pessoas que podem ser

pessoalmente responsáveis pelo crédito tributário previsto pelos arts. 134 e 135 do CTN (1), dispôs

diversamente do CTN sobre as circunstâncias autorizadoras da responsabilidade pessoal de terceiro.

(1) CTN: “Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte,

respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: I – os pais, pelos

tributos devidos por seus filhos menores; II – os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; III –

os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes; IV – o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio; V – o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário; VI – os tabeliães, escrivães e demais

serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício; VII – os

sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório. Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações

tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas

referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”

ADI 4845/MT, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 13.2.2020. (ADI-4845) (Informativo

966, Plenário)

Supremo Tribunal Federal

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