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RESUMO: Este artigo faz o relato de uma experiência pedagógica desenvolvido em uma Escola da Rede Pública do Estado de São Paulo, envolvendo alunos, professores, funcionários, coordenador pedagógico, direção e comunidade local na interação da implementação do Projeto: Feira das Ciências que ocorreu em outubro de 2006. E depois do evento o ensino das ciências desta escola passou por muitas transformações didáticas pedagógicas, onde alunos e professores despertaram para o ensino e aprendizagem de forma mais significativa o que proporcionou a reflexão: Quais são os métodos no Ensino de Ciências que favorece a construção do conhecimento de forma significativa e prazerosa para alunos e professores? ABSTRACT: This article is an account of a teaching experience developed in a School Network for the State of São Paulo, involving students, faculty, staff, pedagogical coordinator, direction and local community interaction in the implementation of the Project: Science Fair which took place in October 2006. And after the event science education this school has gone through many transformations didactic teaching, where students and teachers have awakened to the teaching and learning more meaningful way which provided the reflection: What are the methods in science education that favors the construction of knowledge in a meaningful and enjoyable for students and teachers? FEIRA DE CIÊNCIAS O DESPERTAR PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM Publicação Anhanguera Educacional Ltda. Coordenação Instuto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Correspondência Sistema Anhanguera de Revistas Eletrônicas - SARE [email protected] v.14 • n.18 • 2011 • p. 139-150 Edina Domingues – Centro Universitário Anhanguera - unidade Leme/SP Maria Delourdes Maciel - Universidade Cruzeiro do Sul - UNICSUL REVISTA DE EDUCAÇÃO PALAVRAS-CHAVE: Estratégias, Metodologias, Ensino de Ciências, Ensino, Aprendizagem KEYWORDS: Strategies, Methodologies, Science Education, Teaching, Learning Argo Original Recebido em: 28/10/2011 Avaliado em: 30/06/2013 Publicado em: 30/05/2014

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RESUMO: Este artigo faz o relato de uma experiência pedagógica desenvolvido em uma Escola da Rede Pública do Estado de São Paulo, envolvendo alunos, professores, funcionários, coordenador pedagógico, direção e comunidade local na interação da implementação do Projeto: Feira das Ciências que ocorreu em outubro de 2006. E depois do evento o ensino das ciências desta escola passou por muitas transformações didáticas pedagógicas, onde alunos e professores despertaram para o ensino e aprendizagem de forma mais significativa o que proporcionou a reflexão: Quais são os métodos no Ensino de Ciências que favorece a construção do conhecimento de forma significativa e prazerosa para alunos e professores?

ABSTRACT: This article is an account of a teaching experience developed in a School Network for the State of São Paulo, involving students, faculty, staff, pedagogical coordinator, direction and local community interaction in the implementation of the Project: Science Fair which took place in October 2006. And after the event science education this school has gone through many transformations didactic teaching, where students and teachers have awakened to the teaching and learning more meaningful way which provided the reflection: What are the methods in science education that favors the construction of knowledge in a meaningful and enjoyable for students and teachers?

FEIRA DE CIÊNCIASO DESPERTAR PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM

PublicaçãoAnhanguera Educacional Ltda.

CoordenaçãoInstituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE

CorrespondênciaSistema Anhanguera deRevistas Eletrônicas - [email protected]

v.14 • n.18 • 2011 • p. 139-150

Edina Domingues – Centro Universitário Anhanguera - unidade Leme/SP Maria Delourdes Maciel - Universidade Cruzeiro do Sul - UNICSUL

REVISTA DE EDUCAÇÃO

PALAVRAS-CHAVE: Estratégias, Metodologias, Ensino de Ciências, Ensino, Aprendizagem

KEYWORDS: Strategies, Methodologies, Science Education, Teaching, Learning

Artigo OriginalRecebido em: 28/10/2011Avaliado em: 30/06/2013Publicado em: 30/05/2014

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1. INTRODUÇÃO

As discussões a respeito das relações: ensino x aprendizagem na atual visão: formar alunos críticos e que estes saibam transpor seus conhecimentos de sala de aula para a aplicabilidade da vida real, coloca em questão como estão sendo construídos os saberes dos alunos que ao sair da escola, suas concepções são ainda as mesmas como Giordan (1996, p.23) afirma que “a maior parte do saber cientifico durante a escolaridade é esquecida, após alguns anos, algumas semanas até, e questiona se é que foi adquirido alguma vez”.

O aluno por sua vez, é e foi preparado para receber passivamente as informações, dentro deste cenário em que o professor leva para a sala o conhecimento pronto e acabado para fazer o processo de inculcação1. A criança antes da escola, depois que aprende a falar é naturalmente observadora, observa a tudo e a todos, e criativa e curiosa e quando chega aos bancos escolares sua intuição para curiosidade e criatividade não são incentivados e por tanto são podados.

Acostumados a receberem tudo pronto desde o jardim da infância, desenvolvem a passividade e a vontade de aprender, sua curiosidade a sua criatividade é quebrada. Muitas metodologias aplicadas em sala de aula não despertam a curiosidade dos alunos para a descoberta. Há muita diferença em repasse de informação e construção de conhecimento.

[...]a criatividade do individuo situa-se em dois tipos: pensamento divergente e convergente. O pensamento divergente é a capacidade de perceber lacunas, de ousar em busca de novos caminhos a procura de outras soluções para um determinado problema e ao contrário o convergente não procura outros caminhos por sua falta de habilidade obrigando o individuo a resolver os problemas seguindo modelos, o que chamo de modelo ‘pronto para consumo’ ou receitas. (BORDENAVE ET PEREIRA: 1998, P. 222)

O que fazemos com nossos alunos quando apenas trazemos modelos prontos? Podamos sua criatividade e desenvolvemos alunos apenas com visões convergentes, promovemos uma situação de passividade. Ano após anos nos “bancos escolares” . Incentivamos a tal Educação Bancária! Sim ainda existe e persiste em muitas das nossas escolas, em muitos dos nossos atos educacionais.

Não culpamos os professores, que por muitas vezes acabam por reproduzir metodologias nas quais foram ensinados e que por muitas vezes acabam por imitar seus mestres. Pensamento que segundo os autores Carvalho e Gil Pérez (2006) os professores reproduzem as idéias, atitudes e comportamentos de seus professores que são justificados devida sua longa formação “ambiental” durante o período em que foram alunos.

A situação de passividade ao longo do ensino básico tende a gerar alunos desmotivados, sem compromisso com sua responsabilidade de estudos. Até mesmo os sistemas de ensino

1 Segundo Larousse L. F.III ( 2618) e NOT ( 1993, 23) inculcar significa “ fazer entrar e registrar de forma contundente alguma coisa no espírito de alguém

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das escolas são co-responsáveis pelo desânimo escolar, quanto foi tirado a motivação maior o de ter êxito ao final de cada ano letivo: ser aprovado exigia um movimento de responsabilidade com os estudos: O de estudar!

Somada a esta situação, na vida real os alunos estão cercados de recursos tecnológicos em cada esquina disponível até mesmo para os alunos mais carentes, pois por um valor baixo conseguem acessar em Lan House: internet e jogos de última geração, então voltando para a sala de aula os recursos não propiciam seus espíritos científicos. O resultado é visto com muita insatisfação tanto pelos alunos como de seus professores que querem ensinar e seus alunos não querem aprender pelo menos rejeitam a mesmice de sempre: cópia, explicação e questionário.

Somada a estas situações descritas, cabe a escola o grande desafio de romper as correntes das metodologias geradas pela da educação bancária e fazer o convite aos professores e alunos a se envolverem em ações que promovam e incentivem a participação dos alunos de forma ativa. Quais são estas ações que são capazes de envolver professores e alunos ao grande desafio “da construção de saberes”?

A resposta encontrada em se tratando da Escola Estadual Luiza Hidaka, em Suzano-São Paulo, foi a realização da Feira de Ciências, no ano de 2006, onde tivemos a oportunidade de vivenciar mudanças ocorridas no cenário escolar a partir da sua realização. Presenciamos a ruptura de paradigmas das metodologias “tradicionais” em que alunos e professores caminharam juntos para a realização e concretização de objetivos comuns, não havia a figura do detentor e autoritário do saber em um caminho solitário, vimos alunos e professores caminhando juntos na dialética da construção de saberes, atitudes tão necessárias para viverem em uma sociedade globalizadora.

2. FEIRA DE CIÊNCIAS: RESGATANDO SUA HISTÓRIA

No Brasil, segundo Mancuso (2006), até a década de 1950, o ensino de Ciências foi caracterizado por muitas aulas expositivas e aulas teóricas, com conteúdos que enfatizavam mais o resultado final do que o próprio processo de fazer Ciências, evidenciando os aspectos positivos e sem o questionamento a utilização dos métodos científicos.

Em 1957 os russos, lançaram o Sputnik ao espaço, colocando em evidência sua soberania em relação aos avanços tecnológicos e científicos e a conseqüência foi uma verdadeira revolução nos currículos escolares, principalmente nos Estados Unidos, que buscavam agora uma nova forma de ensinar Ciências. Foram nascendo novas técnicas para o ensino de ciências, que viriam a ser os “projetos de ensino” e os projetos curriculares.

Mancuso (2006) e Krasilchik (1987) afirmam que o movimento em prol do ensino de Ciências no Brasil antecedeu o movimento norte-americano. No inicio da década de 1950, em São Paulo, foi criado o IBECC, sob a liderança de Isaias Raw e um grupo de

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professores universitários, que visavam aprimoramento e qualidade do ensino superior e, em decorrência, esperavam que este influenciasse o processo de desenvolvimento nacional.

Mancuso (1993) e Pereira (2000) relatam que foi em meados da década de 1960 que surgiram as primeiras Feiras de Ciências no Brasil, realizadas em 1965 pelo Colégio Estadual de Vacaria, no Rio Grande do Sul, e em 1967 pelo Instituto de Educação Flores da Cunha, em Porto Alegre/RS.

O primeiro órgão a incentivar e coordenar as feiras de Ciências, em vários níveis - escolar, municipal, regional, estadual e nacional - foi o Centro de Treinamento para professores de Ciências do Rio Grande do Sul, que mais tarde passou a chamar-se Centro de Ciências do Estado do Rio Grande do Sul - CECIRS. Do mesmo modo, os primeiros textos sobre Feira de Ciências são os artigos de Hennig, Monte e Azevedo publicados nos Boletins nº. 03 e nº. 05 do CECIRS (MANCUSO, 2006).

Segundo Hennig (1998) o titulo “Uma atividade que se Impõe”, registrada na 1ª capa do Boletim nº. 5 do CECIRS, de junho de 1970, foi apresentado aos professores de ciências com os primeiros resultados da Feira de Ciências do Rio Grande do Sul. O primeiro parágrafo descrevia o crescente sucesso das Feiras de Ciências e enfatizava o desenvolvimento cultural das próprias comunidades, humanizando as ciências experimentais; a valorização da função da escola, caracterizada como força atuante capaz de gerar o bem-estar individual e social, através da incorporação do conhecimento cientifico e sua utilização na prática.

De acordo com Pereira (2000) as Feiras de Ciências em nível regional aconteceram em 1969, em três cidades do Rio Grande do Sul: Santa Maria, Passo Fundo e Caxias do Sul, vindo a ser um grande evento educacional, considerado em nível estudantil como o “cartão-postal científico do Estado”. Essas Feiras de Ciências, em decorrência das experiências adquiridas, foram sendo aperfeiçoadas em seus objetivos e forma de avaliar, sendo adaptadas e melhoradas na década de 1970.

As Feiras de Ciências estaduais aconteceram também em: Passo Fundo, Cachoeira do Sul, Santa Cruz do Sul, Santa Maria e Santa Rosa, cidades que, desde o inicio do programa, deram maior incentivo, apoio e participação, passando a serem realizadas, posteriormente, em outras quatro cidades: Canoas, São Leopoldo, Carazinho e Butiá. O Centro de Ciências das Faculdades Integradas de Santa Cruz do Sul (Universidade de Santa Cruz do Sul) foi considerada o berço das Feiras de Ciências e serviu como marco na história do Rio Grande do Sul e do Brasil.

Mancuso e Leite (2006) afirmam que em 1991 foi criado o Programa Estadual de Feira de Ciências do R.S., vinculado ao Departamento Pedagógico da Secretaria Estadual da Educação, sob responsabilidade do CECIRS. As Feiras de Ciências continuaram acontecendo até 1998.

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Os autores (2006) dizem que no final da década de 1980, Mancuso classificou e categorizou a produção científica estudantil em três grandes grupos de trabalhos apresentados pelos alunos em Feira de Ciências: trabalhos de montagem, trabalhos informativos e trabalhos investigatórios.

Trabalhos de montagem são aqueles realizados através de descrição ou produção de artefatos, segundo receitas originárias de livros didáticos e até pesquisados pela internet, como por exemplo: vulcão, motor elétrico, maquete da escola etc. Trabalhos informativos visam a divulgação de conhecimentos científicos julgados importantes à comunidade, como: alerta e prevenção a DST, AIDS, Drogas, Gravidez Precoce etc. bem como divulgação e demonstração de conhecimentos adquiridos na escola, como a formação da chuva ácida, alimentos transgênicos, etc. Trabalhos investigatórios são projetos de investigação sobre vários assuntos e áreas do conhecimento humano, envolvendo temas simples do cotidiano e que envolvam a cultura popular ou que desenvolvam a criticidade do sujeito quanto à politização.

Em 1993, Mancuso subdividiu as categorias por temas específicos de abordagem - ênfase - com a base em sua subjetividade como investigador, como por exemplo: temas com ênfase em Saúde Pública, em Educação Ambiental, didático-pedagógicos, interesses comunitários, saber popular, econômico e de produtividade, opinião e levantamento de dados, investigação descritiva e/ou classificatória, ativismo tecnicista, investigação do cotidiano, funcionamento do corpo humano e outros temas relacionados a assuntos não-usuais nas Ciências.

Quanto aos objetivos das Feiras de Ciências, Pereira (2000) diz que elas visam agregar um conjunto de situações de experiência que possibilite o incentivo ao desenvolvimento das atividades científicas e da capacidade do aluno para buscar e organizar os materiais, elaborar registros e fazer a apresentação dos dados obtidos; desenvolver, ainda, as capacidades de elaboração e conclusão, apresentação de prognósticos, compreensão de objetos e fenômenos, oralidade, construção de modelos estáticos ou dinâmicos e o manejo de equipamento do laboratório ou da natureza.

A interação do aluno com o projeto da Feira de Ciências aproxima professor e alunos para o alcance de objetivos comuns. O aluno tem a chance de agir de forma ativa interagindo com o objeto de pesquisa, investiga, explora, registra, argumenta, conclui, expõe com orgulho suas experiências; compartilha conhecimentos e desenvolve aptidões para o trabalho.

O aluno, com sua busca por respostas, investiga, explora e concretiza, na prática, modelos experimentais. Sua relação com o concreto auxilia em suas representações cognitivas. Além disso, o contato facilita sua aprendizagem de forma significativa e prazerosa.

Ao interagir em busca de respostas a seus questionamentos, os alunos saem de sua passividade das aulas magistrais e têm a oportunidade de dialogar e resolver questões de

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forma coletiva, o que favorece a cooperação entre os membros do grupo, sendo esta situação um treino para a vida adulta, pois são as tomadas de decisões para resolução de situações de conflito.

De acordo com Not (1993, p.103), a interação dos alunos através dos projetos permite descobrir a pluridisciplinaridade do saber necessário à ação de vivenciar e à planificação, direção, cooperação e divisão das tarefas, pois experimenta a solidariedade na ação coletiva.

Segundo Hennig (1998) o conhecimento é mais bem adquirido pelos alunos quando estes saem do estado passivo para adquirir o conhecimento através de dificuldades reais. Esta experiência é justificada pela e para a formação do espírito cientifico. As Feiras de Ciências constituem-se em atividades nas quais os alunos realizam atividades de investigação científica, planejam e executam uma seqüência organizada de tarefas em relação a uma situação concreta, possibilitando as demonstrações dos resultados obtidos.

Para o autor, esta técnica proporciona aos estudantes a vivência de situações reais, ensaiando o experimento de viver, convivendo com problemas, não jogando com a vida, mas vivendo-a de verdade, com todas as frustrações e alegrias que ela possibilita. Os projetos investigatórios que compõem a Feira de Ciências refletem-se, basicamente, em atividades de busca, solução de problemas, compreensão dos fatos, entendimento dos princípios, identificação da proposição de problemas, formulação de hipóteses, testes experimentais, coleta, ordenação e interpretação de dados e conclusões operacionais.

Segundo Borba (1996, p.43, apud MANCUSO, 2006, p. 25) a Feira de Ciências desenvolve no aluno a ação democrática; libera o aluno para o pensar criativo, em que sua capacidade de comunicação é exercida e ele retorna para a sala de aula com maior decisão em relação aos problemas do cotidiano.

Pereira (2000) considera que a participação dos alunos nas Feiras de Ciências possibilita a divulgação dos trabalhos, a troca de informação e conhecimentos com alunos de outras escolas e regiões, novos conhecimentos que são levados à comunidade, incentivo ao estudo de Ciências, integração entre os alunos e intercâmbio com outros expositores para troca de ideias e realização de novos trabalhos, aprofundando o assunto investigado.

Acredito que a realização da Feira de Ciências, tal como proposta pelos autores, além de desenvolver habilidades e competências nos alunos, favorece aos professores e escola a integração com a comunidade a partir da divulgação dos trabalhos desenvolvidos pelos alunos, e a relação pais e escola, incentivando a cooperação e o reconhecimento do PPP - Projeto Político Pedagógico - da escola por parte dos pais. Para os alunos é muito gratificante poder mostrar seus projetos para a família e a comunidade, promovendo a auto-estima de todos os envolvidos no evento: filhos e pais, alunos e professores, escola e comunidade.

Pereira (2000) aponta as dificuldades dos professores para a execução dos projetos: falta de bibliografia, de apoio por parte de professores de outras áreas, intervenção dos

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professores na realização de trabalhos e não pelos alunos, falta de empenho por parte dos professores para buscar os incentivos necessários para o desenvolvimento dos projetos com seus alunos; falta de recursos financeiros e humanos, falta de tempo para trabalhar com a metodologia científica, entre outros.

Percebo que apesar dessas dificuldades encontradas por professores e alunos, a Feira de Ciências não está adormecida para o mundo. Muitos são os esforços de pesquisadores como Hennig (1998), Pereira (2000) e Mancuso (2006) e de professores e alunos que desenvolvem seus projetos até de forma anônima, semeando as Ciências e visando colher, no futuro, cidadãos e cientistas conscientes de que o conhecimento é uma riqueza a ser compartilhada com todos, sem a ganância do poder que escraviza e exclui o ser humano.

3. FEIRA DE CIÊNCIAS: O ELO ENTRE A TEORIA E A PRÁTICA

A Feira das Ciências foi um projeto desenvolvido por professores e alunos, a partir das reuniões de Replanejamento e HTPC2, em 2006. A Feira aconteceu em nossa escola no mês de outubro de 2006, com 28 trabalhos inscritos, envolvendo as três áreas do conhecimento: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias. Por envolver todas as áreas, durante o replanejamento, em julho de 2006, os professores decidiram denominar o projeto como Feira das Ciências em vez de Feira de Ciências.

Os alunos escolheram de forma autônoma o tema do seu projeto. As tarefas foram divididas em pesquisa bibliográfica, levantamento de recursos e materiais a serem utilizados; planejamento e elaboração da apresentação envolvendo cenário, cartazes e outros recursos; organização de revezamento para monitoramento e exposição dos projetos, etc.

A Feira das Ciências ficou organizada segundo o seguinte cronograma:• Nos dias 16, 17 e 18 de outubro de 2006, organização e montagem, ficando as equipes

de montagem, selecionadas entre os alunos e seus professores, encarregados de comparecer nestes dias.

• Dia 19 de outubro de 2006, exposição dos trabalhos, nos seguintes horários: 9h às 12h30, 14h às 17h30 e das 19h às 22h. Ficaram responsáveis de comparecer as equipes de monitores divididos em três horários.

• Dia 20 de outubro de 2006, desmontagem da feira e limpeza da escola.A divulgação do evento foi feita por três alunas da 2ª série B, que levaram convites e

banners para outras escolas da cidade de Suzano. Essas alunas também participaram como recepcionistas na Feira das Ciências.

Nos dias 16,17 e 18 de outubro de 2006, quem não estivesse ciente do que estava acontecendo na escola, percebia o cenário como um caos. Era desafiante imaginar que

2 Hora de trabalho pedagógico coletivo

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daquela movimentação de alunos fora da sala, em busca de materiais para compor o cenário de cada sala teria como resultado final a Feira das Ciências.

Como diz a “Teoria do Caos” (MORIN 1973), é preciso ter a ordem e depois a desordem que estabelece a ordem. Percebemos no olhar dos alunos o brilho, o sorriso na face estampado, pela satisfação em realizar algo concreto, produto de seus esforços e objeto para ser mostrado e compartilhado com colegas e familiares.

Segundo Borba (1996, apud MANCUSO , 2006, p.25), a criança aprende mais quando gosta do que faz e a Feira de Ciências é uma das soluções para o resgate de uma escola mais lúdica e prazerosa. Segundo Borba (1996, p.43):

A feira desenvolve nos alunos a ação democrática de participação coletiva. Permite a troca de experiências, libera o aluno para um pensar critico em que sua capacidade de comunicação é exercida. Conseqüentemente, após atuar na feira de ciências, nosso aluno retornará à sua sala com maior capacidade de decisão em relação aos problemas do nosso cotidiano. (BORBA, 1996, p.43)

Surgiram muitas dificuldades para a realização desta Feira das Ciências, mas os alunos, professores e funcionários uniram-se para vencer os obstáculos. Com o incentivo da maioria dos professores de todas as áreas, as informações foram passadas diretamente para os alunos representantes das salas e depois por seus professores coordenadores.

Os recursos foram providos pelos alunos, pais dos alunos e pela APM - Associação de Pais e Mestres - da escola.

E no dia 19 de outubro de 2006, pontualmente às 9h da manhã, as salas estavam prontas para receber as visitas. À medida que chegavam, os alunos organizavam filas para entrada nas salas. Logo eram filas em todas as portas e em todos os lugares da escola, como refeitórios, corredores, os dois pátios, as onze salas de aulas, laboratório de Ciências, SAI – Sala ambiente de Informática-, Sala de vídeo.

A Feira foi desenvolvido em pouco tempo, sendo contemplados a maior parte dos trabalhos classificados, segundo Mancuso (1993, apud MANCUSO, 2006, p.23), como trabalhos informativos, cujo objetivo é informar o público e de divulgação.

Fazemos um destaque especial para o projeto apresentado pelas alunas da 3ªE, sobre Reaproveitamento Alimentar - figura 01 - que, segundo Mancuso (1996, p.48-49, apud MANCUSO, 2006, p.23), é classificado como trabalho de divulgação, considerado importante por demonstrar os conhecimentos adquiridos na escola. Trabalhos com ênfase em assuntos não usuais nas Ciências, segundo classificação de Mancuso (1996, p.48-49, citado por MANCUSO em 2006, p.23), foram os desenvolvidos pelos alunos da 7ªB: Como as ciganas fazem leitura das mãos e a Numerologia (figuras 02e 03). Por ocasião da escolha dos alunos a professora de Ciências explicou que o tema não era considerado cientifico, mas uma representação cultural.

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Figura 01 – Exposição – Projeto: Reaproveitamento alimentar

3ª série E. Fonte: Coordenação Pedagógica, outubro de 2006

Figuras 02 e 03– Exposição – Projeto:

Ciganas e Numerologia - Alunos da 7ªB. Fonte: Coordenação Pedagógica - outubro de 2006

Trabalhos como estes são geralmente criticados pelos professores de Ciências, pois se trata de outros saberes que afloram na sociedade, mas que não são reconhecidos pela Academia. Esses temas refletem e revelam importantes aspectos culturais da escola e da comunidade. Além disso, a presença de temas conflitantes, pela discussão que provocam nos alunos, professores e visitantes, acaba gerando novas e importantes discussões e debates sobre o conhecimento científico e o conhecimento de senso comum.

Como ponto positivo da Feira das Ciências, destaco o envolvimento de todos os professores. Embora tenha sido combinado que os professores coordenadores de classe seriam os responsáveis pelo acompanhamento dos projetos desenvolvidos pelos alunos, nesse evento contamos com quase todos os professores. Aqueles que não eram coordenadores de classe e tinham poucas aulas na escola, principalmente os professores eventuais, cederam parte das suas aulas para desenvolvimento e planejamento dos projetos pelos alunos. Mesmo no dia da organização dos projetos, esses professores acompanharam seus alunos nas saídas para a compra dos materiais necessários.

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Em todos os lugares possíveis foram organizados espaços para exposição dos trabalhos dos alunos que envolviam os mais variados temas. A situação foi registrada pela Supervisora Mara nos seguintes dizeres:

Os trabalhos desenvolvidos perpassaram por todas as áreas dos conhecimentos numa abordagem significativa e contextualizada dos temas selecionados. Entre os temas: Monteiro Lobato, raciocínio matemático, reciclagem, nazismo, chuva ácida, vida animal, reaproveitamento de alimentos, poesia, bulimia e anorexia e aviação entre outros. Parabenizo a todos os envolvidos. Parabéns a toda equipe.

Supervisora Mara S. Bioto

A professora ATP - Assistente Técnico Pedagógico - também deixou registrado o seguinte trecho no termo de acompanhamento:

[...] entre os trabalhos apresentados nota-se que foram trabalhados projetos interdisciplinares e multidisciplinares articulados por temáticas como: Prevenção e Saúde, Reciclagem e Meio Ambiente entre as diferentes áreas do conhecimento e na mesma área ou disciplina. O produto final foi apresentado em forma de painéis explicativos, experimentos, relatos, teatro, música, dança, com apresentação oral ou multimídia. Professores, alunos, Coordenação Pedagógica, Direção e funcionários estavam todos articulados e envolvidos no evento. ATP Elizabeth R. Rodrigues.

Figura 04 –Meio Ambiente: Reciclagem – Alunas da 5ªA.

Fonte: Coordenação Pedagógica s: outubro de 2006.

A supervisora - nossa Diretora afastada para a função de supervisora - deixou o seguinte registro em seus “Termo de Acompanhamento”:

[...] A equipe gestora, funcionários, professores e alunos estão de parabéns pelo nível e qualidade dos trabalhos apresentados, bem como pelo cuidado e organização da escola. Supervisora de Ensino Suzana de A. N. Catharino.

Muitas vezes, quando as escolas chegavam para visitar a Feira, o professor que os acompanhavam anotava a nome da escola e número de alunos, a fim de facilitar o registro e controle da entrada dos visitantes, foram contabilizadas mais de 2.000 mil assinaturas no livro de visitas em um único dia. Eram ônibus chegando com alunos que formavam grande filas para prestigiar o evento.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização da Feira das Ciências foi a concretização do empenho de todos da escola, principalmente dos alunos, que superaram as dificuldades e encontraram soluções. Houve colaboração e interação de todos. Professores e alunos desfrutam do sabor da técnica de projeto Feira de Ciências, um modelo que atente a atual necessidade de mudança quanto ao ensino de Ciências.

A Feira das Ciências propiciou para alunos e professores a possibilidade de interagirem; de praticarem a dialética entre os agentes do processo ensino aprendizagem que, normalmente, fica tão distante da sala de aula.

Professores e alunos uniram-se como parceiros na construção de novas práticas e, juntos, conseguiram construir novos conhecimentos na prática da interação com os outros e com os assuntos desenvolvidos. Professores venceram a barreira da sala de aula, tiveram a ousadia de abraçar o desafio da realização de um trabalho idealizado por vários autores, tendo os alunos como protagonista de uma aprendizagem significativa crítica, como define Moreira (2007), tão necessária nos tempos atuais.

REFERÊNCIAS

BORBA, Edson. A importância do trabalho coletivo com Feiras e Clubes de Ciências. Repensando o ensino de Ciências. Caderno de Ação Cultural Educativa. Vol 03, coleção Desenvolvimento curricular. Diretoria de Desenvolvimento Curricular. Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1996.

BORDENAVE, Juan Diaz; PEREIRA, Martins Pereira. Estratégia de Ensino-Aprendizagem. 14. ed. Vozes. Petrópolis. RJ 1998.

CARVALHO, A. M. P.; GIL-PEREZ, D. Formação de Professores de Ciências. São Paulo: Cortez, 2006. Questões da Nossa Época, nº. 26.

DOMINGUES, E. O HTPC como espaço de formação e construção de novas práticas pedagógicas/Édina Domingues - São Paulo; SP: [s.n], 2007. 275 p. : il. ; 30 cm. (mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática, Universidade Cruzeiro do Sul

GIORDAN, A.; VECCHI, G. As origens do saber: das concepções dos aprendentes aos conceitos científicos. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas,.

HENNIG, Georg J. Metodologia do ensino de ciências. Porto Alegre: Mercado Aberto,1998.

KRASILCHIK, M. O Professor e o Currículo das Ciências. São Paulo: EPU/EDUSP.’ 1997.

MANCUSO, Ronaldo. LEITE,.I.F. Feira de Ciências no Brasil: uma trajetória de quatro décadas. FENACEB/Ministério da Educação, secretaria da Educação Básica – Brasília. Ministério da Educação Básica, 2006. 84p.

_____.A Evolução do Programa de Feira de Ciências do Rio Grande do Sul: Avaliação Tradicional x Avaliação Participativa. Florianópolis: UFSC, 1993. (Dissertação em Educação) Universidade de Santa Catarina, 1993.

MOREIRA, Marco Antonio.. Aprendizagem significativa crítica. Conferência proferida em junho de 2007 no Programa de Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática da UNICSUL/SP.

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Feira de ciências: o despertar para o ensino e aprendizagem

MORIN, Edgar. O Paradigma Perdido: A Natureza Humana. Publicações Europa-América LDA, 1973.

NOT, Louis. Ensinando a Aprender. São Paulo: Summus, 1993.

PEREIRA, A.B. Férias de Ciências. Antonio Batista Pereira. Edson Roberto Oiagen, Georg. J. Hennig. Canoas. Ed. ULBRA, 2000.